Direito Penal - Iter Criminis

20
ITER CRIMINIS É o caminho a ser percorrido pela infração penal. É o conjunto de fases que se sucedem cronologicamente no desenvolvimento do delito doloso. É divido em duas macrofases: 1) Interna (cogitação e atos preparatórios), e; 2) Externa (execução e consumação). A) CO GITAÇÃO: simples idéia do crime. Em razão do princípio da materialização do fato, a cogitação é sempre inpunível, salvo quando ela projeta no mundo exterior e constitua, por si só, fato típico (ameaça, 147; incitação ao crime, 286; quadrilha ou bando, 288) trata-se de evidente direito penal do autor. O Brasil adota o direito penal fato. A cogitação não é sinônimo de premeditação. B) ATOS PREPARATÓRIOS: “conatus remotus”: o agente procura criar condições para a realização da conduta criminosa. Também constituem fato impunível, salvo quando a lei o define como ato executório de outro delito. Neste caso, são puníveis os atos executórios, e não os preparatórios em si mesmos (fabricação de instrumentos para falsidade, art. 291). A tratar da quadrilha ou bando, resta demonstrada a impaciência do legislador, evidenciando-se o direito penal do inimigo. A doutrina moderna entende que esses atos são sempre puníveis. C) EXECUÇÃO: traduz a maneira pela qual o agente atua externamente para realizar o núcleo do tipo. Em regra, é o pressuposto mínimo para a punição. Da segunda para terceira fase passa-se de ato punível para impunível. DIFERENÇA ENTRE ATOS PREPARATÓRIOS E EXECUTÓRIOS 1) Teoria da hostilidade ao bem jurídico (critério material): atos executórios são aqueles que atacam o bem jurídico, criando-lhe uma situação concreta de perigo (Nelson Hungria).

Transcript of Direito Penal - Iter Criminis

Page 1: Direito Penal - Iter Criminis

ITER CRIMINIS

É o caminho a ser percorrido pela infração penal.É o conjunto de fases que se sucedem cronologicamente no desenvolvimento do

delito doloso. É divido em duas macrofases:1) Interna (cogitação e atos preparatórios), e;2) Externa (execução e consumação).

A) CO GITAÇÃO: simples idéia do crime. Em razão do princípio da materialização do fato, a cogitação é sempre inpunível, salvo quando ela projeta no mundo exterior e constitua, por si só, fato típico (ameaça, 147; incitação ao crime, 286; quadrilha ou bando, 288) trata-se de evidente direito penal do autor. O Brasil adota o direito penal fato. A cogitação não é sinônimo de premeditação.

B) ATOS PREPARATÓRIOS: “conatus remotus”: o agente procura criar condições para a realização da conduta criminosa. Também constituem fato impunível, salvo quando a lei o define como ato executório de outro delito. Neste caso, são puníveis os atos executórios, e não os preparatórios em si mesmos (fabricação de instrumentos para falsidade, art. 291). A tratar da quadrilha ou bando, resta demonstrada a impaciência do legislador, evidenciando-se o direito penal do inimigo. A doutrina moderna entende que esses atos são sempre puníveis.

C) EXECUÇÃO: traduz a maneira pela qual o agente atua externamente para realizar o núcleo do tipo. Em regra, é o pressuposto mínimo para a punição. Da segunda para terceira fase passa-se de ato punível para impunível.

DIFERENÇA ENTRE ATOS PREPARATÓRIOS E EXECUTÓRIOS

1) Teoria da hostilidade ao bem jurídico (critério material): atos executórios são aqueles que atacam o bem jurídico, criando-lhe uma situação concreta de perigo (Nelson Hungria).

2) Teoria objetivo-formal: ato executório é o que inicia a realização do núcleo do tipo (Frederico Marques).

3) Teoria objetivo-individual: atos executórios são aqueles que, de acordo com o plano do autor, realizam-se no período imediatamente anterior ao começo da execução típica (complemento da teoria objetivo-formal).

