Dicotomia Produtos e Servicos

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1 Uma análise crítica da dicotomia produto-serviço na gestão de operações (apresentado no Simpoi 2004) Carlos Corrêa e Henrique Corrêa Resumo Muitas teorias e conceitos desenvolvidos inicialmente para as operações de manufatura têm sido aplicados também às operações e aos processos destinados primariamente à prestação de serviços. Não obstante essa permeabilidade evidente entre os tratamentos dos produtos e dos serviços, permanece, na literatura, a citação de fatores de diferenciação básicos entre um e outro. Este artigo sustenta ser a dicotomia produto-serviço, não só pouco relevante, mas potencialmente prejudicial para a formulação estratégica e para o processo de tomadas de decisões das operações. Propõe, ainda, uma nova classificação de atributos para os pacotes de valor 1 que leve em conta os atributos subjacent es aos fatores diferenciadores apontados na literatura. Introdução A importância relativa dos três setores da economia, primário (agricultura e extrativismo), secundário (manufatura e processamento) e terciário (serviços), tem sido, por vezes, avaliada pela quantidade de empregos mantidos em cada um desses setores e ainda, em outras instâncias, pelo valor agregado de riquezas geradas pelos setores (PIB). Mais do que isso, o próprio estágio de desenvolvimento das economias tem sido avaliado pela posição que cada um desses setores ocupa. Clark (1957) argumentava, já na década de 50, que conforme as nações se tornam industrializadas, existe uma mudança inevitável do emprego de um setor para outro. Ainda, conforme os níveis de eficiência em um setor aumentam, a força de trabalho se movimenta de um a outro setor. Nações consideradas desenvolvidas apresentam hoje porcentagens acima de 70% de emprego no setor terciário, contrapondo-se ao declínio no setor secundário. No Brasil, a participação do setor de serviços, no emprego, corresponde a pouco mais de 55%, sendo responsável pela geração de cerca de 60% do Produto Interno Bruto. Paralelamente ao aumento da participação na economia, o setor dos serviços passa por profundas mudanças na forma de condução de seus negócios. Lovelock (1988) aponta para algumas das forças agentes dessas mudanças, entre elas, as inovações tecnológicas. Suas implicações incluem a criação de novos e melhores serviços, a capacidade de manter padrões de consistência, a substituição de homens por máquinas nas tarefas repetitivas e a participação crescente do cliente na própria execução dos serviços em auto-atendimento. O aumento das franquias substituiu ou absorveu um vasto arranjo de serviços antes atomizados em atividades que vão desde cabeleireiros e postos de escapamento automotivos, às redes mundiais de locação veículos, videolocadoras, restaurantes fast-food e provedores de internet. Trouxe também para o setor de serviços as necessidades de padronização nas operações como forma de buscar eficiência, com a compatibilização dos processos às necessidades de customização e volume. Nisso contribuíram os conceitos traduzidos por Hayes e Wheelwright (1984) na 1 O termo pacote de valor é utilizado aqui para significar um resultado dos processos da operação que é entregue ou oferecido ao cliente em contrapartida do preço pago. Os pacotes de valor compõem-se, normalmente, de parcelas constituídas por bens físicos ou não, varáveis conforme o tipo de negócio considerado.

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Uma análise crítica da dicotomia produto-serviço na gestão de operações

(apresentado no Simpoi 2004)

Carlos Corrêa e Henrique Corrêa

Resumo Muitas teorias e conceitos desenvolvidos inicialmente para as operações de manufatura têm sido aplicados também às operações e aos processos destinados primariamente à prestação de serviços. Não obstante essa permeabilidade evidente entre os tratamentos dos produtos e dos serviços, permanece, na literatura, a citação de fatores de diferenciação básicos entre um e outro. Este artigo sustenta ser a dicotomia produto-serviço, não só pouco relevante, mas potencialmente prejudicial para a formulação estratégica e para o processo de tomadas de decisões das operações. Propõe, ainda, uma nova classificação de atributos para os pacotes de valor1 que leve em conta os atributos subjacentes aos fatores diferenciadores apontados na literatura. Introdução A importância relativa dos três setores da economia, primário (agricultura e extrativismo), secundário (manufatura e processamento) e terciário (serviços), tem sido, por vezes, avaliada pela quantidade de empregos mantidos em cada um desses setores e ainda, em outras instâncias, pelo valor agregado de riquezas geradas pelos setores (PIB). Mais do que isso, o próprio estágio de desenvolvimento das economias tem sido avaliado pela posição que cada um desses setores ocupa. Clark (1957) argumentava, já na década de 50, que conforme as nações se tornam industrializadas, existe uma mudança inevitável do emprego de um setor para outro. Ainda, conforme os níveis de eficiência em um setor aumentam, a força de trabalho se movimenta de um a outro setor. Nações consideradas desenvolvidas apresentam hoje porcentagens acima de 70% de emprego no setor terciário, contrapondo-se ao declínio no setor secundário. No Brasil, a participação do setor de serviços, no emprego, corresponde a pouco mais de 55%, sendo responsável pela geração de cerca de 60% do Produto Interno Bruto. Paralelamente ao aumento da participação na economia, o setor dos serviços passa por profundas mudanças na forma de condução de seus negócios. Lovelock (1988) aponta para algumas das forças agentes dessas mudanças, entre elas, as inovações tecnológicas. Suas implicações incluem a criação de novos e melhores serviços, a capacidade de manter padrões de consistência, a substituição de homens por máquinas nas tarefas repetitivas e a participação crescente do cliente na própria execução dos serviços em auto-atendimento. O aumento das franquias substituiu ou absorveu um vasto arranjo de serviços antes atomizados em atividades que vão desde cabeleireiros e postos de escapamento automotivos, às redes mundiais de locação veículos, videolocadoras, restaurantes fast- food e provedores de internet. Trouxe também para o setor de serviços as necessidades de padronização nas operações como forma de buscar eficiência, com a compatibilização dos processos às necessidades de customização e volume. Nisso contribuíram os conceitos traduzidos por Hayes e Wheelwright (1984) na 1 O termo pacote de valor é utilizado aqui para significar um resultado dos processos da operação que é entregue ou oferecido ao cliente em contrapartida do preço pago. Os pacotes de valor compõem-se, normalmente, de parcelas constituídas por bens físicos ou não, varáveis conforme o tipo de negócio considerado.

