Direito Humano à Alimentação Adequada - Exigibilidade

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CURSO FORMAO EM DIREITO HUMANO ALIMENTAO ADEQUADA No contexto da Segurana Alimentar e Nutricional

Perodo: 6 de agosto a 6 de novembro de 2007. Autoria: Flavio Valente (atualmente na FIAN Internacional) Valria Burity (ABRANDH) Thas Franceschini (ABRANDH) Maria de Ftima Carvalho (OPSAN/UnB) Reviso: Marlia Leo (ABRANDH) Elisabetta Recine (ABRANDH) Ivnio Barros (ABRANDH)

Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS)

Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e a Alimentao (FAO)

gere Cooperao em Advocacy

Ao Brasileira pela Nutrio e Direitos humanos (ABRANDH)

Observatrio de Polticas de Segurana Alimentar e Nutrio (OPSAN)Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos.

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MDULO III: EXIGIBILIDADE Este mdulo utiliza parte do contedo do curso de formao a distncia "Introduo ao Direito Humano Alimentao Adequada" elaborado pela Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e a Alimentao (FAO).

ndice Aula 1: Introduo Aula 2: Tipos de instrumento de exigibilidade em mbito nacional Aula 3: Cobrana de direitos em mbito internacional Aula 4: Fortalecimento d exigibilidade Aula 5: Resumo

Ao final deste mdulo voc ser capaz de: Entender e definir o conceito de exigibilidade. Entender como os direitos humanos podem ser exigidos perante os Poderes Pblicos Poder Executivo, perante o Legislativo e o Poder Judicirio. Entender que os direitos humanos podem ser exigidos em nvel internacional. Entender os passos necessrios para a construo e o fortalecimento da exigibilidade de direitos.

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AULA 1: INTRODUO Nos mdulos anteriores, procurou-se demonstrar que cabe ao Estado a obrigao de garantir o respeito, a proteo, a promoo e o provimento dos direitos humanos de todos os habitantes de seu territrio, por meio da atuao efetiva dos poderes Executivo, Legislativo e Judicirio e de seus agentes. Tambm se demonstrou que h responsabilidades de diferentes atores sociais, inclusive dos indivduos ou da sociedade civil, na realizao desses direitos. Os obstculos e desafios para a realizao do DHAA e demais direitos humanos no Brasil so inmeros e bastante complexos. Eles pressupem mudana na legislao, na regulamentao e operacionalizao de leis e normas existentes, nos processos, nas formas de planejar e executar aes, programas e polticas e, mais do que tudo, na cultura institucional que regem as aes e atribuies do Estado e de seus servidores nas suas relaes com os titulares de direitos. Mudanas por parte da populao tambm devem ser buscadas, em especial quanto ao seu entendimento sobre a funo do Estado, dos governos e de seus servidores, bem como das suas responsabilidades para a realizao dos direitos humanos. Sob a tica dos direitos humanos, os fins no justificam os meios e os processos so to importantes quanto os resultados. Isto , as aes pblicas que visam a realizao dos direitos humanos devem ser coerentes com os seus princpios, devem reforar, e jamais ofender, portanto, o princpio da participao social, da igualdade, da informao, do apoderamento, da no discriminao, e, sobretudo, da dignidade humana. Assim, a construo de uma sociedade mais justa e igualitria e o fortalecimento da capacidade de exigir e cobrar a realizao de direitos humanos requer uma verdadeira revoluo cultural dentro da sociedade e da estrutura administrativa do Estado. Nesse processo, uma srie de estratgias precisa ser considerada. A adoo e a apropriao da linguagem e da abordagem dos direitos humanos nas prticas cotidianas de todos ns, cidados, servidores e gestores pblicos, membros de diferentes conselhos e representantes da sociedade civil pode ser destacada como instrumento fundamental para a realizao desses direitos. Esses somente podem ser efetivados quando se coloca em prtica o princpio de que a cada direito humano corresponde a obrigaes do Estado e a responsabilidades dos diferentes atores sociais para a sua realizao. Alm disso, a realizao efetiva dos direitos humanos inclui o direito dos titulares de exigir o cumprimento dos mesmos. Para o exerccio de exigir a realizao de direitos humanos deve-se considerar: 1) A necessidade do apoderamento por parte dos titulares de direitos e, particularmente, dos grupos sociais mais marginalizados, dos instrumentos disponveis para exigir a realizao de direitos. Para isso,

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fundamental que saibam quais so esses direitos e como podem exigi-los. A necessidade de criao, fortalecimento e implementao efetiva de rotinas e instrumentos pblicos para a cobrana de direitos, em primeiro lugar no mbito administrativo, comeando com o nvel local e municipal. Esses instrumentos e rotinas devem ser de acesso pblico, amplamente divulgados, facilmente utilizveis e estar localizados o mais prximo possvel das comunidades. A importncia de garantir o fortalecimento das instituies existentes para a defesa dos direitos humanos, alm da necessidade de pressionar para a criao de novos instrumentos e instituies de defesa e exigibilidade dos DH, tambm em todos os nveis. Essas instituies devem funcionar de acordo com os Princpios de Paris. A necessidade de capacitao dos gestores e servidores pblicos acerca das obrigaes que lhes cabem enquanto agentes do Estado frente realizao dos direitos humanos. A relevncia da responsabilidade dos demais atores sociais para a realizao desses direitos. A necessidade de avanar na utilizao de meios judiciais para a realizao dos DHESC, criando-se uma cultura jurdica favorvel aos direitos humanos econmicos e sociais, inclusive com fundamento em experincias em outros pases.

