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1 Direito parental. 1 - Parentesco no nosso ordenamento jurídico: a) parentesco por consanguinidade: vinculo estabelecido entre as pessoas que descendem de um mesmo tronco ancestral; b) afinidade: relação estabelecida entre um cônjuge e os parentes do outro; c) adoção: estabelecido entre o adotante e filho adotivo, com previsão no ECA (Lei nº 8.069/90), com relação aos menores de 18 anos. Assim, o pedido de adoção, com relação aos menores, deverá ser formulado na Vara da Infância e Juventude. Com relação aos maiores, nas Varas de Família. Pelo atual Código Civil, tanto a adoção de menores como de maiores deverá ser concretizada através de sentença constitutiva (Parágrafo único, do artigo 1.623). Não há mais adoção por escritura pública. A Constituição Republicana de 1988 equiparou, em seu artigo 227, § 7º, os filhos adotivos aos advindos da filiação biológica e, por conseguinte, proibiu designações discriminatórias. O Código Civil, no artigo 1.596, face à determinação constitucional antes aludida, atribuiu aos filhos adotivos os mesmos direitos e deveres dos concebidos pelos próprios pais. Entretanto, o artigo 1.593, do Código Civil, considera a adoção como “parentesco civil” e, para o parentesco resultante da consangüinidade, considera-o “parentesco natural”. Portanto e após a Constituição Federal de 1988, não é mais correto aludir a parentesco legítimo (advindo do casamento) e ilegítimo (aflorados de relações sexuais fora do casamento). O conservadorismo era tão sério e sempre em prejuízo da prole, a ponto de o filho ser considerado natural (pais que não tinham impedimento para casamento e que, entretanto, não se casavam) ou adulterino (de pessoas que não podiam casar, eis que uma já era casada) e filhos incestuosos (nascidos de parentes próximos). Essas discriminações preconceituosas foram sepultadas pelo artigo 227, § 6º da Constituição Federal. O filho passa, então e como não poderia deixar de ser, mais importante do que o casamento, apenas uma das várias formas de entidades familiares, todas também constitucionalmente garantidas. Pelo artigo 1.591 do Código Civil parentes em “linha reta” são “as pessoas que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes”. Portanto, nasceram uma da outra diretamente, em direção ao tronco comum (ascendentes) ou deste se afaste (descendente). O artigo 229 da Constituição Republicana de 1988 estipula obrigações entre os parentes em linha reta. Assim, há obrigação de sustento entre pais e filhos e os filhos têm o dever de amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. O artigo 1.694, concretizando o mandamento constitucional ora citado, estabelece a possibilidade de os parentes pedirem uns

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Direito parental.

1 - Parentesco no nosso ordenamento jurídico: a) parentesco por consanguinidade:

vinculo estabelecido entre as pessoas que descendem de um mesmo tronco ancestral; b)

afinidade: relação estabelecida entre um cônjuge e os parentes do outro; c) adoção:

estabelecido entre o adotante e filho adotivo, com previsão no ECA (Lei nº 8.069/90), com

relação aos menores de 18 anos. Assim, o pedido de adoção, com relação aos menores,

deverá ser formulado na Vara da Infância e Juventude. Com relação aos maiores, nas Varas

de Família. Pelo atual Código Civil, tanto a adoção de menores como de maiores deverá ser

concretizada através de sentença constitutiva (Parágrafo único, do artigo 1.623). Não há

mais adoção por escritura pública.

A Constituição Republicana de 1988 equiparou, em seu artigo 227, § 7º, os filhos adotivos

aos advindos da filiação biológica e, por conseguinte, proibiu designações discriminatórias.

O Código Civil, no artigo 1.596, face à determinação constitucional antes aludida, atribuiu

aos filhos adotivos os mesmos direitos e deveres dos concebidos pelos próprios pais.

Entretanto, o artigo 1.593, do Código Civil, considera a adoção como “parentesco civil” e,

para o parentesco resultante da consangüinidade, considera-o “parentesco natural”.

Portanto e após a Constituição Federal de 1988, não é mais correto aludir a parentesco

legítimo (advindo do casamento) e ilegítimo (aflorados de relações sexuais fora do

casamento). O conservadorismo era tão sério e sempre em prejuízo da prole, a ponto de o

filho ser considerado natural (pais que não tinham impedimento para casamento e que,

entretanto, não se casavam) ou adulterino (de pessoas que não podiam casar, eis que uma já

era casada) e filhos incestuosos (nascidos de parentes próximos). Essas discriminações

preconceituosas foram sepultadas pelo artigo 227, § 6º da Constituição Federal. O filho

passa, então e como não poderia deixar de ser, mais importante do que o casamento, apenas

uma das várias formas de entidades familiares, todas também constitucionalmente

garantidas.

Pelo artigo 1.591 do Código Civil parentes em “linha reta” são “as pessoas que estão umas

para com as outras na relação de ascendentes e descendentes”. Portanto, nasceram uma da

outra diretamente, em direção ao tronco comum (ascendentes) ou deste se afaste

(descendente).

O artigo 229 da Constituição Republicana de 1988 estipula obrigações entre os parentes em

linha reta. Assim, há obrigação de sustento entre pais e filhos e os filhos têm o dever de

amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. O artigo 1.694, concretizando o

mandamento constitucional ora citado, estabelece a possibilidade de os parentes pedirem uns

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aos outros alimentos que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição

social. O artigo 1.521 impede o casamento entre parentes em linha reta.

Parente colateral, pelo artigo 1.592 do Código Civil, é o que une os provindos do mesmo

tronco ancestral, sem descenderem uns de outros. Portanto, há de se considerar duas linhas

distintas que tem como ponto de convergência no autor comum. Assim, entre irmãos

existem dois graus, entre primos, quatro. Assim, não existe primeiro grau nas relações de

parentesco colateral. Esse parentesco é também chamado de colateral ou transversal.

Pelo artigo 1.594 do Código Civil “contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo

número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos

parentes até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente”. Assim,

o grau de parentesco é obtido através da contagem do número de gerações que separam as

pessoas cujas relações estão sendo determinadas. Na “linha reta” contam-se subindo ou

descendo, e tantos são os graus quantas as gerações: de pai a filho um grau; de bisneto a

bisavô três graus (parentesco no terceiro grau).

Na linha colateral conta-se o parentesco subindo por uma das linhas genealógicas até o

ponto ancestral comum e descendo pela outra até a pessoa cujo parentesco é pesquisado.

Cada geração, na linha colateral, corresponde a um grau de parentesco. Assim, tio e

sobrinho são parentes em terceiro grau. Irmãos são parentes colaterais no segundo grau.

Primos são parentes colaterais em quarto grau.

Pelo § 1º do artigo 1.595 do Código Civil, “o parentesco por afinidade limita-se aos

ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro”. Assim, não há

vínculo jurídico entre concunhados, eis que o parentesco por afinidade é de natureza

pessoal. Entretanto, pelo § 2º do art. 1.595 do Código Civil, “na linha reta, a afinidade

não se extingue com dissolução do casamento”. Assim, mesmo após a dissolução do

vínculo matrimonial, sogro ou sogra, genro ou nora, continuam unidos pelo vínculo de

afinidade. Por conseguinte, não é correto falar em “ex-sogra”. Temos, portanto, várias

sogras, dependendo do número de vezes em que casamos.

Há impedimentos, para fins de casamento, entre os parentes colaterais (artigo 1.521-IV).

Também pelo direito processual os parentes colaterais até o terceiro grau (art. 447, § 2º, do

CPC), por consanguinidade ou afinidade, estão impedidos de prestarem declarações. O juiz

não pode participar do feito, eis que é impedido, quando for parente colateral da parte até 3º

grau, por consanguinidade ou afinidade (art. 144, inciso IV do CPC).

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No parentesco colateral é também comum a distinção entre irmãos “germanos ou

bilaterais” e “unilaterais”. Irmãos germanos ou bilaterais são considerados os filhos dos

mesmos pais. Irmãos unilaterais quando há coincidência apenas de um dos pais.