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matriz volume-processo, desenvolvida originariamente para os processos de manufatura. Essa matriz, adaptada na Figura 1, mostra como o trade-off entre volume e variedade de produtos oferecidos é normalmente administrado, nas operações, através da adoção de processos convenientes na busca da eficiência de custos. Os processos convenientes para cada par volume x processo seriam os indicados na diagonal mostrada na figura.

Figura 1 – A matriz volume-processo.

Adaptada de Hill (1985) Focalização Nos serviços, um projeto conveniente das atividades de front-office e de back-office pode permitir à operação o atendimento de requisitos de desempenho às vezes conflitantes, focalizando o front-office na interação com o cliente enquanto, no back-office, o foco estaria na eficiência através da padronização dos processos e da programação dos eventos de forma semelhante ao praticado nos processos de manufatura. Skinner (1974) desenvolveu, para a manufatura, o conceito de focalização como forma de melhor competir: “focalizar cada planta num limitado, conciso e administrável conjunto de produtos, tecnologias, volumes e mercados”. Ainda, para uma operação que estivesse envolvida com vários diferentes produtos, tecnologias, mercados e volumes, propôs o conceito de fábrica-dentro-da-fábrica, na qual as facilidades existentes deveriam ser divididas organizacional e fisicamente em várias fábricas-dentro-da-fábrica, cada uma delas operando focalizadamente. Os mesmos conceitos são extensíveis aos serviços: uma empresa de transporte aéreo, por exemplo, divide fisicamente as suas aeronaves em classe econômica e business class para atender focalizadamente os requisitos de cada classe de passageiros. A divisão conveniente das atividades de front e back-office, buscando na primeira a interação com o cliente e na segunda a eficiência, pode também ser entendida pelos mesmos conceitos de Skinner (op. cit.). A permeabilidade dos conceitos entre os produtos e serviços é clara. Outra dimensão da focalização, também originalmente desenvolvida com vistas aos chamados produtos e aplicada também aos serviços conforme Johnston (1996), é dada por Hill (1985) com os conceitos de critérios qualificadores e ganhadores de pedidos. O cliente, para a decisão de compra, compara as várias opções com base em determinados critérios (preço, qualidade, velocidade, etc...). Segundo Hill (op. cit.), critérios qualificadores são aqueles considerados pelo cliente como condição sine qua non na decisão compra, ou seja, a menos que o produto em análise (pelo cliente) apresente um desempenho mínimo satisfatório (na avaliação do cliente) nesses critérios, a compra será descartada. Ainda, a superação do nível mínimo satisfatório, nos critérios qualificadores, não melhora as chances de compra de um produto. Critérios ganhadores de pedidos, por sua vez, são aqueles que decidem a opção do

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cliente pela compra. Quanto maior for o desempenho do produto nos critérios ganhadores de pedidos, maior será a chance de compra do produto. Conforme Hill (op. cit. apud Johnston), “as empresas podem prover suporte coordenado para as formas essenciais nas quais os produtos ganham pedidos” ou seja, as empresas deveriam focalizar seus esforços nos critérios ganhadores de pedidos, provendo níveis satisfatórios para os qualificadores. Brocas e furos No varejo, sistemas de atendimento ao consumidor são cada vez mais presentes. Nas relações B2B2, os serviços associados3 podem ser “descomoditizadores”4, isto é, podem diferenciar produtos que de outra forma competiriam somente em preço. Mais do que isso, podem ser agentes de fidelização que contribuem para o fluxo futuro de negócios. Isto porque o fluxo de negócios dependerá do fluxo de relacionamentos e, portanto, da retenção ou fidelização dos clientes. A fidelização, em mercados competitivos, segundo Heskett et al. (1997), ocorre somente com clientes que se sintam muito satisfeitos com o pacote de valor oferecido. Pesquisa de Johnston e Clark (2002) apontam que clientes que declararam níveis de satisfação inferiores a 4 (numa escala de zero a 5), estariam vulneráveis à troca de fornecedor. Serviços associados convenientemente oferecidos e entregues podem, portanto, aumentar o nível de satisfação do cliente com o pacote de valor, conduzir à fidelização e, assim, aumentar o fluxo de negócios. O potencial aqui é imenso e o racional é simples: um cliente quando compra uma broca, busca, na realidade, uma capacidade de gerar furos; quando compra uma impressora, busca uma capacidade de impressão de seus documentos. Empresas como a White Martins (fabricante de gases industriais que se restringia somente ao fornecimento dos cilindros de gás), fornecendo hoje serviços de oxi-corte e Hewlett Packard, disponibilizando centrais de cópias nos clientes, entre outras, são exemplos. As Redes de suprimentos Um outro aspecto da idéia de foco de Skinner (op. cit.), aumentada na abrangência e no escopo, pode ser identificado na focalização das operações nas suas competências centrais5 e 2 B2B é uma forma usual de se referir aos fornecimentos entre empresas. Na língua inglesa, B2B é foneticamente equivalente a B to B, abreviando “business to business” (negócio para negócio) 3 Serviços associados são serviços prestados em associação a produtos fornecidos, de forma a facilitar o uso ou aplicação destes. Um fabricante de ferramentas para usinagem, por exemplo, poderá associar à venda das ferramentas um serviço em que seus especialistas recomendam o melhor tipo de ferramenta para a aplicação. 4 O termo commodity é normalmente empregado pra designar produtos sem diferenciação em seus atributos independentemente da origem e portanto competem, via de regra, somente em preço, com margens pressionadas pelo mercado. O termo “descomoditizador” foi utilizado para denotar o efeito de um serviço, associado a uma commodity, poder gerar uma vantagem competitiva sobre os concorrentes (que não ofereçam o serviço associado), que permita ao fornecedor da commodity comandar preço maior que o praticado no mercado e, portanto, operar com margem maior. 5 Segundo Hamel e Prahalad (1994), competências centrais são aquelas que: 1. proporcionam uma contribuição desproporcional para o valor percebido pelo cliente; 2. apresentam um diferenciação sobre a concorrência; 3. quando sua posse tem papel importante na abertura de novos mercados e representam oportunidades para o futuro. Atividades que correspondessem a competências centrais não deveriam ser, portanto, desintegradas. Por outro lado, de forma a buscar o foco, as empresas poderiam terceirizar as atividades que não representassem competências centrais.

