MPES PROBIDADE ADMINISTRATIVA TOCANTE A OBRAS/SERVIÇOS DE ENGENHARIA.
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E
DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
A IMPORTÂNCIA DA INTERVENÇÃO
PSICOPEDAGÓGICA PARA DIMINUIÇÃO DO
FRACASSO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO PRÉ-
ESCOLAR
Por: Eunice dos Santos Rocha
Orientadora
Profª. Diva Nereida
Rio de Janeiro
Setembro/2003
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
Projeto “a vez do mestre”
A IMPORTÂNCIA DA INTERVENÇÃO
PSICOPEDAGÓGICA PARA DIMINUIÇÃO DO
FRACASSO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO PRÉ-
ESCOLAR
Apresentação de monografia ao
Conjunto Universitário Cândido Mendes
como condição prévia para a conclusão
do Curso de Pós-Graduação em
Psicopedagogia.
Por Eunice dos Santos Rocha
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AGRADECIMENTOS
A Deus, pois sem Ele nada é possível.
Aos meus pais que sempre foram essenciais para o meu crescimento pessoal e profissional.
À minha filha que por muitas vezes foi sacrificada em função dos meus horários.
À minha irmã, porque sem a sua força eu não conseguiria concluir este curso e, finalmente, ao meu marido que sempre foi um incentivador.
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos
professores do projeto “A Vez do
Mestre” e todas as pessoas que,
de alguma forma, contribuíram
para sua construção.
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RESUMO
A intervenção psicopedagógica tem sido muito aplicada nos
dias de hoje nas instituições educacionais, a fim de solucionar problemas
dos alunos no âmbito da aprendizagem, das relações ou em ambos.
Portanto, baseado nas visões de alguns autores como Isabel
Solé, Piaget, Freud, Vigotsky e outros, verificaremos nesse trabalho a
importância da intervenção psicopedagógica nas instituições de educação.
“Tolerar a existência do outro e
permitir que ele seja diferente ainda é
muito pouco. Quando se tolera, apenas se
concede e essa não é uma relação de
igualdade, mas de superioridade de um
sobre o outro. Deveríamos criar uma
relação entre as pessoas da qual
estivessem excluídas a tolerância e a
intolerância.”
José Saramago
6
METODOLOGIA
No tocante aos meios de investigação, realizou-se uma
pesquisa recorrendo-se a publicações bibliográficas.
“A satisfação está no
esforço e não apenas na
realização final”
MAHATMA GHANDI
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SUMÁRIO
Títulos Pág.
Introdução 8 CAPÍTULO I
Fases do Desenvolvimento Mental das Crianças em Idade Pré-escolar 10
PIAGET 10 Alguns Conceitos Fundamentais 12 Hereditariedade 13 Adaptação 13 Esquema 15 Equilíbrio 17 Características Gerais dos Principais Períodos do Desenvolvimento 18
CAPÍTULO II FREUD 23
CAPÍTULO III A Importância da Educação Pré-escolar para o Desenvolvimento do Sujeito Cognoscente 31
Para Que Educar? 33 CAPÍTULO IV
Intervenções Psicopedagógicas 37 Conceito Geral 37 Principiais Queixas na Educação Pré-escolar 37 A Demanda Dos Pais 38 A Demanda Do Corpo Docente 38
CAPÍTULO V Possibilidades de Intervenção 40
CAPÍTULO VI Conclusão 43
8
INTRODUÇÃO
A educação recebida pelas crianças e jovens deve contribuir para
sua formação integral. Isso significa que se espera que o que é oferecido
durante essas etapas educacionais contribua para o desenvolvimento de
todas as capacidades construtivas do ser humano: do equilíbrio pessoal,
cognitivo-lingüísticas, motoras, de relação interpessoal e de inserção social,
sem que exista nenhuma justificativa para opor-se a alguma ou algumas
delas em benefício de outras. Para isso deve-se compreender o princípio
que concebe a educação como instrumento de coesão social e não de
exclusão – e, particularmente, a educação obrigatória, ao serviço de
formação de cidadãos e cidadãs capacitados para conviver
democraticamente – que se traduz, entre outras coisas, na adoção de um
mesmo modelo de currículo para a Educação Infantil e para as outras
etapas, assim como num conjunto de medidas em ralação aos profissionais
que a atendem – é um passo à frente que não deveria ser subestimado,
especialmente se levarmos em consideração que o cidadão comum e,
infelizmente, muitos profissionais do próprio sistema educacional, continuam
tendo uma imagem distorcida do que significa educar na Educação Infantil.
A Escola de Educação Infantil deve ser aberta e flexível e deve
aprofundar seu duplo caráter educacional e compensador. A oferta
educacional, para existir de verdade, deve adaptar-se às características e
necessidades de seus usuários; mas, ao mesmo tempo, hoje temos
evidência suficiente sobre as diferenças apresentadas– às vezes, devido a
condições pessoais mas, na maioria das vezes, por causa de fatores
familiares e sociais. Não se trata de cair na utopia e pensar que essas
desigualdades, que são freqüentes, provocadas por um sistema social,
serão compensadas pela escola; trata-se de se fazer com que esta não as
agrave e de que, na medida do possível, ofereça os recursos que algumas
crianças não encontram fora dela.
Um exemplo pode ser revelador: “Uma criança para quem os pais
costumam ler uma história antes de dormir terá assistido, somente entre
9seus dois e quatro anos, aproximadamente 700 experiências de contato com
o texto escrito (além de ter aprofundado a relação afetiva com seus
progenitores, de estar motivada pela leitura e de receber muitos outros
conhecimentos muito relevantes para a posterior aprendizagem da leitura e
da escrita). Um colega que não ouve histórias foi privado dessas 700
experiências. Apesar de a escola não poder proporcioná-las, poderá propor
ações em cujo ponto de partida esteja a consideração dessas diferenças e a
vontade de atenuá-las (por exemplo, estabelecendo o costume de leitura
diária de contos e outros textos para as crianças)”.
10
CAPÍTULO I
Fases do Desenvolvimento Mental da Criança em Idade Pré-escolar
1.1) Piaget
Piaget estudou o desenvolvimento do conhecimento da lógica,
espaço, tempo, casualidade, moralidade, brinquedo, linguagem e
matemática. Lidou com muitos processos psicológicos: pensamento,
percepção, imaginação, memória, imitação, ação. Piaget, conviveu com
crianças de todas as idades, submetendo-as às mais variadas formas de
estimulação e experimentação, mas não deixou de refletir sobre as bases
filosóficas do conhecimento.
A preocupação central de Piaget dirige-se à elaboração de uma teoria
do conhecimento, que possa explicar como o organismo conhece o mundo.
E esta colocação reflete sua forma inicial em Biologia, pois considera que só
o conhecimento possibilita ao homem um estado de equilíbrio interno que o
capacita a adaptar-se ao meio ambiente. Existe, para ele, uma realidade
externa ao sujeito do conhecimento, e é a presença desta realidade que
regula e corrige o desenvolvimento do conhecimento adaptativo. A função
do desenvolvimento não consiste em produzir cópias internalizadas da
realidade externa, mas sim, em produzir estruturas lógicas que permitam ao
indivíduo atuar sobre o mundo de formas cada vez mais flexíveis e
complexas.
Preocupa-se portanto, em saber quais os processos mentais
envolvidos numa dada situação de resolução de problemas e quais os
processos que ocorrem na criança para possibilitar aquele tipo de atuação.
Assim, sua obra é de epstemologia genética e mostra como o conhecimento
se desenvolve, desde as rudimentares estruturas mentais do recém-
nascidos até o pensamento lógico formal do adolescente. Procura entender
11como, e em função de que, estas estruturas iniciais se transformam, dando
lugar a outras cada vez mais complexas.
Estudou, o desenvolvimento dos vários processos cognitivos,
valorizando aos aspectos qualitativos e não quantitativos. Ao aplicar alguns
testes, Piaget interessou-se muito mais pelas respostas incorretas do que
pelas corretas, passando a uma busca de entendimento dos processos
mentais que a criança usara para chegar à emissão daquela resposta.
Portanto, não se contentou com a obtenção e registro das respostas
corretas, da solução adequada do problema, como faziam os demais
pesquisadores, mas, através de outras questões que colocava diante da
criança, procurou entender qual o processo de pensamento subjacente na
emissão daquela resposta.
A partir de seus primeiros contatos com os testes de inteligência e
tendo despertado sua curiosidade científica pra a pesquisa dos processos
cognitivos, passou a observar o desenvolvimento dos seus próprios filhos,
registrando suas reações desde os primeiros dias de vida. Em muitas obras
de Piaget são freqüentes as citações das reações de Jacqueline, Laurent e
Lucienne.
