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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ensino do Português e de Língua Estrangeira nos Ensinos Básicos e Secundário - Português/Espanhol, realizada sob a orientação científica do Professor Doutor João Costa e da Professora Doutora Fernanda Menéndez

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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de

Mestre em Ensino do Português e de Língua Estrangeira nos Ensinos Básicos e Secundário - Português/Espanhol, realizada sob a orientação científica do Professor Doutor João Costa e da Professora Doutora Fernanda Menéndez

Dedico este trabalho à Leonor, pelo fascínio que é fazer parte da sua vida, dia a

dia, hora a hora, minuto a minuto.

À minha família e amigos pelo apoio, pelas palavras de incentivo e de

optimismo, à Sandra pela sua dedicação, paciência e, sobretudo, pelo seu amor.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os meus orientadores pelo incentivo, confiança e

disponibilidade.

Ao Professor Doutor João Costa, à Professora Doutora Fernanda Menéndez e às

minhas orientadoras de estágio, Olga Batista e Conceição Fatela, pela partilha do saber

e as valiosas contribuições para o trabalho.

Por último, à Direcção e a todos os alunos da Escola Secundária Jorge Peixinho

pela preciosa colaboração.

O PODER DAS PALAVRAS: CAPITAL LEXICAL E CONSCIÊNCIA LEXICAL

The power of words: lexical capital and lexical consciousness

Venâncio Gonçalo Mota Pedro

RESUMO

O presente relatório tem como objectivo geral estabelecer uma relação, por vezes negligenciada, entre a fundamentação teórica e a prática de ensino, numa perspectiva de sinergia entre o trabalho de investigadores e a sua aplicação no ensino. Como objectivo específico, pretende dar um enquadramento teórico sobre a aquisição da linguagem, nomeadamente através de três dos mais profícuos investigadores do nosso tempo, Jean Piaget, Lev Vygotski e Noam Chomsky, e as suas repercussões na aquisição e consciência lexical, seguindo a investigação levada a cabo pela investigadora Inês Duarte, sem nunca esquecer o peso sociológico da Escola e do aprendente na construção do seu capital lexical. É também um objectivo deste relatório abordar a aquisição de uma segunda língua (L2). Assim, descrevo as principais teorias, como as teorias nativistas, ambientalistas e interaccionistas. Pelo facto da prática de ensino assentar em duas línguas provenientes da mesma raiz (Português e Espanhol), também considerei pertinente a questão das semelhanças e diferenças entre as duas. Assim, veremos a importância da interlíngua, da Análise Contrastiva e da Análise de Erros, bem como a questão da cognaticidade ou não-cognaticidade, os chamados falsos amigos. Por último, desenvolverei as implicações dos argumentos teóricos evidenciados na prática de ensino supervisionado, nomeadamente através das estratégias utilizadas para a aquisição de léxico, dos materiais desenvolvidos ou adaptados, das reflexões proporcionadas pela bibliografia e a sua influência na prática de ensino.

ABSTRACT

The present report has it general purpose to establish a relation, sometimes neglected, in a perspective of synergy between the theoretical investigation and Teaching. As a specific purpose, I intend to frame theories about language acquisition, following the investigations of some of the most proficuous authors of our times, such as Jean Piaget, Lev Vygotski and Noam Chomsky, and the repercussions in the acquisition and lexical consciousness, on a investigation lead by Inês Duarte, without forgetting the sociological weight of the School and of the learner in the construction

of his lexical capital. It is also a specific purpose of this essay, to approach the second languages (L2) acquisition theories. Therefore, I describe the main theories, such as the nativists, the environmentalists and the interactionists theories. By the fact that the Teaching Practice is based on two languages that came from the same roots (Portuguese and Spanish), I also considered important the similarities and the differences between those two languages. Thus, we will see the importance of the interlanguage, the Contrastive Analysis, the Error Analysis, and also the question of cognaticity and non-cognaticity, the so called false friends. Finally, I will develop the implications of the theoretical arguments, especially on the lexical acquisition strategies, the creation or adaptation of materials and for the reflections caused by the bibliography and its influence on the Teaching practice.

PALAVRAS-CHAVE: aquisição da linguagem, aquisição lexical, consciência

lexical, capital lexical, aquisição de L2

KEYWORDS: Language acquisition, lexical acquisition, lexical consciousness,

lexical capital, L2 acquisition

ÍNDICE

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 1

Piaget, Brunner e Chomsky ............................................................................................... 3

Piaget e Vygotski ............................................................................................................. 13

O papel da Escola no desenvolvimento do capital lexical ................................................ 24

Algumas teorias sobre a aquisição da segunda língua (L2) .............................................. 29

Teorias nativistas ..................................................................................................... 31 As Teorias Ambientalistas ...................................................................................... 32 Teorias interaccionistas da aquisição de L2 ......................................................... 34 Definições de Análise Contrastiva, Análise de Erros e Interlíngua .................. 35

Prática de Ensino Supervisionada .................................................................................... 46

Enquadramento institucional: caracterização da escola cooperante ................ 46

Prática de Ensino Supervisionada nas aulas de Português e de Espanhol ....................... 47

Caracterização da Turma de Português de 9.º Ano ............................................ 47 Caracterização da Turma de Espanhol de 10.º Ano ........................................... 48

Leccionação das aulas de Português e Espanhol ............................................................. 48

Enquadramento do tema do relatório nas aulas de Língua Portuguesa e de Espanhol ..... 48 Estratégias utilizadas ............................................................................................... 51

Reflexão crítica sobre a prática de ensino supervisionada .............................................. 57

CONCLUSÃO .................................................................................................................... 61

BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................. 62

INTRODUÇÃO

O presente relatório tem como principal objectivo estabelecer um

enquadramento teórico sobre a aquisição da linguagem e as suas repercussões na

aquisição e consciência lexical nos alunos do ensino básico e secundário.

Este trabalho será dividido em duas partes, sendo que na primeira parte,

abordarei o enquadramento teórico, onde se evidenciará os conceitos de alguns dos

mais profícuos investigadores do século XX, nomeadamente Piaget, Chomsky e

Vygotski, entre outros. Veremos a sua influência na investigação sobre a aquisição da

língua materna e nas segundas línguas, denominadas de L2. Para além do trabalho

destes investigadores, este relatório tem como bibliografia basilar o estudo de Inês

Duarte, O conhecimento da língua: desenvolver a consciência lexical, e as suas

implicações no ensino básico e secundário, tendo sempre em consideração o peso

sociológico da Escola e do aprendente na construção do seu capital lexical e de

estabelecer uma relação entre aquisição e capital lexical.

Primeiramente, tomaremos contacto com a teoria construtivista de Piaget e as

suas semelhanças e diferenças com a teoria inatista de Chomsky, assim como os

pontos de convergência e divergência entre o autor suíço e Lev Vygotski.

Seguidamente, estabelecerei a implicação destas teorias na relação com a Escola e o

seu envolvimento no desenvolvimento da consciência lexical. Por último, exporei

algumas das teorias para a aquisição de uma L2, assim como os problemas colocados

pela proximidade linguística do Português e do Espanhol.

Na segunda parte deste relatório tentarei enquadrar a primeira parte deste

trabalho na Prática de Ensino Supervisionada, nomeadamente como as teorias

avançadas por estes autores me influenciaram na minha prática como docente,

estabelecendo enquadramentos, estratégias e planificações baseadas nestes autores.

Em primeiro lugar, farei uma breve caracterização do estabelecimento de Ensino, bem

como uma sucinta caracterização das turmas onde obtive a Prática de Ensino

Supervisionada. Seguidamente apresentarei o enquadramento do tema deste relatório

nas aulas de Língua Portuguesa e Espanhol, assim como as estratégias utilizadas.

1

Finalmente, apresentarei uma reflexão crítica sobre o trabalho realizado, as

adequações dos materiais, o sucesso das estratégias, a adequação dos objectivos e

propostas de melhoria no ensino e aprendizagem do léxico na língua materna e na

língua estrangeira.

Este relatório tem como princípio fundamental estabelecer uma relação, por

vezes abandonada, entre a fundamentação teórica e a prática de ensino, numa

perspectiva de sinergia entre o trabalho dos investigadores e a sua aplicação no

ensino.

2

Piaget, Brunner e Chomsky

Ao observarmos crianças dos três aos cinco anos ficamos com a sensação do

quão incrível é a aquisição da linguagem por parte destes e como o pensamento e a

linguagem parecem andar de mãos dadas pelo «recreio» e questionamo-nos como

será feita essa aquisição. Será através do instinto ou através da aprendizagem? É um

percurso que se realiza individualmente ou é feito pelas relações sociais? Estas

questões fizeram crescer um grande interesse pela relação entre o pensamento e a

linguagem. Psicólogos, linguistas e pedagogos, desde o início do século XX, decidiram

investigar esta relação. Todo este interesse pelo tema e a sua complexidade levou,

muitas vezes, a generalizações abusivas que não contribuíram para o esclarecimento

desta relação, mas antes a muitas interrogações:

• Qual a função da linguagem na génese das capacidades intelectuais?;

• Que influência exerce a linguagem no funcionamento intelectual, especialmente

quando se trata da resolução de um problema?;

• De que forma o desenvolvimento cognitivo permite compreender como aprende

a criança a servir-se da linguagem?;

• Em que medida a linguagem tem uma função relevante na actividade intelectual

da criança? (REBELO, 1990, p. 45).

O aparecimento destas perguntas acarreta dois problemas distintos: por um

lado, os processos cognitivos, por outro, as diferentes realizações linguísticas que

permitem a sua significação (OLERON, 1972; cit. REBELO, p. 45).

Nesta primeira parte centrar-nos-emos nos trabalhos desenvolvidos por Piaget,

Chomsky e Vygotski e tentaremos esclarecer as perguntas efectuadas anteriormente.

3

A análise das teorias de Piaget e Vygotski assenta no livro de Vygotski,

Pensamento e Linguagem, de 1934. Um dos capítulos deste livro é uma crítica à obra

de Piaget, O Pensamento e a Linguagem na Criança, de 1932. Para procedermos à sua

análise é necessário esclarecer algumas noções que nos permitem avançar sem receios

pela temática do pensamento e linguagem. A primeira delas diz respeito à distinção

entre fase etária e estádio de desenvolvimento.

A fase etária tem como princípio básico a idade física do indivíduo; já o estádio

de desenvolvimento baseia-se numa estrutura que vai condicionar a sua própria

existência. São conceitos diversos, já que o estádio, embora possa ocorrer ao mesmo

tempo que uma determinada fase etária, não é estabelecido necessariamente em

função da idade. Os estádios de desenvolvimento funcionam como estruturas e como

sistemas que estão sujeitos a mudanças e transformações. As estruturas estão assim

em constante mudança e transformação, num sentido ascendente de maior

complexidade e é na fase linguística onde se demonstra com maior vigor. Piaget, no

seu esquema construtivista, descreve o período pré-operatório que servirá para a

criança desenvolver a inteligência representativa, ligada à aquisição da linguagem. É

nesta etapa específica que a criança desenvolve a capacidade de representar qualquer

coisa por meio de outra coisa, isto é, um significado (objecto, acontecimento) por meio

de um significante diferenciado que só servirá para essa representação: linguagem,

gesto simbólico, imagem mental.

Cada pessoa possui per se uma estrutura onde é possível distinguir diversos

factores essenciais, dos quais se destacam o pensamento e a linguagem. Como refere

Alarcão Tavares, estes factores encontram-se ligados numa teia a muitos outros como

os do relacionamento social, os axiológicos, os afectivos, entre outros, embora

adquiram importância em determinadas fases da nossa existência1. Piaget teve um

longo e árduo trabalho para precisar em que consiste um estádio de desenvolvimento.

Os termos que definem o estádio passam pela ordem de sucessão das aquisições ser

uma constante. Esta sequência deve, depois, obedecer a uma integração, isto é, as

1 «Nos primeiros tempos predominam os aspectos psicomotores e afectivos, depois os cognitivos e, finalmente, os axiológicos e de relacionamento social. A predominância de ou outro de esses aspectos imprime à personalidade da criança ritmos e características próprios que se exprimem em linguagens e comportamentos mais ou menos específicos», in Tavares, J; Alarcão, J., Psicologia do Desenvolvimento e da aprendizagem, Coimbra, Livraria Almedina, 1985, p. 32.

4

estruturas que foram construídas num determinado estádio devem ser integradas nas

estruturas do estádio seguinte.

As características seguintes devem corresponder a uma ideia de conjunto, já

que não é possível constituir-se uma estrutura como uma amálgama justaposta de

partes diversas. Daí decorre que se deve distinguir no interior de cada uma delas o seu

início, o estado de preparação, e um momento final, o denominado «estado de

acabamento». Finalmente, a última característica do estádio de desenvolvimento

realça o facto de se apresentar na sua ordem natural de sucessão «um processo de

formação (de génese) e as suas formas de equilíbrio final»2.

A distinção entre fase etária e estádio de desenvolvimento processa-se de uma

forma mais simples, tendo em atenção estes conceitos. A fase etária tem como

princípio básico a idade física de um indivíduo, já o estádio de desenvolvimento baseia-

se «numa determinada estrutura que condiciona a sua própria existência»3.

Segundo a perspectiva piagetiana, o desenvolvimento do ser humano é uma

reorganização dinâmica das estruturas cognitivas construídas através da acção do

sujeito. Esta acção implica «uma troca funcional entre uma organização biológica e o

meio, pressupõe uma estrutura interna e conduz a uma estruturação do meio»4. Na

origem desta capacidade cognitiva de organizar-se estádios, que podem ser vistos

como as unidades básicas do desenvolvimento, vai estar o denominado

interaccionismo.

O desenvolvimento cognitivo, que decorre através de vários estádios, é o

resultado da interacção entre o sujeito e o ambiente. Associado indelevelmente ao

interaccionismo está o próprio estruturalismo, trave mestra do pensamento de Piaget.

O que se desenvolve são os chamados conjuntos de esquemas, que possuem um nível

de preparação e acabamento. Como sistemas que são, estão abertos à mudança e

contínua transformação: «as estruturas construídas numa idade dada, tornam-se parte

integrante das estruturas da idade seguinte»5. Este carácter integrativo é um dos

fenómenos fundamentais para o funcionamento da máquina construtivista de Piaget. 2 Tavares, J; Alarcão, J., Psicologia do Desenvolvimento e da aprendizagem, Coimbra, Livraria Almedina, 1985, p. 34.3 Idem, p. 37.4 Pais Ribeiro, p. 56.5 Idem, p. 58.

5

As estruturas estão assim em constante mudança e transformação, num sentido

ascendente de maior complexidade.

Será agora oportuno analisar o modo como decorre essa mudança e

transformação no denominado período Pré-Operatório, que Piaget chamou de

segundo estádio, surgindo na criança entre os dois e os cinco, seis anos. Este período

segue-se ao designado período Sensório-Motor, que vai desde o nascimento até aos

dois anos. A partir da transformação dos reflexos inatos, a criança começa a

desenvolver a sua inteligência, prática e manipulativa, que consiste fundamentalmente

numa diferenciação entre ela e o mundo.

No estádio Sensório-Motor, a criança começa por possuir apenas sensações

internas – prazer, dor −, mas depois é capaz de acompanhar com o olhar um objecto

que se desloque no seu campo visual. Lentamente, vai reconhecendo a autonomia dos

objectos e constatando a sua diferença perante os mesmos. O pensamento como

representação interiorizada, neste estádio, ainda não existe.

Voltando ao período Pré-Operatório, é neste período que a criança desenvolve

a inteligência representativa, intimamente ligada à aquisição da linguagem. Ela

desenvolve a capacidade de representar qualquer coisa por meio de outra coisa, ou

seja, um significado qualquer (objecto, acontecimento) por meio de um significante

diferenciado que só servirá para essa representação: linguagem, gesto simbólico,

imagem mental. Estamos na presença da função simbólica. Piaget vai sustentar a tese

de que a passagem do estádio Sensório-Motor para o das operações concretas se faz,

sobretudo, através da representação. «Esta capacidade cognitiva permite representar

os objectos da percepção independentemente da sua presença, ou seja, na sua

ausência».6 Só através da integração desta característica é permitido inaugurar o

estádio da inteligência. É neste período que a criança começa a fazer aquisições na

dimensão linguística. Piaget explica que a linguagem está enraizada e mantém-se

solidária com as aquisições feitas ao nível da inteligência sensório-motora dado que

esta «já contém toda uma lógica em acção, pois que ainda não há pensamento, nem

representação, nem linguagem». O fenómeno presente ao nível desta lógica da acção

6Tavares, J; Alarcão, J., Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem, Coimbra, Livraria Almedina, 1985, p. 64.

6

é a «assimilação», que «garante a integração de novos objectos ou de novas situações

e acontecimentos em esquemas anteriores»7.

A linguagem segue este modelo, e só quando houver a presença da capacidade

de representação é que é possível construir mais tarde a função simbólica e semiótica.

Quando tal sucede, o vocabulário e a construção frásica da criança atingem patamares

de altíssima complexidade, quando comparados com os estádios anteriores. Não é por

isso estranho que muitos autores refiram este estágio como a fase linguística por

excelência, devido à rapidez com que a criança adquire os requisitos linguísticos e

comunicacionais. «As coisas do mundo a dizer são primeiramente objecto da

percepção, para serem, depois, imagens, sinais, símbolos, palavras, frases, linguagem.

É neste jogo que a criança faz a passagem da imagem sensível à imagem mental e em

que investe grande parte da sua energia. Ela comunica-se ainda em grande média em

esquemas de acção, de representação figurativa e não propriamente em esquemas

operatórios»8. Estes últimos só ocorrerão mais tarde, mas o que é um facto é que a

criança de três anos sofre um salto qualitativo em termos de desenvolvimento no que

diz respeito à descoberta do seu próprio corpo, da sua individualidade perante outros

e a distinção dos objectos que povoam o seu quotidiano. A par desta descoberta, a

função simbólica ou semiótica também concorre para o efeito final. O papel semiótico

vai surgir, para Piaget, entre os dois e os quatro anos de idade e está baseado numa

espécie de imagem mental «que pressupõe já a aquisição da capacidade

representativa». Embora este domínio se demonstre de um modo superficial e

abrangendo em especial «os eixos do singular, do concreto e do meramente

figurativo»9, não deixa de estar presente.

Observemos agora como se desenrola todo este processo. Ao longo desta

etapa assiste-se a uma progressiva descentração do indivíduo. A criança que, no

estádio anterior se encontrava encerrada sobre si própria, liberta-se deste casulo e

expõe-se ao mundo. Esta maior abertura que lhe proporciona a linguagem, está

intimamente ligada com a descentração. Este facto é de extrema importância no

esquema piagetiano, na medida em que desta forma se dá a oportunidade de

7 Piaget, Jean, et alia, Teorias da Linguagem Teorias da aprendizagem, Lisboa, Edições 70, p. 241.8 Ibidem.9 Tavares, J; Alarcão, J., Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem, Coimbra, Livraria Almedina, 1985, p. 64.

7

presenciar a transição do egocentrismo inconsciente para o nascimento e a construção

de um universo ainda a dar os primeiros passos, mas desde já, estável, objectivo e

aberto. Neste novo campo, a criança tem a possibilidade de exercitar continuamente

as suas novas aquisições e aprendizagens, que lhe permitem situar a sua acção no

meio dos demais sujeitos e objectos, ao mesmo tempo que reclama para si a sua quota

de individualidade. A sua interacção com o meio ganha uma forma mais ou menos

coerente, o que permite à criança ir transformando os seus esquemas de acção em

esquemas operatórios ou de conhecimento à medida que se forem atingindo os

diversos estádios de desenvolvimento.

No caso específico do subestádio que medeia os dois e os quatro anos, ele é

fundamental para o exercício e aprofundamento das actividades associadas à «função

simbólica», tendo como premissa basilar «imitação representativa». Este «instinto»

para aprender permite à criança dedicar-se «à formação de significantes cada vez mais

variados e complexos e integrá-los num sistema de símbolos que estará na base do

jogo simbólico»10. Esta é, aliás, a sua actividade predominante e predilecta, tomando

conta do seu tempo, quer quando interage com os seus semelhantes e outros

objectos, quer quando se entretém sozinha num perpétuo jogo de faz-de-conta.

Porém, convém referir que, apesar da passagem para uma maior descentração,

o pensamento assimilador com raízes no egocentrismo, não desapareceu. Muito pelo

contrário. Esse género de pensamento permanece e continua a ditar as suas leis. Este

predomínio subsistirá até aos seis, sete anos, isto é, até ao aparecimento das

operações concretas. Este egocentrismo que continua a fazer sentir a sua influência no

decurso do estádio pré-operatório é, para Piaget, de carácter intelectual. Há a

pressuposição lógica e também gnosiológica de se estabelecer que na relação

sujeito/meio a primazia continua a assentar no sujeito. Deste egocentrismo intelectual

vão derivar todos os outros egocentrismos que vão afectar as dimensões verbal, social,

lógica e ontológica. A representação do universo que a criança tem ao seu alcance

manifesta-se depois «no realismo infantil, no animismo e no artificialismo através dos

quais ela explica tudo o que acontece à sua volta»11.

10 Tavares, J; Alarcão, J., Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem, Coimbra, Livraria Almedina, 1985, p. 65.11 Idem, p. 66.

8

No campo da psicologia experimental, J. S. Brunner aposta num modelo

diferente do protagonizado por Piaget. Em Brunner, os mecanismos da linguagem

assumem uma relação estreita com um sistema de valores, com uma filosofia de vida e

até com os laços que se estabelecem com a «aprendizagem no processo educativo e

no quadro social»12.