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modifica o perfil das redes de suprimentos. Em outras palavras, competências não centrais são desintegradas (terceirizadas) na busca não somente de economias de escala e escopo, mas também para ganhar acesso a competências particulares necessárias eventualmente não presentes na própria organização mas disponíveis no mercado. Como resultado dessas movimentações, Fitzsimmons et al. (1994) já citavam que, em pesquisa da National Association of Purshasing Management, 54% da compras nos Estados Unidos no final da década de 80 correspondiam a serviços e não a bens duráveis. As redes de suprimentos assim estabelecidas, com fornecimentos tanto de produtos como de serviços em bases continuadas, exigem mudanças profundas nas interações entre as partes, passando das transações simples de mercado puro aos relacionamentos de prazo mais longo caracterizados por uma troca mais intensa de informações e co-divisão das responsabilidades e destinos. A interação processo-cliente (caracterizada principalmente pelo fluxo de informações do cliente para o processo prestador), anteriormente tida como característica dos fornecimentos de serviços, joga aqui como fator principal do sucesso da rede, indistintamente se os produtos gerados pelos processos são bens ou serviços. Da mesma forma como a matriz volume-processo de Hayes (op. cit.), proposta para processos de manufatura, auxilia os gestores de operações tradiciona lmente de serviços a pensar seus processos de back-office, o esquema de classificação dos serviços baseado no contacto com o cliente, proposto por Chase (1978), originalmente desenvolvida para os chamados serviços, auxilia os gestores das operações a pensarem seus relacionamentos. Chase (op. cit.) propõe que os sistemas prestadores de serviços podem ser agrupados, de acordo com uma ordem decrescente de contacto com os clientes, em serviços puros, serviços mistos e quase manufatura. Serviços puros incluem as operações cuja produção ocorre na presença dos clientes (assistência médica, transporte, restaurantes, etc..); serviços mistos envolvem parcelas de contato face-a-face acopladas a atividades de back-office (sem a presença do cliente) – uma agência bancária, seria um exemplo; serviços de quase manufatura são aqueles cujas atividades ocorrem virtualmente sem o contacto com o cliente (um centro de distribuição, por exemplo). Segundo esse modelo, portanto, uma série de decisões gerenciais (localização, layout, competências dos funcionários, etc ...), depende do maior ou menor contacto com o cliente, necessário ou conveniente, para a entrega do pacote de valor. Evidentemente, uma operação com alto contacto com os clientes deveria, entre outras prioridades, estar localizada próxima a eles, ter seus layouts projetados para acomodar a presença dos clientes e ter seus funcionários com habilidades desenvolvidas para esses contatos. Nesse aspecto, o contato entre os processos e os clientes define as decisões gerencia is, independente dos pacotes de valor fornecidos terem característica de bens tangíveis ou não. Sasser et al. (1982), apud Jonhston (1993) já argumentavam que “quase todas as compras de produtos envolvem também compras de serviços e, de forma transposta, quase todas as compras de serviços envolvem a compra de produtos”. Corrêa e Caon (2002) apresentam um contínuo dos mix de elementos de “bens” e “serviços” oferecidos por várias operações. Como extremos de serviços puros, exemplificam operações como as dos serviços profissionais dos psicanalistas e, no outro extremo, como “bens” puros, operações como a de fornecimento de minério de ferro, que beiram o extrativismo do setor primário. É ainda claro, na literatura, o reconhecimento de que as operações devam fornecer como resultado de seus processos, composições de parcelas convencionalmente chamadas produtos e convencionalmente chamadas serviços. Igualmente, acadêmicos passam a tratar os dois temas de forma cada vez mais permeável. Portanto, para os gestores de operações, o domínio indistinto do