Se os cidados, os agentes pblicos e a sociedade civil estiverem adequadamente informados sobre seus direitos e obrigaes, e souberem aonde ir e o que fazer quando sentir que seus direitos esto sendo violados, mais fcil ser cobrar a responsabilidade do Estado e do servio pblico por seus atos e omisses. Por outro lado, se os mecanismos para a garantia desses direitos forem acessveis e amplamente divulgados, mais a populao se sentir apoderada, legitimada e segura para buscar a realizao dos mesmos. O Estado tem a obrigao de criar e disponibilizar de maneira acessvel os mecanismos necessrios para que todos os habitantes do seu territrio tenham o direito a exigir e reclamar o seu DHAA (Lei Orgnica de Segurana Alimentar e Nutricional, artigo 2 pargrafo 2). Tais mecanismos devem estar disponveis em todas as instncias e esferas dos Poderes Executivo, Legislativo e Judicirio. Tambm obrigao do Estado criar e manter o funcionamento independente de instrumentos de recepo e investigao de denncias, com a autonomia necessria em relao ao governo, para propor reparaes para violaes comprovadas de direitos humanos, conforme determinam os Princpios de Paris1.1

Princpios relacionados com o status de instituies nacionais de direitos humanos Resoluo 1992154 de 3.3.92 da Comisso de Direitos Humanos da ONU

De acordo com os Princpios de Paris as instituies de direitos humanos devem ter atribuio, entre outras coisas, para: a) apresentar ao Governo, Parlamento, ou outro rgo competente, em carter consultivo, opinies, recomendaes, propostas para promoo dos direitos humanos; b) promover e assegurar a harmonizao entre preceitos nacionais e internacionais, e sua efetiva implementao;

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Entre os instrumentos atualmente disponveis no Brasil, com maior ou menor autonomia e independncia, podemos listar o Ministrio Pblico, a Defensoria Pblica, os Conselhos de Direitos Humanos e os Conselhos de Polticas Pblicas. Alm dos instrumentos de cobrana de direitos mantidos pelo poder pblico, existem tambm iniciativas da sociedade civil que exercem uma forte presso sobre o Estado no sentido da cobrana da realizao dos direitos humanos. Entre elas podemos citar as organizaes no governamentais (ONGs), entidades populares e sindicais e movimentos sociais que promovem a realizao de diferentes direitos humanos, reconhecidas hoje como defensoras de direitos humanos. No Brasil, na rea de Direitos Humanos Econmicos, Sociais, Culturais e Ambientais (DHESCA), destaca-se o Projeto Relatores Nacionais da Plataforma DHESCA Brasil2, que instituiu Relatorias Nacionais para atuar nas reas dos Direitos Humanos Moradia e Terra Urbana; Meio Ambiente; Sade; Alimentao Adequada e Terra Rural; Educao e Trabalho. Essas instituies e seus instrumentos de exigibilidade de direitos sero estudados no Mdulo 4. Na prtica, o exerccio de utilizao de qualquer um destes instrumentos, e a proposio de criao de novos que se faam necessrios para exigir direitos, o que denominamos de exigibilidade. Diante das questes explicadas acima percebemos que a exigibilidade , portanto, um processo que possibilita a participao ativa de toda a sociedade em busca da garantia de seus direitos. Exigibilidade a possibilidade de exigir o respeito, a proteo, a promoo e o provimento de direitos, perante os rgos pblicos competentes (administrativos, polticos ou jurisdicionais), para prevenir as violaes a esses direitos ou repar-las. Alm disso, no conceito de exigibilidade est includo, alm do direito de reclamar, o direito de ter uma resposta e ao em tempo oportuno para a reparao da violao por parte do poder pblico.

c) encorajar a ratificao de instrumentos internacionais, e assegurar sua implementao; d) assistir na formulao de programas para o ensino e a pesquisa em direitos humanos, e participar de sua execuo em escolas, universidades e crculos profissionais; e) dar publicidade aos direitos humanos e aos esforos de combater todas as formas de discriminao, em particular de discriminao racial, aumentando a conscientizao pblica, especialmente atravs da educao e de rgos da imprensa. Quanto composio destas instituies fundamental garantir que as mesmas: a)

b)c)2

Primem por uma representao pluralista e independente; Sejam mantidas com recursos adequados para manter pessoal e ambiente de trabalho prprios, de modo a ter independncia do Governo e a no estar sujeita a controle financeiro, o que poderia afetar sua independncia; Os seus membros tenham mandato estvel, sem o que no pode haver independncia.

Para maiores informaes sobre a Plataforma DHESCA e sobre o Projeto Relatores visite o site: http://www.dhescbrasil.org.br

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Sobre os princpios e base legal da exigibilidade, veja tambm a Declarao de Quito sobre a exigibilidade e a realizao dos DESC3. importante ressaltar que os Direitos Humanos podem ser exigidos em nvel nacional - perante os Poderes Judicirio e legislativo e perante as trs esferas do Poder Executivo (federal, estadual e municipal) - e tambm em nvel internacional.

AULA 2: TIPOS DE INSTRUMENTOS DE EXIGIBILIDADE EM MBITO NACIONAL Introduo Mecanismos de Exigibilidade do Direito Humano Alimentao Adequada No caso de violao de um Direito Humano, um indivduo pode exigir o exerccio desse direito nos nveis nacional e internacional. No nvel internacional, os direitos podem ser exigidos por meio de mecanismos de exigibilidade de direitos humanos. No nvel nacional, os direitos podem ser exigidos de forma mais eficaz quando esto previstos na legislao nacional. Alm disso, fundamental que o Estado adote medidas que reforcem a exigibilidade do DHAA e demais direitos humanos, como mostraremos neste mdulo.

