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DIREITOS HUMANOS PARA AS COMUNIDADES ISOLADAS NO PANTANAL DE
CORUMBÁ, MS
Francisca Renata Oliveira 1
Profª Drª Claudia Araújo de Lima 2
RESUMO
A declaração Universal dos Direitos Humanos em (1948) tornou-se um documento norteador,
fundamentando muitas constituições e convenções posteriores à sua criação e sendo um marco
fundamental para a história dos direitos humanos. A garantia desses direitos para grupos
minoritários tem sido um dos pontos relevantes nas discussões atuais. No Brasil, o terceiro
Plano Nacional de Direitos Humanos, também trouxe grande avanço nessa área. O discurso de
defesa e implantação dos direitos do homem, embora seja defendido há alguns anos no país,
demonstra que sua efetivação tem caminhado no mesmo ritmo que a democracia, sendo seu
sucesso relacionado às tentativas de consolidação do estado democrático. Desse modo, este
artigo propõe a uma breve análise de projetos e ações que promovem os direitos humanos para
os povos que habitam as regiões alagadas no Pantanal de Corumbá-MS no período 2005 a 2017,
no que diz respeito ao acesso à educação básica, tendo como tema gerador as reflexões
elaboradas no decurso da disciplina Educação e Direitos Humanos, oferecida pelo Programa de
Pós-graduação em Educação – Educação Social da Universidade Federal de Mato Grosso do
Sul/UFMS, Campus Pantanal. As comunidades de recorte para este estudo foram: Paraguai
Mirim, São Francisco, Barra do São Lourenço e Serra do Amolar, localidades onde o acesso se
dá apenas via embarcações ou por avião. Foi possível identificar que a renda familiar dessa
população é proveniente, na sua grande parte, de programas sociais federais e também da coleta
de iscas para pesca.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Educação do campo. Escolas das águas.
1. INTRODUÇÃO
1 Pedagoga. Especialista em Educação do Campo. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação –
Educação Social da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/Campus do Pantanal. Pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares em Políticas Públicas, Direitos Humanos, Gênero, Vulnerabilidades e
Violências – NEPI/PANTANAL – UFMS/CPAN. 2 Pedagoga. Mestre e Doutora em Saúde Pública. Professora Adjunta do Programa de Pós-Graduação em Educação
– Educação Social, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus do Pantanal. Coordenadora e
Pesquisadora Interdisciplinares em Políticas Públicas, Direitos Humanos, Gênero, Vulnerabilidades e Violências
– NEPI/PANTANAL – UFMS/CPAN.
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Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), em seu artigo 32,
diz que a formação do cidadão dar-se-á mediante “o desenvolvimento da capacidade de
aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo”. Para
que isso ocorra, é fundamental que todo cidadão tenha acesso à educação e condições adequadas
para poder estudar, sendo, portanto, um direito seu e como tal deve ser assegurado em todos os
níveis escolares.
Sabendo da importância da garantia desse direito, este artigo se propõe a apresentar os
projetos e programas atuantes no Pantanal sul-mato-grossense que estão relacionados à
promoção do direito à educação, contemplando as ações de cunho governamental e não-
governamental realizados na região. Ainda, para melhor compreensão, é necessário, apontar as
questões que abarcam os Direitos Humanos, sendo fundamental considerarmos os
apontamentos feitos por Vera Candau (2012,p.01) que os apresenta como: “afirmados ou
negados, exaltados ou violados, eles fazem parte da nossa vida individual, comunitária e
coletiva”. Essa abordagem da autora nos permite elaborar uma linha condutora que nos auxilia
ao pesquisarmos, discutirmos e propormos ações em defesa dos Direitos Humanos. Sobre os
aspectos históricos do reconhecimento dos direitos de cada indivíduo, temos a Declaração
Universal dos Direitos humanos (1948) como primeiro documento sobre os direitos do homem
a ser elaborado em âmbito internacional. Anterior à Declaração Universal, tivemos a Revolução
Francesa em 1789, que colocou na história ocidental os princípios de liberdade, igualdade e
fraternidade (BOBBIO, 2004), e, com certeza, esta veio a influenciar muitas reivindicações em
prol dos direitos do homem.