O pensamento brunneriano tem um percurso alicerçado na convicção de que é

possível «a busca permanente do homem inserido na cultura e que se exprime através

da linguagem»13. Tendo estado à frente dos planos de estudo para as escolas dos

estados Unidos da América na década de 60, Brunner foi um autor que tentou articular

as três grandes estruturas onde assenta a educação: a do desenvolvimento, a do

conhecimento e a da aprendizagem.

Também neste modelo a criança segue um determinado itinerário de

desenvolvimento, segmentado em diversos estádios. Serão considerados três grandes

níveis ou estádios: o estádio da representação activa, o estádio da representação

icónica e o estádio da representação simbólica.

Assim, no primeiro estádio predomina a acção: a criança vê-se impelida a

«representar o mundo que a rodeia através da acção»14. No segundo estádio,

representação icónica, a criança vai representar o mundo circundante através de

imagens. As fronteiras deste estádio são difíceis de delimitar tal como acontece no

período pré-operatório piagetiano, na sua fase final, em que a criança já consegue, em

certa medida «libertar-se do mundo da imagem». No sistema brunneriano essa

imagem está progressivamente a tornar-se símbolo. Com as novas capacidades

adquiridas já é possível usar o símbolo para exprimir a realidade, manipulando-a,

fazendo uso do «em vez de»15. Por fim, surge o estádio da representação simbólica.

Esta só é passível de compreensão tendo como plataforma base a estrutura da

linguagem.

12 Idem, p. 70.13 Idem, p. 71.14 «Uma acção de actos encadeados e, em certa medida, programada através de mecanismos de reflexos simples e condicionados de hábitos. Esta acção traduz-se em respostas de natureza sensório-motora como: andar, agarrar, tocar, etc.» in Tavares, J; Alarcão, J., Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem, Coimbra, Livraria Almedina, 1985, p. 72.15 «É este sair da acção para a imagem e voltar, de certa maneira, à acção, ao real, através do simbólico, que constitui o itinerário do desenvolvimento humano até atingir o último patamar de humanização» idem, p. 74.

9

A relação das linguagens e a dimensão simbólica acarretam em si a expressão

do humano. Nesta afirmação reverbera o inatismo chomskiano (mais à frente

olharemos com detalhe para esta teoria) e Brunner está convencido de que esta

dimensão simbólica «possui já uma estrutura mais simples, mais antiga, uma estrutura

proto-simbólica»16. Esta estrutura da linguagem, onde se estabelecem as relações

Eu/Tu e Eu/Vós é, no modelo brunneriano, «uma estrutura mais complexa do que as

actividades pré-linguísticas ou proto-simbólicas do saber-fazer»17. Mais uma vez a

Gramática Universal proposta por Chomsky faz todo o sentido, segundo Brunner. O

desenvolvimento dos processos cognitivos só é conhecido devido à presença da

linguagem. É através da linguagem que o mundo circundante faz sentido, ganha uma

dinâmica própria. A linguagem permite ao homem obter uma cultura, uma técnica,

uma educação, dotando de identidade, de coerência. É a linguagem que agregará

todos esses limiares vivenciais numa única realidade.18

Apesar das suas idiossincrasias, as teorias de Piaget e Brunner complementam-

se. Se a perspectiva piagetiana permite analisar a génese, as transformações e a

estrutura dos processos cognitivos, o exemplo brunneriano dá o seu contributo «no

estudo do desenvolvimento humano no quadro da cultura, através das “ferramentas”

da linguagem, em busca do espírito humano e numa perspectiva educativa».19

Convém, neste momento, depois de várias alusões à sua obra, debruçarmo-nos sobre

a teoria da Gramática Generativa, da Gramática Universal e a L.A.D. de Chomsky. Ora,

o relevante na perspectiva de Chomsky é a criatividade do falante, a convicção de que

qualquer ser humano possui a capacidade de criar a sua linguagem quando fala e

quando se serve do seu código individual para produzir enunciados que nunca ouvira

antes (REBELO, p. 52).

Para Chomsky qualquer falante é capaz de produzir e compreender um número

infinito de frases com um número finito de unidades (fonemas, morfemas, lexemas).

16 Idem, p. 75.17 Ibidem.18 «A linguagem é uma capacidade dinâmica que se desenvolve também progressivamente no próprio processo de desenvolvimento. É pela linguagem que o mundo do já dito e a dizer vem à presença, se exprime e, ao exprimir-se, torna o homem mais maduro, mais humano. É a famosa espiral da articulação do desenvolvimento e da aprendizagem que passa pela linguagem sem a qual não é possível compreender o processo da acção educativa» in Tavares, J; Alarcão, J., Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem, Coimbra, Livraria Almedina, 1985, p. 76.19 Ibidem.

10

Este comportamento linguístico prova a existência de um mecanismo que permite

produzir todas as frases possíveis. A construção da gramática de uma língua assenta

neste mecanismo. A gramática é então a representação dos processos pelos quais a

criatividade é suportada. Anexada a esta convicção vem a questão da

“gramaticalidade”, isto é, é necessário distinguir entre os enunciados que pertencem à

língua e aqueles que não lhe pertencem, mas que qualquer locutor possui um

conhecimento intuitivo em relação ao que é gramatical e ao que é agramatical

(REBELO, p. 53).

Para Chomsky, a linguagem é a origem autónoma do conhecimento, diferente

de outros processos mentais e dos «mecanismos cognitivos inatos». Para o autor não

existe analogia entre a gramática assimilada por uma pessoa e qualquer outro sistema

cognitivo isolado. É a competência inata, a única possibilidade de se progredir na

aquisição da linguagem, pois é ela a verdadeira fonte do conhecimento (REBELO, p.

53).

No que diz respeito à Gramática Universal podemos descrevê-la, em traços

gerais, como a capacidade inata da criança para possuir uma gramática universal

incorporada à estrutura da mente, isto é, a criança nasce geneticamente com uma

gramática com todas as regras possíveis de todas as línguas, um arquivo, disposto por

ficheiros, que acciona e selecciona consoante o input dado pelos adultos,

transformando essa gramática universal na gramática da língua a que está exposta.

Desta forma, quanto maior for a capacidade cognitiva da criança, maiores serão as

suposições por si feitas e mais próximas estarão da linguagem do adulto. As frases

produzidas pelas crianças, à luz desta teoria, não são simples imitações da fala dos

adultos, possuindo elas disposições e ordenações que não se verificam na fala dos

adultos, o que sugere que sejam produções «originais», regidas por regras próprias. No

entanto, à medida que estabelecem contacto com as regras da linguagem dos adultos,

vão-se moldando e adaptando ao seu sistema de regras. Assim surge o L. A. D.

(Language Acquisition Device) que é accionado através do input dado pelos adultos,

gerando a gramática para a qual a criança está contextualizada. Porém, a criança só

activará algumas regras da Gramática Universal, neste caso consoante a língua a que

11

está exposta, transformando a Gramática universal na gramática da língua nativa a que

está exposta.

Depois destas breves explicações, podemos contrastar alguns aspectos das

teorias apresentadas por Piaget e Chomsky no que diz respeito à aquisição da

linguagem. Piaget afirma que não há estruturas cognitivas inatas. Só o funcionamento

da inteligência é hereditário. Já Chomsky declara que uma capacidade de linguagem,

geneticamente determinada, especifica uma certa classe de «gramáticas

humanamente acessíveis». Piaget não aceita a hipótese do «núcleo fixo inato» porque

biologicamente não se explica que o acaso das mutações torne o ser humano apto

para «aprender» a linguagem articulada, o «núcleo fixo» é visto como o resultado

«necessário» das construções da inteligência sensorial-motora, anterior à linguagem, e

que resultam das auto-regulações, simultaneamente orgânicas e comportamentais.

Chomsky considera que a criança conhece a língua determinada pela gramática que

adquiriu, e esta gramática é uma representação da sua «competência intrínseca».

Considera ainda que o facto de ignorarmos de que modo as mutações ao acaso

dotaram a espécie humana da capacidade específica de aprender a linguagem, não nos

autoriza a tirar qualquer conclusão, pois o mesmo acontece com o desenvolvimento

de outras estruturas, para além da ideia de que as construções da inteligência

sensório-motora determinam o carácter de um órgão mental como a linguagem é tão

plausível como a afirmação de que as propriedades fundamentais do córtex visual se

desenvolvem desta maneira (REBELO, p. 56).

12

Piaget e Vygotski

No campo da investigação do desenvolvimento humano, as diferenças entre

vários autores, por mais subtis que sejam, proporcionam um novo olhar que, muitas

vezes, surge como contraponto a outros já existentes. Lev Vygotski e Piaget são desses

autores.

Vygotski e Piaget fazem parte de um número escasso de investigadores que

possibilitaram uma aceleração no que diz respeito aos estudos sobre o pensamento e

linguagem. Apesar de nunca se terem encontrado pessoalmente, uma vez que

Vygotski morreu aos 37 anos, é certo que o investigador bielorrusso acompanhou os

estudos efectuados por Piaget, servindo-se dos mesmos como contraponto às suas

investigações. Tal como Piaget, Vygotski seguia um modelo estruturalista, mas ao

contrário do psicólogo suíço, vai propor uma «teoria não universal»20, o que nas suas

palavras sobre as teorias estruturalistas, significa que «categorizam domínios

desenvolvimentais que partilham determinadas qualidades críticas com domínios

universais, mas não são nem universalmente atingidos nem espontaneamente

adquiridos»21.

20 Ribeiro, José Pais, in Bartolo, Paiva Campos, Psicologia do Desenvolvimento e Educação de Jovens, Lisboa, Universidade Aberta, 1990.21 Idem, p. 70.

13

Este modelo rejeita a teoria dos estádios de desenvolvimento de Piaget. Para

Vygotski, nem esses estádios são universais, nem tão pouco surgem como que do

nada. No percurso de desenvolvimento do ser humano, a expansão cognitiva é vista

como «um processo dinâmico cheio de elevações, mudanças bruscas e inversões. Este

processo, no entanto, conduz em última análise à formação de funções mentais

culturais elevadas»22. Segundo Vygotski, as situações sociais, onde o indivíduo interage

com os seus pares, assumem um papel importante nesta internalização de preceitos. É

esta experiência gradual de vivência que leva a criança a fazer a aquisição das funções

intelectuais, que o autor distingue das funções elementares como a memória, a

atenção, a vontade e a percepção e as funções culturais que surgem da transformação

gradual das funções elementares. São estas funções exclusivamente humanas que, no

fundo, existem já em solo societário. Se Piaget colocava o papel principal no sujeito, na

construção e desenvolvimento dos seus processos psicológicos, como a maturação, a

experiência ou o próprio equilíbrio, Vygotski, por sua vez, considera que a construção

das funções mais elevadas e intelectualmente superiores só é possível mediante a

ascensão do papel da sociedade como íman de todas as aprendizagens.

Vygotski, na sua obra Pensamento e Linguagem aborda a problemática relação

entre pensamento e linguagem, apresentando como ideia-chave a ligação entre ideia e

palavra. Este contrato entre os dois termos foi, segundo o autor, muito mal visto pelas

«abordagens atomicistas e funcionalistas, por privilegiarem a análise das funções

psíquicas como entidades isoladas»23. O caso é que os psicólogos, ainda que

concordem com o estabelecimento da unidade de consciência e com a inter-relação de

todas as funções psíquicas acabam por «sistematicamente ignorar as relações

interfuncionais».

Até à década de 30 do século XX, oscilava-se entre dois pólos que Vygotski

designa como defensores da homologia, por um lado, e aqueles que advogam a

dissociação, por outro. A homologia permitia a fusão entre ideia e palavra e a

dissociação exigia a total separação entre as duas.

Os autores que defendiam a homologia acreditavam que a identificação

palavra/ideia era completa e quem funde pensamento e linguagem «impede-se a si 22 Ibidem.23 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V.N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 19.

14

próprio de encarar a problemática da relação entre a ideia e a palavra, e torna essa

questão irresolúvel a priori. O problema não é resolvido, sendo simplesmente

evitado.»24 Por sua vez, os que defendem a dissociação do pensamento e da

linguagem, vendo esta última como uma «expressão exterior» do pensamento, tentam

«imaginar a ligação entre ambas como se a relação entre os dois processos fosse

puramente exterior e mecânica»25.

A designação que o autor bielorrusso pretende é a de uma análise que possa

reduzir «totalidades complexas a unidades». Estas unidades são todo e qualquer

produto de análise que distintamente «possua todas as propriedades fundamentais

inerentes ao todo e que, além disso, não desintegre a realidade viva e indivisível que

constituí esse todo»26. Com esta pesquisa, o autor aspira à substituição do método

dissociativo por um outro que possa identificar as «unidades indissociáveis» que

conservam em si «as propriedades do fenómeno enquanto totalidades». No

pensamento verbal, tal unidade indivisível só pode ser encontrada no significado da

palavra, uma vez que é no «lado interior da palavra» que se encontra «o nó central da

tal unidade a que chamamos pensamento verbal»27. A palavra constitui algo que é

crucial para Vygotski, a denominada «generalização implícita». O significado da palavra

é, antes de tudo, «um acto verbal do pensamento, um meio de reflectir o real de um

modo muito distinto da forma como ele é reflectido nas sensações e nas percepções

imediatas»28. Consequentemente, o aspecto psicológico do significado assenta em dois

pólos: o da linguagem e o do pensamento. O significado, ao ser simultaneamente

pensamento e linguagem, pode ser perspectivado como fenómeno de natureza verbal

e como fenómeno cognitivo. Interessa ao autor um método de investigação que possa

efectuar uma análise semântica exaustiva, testado nas experiências com crianças

efectuadas pelo autor.

Atendendo ao anteriormente referido, o autor quer trazer à tona a estreita

ligação entre duas funções da linguagem: a comunicativa e a cognitiva29. É através da

24 Idem, p. 21.25 Ibidem.26 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 25.27 Idem, p. 26.28 Ibidem.29 «A função primordial da linguagem é a comunicação. A linguagem é antes de mais um meio de partilha social, um meio de conversação e de compreensão.» in Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem,

15

conversação e da compreensão proporcionada pela partilha social que a cultura

influencia o desenvolvimento humano em vários planos. É a cultura que proporciona,

ou não, as circunstâncias propícias à resolução de problemas. Por fim, ela surge como

entidade reguladora do nível a que a dificuldade da tarefa a desempenhar pode

facilitar ou atrasar a internalização dos padrões. Assim, a análise da linguagem pecará

sempre enquanto separar a função comunicativa da função intelectual, considerando-

as como estradas paralelas, sem intersecções. Vygotski encontra no significado da

palavra o elemento que vai constituir, ao mesmo tempo, a unidade da linguagem e a

unidade do pensamento.

Ainda sobre o aspecto comunicacional sobressai a imposição das virtualidades

comunicativas que dão especial ênfase à ideia de que se não é possível a comunicação

sem recurso a signos também «não é possível comunicar sem significados». É certo

que a comunicação, baseada na compreensão racional e na transmissão intencional de

sensações e ideias, exige criteriosamente um sistema de signos, cujo protótipo é a

linguagem humana, surgida da necessidade de comunicar. À luz desta premissa «só é

possível transmitir a outra pessoa uma determinada sensação ou um determinado

conteúdo de consciência se esse fenómeno estiver associado a uma determinada

classe ou grupo de fenómenos»30. Tal pressuposto dá pelo nome de generalização: «A

comunicação pressupõe obrigatoriamente a generalização e o desenvolvimento da

significação verbal».31 Este vai ser o ponto de partida que Vygotski estabelece quando

procede ao estudo genético do pensamento e da linguagem: «Só quando se considera

a unidade formada pelo binómio comunicação/generalização é que se compreende

adequadamente a verdadeira relação entre o desenvolvimento do pensamento infantil

e o desenvolvimento social da criança.»32

Partindo desta fundamentação, Vygotski decide enfrentar os estudos

efectuados por Piaget, especialmente a sua obra O Pensamento e a Linguagem da

Criança, de 1932. Embora a sua discordância seja evidente, Vygotski não deixa, no

entanto, de enaltecer o trabalho do psicólogo suíço quanto à sua metodologia clínica e

pelo facto de colocar o pensamento como um problema qualitativo e não meramente

V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 27.30 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 27.31 Ibidem.32 Idem, p. 29.

16

quantitativo. Através do método clínico, Piaget consegue superar as tendências

materialistas e idealistas. Piaget cinge-se «ao âmbito restrito dos factos» que só o

método clínico é capaz e o seu ponto forte assenta «na obtenção dos factos, na cultura

científica do facto psicológico, na sua análise pormenorizada, na classificação dos

dados, na capacidade de ouvir o que eles dizem».33

Vejamos agora onde difere o pensamento do autor bielorrusso do autor suíço.

O nó unificador da obra piagetiana reside no denominado egocentrismo, como vimos

anteriormente. É desta característica fundamental que vão decorrer todos os restantes

caracteres do pensamento da criança. A marca egocêntrica distintiva do pensamento

infantil vai ser vista, no entanto, como uma forma intermédia e de transição que se

situa «entre o pensamento autista e o pensamento racional e intencional».34 Para

Vygotski, Piaget considera «o pensamento intencional e consciente, isto é, persegue

objectivos que estão representados na mente daquele que pensa. É racional, isto é,

adapta-se à realidade e tenta interagir com ela. O Pensamento implica a verdade ou a

falácia, e exprime-se através da linguagem».35

Vejamos como é que este pensamento faz a transição entre o pólo intencional,

passando pelo seu ponto mediador, o do pensamento egocêntrico.

Em primeiro lugar, o pensamento autista não é consciente, os seus objectivos e

as questões que coloca não são de forma alguma acessíveis à consciência. Tal facto

resulta do pensamento egocêntrico não estar ajustado à realidade exterior, já que ele

«cria a sua própria realidade, a realidade do sonho. Ele não procura o esclarecimento

da verdade, mas sim a satisfação do desejo, e permanece totalmente individual. Em si

mesmo o pensamento autista não pode exprimir-se através da linguagem, exprime-se

principalmente através de imagens».36 Por sua vez, o pensamento racional e

intencional, possui já uma natureza social e, á medida que cresce e avança, «tende a

reger-se cada vez mais pela experiência e pela lógica pura».37

No ponto intermédio entre estes dois pólos está, para Piaget, um tipo particular

de pensamento, que funciona como um elo entre a lógica autista e a lógica da razão. 33 Idem, p. 38.34 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 41.35 Ibidem.36 Idem, p. 42.37 Ibidem.

17

Este pensamento designado como egocêntrico, é um pensamento que «procura

adaptar-se à realidade, apesar de não ser comunicável enquanto tal».38 Existe na

criança uma «impermeabilidade à experiência». Aquilo que ela recebe do exterior é

por si assimilada, na expressão piagetiana «deformado», e só dessa maneira pode ser

assimilada. O egocentrismo segue este modelo e pode ser visto como «o produto da

deformação das modalidades de pensamento social que imergem na substância

psicológica da criança – deformação que obedece às leis que regem a vida e o

desenvolvimento dessa substância».39

Vygotski não podia estar mais em desacordo com a posição assumida por

Piaget. O psicólogo bielorrusso discute, desde logo, a questão da centralidade que

afecta o pensamento egocêntrico. Ser considerado como o ponto que medeia o

pensamento autista e as formas superiores do pensamento é algo controverso e que

permite lançar dúvidas sobre a teoria do desenvolvimento. Vygotski afirma que o

pensamento autista a nível genético, funcional e estrutural «não pode constituir o

elemento primário ou a base a partir do qual hão-de surgir todas as formas

subsequentes de pensamento»40. A ideia piagetiana de que o pensamento autista não

está adaptado à realidade exterior, nem tão pouco se pode exprimir através da

linguagem é rebatida pelos próprios resultados da investigação de Vygotski. A

conclusão a que chega é que se trata de uma forma de pensamento «íntima e

indissociavelmente ligada à realidade, operando quase exclusivamente com aquilo que

rodeia a criança e com tudo aquilo com que ela se defronta no dia-a-dia»41.

Depois desta afirmação, o esquema introduzido por Piaget sofre um abalo

desde as suas fundações. Se na sua base não está o pensamento autista, então o

egocentrismo deixa de fazer sentido como ponto intermédio. O que acontece é que no

modelo teórico de Piaget, a linguagem, na primeira infância, não está ao serviço da

comunicação. Se esta linguagem é, em larga medida, egocêntrica então serve,

sobretudo, para marcar e acompanhar «o ritmo, a actividade e as experiências da

criança, como se fosse um acompanhamento da melodia principal. Nesse sentido, não

afecta de forma significativa, nem a actividade da criança, nem as suas experiências

38 Ibidem.39 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 48.40 Idem, p. 55.41 Ibidem.

18

subjectivas».42 A linguagem egocêntrica vista deste prisma é uma espécie de

«acessório da actividade da criança», obedecendo, no entanto, a alguns pressupostos

que convêm explicitar.

O primeiro diz respeito à sua funcionalidade que, se não é nula, tem um valor

residual em termos de desenvolvimento cognitivo e comportamental. A linguagem

egocêntrica considerada sobre este ângulo não tem, de facto, qualquer função

objectivamente útil no comportamento da criança. Trata-se de «uma linguagem de si

para si, que visa a auto-satisfação e que poderia nem sequer existir, pois não exerce

qualquer efeito significativo na actividade da criança»43.