Esquema de graus de parentesco, em linha reta e colateral:

A é pai de B e C (parentesco em linha reta do 1º grau)

A é avô de D e E (parentesco em linha reta do 2º grau)

E é filho de C (parentesco em linha reta do 1º grau)

E é neto de A (parentesco em linha reta do 2ª grau)

E é sobrinho de B (parentesco em linha colateral do 3ª

grau)

E é primo de D (parentesco em linha colateral do 4ª

grau)

Paternidade socioafetiva:

A paternidade socioafetiva, antes admitida na doutrina e na jurisprudência, foi positivada em

nosso ordenamento jurídico, com previsão no artigo 1.593, em sua parte final, do Código

Civil, ao afirmar que: “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de

consangüinidade ou outra origem” (grifamos). Portanto, ampliado foi o conceito jurídico

de parentesco. De prevalecer, inclusive sobre a paternidade biológica, o afeto, a posse de

estado de filho. A própria reprodução heteróloga confirma este entendimento, ou seja, o

marido ou o companheiro admite como filho o ser gerado por inseminação artificial, porém

com sêmem de outro. Comum, também, o pai assumir filho de outrem, registrando-o.

Portanto, entendemos que, posteriormente, não pode este pai, com simples exame de DNA,

pretender desconstituir o vínculo paternal, desde que estabelecido espontaneamente por ele.

Evidentemente que, se tal atitude é crime, no direito de família o que interessa é a vontade

de o homem reconhecer um filho de outro como se fosse dele e, com o filho “adotado”,

estabelecer afeto, carinho, apresentá-lo publicamente como filho dele.

Sobre a paternidade socioafetiva, de destacarem-se os seguintes ensinamentos

jurisprudenciais:

DIREITO CIVIL - FAMÍLIA - RECONHECIMENTO DE FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA POST MORTEM - IMPROCEDÊNCIA EM PRIMEIRO GRAU - RECURSO DO REQUERENTE - PROVAS DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL DA SOCIOAFETIVIDADE - ESTADO DE FILIAÇÃO COMPROVADO - DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO A posse do estado de filiação, consubstanciada em relação afetiva e pública como pais e filho, autoriza o reconhecimento de filiação socioafetiva, amparada na lei civil (art. 1.593 do CC) e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88). (TJSC,

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Apelação Cível n. 0301375-12.2014.8.24.0039, de Lages, rel. Des. Monteiro Rocha, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 05-12-2017).

2 - Filiação: é a relação jurídica que liga o filho a seus pais, independentemente do

casamento (artigo 226, § 6º da Constituição Federal e art.1.596 do Código Civil).

Entretanto, o artigo 1.597 do Código Civil estabelece a presunção de filho àquele

“concebido na constância do casamento”. Na verdade e considerando que o legislador

optou pela manutenção de presunções quanto à filiação (art. 1.597- CC), eis que a

paternidade não pode ser diretamente provada, deveria, automaticamente, estender tais

presunções também às outras formas de constituição de família. Portanto, presume-se,

também filho, o que foi concebido na constância da união estável, desde que, evidentemente,

provada.

Assim e admitindo como filho o concebido durante o casamento, o art. 1.597, inciso I, do

Código Civil, estabelece, com base em probabilidades, os termos máximo e mínimo de uma

gestação. Presume-se concebido na constância do casamento o filho nascido cento e oitenta

dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal e não do dia em que as

núpcias foram celebradas. E, como não é provável uma gestação por período superior a

trezentos dias, presume-se filho o nascido até 300 dias subseqüentes à dissolução da

sociedade conjugal.

Nota-se que poderá haver conflito de presunções, ou seja, um filho poderá nascer até 300

dias a contar da morte do primeiro marido, mas após 180 dias de vigência do segundo

casamento. Assim e se analisarmos o inciso I e II, do artigo 1.597 do Código Civil,

isoladamente, o filho terá dois pais. Para impedir tal fato (turbatio sanguinis) foi instituída a

causa suspensiva prevista no inciso II, do artigo 1.523 do Código Civil. Entretanto, causas

suspensivas não impedem a celebração de casamento. E, se casar a viúva ou aquela cujo

casamento se desfez, há necessidade de utilizar-se de todos os meios de provas admitidos em

direito: documentos, exame de DNA, oitiva de testemunha. E, não solucionada a questão,

por intermédio das provas, o Código, no art. 1.598, presume que o filho seja do primeiro

marido, se nascer dentro dos trezentos dias a contar da dissolução da sociedade conjugal.

Nascendo depois, será filho do segundo marido, desde que decorridos cento e oitenta dias

depois de estabelecida a convivência conjugal.

Também presume concebido na constância do casamento o filho havido por fecundação

artificial homóloga, mesmo que falecido o marido (art. 1.597-III). Na fecundação artificial

homóloga o óvulo e o sêmem pertecem à mulher e ao marido, respectivamente. Há

entendimento de que, no caso de falecido o marido, a presunção persiste, desde que haja

autorização escrita do marido, eis que deve haver convergência de vontade.

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Aliás, a inseminação artificial traz para ao direito sucessório controvérsia séria, ou seja, se

são herdeiros os filhos advindos de reprodução assistida e nascidos após a morte do marido.

De ressaltar-se que, pelo artigo 1.784 do Código Civil, “aberta a sucessão, a herança

transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”. Basta imaginar, a

título de exemplo, uma inseminação artificial post-mortem ocorrida 20 (vinte) anos depois

da morte do pai do nascituro.

Também são presumidos como filhos os havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de

embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga (art. 1.597-IV).

Embriões excedentários são os que não foram, ainda, introduzidos no ventre da mãe e que

permanecem depositados junto às entidades especializadas. A concepção de embriões

excedentários é admitida somente se estes derivarem de fecundação homóloga, isto é,

gametas da mãe e do pai, casados ou convivendo em união estável.

Finalmente e pelo artigo 1.597-V, do Código Civil, há presunção de paternidade dos filhos

havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

Neste caso há utilização do sêmen de outro homem, geralmente um doador anônimo, para

fecundação do óvulo da mulher.

Pelo artigo 1.599 do Código Civil, a prova da impotência do cônjuge para gerar, à época da

concepção, ilide a presunção, independentemente da causa (psíquica, anatômica, fisiológica

ou patológica). A impotência há que coincidir com o período legal da concepção.

Entretanto, o artigo 1.600 é taxativo: “não basta o adultério da mulher, ainda que

confessado, para ilidir a presunção legal da paternidade”. E, desprezado fica, por

completo, a prova da infidelidade, para ilidir a presunção de paternidade, se o marido

convivia com a mulher. A infidelidade (provada ou confessada) não descaracteriza a

presunção. O filho pode ser do marido e a dúvida não é o bastante para ilidir a presunção.

Na mesma linha de raciocínio, o art. 1.602 afirma que “não basta a confissão materna

para excluir a paternidade”.

De ressaltar-se que a presunção de filho concebido durante o casamento é relativa (juris

tantum) e, por conseguinte, admite prova em contrário. E, pelo artigo 1.601, do Código

Civil, o direito de o marido contestar a paternidade do filho nascido de sua mulher é

imprescritível. Falecendo o autor, no curso da ação negatória de paternidade, os herdeiros

dele podem prosseguir na ação (Parágrafo único, do artigo 1.601). Há, portanto,

substituição de parte.

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A maternidade, pelo artigo 1.608 do Código Civil, somente poderá ser impugnada se

provada a falsidade “do termo ou das declarações nele contida”. De ver-se que não foi

previsto o “contrato de gestação” ou barriga de aluguel.

Assim, a negatória da maternidade poderá ocorrer provando que determinada pessoa não é a

que nasceu da mulher (falta de identidade), bem como que àquela mulher não teve aquele

filho, ou nunca teve filho nenhum como, por exemplo, no caso de simulação de parte.

Também poderá ser provada a falsidade do registro ou a substituição do recém-nascido. A

ação é imprescritível e pode ser intentada por quem tenha ou prove ter legítimo interesse.

No tocante à negatória de paternidade pelo marido da mãe, resultante de inseminação

homóloga (art. 1.597, I e II), deverá o pai comprovar que o profissional ou o hospital

utilizaram de sêmen que não foi o dele. Entretanto, na inseminação heteróloga (art. 1.597,

V) não se admite a contestação da paternidade, principalmente considerando que houve

autorização do pai para que ela ocorresse.

