Direito penal

51
Estatuto do Desarmamento Aula 1 - 91489973 22/11/08 1. Introdução O porte e posse de arma de fogo até 1997 era uma mera contravenção penal. A partir de 1997, foi editada a Lei nº 9437/97, passando a ser crime. A partir de 2003, com a edição da Lei nº 10.826/03, o que era crime continuou crime, com algumas modalidades inafiançáveis, que posteriormente foi rechaçada pelo STF. Isto prova que crime é ontologicamente igual a contravenção penal, pois neste caso, estamos diante de opção política. 2. A Lei nº 10.826/03 Três capítulos chamam a atenção: i. Objetivo: inibir o cidadão de possuir arma de fogo, buscando assim, inibir crimes violentos. A proibição da mera posse, para alguns, é inconstitucional. ii. 1º Capítulo: se refere ao registro de armas de fogo (arts. 3º a 5º); iii. 2º Capítulo: do porte de arma de fogo (arts. 6º ao 11), estando regulamentado pelo Decreto nº 5123/04, valendo lembrar que este decreto no art. 33, determina que o porte para os cargos que o exige, é funcional: Art. 33. O Porte de Arma de Fogo é deferido aos militares das Forças Armadas, aos policiais federais e estaduais e do Distrito Federal, civis e militares, aos Corpos de Bombeiros Militares, bem como aos policiais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em razão do desempenho de suas funções institucionais.

description

Estatuto do Desarmamento Aula 1 - 91489973 22/11/08 1. Introdução O porte e posse de arma de fogo até 1997 era uma mera contravenção penal. A partir de 1997, foi editada a Lei nº 9437/97, passando a ser crime. A partir de 2003, com a edição da Lei nº 10.826/03, o que era crime continuou crime, com algumas modalidades inafiançáveis, que posteriormente foi rechaçada pelo STF. Isto prova que crime é ontologicamente igual a contravenção penal, pois neste caso, estamos diante de opção política. 2. A

Transcript of Direito penal

Page 1: Direito penal

Estatuto do Desarmamento

Aula 1 - 91489973

22/11/08

1. Introdução

O porte e posse de arma de fogo até 1997 era uma mera contravenção penal. A partir de 1997, foi editada a Lei nº 9437/97, passando a ser crime. A partir de 2003, com a edição da Lei nº 10.826/03, o que era crime continuou crime, com algumas modalidades inafiançáveis, que posteriormente foi rechaçada pelo STF. Isto prova que crime é ontologicamente igual a contravenção penal, pois neste caso, estamos diante de opção política.

2. A Lei nº 10.826/03

Três capítulos chamam a atenção:

i. Objetivo: inibir o cidadão de possuir arma de fogo, buscando assim, inibir crimes violentos. A proibição da mera posse, para alguns, é inconstitucional.

ii. 1º Capítulo: se refere ao registro de armas de fogo (arts. 3º a 5º); iii. 2º Capítulo: do porte de arma de fogo (arts. 6º ao 11), estando regulamentado pelo

Decreto nº 5123/04, valendo lembrar que este decreto no art. 33, determina que o porte para os cargos que o exige, é funcional:

Art. 33. O Porte de Arma de Fogo é deferido aos militares das Forças Armadas, aos policiais federais e estaduais e do Distrito Federal, civis e militares, aos Corpos de Bombeiros Militares, bem como aos policiais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em razão do desempenho de suas funções institucionais.

No entanto, no RMS nº 23971 – MS, o STJ entendeu que este artigo só se aplica enquanto o servidor estiver em atividade funcional:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DELEGADOS DE POLÍCIA APOSENTADOS. INEXISTÊNCIA DE DIREITO A PORTE DE ARMAS. VEDAÇÃO EXPRESSA PELO ARTIGO 33 DO DECRETO FEDERAL 5.123/2004, QUE REGULAMENTA O ARTIGO 6º DA LEI 10.826/03, ESTATUTO DO DESARMAMENTO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO-CARACTERIZADO.1. Trata-se de recurso ordinário em mandado de segurança ajuizado pelo Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de Mato Grosso - Sindepo/MT em impugnação a acórdão que, amparado na Lei 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento), decidiu que os delegados de polícia aposentados não possuem direito ao porte de armas, prerrogativa somente deferida aos profissionais que estejam no exercício de suas funções institucionais.2. Contudo, a pretensão é de manifesto descabimento, porquanto o artigo 33 do Decreto Federal 5.123/2004, que regulamenta o artigo 6º da Lei 10.826/03, Estatuto do Desarmamento, é expresso ao condicionar o porte de arma de

Page 2: Direito penal

fogo aos policiais civis (dentre outros profissionais) ao efetivo exercício de suas funções institucionais, o que não se verifica em relação aos profissionais policiais que estejam já aposentados. Confira-se o precitado dispositivo:Decreto 5.123/2004 - Art. 33. O Porte de Arma de Fogo é deferido aos militares das Forças Armadas, aos policiais federais e estaduais e do Distrito Federal, civis e militares, aos Corpos de Bombeiros Militares, bem como aos policiais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em razão do desempenho de suas funções institucionais. 3. Ao que se constata, portanto, os argumentos recursais não possuem o condão de elidir o acórdão atacado, que deve ser mantido pelos seus próprios e jurídicos fundamentos. 4. Recurso ordinário em mandado de segurança não-provido.

Quanto ao MP e aos juízes, o art. 33 não lhes é aplicado, pois o porte neste caso, está previsto nas respectivas lei orgânicas, que são leis complementares.Para alguns serviços, devem ser cobrados taxas na forma do art. 11 do estatuto:

Art. 11. Fica instituída a cobrança de taxas, nos valores constantes do Anexo desta Lei, pela prestação de serviços relativos: I – ao registro de arma de fogo; II – à renovação de registro de arma de fogo; III – à expedição de segunda via de registro de arma de fogo; IV – à expedição de porte federal de arma de fogo; V – à renovação de porte de arma de fogo; VI – à expedição de segunda via de porte federal de arma de fogo. § 1o Os valores arrecadados destinam-se ao custeio e à manutenção das atividades do Sinarm, da Polícia Federal e do Comando do Exército, no âmbito de suas respectivas responsabilidades. § 2o São isentas do pagamento das taxas previstas neste artigo as pessoas e as instituições a que se referem os incisos I a VII e X e o § 5o do art. 6o desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008)

No entanto, temos doutrina questionando as taxas constantes do anexo, pois são valores elevados e que possui efeito de confisco sobre a arma levada a registro, ferindo, portanto, o princípio constitucional de instituição de tributos com efeito de confisco, na forma do art. 150, IV, CF. No entanto, essas taxas está de acordo com o objetivo da lei, pois visa inibir o cidadão a possuir arma de fogo.O STF indiretamente rechaçou a tese da inconstitucionalidade na ADI nº 3112-1/DF:

3. Crimes em espécie

Lei nº 9437/97 (revogada) Lei nº 10826/03No art. 10, o legislador punia, com pena igual:

i. Posse;ii. Porte;iii. Dispara de arma;

A lei nova, institui para cada crime, penas diversas em tipos diversos:

i. Art.12ii. Art. 14

Page 3: Direito penal

iv. Comércio irregular.Quando a lei punia comportamentos de gravidades diversas, feria o princípio da proporcionalidade.

iii. Art. 15iv. Art. 17

Desta forma, a lei nova trabalha com proporcionalidade.

De forma constante, encontraremos as expressões arma de fogo de uso restrito, permitido ou proibido, além de munição e acessório, e que estarão previstos no Decreto nº 3.665/00, e no Decreto nº 5.123/00. Assim, na lei, encontraremos sobre este tema, norma penal em branco.

3.1. Posse irregular de arma de fogo de uso permitido

Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

O art. 12 só pune a posse ilegal, e não pune porte. Assim, para possuir uma arma é necessária a autorização, conforme art. 5º.

O objeto jurídico (objetividade jurídica) é a proteção da incolumidade pública, ou seja, essa posse irregular pode causar inúmeros perigos.

O sujeito ativo, para maioria de doutrina, será qualquer pessoa (crime comum), havendo uma minoria crescente entendendo que só pode cometer esse crime o proprietário da residência ou representante legal da empresa ou estabelecimento, sendo um crime próprio. O art. 16, §1º dispõe:

Art. 16. O Certificado de Registro de Arma de Fogo expedido pela Polícia Federal, após autorização do SINARM, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa. § 1o Para os efeitos do disposto no caput deste artigo considerar-se-á titular do estabelecimento ou empresa todo aquele assim definido em contrato social, e responsável legal o designado em contrato individual de trabalho, com poderes de gerência.