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conhecimento nos dois campos, dos convencionalmente chamados serviços e dos chamados produtos, é imprescindível sob pena de obsolescência profissional. A análise da literatura da qualidade fornece ainda observações interessantes sobre a tendência convergente entre as abordagens dos serviços e dos produtos. Enquanto Parasuraman et al. (1985), com o modelo de qualidade para serviços (SERVQUAL) procuram, de certa forma, objetivar a avaliação da qualidade dos serviços em termos dos gaps6 entre as expectativas e percepções quanto ao fornecimento, Garvin (1988) aponta, entre as oito dimensões7 da qualidade dos produtos, a estética e a qualidade percebida, não diretamente objetiváveis por medição. Uma última observação refere-se ao aspecto variabilidade entre os chamados fornecimentos de produtos e os chamados fornecimentos de serviços. Tradicionalmente estes eram tidos como peculiares pela alta variabilidade a que estavam expostos enquanto aqueles contavam com maior estabilidade que lhes proporcionava a chance de padronização. A primeira afirmativa, como já abordado, não é completamente verdadeira com as operações de serviço buscando a eficiência e a focalização pela separação entre atividades de front e back-office (como os banco, que procuram cada vez mais manter os clientes afastados dos processos através do incentivo ao atendimento nos caixas automáticos ou via internet). A segunda, igualmente, não encontra respaldo na realidade: cada vez mais produtos são oferecidos em níveis crescentes de variedade e as operações (de manufatura) buscam a flexibilidade de mix como forma de obter as vantagens da competição através da customização. As diferenças entre produtos e serviços tradicionalmente apontadas Não obstante as convergências de necessidades, de conceitos e até de ferramentas de análise que resultam em similaridades nas análises para as decisões gerenciais (entre os chamados produtos e os chamados serviços) a literatura tem, sistematicamente, apontado diferenças entre uns e outros (Bateson 1977, Berry 1980, Lovelock 1981, Shostak 1977, Parasuraman et. al. op. cit., Zeithaml 1981, Fitzsimmons op. cit., Johnston op. cit., Carmem e Langeard 1980, Gronroos 1978, Regan 1963, Upah 1980). As diferenças apontadas de várias formas, referem-se às características de:

1. Tangibilidade. Os produtos seriam tangíveis e serviços, intangíveis.

2. Heterogeneidade: Os serviços requereriam customização e, portanto, imporiam a interação com o cliente em pelo menos uma fase do processo. Os produtos não exigiriam a presença do cliente na sua fabricação.

3. Inseparabilidade: Os serviços seriam produzidos e consumidos simultaneamente,

enquanto que os produtos poderiam ser produzidos para consumo posterior.

6 Os autores propõem que a qualidade percebida pelo consumidor de um serviço é função da magnitude e da direção do gap (diferença) entre o serviço por ele esperado e sua percepção sobre o serviço recebido. Ainda, segundo os autores, esse gap seria função de 4 outros a saber: 1. Gap entre as reais expectativas do cliente e as percebidas pela gestão da operação fornecedora do serviço; 2. Gap entre as percepções da gestão e as especificações dos serviços geradas a partir delas; 3. Gap entre as especificações dos serviços e os serviços realmente entregues; 4. Gap entre os serviços realmente entregues e expectativas criadas pelas comunicações externas da organização (como propaganda, por exemplo). 7 São as seguintes as dimensões apontadas por Garvin (1988): Desempenho, Características, Confiabilidade, Conformidade, Durabilidade, Manutenção, Estética e Qualidade Percebida.

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Tangibilidade De acordo com o Novo Dicionário da Língua Portuguesa (A. B. de Holanda Ferreira, 1a. edição - 5a. impressão), tangível é o que pode ser tangido, tocado ou apalpado. Portanto, a tangibilidade é, a princípio, um diferenciador de propriedade física e, nesse aspecto, efetivamente diferencia o que se convencionou chamar serviços (intangíveis) do que se convencionou chamar produtos (tangíveis). Essa diferença física, no entanto, é irrelevante para a gestão das operações a menos que tenha conseqüências na formulação estratégica ou nos processos de decisão dela decorrente. Via de regra, a intangibilidade tem sido discutida na literatura pela dificuldade que traz na avaliação dos serviços. Seguem alguns exemplos: A maioria dos serviços é intangível (Bateson 1977, Berry 1980, Lovelock 1981, Shostak 1977, apud Parasuraman et. al. (op. cit.). “Porque eles [serviços] são desempenhos ao invés de objetos, especificações precisas [do tipo das] de manufatura com relação à qualidade uniforme podem raramente ser estabelecidas. A maioria dos serviços não pode ser contada, medida, estocada, testada e verificada antecipadamente à venda para a asseguração da qualidade. Por causa da intangibilidade, as empresas podem encontrar dificuldade em entender como os consumidores percebem os seus serviços e avaliar a qualidade dos seus serviços.” (Zeithaml 1981). “Serviços são menos tangíveis, tornando a avaliação por parte do fornecedor difícil de medir e as especificações do serviço desejado menos precisas. Além disso é difícil julgar se os serviços sendo fornecidos estão atingindo as expectativas por que eles não são objeto de escrutínio. Não há inspeção de recebimento de serviços como é o caso de bens materiais” ... “A natureza intangível dos serviços também apresenta um problema para os clientes. Quando compram um produto, o cliente é capaz de vê-lo, senti- lo e testar o seu desempenho antes de comprar” (Fitzsimmons op. cit.). Heterogeneidade A literatura tem apontado a customização e a conseqüente necessidade de interação com o cliente em pelo menos uma fase do processo como um fator de diferenciação entre produtos e serviços. Como conseqüência, os clientes de serviço, por estarem em contacto com os processos, valer-se-iam de suas percepções sobre esses processos (incluindo as pessoas dele participantes) para a formação de percepções sobre o desempenho dos serviços. São exemplos: [Nos serviços, as] “avaliações de qualidade não são feitas somente sobre a saída (outcome) do serviço; elas também envolvem avaliações sobre os processos de fornecimento.” (Parasuraman op. cit.). “A presença do cliente no local requer atenção ao envoltório físico das instalações de serviço que não é necessária para a manufatura. Para o cliente, serviço é uma experiência conduzida no ambiente das instalações de serviço. A [percepção da] qualidade do serviço é melhorada se as instalações são projetadas a partir da perspectiva do cliente”. “A interação entre os clientes e os empregados de serviços cria a possibilidade de uma experiência de trabalho humana mais completa. A natureza pessoal dos serviços está em completo contraste com a despersonalização do trabalho encontrada na manufatura” (Fitzsimmons op. cit.).