Piaget utilizou como técnica básica de pesquisa o método clínico, que
havia aprendido a aplicar na clínica de Bleuler e nos cursos práticos de
Sorbonne.
Esta opção, às vezes criticada por falha no controle experimental e
descrição incompleta (Baldwin, 1967), permitiu um aprofundamento no
conhecimento dos processos mentais das crianças. Uma de suas primeiras
constatações foi a de que o estudo do pensamento expresso apenas
verbalmente, isto é, através de perguntas feitas à criança, na ausência de
manipulações concretas às quais suas respostas pudessem referir-se –
pode fornecer somente um quadro incompleto da estrutura cognitiva e de
seu desenvolvimento. Só mais tarde quando estudou bebês e crianças em
idade escolar, é que percebeu a necessidade de fazer uma distinção entre a
lógica das ações, isto é, a lógica expressa no comportamento emitido, e a
lógica aplicada a afirmações verbais.
12Assim, através do contato contínuo e constante com um número cada
vez maior de crianças das várias faixas etárias e pesquisando diferentes
aspectos do funcionamento cognitivo, Piaget chegou à formulação de
inúmeros conceitos continuamente reavaliados em função de novos dados.
No Brasil, Piaget começou a ser conhecido na década de 60, e a
partir dessa época foi incluído o seu estudo no currículo dos cursos
universitários de Psicologia, Pedagogia etc. alguns autores tentaram, como
nos estados Unidos, uma apresentação mais didática de seus conceitos
básicos (Biággio, 1976).
No Brasil observamos que muitas escolas para crianças em idades
precoces (a partir dos 2 anos), denominadas escolas maternais ou jardins de
infância, ou mesmo escolas de 1º grau, passaram a utilizar o que
denominaram Método Piaget.
É preciso ficar bem claro que é possível, válida e recomendável uma
utilização dos conhecimentos trazidos à luz por Piaget a respeito das
estruturas mentais que se acham presentes em cada faixa etária e do modo
de funcionamento característico dessas estruturas em cada fase do
desenvolvimento. Mas, é perigoso tentar transpor esses conhecimentos para
um conteúdo programático sem um aprofundamento maior.
É necessário tanto um conhecimento profundo da nossa criança, nos
vários segmentos da população, como também um estudo árduo e
prolongado das propostas piagetianas para que possamos chegar a uma
utilização válida e proveitosa.
1.2) Alguns conceitos fundamentais.
Vamos então examinar alguns conceitos piagetianos que são
essenciais para a compreensão do processo de desenvolvimento da
inteligência.
13
1.3) Hereditariedade
O indivíduo herda uma série de estruturas biológicas (sensoriais e
neurológicas) que predispõem ao surgimento de certas estruturas mentais.
Herdamos um organismo que vai amadurecer em contato com o meio
ambiente. A isto chamamos estrutura biológica.
Ainda atentos ao aspecto biológico, podemos dizer que a maturação
do organismo (basicamente do sistema nervoso central) vai contribuir de
forma decisiva para que apareçam essas novas estruturas mentais que
proporcionam a possibilidade de adaptação cada vez melhor ao meio
ambiente.
Quando se fala em ambiente, é bom lembrar que este inclui tanto
aspectos físicos como sociais, de relacionamento humano, que tornam mais
difícil e complexo o processo de adaptação. Isto porque a criança vai
precisar desenvolver recursos intelectuais para solucionar uma ampla
variedade de situações para viver satisfatoriamente num determinado
ambiente social. Portanto, tanto o ambiente físico como social concorrem no
sentido de oferecer estímulos e situações que requerem um processo
cognitivo para resolução.
Fica claro que a riqueza ou a pobreza de estimulação tanto no plano
físico como no social vão interferir no processo de desenvolvimento da
inteligência.
Entenda-se, que, no caso da linguagem ou de outros aspectos que
dependem do desenvolvimento cognitivo, o sujeito herda a capacidade para
a aprendizagem e o desempenho. Mas a plena realização destas
capacidades depende das condições que o meio ambiente irá oferecer.
1.4) Adaptação
O ambiente físico e social coloca continuamente a criança diante de
questões que rompem o estado de equilíbrio do organismo e inicia a busca
de comportamentos mais adaptativos. No caso do funcionamento mental, as
14questões podem ser propostas pelo próprio sujeito do conhecimento.
Podemos dizer que o conhecimento possibilita novas formas de interação
com o ambiente, proporcionando uma adaptação cada vez mais completa e
eficiente e, neste sentido, é gratificante para o organismo, que se sente mais
apto a lidar com situações novas.
Pode-se dizer que as novas questões movimentam o organismo no
sentido de resolvê-las. Pára tanto vai se utilizar das estruturas mentais já
existentes ou elas serão modificadas a fim de se chegar a uma forma
adequada para se lidar com a nova situação. Assim, no processo global de
adaptação estariam implicados dois processos complementares: a
assimilação e a acomodação.
O processo de assimilação se refere à tentativa , feita pelo sujeito, de
solucionar uma determinada situação utilizando uma estrutura mental já
formada. Isto é, a nova situação, ou o novo elemento é incorporado e
assimilado a um sistema já pronto.
Em relação aos processos mentais., suponhamos que uma criança,
que aprendeu a andar de bicicleta, se depare com outro veículo que guarde
algumas semelhanças com o primeiro, porém contenha elementos novos
que a criança desconhece, como, por exemplo, diversas marchas. Nesta
situação a criança tentará agir com a Segunda bicicleta da mesma maneira
como fazia com a primeira, e não obterá sucesso. Estará usando um
processo de assimilação, isto é, de tentar solucionar a situação nova com
base nas estruturas antigas. Este processo não será eficiente, pois estas
estruturas são inadequadas e insuficientes para este novo elemento. O
sujeito tentará então novas maneiras de agir, levando agora em
consideração as propriedades específicas daquele objeto. Isto é, irá
modificar suas estruturas antigas para poder dominar uma nova situação. A
este processo de modificação de estruturas antigas com vista à solução de
um novo problema de ajustamento, a uma nova situação, Piaget denomina
acomodação. E no momento em que a criança conseguir dominar
adequadamente o segundo veículo, diremos que se acomodou a ele e,
portanto, adaptou-se a esta nova exigência da realidade.
15Vemos, pois que da mesma maneira como, biologicamente, o
organismo desenvolve maneiras de se adaptar à realidade e manter com ela
um estado de equilíbrio, mentalmente desenvolvemos processos com o
mesmo objetivo.
Os processos de assimilação e acomodação são complementares e
acham-se presentes durante toda a vida do indivíduo e permitem um estado
de adaptação possibilitando um crescimento, um desenvolvimento pessoal,
na medida em que o sujeito adquire uma competência e uma flexibilidade
cada vez maiores para lidar com as situações da vida prática.
1.5) Esquema
Ao nascer, as crianças não são dotadas de capacidades mentais
prontas, mas apenas alguns reflexos, como chupar e agarrar, além das
tendências inatas a exercitá-los e a organizar suas ações. Herdam, portanto,
não uma inteligência organizada, mas alguns elementos (a estrutura
biológica, neurológica) que determinam seu modo de reagir ao ambiente,
que é, no início da vida, absolutamente caótico para a criança. Assim, de
acordo com Piaget, a partir de um equipamento biológico hereditário, a
criança irá formar estruturas mentais com a finalidade de organizar este caos
de sensações e estados internos desconhecidos. Quero me referir ao
conceito de esquema, uma unidade estrutural básica de pensamento ou de
ação e que corresponde, de certa maneira, à estrutura biológica que muda e
se adapta.
No aspecto orgânico, sabemos que o nosso corpo é formado de
várias estruturas unitárias (células, por exemplo) que se organizam em
elementos maiores (órgãos) ou em sistemas de funcionamento (aparelhos).
No aspecto mental, poderíamos dizer que a nossa estrutura unitária básica é
o esquema, que pode ser simples (como, por exemplo, uma resposta
específica a um estímulo – sugar o dedo quando este encosta nos lábios) ou
complexo (como o esquema que temos das pessoas – de nossa mãe, por
exemplo, ou ainda a maneira como solucionamos problemas matemáticos
ou científicos).
16Pode-se conceituar um esquema , conforme disse Flavell (1975):
“Sendo uma estrutura cognitiva, um esquema é uma forma mais ou menos
fluida de uma organização mais ou menos plástica, ]à qual as ações e os
objetos são assimilados durante o funcionamento cognitivo”.
Vemos então que o esquema constitui a unidade estrutural da mente
e que, da mesma forma como as unidades estruturais biológicas, não é um
elemento estático, porém, dinâmico e variado em seu conteúdo. Os
esquemas são unidades estruturais móveis que se modificam e adaptam,
enriquecendo com isso, tanto o repertório comportamental como a vida
mental do indivíduo.