Só responde pelo art. 12 (possuir ou manter sob a sua guarda arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido) o representante ou quem tenha poder de gerência. No entanto, se a arma está no local de trabalho, e esta for de outra pessoa que não o representante ou quem tenha poder de gerência, o tipo será o do art. 14 (porte ilegal de arma de foto de uso permitido), com pena mais severa. De acordo com uma doutrina minoritária, o crime é próprio, pois exigiria uma condição especial do agente, ou seja, ser proprietária da residência ou do estabelecimento comercial. No entanto, não prospera essa tese pois ou se é um ou é outro.

Page 4: Direito penal

Quanto ao sujeito passivo (vítima) do art. 12 é a coletividade, pois é ela que é a titular do bem jurídico segurança pública (crime vago, pois o sujeito passivo é indeterminado).

O objeto material é a arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido, pois se for de uso proibido será crime do art. 16.

É imprescindível que o agente ativo aja em desacordo com determinação legal ou regulamentar, sendo este o elemento normativo indicativo da ilicitude.

Ademais, esse crime só pode ser cometido em local específico (elemento indicativo do local):

a) No interior da residência ou suas dependências;b) Local de trabalho

Se não coincidir o local com o personagem, será art. 14.

Vale ressaltar a diferença entre porte e posse:

Posse PorteOcorre no interior da residência do infrator ou em dependência dela;Ocorre no local de trabalho no qual o infrator seja o proprietário ou o responsável legal

Ocorre em qualquer outro local.Ocultar a arma dentro de casa, segundo o STJ, será porte e não posse, conforme HC 72035 – STJ:HABEAS CORPUS . ROUBO TRIPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO (CONCURSO DE AGENTES, USO DE ARMA DE FOGO E RESTRIÇÃO À LIBERDADE DAS VÍTIMAS). CONCURSO MATERIAL. CRIME DE PORTE ILEGALDE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL EM AMBOS OS CRIMES (5 ANOS E 4 MESES, PARA O PRIMEIRO, E 3 ANOS PARA O SEGUNDO). PENA CONCRETIZADA: 7 ANOS, 5 MESES E 18 DIAS E 3 ANOS, RESPECTIVAMENTE. DOSIMETRIA DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. INQUÉRITOS E PROCESSOS EM ANDAMENTO AVALIADOS COMO MAUS-ANTECEDENTES. BIS IN IDEM PELA VALORAÇÃO DAS CAUSAS DE AUMENTO DE PENA DO CRIME DE ROUBO NA FASE DO ART. 59 DO CPB. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. REINCIDÊNCIA. COMPENSAÇÃO COM A ATENUANTE DA CONFISSÃO. BENEFÍCIO AO APENADO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO, NA MODALIDADE DE OCULTAÇÃO. PRETENSÃO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA DO ART. 12 DA LEI 10.826/03 (POSSE). INADMISSIBILIDADE. WRIT PARCIALMENTE CONCEDIDO, PARA REDUZIR A PENA-BASE DOS CRIMES DE ROUBO E PORTE

Page 5: Direito penal

ILEGAL DE ARMA DE FOGO AO MÍNIMO LEGAL.

Neste sentido o HC 92369/SP – STJ:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. PRAZO PARA A REGULARIZAÇÃO DA ARMA. ARTIGOS 30, 31 E 32, DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO.I - Não se pode confundir posse de arma de fogo com o porte de arma de fogo. Com o advento do Estatuto do Desarmamento, tais condutas restaram bem delineadas. A posse consiste em manter no interior de residência (ou dependência desta) ou no local de trabalho a arma de fogo. O porte, por sua vez, pressupõe que a arma de fogo esteja fora da residência ou local de trabalho. (Precedentes).II - Os prazos a que se referem os artigos 30, 31 e 32, da Lei nº 10.826/2003, só beneficiam os possuidores de arma de fogo, i.e., quem a possui em suaresidência ou emprego. Ademais, cumpre asseverar que o mencionado prazo teve seu termo inicial em 23 de dezembro de 2003, e possui termo final previsto para 31 de dezembro de 2008 (nos termos do art. 1º da Medida Provisória nº 417, de 31 de janeiro de 2008, que conferiu nova redação aos arts. 30 e 32 da Lei 10.826/03). Desta maneira, nas hipóteses ocorridas dentro de tal prazo, ninguém poderá ser preso ou processado por possuir (em casa ou no trabalho) uma arma de fogo. (Precedente).III - In casu, as condutas atribuídas ao paciente foram as de possuir munição e de manter sob sua guarda arma de fogo de uso permitido, ambos no interior de sua residência. Logo, enquadra-se tal conduta nas hipóteses excepcionais dos artigos 30, 31 e 32 do Estatuto do Desarmamento, restando, portanto, extinta a punibilidade, ex vi do art. 5º, XL, da CF c/c art. 107, III, do Código Penal.Ordem concedida.

Se a pessoa tem registro da arma (posse), ainda assim, não é possível ficar portando-a, sem vínculo objetivo (uso em casos necessários), sob pena de configurar porte ilegal intra munus, respondendo pelo art. 14.

O art. 28 do Decreto nº 5123/04 dispõe que:

Art. 28. O proprietário de arma de fogo de uso permitido registrada, em caso de mudança de domicílio, ou outra situação que implique no transporte da arma, deverá solicitar à Polícia Federal a expedição de Porte de Trânsito, nos termos estabelecidos em norma própria.

O crime do art. 12 é punido a título de dolo, e se consuma com a prática de qualquer um dos dois núcleos (no momento em que o agente ingressa ilegalmente na posse da arma ou acessório ou manter sob a sua posse).

Page 6: Direito penal

Trata-se de crime permanente, ou seja, a consumação se protrai no tempo. Neste caso, a prescrição só começa a correr depois de cessada a permanência, admite-se flagrante a qualquer tempo e aplica-se a Súmula 711 do STF, ou seja, sobrevindo lei mais grave sobre a permanência, esta será aplicada. Trata-se também de crime de perigo abstrato.

Há divergência quanto à tentativa, mas prevalece que essa é impossível, bem como se trata de crime permanente.

3.1.1. Posse de arma de brinquedo

Na lei anterior, o art. 10, §1º, II, punia-se a utilização de arma de brinquedo, simulacro de arma capaz de atemorizar outrem, para o fim de cometer crimes. No entanto, a nova lei não trata dessa posse, ocorrendo o fenômeno da “abolitio criminis”.

Lei nº 9437/97 Lei nº 10826/03Posse de arma de fogo Art. 10 Art. 12 (ocorreu o princípio da

continuidade normativo típica)Posse de arma de brinquedo Art. 10, §1º, II XXXXXXXXXXXXXXX

Vale lembrar que o STF não tem aplicado a majorante do inciso I §2º do art. 157:

PROCESSUAL PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS. APELAÇÃO CRIMINAL. INTERROGATÓRIO DO RÉU POR VIDEOCONFERÊNCIA. MATÉRIA NÃO-ANALISADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. ARMA DE BRINQUEDO. INCIDÊNCIA INDEVIDA DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 157, § 2º, I, DO CP. SÚMULA 174/STJ CANCELADA. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME INICIAL MAIS SEVERO. DECISÃO FUNDAMENTADA TÃO-SOMENTE NA GRAVIDADE GENÉRICA DO DELITO. SÚMULA 718/STF. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, DEFERIDA. 1. Não tendo a controvérsia suscitada na impetração sido objeto de debate e julgamento por parte do Tribunal de origem, o exame da matéria pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de habeas corpus, ocasionaria indevida supressão de instância. 2. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça cancelou o enunciado da Súmula 174, firmando sua jurisprudência no sentido de que não se aplica a majorante do art. 157, § 2º, I, do CP aos delitos de roubo praticados com emprego de arma de brinquedo. 3. Nos termos da Súmula 718/STF, "A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada". 4. A fixação da pena-base no mínimo legal, por serem favoráveis as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, com o estabelecimento do regime inicial fechado para o cumprimento da reprimenda pela prática do crime de roubo simples, com base apenas na gravidade genérica do delito, constitui constrangimento ilegal, por inobservância do disposto no art. 33, § 2º, alínea c, do Código Penal. 5. Ordem parcialmente conhecida e, nessa

Page 7: Direito penal

extensão, deferida para redimensionar a pena imposta ao paciente para 4 anos de reclusão e 10 dias-multa, a ser cumprida no regime inicial aberto. (HC 107127).