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“Executar um serviço envolve a montagem e a entrega de um mix de instalações físicas, equipamento e trabalho mental ou físico. Em muitas indústrias de serviços, clientes são envolvidos ativamente na ajuda à criação do serviço” ... “Muitos serviços são entregues em tempo real. Clientes têm que estar presentes para receber os serviços em muitos tipos de organizações” (Lovelock op. cit.). “Organizações de serviços, mais freqüentemente do que não, tem que lidar diretamente com grande número de clientes. Nesse modo, elas diferem das empresas de manufatura que tendem a ficar isoladas do usuário final do produto por um pequeno número de intermediários (geralmente pessoal de serviço).” (Johnston op. cit.). Inseparabilidade É a propriedade, atribuída pela literatura aos serviços, de terem simultaneidade entre sua produção e consumo. As conseqüências apontadas da inseparabilidade seriam basicamente a impossibilidade de formação de estoques e a impossibilidade de se executar inspeção da qualidade do produto acabado nos serviços. A seguir estão alguns exemplos: “A produção e o consumo de muitos serviços são inseparáveis (Carmem e Langeard 1980, Gronroos 1978, Regan 1963 Upah 1980 apud Parasuraman op. cit.). Como conseqüência, a qualidade nos serviços não é fabricada e entregue intacta ao consumidor. Em serviços intensivos em mão-de-obra, por exemplo, a qualidade ocorre durante a entrega do serviço, usualmente numa interação entre o cliente e o pessoal de contacto da empresa de serviço (Lehtinen e Lehetinen 1982, também citados em Parasuraman op. cit.). As empresas de serviço podem também ter menos controle gerencial sobre a qualidade nos serviços onde é intensa a participação dos clientes.” (Parasuraman op. cit.). “O fato dos serviços serem criados e consumidos simultaneamente e assim não poderem ser estocados é uma característica crítica para a gestão dos serviços. A inabilidade de estocagem para os serviços impede o uso de estratégias tradicionais de serviços de confiar nos estoques como um amortecedor para absorver as flutuações da demanda... a produção e o consumo simultâneos também eliminam muitas oportunidades para intervenções de controle da qualidade. Diversamente da manufatura, onde os produtos são inspecionados antes da entrega, os serviços devem confiar em outras medidas para garantir a consistência das saídas.” (Fitzsimmons op. cit.). “Produtos manufaturados podem ser verificados antes que deixem a fábrica, bem antes de atingirem o consumidor. Mas, muitos serviços são consumidos conforme são produzidos, com a montagem final ocorrendo sob condições de tempo real. Nesses tipos de serviço, onde o front-office é a parte dominante da operação de serviços, o consumidor literalmente adentra a fábrica ; ambos, cliente e fornecedor tornam-se partes integrantes da experiência de serviço. Esses fatores tornam difícil para as organizações de serviço controlar a qualidade e oferecer uma consistência da saída ... O equipamento, as instalações e a mão-de-obra devem ser mantidos em prontidão para a criação dos serviços, mas isso significa somente capacidade produtiva e não produção em si. Capacidade não utilizada é um desperdício de ativos. Demandas que excedam à capacidade em servir em qualquer tempo representam perdas de lucro que não podem ser mais recuperadas.” (Lovelock op. cit.)

