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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “A VEZ DO MESTRE” A IMPORTÂNCIA DA INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA PARA DIMINUIÇÃO DO FRACASSO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO PRÉ- ESCOLAR Por: Eunice dos Santos Rocha Orientadora Profª. Diva Nereida Rio de Janeiro Setembro/2003

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E

DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

A IMPORTÂNCIA DA INTERVENÇÃO

PSICOPEDAGÓGICA PARA DIMINUIÇÃO DO

FRACASSO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO PRÉ-

ESCOLAR

Por: Eunice dos Santos Rocha

Orientadora

Profª. Diva Nereida

Rio de Janeiro

Setembro/2003

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

Projeto “a vez do mestre”

A IMPORTÂNCIA DA INTERVENÇÃO

PSICOPEDAGÓGICA PARA DIMINUIÇÃO DO

FRACASSO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO PRÉ-

ESCOLAR

Apresentação de monografia ao

Conjunto Universitário Cândido Mendes

como condição prévia para a conclusão

do Curso de Pós-Graduação em

Psicopedagogia.

Por Eunice dos Santos Rocha

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pois sem Ele nada é possível.

Aos meus pais que sempre foram essenciais para o meu crescimento pessoal e profissional.

À minha filha que por muitas vezes foi sacrificada em função dos meus horários.

À minha irmã, porque sem a sua força eu não conseguiria concluir este curso e, finalmente, ao meu marido que sempre foi um incentivador.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos

professores do projeto “A Vez do

Mestre” e todas as pessoas que,

de alguma forma, contribuíram

para sua construção.

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RESUMO

A intervenção psicopedagógica tem sido muito aplicada nos

dias de hoje nas instituições educacionais, a fim de solucionar problemas

dos alunos no âmbito da aprendizagem, das relações ou em ambos.

Portanto, baseado nas visões de alguns autores como Isabel

Solé, Piaget, Freud, Vigotsky e outros, verificaremos nesse trabalho a

importância da intervenção psicopedagógica nas instituições de educação.

“Tolerar a existência do outro e

permitir que ele seja diferente ainda é

muito pouco. Quando se tolera, apenas se

concede e essa não é uma relação de

igualdade, mas de superioridade de um

sobre o outro. Deveríamos criar uma

relação entre as pessoas da qual

estivessem excluídas a tolerância e a

intolerância.”

José Saramago

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METODOLOGIA

No tocante aos meios de investigação, realizou-se uma

pesquisa recorrendo-se a publicações bibliográficas.

“A satisfação está no

esforço e não apenas na

realização final”

MAHATMA GHANDI

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SUMÁRIO

Títulos Pág.

Introdução 8 CAPÍTULO I

Fases do Desenvolvimento Mental das Crianças em Idade Pré-escolar 10

PIAGET 10 Alguns Conceitos Fundamentais 12 Hereditariedade 13 Adaptação 13 Esquema 15 Equilíbrio 17 Características Gerais dos Principais Períodos do Desenvolvimento 18

CAPÍTULO II FREUD 23

CAPÍTULO III A Importância da Educação Pré-escolar para o Desenvolvimento do Sujeito Cognoscente 31

Para Que Educar? 33 CAPÍTULO IV

Intervenções Psicopedagógicas 37 Conceito Geral 37 Principiais Queixas na Educação Pré-escolar 37 A Demanda Dos Pais 38 A Demanda Do Corpo Docente 38

CAPÍTULO V Possibilidades de Intervenção 40

CAPÍTULO VI Conclusão 43

8

INTRODUÇÃO

A educação recebida pelas crianças e jovens deve contribuir para

sua formação integral. Isso significa que se espera que o que é oferecido

durante essas etapas educacionais contribua para o desenvolvimento de

todas as capacidades construtivas do ser humano: do equilíbrio pessoal,

cognitivo-lingüísticas, motoras, de relação interpessoal e de inserção social,

sem que exista nenhuma justificativa para opor-se a alguma ou algumas

delas em benefício de outras. Para isso deve-se compreender o princípio

que concebe a educação como instrumento de coesão social e não de

exclusão – e, particularmente, a educação obrigatória, ao serviço de

formação de cidadãos e cidadãs capacitados para conviver

democraticamente – que se traduz, entre outras coisas, na adoção de um

mesmo modelo de currículo para a Educação Infantil e para as outras

etapas, assim como num conjunto de medidas em ralação aos profissionais

que a atendem – é um passo à frente que não deveria ser subestimado,

especialmente se levarmos em consideração que o cidadão comum e,

infelizmente, muitos profissionais do próprio sistema educacional, continuam

tendo uma imagem distorcida do que significa educar na Educação Infantil.

A Escola de Educação Infantil deve ser aberta e flexível e deve

aprofundar seu duplo caráter educacional e compensador. A oferta

educacional, para existir de verdade, deve adaptar-se às características e

necessidades de seus usuários; mas, ao mesmo tempo, hoje temos

evidência suficiente sobre as diferenças apresentadas– às vezes, devido a

condições pessoais mas, na maioria das vezes, por causa de fatores

familiares e sociais. Não se trata de cair na utopia e pensar que essas

desigualdades, que são freqüentes, provocadas por um sistema social,

serão compensadas pela escola; trata-se de se fazer com que esta não as

agrave e de que, na medida do possível, ofereça os recursos que algumas

crianças não encontram fora dela.

Um exemplo pode ser revelador: “Uma criança para quem os pais

costumam ler uma história antes de dormir terá assistido, somente entre

9seus dois e quatro anos, aproximadamente 700 experiências de contato com

o texto escrito (além de ter aprofundado a relação afetiva com seus

progenitores, de estar motivada pela leitura e de receber muitos outros

conhecimentos muito relevantes para a posterior aprendizagem da leitura e

da escrita). Um colega que não ouve histórias foi privado dessas 700

experiências. Apesar de a escola não poder proporcioná-las, poderá propor

ações em cujo ponto de partida esteja a consideração dessas diferenças e a

vontade de atenuá-las (por exemplo, estabelecendo o costume de leitura

diária de contos e outros textos para as crianças)”.

10

CAPÍTULO I

Fases do Desenvolvimento Mental da Criança em Idade Pré-escolar

1.1) Piaget

Piaget estudou o desenvolvimento do conhecimento da lógica,

espaço, tempo, casualidade, moralidade, brinquedo, linguagem e

matemática. Lidou com muitos processos psicológicos: pensamento,

percepção, imaginação, memória, imitação, ação. Piaget, conviveu com

crianças de todas as idades, submetendo-as às mais variadas formas de

estimulação e experimentação, mas não deixou de refletir sobre as bases

filosóficas do conhecimento.

A preocupação central de Piaget dirige-se à elaboração de uma teoria

do conhecimento, que possa explicar como o organismo conhece o mundo.

E esta colocação reflete sua forma inicial em Biologia, pois considera que só

o conhecimento possibilita ao homem um estado de equilíbrio interno que o

capacita a adaptar-se ao meio ambiente. Existe, para ele, uma realidade

externa ao sujeito do conhecimento, e é a presença desta realidade que

regula e corrige o desenvolvimento do conhecimento adaptativo. A função

do desenvolvimento não consiste em produzir cópias internalizadas da

realidade externa, mas sim, em produzir estruturas lógicas que permitam ao

indivíduo atuar sobre o mundo de formas cada vez mais flexíveis e

complexas.

Preocupa-se portanto, em saber quais os processos mentais

envolvidos numa dada situação de resolução de problemas e quais os

processos que ocorrem na criança para possibilitar aquele tipo de atuação.

Assim, sua obra é de epstemologia genética e mostra como o conhecimento

se desenvolve, desde as rudimentares estruturas mentais do recém-

nascidos até o pensamento lógico formal do adolescente. Procura entender

11como, e em função de que, estas estruturas iniciais se transformam, dando

lugar a outras cada vez mais complexas.

Estudou, o desenvolvimento dos vários processos cognitivos,

valorizando aos aspectos qualitativos e não quantitativos. Ao aplicar alguns

testes, Piaget interessou-se muito mais pelas respostas incorretas do que

pelas corretas, passando a uma busca de entendimento dos processos

mentais que a criança usara para chegar à emissão daquela resposta.

Portanto, não se contentou com a obtenção e registro das respostas

corretas, da solução adequada do problema, como faziam os demais

pesquisadores, mas, através de outras questões que colocava diante da

criança, procurou entender qual o processo de pensamento subjacente na

emissão daquela resposta.

A partir de seus primeiros contatos com os testes de inteligência e

tendo despertado sua curiosidade científica pra a pesquisa dos processos

cognitivos, passou a observar o desenvolvimento dos seus próprios filhos,

registrando suas reações desde os primeiros dias de vida. Em muitas obras

de Piaget são freqüentes as citações das reações de Jacqueline, Laurent e

Lucienne.