HABEAS CORPUS. ROUBO. ARMA DE BRINQUEDO. OBJETO DE INTIMIDAÇÃO DA VÍTIMA. INEXISTÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. MAJORANTE NÃO CARACTERIZADA. 1. A utilização de arma de brinquedo para intimidar a vítima do delito de roubo não autoriza o reconhecimento da majorante da pena, cuja a caracterização está vinculada ao potencial lesivo do instrumento. 2. Ordem concedida para excluir da condenação a circunstância disposta no inciso I do § 2º do art. 157 do CP. (HC 93106).

3.2. Omissão de cautela

Esse crime já existia na lei anterior, estando previsto no art. 13:

Art. 13. Deixar de observar as cautelas necessárias para impedir que menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa portadora de deficiência mental se apodere de arma de fogo que esteja sob sua posse ou que seja de sua propriedade: Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.

Neste tipo, existem dois bens jurídicos tutelados:

i. Bem jurídico imediato: incolumidade pública;ii. Bem jurídico mediato ou secundário: incolumidade pessoa do menor de 18 anos

ou pessoa portadora de deficiência mental (crime de dupla objetividade jurídica);

O sujeito ativo é o possuidor ou proprietário da arma de fogo (crime próprio) e o sujeito passivo será:

i. Vítima primária: coletividade;ii. Vítima secundária: menor de 18 anos ou pessoa portadora de deficiência mental.

Pode existir esse crime, mesmo que não haja vínculo entre o proprietário e o menor ou o deficiente mental, pois se dispensa qualquer vínculo entre os sujeitos. Basta a posse por menor de 18 anos ou deficiente mental, facilitada pelo sujeito ativo.

Trata-se de negligência na guarda de arma de fogo, tratando-se portando, de crime culposo.

O crime é omissivo próprio ou puro.

Para a consumação é indispensável que o menor de 18 anos ou deficiente mental se apodere da arma. Esse menor ou deficiente mental não tem que causar efetiva lesão a quem quer que seja à consumação. Será fato atípico se a pessoa tiver deficiência física.

Vale ressaltar que existem algumas correntes acerca da classificação do crime:

Page 8: Direito penal

i. O apoderamento pela vítima é o resultado naturalístico, configurando o crime material (Capez);

ii. O resultado naturalístico é a lesão à incolumidade pessoal das vítimas, sendo dispensável, tratando-se, portanto, de crime formal (Flávio Monteiro de Barros), sendo uma exceção a regra de que o crime culposo deve ser material;

Hoje, nos doutrinadores prevalece a primeira corrente.

Havendo apoderamento por menor por fruto de dolo do proprietário, estaremos diante do art. 16, parágrafo único, V, no entanto, se for deficiente mental, será art. 14, caput se a arma for de uso permitido, ou art. 16 caput, se arma de uso restrito, ressaltando, neste caso, que o art. 13 independe do tipo de arma.

O art. 19, §2ª, da lei de contravenção penal dispõe:

Art. 19. Trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta, sem licença da autoridade: § 2º Incorre na pena de prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a um conto de réis, quem, possuindo arma ou munição: a) deixa de fazer comunicação ou entrega à autoridade, quando a lei o determina; b) permite que alienado menor de 18 anos ou pessoa inexperiente no manejo de arma a tenha consigo; c) omite as cautelas necessárias para impedir que dela se apodere facilmente alienado, menor de 18 anos ou pessoa inexperiente em manejá-la.

Contravenção Penal Estatudo do DesarmamentoO art. 19, §2º pune a negligência na guarda da arma de fogo e branca

O art. 13 pune a negligência na guarda de arma de fogo

São vítimas:a. Menor de 18 anosb. Pessoa inexperiente

São vítimas:a. Menor de 18 anos;b. Alienado mental

Em relação à arma branca e a pessoa inexperiente, o art. 13 da lei do desarmamento não revogou com sua nova redação, aplicando, portanto, a esses casos, a lei de contravenção penal.Sendo munição, aplica-se o art. 19, e se for acessório, o fato será atípico, pois nenhum dos dois falam deste objeto material.

Esse tipo do estatuto não admite tentativa, pois é culposo.

Outrossim, dispõe o parágrafo único do art. 13:

Parágrafo único. Nas mesmas penas incorrem o proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança e transporte de valores que deixarem de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo,

Page 9: Direito penal

acessório ou munição que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte quatro) horas depois de ocorrido o fato.

Trata-se de crime autônomo, sendo o bem jurídico tutelado é a incolumidade pública e a regularidade dos cadastros do sistema nacional de armas.

O sujeito ativo é o proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança ou transporte de valor.

O sujeito passivo é a coletividade e o Estado, porque coloca em risco o controle da arma de fogo no Brasil.

A conduta punida é deixar de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo, acessório ou munição que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte quatro) horas depois de ocorrido o fato.

Neste caso nós temos duas obrigações, ou seja, deve-se comunicar as duas polícias, e se comunicar apenas uma delas, o crime persiste (maioria da doutrina). Capez entende que um dos registros exclui a tipicidade da conduta.

Esse registro deve acontecer nas primeiras 24 horas depois de ocorrido o fato. No entanto, a melhor interpretação é de que a comunicação deverá ocorrer nas primeiras 24 horas da ciência do fato ocorrido.

Só responde pelo crime quem tinha a arma legalizada, pois quem tinha arma ilegal, responde pelo art. 12 e art. 14.

O crime é punido, somente, a título de dolo. Estamos diante de uma omissão dolosa. Tem doutrina minoritária querendo punir omissão culposa. Esse entendimento está equivocado, pois só pode-se punir por culposa se prevista no tipo, bem como, punir culpa e dolo com a mesma pena, ferindo o princípio da proporcionalidade.

Trata-se de crime a prazo, e se consuma após as 24 horas de inércia após a ciência do fato, não se admitindo fracionamento, por ser omissivo impróprio. A doutrina não admite tentativa por se tratar de crime de mera conduta.

O procedimento é o sumaríssimo.

3.3. Porte Ilegal de arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido

O art. 14 dispõe:

Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente. (Vide Adin 3112-1)

Page 10: Direito penal

Tem posse que vem aqui para este tipo, como no caso do garçom que tem arma guardada no local de trabalho, não sendo porte, mas posse.

O objeto jurídico é a incolumidade pública. Pode ser praticado por qualquer pessoa, e a vítima é a coletividade.

Estes núcleos podem ser divididos em três grupos:

i. Auto-satisfação: empregar, portar;ii. Deslocamento: transportar, remeter;iii. Abastecimento: fornecer, alugar, expor a venda e etc.

Se o agente praticar o crime em mais de um contexto fático, o crime continua único. A prática de mais de um núcleo num mesmo contexto fático, o crime é único. Se o agente for surpreendido carregando mais de uma arma, o crime continuará único, mas servirá de parâmetro na fixação da pena. Vale ressaltar que se ele foi surpreendido trazendo armas permitidas e de uso proibido, o agente pratica dois crimes.

Até pouco tempo, para o STF só haveria crime se a arma estiver em condição de funcionamento, sendo imprescindível a perícia, pois se tratava de perigo concreto, enquanto o STJ já trabalhava com perigo abstrato, conforme STJ HC 86815 – MS:

HABEAS CORPUS . PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA ART. 14 DA LEI N.º 10.826/03 (ESTATUTO DO DESARMAMENTO). TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ATIPICIDADE. INEXISTÊNCIA. PERIGO ABSTRATO CONFIGURADO. DISPOSITIVO LEGAL VIGENTE. 1. Malgrado os relevantes fundamentos esposados na impetração, este Tribunal já firmou o entendimento segundo o qual o porte ilegal de arma de fogo desmuniciada e o de munições, mesmo configurando hipótese de perigo abstrato ao objeto jurídico protegido pela norma, constitui conduta típica. 2. Desse modo, estando em plena vigência o dispositivo legal ora impugnado, não tendo sido declarada sua inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, não há espaço para a pretendida absolvição do Paciente, em face da atipicidade da conduta. 3. Ordem denegada....PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 14 DA LEI 10.826/03. DELITO DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARMA DESMUNICIADA. IRRELEVÂNCIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.1. A objetividade jurídica dos crimes tipificados na Lei de Porte de Armas não se restringe à incolumidade pessoal, alcançando, também, a liberdade pessoal, protegidas mediatamente pela tutela primária dos níveis da segurança coletiva, o que determina a irrelevância da eficácia da arma para a configuração do tipo penal.2. Recurso especial conhecido e provido para restabelecer a sentença condenatória.