Vejamos um exemplo que ilustre a maleabilidade dos esquemas. A
criança, em contato com sua mãe, irá formar um esquema de mãe. Este
esquema incluirá tanto a figura física da mãe como os sentimentos que a
criança tem em relação a ela, as vivências que tiveram em comum etc. à
medida em que a criança vai crescendo, este esquema irá se modificando e
ampliando não apenas no sentido de incluir novas vivências que a criança
tenha com a própria mãe (que seria um aspecto mais quantitativo, de
acréscimo de elementos), mas também de incluir outras mães, até chegar ao
conceito abstrato que nós adultos temos de mãe(mudanças também
qualitativas, que modificam a própria estrutura do esquema inicial, mais
simples e mais primitiva).
Os esquemas, portanto, estão em contínuo desenvolvimento e este
desenvolvimento se dá no sentido de permitir ao indivíduo uma adaptação
mais complexa a uma realidade que é percebida por ele, de forma cada vez
mais diferenciada e abrangente, exigindo, portanto, formas de
comportamento e de pensamento mais evoluídas.
Nesta evolução, que constitui a essência do crescimento mental, os
esquemas iniciais primitivos e sensório-motores se ampliam, se fundem, se
diferenciam, interiorizam-se e adquirem a organização que caracteriza os
sistema operacionais concretos (colocar varinhas de madeira por ordem
crescente de tamanho) ou abstratos (compreensão do sistema numérico ou
de teorias científicas).
171.6) Equilíbrio
Sabe-se que o organismo funciona de modo a atingir e procurar
manter um estado de equilíbrio interno que permita a sobrevivência num
determinado meio ambiente. Para isto, os vários elementos orgânicos se
organizam em sistemas maiores ou menores, mais simples ou mais
complexos, de forma a obter tanto um desenvolvimento como um
funcionamento harmônico de todas as partes. Se um dos elementos de um
sistema entra em desacordo com os demais, ocorre um processo qualquer
no organismo, que vai retornar ao estado anterior de equilíbrio. Exemplo: ao
sentir fome, o indivíduo buscará uma forma de obtenção e ingestão de
alimentos que permita sanar esta deficiência orgânica e, quando o fizer,
retornará a um estado de equilíbrio.
Pode-se dizer que um processo semelhante está presente na
organização mental do indivíduo, processo este denominado equilibração
das estruturas cognitivas ou apenas equilíbrio. Em linguagem simples não
passariam de um processo de organização das estruturas cognitivas num
sistema coerente, independente, que possibilita ao indivíduo um tipo ou
outro de adaptação à realidade. Exemplo: voltamos à situação do recém-
nascido ou do bebê de poucos meses de vida e analisemos sua situação
diante da realidade. A criança está recebendo continuamente uma série de
impressões sensoriais desprovida de qualquer significado para ela. Está,
portanto, em completo desequilíbrio com esta realidade, dependendo
totalmente da interferência de outras pessoas para sobreviver. A tarefa
principal do crescimento mental do primeiro ano de vida consistirá em
organizar estas impressões sensoriais de alguma maneira que permita à
criança atuar de modo coerente sobre a realidade. Isto se conseguirá à
medida em que se forme seus primeiros esquemas, que Piaget denomina
esquemas sensoriais-motores, justamente porque sua firmação dependerá
das impressões sensoriais que a criança receber dos objetos e de sua
possibilidade de manipulação, de exploração motora.
Assim, a primeira forma de equilíbrio que a criança irá adquirir
consiste, justamente, na formação de uma série de esquemas sensoriais-
18motores que lhe permitirão organizar aquele caos inicial de sensações
internas e externas, dando-lhe condições de atuar sobre a realidade.
O desenvolvimento é um processo de equilibração sucessivo, em
cada fase do desenvolvimento a criança consegue uma determinada
organização mental que lhe permite lidar com o ambiente.
1.7) Características gerais dos principais
períodos de desenvolvimento
Piaget observou que existem formas diferentes de interagir com o
ambiente nas diversas faixas etárias. A estas maneiras típicas de agir e
pensar, Piaget denominou estágio ou período. Pode-se então dizer, que a
determinadas faixas etárias correspondem determinados tipos de aquisições
mentais e de organização destas aquisições que condicionam a atuação da
criança em seu ambiente. A criança irá, pois, à medida que amadurece física
e psicologicamente, que é estimulada pelo o ambiente físico e social,
construindo sua inteligência.
Pode-se dizer então que, cada fase corresponde a determinadas
características que são modificadas em função da melhor organização. Cada
estágio constitui uma forma particular de equilíbrio, efetuando-se a evolução
mental no sentido de uma equilibração sempre mais completa e de uma
interiorização progressiva.
O desenvolvimento se inicia a partir do equipamento inicial (reflexos
inatos) que vão gradualmente (no primeiro ano de vida) se transformando
em esquemas sensoriais motores rudimentares. Estes esquemas incluem
ações motoras explícitas, sendo, portanto, uma forma de inteligência
exteriorizada, que irá se modificar, ao longo do tempo, no sentido de uma
interiorização gradual, caminhará para um desligamento progressivo da ação
e da formação de esquemas conceituais que supõem uma ação mental.
Período sensório-motor (0-24 meses)
Representa a conquista, através da percepção e dos movimentos, de
todo o universo prático que cerca a criança. Isto é, a formação dos
19esquemas sensoriais-motores irá permitir ao bebê a organização inicial dos
estímulos ambientais permitindo que, ao final do período, ele tenha
condições de lidar, embora de modo rudimentar, com a maioria das
situações que lhe são apresentadas.
A consciência começa por um egocentrismo inconsciente e integral, até que
os progressos da inteligência sensório-motora levem à construção de um
universo objetivo, onde o próprio corpo aparece como elemento entre os
outros, e, ao qual se opõe a vida interior, localizada neste corpo” (Piaget,
1964, p. 19).
Uma das funções da inteligência será, nesta fase, a diferenciação
entre os objetos externos e o próprio corpo.
O período de bebê é sem dúvida bastante complexo do ponto de vista
do desenvolvimento, pois nele irá ocorrer a organização psicológica básica
em todos os aspectos (perceptivo, motor, intelectual, afetivo, social). Do
ponto de vista do autoconhecimento, o bebê irá explorar seu próprio corpo,
conhecer os seus vários componentes, sentir emoções, estimular o ambiente
social e ser por ele estimulado, e assim irá desenvolver a base do seu
autoconceito. Este autoconceito estará alicerçado no esquema corporal, isto
é, na idéia que a criança forma do seu próprio corpo.
Ao final do período, embora a criança permaneça bastante
egocêntrica, autocentralizada em seu entendimento da realidade, já terá
realizado uma boa caminhada no sentido de conhecimento e adaptação à
realidade, embora permaneça bastante limitada em suas possibilidades
intelectuais. Terá conseguido atingir uma forma de equilíbrio, isto é, terá
desenvolvido recursos pessoais para resolver uma série de situações
através de uma inteligência explícita, ou sensório-motora.
Período pré-operacional (2-7 anos)
Ao se aproximar dos 24 meses a criança estará desenvolvendo
ativamente a linguagem o que lhe dará possibilidade de, além de se utilizar
da inteligência prática decorrente dos esquemas sensoriais-motores
formados na fase anterior, iniciar a capacidade de representar uma coisa por
20outra, ou seja, formar esquemas simbólicos. Isto será conseguido tanto a
partir do uso de um objeto como se fosse outro (quando por exemplo, uma
caixa de fósforos pode se transformar num carrinho para brincar), de uma
situação por outra (na brincadeira de casinha a criança estará representando
situações da vida diária) ou ainda de um objeto, pessoa ou situação por
palavra.
O alcance do pensamento irá aumentar, mas lenta e gradualmente, e
assim a criança continuará bastante egocêntrica e presa às ações.
Egocêntrica, pois devido à ausência de esquemas conceituais e de lógica, o
pensamento será caracterizado por uma tendência lúdica, por uma mistura
de realidade com fantasia, o que determinará uma percepção muito
distorcida da realidade. E esta distorção se dará justamente em função
destas limitações.
Portanto então, uma criança que a nível comportamental atuará de
modo lógico e coerente (em função dos esquemas sensoriais-motores
adquiridos na fase anterior) e que a nível de entendimento da realidade
estará desequilibrada (em função da ausência de esquemas conceituais).
. Assim, por exemplo, “se fizermos duas fileiras de fichas,
emparelhadas uma a uma e perguntarmos a uma criança de cinco anos se
as fileiras são iguais (isto é, se têm a mesma quantidade de fichas), ela
provavelmente responderá que sim. Se mantivermos as posições na
primeira fileira e deslocarmos uma das fichas da Segunda fila e fizermos a
mesma pergunta, possivelmente a criança responderá que a Segunda fileira
tem maior quantidade de fichas.