Um outro pressuposto a considerar diz respeito à visão negativa que se tem

deste tipo de pensamento egocêntrico: «sinal de fraqueza e imaturidade do

pensamento da criança». Parte-se do princípio que este sinal de imaturidade

desapareça ao longo do percurso segmentado em estádios: «funcionalmente inútil,

não directamente ligado à estrutura da actividade da criança, este acompanhamento

melódico começará a soar cada vez mais baixo até, finalmente, se extinguir sem deixar

vestígios na linguagem»44.

Segundo Piaget, no limiar da idade escolar, a linguagem egocêntrica pura e

simplesmente morre e desaparece. É neste aspecto que surgem as principais

divergências entre Vygotski e Piaget. As pesquisas de Vygotski enveredaram por este

caminho e concluíram que a linguagem egocêntrica desempenhava, desde muito cedo,

um papel crucial e único na actividade da criança. Nas experiências levadas a cabo para

averiguar como surge esta linguagem e as possíveis causas da sua origem, a equipa de

Vygotski colocou as crianças em contextos similares aos produzidos por Piaget, mas

com uma diferença fundamental: introduziram uma serie de obstáculos que

dificultavam e perturbavam o livre fluxo da actividade da criança. Os estudos

mostravam que «nos casos em que a tarefa é dificultada, o coeficiente da linguagem

egocêntrica sobe rapidamente quase para o dobro em comparação com o coeficiente

normal obtido por Piaget, e em comparação com o que acontece com as mesmas

42 Idem, p. 60.43 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 61.44 Ibidem.

19

crianças quando a tarefa não era dificultada»45. Os resultados alcançados legitimaram

a suposição de que entre os principais factores que dão vida à natureza particular

desta linguagem encontram-se «os obstáculos ao decurso natural da actividade da

criança»46.

Esta tese alicerça-se em dois postulados. O primeiro, Vygotski vai buscá-lo à

denominada lei de tomada de consciência, formulada pela primeira vez por Edward

Claparède, mestre de Piaget, que sucintamente postula que «as dificuldades e

distúrbios a uma actividade automática levam à tomada de consciência dessa mesma

actividade». O segundo postulado sustenta que o aparecimento da linguagem surge

sempre como «indício de tomada de consciência»47. Estes factos foram observados e

confirmados por Vygotski: a linguagem egocêntrica das crianças é vista como «uma

tentativa de compreensão verbal da situação e um esforço para planear as operações

seguintes»48. A linguagem egocêntrica assume em Vygotski um papel de relevo no

próprio desenvolvimento humano, servindo como uma das estratégias fundamentais

que levam à prossecução do pensamento e da acção da criança.

A linguagem egocêntrica é então um patamar de transição, uma estratégia

usada para superar obstáculos como os que a interacção social proporciona e exige,

consoante os níveis etários da criança. Por terra ficam a inexpressividade e inutilidade

levadas em linha de conta na teoria de Piaget quando aborda a linguagem egocêntrica

da primeira infância.

A partir deste local sem retorno, os caminhos traçados por Piaget e Vygotski,

ambos estruturalistas e construtivistas, serão cada vez mais divergentes. O primeiro

está convencido de que a linguagem egocêntrica está condenada pela sua própria

estrutura ao desaparecimento; ideia distinta do processo de desenvolvimento tem

Vygotski ao apresentar uma serie de semelhanças entre a linguagem egocêntrica da

criança e o discurso interior do adulto. Tais semelhanças provam que o primeiro tipo

de linguagem examinada não desaparece de todo, mas antes sofre um processo de

expansão e de transformação. A primeira semelhança a ser descoberta diz respeito ao

45 Idem, p. 62.46 Idem, p. 63.47 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 63.48 Ibidem.

20

tipo de funções que ambas as línguas partilham: «uma e outra são linguagens para si,

distintas da linguagem social que tem por função a comunicação e a ligação com o

ambiente exterior»49. Uma outra similitude é a questão das características estruturais

semelhantes que ambas possuem. Na linguagem egocêntrica verifica-se que ela é

«incompreensível aos outros», já que perde todo e qualquer sentido «ao ser retirada

do contexto concreto em que foi produzida». Esta característica advém da sua

tendência em «suprimir aquilo que está diante dos olhos». Em suma, a linguagem

egocêntrica é fundamentalmente e intrinsecamente abreviada. Paralelamente, no

«discurso interior» insere-se a mesma tendência da «concisão». Vygotski acha então

que «o que acontece neste caso não é a extinção da linguagem egocêntrica, mas sim a

sua transformação em discurso interior ou a sua interiorização».50

Uma outra particularidade que sobressai destas investigações passa pela

relação entre a linguagem egocêntrica e o carácter egocêntrico do pensamento. O que

sucede é que tal relação pode puramente não existir. Vygotski argumenta que tal

possibilidade de inexistência de qualquer ligação pode depreender-se do facto de que

a linguagem egocêntrica da criança, «além de não ser uma expressão do pensamento

egocêntrico, pode desempenhar uma função diametralmente oposta à do pensamento

egocêntrico – a função do pensamento realista, aproximando-se não da lógica do

sonho e da fantasia, mas sim da lógica da acção e do pensamento racional e

intencional»51. Através destas palavras podemos deduzir que não existe qualquer

suporte empírico que sustente e legitime aquilo que até às pesquisas levadas a cabo

pelo autor eram mais ou menos consensuais: o de haver um reconhecimento do

carácter egocêntrico do pensamento infantil derivado de uma linguagem também ela

egocêntrica. Em contraponto está a perspectiva de Piaget, para quem a narração do

pensamento infantil é «a história da socialização gradual dos processos interiores,

profundamente, íntimos e autistas, que determinam o psiquismo da criança. O social

aparece no fim do desenvolvimento e nem mesmo a linguagem social precede a

egocêntrica, surgindo depois dela»52.

49 Idem, p. 66.50 Idem, p. 67.51 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 68.52 Ibidem.

21

Neste trajecto evolutivo do pensamento na infância e depois das conjecturas

de Vygotski, existem dois caminhos que apontam em direcções contrárias. O primeiro,

recomendado por Piaget, orienta esse caminho do individual para o social e o segundo,

recomendado por Vygotski, avança do social para o individual. Por este caminho, a

função primordial da linguagem é a comunicação, a partilha social e a influência sobre

os outros. Assim, a «forma primordial da linguagem infantil é puramente social»53. Só

mais tarde, no processo de crescimento, é que a linguagem social da criança «evolui

segundo o princípio da diferenciação em funções distintas, até que, numa determinada

idade, se diferencia de forma acentuada em linguagem egocêntrica e comunicativa»54.

A linguagem egocêntrica assume uma forma de transição entre a linguagem exterior e

o discurso interior. Esquematizando, em vez da cadeia genética piagetiana do

pensamento lógico-verbal alicerçada nos elos «pensamento autista não-verbal →

linguagem egocêntrica e pensamento egocêntrico → linguagem socializada e

pensamento lógico», temos uma disposição seguindo o modelo «linguagem social →

linguagem egocêntrica → discurso interior».55

O principal resultado das investigações levadas a cabo por Vygotski tem como

consequência originar um novo rumo ao trajecto evolutivo do pensamento, que deixa

de estar orientado do individual para o social e passa a estar orientado do social para o

individual. Sinteticamente, esta análise divide-se em quatro passos. O primeiro mostra

que, do ponto de vista da evolução biológica «é inconsistente considerar o

pensamento autista como uma forma primária, como o ponto inicial do

desenvolvimento psíquico». O segundo conclui que, ao invés da linguagem egocêntrica

considerada por Piaget como «uma expressão directa do egocentrismo», não existe

«fundamento empírico para o podermos considerar como uma expressão directa do

egocentrismo do pensamento, tanto a nível funcional como estrutural». No terceiro

passo, esclarece que a relação entre o egocentrismo do pensamento e a linguagem

auto-dirigida «não é uma grandeza constante para a definição do carácter da

linguagem da criança». No quarto e último ponto vai no sentido de demonstrar que a

linguagem egocêntrica não é uma actividade secundária e que a prazo desaparecerá.

Pelo contrário, a linguagem egocêntrica define-se como «um estádio intermédio do 53 Idem, p. 71.54 Ibidem.55 Idem, p. 73.

22

desenvolvimento da linguagem, situado entre a linguagem externa (comunicação com

os outros) e o discurso interior (linguagem para si)»56.

Numa tentativa de reflectir sobre o que foi dito anteriormente podemos

afirmar que a criança, ao nascer num mundo onde o acto da fala está sempre

presente, vai construindo o seu conhecimento da realidade física que a rodeia e é

através da presença e do contacto com o adulto que descobre o mundo físico e as suas

propriedades, que desperta a atenção, que a orienta e estimula mediante a linguagem

para a apreensão do real. Vygotski sublinha a importância das inter-relações

específicas que se criam entre os processos cognitivos e os comportamentos verbais

nas diferentes fases do desenvolvimento. Piaget fala da construção dos

comportamentos cognitivos e recusa uma concepção mecanicista das relações entre o

desenvolvimento operatório e a linguagem. Chomsky vê na linguagem uma fonte

autónoma de conhecimento distinto de outros processos mentais. A especificidade da

linguagem encontra-se no seu estatuto de sistema criativo governado por regras. É a

gramática interiorizada, a única fonte verdadeira de progresso na aquisição linguística.

A rapidez com que a criança se apropria da linguagem explica-se pela presença de

dispositivos inatos, inscritos no potencial genético da espécie humana (REBELO, p. 61).

56 Vygotski, Lev, Pensamento e Linguagem, V. N. Gaia, Estratégias Criativas, 2001, p. 75.

23

O papel da Escola no desenvolvimento do capital lexical

Como observamos anteriormente com os autores analisados, a criança, à

medida que vai crescendo, passa por várias etapas onde vai explorando de maneiras

diferentes a linguagem, desde a linguagem egocêntrica, percurso intermédio entre a

linguagem introspectiva, ou interiorização do discurso como refere Vygotski, até à sua

finalidade máxima, isto é comunicar com os outros. As funções organizativas da

linguagem são usadas nas actividades cognitivas, nomeadamente como instrumento

de representação no denominado discurso interior e quando a linguagem é usada para

fins comunicativos são as actividades cognitivas que estão ao serviço da finalidade

comunicativa. O locutor trabalha o material linguístico com o propósito de provocar no

interlocutor mudanças nas interpretações.

Pudemos observar que a linguagem intervém de maneira diferente no que se

refere à interpretação de uma situação por parte da criança e à situação em que a

criança tem de explicar ao seu interlocutor o que acaba de fazer. No primeiro caso, os

instrumentos linguísticos vão servir a actividade cognitiva e, no segundo caso, vão ter

de explicar por palavras, o que implica a organização de um discurso em função

daquilo que a criança quer dar a conhecer ao seu interlocutor. Há uma distinção entre

24

operações cognitivas e operações linguísticas, onde se trabalha as características

próprias da linguagem. Estas observações feitas por estudiosos ao longo dos tempos,

aconselham-nos a ter prudência quanto a avaliações das performances linguísticas e

intelectuais das crianças em situação escolar, onde não só os aspectos cognitivos e

linguísticos intervêm, mas também onde a dimensão social da criança adquire um

maior peso na aquisição da linguagem (REBELO, p. 63).

As opiniões sobre as dificuldades linguísticas relacionadas com a origem social

das crianças são interpretadas de duas maneiras:

1. A criança pertence a uma classe culturalmente desfavorecida, logo não

tem possibilidades de desenvolver as suas capacidades;

2. A criança, porque vive num meio pobre de estímulos culturais, fica

atingida psicológica e intelectualmente. Daí sofrer de um atraso que não

poderá ultrapassar. (REBELO, p. 64)

As dificuldades materiais e culturais, desde o nascimento da criança irão

influenciar a sua primeira infância e os seus efeitos reflectir-se-ão na inteligência, que

por sua vez influenciará a fala. Mais tarde, à criança em situação escolar ser-lhe-á

difícil a aprendizagem da leitura e da escrita. No sentido mais restrito de interpretação,

poderemos dizer que a escola nada terá a fazer, mas também poderemos colocar a

questão de que não deveria a escola tentar combater as dificuldades dos alunos

mediante aprendizagens planificadas, orientadas por objectivos bem definidos que

poderiam, de certa forma, compensar as diferenças cognitivas de classes.

Passarei a explicar quatro concepções diferentes para a questão dos problemas

linguísticos infantis. Em primeiro lugar, as investigações de Bourdieu e Passeront (cit.

REBELO, p. 64). Estes autores defendem que a relação professor-aluno funciona na

base da alusão, da referência implícita a uma cultura que não é partilhada por todas as

crianças de uma aula. Por conseguinte, as dificuldades de expressão verbal de alguns

alunos devem-se ao funcionamento linguístico do discurso escolar que espelha o

espírito de classe do docente. Assim, estes autores rejeitam a afirmação de que há

ligação directa entre insucesso escolar e a revelação dos «dotes» de cada aluno: «A

cegueira perante as dificuldades escolares autoriza que se expliquem todas as

25

desigualdades naturais, as desigualdades dos dotes» (1964, p. 103, cit. REBELO, p. 64).

Esta afirmação e outras puseram em evidência o aspecto sociológico do insucesso

escolar, embora tenha descurado o aspecto psicológico que pode intervir durante as

aprendizagens e que é de igual importância. A análise destes autores quanto às

primeiras aquisições escolares também não é concisa, levando a que seja de difícil

compreensão o denominado espírito de classe do docente sem primeiro precisar o que

é que na linguagem funciona conforme às normas arbitrárias da classe do professor e o

que é que se refere às operações cognitivas do aluno. De um modo geral, estes autores

defendem que a origem social das crianças tem um papel mais importante no seu

desempenho escolar do que as características psicológicas individuais.

Em segundo lugar, Baudelot e Establet (cit. REBELO, p. 65). Estes autores

consideram que o instrumento do insucesso escolar é a linguagem escrita de onde

resulta a divisão do sistema escolar em duas vias escolares: a do primário-profissional

e a do secundário-superior. É a própria escola que produz estas duas vias, pois não

aceita as práticas linguísticas ligadas às condições materiais de existência diferentes,

reprimindo as expressões espontâneas que não estão de acordo com as normas da

linguagem escolar. Segundo estes autores, o insucesso linguístico não é de origem

instrumental (sintaxe inadequada, vocabulário insuficiente, etc.), mas resulta do facto

de as crianças não se reconhecerem nos significados transmitidos pela escola:

«aprender a ler e a escrever implica que se corte sistematicamente a palavra a quem a

quer tomá-la sem se conformar com as leis do texto escrito. Só são autorizados a falar

os que falam como os livros» (1971, p. 231, cit. REBELO, P. 65).

Para estes autores, o dever da escola é sem dúvida criar condições que

proporcionem às crianças o acesso à leitura e à escrita, no entanto isso só será viável

se o professor tomar conhecimento da língua que falam as crianças a seu cargo para, a

partir daí, fazê-los avançar. Contudo, torna-se difícil ao professor, nos primeiros anos

de aprendizagem, impor uma norma linguística arbitrária aos alunos das camadas

populares no início das primeiras aprendizagens. É na escola que os alunos terão que

aprender a servir-se dos instrumentos linguísticos necessários para poderem

comunicar, pelo que o professor, embora respeitando os registos usados pelos alunos,

os deverá iniciar no conhecimento da língua que lhes dará prestígio social. Logo, tem

26

que haver distinção entre os instrumentos linguísticos necessários e os que

caracterizam uma linguagem cultural arbitrária ligada a uma classe social.

Em terceiro lugar, Bernstein (cit. REBELO, p. 65). Este autor parte do princípio

de que todas as classes sociais dispõem da mesma inteligência potencial e da mesma

competência linguística, embora na organização das sociedades existam as classes que

detêm o poder e as outras que o não têm. Consequentemente, as pessoas de uma

determinada classe adoptarão uma forma particular de comunicação. Ao nível da

linguagem, essa forma de comunicação traduz-se pelo uso do «código restrito» ou do

«código elaborado», possuindo cada código as suas características próprias. Assim, as

diferenças de «performance» explicam-se, não pela capacidade linguística de cada

indivíduo, mas sim pelas diferenças de emprego e de usos da linguagem. Contudo, a

escola privilegia o código elaborado e, por conseguinte, surge o insucesso escolar dos

filhos das classes populares. Este autor recusa a tese do défice, quer linguístico, quer

intelectual, considerando que os dois códigos têm o seu valor afectivo, a sua estética,

as suas potencialidades. Na sua investigação, Bernstein caracteriza o «código restrito»

como tendo sintaxe menos rica, vocabulário mais pobre, lógica menos marcada, etc.

Deste modo, não se vislumbra claramente onde está a igualdade de linguagem que

possui um utilizador deste código em comparação com as características do código

elaborado.

A orientação das crianças da classe popular não é inferior à das crianças da

classe média, mas não corresponde à norma exigida pela escola e pela sociedade. A

apreciação da orientação cognitiva da classe popular é feita do mesmo modo,

negativamente: menos abstracta, menos capaz de generalização, etc. Assim, Bernstein

não consegue evitar uma comparação deficitária do código linguístico, o que por sua

vez se liga a um comportamento cognitivo deficitário. O que significa que as diferenças

cognitivas são determinadas pela forma de uso dos códigos linguístico e o cognitivo,

confundindo-se novamente os dois planos: o linguístico e o cognitivo.

Em quarto e último lugar, Lautrey (cit. REBELO, p. 66). Este autor procura

explicar as desigualdades de desenvolvimento entre indivíduos pelos mecanismos

gerais de desenvolvimento, interrogando-se sobre os efeitos diferenciadores das

condições sociais no desenvolvimento psicológico, questionando também quanto às

27

razões que fazem com que meios socioculturais diferentes apresentem formas de

estruturação diferentes e desigualmente favoráveis.

Lautrey, articulando o nível psicológico com o nível sociológico, colocando-os

no mesmo patamar, considera que o tipo de estruturação e sistema de valores

constituem em conjunto, e pela sua interacção, o sistema educativo da família.

Intervêm conjuntamente no desenvolvimento cognitivo, mas não mantêm as mesmas

relações em todos os grupos sociais e estas diferenças na organização do sistema

educativo têm um determinado efeito no desenvolvimento. O autor demonstra que o

sistema educativo familiar mais desfavorável ao desenvolvimento era aquele que

associava uma estruturação rígida a uma valorização da obediência, não devendo ser

este o caminho escolhido pela escola.

O desenvolvimento cognitivo não se processa na simples interacção da criança

com o mundo físico, que se imporia de forma idêntica a todos. A criança apropria-se

de uma realidade transformada pelo homem, onde as produções humanas têm um

conteúdo cultural que influencia a forma das suas experiências. O mundo dos objectos

desvenda-se progressivamente à criança na sua significação social. No percurso deste

processo, a criança é guiada pela linguagem do adulto: «É pela linguagem que se

generaliza e se transmite a experiencia da prática socio-histórica da humanidade; por

conseguinte ela é igualmente um meio de comunicação, a condição da apropriação

pelos indivíduos desta experiencia, e a forma da sua existência na consciência»

(LEONTIEV, P. 161, cit. REBELO, p. 67).

28

Algumas teorias sobre a aquisição da segunda língua (L2)

A relevância das teorias de aquisição/aprendizagem de línguas é um facto

inegável para todos aqueles que se dedicam à formação de futuros professores de

línguas. Assim sendo, apresentaremos uma amostra reduzida de algumas das

principais teorias linguísticas de aquisição/aprendizagem de línguas, tendo em vista a

ênfase de cada uma delas nos factores cognitivos e ambientais, classificando-as em

29

nativistas, ambientalistas e integracionistas. Inicialmente, faremos uma breve

retrospectiva da constituição do campo de pesquisa em aquisição e/ou aprendizagem

de segundas línguas, relacionando-as com o programa de Análise Contrastiva e com os

postulados chomskyanos. Posto isto, trataremos das teorias de

aquisição/aprendizagem de línguas que, actualmente, configuram um importante

campo de pesquisa.

Nos últimos anos, as pesquisas em aquisição e/ou aprendizagem de segundas

línguas começaram a delinear um importante campo. Larsen-Freeman & Long57 (1994,

p. 199-271) observam que há pelo menos 40 teorias de aquisição de segundas línguas

e que esse número aumenta considerando-se as teorias sobre a aquisição de primeira

língua, crioulização, mudanças na história da língua, entre outras.

A hipótese de Análise Contrastiva, inicialmente, era a de que, se o aprendiz

tivesse uma língua similar à estrangeira, seria mais fácil a sua aprendizagem, sendo o

inverso também válido. Este tipo de análise imperou nas décadas de 1950 e 1960, mas

entrou em declínio pela sua inadequação empírica e incremento das investigações da

sintaxe. Chomsky já tinha atacado as bases do behaviorismo de Skinner, em 1957, e,

em 1965, propôs, no seu Aspects of Theory of Sintax, a aquisição da linguagem em

termos inatistas, abalando as bases teóricas da hipótese da Análise Contrastiva, na sua

versão original.

Iniciou-se, a partir dos anos 60, um período em que a Análise Contrastiva foi

marcada por uma forte orientação gerativa, com aplicações pedagógicas dos

postulados chomskyanos. Esse período de breve existência, por causa das

inadequações entre a adaptação dos postulados teóricos aplicados aos objectivos

pedagógicos e a Análise Contrastiva, na sua versão forte, entrou em colapso na década

de 1970. Antes, em 1967, P. Corder havia proposto uma nova avaliação dos erros, que

assumiram um papel fundamental para a aprendizagem, como hipóteses elaboradas

para aprendizes. Iniciou-se um período conhecido como o do «análise dos erros»,

57 In LARSEN-FREEMAN, D. L., LONG, M. H. (1994). Introducción al estudio de la adquisición de segundas lenguas. Madrid. Gredos.