A prova da filiação é feita pela certidão do termo de nascimento registrada no Registro Civil

(art. 1.603). Na falta do respectivo assento, destruição do livro, etc., qualquer outro meio de

prova é válido, desde que haja um começo de prova por escrito emanado dos pais (cartas

familiares, reconhecimento extrajudicial etc.).

No tocante a maternidade a prova é mais fácil. Prova-se a gravidez, o parto e a identidade da

pessoa.

O artigo 1.604 determina que “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do

registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro”. Assim, o

registro civil gera a presunção de veracidade do estado da filiação e sobrepõe à paternidade

biológica. Portanto, a presunção decorrente do registro é iuris tantum. Provada a existência

de falsidade (ideológica ou material), ou de erro cometido pelo oficial ou pelo declarante,

desfeita restará a presunção.

Não existindo registro ou não sendo este encontrado, ou encontrando-se o registro em local

inacessível, ou constando dele declarações inexatas, admite o Código que se prove a filiação

por qualquer modo admissível em direito, eis que o artigo 1.605 determina que “na falta,

ou defeito, do termo de nascimento, poderá provar-se a filiação por qualquer modo

admissível em direito: I –quando houver começo de prova por escrito, proveniente dos

pais, conjunta ou separadamente; II – quando existirem veementes presunções

resultantes de fatos já certos”.

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A prova da paternidade pela “posse de estado de filho” (ter o nome paterno ou ser

considerado na família e no meio social em que vive como filho) poderá ser considerado

como fato certo (art. 1.605-II).

Pelo artigo 1.606 e seu parágrafo único a legitimação para a ação da prova da filiação é do

filho e passa aos herdeiros, os quais poderão continuá-la, se não extinto o processo.

Negada a condição de filho, em razão da presunção legal da paternidade (filho nascido

durante o casamento dos pais) poderá ele ajuizar “ação de vindicação do estado de

filiação”. Entretanto, tal nome está em desuso, considerando que a ação geralmente ofertada

é a declaratória de paternidade, já que o nome da ação não é fundamental e também há que

se considerar é a causa de pedir e o pedido. Tal ação é imprescritível e pode ser intentada

pelo filho enquanto viver, passando aos seus herdeiros, se morrer incapaz ou na pendência

da lide. Para tanto, o autor deverá comprovar: a data do nascimento coincidindo com o

estado de casados dos pais e a identidade da pessoa em relação à criança nascida daquele

casamento. Assim, deverá o autor apresentar: certidão do casamento dos pais e assento de

nascimento do filho. Neste caso, com tais documentos, dispensada é a produção de outras

provas.

Pelo artigo 1.599 do Código Civil a prova da impotência do cônjuge ilide a presunção de

paternidade. Portanto, se o marido comprovar que era impotente (impotência coeundi e

generadi) dentro do período legal da concepção do filho, a presunção legal da paternidade

restará descaracterizada.

Reconhecimento do estado de filho.

O reconhecimento de um filho pode ser espontâneo ou judicial, neste último caso, através

da ação de investigação de paternidade ou maternidade. O ato de reconhecimento, judicial

ou extrajudicial, é sempre declaratório, posto que não cria a paternidade, mas apenas declara

uma situação fática.

Pelo artigo 1.613 do Código Civil o reconhecimento há de ser puro e simples, ou seja, não

pode ser celebrado sob condição e/ou termo. No caso reconhecimento, por escritura pública,

o menor púbere deverá ser assistido pelos pais ou tutor.

Entretanto, se reconhecimento ocorrer após a maioridade do filho, o artigo 1.614 exige o

expresso consentimento do filho, pena de nulidade do ato, eis que o consentimento do filho

maior constitui condição de validade do ato.

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Portanto, com exceção do reconhecimento por testamento, o artigo 1. 609 do Código Civil

indica as formas para aceitação do reconhecimento pelo filho, isto é, o filho comparecerá no

registro de nascimento ou quando da lavratura da escritura pública concordando,

expressamente, ou poderá manifestar sobre o reconhecimento em escrito particular

concordando com a afirmação, mesmo feita perante a autoridade judicial.

A “maternidade”, que sempre é certa (mater semper certa est), em razão de notórios sinais

exteriores (gravidez, parto, aleitamento, educação), pode ser reconhecida, em documento ou

no assento de nascimento e até mesmo por testamento. Não havendo o reconhecimento, o

filho poderá propor ação investigatória de maternidade, com utilização de todos os meios de

prova em direito permitidos.

A Constituição de 1988, ao proibir quaisquer designações discriminatórias (art. 227, § 6º),

revogou diversos dispositivos do Código Civil anterior, que ainda insistiam em fazer a

distinção entre filhos “adulterinos” e “incestuosos”. Com relação aos filhos adulterinos

ainda existia uma subdivisão: adulterino a patre (filho de pai casado e mãe solteira;

adulterino a matre (filho de mãe casada e pai solteiro); bilateralmente adulterino, que era

considerando com adulterino “a matre”.

Pelo art. 1.609, do Código Civil, o reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é

irrevogável e será feito: no registro de nascimento; por escritura pública ou escrito

particular, a ser arquivado em cartório; por testamento, ainda que incidentalmente

manifestado; por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento

não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém. E o parágrafo do artigo ora

focado deixa expresso que o reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser

posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

O reconhecimento, por escritura pública ou documento particular (inciso II do art. 1.609),

pode ser realizado por procurador, investido de poderes especiais e expressos. O documento

particular deverá ficar arquivado no Cartório.

No reconhecimento concretizado através de testamento (inciso III do art. 1.609), por ser ato

personalíssimo, não há que se falar, evidentemente, em representação. E, pelo artigo 1.610,

do Código Civil, o reconhecimento não pode ser revogado, nem mesmo por outro

testamento. Portanto, regra geral é que o segundo testamento anula o primeiro e assim por

diante. Porém, a paternidade reconhecida prevalecerá. De ressaltar-se, ainda, que o maior de

16 anos tem capacidade de testar (art. 1.860). Portanto, nesta hipótese o relativamente capaz

atua sem assistência.

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Pelo artigo 1.609 inciso IV, o reconhecimento da paternidade poderá ocorrer diretamente ao

juiz. Neste caso, a paternidade será averbada, desde que não discorde o filho, se maior de

idade. Essa maneira de reconhecer a paternidade poderá acontecer em qualquer ação.

Portanto, mesmo em uma ação de alimentos, se o registro do nascimento for nulo, poderá ser

sanado o ato, se o pai comparece em juízo e concorda no pagamento de verba alimentícia ao

filho. Também em um processo criminal, se o pai declara que o réu é filho dele, basta o

magistrado determinar a expedição de ofício determinando o registro.

Reconhecido o filho, por uma das formas acima aludidas, do registro de nascimento já

aberto pela mãe constará o nome do pai e avós paternos, bem como o novo nome do

reconhecido, se modificado, desde que haja concordância do filho. Da certidão do Registro

Civil não poderá mencionar a circunstância de ter o filho nascido do casamento ou de

relação extramatrimonial.

O artigo 1.614 do Código Civil permite ao filho impugnar o reconhecimento da paternidade

nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação. Estamos, pois, frente a

uma ação negatória de paternidade, que terá como causa próxima a falta de sinceridade do

declarante, bem como a assertiva de que o reconhecimento veio de quem não é o verdadeiro

pai.

O procedimento oficioso, de investigação de paternidade, e suas consequências.

De ressalta-se que a Lei nº 8.560/92 prevê a possibilidade de a mãe indicar o nome do pai e

o Juiz de Registro Público, em averiguação oficiosa, através de procedimento provocado

pelo Oficial do Cartório, chamará o suposto pai. Caso haja o reconhecimento, nesta fase,

lavrar-se-á termo e expedir-se-á mandado ao Cartório para acrescentar o nome do pai e dos

avós paternos. Não havendo reconhecimento, o Representante do Ministério Público poderá

ajuizar ação investigatória de paternidade, como substituto processual do investigado.

Após permitir, a Lei 8.560/92, o reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento no

próprio registro de nascimento, por escritura pública, escrito particular, a ser arquivado m

cartório ou por testamento, ainda que incidentalmente manifestado, o art. 3º, desta mesma

lei, contraditoriamente acaba por vedar o reconhecimento de filho ata do casamento. Ora, até

mesmo no pacto antenupcial será possível o reconhecimento do filho, tal vedação não pode

prosperar.