*Flávio Monteiro de Barros determina que é razoável trabalharmos com as três teorias conjuntamente.

Cuidado: nem todos os crimes percorrem as 4 fases. Há crimes que se consumam com o fim dos atos executório, são os chamados crimes formais. Só os crimes materiais percorrem necessariamente as 4 fases.

Page 2: Direito Penal - Iter Criminis

D) CONSUMAÇÃO : assinala o instante da composição plena do fato criminoso.

MOMENTOS DA CONSUMAÇÃO

a. Crimes materiais: a consumação ocorre com a conduta e a produção do resultado naturalístico indispensável (morte no infanticídio, art. 123).

b. Crimes formais (de consumação antecipada): o tipo penal descreve conduta mais resultado naturalístico e a consumação ocorre com a simples atividade, independentemente da produção do resultado descrito no tipo (na violação de segredo profissional, art. 154, basta a simples revelação do segredo, independentemente da afetiva produção de dano).

STJ SÚMULA: 96 O CRIME DE EXTORSÃO CONSUMA-SE INDEPENDENTEMENTE DA OBTENÇÃO DA VANTAGEM INDEVIDA.

c. Crimes de mera conduta: a consumação se dá a simples ação, já que o tipo não faz menção ao resultado naturalístico (violação de domicílio, art. 150, ato obsceno).

d. Crimes omissivos próprios: a consumação se perfaz com o simples comportamento negativo (conduta), não se condicionando à produção de resultado ulterior (falta de notificação compulsória – art. 269 – perda do prazo fixado para denunciar). o dever de agir é para evitar o resultado concreto. Estamos diante de um crime de resultado material, exigindo, consequentemente, a presença de nexo causal entre a conduta omitida (e esperada) e o resultado. Esse nexo, no entanto, para a maioria da doutrina, não é naturalístico (do nada da surge). Na verdade, o vínculo é jurídico, isto é, o sujeito não causou o resultado, mas como não o impediu, é equiparado ao verdadeiro causador. Ex.: a mãe deixa de amamentar o filho, que vem a falecer. Não se trata de nexo físico, e sim jurídico; como ela não impediu o que deveria ter impedido, ela será, por equiparação, a causadora do resultado. Estamos diante de um nexo de não impedimento, ou de não evitação – Zaffaroni.

e. Crimes omissivos impróprios: a consumação se verifica com a produção do resultado (mãe que deixa o filho morrer de inanição – consumação depende da morte).

f. Crimes complexos: por encerrarem, na descrição legal, mais de um tipo penal, a consumação somente ocorrerá quando os componentes de novo tipo estiverem integralmente realizados. Exceção: súmula nº 610, do Supremo Tribunal Federal.

E) Exaurimento: são atos posteriores à consumação. A consumação não se confunde com o exaurimento. Diz-se crime exaurido (esgotado plenamente) os acontecimentos posteriores ao término do “iter criminis”. O exaurimento não interfere no tipo, mas interfere na pena, assim mais severamente punido.

Page 3: Direito Penal - Iter Criminis

CONSUMAÇÃO E TENTATIVA

A) Crime Consumado: Previsão legal:

Art. 14. Diz-se o crime:Crime consumadoI – consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal;

Conceito: considera-se crime consumado a realização do tipo penal por inteiro, nele encerrando o iter criminis.

Súmula 610 do STF:

Súmula 610HÁ CRIME DE LATROCÍNIO, QUANDO O HOMICÍDIO SE CONSUMA, AINDA QUE NÃO REALIZE O AGENTE A SUBTRAÇÃO DE BENS DA VÍTIMA.

Essa Súmula considera crime consumado sem que se reúna todos os elementos do iter criminis. Essa Súmula contraria o art. 14, I do CP (Rogério Greco), sendo contra legem. Mas o STF a aplica.

