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DIFERENTES OLHARES SOBRE A FORMAÇÃO DOCENTE NO ENSINO
SUPERIOR: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Elenice Maria Cammarosano ONOFRE (UFSCar) [email protected]
Cloris Violeta Alves LOPES (UFSCar) [email protected]
Katia Aparecida da Silva Nunes MIRANDA (UFSCar)
Eixo Temático: Formação e desenvolvimento profissional de professores do
ensino superior
Introdução
O relato que se apresenta é fruto de nossa vivência enquanto estudantes
e docente do Curso de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal
de São Carlos – UFSCar, em que participamos no primeiro semestre de 2015 da
disciplina optativa do Programa de Estágio Supervisionado de Capacitação
Docente – PESCD.
O PESCD visa aprimorar a formação continuada de professores/as,
enquanto discentes nos cursos de mestrado e de doutorado, possibilitando sua
preparação pedagógica, por meio de estágio supervisionado em atividades
didáticas inseridas nos cursos de graduação, permitindo, assim, que os
estudantes vivenciem a docência no ensino superior.
A experiência relatada ocorreu em disciplina do curso de graduação em
Pedagogia - Práticas Sociais e Processos Educativos, ministrada por docente da
graduação e da pós-graduação. Como doutorandas e docente da disciplina,
nossa vivência nos permitiu aprofundar conteúdos, referenciais teóricos comuns,
discussões, envolvimento e amadurecimento profissional. Por outro lado, a
semelhança entre as atividades desenvolvidas permitiu a troca de experiências
entre pós-graduanda, graduandos e a docente responsável e que ocupou um
lugar significativo no processo de formação docente.
Para a docente responsável pela disciplina, a oportunidade de transitar
conosco nas discussões, nas reflexões entre a pós-graduação e a graduação,
permitiu aos estudantes da graduação, momentos de reflexão com a estudante
da pós-graduação, que também é docente em curso de Pedagogia em seu
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estado, uma vez que possibilitou intercâmbio de trocas sobre o fazer docente em
nível superior.
Os aportes teóricos estudados e as diferentes atividades realizadas na
disciplina tiveram por intenção evidenciar os processos educativos que
acontecem em práticas sociais e sua importância para a formação continuada de
professores/as. No contexto da disciplina entende-se que os processos
educativos,
[...] se desenrolam em práticas sociais, inclusive nas escolares.Os sujeitos que participam de tais práticas interconectam oaprendido em uma prática com o que estão aprendendo emoutra, ou seja, o aprendido em casa, na rua, na quadracomunitária do bairro, nos bares, no posto de saúde, em todosos espaços por onde cada um transita, serve como ponto deapoio e referência para novas aprendizagens, inclusive aquelasque a escola visa proporcionar (OLIVEIRA et al, 2014, p. 35).
No decorrer da disciplina, foi possível observar que as práticas sociais
advindas das interações estabelecidas entre as pessoas geram processos
educativos que transmitem conhecimentos de distintas formas e em diferentes
contextos, na maneira de se relacionar com o conhecimento, dele se apropriar e,
assim, construir as trajetórias de vida. As diferentes práticas sociais existentes
na formação continuada de professores/as como o convívio e partilha entre
docentes e discente da pós-graduação na elaboração, desenvolvimento e
avaliação da disciplina, também geraram processos educativos, nos quais nos
educamos umas com as outras.
Neste processo de educar e educar-se, a experiência vivida mostrou
como a sala de aula pode se constituir em um espaço de formação, vinculando a
teoria à prática. Assim sendo, a prática docente é considerada necessária na
formação do/a futuro/a professor/a, como parte de seu processo formativo. Para
Tardif (2002, p. 38) “[...] os próprios professores, no exercício de suas funções e
na prática de sua profissão, desenvolvem saberes específicos, baseados em seu
trabalho cotidiano e no conhecimento de seu meio. Esses saberes brotam da
experiência e são por ela validados”. Nesse sentido, incluir a vivência da prática
docente no processo de formação do/a futuro/a professor/a propicia a aquisição
de conhecimentos que a academia, por si só, não é capaz de fornecer.
Os saberes constituídos na formação continuada e aolongo do exercício profissional docente formam o/aprofessor/a e favorecem os processos de reflexão daprópria prática. Os saberes de experiência são elementos
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de práxis e “[...] Quanto mais me assumo como estousendo e percebo a ou as razões de ser de porque estousendo assim, mais me torno capaz de mudar, depromover-me, no caso, do estado de curiosidade ingênuapara o de curiosidade epistemológica” (FREIRE, 1998, p.44).