A declaração Universal dos Direitos Humanos tornou-se um documento norteador,
fundamentando muitas constituições e convenções posteriores à sua criação e sendo um marco
fundamental para a história dos Direitos Humanos em âmbito mundial. Aos poucos os direitos
foram se transformando e multiplicando, Norberto Bobbio (2004) nos revela que estes passaram
por alguns processos, como de “direitos de liberdade” para “direitos políticos” e “direitos
sociais”. Deixou-se de generalizar os direitos para o “indivíduo humano” para “sujeitos
diferentes”. Sendo assim, os direitos passam a ser pensados por categorias como: família,
minorias étnicas e religiosas.
Ainda dentro deste processo de crescimento dos direitos apresentado por Bobbio
(2004), temos a explicação sobre o surgimento das iniciativas sobre a diversidade, pois “a
mulher é diferente do homem; a criança, do adulto; o adulto, do velho; o sadio, do doente; o
doente temporário, do doente crônico; o doente mental, dos outros doentes; os fisicamente
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normais, dos deficientes, etc (BOBBIO,2004,P.34).” e seguindo essa linha cronológica sobre
os direitos aos diferentes temos:
[...] em 1952, a Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher; em 1959, a
Declaração da Criança; em 1971, a Declaração dos Direitos do Deficiente
Mental; em 1975, a Declaração dos Direitos dos Deficientes Físicos; em 1982, a primeira Assembleia Mundial, em Viena, sobre os direitos dos anciãos, que
propôs um plano de ação aprovado por uma resolução da Assembleia da ONU
em 3 de dezembro. (BOBBIO, 2004, p. 34).
O autor em questão nos traz um quadro sobre a multiplicação dos direitos que se deu nos
quarenta anos seguintes a promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Norberto Bobbio (2004) nos relata ainda que os direitos do homem estão em constante
modificação, caminhando de acordo com as condições históricas, dependendo dos
“carecimentos e dos interesses, das classes no poder”. É por essas questões que temos
acompanhado o impacto tanto da presença quanto da ausência das políticas de governo que
deveriam ter se consolidado como políticas de estado em favor da implantação das ações que
garantem os Direitos Humanos que atendam a todos os grupos.
2. DESENVOLVIMENTO
Este artigo é resultado dos estudos feitos em uma das disciplinas do curso de pós-
graduação em Educação, com área de concentração em Educação Social, ofertado pela
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul(UFMS), campus Pantanal. A partir das
contribuições teóricas dos autores estudados na disciplina de Educação e Direitos Humanos,
como Norberto Bobbio, Vera Maria Candau, Susana Beatriz Sacavino, a pesquisa em artigos
publicados na área, somadas com as vivências enquanto docente em uma das escolas no
Pantanal, que atendia a população ribeirinha, foi possível fazer uma reflexão sobre a questão
dos Direitos Humanos para as comunidades isoladas, em que se aborda o acesso ao direito à
educação. Além dos estudos sobre a produção bibliográfica em Direitos Humanos, também
foi necessário a busca por produções que possibilitassem entender os aspectos geográficos do
Pantanal para compreender aspectos da vida da população que reside nessa região.
Foi realizado um levantamento de informações relacionadas à proposta de ampliação
da oferta da educação para as comunidades que estão em ambientes considerados do campo,
caso das populações que residem no Pantanal e que são o foco deste trabalho. Desse modo o
Plano Nacional de Educação (2014) e Plano Estadual de Educação do Estado de Mato Grosso
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do Sul (2014), foram consultados e estudados, incluindo os documentos municipais, que
também trouxeram grande contribuição para o agrupamento das informações sobre a Educação
no Pantanal.