O parágrafo único, do art. 3º, da Lei 8.560/92, ressalvou o direito de averbar alteração do

patronímico materno, em decorrência do casamento, no termo do nascimento. Assim,

consequência de um novo casamento, a mãe poderá averbar a alteração do patronímico,

direito este que, consequência de uma interpretação extensiva, se estende também ao pai,

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que também poderá modificar o nome, se casar novamente.

O § 4º da Lei 8.560/92 não permite o reconhecimento do filho maior, sem o consentimento

dele. E os arts. 5º e 6º vão ao encontro do princípio da igualdade dos filhos, nascidos ou não

de pais casados, ou seja, não permite discriminação com relação aos filhos,

independentemente do estado civil dos pais deles (art. 227, § 6º das CF).

Portanto, estamos, com a Lei 8.56-0/92, tratando do registro de filho de mãe solteira. Na

verdade, quando se fala em mãe solteira a adjetivação é apenas em reforço ao que

pretendemos demonstrar aqui. Não há nenhum preconceito no título acima. A mulher tanto

pode ser mãe, em razão de viver com outro, em estado de casado, em união estável,

concubinato ou até mesmo com pessoa do mesmo sexo, no caso de inseminação ou adoção.

A mãe pode optar pela família homoparental e não querer a presença do outro na vida do

filho.

Entretanto, necessária a distinção acima, considerando que, se for casada a mulher, há as

presunções de paternidade, que permite o registro em nome do pai da criança. Portanto, a

mulher casada pode registrar o filho, no Cartório, independentemente da presença do

marido, se a concepção da criança ocorreu dentre de umas das presunções ditadas pelo art. 1.

597 do Código Civil, no nome dela e do marido. As presunções existem justamente para

evitar a propositura da ação investigatória de paternidade e também dispensando a presença

do pai no momento do registro do filho dele.

Entretanto, em se tratando de filho nascido fora das presunções e principalmente de mães

solteiras, a lei nº Lei 8.560/92, que regula a investigação de paternidade dos filhos havidos

ora do casamento, foi muito feliz, considerando que permitiu que a mãe, ao comparecer no

Cartório, para registrar o filho apenas no nome dela, indicasse o nome do suposto pai ao

oficial e aí começa o procedimento oficioso em análise.

Destacamos que é faculdade da mãe indicar o nome do suposto pai do filho dela. O oficial

em hipótese alguma poderá obrigar que a mãe indicasse o nome do suposto pai. E, se a mãe

assim o fizer, espontaneamente, o oficial remeterá, pelo art. 2º da Lei nº 8.560/92, ao juiz,

certidão integral do registro e o nome e prenome, profissão, identidade e residência do

suposto pai, a fim de ser averiguada, oficiosamente, a procedência da alegação. Ressalta-se

que não se trata de ação, não se trata de processo. É mero procedimento. Assim, não há

contraditório.

O juiz aludido é o de direito. E, em existindo Varas Especializada, a remessa é enviada para

o Juiz de Registro Público, o que entendemos não ser correto, eis que, na verdade, está em

discussão a paternidade da criança, o estado de filho. Portanto, o adequado seria a remessa

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dos dados acima ao juiz de família, principalmente considerando que, comparecendo o

suposto pai e reconhecendo a criança como filha, poderá também, desde aquele momento,

acordar as partes sobre guarda, visita e pensão alimentícia, matérias estas alheias à

competência do Juiz da Vara de Registro Público.

Pelo § 1º do art. 2º, da Lei nº 8.560/92, o juiz, sempre que possível, ouvirá a mãe sobre a

paternidade alegada e mandará, em qualquer caso, notificar o suposto pai,

independentemente de seu estado civil, para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é

atribuída. Tal entrevista poderá ocorrer em segredo de justiça (§ 2º do art. 2º da Lei

8.560/92).

Pelo § 3º, do art. 2º, da Lei nº 8.560/92, confirmada, expressamente, a paternidade, pelo

suposto pai, será lavrado termo e remetida certidão ao oficial do registro, para a necessária

averbação. Portanto, neste caso houve o reconhecimento espontâneo, evitando a propositura

da ação declaratória de paternidade e, lado outro, o pai poderá aproximar mais rapidamente

do filho, indo tal lei ao encontro do princípio do afeto e também o princípio da paternidade

responsável.

Entretanto, se o suposto pai não atender, no prazo e 30 (trinta) dias, a notificação judicial, ou

negar a alegada paternidade, pelo § 4º, do art. 2º, da Lei nº 8.560/92, o juiz remeterá os

autos ao representante do Ministério Público para que intente, havendo elementos

suficientes, a ação de investigação de paternidade.

Nota-se que o legislador deferiu legitimação extraordinária ao representante do Ministério

Público para oferta da ação de investigação de paternidade. Tão logo a lei nº 8.560/92 foi

publicada, o que aconteceu em 29 de dezembro de 1992, em Minas Gerais a legitimidade

extraordinária do representante do Ministério Público foi questionada perante, na época, a

Corte Superior do TJMG que, por pouco, não rotulou de ilegal tal permissão, o que seria um

desserviço às inúmeras crianças pobres existentes neste Estado e residentes em várias

Comarcas, ainda não abarcadas pelo eficiente atuação da Defensoria Pública.

Na época, em 1993, estávamos atuando, como juiz, em Itamarandiba/MG, cidade que tinha

no máximo 05 (cinco) advogados atuantes e vários filhos de mães solteiras, não

reconhecidos pelos pais. Estes advogados geralmente tinham como clientes os supostos pais

dos menores e, portanto, não ofertavam ação investigatória de paternidade, além da pressão

que sofriam, considerando que estes supostos pais eram pessoas influentes naquela cidade.

Assim foi que, naquela hospitaleira cidade, o então Promotor, André Luís Garcia de Pinho,

com base na lei em comento, ofertou centenas de ações investigatórias de paternidades,

inclusive aplicando aludida legislação para os filhos nascidos antes do advento desta

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normatização.

A questão chegou, em recurso de apelação, no Tribunal mineiro que acabou entendendo, em

algumas de suas Câmaras, que o representante do Ministério Público não poderia propor

ação para os filhos nascidos antes da lei nº 8.560/92. Assim, vários autos de processos foram

extintos, sem enfrentamento de mérito. Porém, a Procuradoria do Ministério Público ofertou

recurso especial e o Superior Tribunal de Justiça acabou entendo que poderia sim o Parquet

propor ação também em prol dos filhos nascidos antes da lei nº 8.560/92.

O § 4º, da Lei 8.560/92, deixa expresso que, mesmo ofertando o representante do Ministério

Público ação investigatória de paternidade, tal fato não inibe que o menor, representado pela

mãe, compareça nos autos, com advogado ou com defensor, hipótese em que o representante

do Ministério Público se afasta da ação, como substituto processual, se iniciada, ou, então,

não a ajuizaria, caso ainda não ofertada.

Efeitos do reconhecimento da paternidade.

O reconhecimento da paternidade, que é irrevogável, incondicional, indivisível, tem também

efeito ex tunc, isto é, retroage ao dia do nascimento do filho, sem prejuízo das situações

jurídicas já definitivamente constituídas.

Com relação à mãe, além dela própria poder fazer o reconhecimento, dentre os diversos

meios indicados no artigo 1.609 do Código Civil, outras pessoas também podem declarar o

nascimento no registro civil, autorizadas pelo art. 52 da Lei de Registro Público (Lei nº

6.015/73), quais sejam: o pai, um parente, os administradores de hospitais, médicos e

parteiras. É em razão de terceiras pessoas poderem declarar a maternidade que o art. 1.608

do Código Civil dá legitimação à mãe para impugnar a maternidade provando a falsidade do

termo ou as declarações nele contidas.

Ao filho, a partir do momento em que reconhecido, são atribuídos direitos, faculdades e

deveres de ordem pessoal e patrimonial. Assim, estará sob a autoridade parental. Entretanto,

pelo artigo 1.611 do Código Civil, não será admitido no lar do que o reconheceu, sem a

anuência do outro cônjuge.