30

derivado, inicialmente, de uma versão «fraca» da Análise Contrastiva e que nos trouxe

o conceito de interlíngua e as investigações sobre a sua natureza.

Segundo Ellis (1985, p. 249), o principal objectivo de uma teoria de aquisição de

segundas línguas é justamente o da descrição da natureza das categorias linguísticas

que constituem a interlíngua dos aprendizes num ponto do seu desenvolvimento.

Refere-se à distinção de Schumann entre dois tipos de explicação: a) a dos processos

cognitivos – preocupada com o como a aquisição se dá − e b) a dos factores iniciantes

preocupada com o porquê que a aquisição se dá.

Teorias nativistas

As teorias nativistas explicam a aquisição como uma aptidão biológica que

permite a aprendizagem. Chomsky postula que existe uma faculdade inata para a

linguagem, um conhecimento inato de substantivos universais como categorias

sintácticas – sujeito, objecto, nome, verbo − e traços fonológicos distintivos e de

universais formais (princípios abstractos que regem regras e parâmetros das línguas

naturais). Outras teorias nativistas como as de O´Grady e a de Parker consideraram

inatas as ideias cognitivas gerais, como a «dependência», a «contiguidade», a

«prioridade», etc., a partir de todo o tipo de aprendizagem da língua (Ellis, 1985, p.

207). Chomsky propõe uma teoria sobre a aquisição da linguagem que acabou por

estimular investigações sobre a aquisição de segundas línguas: a Gramática Universal e

o DAL (Dispositivo de Aquisição da Linguagem (vista no capitulo anterior).

Larsen-Freeman & Long (1994, p. 220-31) consideram nativista a Teoria da

Monotorização de Krashen. Desta teoria interessa ver as suas cinco hipóteses: a

hipótese da aquisição/aprendizagem, a da ordem natural, a do monitor, a do input e a

do filtro afectivo.

Krashen considera a existência de dois conhecimentos independentes que

subjazem à actuação numa segunda língua: o sistema adquirido e o aprendido. O

primeiro resulta do facto de os aprendizes aplicarem as mesmas habilidades de

aprendizagem linguística (não-especificadas) que as crianças utilizam na aquisição da

língua materna. O segundo resulta do ensino formal e abarca o conhecimento

31

consciente das regras gramaticais da segunda língua. O sistema adquirido é a única

fonte de conhecimento de que os falantes dispõem durante a comunicação, quando

prestam atenção ao significado e não à sua forma. O sistema aprendido funciona como

o «programador» e o «editor» com o qual o aprendiz se confronta ou controla o input

do sistema adquirido. O aprendiz só ascende ao sistema aprendido tendo cumpridas

três condições: tempo suficiente, concentração na forma e conhecimento da regra.

A hipótese da ordem natural propõe que as regras da L2 são adquiridas numa

ordem predizível. A de monitorização engloba a relação estabelecida durante a

actuação entre os sistemas adquirido e apreendido na L2, sendo que o primeiro activa

a «expressão» e o segundo actua na «planificação», responsável pela edição e da

correcção das funções.

A hipótese do input, pretende explicar como o aprendiz adquire a L2. Somente

se consegue adquirir uma L2 quando se processa o input compreensível. Nota-se um

progresso na L2 quando o aprendiz, seguindo-se a ordem natural, numa determinada

etapa do desenvolvimento, recebe input compreensível com estruturas (lexicais,

fonéticas, morfológicas, sintácticas, etc.) que ultrapassem a etapa em curso. Krashen

corrobora a hipótese inatista de Chomsky e, dessa forma, o input é o componente

principal tal como o DAL e a Gramática Universal.

A hipótese de filtro afectivo refere-se aos distintos factores afectivos, como a

motivação, autoconfiança e ansiedade que contribuem para a aquisição da L2.

Segundo Krashen, a ausência de motivação, a falta de autoconfiança, a excessiva

ansiedade podem «activar o filtro» e formar um «bloqueio mental», impedindo que o

input compreensível active o DAL e que esse seja utilizado na aquisição.

As Teorias Ambientalistas

Estas teorias consideram que a educação ou a experiência são mais

importantes para o desenvolvimento do que a natureza ou as aptidões inatas. As mais

conhecidas são as de aprendizagem condutista e neocondutista de estímulo e

resposta, como, por exemplo, a de Skinner.

32

A teoria neocondutista influenciou o ensino, nomeadamente no método áudio-

lingual, dos quais se destaca o modelo de Processamento Distribuído em Paralelo. O

PDP é uma teoria cognitiva que refuta a dotação inata, entendendo que a

aprendizagem se baseia no processamento do input. Contudo, o processamento não

resulta de um acumular de regras, mas sim do fortalecimento e do enfraquecimento

das conexões das redes neuronais complexas em razão da frequência de estímulos do

input. As redes controlam um comportamento aparentemente comandado por regras,

mas que é um reflexo das conexões que se formaram na base do poder que cada

modelo possui sobre o input (1994, p. 232).

Uma outra teoria que respeita alguns princípios propostos pelas teorias

ambientalistas é o modelo de aculturação ou pidginização58 de Schumann (idem, p.

234). Para Schumann, o estudo longitudinal da interlíngua de Alberto59 prova a

existência e a persistência da pidginização na aquisição da L2. Nos estádios iniciais, as

L2 compartilham com os pidgins a ausência de morfologia flexiva e de transformações

e a tendência de evitar a redundância no sistema. Compartilham traços de uma

interlíngua simplificada, caracterizada pela ausência de certas regras de movimento

(transformações), como a passiva. Têm léxico reduzido, ausência de marcadores

temporais e preferem a ordem tema-comentário, entre outras (1994, p. 236-37). A

interlíngua de Alberto seria um exemplo de pidginização e das funções possíveis para a

linguagem – a comunicativa, a integradora e a expressiva; no pidgin só se emprega a

primeira função. Posteriormente, a interlíngua alcança uma maior complexidade

estrutural, excepto quando persiste a distância social e psicológica, tal como no caso

de Alberto. Para Larsen-Freeman & Long, Schumann não considerava que os pidgins e

as L2, nas primeiras etapas, fossem «iguais», mas sim que na produção de cada uma

existem processos de simplificação análogos e que o alcance da simplificação e da

redução estariam relacionados com a distância social e psicológica que separava o

aprendiz dos falantes da língua-meta. Para Bickerton, a pidginização seria similar a

58 «A simplified form of speech that is usually a mixture of two or more languages, has a rudimentary grammar and vocabulary, is used for communication between groups speaking different languages, and is not spoken as a first or native language. Also called contact language.» in The American Heritage Dictionary of the English Language, Fourth Edition copyright ©2000 by Houghton Mifflin Company. 59 Schumann investigou durante dez meses a aquisição não controlada do inglês como segunda língua de Alberto, um jovem de 33 anos da Costa Rica, que vivia com a sua esposa numa região de imigrantes portugueses.

33

uma aquisição com input limitado, enquanto a crioulização60 equivaleria à aquisição da

primeira língua com idêntico tipo de input. Schumann abandona a comparação entre

aquisição de L2 e crioulização e Andersen tenta reconciliar distintas perspectivas sobre

pidgins/crioulos e aquisição de l2. Para Andersen, a crioulização, a pidginização e a

primeira aquisição de L2 são processos nos quais há a criação de sistemas linguísticos

independentes ou parcialmente autónomos da língua do input e que tal fenómeno

caracterizaria a «nativização». Na «desnativização», que compreende a

«descrioulização» e a «despidginização» e o final da aquisição de L2, o aprendiz

reconstrói o seu sistema linguístico para ajustá-lo do modo mais fiel possível à língua-

meta (1994, p. 239).

A hipótese de pidginização e o modelo de aculturação de Schumann

fomentaram pesquisas sobre certos processos de simplificação linguística no

desenvolvimento inicial da interlíngua, assinalando factores sociais e psicológicos que

interferem na aquisição da L2. As variáveis sociais e psicológicas estudadas por

Schumann constituem um ponto de partida para um modelo de aculturação e não para

um modelo de aquisição de L2. Devemos contemplar os factores grupais, individuais,

sociais e psicológicos, se ansiamos por uma teoria compreensiva da aquisição de L2,

considerando-os como variáveis e condicionantes da «quantidade» e do «tipo» de

exposição à língua-meta que o aprendiz experimenta. Não devemos ignorar as

variáveis linguísticas e cognitivas se nos dispomos a explicar o processo mental, a

aprendizagem da L2 e da língua (1994, p. 246-8).

Teorias interaccionistas da aquisição de L2

Larsen-Freeman & Long observaram que várias pesquisas funcionalistas sobre

interlingua se basearam, implícita ou explicitamente, nos trabalhos de Givón, cujo

objectivo é o de fazer uma «teoria unificada», que contemple qualquer tipo de

mudança linguística, incluindo a aquisição. Givón desenvolveu um enfoque que se

60 “Since the 1930s some linguists have claimed that creoles emerged from pidgins, languages with very reduced vocabularies and grammars that are typically seen where otherwise mutually unintelligible groups come together intermittently. This hypothesis is controversial, in part because the plantations on which creole languages emerged started as small homestead communities in which non-European slaves, European indentured labourers, and European masters lived fairly intimately. Typically, all three of these groups spoke similarly until a colony shifted from subsistence to plantation agriculture and institutionalized segregation. The hypothesis proposed by several creolists in the 1970s and ’80s—namely, that creoles emerged abruptly—has also been contested by those who posit a gradual development during the transition to a plantation economy.” In http://www.britannica.com

34

conhece como «análise sintáctico-funcional-tipologico» (ASFT): funcionalista, por

destacar que a sintaxe provém das propriedades do discurso humano e tipológica por

considerar um conjunto de línguas e não uma única ou uma família de línguas. Givón

afirma que a mudança sintáctica funciona seguindo princípios psicolinguísticos e

pragmáticos referentes à percepção e à produção da fala na interacção pessoal. Os

princípios pensados para as mudanças linguísticas históricas são aplicáveis a qualquer

situação de variação ou de modificação linguística, dentro dessas a variação sincrónica

do registo da fala dos adultos, o desenvolvimento de pidgins e crioulos, a aquisição

infantil da língua e a aquisição da L2. Nessas situações, tanto os falantes como os

sistemas linguísticos passam de um modo pragmático de comunicação, baseado no

discurso, a um modo mais sintáctico. Há um processo dirigido à sintaxe que actua

sobre uma serie de traços contrastivos, através de duas modalidades da comunicação:

a pragmática e a sintáctica (1994, p. 248-9). No entanto, os autores advertem que é

prematuro adoptar a distinção «givoniana» entre modos de comunicação pragmáticos

e sintácticos, para realizar uma análise funcionalista da mudança linguística, pois a

ASFT é muito ampla e geral para captar de modo preciso as diferentes situações de

mudanças linguísticas. Os linguistas interessam-se pela linguagem como fenómeno

grupal, enquanto os pesquisadores de aquisição de línguas, pelo nível individual do

aprendiz (1994, p. 251).

Definições de Análise Contrastiva, Análise de Erros e Interlíngua

Depois de evidenciadas as várias teorias de aquisição de uma L2, convém esclarecer

algumas definições, nomeadamente as definições de Análise Contrastiva, Análise de

Erros e de Interlíngua, bem como as suas implicações para a Prática de Ensino

Supervisionada.

Começaremos então por definir a Análise Contrastiva61. A AC é um método de

investigação que propõe ou se fundamenta principalmente na comparação dos

sistemas linguísticos de duas línguas, geralmente a língua materna (L1) e a língua meta

(L2) que se aprende. Assim, esta comparação sistemática pretende servir de base para

a elaboração de materiais didácticos e estabelecer parâmetros que sirvam de guia para

61 Doravante AC

35

a produção de tais materiais, preparação da programação e técnicas de instrução para

posterior utilização na aula. Resumindo, o objectivo principal deste modelo é a

elaboração de uma gramática contrastiva de maneira a estabelecer-se uma hierarquia

dos diferentes níveis de uma gramática de forma paralela, com a finalidade de poder

estabelecer graus de dificuldade ao longo de uma aprendizagem de uma L2. Quanto

maior é a diferença entre os dois sistemas, maior será a dificuldade de aprendizagem e

onde se produz um maior número de interferências. Ou seja, quando existe

coincidência entre a L1 e L2, significa que a aquisição da L2 é mais fácil, e, pelo

contrário, quando a L1 e L2 são menos coincidentes torna-se mais difícil a sua

aquisição.62

Existem vários modelos e hipóteses de AC segundo a Linguista Santos Gargallo (1993,

p. 40 e ss, cit. Pavón, Esther) que passamos a evidenciar:

a) Hipótese de L1=L2, que se baseia na igualdade de processos de aquisição da L1

e L2, sustentada na perspectiva generativista que considera a linguagem como

uma capacidade inata e a única fonte de conhecimento. Isto é, as estratégias

utilizadas por um aprendente de L2 são semelhantes às estratégias utilizadas

por uma criança para a aprendizagem da L1. Além do mais, esta teoria rejeita o

conceito de interferência, que mais tarde explicaremos, pelo facto de que se o

estudo de uma L2 está determinado por uma assimilação gradual das

estruturas linguísticas da L2, os erros que o aprendente possa cometer estão

directamente condicionados pela estrutura da L2 e não pela L1.

b) A Hipótese Estruturalista considera que as línguas podem ser estudada em

todos os níveis dentro da própria estrutura das mesmas e esses mesmos

estudos servem para contrastar e determinar quais são as diferenças e

semelhanças entre as duas línguas analisadas.

c) A Hipótese Generativista destaca os conceitos de «equivalência» e

«interferência», onde a equivalência determina os critérios a utilizar para a

62 Estes processos têm por nome «transferência positiva» quando se trata da aproximação das L1 e L2 e «transferência negativa» quando se trata do afastamento das L1 e L2,que mais tarde explicaremos.

36

comparação entre as duas línguas, enquanto a interferência estabelece as

interferências produzidas entre as estruturas da L1 e L2.

d) Hipótese Psicolinguística centra-se no ser humano e nos factores que

influenciam no momento de aprender uma L2, uma vez que a aprendizagem é

considerado como um processo de selecção entre a L1 e L2, isto é, o aprendiz

vai adquirindo, pouco a pouco, estruturas que estão determinadas pelas

características psicológicas do aprendente. Pelo facto de se centrar no

aprendente e na sua capacidade de actuação, conhecida por «competência

comunicativa».

e) Por último, a Hipótese Mista é a combinação dos modelos estrutural e

generativo. O estruturalismo serviria para classificar e segmentar os elementos

susceptíveis de contrastação e o generativismo para realizar a contrastação

propriamente dita.

Durante a década de cinquenta, a AC considerava que os erros cometidos pelos

aprendentes de uma L2 se deviam a uma interferência63 linguística com a L1. Esta

interferência baseia-se, sobretudo, na ideia que a L1 funciona como um filtro que

condiciona a L2, isto é, o aprendente recorre aos seus conhecimentos linguísticos

gerais para empregá-los na aprendizagem da L2. Nalgumas situações pode facilitar

a aprendizagem (transferência positiva), e noutras considera-se que o aprendido

na L1 obstrui a aprendizagem da L2 (transferência negativa).

No que diz respeito a interferências linguísticas, podem-se distinguir três etapas: a

condutiva, que considera que qualquer erro produzido durante a aprendizagem de

uma L2 é motivado pela L1; a inatista, que se centra no desenvolvimento da

interlíngua do aprendente e nos factores que intervêm na produção desta, ao

tentar demonstrar o paralelismo entre o processo de aquisição que se dá na L1 e

na L2; por último, a cognitiva, que considera a interferência como um processo que

o aprendente de uma L2 põe em prática um uso estratégico da sua L1 ao longo do

processo de aquisição de uma L2.

63 Define-se interferência como a utilização numa língua de elementos léxicos, morfológicos, sintácticos e/ou pragmáticos específicos de outra língua distinta.

37

Torna-se óbvio que a interferência da L1 é responsável por erros cometidos na L2,

no entanto, existem também erros cometidos que procedem da L2, denominados

«intralinguísticos», e que são semelhantes aos erros que produz um nativo na sua

L1, exemplo disto são as generalizações de regras gramaticais.

Dentro da AC a interferência estuda-se e agrupa-se em três áreas: a fonológica, a

gramatical e lexical. Uma das interferências mais visível é a interferência fónica,

conhecida como «acento estrangeiro», no âmbito deste relatório interessa-nos o

Português como L1 e o Espanhol como L2, pela distinção entre o /b/ (bilabial,

oclusiva, sonora) e o /v/ (em Espanhol não existe distinção). Na área gramatical

encontramos o caso do uso do artigo antes do nome próprio, enquanto na área

lexical destaca-se a questão dos cognatos, dos «falsos amigos», onde em espanhol

o que entendemos por «beca», em português significa «toga»

Passemos agora à Analise de Erros64, que surgiu pela preocupação crescente em

identificar e evitar os erros que cometiam os aprendentes de uma L2.

Só a partir dos estudos de S. P. Corder, que veio completar a AC no sentido em que

os erros não se produzem apenas pela interferência da L1 na aquisição da L2 e

onde surge como base a análise da produção oral e escrita do aprendente, isto é, a

aprendizagem não é só a aquisição de um conjunto de hábitos, mas também a

aquisição de estratégias cognitivas por parte do aprendente. Assim, é de extrema

importância que estas duas teorias não existam de «costas voltadas», mas sim que

cooperem no sentido de obter resultados mais completos, pois ambos têm a

mesma função, a de analisar a língua de um aprendente de L2. Vez

Jeremías65(2004:152) sublinha isso mesmo: «Mientras el análisis contrastivo trata

de predecir las posibles dificultades o facilidades que se presentarán, sobre la base

de la comparación de la descripción de la lengua base (L1) y la lengua de referencia

(L2), el procedimiento de analizar los errores sigue, por su parte, una metodología

“a posteriori” con la que intenta descubrir la causa de tal o cual error.»

64 Doravante AE

65 Vademecum para la formación de profesores: enseñar español como segunda lengua (L2)/ lengua extranjera (LE)

38

Embora ambas as teorias tenham a mesma finalidade, a sua principal diferença é o

conceito que defende cada teoria sobre o erro, que mais tarde exploraremos.

Santos Gargallo (1993:76, cit. Pavón, Esther) destaca os seguintes valores

fundamentais da AE:

- Supõe uma contribuição significativa à Linguística Aplicada, eleva o estado do erro

e amplia o âmbito das suas fontes (os erros são vistos como sinais positivos de que

o processo de aprendizagem está em curso).

- Mostra aos professores e investigadores em que ponto de aprendizagem está o

aluno e quais são a estratégias que coloca em prática.

- Erige uma hierarquia de dificuldades evidenciando quais as prioridades no ensino.

- A partir deste processo, cria-se material didáctico mais útil e adequado que os

usados anteriormente.

- Oferece testes imprescindíveis para determinados objectivos e níveis.

Como referimos anteriormente, o erro ocupa um papel preponderante na AE.

Segundo S. P. Corder (1967:162, cit. Pavón, Esther) o erro é um desvio sistemático

que determina o sistema linguístico de um estudante num nível concreto,

considerando-o como algo inevitável em como positivo. Este autor distingue

«erro» de «falta» e «lapso». Segundo o autor, «falta» é um desvio não sistemático

e «lapso» ainda que se trate também de um desvio não sistemático, responde a

factores «extralinguísticos» como a falta de concentração ou a memória curta e

como consequência da urgência comunicativa. Corder emprega o conceito de

«erro» como base para definir a Interlíngua (que mais tarde analisaremos), que é a

língua própria dos estudantes que se caracteriza pelo erro. No entanto, existem

duas posturas claramente diferenciadas sobre o conceito de «erro». Uma positiva,

onde o erro é necessário ao longo do processo de aprendizagem de L2 e uma

negativa, que considera o erro como contraproducente nas estratégias de

aprendizagem utilizadas pelo estudante. No que diz respeito às principais

particularidades do «erro», são basicamente três: é sistemático, é utilizado por um

estudante ou um grupo de estudantes que compartilham a mesma instrução da

39

língua meta e, por último, a cada nível dentro da aprendizagem comporta o

chamado «dialecto transitório»66.

Torna-se claro que o «erro» está intimamente ligado com as estratégias de ensino

e de aprendizagem, ou seja, dependendo do nível de aprendizagem, devemos

determinar uma definição de «erro», tanto funcional como formal, atendendo às

necessidades comunicativas e à conduta dos estudantes de L2, o que não está

suficientemente claro é a atribuição dos conceitos de «erro», «falta» ou «lapso»

quanto ao grau sistemático do erro. Assim, devemos ter em conta, de modo a

determinar certeiramente se estamos perante um «erro» ou uma «falta», dois

pontos de vista: um quantitativo, onde se possa observar o grau de propagação do

«erro» e outro qualitativo, que permita fazer uma comparação entre o número de

erros e o número de respostas acertadas. Sendo de interesse bastante significativo,

de modo a melhorar a comunicação numa L2, a procura das causas que originam o

erro, com a finalidade de poder erradicá-lo, podemos analisá-las desde vários

pontos de vista: o interlinguístico, influenciado pela língua materna do estudante,

onde a L1 condiciona a L2 (visto anteriormente na questão da interferência), o

intralinguístico, onde o prévio conhecimento em relação ao sistema da língua meta

afecta o processo de aprendizagem, o gramatical, que se dá em todos os níveis da

gramática, onde podemos encontrar erros fonológicos, sintácticos, pragmáticos,

etc., o pedagógico, onde Corder distingue entre os erros transitórios (que não são

sistemáticos) e os erros sistemáticos que resultam de uma falta de conhecimento

das regras e o descritivo, com as seguintes características: omissão, adição,

formação errónea, ausência de ordem. Por outro lado, um dos principais objectivos

da AE era o de produzir uma metodologia que resultasse de extrema utilidade,

nesse sentido a criação de taxonomias de erros tem como finalidade localizar as

dificuldades em que se encontra um determinado grupo de estudantes tendo em

conta a sua L1. No entanto, é complicado adjudicar uma fonte concreta a um erro

66 Definido por Santos Gargallo com as seguintes características: 1) é um sistema linguístico com uma gramática própria; 2) é um sistema linguístico pouco estável, sempre em mutação; 3) é um sistema que pode ser descrito como um conjunto de regras de um subconjunto das regras da gramática da língua meta; é um sistema cujas orações não são desviadas nem erróneas, são simplesmente idiossincrásicas e 5) é um sistema peculiar de um estudante individual ou de um grupo de estudantes com a mesma formação académica.