Antes de se aprofundar nas questões que envolvem direitos humanos para as
comunidades isoladas no Pantanal, é válido apresentar o histórico de luta e conquista dos
direitos como um todo na sociedade brasileira.
3. DIREITOS HUMANOS NO BRASIL: UMA HISTÓRIA DE LUTA
O discurso de defesa e implantação dos Direitos do homem, embora venha sendo
defendido há alguns anos em nosso país, o seu crescimento como direito efetivo caminha com
a mesma dificuldade que caminha a nossa democracia (Sacavino, 2009). Para exemplificar este
processo basta relembrar alguns períodos históricos do nosso país.
Fazendo esse recorte de lembranças, temos na história o período da era Vargas, 1930
a 1945, que foi marcado por fortes repressões aos ideais democráticos e de liberdade. Décadas
anteriores ao governo de Getúlio Vargas, o Brasil vivenciou momentos importantes, pois foram
marcantes as iniciativas de movimentos sociais que reivindicavam melhores condições de vida
à população brasileira. No que se refere à educação, destaca-se o movimento dos anarquistas.
Os anarquistas, grupo que tinham a cultura como prioridade, criticavam as estratégias paliativas
de instrução pública e defendiam uma proposta de educação libertária, e pela qual seria possível
construir uma sociedade justa e igualitária (GHIRALDELLI, 1987). No entanto, os anarquistas
e suas ideias libertárias de educação foram reprimidas pelo regime totalitário de Getúlio Vargas
junto com demais grupos de movimentos sociais que lutavam por melhores condições de vida.
No percurso dos atentados à democracia tivemos a ditadura militar 1964 a 1985, e anterior a
este período, o Brasil vinha se destacando com propostas de Reformas Sociais do Governo João
Goulart (TOLEDO, 2004), que viabilizariam uma redistribuição de renda, garantindo assim
melhores condições de vida para a grande maioria da população que era grupo dos desvalidos
de educação, saúde, emprego e moradia.
Mais apropriado seria então afirmar que 1964 significou um golpe contra a
incipiente democracia política brasileira; um movimento contra as reformas
sociais e políticas; uma ação repressiva contra a politização das organizações
dos trabalhadores (no campo e nas cidades); um estancamento do amplo e rico debate ideológico e cultural que estava em curso no país. (TOLEDO, 2004, p.
15).
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Porém, como a história bem nos diz, essas ideias foram vistas como ameaça e foram
duramente repreendidas com o golpe militar em 1964 e os anos que se seguiram marcaram
novamente uma ruptura com as iniciativas que estavam ligadas aos Direitos Humanos e a
educação para Direitos Humanos.
Com o processo de redemocratização, a partir de meados da década de 1980, o Brasil
passa a ter suas primeiras experiências voltadas para a discussão do tema Educação para os
direitos Humanos:
[...] Na segunda metade da mesma década, a educação em/para os direitos
humanos começou a adquirir certo nível de sistematicidade. (...) Intuía-se que
a educação em direitos humanos tinha papel importante nos processos de democratização das sociedades, tão afetadas pelas violações sistemáticas dos
direitos fundamentais dos indivíduos e das instituições pelas ditaduras
militares. (SACAVINO, 2009, p. 75-76)
O histórico da evolução das discussões e implantação da educação em direitos
humanos perpassa por questões intrinsicamente ligadas à democracia. Por isso, é válido ser
registrada e discutida, pois esse processo faz parte da história recente na nossa sociedade.
Longe do êxito obtido pelos países europeus no que tange à materialidade das ações implementadas no campo dos direitos humanos - através da constituição
de um Estado de Bem-Estar – no Brasil, os direitos sociais situam-se no bojo
de lutas e enfrentamentos constantes. Tomam feições de leis afirmativas materializadas por seus programas/projetos de inclusão social que são
oferecidas pelas esferas do poder estatal e, também, pelo chamado terceiro
setor. Estão voltadas para os segmentos sociais mais afetos a uma sociedade
vulnerabilizadora e, em geral, manifestam-se enquanto medidas de proteção (social) no amparo às necessidades básicas. (ZUCCHETTI e MOURA, 2017,
p.258).