Consumação ≠ Exaurimento: consumação: encerra o iter criminis. Exaurimento: são atos posteriores ao iter criminis. Ele é considerado na fixação da pena. U crime exaurido deve ser mais severamente punido.

Cuidado com crime cuja consumação se protrai no tempo: crimes permanentes.

Cuidado: A doutrina moderna vem falando em consumação formal e consumação material, o que é isso? Consumação formal ocorre quando se dá o resultado naturalístico nos crimes materiais ou quando o agente concretiza a conduta nos crimes formais e de mera conduta. Ex.: subtraiu coisa alheia móvel.Consumação material: ocorre quando se dá a relevante e intolerável lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.Essa doutrina é para quem diferencia tipicidade formal de tipicidade material.

TENTATIVAB) Crime Tentado: Previsão legal:

Art. 14. Diz-se o crime:

II – tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Page 4: Direito Penal - Iter Criminis

Conceito: o conceito doutrinário reproduz o que diz a lei.Está certo falar em “crime de tentativa”?A tentativa não constitui crime “sui generis” com pena autônoma. A tentativa é a violação incompleta da mesma norma de que o crime consumado representa violação plena. Portanto, não há crime de tentativa, mas tentativa de crime.

Natureza jurídica da tentativa: é norma de extensão temporal.Ela amplia a incriminação a fatos humanos praticados de forma incompleta.

Elementos da tentativa:

1) Início da execução;

2) Não consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente;Tem doutrina que acrescenta um 3º elemento da tentativa:

3) Dolo de consumação (LFG, FMB): mas isso já está no segundo elemento.

Conseqüência da tentativa:CP Art.14 Pena de tentativa Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços. (quanto mais próximo de consumar o delito, menor a redução). Portanto, em regra, o Brasil adotou o critério objetivo.

O que é um tipo “manco”? Na consumação o elemento subjetivo é perfeito e completo, assim como o elemento objetivo. Quanto à tentativa, o elemento subjetivo é perfeito e completo, mas não o elemento objetivo (a graduação da pena é minorada). A tentativa é determinada como crime manco, depreendendo-se da definição posta acima.

Mas há casos excepcionais em que o Brasil adotou a teoria subjetiva (a tentativa terá a mesma pena da consumação, sem redução). São hipóteses excepcionais de critério subjetivo. Crime eleitoral: votar ou tentar votar em nome de outrem. Lei de genocídio também.Ex.: art. 352 do CP:

Evasão mediante violência contra a pessoaArt. 352. Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa:Pena – detenção, de três meses a um ano, além da pena correspondente à violência.

Como se chama esse tipo de crime? São chamados de crime de atentado ou empreendimento. A consumação e a tentativa são punidas com a mesma pena sem qualquer redução.

Page 5: Direito Penal - Iter Criminis

CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA DA TENTATIVA:

A) Quanto ao iter criminis percorrido

- Perfeita (acabada ou crime falho): o agente apesar de praticar todos os atos executórios a sua disposição, não consegue consumar o crime por circunstâncias alheais a sua vontade. Nesta tentativa, ele consegue praticar todos os atos de execução. Essa tentativa somente é possível nos crimes materiais.

- Imperfeita (inacabada): o agente é impedido de praticar todos os atos executórios a sua disposição.Cuidado: geralmente as provas confundem crime falho com crime impossível, que não possuem qualquer relação.OBS: a tentativa perfeita (onde se esgotam os atos executórios) somente é compatível com os crimes materiais porque no crime formal e no crime de mera conduta esgotando-se os atos executórios, não há crime tentado, já há crime consumado.OBS: Qual das duas tentativas merece uma maior redução? Há jurisprudência norteando a redução da pena na tentativa conforme o maior percurso percorrido no caminho do crime. Conclusão: quanto mais atos executórios, maior a pena; quanto menos atos executórios, menor a pena. Prevalece, no entanto, que a redução da pena na tentativa deve ser inversamente proporcional à proximidade da produção do resultado. Conclusão: quanto mais próximo de causar o resultado, menor a redução; quanto menos próximo, maior a redução.