Cobrana de direitos em nvel nacional Segundo o Comit de Direitos Econmicos, Sociais e Culturais da ONU qualquer pessoa ou grupo que seja vtima de uma violao do Direito Humano Alimentao Adequada deve ter acesso a instrumentos, judiciais ou de outra natureza, que sejam eficazes para a exigibilidade de direitos (Comentrio Geral 9). Para garantir a realizao de direitos fundamental que os titulares tenham o poder de denunciar quando os mesmos esto sendo violados, pois ainda que a existncia desses direitos esteja prevista em normas, a constatao de sua realizao ou violao possui um forte teor subjetivo, ou seja, fundamental que os indivduos ou grupos possam denunciar essas violaes.

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Declarao de Quito sobre a exigibilidade e a realizao dos DESC:

http://www.abrandh.org.br/downloads/quitodesc.pdf Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos.

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Em nvel nacional, os titulares de direitos devem ter a possibilidade de exigir a realizao de seus direitos e reclamar sobre a existncia de violaes ao DHAA por meio de instrumentos de exigibilidade: Administrativos Polticos Quase judiciais Judiciais Vamos ver alguns exemplos... Exigibilidade administrativa: A exigibilidade administrativa a possibilidade de exigir, junto aos organismos pblicos, diretamente responsveis pela garantia do DHAA (postos de sade, INCRA, escola, etc.), a promoo desse direito, bem como a preveno, correo ou reparao das ameaas ou violaes ao mesmo. Para a efetivao da exigibilidade administrativa fundamental que as instituies pblicas e os programas tenham previstas rotinas e procedimentos acessveis e de conhecimento pblico, explicitando quem so os titulares de direito e que organismos so responsveis pelo cumprimento das obrigaes. Alguns rgos pblicos tm procedimentos prprios para analisar recursos administrativos. Veja alguns exemplos: Para exigir determinados direitos, como, por exemplo, o Benefcio da Prestao Continuada (BPC), preciso ir a um posto ou agncia da Previdncia Social (INSS) e fazer esta requisio. Caso o pedido seja negado, possvel exigir de rgos superiores dessa instituio uma nova anlise. Outro exemplo de exigibilidade administrativa: A alimentao escolar de qualidade um direito humano assegurado na Constituio Federal de 1988 e no Pacto Internacional de Direitos Econmicos, Sociais e Culturais. Assim, dentre as diferentes dimenses do Direito Humano Alimentao Escolar, todo aluno tem, por exemplo, o Direito Humano Alimentao Adequada durante seu perodo na escola, durante todos os dias letivos. Caso haja violao a esse direito, o estudante, seu pai ou responsvel, por exemplo, pode apresentar uma denncia de violao na prpria escola, que tem a obrigao de receb-la, investig-la e resolver o problema ou reparar a violao, se for da esfera de sua competncia. Se a competncia para a soluo ou reparao da violao no couber escola diretamente, ela tem a obrigao de encaminh-la para o rgo ou instituio competente ou esclarecer ao titular, interessado ou defensor de direitos os passos a serem dados para isso. importante ressaltar, contudo, que em hiptese alguma a escola pode negar-se a receber a denncia ou no encaminhar a sua soluo. Se o agente pblico no fizer isso, estar cometendo mais uma violao de direitos. Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos. 7

Exigibilidade poltica: A exigibilidade poltica a possibilidade de exigir o respeito, a proteo, a promoo e o provimento de direitos junto aos organismos de gesto de programas e polticas pblicas (Poder Executivo); junto aos organismos de gesto compartilhada responsveis pela proposio e fiscalizao de polticas e programas pblicos (Conselhos de Polticas Pblicas); junto aos Conselhos de Direitos Humanos; ou junto aos representantes do Poder Legislativo. A exigibilidade poltica , portanto, a capacidade de exigir que os agentes polticos faam as escolhas mais eficazes e diligentes, contemplando a participao social e outros princpios, para a garantia dos direitos humanos. Reclamando junto ao Legislativo: Junto ao Poder Legislativo e aos seus membros possvel exigir que sejam elaboradas as leis necessrias para a realizao dos direitos humanos e que deixem de criar leis que possam ser obstculos para a realizao dos mesmos. Tambm compete, por fora constitucional ao Poder Legislativo, o acompanhamento de programas e aes executados pelo Poder Executivo, bem como a sua fiscalizao oramentria. Portanto, sempre que necessrio, possvel exigir que o Legislativo faa uso desta competncia para averiguar possveis irregularidades ou violao de direitos por parte da Administrao Pblica Federal para preveni-los, corrigi-los ou repar-los. A Constituio Federal prev os casos em que o Poder Legislativo Federal pode realizar esse controle e as constituies estaduais tambm podem prever alguns casos para o Poder Legislativo estadual, desde que no ultrapassem as hipteses que esto estabelecidas na Constituio Federal. Os instrumentos e mecanismos disponveis pelo Legislativo que podem ser usados para exigibilidade de direitos sero abordados no Mdulo 4. Veja alguns exemplos de exigibilidade poltica: Os moradores de um assentamento apresentam denncia Secretaria Municipal de Sade que crianas esto ficando desnutridas devido a freqentes episdios de diarria causados por gua contaminada. Pais e alunos de uma determinada escola apresentam reclamao junto Secretaria da Escola, Secretaria Municipal de Educao ou ao Conselho Municipal de Alimentao Escolar sobre o no recebimento regular da alimentao na escola ou sobre a qualidade da alimentao ofertada. Uma comunidade reclama junto ao Programa de Sade da Famlia porque as gestantes da mesma no tm tido acesso a orientaes no perodo pr-natal. Moradores de uma comunidade que se organizam e cobram junto Secretaria de Sade Municipal diretamente, ou por meio do Conselho Municipal de Sade, a Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos.