Piaget utilizou como técnica básica de pesquisa o método clínico, que

havia aprendido a aplicar na clínica de Bleuler e nos cursos práticos de

Sorbonne.

Esta opção, às vezes criticada por falha no controle experimental e

descrição incompleta (Baldwin, 1967), permitiu um aprofundamento no

conhecimento dos processos mentais das crianças. Uma de suas primeiras

constatações foi a de que o estudo do pensamento expresso apenas

verbalmente, isto é, através de perguntas feitas à criança, na ausência de

manipulações concretas às quais suas respostas pudessem referir-se –

pode fornecer somente um quadro incompleto da estrutura cognitiva e de

seu desenvolvimento. Só mais tarde quando estudou bebês e crianças em

idade escolar, é que percebeu a necessidade de fazer uma distinção entre a

lógica das ações, isto é, a lógica expressa no comportamento emitido, e a

lógica aplicada a afirmações verbais.

12Assim, através do contato contínuo e constante com um número cada

vez maior de crianças das várias faixas etárias e pesquisando diferentes

aspectos do funcionamento cognitivo, Piaget chegou à formulação de

inúmeros conceitos continuamente reavaliados em função de novos dados.

No Brasil, Piaget começou a ser conhecido na década de 60, e a

partir dessa época foi incluído o seu estudo no currículo dos cursos

universitários de Psicologia, Pedagogia etc. alguns autores tentaram, como

nos estados Unidos, uma apresentação mais didática de seus conceitos

básicos (Biággio, 1976).

No Brasil observamos que muitas escolas para crianças em idades

precoces (a partir dos 2 anos), denominadas escolas maternais ou jardins de

infância, ou mesmo escolas de 1º grau, passaram a utilizar o que

denominaram Método Piaget.

É preciso ficar bem claro que é possível, válida e recomendável uma

utilização dos conhecimentos trazidos à luz por Piaget a respeito das

estruturas mentais que se acham presentes em cada faixa etária e do modo

de funcionamento característico dessas estruturas em cada fase do

desenvolvimento. Mas, é perigoso tentar transpor esses conhecimentos para

um conteúdo programático sem um aprofundamento maior.

É necessário tanto um conhecimento profundo da nossa criança, nos

vários segmentos da população, como também um estudo árduo e

prolongado das propostas piagetianas para que possamos chegar a uma

utilização válida e proveitosa.

1.2) Alguns conceitos fundamentais.

Vamos então examinar alguns conceitos piagetianos que são

essenciais para a compreensão do processo de desenvolvimento da

inteligência.

13

1.3) Hereditariedade

O indivíduo herda uma série de estruturas biológicas (sensoriais e

neurológicas) que predispõem ao surgimento de certas estruturas mentais.

Herdamos um organismo que vai amadurecer em contato com o meio

ambiente. A isto chamamos estrutura biológica.

Ainda atentos ao aspecto biológico, podemos dizer que a maturação

do organismo (basicamente do sistema nervoso central) vai contribuir de

forma decisiva para que apareçam essas novas estruturas mentais que

proporcionam a possibilidade de adaptação cada vez melhor ao meio

ambiente.

Quando se fala em ambiente, é bom lembrar que este inclui tanto

aspectos físicos como sociais, de relacionamento humano, que tornam mais

difícil e complexo o processo de adaptação. Isto porque a criança vai

precisar desenvolver recursos intelectuais para solucionar uma ampla

variedade de situações para viver satisfatoriamente num determinado

ambiente social. Portanto, tanto o ambiente físico como social concorrem no

sentido de oferecer estímulos e situações que requerem um processo

cognitivo para resolução.

Fica claro que a riqueza ou a pobreza de estimulação tanto no plano

físico como no social vão interferir no processo de desenvolvimento da

inteligência.

Entenda-se, que, no caso da linguagem ou de outros aspectos que

dependem do desenvolvimento cognitivo, o sujeito herda a capacidade para

a aprendizagem e o desempenho. Mas a plena realização destas

capacidades depende das condições que o meio ambiente irá oferecer.

1.4) Adaptação

O ambiente físico e social coloca continuamente a criança diante de

questões que rompem o estado de equilíbrio do organismo e inicia a busca

de comportamentos mais adaptativos. No caso do funcionamento mental, as

14questões podem ser propostas pelo próprio sujeito do conhecimento.

Podemos dizer que o conhecimento possibilita novas formas de interação

com o ambiente, proporcionando uma adaptação cada vez mais completa e

eficiente e, neste sentido, é gratificante para o organismo, que se sente mais

apto a lidar com situações novas.

Pode-se dizer que as novas questões movimentam o organismo no

sentido de resolvê-las. Pára tanto vai se utilizar das estruturas mentais já

existentes ou elas serão modificadas a fim de se chegar a uma forma

adequada para se lidar com a nova situação. Assim, no processo global de

adaptação estariam implicados dois processos complementares: a

assimilação e a acomodação.

O processo de assimilação se refere à tentativa , feita pelo sujeito, de

solucionar uma determinada situação utilizando uma estrutura mental já

formada. Isto é, a nova situação, ou o novo elemento é incorporado e

assimilado a um sistema já pronto.

Em relação aos processos mentais., suponhamos que uma criança,

que aprendeu a andar de bicicleta, se depare com outro veículo que guarde

algumas semelhanças com o primeiro, porém contenha elementos novos

que a criança desconhece, como, por exemplo, diversas marchas. Nesta

situação a criança tentará agir com a Segunda bicicleta da mesma maneira

como fazia com a primeira, e não obterá sucesso. Estará usando um

processo de assimilação, isto é, de tentar solucionar a situação nova com

base nas estruturas antigas. Este processo não será eficiente, pois estas

estruturas são inadequadas e insuficientes para este novo elemento. O

sujeito tentará então novas maneiras de agir, levando agora em

consideração as propriedades específicas daquele objeto. Isto é, irá

modificar suas estruturas antigas para poder dominar uma nova situação. A

este processo de modificação de estruturas antigas com vista à solução de

um novo problema de ajustamento, a uma nova situação, Piaget denomina

acomodação. E no momento em que a criança conseguir dominar

adequadamente o segundo veículo, diremos que se acomodou a ele e,

portanto, adaptou-se a esta nova exigência da realidade.

15Vemos, pois que da mesma maneira como, biologicamente, o

organismo desenvolve maneiras de se adaptar à realidade e manter com ela

um estado de equilíbrio, mentalmente desenvolvemos processos com o

mesmo objetivo.

Os processos de assimilação e acomodação são complementares e

acham-se presentes durante toda a vida do indivíduo e permitem um estado

de adaptação possibilitando um crescimento, um desenvolvimento pessoal,

na medida em que o sujeito adquire uma competência e uma flexibilidade

cada vez maiores para lidar com as situações da vida prática.

1.5) Esquema

Ao nascer, as crianças não são dotadas de capacidades mentais

prontas, mas apenas alguns reflexos, como chupar e agarrar, além das

tendências inatas a exercitá-los e a organizar suas ações. Herdam, portanto,

não uma inteligência organizada, mas alguns elementos (a estrutura

biológica, neurológica) que determinam seu modo de reagir ao ambiente,

que é, no início da vida, absolutamente caótico para a criança. Assim, de

acordo com Piaget, a partir de um equipamento biológico hereditário, a

criança irá formar estruturas mentais com a finalidade de organizar este caos

de sensações e estados internos desconhecidos. Quero me referir ao

conceito de esquema, uma unidade estrutural básica de pensamento ou de

ação e que corresponde, de certa maneira, à estrutura biológica que muda e

se adapta.

No aspecto orgânico, sabemos que o nosso corpo é formado de

várias estruturas unitárias (células, por exemplo) que se organizam em

elementos maiores (órgãos) ou em sistemas de funcionamento (aparelhos).

No aspecto mental, poderíamos dizer que a nossa estrutura unitária básica é

o esquema, que pode ser simples (como, por exemplo, uma resposta

específica a um estímulo – sugar o dedo quando este encosta nos lábios) ou

complexo (como o esquema que temos das pessoas – de nossa mãe, por

exemplo, ou ainda a maneira como solucionamos problemas matemáticos

ou científicos).

16Pode-se conceituar um esquema , conforme disse Flavell (1975):

“Sendo uma estrutura cognitiva, um esquema é uma forma mais ou menos

fluida de uma organização mais ou menos plástica, ]à qual as ações e os

objetos são assimilados durante o funcionamento cognitivo”.

Vemos então que o esquema constitui a unidade estrutural da mente

e que, da mesma forma como as unidades estruturais biológicas, não é um

elemento estático, porém, dinâmico e variado em seu conteúdo. Os

esquemas são unidades estruturais móveis que se modificam e adaptam,

enriquecendo com isso, tanto o repertório comportamental como a vida

mental do indivíduo.