B) Quanto ao resultado produzido na vítima

- Cruenta (vermelha): a vítima é atingida. Redução de 1/3.- Não cruenta ou incruenta (branca): a vítima não é atingida.A tentativa branca terá maior redução (2/3).

C) Quanto à possibilidade de alcançar o resultado- Idônea: o resultado, apesar de não alcançado por circunstâncias alheias à vontade do agente, era possível. Essa tentativa é punível.- Inidônea (crime impossível): o resultado não alcançado era impossível. Essa tentativa é impunível, sendo sinônimo de crime impossível.

D) Quanto à vontade do agente- Simples: o resultado não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente. É o próprio art. 14, II do CP.- Qualificada (abandonada): o resultado não ocorre por circunstâncias inerentes à vontade do agente. Esse tentativa nada mais é do que gênero do qual são espécies a desistência voluntário e o arrependimento eficaz. Está no art. 15 do CP:

Qual crime a tentativa é punível e o crime consumado é atípico? São os crimes de lesa-pátria (Lei dos crimes contra a segurança nacional – Lei 7.170/83, arts. 9º e 11):

Art. 9º Tentar submeter o Território Nacional, ou parte dele, ao domínio ou à soberania de outro País.

Page 6: Direito Penal - Iter Criminis

Pena – reclusão, de quatro a vinte anos.Parágrafo único. Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até um terço; se resulta morte, aumenta- se até a metade.Art. 11. Tentar desmembrar parte do Território Nacional para constituir País independente.Pena – reclusão, de quatro a doze anos.

INFRAÇÕES PENAIS QUE NÃO ADMITEM TENTATIVA:

a) CRIMES CULPOSOS (salvo a hipótese de culpa imprópria), pois o resultado não é alcançado pela vontade do agente, isto é, não há dolo de consumação. Existe minoria admitindo minoria na culpa imprópria.b) PRETERDOLOSOS: Prova discursiva: mas vale ressaltar que a doutrina moderna admite tentativa quando a parte frustrada é a dolosa, ocorrendo o resultado culposo.Ex 1: aborto qualificado pela morte na gestante. O agente realiza manobras abortivas, não consegue interromper a gravidez mas a gestante vem a óbito. Resta frustrada a parte dolosa sendo acusado o agente de tentativa de abordo qualificado pela morte da gestante.Ex 2: O estupro qualificado pela morte da vítima é preterdoloso. Tentativa de estupro agindo dolosamente e, se intento do agente, vem a óbito a vítima devido à violência empregada. Responde o agente por tentativa de estupro qualificada pela morte.c) OMISSIVOS PRÓPRIOS;d) HABITUAIS; pois o fato típico exige reiteração de condutas (atos). Prova discursiva: Minoria discorda quanto ao curandeiro que cura uma pessoa e tem uma fila de espera que poderá ser impedida. A doutrina cita exceção: crime de curandeirismo em fila de espera sendo possível inclusive a prisão em flagrante.e) UNISSUBSISTENTES; a sua execução não admite fracionamento em vários atos. Ex: Crimes omissivos puros (art. 135) e crimes de mera conduta. Mas há crime de mera conduta que admite tentativa: violação de domicílio (art. 150).f) CRIME DE ATENTADO ou empreendimento (ex: art. 352, CP); Prova discursiva: Rogério Grecco discorda com razão, pois crime de atentado só não admite a redução da tentativa. Afirma que o delito de atentado nada mais é que uma tentativa punida com pena de consumação.g) CONTRAVENÇÕES PENAIS. Prova discursiva: art. 4 da LCP a tentativa não é punível. Mas admite tentativa, mas o direito é que não pune.h) CRIMES QUE SÓ SÃO PUNÍVEIS QUANDO OCORRE DETERMINADO RESULTADO. Ex: participação em homicídio. Mas Cezar Roberto Bitencourt discorda e admite tentativa quando do suicídio resulta lesão grave (minoria). A maioria não admite tentativa, porque quando a vítima morre ou sofre lesão, é crime consumado a participação.i) DOLO EVENTUAL: novos doutrinadores assim postulam.