Pelo artigo 1.612, “o filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob a guarda do genitor

que o reconheceu, e, se ambos o reconheceram e não houver acordo, sob a de quem

melhor atender aos interesses do menor”. É a aplicação do princípio do “melhor

interesse do menor”.

Ação de investigação de paternidade e de maternidade

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O artigo 363 do Código Civil de 1916 dava legitimação ao filho natural para propor ação de

paternidade, desde que fundada nos seguintes fatos: concepção do filho durante o

concubinato da mãe com o pretenso pai; coincidência da concepção com o rapto da mãe pelo

suposto pai, ou suas relações sexuais com ele; existência de escrito do pretendido pai,

reconhecendo expressamente a paternidade.

Assim, os filhos “adulterinos” e “incestuosos” não podiam investigar a paternidade no

regime do Código Civil de 1916. Entretanto, pelo Decreto-lei n٥ 4.737/42, foi permitido ao

filho “adulterino”, após o “desquite” ajuizar ação de investigação de paternidade. A

jurisprudência entendeu, em uma interpretação extensiva, que no lugar de “desquite”,

apenas, era de se considerar a dissolução da sociedade conjugal, em qualquer uma de suas

formas, para que qualquer dos cônjuges reconhecesse o filho havido fora do matrimônio e

ao filho para propor ação de paternidade ou maternidade.

Entretanto, desde a Constituição de 1988, que proibiu qualquer designação discriminatória

(art. 227, § 6º) entre os filhos, não há mais obstáculo para que o filho, advindo ou não do

casamento, possa ofertar ação de pesquisa da paternidade biológica ou até mesmo

sócioafetiva. A ação investigatória de paternidade deverá, pelo artigo 46 do Código de

Processo Civil, ser ajuizada no foro do domicílio do investigado, se não for cumulação com

ação de alimentos.

Havendo cumulação de pedido, investigação e alimentos, pela Súmula n٥ 1, do Superior

Tribunal de Justiça, a ação deverá ser proposta no foro do domicílio ou residência do

alimentando. Trata-se de competência relativa, a impedir, ainda segundo Súmula 33, do

Superior Tribunal de Justiça, que o juiz, de ofício, decline da competência. Há, pois,

necessidade de o réu ofertar o incidente de exceção de incompetência relativa, pena de haver

prorrogação da competência.

A ação de investigação de paternidade ou maternidade deverá ser propostas pelo

investigante, pessoalmente, que, se menor, deverá ser representado ou assistido pelo

representante legal, geralmente, nestes casos, a mãe, que detém a guarda, de fato, do

investigante, desde o nascimento. Pelo parágrafo único do artigo 1.606, os herdeiros

prosseguiram não ação iniciada pelo filho. Trata-se do fenômeno processual de substituição

de parte.

Réu na ação investigatória de paternidade é o suposto pai, se vivo, ou os herdeiros, se

falecido, que, dependendo do regime de bens (artigo 1.829 do CC), terá também a viúva

como herdeira concorrente. Assim, não tem o espólio legitimidade passiva na ação

investigatória de paternidade.

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O réu poderá alegar impossibilidade jurídica do pedido se, por exemplo, o filho, concebido

durante o casamento, foi registrado pelo pai. No mérito, poderá o investigado demonstrar a

impossibilidade material da coabitação, bem como a impotência coeundi e generandi, se

existente no momento da concepção do filho. Também poderá o réu alegar a exceptio

plurium concubentium. ou seja, demonstração de que no período legal da concepção do

investigante (os primeiros 120 dias, dos 300 que antecederam ao nascimento – art. 1.597,

II), a mãe teve relações com outro homem. Entretanto, tal defesa deverá ser afastada se o

pretenso pai recusar a submeter-se ao exame do DNA.

A discussão hoje é sobre a recusa do suposto pai de se submeter ao exame de DNA,

principalmente considerando que, por determinação do Supremo Tribunal Federal, não pode

o juiz obrigar as partes a submeterem-se a tal exame. Assim, da análise da súmula 301, do

STJ, conclui-se que tal recusa induz presunção juris tantum de paternidade. Portanto, se o

suposto pai não comparece ao exame de DNA, depois de intimado pessoalmente (a

intimação pessoal é necessária, por ser ato personalíssimo), haverá inversão do ônus de

prova, ou seja, restará ao investigado, a partir de então, demonstrar que não é o pai do

investigante.

Entretanto, se realizado o exame de DNA, de notar-se que tal prova não é absoluta, ou seja,

deverá ser confrontada com as demais e poderá até mesmo ser rechaçada. Fosse outro o

entendimento, com a realização do exame e juntada do laudo aos autos, após oitiva das

partes poderia haver o julgamento antecipado da lide. Entretanto e pena de cerceamento de

defesa, haverá necessidade, na ação de investigação de paternidade, de audiência de

instrução e julgamento, inclusive com oitivas de testemunhas, se arroladas ou se referidas,

hipótese em que o juiz, do ofício, poderá inquiri-las. Evidentemente que, caso as partes,

após a realização do exame, permitam o julgamento antecipado ou não indiquem outras

provas, nestes casos de prevalecer o exame realizado.

Portanto, o exame de DNA é mais uma prova, dentre várias outras, que poderão ser colhidas

no curso da instrução. Nenhuma prova é mais importante do que a outra, competindo o juiz,

através de seu livre convencimento motivado, desprezar a que entender fora do contexto do

conjunto probatório, inclusive o exame de DNA, eis que, pelo art. 369, do Código de

Processo Civil, todos os meios de provas legais e os moralmente legítimos são hábeis para

provar a verdade, ainda que não especificados naquele Código.

Portanto, a Lei nº 8.8560/92, além de dar legitimidade extraordinária ao Ministério Público

para propositura de ação investigatória de paternidade, acabou, no parágrafo único do seu

art. 2º-A, acrescentado pela Lei nº 12.004, de 29-7-2009, por encampar a Súmula 301 do

STJ ao afirmar que “a recusa do réu em se submeter ao exame de código genético – DNA

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gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório.”.

Com efeito, a Súmula 301 do STJ afirma: “em ação investigatória, a recusa do suposto pai a

submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade.”.

Portanto e conforme dito acima, se o suposto pai, réu na ação investigatória de paternidade,

não comparece ao exame de DNA, há inversão do ônus de prova. O réu é pai, salvo se

provar o contrário, a ser realizada no curso da ação. Assim e considerando que pelo próprio

STF não é possível a condução coercitiva do suposto pai ao exame de DNA, na verdade o

réu na ação de investigação de paternidade acaba trocando, beneficiado que foi com tal

entendimento, uma prova científica por qualquer outro meio, até mesmo pelas oitivas de

meras testemunhas.

Interessante que o STF ao não permitir a condução coercitiva do suposto pai ao exame de

DNA argumentou que ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo. Entretanto, na

verdade se o réu contesta a paternidade, afirmando que não é o pai da criança, ele não irá

fazer prova contra ele, mas sim a favor dele mesmo, salvo se estiver mentindo, o que não é

correto (art. 80, II, III, IV, VI do CPC). Depois, se tal argumento ainda não for convincente

à condução coercitiva do réu ao exame de DNA, a ponderação dos princípios favorece tal

proposta, ou seja, entre o pai não querer se submeter ao exame e o direito de o filho

investigar sua ascendência genética, de prevalecer esse direito, em razão do princípio do

melhor interesse da criança e o da paternidade responsável (art. 226,§ 7º da CF).

Também como prova e ainda alicerçado no artigo 369 do Código de Processo Civil

entendemos que há que ser considerada, desde que corroborada por outras provas, a posse

de estado de filho, como meio de prova. Caracteriza-se, na doutrina, a posse de estado de

filho se o investigante traz e usa nome do investigado e dele recebe tratamento como filho,

tanto em casa como na sociedade, a ponto de todos que conhecem a família considerar que

se trata de relacionamento entre pai e filho.

A união estável e também o concubinato devem ser considerados como provas em uma ação

de investigação de paternidade.

E, julgado procedente o pedido declaratório da ação de investigação de paternidade

cumulada com ação de alimentos, a verba alimentar é devida a partir da citação, conforme

Súmula 277, do Superior Tribunal de Justiça, e que está em consonância com o efeito “ex

tunc” das ações declaratórias. Poder-se-ia, argumentar que, neste caso os alimentos

deveriam, então, retroagir à data do nascimento do investigante. Entretanto, não podemos

olvidar que é com citação que o devedor é colocado em mora.