Vejamos um exemplo que ilustre a maleabilidade dos esquemas. A

criança, em contato com sua mãe, irá formar um esquema de mãe. Este

esquema incluirá tanto a figura física da mãe como os sentimentos que a

criança tem em relação a ela, as vivências que tiveram em comum etc. à

medida em que a criança vai crescendo, este esquema irá se modificando e

ampliando não apenas no sentido de incluir novas vivências que a criança

tenha com a própria mãe (que seria um aspecto mais quantitativo, de

acréscimo de elementos), mas também de incluir outras mães, até chegar ao

conceito abstrato que nós adultos temos de mãe(mudanças também

qualitativas, que modificam a própria estrutura do esquema inicial, mais

simples e mais primitiva).

Os esquemas, portanto, estão em contínuo desenvolvimento e este

desenvolvimento se dá no sentido de permitir ao indivíduo uma adaptação

mais complexa a uma realidade que é percebida por ele, de forma cada vez

mais diferenciada e abrangente, exigindo, portanto, formas de

comportamento e de pensamento mais evoluídas.

Nesta evolução, que constitui a essência do crescimento mental, os

esquemas iniciais primitivos e sensório-motores se ampliam, se fundem, se

diferenciam, interiorizam-se e adquirem a organização que caracteriza os

sistema operacionais concretos (colocar varinhas de madeira por ordem

crescente de tamanho) ou abstratos (compreensão do sistema numérico ou

de teorias científicas).

171.6) Equilíbrio

Sabe-se que o organismo funciona de modo a atingir e procurar

manter um estado de equilíbrio interno que permita a sobrevivência num

determinado meio ambiente. Para isto, os vários elementos orgânicos se

organizam em sistemas maiores ou menores, mais simples ou mais

complexos, de forma a obter tanto um desenvolvimento como um

funcionamento harmônico de todas as partes. Se um dos elementos de um

sistema entra em desacordo com os demais, ocorre um processo qualquer

no organismo, que vai retornar ao estado anterior de equilíbrio. Exemplo: ao

sentir fome, o indivíduo buscará uma forma de obtenção e ingestão de

alimentos que permita sanar esta deficiência orgânica e, quando o fizer,

retornará a um estado de equilíbrio.

Pode-se dizer que um processo semelhante está presente na

organização mental do indivíduo, processo este denominado equilibração

das estruturas cognitivas ou apenas equilíbrio. Em linguagem simples não

passariam de um processo de organização das estruturas cognitivas num

sistema coerente, independente, que possibilita ao indivíduo um tipo ou

outro de adaptação à realidade. Exemplo: voltamos à situação do recém-

nascido ou do bebê de poucos meses de vida e analisemos sua situação

diante da realidade. A criança está recebendo continuamente uma série de

impressões sensoriais desprovida de qualquer significado para ela. Está,

portanto, em completo desequilíbrio com esta realidade, dependendo

totalmente da interferência de outras pessoas para sobreviver. A tarefa

principal do crescimento mental do primeiro ano de vida consistirá em

organizar estas impressões sensoriais de alguma maneira que permita à

criança atuar de modo coerente sobre a realidade. Isto se conseguirá à

medida em que se forme seus primeiros esquemas, que Piaget denomina

esquemas sensoriais-motores, justamente porque sua firmação dependerá

das impressões sensoriais que a criança receber dos objetos e de sua

possibilidade de manipulação, de exploração motora.

Assim, a primeira forma de equilíbrio que a criança irá adquirir

consiste, justamente, na formação de uma série de esquemas sensoriais-

18motores que lhe permitirão organizar aquele caos inicial de sensações

internas e externas, dando-lhe condições de atuar sobre a realidade.

O desenvolvimento é um processo de equilibração sucessivo, em

cada fase do desenvolvimento a criança consegue uma determinada

organização mental que lhe permite lidar com o ambiente.

1.7) Características gerais dos principais

períodos de desenvolvimento

Piaget observou que existem formas diferentes de interagir com o

ambiente nas diversas faixas etárias. A estas maneiras típicas de agir e

pensar, Piaget denominou estágio ou período. Pode-se então dizer, que a

determinadas faixas etárias correspondem determinados tipos de aquisições

mentais e de organização destas aquisições que condicionam a atuação da

criança em seu ambiente. A criança irá, pois, à medida que amadurece física

e psicologicamente, que é estimulada pelo o ambiente físico e social,

construindo sua inteligência.

Pode-se dizer então que, cada fase corresponde a determinadas

características que são modificadas em função da melhor organização. Cada

estágio constitui uma forma particular de equilíbrio, efetuando-se a evolução

mental no sentido de uma equilibração sempre mais completa e de uma

interiorização progressiva.

O desenvolvimento se inicia a partir do equipamento inicial (reflexos

inatos) que vão gradualmente (no primeiro ano de vida) se transformando

em esquemas sensoriais motores rudimentares. Estes esquemas incluem

ações motoras explícitas, sendo, portanto, uma forma de inteligência

exteriorizada, que irá se modificar, ao longo do tempo, no sentido de uma

interiorização gradual, caminhará para um desligamento progressivo da ação

e da formação de esquemas conceituais que supõem uma ação mental.

Período sensório-motor (0-24 meses)

Representa a conquista, através da percepção e dos movimentos, de

todo o universo prático que cerca a criança. Isto é, a formação dos

19esquemas sensoriais-motores irá permitir ao bebê a organização inicial dos

estímulos ambientais permitindo que, ao final do período, ele tenha

condições de lidar, embora de modo rudimentar, com a maioria das

situações que lhe são apresentadas.

A consciência começa por um egocentrismo inconsciente e integral, até que

os progressos da inteligência sensório-motora levem à construção de um

universo objetivo, onde o próprio corpo aparece como elemento entre os

outros, e, ao qual se opõe a vida interior, localizada neste corpo” (Piaget,

1964, p. 19).

Uma das funções da inteligência será, nesta fase, a diferenciação

entre os objetos externos e o próprio corpo.

O período de bebê é sem dúvida bastante complexo do ponto de vista

do desenvolvimento, pois nele irá ocorrer a organização psicológica básica

em todos os aspectos (perceptivo, motor, intelectual, afetivo, social). Do

ponto de vista do autoconhecimento, o bebê irá explorar seu próprio corpo,

conhecer os seus vários componentes, sentir emoções, estimular o ambiente

social e ser por ele estimulado, e assim irá desenvolver a base do seu

autoconceito. Este autoconceito estará alicerçado no esquema corporal, isto

é, na idéia que a criança forma do seu próprio corpo.

Ao final do período, embora a criança permaneça bastante

egocêntrica, autocentralizada em seu entendimento da realidade, já terá

realizado uma boa caminhada no sentido de conhecimento e adaptação à

realidade, embora permaneça bastante limitada em suas possibilidades

intelectuais. Terá conseguido atingir uma forma de equilíbrio, isto é, terá

desenvolvido recursos pessoais para resolver uma série de situações

através de uma inteligência explícita, ou sensório-motora.

Período pré-operacional (2-7 anos)

Ao se aproximar dos 24 meses a criança estará desenvolvendo

ativamente a linguagem o que lhe dará possibilidade de, além de se utilizar

da inteligência prática decorrente dos esquemas sensoriais-motores

formados na fase anterior, iniciar a capacidade de representar uma coisa por

20outra, ou seja, formar esquemas simbólicos. Isto será conseguido tanto a

partir do uso de um objeto como se fosse outro (quando por exemplo, uma

caixa de fósforos pode se transformar num carrinho para brincar), de uma

situação por outra (na brincadeira de casinha a criança estará representando

situações da vida diária) ou ainda de um objeto, pessoa ou situação por

palavra.

O alcance do pensamento irá aumentar, mas lenta e gradualmente, e

assim a criança continuará bastante egocêntrica e presa às ações.

Egocêntrica, pois devido à ausência de esquemas conceituais e de lógica, o

pensamento será caracterizado por uma tendência lúdica, por uma mistura

de realidade com fantasia, o que determinará uma percepção muito

distorcida da realidade. E esta distorção se dará justamente em função

destas limitações.

Portanto então, uma criança que a nível comportamental atuará de

modo lógico e coerente (em função dos esquemas sensoriais-motores

adquiridos na fase anterior) e que a nível de entendimento da realidade

estará desequilibrada (em função da ausência de esquemas conceituais).

. Assim, por exemplo, “se fizermos duas fileiras de fichas,

emparelhadas uma a uma e perguntarmos a uma criança de cinco anos se

as fileiras são iguais (isto é, se têm a mesma quantidade de fichas), ela

provavelmente responderá que sim. Se mantivermos as posições na

primeira fileira e deslocarmos uma das fichas da Segunda fila e fizermos a

mesma pergunta, possivelmente a criança responderá que a Segunda fileira

tem maior quantidade de fichas.