O mesmo ocorrerá em relação à conservação do volume, massa e
peso. Em relação à conservação do volume, se despejarmos, na frente da
criança, uma certa quantidade de água de um copo baixo e largo para um
copo alto e fino ela não perceberá que a quantidade de água não foi
1ª situação 2ª situação
21alterada. Isto porque em função da ausência de esquemas conceituais e da
noção de conservação ou invariância a criança julgará pelo que vê. E no
caso do copo alto e fino, o nível de água será mais alto.
Em relação à conservação de massa, se fizermos duas bolinhas com
massa de modelar, e uma delas for transformada em salsicha, a nossa
criança pré-operacional não entenderá que não houve mudança de
quantidade e de massa.
Para verificar a presença ou ausência de noção de conservação de
peso, podemos utilizar novamente a massinha de modelar. Fazemos duas
bolas iguais e pedimos à criança que avalie se o peso é igual para as duas.
Se a criança disser que sim, transformamos uma das bolas em bife e
repetimos a pergunta. A criança responderá que uma delas pesa mais”.
Além destas provas clássicas, Piaget realizou inúmeras outras que
demonstraram empiricamente a ausência do pensamento conceitual e das
noções de conservação e invariância da criança em idade pré-escolar. Como
1ª situação 2ª situação
1ª situação 2ª situação
1ª situação 2ª situação
22estas são premissas básicas para a realização das operações mentais o
período foi denominado pré-operacional.
O que se verifica é que estas provas têm sido repetidas por
pesquisadores, psicólogos e professores em vários locais do mundo e os
resultados têm confirmado aqueles obtidos por Piaget na Suíça. O que varia
algumas vezes é a idade em que os conceitos são adquiridos pelas crianças
e esta variação (que não é muito grande) pode ser explicada por uma
estimulação social e educacional mais rica e mais adequada.
Quanto ao aspecto social, vemos como característica marcante desta
fase, o início do desligamento da família em direção a uma sociedade de
crianças. Isto é, se quando bebê o contato social se restringia às pessoas da
família e algumas outras, na fase pré-escolar a criança começará a se
interessar por outras de sua mesma idade. No que se refere à linguagem, o
que se nota é a presença concomitante de linguagem socializada (um
diálogo verdadeiro, com intenção de comunicação) e de linguagem
egocêntrica (aquela que não necessita necessariamente de um interlocutor,
não tem função de comunicação). O que se pode observar é que quanto
menor a criança, maior a porcentagem de ]linguagem egocêntrica em
relação à linguagem socializada. À medida que ela vai crescendo a evolução
da linguagem se dá no sentido de uma maior socialização, mostrando mais
uma vez que toda tendência do desenvolvimento em, seus vários aspectos
se dá no sentido da interiorização e da socialização. Isto porque para Piaget,
a linguagem socializada é aquela que pode ser compreendida pelas outras
pessoas de uma mesma cultura. E para ele todo pensamento adulto é
socializado, no sentido de ser construído de tal forma, que se for verbalizado
será compreendido pelo interlocutor.
23
CAPÍTULO II 2.1) Freud
Sobre o tema aprendizagem, especificamente, não vamos encontrar
nenhum texto escrito por Freud. Suas preocupações eram
predominantemente as de um clínico interessado em livrar as pessoas do
peso das neuroses (embora ele tenha descoberto depois que se pode, no
máximo, livrar alguém de seus sintomas e que, no caso das aneuroses,
pode-se apenas atenuá-las!).
No entanto, Freud, por sua própria posição frente ao conhecimento,
gostava de pensar nos determinantes psíquicos que levam alguém a ser um
“desejante” de saber. Nessa categoria incluem-se os cientistas, que devotam
a vida à pergunta por quê, e as crianças , que, a partir de um determinado
momento, bombardeiam os pais com por quês.
Abordar esse tema a partir de uma perspectiva freudiana é, antes de
mais nada, buscar resposta para a seguinte pergunta: o que se busca
quando se quer aprender algo? Só a partir dela pode-se refletir sobre o que
é o processo de aprendizagem, pois o processo depende da razão que
motiva a busca do conhecimento.
Por que a criança pergunta tanto?
A criança pergunta por que chove, por que existem noite e dia, por
que... e todo o resto, responde Freud, está na verdade interessada em dois
porquês fundamentais: por que nascemos e por que morremos, ou, dito do
modo clássico, de onde viemos e para onde vamos.
Vamos acompanhar com Freud a gênese dessas preocupações em
uma criança.
Há, para , um momento capital e decisivo na vida de todo ser
humano: o momento da descoberta daquilo que ele chama de diferença
sexual anatômica. Se, até então, os meninos e meninas acreditavam que
todos os seres humanos eram ou deviam ser providos de pênis, a partir
24desse momento “descobrem” que o mundo se divide em homens e
mulheres, em seres com pênis e seres sem pênis.
Sejamos mais precisos. Essa descoberta não é propriamente uma
descoberta, já que meninos e meninas terão oportunidade, antes dela, de
observar que são diferentes. A diferença está na interpretação dada a esse
fato. Meninos poderiam pensar, por exemplo, que se as meninas não são
iguais a eles, podem vir a sê-lo, quando crescerem. Mas a descoberta
implica entender que, de fato, alguma coisa falta.
No entanto, o que angustia não é a constatação de que algo falta às
mulheres, e pode vir a faltar aos homens. A angústia provém de uma nova
compreensão de antigas perdas à luz desse novo sentimento de perda. “aqui
perdi, e sei agora que também perdi o seio, as fezes...” poderia ser o
“pensamento” inconsciente de uma criança que está fazendo a descoberta
da diferença sexual anatômica.
A essa angústia das perdas Freud chamou de angústia de
castração.
Freud achava, de início, que a pergunta pelas origens era detonada
depois que um irmão nascia, e isso quando a criança já tinha mais ou menos
dois anos (antes, tal conhecimento não tinha esse poder detonador). É claro
que as coisas não são assim tão simples; se assim fosse, os filhos únicos
jamais atravessariam a angústia de castração. Freud mesmo percebeu isso
e buscou determinantes mais estruturais para isso que, a princípio, ele
apenas observou. Essa busca dos determinantes mais estruturais levou-o
justamente a desenvolver melhor um dos aspectos mais importantes de sua
teoria: o complexo de Édipo. Pode-se dizer que a descoberta da diferença
sexual anatômica da criança não depende de sua observação, mas da
passagem pelo complexo de Édipo; e o Édipo é, o processo através do qual
uma menina se “define” como mulher e o menino como homem (ou vice-
versa), depois de terem extraído das relações com o pai e a mãe as
referências necessárias a essa definição.
A criança descobre diferenças que a angustiam. É essa angústia que
a faz querer saber. Só que a abordagem direta é difícil, justamente porque
envolve angústia. Os instrumentos de que a criança pode dispor são o que
25Freud chamou de “investigações sexuais infantis”. Essas investigações são
sexuais, mas não claramente sexuais. Em um relato de Melanie Klein, pode-
se destacar um exemplo dessa afirmação.
“Um menino de mais ou menos 5 anos pergunta à mãe se Deus
existe, ao que ela, depois de algumas evasivas, responde “não”. pergunta
depois ao pai, que afirma acreditar em Deus. Mais tarde, andando na rua
com a irmã, ela lhe diz que precisa perguntar as horas a um passante. Então
o menino lhe diz: vai perguntar a um homem ou a uma mulher?. Ora, replica
a irmã, “tanto faz”. E ele “se perguntar a um homem, terá uma resposta, se
perguntar a uma mulher terá outra!”.
Mais do que sobre a existência de Deus, esse menino extraiu
informações sobre aquilo que ele supõe ser representativo das posições
feminina e masculina, e saiu pela rua (literalmente) aplicando esse novo
conhecimento: homens pensam diferente de mulheres (provavelmente,
“pensará” ele, porque têm pênis!).
Para Freud as primeiras investigações serão sempre sexuais e não
podem deixar de sê-lo;: o que está em jogo é a necessidade que tem a
criança de definir, antes de mais nada, seu lugar no mundo. Esse lugar é, a
princípio, um lugar sexual.
E o que tem isso a ver com a pergunta “de onde viemos, para onde
vamos”?
Acontece que esse lugar sexual é situado, a princípio, em relação aos
pais. Mais do que isso, os pais esperam que ele seja. Em relação ao desejo
dos pais. O “de onde viemos” eqüivale a “qual é a minha origem em relação
ao desejo de vocês?, por que me puseram no mundo, para atender a quais
expectativas e esperando que eu me torne o quê?” (para onde vamos?). de
novo, Édipo está presente.
Assim, as perguntas sobre a origem das coisas estariam na base das
investigações sexuais infantis.
A criança que vai à escola para aprender a ler e escrever não parece
ter nenhuma dessas preocupações.