Todavia, recentemente o STF mudou seu posicionamento, admitindo o porte como perigo abstrato:

Page 11: Direito penal

Porte Ilegal de Arma e Ausência de MuniçãoA Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se discute a tipicidade, ou não, do porte de arma desmuniciada. Trata-se, na espécie, de habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime previsto no art. 14 da Lei 10.826/03 — Estatuto do Desarmamento —, no qual se pretende a nulidade da sentença condenatória, sob alegação de atipicidade da conduta, em razão de a arma portada estar desmuniciada. A Min. Ellen Gracie, relatora, denegou a ordem por entender que o tipo penal do art. 14 da mencionada lei contempla crime de mera conduta, sendo suficiente a ação de portar ilegalmente a arma de fogo, ainda que desmuniciada (Lei 10.826: “Art. 14 Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:”). Aduziu que o fato de o revólver estar desmuniciado não o desqualificaria como arma, tendo em vista que a ofensividade deste artefato não está apenas na sua capacidade de disparar projéteis, causando ferimentos graves ou mortes, mas também, na grande maioria dos casos, no seu potencial de intimidação. Enfatizou que o crime é de perigo abstrato, não tendo a lei exigido a efetiva exposição de outrem a risco, sendo irrelevante a avaliação subseqüente sobre a ocorrência de perigo à coletividade. Após, pediu vista dos autos o Min. Cezar Peluso. HC 95073/MS, rel. Min. Ellen Gracie, 2.6.2009. (HC-95073)

EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. PORTE DE ARMA DE FOGO DESMUNICIADA. INTELIGÊNCIADO ART. 14 da Lei 10.826/2003. TIPICIDADE RECONHECIDA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. ORDEM DENEGADA. I. A objetividade jurídica da norma penal transcende a mera proteção da incolumidade pessoal, para alcançar também a tutela da liberdade individual e do corpo social como um todo, asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia. II. Mostra-se irrelevante, no caso, cogitar-se da eficácia da arma para a configuração do tipo penal em comento, isto é, se ela está ou não municiada ou se a munição está ou não ao alcance das mãos, porque a hipótese é de crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação. III - Habeas corpus denegado. HC 96072 / RJ - RIO DE JANEIRO HABEAS CORPUSRelator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKIJulgamento: 16/03/2010 Órgão Julgador: Primeira Turma

Page 12: Direito penal

Nessa linha, o STJ vem entendendo que o crime dispensa perícia, pois trata-se de crime de perigo abstrato, conforme Resp 953853 –RS:PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. DESNECESSIDADE DE EXAME PERICIAL. Na linha de precedentes desta Corte, a nulidade ou a não realização do exame pericial da arma é irrelevante para a caracterização do delito do art. 12 da Lei nº 10.826/03, sendo bastante que o agente porte sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Recurso provido.

Ademais, em decisão recente a Corte Suprema dispôs (Info 539):

Porte de Arma e Perícia sobre a Potencialidade LesivaPara a configuração do crime de porte ilegal de arma de fogo não importa se a arma está municiada ou, ainda, se apresenta regular funcionamento. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se pleiteava a descaracterização da materialidade da conduta imputada ao paciente, porte ilegal de arma de fogo (Lei 9.437/97, art. 10), sob a alegação de ausência de perícia para comprovação do potencial lesivo do revólver apreendido. De início, ressaltou-se que a mencionada norma incriminadora não fazia menção à necessidade de se aferir o potencial lesivo da arma. Aduziu-se que a Lei 9.437/97 fora revogada pela Lei 10.826/2006 (Estatuto do Desarmamento), cujo art. 14 tipificou a simples conduta de portar munição, a qual, isoladamente, ou seja, sem a arma, não possui qualquer potencial ofensivo. Ademais, asseverou-se que ambos os diplomas legais foram promulgados com o fim de garantir a segurança da coletividade, sendo que a objetividade jurídica neles prevista transcende a mera proteção da incolumidade pessoal. Dessa forma, dispensável a realização do laudo pericial do revólver para avaliação da materialidade do crime. HC 96922/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 17.3.2009. (HC-96922)

Vale ressaltar, dois julgados recentes quanto à porte ilegal de arma de fogo, demonstrando a volatilidade do instituto (Inf 550 – STF):

Porte Ilegal de Arma e Ausência de MuniçãoPara a configuração do delito de porte ilegal de arma de fogo é irrelevante o fato de a arma encontrar-se desmuniciada e de o agente não ter a pronta disponibilidade de munição. Com base nesse entendimento, a Turma desproveu recurso ordinário em habeas corpus interposto por condenado pela prática do crime de porte ilegal de arma de fogo (Lei 9.437/97, art. 10), no qual se alegava a atipicidade do porte de revólver desmuniciado ante a ausência de lesão ao bem jurídico penalmente protegido. Assentou-se que a objetividade jurídica da norma penal transcende a mera proteção da incolumidade pessoal para alcançar a tutela da liberdade individual e do corpo social como um todo, asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia. Enfatizou-se, destarte, que se mostraria irrelevante, no caso, cogitar-se da

Page 13: Direito penal

eficácia da arma para configuração do tipo penal em comento — isto é, se ela estaria, ou não, municiada ou se a munição estaria, ou não, ao alcance das mãos —, porque a hipótese seria de crime de perigo abstrato para cuja caracterização desimporta o resultado concreto da ação. RHC 90197/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 9.6.2009. (RHC-90197)

Porte Ilegal de Arma e Ausência de MuniçãoArma desmuniciada ou sem possibilidade de pronto municiamento não configura o delito previsto no art. 14 da Lei 10.826/2003. Com base nesse entendimento, a Turma, por maioria, deferiu habeas corpus para trancar ação penal instaurada em desfavor de denunciado pela suposta prática do crime de porte ilegal de arma de fogo, em razão de possuir, portar e conduzir espingarda, sem munição, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Vencidos os Ministros Ellen Gracie, relatora, e Joaquim Barbosa que denegavam o writ por considerar típica a conduta narrada na inicial acusatória. HC 97811/SP, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Eros Grau, 9.6.2009. (HC-97811 – 2ª Turma)

No caso de venda de arma de fogo de uso permitido, esta ocorrendo no exercício de atividade comercial, será art. 17, e se for em venda particular será o art. 14, pois a doutrina subsume essa conduta nos núcleos “ceder” e no “fornecer”.

Não há, ainda, entendimento concreto sobre o tema. A arma desmuniciada é aquela arma sem munição e sem possibilidade de municiamento. Sob o advento da Lei nº 9437/97, entendeu o STF, em ambos os sentidos, que não é crime por ser impossível gerar perigo por lei, ou seja, crime de perigo abstrato. A questão é que com o advento da Lei nº 10826/03, passou-se a punir porte de arma, acessório ou munição, diferenciado-os, demonstrando que é crime, tanto portar uma arma sem munição, como é crime portar uma arma com munição. Neste sentido, o STF ratificou o entendimento em sentido a configurar o crime e outro que não configura, ou seja, absoluta impropriedade do objeto material. No entanto, o STJ entende ser crime de perigo ABSTRATO (HC 89509-SP/HC 70080-SP):

PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 14 DA LEI Nº 10.826/03. DELITO DE PERIGO ABSTRATO. Na linha de precedentes desta Corte o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido é delito de perigo abstrato, sendo, portanto, em tese, típica a conduta daquele que é preso portando arma de fogo, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (Precedentes). Ordem denegada. ...CRIMINAL. HC. PORTE DE MUNIÇÃO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CONDUTA TÍPICA. PERIGO ABSTRATO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. I . Hipótese em que ao paciente foi imputada a prática do crime previsto no art. 14 da Lei 10.826/2003 por terem sido encontradas, em tese, sob sua guarda, oito cápsulas calibre 38. I I . Esta Turma já decidiu que o porte de munição configura

Page 14: Direito penal

conduta típica, eis que caracterizado o perigo abstrato ao objeto jurídico protegido pela Lei n.º 10.826/2003, na esteira do entendimento consolidado quanto ao porte ilegal de arma de fogo desmuniciada. Precedente. I I I .Ordem denegada. (HC 70080 – SP)...RECURSO ESPECIAL. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA. ART. 10, § 3.º, INCISO IV, DA LEI N.º 9.437/97. ARMA DESMUNICIADA. ARGUIDA ATIPICIDADE. INEXISTÊNCIA. PERIGO ABSTRATO CONFIGURADO. DISPOSITIVO LEGAL VIGENTE. RECURSO PROVIDO.1. Malgrado os relevantes fundamentos esposados no acórdão recorrido, este Tribunal já firmou o entendimento segundo o qual o porte ilegal de arma de fogo desmuniciada e o de munições, mesmo configurando hipótese de perigo abstrato ao objeto jurídico protegido pela norma, constitui conduta típica.2. Desse modo, estando em plena vigência o dispositivo legal ora impugnado, não tendo sido declarada sua inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, não há espaço para a pretendida absolvição do Paciente, em face da atipicidade da conduta.3. Recurso provido para, cassando o acórdão recorrido, determinar ao Egrégio Tribunal a quo que, considerando a tipicidade da conduta imputada ao Réu, prossiga no julgamento das teses defensivas expostas na apelação. Resp 849759 -

O art. 14 é punido a título de dolo.

