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    2PROPOSTA PEDAGGICA

    DILOGOS CINEMA E ESCOLALAURA MARIACOUTINHO1

    APRESENTAO

    Antes do cinema, voc olhava para a sua vida da mesma forma

    que um despreparado ouvinte de um concerto ouve a orquestra

    executando uma sinfonia. O que ele ouve apenas a melodia

    principal, enquanto que todo o resto se confunde num rudo

    geral. Somente os que conseguem distinguir a arquitetura dos

    contrapontos de cada trecho da partitura que podem real-

    mente entender e apreciar a msica. E assim que vemos a

    vida: s a melodia principal chega aos olhos. Mas um bom filme,com seus close-ups, revela as partes mais recnditas de nossa

    vida polifnica, alm de nos ensinar a ver os intrincados deta-

    lhes visuais da vida, da mesma forma que uma pessoa l uma

    partitura orquestral.2

    Voc entra numa sala de cinema, apagam-se as luzes, ilumina-se a

    tela. Uma sucesso de imagens, cores, luzes, sombras e sonoridades

    preenche o espao e voc, junto aos personagens que compem a histria

    que se desenrola sua frente, reconstri aquela narrativa cinematogrfica.

    Um filme sempre visto como se fosse a primeira vez, mesmo que voc o

    tenha visto antes, ou ainda que o veja depois. A linguagem cinematogrfica

    conduz o espectador a um tempo inaugural, sempre no presente. Primeiro

    1 Professora da Faculdade de Educao da Universidade de Braslia, Doutora em Educao na rea Educao, Conhe-cimento, Linguagem e Arte pela UNICAMP. Consultora desta srie.

    2 Balzs, Bela. A face das coisas. Em: Xavier, Ismail. (org.)A experincia do cinema. Rio de Janeiro: Graal/Embrafilme,1983, p. 90.

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    a escurido, minutos depois a luz se faz. Tudo se passa, ento, como se o

    filme, ao apreender determinado tempo, pudesse transform-lo em um

    eterno presente. E para esse presente que o espectador transportado a

    cada nova projeo. As pessoas vo ao cinema em busca do tempo, do tempoperdido da histria, do tempo das muitas histrias que os filmes contam.

    Este, talvez, seja o maior poder do cinema: o de enriquecer a experincia

    viva e presente de uma pessoa3.

    Por isso, posso dizer que o filme est sempre no presente, mesmo

    quando procura retratar histrias acontecidas em tempos remotos. Assim,

    o cinema inaugura uma maneira nova de estar e de olhar para o mundo e,

    mais ainda, estabelece uma nova forma de inteligibilidade. Depois do cinema,

    as pessoas passaram a contar com um instrumento poderoso de

    conhecimento do mundo, de si prprias, do comportamento humano, de

    lugares, de situaes, da histria. Jamais o homem esteve to exposto com

    todas as suas virtudes e mazelas como no cinema.

    Pela fora que a imagem visual adquiriu, as narrativas do cinema so

    aquelas que, em quantidade e intensidade, povoam a imaginao de um

    nmero significativo de pessoas; personagens de filmes passam a compor

    certo imaginrio coletivo, de tal forma que transcendem o universo ficcionale, como figuras exemplares de virtudes ou de vcios, transitam pela vida de

    quem anda pela cidade, pela escola, pela academia e institutos de pesquisa,

    de quem v televiso.

    , sobretudo, por meio do aparato televisivo emissoras com canais

    abertos e por assinatura e, ainda, com o videocassete que o cinema, os

    filmes e seus personagens expandiram as possibilidades de exposio,

    alcanando nveis antes inimaginveis. Se por um lado o cinema perdeu o

    requinte da projeo em tela branca na sala escura, com acstica apropriada,

    com um nmero reduzido de lugares, por outro ganhou a rua, a escola, a

    casa, o ambiente de trabalho, a sala de espera.

    Depois dessa pequena digresso, retomo a reflexo que fazia sobre a

    linguagem do cinema, que tem como elemento essencial a realidade, ainda

    que esta seja, quase sempre, criada em estdios. Algumas cenas de filme so

    rodadas em ambientes naturais que no foram criados originalmente para o

    3 Ver o livro de Andrei Tarkoviski.Esculpir o tempo.So Paulo: Martins Fontes, 1998.

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    cinema, mas servem como locais onde a narrativa se desenrola. So as

    filmagens feitas em locaes que podem estar a quilmetros dos locais onde

    se passa a histria que o filme quer contar. As locaes e os cenrios artificiais

    dos estdios cinematogrficos procuram reproduzir a realidade com toda averossimilhana possvel. Mais do que uma realidade composta de elementos

    reconhecidos, identificados, verdadeiros, o cinema cria imagens e sons que

    possam construir para o espectador uma sensao de realidade. Assim, o

    cinema cria uma linguagem que expressa o real, com toda a multiplicidade

    de aspectos que o compem. Muitos destes aspectos no so vistos ou ouvidos

    objetivamente, so apenas sugeridos. Alguns podem ser encontrados no

    espao que Gilles Deleuze chamou de extra-campo ou espao-of f4.

    Para Pier Paolo Pasolini, o cinema no evoca a realidade como a lngua

    da literatura; no copia a realidade como a pintura; no mima a realidade

    como o teatro. O cinema reproduza realidade: imagem e som! E reproduzindo

    a realidade, que faz o cinema ento? Expressa a realidade pela realidade.5 E

    ainda a Pasolini, j em outro texto, que recorro para falar desse novo olhar que

    o cinema cria: Nada como fazer um filme obriga a olhar as coisas. O olhar de

    um literato sobre uma paisagem, campestre ou urbana, pode excluir uma

    infinidade de coisas, recortando do conjunto s as que o emocionam ou lhe

    servem. O olhar de um cineasta sobre a mesma paisagem no pode deixar,

    pelo contrrio, de tomar conscincia de todas as coisas que ali se encontram,

    quase as enumerando. De fato, enquanto para o literato as coisas esto

    destinadas a se tornar palavras, isto , smbolos, na expresso de um cineasta

    as coisas continuam sendo coisas: os signosdo sistema verbal so portanto

    simblicos e convencionais, ao passo que os signos do sistema cinematogrfico

    so efetivamente as prprias coisas, na sua materialidade e na sua realidade.6

    O cinema feito de imagens e sons em seqncia e, embora seexpressando por meio da realidade, convencionou uma linguagem que revela

    um modo de ver completamente artificial, criado atravs do olhar ciclpico

    4 O extra-campo pode ter duas naturezas distintas: umaspecto relativo, atravs do qual um sistema fechado remete noespao a um conjunto que no se v e que pode, por sua vez, ser visto, com o risco de suscitar um novo conjunto visto,ao infinito; umaspecto absoluto, atravs do que o sistema fechado se abre para uma durao imanente ao todo douniverso, que no mais um conjunto e no pertence ordem do visvel. Deleuze, Gilles. Cinema: a imagem-

    movimento.So Paulo: Brasiliense, 1985, p.29.5 Pasolini, Pier Paolo.Empirismo Hereje.Lisboa: Assrio e Alvim, 1982, p. 107.6 Pasolini, Pier Paolo. Gennariello: a linguagem pedaggica das coisas. In:Os jovens infelizes: antologia de ensaios

    corsrios.So Paulo: Brasiliense, 1990.

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    das cmeras e de todo o aparato tecnolgico que est presente desde o

    momento da captao das imagens at o instante em que surgem,

    iluminando as telas e contando todos os tipos de dramas, comdias,

    tragdias, reais ou fictcias. As inmeras possibilidades do olhar que cmeracriou, as mltiplas formas de aproximao e distanciamento que vo dos

    enormes planos gerais ao close-up7, os enquadramentos e movimentos que

    as novas tecnologias de captao de imagens permitem, quando percorrem

    grandes distncias indo de um ponto de vista a outro na mesma tomada,

    deram origem linguagem cinematogrfica atual e, ao mesmo tempo

    alteraram irreversivelmente a prpria percepo visual das pessoas e por

    isso a prpria realidade em que vivem.

    Tudo isso aconteceno mesmo espao 4x3 das telas, que permanece

    inalterado enquanto coisas, pessoas, detalhes aumentam ou diminuem

    frente do espectador, que est acostumado com a forma de expressar que o

    cinema inventou, pois j nasceu mergulhado nesse universo de imagens

    criadas pela linguagem cinematogrfica. As cabeas decepa das do incio

    do cinema j no surpreendem mais8. Porque o espectador aprendeu, cedo,

    como todas as pessoas com as quais convive, a decifrar os cdigos do cinema

    que perpassam as relaes da sociedade contempornea.