Neste contexto, o presente relato de experiência tem como objetivo
compartilhar como o estágio de capacitação docente pode se constituir em um
curso de formação continuada de professores/as para atuarem no ensino
superior.
Formação continuada compartilhada: olhares de educadoras que
aprendem e ensinam no ensino superior
A disciplina Práticas Sociais e Processos Educativos, na qual se deu o
estágio supervisionado do curso de pós-graduação e da docente responsável
pela disciplina, autoras desse relato, contou com a participação de 41 alunos/as
da graduação em Pedagogia e está estruturada em créditos teóricos e práticos.
Os créditos teóricos foram desenvolvidos a partir de encontros presenciais, às
quintas-feiras, das 8h às 12h, por meio de discussões de referenciais teóricos e
esclarecimentos de conceitos relativos às práticas sociais e aos processos
educativos, bem como aos procedimentos metodológicos utilizados para a coleta
de dados dos créditos práticos. Os créditos práticos foram desenvolvidos por
meio de inserções dos/das graduandos/das em diferentes espaços não
escolares, previamente selecionados, orientados e acompanhados pela docente
responsável e pela doutoranda, a fim de que a partir da identificação desses
espaços, fosse possível reconhecer uma prática social e os processos
educativos dela decorrentes.
Na primeira aula foi feita uma apresentação da doutoranda e sua
participação nas aulas do semestre e da disciplina, evidenciando seus objetivos,
conceitos-chave, sistemática de avaliação e orientações para o trabalho de
campo que seria realizado para cumprimento dos créditos práticos. Nas aulas
seguintes, os estudantes entregaram sinopses de textos previamente indicados
para leitura e que subsidiavam o desenvolvimento da aula. As sinopses
entregues foram cuidadosamente lidas pela doutoranda, com a responsabilidade
de contribuir no processo reflexivo de suas leituras, orientar na construção de
suas sínteses, pontuar a construção dos escritos com reflexões, indagações,
questionamentos e correções ortográficas. Essa primeira leitura das sinopses foi
encaminhada à docente responsável pela disciplina para uma segunda leitura
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tendo em vista o acompanhamento de nossa participação no processo, outras
orientações e reflexões a partir de seu olhar, sendo então, devolvidas aos
estudantes. Antes da entrega do material, as discussões, questionamentos,
reflexões foram realizadas em sala pautadas nas leituras dos estudantes, da
doutoranda da professora. Em diversos momentos nos reuníamos para dialogar
e compartilhar nossas impressões sobre a leitura das sinopses, refletir sobre
nossas práticas pedagógicas e o que cada atividade agregou para nosso
processo de formação. Essa convivência e diálogos estabelecidos com o
objetivo de refletir sobre a produção dos estudantes e as nossas orientações,
constituiu-se como uma prática social no qual o percurso de nos fazermos
professoras, evidenciou-se como processo compartilhado e permanente de
formação. Nesse sentido, Zeichner (2003, p. 45) afirma que:
[...] a maior parte do discurso sobre o ensino reflexivo dá poucaênfase a reflexão como prática social, no qual grupo deeducadores apoiem e sustentam o crescimento de cada umdos seus membros. A definição de desenvolvimento doprofessor como uma atividade a ser exercida unicamente pelosprofessores individuais limita muito seu potencial decrescimento.
Corroborando com a afirmação do autor, a docência compartilhada
possibilitou nosso crescimento profissional, uma vez que ao partilharmos nossos
olhares umas com as outras, tivemos nossos horizontes ampliados,
especialmente em relação à docência no ensino superior.
Após esse primeiro momento de discussões de textos como
embasamento teórico, alguns encontros foram destinados à discussão de
procedimentos metodológicos da pesquisa em educação, com o objetivo de
subsidiar o processo metodológico das atividades de campo, vinculadas aos
créditos práticos da disciplina. Nesses momentos as considerações,
contribuições, reflexões, indagações da docente foram importantes para a nossa
compreensão e reflexão sobre algumas questões: Por que estou pesquisando?
O que quero fazer com isso? De onde vem o nosso tema? Onde queremos
chegar? Em que queremos contribuir?