O mesmo ocorrerá em relação à conservação do volume, massa e

peso. Em relação à conservação do volume, se despejarmos, na frente da

criança, uma certa quantidade de água de um copo baixo e largo para um

copo alto e fino ela não perceberá que a quantidade de água não foi

1ª situação 2ª situação

21alterada. Isto porque em função da ausência de esquemas conceituais e da

noção de conservação ou invariância a criança julgará pelo que vê. E no

caso do copo alto e fino, o nível de água será mais alto.

Em relação à conservação de massa, se fizermos duas bolinhas com

massa de modelar, e uma delas for transformada em salsicha, a nossa

criança pré-operacional não entenderá que não houve mudança de

quantidade e de massa.

Para verificar a presença ou ausência de noção de conservação de

peso, podemos utilizar novamente a massinha de modelar. Fazemos duas

bolas iguais e pedimos à criança que avalie se o peso é igual para as duas.

Se a criança disser que sim, transformamos uma das bolas em bife e

repetimos a pergunta. A criança responderá que uma delas pesa mais”.

Além destas provas clássicas, Piaget realizou inúmeras outras que

demonstraram empiricamente a ausência do pensamento conceitual e das

noções de conservação e invariância da criança em idade pré-escolar. Como

1ª situação 2ª situação

1ª situação 2ª situação

1ª situação 2ª situação

22estas são premissas básicas para a realização das operações mentais o

período foi denominado pré-operacional.

O que se verifica é que estas provas têm sido repetidas por

pesquisadores, psicólogos e professores em vários locais do mundo e os

resultados têm confirmado aqueles obtidos por Piaget na Suíça. O que varia

algumas vezes é a idade em que os conceitos são adquiridos pelas crianças

e esta variação (que não é muito grande) pode ser explicada por uma

estimulação social e educacional mais rica e mais adequada.

Quanto ao aspecto social, vemos como característica marcante desta

fase, o início do desligamento da família em direção a uma sociedade de

crianças. Isto é, se quando bebê o contato social se restringia às pessoas da

família e algumas outras, na fase pré-escolar a criança começará a se

interessar por outras de sua mesma idade. No que se refere à linguagem, o

que se nota é a presença concomitante de linguagem socializada (um

diálogo verdadeiro, com intenção de comunicação) e de linguagem

egocêntrica (aquela que não necessita necessariamente de um interlocutor,

não tem função de comunicação). O que se pode observar é que quanto

menor a criança, maior a porcentagem de ]linguagem egocêntrica em

relação à linguagem socializada. À medida que ela vai crescendo a evolução

da linguagem se dá no sentido de uma maior socialização, mostrando mais

uma vez que toda tendência do desenvolvimento em, seus vários aspectos

se dá no sentido da interiorização e da socialização. Isto porque para Piaget,

a linguagem socializada é aquela que pode ser compreendida pelas outras

pessoas de uma mesma cultura. E para ele todo pensamento adulto é

socializado, no sentido de ser construído de tal forma, que se for verbalizado

será compreendido pelo interlocutor.

23

CAPÍTULO II 2.1) Freud

Sobre o tema aprendizagem, especificamente, não vamos encontrar

nenhum texto escrito por Freud. Suas preocupações eram

predominantemente as de um clínico interessado em livrar as pessoas do

peso das neuroses (embora ele tenha descoberto depois que se pode, no

máximo, livrar alguém de seus sintomas e que, no caso das aneuroses,

pode-se apenas atenuá-las!).

No entanto, Freud, por sua própria posição frente ao conhecimento,

gostava de pensar nos determinantes psíquicos que levam alguém a ser um

“desejante” de saber. Nessa categoria incluem-se os cientistas, que devotam

a vida à pergunta por quê, e as crianças , que, a partir de um determinado

momento, bombardeiam os pais com por quês.

Abordar esse tema a partir de uma perspectiva freudiana é, antes de

mais nada, buscar resposta para a seguinte pergunta: o que se busca

quando se quer aprender algo? Só a partir dela pode-se refletir sobre o que

é o processo de aprendizagem, pois o processo depende da razão que

motiva a busca do conhecimento.

Por que a criança pergunta tanto?

A criança pergunta por que chove, por que existem noite e dia, por

que... e todo o resto, responde Freud, está na verdade interessada em dois

porquês fundamentais: por que nascemos e por que morremos, ou, dito do

modo clássico, de onde viemos e para onde vamos.

Vamos acompanhar com Freud a gênese dessas preocupações em

uma criança.

Há, para , um momento capital e decisivo na vida de todo ser

humano: o momento da descoberta daquilo que ele chama de diferença

sexual anatômica. Se, até então, os meninos e meninas acreditavam que

todos os seres humanos eram ou deviam ser providos de pênis, a partir

24desse momento “descobrem” que o mundo se divide em homens e

mulheres, em seres com pênis e seres sem pênis.

Sejamos mais precisos. Essa descoberta não é propriamente uma

descoberta, já que meninos e meninas terão oportunidade, antes dela, de

observar que são diferentes. A diferença está na interpretação dada a esse

fato. Meninos poderiam pensar, por exemplo, que se as meninas não são

iguais a eles, podem vir a sê-lo, quando crescerem. Mas a descoberta

implica entender que, de fato, alguma coisa falta.

No entanto, o que angustia não é a constatação de que algo falta às

mulheres, e pode vir a faltar aos homens. A angústia provém de uma nova

compreensão de antigas perdas à luz desse novo sentimento de perda. “aqui

perdi, e sei agora que também perdi o seio, as fezes...” poderia ser o

“pensamento” inconsciente de uma criança que está fazendo a descoberta

da diferença sexual anatômica.

A essa angústia das perdas Freud chamou de angústia de

castração.

Freud achava, de início, que a pergunta pelas origens era detonada

depois que um irmão nascia, e isso quando a criança já tinha mais ou menos

dois anos (antes, tal conhecimento não tinha esse poder detonador). É claro

que as coisas não são assim tão simples; se assim fosse, os filhos únicos

jamais atravessariam a angústia de castração. Freud mesmo percebeu isso

e buscou determinantes mais estruturais para isso que, a princípio, ele

apenas observou. Essa busca dos determinantes mais estruturais levou-o

justamente a desenvolver melhor um dos aspectos mais importantes de sua

teoria: o complexo de Édipo. Pode-se dizer que a descoberta da diferença

sexual anatômica da criança não depende de sua observação, mas da

passagem pelo complexo de Édipo; e o Édipo é, o processo através do qual

uma menina se “define” como mulher e o menino como homem (ou vice-

versa), depois de terem extraído das relações com o pai e a mãe as

referências necessárias a essa definição.

A criança descobre diferenças que a angustiam. É essa angústia que

a faz querer saber. Só que a abordagem direta é difícil, justamente porque

envolve angústia. Os instrumentos de que a criança pode dispor são o que

25Freud chamou de “investigações sexuais infantis”. Essas investigações são

sexuais, mas não claramente sexuais. Em um relato de Melanie Klein, pode-

se destacar um exemplo dessa afirmação.

“Um menino de mais ou menos 5 anos pergunta à mãe se Deus

existe, ao que ela, depois de algumas evasivas, responde “não”. pergunta

depois ao pai, que afirma acreditar em Deus. Mais tarde, andando na rua

com a irmã, ela lhe diz que precisa perguntar as horas a um passante. Então

o menino lhe diz: vai perguntar a um homem ou a uma mulher?. Ora, replica

a irmã, “tanto faz”. E ele “se perguntar a um homem, terá uma resposta, se

perguntar a uma mulher terá outra!”.

Mais do que sobre a existência de Deus, esse menino extraiu

informações sobre aquilo que ele supõe ser representativo das posições

feminina e masculina, e saiu pela rua (literalmente) aplicando esse novo

conhecimento: homens pensam diferente de mulheres (provavelmente,

“pensará” ele, porque têm pênis!).

Para Freud as primeiras investigações serão sempre sexuais e não

podem deixar de sê-lo;: o que está em jogo é a necessidade que tem a

criança de definir, antes de mais nada, seu lugar no mundo. Esse lugar é, a

princípio, um lugar sexual.

E o que tem isso a ver com a pergunta “de onde viemos, para onde

vamos”?

Acontece que esse lugar sexual é situado, a princípio, em relação aos

pais. Mais do que isso, os pais esperam que ele seja. Em relação ao desejo

dos pais. O “de onde viemos” eqüivale a “qual é a minha origem em relação

ao desejo de vocês?, por que me puseram no mundo, para atender a quais

expectativas e esperando que eu me torne o quê?” (para onde vamos?). de

novo, Édipo está presente.

Assim, as perguntas sobre a origem das coisas estariam na base das

investigações sexuais infantis.

A criança que vai à escola para aprender a ler e escrever não parece

ter nenhuma dessas preocupações.