    Todo espectador capaz de perceber, identificar e reconstituir, por

    inteiro, a imagem que se apresenta fragmentada na tela, um big close

    hoje to natural quanto qualquer figura que aparece inteira na tela. Posso

    dizer que natural apenas no cinema, pois essa no uma experincia que

    as pessoas possam ter sem contar com os aparatos de captao e tratamento

    de imagem cmera, lentes, gravadores, editores. A linguagem

    cinematogrfica o resultado de um processo de elaborao que envolveu

    muitas escolhas e precisou de certo tempo para tornar-se a linguagem globalque hoje. Jean-Claude Carrire9conta que, no incio do cinema, para que

    7 Plano para a linguagem cinematogrfica pode significar duas coisas: primeiro a composio de cada imagem que, deacordo com enquadramento e distncia do assunto, pode ser classificada em: plano geral, plano de conjunto, planoamericano, primeiro plano, plano detalhe; e, ainda, o espao-tempo contido em uma nica tomada.

    8 Massimo Canevacci, citando Bla Balzs diz que este usa palavras cheias e comoo para descrever a descoberta doprimeiro plano, por ele atribuda a D.W. Griffith, que inventou tambm a montagem alternada. Graas fisionmica, ocinema exalta a correspondncia entre os sentimentos interiores at os mais escondidos do homem e os traos do rosto:

    os movimentos da alma impressos, marcados no cdigo facial que, de tal modo, se torna a mscara da tela. (...) Noprimeiro plano freqentemente est a dramtica revelao daquelo querealmentese esconde na aparnciado ho-mem. Antropologia da comunicao visual.So Paulo: Brasiliense, 1990.

    9 Carrire, Jean-Claude.A linguagem secreta do cinema.Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1995.

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    espectadores entendessem a narrativa, havia a figura do explicador, uma

    pessoa que, postada ao lado da tela, ia fazendo a relao entre as imagens e

    contando a histria.

    Ningum v enquadrado, ou mesmo se aproxima de tal maneira decoisas e pessoas para captar determinados detalhes que compem muitas

    narrativas flmicas. So lentes especiais que realizam esse trabalho. Essa

    naturalizao da linguagem faz que no haja uma maior preocupao com

    ela. Ver um filme algo trivial para algum que nasceu no sculo passado.

    O olhar enquadrado parte essencial e corriqueira do viver contemporneo,

    mas requer uma infinidade de tcnicos e profissionais e movimenta uma

    indstria poderosa que lana, no mercado dos consumidores de histrias,

    uma profuso cada vez maior de narrativas, procurando atender a todos os

    gneros e gostos.

    Um filme feito de tudo o que vemos estampado na tela e ouvimos

    pelas caixas de som, mas tambm por tudo o que os cortes que conduzem o

    olhar do espectador de uma para outra cena evocam. Os vazios entre os

    planos supem uma supresso temporal e abrem o espao para a imaginao

    do espectador. Por isso, talvez, o procedimento da montagem do filme

    chamado de especfico flm ico, ou seja, aquilo que faz do cinema, cinema.Traduz a essncia da linguagem cinematogrfica e diferencia o cinema da

    realidade da qual se destaca e se separa.

    A realidade, diz Pasolini, seria um plano-seqncia infinito e o filme,

    ao contrrio, um plano-seqncia finito; comea, desenvolve e termina10. O

    filme feito de tudo o que se oferece viso e, igualmente, do que no ser

    visto. Algumas coisas sero apenas sugeridas e iro compor os vazios, os

    intervalos que, no cinema, so to significativos quanto o que as imagens e

    sons explicitam. nesse intervalo que os sentidos conversam: o sentido do

    filme que o diretor quis expressar e o sentido acrescido de quem v. Assim,

    posso dizer tambm que o filme sempre uma obra aberta. No se presta a

    uma nica interpretao. Pode ser visto e revisto de vrias maneiras, tudo

    fica a depender do contexto, da capacidade, do interesse, das expectativas

    de quem v.

    O cinema cria uma linguagem especfica, portanto, uma

    inteligibilidade peculiar. Assim, ao pensar o cinema, a escola pode tambm

    1 0 Pasolini, Pier Paolo.Empirismo Hereje.op.cit.

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    refletir sobre a educao que realiza, os mtodos, o programa e at mesmo

    a sua organizao. Como os filmes e com eles a linguagem cinematogrfica

    , chegam escola, sala de aula, aos ambientes educacionais? Esta a

    questo bsica que permeia esta srie de programas em que vamos discutiras possveis relaes do cinema com a educao. Nesta srie, vamos nos

    dedicar, prioritariamente, aos filmes produtos da cultura, manifestaes

    esttico-culturais, obras abertas e que, portanto, no foram pensadas para

    a escola ou para a educao. Filmes dessa natureza so realizados para um

    pblico muito amplo, para a massa heterognea de pessoas que vo ao

    cinema, vem televiso e assim consomem os produtos da indstria cultural.

    Como produtos dessa indstria, os filmes no foram pensados para

    atender a determinados requisitos que a educao realizada pela escola

    exige: a adequao a um contedo predeterminado, seriao, s

    especialidades, s disciplinas, aos horrios. A educao escolar ainda est,

    em grande parte, centrada na escrita e na oralidade das aulas expositivas

    que os professores ministram. Assim o filme imagem e som chega ao

    ambiente escolar como ilustrao, anexo, acessrio do texto que, ainda, o

    mais forte referencial para a escola, mesmo com todo o vigor que a linguagem

    audiovisual adquiriu na sociedade contempornea.

    O cinema j nasceu com certa vocao cientfico-educacional para alm

    dos espetculos e curiosidades dos vaudevi l les do incio do sculo XX11.O

    cinema documentrio e a tradio dos filmes etnogrficos confirmam essa

    tendncia. No Brasil, o dilogo cinema e escola tem o seu mito de origem:

    Humberto Mauro e o Instituto Nacional do Cinema Educativo INCE, criado

    em 1936 por Roquette Pinto. Nada como um filme que se leve para a sala de

    aula nos obriga a olhar para a escola. Posso dizer que era essa a preocupao

    dos criadores do INCE: que educao essa que estamos promovendo, nocinema, na televiso, na sala de aula? Como o cinema pode, em realidade e

    magia, penetrar o universo educacional da sala de aula? Como seria uma

    escola que tambm pudesse se expressar na lngua do cinema e no somente

    na lngua dos livros? Essas questes parecem persistir depois de tanto tempo

    e de tantas experincias. A TV Escola no tem fugido a essas questes, pelo

    contrrio, as vem recolocando de novas maneiras, buscando sempre sob

    novos enfoques que esse dilogo se concretize.

    1 1 Ver Costa, Flvia Cesarino. O primeiro cinema: espetculo, narrao, domesticao. So Paulo: Scritta, 1995.

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    O cinema, com o seu aparato tecnolgico apropriado para

    documentar, encenar e narrar histrias, construiu uma nova maneira de

    olhar para o mundo e, com isso, estabeleceu uma forma peculiar de

    inteligibilidade e conhecimento. Esta srie, que ser apresentada de 3 a 7de junho, no programa Salto para o Futuro, da TV Escola, constitui-se de

    cinco programas dedicados a refletir as relaes possveis entre o cinema e

    a escola, entre a linguagem cinematogrfica e a educao.

    Esta reflexo dever acontecer, prioritariamente, em salas de aula.

    Sobretudo aps a apresentao dos filmes. Pouqussimas escolas podem

    contar com salas apropriadas para sesses de cinema. Tampouco as escolas

    tm se organizado para a recepo de novas linguagens. O tempo recortado

    das aulas quase sempre no permite que os filmes sejam vistos na sua

    integralidade. H uma incompatibilidade temporal entre o cinema e a escola

    que talvez pudesse ser superada com um pouco de boa vontade e

    determinao.

    Os filmes, na escola, chegam, em geral, por meio do videocassete e da

    televiso, sendo vistos em telas menores. Mas, se perde em tamanho e

    concorre com as imagens da prpria sala, pois os ambientes nem sempre

    podem ser escurecidos, ganha em pblico que se amplia a cada novaprojeo. Muitas pessoas somente tero acesso a certos filmes se eles

    estiverem presentes nas salas de aula. Ademais, o videocassete permite,

    para o bem ou para o mal, que o filme seja decupado a critrio de quem o

    assiste. As imagens podem ser facilmente vistas e revistas. Ver filmes e as

    imagens que eles propem deve ser um exerccio de liberdade, uma fruio.

    Sem isso o cinema estar reduzido mera ilustrao de contedos

    curriculares e pouco dir ao aluno. Cinema a arte da vida e talvez possa se

    constituir em um grito que desperte professores e alunos para uma novaviso educativa, na qual os tradicionais e os modernos mtodos de ensinar

    e aprender possam fundir-se em novas possibilidades expressivas.

