Direito Comercial - Casos Práticos

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DIREITO COMERCIAL CASOS PRÁTICOS FDUCP Maria Luísa Lobo 2012/2013 Página 1 RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS PROFESSOR FRANCISCO BARONA CASO 1 António tem uma empresa que se dedica à instalação de painéis solares e conseguiu obter a representação de uma importante fábrica nacional, através de contrato que assinou recentemente. Para poder responder cabalmente às exigências do novo contrato, encomendou a feitura da página de internet da sua empresa a Bernardo, tomou de arrendamento uma loja e contraiu junto de um Banco um financiamento de curto prazo, tendo para o efeito subscrito uma livrança. Como qualificaria o contrato celebrado entre António e a empresa fabricante? No presente caso estamos face a uma situação em que António se dedica à instalação de painéis solares e que recentemente conseguir obter a representação de uma importante fábrica nacional através da celebração de um contrato. De acordo com estes dados estamos face a um contrato de distribuição que se caracteriza pelo facto de disciplinar as relações jurídicas entre o produtor e o distribuidor ‘’lato sensu’’ com vista à comercialização dos bens e serviços do primeiro. Importa salientar que a distribuição comercial pode assentar em duas modalidades: Por um lado, pode ser uma distribuição comercial directa, ou seja é o produtor que se encarrega da colação dos seus próprios produtos no mercado. Por outro lado, pode ser uma distribuição comercial indirecta, sendo que nesta ocorre a concentração exclusivamente na função produtiva e a renúncia à tarefa de comercialização, confiando esta a empresários ou intermediários autónomos especializados. Esta modalidade de distribuição pode ainda assumir duas formas: CONTRATOS COMERCIAIS

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RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS – PROFESSOR FRANCISCO BARONA

CASO 1

António tem uma empresa que se dedica à instalação de painéis solares e conseguiu

obter a representação de uma importante fábrica nacional, através de contrato que

assinou recentemente. Para poder responder cabalmente às exigências do novo

contrato, encomendou a feitura da página de internet da sua empresa a Bernardo,

tomou de arrendamento uma loja e contraiu junto de um Banco um financiamento de

curto prazo, tendo para o efeito subscrito uma livrança. Como qualificaria o contrato

celebrado entre António e a empresa fabricante?

No presente caso estamos face a uma situação em que António se dedica à

instalação de painéis solares e que recentemente conseguir obter a representação de

uma importante fábrica nacional através da celebração de um contrato.

De acordo com estes dados estamos face a um contrato de distribuição que se

caracteriza pelo facto de disciplinar as relações jurídicas entre o produtor e o

distribuidor ‘’lato sensu’’ com vista à comercialização dos bens e serviços do primeiro.

Importa salientar que a distribuição comercial pode assentar em duas modalidades:

Por um lado, pode ser uma distribuição comercial directa, ou seja é o produtor

que se encarrega da colação dos seus próprios produtos no mercado.

Por outro lado, pode ser uma distribuição comercial indirecta, sendo que nesta

ocorre a concentração exclusivamente na função produtiva e a renúncia à

tarefa de comercialização, confiando esta a empresários ou intermediários

autónomos especializados. Esta modalidade de distribuição pode ainda

assumir duas formas:

CONTRATOS COMERCIAIS

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Simples, que se caracteriza pela ausência de coordenação entre a

produção e a distribuição, concedendo o produtor uma grande

autonomia aos seus distribuidores no exercício da respectiva actividade

empresarial distributiva

Integrada, em que existe a coordenação entre a produção e a

distribuição, sendo que o distribuidor surge aos olhos do público como

um empresário integrado no âmbito da estratégia e da rede de

distribuição concebida pelo produtor pelo que se sujeita, em maior ou

menor grau, às orientações e fiscalizações genéricas deste último. Este

caso de distribuição comercial indirecta integrada consubstancia os

casos dos agentes, concessionários e franquiados ou distribuidores

selectivos.

No presente caso, António através da instalação dos painéis solares irá distribuir tais

pelo que existe um contrato de distribuição em que a Fábrica é a produtora dos

referidos e António o distribuidor.

Verificado que estamos face a um contrato de distribuição é necessário verificar entre

os contratos de distribuição estudados nesta disciplina aquele que se aplica ao caso

concreto. Como contratos de distribuição podemos estar face a um contrato de

agência, a um contrato de concessão comercial e um contrato de franquia.

CONTRATO DE AGÊNCIA

Elementos Essenciais

Elementos Não Essenciais

Promoção da Celebração do Contrato

Actuação por Conta e no Interesse do

Principal

Estabilidade

Autonomia

Onerosidade

Atribuição ao Agente de Certa Zona ou

Determinado Círculo de Clientes

Exclusividade Recíproca da Relação de

Agência

CONTRATO DE CONCESSÃO COMERCIAL

Obrigação de Venda e de Compra par Revenda

Actuação do Concessionário em Nome e por Conta Própria

Autonomia

Estabilidade

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CONTRATO DE FRANQUIA

Elementos Essenciais

Elementos Não Essenciais

Fruição da Imagem Empresarial do

Franquiador

Transmissão do Know-How e Assistência

Técnica

Controlo e Fiscalização do Franquiado

Onerosidade

Cláusula de Exclusividade

Aquisição de Stocks Mínimos

Assistência Financeira e Contabilística

Cláusula de Não Concorrência

No presente caso, António adquire os painéis através de uma fábrica nacional sendo

que posteriormente os irá instalar. Ora tal exclui a possibilidade de estarmos face a um

contrato de concessão comercial uma vez que não se verifica a característica deste

que assenta na obrigação de venda (do concedente ao concessionário) e de

compra para revenda (do concessionário a terceiros). Quanto António instala os

painéis solares não está a revende-los.

No presente caso, António encomendou a feitura da página de internet da sua

empresa a Bernardo. Ora aqui se exclui a possibilidade de estarmos face a um

contrato de franquia uma vez que não se verifica a atribuição ao franquiado do

privilégio de fruição da imagem empresarial do franquiador, ou seja não foi

concedido nenhum direito de utilizar a marca da fábrica ou qualquer direito privativo

de propriedade industrial (logótipos, modelos publicitários, etc.). O Contrato de

Franquia constitui um veículo negocial sobre o qual assenta a criação e organização

distributiva do franquiador no mercado, uma vez que a unidade da imagem

empresarial externa do franquiado e do franquiador, aos olhos do público, é um

pressuposto da integração do primeiro nessa rede. Tal unidade não existe no caso:

uma coisa é a fábrica nacional que produz os painéis solares, outra é a empresa de

António que instala tais painéis.

Deste modo, parte-se do princípio que se estará face a um contrato de agência. Nos

termos do art. 2º do Diploma Legal que regula o Contrato de Agência (DL 178/86, de 3

de Julho) o agente, por força de disposição contratual expressa, está autorizado a

celebrar contratos na qualidade de representante do principal. É exactamente o que

sucede neste caso: António representa a fabrica nacional.

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CASO 2

Responda às questões seguintes:

a) Pode haver indemnização de clientela nos contratos de concessão e de

franquia? Justifique.

Nos termos do art. 33º do DL 178/86, de 3 de Julho, a indemnização de clientela

consiste numa indemnização devida pelo principal ao agente, cumulável com outras

indemnizações a que haja direito (indemnização por denúncia sem aviso prévio ou

sem pré aviso suficiente; indemnização por incumprimento), que assenta no facto de,

cessando o contrato de agência, ser justo compensar o agente pelo enriquecimento

assim proporcionado à outra parte desde que observados os seguintes requisitos:

Cessação do contrato de agência

Que o agente tenha angariado novos clientes para a outra parte ou tenha

aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já

existente, desde que tal se deva a um esforço sério por parte do agente

Que o principal venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do

contrato, da actividade desenvolvida pelo agente

Que o agente deixe de receber qualquer retribuição por contratos negociados

ou concluídos após a cessação da agência com os clientes angariados ou

cujos negócios tenham sido aumentados

Importa salientar que a indemnização de clientela não é uma verdadeira

indemnização, porque não visa reparar danos, mas antes uma compensação devida

ao agente, após ter cessado o contrato – desde que não imputável ao agente –

como contrapartida dos benefícios que o principal vai auferir com a clientela

angariada ou aumentada por aquele.

Quanto ao Contrato de Concessão Comercial, a doutrina e a jurisprudência têm

defendido que as normas sobre a indemnização de clientela na agência não têm

aplicação automática a este contrato, havendo sempre que ponderar os requisitos e

a analogia. Ou seja, segundo o Prof. Pinto Monteiro será necessário averiguar, em

cada caso, se a norma que se pretende aplicar permite uma aplicabilidade

analógica, o que implica ponderar se a sua ratio se adequa a um concessionário. Um

dos fundamentos invocados para a aplicabilidade analógica da norma constante do

art. 33º assenta no facto de existir um incremento da clientela, que reverte a favor do

concedente, enquanto o concessionário perde a retribuição que poderia auferir

daquela clientela se o contrato não tivesse terminado.

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Quanto ao Contrato de Franquia, tal consubstancia uma grande querela doutrinal:

Prof. Pinto Monteiro: defende que a indemnização de clientela será aplicável

também aos franquiados sempre que a analogia se verifique. O que importa

começar por averiguar é se em cada caso concreto o franquiado, pese

embora juridicamente actue por conta própria, desempenhou funções,

cumpriu tarefas e prestou serviços semelhantes aos de um agente, em termos

de ele próprio dever considerar-se, pela actividade que exerceu, como um

relevante factor de atracção de clientela. A realidade pode demonstrar, com

efeito, a existência de uma clientela especialmente ligada à pessoa ou aos

serviços do franquiado, apesar de a este serem fornecidas as ferramentas

básicas, o sucesso da empresa depende muito da sua atitude empenhada e

capaz que pode desempenhar papel na angariação de clientela.

Prof. Menezes Cordeiro: defende que a indemnização de clientela não será

aplicada ao contrato de franquia, uma vez que a clientela é angariada pela

marca, para o franquiado, sendo as (des) vantagens que tudo isso acarreta

como integrantes dos riscos próprios do negocio.

Prof. Menezes Leitão: defende que a indemnização de clientela, por principio,

não será aplicada ao contrato de franquia, uma vez que os clientes

angariados pelo franquiado não são na verdade clientes dele, mas antes

clientes gerais do sistema de franquia que nele permanecem apos a extinção

do contrato. Apenas admite a aplicação analógica em certos casos de

franquia de distribuição de produtos, em que o franquiado é obrigado a

adquirir os produtos ao franquiador e pode conquistar para ele uma clientela

própria e desde que se verifique a aquisição da clientela pelo franquiador com

a extinção do contrato.

Deste modo, conclui-se, que quanto ao contrato de franquia, será de exigir ao

franquiado a alegação e prova da sua contribuição determinante para o notório

aumento do negócio e clientela do franquiador e que este venha a beneficiar dessa

melhor qualidade comercial para além do termo do franchising. O aumento e a

fidelização da clientela obtidos à custa da actividade pessoal do franquiado são

factos a apurar caso a caso, cujo ónus de alegação e prova a este incumbe,

NOTA1: quer o concessionário quer o franquiado encontram-se obrigados a informar

quer o concedente quer o franqueador dos clientes angariados

NOTA2: no contrato de agência em regra quem detém a carteira de clientes é o

principal, uma vez que os clientes são clientes deste. Na Concessão e na Franquia os

clientes são clientes do concessionário e do franquiado uma vez que este suportam o

risco do negócio, ao contrário do que sucede na agência em que o risco corre por

conta do principal. Deste modo, tanto o concessionário como franquiado estão na

mesma posição que o principal. É aqui que existe a analogia: existe uma analogia

com a posição do principal. Deste modo se se verificarem os requisitos da

indemnização de clientela tal aplica-se analogicamente ao contrato de concessão

comercial e de franquia.

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b) Refira-se à contratação mitigada no campo comercial e apresente as suas

principais manifestações e consequências.

O Professor não resolveu.