A partir dos diálogos compreendemos a importância da postura de
pesquisadores/as, a maneira e os cuidados ao nos aproximarmos de um espaço
e de um grupo que se pretende pesquisar; a razão, como e por que elaborar
uma Carta de Apresentação; o reconhecimento da importância do registro da
vivência em um diário de campo, a estrutura e finalidade do Termo de
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Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Esses momentos constituíram-se
como uma aproximação entre a prática docente e a pesquisa em educação, uma
vez que se faz importante conhecer as múltiplas possibilidades de atuação do
pedagogo em formação, como futuro professor, e que vivenciará e refletirá sobre
práticas relativas à pesquisa em seu fazer docente. Para nós, esses momentos
foram de grande riqueza uma vez que, enquanto estudantes-educadoras no
ensino superior, nos propusemos desenvolver pesquisa e gerar conhecimento
em uma área específica. Poder discutir sobre as práticas de pesquisa com
futuros professores em sua formação inicial e com eles apurar o olhar
investigativo, configurou-se como uma oportunidade para fortalecermos nossas
próprias formações, sinalizando a relevância de se rompeu com a dicotomia
entre ensino e pesquisa, em muitos momentos tão presentes no ensino superior.
Após essas primeiras orientações os estudantes iniciaram as inserções
nos espaços escolhidos, em que deveriam totalizar, ao final da disciplina, no
mínimo cinco inserções com duração de quatro horas cada uma. Nesse
momento, a disciplina estruturou-se, de acordo com o planejamento previsto, de
modo que os créditos práticos fossem intercalados aos créditos teóricos, a fim de
que após o início da atividade de inserção, houvesse momentos de encontro em
sala de aula para compartilhar as experiências, expor angústias, incertezas,
inquietações, avanços e retrocessos, dificuldades e busca de solucionar
problemas, se houvessem. Por se tratar de uma turma com elevado número de
estudantes, optamos por dividir a turma em grupos, de modo que em cada grupo
estivesse presente uma de nós, para assumirmos o papel de facilitadoras, no
diálogo e na orientação para as etapas seguintes do trabalho, formando-se
assim, rodas de conversas que viabilizassem um momento para a exposição das
experiências e das anotações nos Diários de Campo. De acordo com Ribas
(2000, p.38),
A formação inicial não é uma fase completa na vida doprofessor e sim uma primeira etapa: no entanto se ela prepararbem (desenvolvendo atitudes de disposição para o estudo,para a busca de referências na prática e para a investigação) oprofessor transporá os obstáculos do cotidiano escolar e terámaior segurança nas decisões, principalmente na fase desocialização que ocorre no ambiente de trabalho.
Finalizadas as inserções, os estudantes elaboraram um relatório, a partir
das orientações da docente sobre o trabalho de campo, no qual apresentaram o
espaço e o grupo onde se inseriram e a prática social que identificaram, bem
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como os processos educativos por ela desencadeados, em diálogo com os
autores estudados e as reflexões que ocorreram durante a disciplina. Por fim, os
estudantes foram reunidos em grupos de acordo com a afinidade dos espaços
escolhidos para a inserção e organizassem uma apresentação coletiva das
práticas sociais identificadas. A turma foi dividida em sete grupos, que
posteriormente foram nomeados pelos estudantes da seguinte maneira: 1 –
Esportes (academia de dança e luta, capoeira, escola de futebol e clube); 2 –
Espaços predominantemente masculinos (pescaria, torcida de futebol, escoteiro
e grupo de pedreiros); 3 – Corpo (aulas de dança, coral e rádio); 4 – Artes
Manuais (artesanato, pintura a óleo); 5 - Diversidade de religiosidade (grupo de
jovens, projetos voltados para atendimento de crianças carentes e casa de
umbanda); 6 – Agrupamentos estudantis (moradia estudantil e movimentos
estudantis); 7 – Idosos e terceira idade (asilos e espaços de atividade para
terceira idade). A busca por identificarem semelhanças entre as diferentes
práticas a fim de propiciar uma apresentação integrada, levou à percepção de
que as diferentes práticas por eles vivenciadas desencadeavam alguns
processos educativos comuns. O grupo da diversidade de religiosidade
identificou, por exemplo, que apesar dos diferentes espaços as práticas sociais
por eles identificadas apresentaram a solidariedade como um dos principais
processos educativos desencadeado. O grupo de esportes, por sua vez,
identificou a presença de processos educativos como disciplina, força de
vontade e respeito desencadeados nas diferenças práticas sociais esportivas, e
assim por diante.
A disciplina foi encerrada com uma roda de discussão onde todos
puderam refletir sobre o que consideraram ter ensinado e aprendido nas
diferentes etapas da disciplina, assim como trazer sugestões para aperfeiçoar as
próximas ofertas.
Consideramos que participar da disciplina PESCD representou um
significativo aprendizado para a nossa formação permanente e que para
atuarmos como professoras no nível superior é preciso considerar que a
atividade profissional de todo docente, conforme propõe Pimenta (2002), possui
uma natureza pedagógica, que se vincula a objetivos educativos de formação
humana e a processos metodológicos e organizacionais de construção e
apropriação de saberes e modos de atuação. Dessa forma, compreendemos que
para ensinar, o docente precisa assimilar conhecimentos e práticas que estejam
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além de seu raio de ação e conhecimento específico, e isso quase sempre não
acontece no ensino superior.