    ESTES SO OS TEMAS A SEREM DEBATIDOS DOS PROGRAMAS:

    PGM 1 CINEMA E REALIDADE

    Apresentar o cinema documentrio como construo esttica de uma viso

    sobre o real. As mltiplas possibilidades educacionais deste gnero. Esta-

    belecer algumas conexes entre os inmeros filmes documentrios que a

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    TV Escola veicula e as diferentes formas e abordagens pedaggicas que

    permitem.

    PGM 2 CINEMA E HISTRIA

    Apresentar as potencialidades do cinema como revelao e ocultao da his-

    tria. A fora da imagem como formadora de um entendimento do mundo. A

    fico e a realidade dos filmes histricos, sejam ficcionais ou documentrios.

    Como os filmes baseados em fatos histricos chegam na escola.

    PGM 3 CINEMA E LITERATURA

    O objetivo deste programa o de apresentar uma reflexo que permita

    estabelecer relaes entre a linguagem escrita e a linguagem audiovisual,enfocando, sobretudo, o potencial pedaggico de cada uma dessas lingua-

    gens. Discutir a traduo de uma linguagem para outra, com exemplos de

    filmes que foram baseados em obras literrias. Indicar algumas possibilida-

    des educativas que possam auxiliar o trabalho do professor em sala de aula.

    PGM 4 CINEMA NA ESCOLA

    Apresentar a histria do cinema educativo brasileiro com a criao do Insti-

    tuto Nacional do Cinema Educativo- INCE. A importncia de Humberto Mauro

    para o cinema brasileiro.

    PGM 5 ESCOLA NO CINEMA

    Discutir, a partir de alguns filmes comerciais, a viso que o cinema apre-

    senta da escola, e de que forma esta viso pode concorrer para conformar

    uma percepo e uma memria das relaes ocorrentes no interior desta

    instituio educacional.

    BIBLIOGRAFIA

    Almeida, Milton Jos de. Imagens e sons: a nova cultura oral.So Paulo: Cortez, 1994.

    O livro trata as linguagens audiovisuais do cinema e da televiso como

    produtos de uma nova cultura e suas relaes com a educao. Em um

    primeiro momento, aborda a linguagem audiovisual do ponto de vista da

    sua constituio na moderna sociedade oral e, depois, a sua traduo em

    alguns filmes contemporneos.

    Canevacci, Massimo. Antropologia da comun icao visual . So Paulo: Brasiliense, 1990.

    Aborda a sociedade contempornea com o estranhamento prprio dos an-

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    troplogos. Busca mostrar, de maneira singular, as imbricadas relaes

    entre a linguagem audiovisual, a cultura e a sociedade moderna.

    Carrire, Jean-Claude. A l ingua gem secreta d o cinema . Rio de Janeiro: Nova

    Fronteira, 1995.Desvela com muita propriedade a linguagem do cinema da perspectiva do

    roteirista, ou seja, de quem escreve o que ser filmado. Constri uma

    narrativa que leva o leitor a uma compreenso profunda da linguagem

    cinematogrfica.

    Costa, Flvia Cesarino. O p rimeir o cin ema : espetcu lo, n a rr ao, d omest icao.

    So Paulo: Scritta, 1995.

    Focaliza os primrdios do cinema, um perodo muito pouco conhecido.

    Procura desvelar as suas origens, situando os processos que constituram

    a linguagem cinematogrfica.

    Pasolini, Pier Paolo. Empir ismo Hereje. Lisboa: Assrio e Alvim, 1981.

    O livro no qual Pasolini constri as suas teorias sobre linguagem, mais

    especificamente a linguagem cinematogrfica.

    Tarkoviski, Andrei. Esculpir o tempo. So Paulo: Martins Fontes, 1998.

    O livro uma reflexo potica do cineasta sobre o cinema, o ato de filmar,

    as imagens, os sons, o tempo, o espao. A realizao cinematogrfica e os

    elementos que a constituem.

    Viany, Alex. Humberto Mauro: sua vida , sua a rte, sua tr ajetria no cinema . Rio de

    Janeiro: Artenova/Embrafilme, 1978.

    Trata-se de uma coletnea de textos e imagens da vida do cineasta

    Humberto Mauro.

    Xavier, Ismail. (org.) A experincia do cinema. Rio de Janeiro: Graal/Embrafilme,

    1983.

    Trata-se de uma antologia que rene os principais estudiosos da lingua-

    gem cinematogrfica. Introduz o leitor a diferentes concepes de cinema.

    SITES

    www.cineduc.org.br Site com rica produo na rea do cinema e educao,

    abrangendo aspectos da histria do cinema e de atualidades. Instituio que

    se dedica a ensinar linguagens audiovisuais para crianas e adolescentes.

    www.kinedia.hpg.ig.com.br Divulga informaes gerais sobre cinema.

    www.cenaporcena.com.br - Apresenta links de entrada para vrias institui-

    es e assuntos relativos a cinema.

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    11PROPOSTA PEDAGGICA

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    www.revbravo.com.br Site da Revista Bravo que trata dos mltiplos aspectos

    do audiovisual, com nfase no cinema e na televiso.

    www.classicvideo.com.br - Site onde possvel encontrar para encomenda

    filmes que no existem em muitas locadoras.

    www.casacinepoa.com.br Site que divulga as atividades da Casa de Cinema

    de Porto Alegre e, ainda, artigos e sinopses de filmes.

    www.studium.iar.unicamp.br Site do Instituto de Artes da Unicamp. Divulga

    atividades e artigos sobre arte, incluindo audiovisual, cinema e televiso.

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    12BOLETIM

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    PGM 1 CINEMA E REALIDADEOMUNDO ATRAVS DAS LENTES

    MARCOS DE SOUZA MENDES1

    Para o documen tarista , na da ad quirid o par a sempre. A realid ad e

    sem pr e ma is for te, ela impe su a ord em e com ela que necess-

    rio se medir . Posso dizer que no existiu um fi lme d ura nte o qua l eu

    no tivesse aprend ido alguma coisa, de uma maneira ou de outra . At

    hoje, aps cinqenta an os de prtica, a ind a no cheguei a d efinir , de

    uma vez por toda s, um mtodo de me aproxima r d os homens e de os

    fi lmar. por que esse mtod o no exis te: a cada vez diferen te.

    Joris Ivens

    Ao longo do sculo XIX, foram in-

    meras as experincias humanas para

    registrar e captar as imagens da vida

    real. Em paralelo ao desenvolvimentotcnico e industrial da fotografia, cien-

    tistas e fotgrafos se interessaram, par-

    ticularmente, pela anlise do movimen-

    to em sua progresso no tempo. Esta

    anlise seria possvel pela obteno de

    imagens sucessivas do mesmo corpo, o

    que realizaria o to sonhado desejo hu-

    mano de reproduzir o movimento, de re-

    ter a vida em sua passagem, de perdu-

    rar as aes dos seres animais em suasvrias manifestaes no mundo: corrida

    de cavalos, caminhadas, danas, banhos

    de mar e gestos banais como os da ali-

    mentao de um beb.

    Em 1879, o fotgrafo ingls Eadweard

    James Muybridge, radicado nos Estados

    1 Cineasta. Professor de cinema da Universidade de Braslia. Doutorando em Multimeios no Instituto de Artes da UNICAMP.

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    13BOLETIM PGM 1 - CINEMA E REALIDADE

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    CINEMA E ESCOLA

    Unidos, disps 24 cmeras fotogrficas

    que, ao serem disparadas sucessivamen-

    te, possibilitaram imagens fixas do galo-

    pe de um cavalo, fotografias que foramdeterminantes das diferentes posies

    de suas patas durante o movimento. O

    tempo, no entanto, ainda no chegara a

    ser restitudo.