CASO 3

Diana está convicta de ter descoberto a pólvora. Uma pequena pastelaria em Chaves

faz umas deliciosas empadas de perdiz, totalmente desconhecidas em Lisboa. Diana

comprometeu-se perante a Empada Transmontana, Lda (“ET”) a encontrar restaurantes

e pastelarias em Lisboa, assim como boas charcutarias que comprem as deliciosas

empadas. Em contrapartida, a ET partilhará com Diana 10% do valor facturado em

Lisboa. Mal Diana começou a sua actividade, o sucesso foi estrondoso. Ao ponto de,

duas semanas volvidas, a ET deixar de atender os telefonemas de Diana, ou fornecer

dados precisos sobre os transportes de empadas. A ET tinha contratado uma outra

entidade, com mais recursos humanos e técnicos, para conquistar os mercados

nacionais e internacionais e não quer saber mais da nossa amiga. Diana está

desolada. Não formara ainda uma clientela estável para a ET, mas investira muito

nesta nova actividade: um arrendamento no centro de Lisboa, um computador,

cartões de visita, entre outros dispêndios. Menos mal que continua a conduzir o

belíssimo carro que a ET lhe emprestara, para visitar clientes. Quid iuris?

No presente caso estamos no âmbito do Contrato de Agência uma vez que Diana

representa a pastelaria ET através da procura de restaurantes e pastelarias em Lisboa

que comprem as empadas realizadas pela referida pastelaria.

Tendo em consideração que a pastelaria ET deixou de atender os telefonemas a

Diana, após o estrondoso sucesso da referida pastelaria alcançado por esta, e

contratou outra entidade com mais recursos humanos para conquistar os mercados

nacionais e internacionais é necessário averiguar se o contrato de agência cessou.

Nos termos do art. 24º e ss do DL 178/86, de 3 de Julho consagram-se as formas de

cessação do contrato de agência

Acordo das Partes (art. 24º al. a) e art. 25º) – não existe nenhum acordo escrito

assinado por ambas as partes em que elas fazem cessar o contrato de agência

Caducidade (art. 24º al. b) e art. 26º): o presente caso não se insere em

nenhum dos casos geradores de caducidade consagrados nas várias alienas

do art. 26º

Denúncia (art. 24º al. c) e art. 28º): esta consagra um acto unilateral, por

qualquer das partes, onde não necessita de ser invocado qualquer

fundamento, apenas podendo ser admitida em contratos celebrados por

tempo indeterminado (verifica-se, uma vez que a pastelaria ET e Diana nada

convencionaram quanto ao prazo de duração do contrato pelo que se aplica

o regime do art. 27º), desde que exista aviso prévio com respeito pelos prazos

consagrados nas varias alienas do art. 28º/1. Ora, no presente caso não existiu

aviso prévio, até porque o contrato durava apenas há duas semanas, e não

houve nenhuma comunicação por escrita a Diana por parte da pastelaria ET

em que esta fizesse cessar o contrato por denúncia.

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Resolução (art. 24º al. d) e art. 30º e 31º): pode ser de cariz subjectivo (al. a) do

art. 30º) ou de cariz objectivo (al. b) do art. 30º), tendo de ser fundamentada,

contudo é sempre necessário que seja comunicada à contraparte por escrito.

Analisadas as várias formas de cessação do contrato de agência conclui-se que no

presente caso, o contrato celebrado entre a Pastelaria ET e Diana não cessou.

Coloca-se agora a questão de saber o que Diana pode fazer a fim de reagir contra

esta situação, uma vez que existe uma atitude da ET que frusta a actividade de Diana,

nomeadamente através da remuneração, pelo que existe uma violação grave e

reiterada não sendo exigível a Diana que ela continue a actividade, podendo resolver

o mesmo nos termos do art. 30º al. a).

Deste modo, Diana terá direito a uma indemnização nos termos do art. 32º (que é uma

verdadeira indemnização pois visa reparar os danos que Diana sofreu com o não

cumprimento das obrigações por parte da ET).

Poderia questionar-se a possibilidade de Diana ter ainda direito a uma indemnização

de clientela (que não é uma verdadeira indemnização, uma vez que não visa a

reparação de danos, mas sim uma compensação) mas observando os requisitos de

que depende a verificação de tal instituto tais não parecem estar verificados,

nomeadamente porque Diana ainda não tinha angariado uma clientela estável.

No termo do contrato, cada contraente deve restituir os objectos, valores e demais

elementos que pertençam ao outro (neste caso, o carro pertente à ET) nos termos do

art. 36º. O agente goza, todavia, sobre eles, do direito de retenção pelos créditos

resultantes da sua actividade nos termos do art. 35º. Ou seja, enquanto a ET não

indemnizar Diana pelos danos por esta sofridos, Diana gozara de direito de retenção

sobre o carro.

NOTA: o legislador ao consagrar o art. 13º visa garantir a remuneração do agente.

Esta, embora possa ser fixada em alguns casos através de um valor absoluta, a regra é

que a remuneração depende do volume de negócios celebrados em cuja origem na

realização foi causa aquele agente. Trata-se de uma violação que irá comprometer a

continuação do negócio.

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CASO 4

A António Cardoso – Comércio de Vestuário, S.A., celebrou com o Banco Top Crédito,

SA, um contrato, por virtude do qual este último se obrigava a adquirir todos os créditos

de que a António Cardoso – Comércio de Vestuário, S.A. fosse titular sobre os seus 10

principais clientes, no valor total de €1.000.000,00. Para o efeito, o Banco Top Crédito

pagou de imediato €750.000,00. Passados dois meses, o Banco Top Crédito vem exigir

à António Cardoso – Comércio de Vestuário, S.A., o pagamento de €1.000.000,00., com

o argumento de que nenhum dos 10 clientes procedeu ao pagamento dos valores em

dívida. Quid iuris?

O Contrato de Factoring ou de Cessão Financeira constitui um contrato pelo qual uma

das partes (o facturizado) cede ou obriga a ceder à outra parte (o factor) a

totalidade ou parte dos seus créditos comerciais de curto prazo decorrentes dos

contratos já celebrados ou a celebrar com certos terceiros (alguns ou mesmo a

totalidade dos clientes do cedente), para que este ultimo (o factor) os administre e

cobre na data do seu vencimento e eventualmente nos termos fixados nesse negocio

lhe conceda adiantamentos calculados sobre o valor nominal desses créditos e/ou

também garanta o cumprimento ou a solvência dos devedores cedidos. Pelo serviço

de gestão e cobrança dos créditos o facturizado paga uma comissão (comissão de

cobrança), em contrapartida do adiantamento quando concedido, o que é muito

frequente: pagas juros e pela garantia paga igualmente uma comissão (comissão de

garantia) (DL 171/95, de 18 de Julho – art. 2º/1)

Sendo que a transferência de créditos ocorre com a aceitação expressa dos créditos

tal poderá assumir diversas modalidades, nomeadamente entre o contrato de

factoring celebrado com cláusula de recurso ou sem cláusula de recurso.

Sem cláusula de recurso

Nestes casos o factor (Banco) assume o risco del credere, sendo apenas admissível

quando os créditos cedidos são objecto de aprovação. O cliente (António) fornece

ao Banco a lista de clientes de onde irão imergir os crédidos. De seguida, o factor

(Banco) irá realizar uma análise económico financeira. O banco irá realizar um acordo

com o potencial cedente (António) em que se consagra quais os créditos que irá

aceitar, podendo o cliente (António) propor-se a assumir o risco de todos ou de

apenas alguns dos créditos.

Ocorrida a aprovação pelo factor, é fixada uma provisão financeira e um plafond

dentro do qual o factor assume todos os créditos. Esgotado o plafond, o factor

(Banco) pode aceitar os créditos mas com inversão do risco de crédito que passa a

correr por conta do cliente (António):

O Contrato de Factoring sem cláusula de recurso depende da solicitação destas, de

acordo com as condições particulares de cada contrato.

Não tendo sido feita antecipação, na data da cobrança do crédito, o factor (Banco)

entrega ao cedente o valor do mesmo, deduzido da comissão da garantia e do

contrato de factoring.

Deste modo, não existindo cláusula de recurso o Banco assumiu o risco de crédito pelo

que terá de ser ele a suportar tal situação.

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Com cláusula de recurso

Nestes casos, o cedente não solicita ao factor a assunção do risco del credere,

relativamente a todos ou alguns dos devedores do cedente. Contudo, o factor

também analisa os devedores, fixando para cada um deles um plafond.

Nestes casos, os limites de crédito têm uma acepção diferente dos fixados para as

cessões sem recurso, referindo-se ao montante máximo de adiantamentos que o

factor poderá conceder ao cedente, relativamente aos créditos cedidos sobre

determinado devedor (≠ risco). O factor negocia com o cliente um plafond máximo

de adiantamentos, face aos créditos que este último lhe venha a transmitir sobre os

devedores indicados em lista anexa ao contrato, resultante da análise económico-

financeira do cedente.

No caso de serem concedidos adiantamentos e o devedor não cumprir, o factor

debita o montante juntamente com a comissão de factoring na conta-corrente do

cedente, mantendo-o em cobrança, por um determinado período de tempo, após o

qual realizará o débito.

Neste caso, sendo o contrato de factoring com cláusula de recurso, o factorizado

(António) tem de restituir a quantia que lhe foi mutuada e com essa restituição o factor

(Banco) terá de retransmitir os créditos, para que depois a empresa factorizada possa

ir junto dos devedores tentar restituir os créditos que lhe são devidos. Trata-se de uma

antecipação de fundos.

NOTA1: na cessão de créditos, além da transmissão do crédito transmitem-se ainda as

garantias e acessórios (se o credito estiver vencido a possibilidade de exigir o crédito

judicialmente, o direito à anulação, etc.) daquele. As garantias que existissem para

assegurar aquele crédito e qualquer acessório do crédito transmitem-se com a cessão

de créditos. O mesmo se passa no contrato de cessão financeira em que ocorrendo a

cessão de créditos também ocorre a transmissão da garantia e acessórios do credito.

NOTA2: um comerciante quando tem necessidades de pagar créditos poderá pedir

uma letra a um Banco – antecipação de fundos.

NOTA3: Enquanto no direito de regresso parte-se do pressuposto que há dois ou mais

obrigados ao pagamento de determinada dívida, na cessão de créditos quando o

cessionário/factor tem direito de recurso em relação ao cedente não há partida

nenhuma dupla obrigação.

NOTA4: A regra geral no contrato de cessão financeira é que este é sem recurso,

porque parte-se do pressuposto que quando as pessoas celebram um contrato de

factoring uma das vantagens é que o risco seja transmitido para o factor. Deste modo

no silêncio das partes o risco será transmitido para o factor pelo que será sem recurso.

NOTA5: Na grande maioria dos casos, a maioria dos bancos só aceita fazer factoring

com base numa relação de clientes previamente estabelecida. O banco terá de

verificar qual o risco de crédito: se for baixo, a probabilidade de cobrança do crédito

é elevada não se importante se consistir um factoring sem recurso; se o banco verificar

que o risco de cobrança de créditos é baixa ou não se consegue determinar irá

celebrar um factoring com recurso.

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CASO 5

A Mais Construção, SA, celebrou um contrato com o Banco Compre a Crédito, SA,

com vista a aquisição por este último de três gruas metálicas, ficando a Mais

Construção, S.A., com o gozo das mesmas por um período de 36 meses, mediante o

pagamento de uma quantia mensal de €200.000,00. Pergunta-se:

a) Findo os 36 meses, quem é o proprietário das gruas?

No presente caso estamos face a um caso de locação financeira em que uma das

partes (o locador) se obriga, mediante remuneração, a ceder à outra parte (locatário)

o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida para o efeito pelo

primeiro (locador) a um terceiro (fornecedor) ficando o último investido no direito de a

adquirir em prazo e por preço determinados (DL 149/95, de 24 de Junho – art. 1º).

Nos termos do art. 9º/1 al. c) e 10º/2 al. e) o locatário tem a possibilidade de findo o

contrato de comprar a coisa pelo respectivo preço residual no termo do contrato.

Deste modo, se a Mais Construção exercer esta opção de compra a propriedade das

gruas será sua; se não exercer a propriedade das gruas será do Banco Compre a

Crédito.

NOTA1: No leasing há um contrato de compra e venda entre o fornecedor e o

locador, sendo que este é celebrado consoante as indicações dadas pelo futuro

locatário ou cliente do banco. O dono do bem (locador) vai locar a coisa ao cliente

(locatário). O contrato de locação so vai ser celebrado se o locatário der indicações

ao locador de que o bem que ele tinha escolhido e que agora vai ser entregue pelo

fornecedor directamente ao locatário estiver em condições ou não de ser

redireccionado. O locatário fica logo com a detenção da coisa, mas so a recebe

verificadas as qualidades da coisa que recebe (recepção e qualidades). Neste

momento a entidade de locação financeira paga o valor ao fornecedor e debita ao

locatário a primeira renda do contrato (essa renda varia consoante a analise

financeira que o banco faça). Deste modo, diz-se que na locação financeira há uma

relação tripartida.