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seleo para a contratao de agentes comunitrios de sade ou a construo de uma unidade de sade. Ao receber informaes sobre o Programa de Aquisio de Alimentos (PAA), as lideranas de uma comunidade, com o apoio de organizaes no-governamentais defensoras de direitos humanos, apresentam ao CONSEA Estadual uma denncia reclamando a no incluso da comunidade no programa. Denncias relativas s violaes do DHAA dos povos indgenas, devido a falta de polticas que garantam a sustentabilidade desses povos, so apresentadas para a Comisso Especial de Monitoramento de Violaes do DHAA, instncia criada em maio de 2005 no mbito do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDDPH) da Secretaria Especial de Direitos Humanos. A presso exercida por determinadas entidades da sociedade civil para a criao, a revogao ou a regulamentao de leis. Cobrana que as Comisses de Direitos Humanos do legislativo investiguem denncias de violaes do DHAA. Vale destacar que nos trs nveis de poder e nas diversas esferas de administrao pblica, geralmente existem ouvidorias ou corregedorias para que sejam feitas denncias contra os agentes da prpria instituio. fundamental fazer uso desses mecanismos e exigir uma atuao eficaz das mesmas para a garantia dos direitos humanos. Exigibilidade quase judicial: Os membros do Ministrio Pblico, antes de exigirem direitos perante o Poder Judicirio, podem usar instrumentos quase-judiciais, para averiguar violaes de direitos e para fazer com que os agentes pblicos adequem suas aes s normas que prevem direitos humanos. Exemplos desses instrumentos de exigibilidade quase judiciais so o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e o inqurito civil. O inqurito civil consiste na instaurao de um procedimento de investigao de denncias sobre violaes de direitos. Esses inquritos podem levar emisso de recomendaes ao poder pblico ou elaborao de TACs - Termo de Ajustamento de Conduta, quando necessrio. O inqurito civil um procedimento administrativo e, por essa razo, extrajudicial e pr-processual, que visa reunio de provas ou outros elementos que possam fundamentar a atuao do Ministrio Pblico, para, por exemplo, promover aes perante o Poder Judicirio. O propsito do TAC fazer com que as autoridades pblicas firmem documento onde se comprometam em ajustar sua conduta aos preceitos legais, dentro de um perodo estipulado. Para elaborao e firmamento do TAC, geralmente necessrio que sejam dados alguns passos:

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1) o Ministrio Pblico pode colecionar informaes, documentos comprobatrios das violaes e, ainda, promover reunies com os interessados: de um lado, a populao titular do direito que est sendo violado ou ameaado de leso por ao ou omisso do Estado e, de outro lado, os responsveis pela superao da ameaa ou da leso de direitos; 2) O Ministrio Pblico, a partir da realidade de cada caso, pode elaborar uma proposta de termo para ser firmado pelas partes envolvidas; 3) importante que o TAC seja firmado em uma Audincia Pblica. Nessa ocasio, as demandas de uma comunidade so apresentadas e discutidas com os integrantes do Ministrio Publico e autoridades pblicas presentes, e, como resultado desse encontro, pode ser firmado o TAC. O TAC pode ser utilizado como um instrumento de monitoramento e, caso os compromissos no venham a ser cumpridos, o Ministrio Pblico pode requerer, perante o Poder Judicirio, a responsabilizao administrativa, civil e penal da autoridade que no observar o que foi nele acordado. Exigibilidade quase judicial, portanto, exercida atravs do uso de instrumentos no judiciais, mas que, em ltima instancia, podem embasar a proposio de ao judicial. importante, ressaltar, porm, que o uso do TAC e a instituio de inqurito civil nem sempre provocam a abertura de uma ao perante o Poder Judicirio, pois, esse poder s ser acionado se atravs do inqurito forem apuradas violaes de direitos ou se os TACs forem descumpridos. Exigibilidade Judicial: A exigibilidade judicial a possibilidade de exigir o respeito, a proteo, a promoo e o provimento de direitos junto ao Poder Judicirio. No Brasil, a cobrana de direitos junto ao Judicirio, pode ser realizada mediante diferentes instrumentos formais como a ao civil pblica, as aes populares, etc. Como explicado no mdulo 2 apesar de a Constituio Federal no explicitar textualmente o direito alimentao no rol dos direitos sociais previstos em seu artigo 6, esse direito encontra-se implcito nos princpios e em vrios dispositivos constitucionais. Por exemplo, direito a um salrio mnimo, reforma agrria, assistncia social, educao, alimentao escolar, no discriminao e o direito vida. Alm disso, como j afirmado, o Brasil incorporou os mais importantes tratados de direitos humanos, que prevem todos esses direitos. Caso o Poder Judicirio no resolva situaes de violaes de direitos humanos, possvel recorrer aos Sistemas Internacionais de Proteo de Direitos Humanos. Exemplo: Ao Civil Pblica que exige a realizao do DHAA: Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos. 10