    Contemporneo de Muybridge, o

    fisiologista francs Etienne Jules Marey

    que j estudara a locomoo animal

    em 1873 com um grfico de tempo emovimento, a cronograf ia criou, em

    1882, um aparelho capaz de reter os v-

    rios movimentos do vo de um pssaro:

    o fuzil fotogrfico. Esta cmera cinema-

    togrfica ancestral deu origem, pouco

    tempo depois, ao Cronofotgraf o em pe-

    lcu la ( em filme de celulide, inventado

    em1887). O aprimoramento do Cronofo-tgrafo de Marey deu origem ao Kinetos-

    cpio, dos inventores Thomas Edison e

    Laurie Dickson, que permitia o visio-

    namento de imagens em movimento. Em

    1895, finalmente, com a criao do

    Cinematgra fo dos irmos Lumire

    Louis e Auguste, industriais franceses

    o cinema veio luz. A vida real em seu

    tempo e movimento se projetou nas te-

    las. Trens chegando estao, operri-

    os saindo da fbrica, pedestres e ciclis-

    tas nas ruas, crianas brincando na neve

    e saltando sobre o mar. O movimento e

    o tempo real eram o espetculo; os se-

    res humanos em suas vidas cotidianas a

    essncia desses primeiros filmes2

    .Nascido como registro da vida, logo

    o cinema tornou-se documento e teste-

    munho da histria. Os cinegrafistas de

    Lumire percorreram vrios pases e re-

    gistraram acontecimentos sociais e pol-

    ticos, trgicos acidentes, paisagens ex-

    ticas, o que deu origem aos filmes de atu-

    alidades, de explorao e de reportagem.No incio do sculo XX, inmeros

    pioneiros percorreram terras distantes

    e inspitas para filmar guerras, batalhas,

    expedies e povos desconhecidos. En-

    tre ns, por exemplo, o fotgrafo e

    cinegrafista Lus Toms Reis (1878-

    1940) do Servio de Proteo aos ndios,

    percorreu entre 1914 e 1916 centenasde quilmetros do Brasil Central e da

    Amaznia para documentar as viagens

    da comisso Rondon e aspectos da cul-

    tura dos povos indgenas contactados3.

    De curtos registros para filmes de

    longa metragem, estas imagens de no

    fico se constituram em memria dos

    povos e sociedades. Seus realizadores

    cinegrafistas, diretores, montadores

    transformaram-se em cineastas do real

    reprteres, historiadores, socilogos,

    pintores, etnlogos, poetas, enfim, ho-

    2 A Chegada do Trem na estao( L arrive dun train la gare de la Ciotat ) , de Louis Lumire, 1895. A sada dosoperrios da fbrica ( La sortie des usines Lumire), Louis Lumire, 1895. Referncias: Filmoteca do consulado daFrana, Rio de Janeiro, Cinemateca do Museu de Arte Moderna, R.J., Sr. Hernani Hefner; UNB-Filmoteca da Faculdadede Comunicao; Filmoteca da Embaixada da Frana, Braslia.

    3 Ao redor do Brasil, Lus Toms Reis, 1938. (FUNARTE, Decine, CTAV: Renato Costa e Vanda Ribeiro 21.25803631).

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    14BOLETIM PGM 1 - CINEMA E REALIDADE

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    mens comprometidos com seu tempo e

    com a vida, uma presena no mundo

    (parafraseando o educador Paulo Freire),

    presena que se pensa a si mesma, quese sabe presena, que intervm, que

    transforma, que fala do que faz mas tam-

    bm do que sonha, que constata, com-

    para, avalia, que decide, que rompe (...)

    a tica se torna inevitvel e sua trans-

    gresso possvel um desvalor, jamais

    uma virtude.

    O Cin ema Documentrio, que teveseu nome cunhado na dcada de 20 do

    sculo passado, foi definido por John

    Grierson, grande produtor e documen-

    tarista britnico, como o tratamento cri-

    ativo da realidade; j para o cineasta

    francs Jean Vigo, documentrio era um

    ponto de vista documentado. Podera-

    mos acrescentar tambm o conhecimen-to do outro, pensamento do realizador

    brasileiro Eduardo Coutinho o outro e

    seu patrimnio de cultura vivida (seus

    valores espirituais, ticos e sua tradio

    oral, no apenas sua cultura material).

    Todas essas definies apontam o

    documentarista como um artista

    revelador da vida, vida j to rica em gran-

    des e pequenos assuntos, em dramas hu-

    manos e sociais, to rica em cinema. Este

    Cinema se oferece em luz de naturezas,

    direes e intensidades diferentes; se

    oferece em lentes que abrem espaos de

    paisagens, campos, cidades e ruas; len-

    tes que descobrem o espao do prprio

    corpo do homem em toda plasticidade

    de seus movimentos, em toda nobrezade suas aes de trabalho e em suas lu-

    tas trgicas nesse mundo.

    Essas lentes, essas cmeras, que tra-

    zem em si um corao e uma moral, ora

    so fixas e contemplativas; ora so m-

    veis e participativas e correm leves e qua-

    se voam para seguir os seres e as coisas

    na totalidade de seu percurso, para di-alogar com outros pensamentos e olhar

    e ver o mundo mais em profundidade.

    Sem a objetividade excessiva e o oportu-

    nismo do reprter, o documentarista

    deixa o mundo se apresentar.

    Alguns documentaristas, como Dziga

    Vertov (1896-1954), principal cineasta

    sovitico dos anos 20, no negociaramseu cinema engajado no caso de Vertov,

    compromissado com os ideais da revolu-

    o bolchevique de outubro no nego-

    ciaram o cinema do real, do homem vivo,

    sem encenao, nem o cinema da cria-

    o e da experimentao (principalmen-

    te em som e montagem)4.

    (...) De uma monta gem d e fa tos vi sveis e

    fixa dos na pelcula (Kin o-Glaz), cinema -

    olho, a uma mon tagem de fatos visveis-

    audveis pelo rd io (Rd io-Glaz). A uma

    4 Kino Glaz.Dziga Vertov, URSS, 1929. O homem da cmera.Dziga Vertov, URSS, 1924.

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    CINEMA E ESCOLA

    mon tagem de fatos simulta neamen te vis-

    veis-audveis-pa lpveis-res pi rveis,etc...

    A uma filmagem de improviso dos pen-

    samentos humanos e, finalmente a

    uma grandiosa tentativa de organiza-

    o direta do pensamento por conse-

    qncia, das aes) de toda a huma-

    nidade (...) Dziga Vertov,Kiev, 06/ 11/

    1928 .

    Cada vez mais lrico e potico em seus

    documentrios de longa metragem Cine-Poemas, como ele chamou alguns filmes,

    entre os quais, Trs Cantos sob re Lnin e

    Ca no d e Em ba la r (Kolibelnaya),

    Vertov sofreu com a burocracia e a cen-

    sura artstica dos produtores e crticos.

    Outros cineastas abraaram o mun-

    do com a alma. Conviveram com a reali-

    dade sem a (pr)-concepo de roteiros

    e narrativas fceis de sucesso comercial.

    Sentiram o mundo como poetas maio-

    res, com o nico compromisso de res-

    peitar o cotidiano das pessoas que parti-

    ciparam das filmagens e tambm de res-

    peitar seu prprio sentimento. Robert

    Joseph Flaherty (1884-1951) foi, talvez,

    o mais romntico, o mais sensvel des-

    ses documentaristas. Pai do filme antro-

    polgico, este fotgrafo, diretor e

    montador norte-americano trouxe hu-

    manidade trs testemunhos inesquec-

    veis sobre o ser humano em luta contra

    a natureza ou em harmonia com o mun-

    do: Nan ook of the North(1920-1921), fil-

    me sobre o cotidiano de uma famlia es-quim do nordeste da Baa de Hudson,

    no rtico5; Moana - a roma nce of the

    Golden Age (1923-1926), rodado no Pa-

    cfico Sul, Polinsia, com os habitantes

    de Samoa em suas vidas dirias de ale-

    grias e danas; Man of Aran(1932-1934),

    sobre a pesca, o preparo da terra vegetal

    e a luta contra o selvagem mar das ilhasde Aran, na costa oeste da Irlanda.

    O cinema de Flaherty foi, antes de

    tudo, um cinema de amor ao prximo.

    Um cinema generoso para com o huma-

    no das relaes da famlia, trabalho e

    amizade. Talvez at um cinema utpico,

    pea de resistncia do potico em uma

    cinematografia mundial cada vez maisvoltada ao consumo.

    (...) Hoje, ma is que nu nca, testemunh ou

    Rober t Flaher ty, o mu nd o precisa p ro-

    mover a mtua compreenso entre os p o-

    vos. A via mais rpid a, a mais segu ra

    pa ra achegar oferecer a o homem emgeral, ao homem da ru a, como se diz, a

    ocas io de se tom ar conscincia d os pro-

    blemas que a fligem seus semelhan tes (...).

    O drama est na vida real e especialmen-

    te na vida p rimit iva. O homem, nas lutas

    5 Nanook, o esquim (Nanook of the North), Robert Flaherty, USA, 1920-22.. O homem de Aran.(Man of Aran), RobertFlaherty, EUA, 1932-34. (Cinemateca Brasileira; Embaixada dos EUA; Cinemateca do MAM; UNICAMP/Instituto de

    Artes.)

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    CINEMA E ESCOLA

    contra a ameaa natu ral, forma o mais po-

    deroso confl i to do mund o. Nos meus fi l-

    mes eu ten to evocar este confl ito(...).