Se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos, sendo alguns permanentes (ter em depósito, transportar, ocultar, manter em guarda). A tentativa, em tese, é possível, por exemplo, no verbo adquirir.

O porte de munição isolado, desacompanhado de arma, não possui nenhuma lesividade. Portanto, criminalizá-lo, fere o princípio constitucional da ofensividade ou lesividade. Para o STJ, o porte só de munição sempre configura crime, por se tratar de perigo abstrato, bem como há previsão expressa do tipo da munição como objeto material do crime. O STF ainda não se manifestou sobre, exceto no HC 90075/SC, em que a 2ª turma (voto de dois ministros até agora) entende que o porte só de munição é crime.

Acerca da arma desmuniciada, o STF já entendeu:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. ARTIGO 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO IV, DA LEI N. 10.826/03. ARMA DE FOGO. SUPRESSÃO DO NÚMERO DE IDENTIFICAÇÃO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INOCORRÊNCIA. A arma de fogo desmuniciada não infirma a conduta tipificada no artigo 16, inciso IV, da Lei n. 10.826/03. Isso porque, com ou sem munição, dela sempre deverá constar número de série, marca ou sinal de identificação, a fim de garantir o controle estatal. Ordem denegada. HC 91853 / SP - SÃO PAULO...EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARMA

Page 15: Direito penal

DESMUNICIADA E ENFERRUJADA. AUSÊNCIA DE EXAME PERICIAL. ATIPICIDADE. Inexistindo exame pericial atestando a potencialidade lesiva da arma de fogo apreendida, resulta atípica a conduta consistente em possuir, portar e conduzir arma de fogo desmuniciada e enferrujada. Recurso provido. RHC 97477 / RJ - RIO DE JANEIRO....EMENTA: HABEAS CORPUS. TIPICIDADE. PORTE ILEGAL DE ARMA DESMUNICIADA E COM NUMERAÇÃO RASPADA. INCIDÊNCIA DO INCISO IV DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 16 DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, DENEGADA. 1. A tese da atipicidade do porte ilegal de arma desmuniciada não foi arguida perante a autoridade apontada como coatora. Impossibilidade de conhecimento pelo Supremo Tribunal Federal, pena de indevida supressão de instância. 2. No julgamento do RHC 89.889, da relatoria da ministra Cármem Lúcia, o Plenário desta colenda Corte entendeu que o delito de que trata o inciso IV do parágrafo único do art. 16 do Estatuto do Desarmamento é Política Criminal de valorização do poder-dever do Estado de controlar as armas de fogo que circulam em nosso País. Isso porque a supressão do número, marca, ou qualquer outro sinal identificador do artefato lesivo impede o seu cadastramento e controle. 3. A função social do combate ao delito em foco alcança qualquer tipo de arma de fogo; e não apenas armamento de uso restrito ou proibido. Tanto é assim que o porte de arma de fogo com numeração raspada constitui crime autônomo. Figura penal que, no caso, tem como circunstância elementar o fato de a arma (seja ela de uso restrito ou não) estar com a numeração ou qualquer outro sinal identificador adulterado, raspado ou suprimido. 4. Ordem parcialmente conhecida e, nessa extensão, denegada. HC 99582 / RS - RIO GRANDE DO SUL...EMENTA: PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARMA DESMUNICIADA. TIPICIDADE. CARÁTER DE PERIGO ABSTRATO DA CONDUTA. RECURSO IMPROVIDO. 1. O porte ilegal de arma de fogo é crime de perigo abstrato, consumando-se pela objetividade do ato em si de alguém levar consigo arma de fogo, desautorizadamente e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Donde a irrelevância de estar municiada a arma, ou não, pois o crime de perigo abstrato é assim designado por prescindir da demonstração de ofensividade real. 2. Recurso improvido. RHC 91553 / DF - DISTRITO FEDERAL...EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARMA DESMUNICIADA. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. ATIPICIDADE. Inexistindo laudo pericial atestando a potencialidade lesiva da arma de fogo resulta atípica a conduta consistente em possuir, portar e conduzir

Page 16: Direito penal

espingarda sem munição. Ordem concedida. HC 97811 / SP - SÃO PAULO

EMENTA: PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PORTE DE ARMA DE FOGO DESMUNICIADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 14 da Lei 10.826/03. TIPICIDADE RECONHECIDA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. RECURSO DESPROVIDO. I. A objetividade jurídica da norma penal transcende a mera proteção da incolumidade pessoal, para alcançar também a tutela da liberdade individual e do corpo social como um todo, asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a Lei propicia. II. Mostra-se irrelevante, no caso, cogitar-se da eficácia da arma para a configuração do tipo penal em comento, isto é, se ela está ou não municiada ou se a munição está ou não ao alcance das mãos, porque a hipótese é de crime de perigo abstrato, para cuja caracterização desimporta o resultado concreto da ação. III - Recurso desprovido. RHC 90197 / DF - DISTRITO FEDERAL

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NÚMERO DE SÉRIE SUPRIMIDO: INTELIGÊNCIA DO ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. IV, DA LEI N. 10.826/03. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, DESPROVIDO. 1. A arma de fogo, mesmo desmuniciada, não infirma a conduta penalmente punível na forma tipificada no dispositivo mencionado, porque, com ou sem munição, ela haverá de manter o seu número de série, marca ou sinal de identificação para que possa ser garantido o controle estatal. 2. A supressão ou a alteração da numeração ou de qualquer outro sinal identificador impede ou dificulta o controle da circulação de armas pela ausência dos registros de posse ou porte ou pela sua frustração. 3. Comprovação inegável do porte e posse de arma de fogo, com o seu número de série suprimido, pelo Recorrente. 4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. RHC 89889 / DF - DISTRITO FEDERAL

Pelos julgados, observa-se que STJ entende se tratar de crime é de perigo abstrato, não havendo necessidade de se realizar perícia para autenticar a potencialidade lesiva do objeto material. Ao contrário, para o STF, é necessário que o crime seja de perigo concreto para configuração do tipo.

3.3.1. Art. 14 e concurso de crimes

Se o sujeito utiliza uma arma para praticar roubo e o sujeito não tem porte, configurará tipos distintos, de acordo com a corrente adotada:

i. Art. 121 ou art. 157, ficando o art. 14 absorvido;ii. Art. 121 ou art. 157 + art. 14, pois os tipos protegem bem jurídicos diversos,

sendo essa a corrente que prevalece, respondendo em concurso material;

Page 17: Direito penal

iii. Se o porte serviu somente para o homicídio ou roubo, fica absorvido, pois o porte é meio de execução do homicídio;

No HC 57519, o STJ assim se posicionou:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS . TENTATIVA DE HOMICÍDIO E PORTE ILEGAL DE ARMA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. QUESTÃO QUE DEPENDE DA ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS EM QUE OCORRERAM OS DELITOS. INVIABILIDADE NA ESTREITA VIA DO WRIT. LIAME LÓGICO ENTRE OS DELITOS. CONEXÃO. REGRA DO ART. 76 DO CPP. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. UNIDADE DE JULGAMENTO. ART. 78, INCISO I, DO CPP. RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE. IMPOSSIBILIDADE. LAVRATURA DO AUTO. PREENCHIMENTO DE TODAS AS FORMALIDADES LEGAIS. ORDEM DENEGADA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. 1. Consoante entendimento consolidado nesta Corte, aferir se o crime de tentativa de homicídio absorve ou não o delito de porte ilegal de arma de fogo, depende de uma atenta análise do contexto fático em que ocorreu o delito, a fim de averiguar se o porte da arma constituiu efetivamente meio necessário ou normal fase de preparação ou execução do homicídio, o que se afigura inviável na estreita via do habeas corpus , marcado por cognição sumária e rito célere.2. Encontrando-se as infrações entrelaçadas, bem como apresentando liame lógico, tem-se presente a conexão, nos termos do art. 76 do Código de Processo Penal.3. Tratando-se de crimes conexos, prevalece a competência do Tribunal do Júri (art. 78, inciso I, do Código de Processo Penal) e, desse modo, a não ser que a relação consuntiva entre os delitosse perceba de pronto, de uma análise perfunctória, o que não ocorre na hipótese retratada nos autos, a questão não deve ser analisada na fase do judicium accusationis , sob pena de violar oprincípio constitucional da soberania do Júri.4. Do exame das peças juntadas aos autos, verifica-se que na lavratura do auto de prisão em flagrante, foram obedecidas todas as exigências legais previstas no art. 304 do Código de Processo Penal, não havendo nenhum vício a ser sanado.5. Ordem denegada. Habeas Corpus concedido de ofício para determinar a reunião das ações penais instauradas contra o paciente (ação penal n.º 2005.0027.1620-0, em trâmite na Vara Única da Comarca de Novo Oriente/CE e Ação Penal n.º 2005.0027.2782-1, em trâmite na 2ª Vara da Comarca de Cratéus), com a conseqüente unidade de julgamento, em obediência ao que determina o art. 78, inciso I, c/c 79, ambos do Código de Processo Penal.