Page 7: Direito Penal - Iter Criminis

TENTATIVA QUALIFICADA OU ABANDONADASão espécies de tentativa qualificada ou abandonada a desistência voluntária e o arrependimento eficaz.

Desistência voluntária e arrependimento eficazArt. 15. O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução (desistência voluntária) ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados (arrependimento eficaz).

A) DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA:O sujeito ativo abandona a execução do crime quando ainda lhe sobra, do ponto de vista objetivo, uma margem de ação.

2) Elementos:a) Início da execuçãob) Não consumação por circunstâncias inerentes à vontade do agente: por sua própria vontade que não ocorreu a consumação. Essa é a diferença para a tentativa.Na tentativa quer prosseguir, mas não pode; na desistência pode prosseguir, mas não quer.c) A desistência deve ser voluntária.Cuidado: não se exige espontaneidade, mas sim voluntariedade. A voluntária admite interferência externa

Voluntária não se confunde com espontânea. Voluntária é a desistência sugerida ao agente que ele assimila, subjetiva e prontamente essa sugestão (amigo desencoraja o agente), esta influência externa de outra pessoa. Isto é desistência voluntária.

Se a causa que determina a desistência é circunstância exterior, uma influencia objetiva (acender luz, tocar alarme, sirene) que compele o agente a renunciar do propósito crimino, haverá tentativa.

CONSEQÜÊNCIA DA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA: Só responde pelos atos já praticados.

14, II (tentativa) 15, primeira parte (desistência voluntária)Inicio da execução e não consumação alheias a vontade do agente

Início da execução e não consumação por circunstâncias inerentes a vontade do agente

O agente quer prosseguir, mas não pode O agente pode prosseguir, mas não querRedução de 1/3 a 2/3 O agente responde pelos atos praticados*

* Se quebra o vidro do carro e desiste do furto responde por crime de dano.* Se invade a casa para furtar e desiste, responde por violação de domicílio.

A lei admite desistência voluntária, mesmo que não espontânea, podendo ser por interferências externas.

Adiamento da execução configura desistência voluntária?

Page 8: Direito Penal - Iter Criminis

Por exemplo, remove as telhas para entrar no local no dia seguinte. Duas correntes:1ª) A desistência momentânea é irrelevante; pois, deve ser sempre definitiva para configurar a tentativa abandonada;2ª) Se o agente apenas suspende a execução e continua a praticá-la posteriormente, aproveitando-se dos atos já cometidos, haverá tentativa. Se não renova a execução por sua própria vontade, configura desistência voluntária. (é a que prevalece)

B) ARREPENDIMENTO EFICAZ:1) Previsão legal:

Art. 15, 2ª parte do CP:

Desistência voluntária e arrependimento eficazArt. 15. O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução (desistência voluntária) ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados (arrependimento eficaz).

O arrependimento eficaz ocorre quando o agente, desejando retroceder na atividade delituosa percorrida, desenvolve nova conduta, após terminada a execução criminosa. Von Litz trata como ponte de ouro.

Qual a diferença da desistência voluntária para o arrependimento eficaz? R: Na desistência voluntária interrompe o seu intento quando ainda tinha atos executórios a serem praticados; já no arrependimento eficaz já se esgotou todos os atos executórios, retrocedendo na conduta, evitando que o resultado se produza.

Qual é o sinônimo de arrependimento eficaz (Zaffaroni)? Resipiscência.