26Até esse momento – da entrada na escola -, mais ou menos aos sete

anos, algumas coisas poderão ter acontecido com as investigações sexuais

infantis.

O que se espera é que, ao final da época do conflito edipiano, a

investigação sexual caia sob o domínio da repressão. Toda? Não. parte dela

“sublima-se” em “pulsão” de saber associada a “pulsão de domínio” e a

“pulsão de ver”. Palavras de Freud. Enigmáticas, não? e até mesmo, pode-

se dizer, controvertidas. Sem cair em discussões acadêmicas a respeito da

validade conceitual de termos como pulsão de domínio, por exemplo, pode-

se, contudo, extrair daí o mais importante: o desejo de saber associa-se

com o dominar, o ver e o sublimar.

Vamos por partes: sublimar. As investigações sexuais são

reprimidas. A Educação não é a maior responsável por isso. As crianças

deixam de lado a questão sexual por uma necessidade própria. Não porque

lhes dizem que é “feio”, mas por que precisam renunciar a um saber sobre a

sexualidade e porque não podem mais saber sobre a sexualidade, procedem

(não de modo consciente, é claro) a um deslocamento dos interesses

sexuais para os não-sexuais. Desviam, por assim dizer a energia aí

concentrada para objetos não-sexuais Perguntam então sobre ostras coisas

para poder continuar pensando sobre as questões fundamentais.

Freud diz ainda que essa investigação sexual sublimada se associa

com algo que ele chamou, inicialmente, de pulsão de domínio. A princípio

pensava existir em todo ser humano essa pulsão, que, submetida às leis da

constituição do ser humano, se transmudaria em sadismo e agressividade.

Retenha-se o essencial. Saber associar-se com dominar. Encontra-se um

bom exemplo no poema “A mosca azul”, de Machado de Assis.

Um homem fica alucinado com o que vê nas asas de uma mosca.

Para saber o que há lá dentro, disseca-a e a destrói. Do mesmo modo, uma

criança que passa seu tempo caçando bichinhos, cortando-os em pedaços,

pode correr o risco de ser classificada como sádica e agressiva, quando, na

verdade, não está exercendo sua “pulsão de domínio”. Tudo isso se associa

com a idéia de curiosidade. E é importante que o educador esteja ciente

dessa dimensão, presente em todo ato de conhecimento: a dimensão da

27curiosidade “sádica” propiciada pela pulsão de domínio. Não se quer dizer

com isso que se deva aplaudir toda tentativa infantil de sair por aí

decepando bichos. O que se pretende destacar é que o modo de lidar com

isso depende da compreensão que se tenha desses atos.

Para satisfazer aos educadores animados com uma pulsão de saber

mais “intensa”, pode-se ir um pouquinho mais longe no desenvolvimento

teórico da pulsão de domínio. Veja-se novamente “A mosca azul”. Na ânsia

de saber, a personagem destrói, mata, a mosca.

Freud não ficou indiferente a essa dimensão da pulsão de domínio e

localizou aí a ação da pulsão de morte. Para nós, há um susto considerável

quando se percebe a presença da morte em algo sempre tão identificado

com a vida, como é a noção de saber, de conhecimento.

É claro que, diante da manifestação dessa “face mortal” do saber na

conduta investigadora de uma criança, a tendência é negá-la e reprimi-la.

Naturalmente, se é só essa face mortal que uma determinada criança revela,

algo certamente não vai bem, mas, em geral, a pulsão de morte não se

encontra nunca em estado “puro”, apresentando-se antes em combinações

com outras.

Ao descrever o processo de emergência do desejo de saber, foi dito

também que a investigação sexual, agora sublimada, relaciona-se,

igualmente, com o ver.

O visual não é um elemento acessório ou secundário nas esferas das

pulsões sexuais. Ao contrário, é um aspecto constante e constitutivo delas,

como afirmou Mezen numa conferência sobre o olhar, realizada em 1987.

Muito tem sido dito sobre as pulsões oral, anal e fálica, mas, embora menos

conceituada, a pulsão visual tem em relação a elas o mesmo estatuto. Na

constituição da sexualidade, um elemento central estudado por Freud é a

fantasia da cena primária, ou cena de relação sexual entre os pais, na qual

essa relação sexual “é objeto de uma visão pela qual o sujeito imagina (põe

em imagens) a sua origem”. É através dessa fantasia, uma das três

universais, que o sujeito representa não somente sua origem mas também

se imagina personagem, através da identificação com uma das personagens

em cena. O objeto dessa pulsão é, então, essa cena primária imaginada.

28Mas já se disse que essa pulsão, sublimada, transforma-se, após a

associação com a pulsão de domínio, em “pulsão de saber” . transforma-se

em curiosidade agora dirigida, porque sublimada, a objeto geral. “São seus

derivados o prazer de pesquisar, o interesse pela observação da natureza, o

gosto pela leitura, o prazer de viajar (ver coisas diferentes e novas) etc.

O importante a ser ressaltado é a filiação da curiosidade intelectual à

curiosidade sexual, à imagem fantasiada da cena primária. Não é preciso ir

muito longe para estabelecer essa filiação. Basta lembrar o termo bíblico

para designar que houve uma relação sexual: Adão conheceu Eva...

Pode-se dizer, então, que, para Freud, a mola propulsora do

desenvolvimento intelectual é sexual. Melhor dizendo, a matéria de que se

alimenta a inteligência em seu trabalho investigativo é sexual. Ou, nas

palavras de O. Manonni, são restos da sexualidade, na medida em que se

trata da sublimação de parte da pulsão sexual visual. A inteligência emerge

a partir de um apoio sobre “restos sexuais”. É nesse ponto que se situa uma

diferença radical da teoria psicanalítica em relação a qualquer teoria

cognitiva sobre o desenvolvimento da inteligência, incluindo a de Piaget.

A criança quer aprender, contudo, ela não aprende sozinha. È

preciso que haja um professor para que esse aprendizado se realize. Ora,

nem sempre esse encontro é feliz. Então, a pergunta “O que é aprender?”

supõe, para a Psicanálise, a presença de um professor, colocado numa

determinada posição, que pode ou não propiciar a aprendizagem.

O ato de aprender sempre pressupõe uma relação com outra pessoa,

a que ensina. Não há ensino sem professor. Até mesmo o autodidatismo

(visto pela psicanálise como um sintoma)supõe a figura imaginada de

alguém que está transmitindo, através de um livro, por exemplo, aquele

saber. E no caso de não haver sequer um livro ensinando, o aprender como

descoberta aparentemente espontâneo supõe um diálogo interior entre o

aprendiz e alguma figura qualquer, imaginada por ele, que possa servir de

suporte para esse diálogo.

Por isso, a pergunta “O que é aprender?” envolve relação professor-

aluno. Aprender é aprender com alguém.

29Vamos nos concentrar agora nesse com, nesse espaço entre

professor e aluno, deixando completamente de lado os conteúdos que

transitam do professor para o aluno e, eventualmente, do aluno para o

professor. Pouco importa agora que esse professor esteja ensinando, por

exemplo, o Descobrimento do Brasil, mesmo porque esses conteúdos não

têm nenhum valor de verdade. As gerações de brasileiros hoje com 40 anos

ou mais aprenderam que o Brasil foi descoberto “por acaso”, em razão de

uma calmaria que teria desviado a frota de Cabral de destino. Para as

gerações mais novas, isso parece ser um absurdo inimaginável. Não há

dúvida de que o Brasil não foi “descoberto”, mas tomado intencionalmente

pelos portugueses.

Será que, por isso, devemos jogar fora todo o velho curso primário? O

que restou daqueles tempos em que todo dia se ia para a escola escutar

daquela primeira professora ensinamentos dos quais não se acredita mais?

Por acaso os alunos de ontem denigrem hoje a imagem dessa primeira

professora, ou ela se conserva como algo precioso, uma marca presente na

busca de conhecimento? Não é preciso dizer qual é a resposta dos adultos

de hoje. O discurso dos primeiros professores calou fundo em todos os que

o autorizaram e nele acreditaram. Mas, como se vê agora, aquele discurso

não se impôs por ele mesmo, pela dose de verdade que o acompanhou

(muito ao contrário, o “descobrimento” casual do Brasil era uma deslavada

mentira!). evidentemente, os critérios para avaliação do que era verdadeiro

eram assentados pelo próprio professor, e nós, mais uma vez,

acreditávamos neles. Então por quê? Se não é a verdade por eles

anunciada, então qual é a fonte da qual extraem seu poder de

convencimento, sua credibilidade?

Freud nos mostra que um professor pode ser ouvido quando está

revestido por seu aluno de uma importância especial. Graças a essa

importância, o mestre passa a ter em mãos um poder de influência sobre o

aluno. Essa é, naturalmente, uma idéia bastante conhecida, assim como é

também conhecida a fonte atribuída por Freud a esse poder de influência.