NOTA2: No lease back o cliente vende um bem ao banco e depois o banco loca esse

bem a esse mesmo cliente. Problema: o cliente, precisa de financiamento, esta a

alienar a propriedade de um bem que era seu ao banco, e em troca o banco faz um

contrato de locação com o cliente e este fica a pagar uma renda. Tal nada difere da

hipoteca. Em caso de incumprimento do devedor, o credor hipotecado apenas pode

vender em hasta publica o bem hipotecada mas não pode fazer sua a coisa

hipotecada. Ora no lease back se o locatário deixar de pagar as rendas o banco fica

com a propriedade do bem na sequencia do incumprimento, pelo que tal

consubstancia um pacto sucessório que é proibido. Mas no leasing em geral se

decorrido o prazo do leasing e pagas as rendas, o locatário tem o direito a comprar a

coisa, contudo a chamada opção de venda é apenas um contrato promessa

unilateral de venda (o banco obriga-se a vender a coisa ao locatário mas só se este

quiser comprar tal).

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b) Caso a Mais Construção, SA deixe de pagar a quantia mensal ao fim de 24

meses, que direitos assistem ao Banco Compre a Crédito, SA?

O Contrato de Locação Financeira pode extinguir-se ou por caducidade (não é o

caso, uma vez que ainda só decorreram 24meses) ou por resolução. Em caso de

resolução com fundamento em incumprimento do locatário (a Mais Construção deixa

de pagar a quantia mensal (renda) ao fim de 24meses) existe um dever de restituição

do bem locado (devolução das gruas ao Banco Compre a Crédito), a obrigação de

pagamento das rendas vencidas até à efectiva restituição e a obrigação de

pagamento de 20% do valor das rendas vincendas.

NOTA: A jurisprudência não admitia de todo que o banco pudesse formular a

resolução do contrato com o pagamento das rendas vincendas. Contudo,

actualmente em determinados casos, para o cliente não ficar em vantagem podem

ser fixadas cláusulas penais que consagram que numa situação de incumprimento o

banco poderá exigir uma percentagem das rendas vincendas (20%). Contudo, numa

situação de incumprimento o banco nunca poderá receber mais do que receberia

numa situação de cumprimento (limite).

c) Se, no fim do contrato, o Banco Compre a Crédito, SA ficar com as gruas,

pode o banco alugá-las a um terceiro?

No contrato de renting uma das partes proporciona à outra o gozo temporário e

retribuído de uma coisa (standardizada), tendo em vista um fim específico. Do ponto

de vista daquele que cede o gozo da coisa, ele adquiriu-a, em momento prévio, ao

seu fabricante ou ao seu produtor; dispõe antecipadamente de um conjunto variado

de bens que lhe pertencem. Por sua vez, o utilizador apenas pretende o uso da coisa

de modo transitório e circunstancial, sendo as suas necessidades pontuais,

esporádicas e visam tarefas definidas e certas. Na vigência do contrato cabe ao

locador suportar os custos de conservação e de reparação da coisa, sem prejuízo da

sua substituição, caso se mostre necessário.

Deste modo, nos termos do art. 7º o Banco ficando com as gruas poderá alugá-las a

um terceiro.

NOTA1: o renting é uma forma de locação em que surge agregada a a tal uma serie

de serviços associados a essa locação que fazem correr o risco da perda ou

deterioração do bem sobre o locador. Na situação dos automóveis há de facto uma

locação do bem e associada a tal a prestação de serviços. As rendas englobam o

gozo do bem e os serviços associados à locação

NOTA2: O renting pode ter associado uma opção de compra mas, normalmente, o

valor é muitíssimo elevado, visando evitar que o cliente compre o bem (assim o cliente

irá celebrar outro contrato de renting).

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Matéria Aula Prática

Análise do art. 2º C.COM

I parte – actos objectivos absolutos, ou seja actos previstos no código comer

comercial ou em legislação avulsa com natureza comercial

II parte – actos comerciais subjectivos, porque praticados por um comerciante

presumem-se comerciais

Nos termos do art. 13º refere-se aquele que é comerciante, sendo que só se adquire

tal caracteristica com a pratica de actos de comércios? É necessário conjugar com o

art. 2º I parte com o art. 13º.

O art. 2º II parte respeita aos actos conexos com a actividade profissional mas que não

se encontram inseridos na sua actividade principal, embora se encontrem com ela

relacionados.

TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO

Art. 2º I parte – actos comerciais, independentemente do sujeito que os pratica

Art. 2º II parte – qualquer acto que um comerciante pratique no âmbito da sua

actividade comercial presume-se acto comercial. Excepções: actos pessoais e

patrimoniais mas com finalidade diferente da sua actividade comercial

Nota: o art. 230º para esta teoria é um acto objectivo absoluto.

TEORIA JURÍDICA DE EMPRESA: é necessário analisar o art. 230º para saber a noção de

empresa. A empresa assenta no risco de capital. O art. 230º é uma norma

qualificadora central. O art. 2º I parte só se aplica aos actos ocasionais, ou seja, os que

são praticados por não comerciantes. O art. 230º assenta no seguinte:

Alarga o Direito Comercial a outras áreas que não só o comercio em sentido

economico integração. Fala-se agora em comércio em sentido jurídico

É uma norma de alargamento. Entende que as actividades de integração são

comerciais por natureza (compra para revenda, por exemplo)

As empresas são comerciais porque assumiram um risco de capital.

Do âmbito do art. 230º excluem-se (1) os profissionais liberais, (2) as empresas agrícolas;

(3) empresas acessórias das agrícolas (exemplo: empresa transportadora)

Note-se que tanto os profissionais liberais como as empresas agrícolas são reguladas

pelo Direito Civil. Coloca-se a questão de saber quanto às empresas acessórias das

agricolas como é que se distinguem das verdadeiramente comerciais? Qual o seu

critério de distinção?

ACTOS. QUALIFICAÇÃO. ESTATUTO DO COMERCIANTE

Page 13: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 13

Risco: na empresa acessória da agrícola o seu risco provém da terra. As pequenas

empresas tambem são excluídas porque o rseu risco é pessoal; assentam no exercicio

direito da actividade do seu titular.

O art. 230º além de qualificar como comercial as actividades também o faz em

relação aos sujeitos que as praticam: ‘’empresa singular ou colectiva’’ qualifica o

sujeito num momento diferente do que aquele que ocorre na Teoria dos Actos de

Comércio. Há toda uma preparatória antes de começar a actividade comercial –

nesta fase ainda não era comerciante. Com a Teoria da Empresa antecipa-se a

qualificação como comerciante – já o é antes de iniciar a actividade comercial. Os

seus actos prepatórios já são comerciais.

Conjugação do art. 230º e do art. 2º: a norma central é o art. 230º. Mas se o

comerciante praticar um acto, fora da sua actividade principal, mas que está com ela

relacionado (exemplo: actos preparatórios, financiamento) são actos comerciais, de

acordo com o art. 2º II parte (actos conexos). Os actos ocasionais praticados por não

comerciantes encontram-se no art. 2º I parte.

CASO 1

António, empresário taxista, celebra com os seus clientes contratos de transporte.

Esses contratos são comerciais? Justifique.

Tendo em consideração o exposto anterior é necessário distinguir:

TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO: art. 2º I parte e art. 366º

TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA: art. 230º, art. 366º (se tiver uma empresa

comercial) e art. 2º II parte

a) António comprou os livros necessários à sua exploração mercantil. Comprou

também dois táxis e contratou um financiamento bancário para financiar essa

aquisição. Esses actos são comerciais? Justifique.

TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO

Conjugado o art. 2º I parte com o art. 13º define-se quem é comerciante (requisito1).

Os actos são conexos? É necessário partir de uma presunção: não é um acto

exclusivamente civil (requisito2) e das circunstâncias que rodearam a prática do acto

não resulta que o mesmo se destina à sua vida pessoal e familiar (requisito3). Note-se

que a presunção só funciona se estiverem demonstrados os requisitos enunciados.

TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA

É necessário conjugar o art. 230º com o art. 2º II parte

O art. 230º só se aplicaria a este caso se estivéssemos a falar da actividade

comercial do comercial

O art. 2º II parte aplica-se às actividades conexas, sendo que no caso, a

actividade principal do taxista são os contratos de transporte. Ou seja, estamos

face a actividades conexas.

Page 14: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 14

NOTA: No Direito Comercial, a compra e venda não é uma figura global, sendo que se

divide os actos. O mesmo acontece no contrato de mútuo. No Direito Civil acontece

exactamente o oposto. Podemos chegar à conclusão de que um acto é, para uma

parte, civil, e para outra parte comercial. No Direito Comercial unem-se os actos num

contrato. É a técnica usada pelo código comercial (exemplo: não há compra e

venda – há actos de compra e ha actos comerciais)

b) Suponha que António, num local distante do seu negócio e sem aludir à

qualidade de empresário, celebrou um contrato de arrendamento de um

andar, por um mês , durante o período normal de férias.

É necessário conjugar o art. 2º II parte com o art. 13º. Nos termos da primeira norma

falta um requisito para que exista a presunção de comercialidade. Uma vez que a

falta desse requisito se encontra relacionada com a sua vida pessoal e familiar é um

acto civil.

Na TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA é exactamente o mesmo: o art. 230º conjugado

com o art. 2º II parte volta a conduzir a que não esteja reunido um dos requisitos e aus

actividade principal não é o arrendamento, pelo que se assim não fosse o acto seria

conexo.

c) Suponha agora que António, sem aludir à qualidade de comerciante mas

perante quem sabia que ele era comerciante, encomendou pelo telefone um

computador. O acto é comercial? Justifique.

Em todos os casos duvidosos aplica-se o art. 2º II parte. Mais do que uma presunção,

esta norma é qualificadora. Afere-se a demonstração ou não dos pressupostos. Tal é

igual quanto à TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA.

CASO 2

António, comerciante de eletrodomésticos, comprou cinco torradeiras e uma carrinha

de transporte de mercadorias.

a) Os negócios celebrados por António são comerciais?

Quanto às Torradeiras:

TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO: art. 2º I parte

TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA: nos termos do art. 230º a compra para revenda

(torradeiras) está implícito (‘’Haver-se-ão por comerciais..’’ – para além da

compra para revenda o disposto no artigo é comercial)

Quanto à Carrinha: nos termos do art. 2º II encontram-se reunidos os pressupostos pelo

que é uma actividade conexa à principal.

b) Suponha que Bernardo, cliente da loja de António, comprou uma torradeira

para a sua casa nova. O acto praticado por Bernardo é comercial? Justifique.

Nos termos do art. 464º desqualifica-se a compra como comercial. Aplica-se a lei civil.

Mesmo que a coisa venha a ser revendida, mais tarde, continua a aplicar-se a lei civil.

No momento da compra não havia intenção de revenda.

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 15

CASO 3

Carlos, comerciante de artigos desportivos, comprou 100 camisolas do Benfica, 50

porta-chaves do Sporting, tendo ainda encomendado ao mesmo fornecedor 1000

patins em linha com o símbolo do Futebol Clube do Porto.

a) Os negócios celebrados por Carlos são comerciais?

Remete-se para a al. a) do Caso 1 (são comerciais).

b) Se o preço não for pago na data devida qual o valor dos juros?

No presente caso é necessário proceder à analise do art. 230º:

Taxa de juro: 8%

A taxa de juro é definido por duas portarias/ano

Porque é que existe uma taxa de juro mínima? Nas dívidas comerciais a taxa

não pode ser inferior à do BCE, uma vez que este é de regulação do mercado.

Caso assim não fosse, haveria um incentivo ao não cumprimento. Se não se

cumprisse pagava-se uma taxa de juro mais baixa do que se cumprissem o

pagamento à Banca.