40

determinado, pois um erro pode ter origem em diversos factores. Quanto ao

tratamento do erro, Corder aponta a duas perspectivas de tratamento do erro, a

perspectiva pedagógica que coloca a questão da necessidade de se conhecer a

natureza do erro e a segunda, de carácter teórico, que exige um estudo da língua

dos aprendentes ao longo do processo de aquisição de uma L2.

Resumindo, a AE defende a necessidade do erro ao longo da aprendizagem de uma

L2, porque este forma parte do mesmo e determinará as diferentes etapas pelas

que passará o aluno, o que era positivo. Contudo, corrigir um erro significa como

fazê-lo e em que medida.

Depois desta breve caracterização da AC e da AE passemos então à definição de

Interlíngua.

Segundo Marta Baralo67(2004:373), a Interlíngua68 é «[…] un sistema independiente

de conocimiento del aprendiente de una L2 o una LE. Este sistema lingüístico

interiorizado evoluciona tornándose cada vez más complejo. El aprendiente posee

intuiciones propias de este sistema, que es diferente del de la LM (aunque se

encuentren en él algunas huellas) y del de la LO; tampoco puede ser considerado

como una mezcla de uno y otro, ya que contiene reglas que son las propias; cada

aprendiente o grupo de aprendientes posee, en un estadio de su aprendizaje, un

sistema específico.»

Sendo assim, o processo de IL na aquisição de uma L2 produz-se quando um

indivíduo percebe uma língua que não é a materna, que automaticamente tende a

associá-la com os seus conhecimentos ou estruturas cognitivas e é a partir desse

momento que realiza hipóteses sobre as regras gramaticais, usos etc.

Posteriormente põe em prática essa informação falando ou escutando a língua

meta.

67 In “La interlengua del hablante no nativo” in Vademecum para la formación de profesores: enseñar español como segunda lengua (L2)/ lengua extranjera (LE)

68 Doravante IL

41

Em síntese, o conceito de IL69 é o término mais apropriado para indicar que o

aprendente se encontra num estado de aprendizagem «entre línguas». É um

sistema linguístico empregue pelo estudante de uma L2 durante o processo de

aprendizagem da língua meta. Passemos agora a caracterizar a IL. Quanto às suas

principais características, e seguindo Santos Gargallo (1993:128, cit. Pavón, Esther)

destacamos as seguintes:

a) O sistema linguístico da L1 é diferente do da L2,

b) Possui um sistema interno que está estruturado;

c) É um sistema que está formado por várias etapas sucessivas,

d) É um sistema que se vai renovando, portanto dinâmico;

e) O sistema está conformado por uma serie de processos internos;

f) É um sistema adequado dentro da sua própria idiossincrasia.

Depois destas características, deduzimos que a IL conta com códigos intermediários

que se ocupam de uma função comunicativa concreta dentro de uma determinada

comunidade linguística, isto é, o aluno de L2 usa um sistema linguístico que não

conhece completamente e cuja finalidade será comunicar com o seu interlocutor.

Creio ser conveniente mostrar o seguinte quadro representativo da IL da linguista

Kim Griffin (2005: 97 cit. Pavón, Esther) presente nos anexos deste relatório.

Marta Baralo (2004: 373) mostra a proposta metodológica elaborada por Adjémian.

Esta proposta pretende determinar a «especificidade» da gramática do sistema

linguístico do aluno. Assim, caracteriza a IL com os seguintes pontos: 1) a

fossilização, considerada como um fenómeno linguístico que retém de forma

inconsciente elementos da L1 na IL; 2) a regressão voluntária, são aqueles

elementos gramaticais que se afastam da norma da L2; e 3) a permeabilidade, que é

a introdução de regras da L1 na IL.

69 Ver anexo A.

42

Sendo de extrema importância para a elaboração deste relatório, tentaremos

caracterizar e definir o processo de «fossilização», embora saibamos o quão difícil

é, ao longo dos anos, a elaboração de uma definição que não seja contraditória.

Para Marta Baralo (2004: 378) a «fossilização» é: «[…] un mecanismo por el que un

hablante tiende a conservar en su IL ciertos ítems, reglas y subsistemas lingüísticos

de su lengua materna en relación a su lengua objeto dada.» Podemos entender a

fossilização como um fenómeno que «bloqueia» durante o processo de aquisição

da L2, que inclusivamente chega a dar-se em níveis pouco avançados, sendo o

resultado da permeabilidade da IL.

Identificar ou determinar o que é uma «fossilização» não é simples, pois existem

varias causas que podem provocar a «fossilização» No entanto, parece óbvio que a

repetição permanente de um erro seja uma manifestação de «fossilização».

Perante estas dúvidas, seria conveniente saber como reconhecemos um erro

fossilizado, quando se poderia considerar que o erro está realmente fossilizado,

quais são os elementos mais propícios à «fossilização» e como se deveriam tratar

este tipo de erros. Sánchez Iglesias (2006:31, cit. Pavón, Esther), embora não seja

fácil, destacou rasgos específicos dentro de um âmbito que tendem a fossilizar-se

enquanto outros não. Podemos destacar os seguintes: a) a «fossilização»

corresponde, de forma selectiva, à compreensão e à produção; b) a «fossilização»

afecta de maneira selectiva a competência e a actuação, como é o caso dos alunos

de L2 que podem chegar a níveis muito similares aos de um nativo, mas que se

distinguem destes no momento de elaborar intuições gramaticais; c) a

«fossilização» afecta de forma selectiva a alguns aspectos da IL, isto é, há aspectos

da língua que tendem a fossilizar-se mais que outros. Quanto às causas e variáveis

que produzem a «fossilização» são extensas, porém cremos ser conveniente

enumerar algumas das possíveis causas como a falta de retro alimentação negativa

ao cometer erros, a falta de sensibilidade perante uma retro alimentação negativa,

a perda de sensibilidade perante os dados linguísticos por razões de idade, a falta

de acesso a determinados componentes da Gramática Universal, a transferência da

L1, as limitações no processamento linguístico, erros de aculturação, a combinação

de razões sócio psicológicas, pressão comunicativa prematura, automatização de

43

regras incorrectas, tendência a usar um sistema simplificado, incapacidade de

observar as diferenças entre input e output, desinteresse pela reestruturação da

informação linguística conhecida, recepção da parte dos nativos de um input

agramatical, entre outras.

Em síntese, são muitos os problemas do tipo teórico – conceptual que nos surgem

quando queremos determinar se estamos perante uma «fossilização». Contudo, é

necessário que as investigações vão no sentido de uma posta em prática dentro da

didáctica.

Por fim, cremos ser útil para este relatório a definição de transferência, sobretudo

pelo facto de este relatório se basear no ensino do Português e do Espanhol.

Segundo Santos Gargallo (1993: 140, cit. Pavón, Esther) a transferencia é um

«fenómeno que subscribe todos aquellos vocablos, reglas y subsistemas fosilizables

que tienen lugar en la interlengua como resultado de la influencia de la lengua

nativa». Deste modo podemos afirmar que a transferência pode entender-se desde

duas vertentes, como um processo de aprendizagem e como um processo de

produção da língua meta. A transferência é um fenómeno que provoca no

estudante de L2 uma transferência do conhecimento linguístico da sua língua

materna para a língua meta durante o processo de aquisição/ aprendizagem e que

afecta tanto a produção como a recepção da dita língua. Neste caso a transferência

linguística é um processo inevitável e imprescindível para o processo de aquisição

de uma L2. E essa transferência linguística pode ser positiva, quando existe uma

semelhança entre a L1 e a L2 em certas estruturas internas das duas línguas que

facilita a aprendizagem, e pode ser negativa, quando uma L1 não tem

correspondência com a L2 e onde existem grandes diferenças internas entre as

duas línguas. No entanto, como assinala Corder (1992: 227, cit Pavón, Esther)

torna-se discutível se as distâncias beneficiam ou não a aprendizagem, como o

caso do Português e do Espanhol: «[…] existen pruebas de que algo totalmente

“nuevo” o diferente, puede resultar más fácil de dominar que algo que es solo

ligeramente diferente; por ejemplo, cuando un sonido muy semejante existe en las

dos lenguas, pero en diferentes circunstancias fonéticas, puede haber un problema

44

de aprendizaje mayor que en el caso de un sonido completamente nuevo.» Esta

afirmação remete-nos para a questão dos cognatos. São muitas as semelhanças

entre ambas as línguas a todos os níveis: morfológico, sintáctico, semântico e

fonético – fonológico. Se, por um lado, as semelhanças fazem com que os luso -

falantes avancem rapidamente na aquisição do Espanhol, por outro, são

constantes os erros interlinguais e as fossilizações (portuñol) e o aprendente aceita

como suficiente para a comunicação e não procura avançar. Dentro do tema da

aquisição do léxico, destacamos as divergências lexicais entre as duas línguas,

como nos vocábulos heterotónicos, heterogenéricos e heterosemânticos. Os

vocábulos heterotónicos compartem com ambas as línguas a forma gráfica, fónica

e o significado, no entanto divergem quanto à tonicidade. Os vocábulos

heterogenéricos são idênticos quanto à forma gráfica e quanto ao significado, mas

divergem no género, ao mudar de uma língua para a outra sofrem uma não

equivalência de género. Por último, os vocábulos heterosemanticos, os chamados

falsos amigos, que são vocábulos idênticos quanto à sua forma gráfica e fónica,

mas divergem parcial ou totalmente no que respeita ao seu significado em ambas

as línguas, sendo os mais perigosos, pois podem provocar interferência na

comunicação. Dentro deste grupo podemos definir os falsos amigos como tendo

formas semelhantes com significados totalmente diferentes, formas semelhantes

com um ou mais de um significado semelhante e outro ou vários diferentes e

formas semelhantes com significados diferentes actualmente.

Como conclusão, podemos concluir que a língua materna tem um papel bastante

activo no processo de aquisição de uma L2, assim como a proximidade tipológica

entre as línguas espanhola e portuguesa são um factor positivo no processo de

aprendizagem da língua espanhol, embora, como vimos anteriormente, existam

factores a ter em conta, como as interferências negativas, que devem ser

superadas através da consciencialização das diferenças entre a língua meta e a

língua nativa, o que exigirá da parte do professor a elaboração de propostas

didácticas que ajudem os alunos a superar, e, sobretudo, a consciencializar os seus

erros.

45

Prática de Ensino Supervisionada

Enquadramento institucional: caracterização da escola cooperante

A actual Escola Secundária Jorge Peixinho abriu as suas portas em 1957 como

Escola Técnica e Profissional para suprir as necessidades de uma «região em que se

está operando rápida evolução económica […] permitindo aliviar a pressão exercida

sobre as escolas do Barreiro e de Setúbal, ambas superlotadas» (Decreto n.º 41.258,

de 10 de Setembro de 1957).

Em 1963, foi concluído o edifício actual (neste momento em reformulação pelo

Parque Escolar) e nesse mesmo ano teve como oferta formativa os cursos de

Administração e Comércio, Formação Feminina, Montador Electricista e Serralheiro

Mecânico, sendo que só em 1972, a então denominada Escola Industrial e Comercial

passou a incluir uma secção do Liceu de Setúbal, disponibilizando o Curso Geral dos

Liceus. Em 1974, passou a designar-se Escola Secundária do Montijo e,

posteriormente, com a construção de uma outra escola secundária, passou a designar-

se Escola Secundária N.º 1 do Montijo. Finalmente, no ano de 1998 passou a designar-

se Escola Secundária Jorge Peixinho, em homenagem ao compositor montijense.

Nascido em Janeiro de 1940, Jorge Peixinho foi galardoado com vários prémios entre

os quais se destacam o Prémio de Composição da Fundação Calouste Gulbenkian, em

1974 e uma distinção em 1976 por parte da SPA. Foi ainda Presidente da Assembleia

Municipal do Montijo.

A Escola Secundária Jorge Peixinho inclui 1438 alunos distribuídos pelo Ensino

Diurno e Nocturno, integra um corpo docente de 189 professores e um corpo não-

docente de 48 profissionais, possuindo ainda Associação de Pais e Encarregados de

Educação e Associação de Estudantes.

Um dos propósitos do seu Projecto Educativo é a «melhoria global da cultura

da escola, incentivando um espírito de pertença e participação em todos os membros

da comunidade educativa» tendo como objectivos a atingir os seguintes:

• - «Promover o Projecto Educativo como instrumento vivo e operante, ao

serviço da melhoria da Escola»;

46

• - «Motivar os recursos humanos e os alunos a promover atitudes de

envolvimento positivo com as tarefas»;

• - «Desenvolver atitudes e valore de responsabilização, respeito pelos outros

e tolerância crítica»;

• - «Induzir expectativas elevadas, renovar metas e melhorar resultados»;

• - «Dignificar a imagem da escola e promover a interacção com a

comunidade».

Assim, as linhas estratégicas de intervenção do Projecto Educativo têm a

seguinte lógica orgânica: a formação integral e implicação dos alunos no processo de

ensino-aprendizagem, a colaboração e co-responsabilização dos pais e encarregados

de educação e o aprofundamento das relações com a autarquia e a comunidade.

Resumindo, através da implicação de todos, guiados pela liderança e pelas

linhas orientadoras do Projecto Educativo, pretende atingir-se uma melhoria global da

cultura de escola, assente no mote «Recuperar o prestígio, melhorar os resultados».

Prática de Ensino Supervisionada nas aulas de Português e de Espanhol

Caracterização da Turma de Português de 9.º Ano

A turma do 9.º G é composta por 23 alunos, dos quais 11 são do sexo masculino

e 12 do sexo feminino. A turma é classificada, segundo o Conselho de Turma, como

tendo um aproveitamento satisfatório, embora esse aproveitamento não seja

homogéneo. A turma trabalha pouco em casa e revela alguma falta de maturidade

para alunos em final de ciclo. Relativamente à relação estabelecida com a turma posso

afirmar que, apesar de confirmar que a turma trabalha pouco em casa, pois só uma

pequena parte realizou os trabalhos de casa pedidos, consegui manter uma relação de

proximidade e, ao mesmo tempo, de distância. Proximidade, no tratamento com os

alunos, o que levou a uma relação próxima com os alunos. Distância, sempre que

necessária, para manter um ambiente favorável ao trabalho em aula.

47

Caracterização da Turma de Espanhol de 10.º Ano

A turma de Espanhol é composta por alunos oriundos de três turmas (10.º B,

10.º D e 10.º G), dos quais sete são do 10.º B (quatro do sexo masculino, três do sexo

feminino), seis do 10.º D (três do sexo masculino, três do sexo feminino) e seis do 10.º

G (três do sexo masculino, três do sexo feminino), que perfazem o total de 19 alunos.

O 10.º B, segundo o Conselho de Turma, tem um comportamento e aproveitamento

satisfatório, embora a turma seja agitada e haja alguma falta de concentração. A turma

é considerada heterogénea a nível do comportamento. Quanto ao 10.º D, segundo o

Conselho de Turma, o comportamento foi considerado insatisfatório e o

aproveitamento satisfatório. O facto de ser uma turma muito conversadora limita a

obtenção de resultados melhores, assim como o desinteresse por diversas matérias e

pela realização de tarefas. Por último, o 10.º G. Segundo o Conselho de Turma, a turma

possui uma fraca atitude relativamente ao trabalho em aula e fora de aula, conversa

generalizadamente e tem um comportamento infantil, o que levou a uma avaliação do

comportamento e do aproveitamento insatisfatória. Relativamente à relação

estabelecida com a turma, creio que, embora o seu comportamento na sala de aula

não fosse exemplar, assim como o trabalho fora da sala de aula, consegui um

ambiente favorável ao trabalho dentro da sala de aula, pois, apesar de serem

conversadores, tinham interesse em aprender e realizavam as tarefas pedidas,

algumas com bastante entusiasmo.

Leccionação das aulas de Português e Espanhol

Enquadramento do tema do relatório nas aulas de Língua Portuguesa e de Espanhol

As palavras concentram em si poderes infindáveis: é através delas que

acedemos ao conhecimento, exprimimos ideias e conceitos e aprendemos novas ideias

e conceitos. Desta ideia surge a relação entre o sucesso escolar e o capital lexical.

Segundo Inês Duarte (2008, p. 5), «capital lexical é o conjunto organizado de palavras

que conhecemos e usamos» e quanto menor for esse capital lexical mais penoso será o

processo de leitura, bem como o desempenho na compreensão da leitura. Ora, se o

capital lexical de um falante for reduzido, este tem mais dificuldades em atribuir

48

significado ao que lê, o que por sua vez leva a um distanciamento da leitura, e, por

conseguinte, a uma maior dificuldade em aprender palavras novas: «Crianças com

maior capital lexical à partida lêem mais, tornam-se cada vez melhores leitores,

aumentam através da literatura o seu capital lexical. Pelo contrário, crianças com

capital lexical reduzido à partida lêem menos, tornam-se cada vez piores leitores, pelo

que não aumentam através da leitura o seu capital lexical.» (Duarte, Inês, 2008, p. 5).

O capital lexical auxilia a compreensão da leitura e aumenta a qualidade da

expressão escrita. Se, enquanto crianças, devido a factores como os socioeconómicos,

o conhecimento prévio do mundo e a variedade linguística da origem determinam o

capital lexical, é através do ensino explícito do léxico que essas limitações se esbatem

e que se «desencadeia a espiral ascendente que conduz ao sucesso escolar» (Lubliner

& Smetana 2005: 10, Cit. Duarte, Inês, 2008, p. 6).

Cada palavra alberga em si um sistema complexo. Assim, para conhecer uma

palavra temos que ter em conta a sua forma fónica, a sua forma gráfica, a classe e a

subclasse a que pertence, o seu género e o seu significado, ou seja, «conhecer uma

palavra envolve saber implicitamente a classe de palavras a que pertence, uma vez que

esse conhecimento determina as posições que ela pode ocupar numa frase e os

paradigmas flexionais em que pode entrar.» (Duarte, Inês 2008, p. 9).

O nosso conhecimento das palavras envolve ainda a sua estrutura interna. Uma

das razões para a nossa rápida aprendizagem de palavras novas advém do facto de

muitas delas terem elementos comuns, como os prefixos e sufixos, que contribuem

para a sua formação, cujo conhecimento é crucial quando ouvimos ou lemos novos

itens lexicais. «Deste modo, o conhecimento de prefixos e sufixos de valor lexical e

gramatical e das suas regras de combinação com radicais habilita-nos a reconhecer e a

integrar no nosso capital lexical um sem número de palavras e de formas de palavras.»

(Duarte, Inês 2008, p. 11).

Em suma, para um falante letrado, «compreender e saber usar uma palavra

envolve um conhecimento intuitivo muito complexo, uma vez que inclui as seguintes

dimensões:

(i) Conhecer a sua forma fónica;

49

(ii) Conhecer a sua forma ortográfica;

(iii) Conhecer os (s) seus (s) significados (s);

(iv) Saber a que classe e subclasse de palavras pertence;

(v) Conhecer as suas propriedades flexionais;

(vi) Reconhecer as unidades mínimas com significado que a constituem;

(vii) Saber com que classes de palavras se pode combinar para formar

unidades linguísticas mais extensas;

(viii) Saber que papéis semânticos distribui pelas expressões linguísticas com

que se pode combinar;

(ix) Saber que propriedades sintáctico-semânticas têm de ter as expressões

linguísticas a que atribui papéis semânticos.» (Duarte, Inês, 2008, p. 12).

Porém, existem várias dificuldades no que diz respeito ao enriquecimento do

capital lexical. Segundo Inês Duarte (2008, p. 11-15), as principais dificuldades são: a

diferença entre o oral e escrito; a dimensão da tarefa [o léxico da língua portuguesa

ultrapassará as 500 000 palavras, de acordo com Biderman (2002)]; as fontes e os

recursos à disposição dos professores e dos alunos; a falta de recursos sobre a

frequência das palavras, dos prefixos e sufixos e dos radicais eruditos. A mesma autora

refere os vários pontos onde deve assentar o ensino do capital lexical e o

desenvolvimento da consciência lexical, como por exemplo: o encorajamento e apoio à

leitura de muitos textos de vários tipos; a exposição dos alunos a um input oral de

grande qualidade; a promoção da consciência lexical; o ensino explícito de novas

palavras e o desenvolvimento de estratégias de descoberta do significado. Ainda que a

autora fale sobre a aprendizagem do léxico para alunos do primeiro ciclo, creio que

podemos estabelecer pontos comuns aos alunos de Português, do 3.º ciclo e

secundário, bem como a aquisição de capital lexical numa língua estrangeira.