Um exemplo de exigibilidade judicial foi a Ao Civil Pblica, interposta pelo Ministrio Pblico, atravs das Promotorias de Justia da Infncia e da Juventude e do Ministrio Pblico do Trabalho de Alagoas contra o Municpio de Macei, pela leso aos direitos difusos e coletivos das crianas e adolescentes residentes na Orla Lagunar de Macei que vivem notoriamente abaixo da linha da pobreza e enfrentam uma srie de dificuldades para exercer seus direitos humanos mais fundamentais, como o de se alimentar. A Ao baseou-se nos dados fornecidos pelo diagnstico realizado pela Ao Brasileira pela Nutrio e Direitos Humanos - ABRANDH, que aplicou questionrios na comunidade Sururu de Capote com objetivo de estudar a situao de insegurana alimentar da referida comunidade. Os dados nutricionais apresentados apontaram que no h polticas pblicas de alimentao, sade, educao, trabalho e lazer que atendam s crianas e adolescentes da comunidade, notadamente diante de seus problemas mais severos: desnutrio, explorao sexual, verminose e dependncia qumica. Diante do quadro de violao dos direitos humanos, decorrente da condio scioeconmica da populao e do no acesso s polticas pblicas sociais, e com base nos tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Estado Brasileiro, na Constituio Federal de 1988 e no Estatuto da Criana e do Adolescente, a Ao visa fazer com que o Municpio de Macei use todos os meios necessrios para a elaborao e implementao imediata de polticas pblicas que efetivem os direitos violados pela sua omisso. Para tanto, a Ao requer que o Municpio apresente propostas de polticas pblicas a serem implementadas com abrangncia suficiente e apresentando solues de curto, mdio e longo prazo para a referida populao, alm de requerer que sejam includas no projeto de lei oramentria de 2008 as verbas necessrias para implementao das polticas pblicas. Caso o Poder Judicirio julgue procedente a Ao Civil Pblica, dever tambm o Municpio de Macei formar uma comisso multidisciplinar de profissionais para realizar um perfil scio-econmico das crianas e adolescentes da comunidade da Orla Lagunar; garantir condies adequadas para o funcionamento do Conselho Tutelar da Regio; apresentar um cronograma de curto prazo de ampliao da rede de proteo criana e ao adolescente, com a abertura de abrigos para crianas e adolescentes em situao de risco; garantir creche em horrio integral e educao infantil, em quantidade suficiente a atender populao de 0 a 6 anos da referida comunidade bem como assegurar as matrculas de todas as crianas e adolescentes em idade escolar no ensino fundamental.

AULA 3: COBRANA DE DIREITOS EM MBITO INTERNACIONAL Nos casos em que no haja reparao em nvel nacional, ou que a mesma demore a ser prestada, um indivduo pode recorrer a um mecanismo internacional de exigibilidade de direitos humanos.

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Em caso de violaes de Direitos Civis e Polticos possvel apresentar uma petio individual para rgos internacionais de direitos humanos. O PIDESC, porm, ainda no prev mecanismos de reclamao individuais em caso de violao aos direitos previstos no Pacto. O Comit DESC da ONU, enquanto organismo que tem a funo de monitorar a implementao dos direitos previstos no PIDESC, est encarregado apenas de examinar relatrios peridicos elaborados pelos Estados Partes do Pacto, no que se refere a como os direitos esto sendo implementados em nvel nacional. Algumas disposies do PIDESC, inclusive o artigo 11, entretanto, foram objeto de litgio perante a Corte Internacional de Justia, que o rgo judicirio mximo no direito internacional. Os Relatrios dos Estados Partes so analisados pelo Comit na presena desses Estados. O Comit faz as suas consideraes aos relatrios dos Estados Parte emitindo observaes finais, que constituem a deciso do Comit sobre a implementao do PIDESC em um determinado Estado Parte. Embora as observaes finais do Comit no tenham status legalmente vinculante, para os Estados Partes ignorar ou no agir em relao s consideraes do Comit significa uma demonstrao de m-f na implementao de suas obrigaes relacionadas ao Pacto. Na ltima reunio do Conselho de Direitos Humanos em junho de 2006, os Estados membros concordaram em renovar o mandato do grupo de trabalho que vem discutindo a elaborao de um Protocolo Adicional ao PIDESC, que conferiria ao Comit competncia para examinar reclamaes individuais. Veja as observaes do Comit relativas aos Relatrios do Brasil sobre cumprimento do PIDESC. No nvel regional, a Comisso Africana de Direitos Humanos e a Comisso Interamericana de Direitos Humanos tratam do Direito Humano Alimentao Adequada: Comisso Africana de Direitos Humanos A Comisso Africana de Direitos Humanos, recentemente, analisou um caso de violao ao Direito Humano Alimentao Adequada. No caso SERAC vs. Nigria (tambm chamado de caso Ogoni), a Comisso decidiu que, ao participar da destruio das fontes de alimentos do povo Ogoni e abster-se de proteg-lo das atividades nocivas das empresas de petrleo que operavam no Delta do Nger, o Governo nigeriano havia violado todos os 4 nveis de obrigaes mnimas relacionadas ao Direito Humano Alimentao Adequada. Embora o Direito Humano Alimentao Adequada no seja garantido como tal pela Carta Africana, a Comisso o considerou irreversivelmente ligado dignidade dos seres humanos e, portanto, essencial para a fruio de outros direitos tais como o direito vida, o direito sade, educao e ao trabalho. Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos. 12