Somente crimes materiais admitem arrependimento eficaz porque se esgotam os atos executórios, pois evita-se a consumação, o agente já consumou o crime formal e o crime de mera conduta.

3) Elementos:a) Início da execução;b) Não consumação por circunstâncias inerentes à vontade do agente (é isso o que diferencia da tentativa);c) O arrependimento deve ser voluntário (não precisa ser espontâneo) e eficaz.Arrependimento ineficaz é mera atenuante de pena.

4) Conseqüência:O agente só responde pelos atos até então praticados. Deixa de responder por tentativa de homicídio e responde por lesão corporal. Se falece, homicídio consumado.Se o agente não responde por tentativa. Mas porque, se ele iniciou a execução? Duas correntes:1ª) O art. 15 configura hipótese de atipicidade da tentativa (a doutrina moderna diz que hoje prevalece essa corrente);2ª) O art. 15 extingue a punibilidade da tentativa, por razões de política criminal.ARREPENDIMENTO POSTERIOR

A) Previsão legal:

Page 9: Direito Penal - Iter Criminis

Art. 16. Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.

Conceito: Conceito. Pressupõe o crime consumado. O arrependimento posterior, embora não afaste a tipicidade do fato ou tampouco extingue a punibilidade do agente, tem a finalidade de reduzir a pena entre 1/3 e 2/3, desde que o fato seja desprovido de violência e haja reparação do dano ou restituição da coisa antes do recebimento da denúncia ou queixa. Preenchidos os requisitos não só pode como deve reduzir a pena, pois se trata de direito subjetivo do acusado. Quanto mais rápido maior a redução.

B) Natureza jurídica:Causa geral de diminuição de pena. É causa obrigatória de diminuição de pena;

o art. 16 é imperativo: “a pena será reduzida”. Dá-se até o recebimento da denúncia ou da queixa.

1) Requisitos:Esses requisitos são cumulativos (faltando um não cabe o benefício, mas se presentes

todos é direito subjetivo do acusado não cabendo discricionariedade):

a) Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa :

b)Crime violento culposo admite arrependimento posterior Lesão culposa no trânsito.

c)Violência contra a coisa não impede a aplicação do arrependimento posterior.

c) Roubo praticado sem violência própria admite arrependimento posterior Ex; boa noite Cinderela. A uma minoria que há uma violência imprópria.

RouboArt. 157. Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência (nesta forma, o crime de roubo admite arrependimento posterior):Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

Ex.: uso de psicotrópicos; boa-noite cinderela.Mas há uma minoria que discorda dizendo que configura violência imprópria.

4) Reparação do dano ou restituição da coisa por ato voluntário: tanto a reparação quanto à restituição devem ser feitas de forma integral, mas se a vítima der-se por satisfeita, pode ser parcial. Em ambas as hipóteses, exige-se a voluntariedade do agente, porém não se exige a espontaneidade. Mas se a vítima se dá por satisfeita com a restituição parcial, faz-se possível o arrependimento posterior (jurisprudência).

5) Até o recebimento da denúncia (após é mera atenuante de pena);Cuidado, o examinador geralmente troca por “oferecimento” e está errado.

2) Benefício:Redução de 1/3 a 2/3.

Page 10: Direito Penal - Iter Criminis

Qual o critério que o juiz adota? A presteza na reparação ou na restituição da coisa. Quanto mais rápido, maior a redução da pena.

Qual a diferença do arrependimento eficaz para o arrependimento posterior? No arrependimento eficaz evita-se a consumação, noutro se pressupõe a consumação. A diferença está no momento do arrependimento.

Violência contra a coisa impede o arrependimento posterior como, por exemplo, furto qualificado pelo rompimento de obstáculo? Violência contra a coisa não impede o benefício, o artigo somente fala de violência à pessoa (cuidado: geralmente o examinado insere a palavra “coisa”).