Coloca-se a questão de saber em que casos é que se aplicam taxas de juro

moratórias comerciais? Quando ao credor comerciante e ao crédito comercial

aplica-se a taxa de juro comercial. Mas do outro lado da relação pode estar um

comerciante ou um particular. Em 2003 surgiu um novo DL que estabelece

medidas de atraso nas transacções comerciais. Aplica-se às relações de

transacções entre comerciantes. No seu art. 2º al. a) consagra-se que estão

excluídos os contratos com os consumidores. Este diploma alterou o art. 54º. Sendo

crédito sobre consumidores colocava-se a questão de saber se se aplicava a taxa

civil ou comercial, mas este diploma veio limitar a aplicação do art. 102º aos

comerciantes. Nos termos do art. 99º, este diploma não transforma actos civis em

comerciais, mas faz com que se aplique o regime comercial, com excepção de

actos a que não se deva aplicar. Que-se saber qual a taxa de juro a aplicar, quais

as soluções?

A DOUTRINA tem dúvidas se em dívidas comerciais detidas por comerciantes sob

consumidores se deva aplicar o juro comercial.

A JURISPRUDÊNCIA afirma que, no diploma de 2003, não se aplica o juro comercial

as dívidas entre comerciantes e consumidores, pelo que terá de se aplicar o

regime normal constante do art. 102º. O art. 102º não se preocupa em saber quem

está do outro lado, basta saber que a dívida é comercial e que está é detida por

um comerciante.

CASO 4

António, empresário mercantil, e Carlos, agricultor, compraram a um particular

(Bernardo) uma carrinha por 50 000 euros. Duarte ficou fiador de António. Se nada for

pago, quanto pode Bernardo exigir de cada um?

No presente caso estamos no âmbito das obrigações plurais, art. 100º, em que a regra

é a solidariedade, ou seja aplica-se aos co-obrigados se forem comerciantes.

O agricultor nos termos do art. 230º não é comerciante. A solidariedade não é solidária

com António (art. 100º) e quanto a Carlos aplica-se o regime civil (obrigação

conjunta). O credor pode pedir tudo a António, mas só pode pedir metade a Carlos.

Page 16: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 16

Note-se que Duarte é fiador de António. O Fiador ainda que não seja comerciante

mas se garantir uma obrigação comercial tem direito ao benefício da escusão prévia

(não pode ser demandado enquanto todo o património do devedor não tiver

esgotado, ou seja não tiver mais bens no seu património). Mas tal benefício não se

aplica porque o fiador responde ao lado. Não existe uma regra supletiva, mas as

partes podem acordar a existência do benefício de execução prévia. Nesse caso, o

fiador responde solidariamente com António até cinquenta mil euros.

CASO 5

António, comerciante de automóveis usados, casado sob o regime da comunhão de

adquiridos com Berta, contraiu um empréstimo bancário no valor de 100 000 euros

para ampliar as instalações do seu estabelecimento. Não tendo sido pago o

empréstimo, qual a garantia patrimonial do crédito do banco?

DOUTRINA MAIS ESCLARECIDA: Nos termos do art. 1691º al. b) e d) CC se os conjuges

estiverem casados em regime de separação de bens não funciona a presunção, mas

existe responsabilidade solidária se o credor fizer prova do proveito comum.

JURISPRUDÊNCIA E RESTANTE DOUTRINA: Caso os cônjuges estejam casados em regime

de separação de bens não funciona a presunção, não havendo responsabilidade

solidária.

No caso: aplica-se o regime específico das dívidas de direito comercial? Só se

estivermos face um acto comercial. E estamos face a um acto comercial?

TEORIA DOS ACTOS DE COMÉRCIO: art. 2º I parte e art. 463º

TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA: art. 230º, implicitamente

Nos termos do art. 1691º al. d) CC estabelece-se que as dívidas de comércio são da

responsabilidade de ambos os cônjuges, salvo (1) se se provar que não foram

contraídas em proveito comum do casal; (2) vigorar o regime de separação de bens.

Nos termos do art. 15º CCOM consagra-se uma presunção de que as dívidas

contraídas pelo conjuge comerciante são contraidas no exercício do seu comércio,

logo, para ilidir esta presunçao o conjuge terá de demonstrar que não houve proveito

comum do casa ou demonstrar que a dívida não foi contraída no exercício da sua

actividade comercial. Ratio: havendo regime de comunhão, os proveitos do exercício

da actividade comercial aproveitam a ambos os cônjuges.

Nos termos do art. 1695º CC consagra-se quais os bens que vão respondem por estas

dívidas: (1) bens comuns do casal; (2) na falta ou insuficiência, solidariamente,

respondem os bens proprios de cada um dos conjuges.

Assim sendo, as dívidas comerciais do cônjuge comerciante casado em regime de

comunhão de bens presumem-se contraídas no exercício da sua actividade

comercial e sendo contraidas no exercicio da mesma, presumem-se contraidas em

proveito comum do casal. Logo, a garantia seria o patrimonio de ambos os conjuges.

Matéria Aula Prática

Page 17: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 17

Matéria Aula Prática

Análise do art. 230º C.Com: alarga-se o âmbito do comércio para outras áreas

(produção, industria e prestação de serviços). O Direito Comercial abrange o

comércio em sentido jurídico (actividades de intermediação, actividades de

produção e industriais e actividades de prestação de serviços). Pressupõe, sendo uma

norma de alagamento, que a compra e venda para revenda, sendo uma actividade

de intermediação, já é uma actividade comercial. No primeiro parágrafo deste artigo

excluem-se determinadas áreas do âmbito do Direito Comercial (profissionais liberais,

empresas agrícolas, empresas acessórias das agrícolas). Nas empresas comerciais

existe o risco de capital.

EMPRESAS ACESSÓRIAS DAS AGRÍCOLAS EMPRESAS (VERDADEIRAMENTE)

COMERCIAIS

Critério de distinção: risco

É uma empresa transformadora que se

exclui do âmbito comercial, sendo deste

modo integrante do âmbito civil.

Existem duas empresas: uma agrícola e

uma transformadora.

Existe o risco da terra, sendo que o

sucesso ou insucesso da empresa é

ditado não pelo capital mas sim pela

terra: se a empresa agrícola não tiver

uma boa colheita devido à seca, por

exemplo, a empresa acessória da

agrícola não produz.

O principal risco é o de capital, ou seja o

risco da sua actividade assenta no risco

de capital.

Pequenas Empresas EMPRESAS COMERCIAIS

o risco em que assentam é um risco

pessoal, risco que decorre directamente

da profissão (pode existir risco de capital

mas não é isso que conta).

Risco de Capital

Nos termos do art. 230º, além de as empresas serem comerciais também o são os

comerciantes: os sujeitos que praticam as actividades comerciais são os comerciantes.

Basta que um sujeito se proponha no mercado ao exercício de uma determinada

actividade para que passem a ser considerados comerciantes ocorrendo uma

antecipação do momento em que ocorre a qualificação daquele sujeito como

comerciante (≠ Teoria dos Actos do Comércio).

ESTABELECIMENTO COMERCIAL

Page 18: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 18

Conjugação do art. 230º e do art. 2º2ª parte:Se o comerciante praticar algum acto

que não se insira na sua actividade principal mas se encontra com ela relacionada

será qualificado como comercial nos termos do art. 2º 2ºparte (acto comercial

subjectivo). O art. 2º2ª parte refere-se aos actos conexos da actividade principal.

Teoria dos Actos do Comércio: é comerciante quem praticar actos de comércio

profissionalmente. A actividade principal, neste caso, é a hospedagem. Inserindo-se os

actos no âmbito profissional do comerciante aplica-se o art. 2º, 1ª parte.

O art. 230º no 1ª paragrafo exclui as pequenas empresas. Deste modo sendo um

pequeno motel poderia ser uma pequena empresa? Então e não se aplicando o art.

230º o estabelecimento não seria comercial.

Nos termos do art. 1112º quando se refere a industria tal significa trabalho, ou seja

quando para aquelas actividades que não tem caracter intelectual mas manual,

assentando no esforço do próprio, são abrangidos pela figura do trespasse

(cabeleireiro, sapateiro, pasteleiro fora do DComercial enquanto pequenas

empresas mas que o legislador quis abranger pela figura do trespasse.

Razão de ser deste regime do trespasse (estabelecimentos comerciais,

estabelecimentos cujos titulares são profissionais liberais e estabelecimentos civis)

ideia de permitir a continuação da actividade económica, independentemente de

ser de natureza civil ou comercial, não sendo prejudicadas pela transmissão de um

estabelecimento. Para permitir esta continuidade o legislador abarcou no âmbito do

trespasse todos os estabelecimentos que tivessem natureza civil ou comercial. Deste

modo a figura do trespasse pode ter como objecto qualquer estabelecimento.

Embora a interpretação do art. 1112º não seja pacifica visto que alguma

jurisprudência interpreta que o trespasse so existe relativamente a estabelecimentos

comerciais com fundamento que na noção de comercio em sentido económico

(actividade de intermediação) e olhava para este artigo e interpretava que quando o

legislador falava em estabelecimentos comerciais eram estabelecimentos comerciais

em sentido económico enquanto que industria seria comercio em sentido jurídico com

base no art. 230º CCom. As actividades civis estariam excluídas do âmbito do

trespasse todos os estabelecimentos sem natureza comercial estariam fora do

regime do trespasse, pelo que o negocio atarves do qual o titular o alienasse a terceiro

não benefeceria do regime do trespasse nem a transmissão da posição forçada do

arrendatoria

PROF. FRANCISCO BARONA – CRÍTICA: desde que surgiram as leis de 1910, a ideia que

presidiu sempre ao trespasse foi permitir a continuidade das actividades económicas,

independentemente da sua natureza. Deste modo justifica-se que o trespasse tenha

sempre figurado do ponto de vista sistemática na parte do arrendamento porque o

objectivo do trespasse é a continuidade da actividade económica.

O nº5 indica que o trespasse se aplica ao exercício de profissionais liberais.

Admitindo a existência de um trespasse como distingue-se este da cessão para

exploração? Trespasse enquanto transmissão da titularidade definitiva; a cessão de

exploração não transmite a propriedade havendo apenas uma locação do

estabelecimento ou seja a cessão temporária do gozo mediante uma retribuição

(locação do estabelecimento)

Page 19: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 19

Caso I

A, titular de um pequeno motel, com 8 empregados, situado em local de que C é o

locador, vendeu-a a B, com todo o activo e passivo, por 20 000 euros, apesar de a

situação líquida ser ligeiramente negativa. C, notificado do negócio, propôs acção de

despejo contra B, alegando que o negócio fora simulado, e deduziu como pedido

subsidiário a entrega do imóvel, por se considerar titular de um direito de preferência.

Quid iuris?

No presente caso tendo em consideração o exposto anteriormente existe um

trespasse a título de venda.

O problema coloca-se quanto ao facto de a situação liquida do estabelecimento ser

negativa (passivo superior ao activo estabelecimento com exploração que dava

prejuízo; pagamento do preço pode justificar-se pela dimensão de mercado

(localização do hotel). O preço em estabelecimentos cuja situação liquida é negativa

justifica-se não porque se quer aceder à posição de arrendatário mas sim pela

dimensão de mercado.

O art. 1112º/2 consagra dois requisitos, pelo que se tais não se verificarem o legislador

considera que o negocio tem indícios de simulação. As partes não quiseram

efectivamente realizar um trespasse mas sim fazer uma cessão não autorizada da

transmissão da posição do arrendatário (contratual).

E se a actividade passado um determinado tempo deixasse de ser de restauração e

passasse para vestuário? Ou seja pode-se mudar a actividade? É necessário que no

momento do trespasse fique demonstrado que era intenção do trespassado de vir a

exercer uma actividade diferente daquela que vinha sendo exercida. Se o senhorio

mostrar que foi no momento do trespasse com existiu o intuito de mudar o ramo de

actividade não pode.

Importa ainda referir o âmbito da cláusula genérica: todo activo e passivo transmite-se

pelo trespasse. Existe a responsabilidade solidaria do antigo e do novo devedor numa

transmissão singular de dividas quando não é ratificada pelo credor nem lhe seja

pedido o consentimento (visa que o credor não saia prejudicado). Além do mais,

quanto às posições contratuais tem de haver acordo do devedor cedido sob pena de

se tal não acontecer será invalidade

NOTA1: O Estabelecimento é uma universalidade, pelo que será composto por vários

elementos.

NOTA2: Nos termos do art. 230º CCom. Define-se a noção de empresa. Contudo tal é

sinónimo de estabelecimento? A resposta afirmativa conduziria a resultados nefastos.

Exemplo: pequeno sapateiro quer vender a sua loja. Nos termos do art. 230º exclui-se

os pequenos empresários. Logo, não era um contrato de trespasse.