São por essas questões históricas que é válido nos ater ao universo onde se concentra
grupos singulares que carecem de acesso aos direitos sociais. Pois tendo como exemplo os
povos que vivem em áreas isoladas no Pantanal de Corumbá, podemos identificar que em
alguns casos o gozo do direito à educação faz parte de uma história recente quando se identifica
que as primeiras escolas na região datam de 2005.
4. DIREITOS HUMANOS E AS COMUNIDADES RIBEIRINHAS DO PANTANAL DE
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4.1 Aspectos geográficos
É importante entender o contexto pantaneiro e seus aspectos geográficos, uma vez que
se trata de um ambiente específico do território brasileiro e possui algumas peculiaridades sobre
o modo de vida da população e o acesso a serviços básicos como educação e saúde.
O Pantanal é a maior planície úmida, abrangendo o ponto sudoeste do Brasil, presente
nos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e em algumas áreas do Paraguai e Bolívia
(FRANCO, 2013). O Pantanal se destaca em vários aspectos por possuir rica diversidade de
fauna e flora, porém uma das coisas que mais marcam esta planície são as cheias sazonais. As
cheias que compreendem os meses de fevereiro e abril no norte do Pantanal, e, junho a agosto,
no sul da região.
O Pantanal se apresenta ainda por regiões, cujas classificações variam conforme os
autores. Silva e Abdon (1998), por exemplo, classificam o Pantanal em onze sub-regiões, sendo
elas: Cáceres, Poconé, Barão de Melgaço, Paraguai, Paiaguás, Nhecolândia, Abobral,
Aquidauana, Miranda, Nabileque e Porto Murtinho. Para este trabalho será adotada a
classificação utilizada nos documentos da Secretaria Municipal de Educação que apresentam o
Pantanal de Corumbá dividido em Alto, Médio e Baixo Pantanal.
Sendo a região do alto Pantanal a área que se concentra as escolas que serão
apresentadas para discussão neste artigo, iremos nos ater às suas características:
Localizado a aproximadamente 320 km do Porto Geral, na divisa com o estado
do Mato Grosso, é formado pelas seguintes regiões: Domingos Ramos,
Castelo, ilha Verde, Paraguai Mirim, Chané, Amolar, Barra do Rio São
Lourenço e região do Rio São Lourenço, com aproximadamente 198 famílias, totalizando 740 pessoas. (CORUMBÁ, 2015, p. 23)
Uma das questões relevantes que se apresenta no Alto Pantanal é o meio de acesso,
pois o transporte principal é via embarcações ou por aviões de pequeno porte, não há oferta de
energia elétrica, baixo sinal de telefonia e não há a presença de unidade básica de saúde 3.
4.2 As populações ribeirinhas no Pantanal
3 O atendimento médico e odontológico oferecido para as populações que residem no Alto Pantanal é realizado pela Prefeitura Municipal de Corumbá com Programa Social Povos das Águas e pelo Navio hospitalar do 6º
Distrito Naval da Marinha do Brasil.
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As populações ribeirinhas de recorte para esta discussão são formadas pelas
comunidades do Paraguai Mirim, São Francisco, Barra do São e Serra do Amolar. Além dos
moradores ribeirinhos, há a presença de outros atores sociais que também se relacionam ao
contexto em questão que são o poder público e instituições públicas, organizações não
governamentais, instituições ligadas à conservação ambiental e ao turismo de pesca (FRANCO,
2013).
Para discorrer sobre os Direitos Humanos para a população ribeirinha, é válido
destacar que o terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos, considera três aspectos básicos de
garantia de sobrevivência que são economia, educação e saúde (BRASIL, 2009).