Se o sujeito pratica o art. 14 e art. 12, o primeiro absorve o art. 12. Se o sujeito pratica o art. 14 e 19 da LCP, o art. 19 foi parcialmente revogado quando se tratar de arma de fogo, ou seja, continua para arma branca. No caso de arma de arremesso será o art. 19 da LCP. Se o sujeito

Page 18: Direito penal

pratica o art. 14 e o art. 288, CP, deve-se ter cuidado, pois o parágrafo único deste, pune a quadrilha armada. A maioria ensina que ele responde pelo art. 14 e pelo art. 288 simples, retirando a qualificadora, para evitar “bis in idem”. Se for arma branca, ele responderá pelo art. 288, parágrafo único, que absorve a lei das contravenções penais.

O art. 14, parágrafo único dispõe:

Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente. (Vide Adin 3112-1)

A ADI 3112-1 julgou esse parágrafo único inconstitucional, cabendo fiança em qualquer caso, considerando que:

i. É descabida a vedação sobre o argumento de que este delito não poderia ser equiparado ao terrorismo, à prática da tortura, ao tráfico ou a crimes hediondos, pois se trata de crime de mera conduta que, embora acarreta maior insegurança à sociedade, não pode ser igualado àqueles;

O porte ou a posse de mais de uma arma configura crime único, pois a quantidade de armas influenciará na pena.

Procedimento sumário.

3.4. Disparo de arma de fogo

Dispõe o art. 15:

Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável. (Vide Adin 3112-1)

O bem jurídico tutelado é a incolumidade pública.

O sujeito ativo será qualquer pessoa (crime comum) e o sujeito passivo é a coletividade.

Se o indivíduo tem porte de arma e a dispara em lugar vazio não há crime algum (fato atípico).

Não importa a quantidade de disparos ou munição, devendo para o STF, gerar perigo concreto, enquanto para o STJ deve gerar perigo abstrato, ou seja, o simples disparo já configura fato típico.

O crime é punido a título de dolo, acrescido de um elemento subjetivo negativo, ou seja, uma finalidade que não pode existir, sob pena de mudança do crime.

Esse crime se consuma com o mero disparo ou acionamento da munição, em lugar habitado, via pública ou em direção a ela. Para o STF deveria haver perigo concreto, enquanto para o STJ esse perigo está presumido pela ação. Todavia, o STF mudou entendimento, aceitando a hipótese de que o disparo cause real perigo a alguém.

Page 19: Direito penal

Em tese é possível a tentativa, no caso do infrator que é desarmado no momento em que vai efetuar o disparo.

Por último, o art. 15 revogou o art. 28 da lei das contravenções penais.

Por uma interpretação literal, não se aplica o art. 15 quando o disparo teve por finalidade a pratica de outro crime, mais grave ou menos grave. Porém, doutrina e jurisprudência entendem que se houve homicídio e disparo só se aplica o homicídio; lesão leve e disparo, haverá concurso de crimes pois o crime de lesão leve é menos grave que o crime de disparo, e o crime menos grave não absorve o mais grave; se houver porte ilegal e disparo, dependerá, pois se for porte ilegal de arma permitida e disparo, como ambos tem a mesma pena e ofendem o mesmo bem jurídico, haverá um único crime, para uns o disparo e para outros o porte; se for porte ilegal de arma proibida e disparo, o primeiro prevalece sobre o segundo, por ser crime mais grave. Isso é um apanhado da doutrina e jurisprudência sobre a questão.

3.4.1. Concurso de Crimes

O antigo art. 10, §1, III, dispunha que seria crime disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que o fato não constitua crime mais grave. Por sua vez, o art. 15 dispõe, ao final, que desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime.

A repercussão técnica é que antes havia o princípio da subsidiariedade. Agora, com a mudança há o princípio da especialidade (especial finalidade). No entanto, vejamos os casos:

i. Disparo projétil em via pública (sem finalidade especial) – crime: art. 15;ii. Disparo projétil em via pública querendo ferir levemente alguém – crime: art. 129,

CP. Essa incoerência, pela doutrina, ensina que deve haver uma subsidiariedade implícita, aplicando-se o art. 15 se o outro delito não é mais grave;

iii. Disparo de projétil e porte ilegal:

Art. 14 Art. 15Pena: 2 a 4 anos Pena: 2 a 4 anosNeste caso, temos duas correntes:

a. Cúmulo materialb. Porte fica absorvido: prevalece essa corrente

No caso do art. 16 e art. 15, no primeiro teremos pena de 3 a 6 anos, e o art. 15 pena de 2 a 4 anos, ficando este absorvido pelo art. 16.

O art. 14, parágrafo único dispõe:

Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável. (Vide Adin 3112-1)

A ADI 3112-1 julgou esse parágrafo único inconstitucional, considerando que:

i. É descabida a vedação sobre o argumento de que este delito não poderia ser equiparado ao terrorismo, a prática da tortura, ao tráfico ou a crimes hediondos, pois

Page 20: Direito penal

se trata de crime de mera conduta que, embora acarrete maior insegurança à sociedade, não pode ser igualado àqueles;

O policial militar que atira em via pública sem autorização pratica crime comum, julgado pela justiça comum, por ausência de previsão do tipo legal.

Procedimento sumário.

3.5. Posse ou porte ilegal de arma de fogo, acessório ou munição de uso restrito ou proibido

Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: I – suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato; II – modificar as características de arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a arma de fogo de uso proibido ou restrito ou para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a erro autoridade policial, perito ou juiz; III – possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar; IV – portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado; V – vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança ou adolescente; e VI – produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo.

O art. 16 juntou o art. 12 e o art. 14, mudando somente o acessório, a arma e a munição, que não é, neste caso, de uso permitido.

No que se refere a ausência de laudo pericial, assim se manifestou o STF:

Porte Ilegal de Munição de Uso Restrito e Ausência de Laudo Pericial - 1A Turma indeferiu habeas corpus em que condenados por tráfico de entorpecentes (Lei 6.368/76, art. 12 c/c o art. 18, III) e porte ilegal de munição de uso restrito (Lei 10.826/2003, art. 16) pleiteavam a concessão da ordem para que fosse reconhecida a atipicidade do delito descrito no art. 16 da Lei 10.826/2003, pela ausência de laudo pericial (CPP, art. 158) das munições apreendidas que atestasse a sua potencialidade lesiva. Alegava, também, a impetração: a)inobservância do disposto no art. 31, parágrafo único, da Lei 10.409/2002, em decorrência de juntada de documento sigiloso relativo à quebra de sigilo telefônico fora

Page 21: Direito penal

do prazo legal, qual seja, após a realização da audiência de instrução e julgamento e b) contrariedade aos critérios definidos no art. 59 do CP, por ter sido a pena-base fixada acima do mínimo legal, sem motivação idônea. HC 93876/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 28.4.2009. (HC-93876)

Porte Ilegal de Munição de Uso Restrito e Ausência de Laudo Pericial - 2Quanto ao primeiro ponto, observou-se que o Estatuto do Desarmamento — que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo — fora promulgado com o objetivo de disciplinar a venda de armas e munições em território nacional, bem como de regulamentar os registros e portes das armas que estão em posse de cidadãos comuns, visando, em última análise, garantir a segurança da coletividade. Asseverou-se, ademais, que a objetividade jurídica dos delitos nela tipificados transcende a mera proteção da incolumidade pessoal, para alcançar também a tutela da liberdade individual e do corpo social, asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia. Entendeu-se, por conseguinte, irrelevante indagar-se acerca da eficácia da arma ou das munições para a configuração do tipo penal em comento, sendo, assim, despicienda, do ponto de vista jurídico, a falta ou nulidade do laudo pericial. Nesse sentido, reputou-se configurado o crime previsto no caput do art. 16 da Lei 10.826/2003, uma vez que restara atestada a materialidade delitiva por outros meios de prova. Com relação à nulidade decorrente do fato de ter sido o procedimento de quebra de sigilo telefônico juntado aos autos após a audiência de instrução e julgamento, registrou-se que a questão não poderia ser conhecida, dado que a matéria não fora apreciada nas instâncias inferiores. Por fim, aduziu-se que o magistrado, ao fixar a pena-base dos pacientes, fundamentara adequadamente as circunstâncias judiciais constantes do art. 59 do CP, o que justificaria a fixação do quantum da pena acima do mínimo legal, haja vista a grande quantidade de substância entorpecente apreendida, assim como o fato de os pacientes serem os mentores intelectuais e controladores da ação delitiva. O Min. Menezes Direito acrescentou, no ponto, a necessidade de se deixar inequívoco que foram consideradas circunstâncias judiciais outras que não os antecedentes criminais para a fixação da pena acima do mínimo legal, ressaltando que esse tema encontra-se pendente de julgamento pelo Plenário da Corte. HC 93876/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 28.4.2009. (HC-93876)HC N. 93.876-RJRELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKIEMENTA: PROCESSUAL PENAL. PENAL. HABEAS CORPUS. PORTE DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. ART. 16 DA LEI 10.826/2003. PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DO POTENCIAL LESIVO DA MUNIÇÃO. DESNECESSIDADE. SIGILO TELEFÔNICO JUNTADO AOS AUTOS APÓS