NOTA3:Existe alguma diferença entre um estabelecimento e uma loja aberta ao

público? Uma coisa é o estabelecimento e outra é o local onde se está a exercer a

actividade. A loja pode ser apenas um dos locais em que assenta aquele

estabelecimento. Em estabelecimentos comerciais com uma maior dimensão o

empresário pode ter uma rede própria através de lojas espalhadas por todo o país –

mas todas elas compõem o estabelecimento. Tanto se pode ter a actividade assente

numa rede própria como numa rede de distribuição e tudo isso compõe o

estabelecimento (não há quantos estabelecimentos como quantas lojas).

Page 20: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 20

Uma linha de vendas na internet – o site de vendas é um dos elementos que compõe

o estabelecimento. Ou seja, não se pode confundir o local onde se exerce a

actividade e o estabelecimento. O estabelecimento é uma realidade jurídica mais

ampla que a realidade física da loja aberta ao publico, seja esta uma rede de lojas ou

uma rede de distribuição.

NOTA4: Quando se fala em estabelecimento, este é composto por:

Elementos Corpóreos: imóveis, bens de equipamento, activo circulante do

estabelecimento (fornecimento, própria caixa onde é depositado o dinheiro)

Há ou não um direito ao local, ou seja uma vez que o estabelecimento

tanto pode estar a funcionar num local próprio (da titularidade do dono

do estabelecimento) ou pode ser arrendado? O Estabelecimento como

universalidade que é é algo que pode ser objecto de relações jurídicas

autónomas. O direito a permanecer naquele local também se transmite

com a transmissão do estabelecimento?

Nos termos do art. 1612º CC, quando o estabelecimento

funcionar em local arrendando, havendo trespasse, ocorre

também uma transmissão forçada da posição do arrendatário

por força do trespasse. Historicamente, os grandes conflitos

surgiam nos casos em que o estabelecimento funcionava em

locais arrendados. O senhorio tinha todo o interesse em fazer

cessar aquele arrendamento devido ao facto de as rendas

serem baixas. O legislador criou o seguinte sistema: com o

trespasse dá-se à transmissão forçada da posição de

arrendatário, mas o senhorio tem um direito de preferência

sobre tal.

Quando os estabelecimentos funcionam em locais próprios, se o

proprietário vender o estabelecimento mas não vender a

propriedade do imóvel o que sucede? Na grande maioria das

vezes o local não é um elemento conatural do estabelecimento

comercial (exemplo: o campo de golf é um estabelecimento

comercial – situação em que o local é um elemento conatural

do estabelecimento; mas e quanto à pastelaria dos pasteis de

Belém?). Tem ou não direito ao local e a que título? A

propriedade do estabelecimento é transmitida mas e a

propriedade do imóvel pertence a quem? Sendo o objecto do

negócio a transmissão do estabelecimento, quanto ao imóvel

qual a posição do novo adquirente? Proprietário não é, e

arrendatário? Existe uma situação de co titularidade – existe

apenas o direito de gozar aquele local, mas não tem a

titularidade do mesmo. Tendo o gozo o único titulo jurídico que

lhe permite tal é o arrendamento. Ou seja, ele fica com direito

ao arrendamento mas em que termos? De facto tem o direito a

ter um contrato de arrendamento, mas se as partes não se

entendem quanto aos termos do arrendamento, quem decide

tal? O Tribunal (define as condições mínimas do arrendamento

com base no mercado actual). A lei só trata do

estabelecimento quanto ao arrendamento.

Page 21: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 21

Elementos Incorpóreos: relacionam-se com todos os direitos e obrigações nos

quais esta assente a actividade daquele comerciante (dividas a fornecedores,

créditos sobre clientes, marcas, patentes, know-how, direitos emergentes de

contratos de trabalho, etc.)

NOTA5:O estabelecimento para além dos elementos corpóreos e incorpóreos também

engloba a clientela? Ou seja, o estabelecimento também tem uma dimensão de

mercado? Exemplo: Professor dono de um estabelecimento. Vende-o. Amanhã abre

ao lado outro estabelecimento exactamente igual. Pode?

Partes podem convencionar este aspecto – questão resolvida

Se as partes não convencionarem nada, em regra não se transmite a clientela

(não se pode obrigar as pessoas após a transmissão do estabelecimento, a

continuarem a ir lá. Nem de forma jurídica nem de forma material). Quando se

vende o estabelecimento não se obriga a nenhuma obrigação de resultado

quanto à clientela, mas apenas uma obrigação de meios (obrigação de não

adoptar actos que prejudicam o exercício da actividade daquele

estabelecimento).

NOTA6: entende-se por Aviamento Subjectivo – relaciona-se com o comerciante que

vende o estabelecimento

NOTA7: entende-se por passivo de exploração o crédito que os fornecedores dão

aquele estabelecimento. É um dos elementos positivos avaliados num

estabelecimento, na medida em que traduz em números a actividade daquele

estabelecimento. Tal traduz a dimensão de mercado do estabelecimento

(conjuntamente com a transmissão ou não da marca, do know-how etc.). A dimensão

do mercado é apurada em função de vários indicadores, e em relação a ela, o que

transmite apenas se compromete a uma obrigação de meios (não praticar actos que

impeçam ou prejudiquem o normal funcionamento do estabelecimento comercial).

NOTA8: O trepasse é um figura contratual em que na sua base pode estar qualquer

negócio jurídico (negócio pluricausal). O trespasse surgiu, inicialmente, porque não

existia nenhuma figura que unificasse, que permitisse transmitir de forma definitiva, o

estabelecimento como um todo. Não havendo trespasse, as pessoas teriam de fazer

uma compra e venda de todos os elementos corpóreos e incorpóreos – tantos

negócios como quantos elementos que estivessem naquele estabelecimento. Tal

levantava problemas complexos, mas o trespasse também levanta quando se trata de

créditos e débitos que compõem o estabelecimento. Com o trespasse também são

transmitidos posições em contratos e dívidas do estabelecimento a terceiro e créditos

do estabelecimento sobre determinados clientes?

Doutrina e Jurisprudência maioritária: no caso dos créditos, das posições

contratuais e das dívidas par além de se realizar o contrato de trespasse é

necessário realizar todas as formalidades para a cessão de créditos,

transmissão de dívidas e cessão da posição contratual.

Outra parte da doutrina diz que tal esvazia em grande medida o trespasse,

uma vez que a observação de tais formalidades complica muito o trespasse.

Outros autores: Créditos e dívidas com o exercício da actividade transmitem-se

com o trespasse.

Page 22: Direito Comercial - Casos Práticos

DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 22

Caso II

Alberto, casado com Berta, industrial de sumos e refrigerantes, adquiriu em 31 de Julho

de 2008 a Carlos, agricultor e fornecedor de matérias-primas, 100 toneladas de frutas

para a produção de sumos naturais, pelo preço de € 50.000,00, que o adquirente ficou

de pagar em cinco prestações iguais. Para garantia do pagamento das duas últimas

prestações, a vencerem-se, respectivamente, em 31 de Dezembro de 2008 e 31 de

Janeiro de 2009, Alberto aceita uma letra sacada em favor de uma sociedade de

rações credora de Carlos, a “Douro Valor – Rações, SA”, e saca um cheque em

branco, que deverá ser preenchido com a data de 5 de Fevereiro de 2009, se a última

quantia não fosse pontualmente paga, em 31 de Janeiro de 2009. Entretanto, e para

distribuição dos seus sumos, Alberto celebra com Etelvino, dono de uma pequena

mercearia, situada num imóvel pertencente a Felisberta, um contrato pelo qual

Etelvino lhe cede o gozo da loja (incluindo o respectivo activo e passivo), a título

definitivo, mediante o pagamento de € 100.000,00.

a. Suponha que Felisberta pretende intentar uma acção de despejo contra

Alberto, invocando que houve uma cessão não autorizada da posição de

arrendatário. Quid Iuris?

No presente caso é necessário apurar se estamos face a uma cessão de exploração

ou a um trespasse. Nos casos de cessão de exploração permite-se o gozo da coisa a

outrem, com caracter temporário, mediante o pagamento de uma renda periódica.

No caso, aparentemente as partes teriam celebrado um trespasse e não uma cessão

de exploração, uma vez que faltam os requisitos da alienação temporária mediante o

pagamento de uma renda. A causa do negócio é a venda.

Deste modo, uma vez que nos termos do art. 1112º estamos face a um trespasse

Felisberta não tem qualquer fundamento para intentar uma acção.

b. Caso Irene tivesse um crédito contra Etelvino resultante de um fornecimento de

bebidas que não foi pago, contra quem poderá Irene fazer valer agora o seu

crédito?

O trespassante vai pagar aos credores e, nas relações internas, uma vez que houve a

transmissão do estabelecimento exige-se essa quantia ao novo titular. Pode-se exigir a

qualquer um deles.

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 23

Caso III

A, titular de uma papelaria na cidade de Braga, relativamente conhecida mas já com

certo aspecto «fora de moda» - chamada «papelaria da arcada» -, vendeu-a a B, com

todo o activo e passivo, por 100 000 euros. No momento da venda, da contabilidade

constava um activo de 30 000 euros e um passivo de 20 000. Passados dois meses, foi

aberta pela sociedade C, a 100 metros do local, uma outra papelaria, designada

«papelaria moderna». A sociedade pertence maioritariamente a A. Quid iuris ? A

resposta seria diferente se a segunda papelaria tivesse sido aberta pelo próprio A? E

pelo cônjuge? E se fosse o cônjuge o sócio maioritário da sociedade?

No caso a diferença entre o activo e o passivo era apenas de 10 mil. Contudo, o

negócio foi celebrado pelo valor de 100 mil o que conduz a que existam 90 mil euros

que não se explicam: ou o negócio foi simulado ou existe dimensão de mercado.

Se o estabelecimento tiver uma dimensão de mercado e as partes ao celebrar o

trespasse quiseram transmitir tal dimensão isso significa que as partes mesmo que o

negocio já tenha sido cumprido não podem praticar actos que frustrem tal fim.

Quando a lei diz que as partes devem entregar tudo o que estiver acordado quanto

ao estabelecimento tal significa que se deve assegurar por parte do trespassante o

gozo pacifico do estabelecimento, sob pena de se frustrar o fim contratual previsto.

Isso significa que do contrato de trespasse pode resultar uma obrigação de não

concorrência a cargo do trespassante. Mas este também tem uma certa liberdade

económica. Problema: como se concilia a obrigação de não concorrência com este

principio da livre iniciativa económica? Nem faz sentido dizer que o sujeito fica

impedido de exercer aquela actividade ad eternum ou em qualquer local. A

obrigação de não concorrência a existir tem de ter limites:

Temporal: no âmbito do contrato de agencia o prazo é de 2anos (art. 9º/2).

Contudo, estes dois anos é para um período máximo. Noutros ordenamentos

jurídicos a obrigação de não concorrência é de 5anos. Jurisprudência do

tribunal de justiça das comunidades vai no sentido de estabelecer no limite

5anos. Em Portugal, o limite temporal varia entre os dois e cinco anos.

Espaço: há estabelecimentos com uma área de irradiação limitada (rua,

quarteirão – mercearia de barrio) ou seja o âmbito de irradiação geográfica

esta determinado a uma zona limitada; outros tem uma área de irradiação

maior atepode ser nacional. A clientela ou a dimensão de mercado do corte

ingles pode ser nacional (toda a gente vai la, seja lisboeta ou não). Deste

modo, quanto ao El Cort Inglês não se pode estabelecer depois da venda logo

noutro sitio. Se se vendesse todos os Pingo Doce’s, o Jerónimo Martins poderia

abrir passado 3meses o ‘’pingo amargo’’? Não. Mas é necessário ver caso a

caso podendo a irradiçao geográfica ser maior ou menor.

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 24

No caso, a sociedade aberta perentece maioritariamente a A mas ele não é o dono.

Qual é o âmbito da vinculação à não concorrência? Muitas vezes, sucede que o

dono do estabelecimento é uma sociedade e os sócios não tem um especial

conhecimento qualificado sobre as actividades exercidas, tendo tal o gestor da

sociedade. Os gestores, membro de um órgão social, também estao obrigados a não

concorrência? Ou o dono vende e a mulher poderá abrir outro estabelecimento? Há

certas pessoas que pela relação de proximidade que tem com o antigo titular tem um

conhecimento especial sobre o negocio pelo que ao abrir um novo estabelecimento

poderiam estar a exercer a concorrência.