Incentivar e promover a realização de atividades de valorização da cultura das
comunidades tradicionais, entre elas ribeirinhos, extrativistas, quebradeiras de coco, pescadores artesanais, seringueiros, geraizeiros, varzanteiros,
pantaneiros, comunidades de fundo de pasto, caiçaras e faxinalenses
(BRASIL, 2009, p..113).
Como bem apresenta o documento supracitado, suas ações programáticas são a da
valorização da cultura de povos tradicionais. Neste aspecto, as populações da região do alto
Pantanal se caracterizam como tal.
A economia nessa região está baseada na pesca, catação de isca, e atividades de trabalho
temporário em fazendas da região. Outra fonte de renda se dá pelo recebimento dos benefícios
sociais oferecidos pelo governo como bolsa família e seguro pesca.
4.3 Educação
Os atores sociais que gerenciam a educação formal para os povos das comunidades
localizadas no Alto Pantanal, se configuram em a Prefeitura Municipal de Corumbá e uma
Organização não-governamental que mantém com a prefeitura uma parceria pública- privada.
Essa região é contemplada com três escolas que se adequam à realidade local para
funcionar atendendo tanto alunos mais próximos como também os mais distantes que, na
maioria dos casos, precisam passar o bimestre alojados nas dependências das escolas. Dentre
as Escolas temos: A Escola Municipal Rural de Educação integral Polo Paraguai Mirim e sua
extensão Jatobazinho, Escola Municipal Rural de Educação Integral Polo São Lourenço e
Extensões.
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A regulamentação da fundação dessas escolas, se deu pelo Decreto nº 114/2005, que
as criou como extensões da então Escola Municipal Rural Polo Porto Esperança. A partir de 11
de março de 2016, com o Decreto nº 1.648, As extensões Paraguai Mirim e são Lourenço,
passaram a ser denominadas como Escola Municipal Rural de Educação Integral Polo São
Lourenço e Extensões, Escola Municipal Rural de Educação Integral Polo Paraguai Mirim e
Extensões.
Cabendo esclarecer que a Escola Paraguai Mirim, tem como extensão a Escola
Jatobazinho, a qual foi fundada pelo Decreto nº 565, de 5 de fevereiro de 2009. Juntas, as
escolas mencionadas, atendem um total de 133 alunos.
A Escola São Lourenço, está 224 km distante do porto de Corumbá, funciona no
regime de semi-internato4, com oferta do ensino fundamental I e ensino fundamental II. É a
primeira unidade escolar a contar com energia elétrica fotovoltaica, um recurso que foi
viabilizado por um projeto da Organização não-governamental Ecologia e Ação/Ecoa e a
empresa Nexans Foundation. A escola conta com dois piloteiros5 que se encarregam de fazer o
transporte fluvial dos alunos entre trajeto casa e escola, dois funcionários de serviços gerais,
um monitor e uma monitora que ficam nos alojamentos juntamente com os alunos e os
acompanham em atividades que não são dentro da carga horária escolar, e três professores que
trabalham com classes multisseriadas.
A Escola Paraguai Mirim atende 51 alunos, oferecendo o ensino fundamenta I e II,
ambos funcionam de forma muiltisseriada, sendo ao todo cinco professores para atender essa
comunidade. A partir de 2014, a escola, passou a oferecer também a educação infantil para
crianças de quatro a cinco anos, sendo a primeira escola do Pantanal a oferecer a educação
infantil.