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“Como a produção e o consumo dos serviços são simultâneas, serviços não podem ser estocados. Portanto, um conjunto comple to de considerações importantes para a manufatura, o uso de estoques e a habilidade de backlogs físicos são perdidos [nos serviços]” (Johnston op. cit.). Problemas das diferenciações presentes na literatura A análise crítica das três diferenças tradicionalmente apontadas entre os produtos e os serviços será aqui feita levando em conta, para cada uma, a sua amplitude de aplicação e a sua relevância na condução das análises e decisões gerenciais no âmbito das operações. A análise critica, com o exercício de racional lógico, tem por objetivo a contribuição na busca de taxonomia mais conveniente que a atualmente apontada na literatura para os pacotes de valor resultantes dos processos das operações. Tangibilidade: a intangibilidade dos serviços é apontada na literatura como tendo impacto sobre a facilidade dos clientes em avaliar a qualidade dos serviços, impondo, ainda, dificuldades aos fornecedores no estabelecimento de padrões de qualidade e mesmo de entendimento das necessidades ou exigências dos clientes no planejamento dos serviços a serem prestados. A intangibilidade dos serviços impõe às operações e aos clientes a dificuldade da avaliação objetiva da qualidade. Essa dificuldade não é prerrogativa exclusiva dos chamados serviços e está também presente em muitos produtos. Obras de arte , por exemplo, são bens tangíveis e têm a sua avaliação dificultada, assim com a têm todos os produtos que competem nas dimensões estéticas. É reconhecido que produtos também podem adquirir vantagens competitivas com base em qualidade percebida, onde critérios objetivos completos não existem e, neste caso, embora tangíveis como produtos, são avaliados também por critérios não objetivos como, por exemplo jóias, objetos de arte e mesmo automóveis. As drogas, as vacinas, os equipamentos de segurança, e tantos outros bens tangíveis são também de difícil avaliação objetiva pelos consumidores, sendo as suas decisões de compra norteadas muitas vezes por recomendações e credenciais, critérios freqüentemente correlacionados a decisões de compras dos chamados serviços. Por outro lado, uma vasta gama do que convencionalmente se chama serviços, embora intangíveis, têm avaliação bastante fácil e até objetiva por parte dos consumidores. Um consumidor pode avaliar de forma bastante segura, por exemplo, a qualidade da lavagem de seu veículo, mesmo antes da execução do serviço, pela simples observação da qualidade da lavagem dos veículos que estão saindo à sua frente. Esse mesmo consumidor, no entanto teria muita dificuldade em avaliar objetivamente um pára-quedas para seu hobby ou o air-bag de seu veículo. Com base neste racional, concluímos que a tangibilidade, embora seja fator de diferenciação física entre o que se convencionou chamar produtos e o que se convencionou chamar serviços, não os diferencia no que tange às decisões gerenciais. Heterogeneidade: a heterogeneidade é a característica atribuída aos serviços de requererem customização. Seria cada cliente diferente, em suas exigências e necessidades, do anterior e do próximo. A necessidade de customização imporia nos serviços, a interação cliente-processo em pelo menos alguma das fases da prestação onde a interação ocorresse. As implicações na gestão das operações quanto à heterogeneidade ocorrem em duas dimensões: a primeira ocorre pela necessidade de uma predisposição à customização conforme necessidades e exigências do cliente, contrapondo-se ao conceito de padronização das atividades que contribuiria com a eficiência dos processos; a segunda ocorre pela interação do cliente-processo, implicando na necessidade de atenção gerencial aos processos e ao próprio ambiente onde os processos são desenvolvidos, por serem estes formadores das percepções.

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Novamente, concluímos não ser a heterogeneidade, com suas implicações na gestão, prerrogativa dos chamados serviços. Tampouco a heterogeneidade diferencia o que se convencionou chamar produtos do que se convencionou chamar serviços. Evidentemente, alguns pacotes de valor têm, na sua produção, pouca ou nenhuma interação entre processo prestador e cliente e, além disso, são fornecidos com pouca ou nenhuma customização - uma caneta é um exemplo. Por outro lado, o pacote de valor fornecido por um psicanalista requer, não só a presença do cliente em todo o processo, como exige um grau bastante elevado de customização. Embora o primeiro exemplo tradicionalmente se chama de produto e o segundo, de serviço, a diferenciação poucas vezes é dicotômica em termos da heterogeneidade. Inúmeros bens tangíveis requerem customização e precisam contar com a interação cliente-processo em sua produção (o terno sob-medida que uso, por exemplo) e inúmeros intangíveis têm os clientes distantes de seus processos e são pouco customizados (a novela que assisto, por exemplo). Pacotes de valor, portanto, exigirão, no seu fornecimento, diferentes graus de interação cliente-processo e diferentes graus de customização, independentes de serem eles constituídos de bens tangíveis (convencionalmente, produtos), bens intangíveis (convencionalmente, serviços) ou suas composições. A heterogeneidade não é, conseqüentemente, prerrogativa dos chamados serviços e não está ausente nos chamados produtos. É, portanto, uma característica que não os diferencia principalmente, de forma dicotômica, como a literatura faz crer. Inseparabilidade: é a característica atribuída aos chamados serviços e que impõe que seu consumo seja simultâneo à produção. Interessam, nesta análise, as implicações que essa característica vem a ter sobre as decisões gerenciais. A imposição da produção simultânea ao consumo, evidentemente, impacta as decisões referentes à compatibilização entre a produção e a demanda das operações. De maneira genérica, três estratégias de compatibilização estarão à disposição dos gestores, designadas aqui por: seguimento da demanda, nivelamento da demanda e gestão da demanda. No seguimento da demanda, as variações de demanda deverão ser acompanhadas pela disponibilização dos recursos de produção da operação. A flexibilidade de volume dos recursos determinará a capacidade de seguimento. No nivelamento da demanda, a formação de estoques permite a compatibilização de demandas variáveis a níveis de produção razoavelmente estáveis. Na gestão da demanda, por sua vez, a operação procura influir na demanda de forma a torná- la compatível aos recursos de produção disponíveis – as promoções de vendas são um exemplo de gestão da demanda. A Figura 2 ilustra os três conceitos:

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Figura 2 – Oportunidade de gestão da capacidade / demanda Evidentemente que, no fornecimento de pacotes de valor cujo consumo fosse simultâneo à produção, a estratégia do nivelamento da demanda tornar-se-ia inviável, por não ser possível a formação de estoques. É certo que muitos dos chamados serviços têm o consumo simultâneo à sua produção e, portanto, não permitem a formação de estoques de nivelamento. Mas, devemos também considerar que muitos dos chamados produtos também não permitem a formação desses estoques e, portanto, sobre eles, a estratégia do nivelamento também não pode ser aplicada. A gestão da capacidade de produção desses produtos seria, então, bastante semelhante à daqueles chamados serviços. Todos aqueles bens tangíveis cujos tempos de vida fossem inferiores às ciclicidades da demanda ou que, por restrições tecnológicas, o armazenamento fosse inviável (energia elétrica em níveis altos, por exemplo) estariam entre os que a aplicação do nivelamento seria impossível. Considerando que, para a infinidade dos bens tangíveis produzidos, os seus tempos de vida variam desde segundos (um café expresso, por exemplos) até uma eternidade (os diamantes são eternos), a dificuldade de formação de estoques de nivelamento, para cada tipo de bem produzido, variaria também, num contínuo, desde a completa impossibilidade até a trivial exeqüibilidade. A inseparabilidade, portanto, sob o ponto de vista gerencial, não seria, então, atributo dos chamados serviços, mas impactaria igualmente esses e os chamados produtos, de uma forma crescente, quanto menores fossem os tempos de vida comparativamente às ciclicidades da demanda. A inseparabilidade, portanto, no âmbito da gestão das operações, não diferencia os convencionalmente chamados produtos daqueles convencionalmente chamados serviços. A inseparabilidade também, conforme a literatura, impediria o controle da qualidade do produto acabado, estando as oportunidades de controle restritas ao controle dos processos de fornecimento. Evidentemente, um atendimento num call-center (tradicionalmente, um serviço) não permitiria um controle do produto acabado (do próprio atendimento). No entanto, um serviço de reparo automotivo (também tradicionalmente um serviço) o permitiria. O mecânico poderia, após o término do reparo, e antes de entregar o veículo reparado ao cliente, proceder a um test-drive, quando uma desconformidade poderia ser identificada e reparada antes da entrega. Neste caso, como em muitos outros, embora o reparo automotivo seja tradicionalmente considerado um serviço, o seu consumo não é simultâneo à execução. Mutatis mutantis, na manufatura, o controle da qualidade é, via de regra, mais conveniente quando executado sobre os processo que sobre os produtos acabados. Portanto, embora a maioria dos produtos manufaturados permita o controle sobre o produto acabado, os esforços de programas como os da Qualidade Total, têm sido por controlar os processos, evitando que falhas resultem em produtos finais não conformes. Novamente, vê-se que a inseparabilidade não é uma característica biunívoca que diferencie os chamados produtos dos chamados serviços. Isso porque os seus efeitos sobre as decisões gerenciais (dificuldade de estocagem e inconveniência no controle do produto acabado) não são prerrogativas dos chamados serviços, atingindo também os chamados produtos nas condições aqui expostas. Nenhum dos três fatores (tangibilidade, heterogeneidade e inseparabilidade) apontados pela literatura como diferenciadores entre os chamados serviços e os chamados produtos

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é, portanto, prerrogativa dos primeiros e, tampouco, estão os segundos livres dos impactos desses fatores nas decisões gerenciais. A separação entre produtos e serviços através desses fatores carece, portanto, de sentido, pelo menos do ponto de vista da gestão da operação que os gera. No âmbito gerencial, carece ainda de sentido a própria separação entre produtos e serviços, na medida que, nas relações de troca entre cliente e fornecedor, um não estará separado do outro. Tanto a formulação estratégica quanto as decisões decorrentes deveriam, então, considerar o pacote de valor como um todo. Uma classificação para os atributos do pacote de valor Tangibilidade, heterogeneidade e inseparabilidade, portanto, como mostrado, não conduzem à diferenciação entre produtos e serviços. No entanto, os conceitos subjacentes a elas trazem importante contribuição tanto para a formulação estratégica quanto para o apoio às decisões relacionadas à produção e à entrega dos pacotes de valor. Das discussões prévias resulta que, independentemente dos objetos de troca serem bens tangíveis ou intangíveis, as decisões gerenciais relativas à sua produção e entrega dependerão da análise dos atributos do pacote de valor produzido e entregue quanto ao:

a) grau de estocabilidade

b) grau de intensidade e extensão da interação com o cliente

c) grau de objetivação na análise do desempenho

d) grau de simultaneidade entre produção e consumo Grau de estocabilidade É um atributo cujo conceito é subjacente ao da simultaneidade da literatura. Este atributo, no entanto, depende tão somente da maior ou menor facilidade na adoção da estratégia de nivelamento da demanda para a produção e entrega do pacote de valor em análise, independentemente se os produtos (entendidos aqui com resultados dos processos) são bens tangíveis ou não. Tanto maior será o grau de estocabilidade quanto maior for a facilidade que o pacote de valor e seu fornecimento apresentarem quanto à possibilidade de utilização de estoques de nivelamento. Grau da intensidade e extensão da interação com o cliente É um atributo cujo conceito é subjacente ao da heterogeneidade da literatura. Todo processo de geração e entrega de pacote de valor implica, em maior ou menor grau, em troca de informações. As informações trocadas entre fornecedor e destinatário (cliente) ocorrem em dois sentidos: do fornecedor para o cliente e do cliente para o fornecedor. As trocas podem ser analisadas pelas dimensões de extensão e intensidade das informações trocadas. A extensão das informações é medida pelo tempo que perdura a troca no relacionamento cliente-fornecedor e pela quantidade das informações trocadas. A intensidade, por sua vez, é medida pela profundidade (riqueza, detalhamento, etc) das informações trocadas e pela necessidade de customização na geração do pacote de valor. Embora as características de troca das informações cliente-fornecedor sejam relevantes em ambos os sentidos, são as ocorridas no