50

Estratégias utilizadas

Podemos dividir as estratégias utilizadas em dois pontos. No primeiro abordarei

as estratégias que empreguei nas aulas de Língua Portuguesa e, no segundo, as

estratégias usadas nas aulas de língua estrangeira, neste caso o Espanhol.

Sendo assim, no primeiro ponto podemos considerar o estudo elaborado por

Inês Duarte como base de todo o trabalho realizado nas aulas de Língua Portuguesa.

Como refere a autora, «existe uma correlação forte entre o volume de leituras de uma

criança e a dimensão do seu capital lexical» (DUARTE, p. 16) sendo então de extrema

importância que na aula de Língua Portuguesa exista espaço para «textos simples, que

não lhes colocam problemas de compreensão, como textos mais complexos, que

constituam desafios quer do ponto de vista da complexidade estrutural quer do ponto

de vista do vocabulário.» Esta afirmação de Inês Duarte remete-nos para a importância

da linguagem e da literatura na aula de Língua Portuguesa e para o papel do professor.

Quando Wittgenstein afirma que «Os limites da minha linguagem significam os limites

do meu mundo» (cit. In Aguiar e Silva, 2010, p. 172) compreendemos o papel fulcral

que a linguagem exerce no nosso mundo. Não podemos entender a linguagem como

um mero conjunto de signos que nos permite comunicar, mas que transporta em si o

poder da criação, seja ideológica ou meramente lúdica. É a linguagem que nos permite

manifestar os nossos sentimentos, argumentar, criar «novos mundos», escapar da

solidão e da realidade. No entanto, a linguagem «obriga a dizer de determinado modo,

é poder e instrumento de poder» (Aguiar e Silva, 2010, p. 172), fazendo com que a sua

aprendizagem adquira uma importância basilar, pois é a linguagem e a sua utilização

que determina o estatuto social, a criatividade, a individualidade e o colectivismo, bem

como a aquisição de outros saberes.

Inserindo neste diálogo a educação do Português, vários são os autores que apontam

as inúmeras dificuldades que representa a massificação do ensino em Portugal e o

prolongamento do ensino obrigatório para o 12.º ano. O ensino para todos revela o

seu melhor e o seu pior. Se por um lado permite a ascensão na sociedade e liberta-nos

das amarras sociais, por outro lado nem todos os intervenientes no ensino estão ao

mesmo nível. Assim, é necessário «conceber e executar políticas educativas que

possibilitem que a escola de massas seja uma escola de sucesso educativo e que, em

51

particular, permitam compensar o subdesenvolvimento verbal (…) tendo em

consideração que saber falar e escrever (…) é uma competência comunicativa

adquirida em demorados e complexos processos de natureza cognitiva, social e

cultural.» (Aguiar e Silva, 2010, p. 176).

Esta afirmação remete-nos para o conceito de capital cultural de Bourdieu,

intimamente ligado à compreensão das desigualdades no desempenho escolar, o

sucesso ou o fracasso de cada aluno. Ao longo da primeira metade do século XX, a

visão predominante atribuía à escola o papel central na construção de uma nova

sociedade, justa, moderna, aberta e democrática, na qual a escola pública e gratuita

garantiria o acesso à educação, e, consequentemente, à igualdade de oportunidades.

Foi no contexto da democratização do acesso à escola e do prolongamento da

escolaridade obrigatória que se tornou evidente o problema das desigualdades de

escolarização entre grupos sociais. O optimismo marcante do período anterior foi

substituído por uma postura mais pessimista, baseada na influência da origem social

nos resultados escolares, ou seja, a forte relação existente entre desempenho escolar

e origem social (classe, etnia, sexo, entre outros), assumindo o ensino da língua

materna uma preponderância que poderá determinar o sucesso ou o insucesso

escolar, bem como esbater as diferenças sociais e culturais. Este conceito envia-nos de

volta para Aguiar e Silva quando afirma: «Apurando os conhecimentos

morfossintácticos, enriquecendo o vocabulário, discriminando os matizes semânticos e

as conotações das palavras, aprofundando as relações entre co-texto e contexto,

corrigindo a dicção e a ortografia, sabendo, em suma, ler e produzir textos, o aluno

dominará os mecanismos linguísticos indispensáveis para o seu desenvolvimento

cognitivo e cultural, para assegurar o seu bom rendimento escolar e para assumir os

seus direitos e deveres de cidadania.» (Aguiar e Silva, 2010. p. 179).

Posto isto, tudo o que foi dito anteriormente direcciona-nos para o papel da

literatura no ensino da língua e para o papel do professor na aula de Português. No

que diz respeito ao papel da literatura temos assistido à consequente perda de

importância desta em detrimento da linguística per se, dissociando uma da outra, sem

que se perceba esse afastamento, pois é através da literatura que nós vemos aplicada

a linguística e é também na literatura que se transgride a linguística. É através do texto

52

literário que observamos as várias disciplinas da linguística (fonologia, morfologia,

sintaxe, semântica, pragmática), mas também é através deste que observamos a sua

transgressão, a criação de novas realidades, as vozes que ecoam desde um tempo

distante. O laboratório onde podemos observar todas essas «fórmulas químicas» e as

suas «acções» e «reacções» só poderá ser a aula de Português, como constata Aguiar e

Silva: «A aula de língua materna poderá constituir assim uma fascinante aprendizagem

dos códigos que obrigam a obedecer, mas que o texto pode alterar até aos limites da

transgressão; uma maravilhada e perturbante da descoberta da voz dos outros; a lição

que ensina, na escrita e na leitura, a construir, sob e para além das significações

literais, as significações e alegóricas, metafóricas e simbólicas.» (Aguiar e Silva, 2010. p.

187).

Contudo, a maneira como tem funcionado o ensino da língua materna, tem

levado ao afastamento dos alunos do texto literário, anteriormente fonte primária de

conhecimento e cultura. Se o ensino da língua materna continuar a incidir sobre

termos técnicos e terminologias linguísticas que sufocam o texto literário e lhe retira a

imaginação, a sensibilidade e, sobretudo, a liberdade, chegaremos à triste conclusão

de que um dos principais objectivos dos programas de Língua Portuguesa ou do

Português, que é formar leitores autónomos, não passará de uma frase «agramatical»

no final dos vários ciclos de aprendizagem. Como poderemos mudar? Aguiar e Silva

(2010, P. 207 a 216), nas suas teses sobre o ensino do texto literário na aula de

Português, enumera vários pontos de mudança em relação ao praticado até agora. Em

primeiro lugar, «não se pode ensinar língua sem o estudo da poesia, não se pode

ensinar a poesia sem o estudo da língua.». Em segundo lugar, o texto literário deve

ocupar um lugar central e não um lugar periférico, constituindo um «thesaurus por

excelência da identidade nacional. Todos os textos devem ser sempre de qualidade

indubitável, prestando a devida atenção às suas estruturas formais e semânticas e

sempre que possível estabelecer diálogos com outras artes. Em terceiro lugar, embora

a língua e a literatura sigam uma linha temporal, a história literária não deverá ocupar

o espaço do próprio texto literário. Por último, o texto literário deve suscitar nos

alunos «o desejo e o gosto de escrever» e esse desejo só poderá ser suscitado se a

leitura e interpretação dos textos seja «uma viagem guiada pelo professor com

53

segurança, mas com delicadeza e com discrição (…)». Esta última afirmação remete-

nos para o papel fulcral que o professor exerce na aula de Português.

O professor de Português tem de gostar de ler livros de literatura e, através da

sua paixão pela literatura, despertar nos alunos o gosto pela leitura, propondo-se nem

sempre a seguir o caminho mais rectilíneo, mas a explorar outros caminhos, de difícil

acesso, que só o professor conhece e que só ele pode ensinar, partilhando-o com os

alunos para que eles próprios os possam conhecer e explorar. Esse caminho é o da

literatura.

Depois desta «declaração de intenções» na orientação que deve ter o ensino da

língua portuguesa, voltemos à autora Inês Duarte. No que diz respeito aos textos de

carácter mais complexo, esta elabora estratégias a implementar na sala de aula que

considero bastante pertinentes e as quais me foram extremamente úteis na

preparação das aulas. A sua leitura deve ser preparada pela aprendizagem de

estratégias de compreensão de leitura (eg., identifica a ideia principal; sublinha o que

não percebes; identifica e sublinha as ideias acessórias, etc.)» (Duarte, p. 16)

Esta estratégia foi basilar na criação de fichas de leitura, onde houve o cuidado

de estruturar o pensamento dos alunos no sentido de distinguirem o fulcral do

acessório, havendo perguntas directas que os ajudam a responder a perguntas de

carácter mais indirecto e mais abertas, ou seja, partindo de uma informação específica

dada, para uma resposta mais abrangente sobre todo o texto.

Deve haver espaço reservado para a sua leitura em sala de aula, de modo a que

o professor possa ajudar as crianças a ultrapassar as dificuldades e lhes forneça as

indicações que os levarão a desenvolver e utilizar autonomamente estratégias de

compreensão de leitura» (Duarte, p. 16).

Neste caso, nas aulas leccionadas houve sempre um espaço reservado para a

leitura e a utilização de várias estratégias de leitura (leitura pelos alunos em voz alta,

em voz alta pelo professor, silenciosa, em busca de conteúdos específicos, etc.)70.

Uma outra forma de contribuir para o enriquecimento lexical é expor os alunos

a «textos orais que exemplifiquem a complexidade sintáctica e a riqueza vocabular

70 Ver anexo B, J, K, L.

54

típica do português escrito» (DUARTE, p. 17). Para isso, tal como sugere a autora, foi

proporcionado aos alunos, (para além da ida a peças de teatro previamente propostas

no PCT, e da audição de textos, neste caso poemas), a exposição a um input oral de

qualidade por parte do professor, o qual através da interacção que tive com os alunos,

quer seja através de questões formuladas de várias maneiras, através de sinónimos, na

utilização de figuras de estilo no discurso, quer através de experiências pessoais, de

leituras, de tópicos e temas que estão fora da área de conforto dos alunos, de maneira

a expandir os seus interesses e a motivar a descoberta. (ver anexo PowerPoint

mitologia rodapé).

Como evidencia a Autora, uma outra maneira de desenvolver a consciência

lexical das crianças em aula é «envolvê-las em actividades que as obrigam a

concentrar-se ora na forma fónica das palavras, na sua forma ortográfica, ora na sua

estrutura interna, ora nas condições que impõem ao contexto, ora no seu significado.»

(DUARTE, p. 17). Esta estratégia não foi elaborada de forma lúdica como a autora

sugere. No entanto, através do texto estudado pelos alunos durante o estágio (Os

Lusíadas), pudemo-nos concentrar nas várias «facetas» de uma palavra, quer na

evolução fonética e semântica, quer em actividades de reconhecimento e produção de

figuras de sintaxe e de semântica71.

Por último, podemos referir que a principal preocupação em ensinar léxico tem

que ver com a contextualização da palavra e em verificar as suas relações com outras

palavras. Assim, o contexto torna-se elemento imprescindível para a aquisição do

léxico de uma língua, pois «quando uma palavra tiver várias significações, elas serão

dadas através de frases e nunca apresentadas ou pretensamente fixadas fora do

texto», isto é «a palavra só tem significado na frase, e esta no texto» (Genouvrier,

Peytard, p. 290).

Quanto ao segundo ponto, as estratégias utilizadas para a aquisição de léxico

numa segunda língua, tive em consideração, para além das várias teorias de aquisição

de segunda língua, o trabalho desenvolvido por Isabel Leiria72. A autora refere que

71 Ver anexos J, K, L.

72 In LEIRIA, Isabel (2006). Léxico, aquisição e ensino do Português Europeu língua não materna. Lisboa. Fundação Calouste Gulbenkian – Fundação para Ciência a Tecnologia.

55

existem duas posições bastante fortes. Os que defendem que o vocabulário deve ser

ensinado explicitamente e os que consideram que a sua aprendizagem deve ser

implícita (LEIRIA, p.160). Segundo Ellis (cit. Leiria, p. 160) podemos distinguir quatro

posições:

• A hipótese forte de aprendizagem implícita defende que o significado de

uma palavra nova é adquirido de modo totalmente inconsciente como

resultado da exposição repetida a uma serie de conceitos em que ela é

activada, o que nos remete para a teoria do input de Krashen, descrita na

primeira parte do relatório;

• A hipótese fraca de aprendizagem implícita sugere que a aquisição não será

possível sem se tomar consciência de que se trata de uma palavra nova;

• A hipótese fraca de aprendizagem explícita defende que o facto de a

maioria das palavras não nos serem ensinadas não significa que não

tenhamos usado estratégias para as aprendermos. Assim, poderemos tirar

partido da aprendizagem de um novo item e utilizarmos diversas

estratégias para inferir o significado a partir do contexto como para a

retenção desse mesmo significado;

• A hipótese forte de aprendizagem explícita preconiza que a aplicação de

estratégias metacognitivas facilita fortemente a aquisição de vocabulário

novo, verificando que se trata de uma palavra nova, tentando inferir o seu

significado a partir do contexto ou do dicionário, e procurando consolidar

este novo conhecimento através da repetição e de outras estratégias de

associação semântica ou imagética.

Tendo em consideração estas várias hipóteses, decidi utilizar a primeira e a

quarta hipótese. Quanto à primeira hipótese, ao expor os alunos a um input sobre um

determinado tema (a publicidade), dando-lhes textos, bem como imagens e

exposições orais e auditivas, os alunos puderam inferir o léxico da publicidade, as

expressões mais utilizadas, a importância da linguagem (figuras de estilo, expressões

idiomáticas, etc.) na criação de slogans. Ao realizar exercícios de compreensão e de

escolha de informação de textos, ao introduzir exercícios de gramática que ajudaram

56

os alunos a estruturar o vocabulário apreendido, os alunos puderam consolidar este

novo conhecimento e aplicá-lo na realização de um vídeo publicitário.73

No que diz respeito a estratégias de inferência, como refere Ellis (cit. Leiria, p.

169) o facto de uma palavra em L2 nos lembrar a palavra em L1, realça o papel dos

estudos dos cognatos, sendo assim ao ensinar as expressões idiomáticas pude explorar

a cognaticidade entre a L1 e a L2 e também a sua não-cognaticidade, analisando os

falsos amigos, através de textos e de exercícios74 Também, como refere Leiria, através

da morfologia, pelo facto de através dos processos de inferência, «as regras que

governam a formação de palavras na L1, restringem as hipótese que os sujeitos põem

acerca das regras lexicais da L2 e, consequentemente, inferem no pensamento

(Hancin-Bhatt & Nagy, 1994, cit Leiria, p. 169). Assim, ao realizar o jogo superescoba,

adaptado à formação de palavras em L2, pude colmatar dificuldades na formação de

palavras por parte dos alunos e contribuir para o conhecimento desses mesmos

processos75.

Para além das estratégias de inferência utilizadas ainda explorei algumas

estratégias de retenção, nomeadamente, jogos mnemónicos76.

Por fim, em termos conclusivos e parafraseando Oxford & Scarcella (cit. Leiria,

p. 171) «o trabalho na sala de aula que desenvolve a aplicação de estratégias de

inferência e de retenção para o significado parece justificar-se e de merecer a nossa

atenção, mas a aprendizagem incidental […] é, sem dúvida, essencial e o principal

motor para o desenvolvimento da linguagem».

Reflexão crítica sobre a prática de ensino supervisionada

Esta reflexão crítica sobre a prática de ensino supervisionada está estruturada

em quatro pontos fundamentais: a adequação dos materiais; o sucesso das estratégias

73 Ver anexo N.

74 Ver anexo D.

75 Ver anexo E.

76 Ver anexo F.

57

aplicadas; a adequação dos objectivos previstos nos documentos orientadores de cada

disciplina e propostas de melhoria no ensino e a aprendizagem do léxico na língua

materna e na língua estrangeira.

No primeiro ponto, através da prática supervisionada, pude constatar que a

maioria dos manuais de língua materna não proporciona qualquer tipo de actividade

no que diz respeito à aquisição de léxico, quer ao nível dos conteúdos, quer ao nível

das actividades, pelo menos a um nível explícito, à excepção da criação de um

dicionário mitológico, n’ Os Lusíadas. No entanto, e depois do evidenciado em

capítulos anteriores, sabemos que o ensino incidental de léxico é o mais eficaz para a

aquisição de léxico, embora não haja vestígios de estratégias e actividades para o

ensino do léxico implicitamente ou pelo menos a consciencialização do quão

importante se torna a aquisição do léxico num período de globalização e onde as

turmas são cada vez menos homogéneas e tem alunos de várias proveniências

geográficas. Neste caso, cabe ao professor proporcionar uma maior envolvência do

léxico no ensino da língua materna. Foi difícil a preparação de materiais,

nomeadamente por não existir materiais de aquisição de léxico explícito adequados

para níveis como o 9.º ano do ensino básico ou anos seguintes, daí que os materiais

por mim realizados sejam de natureza implícita e não explícita. Estes materiais,

embora não sendo originais, pois muitos deles foram adaptados, tentam inculcar nos

alunos, a importância da compreensão do léxico para o deslindamento da mensagem

nos textos literários, sabendo que essa linguagem muitas vezes é figurativa, sendo

assim os materiais elaborados tentam, em primeiro lugar, ajudar o aluno a distinguir o

que é informação importante e o que é informação acessória, ajudar o aluno a utilizar

o texto como fonte de conhecimento, assim como a ajudar o aluno a tomar

conhecimento das estratégias literárias utilizadas pelos vários autores e,

principalmente, o porquê dessas utilizações especificas, nomeadamente na utilização

das figuras de estilo. Neste ponto tive a preciosa ajuda do texto a estudar,

nomeadamente Os Lusíadas, já que é, senão a maior, uma das maiores fontes de léxico

de diversas áreas, bem como de figuras estilísticas, entre outras.

Já no que diz respeito à L2, o manual utilizado dispõe de inúmeros exercícios de

aquisição de léxico, embora sejam exercícios adaptados e abordam a aquisição de uma

58

maneira explícita. Alguns dos exercícios das unidades do manual que leccionei foram

utilizados, embora tenha tido a preocupação de utilizar textos autênticos, audições

reais e não fabricadas como no caso das cunas publicitárias e nas músicas infantis77.

Embora o manual escolar privilegie a abordagem comunicativa, acabei por utilizar

numa das unidades o «enfoque por tareas», nomeadamente na unidade sobre a

publicidade, onde a tarefa final foi a realização de um anúncio publicitário78. Decidi

ainda utilizar todo o tipo de materiais desde vídeos, fichas informativas e de exercícios

sobre determinadas matérias, canções, textos, jogos didácticos. Enfim, sempre que

considerei que o manual não era suficiente optei por criar ou adaptar materiais.

Quanto ao segundo ponto, o sucesso das estratégias aplicadas, penso ter

atingindo os objectos a que me propus nas planificações. Por vezes, como é óbvio, no

início da leccionação das aulas, as estratégias nem sempre surtiram efeito,

nomeadamente nas de Língua Portuguesa onde algumas fichas realizadas por mim,

não surtiram o efeito desejado pela sua complexidade ou pela sua organização No

entanto, através das reuniões mantidas com os orientadores, pude melhorar e

organizar melhor a finalidade das actividades o que levou a um resultado positivo das

estratégias implementadas. Penso que um dos factores que levou ao sucesso das

estratégias implementadas foi, sem dúvida, a observação de aulas, onde pude recolher

informação fulcral para a organização das planificações e das estratégias a utilizar, bem

como pelo facto de utilizar estratégias usadas pelas orientadoras que, através da sua

observação, pude verificar a sua funcionalidade, nomeadamente o relatório oral no

início de cada aula e a escrita do sumário no final de aula entre outras.

No que concerne o terceiro ponto, a adequação dos objectivos previstos nos

documentos orientadores de cada disciplina, tive sempre em consideração, nestes

casos, o programa de Língua Portuguesa do Ensino Básico, o Programa de Espanhol

Continuação do Ensino Secundário, assim como o Marco Comum Europeu de

Referência para as Línguas, como é observável nas planificações efectuadas. Tendo

sempre como objectivo o tema do meu trabalho, no entanto nunca descurei os

programas e cumpri sempre os objectivos dos mesmos. No caso específico da Língua

77 Ver anexo G.

78 Ver anexo N.

59

Portuguesa, é bastante visível já que o facto de ter leccionado aulas a uma turma de

9.º ano, tendo este exame de final de ciclo à disciplina, fez com que as adequações aos

programas vigentes fossem escrupulosamente cumpridas.

Por fim, no quarto e último ponto, as propostas de melhoria no ensino e

aprendizagem do léxico na língua materna e na língua estrangeira, assentam na

bibliografia lida e na experiência dada pelo estágio.

O que pude constatar ao longo do estágio, é que nos manuais de Língua

Portuguesa o léxico e a sua aquisição estão demasiadamente «implícitos», isto é,

apesar de concordar que a melhor maneira de adquirir léxico é o método incidental,

não significa que não deva existir nos manuais estratégias de accionamento do léxico,

estratégias de memorização, estratégias de inferência e retenção do léxico.

Inclusivamente, tendo em conta os textos literários utilizados, muitos deles de há

vários séculos atrás, os manuais não impulsionam o método da descoberta de novo

léxico. Segundo Inês Duarte e outros estudiosos, um aluno normal deve adquirir, ainda

no 6.º ano de escolaridade, 10 000 palavras (Duarte, p. 13). A continuação destes

métodos, contribuindo para um menor esforço por parte dos alunos, fará com que a

cifra, em vez de aumentar, estagne nos anos do ensino básico e secundário,

contribuindo para um maior fosso social entre os alunos.