    Flaherty, sem abrir mo de seu es-

    prito humanista e de seus mtodos de

    realizao, sofreu com os poderes finan-

    ceiros: Moana foi mal distribudo pela

    Paramount e teve seus negativos perdi-

    dos; Wh ite Sha dow s of the South Seas

    (1927-1928) foi abandonado por Flahertyno incio das filmagens, pelo fato de o

    mesmo no aceitar as interferncias da

    Metro Goldwyn Mayer; The Land (1939-

    1942), produzido pelo Departamento de

    Agricultura dos EUA, foi interditado pela

    censura poltica.

    Outro grande documentarista do s-

    culo XX, trabalhador da luz, constru-tor do tempo, foi Joris Ivens, o holands

    voador. Ubquo, documentarista da liber-

    dade, Ivens atravessou o sculo docu-

    mentando a luta de emancipao dos

    povos. Filmou na Espanha em 1936 (Ter-

    ra d e Espanha , sobre a Guerra Civil Es-

    panhola)6; filmou nos Estados Unidos, na

    Indonsia, na Tchecoslovquia e na

    Polnia nos anos 40; filmou na Frana,

    na China (Before Sprin g e 60 0 milh es

    com vocs) e na Itlia, nos anos 50; fil-

    mou em Cuba, no Chile e no Vietn

    onde, de corpo fechado, aos 67 anos de

    idade, realizou O 17 - Para lelo, sob os

    atrozes bombardeios norte-americanos.

    Entre 1971 e 1976 retornou Chi-

    na e pintou com Marceline Loridan,sua companheira, o mural cinematogr-

    fico Como Yuk ong des locou as monta -

    nhas, doze horas de filme sobre diver-

    sos aspectos da vida cotidiana durante a

    Revoluo Cultural.

    Nonagenrio, novamente voltou

    China para, com sua cmera de jovem

    poeta, filmar o vento. Quando a terrarespira, isto chama-se o vento ..., (se-

    gundo um provrbio chins). Penso,

    como cineasta, que preciso ousar no

    no man s l and entre a rea l ida de e o

    imaginrio disse Ivens, em entrevista

    a Jean Pierre Sergent, durante lana-

    mento do filme , entre o documentrio

    e a fico. (...) A poesia, alm da reali-dade, eu j havia encontrado rodando

    meus filmes de guerra. Desta vez, eu a

    quis filmar. Enquanto artista, senti a

    necessidade de ir mais longe. Uma his-

    tria do Vento (1988) foi o ltimo filme

    de Joris Ivens.

    E assim como Ivens, Flaherty e

    Vertov, foram tantos que se arriscaram e

    permaneceram fiis sua arte: Jean

    Vigo, Alberto Cavalcanti, Basil Wright,

    Humberto Mauro, Jean Rouch, Roman

    Karmen...

    Ao acompanhar a dialtica do tem-

    6 Terra de Espanha.Joris Ivens, EUA, 1936. (UnB/Faculdade de Comunicao; Cinemateca do MAM; Cinemateca Brasi-leira; cineasta Guido Arajo 71.347,5489, filmes de Joris Ivens).

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    17BOLETIM PGM 1 - CINEMA E REALIDADE

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    CINEMA E ESCOLA

    po, o documentarista resgata a histria,

    a memria, e registra identidades cultu-

    rais em extino no mundo moderno7.

    Flexvel, curioso, vigilante, ele acompa-nha a vida em seu processo e por ela

    roteirizado e dirigido. Pesquisa muito, faz

    e refaz estruturas narrativas, intui his-

    trias do prprio lugar da filmagem. Fil-

    ma, aparentemente, ao lu, mas respei-

    tando caminhos nascentes para a des-

    coberta de seu filme e como difcil

    explicar aos burocratas de planto queo roteiro (ou no-roteiro) do documen-

    trio dinmico, que seu oramento

    flexvel, que segue urgncias que s o

    impondervel do processo criativo sabe

    explicar. Depois, na montagem, ainda se

    atendo espinha dorsal do roteiro ou

    estrutura do guia de filmagem, o do-

    cumentarista lida com tempos e espa-os impensveis, o que o leva a uma mon-

    tagem criativa, independente de de-

    cupagens preestabelecidas to distan-

    te, no entanto, da montagem irrespon-

    svel, to comum nos trabalhos que pre-

    conizam: a gente filma e na montagem

    a gente resolve.

    O auge da montagem e do ritmo vi-

    sual como expresso mxima do filme

    ocorreu no final dos anos 20 (do sculo

    passado), no final do perodo silencioso.

    Com o advento do cinema sonoro, o

    Documentrio se enriqueceu com as ex-

    perincias da vanguarda sovitica e as

    inovaes tcnicas da escola britnicados anos 308. Rudos, msicas, poemas

    foram incorporados narrativa, o que

    ampliou os horizontes artsticos do g-

    nero.

    Nos anos 60, as cmeras leves de

    16mm em sincronia com gravadores

    portteis de captao do som direto da

    realidade revolucionaram, ainda mais,a dramaturgia documentria9. O tempo

    real, em toda sua plenitude e durao,

    reapareceu e trouxe, desta vez, a voz

    humana, viva, de um ator natural, per-

    sonagem do real, sem maquiagem, sem

    texto decorado e comportamento este-

    reotipado. Trouxe a oralidade, com a be-

    leza de seus timbres, seus sotaques, suascadncias e seu vocabulrio10. O sonho

    antigo de Vertov se realizava: o cinema

    do som e imagem da vida e desvelador

    da verdade.

    Nessa nova dimenso, na qual o

    Documentrio ganhou novos nomes e

    horizontes Cinema Verdad e, Cinema

    Direto a montagem tambm se modifi-

    cou. Tornou-se mais fluida ao privilegiar

    o tempo do nascimento de pensamen-

    tos e aes; tornou-se menos expressiva

    7 Jango.Slvio Tendler, 1984. (Caliban, 21.254.35645/5086871)Memria do cangao. Paulo Gil Soares, 1965.8 The song of Ceylon.Basil Wright, Inglaterra, 1934-35.Night mail,Basil Wright e Harry Watt, Inglaterra, GPO, 1936.

    Coal Face,Alberto Cavalcanti. Inglaterra, 1936. British Council (RJ); UNICAMP/Instituto de Arte.9

    Crnica de um vero. (Chronique dun t)Jean Rouch e Edgar Morin, Frana, 1960. (Consulado/Filmoteca daEmbaixada da Frana, UNICAMP/Instituto de Arte).1 0 Nelson Cavaquinho,Leon Hirszman, Brasil, 1966. Cabra marcado para morrer, Eduardo Coutinho, Brasil, 1984.

    Conterrneos Velhos de Guerra, Vladimir Carvalho, Brasil, 19.Uma questo de terra, Manfredo Caldas, Brasil, 19.

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    18BOLETIM PGM 1 - CINEMA E REALIDADE

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    CINEMA E ESCOLA

    e mais interna, ao respeitar a conjuga-

    o das movimentaes de cmera dian-

    te de improvisos e imprevistos sem,

    contudo, perder a noo de sntese, ob-jetividade, ritmo, experimentao e cri-

    ao artstica11.

    H vinte anos atrs, j octogenrio,

    o mestre Joris Ivens abordou a questo

    da criao artstica no Documentrio com

    tamanha lucidez e bom senso que, ain-

    da hoje, em plena era das novas

    tecnologias digitais, seu pensamentocontinua atual.

    (...) Exis te uma fa lsa idia que pr eci-

    so comb at er, esta velh a idia d e que

    documentrio reporta gem, que nada tem

    a ver com a ar te, qu e o filme d e fico

    a nica ma neira ar tstica d e se fa zer ci-nema (. .. ). Em a lguns casos, o docum en-

    tr io e a fi co se en tr ecor ta m , se en r i-

    quecem mu tuamente. Eu acredi to que o

    documentrio um a boa ba se pa ra um a

    evoluo auten ticamente cin ematogrfica

    do film e. No documentrio, a in fluncia

    d o teatr o e da l itera tu ra menor; a

    ima gem flmica qu e comand a bem mais

    que em um a na rra tiva d ialogada (...). Lutei

    du ran te cinqenta a nos para que se re-

    conh ecesse ao f i lm e d ocumentrio a

    mesma importncia e a mesma n ecessi-

    dad e para a a rte cinema togrfica que o

    fi lm e d e f ico... Par a m im , no ex is te

    con tr ad io nem opos io en tre o cin e-

    ma docum en trio e o cinema de fi co.

    Nos docum entrios ond e se uti l iza me-

    nos o d ilogo, a liberd ad e e os recurs os

    de mon ta gem so bem mai s cons id er-

    veis. Em um segun do, pode-se passa r

    d o microcosmo ao macrocosmo. Pode-se

    fazer ma laba rismos com o tempo e o es-

    pao. Es te gnero de fi lm e mais pr xi -

    mo da poesia, enqua nto que o f i lme de

    fi co se a paren ta prosa .