Page 22: Direito penal

AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE QUE NÃO PODE SER EXAMINADA SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. POSSIBILIDADE. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. IMPETRAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E DENEGADA A ORDEM NESSA EXTENSÃO. I - A objetividade jurídica dos delitos previstos na Lei 10.826/03 transcende a mera proteção da incolumidade pessoal, para alcançar também a tutela da liberdade individual e de todo o corpo social, asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia. II - Despicienda a ausência ou nulidade do laudo pericial da arma ou da munição para a aferição da materialidade do delito.III - A questão da nulidade decorrente do fato de o procedimento de quebra de sigilo telefônico ter sido juntado aos autos após a audiência de instrução e julgamento não pode ser conhecida, sob pena de indevida supressão de instância com o desbordamento dos limites de competência do STF descritos no art. 102 da Constituição Federal.IV - No caso, o magistrado, ao fixar a pena-base dos pacientes, observou fundamentadamente todas as circunstâncias judiciais constantes do art. 59 do Código Penal, especialmente a grande quantidade de substância entorpecente e a qualidade de mentores intelectuais ostentada pelos pacientes, o que justifica a fixação do quantum da pena acima do mínimo legal.V - Writ conhecido em parte, denegando-se a ordem na parte conhecida.

3.5.1. Suprimir ou alterar marca ou numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato

Apesar de ser o parágrafo único do art. 16, a arma poderá ser de uso permitido ou proibido.

O crime é comum, sendo a coletividade sua vítima.

Se consuma com a supressão ou alteração da numeração ou sinal de identificação.

A doutrina admite tentativa, quando a pessoa é surpreendida antes de efetivar a supressão.

Punido a título de dolo, sendo atípica a modalidade culposa.

Este inciso absorve o art. 12 e o art. 14.

A lei anterior punia esse tipo, tendo apenas ocorrido a continuidade normativa típica.

No entanto, o porte de arma com numeração raspada que era fato atípico anteriormente, passou a ser hipótese do IV, do parágrafo único do art. 16, havendo uma “novatio legis in pejus”.

3.5.2. Modificar as características de arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a arma de fogo de uso proibido ou restrito ou para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a erro autoridade policial, perito ou juiz

Page 23: Direito penal

Na primeira conduta, há arma de uso permitido, tranformando-a em algo equivalente de uso proibido ou restrito. Na segunda conduta, é hipótese de arma de fogo de uso proibido ou restrito, que é transformada para arma equivalente de uso permitido.

Os dois comportamentos são punidos a título do dolo, com finalidade específica a segunda parte.

O crime se consuma com a mera modificação das características, independentemente, nesta segunda parte, se houve o engano das autoridades citadas, bastando a potencialidade para tal, que se ocorrer, será mero exaurimento.

A doutrina admite a tentativa.

O art. 16, parágrafo único II, é especial em relação ao art. 347, que é crime de menor potencial ofensivo.

3.5.3. Possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar;

Este inciso revogou parcialmente o art. 253 do Código Penal. Eventual incêndio advindo destes comportamentos, acarreta também a aplicação do art. 251, do Código Penal. A maioria da doutrina não absorve o primeiro pelo segundo, na forma dolosa ou culposa (concurso material).

3.5.4. Portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado

Esse não altera a arma, mas apenas a porta, já estando adulterada.

3.5.5. Vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança ou adolescente

Este dispositivo revogou em parte o art. 242 do ECA.

Neste caso, pouco importa se a arma é de uso permitido ou restrito.

O núcleo vender de forma particular para menor de 18 anos, configura este tipo. No entanto, sendo a venda comercial, o tipo é do art. 17, que não prevê majorante para o caso de comprador menor. Se for arma branca, será o art. 242 do ECA.

3.5.6. Produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo.

Procedimento sumário.

3.5.7. Comércio Ilegal de armas

O art. 17 dispõe:

Art. 17. Adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, adulterar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em

Page 24: Direito penal

proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. Parágrafo único. Equipara-se à atividade comercial ou industrial, para efeito deste artigo, qualquer forma de prestação de serviços, fabricação ou comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência.

Este tipo não diferencia o crime de arma, que será considerado na fixação da pena pelo juiz.

O bem jurídico é a incolumidade pública.

O sujeito ativo será somente quem está no exercício de atividade comercial ou industrial.

O parágrafo único equipara a atividade comercial ou industrial qualquer forma de prestação de serviços, fabricação ou comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência. Não basta ostentar esses predicados, deve o agente agir com vínculo entre o comportamento e o exercício de sua atividade comercial ou industrial.

O crime é punido a título de dolo, e se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos, lembrando que alguns são permanentes.

Embora a lei mencione a expressão exercício da atividade comercial ou industrial, não se trata de crime habitual. A atividade desenvolvida pelo agente é que deve ser contínua, e não a prática dos atos típicos. Por não ser crime habitual, é que algumas modalidades admitem tentativa.

3.5.8. Tráfico Internacional de arma de fogo

Art. 18. Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente: Pena – reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

É o crime mais grave da lei.

O art. 18 nada mais é do que um desdobramento de convenções internacionais de combate ao tráfico internacional de armas, pouco importando se a arma é de uso permitido ou proibido.

O art. 50 a 64 do decreto nº 5123/04, traz o que significa esse tipo.

Trata-se de crime comum, praticado por qualquer pessoa, dispensando a condição de comerciante. O tráfico nacional é crime próprio, e o internacional é comum.

É punido a título de dolo, e quanto á consumação nós temos que diferenciar duas situações:

i. Nas modalidades importar e exportar, o crime se consuma com a entrada ou saída do artefato do território brasileiro;

Page 25: Direito penal

ii. Na modalidade favorecer, o crime se consuma com a mera assistência, pouco importando se o artefato logrou entrar ou sair do território. Se consuma com o mero favorecimento.

OBS: ESSE TIPO TRAZ UMA MODALIDADE ESPECIAL DE CONTRABANDO. ASSIM, EU APLICO O ART. 334, DO CP?

O art. 334 dispõe:

Art. 334 Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria:

i. No caso de arma de fogo, o contrabando é disciplinado pelo art. 18 do estatuto;ii. No caso de artefato explosivo ou incendiário, o contrabando é disciplinado pelo

código penal, na forma do art. 334.iii. O art. 334 do CP continua disciplinando o descaminho no caso de elisão de tributos

referentes a importação ou exportação de armas.

O art. 18 é o único crime de competência da justiça federal.

3.5.9. Aumento de pena

O art. 19 dispõe:

Art. 19. Nos crimes previstos nos arts. 17 e 18, a pena é aumentada da metade se a arma de fogo, acessório ou munição forem de uso proibido ou restrito.

No caso do art. 17 e 18, se a munição for de uso proibido aumenta-se a pena de metade.

Art. 20. Nos crimes previstos nos arts. 14, 15, 16, 17 e 18, a pena é aumentada da metade se forem praticados por integrante dos órgãos e empresas referidas nos arts. 6o, 7o e 8o

desta Lei.Os arts. 6º, 7º e 8º, não abrange colecionadores ou caçador. Se ele pratica comércio ilegal não pratica esses crimes, pois não está rol.