A obrigação de não concorrência abrange quer o titular antigo, como todos os que

com ele estão numa relação de proximidade (familiar, fucnional ou societária), ou seja

todos aqueles que têm um conhecimento especial sobre a actividade de exercício

(âmbito subjecto do direito de não concorrência).

Em caso de incumprimento da obrigação de não concorrência: responsabilidade civil

Indemnização, mas o estabelecimento continuaria a funcionar

Analogia com o art. 829º/1

Trata-se de uma analogia de prestação de facto negativo

DOUTRINA: o art. 829º pode ser aplicado às prestações de facto

negativo e não só quando estejam em causa obras – pode-se pedir o

simples encerramento do estabelecimento.

NOTA: Prof. Menezes Cordeiro funda-se na ideia da pós eficácia das

obrigações/eficácia póstuma das obrigações. O Estabelecimento tem uma dimensão

técnico produtivo, mas não faria parte do estabelecimento a dimensão de mercado.

Caso IV

A, titular de um estabelecimento a funcionar em local arrendado, vendeu-o por

€50.000, assumindo, ainda, um passivo líquido de €20.000. Executado o negócio e

notificado do mesmo, o senhorio propôs uma acção de despejo, invocando que,

como os próprios valores indicavam, o contrato era simulado; apenas haveria a

transmissão da posição de arrendatário, encoberta por certos bens sem valor

económico apreciável. Quid iuris? E se, em vez da simulação, tivesse havido mudança

de ramo (compreendida no âmbito abstractamente definida pelo contrato de

arrendamento)?

Nos termos do art. 1112º/1 al. a) com o trespasse ocorre a cessão forçada da posição

contratual, ou seja com este transmite-se a posição de arrendatário.

No presente caso é necessário saber qual a motivação de aquisição por parte do

trespassário: para beneficiar da renda mais baixa ou devido à dimensão de mercado?

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 25

Nos termos do art. 112º/2 al. a) ocorre a inversão do ónus da prova, cabendo ao

trespassante e ao trespassário. Se o senhorio demonstrar que os valores em causa são

exagerados face ao estabelecimento não existe trespasse (senhorio tem o indicio de

que existiu um negócio simulado). Ao trespassário cabe demonstrar que o negócio

não foi simulado e que portanto existiu um verdadeiro trespasse.

Como é que se pode provar que existiu trespasse (o senhorio argumenta que o

negócio foi simulado com base no art. 1112º/2 al. a) e devido ao preço)? Atraves do

valor da facturação, do crédito que fornecedores dão ao estabelecimento e da

clientela (normalmente é ocasional sendo dificil encontrar uma lista de clientes).

É preciso averiguar-se, se no momento do trespasse, a intenção era a de continuar no

mesmo ramo de actividade ou mudar. Se a intenção fosse mudar, logo no momento

do trespasse, o senhoria podia resolver o contrato e propor acção de despejo.

Caso V

A, marceneiro com estabelecimento aberto ao público em local arrendado e

exercendo directamente a profissão, vendeu-o, em 2010, a B, tendo notificado da

transmissão o senhorio. Este pretendeu exercer o direito de preferência, mas foi-lhe

dito que tal direito não existia. Quid iuris ?

No presente caso não estamos face a um acto comercial objectivo nos termos do art.

2º I parte. Nos termos do art. 230º estamos face a uma pequena empresa, pelo que se

coloca a questão de se saber se é aplicável o regime comercial.

A situação em causa enquadra-se no art. 1112º quando este se refere a industrial? Se

a resposta for afirmativa aplica-se o regime desta norma, nomeadamente o seu nº4.

Nos termos do art. 1112º/4 o senhorio tinha direito de preferência na venda, mas existia

a possibilidade de tal ser por ele exercido? Ele terá de exercer o direito de preferência

nas mesmas condições que são oferecidas pelo terceiro interessado. Exercendo a

preferência, a titularidade do estabelecimento e a titularidade do imóvel juntam-se no

mesmo e o arrendamento extingue-se por confusão.

Caso VI

Carlos é docente liceal e está casado com Dora, que trabalha como “caixa” num

supermercado. Insatisfeitos com o que auferem decidiram abrir um restaurante. Um

amigo, Ernesto, que tem uma pequena quinta, fornece-lhes os legumes frescos. O

negócio estava a correr bem até que foram surpreendidos com a abertura de uma

cantina da Paróquia nas imediações, a praticar preços sociais. Confrontados com

dificuldades de crédito e com o protesto de letras que Carlos entregara (não

completamente preenchidas) a um fornecedor, optaram por se desfazer do negócio,

vendendo-o a Fernando.

a. O senhorio pode exercer o direito de preferência para ficar com o restaurante?

No presente caso estamos face a um contrato de restauração que consubstancia um

contrato de prestação de serviços.

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 26

O restaurante é um estabelecimento? Note-se que os estabelecimentos podem ser

civis ou comerciais. Para existir um estabelecimento é necessário que exista uma

ligação funcional dos elementos a um determinado fim, havendo uma certa

indiferenciação entre os elementos.

No estabelecimento o que faz com que o restaurante seja qualificado como tal são:

os elementos corpóreos (cadeiras, mesas, cozinha, utensílios, matérias primas – tudo o

que é essencial ao exercício da actividade) e os elementos incorpóreos (créditos,

obrigações que tenham face a terceiros, direitos inerentes aos contratos de trabalho).

Tal consubstância a dimensão técnico produtiva do estabelecimento. Além de tal o

estabelecimento tem a dimensão de mercada (volume de vendas, clientes habituais

ou contratos com determinadas empresas, localização às vezes, etc.).

Deste modo, aplicando o art. 1112º/4 o senhorio poderia exercer o direito de

preferência.

b. Suponha que o contrato de arrendamento fora celebrado no ano 2000. A

venda do negócio tem algum efeito a nível do regime do arrendamento?

Art. 26º NRAU art. 1101º

Matéria da Aula Prática

Nos termos do art. 3º CIRE consagram-se as situações em que existe insolvência:

Análise do nº1:

Devedor tem de estar impossibilitado de cumprir por qualquer causa as

suas dividas que já se venceram

Devedor deve ter a generalidade das suas dividas vencidas (não é

todas nem uma) não se adoptou um critério quantitativo mas sim

qualitativo que tem de ser apreciado caso a caso – o devedor pode ter

apenas um divida vencida mas que pela sua grandeza faz concluir que

o devedor não irá cumprir as restantes obrigações. O critério de partida

para se considerar que um sujeito esta insolvente é à partida a

impossibilidade de cumprir as suas obrigações mas depois há factos

que indiciem uma situação de insolvência (o legislador equipara a

insolvência iminente à insolvência actual).

INSOLVÊNCIA

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 27

Análise do nº2 (pessoas colectivas e patrimónios autónomos)

Para alem de essas entidades estarem impossibilitadas de cumprir a

generalidade das suas obrigações vencidas é preciso que o seu passivo

seja manifestamente superior ao activo. Como é que avalia se uma

empresa tem um passivo manifestamente superior ao activo? Para

demonstrar que se esta na iminência de cumprir as obrigações

vencidas é necessário atender se aquela entidade apesar de ter uma

situação deficitária terá de se mostrar a impossibilidade de tal cumprir

as obrigações passivas: não gera receita suficiente para pagar as

obrigações vencidas.

Pode ocorrer existir uma entidade em que o passivo não é

manifestamente superior ao activo mas é superior, mas ela não gera

receitas suficientes para pagar as dividas vencidas está ou não

insolvente? Tem um activo que é avaliado contabilisticamente em

montante superior ao seu passivo mas não gera receitas para pagar as

dividas que se encontram vencidas. Apesar de ser controverso

considera-se que encontra-se insolvente é sempre necessário avaliar

a capacidade de gerar receita e ver qual o activo e o passivo. Mesmo

que o ativo seja superior ao passivo mas não tenha capacidade para

gerar receita então estará insolvente

Breve Análise do CIRE

O Processo de Insolvência desencadeia-se de uma de duas maneiras:

ou o próprio apresenta-se à insolvência

Ou são os credores que a requerem

Quando são os credores a requerer a insolvência do devedor inicia-se o processo

judicial em que o devedor é citado para contestar; existe um período de instrução

(testemunhas ou peritos) e este processo culmina com uma decisão judicial. Tal

decisão judicial pode ser de ou não declaraçao de insolvência. Quando se trata de

uma declaração de insolvência abre-se uma nova etapa processual, uma vez que a

sentença terá de transitar em julgado para se abrir a segunda fase. Na segunda fase

em que o sujeito já foi declarado insolvente aos demais credores que ainda não

intervieram no processo é lhes dado conhecimento que o sujeito foi declarado

insolvente e para virem ao processo de insolvência reclaramerem os seus créditos

processo de insolvência é um processo de execução universal ou seja todos os

credores que pretendam exercer os seus direitos contra aquele sujeito têm de o fazer

obrigatoriamente no processo de insolvência. Todos os processos em cursos

suspendem-se e são apensos ao processo de insolvência que visa garantir a eficiacia

processual e a igualdade entre os credores – todos os credores devem ser tratados de

uma forma igualitária mas tal depende do credor em questão (comuns,

garantidos/privilegiados, subordinados), ou seja da sua classe: os credores da mesma

classe devem ser tratados de forma igualitária.

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 28

Os credores são chamados ao processo para virem reclamar os seus créditos e

posteriormente abre-se o reconhecimento dos créditos reclamados/triagem dos

créditos e ver aqueles que estao em condições se serem reconhecidos totalmente e

parcialmente. Depois de tal, os credores são convocados para uma assembleia em

que se toma uma de duas decisões:

aprovam a liquidação do devedor se chegarem à conclusão que este não

tem viabilidade para a continuação da sua actividade;

aprovam um plano e nesse plano irão ser previstas as medidas que tem de ser

implementadas no sentido de assegurar a continuidade da actividade do

insolvente.

solução mista: alguns bens são liquidados e outros aproveitam-se pelo plano. O

CIRE parte do pressuposto que os proprietários económicos do património do

insolvente são os credores uma vez que são os verdadeiros interessados na

satisfação dos seus créditos; os credores são livres para decidir e até podem

impor perdões de credito ou seja, determina-se que os credores de uma

determinada categoria so sejam pagos em 60% 70% do valor dos seus créditos,

ocorrendo uma extinção parcial de créditos.

Deste modo o processo de insolvência so termina quando os credores forem pagos ou

quando se considerar que não existem mais bens a liquidar. Pode haver aqui uma

segunda sentença: sentença quanto à qualificação da insolvência, uma vez que esta

pode ter sido originada por caso furtuito ou pode ser culposa (dolo ou negligencia). O

tribunal pode ter que fazer uma segunda sentença para qualificar tal insolvência. Se

for culposa tal tem efeitos importantes naqueles que foram culpados da situação de

insolvência: do ponto de vista de eventuais créditos que se extinguem; do ponto de

vista profissional podendo decretar-se uma inibição para o exercício da actividade

profissional ate 10 anos; consequências criminais.

Pode ainda suceder que determinados actos praticados no passado possam vir a

considerar-se extintos e o valor de tais regressa à massa insolvente. Existe um período

suspeito que assenta nos dois anos anteriores à data da declaração de insolvência.

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 29

Caso 1

António, Bernardo e Carlos, gerentes da sociedade “Devedores e companhia Lda.”,

foram interpelados por Dionísio, trabalhador da referida empresa, para procederem ao

pagamento de salários em atraso há mais de 6 meses de 50 trabalhadores da

sociedade. Nessa data, Carlos constatou que:

I. Bernardo, que tinha o pelouro financeiro da sociedade, não procedia ao

pagamento dos impostos da sociedade há mais de um ano e havia fugido

para Espanha com a sua mulher, levando boa parte dos saldos das contas

bancárias;

No presente caso é necessário analisar se estamos face a uma situação de

insolvência. Uma vez que estamos face a uma pessoa colectiva, aplicando o art. 3º/2,

sendo o passivo superior ao activo estamos face a uma situação de insolvência.

Nos termos do art. 18º, Carlos tinha o dever de se apresentar à insolvência. Nos termos

do art. 20º quando existam dívidas, nomeadamente de natureza tributária, com a

segurança social, emergentes de contratos de trabalho e de natureza fiscal se

perdurarem há mais de três meses presume-se inilidivelmente que o devedor insolvente

conhecia aquela situação.