Alguns autores como Pimenta e Anastasiou (2002), Pimenta e Almeida
(2009), Cunha (2010) e Pimenta e Lima (2008), apontam para a necessidade de
uma Pedagogia Universitária. Nesta perspectiva, o Estágio de Docência PESCD
do curso de pós-graduação em Educação da UFSCar se constitui em um terreno
fértil a trazer contribuições tanto para a formação do professor do ensino
superior quanto para o pós-graduando, que ali está na condição de aprendiz da
profissão docente, particularmente, quanto aos aspectos pedagógicos e teórico-
metodológicos da aula.
Destacamos como pontos significativos dessa experiência as leituras e
discussões sobre as produções (sinopses, diários de campos e relatório), por
constituir-se como uma possibilidade de diálogo e compartilhamento de
diferentes olhares; o acolhimento dos estudantes, possibilitando que os
auxiliássemos em seus processos formativos e o fortalecimento de nossas
próprias formações, uma vez que pudemos vivenciar a licenciatura em nível
superior e consolidar conceitos importantes para a nossa linha de pesquisa.
Durante a avaliação da disciplina, constatamos que a experiência nos propiciou
o sentimento de estar aprendendo a sermos professoras, o que vai ao encontro
de Nóvoa (1997, p. 28):
Formar um professor é possível? Formar não, formar-se! Oprofessor forma a si mesmo através das suas inúmerasinterações, não apenas com o conhecimento e as teoriasaprendidas nas escolas, mas com a prática didática de todosos seus antigos mestres e outras pessoas, coisas e situaçõescom as quais interagiu em situações de ensino durante toda asua vida.
Portanto, percebemos não apenas a importância da existência de
disciplinas na pós-graduação que propiciem esse tipo de experiência, mas
também dessa vivência do fazer compartilhado, pois, como afirma Nóvoa (2011,
p. 6):
É muito importante a socialização profissional que é feita pelosmais experientes junto dos mais jovens. A transição de umacultura de isolamento para uma cultura colaborativa é umaspecto decisivo para os professores. Trabalho em equipe.Colaboração. Partilha. Sem isso, é impossível enfrentar osproblemas educativos atuais. Nem todos os professores sãoiguais. É preciso que haja referências dentro da profissão -aqueles professores que reconhecemos como profissionais de
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grande competência e dedicação e que devem ter um papel noenquadramento dos mais jovens.
Termos nos constituído enquanto grupo de trabalho no cursar e ministrar
essa disciplina fez dessa vivência uma experiência ímpar. Além de trabalharmos
colaborativamente em todo processo de planejamento, execução e avaliação da
disciplina junto com a docente responsável e das inúmeras trocas com os
estudantes da graduação, pudemos também vivenciar o trabalho docente
enquanto equipe, pois compartilhamos e dividimos entre nós essa experiência ao
longo da disciplina.
Durante uma roda de conversa para avaliarmos o processo, concluímos
que se trata de uma disciplina trabalhosa, por envolver diferentes procedimentos
e que a disciplina é desenvolvida a partir de um fio condutor e depende do
envolvimento e comprometimento de cada um, de um acompanhamento
individualizado, o que indica a importância de um número menor de estudantes
para que a qualidade da disciplina seja preservada.
A disciplina, devido à sua dinâmica, aponta para a possibilidade de
continuidade de trabalho, em outros espaços seja em forma de apresentação de
trabalhos por parte da doutoranda e professora regente, como também dos
estudantes que vislumbram participação em atividades de pesquisa e inserção
na pós-graduação. Isso se constitui como uma oportunidade por ela propiciada
de atrelar-se prática educativa com pesquisa, evidenciando que nem a formação
docente continuada, nem a formação inicial da graduação se esgotam na
realização das disciplinas. Pelo contrário, indica a relevância de tornarmos a
ação docente no ensino superior, como possibilidade de formarmos e nos
formamos professoras, de maneira compartilhada com os estudantes e com
professores experientes da universidade.
Algumas considerações
A constante atualização docente ao longo da carreira pressupõe
acompanhar o processo natural de transformações que ocorrem não apenas nas
escolas, mas em todas as áreas como um todo, especialmente nos tempos
atuais, uma vez que o conhecimento é produzido em escala vertiginosa. Nesse
sentido, a formação continuada de professores permite conhecer as novas
tecnologias, superar os obstáculos que se apresentam no fazer docente e
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também a troca de experiências com outros educadores possibilitando, assim, a
aprendizagem permanente de forma colaborativa.