    Os aparatos tecnolgicos de capta-

    o e edio de imagens e sons esto

    cada vez mais prticos e sofisticados. Im-

    budos dessa modernidade, muitos cr-

    ticos e cineastas discutem a ausncia de

    novas linguagens nos Documentrios. O

    novo, entretanto, no ser proporciona-do por uma cmera de ponta. O novo vir

    da prpria vida vida que muda e se

    transforma a cada momento e da tica

    que todo cineasta trar em si. A tica

    que definir a to ansiada forma. Um fil-

    me novo no nasce de uma moldagem,

    de um verniz tecnolgico que se aplica

    sobre um tema ou que coloca uma obraa seu servio. Um filme novo nasce de

    dentro para fora, como um todo. Da alma

    da prpria vida e da responsabilidade

    que todo cineasta deve ter.

    1 1 Futebol,Joo Moreira Salles e Arthur Fontes.Santo Forte, Eduardo Coutinho.(Vdeo Filmes, RJ; CTAV-FUNARTE, RJ).

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    19/50

    19BOLETIM PGM 1 - CINEMA E REALIDADE

    D I L O G O S

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    20BOLETIM

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    PGM 2 : CINEMA E HISTRIAAREALIDADE FICCIONADA

    S LVIO TENDLER1L AURAMARIACOUTINHO2 (DILOGOS)

    Para d iscut i r c i n em a e h i s t r i a , nest a srie, p roponh o pr imeiro

    que ad otemos o l ivro A h i s t r i a v a i a o c i n ema , de Mar iza de

    Car va lho Soares e Jorge Ferreira , um a p ub licao da Ed itora Record

    de 2001 .

    E, d epois, que esta beleam os um d ilogo com o livro, toman do como

    ref erncia o pr efcio d e Slv io Tend ler . mais ou menos is so qu e

    professores e alunos fazem quand o levam para a sa la d e aula tex-

    tos, l ivros, f i lmes. Ou, pelo menos deveriam fazer. Os textos e os

    f i lmes so fei tos para tr ata r d e assun tos objet ivos, mas apresentam

    semp re um ponto d e vista cons trudo tam bm pelas subjetivid ad e

    dos au tores e, igualm ente, de leitores e especta dores. Talvez no

    seja dema is lembrar que os produ tos cul tu rais d essa na tureza so

    d inm icos: s se rea lizam n a in terao entr e pessoa s. O film e preci-

    sa ser visto. O livro precisa ser lido. E jus tam ente neste aspecto

    que, acred ito, est a gr an de riqu eza d a p rod uo int electua l e cultu -

    ra l. Alm d o que, o mesm o fato mostr a-se de va ria das m an eiras . E a

    viso de um a pessoa traz sempre a possibi l ida de d e enriquecer a

    viso de tod os e a d e cad a um.

    Ass im inicio o nosso d ilogo com este texto p recioso chama nd o a

    a teno pa ra al gun s a spectos que Slvio Ten d ler coloca n o fin a l, ou

    seja, o papel do professor dian te da s ima gens. claro que as ima -

    1 Cineasta. Professor de cinema da Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro.2 Professora da Faculdade da Educao da Universidade de Braslia. Doutora em Educao na rea Educao, Conhe-

    cimento, Linguagem e Arte pela UNICAMP.

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    21BOLETIM PGM 2 - CINEMA E HISTRIA

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    CINEMA E ESCOLA

    gens nos fascinam a todos. justamente esta a gran de fora da

    lin gua gem cin ema togrfica qu e, em esttica , reali dade e magia , cria

    e recr ia un iversos f iccionais d e toda s as ord ens, sejam eles ba sea-

    dos em fa tos reais ou fictcios. Ma s nos ambient es educaciona is, na

    escola, n a sa la de au la , possvel ir a lm do film e e das imagens e,

    pr in cipa lmente, estabelecer uma relao hist rico-tempora l entr e pas -

    sado e presen te. Repito aqu i o qu e vocs vo ler mais ad ian te: uma

    abord agem do passa do mu itas vezes ma is rica qua nd o an al isad a

    sob a lu z do conhecimento e d as a ngst ias d o tempo presente.

    Ouamos, ento, Slvio Tendler:

    Nos idos dos anos 60, estudante quese prezasse e quisesse jogar pedras na

    ditadura deveria buscar fundamentos

    tericos em Histor ia da r iqueza d o ho-

    mem, e Leo Huberman. Logo na abertu-

    ra, o autor para falar de dinheiro, usa

    uma cena de cinema como exemplo;

    Georges Duby, um dos mais importan-

    tes medievalistas, abre um de seus en-

    saios sobre a Idade Mdia escrevendo:

    Imaginemos. Desde sempre, imagem e

    imaginao fazem parte do conhecimento

    da histria.

    Quando, em 1974, Jacques Le Goff

    e Pierre Nora coordenaram a publicao

    de Faire de lHistoire3, estavam eviden-

    ciando novos horizontes para a histria,

    que saa ento da dicotomia factual

    versus interpretativa para buscar novas

    relaes com seu objeto de estudo. Nos

    rescaldos ps-maio de 1968, uma srie

    de histriadores franceses discutiam

    novos problemas, novas abordagens, no-

    vos mtodos. Marc Ferro participa destacoletnea com seu artigo O filme: uma

    contra-anlise da sociedade, no qual

    aborda a questo do cinema como fonte

    da histria. Mais do que introduzir, esse

    artigo servir para legitimar uma rela-

    o que j vinha se desenvolvendo havia

    muitos anos e que Ferro transforma em

    seminrio, com o nome de Cinema e His-

    tria.

    Por outro lado, desde o nascimento

    do cinema, a histria sua fonte. O nas-

    cimento de uma nao, de David Griffith,

    nos Estados Unidos e O en cour aad o

    Potemkin, de Sergei Eisenstein, na Unio

    Sovitica, so alguns dos muitos filmes

    em que, atravs de cowboys, carruagens,

    reis e rainhas, a histria est presente.

    Em 1937, o documentarista holan-

    ds Joris Ivens, ao filmar a Guerra Civil

    Espanhola em parceria com Ernest

    Hemingway, registra nos crditos do fil-

    3 Jacques Le Goff e Pierre Nora.Histria: novos objetos.Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1976.

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    22BOLETIM PGM 2 - CINEMA E HISTRIA

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    CINEMA E ESCOLA

    me Ter r a es ponh o l a a produo da

    Contemporary Historians Inc. Neste caso,

    o cineasta define-se como historiador e,

    mais do que um documentrio de de-nncia da ascenso do fascismo ao po-

    der na Europa, sente-se fazendo hist-

    ria.

    A essa a l tura abr o um parntese para

    relata r br evement e uma experincia r e-

    cente que, de alguma forma , se insere

    na situ ao em qu e, penso, o cinea sta e

    sua obra podem ser d ef in idos como his-

    toriad or e his tria . Silvio Tend ler inicia

    seu texto falan do d os anos 60. Talvez

    os ma is pu lsa nt es d os ltim os sculos.

    Ainda ontem, num a l ivrar ia, folheando a

    biograf ia de Pau l MacCar tney Many

    year f rom now , uma fra se me cham ou

    a a teno. Pau l d izia mai s ou m enos a s-

    sim : no vejo os a nos 6 0 como pas sa -

    do, ma s como fut uro, como algum a coisa

    que a ind a no se realizou . Acho qu e

    ma is ou menos esse sen t imen to que

    af lorou d uran te a sema na em que a Fa-

    culd ad e de Ed ucao da Univ ersid ad e

    de B ra slia pr omoveu a exi bio d o fi l-

    me B a r r a 6 8 de Vlad imi r Carva lho eque mon ta perfeit am ent e com a idia

    de que a hi stria mai s ri ca lu z do

    presen te. Foram 18 exibies segu id as

    de d ebates emocionad os com o cineas-

    ta, professores, alun os e personagens

    do fi lme e d a h istria que no estavam

    no f i lm e. No Ba r r a 6 8 esto presen tes

    as pr in cipais personal idad es da hist-r ia d a Un B epoca, Dar cy Rib eiro, o

    rei tor JosCar los Azeved o, alu nos. . .

    Quase todos em imagens passad as e

    presentes. E o que gostar ia d e ressal tar

    aqu i a s ensao de incompl etu de que

    o fi lme su scita, no do fi lm e em si, mas

    da prpr ia histr ia. Assim quero dizer

    vend o Slvio, Vla d imir , Paul, que t alv ez

    o mais importan te da h istria que vai ao

    cinema seja no o resgate d os fa tos, ma s

    da s possibi l ida des que os fatos susci -

    tam e que ain da esto por se realiza r.