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sentido do cliente para o fornecedor que determinam o grau de intensidade da interação e, portanto, da customização do fornecimento. O grau da intensidade e extensão da interação com o cliente dependerá tanto das características intrínsecas do pacote de valor quanto da estratégia pretendida para a sua produção e entrega, independendo de ser o pacote em análise um bem tangível ou intangível. Pacotes de valor que se pretendam, por exemplo, ser customizados, requereriam alto grau de intensidade no relacionamento. Por outro lado, pacotes de valor cuja estratégia permita um fornecimento de forma massificada teriam essa exigência atenuada. Grau de objetivação na análise do desempenho É um atributo cujo conceito é subjacente ao da tangibilidade da literatura. Alguns pacotes de valor, conforme já discutido, possuem características que lhes dificultam a avaliação de desempenho. A medida dessa dificuldade é o grau de objetivação. Pacotes de valor com baixo grau de objetivação exigirão, certamente, formulação de estratégias diferentes para o seu fornecimento comparativamente àqueles que apresentem alto grau de objetivação, independentemente de serem, estes ou aqueles, bens tangíveis ou não. Grau de simultaneidade entre produção e consumo Este atributo traz conceitos subjacentes tanto a tangibilidade quanto à simultaneidade apresentadas na literatura. Determinados pacotes de valor, dadas suas características de fornecimento, têm baixo grau de estocabilidade e, no entanto não têm o seu consumo simultâneo à produção. Um exemplo é o serviço de reparação automotiva (ou um serviço terceirizado de limpeza de um banco ou hospital). Evidentemente, nenhum desses pacotes de valor pode ser estocado (não é possível estocar reparos automotivos, por exemplo) e, no entanto, o consumo não é simultâneo à produção (então, é possível o controle do produto acabado). Processos de manufatura, por sua vez, têm o controle de produto acabado ou inviável ou inconveniente, exigindo dos gestores a opção pelo controle dos processos. A adoção de uma ou outra forma de controle (processo ou produto acabado) dependerá das características dos processos de fornecimento e não propriamente de serem os pacotes de valor bens tangíveis ou não. Conclusões: A literatura tem apresentado a tangibilidade, a heterogeneidade e a inseparabilidade como fatores de diferenciação entre produtos e serviços. Consideramos, no entanto, que esses fatores não são prerrogativas do que se convencionou chamar de serviços ou produtos, pois não são atributos exclusivos destes ou daqueles objetos de fornecimento, como se demonstrou. Além disso, esses atributos, como diferenciadores, conforme constantes na literatura, não contribuem para a formulação estratégica ou para a tomada das decisões dela decorrentes nas operações. Não obstante a inconveniência da utilização desses fatores como diferenciadores entre produtos e serviços, e mesmo a carência de sentido da diferenciação em si, consideramos que os conceitos subjacentes à tangibilidade, à heterogeneidade e à inseparabilidade fornecem uma base para a proposição de uma classificação para os pacotes de valor, baseada em:

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a) grau de estocabilidade

b) grau de intensidade e extensão da interação com o cliente

c) grau de objetivação na análise do desempenho

d) grau de simultaneidade entre produção e consumo A classificação proposta constitui taxonomia relevante pois contribui para a definição dos conteúdos e processos da formulação estratégica e para a análise nos processos de tomada de decisões das operações. Referências: Bateson, J. E. G. “Do We Need Service Marketing”,?” in Marketing Consumer Services: New Insights, Cambrige, MA: Marketing Science Institute, Report # 77-115, 1977 Barry, L. L.”Services Marketing is Different,” Business, 30 (May-June), 24-28, 1980 Carmen, J. M. e Bitner, M.J. “Growth Strategies of Service Firms,” Strategic Management Journal, 1 (January-March). 7-22, 1980 Chase, R.B.”Where Does the Customer Fit in the Service Operation?”.Harvard Business Review. Vol. 56 ,1978. Clark, C. The Conditions of Econonomic Progress. 3rd ed. London: The MacmillanCo., 1957 Corrêa, H.L. e Coon, M. Gestão de Serviços. São Paulo: Atlas, 2002 Fitzsimmons, J. A. e Fitzsimmons, M. J. Service Management for Competitive Adbantage, New York: McGraw-Hill, 1994 Garvin, D.A. Managing Quality. New York: The Free Press, 1988 Gronroos, C. “A Service-Oriented Aproach to Marketing Services,” European Journal of Marketing, 12 (no. 8), 588-601, 1978 Hamel, G. e Prahalad, C.K. Competing for the Future. Boston: JBRP, 1994 Hayes, R.H. e Wheelwright, S.C. Restoring our Competitive Edge. New York: John Wiley ansd Sons, 1984 Heskett, J.; Jones, T.O.; Loveman, G.W.; Sasser, W.E. The Service Profit Chain. New York: Free Press, 1997. Hill, T. Manufacturing Strategy, Basingstoke: Macmillan, 1985 Johnston, R. “Products and Services – A Question of Visibility” , London: The Service Industries Journal, Vol 13, No. 3. July 1993, pp.125-133

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