A proposta do estágio supervisionado de capacitação docente para a
formação continuada de professores, oferecida no programa de pós-graduação
em Educação da UFSCar, é uma oportunidade que vivenciamos e que contribuiu
efetivamente para a nossa formação docente. Entendemos que a formação no
ensino superior não é suficiente para preparar um professor para exercer seu
ofício, pois esta construção se faz na prática e na reflexão sobre a prática.
Consideramos, neste relato, que as oportunidades de formação continuada são
constantes e não pontuais, de modo que os professores possam aplicar em seu
trabalho as vivências dos cursos, apresentar suas experiências e refletir sobre
elas. A reflexão a partir da prática é essencial ao processo de formação, pois se
esta não acontece os professores deixam de encontrar significado no que
aprendem em suas formações, não há, portanto, qualquer mudança em sua
prática profissional docente. (FREIRE, 1998).
A possibilidade de formação que tivemos ao participar na disciplina
PESCD evidenciou uma outra perspectiva de ensino e de aprendizagem, uma
vez que fomos alunas e professoras ao mesmo tempo. À Universidade cabe,
dessa forma, parte dessa tarefa, abrindo seus espaços para a inserção do aluno
e possibilitando que professores/as experientes tomem para si, a
responsabilidade pela orientação e supervisão da aprendizagem do ofício
docente pelo futuro professor.
A experiência vivenciada por nós e aqui relatada foi estimulante pelos
resultados, especialmente no que tange ao amadurecimento profissional, que
pudemos ver em nossa atuação, bem como em nossas pesquisas em educação.
Os encontros nos permitiram sermos alunas e professoras, indagar e responder,
aprender e ensinar, em um movimento cíclico, de constante troca e reflexão, em
uma relação horizontal entre os atores, pois o foco detinha-se no aprendizado de
todos. Acompanhar o processo de construção da disciplina, os pequenos grupos
de alunos em seus fichamentos e os processos de inserções nos espaços
sociais, mantendo diálogo permanente com a professora formadora, foi um
ganho para nossa formação enquanto docentes/discentes.
Foi possível compreender que a formação continuada de professores
para o ensino superior exige comprometimento, busca por caminhos alternativos
frente às dificuldades individuais dos estudantes, priorizando a realização das
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atividades propostas. Destacamos positivamente a possibilidade de
desenvolvimento profissional que disciplina nos ofertou, ao abrir espaços para
nossas falas, nossos desabafos e inúmeros questionamentos por meio do
diálogo entre todos os envolvidos na condução da disciplina. O Programa de
Capacitação Docente, associado à condução cuidadosa da professora
formadora, nos revelou um potencial promissor para a execução das ações
formativas em ensino superior. Nessa perspectiva, entendemos que o
reconhecimento do importante papel que o Programa de Capacitação Docente
tem na formação continuada de professores para o ensino superior, deve ser
divulgado/compartilhado como experiência formativa exitosa nos cursos de pós-
graduação, uma vez que promove experiências de formação, descortinando
dificuldades e ofertando possibilidades de aproximações entre ensino e
pesquisa.
Finalizando estas reflexões, concordamos com Cunha (1998) e Onofre
(2008), que se faz necessário o preparo dos docentes que atuam na educação
superior, uma vez que a pós-graduação stricto sensu não qualifica esse
profissional, e o mundo acadêmico, na maioria das vezes, enfatiza o valor da
pesquisa em detrimento do ensino. Embora a capacidade investigativa seja
condição fundamental para o professor universitário, há que se considerar que
os saberes da docência são distintos dos requeridos para a pesquisa, o que leva
o professor, em muitos casos, a tomar como base das suas decisões
pedagógicas as experiências que teve ao longo de sua formação estudantil. O
que se pode notar, é que persiste uma frágil formação pedagógica para o
exercício da docência no ensino superior – muitos professores apresentam bem
os conteúdos, mas desconhecem procedimentos que levem o estudante a ter
autonomia intelectual e a construir sua própria aprendizagem. Daí a relevância
de se buscar caminhos que conduzam à criação de novos estilos pedagógicos,
no convívio com as salas de aula dos cursos de graduação durante o curso de
pós-graduação – tais oportunidades foram vivenciadas ao cursar a disciplina
PESCD: de estar com os estudantes de graduação, de diálogo com os pares
(incluindo-se a docente experiente), do planejamento coletivo da disciplina, das
discussões sobre as aprendizagens dos estudantes e da nossa própria formação
docente.
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