O arrependimento posterior tem que anteceder o recebimento da denúncia. E quando se dá esse recebimento com a Lei 11.719/2008? Duas correntes:1ª corrente: prevalece:1- Oferecimento da inicial;2- Recebimento;3- Citação;4- Defesa escrita;5- Possibilidade de absolvição sumária;6- Se não absolve, audiência concentrada de instrução, debates e julgamento.Para essa corrente, recebimento é o que está no art. 396 do CPP:

Art. 396. Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).Fundamentos para essa corrente: Art. 363 CPP: citou, o processo está completo (acusação formalizada):Art. 363. O processo terá completada a sua formação quando realizada a citação do acusado. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Como a segunda corrente fala em recebimento se o processo já está completo? Como se absolve uma pessoa sem processo (sem acusação formal)? O juiz teria que rejeitar e não absolver.

2ª corrente:1- Oferecimento da inicial;2- Citação;3- Defesa escrita;4- Possibilidade de absolvição sumária;5- Recebimento;6- Audiência concentrada.Para essa corrente, recebimento é o que está no art. 399 do CPP:

Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Repercussão prática: momento do arrependimento posterior. Na segunda corrente, ainda há chance de se arrepender. Outra repercussão: momento da interrupção da prescrição.

Qual o crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa que não admite arrependimento posterior? Estelionato praticado mediante emissão de cheque se fundos. Súmula 554 STF:

Súmula 554 - O PAGAMENTO DE CHEQUE EMITIDO SEM PROVISÃO DE FUNDOS, APÓS O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA, NÃO OBSTA AO PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL.Se for antes do recebimento da denúnica, obsta.

Trata-se de um perdão criado pela jurisprudência.

Page 11: Direito Penal - Iter Criminis

-Crime que não admite arrependimento posterior porque há norma mais benéfica se reparado o dano até o recebimento? Crime contra a ordem tributária porque extingue a punibilidade.

-Cuidado com o peculato culposo (art. 312, §3º): reparado o dano até a sentença irrecorrível extingue a punibilidade.

§ 3º No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.

-Autor de peculato culposo faz jus ao arrependimento posterior? Há jurisprudência do STJ dizendo que não porque jamais se repara a moralidade administrativa, porque se trata de um dano irreparável.

Arrependimento posterior se estende a coautores e partícipes?Luis Regis Prado determina que é uma circunstância subjetiva, pois depende da voluntariedade do agente, sendo incomunicável (circunstância subjetiva).

CRIME IMPOSSÍVEL (tentativa inidônea, crime oco, quase-crime, tentativa inidônea ou inadequada, ou ainda, crime de ensaio)

A) Previsão legal: Art. 17. Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta (objetiva temperada) do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

B) Conceito:Diz-se impossível o impossível crime quando o comportamento do agente é inapto a produção (consumação) do crime, quer em razão dos meios empregados, quer por falta do objeto material.

Teorias: A) Teoria sintomática: com sua conduta, demonstra o agente ser perigoso, razão pela qual deve ser punido, ainda que o crime se mostre impossível de ser consumado.

Quem adota essa teoria adota um direito penal do autor (pelo perigo que o agente representa, e não pelo fato que ela pratica).

B) Teoria subjetiva: sendo a conduta subjetivamente perfeita (vontade consciente de praticar o crime), deve o agente sofrer a mesma pena da tentativa (delito tentado).Pune o agente pelo crime tentado.O Brasil não adota essa teoria porque ela também está contaminada pelo direito penal do autor.

C) Teoria objetiva: crime é conduta e resultado. Este configura dano ou perigo ao objeto jurídico. A execução deve ser idônea para se configurar o crime. Esta teoria se divide em duas.

1) Teoria objetiva pura: não há tentativa, mesmo que a inidoneidade seja relativa. as impossibilidades absoluta e relativa são impuníveis.