“No decorrer do período da latência, são os professores e geralmente as

pessoas que têm a tarefa de educar que tomarão para a criança o lugar dos

30pais, do pai em particular, e que herdarão os sentimentos que a criança

dirigia a esse último na ocasião da resolução do complexo de Édipo. Os

educadores, investidos da relação afetiva primitivamente dirigida ao pai, se

beneficiarão da influência que esse último exercias sobre a criança.

Pode-se perceber que a ênfase dada por Freud ao estudo da relação

entre um professor e um aluno não estava no valor dos conteúdos cognitivos

que transitam entre essas duas pessoas – vale dizer, na informação que é

transmitida de um para o outro. Sim, a ênfase freudiana está concentrada

sobretudo nas relações afetivas entre professores e alunos. A citação acima

menciona justamente “uma relação afetiva primitivamente dirigida ao pai”

bem, isto está correto, mas até certo ponto. Os esquemas desenvolvidos

posteriormente pelo próprio Freud apontam numa direção um pouco

diferente, nos quais a palavra afeto deixa de ter tanta importância.

Por isso, pode-se dizer que, da perspectiva psicanalítica, não se

focalizam os conteúdos, mas o campo que se estabelece entre o professor e

seu aluno, que estabelece as condições para o aprender, sejam quais forem

os conteúdos.

Em Psicanálise, dá-se a esse campo o nome de transferência.

31

CAPÍTULO III 3.1) A importância da educação pré-escolar

para o desenvolvimento do sujeito cognoscente

Os estudos sobre Teoria Construtivista começaram com Piaget

(1896– 1980), que foi um biólogo com preocupações eminentemente

epistemológicas (teoria do Conhecimento), numa perspectiva interdisciplinar.

A grande pergunta que formulou foi: “Como se passa de um

conhecimento menos elaborado?”

Pesquisou e elaborou uma teoria sobre os mecanismos cognitivos da

espécie (sujeito epistêmico) e dos indivíduos (sujeito psicológico).

Piaget, entendendo ser praticamente impossível remontar aos

primórdios da humanidade e compreender qual foi, efetivamente, o processo

de desenvolvimento cognitivo desde o homem primitivo até os dias atuais

(Filogênese), voltou-se para o desenvolvimento da espécie humana, do

nascimento até a idade adulta (Ontogênese).

Assim se explica o fato de que, para conhecer como o sujeito

epistêmico (sujeito que conhece) constrói conhecimento, tenha recorrido à

Psicologia como campo de pesquisa. Ao elaborar a teoria psicogenética,

procurou mostrar quais as mudanças qualitativas porque passa a criança,

desde o estágio inicial de uma inteligência prática (período sensório-motor),

até o pensamento formal, lógico-dedutivo, a partir da adolescência.

Segundo Piaget, o conhecimento não pode ser concebido como algo

predeterminado desde o nascimento (inatismo), nem como resultado do

simples registro de preocupações e informações (empirismo). Resulta das

ações e interações do sujeito com o ambiente onde vive. Todo o

conhecimento é uma construção que vai sendo elaborada desde a infância,

através das interações do sujeito com os objetos que procura conhecer,

sejam eles do mundo físico ou cultural.

Segundo Piaget, o conhecimento resulta de uma interelação

entre o sujeito que conhece e o objeto a ser conhecido.

32Por uma lado, existe um sujeito ativo que, em todas as etapas de sua

vida, procura conhecer e compreender o que se passa à sua volta. Mas não

o faz de forma imediata, pelo simples contato com os objetos. Suas

possibilidades, a cada momento, decorrem do que Piaget denominou

esquemas de assimilação, ou seja, esquemas de ação (agitar, sugar,

balançar) ou operações mentais (reunir, separar, classificar, estabelecer

relações), que não deixam de ser ações mas que se realizam no plano

mental.

Estes esquemas se modificam como resultado do processo de

maturação biológica, experiências, trocas interpessoais e transmissões

culturais.

Por outro lado, os objetos do conhecimento apresentam propriedades

e particularidades que nem sempre são assimiladas (incorporadas) pelos

esquemas já estruturados no sujeito.

Isto ocorre, ou porque o esquema é muito geral e não se aplica a uma

situação particular, ou porque é ainda insuficiente para dar conta de um

objeto mais complexo.

“Assim, uma criança que já construiu o esquema de sugar, assimila a

mamadeira, mas terá que modificar o esquema para sugar a chupeta, comer

com colher etc.”.

“Outro exemplo: um aluno que já construiu o conceito de

transformação, terá que compreendê-lo tanto em situações específicas da

vida cotidiana, como em conteúdos de História, Geografia, Biologia etc.”.

A esse mecanismo de ampliação ou modificação de um esquema de

assimilação, Piaget chamou de acomodação. E fica claro que, embora seja

“provocado” pelo objeto, é também possível graças à atividade do sujeito,

pois é este que se modifica para a construção de novos conhecimentos.

O conteúdo das assimilações e acomodações variará ao longo do

processo do desenvolvimento cognitivo, mas a atividade inteligente é

sempre um processo ativo e organizado de assimilação do novo ao já

construído, e de acomodação do construído ao novo.

Fica assim estabelecida a relação do sujeito conhecedor e do objeto

conhecido. Por aproximações sucessivas, articulando assimilações e

33acomodações, completa-se o processo a que Piaget chamou de adaptação.

A cada adaptação realizada, novo esquema assimilador se torna estruturado

e disponível para que o sujeito realize novas acomodações e assim

sucessivamente.

O que promove este movimento é o processo de equilibração,

conceito central na teoria construtivista.

Diante de um desafio, de um estímulo, de uma lacuna no

conhecimento, o sujeito se “desequilibra” intelectualmente, fica curioso,

instigado, motivado e, através de assimilações e acomodações, procura

restabelecer o equilíbrio que é sempre dinâmico, pois é alcançado por meio

de ações físicas e/ou mentais.

O pensamento vai se tornando cada vez mais complexo e

abrangente, interagindo com objetos do conhecimento cada vez mais

abstratos e diferenciados.

As situações concretas presentes nos exemplos a seguir, procuram

ilustrar pressupostos e explicações teóricas e apontar implicações que

ressaltem a importância de compreender a relação teoria-prática.

3.2) Para que educar?

Para Piaget, ter assegurado o direito à educação, significa ter

oportunidades de desenvolver, tanto do ponto de vista intelectual, como

social e moral.

Cabe à sociedade, através de instituições como a família e a escola,

propiciar experiências, trocas interpessoais e conteúdos culturais, que

interagindo com o processo de maturação biológica, permitam à criança e ao

adolescente atingir capacidade cada vez mais elaboradas de conhecer e

atuar no mundo físico e social.

Como enfatiza Piaget, a lógica, a moral, a linguagem e a

compreensão de regras sociais não são inatas, ou seja, pré-formadas na

criança, nem são impostas de fora para dentro, por pressão do meio. São

construídas por cada indivíduo ao longo do processo do desenvolvimento,

processo este entendido como sucessão de estágios que se diferenciam um

34dos outros, por mudanças qualitativas. Mudanças que permitem, não só a

assimilação de objetos de conhecimento compatíveis com as possibilidades

já construídas, através da acomodação, mas também sirvam, de ponto de

partida para novas construções (adaptação).

Para que este processo se efetive, é importante considerar o principal

objeto da educação que é a autonomia, tanto intelectual como moral.

Alguns exemplos ilustrarão o que Piaget entende por autonomia.

“Um aluno que tinha decorado a tabuada de multiplicar, sem saber o

que esta significava em termos de operação mental, freqüentemente

esquecia ou cometia erros e, mesmo alertado não encontrava o ressaltado

correto.

Quando teve oportunidade de compreender que as multiplicação é a

soma de parcelas iguais, passou a ser capaz de encontrar qualquer

resultado. Se tinha dúvida sobre quanto é 8x7, multiplicava 7x7=49, somava

mais sete e acertava: 8x7=56.

O aluno passou a não depender exclusivamente da memória, ficando

autônomo para resolver os desafios por seus próprios meios, ou seja,

utilizando uma operação mental já construída.

Esta capacidade construída lhe permite, agora, compreender se o

enunciado de um problema de matemática indica a necessidade de efetuar

uma conta de multiplicação ou não.

Não faria como um aluno das primeiras séries do 1º grau que, ao

fazer o dever, perguntava à mão, que estava em outro local da casa “Mãe,

este problema é de somar ou de multiplicar?” – revelando depender da

opinião de outra pessoa para agir, ou seja, sendo heterônomo no campo

intelectual.

Aquela construção permitiu-lhe compreender, com mais facilidade,

que a divisão também se faz por parcelas iguais e, finalmente, compreender

porque 8x0=0!!