Comisso Interamericana de Direitos Humanos No Continente Americano, a Declarao Americana dos Direitos e Deveres do Homem, de 1948, reconhece o direito de todas as pessoas preservao da sade e ao bem-estar, por meio de... medidas sociais relativas alimentao... (artigo XI). No recente caso comunidades indgenas Maya do Distrito de Toledo vs. Belize, referente a concesses para extrao de madeira e petrleo em terras tradicionalmente ocupadas e utilizadas pelo povo Maya em Belize, a Comisso Interamericana de Direitos Humanos aludiu ao caso Ogoni da Comisso Africana de Direitos Humanos e reconheceu os aspectos alimentares e socioeconmicos relacionados ao direito propriedade garantido pela Declarao Americana. A Comisso observou que o dano ambiental causado pela extrao de madeira havia debilitado as fontes de alimentos dos Maya e ameaava contaminar solos e guas, enfatizando que o desenvolvimento de atividades deveria ser acompanhado de medidas apropriadas e eficazes para assegurar que essas atividades no fossem praticadas sem o devido respeito aos direitos fundamentais das pessoas que pudessem ser negativamente afetadas inclusive comunidades indgenas e o meio ambiente do qual essas pessoas dependem para o seu bem estar fsico, cultural e espiritual. A Comisso considerou, ainda, que o fato de o Estado no haver consultado o povo Maya em relao s concesses em questo no Distrito de Toledo e os efeitos ambientais negativos decorrentes dessas concesses, constituem violaes de vrios outros direitos no mbito da lei internacional de direitos humanos, inclusive o direito vida e o direito preservao da sade e do bem estar garantidos pela Declarao Americana dos Direitos e Deveres do Homem. Em nvel mundial, dois mecanismos de exigibilidade podem ser utilizados para a garantia do DHAA: Comit de Direitos Humanos O Comit de Direitos Humanos da ONU competente, no mbito do Protocolo Opcional ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Polticos, para receber e examinar comunicaes de indivduos que alegam ser vtimas de violao, por um Estado Parte do Protocolo Opcional, de quaisquer dos direitos preconizados no Pacto, desde que determinados requisitos sejam atendidos. O Comit de Direitos Humanos poderia considerar o Direito Humano Alimentao Adequada com base em uma interpretao abrangente do direito vida, ou na clusula de no discriminao garantida pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Polticos.

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Comit para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao contra a Mulher Em conformidade com o Protocolo Opcional Conveno sobre a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao contra a Mulher, o Comit para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao contra a Mulher est encarregado de examinar reclamaes de indivduos ou grupos sobre violaes dos direitos garantidos pela Conveno, desde que determinados requisitos sejam atendidos. O Protocolo contempla dois procedimentos: 1) Primeiro, um procedimento de comunicao que permite s mulheres, individualmente ou em grupo, submeter ao Comit alegaes de violaes de direitos protegidos pela Conveno. 2) Segundo, o Protocolo tambm cria um procedimento de investigao que permite ao Comit investigar situaes de violaes graves ou sistemticas aos direitos da mulher. Em ambos os casos, os Estados devem ser signatrios da Conveno e do Protocolo. O Protocolo Opcional entrou em vigor em 2000 para 79 Estados Partes. Um caso de violao ao Direito Humano Alimentao Adequada poderia ser submetido ao Comit para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao contra a Mulher, com base nas disposies sobre proteo especial a mulheres grvidas, ou no que se refere ao acesso a terra e a servios para mulheres rurais.

AULA 4: FORTALECIMENTO DA EXIGIBILIDADE Para o fortalecimento da exigibilidade administrativa, poltica, quase judicial e judicial: 1. As pessoas precisam saber que tm direitos. 2. Responsveis precisam saber que tm obrigaes. 3. necessrio que sejam estabelecidas rotinas e instrumentos pblicos de exigibilidade, de conhecimento de todos, de fcil acesso e o mais prximo possvel das comunidades. Os trs passos essenciais para o fortalecimento da exigibilidade Trs passos so fundamentais para a construo e fortalecimento da exigibilidade de direitos humanos. So eles:

1. As pessoas precisam saber que tm direito Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos. 14

Para que a realizao do DHAA e demais direitos humanos seja realmente efetiva fundamental garantir que os seus titulares tenham acesso a informaes acerca dos seus direitos, sobre os mecanismos de exigibilidade disponveis e que se apoderem desses instrumentos para cobr-los. Tambm existe a necessidade de fortalecer e capacitar os movimentos sociais, Conselhos, Ministrio Pblico, Ouvidorias para que eles sirvam de multiplicadores no processo de divulgao da existncia de direitos humanos e para que possam apoiar os grupos excludos em aes de exigibilidade de direitos e superao de violaes. No mdulo 5 ser abordada, com maior detalhe, a importncia do apoderamento no processo de exigibilidade dos direitos humanos. 2. Responsveis precisam saber que tm obrigaes No Brasil, a responsabilizao pela violao de direitos certamente um enorme desafio. A falta de termos de referncias com definio de obrigaes claras e bem definidas em relao realizao dos direitos humanos, os casos de corrupo no Legislativo, Executivo e Judicirio e o clima de impunidade so ainda uma forte realidade que certamente constitui-se em um grande obstculo para a realizao do DHAA. A identificao dos portadores de obrigaes para o cumprimento dos direitos humanos (no Poder Legislativo, Judicirio e Executivo e nas diferentes esferas de governo) torna-se necessria, bem como determinar claramente as suas obrigaes e avaliar o desempenho dos atores responsveis por sua realizao. O que se observa, na prtica, que a grande maioria dos agentes pblicos brasileiros desconhece suas obrigaes enquanto agentes do Estado e desconhece os direitos humanos como verdadeiros direitos que podem ser exigidos, seja de forma administrativa, poltica, quase judicial ou judicial. Como os Estados so os maiores responsveis pela realizao dos direitos humanos, acabam por ser tambm os maiores violadores desses direitos. Portanto, grande nfase e investimentos concretos devem ser aplicados para a responsabilizao - administrativa, civil e penal - dos agentes pblicos, cujas aes tm um impacto nos direitos das pessoas. Arranjos e instrumentos legais e administrativos que visem a assegurar a responsabilizao de autoridades competentes devem ser implementadas pelos Estados. No mdulo 6 ser explicada com maior detalhamento a importncia da formao/capacitao e construo de competncias continuadas no que se refere ao DHAA.