26Até esse momento – da entrada na escola -, mais ou menos aos sete
anos, algumas coisas poderão ter acontecido com as investigações sexuais
infantis.
O que se espera é que, ao final da época do conflito edipiano, a
investigação sexual caia sob o domínio da repressão. Toda? Não. parte dela
“sublima-se” em “pulsão” de saber associada a “pulsão de domínio” e a
“pulsão de ver”. Palavras de Freud. Enigmáticas, não? e até mesmo, pode-
se dizer, controvertidas. Sem cair em discussões acadêmicas a respeito da
validade conceitual de termos como pulsão de domínio, por exemplo, pode-
se, contudo, extrair daí o mais importante: o desejo de saber associa-se
com o dominar, o ver e o sublimar.
Vamos por partes: sublimar. As investigações sexuais são
reprimidas. A Educação não é a maior responsável por isso. As crianças
deixam de lado a questão sexual por uma necessidade própria. Não porque
lhes dizem que é “feio”, mas por que precisam renunciar a um saber sobre a
sexualidade e porque não podem mais saber sobre a sexualidade, procedem
(não de modo consciente, é claro) a um deslocamento dos interesses
sexuais para os não-sexuais. Desviam, por assim dizer a energia aí
concentrada para objetos não-sexuais Perguntam então sobre ostras coisas
para poder continuar pensando sobre as questões fundamentais.
Freud diz ainda que essa investigação sexual sublimada se associa
com algo que ele chamou, inicialmente, de pulsão de domínio. A princípio
pensava existir em todo ser humano essa pulsão, que, submetida às leis da
constituição do ser humano, se transmudaria em sadismo e agressividade.
Retenha-se o essencial. Saber associar-se com dominar. Encontra-se um
bom exemplo no poema “A mosca azul”, de Machado de Assis.
Um homem fica alucinado com o que vê nas asas de uma mosca.
Para saber o que há lá dentro, disseca-a e a destrói. Do mesmo modo, uma
criança que passa seu tempo caçando bichinhos, cortando-os em pedaços,
pode correr o risco de ser classificada como sádica e agressiva, quando, na
verdade, não está exercendo sua “pulsão de domínio”. Tudo isso se associa
com a idéia de curiosidade. E é importante que o educador esteja ciente
dessa dimensão, presente em todo ato de conhecimento: a dimensão da
27curiosidade “sádica” propiciada pela pulsão de domínio. Não se quer dizer
com isso que se deva aplaudir toda tentativa infantil de sair por aí
decepando bichos. O que se pretende destacar é que o modo de lidar com
isso depende da compreensão que se tenha desses atos.
Para satisfazer aos educadores animados com uma pulsão de saber
mais “intensa”, pode-se ir um pouquinho mais longe no desenvolvimento
teórico da pulsão de domínio. Veja-se novamente “A mosca azul”. Na ânsia
de saber, a personagem destrói, mata, a mosca.
Freud não ficou indiferente a essa dimensão da pulsão de domínio e
localizou aí a ação da pulsão de morte. Para nós, há um susto considerável
quando se percebe a presença da morte em algo sempre tão identificado
com a vida, como é a noção de saber, de conhecimento.
É claro que, diante da manifestação dessa “face mortal” do saber na
conduta investigadora de uma criança, a tendência é negá-la e reprimi-la.
Naturalmente, se é só essa face mortal que uma determinada criança revela,
algo certamente não vai bem, mas, em geral, a pulsão de morte não se
encontra nunca em estado “puro”, apresentando-se antes em combinações
com outras.
Ao descrever o processo de emergência do desejo de saber, foi dito
também que a investigação sexual, agora sublimada, relaciona-se,
igualmente, com o ver.
O visual não é um elemento acessório ou secundário nas esferas das
pulsões sexuais. Ao contrário, é um aspecto constante e constitutivo delas,
como afirmou Mezen numa conferência sobre o olhar, realizada em 1987.
Muito tem sido dito sobre as pulsões oral, anal e fálica, mas, embora menos
conceituada, a pulsão visual tem em relação a elas o mesmo estatuto. Na
constituição da sexualidade, um elemento central estudado por Freud é a
fantasia da cena primária, ou cena de relação sexual entre os pais, na qual
essa relação sexual “é objeto de uma visão pela qual o sujeito imagina (põe
em imagens) a sua origem”. É através dessa fantasia, uma das três
universais, que o sujeito representa não somente sua origem mas também
se imagina personagem, através da identificação com uma das personagens
em cena. O objeto dessa pulsão é, então, essa cena primária imaginada.
28Mas já se disse que essa pulsão, sublimada, transforma-se, após a
associação com a pulsão de domínio, em “pulsão de saber” . transforma-se
em curiosidade agora dirigida, porque sublimada, a objeto geral. “São seus
derivados o prazer de pesquisar, o interesse pela observação da natureza, o
gosto pela leitura, o prazer de viajar (ver coisas diferentes e novas) etc.
O importante a ser ressaltado é a filiação da curiosidade intelectual à
curiosidade sexual, à imagem fantasiada da cena primária. Não é preciso ir
muito longe para estabelecer essa filiação. Basta lembrar o termo bíblico
para designar que houve uma relação sexual: Adão conheceu Eva...
Pode-se dizer, então, que, para Freud, a mola propulsora do
desenvolvimento intelectual é sexual. Melhor dizendo, a matéria de que se
alimenta a inteligência em seu trabalho investigativo é sexual. Ou, nas
palavras de O. Manonni, são restos da sexualidade, na medida em que se
trata da sublimação de parte da pulsão sexual visual. A inteligência emerge
a partir de um apoio sobre “restos sexuais”. É nesse ponto que se situa uma
diferença radical da teoria psicanalítica em relação a qualquer teoria
cognitiva sobre o desenvolvimento da inteligência, incluindo a de Piaget.
A criança quer aprender, contudo, ela não aprende sozinha. È
preciso que haja um professor para que esse aprendizado se realize. Ora,
nem sempre esse encontro é feliz. Então, a pergunta “O que é aprender?”
supõe, para a Psicanálise, a presença de um professor, colocado numa
determinada posição, que pode ou não propiciar a aprendizagem.
O ato de aprender sempre pressupõe uma relação com outra pessoa,
a que ensina. Não há ensino sem professor. Até mesmo o autodidatismo
(visto pela psicanálise como um sintoma)supõe a figura imaginada de
alguém que está transmitindo, através de um livro, por exemplo, aquele
saber. E no caso de não haver sequer um livro ensinando, o aprender como
descoberta aparentemente espontâneo supõe um diálogo interior entre o
aprendiz e alguma figura qualquer, imaginada por ele, que possa servir de
suporte para esse diálogo.
Por isso, a pergunta “O que é aprender?” envolve relação professor-
aluno. Aprender é aprender com alguém.
29Vamos nos concentrar agora nesse com, nesse espaço entre
professor e aluno, deixando completamente de lado os conteúdos que
transitam do professor para o aluno e, eventualmente, do aluno para o
professor. Pouco importa agora que esse professor esteja ensinando, por
exemplo, o Descobrimento do Brasil, mesmo porque esses conteúdos não
têm nenhum valor de verdade. As gerações de brasileiros hoje com 40 anos
ou mais aprenderam que o Brasil foi descoberto “por acaso”, em razão de
uma calmaria que teria desviado a frota de Cabral de destino. Para as
gerações mais novas, isso parece ser um absurdo inimaginável. Não há
dúvida de que o Brasil não foi “descoberto”, mas tomado intencionalmente
pelos portugueses.
Será que, por isso, devemos jogar fora todo o velho curso primário? O
que restou daqueles tempos em que todo dia se ia para a escola escutar
daquela primeira professora ensinamentos dos quais não se acredita mais?
Por acaso os alunos de ontem denigrem hoje a imagem dessa primeira
professora, ou ela se conserva como algo precioso, uma marca presente na
busca de conhecimento? Não é preciso dizer qual é a resposta dos adultos
de hoje. O discurso dos primeiros professores calou fundo em todos os que
o autorizaram e nele acreditaram. Mas, como se vê agora, aquele discurso
não se impôs por ele mesmo, pela dose de verdade que o acompanhou
(muito ao contrário, o “descobrimento” casual do Brasil era uma deslavada
mentira!). evidentemente, os critérios para avaliação do que era verdadeiro
eram assentados pelo próprio professor, e nós, mais uma vez,
acreditávamos neles. Então por quê? Se não é a verdade por eles
anunciada, então qual é a fonte da qual extraem seu poder de
convencimento, sua credibilidade?
Freud nos mostra que um professor pode ser ouvido quando está
revestido por seu aluno de uma importância especial. Graças a essa
importância, o mestre passa a ter em mãos um poder de influência sobre o
aluno. Essa é, naturalmente, uma idéia bastante conhecida, assim como é
também conhecida a fonte atribuída por Freud a esse poder de influência.