A extensão denominada Escola Jatobazinho oferece as séries iniciais do ensino
fundamental I, atende 50 alunos, possui classes seriadas, sendo a única unidade escolar da Rede
Escola das Águas6 que não é multisseriada, tendo seis professores, e também funciona no
regime de semi-internato, no qual os alunos passam a semana na escola e retornam para casa
aos finais de semana. Esta unidade escolar, faz parte de uma parceria público-privada entre a
Prefeitura Municipal de Corumbá e a Organização não- governamental Instituto Acaia,
4 O regime de semi-internato nesta unidade, se configura em um grupo de alunos que vem para a escola e retornam
para suas casas todos os dias e o grupo que devido à distância, ficam alojados nas dependências da unidade escolar
junto com os professores e monitores que também retornam para casa bimestralmente. 5 Profissionais responsáveis em conduzir as embarcações de transporte escolar. 6 É conhecido como Escola das Águas, as 11 unidades escolares que estão as margens dos rios ou próximas a eles,
que o acesso e via transporte fluvial ou por pequenos aviões.
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conforme o Decreto nº 565 de 05 de fevereiro de 2009, o qual esclarece em seu artigo 2º: “fica
o poder Executivo Municipal, através da Secretaria Municipal de Promoção da Cidadania,
autorizado a firmar ajustes com o Poder Público, iniciativa privada ou organizações não
governamentais para a efetivação do presente Decreto”.
As unidades escolares mencionadas acima, conforme os dados populacionais
apresentados no Plano Municipal de Educação, atendem um grupo de “198 famílias, totalizando
740 pessoas”. Todas elas adotam a matriz de educação integral. Por isso, é relevante nos ater à
questão da educação apresentada como um direito e como tal exige que seja garantido.
Conforme as datas de fundação das escolas na região do alto Pantanal é notório que
elas fazem parte de uma história recente, e oferecem apenas o ensino fundamental. A ausência
de informação no texto sobre os anos finais da educação básica é justamente porque não existe
a oferta do ensino médio para este público que habita as áreas alagadas do Pantanal.
O reconhecimento de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos é uma conquista recente, datada da década de 1980 e marca uma importante
ruptura paradigmática no modo como a sociedade e o Estado brasileiro passam
a tratar a infância e a juventude, fundando um novo e moderno arcabouço jurídico e pedagógico para o enfrentamento de questões atinentes a estes
sujeitos (ZUCCHETTI; MOURA, 2017, p.263).
Conforme as autoras nos apresentam, a história do direito para crianças e adolescentes
faz parte de um passado recente. Em realidades particulares como crianças e jovens de
ambientes do campo como é o caso das crianças e jovens que se encontram no Pantanal, essa
conquista dos direitos à educação básica ainda não se encontra totalmente consolidada, e é
notório que há tanto a presença do poder público como também do setor privado e que ainda
assim não garantem o acesso ao ensino médio.
O Plano Nacional de Educação - PNE (2014), prevê em sua meta 8 ampliar a
escolarização básica para as populações do campo: “[...] elevar a escolaridade média da
população de dezoito a vinte e nove anos, de modo a alcançar, no mínimo, doze anos de estudo
no último ano de vigência deste Plano, para as populações do campo, da região de menor
escolaridade no país [...]”.
Além do Plano Nacional, buscou-se também verificar no Plano Estadual de Educação
- PEE do Estado de Mato Grosso do Sul, (2014 a 2024) as estratégias planejadas, sendo estas:
Garantir, a partir do primeiro ano de vigência deste PEE, a alfabetização e
letramento, com aprendizagem adequada, de todas as crianças do campo,
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indígenas, povos das águas, quilombolas e populações itinerantes, nos três
anos iniciais do ensino fundamental (MATO GROSSO DO SUL, 2014, p. 90).
O Plano Estadual de Educação apresenta um interesse para o material didático que será
ofertado para os estudantes que fazem parte de universos singulares em que se dá a educação:
Produzir, na vigência do PEE, materiais didáticos e de apoio pedagógico específicos, para a alfabetização de crianças do campo, indígenas,
quilombolas, povos das águas e populações itinerantes, incluindo a inserção
de recursos tecnológicos (MATO GROSSO DO SUL, 2014, p. 90).