Outra das lacunas que evidenciei, neste caso relativamente aos manuais de L2,

foi a falta de textos literários. Como poderemos compreender uma língua estrangeira

se não usufruímos da sua literatura, fonte de riqueza lexical e semântica? Como

refutar os estereótipos e preconceitos relativamente a uma língua e uma cultura,

criando pontes entre a nossa própria cultura e cultura da L2 que nos ajuda a criar laços

de aproximação, espelhando proximidades e distanciamentos que nos tornam

melhores cidadãos, cientes das idiossincrasias de cada cultura e com a capacidade de

refutar determinados estereótipos que se criam e se enraízam sem o mínimo fundo de

verdade? O que é a aprendizagem de uma língua sem conhecer a sociedade, a

literatura e a sua cultura?

60

CONCLUSÃO

Em síntese, este relatório pretende ser, de alguma forma, a união entre a

investigação teórica e a prática de Ensino, no que diz respeito à aquisição da linguagem

e as suas repercussões na aprendizagem da língua materna e da segunda língua. Em

última instância, este relatório tem o propósito de ser um retrato fiel do que implica a

prática de ensino. Desde a investigação levada a cabo pelo professor até à elaboração

ou adequação de materiais. Segundo Ana Paula Dias «O professor do 3º milénio deve

ser preparado para tomar decisões que decorram de uma visão clara do papel da

língua materna [e da segunda língua] na educação, decisões que, certamente, exigirão

grande capacidade de inovação pedagógica que deverá fluir de várias fontes: formação

inicial, formação contínua e profissional e, talvez ainda mais importante, da busca

pessoal e incessante do conhecimento, do olhar crítico, da participação activa nas

manifestações culturais que o rodeiam […]»79.

De toda a experiência adquirida ao longo do ano lectivo, constatei que todas a

investigações teóricas que pesquisei não são unânimes, daí a importância da frase de

Ana Paula Dias, pois só através de todos esses métodos e de toda a experiência

adquirida, podemos escolher o caminho mais luminoso para os nossos alunos, o

caminho da descoberta do conhecimento e, principalmente, o caminho da descoberta

do seu interior, dando luminosidade a sítios onde reside a penumbra, desvanecendo o

nevoeiro pelo conhecimento.

Por último, creio ser bastante pertinente para este relatório a afirmação de

Eduardo Lourenço: «É isso é que é de facto a nossa língua, aquela que nos fala sem nós

mesmos sabermos de que nos fala, e, nos falando, nos cria.»80

79 In Actas Conferência Internacional sobre o Ensino do Português (2007). Lisboa. Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular. Ministério da Educação. P. 125)

80 In Actas Conferência Internacional sobre o Ensino do Português (2007). Lisboa. Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular. Ministério da Educação. P. 125)

61

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65

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66

ANEXOS

67

Anexo A - Representações de interlíngua. Kim Griffin (2005:97, cit. Pavón, Esther, p. 136)

68

LENGUA EN EL ENTORNO

(Compuesta de elementos conocidos y desconocidos por el aprendiz)

El aprendiz percibe lengua del entorno según necesidades y recursos.

El aprendiz interactúa con la lengua reforzando conocimientos y asociando algo de conocimientos desconocidos con los conocidos

- El aprendiz hace hipótesis sobre las asociaciones y las ensaya

- Observa reacciones y retroalimentación.

-Confirma o rechaza hipótesis.

Rechaza hipótesis Confirma hipótesis

- Categoriza información nueva

- Almacena información nueva

- Se recupera cuando parece necesario

- Se reconfirma la hipótesis en sucesivas ocasiones de uso

- Se modifica según nuevos usos observados

- Pasa a formar parte de conocimientos establecidos y sirve para asociarse con nuevos conceptos

Anexo B – Planificação de uma aula de 90 minutos de Língua Portuguesa

Planificação de aula (16/04/2012) Aula nº: 120,121 9ºG (90 minutos)

O texto épico: Os Lusíadas: leitura e interpretação de episódios seleccionados da obra.

Competências específicas

Objectivos específicos

Conteúdos

Actividades

Tempo

Materiais/

Recursos didácticos

Avaliação

• Expressão Oral/ Compreensão oral

. Produzir enunciados orais coesos e coerentes.

. Conteúdos relacionados com aula (s) anterior (es)

. Entrada

na sala de aula;

. Apresentação oral do relatório/síntese da aula anterior

5 m.

5 m. • Observação

directa

• Leitura.Interpretar textos com diferentes graus de complexidade.

. Texto épico

. Leitura expressiva conjunta do excerto seleccionado d’Os Lusíadas «Despedidas em Belém».

15 m.

. Manual (pág. 212 e 213)

• Observação

directa

69

• . Leitura

• C.E.L

. Discutir diferentes interpretações de um mesmo texto ou sequência.

. Reconhecer e reflectir sobre os valores culturais, estéticos e religiosos que perpassam nos textos.

. Analisar processos linguísticos e retóricos utilizados pelo autor na construção de uma obra literária

. Texto épico:

. Significação e relações semânticas entre palavras.

. Contexto.

. Níveis e categorias da narrativa.

. Figuras retóricas e tropos (personificação, enumeração, metáfora).

. Análise do excerto por parte dos alunos, com a ajuda do professor, identificando o tema, a estrutura interna, o aspecto formal, bem como a sua importância no contexto geral da obra.

30 m.

. Manual (pág. 214)

• Observação

directa

• .Leitura

.Interpretar textos com diferentes

. Texto lírico

. Leitura expressiva por parte dos alunos do poema Mar português de

5 m.

Manual (pág. 216)

• Observação

directa

70

graus de complexidade.

Fernando Pessoa.

• Leitura Discutir diferentes interpretações de um mesmo texto ou sequência.

. Texto lírico: estrutura externa e estrutura interna.

Análise do poema por parte dos alunos, com a ajuda do professor, identificando o tema, assunto e a intertextualidade com o episódio d’Os Lusíadas.

15 m.

. Manual (pág. 216)

• Observação

directa

• .Escrita

. Utilizar a escrita para estruturar o pensamento e sistematizar conhecimentos

. Escrita do sumário. 5 m.

. Caderno diário

• Observação

directa

Sumário: Relatório oral. Leitura e interpretação do episódio «Despedidas em Belém». Leitura e análise do poema Mar português de Fernando Pessoa.

Venâncio Pedro -10.02.2012

Anexo C – Planificação de uma aula de Espanhol

71

72

Destrezas Objetivos

Contenidos

Actividades Materiales Tiempo Evaluación

E. Oral

C. Oral

C. Escrita

- Comunicar con seguridad sobre temas relacionados con sus conocimientos e intereses.

-Interaccionar con seguridad sobre temas conocidos y de interés personal.

-Identificar palabras relacionadas con un tema específico.

- Los animales;

- Expresiones idiomáticas;

- Entrada en clase;- Introducción del

tema de la unidad por parte del profesor;

- Los alumnos repasan los nombres de los animales, a través de una sopa de letras.

- Se hace la corrección del ejercicio por todo el grupo;

- Los alumnos realizan los ejercicios 3 y 4 de la página 106 del manual;

- Pizarra;

-Ficha de ejercicios;

-Manual

5 m.

5 m.

10 m.

10 m.

Obs

erva

ción

dir

ecta

E. Oral

C. Oral

C. Escrita

E. Escrita

- Comunicar con seguridad sobre temas relacionados con sus conocimientos e intereses.

-Interaccionar con seguridad sobre temas conocidos y de interés personal.

-Identificar palabras relacionadas con un tema específico.

-Tomar notas de memoria;

- Los animales;

- Expresiones idiomáticas;

- La clase visualiza una imagen que les enseña el profesor;

- Los alumnos intentan adivinar de que trata el imagen;

- El profesor distribuye la imagen por toda la clase y los alumnos tienen que memorizar los animales que aparecen en la imagen (si necesario con la ayuda del diccionario).

- El profesor recoge la imagen y los alumnos tienen que escribir los nombres de los animales que han memorizado.

- Imagen;

-Cuaderno;

5m.

5 m.

5 m.

Anexo D – ficha sobre falsos amigos

“Falsos amigos” son palabras parecidas en las dos lenguas (portugués y español), pero con sentidos distintos.

1- Elige la opción que mejor explica la palabra subrayada.

01. La muchacha está embarazada.

a) Ella tiene vergüenza.b) Ella va a ser madre.

02. La comida está exquisita.

73

ESCOLA SECUNDÁRIA JORGE PEIXINHO, MONTIJO

Fecha: Profesor: Venâncio Pedro

Disciplina: Español Año: 10º Grupo:

Nombre: Nº:

Falsos amigos

a) La comida está muy sabrosa.b) La comida está rara.

03. Alumnos, vamos a ver la foto de este oso.

a) Forma parte del esqueleto.b) Es un animal.

04. Esta taza es de porcelana china. Mi hermana me trajo de regalo.

a) Recipiente en que bebemos café o té.b) Recipiente en que bebemos vino o champán.

05. El nuevo coche de Pedro es rojo.

a) Es el color de la sangre.b) Es el color de la uva.

06. Este muchacho es zurdo.

a) No escucha.b) Escribe con la mano izquierda.

07. La novia de Andrés es rubia.

a) Tiene el pelo rojo.b) Tiene el pelo amarillo.

08. Me duele el cuello.

a) Animal – símbolo de la Pascua.b) Parte del cuerpo.

09. Nino, traiga la escoba para mamá.

a) Instrumento que usamos para barrer.b) Instrumento que usamos para peinar el pelo.

10. Mi apellido es Gómez.

a) Nombre de familia.b) Nombre que los amigos suelen usar para llamar a la persona.

11. Mi papá trabaja en una oficina.

74

a) Lugar donde se arreglan los coches.b) Lugar donde abogados y empresarios trabajan.

12. Mi agenda está en mi escritorio.

a) Donde abogados y empresario trabajan.b) Mesa que usamos para escribir o estudiar. En general hay estas mesas en las oficinas.

13. ¡Qué lindos cachorros!

a) Animal doméstico de cuatro patas.b) Cría de animales mamíferos.

14. La comida está salada.

a) Comida con mucha sal.b) Plato de entrada. En general con tomate, lechuga y cebolla.

15. ¡Qué horror! ¡Cuánto polvo! Voy a tener mucho trabajo para limpiar.

a) Animal marino.b) Suciedad.

2 - Considera la lista a continuación y completa los espacios en al texto.ESPAÑOL: PORTUGUÉS- abono: adubo- alargar: alongar, aumentar o comprimento- aposentar: alojar, hospedar- balón: bola - batata: batata doce - beca: bolsa de estudos- bodega: adega / armazém- carnicero: açougueiro- cava: adega - ciruela: ameixa- competencia: = / concorrência - concurrencia: assistência, confluência- consigo: pronombre tônico- curso: ano acadêmico- enamorado: apaixonado - gira: = (volta, giro) - lámpara: abajur / lustre- pegar: bater, colar- sobrenombre: apelido

75

- sumir: afundar- tirar: atirar / deitar / puxar

- trampa: armadilha / batota

1 - En mi ____________ hay una botella de vino que puedes llevar ____________.2 - El ____________ de cumpleaños en forma de ____________ es una novedad en esta fiesta.3 - Para el ____________ de 2009 vamos a estar en la facultad y vamos a solicitar una ____________ de estudios.4 - La ____________ de personas en el accidente puede ser una ____________ para los bomberos.5 - El ____________ nunca me vende carnes buenas para hacer con ____________.6 - Yo voy a ____________ a mis amigos de Pirapora y después vamos en ____________ por la ciudad.7 - Pepito se quedó ____________ de esta ____________ y la quiere para iluminar su cuarto.

Fonte: http://adrianofgssp.blogspot.pt; http://espanholressurp.wordpress.com.

Anexo E – Juego superescoba

Hoja de instrucciones:

Preliminares. Se juega utilizando una baraja de palabras de 40 cartas: las 10 cartas de color naranja son sufijos y las restantes 30 cartas son sustantivos o verbos.

Modo de distribuir las cartas y la salida.. El jugador que empiece el juego será «el mano». Para ello, toma todas las cartas, y, tras barajarlas bien, se las ofrece a un compañero para cortar. Después distribuirá, de una en una, tres cartas a cada jugador, empezando por su derecha. Colocará a continuación, en el centro de la mesa, cuatro cartas descubiertas. Las cartas restantes quedarán boca abajo sobre la mesa. En las bazas siguientes, el turno de dar cartas continúa por orden riguroso de izquierda a derecha.

76

ESCOLA SECUNDÁRIA JORGE PEIXINHO, MONTIJO

Fecha: Profesor: Venâncio Pedro

Asignatura: Español Año: 10º Grupo:

Nombre: Nº:

Juego superescoba

Marcha del juego. El jugador que ha repartido las cartas, y todos los demás, después, cuando llegue su turno de jugar, intentarán emparejar una de sus cartas con alguna de las que están boca arriba en el centro de la mesa, con el objetivo de formar una palabra nueva. Mientras componen la palabra, deberán construir en voz alta una frase correcta con ella. Si hacen las dos cosas sin errores dirán en voz alta escoba y colocarán las cartas a su lado. En caso de no lograr formar ninguna palabra, el jugador deberá desprenderse de una de sus cartas y dejarla boca arriba junto a las otras cartas descubiertas.

Cuando todos hayan jugado sus tres cartas, el jugador que reparte hará una nueva distribución de tres cartas a cada jugador. Continúa el juego de esta forma hasta que no haya más cartas que repartir. En la última distribución de tres cartas, el que da tiene obligación de anunciar en voz alta que se trata de las últimas cartas.

Tanteo del juego. Cada palabra compuesta con su frase correspondiente contará dos puntos. Gana el jugador que más puntos sume.

Tabla 1 – nombres y verbos

romper labor heroé Amor reciclar

comercio Razón valor Voluntad peligro

Representar mundo penetrar ruido competir

mes adelgazar sociología nauta palpar

menguar desobedecer Calor horror corresponder

corrosión fama Fan sedar vértigo

Tabla 2 – sufijos

Sufijo -al Sufijo -ico Sufijo - ble Sufijo -nte Sufijo -oso

Sufijo -ivo Sufijo - osas Sufijo -ivas Sufijo -les Sufijo - icas

77

78

Fonte: http://cvc.cervantes.es/aula/didactired/anteriores/noviembre_02/25112002.htm

Anexo F – jogos mnemónicos

1 - Vas a hacer una pequeña actividad de memorización que consiste en aprender en un minuto una lista de palabras.

79

ESCOLA SECUNDÁRIA JORGE PEIXINHO, MONTIJO

Fecha: Profesor: Venâncio Pedro

Asignatura: Español Año: 10º Grupo:

Nombre: Nº:

Juego: Mejor juntas que revueltas

Niebla tifón nevada lluvia

nuboso llovizna despejado ventoso

Viento lluvioso nieve huracán

Sol soleado chubasco

Fonte: http://cvc.cervantes.es/aula/didactired

Anexo G – comprensión auditiva: los diminutivos

1. Escucha las siguientes canciones infantiles y completa los huecos.

“Cinco ratoncitos”

Cinco ratoncitos de ________ gris,mueven las orejas, mueven la nariz,abren los ______, comen sin cesar,por si viene el gato, que los comerá,comen un __________, y a su casa van,cerrando la puerta, a dormir se van

“Cinco lobitos”

Cinco lobitostiene la loba,cinco lobitos, detrás de la escoba.Cinco lobitos,cinco parió,cinco críó,y a los cinco, a los cinco

________ les dió.

Pulgar, pulgar,se llama éste,éste se llama índice y sirve para señalar,éste se llama corazón y aquí se pone el dedal,aquí se pone el anillo y se llama anulary este tan _________¡meñique, meñique!.

“Palmas, palmitas”

Palmas, palmitas,

higos y ___________,

azúcar y turrón

80

Niebla nieve nevada nuboso

Lluvia llovizna chubasco lluvioso

Viento ventoso tifón huracán

Sol soleado despejado

ESCOLA SECUNDÁRIA JORGE PEIXINHO, MONTIJO

Fecha: Profesor: Venâncio Pedro

Asignatura: Español Año: 10 Grupo:

Nombre: Nº:

Diminutivos

para mi niño/a son.

fonte: http://www.guiainfantil.com

Palmas, palmitas,

que viene papa

palmas palmitas

que luego vendrá

Palmas, palmitas,

que viene papa

palmas __________

que en casa ya está

Los cochinitos ya están en la cama,muchos _________ les dio su mamá,y ___________ los tres en pijamadentro de un rato los tres roncarán.

Uno soñaba que era Reyy de momento quiso un pastelsu real ministro le hizo traerquinientos pasteles no más para el.

Otro soñaba que en el maren una barca iba a remarmás de repente a embarcarse cayó de la cama y se puso a llorar.

Los cochinitos ya están en la cama,muchos besitos les dio su mamá,y calientitos los tres en pijamadentro de un rato los tres roncarán.

El más pequeño de los tresun cochinito lindo y cortésese soñaba con trabajarpara ayudar a su pobre mamá.

y así soñando sin descansarlos ___________ pueden jugarronca que ronca y vuelve a roncara país de los sueños se van a jugar

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Anexo H – Animales y expresiones idiomáticas

1- Mira la imagen durante 2 minutos.

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ESCOLA SECUNDÁRIA JORGE PEIXINHO, MONTIJO

Fecha: Profesor: Venâncio Pedro

Disciplina: Español Año: 10º Grupo:

Nombre: Nº:

Animales

2 – Ahora, sin mirar la imagen, tienes que escribir los nombres de los animales que aparecen en la imagen. Tienes 4 minutos.

3 – Lee el texto y contesta a las preguntas.

Mitos y errores sobre animales

«Enumerar errores sobre animales podría llenar un libro. Nada llamó más la atención del hombre a lo largo de la Historia que las otras criaturas vivientes. Pero las confusas impresiones que se ha figurado de ellas hablan mal de sí mismo. Posiblemente los animales que acumularon más creencias erróneas sean los perros, los cuales son casi sagrados en nuestra cultura. La gente imaginó que tenían habilidades increíbles, como la de predecir el futuro, advertir de peligros inminentes, sentir instintivamente la muerte de su amo, etc. Una noticia cuenta que un cócker spaniel, enviado a EE.UU. desde el Pacífico, «intuitivamente» reconoció a la esposa de su amo. [...] Lo más corriente es atribuirles la habilidad de leer el carácter. [...] En las historias populares, de la literatura y las películas los únicos que se dan cuenta de que alguien es «malo» son los perros. [...]

Otra creencia sobre los perros es que, como las palomas, tienen la habilidad sobrenatural de encontrar el camino de regreso al hogar a través de centenares y miles de kilómetros de terreno desconocido, tal vez tengan una brújula y un sistema de localización por satélite escondido. Bergen Evans, en su Historia natural del disparate, cuenta que los periódicos están llenos de historias de perros que, perdidos, han sabido encontrar el camino de vuelta a casa de sus amos. Pero el mismo Evans explica que a estas historias, se puede oponer el hecho de que los periódicos están llenos de perros perdidos.

Otra de nuestras mascotas está también llena de mitos, el gato. A muchas personas les molestan los gatos. Los gatos según las creencias populares traen mala suerte, particularmente si son negros. Algunos afirman que los gatos absorben el aliento de los niños. [...]

Los toros también tienen sus mitos. Lo primero que piensa una persona al toparse con un toro es «¿tengo algo rojo?», por miedo a que el toro lo embista. Sin embargo, los toros son ciegos a los colores. Según los matadores de toros, en las corridas, lo que irrita al toro es el movimiento de la tela, no su color.

El cerdo tiene mala fama, se dice de él que es un glotón y un animal sucio y asqueroso. [...] Su mala reputación debe de ser por el ruido que hace al comer, y al hecho de que, les encanta chapotear en el barro. Un animal mucho más sucio que el cerdo es la oveja y sin embargo, ésta se convirtió en símbolo de pureza.

El zorro es sabio, astuto, ágil, ¿qué más? La sabiduría y astucia del zorro se consideran admirables. Siempre engaña a sus perseguidores. El naturalista Ernest Seton Thomson nos cuenta en el libro Los animales salvajes que conocí,que un zorro es capaz de correr a lo largo de las vías del tren poco antes que éste pase, sabiendo que su rastro será «destruido por el tren», y sabiendo también que «existe siempre la probabilidad de que sean atrapados por la máquina». Thompson se olvida de aclarar dónde consigue el zorro un horario de trenes.

Los pobres lobos están muy maltratados por el «saber popular». Se dice de ellos que son cruelmente caníbales, que les gusta la carne humana. Sitian aldeas, y a veces amenazan ciudades de más de un millón de habitantes. Llegaron a atacar regimientos

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en marcha y abordaron trenes de ganado. Pero contrariamente también se cuenta que los lobos adoptan bebés, como es el caso de los famosos Rómulo y Remo, fundadores de Roma, y que fueron amamantados por una loba. No hay ningún antecedente auténtico de algún ser humano atacado y comido, actualmente, por un lobo. Durante años, la United States Bilogical Survey, de Washington, investigó todos los relatos publicados de matanza de seres humanos por lobos, en EE.UU. y Canadá, «y sin una sola excepción, resultaron ser puramente imaginarios».