Uma vez que Carlos não se apresentou à insolvencia é necessário saber quais as

consequências que daí decorrem. Nos termos do art. 186º/3 al. d) consagra-se que a

insolvência será culposa se o devedor conhecia a situação há mais de tres meses e

não se apresentou à insolvência (Carlos estaria numa situação de insolvência culposa

se conhecia a situação há mais de 3meses; se não conhecia encontrava-se apenas

numa situação de insolvência).

Nos termos do art. 20º os credores das dívidas que existem há mais de 6 meses podem

requer a declaração de insolvência uma vez que tais dívidas indiciam o

incumprimento generalizado. O ónus de demonstrar o contrário pertence ao devedor,

ou seja, a este cabe fazer prova que os indicios do art. 20º apesar de verificados não

conduzem a que a situação de insolvência se venha a materializar.

Trata-se de dividas que indiciam o incumprimento generalizado. Para os

credores as dividas há mais de 6meses é suficiente para requerer a

declaraçao de insolvência – art. 20

II. António tinha escondido num armazém de uma propriedade sua no Alentejo

grande parte da maquinaria que deveria estar nas instalações fabris da

sociedade;

Tanto António como Bernardo encontram-se numa situação de insolvência culposa: o

primeiro em virtude do art. 186º/2 al. a) e o segundo em virtude do art. 186º/2 al. h).

A consequência de ambos se encontrarem numa situação de insolvência culposa, nos

termos do art. 189º, conduz a que a responsabilidade seja solidária

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 30

NOTA: Antigamente o art. 189º consagrava a possibilidade d ena sentença de de

declaração de insolvência se decretar a inabilitação de tais pessoas de 2 a 10 anos. O

Tribunal Constitucional declarou tal inconstitucional. Uma coisa é declarar-se uma

inibição, outra coisa é a inabilitação em que eles passam a ser considerados

incapazes (violação do direito liberdade e garantia que assenta em que alguém

sendo capaz fosse declarado incapaz por razões profissionais).

III. O passivo da empresa há muito que havia superado o activo.

Pergunta-se:

a. O que poderá ou deverá fazer Carlos perante aquela situação?

b. Bernardo e António poderão vir a sofrer pessoalmente pelos factos que

praticaram?

c. Suponha que Bernardo, dois anos antes, havia alienado parte substancial do

património da empresa a dois sobrinhos, ao primo e à sogra. O que poderá

suceder a estes negócios?

Existem certas situações de resolução em benefício da massa que dependem da

verificação de certos pressupostos nos termos do art. 121º. Os pressupostos para a

resolução em benefício da massa são:

Actos prejudiciais à massa

Actos praticados até ao limite temporal de há dois anos atrás

Má fé do terceiro

Art. 120º/5 alineas

Art. 120º/4: presunção de má fé (pessoas especialmente relacionadas

com o insolvente – art. 49º)

Embora Bernardo fosse gerente, nos termos do art. 49º, a sogra, o primeiro e os

sobrinhso não se incluem no seu âmbito. Neste caso é necessário analisar se esta

situação se insere em algum dos casos de resolução incondicional. Nos termos do art.

121º consagram-se várias hipoteses em que se admite que possam ser resolvidos em

beneficio da massa desde que se verifique algum dos actos. O facto de Bernardo ter

alienado uma parte substancial do património cairá na al. b) ou na al. h), consoante o

acto de alienação tenha sido gratuito ou oneroso respectivamente. Tal acarreta

efeitos retroactivos. Nos termos do art. 46º, existindo resolução em benefício da massa,

os bens outrora alienados regressam à massa insolvente.

NOTA: o art. 49º possui duas funções – (1) casos de resolução em benefício da massa;

(2) classificar os créditos (tais créditos consideram-se subordinados nos termos do art.

48º).

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

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Caso 2

A sociedade comercial Granja Amarela, S.A. (“GA”) já viveu melhores dias. O

empréstimo hipotecário a 20 anos que contratou com o Banco Hércules (“BH”) faz

sentir mensalmente o seu peso, bem como a pressão dos fornecedores, face ao

constante atraso nos pagamentos. O seu único activo é a herdade amarela, cujo

potencial agrícola diminuiu muitíssimo, após a construção de uma incineradora

gigantesca, no terreno vizinho. Há quem sugira que a herdade agrícola deixou de ter

valor comercial… Podem os credores da GA requerer a declaração de insolvência?

Qual a ordem de satisfação dos seguintes créditos: o crédito do BH; os honorários do

Dr. Coelho, que foi nomeado administrador da insolvência; o crédito da Sementes

Ilíada, S.A. (“SI”), pela venda de sementes de girassol à GA?

No presente caso nos termos do art. 20º al. b) a situação em causa é fundamento de

declaração de insolvência.

Quanto às dívidas da sociedade é necessário proceder à seguinte distinção:

Dívidas da Massa (contraídas no momento posterior à declaração de

insolvência, sendo pagas em primeiro lugar)

Art. 172º - créditos sobre a massa

Art. 51º - noção de dívidas da massa (honorários do Dr. Coelho)

Dívidas da Insolvência (contraídas antes da declaração de insolvência)

Os créditos que se encontrem garantidos são pagos em primeiro lugar. Nos termos do

art. 48º, os créditos subordinados serão os últimos a ser pagos (note-se que o art. 604º

CC é uma regra geral: o que o CIRE trás d enovo é que quando existe uma problema

de eficácia externa das obrigações tal é o único caso em que se permite que por

acordo se estabeleça um contrato com eficácia erga omnes). O art. 48º al. c) permite

a eficácia externa o que tem uma enorme importância, não para os casos de simples

mútuo mas sim para outro tipo de operações, ou seja quanto ao nível societário, as

emissões de títulos de divida, sendo que estes representam empréstimos que os

subscritores de tais fazem à sociedade (muitas vez, em vez de todos os obrigacionistas

serem pagos em igualdade de circunstâncias, pode suceder que uns sejam pagos

primeiro lugar, outros em segundo lugar, etc – cria-se uma sobordinação entre dois

credores). A ideia de subordinação permitiu flexibilizar a gestão das sociedades

permitindo que as sociedades possam muitas vezes graduar credores entre si, mas

devido à amplitude da norma tal vale para qualquer crédito (os outros credores

podem invocar o acordo de subordinação para dizer que o credor que a invocou

será pago depois de todos os outros mas tal acarreta o problema dos terceiros, ou seja

de invocarem este acordo face aquele credor só ser pago depois dos outros – caso

de criação de direitos com eficácia erga omnes por mero acordo das partes).

No presente caso a ordem de pagamento das dívidas seria:

1. Honorários do Dr. Coelho (dívidas da massa)

2. Banco – Hipoteca (crédito garantido)

3. Sementes (crédito comum)

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

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Matéria Aula Prática

LETRA DE CÂMBIO: o sacador dá ao sacado uma ordem de pagamento. Sendo o

saque um acto unilateral (da exclusiva responsabilidade do sacador), o sacado fica

obrigado ao pagamento da letra se a aceitar (posição da assinatura do sacado na

letra assinatura do sacado equivale a aceitar).

Nos termos do art. 1º da LULL consagram-se os elementos essenciais da letra,

nomeadamente: (1) encontrar-se escrita a palavra letra; (2) ordem de pagamento; (3)

nome do sacado; (4) nome a quem deve pagar – beneficiário; (4) nome do sacado

(aquele que deve pagar), ou seja se o sacado não assinar a letra é apenas sacado.

Note-se que enquanto na cessão de créditos é necessário notificar o devedor da

transmissão de créditos o mesmo não sucede na letra de câmbio.

A função da letra é circular e circula atraves de uma operação especial que se

designa de endosso (sacador transmite a letra a alguém que passa a ser o endossado

(C) e depois este transmite a letra a outro endossado (D) que transmite a outro

endossado (E), etc.). Em cada uma das operações cambiárias existe uma relação

jurídica subjacente (entre o sacador e C existe uma relação de mútuo; entre C e D

uma relação de compra e venda, etc.).

Enquanto a letra vai circulando, quem transmite a letra vai realizando o seu respectivo

valor. Quando o E (endossado) apresenta a letra ao sacado aceitante como é que

este sabe que paga bem a E, uma vez que é alheio a todas as relações subjacentes?

O E vai ser considerado portador legitimo da letra, justificando o seu direito de a exigir

com base numa cadeira interrupta de aceitantes. O sacado aceitante consegue

verificar tal cadeira interrupta sendo E, então, considerado portador legítimo pelo que

paga bem.

Na costa da letra da letra, com o intuito de se realizar um endosso, deve-se indicar o

nome dos sacados. Contudo, pode suceder que exista uma assinatura do sacador e

depois um endosso a dizer que se deve pagar a D, estando tal assinado por C. No

primeiro endosso existe aquilo que se designa como endosso em branco, uma vez que

o sacador não indica a favor de quem é dirigido o endosso.

Nos termos do art. 16º LULL, quando existe um endosso em branco, tendo por base o

exemplo anterior, presume-se que C terá adquirido a letra por força do endosso que o

sacador lhe tinha feito mas que se encontra em branco.

Se o sacado aceitante aceitar pagar a letra na data no seu vencimento irá exigir que

lhe seja entregue o título. O que sucede se à data do vencimento, E apresentar a letra

a pagamento ao sacado aceitante e este se recusar a pagá-la? O notário irá atestar

perante uma letra que lhe é apresentada. Tendo sido a letra preenchida, o notário irá

análisá-la e irá analisar também os seus elementos. Não tendo sido a letra paga na

data do seu vencimento, continuando o portador na posse da letra, o notário irá lavrar

o protesto e atestar que a letra foi apresentada pelo portador legítimo da mesma.

Se E não realizar o protesto só terá direito de acção contra o aceitante, sendo que

neste caso estamos face a uma acção executiva uma vez que a letra consubstancia

um título executivo.

TÍTULOS DE CRÉDITO

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

Maria Luísa Lobo – 2012/2013 Página 33

Só se E tiver lavrado protesto é que poderá exigir o cumprimento da letra ao sacador,

aos endossados e aos co-obrigados. Ou seja, se E lavrar o protesto, além de continuar

a ter direito de acção contra o sacado aceitante, terá ainda direito de agir contra

todos os endossados anteriores (E pode accionar D, D acciona C e C acciona o

sacador). Note-se que pode ainda ocorrer o regresso pre salto, ou seja E em vez de

accionar D poderá exigir o pagamento da letra a qualquer outro que se encontre

atras de si (problema: a partir daqui a letra só anda para trás). Todos os que se

encontrem na cadeia de endosso são solidariamente responsáveis pelo pagamento

da letra. Note-se que o prazo de protesto é de dois dias (englobando já os dois dias

subsequentes ao dia em que era suposto pagar-se a letra ou só depois destes?), e se

não for realizado só existe direito de acção face ao sacado. No limite quem sofre o

prejuizo da letra é o sacador na medida em que foi ele quem a criou.

Pode ainda suceder que surja o avalista (garante), sendo que o aval tem de ser

sempre dado pelo valor de alguém (se não se identicar a favor de quem se faz o aval

este presume-se feito pelo sacador). Note-se que se dá o aval por honra do aceitante

ou por honra do endossado, mas nin guém dá o aval à letra na sua globalidade.

Existe uma querela doutrina que assenta em saber se é ou não necessário realizar

protesto para accionar o avalista? Parte da doutrina defende a desnecessidade de

protesto, contudo a posição defendida pela regente é em sentido contrário.

FUNÇÃO DO PROTESTO: poder-se-ia pensar que a sua função assenta em pagar-se a

letra quando o sacado aceitante não o faz, mas tal consubstancia um mero efeito. Na

verdade assenta em fazer prova de que não foi paga a letra, sendo o único meio de

prova que a LULL admite.

Ou seja, uma parte da doutrina reconduz o aval a uma fiança, sendo neste caso uma

garantia meramente acessória do crédito; por outro lado, outra parte da doutrina

reconduz o aval a uma garantia autónoma, não sofrendo as vicissitudes da obrigação

garantida. Enquanto que o aval fiança irá sofrer as vicissitudes próprias da obrigação

avaliazadas, no aval garantia autónoma tal não sucede.

Embora a letra seja em si mesmo um título abstracto, ou seja abstrai-se da causa, o

avalista não é o único garante que surge na letra: o sacador e os endossantes são

igualmentes garantes do pagamento.