Ainda sobre o que a legislação propõe e assegura para a garantia da educação no campo,
temos as diretrizes operacionais para a Educação Básica no Campo que institui:
Art. 6º O Poder Público, no cumprimento das suas responsabilidades com o atendimento escolar e à luz da diretriz legal do regime de colaboração entre a
União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, proporcionará
Educação Infantil e Ensino Fundamental nas comunidades rurais, inclusive para aqueles que não o concluíram na idade prevista, cabendo em especial aos
Estados garantir as condições necessárias para o acesso ao Ensino Médio e à
Educação Profissional de Nível Técnico (BRASIL, 2002).
A garantia do direito à educação pública para a população que está em ambientes do
campo é uma questão que devemos sempre vigiar para que sejam atendidas de acordo com suas
especificidades. Dentro dessas realidades, podemos citar como exemplo os critérios
considerados para criar uma classe de ensino médio no campo não se diferem dos da cidade.
Outra questão que merece ser melhor estudada quando se trata de planejamento da
educação pública para o campo é a distribuição das verbas públicas para manutenção dessas
escolas.
É notório que em ambientes em que o transporte é somente via embarcações, e a energia
elétrica é somente via geradores, não resta dúvida que estes dois fatores, transporte e energia
sobem consideravelmente o custo de um aluno se comparado com o custo de um aluno da
cidade. Por isso a necessidade de se pensar em planejamentos que considerem essa questão,
dispondo de um orçamento que leve em consideração o custo Pantanal.
Sobre este intervalo que vemos entre o que está sendo escrito nos documentos nacionais e
estaduais e o que está sendo feito na prática, Geovana Mendonça Lunardi Mendes e Vânio
Cesar Seemann (2016), nos trazem uma excelente contribuição, quando fazem o trabalho de
abordagem do ciclo de políticas sobre a ampliação da jornada escolar:
[..]. os textos políticos têm uma historicidade representacional que adentra
espaços institucionais e sociais, que não são uma tábula rasa e, por
conseguinte, são recriados a cada leitura no contexto da prática, que assume
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uma dimensão produtiva, muito embora isso não possa ser compreendido
distante da coerção e dos constrangimentos produzidos pelas relações de
poder, estruturadas e distribuídas pela política. O contexto da prática constitui o processo de tradução ou transformação do texto político, na prática. Esse
contexto é também marcado por disputas onde contestações, significações e
ressignificações se processam, envolvendo múltiplos atores e interesses,
através de empréstimos, adaptações e apropriações, realizadas por meio de redes. A tradução das políticas se dá por meio de leituras e releituras ativas,
apresentações e reapresentações, contextualizações e recontextualizações,
ordenamento e reordenamento de práticas, onde se aninham aceitação e resistência, colaboração e negociação (MENDES; SEEMANN, 2016, p.523)
Neste aspecto de abordagem dos ciclos de políticas estudados pelas autoras, podemos
comparar também os textos políticos que fazem menção ao direito a educação básica no campo:
Lei nº 9.394/ 1996, CNE/CEB 1, de 3 de abril de 2002 que institui as Diretrizes Operacionais
para a Educação Básica nas Escolas do Campo, Plano Nacional de Educação (2014- 2024),
Plano Estadual de Educação - PEE do Estado de Mato Grosso do Sul, (2014 a 2024).
Outro documento público que merece atenção especial ao analisarmos as propostas
governamentais que garantem o direito à educação, é o Plano Municipal de Educação, 2015-
2025-PME. O Plano apresenta conforme o censo escolar 2010, que dos 94% dos alunos
matriculados nas séries iniciais do ensino fundamental, apenas 43,3% concluem os anos finais.
Para universalizar o ensino fundamental de 9 anos, para toda a população de 6 a 14 anos e garantir que pelo menos 95% dos estudantes concluam essa etapa
na idade recomendada, será necessária uma articulação entre todos os
segmentos educativos, intensificar o regime de colaboração entre o Poder
Público, para superar as diversas situações, como: atender os diferentes contextos sociais e culturais (vulnerabilidade social, crianças indígenas,
quilombolas, ribeirinhas, do campo e crianças com deficiência),
infraestrutura, formação continuada, base comum curricular e gestão das escolas (CORUMBÁ, 2015, p. 38).