“No decorrer do período da latência, são os professores e geralmente as
pessoas que têm a tarefa de educar que tomarão para a criança o lugar dos
30pais, do pai em particular, e que herdarão os sentimentos que a criança
dirigia a esse último na ocasião da resolução do complexo de Édipo. Os
educadores, investidos da relação afetiva primitivamente dirigida ao pai, se
beneficiarão da influência que esse último exercias sobre a criança.
Pode-se perceber que a ênfase dada por Freud ao estudo da relação
entre um professor e um aluno não estava no valor dos conteúdos cognitivos
que transitam entre essas duas pessoas – vale dizer, na informação que é
transmitida de um para o outro. Sim, a ênfase freudiana está concentrada
sobretudo nas relações afetivas entre professores e alunos. A citação acima
menciona justamente “uma relação afetiva primitivamente dirigida ao pai”
bem, isto está correto, mas até certo ponto. Os esquemas desenvolvidos
posteriormente pelo próprio Freud apontam numa direção um pouco
diferente, nos quais a palavra afeto deixa de ter tanta importância.
Por isso, pode-se dizer que, da perspectiva psicanalítica, não se
focalizam os conteúdos, mas o campo que se estabelece entre o professor e
seu aluno, que estabelece as condições para o aprender, sejam quais forem
os conteúdos.
Em Psicanálise, dá-se a esse campo o nome de transferência.
31
CAPÍTULO III 3.1) A importância da educação pré-escolar
para o desenvolvimento do sujeito cognoscente
Os estudos sobre Teoria Construtivista começaram com Piaget
(1896– 1980), que foi um biólogo com preocupações eminentemente
epistemológicas (teoria do Conhecimento), numa perspectiva interdisciplinar.
A grande pergunta que formulou foi: “Como se passa de um
conhecimento menos elaborado?”
Pesquisou e elaborou uma teoria sobre os mecanismos cognitivos da
espécie (sujeito epistêmico) e dos indivíduos (sujeito psicológico).
Piaget, entendendo ser praticamente impossível remontar aos
primórdios da humanidade e compreender qual foi, efetivamente, o processo
de desenvolvimento cognitivo desde o homem primitivo até os dias atuais
(Filogênese), voltou-se para o desenvolvimento da espécie humana, do
nascimento até a idade adulta (Ontogênese).
Assim se explica o fato de que, para conhecer como o sujeito
epistêmico (sujeito que conhece) constrói conhecimento, tenha recorrido à
Psicologia como campo de pesquisa. Ao elaborar a teoria psicogenética,
procurou mostrar quais as mudanças qualitativas porque passa a criança,
desde o estágio inicial de uma inteligência prática (período sensório-motor),
até o pensamento formal, lógico-dedutivo, a partir da adolescência.
Segundo Piaget, o conhecimento não pode ser concebido como algo
predeterminado desde o nascimento (inatismo), nem como resultado do
simples registro de preocupações e informações (empirismo). Resulta das
ações e interações do sujeito com o ambiente onde vive. Todo o
conhecimento é uma construção que vai sendo elaborada desde a infância,
através das interações do sujeito com os objetos que procura conhecer,
sejam eles do mundo físico ou cultural.
Segundo Piaget, o conhecimento resulta de uma interelação
entre o sujeito que conhece e o objeto a ser conhecido.
32Por uma lado, existe um sujeito ativo que, em todas as etapas de sua
vida, procura conhecer e compreender o que se passa à sua volta. Mas não
o faz de forma imediata, pelo simples contato com os objetos. Suas
possibilidades, a cada momento, decorrem do que Piaget denominou
esquemas de assimilação, ou seja, esquemas de ação (agitar, sugar,
balançar) ou operações mentais (reunir, separar, classificar, estabelecer
relações), que não deixam de ser ações mas que se realizam no plano
mental.
Estes esquemas se modificam como resultado do processo de
maturação biológica, experiências, trocas interpessoais e transmissões
culturais.
Por outro lado, os objetos do conhecimento apresentam propriedades
e particularidades que nem sempre são assimiladas (incorporadas) pelos
esquemas já estruturados no sujeito.
Isto ocorre, ou porque o esquema é muito geral e não se aplica a uma
situação particular, ou porque é ainda insuficiente para dar conta de um
objeto mais complexo.
“Assim, uma criança que já construiu o esquema de sugar, assimila a
mamadeira, mas terá que modificar o esquema para sugar a chupeta, comer
com colher etc.”.
“Outro exemplo: um aluno que já construiu o conceito de
transformação, terá que compreendê-lo tanto em situações específicas da
vida cotidiana, como em conteúdos de História, Geografia, Biologia etc.”.
A esse mecanismo de ampliação ou modificação de um esquema de
assimilação, Piaget chamou de acomodação. E fica claro que, embora seja
“provocado” pelo objeto, é também possível graças à atividade do sujeito,
pois é este que se modifica para a construção de novos conhecimentos.
O conteúdo das assimilações e acomodações variará ao longo do
processo do desenvolvimento cognitivo, mas a atividade inteligente é
sempre um processo ativo e organizado de assimilação do novo ao já
construído, e de acomodação do construído ao novo.
Fica assim estabelecida a relação do sujeito conhecedor e do objeto
conhecido. Por aproximações sucessivas, articulando assimilações e
33acomodações, completa-se o processo a que Piaget chamou de adaptação.
A cada adaptação realizada, novo esquema assimilador se torna estruturado
e disponível para que o sujeito realize novas acomodações e assim
sucessivamente.
O que promove este movimento é o processo de equilibração,
conceito central na teoria construtivista.
Diante de um desafio, de um estímulo, de uma lacuna no
conhecimento, o sujeito se “desequilibra” intelectualmente, fica curioso,
instigado, motivado e, através de assimilações e acomodações, procura
restabelecer o equilíbrio que é sempre dinâmico, pois é alcançado por meio
de ações físicas e/ou mentais.
O pensamento vai se tornando cada vez mais complexo e
abrangente, interagindo com objetos do conhecimento cada vez mais
abstratos e diferenciados.
As situações concretas presentes nos exemplos a seguir, procuram
ilustrar pressupostos e explicações teóricas e apontar implicações que
ressaltem a importância de compreender a relação teoria-prática.
3.2) Para que educar?
Para Piaget, ter assegurado o direito à educação, significa ter
oportunidades de desenvolver, tanto do ponto de vista intelectual, como
social e moral.
Cabe à sociedade, através de instituições como a família e a escola,
propiciar experiências, trocas interpessoais e conteúdos culturais, que
interagindo com o processo de maturação biológica, permitam à criança e ao
adolescente atingir capacidade cada vez mais elaboradas de conhecer e
atuar no mundo físico e social.
Como enfatiza Piaget, a lógica, a moral, a linguagem e a
compreensão de regras sociais não são inatas, ou seja, pré-formadas na
criança, nem são impostas de fora para dentro, por pressão do meio. São
construídas por cada indivíduo ao longo do processo do desenvolvimento,
processo este entendido como sucessão de estágios que se diferenciam um
34dos outros, por mudanças qualitativas. Mudanças que permitem, não só a
assimilação de objetos de conhecimento compatíveis com as possibilidades
já construídas, através da acomodação, mas também sirvam, de ponto de
partida para novas construções (adaptação).
Para que este processo se efetive, é importante considerar o principal
objeto da educação que é a autonomia, tanto intelectual como moral.
Alguns exemplos ilustrarão o que Piaget entende por autonomia.
“Um aluno que tinha decorado a tabuada de multiplicar, sem saber o
que esta significava em termos de operação mental, freqüentemente
esquecia ou cometia erros e, mesmo alertado não encontrava o ressaltado
correto.
Quando teve oportunidade de compreender que as multiplicação é a
soma de parcelas iguais, passou a ser capaz de encontrar qualquer
resultado. Se tinha dúvida sobre quanto é 8x7, multiplicava 7x7=49, somava
mais sete e acertava: 8x7=56.
O aluno passou a não depender exclusivamente da memória, ficando
autônomo para resolver os desafios por seus próprios meios, ou seja,
utilizando uma operação mental já construída.
Esta capacidade construída lhe permite, agora, compreender se o
enunciado de um problema de matemática indica a necessidade de efetuar
uma conta de multiplicação ou não.
Não faria como um aluno das primeiras séries do 1º grau que, ao
fazer o dever, perguntava à mão, que estava em outro local da casa “Mãe,
este problema é de somar ou de multiplicar?” – revelando depender da
opinião de outra pessoa para agir, ou seja, sendo heterônomo no campo
intelectual.
Aquela construção permitiu-lhe compreender, com mais facilidade,
que a divisão também se faz por parcelas iguais e, finalmente, compreender
porque 8x0=0!!