Outro exemplo:

Durante uma aula de Geografia, a professora e alunos da 8ª série

lêem um texto do livro didático, sobre aspectos socio-econômicos do Oriente

Médio.

35Dentre outras informações o texto afirma que os países ali localizados

se caracterizam por serem muito ricos em petróleo, e que suas populações

são muito pobres, muitas delas nômades, vivendo em cabanas no deserto.

Após a leitura, inicia-se um exercício de fixação das informações.

Um aluno pergunta: “Professora, se existe tanto petróleo, se o país é

tão rico, por que o povo é tão pobre?”

Este aluno foi capaz de perceber, autonomamente, uma contradição,

não aceitando passivamente as informações.

Sua curiosidade lhe permitiu avançar na compreensão de relações

entre riquezas naturais (petróleo) e estrutura social, modelo sócio-econômico

e político e distribuição de renda etc.

Ser autônomo, do ponto de vista moral, significa ser capaz de agir a

partir de valores morais, conscientemente assumidos como os mais corretos.

Como afirma Kamii: A essência da autonomia é que as crianças se

tornem capazes de tomar decisões por elas mesmas. Autonomia não é

a mesma coisa que liberdade completa. Autonomia significa ser capaz

de considerar os fatores relevantes para decidir qual deve ser o melhor

caminho da ação. Não pode haver moralidade quando alguém

considera somente o seu ponto de vista. Se também considerarmos o

ponto de vista das outras pessoas, veremos que não somos livres para

mentir, quebrar promessas ou agir irrefletidamente” (Kamii, 1986:72)

Para que uma pessoa ultrapasse a heteronomia que significa agir ou

fazer julgamentos, sem questionar os valores que os sustentam, precisa ser

encorajada a construir por si mesma seus valores.

Uma criança heterônoma considera que é pior mentir para um adulto,

do que mentir para uma criança, porque o adulto pode descobrir e puni-la.

Uma criança que já atingiu a moralidade autônoma, considera que é

errado mentir tanto para os adultos quanto para as crianças, pois, em

qualquer dos casos, se está enganando o outro.

As crianças que são submetidas, tanto na família como na escola, a

punições arbitrárias, sem sentido, têm sua heteronomia reforçada. Quando

se habituam a fazer suas obrigações, só quando são recompensadas, não

36compreendem o valor intrínseco de suas ações e se tornam, muitas vezes,

incapazes de se autogovernarem.

Se, ao contrário, as crianças e adolescentes forem incentivados a

trocar pontos de vista entre si e com os adultos, forem levadas a refletir

sobre as conseqüências de seus atos para si e para os outros, discutirem os

significados dos valores, terão mais chances de se tornarem autônomas.

No Brasil, quantas coisas precisaram acontecer, para que a frase “O

importante é levar vantagem em tudo, certo?” (Lei de Gerson) começasse a

ser questionada, e fossem avaliadas criticamente as implicações desta

atitude individualista e, até certo ponto, desonesta?

37

CAPÍTULO IV

Intervenções Psicopedagógicas 4.1) Conceito geral

O deslocamento do enfoque clínico ou assistencial da intervenção

para o enfoque educacional, o questionamento de perspectivas estritamente

individuais na abordagem das dificuldades enfrentadas pelos alunos nos

processos de aprendizagem e na conceituação dos próprios serviços de

intervenção psicopedagógica, como recursos especializados para a

instituição escolar em seu conjunto, têm favorecido uma nova postura dos

psicopedagogos em relação à escola, assim como uma progressiva

inserção, quando possível, nos âmbitos de coordenação e de planejamento

das propostas educacionais.

Deste modo, os psicopedagogos têm diante de si um campo de

trabalho e necessidades de formação que não eram valorizados da mesma

forma há apenas duas décadas, quando a intervenção centrava-se de forma

quase exclusiva na sala de aula ou, ainda, em alunos concretos, e quando

os interlocutores dos profissionais de psicopedagogia eram o professor de

educação especial ou os regentes daqueles alunos.

4.2) Principais queixas na educação pré-escolar

Para que uma criança “aprenda”, é necessário que ela tenha o desejo

de aprender. A linguagem popular diz: “O desejo e o amor não se

comandam”. É nisso, no entanto, que acreditam muitos pais que querem

“motivar seus filhos e tudo fazer para que eles se interessem pela escola”.

Não é preciso “fazer” nem impor quando o “saber” adquiriu o brilho do objeto

do desejo para os pais, não é preciso imperativo algum para que a criança

se apodere desse saber.

384.3) A demanda dos pais

A criança ouve bem cedo a demanda que lhe é feita: ela deve

aprender, ela deve ser bem-sucedida. Desde a pré-escola, alguns pais se

inquietam com as performances intelectuais de seus filhos e com suas

possibilidades de sucesso; querem, às vezes, fazê-los “pularem” o último

ano da pré-escola, pois um ano de avanço é sempre útil para a preparação

dos concursos mais tarde! A criança percebe muito bem que ela tem de

responder a uma expectativa. O sucesso é exatamente esse objeto de

satisfação que ela deve proporcionar aos pais. Boas notas, bons curriculuns

são destinados a dar prazer. Ela pode responder docilmente a essa

demanda durante um certo tempo, mas, cedo ou tarde, sozinha diante da

folha branca o da tarefa a desempenhar, ela será confrontada com seu

próprio desejo.

Além dessa demanda dos pais, há a pressão social que exerce sobre

todos e gera uma angústia surda que a criança tem dificuldade em

identificar.

4.4) A demanda do corpo docente

Esse discurso em que o sucesso é desejado e esperado não é

sustentado somente pelos pais; as crianças o ouvem também de seus

professores, que têm, um contrato a cumprir. Eles também são submetidos a

um imperativo de sucesso, a turma pela qual são responsáveis deve ser

suficientemente boa para que, no final do ano, a maioria dos alunos passe

para o ano seguinte. São, portanto, os bons resultados dos alunos que

fazem os bons professores serem reconhecidos pela hierarquia: direção,

inspeção etc., e pelos pais dos alunos. A angústia que essa competitividade

gera parece mais particularmente nociva durante os primeiros anos da

aprendizagem escolar. De fato, a inquietude ligada às performances suscita

na criança um questionamento permanente: Conseguirá passar de ano?

Terá “maturidade” suficiente? Possuirá as capacidades intelectuais que se

supunha que se tivesse? Os julgamentos sobre ela terão sérias

39conseqüências e serão, às vezes, determinantes para o prosseguimento da

escolaridade, pois podem modificar e até mesmo deteriorar grandemente as

relações com o ambiente. A criança nem sempre faz separação entre um

julgamento de valor e o amor que alguém lhe dedica. Ser um mau aluno

eqüivale para ela ser um mau filho. Será necessário acrescentar que a ferida

narcísica vivida pelos pais de uma criança precocemente considerada

deficiente mental pode despertar neles uma ferocidade insuspeitada e

medidas de retorsão sem relação com a natureza do distúrbio?

40

CAPÍTULO V 5.1) Possibilidades de intervenção

São vários os autores que consideram que o construtivismo, em

sentido amplo e, concretamente, a Concepção Construtivista da

Aprendizagem Escolar e do Ensino (Coll, 1990; 1991b; 1997) constitui um

marco adequado não apenas para explicar a aprendizagem que ocorre na

escola, mas para erigir-se em instrumento de análise da intervenção

psicopedagógica (Bassedas, 1988; Bassedas e outros, 1991; Huguet, 1993;

Monereo, 1996; Monereo e Solé, 1996; Solé, 1997).

Embora não possamos entrar nessa ampla questão, talvez alguns

breves comentários a esse respeito permitam justificar a afirmação do

parágrafo anterior. Como sabemos a Concepção

Construtivista da Aprendizagem Escolar e do Ensino considera a

educação como um processo social e socializador, mediante o qual os

grupos sociais promovem a socialização e o desenvolvimento de seus

membros mais jovens. A educação escolar, como processo formalizado,

planejado e intencional, persegue tal objetivo mediante a organização de

experiências e situações que permitam a elaboração, com a ajuda de outros,

de significados pessoais sobre os conceitos, valores e procedimentos da

cultura que configuram o currículo escolar. Essa elaboração, que se

caracteriza na realização de aprendizagens tão significativas quanto

possível, exige do aluno uma atividade intelectual de tipo auto-estruturadora,

que se incorpora em processos interpessoais professor/aluno e aluno/aluno,

nos quais a construção do conhecimento torna-se possível graças ao

exercício da influência educacional.