Los monos también son formadores de mitos. El autor romano Plinio, cuenta que los monos jugaban al ajedrez. También se decía de ellos en siglos pasados que los mandriles fumaban y jugaban a las cartas. Lord Monboddo afirmaba que los orangutanes construían casas y mantenían a seres humanos como esclavos. En el siglo XIX el famoso periodista explorador Henry Morton Stanley contaba que los chimpancés, llevaban antorchas cuando viajaban de noche.

Las cigarras quedaron muy mal, después que Disney las inmortalizara como vagas y a las hormigas como muy trabajadoras. Este mito no lo inventó Disney, sino que viene desde la antigüedad y se encuentra ya en el autor griego Esopo. Pero esta creencia no es cierta, ya que no es la cigarra la que le pide alimento a la hormiga, sino que esta última se lo roba a la pobre cigarra. En tiempo caluroso, la cigarra busca agotadoramente con su pico savia de las plantas, mientras las codiciosas hormigas se arrastran entre sus patas y roban los frutos de su labor.»

Martín A. Cagliani, (texto adaptado procedente de http://webs.sinectis.com.ar/mcagliani/mitosy.htm)

1. Completa la tabla con informaciones del texto.

creencias falsas sobre

estos animales, según el texto

creencias sobre estos animales en tu cultura

creencias sobre estos animales en las culturas

de tus compañeros

perro

gato

toro

zorro

lobo

cerdo

mono

cigarra

hormiga

otros animales

2. Descubre el significado de las siguientes expresiones idiomáticas.

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Ser perro viejo.Ser un perro.Ser un cerdo.Estar como un toro.Ser un toro.Ser una loba.Ser un zorro.Ser mono / una mona.Ser un mono de feria.Ser un / una hormiguita.

Fonte: http://cvc.cervantes.es/aula/didactired/anteriores/octubre_07/29102007a.htm

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Anexo I – Ficha de avaliação Espanhol

Grupo I – Comprensión auditiva (200 puntos)

1. Escucha la predicción del tiempo para mañana en España y contesta (v) verdadero o (f) falso. (cada 25 puntos)

a) En el noroeste peninsular se prevén precipitaciones débiles.b) En el Cantábrico lloverá pero el cielo no estará cubierto ni habrá posibilidad

de brumas y nieblas.c) Las precipitaciones débiles se extenderán al centro de la Península.d) Las precipitaciones serán más probables en el área mediterránea.e) La cota de nieva descenderá a lo largo del día hasta los 1200 m.f) Seguirá nevando con fuerza en todo el Pirineo.g) En las Islas Baleares habrá posibilidades de tormentas.h) En las Islas canarias habrá riesgo de granizo y vientos flojos en el estrecho

peninsular.

Grupo II – Comprensión lectora (200 puntos)

1. Lee el texto y contesta a las preguntas.

«Pero ¿Es el hombre el causante del cambio?»

«La idea de que la temperatura global está aumentando es unánime entre los científicos; las causas, sin embargo, pueden encontrarse en múltiples orígenes e interaccionar entre ellas. Aún así, los últimos informes científicos demuestran que la influencia humana es cada vez más evidente y puede diferenciarse de causas naturales como la irradiación, las erupciones volcánicas o la misma variabilidad interna del clima.

Para entenderlo se tienen que tener en cuenta los factores que determinan la temperatura terrestre. La energía solar es el motor climático del planeta. Cuando las radiaciones llegan a la atmósfera, una pequeña parte de ellas se refleja y se pierde en el espacio; el resto llega a la superficie terrestre que, a su vez, absorbe una parte y refleja el resto, pero con una diferencia, las radiaciones han cambiado sus características físicas al entrar en la atmósfera y aunque han penetrado sin dificultad ya no se les permite salir y son absorbidas. Este fenómeno, conocido como efecto invernadero, es causado por los gases que componen la atmósfera. El vapor de agua, el dióxido de carbono, el metano, el óxido nitroso y otros gases de origen industrial son los principales responsables de la retención del calor.

El efecto invernadero en sí es un fenómeno natural y, además, imprescindible para mantener una temperatura relativamente alta y constante que permita la vida en el planeta. Pero, desde la Revolución industrial, la concentración de los gases que lo producen se ha disparado y no cesa de aumentar. Actividades humanas, en especial la quema de combustibles fósiles, la deforestación y determinadas

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prácticas agrícolas han convertido el dióxido de carbono en el principal gas de efecto invernadero, con un aumento del 31% desde 1750. Otros gases como los CFC (clorofluorocarbonos) ni siquiera existirían si no fuera por las actividades industriales.

La contribución porcentual de estas actividades en el cambio climático no está bien determinada, lo que sí se sabe con certeza es que la temperatura aumenta por su causa y que su influencia será mayor en el futuro.»

(Adaptado de www.lavanguardia.es)

2. Señala la respuesta correcta a las siguientes preguntas.(75 puntos)

2.1¿Cuáles son las causas del cambio climático según el texto? (25 puntos)

a. el hombre

b. causas naturales

c. ambas

2.2 ¿Fue siempre negativo el efecto invernadero? (25 puntos)

a. sí

b. no, porque antes permitía mantener una cierta temperatura

c. no, porque ahora es una vía de escape de la concentración de gases

2.3 ¿Cuáles son las causas del efecto invernadero? (25 puntos)

a. la concentración de gases

b. los combustibles fósiles y las prácticas agrícolas

c. las actividades industriales

3. Contesta a las siguientes cuestiones: (125 puntos)

3.1 ¿Cuáles son los factores que determinan la temperatura terrestre? (25 puntos)

3.2 ¿Cuál es el principal motor climático del planeta? (25 puntos)

3.3 ¿Cuáles son los gases que componen la atmósfera? (25 puntos)

3.4 ¿Para qué sirve el efecto invernadero? (25 puntos)

3.5 ¿Qué actividades humanas contribuyen para el aumento del efecto invernadero? (25 puntos)

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Grupo III – Producción escrita (200 puntos)

1. De estos dos temas elige uno:

A) Escribe un texto expositivo (150-220 palabras, aproximadamente) sobre el calentamiento global. El texto deberá tener introducción, desarrollo y conclusión. Debes hablar sobre los siguientes tópicos:

• Efecto invernadero• La mano del hombre en el efecto invernadero• Consecuencias del efecto invernadero• Posibles soluciones para el calentamiento global

B) Escribe una noticia para el periódico de tu escuela donde redactes una experiencia durante una catástrofe natural (sequía, riadas, erupción volcánica, huracán, tsunami, etc.). Debes tener en cuenta la construcción de la noticia, contestando a las preguntas ¿qué?, ¿dónde?, ¿cómo?, ¿cuándo?, ¿por qué?

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Anexo J – Ficha de leitura de Língua Portuguesa

Os Lusíadas de Luís de Camões - Guião de Trabalho

Batalha de Aljubarrota

(Canto IV, estrofes 28 à 45)

Lê, atentamente, este excerto (páginas 206 a 209 do manual), de forma a proceder à sua análise.

Deves responder às questões de maneira sucinta e recorrendo, sempre que possível, ao texto para justificares as tuas respostas.

1. A Batalha de Aljubarrota trava-se em 1385, pondo frente-a-frente os exércitos portugueses e castelhano.

1.1 Identifica o plano narrativo em que se integra este episódio bélico, justificando a tua resposta.

1.2 Que factos históricos estiveram na origem desta batalha?

1.3 Sintetiza o conteúdo deste episódio, resumindo as seguintes sequências narrativas:

- 1ª - introdução – estrofes 28 e 29

- 2ª - desenvolvimento – estrofes 30 à 41

- 3ª - conclusão – estrofes 42 à 45.

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2. Presta atenção às estrofes 28 e 29.

2.1 Que sinal anuncia o início da batalha?

2.2 Que efeitos produz esse sinal na Natureza e nas pessoas? Transcreve do texto expressões que indiquem esses efeitos.

2.3 Recorrendo ao texto, descreve o estado de espírito dos combatentes, momentos antes da contenda.

3. «Começa a travar-se a incerta guerra» (estrofe 30)

3.1 Indica os motivos que impelem ambas as partes à luta.

3.2 A quem se referem os pronomes «uns» e «outros»?

3.3 Identifica a figura histórica que aí se destaca.

3.3.1 Caracteriza-a, atendendo ao texto na sua globalidade.

4. Nas estrofes 31 e 32, o poeta fornece-nos algumas informações importantes sobre:

• A violência dos combates;• A superioridade numérica das tropas castelhanas;• O facto de alguns portugueses (irmãos de Nuno Álvares Pereira e

grande parte da alta nobreza) lutarem contra a própria Pátria. 4.1 Localiza-as.

4.2 Segundo a opinião do Poeta, o que é mais grave: lutar contra o irmão ou contra o rei e a Pátria?

5. Na estrofe 33, são referidos alguns traidores famosos. Qual a intenção do Poeta ao incluí-los neste episódio?

6. O valor e as ações de D. João, Mestre de Avis, assumem uma posição de destaque durante a batalha.

6.1 De que modo?

6.2 Com que intenção profere o seu discurso?

6.3 Quais as consequências imediatas de tais palavras e actos?

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7. As últimas três estrofes descrevem as diferentes reações/atitudes dos vencidos e vencedores.

7.1 Recorrendo ao texto, caracteriza o estado de espírito e os sentimentos das tropas castelhanas.

7.2 Relendo a estrofe 44, indica a consequência mais nefasta de qualquer batalha.

8. Completa o quadro que se segue:

Fig. estilo Exemplos Expressividade estrofes

Gradação 28

Hipérbole 28

Personificação 28

Perífrase 41

Sinédoque 41

9. Classifica as orações presentes nos versos que se seguem:

«Com torva vista os vê, mas a natura/Ferina e a ira não lhe compadecem» (estrofe 35)

Bom trabalho!

Venâncio Pedro

Anexo K – Ficha de leitura de Língua Portuguesa

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Tempestade

(Canto VI, estrofes 70 à 93)

Lê, atentamente, este excerto (páginas 228 a 232 do manual), de forma a responderes às perguntas com excertos do texto.

1. Retira do texto os versos que comprovam a chegada da tempestade e o tom de voz do mestre.

2. A tripulação fica apavorada e desnorteada. Retira do texto versos que exemplifiquem esse desnorte.

3. Retira do texto expressões que comprovem o efeito da tempestade nos navios.

4. A tempestade adquire um carácter divino. Retira do texto expressões que o comprovem.

5. Nos primeiros versos da estrofe 76 que recurso estilístico encontramos?

6. Vasco da Gama tem dificuldades em compreender o castigo da Divina Guarda. Retira do texto a expressão que corrobora esse sentimento.

7. Vasco da Gama não que perecer aos braços da Natureza porque acha que é uma morte pouco honrosa. Em que morte honrosa crê Vasco da Gama? Procura no texto.

8. Vénus decide ajudar os Portugueses. De que maneira? Exemplifica com expressões do texto.

9. Por fim, depois de a tempestade amainar, os Portugueses avistam pela primeira vez a Índia. De que maneira agradeceu Vasco da Gama?

Anexo L – ficha de leitura de língua Portuguesa

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Os Lusíadas de Luís de Camões - Guião de Trabalho

O Adamastor

(Canto V, estrofes 37 à 60)

Lê, atentamente, este excerto (páginas 217 a 221 do manual), de forma a proceder à sua análise.

Deves responder às questões de maneira sucinta e recorrendo, sempre que possível, ao texto para justificares as tuas respostas.

1. O excerto apresentado constitui o episódio do Gigante Adamastor, figura literária criada por Camões.

1.1 Delimita os momentos fundamentais da ação: introdução, desenvolvimento e conclusão.

1.2 Apresenta resumidamente o seu conteúdo.

2. Centra-te nas estrofes 39 e 40.

2.1 Caracteriza fisicamente o Adamastor.

2.2 Como reagiram os Portugueses à aparição do Adamastor?

2.2.1 Retira da estrofe 40 uma expressão comprovativa dos seus sentimentos.

3. Nas estrofes 41- 48, toma a palavra o Gigante Adamastor.

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3.1 Em que termos se dirigiu aos portugueses?

3.2 Qual é o seu parecer acerca da «Gente» que tem diante de si?

3.2.1 Retira do texto duas frases comprovativas.

3.3 Explica o sentido dos seguintes versos: «E navegar meus longos mares ousas, / Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,/ Nunca arados de estranho ou próprio lenho:»

3.3.1 Indica as figuras de estilo presentes nestes versos.

4. Ao longo do discurso, o Gigante expressa sentimentos antagónicos em relação aos Portugueses.

4.1 Prova a veracidade desta afirmação, justificando com elementos textuais.

5. A partir da estrofe 42, o Adamastor vaticina algumas profecias reveladoras de inquietantes acontecimentos.

5.1 Enumera-as.

6. O valor dos Portugueses é reconhecido por esta personagem mítica.

6.1 Retira do texto elementos comprovativos.

7. Entretanto, Vasco da Gama interrompe o Gigante para o questionar.

7.1 Que pergunta lhe faz?

7.2 Qual é a intenção do «Forte Capitão»?

7.3 Como reage o Adamastor?

7.3.1 Que sentimentos manifestou ao contar a sua história?

7.3.2 Transcreve os versos que sintetizam o seu infeliz destino.

8. Por fim, o Adamastor deixa passar os Portugueses.

8.1 De que forma é descrito este momento?

8.2 Como reage Vasco da Gama?

Bom trabalho!

Venâncio Pedro

Anexo M – ficha de avaliação de Língua Portuguesa

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Grupo I – Leitura (100%)

Parte A (40%)

1. Lê atentamente o texto:

«A ideia de realizar um poema heróico sobre a expansão portuguesa manifesta-se já desde o século XV, dentro e fora de Portugal. O humanista italiano Ângelo Policiano ofereceu-se a D. João II para cantar em verso latino os seus feitos, e Luís Vives exaltou os Descobrimentos numa dedicatória a D. João III. No prólogo do Cancioneiro Geral, Garcia de Resende lamenta que os feitos dos Portugueses não estejam condignamente cantados. António Ferreira, apesar da sua aversão – várias vezes manifesta – pela vida guerreira e marítima, encorajou mais de um confrade a escrever a epopeia, e ele mesmo ensaiou o estilo heróico […]. Este projecto dos Humanistas relaciona-se com a ambição de ressuscitar um dos mais nobres géneros greco-romanos. As viagens dos Portugueses prestavam-se a uma comparação emuladora com as de Ulisses, dos Argonautas e de Eneias, assim como os seus feitos guerreiros com os dos Gregos e Troianos. […]

Foi precisamente o desiderato da ressurreição da epopeia clássica segundo o padrão homérico que Camões procurou satisfazer, levando a cabo um objectivo característico dos escritores humanistas. O ambiente marítimo do assunto central aponta para a filiação do poema sobretudo na linhagem da Odisseia, da primeira metade da Eneida e dos poemas sobre os Argonautas escritos pelo grego Apolónio de Rodes e pelo romano Valério Flaco. […]

À ideia da epopeia pátria andava associada certa ideologia nascida da expansão, e cujas raízes encontrámos já em Zurara. Segundo essa ideologia, os Portugueses cumpriam uma missão providencial, dilatando tanto o Império como a Fé: eram os Cruzados por excelência.»

In ANTÓNIO JOSÉ SARAIVA E ÓSCAR LOPES, História da Literatura Portuguesa (com supressões)

2. As afirmações de (A) a (E) referem-se a afirmações do texto.Escreve a sequência de letras que corresponde à ordem pela qual essas informações aparecem no texto. (cada 8%)

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(A) Os Portugueses através da expansão marítima aumentaram o Império e espalharam a fé cristã.

(B) O Renascimento ressuscitou um dos mais nobres géneros greco-romanos.(C) A ideia de escrever uma epopeia clássica remonta ao século XV.(D) Os Descobrimentos portugueses eram comparados com os feitos alcançados

por Ulisses e Eneias.(E) Garcia de Resende no prólogo do Cancioneiro Geral lamenta que os feitos dos

Portugueses não sejam devidamente cantados.

Parte B (60%)

1. Lê atentamente o texto. Em caso de necessidade consulta o vocabulário apresentado.

37 Porém já cinco Sóis1 eram passados

Que dali2 nos partíramos, cortando

Os mares nunca de outrem navegados,

Prosperamente os ventos assoprando,

Quando hua noute, estando descuidados

Na cortadora proa vigiando,

Hua nuvem que os ares escurece,

Sobre nossas cabeças aparece.

38 Tão temerosa vinha e carregada,

Que pôs nos corações um grande medo;

Bramindo, o negro mar de longe brada,

Como se desse em vão nalgum rochedo.

«Ó Potestade (disse) sublimada!

Que ameaço divino ou que segredo

Este clima3 e este mar nos apresenta,

Que mor cousa parece que tormenta?»

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39 Não acabava, quando hua figura

Se nos mostra no ar, robusta e válida4

De disforme e grandíssima estatura;

O rosto carregado, a barba esquálida5,

Os olhos encovados, e a postura

Medonha e má e a cor terrena e pálida;

Cheios de terra e crespos os cabelos,

A boca negra, os dentes amarelos.

40 Tão grande era de membros, que bem posso

Certificar-te que este era o segundo

De Rodes6 estranhíssimo Colosso,

Que um dos sete milagres foi do mundo.

Cum tom de voz nos fala, horrendo e grosso,

Que pareceu sair do mar profundo.

Arrepiam-se as carnes e o cabelo,

A mim e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!

41 E disse: «Ó gente ousada, mais que quantas

No mundo cometeram grandes cousas:

Tu, que por guerras cruas, tais e tantas,

E por trabalhos vãos nunca repousas,

Pois os vedados términos quebrantas7

E navegar meus longos mares ousas,

Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,

Nunca arados de estranho ou próprio lenho8;

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42 Pois vens ver os segredos escondidos

Da natureza e do húmido elemento9,

A nenhum grande humano concedidos

De nobre ou de imortal merecimento,

Ouve os danos de mi que apercebidos10

Estão a teu sobejo atrevimento,

Por todo o largo mar e pola terra

Que inda hás de sojugar com dura guerra.»

Luís de Camões, Os lusíadas, Canto V, 37- 42

1.dias; 2. baía de Santa Helena; 3. esta região; 4. vigorosa; 5. suja; 6. alusão à colossal estátua de Apolo na ilha de Rodes (uma das sete maravilhas do Mundo Antigo); 7. rompe os limites proibidos; 8. jamais navegados por nenhum barco; 9 mar; 10. preparados.

2. As estrofes 37 e 38 têm a função de anunciar o aparecimento do Gigante Adamastor. (10%)

2.1 Identifica o fenómeno atmosférico descrito. (3%)2.2 Caracteriza o estado de espírito dos marinheiros, antes e depois da

manifestação desse fenómeno. Justifica com expressões textuais. (7%)

3. As estrofes 39 e 40 apresentam a caracterização do Gigante.(5%)3.1 Transcreve do texto os nomes e os adjetivos utilizados no retrato físico. (5%)

4. A estância 40 refere a reação dos marinheiros ao escutarem a voz do Adamastor (5%)4.1 Transcreve os versos que a indicam. (5%)

5. As estrofes 41 e 42 apresentam o discurso do Gigante. (30%)5.1 Identifica o seu destinatário. (4%)5.2 Retira do texto as expressões e/ou frases que caracterizam esse destinatário.

(6%)5.3 Qual a opinião do Adamastor relativamente aos Portugueses? (10%)5.4 Os dois últimos versos do excerto remetem para o futuro. Porquê? (10%)

6. O narrador deste texto é também a personagem que enfrenta o Gigante e dialoga com ele. (10%)

6.1 Identifica o narrador e classifica-o quanto à sua participação na ação.(5%)6.2 Refere os sentimentos revelados por este narrador na fala em que se dirige ao

Gigante (est. 38). (5%)

98

Grupo II – Expressão Escrita (100%)

1. Lê as estrofes 134 e 135 do Canto III de Os Lusíadas, a seguir transcritas, e responde, de forma completa e bem estruturada. Em caso de necessidade, consulta o vocabulário apresentado.

Assi como a bonina1, que cortada

Antes do tempo foi, cândida2 e bela,

Sendo das mãos lacivas3 maltratada

Da minina que a trouxe na capela4,

O cheiro traz perdido e a cor murchada:

Tal está, morta, a pálida donzela,

Secas do rosto as rosas e perdida

A branca e viva cor, co a doce vida.

As filhas do Mondego a morte escura

Longo tempo chorando memoraram,

E, por memória eterna, em fonte pura

As lágrimas choradas transformaram.

O nome lhe puseram, que inda dura,

Dos amores de Inês, que ali passaram.

Vede que fresca fonte rega as flores,

Que lágrimas são a e o nome Amores!

Luís de Camões, Os Lusíadas, edição de A.J. da Costa Pimpão, 5ª ed., Lisboa, MNE – IC, 2003

Vocabulário: 1. flor do campo; 2. branca; pura; 3. lascivas; traquinas; 4. coroa de flores; grinalda.

2. Escreve um texto expositivo, com um mínimo de 70 palavras e um máximo de 120 palavras, no qual explicites o conteúdo das estrofes 134 e 135.

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O teu texto deve incluir uma parte introdutória, uma parte de desenvolvimento e uma parte de conclusão.

Organiza a informação da forma que considerares mais pertinente, tratando os tópicos apresentados a seguir.

• Identificação do episódio a que pertencem as estrofes.

• Explicitação dos dois elementos que são comparados na primeira estrofe e referência a duas características comuns a ambos.

• Indicação da reação das «filhas do Mondego» (verso 9) à situação descrita.

• Referência à origem da «fresca fonte» (verso 15).

• Explicação do nome atribuído à fonte referida na segunda estrofe.

100

Anexo N – ficheiros digitais

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