3.5.10. Liberdade provisória

O art. 21 equiparava a crimes hediondos ao negar-lhes liberdade provisória, e assim dispunha:

Art. 21. Os crimes previstos nos arts. 16, 17 e 18 são insuscetíveis de liberdade provisória. (Vide Adin 3112-1)

No entanto, para o STF, é o juiz que deverá analisar o caso concreto, fulminando-a de inconstitucionalidade, sendo possível a aplicação da liberdade provisória:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 10.826/2003. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL AFASTADA. INVASÃO DA COMPETÊNCIA RESIDUAL DOS ESTADOS. INOCORRÊNCIA. DIREITO DE PROPRIEDADE.

Page 26: Direito penal

INTROMISSÃO DO ESTADO NA ESFERA PRIVADA DESCARACTERIZADA. PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE PÚBLICO RECONHECIDA. OBRIGAÇÃO DE RENOVAÇÃO PERIÓDICA DO REGISTRO DAS ARMAS DE FOGO. DIREITO DE PROPRIEDADE, ATO JURÍDICO PERFEITO E DIREITO ADQUIRIDO ALEGADAMENTE VIOLADOS. ASSERTIVA IMPROCEDENTE. LESÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. AFRONTA TAMBÉM AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. ARGUMENTOS NÃO ACOLHIDOS. FIXAÇÃO DE IDADE MÍNIMA PARA A AQUISIÇÃO DE ARMA DE FOGO. POSSIBILIDADE. REALIZAÇÃO DE REFERENDO. INCOMPETÊNCIA DO CONGRESSO NACIONAL. PREJUDICIALIDADE. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE QUANTO À PROIBIÇÃO DO ESTABELECIMENTO DE FIANÇA E LIBERDADE PROVISÓRIA. I - Dispositivos impugnados que constituem mera reprodução de normas constantes da Lei 9.437/1997, de iniciativa do Executivo, revogada pela Lei 10.826/2003, ou são consentâneos com o que nela se dispunha, ou, ainda, consubstanciam preceitos que guardam afinidade lógica, em uma relação de pertinência, com a Lei 9.437/1997 ou com o PL 1.073/1999, ambos encaminhados ao Congresso Nacional pela Presidência da República, razão pela qual não se caracteriza a alegada inconstitucionalidade formal. II - Invasão de competência residual dos Estados para legislar sobre segurança pública inocorrente, pois cabe à União legislar sobre matérias de predominante interesse geral. III - O direito do proprietário à percepção de justa e adequada indenização, reconhecida no diploma legal impugnado, afasta a alegada violação ao art. 5º, XXII, da Constituição Federal, bem como ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido. IV - A proibição de estabelecimento de fiança para os delitos de "porte ilegal de arma de fogo de uso permitido" e de "disparo de arma de fogo", mostra-se desarrazoada, porquanto são crimes de mera conduta, que não se equiparam aos crimes que acarretam lesão ou ameaça de lesão à vida ou à propriedade. V - Insusceptibilidade de liberdade provisória quanto aos delitos elencados nos arts. 16, 17 e 18. Inconstitucionalidade reconhecida, visto que o texto magno não autoriza a prisão ex lege, em face dos princípios da presunção de inocência e da obrigatoriedade de fundamentação dos mandados de prisão pela autoridade judiciária competente. VI - Identificação das armas e munições, de modo a permitir o rastreamento dos respectivos fabricantes e adquirentes, medida que não se mostra irrazoável. VII - A idade mínima para aquisição de arma de fogo pode ser estabelecida por meio de lei ordinária, como se tem admitido em outras hipóteses. VIII - Prejudicado o exame da inconstitucionalidade formal e material do art. 35, tendo em conta a realização de referendo. IX - Ação julgada procedente, em parte, para declarar a inconstitucionalidade dos parágrafos únicos dos

Page 27: Direito penal

artigos 14 e 15 e do artigo 21 da Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003.

3.6. Registro conforme a Lei nº 11.706/08

Art. 30. Os possuidores e proprietários de arma de fogo de uso permitido ainda não registrada deverão solicitar seu registro até o dia 31 de dezembro de 2008, mediante apresentação de documento de identificação pessoal e comprovante de residência fixa, acompanhados de nota fiscal de compra ou comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova admitidos em direito, ou declaração firmada na qual constem as características da arma e a sua condição de proprietário, ficando este dispensado do pagamento de taxas e do cumprimento das demais exigências constantes dos incisos I a III do caput do art. 4o desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008) Parágrafo único. Para fins do cumprimento do disposto no caput deste artigo, o proprietário de arma de fogo poderá obter, no Departamento de Polícia Federal, certificado de registro provisório, expedido na forma do § 4o do art. 5o desta Lei. (Incluído pela Lei nº 11.706, de 2008)

Vale ressaltar que a lei nº 11.922/09 prorrogou a validade dos registros estaduais na forma de seu art. 20, até 31/12/2009, no que se refere ao §3º do art. 5º e art. 30 do estatuto do desarmamento. Assim fica prorrogada a validade dos registros estaduais e o prazo para os possuidores que não tem o registro da arma regularizarem este registro até 31/12/09. Assim, ter arma sem registro da arma até 31/12/09 não é crime, sendo abolitio criminis temporária ou vacatio legis indireta, de acordo com entendimento do STF e STJ. A consequência disso é que essas normas de prorrogação não retroagem, provocando a abolitio criminis apenas dentro do período da prorrogação. Vale ressatar que as condutas praticadas entre 01/01/09 até 12/04/09 caracterizam crime, pois não estão dentro do período da abolitio criminis temporária. Esse período se aplica ao crime de posse, permitida ou proibida, mas não se aplica ao crime de porte, permitida ou proibida.

Quanto à arma raspada, esse período de abolitio criminis temporária não é aplicável, segundo STF, no HC 94158 /MG:

EMENTA: HABEAS CORPUS. HABEAS CORPUS. PORTE DE ARMA DE FOGO. ABOLITIO CRIMINIS TEMPORÁRIA. NÃO-APLICAÇÃO AO CRIME DE SUPRESSÃO OU ALTERAÇÃO DE MARCA, NUMERAÇÃO OU QUALQUER SINAL DE IDENTIFICAÇÃO DE ARMA DE FOGO. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS INDEFERIDO. 1. Firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido de que o "... prazo de cento e oitenta dias previsto nos artigos 30 e 32 da Lei n. 10.826/2003 é para que os possuidores e proprietários de armas de fogo as regularizem ou as entreguem às autoridades. Somente as condutas típicas 'possuir ou ser proprietário' foram abolidas temporariamente" (HC 92.573, Rel. Min. Eros Grau, DJ 2.6.2006). 2. Não configurado, na espécie, o porte ilegal de arma de fogo, conforme sustenta o Impetrante, mas sim o crime de suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de

Page 28: Direito penal

fogo (art. 16, parágrafo único, inc. I, da Lei n. 10.826/03). 3. Este Supremo Tribunal Federal reputa válida a regularização prevista na Medida Provisória n. 174/04 aos possuidores e proprietários legítimos de arma de fogo, não entendendo haver aplicação aos portadores de armas de fogo com numeração raspada. Precedentes. 4. Habeas Corpus indeferido.

Há, contudo, entendimento contrário ao do STF, conforem HC 46322/SP – STJ:

Posse ilegal de arma de fogo com numeração raspada (art. 16, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.826/03). Delito praticado no prazo de 180 dias previsto no art. 30 (vacatio legis). Atipicidade (ocorrência).1. Durante o prazo legal para a regularização do registro da arma, houve descriminalização temporária da conduta de posse ilegal de arma de fogo. 2. O fato de se tratar de arma adulterada e, portanto, insuscetível de regularização não afasta a incidência da vacatio legis. A Lei nº 10.826/03 não trata apenas da possibilidade de regularização da arma, mas também da sua simples entrega à Polícia Federal.3. Atipicidade da conduta (Precedentes).4. Ordem concedida a fim de se trancar a ação penal.

Para Luiz Flávio, trata-se de anistia. Assim, quem for surpreendido na posse de arma de fogo de uso permitido, e capaz de ser registrada, não poderá ser preso porque não é crime . É uma hipótese de atipicidade exclusiva ao art. 12. Desta forma, só está abrangido o art. 12.

O art. 32 dispõe:

Art. 32. Os possuidores e proprietários de arma de fogo poderão entregá-la, espontaneamente, mediante recibo, e, presumindo-se de boa-fé, serão indenizados, na forma do regulamento, ficando extinta a punibilidade de eventual posse irregular da referida arma. (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008) Parágrafo único. (Revogado pela Lei nº 11.706, de 2008)

Esse artigo traz hipóteses de extinção da punibilidade, e abrange possuidores ou proprietários:

a) De arma de fogo;b) De uso permitido ou não;c) Ainda que impossível o registro (arma de numeração raspada);d) Espontaneamente entreguem à autoridade competente.

Se a pessoa está indo à delegacia para isso, não se extinguirá a punibilidade.