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No registro de nascimento não se fará, no momento da averbação dos nomes dos avôs

paternos e do pai, qualquer referência à natureza da filiação, por exigência Constitucional, a

proibir designações discriminatórias. Também das certidões de nascimento não constarão

indícios de haver sido a concepção decorrente de relação extraconjugal (art. 5º e 6º da Lei nº

8.560/92). O filho tem o direito de usar o sobrenome do pai.

O mandado com o novo nome do filho, nomes dos avôs paternos e do pai, deverá ser levado

ao Registro de Nascimento para ser averbado à margem do assento de nascimento ou para

lavratura deste, se o filho ainda não era registrado e terá validade “erga omnes”.

Acerca da coisa julgada na ação de investigação de paternidade, temos o seguinte

entendimento, considerando o direito de investigar a paternidade indisponível e

imprescritível: se a ação foi ajuizada antes da existência do exame de DNA, não há que se

falar em coisa julgada. Ofertada a ação após o advento do exame de DNA a sentença

transitará em julgado no caso de recusa de alguma das partes em se submeter ao exame. Para

tanto e independentemente de existir ou não contestação, as partes deverão ser intimadas,

pessoalmente, para comparecimento no laboratório. Não comparecendo, caracterizada estará

a recusa e, por conseguinte, a ausência de tal prova não é obstáculo o trânsito em julgado da

sentença.

Acerca do tema o então Desembargador, Francisco de Assis Figueiredo, profundo

conhecedor do Direito de Família em Minas Gerias, assim se pronunciou, com a clareza e

sensibilidade que lhe é peculiar, no Agravo Regimental nº 1.0701.03.039620-7/002,

publicado no Diário do Judiciário de Minas Gerais, em data de 1º de Maio de 2004:

“tendo sido a ação investigatória de paternidade julgada improcedente por

falta de prova, à investigante tem sido reconhecida a possibilidade de novo

ajuizamento, pautado no entendimento jurisprudencial do STJ de

relativização da coisa julgada, de que, nas atuais ações rescisórias, o exame

do DNA, mesmo somente realizado e obtido agora, ser entendido como

documento novo (art. 485 do CPC) capaz de justificar a nova ação. Este

novo entendimento, aplicado no campo do Direito de Família, é fruto do

reconhecimento do Direito Real da Verdade, que deve inspirar o processo,

bem como e também da proteção integral do Direito Personalíssimo da

Pessoa. Em sede de investigatória, deve estar o agravante advertido para o

teor dos artigos 231 e 232 do Novo Código Civil.”.

Ação negatória de paternidade c/c ação declaratória de paternidade.

Quando o filho já estiver registrado em nome de outra pessoa que, na verdade, não é o pai

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dele, o pretenso pai poderá ajuizar ação para desconstituir o registro de nascimento, no

tocante ao pai registrário, cumulando tal pretensão com a ação declaratória de paternidade

contra o suposto filho.

Tal proposta não encontra ressonância pacífica entre alguns doutrinadores e até diante de

alguns julgados, considerando que uns dizem que a ação correta será a de nulidade de

registro c/c ação declaratória de paternidade. E, em se tratando de Comarcas em que não há

Varas de registro público, a questão não tem maiores consequências, considerando que,

como sabido, o nome da ação não tem importância, devendo o juiz se ater à causa remota,

próxima e aos pedidos.

Entretanto, considerando as Comarcas que têm Varas especializadas, especialmente de

família e também Vara de registros públicos, propor ação de nulidade de registro c/c ação

declaratória de paternidade já não é possível, considerando que são duas Varas, de

competência absoluta divergentes, em razão da matéria. Fosse correto o entendimento de

que se trata de ação de nulidade de registro, primeiramente deveria ser proposta tal ação na

Vara de registro público e, nulificado o registro, propor então ação declaratória de

paternidade, agora na Vara de Família.

Assim, insistimos que, se o filho estiver registrado em nome de outro, que não seja o pai

dele, biológico ou socioafetivo, as ações a serem cumuladas são: ação negatória de

paternidade c/c ação declaratória de paternidade. Julgado procedente o pedido de negação de

paternidade, que é uma ação declaratória negativa, passa-se então à análise do segundo

pedido, ou seja, o de declaração de paternidade. Julgado improcedente o pedido de negação

de paternidade, o segundo, de declaração de paternidade, restará prejudicado.

Evidentemente que anos atrás o Superior Tribunal de Justiça entendia que bastava propor

ação declaratória de paternidade, eis que, se procedente o pedido, a consequência era

desconstituir o registro anterior. Entretanto, tal entendimento não era o mais correto,

considerando que desprezava o devido processo legal, com relação ao pai registrário, que

deixava de ser pai, sem participar do processo. Era uma autêntica decisão surpresa!

Nessas demandas, negatória de paternidade c/c ação declaratória de paternidade,

evidentemente que haverá um cúmulo de ações contra réus diferentes, o que é perfeitamente

possível, principalmente em se tratando do direito das famílias e também se levando em

consideração o princípio da economia processual.

Assim, réu nesta ação poderá ser o próprio filho, que poderá propor ação negatória contra o

pai que o registrou e ação declaratória de paternidade contra o pai, seja biológico ou afetivo

ou contra ambos, se for o caso. Neste caso, perfeitamente possível também cumular a ação

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declaratória de paternidade com alimentos, hipótese em que, se declarada a paternidade, os

alimentos são devidos a partir da citação, conforme Súmula 277 do Superior Tribunal de

Justiça. Nesse caso, a ação também deverá ser proposta no domicílio do alimentando

(Súmula 01 do STJ).

A defesa na ação negatória de paternidade poderá ser no tocante à possível paternidade

socioafetiva, se for o caso. Com relação ao réu, na ação declaratória de paternidade, caso

haja recusa de submeter-se ao exame de DNA, após ser intimado pessoalmente para tanto,

de aplicar-se a Súmula 301, do Superior Tribunal de Justiça, ou seja, gera presunção de

paternidade, o que implica em inversão do ônus de prova, ou seja, a partir da recusa o réu é

pai, salvo prova em contrário, ônus dele.

No caso de o pretenso pai propor ação, a negatória de paternidade será contra o pai

registrário e a paternidade contra suposto filho.

Portanto, entendemos que tanto o filho como o pai tem legitimidade ativa para propositura

da ação negatória de paternidade c/c ação declaratória de paternidade e nada impede também

que apenas a ação negatória de paternidade seja ofertada, considerando que o filho, por

exemplo, não sabe quem realmente é o pai dele, porém, não tem nenhuma aproximação com

o pai registrário, que não é o pai biológico. A ação negatória de paternidade poderá ser

proposta pelo filho contra o pai registrário ou vice-versa.

Ilustrando o acima exposto, bem como demonstrando que se o reconhecimento foi

espontâneo e que houve afeto entre pai e filho, reforçando o registro, de destacar a seguinte

ementa:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA E AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO DA SENTENÇA NÃO CONFIGURADOS. PAI NÃO BIOLÓGICO. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO CAPAZ DE JUSTIFICAR A MODIFICAÇÃO DO REGISTRO DE NASCIMENTO. VÍNCULO SOCIOAFETIVO DEMONSTRADO. PATERNIDADE RECONHECIDA. 1. A força que ganhou a afetividade no moderno Direito de Família deve-se ao alargamento do conceito de família ao longo dos tempos, por influência das fortes mudanças socioeconômicas e culturais a que se submeteu e se submete dia a dia a sociedade brasileira. 2. A seara do Direito de Família se conscientizou de que o melhor genitor ou genitora nem sempre é quem se liga à prole pela via consanguínea, mas sim aqueles que, de fato, vivem a condição de pai e mãe na melhor acepção das palavras. 3. Tem entendido o STJ que o reconhecimento voluntário da paternidade é ato irrevogável, sendo indispensável a comprovação de que houve engano na manifestação da vontade de registrar para que haja a possibilidade de modificação dessa situação jurídica, o que não se verifica no caso em deslinde. 4. No presente caso, restou demonstrado que o reconhecimento da paternidade foi feito de forma voluntária e que havia laços de afetividade entre as partes, o que caracteriza a paternidade socioafetiva. Recurso conhecido e provido. Decisão unânime (Relator: Des. Tutmés Airan de Albuquerque Melo, TJ- AL, data: 03/04/2018)

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Ação declaratória de paternidade c/c ação de alimentos.