    Voltemos ao texto.A coletnea de artigos que compe

    este livro segue na trilha original apon-

    tada por Marc Ferro: o estudo de filmes

    como fonte de conhecimento e o que

    Ferro chama de contra-anlise da socie-

    dade. Em seu artigo, considera que o

    estudo da imagem pode fornecer elemen-

    tos de anlise que ultrapassem os limi-tes das intenes do autor ou de quem

    as captou. A leitura dos filmes no se

    restringe a uma interpretao colada

    na obra.

    No caso deste livro, os autores fize-

    ram uma releitura da obra cinematogr-

    fica, relacionando com uma abordagem

    histrica, confrontando filme e histria.

    Esta coletnea de ensaios chega em

    boa hora. A histria do sculo XX ser

    contada com recursos audiovisuais e a

    partir da produo audiovisual do scu-

    lo XX. O conjunto de artigos de alto

    nvel, merecedor de leitura, exercendo

    importante funo didtica que aponta

    mais um territrio a ser explorado pelo

    historiador.

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    23BOLETIM PGM 2 - CINEMA E HISTRIA

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    CINEMA E ESCOLA

    Alguns limites foram estabelecidos

    nos critrios de seleo dos filmes: ape-

    nas filmes nacionais, e o corte temporal

    foi determinado pelo perodo de produ-o dos filmes, que foi de meados dos

    anos 70 ao final dos anos 90. Os temas

    so os mais diversos, nem sempre tra-

    balhando a histria de forma direta, mas

    refletindo a formao brasileira ao longo

    dos sculos. Diversos historiadores divi-

    diram entre si a misso de esmiuar a

    produo cinematogrfica, o que trans-forma este livro num raro painel que re-

    trata a pluralidade e a diversidade de

    nossa produo.

    Por no ser obra de um autor, mas

    uma coletnea de textos com enfoques

    diferenciados, torna-se mais rico ainda

    devido variedade de olhares que se pro-

    jetam sobre a diversidade das obras.Tem, alm disso, o mrito de registrar a

    fecundidade do cinema brasileiro nes-

    ses anos 70/80/90 e, sobretudo, sua

    importncia cultural, tornando-se o me-

    lhor arrazoado em defesa do cinema bra-

    sileiro, de sua pluralidade, diversidade

    e criatividade.

    Em sua maioria, os estudos aqui de-

    senvolvidos servem tambm como uma

    aula de histria, uma vez que so acom-

    panhados de citaes que transcendem

    a obra abordada para situ-la em seu

    tempo, descrevendo suas fontes, influ-

    ncias ou precedncias. Esse universo

    que circunscreve a obra faz com que este

    livro se torne objeto de consulta essen-

    cial para quem estuda ou quer conhecer

    mais profundamente as obras e o tempo

    abordados dentro do trinmio cinema/

    Brasil/histria.

    Aqui esto sendo analisados filmesque retratam a migrantes e imigrantes,

    a mulher, o negro, as circunstncias

    histricas, os acontecimentos e as per-

    sonalidades. Filmes de Joo Batista de

    Andrade (O homem qu e v i rou suco, o

    migrante massacrado), Tizuca Yamasaki

    (Gaij in, a imigrao japonesa), Eduardo

    Coutinho (Cabra m arcado para morrer),o meu (Jango,a reconstruo da hist-

    ria ), Norma Bengell (Pagu, a mulher

    libertria que foi contra a corrente de

    seu tempo mas a favor da histria). O

    Brasil dissecado pela literatura e o in-

    crvel desafio de transformar letras em

    imagens: Mrio de Andrade, Jorge Ama-

    do, Graciliano Ramos imaginados pelocinema, livros que se tornaram filmes

    pelos olhos de Nelson Pereira do San-

    tos, Joaquim Pedro, Eduardo Escorel,

    Bruno Barreto.

    Quero ressa ltar aqu i outra temtica des-

    ta sri e Dilogos C in ema e escol a , ex-pressa n o texto Li teratura e Cinema :

    uma sinta xe transit iva. A au tora, Rosalia

    d e ngelo Scorsi , tra ba lha seu escri to

    bu scand o desvelar no o un iverso his-

    trico em qu e os fi lmes a contecem, como

    abord a Si lv io Tend ler , ma s o universo

    express ivo das lingu agens cinema togr-

    f ica e l i terria . Lemb remos que ess esdois pontos de vista complementam -se

    na perspect iva da s mul t ip licidad es da s

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    24BOLETIM PGM 2 - CINEMA E HISTRIA

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    CINEMA E ESCOLA

    vises que as l ingua gens au d iovisuais

    podem su sci tar .

    A pluralidade registrada pelos filmese os estudos correspondentes aos anos

    de chumbo, observados no apenas pelo

    vis da poltica, mas com ampla viso da

    poca do seja marginal, seja heri, gri-

    to de rebeldia do artista plstico Hlio

    Oiticica sobre a imagem do bandido Cara

    de Cavalo, marca dos anos 70: o cinema

    mostra, com Lcio Flvio, o passageiroda agonia, o marginal necessrio para

    apontar as mazelas da polcia (Polcia

    polcia, bandido bandido), transpas-

    sado das reportagens literrias de Jos

    Louzeiro para as imagens de Hector

    Babenco; o mito registrado em Xica d a

    Silvaou o pas trocando de pele em By e

    bye Bras i l ,filmados por Carlos Diegues.

    Em Eles no us am bla ck-t ie, de Leon

    Hirszmann, a classe operria vai ao ci-

    nema e o Brasil caipira em A marvada

    carne,de Andr Klotzel.

    Este livro tambm supre uma lacu-

    na: como a crtica cinematogrfica prati-

    camente desapareceu, e a cada dia tor-

    nam-se mais raras as publicaes

    especializadas, e por conseguinte a an-

    lise e o debate em torno da produo

    cinematogrfica , transferiu-se para o

    historiador a tarefa da crtica, o que va-

    loriza ainda mais o presente livro. A abor-

    dagem diferenciada do historiador pro-

    funda e analtica foge da superficiali-

    dade da informao jornalstica, neces-

    sria para divulgar a existncia da obra

    mas insuficiente para inform-lo sobre

    a obra.

    Mesmo quando a anlise favorvel

    ao filme, ainda assim melhor a publi-cao, que abre o caminho para a dis-

    cusso e a polmica, do que conden-lo

    ao silncio e ao esquecimento. Nos anos

    50, poca de nacionalismo na poltica (O

    petrleo nosso) e das chanchadas no

    cinema, em sua defesa foi cunhada a fra-

    se: Falem mal, mas falem do cinema

    nacional, logo sintetizada no bordo Oabacaxi nosso. Avacalhar (expresso

    prpria da poca) era a forma de prote-

    ger e divulgar. Logo, este livro ajuda a

    resgatar nossos filmes, rompendo o cer-

    co do silncio e do esquecimento.

    O filme torna-se matria de sala de

    aula, servindo como objeto de estudo e

    conhecimento. Em hiptese alguma o fil-me substitui o professor. Sua leitura

    correta est condicionada a um conhe-

    cimento prvio, sujeita orientao do

    professor. Confrontar veracidade com ve-

    rossimilhana real versus aparncia do

    real uma das responsabilidades do

    professor, que evitar a trilha de um ca-

    minho equivocado e cuja ausncia po-

    der induzir a erros de abordagem di-

    ante do fascnio e da facilidade da hist-

    ria recriada em imagens. Quanto a pas-

    sado versus presente, bom dizer que o

    filme de tema histrico geralmente tem

    mais a ver com a poca em que produ-

    zido do que com a poca abordada. As-

    sim, por exemplo, uma abordagem do

    passado muitas vezes, mais rica quan-

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    25BOLETIM PGM 2 - CINEMA E HISTRIA

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    CINEMA E ESCOLA

    do analisada sob a luz do conhecimento

    e das angstias do tempo presente.

    Um grito de alerta: querem apagar

    a histria. Jovens de 20 anos no sa-bem o que foi a Guerra do Vietn, como

    foi a descolonizao da frica, as lutas

    populares por liberdade, contra a dita-

    dura, a tortura. E o mais grave: livros,

    filmes, peas de teatro, pensamentos e

    personalidades que escreveram um pro-

    jeto de Brasil so apagados da histria.

    Em tempos que privilegiam o efmero,o voltil e o descartvel, este livro pea

    essencial na guerra santa que trava-

    mos contra a amnsia histrica que que-

    rem nos impor.

    Bibliografia

    Soares, Mariza de Carvalho. A histria va i

    ao c inem a. Rio de Janeiro: Record,

    2001.Ramos, Ferno Pessoa. Es tudos d e ci ne -

    ma. Porto Alegre: Sulina, 2001.