Outro ponto relevante que o PME destaca é distorção idade-série, sendo maior nos
anos finais do ensino fundamental.
Quanto as metas para a educação do campo, o PME coloca como meta:
Desenvolver tecnologias pedagógicas que combinem, de maneira articulada,
a organização do tempo e das atividades didáticas entre a escola e o ambiente comunitário, considerando as especificidades da educação especial, das
escolas do campo e das comunidades indígenas e quilombolas, inseridas nos
currículos específicos, respeitando a cultura de cada comunidade. (CORUMBÁ, 2015, p. 39).
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De acordo com os dados apresentados pelo PME, os desafios a serem superados são
significativos e as dificuldades relacionadas à educação, necessitarão de planejamentos
específicos para serem sanadas.
5. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES PARA DISCUSSÃO
Este trabalho teve o objetivo de propor uma discussão sobre o que tem sido planejado
e garantido em relação ao acesso à educação para as populações que estão em áreas isoladas
no país como é caso dos moradores na região do Alto Pantanal em Corumbá, tendo por base a
compreensão dos direitos humanos e a necessidade de garanti-los a todo cidadão.
Diante de um histórico que nos permite avaliar como um sucesso recente nas políticas
públicas para os direitos humanos, concluímos que as unidades escolares no Alto Pantanal,
embora representem um avanço histórico, pois estamos falando de escolas que tem entre 12
anos e oito anos de implantação, carecem de ampliação na oferta de outros segmentos de
ensino, como a educação infantil e o ensino médio.
Observando o que propõe os textos políticos e o que temos na prática quanto ao acesso
à educação no Pantanal, este trabalho nos desperta a atenção para querer acompanhar a
execução do que foi planejado tanto em nível nacional quanto em nível estadual. Suscita
também pesquisas sobre como se dá a educação nessas áreas e a repercussão nas comunidades
atendidas visto que é um processo recente pelo fato das primeiras escolas terem pouco mais de
uma década.
Enquanto educadores, cabe a nós também, além da ação pedagógica, a participação
em conselhos municipais e demais espaços de planejamento e discussão da educação para que
possa ser ampliado o atendimento às crianças e adolescentes localizados nas regiões aqui
mencionadas no que se refere à vida escolar visto que é um direito deles.
Não basta os direitos serem garantidos apenas nos textos políticos, as propostas
pensadas, precisam sair do plano e transformarem em práticas.
A diversidade dos direitos humanos, hoje já faz parte de um direito adquirido, porém
conforme o Norberto Bobbio (2004) nos pontua muito bem em sua obra a era dos direitos que
estamos diante de um novo problema. Não precisamos mais fundamentar os direitos, mas sim
protege-los.
Desse modo, concluímos que estamos passando por um momento histórico, pois nos
períodos de golpes a democracia que apresentamos no início deste artigo, era notório a rejeição
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aos direitos humanos. Estes eram vistos como ameaça e não como questões essenciais a vida.
Hoje, principalmente depois políticas públicas de afirmação dos direitos humanos, temos um
número significativo de propostas de leis e demais documentos nacionais que foram criadas
para promulgar os direitos do homem.
Esse processo de solidificação dos direitos, não se dá de forma instantânea como bem
nos esclarece (BOBBIO,2004), os primeiros momentos são a fundamentação, são as teorias que
são fundamentadas do acordo com as linhas filosóficas. O segundo momento é justamente o
período que a teoria alcança a prática e torna as ideias realizadas.
O fato de termos abertura das políticas públicas para a defesa dos direitos, nos dá um
certo conforto, porém aumenta mais ainda nossa responsabilidade enquanto cidadãos de direitos
que somos, pois estas precisam ir além dos textos e traduzirem em práticas, construindo assim,
uma cultura de direitos humanos.
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