Outro exemplo:
Durante uma aula de Geografia, a professora e alunos da 8ª série
lêem um texto do livro didático, sobre aspectos socio-econômicos do Oriente
Médio.
35Dentre outras informações o texto afirma que os países ali localizados
se caracterizam por serem muito ricos em petróleo, e que suas populações
são muito pobres, muitas delas nômades, vivendo em cabanas no deserto.
Após a leitura, inicia-se um exercício de fixação das informações.
Um aluno pergunta: “Professora, se existe tanto petróleo, se o país é
tão rico, por que o povo é tão pobre?”
Este aluno foi capaz de perceber, autonomamente, uma contradição,
não aceitando passivamente as informações.
Sua curiosidade lhe permitiu avançar na compreensão de relações
entre riquezas naturais (petróleo) e estrutura social, modelo sócio-econômico
e político e distribuição de renda etc.
Ser autônomo, do ponto de vista moral, significa ser capaz de agir a
partir de valores morais, conscientemente assumidos como os mais corretos.
Como afirma Kamii: A essência da autonomia é que as crianças se
tornem capazes de tomar decisões por elas mesmas. Autonomia não é
a mesma coisa que liberdade completa. Autonomia significa ser capaz
de considerar os fatores relevantes para decidir qual deve ser o melhor
caminho da ação. Não pode haver moralidade quando alguém
considera somente o seu ponto de vista. Se também considerarmos o
ponto de vista das outras pessoas, veremos que não somos livres para
mentir, quebrar promessas ou agir irrefletidamente” (Kamii, 1986:72)
Para que uma pessoa ultrapasse a heteronomia que significa agir ou
fazer julgamentos, sem questionar os valores que os sustentam, precisa ser
encorajada a construir por si mesma seus valores.
Uma criança heterônoma considera que é pior mentir para um adulto,
do que mentir para uma criança, porque o adulto pode descobrir e puni-la.
Uma criança que já atingiu a moralidade autônoma, considera que é
errado mentir tanto para os adultos quanto para as crianças, pois, em
qualquer dos casos, se está enganando o outro.
As crianças que são submetidas, tanto na família como na escola, a
punições arbitrárias, sem sentido, têm sua heteronomia reforçada. Quando
se habituam a fazer suas obrigações, só quando são recompensadas, não
36compreendem o valor intrínseco de suas ações e se tornam, muitas vezes,
incapazes de se autogovernarem.
Se, ao contrário, as crianças e adolescentes forem incentivados a
trocar pontos de vista entre si e com os adultos, forem levadas a refletir
sobre as conseqüências de seus atos para si e para os outros, discutirem os
significados dos valores, terão mais chances de se tornarem autônomas.
No Brasil, quantas coisas precisaram acontecer, para que a frase “O
importante é levar vantagem em tudo, certo?” (Lei de Gerson) começasse a
ser questionada, e fossem avaliadas criticamente as implicações desta
atitude individualista e, até certo ponto, desonesta?
37
CAPÍTULO IV
Intervenções Psicopedagógicas 4.1) Conceito geral
O deslocamento do enfoque clínico ou assistencial da intervenção
para o enfoque educacional, o questionamento de perspectivas estritamente
individuais na abordagem das dificuldades enfrentadas pelos alunos nos
processos de aprendizagem e na conceituação dos próprios serviços de
intervenção psicopedagógica, como recursos especializados para a
instituição escolar em seu conjunto, têm favorecido uma nova postura dos
psicopedagogos em relação à escola, assim como uma progressiva
inserção, quando possível, nos âmbitos de coordenação e de planejamento
das propostas educacionais.
Deste modo, os psicopedagogos têm diante de si um campo de
trabalho e necessidades de formação que não eram valorizados da mesma
forma há apenas duas décadas, quando a intervenção centrava-se de forma
quase exclusiva na sala de aula ou, ainda, em alunos concretos, e quando
os interlocutores dos profissionais de psicopedagogia eram o professor de
educação especial ou os regentes daqueles alunos.
4.2) Principais queixas na educação pré-escolar
Para que uma criança “aprenda”, é necessário que ela tenha o desejo
de aprender. A linguagem popular diz: “O desejo e o amor não se
comandam”. É nisso, no entanto, que acreditam muitos pais que querem
“motivar seus filhos e tudo fazer para que eles se interessem pela escola”.
Não é preciso “fazer” nem impor quando o “saber” adquiriu o brilho do objeto
do desejo para os pais, não é preciso imperativo algum para que a criança
se apodere desse saber.
384.3) A demanda dos pais
A criança ouve bem cedo a demanda que lhe é feita: ela deve
aprender, ela deve ser bem-sucedida. Desde a pré-escola, alguns pais se
inquietam com as performances intelectuais de seus filhos e com suas
possibilidades de sucesso; querem, às vezes, fazê-los “pularem” o último
ano da pré-escola, pois um ano de avanço é sempre útil para a preparação
dos concursos mais tarde! A criança percebe muito bem que ela tem de
responder a uma expectativa. O sucesso é exatamente esse objeto de
satisfação que ela deve proporcionar aos pais. Boas notas, bons curriculuns
são destinados a dar prazer. Ela pode responder docilmente a essa
demanda durante um certo tempo, mas, cedo ou tarde, sozinha diante da
folha branca o da tarefa a desempenhar, ela será confrontada com seu
próprio desejo.
Além dessa demanda dos pais, há a pressão social que exerce sobre
todos e gera uma angústia surda que a criança tem dificuldade em
identificar.
4.4) A demanda do corpo docente
Esse discurso em que o sucesso é desejado e esperado não é
sustentado somente pelos pais; as crianças o ouvem também de seus
professores, que têm, um contrato a cumprir. Eles também são submetidos a
um imperativo de sucesso, a turma pela qual são responsáveis deve ser
suficientemente boa para que, no final do ano, a maioria dos alunos passe
para o ano seguinte. São, portanto, os bons resultados dos alunos que
fazem os bons professores serem reconhecidos pela hierarquia: direção,
inspeção etc., e pelos pais dos alunos. A angústia que essa competitividade
gera parece mais particularmente nociva durante os primeiros anos da
aprendizagem escolar. De fato, a inquietude ligada às performances suscita
na criança um questionamento permanente: Conseguirá passar de ano?
Terá “maturidade” suficiente? Possuirá as capacidades intelectuais que se
supunha que se tivesse? Os julgamentos sobre ela terão sérias
39conseqüências e serão, às vezes, determinantes para o prosseguimento da
escolaridade, pois podem modificar e até mesmo deteriorar grandemente as
relações com o ambiente. A criança nem sempre faz separação entre um
julgamento de valor e o amor que alguém lhe dedica. Ser um mau aluno
eqüivale para ela ser um mau filho. Será necessário acrescentar que a ferida
narcísica vivida pelos pais de uma criança precocemente considerada
deficiente mental pode despertar neles uma ferocidade insuspeitada e
medidas de retorsão sem relação com a natureza do distúrbio?
40
CAPÍTULO V 5.1) Possibilidades de intervenção
São vários os autores que consideram que o construtivismo, em
sentido amplo e, concretamente, a Concepção Construtivista da
Aprendizagem Escolar e do Ensino (Coll, 1990; 1991b; 1997) constitui um
marco adequado não apenas para explicar a aprendizagem que ocorre na
escola, mas para erigir-se em instrumento de análise da intervenção
psicopedagógica (Bassedas, 1988; Bassedas e outros, 1991; Huguet, 1993;
Monereo, 1996; Monereo e Solé, 1996; Solé, 1997).
Embora não possamos entrar nessa ampla questão, talvez alguns
breves comentários a esse respeito permitam justificar a afirmação do
parágrafo anterior. Como sabemos a Concepção
Construtivista da Aprendizagem Escolar e do Ensino considera a
educação como um processo social e socializador, mediante o qual os
grupos sociais promovem a socialização e o desenvolvimento de seus
membros mais jovens. A educação escolar, como processo formalizado,
planejado e intencional, persegue tal objetivo mediante a organização de
experiências e situações que permitam a elaboração, com a ajuda de outros,
de significados pessoais sobre os conceitos, valores e procedimentos da
cultura que configuram o currículo escolar. Essa elaboração, que se
caracteriza na realização de aprendizagens tão significativas quanto
possível, exige do aluno uma atividade intelectual de tipo auto-estruturadora,
que se incorpora em processos interpessoais professor/aluno e aluno/aluno,
nos quais a construção do conhecimento torna-se possível graças ao
exercício da influência educacional.