A lógica e, inclusive, o “senso comum” que se extrai da injusta

recapitulação de algumas idéias mais conhecidas Concepção Construtivista

podem dar a impressão equivocada de que se trata de uma explicação

simples, de que a familiaridade com estes enunciados já proporcionam seu

conhecimento e possibilidade de uso. Não há nada mais afastado da

realidade. A Concepção Construtivista é um conjunto articulado de princípios

41– embora ainda imparcial e inacabado – que permite a análise das situações

educacionais e a tomada de decisões inerentes ao planejamento, ao

desenvolvimento e a avaliação do ensino. Pressupõe uma posição

ideológica (o caráter socializador e progressista que se atribui à educação) e

uma posição intelectual, que leva a explorar conceitos e princípios cuja

origem situa-se em teorias diversas, mas que dividem o fato de assumir o

“construtivismo”! como princípio epistemológico; tais princípios e conceitos

são reinterpretados a partir dessas posições, em um processo que gera uma

explicação peculiar para um problema também peculiar. A simplicidade é

apenas aparente; encerra, na verdade, uma complexa trama de relações

entre conhecimento psicológico e educacional de enorme utilidade para a

intervenção educacional e psicopedagógica, assim como para aprofundar

conceitos diversos que, devido ao uso comum, têm sido, às vezes,

banalizados.

A Concepção Construtivista da Aprendizagem Escolar e do Ensino

aparece, então, como explicação e instrumento de análise daquilo que

ocorre em um processo educacional concreto; como instrumento, é

suscetível de ser usada pelo psicopedagogo para compreender a situação e

encontrar meios de intervir nela. É conveniente, entretanto, Ter consciência

de que não funciona somente como instrumento de análise. Na verdade,

partir de uma visão como esta, ou partir de outra, vai determinar o campo de

visão do psicopedagogo, o que olha, o que vê, o que considera um problema

e o que lhe parece não sê-lo; determina, também, aquilo que considera

necessário atender e estabelece uma saída ou outra para a solução que

enfrenta.

Na explicação construtivista, a aprendizagem (e a ausência ou

dificuldade de aprendizagem) de um aluno ou de um grupo de alunos não é

uma característica inerente a eles; é entendida mais como um produto de

uma feliz confluência (ou de uma disfunção) – entre os componentes

nucleares de todo processo educacional: os alunos, cada um com suas

condições pessoais, os conteúdos que devem ser objeto de apropriação por

parte daqueles, e as respostas e as medidas educacionais que se articulam

para alcançar essa apropriação. Parece óbvio, então, a partir dessa

42explicação, que analise a analisar e a intervir sobre um dos componentes

desse núcleo, mas exige dotar-se de instrumentos para entender as relações

que ocorrem entre todos eles e intervir para otimizá-las.

No sentido que acabamos de expor parece evidente que, ao optar

pela explicação da aprendizagem, do ensino e do desenvolvimento que

subjaz à concepção construtivista como instrumento para abordar o objeto

de intervenção, está havendo uma decisão de segundo nível que permite

falar não somente de enfoque educacional, mas de modelo educacional

construtivista de intervenção psicopedagógica.

Finalmente, os conceitos-chave da concepção construtivista podem

ser considerados instrumentos para articular a relação entre professores e

psicopedagogo, para a construção progressiva da colaboração entre eles.

43

CAPÍTULO VI

6.1) CONCLUSÃO Diante de tudo que foi lido concluí-se que os autores acima citados

muito contribuíram para elucidar o processo de desenvolvimento mental da

criança e diante disso a importância da intervenção psicopedagógica se faz

de acordo com muitas variáveis, entre elas a que dizem respeito à instituição

destinatária do assessoramento, pois é algo mais do que “ lugar físico “ o

local onde se realiza a intervenção; é objetivo da mesma e, em boa medida,

determinante de seus limites e de sua capacidade de transformação. É

analisando a instituição que o psicopedagogo deve avaliar como realizar sua

intervenção.

Em geral, nas instituições de ensino, são os professores que se

dirigem ao psicopedagogo para dizer que um determinado aluno apresenta

dificuldades, seja de aprendizagem, seja de relações ou ambos. Pode

também ocorrer de ser os pais ou familiares que solicitem a ajuda do

psicopedagogo.

É importante levar em consideração que a demanda de intervenção é

procedida pelos educadores no sentido de superar as dificuldades que

existem com os recursos habituais. O que foi realizado até o momento, os

indicadores que levam a constatar sua insuficiência e a interpretação do fato,

elaborado por quem encaminhou, são aspectos importantíssimos para

compreender o ponto de partida da situação.

Muitos profissionais tem elaborado instrumentos que buscam obter

informações disponíveis nesse momento sobre os alunos e sobre a situação

na qual se manifestam as dificuldades. Estes instrumentos, como roteiro por

exemplo, exigem que o professor ou quem encaminhou exponham dados

relevantes sobre o aluno: motivo da demanda; ações realizadas; avaliação

das competências dos alunos em diferentes áreas, avaliação de suas

capacidades de relação, da percepção que tem de si mesmo, vivência de

suas dificuldades, atitudes diante das tarefas... e portanto possuem

44características que o tornam interessantes. Primeiro pelo fato de evitar o

esquema de “ encaminhamento/depósito de caso “ no psicopedagogo;

mediante solicitação que este realiza ao professor lhe transmite a idéia de

co-responsabilidade, e ao fazer isso diz a ele que sua visão é necessária

para abordar o problema. Por outro lado, a solicitação que estes dados

sejam expressos por escrito ajuda a refletir sobre a situação em termos mais

concretos e específicos. É possível transformar apreciações genéricas

como: “ não compreende, não é capaz de prestar atenção “ em outras mais

precisas “ não entende o que lê, mas se isso lhe é dito, não tem nenhuma

dificuldade; não presta atenção no conteúdo, não demonstra nenhum

interesse, somente parece motivado pelo trabalho de ciências sociais. A

dinâmica das escolas deixa, às vezes, pouco tempo para reflexão é os “

roteiros “ de encaminhamento contribui para encontrá-lo.

Além disso deve-se incluir nesse roteiro questões que levem a

observar não somente as dificuldades, mas as competências dos alunos.

É preciso que os professores compreendem que não se trata de

responder aos alunos de forma mecânica: o importante é a reflexão que

provocam e a compreensão compartilhada que permitam ao professor e o

psicopedagogo, por isso uma boa estratégia é utilizar o roteiro e fazer de seu

cumprimento uma tarefa conjunta.

45

BIBLIOGRAFIA

SOLÉ, Isabel. Orientação Educacional e Intervenção Psicopedagógica. Porto

Alegre: Artmed, 2001,

RAPPAPORT, Clara Regina; FIORI, Wagner da Rocha e DAVIS, Cláudia.

Teorias do desenvolvimento. São Paulo: EPV, Volume1

CORDIÉ, Anny. Os atrasados não existem. Porto Alegre: Artes Médicas,

1996, v1.

KUPFER, Maria Cristina. Freud e a educação. São Paulo: editora scipione,

1989, v 14.

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. Multirio – Núcleo curricular

básico. Rio de Janeiro: 1996.

46

ÍNDICE

AGRADECIMENTOS ................................................................................. 03

DEDICATÓRIA ........................................................................................... 04

RESUMO..................................................................................................... 05

METODOLOGIA ......................................................................................... 06

SUMÁRIO................................................................................................... 07

INTRODUÇÃO............................................................................................ 08

CAPÍTULO I

Fases do Desenvolvimento Mental da Criança em Idade Pré-escolar 10

1.1 PIAGET 10

1.2 ALGUNS CONCEITOS FUNDAMENTAIS 12

1.3 HEREDITARIEDADE 13

1.4 ADAPTAÇÃO 13

1.5 ESQUEMA 15

1.6 EQUILÍBRIO 17

1.7 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS PRINCIPAIS PERÍODOS DO DESENV. 18

CAPÍTULO Ii

2.1 FREUD 23

CAPÍTULO III

A importância da Educação Pré-escolar para o Desenv. do Sujeito Cognoscente 31

3.1 PARA QUE EDUCAR? 33

CAPÍTULO IV

INTERVENÇÕES PSICOPEDAGÓGICAS 37

4.1 CONCEITO GERAL 37

4.2 PRINCIPAIS QUEIXAS NA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR 37

4.3 A DEMANDA DOS PAIS 38

4.4 A DEMANDA DO CORPO DOCENTE 38

CAPÍTULO V

5.1 POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO 40

CAPÍTULO VI

6.1 CONCLUSÃO 43

BIBLIOGRAFIA 45

ÍNDICE 46

FOLHA DE AVALIAÇÃO 47

ANEXOS 48

47

Folha de avaliação

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

Projeto A Vez do Mestre

Pós-Graduação “Lato Sensu”

TÍTULO DA MONOGRAFIA:

“A IMPORTÂNCIA DA INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA PARA DIMINUIÇÃO DO FRACASSO ESCOLAR NA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR”

Data da entrega: _______________________________________

_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________

Avaliado por: _______________________________Grau ______________.

Rio de Janeiro _____de _______________de 20___

48

ANEXOS