3. Necessidade de estabelecimento de rotinas e instrumentos pblicos, que devem ser divulgados amplamente, que sejam de fcil acesso e estejam sempre o mais prximo possvel das comunidades. Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos. 15

tambm obrigao do Estado brasileiro criar instrumentos e rotinas que venham a permitir a apresentao de denncias por pessoas ou grupos que se sintam violados em seus direitos e/ou que no se sintam adequadamente contemplados por programas e polticas pblicas. Essa obrigao, prevista nos instrumentos internacionais de direitos humanos, reforada atravs do pargrafo 2, art. 2 da Lei Orgnica de Segurana Alimentar e Nutricional - LOSAN. Realizar direitos humanos vai alm de reconhec-los no discurso, ou mesmo no texto de leis e polticas. Faz-lo implica que o Estado, por meio de aes concretas, cumpra suas obrigaes legais, promovendo a elaborao, implementao e monitoramento de polticas pblicas sob a perspectiva do DHAA, no contexto da indivisibilidade dos direitos humanos. O monitoramento da realizao dos DHESC, em mbito local, estadual e nacional, exige a elaborao de planos de trabalho detalhados, incluindo a especificao dos recursos a serem alocados, bem como de metas, indicadores, marcos, objetivos e prazos relacionados realizao das dimenses especficas do DHAA. A existncia desses planos de trabalho com previso de instrumentos de recursos em caso de violaes se constituiria em uma ferramenta valiosa para a garantia efetiva da exigibilidade administrativa e, portanto, para a realizao dos direitos humanos. Os instrumentos de exigibilidade, quando apoderados pelos titulares de direitos e bem utilizados, podem ser potentes instrumentos para a superao dos quadros de violaes do DHAA de indivduos, comunidades e grupos sociais afetados pela alimentao inadequada e tambm pela fome e pela pobreza. Eles podem ser instrumentos: De fortalecimento das aes de reivindicao, mobilizao e luta da populao; Concretos para que a sociedade e os conselhos de controle social monitorem as responsabilidades e as obrigaes dos agentes pblicos em diferentes instncias e nveis (Judicirio, Executivo, Legislativo, em mbito local, estadual e federal), responsabilizando-os quando identificadas aes e/ou omisses que resultem em violaes de direitos. Um exemplo de construo de rotinas e procedimentos de exigibilidade: Em 2005, a ABRANDH desenvolveu um trabalho com tcnicos do Programa Nacional de Alimentao Escolar - PNAE no sentido da construo de propostas de rotinas de implementao e monitoramento do programa que incorporassem a promoo do DHAA de forma efetiva em todas as fases de operacionalizao. O trabalho teve as seguintes etapas: Anlise de toda a legislao que regulamenta a implementao do programa, desde as provises constitucionais at as normas de operacionalizao do programa, incluindo Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos. 16

tambm uma avaliao do marco legal internacional de DH, em especial o DHAA (Direitos, Obrigaes e Responsabilidades no mbito do PNAE). Identificao das instituies e gestores pblicos responsveis pelas obrigaes relativas garantia destas diferentes dimenses do DHAA. Anlise do processo de operacionalizao do PNAE, com a identificao das diferentes dimenses do DHAA da criana na idade escolar, levando ao estabelecimento de 16 dimenses deste direito (16 dimenses do Direito Humano Alimentao Escolar). Estabelecimento de rotinas e procedimentos de recepo, anlise e resposta a denncias apresentadas por escolares, pais ou outras pessoas que identificam possveis violaes a alguma das dimenses do DHAA (Rotinas e procedimentos de recepo, anlise e resposta a denncias). Veja, a partir do exemplo abaixo, como o uso deste procedimento de exigibilidade, caso implantado, poderia colaborar para a superao das violaes e melhoria do funcionamento do programa: Em uma escola no interior do Estado do Maranho, os pais de Joo, estudante da 2 srie primria, tm conhecimento que os alimentos da escola de seu filho esto sendo preparados sem proteo contra insetos e roedores. Ratos foram vistos pelas crianas e tambm por alguns pais inclusive no local de preparao das refeies. Tendo conhecimento das 16 dimenses do Direito Humano Alimentao Escolar, atravs de um cartaz fixado no mural da escola, os pais de Joo sabem que, pelo menos uma das dimenses do Direito Humano Alimentao Escolar das crianas da escola est sendo violada: Que os alimentos sejam preparados em condies adequadas de higiene, protegidos contra insetos, roedores e outros contaminantes, preservando a qualidade dos alimentos. Os pais de Joo tambm sabem, pela informao contida no cartaz, e por informaes obtidas em folheto sobre o programa, que eles podem: 1) apresentar reclamao junto secretaria da escola, que deveria encaminhar uma soluo para o problema dentro de prazo razovel; 2) caso a direo da escola no resolva o problema, a famlia pode apresentar queixa ao Conselho de Alimentao Escolar (CAE) e Secretaria Municipal de Educao; e 3) finalmente, caso no haja resposta nem do CAE nem da Secretaria de Educao, uma reclamao pode ser encaminhada ao Ministrio Pblico Estadual e ao FNDE. Dando seqncia ao trabalho elaborado no mbito do PNAE, a gerncia nacional do programa comprometeu-se a estudar a possibilidade de adaptar estes materiais e com base nos mesmos, elaborar materiais de informao e capacitao para aplicao nos municpios-piloto, nas regies Norte e Nordeste. Vale ressaltar que esse material ainda um exemplo de como a realizao do DHAA pode ser garantida e protegida por meio do apoderamento dos titulares de direitos e criao de competncias em DHAA aos portadores de obrigaes. Caso venha a ser implementado esse trabalho se constituir em uma primeira tentativa de se colocar em Os direitos de uso deste material pertencem ABRANDH. permitida sua reproduo integral ou parcial, desde que citada a fonte; preservado o contedo e no tenha fins lucrativos. 17