Em suma:

Se o aval for configurado como uma garantia autónoma, e não acessória do

crédito:

É necessário protesto

O avalista do aceitante não pode invocar as excepções que o

avalizado pode invocar nos termos do art. 17º LULL

A Teoria da Acessoriedade prescinde do protesto, mas em

contrapartida permite ao avalista do aceitante que ele recorra ao art.

17º LULL

A doutrina maioritária defende que o avalista do aceitante pode ser sempre

accionado sem necessidade de protesto

A doutrina minoritária defende que é necessário protesto

PROF. FRANCISCO BARONA: A doutrina maioritária não é coerente. Da mesma forma

que diz que não é necessário protesto com base na interpretação literal do art. 32º I

LULL (aval segue o regime da fiança) afirma de seguida que no tocante à invocação

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DIREITO COMERCIAL – CASOS PRÁTICOS FDUCP

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das excepções constantes do art. 17º LULL o avalista do aceitante não poderá recorrer

a tais.

O art. 17º LULL distingue relações imediatas de mediatas, não se olhando para as

posições cambiárias mas sim para as relações subjacentes. No dominio das relações

imediatas todas as excepções são oponíveis.

Para quem entende que o aval consubstancia uma relação autónoma, o avalista

encontra-se numa relação imediata com o sacador.

LETRA EM BRANCO: letra que não se encontra preenchida em algum(ns) do(s) seu(s)

elemento(s), mas existe um acordo entre as partes (pacto de preenchimento). Ou

seja, quando se dá a letra a pagamento está terá de ser acompanhada do referido

pacto nos termos do art. 10º LULL. A inoberservância dos pactos de preenchimento

não é oponível ao portador, a não ser que este tenha agido de má fé ou cometido

falta grave. É sempre necessário cumprir deveres de cuidado. Coloca o problema do

risco do preenchimento abusivo.

LETRA INCOMPLETA: a letra não se encontra preenchida em algum(ns) do(s) seu(s)

elemento(s), mas por uma razão desconhecida cái em circulação. Em principio, cada

subscritor cambiário só responde pelo valor da letra na medida que tenha realizado o

seu valor. Se alguém é furtado da sua letra incompleta e vem a ser accionado em via

de regresso poder-se-á opor dizendo que não realizou o valor daquela letra. Mas só e

apenas ele.

Caso 1

Bernardo vendeu um conjunto de mobílias a António por 1000 euros, com a entrega

dos bens daí a 15 dias e com o pagamento do preço a 90 dias. Em representação da

operação, Bernardo sacou sobre António uma letra de câmbio pagável a 90 dias da

data. A letra foi aceite e descontada depois de Carlos ter prestado o seu aval por

honra do aceitante. Em virtude da não entrega das mobílias a letra não foi paga no

vencimento. Quais os direitos do portador da letra?

No presente caso estamos face a uma letra de câmbio, que constitui um título de

crédito. A relação subjacente assenta no contrato de compra e venda celebrado

entre Bernardo e António e a relação cartular ou cambiária em Bernardo sacar uma

letra de câmbito sobre António, que este aceite.

Intervenientes no presente caso:

Sacador – Bernardo

Sacado Aceitante – António

Avalista – Carlos

Portador – Banco (‘’a letra foi aceite e descontada’’ – para fazer o desconto

teve de lhe ser endossada)

Uma vez que nada nos é dito em sentido contrário, presume-se que os requisitos

formais constantes do art. 1º LULL se encontrem preenchidos.

Nos termos do art. 33º LULL consagram-se os tipos de vencimento da letra, sendo que

no presente caso a letra vencia-se em 90 dias (se não tivesse sido indicado prazo a

letra seria à vista podendo ser apresentada a todo o tempo).

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Não sendo paga a letra (em virtude da não entrega das mobilias) é necessário saber

quais são os direitos que assitem ao banco (portador da letra).

Em primeiro lugar o Banco poderia (e deveria) protestar. Neste caso, teria dois dias

para o fazer a contar da data do vencimento do título de crédito. É necessário lavrar

o protesto para se poder abrir a cadeia de regresso, ou seja, accionar Bernardo

(sacador endossante será responsável de regresso) e Carlos (avalista). Quanto a este

último coloca-se a questão da (des)necessidade de protesto.

Poderia o sacado aceitante, ou seja António, recusar-se a pagar a letra? Estando o

sacado aceitante numa relação mediata com o banco não poderia invocar

excepções a menos que se encontre consagrado no art. 17º LULL.

NOTA: Existe uma situação em que é possível accionar qualquer subscritor cambiário

sem necessidade de protesto. Tal situação encontra-se consagrada no art. 46º LULL e

refere-se à cláusula sem despesa que abrange e só beneficia todos os subscritores se

tiver sido aposta no título pelo sacado no momento do saque; só vincula aqueles que

tiverem recebido o título com aquela cláusula incerta.

Caso 2

António, casado com Berta no regime da comunhão de adquiridos, comprou a Carlos

e Duarte a casa de saúde Aurora Matias, que estes haviam herdado da falecida mãe

há dois anos e explorado, entretanto, em conjunto. O preço ajustado foi de 80 000

euros, dos quais 50 000 euros seriam pagos em prestações e ficaram representados

por cinco letras sem data de vencimento e com o valor nominal de 10 000 euros cada.

As letras foram aceites. Eduardo e Filipe, os filhos do casal, deram o seu aval por honra

do aceitante. De acordo com o contrato de compra e venda, o não pagamento

pontual de uma prestação acarretaria o imediato vencimento das restantes. Os títulos

foram descontados. No respectivo vencimento, o primeiro deles não foi pago.O

portador apresentou então também os demais a pagamento e, perante a recusa do

sacado em pagar, fê-los protestar.

a. Faça um esquema que retrate sinteticamente a relação cartular com os

respectivos negócios e intervenientes, bem como as relações subjacentes.

b. Responda ordenada e sinteticamente às seguintes questões, justificando

legalmente a sua resposta.

I. Quem é o portador da letra?

O Portador da Letra é o Banco, sendo que a relação subjacente que

existe para com este é de desconto: contrato em que o valor da letra é

descontado com as comissões do Banco.

II. As letras eram pagáveis à vista?

As letras à vista encontram-se consagradas no art. 2º II LULL, mas no

presente caso estamos face a uma letra em branco, em que embora a

data de vencimento se encontre em branco a letra encontra-se

preenchida quanto ao valor. Estamos face a uma letra em branco uma

vez que na relação subjacente encontra-se um contrato de compra e

venda a prestações, em que cada letra tinha o valor de dez mil euros,

sendo cinco letras no total, pelo que cada uma pagava uma

prestação. Conclui-se que as partes realizaram uma pacto de

preenchimento. Se estivessemos face a uma letra à vista as partes nao

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teriam acordado o momento do pagamento, ao contrário do que

sucede no caso: a data de pagamento é quando cada uma das letras

se vence.

III. Podia o portador apresentar a pagamento todas as letras em causa?

Só podria apresentar as demais letras se por falta de pagamento de

uma das prestações se tivessem vencido as demais. Se assim não fosse,

só poderia apresentar uma a uma na respectiva data do seu

vencimento.

IV. Perante a recusa de pagamento ocorrida, que direitos tem o portador

da letra?

Se o Banco lavrar protesto existirá direito de regresso face ao sacador,

endossantes que se encontrem atrás de si na cadeira de regresso e os

avalistas do aceitante, neste caso.

Caso 3

António tem uma empresa que se dedica à instalação de painéis solares e conseguiu

obter a representação de uma importante fábrica nacional, através de contrato que

assinou recentemente. Para poder responder cabalmente às exigências do novo

contrato, encomendou a feitura da página de internet da sua empresa a Bernardo,

tomou de arrendamento uma loja e contraiu junto de um Banco, um financiamento de

curto prazo, tendo para o efeito subscrito uma livrança. Como se caracteriza a

livrança e qual é a sua função neste contexto?

No presente caso estamos face a uma livrança que consubstancia uma promessa de

pagamento feita pelo subscritor. A livrança, embora se distinga da letra de câmbio

pelo facto de ser uma promessa de pagamento enquanto que a segunda é uma

ordem de pagamentom segue o mesmo regime jurídico do que esta. É necessário

atender ao disposto no art. 77º e ss LULL.

A livrança consubstancia um título executivo e desempenha uma função de garantia

da operação (caução da operação). A caução é uma garantia, não

necessariamente pecuniária, que pode revestir qualquer tipo (de garantia).

Inicialmente a caução era utilizada enquanto forma de garantia de determinados

metais preciosos. Trata-se de um negócio pluricausal (tal como a cessão de créditos).

Caso 4

Comente a seguinte frase: “o emitente de uma letra não está obrigado pela mesma

quando demonstre que o título é de favor”.

LETRA DE FAVOR/TÍTULO DE CRÉDITO DE FAVOR: se alguém se dirgir ao banco e pedir

um empréstimo, se o banco pedir uma garantia pessoal vamos falar com a mãe ou

com o pai e pedimos que seja fiador. Não há nenhuma relação jurídica entre o

garante e o garantido que não seja de favor. Não é obrigacional. O aval numa fiança

deve ser a relação de favor que se tem com o outro.

Neste caso coloca-se a questão de saber como é que se poderá opor ao portador

uma vez que se encontra apenas numa relação de facor. Poder-se-á opor apenas nas

relações imediatas, sendo de todo improcedente fazer o mesmo nas relações

mediatas a menos que o terceiro tenha recebido a livrança com o intuito de

prejudicar o devedor.

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EXCEPÇÃO DE FAVOR: tal excepção surge nos casos em que quem subscreve a letra

ou a livrança apenas tem uma relação de amizade ou de favor. Durante algum

tempo entendeu-se que era oponivel contra qualquer portador da letra,

independentemente do tipo de relação. Havendo uma mera relação de amizade tal

não é subjacente pelo que não se enquadra nos termos do art. 17º LULL.

NOTA: a letra considera-se juridicamente existente e vinculativa com o seu mero

preenchimento ou é necessário para que a letra vincule o sacador e os demais

intervenientes que tenha sido criada pelo proprio sacador e colocada por ele

voluntariamente em circulação? Ou seja se o sacador criar uma letra, guardá-la na

gaveta de sua casa e se posteriormente a mesma for furtada coloca-se a questão de

saber se a letra já existe ou não. A regra é a de que a letra para vincular o sacador

terá de ser voluntariamente colocada por ele em circulação. Tal consubstancia a

Teoria da Emissão (preencher a letra e entregar a alguém). Tendo sido

involuntariamente colocada em circulação, o sacador não é obrigado cambiário

podendo se exigida podendo se opor, deduzindo qualquer outra excepção ou

invocando que a letra lhe foi furtada.

Caso 5

Carlos é professor e está casado com Dália, que trabalha como empregada de

escritório. Insatisfeitos com os rendimentos que auferem decidiram abrir um

restaurante. Um amigo, Edgar, que tem uma pequena produção agrícola, fornece-lhes

os legumes e fruta fresca. Entretanto foram surpreendidos com a abertura de um

restaurante de fast food a praticar preços mais baixos. Confrontados com dificuldades

de crédito e com o protesto de letras que Carlos entregara (ainda não completamente

preenchidas) a um fornecedor, optaram por se desfazer do negócio, vendendo-o a

Filomena. Carlos poderá alegar perante Guiomar, portadora actual da letra, que a

mesma foi apresentada antes do tempo e preenchida abusivamente?

No presente caso é necessário distinguir duas situações: se o endossado sabia dos

acordos e os preencheus tais são lhe oponiveis; se desconhecia ou foram transmitidos,

ele poderá ter usado a diligência necessária para se certificar que se tratava de um

título legítimo pelo que não lhe seria oponível.

É necessário analisar a questão do preenchimento abusivo: uma vez que foram

preenchidos por ele, mas não na sua totalidade, tal conduz a que tenha de pagar

uma vez que assumiu o risco ao não preencher. Tal conduz a uma situação de

responsabilidade contratual.

Carlos não poderá alegar face a Guiomar a apresentação antecipada e o

preenchimento abusivo (problema das letras em branco).

Não existe contradição uma vez que se tiver existido violação do pacto de

preenchimento, Carlos poderá tentar responsabilizar o fornecedor em sede extra

cartular. Contudo, as vicissitudes da relação subjacente à emissão da letra não são

oponíveis nas relações mediatas a terceiros portadores de boa fé. Guiomar não é

parte na convenção executiva com Carlos, é terceiro.