Interessante é a cumulação da ação de alimentos com a ação declaratória de paternidade,

considerando que os alimentos, se não estipulados a títulos de provisórios, são devidos

retroativamente à citação, conforme Súmula 277, do Superior Tribunal de Justiça.

Portanto, havendo necessidade alimentar, de se propor ação declaratória de paternidade

c/c alimentos.

A lei nº 8.560/92, que continua vigente, mesmo depois do atual Código Civil, seu artigo

7º, permite, inclusive, que o Juiz, se o investigante for pobre, fixe alimentos,

independentemente de pedido neste sentido, na ação de declaratória de paternidade. Os

alimentos passam a ser, por conseguinte, efeito da procedência do pedido declaratório de

paternidade.

Portanto, modificação significativa foi a ditada pelo art. 7º, da Lei 8.560/92, ao

determinar que, “sempre que na sentença de primeiro grau se reconhecer a paternidade,

nela se fixarão os alimentos provisionais ou definitivos do reconhecido que deles

necessite”. Nota-se que os alimentos passaram a ser consequência da procedência do

pedido declaratório de paternidade, não havendo mais necessidade, neste caso, de

cumulação da ação investigatória de paternidade c/c alimentos.

Tal proposta é interessante considerando que não basta ser pai, apenas fornecendo o

nome. Necessário também que os alimentos sejam estipulados, ao declarar a paternidade,

até mesmo de ofício pelo juiz. Tal proposta não macula o devido processo legal, eis que o

advogado, já ciente de tal disposição legal, ao contestar a ação de investigação de

paternidade, pelo princípio da eventualidade, deverá também contestar o que será uma

consequência da procedência do pedido desta ação, ou seja, a fixação, na sentença, dos

alimentos, principalmente em se tratando de investigante pobre. Porém, a destinação

desse artigo não é exclusivamente para filho pobre, mas sim ao necessitado da verba

alimentar que, no nosso entendimento, todos os filhos são e o pai já está em mora, no

tocante à verba alimentícia, desde a citação na ação investigatória de paternidade.

Assim e a partir do disposto no art. 7º, da Lei 8.560/92, há que ser revisada a Súmula 01

do STJ, a determinar que: “o foro do domicílio ou da residência do alimentando é o

competente para a ação de investigação de paternidade, quando cumulada com a de

alimentos”. Na verdade e a partir da Súmula em análise, o correto é entender que o foro

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do domicílio ou da residência do investigante é o competente para a ação declaratória de

paternidade, independentemente de haver cumulação desta ação com a ação de alimentos.

Também necessário é entender a Súmula 277 do STJ em consonância com o art. 7º, da

Lei 8.560/92, ou seja, fixados os alimentos, mesmo não havendo cumulação de ações

(ação declaratória de paternidade c/c ação de alimentos), a verba alimentar é devida a

partir da citação. A Súmula 277 assim afirma: “julgada procedente a investigação de

paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação”. Na verdade julgado procedente

o pedido. Com relação à ação há que se falar em carência e não improcedência, que já

discussão de mérito.

Multiparentalidade e seus reflexos nos Ofícios da cidadania (Cartórios de Registro

civil de pessoas naturais).

Multiparentalidade é a possibilidade de uma pessoa ter mais de um pai e também mais de

uma mãe concomitantemente, em razão da convivência entre a paternidade biológica e a

paternidade socioafetiva, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, advindo do

tema de repercussão geral, de relatoria do ministro Luiz Fux.

A sessão do STF que firmou a tese da multiparentalidade aconteceu no dia 21/09/2016, em

deliberação do pleno do STF. O caso balizador da apreciação da temática foi o RE

898060/SC, no qual o Instituto Brasileiro de Direito de Família-IBDFAM atuou como

Amicus Curiae.

A tese aprovada pelo STF tem o seguinte teor: "A paternidade socioafetiva, declarada ou

não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação

concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios".

Lado outro e considerando o título deste tema, de esclarecer-se, ainda, que Ofícios de

cidadania é o nome dos ofícios de registro civil das pessoas naturais, ditado pelo § 3º, do art.

19, da Lei 13.384: “os ofícios de registro civil das pessoas naturais são considerados ofícios

da cidadania e estão autorizados a prestar outros serviços remunerados, na forma prevista

em convênio, em credenciamento ou em matrícula com órgãos públicos e entidades

interessadas”.

Assim e após a admissão da multiparentalidade no nosso ordenamento jurídico a maneira de

materializar tal instituto nos Ofícios de registro civil, agora Ofícios de cidadania, gerou

inúmeras dúvidas, exigindo da Corregedoria Nacional de Justiça que emitisse o Provimento

nº 63, com a finalidade de sanar as imprecisões e também de auxiliar nas decisões a serem

efetivadas de maneira uniforme em todo este país.

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Assim, tal instrumento contêm normas para emissão, pelos cartórios de registros civis, de

certidão de nascimento, casamento e óbito, que terão obrigatoriamente o número de CPF,

bem como permite o reconhecimento voluntário da maternidade e paternidade socioafetiva.

Na omissão e vagareza do nosso conservador legislador e encampado, de imediato, os novos

direitos advindos do atual e democrático direito das famílias, alguém tem que fazer algo, em

prol de efetivação destes aludidos direitos, de imediato, evitando a judicialização da questão.

Assim o fez o atuante e culto Corregedor Nacional de Justiça, Ministro João Otávio de

Noronha, em 20/11/17. O provimento 63, por conseguinte, tem natureza jurídica de lei, no

sentido material, merecendo destaques os seguintes CONSIDERANDOS, uma verdadeira

síntese do atual direito das famílias, no tocante à filiação:

“CONSIDERANDO a competência da Corregedoria Nacional de Justiça de regulamentar a

padronização das certidões de nascimento, casamento, óbito e certidão de interior teor (art.

19, caput, da Lei de Registro Público);

CONSIDERANDO a existência de regulamentação pelas corregedorias-gerais de justiças

dos Estados do reconhecimento voluntário de paternidade e maternidade socioafetiva

perante os oficiais de registro civil das pessoas naturais;

CONSIDERANDO a ampla aceitação doutrinária e jurisprudencial da paternidade e

maternidade socioafetiva, contemplando os princípios da afetividade e da dignidade da

pessoa humana como fundamento da filiação civil;

CONSIDERANDO a possibilidade de o parentesco resultar de outra origem que não a

consaguinidade e o reconhecimento dos mesmos direitos e qualificações aos filhos, havidos

ou não da relação de casamento ou por adoção, proibida toda designação discriminatória

relativa à filiação (arts. 1.539 e 1.596 do Código Civil);

CONSIDERANDO a possibilidade de reconhecimento voluntário da paternidade perante o

oficial de registro civil das pessoas naturais e, ante o princípio da igualdade jurídica e de

filiação, de reconhecimento voluntário da paternidade ou maternidade socioafetiva;

CONSIDERANDO a necessidade de averbação, em registro público, dos atos judiciais ou

extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação (art. 10, II, do Código Civil);

CONSIDERANDO o fato de que a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro

público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação baseado na origem biológica,

com os efeitos jurídicos próprios (Supremo Tribunal Federal – RE n. 898.060/SC);”.

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Logo depois da publicação do provimento nº 63, a Associação Nacional dos Registradores

de Pessoas Naturais, em 06/12/17, emitiu nota de esclarecimento sobre aludido provimento,

que instituiu modelos únicos de certidão de nascimento, casamento e de óbito, a serem

adotadas pelos ofícios de registro civil das pessoas naturais e dispõe sobre o reconhecimento

voluntário e a averbação da paternidade e maternidade socioafetiva no Livro “A” e também

sobre o registro de nascimento e emissão da respectiva certidão dos filhos havidos por

reprodução assistida.