Page 12: Direito Penal - Iter Criminis

2) Teoria objetiva temperada (adotada art. 17): a ineficácia do meio e a impropriedade do objeto devem ser absolutas, pois se relativas haverá tentativa. somente a impossibilidade absoluta é impunível (a relativa gera tentativa). O Brasil adotou esta teoria.

OBS: a doutrina é divergente quanto à natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, para uns trata-se de atipicidade de tentativa, para outros é causa de extinção de punibilidade por razões de política criminal.

OBS: inônimos de crime impossível: tentativa inidônea ou crime oco ou quase-crime.

Elementos do crime impossívelTentativa idônea Tentativa inidôneaInício da execução; Início da execução;Não consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente

Não consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente

Dolo de consumação; Dolo de consumação;Resultado não alcançado era possível. *Resultado impossível de ser alcançado,

por:- absoluta ineficácia do meio ou- absoluta impropriedade do objeto material

*Inidoneidade absoluta do meio (absoluta ineficácia do meio): configura falta de potencialidade causal; pois, os instrumentos postos a serviço da conduta não são eficazes, em hipótese alguma, para a produção do resultado. Não se confunde com o objeto jurídico.Se o meio é relativamente possível trata-se de tentativa. Exemplos: - acionar arma desmuniciada, por exemplo, tenta matar alguém acionando arma sem munição;- abortamento por meio de rezas e despachos. Aqui há jurisprudência.*Inidoneidade absoluta do objeto (absoluta impropriedade do objeto material): ocorre quando a pessoa ou coisa que representa o ponto de incidência da conduta não serve à consumação do delito.Exemplos:- tentar matar cadáver;- mulher supondo-se grávida pratica manobras abortivas.Nestes casos, o objeto material não serve à consumação do delito.Sistema de vigilância em supermercado torna o crime patrimonial impossível? A jurisprudência majoritária diz que esse sistema, por si só, não torna o crime impossível.Dentro desse tema desperta atenção duas espécies de prisão em flagrante: esperado e provocado.Flagrante esperado: a postura da autoridade é de espera, aguardando a prática do delito anunciado. Esse flagrante é espécie de flagrante preparado.Flagrante provocado: a postura da autoridade é de induzir a prática criminosa, pressuposto para a prisão. Esse flagrante é espécie de flagrante preparado.A diferença é que no primeiro não se induz ao crime; já no segundo se induz ao crime.

Page 13: Direito Penal - Iter Criminis

A doutrina diz que o flagrante esperando é crime possível, logo punível; já o flagrante provocado é crime impossível (é o chamado delito putativo por obra do agente provocador). Mirabette discorda disso, afirmando que não isso que diz a súmula 145 do STF:

Súmula 145 - NÃO HÁ CRIME, QUANDO A PREPARAÇÃO DO FLAGRANTE PELA POLÍCIA TORNA IMPOSSÍVEL A SUA CONSUMAÇÃO.

Há preparação do flagrante nas duas espécies, logo, o flagrante esperado, assim como o provocado podem ou não ser crime: tudo depende da preparação.A preparação do flagrante tem que tornar o crime possível ou impossível.Exemplos:- o patrão querendo ver se a empregada é honesta pega um dólar, deixa em cima da mesa e fica vigiando. Ela pega dólar e o patrão quando volta para casa verifica a bolsa da empregada e acha o dólar. Houve indução, e a empregada não tinha como consumar o delito. - mas, se ela sai correndo, há um flagrante provocado consumado.- estuprador de Campinas cujas vítimas eram somente dentistas: a preparação desse flagrante tornou o crime impossível.

Crime putativo ou imaginário. É aquele que o agente supõe, por erro, que está praticando uma conduta típica, quando na verdade o fato não constitui crime (homem que supõe estar praticando sedução, mas a mulher é maior de 18 anos).

Crime provocado. Quando o agente é induzido à prática de um crime por terceiro, porém a consumação é impossível de ocorrer. É também chamado crime de experiência ou de ensaio. Súmula 145 do STF: “Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”.