prtica a implementao de um programa pblico dentro da perspectiva da exigibilidade do DHAA. Vale destacar tambm que o resultado desse trabalho foi incorporado nas recomendaes ao PNAE elaboradas pela Comisso Permanente de Direito Humano Alimentao Adequada do CONSEA, quando da anlise do PNAE sob a perspectiva do DHAA. O trabalho realizado pela Comisso Permanente de DHAA do CONSEA ser explicado no mdulo 4, bem como o trabalho das demais instituies e instrumentos de defesa e exigibilidade dos direitos humanos. O ideal que todos os programas e polticas pblicas relacionados SAN e ao DHAA cheguem a um grau de detalhamento semelhante, ou seja, que haja elaborao de rotinas e procedimentos de implementao e exigibilidade do DHAA. O objetivo desse tipo de anlise criar instrumentos acessveis de exigibilidade para que as aes e servios providos pelos programas e polticas passem a ser de fato entendidos como direitos humanos passveis de serem exigidos.

AULA 5: RESUMO Os obstculos e desafios para a realizao do DHAA e demais direitos humanos no Brasil so inmeros e bastante complexos. Eles pressupem mudana na legislao, na regulamentao e operacionalizao de leis e normas existentes, nos processos, nas formas de planejar e executar aes, programas e polticas e, mais do que tudo, na cultura institucional que regem as aes e atribuies do Estado e de seus servidores nas suas relaes com os titulares de direitos. A construo de uma sociedade mais justa e igualitria e o fortalecimento da capacidade de exigir e cobrar a realizao de direitos humanos requer uma verdadeira revoluo cultural dentro da sociedade e da estrutura administrativa do Estado. Se os cidados, os agentes pblicos e a sociedade civil estiverem adequadamente informados sobre seus direitos e obrigaes, e souberem aonde ir e o que fazer quando sentir que seus direitos esto sendo violados, mais fcil ser cobrar a responsabilidade do Estado e do servio pblico por seus atos e omisses. Por outro lado, se os mecanismos para a garantia desses direitos forem acessveis e amplamente divulgados, mais a populao se sentir apoderada, legitimada e segura para buscar a realizao dos mesmos. Existem diversos instrumentos para exigibilidade de direitos. Na prtica, o exerccio de utilizao de qualquer um destes instrumentos, e a proposio de criao de novos que se faam necessrios para exigir direitos, o que denominamos de exigibilidade. No caso de violao de um direito humano, um indivduo pode exigir o exerccio desse direito nos nveis nacional e internacional.

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Em nvel nacional, os titulares de direitos devem ter a possibilidade de exigir a realizao de seus direitos e reclamar sobre a existncia de violaes ao DHAA por meio de instrumentos de exigibilidade: Administrativos: A exigibilidade administrativa a possibilidade de exigir, junto aos organismos pblicos, diretamente responsveis pela garantia do DHAA (postos de sade, INCRA, escola, etc.), a promoo desse direito, bem como a preveno, correo ou reparao das ameaas ou violaes ao mesmo. Polticos: A exigibilidade poltica a capacidade de exigir que os agentes polticos faam as escolhas mais eficazes e diligentes, contemplando a participao social e outros princpios, para a garantia dos direitos humanos. Quase judiciais: A exigibilidade quase judicial exercida atravs do uso de instrumentos no judiciais, mas que, em ltima instancia, podem embasar a proposio de ao judicial. Judiciais: A exigibilidade judicial a possibilidade de exigir o respeito, a proteo, a promoo e o provimento de direitos junto ao Poder Judicirio. Nos casos em que no haja reparao em nvel nacional, ou que a mesma demore a ser prestada, um indivduo pode recorrer a um mecanismo internacional de exigibilidade de direitos humanos. Para o fortalecimento da exigibilidade administrativa, poltica, quase judicial e judicial: As pessoas precisam saber que tm direitos. Responsveis precisam saber que tm obrigaes. necessrio que sejam estabelecidas rotinas e instrumentos pblicos de exigibilidade, de conhecimento de todos, de fcil acesso e o mais prximo possvel das comunidades.

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