A paternidade socioafetiva foi tratada, pelo provimento nº 63, na Seção II, arts. 10 a 15. O

art. 10 deste provimento permite o reconhecimento voluntário da paternidade ou da

maternidade socioafetiva de pessoa de qualquer idade perante os oficiais de registro civil das

pessoas naturais, esclarecendo, o § 1º, deste mesmo artigo, que tal reconhecimento é

irrevogável, somente podendo ser desconstituído pela via judicial, nas hipóteses de vício de

vontade, fraude ou simulação.

Pelo § 2º, ainda do art. 10, do provimento nº 63, poderão requerer o reconhecimento da

paternidade ou maternidade socioafetiva de filho os maiores de dezoito anos de idade,

independentemente do estado civil. Pelo § 3º, também do art. 10, não poderão reconhecer a

paternidade ou maternidade socioafetiva os irmãos entre si nem os ascendentes e, pelo § 4º o

pretenso pai ou mãe será pelo menos dezesseis anos mais velho que o filho a ser

reconhecido.

Continuando nossa manifestação sobre o provimento 63, emitido pela Corregedoria

Nacional de Justiça, através do Ministro João Otávio de Noronha, que regulamenta o

reconhecimento da paternidade e/ou maternidade socioafetiva, dentre outras medidas, face à

importância deste aludido instrumento normativo, a evitar o ajuizamento da ação

declaratória de paternidade ou maternidade socioafetivas, havendo consenso entre as partes

e desde que presentes os requisitos abaixo, com destaque para o art. 11.

Assim e pelo art. 11, do provimento 63, o reconhecimento da paternidade ou maternidade

socioafetiva será processado perante o oficial de registro civil das pessoas naturais, ainda

que diverso daquele em que foi lavrado o assento, mediante a exibição de documento oficial

de identificação, com foto do requerente e da certidão de nascimento do filho, ambos em

original e cópia, sem constar do traslado menção à origem da filiação. Assim, não constará

que o filho é “socioafetivo”, o que seria uma discriminação, vedada pela Constituição

Federal.

Pelo § 3º, desse artigo 11, o registrador deverá colher a assinatura do pai e da mãe do

reconhecido, caso este seja menor. E, pelo § 4º, ainda do artigo 11, se o filho for maior de

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doze anos, o reconhecimento da paternidade ou maternidade socioafetiva exigirá seu

consentimento. Portanto, nota-se que, se o filho maior de doze anos não consentir com o

reconhecimento extrajudicial, não há como fazê-lo.

Pelo § 5º do art. 11, a coleta da anuência, tanto do pai quanto da mãe e do filho maior de

doze anos, deverá ser feita pessoalmente, perante o oficial de registro civil das pessoas

naturais ou escrevente autorizado.

Pelo § 6º, também do art. 11, na falta da mãe ou do pai do menor, na impossibilidade de

manifestação válida destes ou do filho, quando exigido, o caso será apresentado ao juiz

competente, nos termos da legislação local. Este dispositivo é de difícil entendimento ao

não esclarecer o que seria a falta da mãe ou do pai, ou seja: desaparecidos, mortos ou em

razão de o menor não ter pai ou mãe no registro. Caso o filho não seja registrado,

evidentemente que não há que se falar em anuência dos pais biológicos, o mesmo

acontecendo se já são falecidos.

Depois, na impossibilidade de manifestação válida dos pais ou do filho o correto seria a

proibição da lavratura da escritura, diante da impossibilidade de consenso. Ora, o juiz,

geralmente o de registro público, não poderá fazer nada, nestes casos. Portanto, necessário

será, nestes casos, é o ajuizamento da ação declaratória de paternidade e/ou maternidade

socioafetiva.

O 7º, art. 11, do provimento 63, determina a observância das regras da tomada de decisão

apoiada quando o procedimento envolver a participação de pessoa com deficiência.

Pelo § 8º, ainda do art. 11, o reconhecimento da paternidade ou da maternidade socioafetiva

poderá ocorrer por meio de documento público ou particular de disposição de última

vontade, desde que seguidos os demais trâmites previstos naquele provimento, ou seja,

também por testamento público ou particular poderá ser reconhecido o filho socioafetivo.

Porém e pelo art. 12, se o registrador suspeitar de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade,

simulação ou dúvida sobre a configuração do estado de posse de filho, deverá recusar o

registro, em decisão fundamentada, encaminhando o pedido ao juiz competente, nos termos

da legislação local. Neste caso, o juiz, geralmente o de registro público, em consonância

com a Lei de Organização Judiciária do Estado, deverá ouvir o Ministério Público e, após,

deferir ou não o pedido, tudo a nível ainda administrativo, ou seja, tal decisão não impede o

ajuizamento da ação declaratória de paternidade e/ou maternidade socioafetiva.

Pelo art. 13 a discussão judicial sobre o reconhecimento de paternidade ou de procedimento

de adoção obstará o reconhecimento da filiação pela sistemática estabelecida naquele

provimento. Para tanto, determina o parágrafo único, deste art. 13, que o requerente deverá

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declarar o desconhecimento da existência de processo judicial em que se discuta a filiação

do reconhecendo, sob pena de incorrer em ilícito civil e penal.

O art. 14, do provimento nº 63, limita a multiparentalidade ao não permitir o registro de

mais de dois pais e de duas mães no campo FILIAÇÃO, no assento de nascimento. Portanto

e pelo mencionado provimento, se o filho já é registrado em nome dos pais biológicos

poderão ser registrados os nomes dos pais socioafetivos, por apenas uma vez. Entretanto e

em razão do afeto, quer nos parecer que uma pessoa possa ter vários pais e não apenas mais

um, além dos biológicos.

O art. 15 esclarece que o reconhecimento espontâneo da paternidade ou maternidade

socioafetiva não obstacularizará a discussão judicial sobre a verdade biológica, seguindo

também o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que não há

incompatibilidade entre a paternidade de sangue e a paternidade socioafetiva, infelizmente,

eis que, conforme já dissemos em outras manifestações, entendemos que possa haver sim

vários pais ou várias mães, desde que presente em todas as paternidades o afeto. Assim, não

poderia ser permitida a discussão da paternidade biológica, se desacompanhada de afeto.

Porém, este não foi o entendimento do STF.

Nos Tribunais está prevalecendo o entendimento de que é possível prevalecer tanto a

paternidade socioafetiva como a biológica, conforme ementa abaixo transcrita:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM ALIMENTOS. DEMANDA AJUIZADA CONTRA A GENITORA E O PAI SOCIOAFETIVO. PROVA PERICIAL (EXAME DE DNA). PATERNIDADE BIOLÓGICA DO AUTOR COMPROVADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MAGISTRADO QUE ENTENDEU PELA PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. RECURSO DO DEMANDANTE. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA MULTIPARENTALIDADE. VIABILIDADE. RECONHECIMENTO NESTE GRAU DE JURISDIÇÃO DA DUPLA PARENTALIDADE. DETERMINAÇÃO DE RETIFICAÇÃO DO REGISTRO CIVIL PARA CONSTAR O NOME DO PAI BIOLÓGICO COM A MANUTENÇÃO DO PAI SOCIOAFETIVO. VÍNCULO SOCIOAFETIVO QUE NÃO EXCLUI O BIOLÓGICO. POSSIBILIDADE DE COEXISTÊNCIA DE AMBOS. PREVALÊNCIA INTERESSE DA CRIANÇA. TESE FIRMADA EM REPERCUSSÃO GERAL. FIXAÇÃO DE ALIMENTOS A PEDIDO DO AUTOR. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. "A paternidade responsável, enunciada expressamente no art. 226, § 7º, da Constituição, na perspectiva da dignidade humana e da busca pela felicidade, impõe o acolhimento, no espectro legal, tanto dos vínculos de filiação construídos pela relação afetiva entre os envolvidos, quanto daqueles originados da ascendência biológica, sem que seja necessário decidir entre um ou outro vínculo quando o melhor interesse do descendente for o reconhecimento jurídico de ambos" (STF, RE n. 898.060/SP. Rel. Min. Luiz Fux, j. 21.9.2016). (AC: 03026749320158240037 Joaçaba 0302674-93.2015.8.24.0037, Relator: Saul Steil, Data de Julgamento: 17/04/2018, Terceira Câmara de Direito Civil,TJ-SC)