A lógica e, inclusive, o “senso comum” que se extrai da injusta
recapitulação de algumas idéias mais conhecidas Concepção Construtivista
podem dar a impressão equivocada de que se trata de uma explicação
simples, de que a familiaridade com estes enunciados já proporcionam seu
conhecimento e possibilidade de uso. Não há nada mais afastado da
realidade. A Concepção Construtivista é um conjunto articulado de princípios
41– embora ainda imparcial e inacabado – que permite a análise das situações
educacionais e a tomada de decisões inerentes ao planejamento, ao
desenvolvimento e a avaliação do ensino. Pressupõe uma posição
ideológica (o caráter socializador e progressista que se atribui à educação) e
uma posição intelectual, que leva a explorar conceitos e princípios cuja
origem situa-se em teorias diversas, mas que dividem o fato de assumir o
“construtivismo”! como princípio epistemológico; tais princípios e conceitos
são reinterpretados a partir dessas posições, em um processo que gera uma
explicação peculiar para um problema também peculiar. A simplicidade é
apenas aparente; encerra, na verdade, uma complexa trama de relações
entre conhecimento psicológico e educacional de enorme utilidade para a
intervenção educacional e psicopedagógica, assim como para aprofundar
conceitos diversos que, devido ao uso comum, têm sido, às vezes,
banalizados.
A Concepção Construtivista da Aprendizagem Escolar e do Ensino
aparece, então, como explicação e instrumento de análise daquilo que
ocorre em um processo educacional concreto; como instrumento, é
suscetível de ser usada pelo psicopedagogo para compreender a situação e
encontrar meios de intervir nela. É conveniente, entretanto, Ter consciência
de que não funciona somente como instrumento de análise. Na verdade,
partir de uma visão como esta, ou partir de outra, vai determinar o campo de
visão do psicopedagogo, o que olha, o que vê, o que considera um problema
e o que lhe parece não sê-lo; determina, também, aquilo que considera
necessário atender e estabelece uma saída ou outra para a solução que
enfrenta.
Na explicação construtivista, a aprendizagem (e a ausência ou
dificuldade de aprendizagem) de um aluno ou de um grupo de alunos não é
uma característica inerente a eles; é entendida mais como um produto de
uma feliz confluência (ou de uma disfunção) – entre os componentes
nucleares de todo processo educacional: os alunos, cada um com suas
condições pessoais, os conteúdos que devem ser objeto de apropriação por
parte daqueles, e as respostas e as medidas educacionais que se articulam
para alcançar essa apropriação. Parece óbvio, então, a partir dessa
42explicação, que analise a analisar e a intervir sobre um dos componentes
desse núcleo, mas exige dotar-se de instrumentos para entender as relações
que ocorrem entre todos eles e intervir para otimizá-las.
No sentido que acabamos de expor parece evidente que, ao optar
pela explicação da aprendizagem, do ensino e do desenvolvimento que
subjaz à concepção construtivista como instrumento para abordar o objeto
de intervenção, está havendo uma decisão de segundo nível que permite
falar não somente de enfoque educacional, mas de modelo educacional
construtivista de intervenção psicopedagógica.
Finalmente, os conceitos-chave da concepção construtivista podem
ser considerados instrumentos para articular a relação entre professores e
psicopedagogo, para a construção progressiva da colaboração entre eles.
43
CAPÍTULO VI
6.1) CONCLUSÃO Diante de tudo que foi lido concluí-se que os autores acima citados
muito contribuíram para elucidar o processo de desenvolvimento mental da
criança e diante disso a importância da intervenção psicopedagógica se faz
de acordo com muitas variáveis, entre elas a que dizem respeito à instituição
destinatária do assessoramento, pois é algo mais do que “ lugar físico “ o
local onde se realiza a intervenção; é objetivo da mesma e, em boa medida,
determinante de seus limites e de sua capacidade de transformação. É
analisando a instituição que o psicopedagogo deve avaliar como realizar sua
intervenção.
Em geral, nas instituições de ensino, são os professores que se
dirigem ao psicopedagogo para dizer que um determinado aluno apresenta
dificuldades, seja de aprendizagem, seja de relações ou ambos. Pode
também ocorrer de ser os pais ou familiares que solicitem a ajuda do
psicopedagogo.
É importante levar em consideração que a demanda de intervenção é
procedida pelos educadores no sentido de superar as dificuldades que
existem com os recursos habituais. O que foi realizado até o momento, os
indicadores que levam a constatar sua insuficiência e a interpretação do fato,
elaborado por quem encaminhou, são aspectos importantíssimos para
compreender o ponto de partida da situação.
Muitos profissionais tem elaborado instrumentos que buscam obter
informações disponíveis nesse momento sobre os alunos e sobre a situação
na qual se manifestam as dificuldades. Estes instrumentos, como roteiro por
exemplo, exigem que o professor ou quem encaminhou exponham dados
relevantes sobre o aluno: motivo da demanda; ações realizadas; avaliação
das competências dos alunos em diferentes áreas, avaliação de suas
capacidades de relação, da percepção que tem de si mesmo, vivência de
suas dificuldades, atitudes diante das tarefas... e portanto possuem
44características que o tornam interessantes. Primeiro pelo fato de evitar o
esquema de “ encaminhamento/depósito de caso “ no psicopedagogo;
mediante solicitação que este realiza ao professor lhe transmite a idéia de
co-responsabilidade, e ao fazer isso diz a ele que sua visão é necessária
para abordar o problema. Por outro lado, a solicitação que estes dados
sejam expressos por escrito ajuda a refletir sobre a situação em termos mais
concretos e específicos. É possível transformar apreciações genéricas
como: “ não compreende, não é capaz de prestar atenção “ em outras mais
precisas “ não entende o que lê, mas se isso lhe é dito, não tem nenhuma
dificuldade; não presta atenção no conteúdo, não demonstra nenhum
interesse, somente parece motivado pelo trabalho de ciências sociais. A
dinâmica das escolas deixa, às vezes, pouco tempo para reflexão é os “
roteiros “ de encaminhamento contribui para encontrá-lo.
Além disso deve-se incluir nesse roteiro questões que levem a
observar não somente as dificuldades, mas as competências dos alunos.
É preciso que os professores compreendem que não se trata de
responder aos alunos de forma mecânica: o importante é a reflexão que
provocam e a compreensão compartilhada que permitam ao professor e o
psicopedagogo, por isso uma boa estratégia é utilizar o roteiro e fazer de seu
cumprimento uma tarefa conjunta.
45
BIBLIOGRAFIA
SOLÉ, Isabel. Orientação Educacional e Intervenção Psicopedagógica. Porto
Alegre: Artmed, 2001,
RAPPAPORT, Clara Regina; FIORI, Wagner da Rocha e DAVIS, Cláudia.
Teorias do desenvolvimento. São Paulo: EPV, Volume1
CORDIÉ, Anny. Os atrasados não existem. Porto Alegre: Artes Médicas,
1996, v1.
KUPFER, Maria Cristina. Freud e a educação. São Paulo: editora scipione,
1989, v 14.
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. Multirio – Núcleo curricular
básico. Rio de Janeiro: 1996.
46
ÍNDICE
AGRADECIMENTOS ................................................................................. 03
DEDICATÓRIA ........................................................................................... 04
RESUMO..................................................................................................... 05
METODOLOGIA ......................................................................................... 06
SUMÁRIO................................................................................................... 07
INTRODUÇÃO............................................................................................ 08
CAPÍTULO I
Fases do Desenvolvimento Mental da Criança em Idade Pré-escolar 10
1.1 PIAGET 10
1.2 ALGUNS CONCEITOS FUNDAMENTAIS 12
1.3 HEREDITARIEDADE 13
1.4 ADAPTAÇÃO 13
1.5 ESQUEMA 15
1.6 EQUILÍBRIO 17
1.7 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS PRINCIPAIS PERÍODOS DO DESENV. 18
CAPÍTULO Ii
2.1 FREUD 23
CAPÍTULO III
A importância da Educação Pré-escolar para o Desenv. do Sujeito Cognoscente 31
3.1 PARA QUE EDUCAR? 33
CAPÍTULO IV
INTERVENÇÕES PSICOPEDAGÓGICAS 37
4.1 CONCEITO GERAL 37
4.2 PRINCIPAIS QUEIXAS NA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR 37
4.3 A DEMANDA DOS PAIS 38
4.4 A DEMANDA DO CORPO DOCENTE 38
CAPÍTULO V
5.1 POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO 40
CAPÍTULO VI
6.1 CONCLUSÃO 43
BIBLIOGRAFIA 45
ÍNDICE 46
FOLHA DE AVALIAÇÃO 47
ANEXOS 48
47
Folha de avaliação
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
Projeto A Vez do Mestre
Pós-Graduação “Lato Sensu”
TÍTULO DA MONOGRAFIA:
“A IMPORTÂNCIA DA INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA PARA DIMINUIÇÃO DO FRACASSO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR”
Data da entrega: _______________________________________
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________
Avaliado por: _______________________________Grau ______________.
Rio de Janeiro _____de _______________de 20___