    Bernadet, Jean-Claude. Bras i l em tempo

    de cinema: ensaio sobre o cinema bra -

    si le i ro. Rio de Janeiro: Paz e Terra,

    1978.

    Gerber, Raquel. O mito da civi li zao at ln-

    tica : Glau ber Rocha , cinema, poltica e

    esttica do incons cien te. Petrpolis: Vo-

    zes, 1982.

    Gomes, Paulo Emlio Salles. Cinema: traje-

    tr ia n o subd esenvo lv imento . Rio de

    Janeiro: Paz e Terra, 1980.

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    26BOLETIM

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    CINEMA E ESCOLA

    PGM 3 CINEMA E LITERATURAUMA SINTAXE TRANSITIVA

    ROSALIA DENGELOSCORSI*

    * Dra. em Educao pela Universidade Estadual de Campinas Unicamp. Pesquisadora do Lab. de Estudos AudiovisuaisOLHO Faculdade de Educao - Unicamp.

    1 EmA Experincia do Cinema(org. Ismail Xavier) O Cinema e as Letras Modernas, p. 269.2 Extrado de publicao feita pela Embrafilme,Lio de Amor, p. 5.

    A literatu ra moderna est satu rad a

    de cinema . Reciprocamente, esta arte m is-

    ter iosa mui to ass imi lou da l i teratura1.

    Com estas palavras, Jean Epstein inicia

    seu ensaio, de 1921, sobre o intercm-

    bio entre as estticas do cinema e da li-

    teratura moderna, mostrando-nos a for-te influncia de uma arte sobre a outra.

    Podemos confirmar essa declarao

    de Epstein em Ama r, Verbo Intran si t ivo,

    romance moderno de Mrio de Andrade,

    que se constri com perceptvel dilogo

    com o cinema, tanto nas referncias que

    faz a este, como nas tcnicas utiliza-

    das que lembram aquelas utilizadas pelocinema. O livro foi escrito em 1923 e

    publicado em 1927. O prprio Mrio de

    Andrade escreve a Srgio Milliet sobre o

    romance, em 1923, chamando-o de ci-

    nematogrfico: A t ua lm en t e escrevo

    Fru lein - rom ance. possvel que fi que

    no meio, como todas as grand es emp rei-

    ta das que tomo. Cinemat ogrfico. Ma n-

    do-te d o pr efcio (cu r to) as duas idia s

    que con tm2 .

    Ama r , Ver bo In t r an s i t i vono pos-

    su i captu los, conforme a norm a a ceita ,numerao de seqncias ou ttu los para

    ela s. um tex to de fi co const rudo pela s

    cenas que fixam d iretamente momentos,

    f lashs, resgatand o o passa do, ou cenas

    que so apresentadas pelo Nar rador. s

    cena s, cont ra pem-se as d igresses d o

    Narra dor que comp ete f reqentemente,

    dan do gran des demonst raes de conhe-cimento terico, com a viso que a herona

    tem do mun do e do amor. As d igresses

    so, de fa to, su a in terpr etao. A sepa ra -

    o d os episd ios , a mudana de cen-

    rio, de espao, a passagem do tempo, os

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    27BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    cortes desv ia ndo a a teno do leit or, so

    ma rcados apena s pelo espacejam ento

    padr onizad o que, graficamente, acentua

    a idia de seqncia solt a e d iv iso danarra t iva em f lagrantes3 . J nesse tre-

    cho do prefcio ao romance, de Tel Porto

    Ancona Lopez, percebe-se o uso de uma

    terminologia prpria gramtica do cine-

    ma: fla sh , cena, seqncia, corte. Seguin-

    do o prefcio mais frente, l-se: O

    Narr ad or, que cap ta a cena no que ela

    tem de essencial, freqentemente nos fazlembrar a rep resentao cinematogrfica :

    a cmera que segue os passos, foco isen-

    to, olhand o por d etrs, ou foco comprome-

    tid o que faz s vezes dos olhos d a perso-

    nagem. Narr ar cinematogrfico de roman-

    ce modern o, combin ad o com a reflexo

    lit erria , ma chad iana , meta lin gsti ca, e

    com a capacidade do Narrador d e se fun-

    d ir s man ifestaes do mun do in terior de

    suas personagens4 .

    Na forma que o romance toma, muito

    desse narrar cinematogrfico produzi-

    do com a oralidade da prosa que o texto

    escrito reproduz; com a tcnica das cenas

    que substituem os convencionais captu-

    los, como j foi dito; e por muitos outros

    recursos formais, dos quais cito alguns:

    F r a s e s t e l e g r f i c a s . N o m e a o

    abundante. Enumerao : Procedimen-

    to, na prosa, equivalente ao processo

    descritivo-narrativo da linguagem cine-

    matogrfica expresso atravs da contigi-

    dade de planos. (...) O quart in ho escu -

    ro . Ma r ia emb ala no bercinh o pobre of i lh o recm -na sc id o. Ja n elas ab erta s,

    dan do para a grande noite azulada, fa-

    cilm ente mst ica . Nascem do cho, sa em

    pelas jan e las a s d uas co luna s inc lina-

    d as d o lu a r. Vero. Silncio. Mu rm ri o

    em ba ixo, longe, das guas sagrad as d o

    Reno.(Amar, verbo intran sit ivo - AVI5 , p.

    65.) (Esse trecho refere-se a uma diva-gao de Frulein, cuja representao

    sugere as tomadas e movimentos de

    cmera, um certo tipo de luz, de som e

    at o silncio significativo.)

    M a i s c u l a s d e s t a c a n d o a l g u n s

    enunciados : O uso das maisculas aqui

    corresponde, se pensarmos na lingua-

    gem cinematogrfica, tcnica do Close-

    up e/ou Detalhe,que vo alm da su-

    perfcie das aparncias para tocar em

    revelaes dramticas:A cid ade uma

    inva so d e avent ure i ra s a gora! Como

    nu nca teve! COMO NUNCA TEVE, Laur a

    (...) Por isso! Frul ein p repa ra o rap az. E

    evitam os quem sabe? atumdesastre!.. .

    UM DESASTRE! (AVI, p. 77).

    NO EXISTE MAIS UMA NICA PES-

    SOA INTEIRA NESTE MUNDO E NADA

    3 Em Uma Difcil Conjugao, prefcio aAmar, Verbo Intransitivo,escrito por Tel Porto Ancona Lopez, p.13.4 idem, p.15.5 AVI abreviatura de Amar, Verbo Intransitivo.

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    28BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    MAIS SOMOS QUE DISCRDIA E

    COMPLICAO(AVI, p. 80 )

    Meu D eus! UM FILH O. (. . .) . . . um

    FILHO...(AVI, p.135)

    FIM(AVI, p. 14 0)

    Uso de Onomatopias e Neologis-

    m o s : Espcie de dimenso auditiva que

    complementa significativamente as ce-

    nas textuais:

    A bulha dos passarinhos arranhava

    o corredor. De repente fogefugia as-

    sustado sem motivo colibri: Pleque-

    leque, pleque... pleque... pleque...

    (AVI, p. 51)

    Carlos abaixou o rosto, brincabrin-

    cando com a pgina.(AVI, p. 56)

    Pum! Tarat! Clarins gritando, baio-

    netas cintilando, desvairado matar,

    hecatombes, trincheiras, pestes, ce-

    mitrios...(AVI, p .61)

    Chiuiiii... ventinho apreensivo. Gran-

    des olhos espantados de Aldinha e

    Laurita. Porta bate. Mau agouro?...

    No... Plaa... Brancos mantos... E

    iluso. No deixe essa porta bater!Que sombras grande no hol... Por

    ques? Tocainado nos espelhos, nas

    janelas. Janelas com vidros fecha-

    dos... que vazias! Chiuiii... Olhe o si-

    lncio. Grave.(AVI, p . 88)

    O murmulho das guas gargalhou um

    brekekekex fanhoso.(AVI, p . 120 )

    O cinema est presente no roman-

    ce, no s pelos recursos lingsticos

    utilizados que o mimetizam, mas tam-

    bm atravs de citaes ao cinema, afir-

    mando o hbito j entranhado no con-texto urbano onde o romance se passa

    de freqent-lo e sua influncia no ima-

    ginrio dos freqentadores:

    Dona Laura ficava ali, mazonza, numa

    quebreira gostosa quase deitada na

    poltrona de vime, balanceando manso

    uma perna sobre a outra. Isso quando

    no tinham frisa, segundas e quintas,

    no Cine Repblica. (AVI, p. 59)

    Depois do almoo as crianas foram

    na matin do Royal. (...) E como so

    juntinhas as cadeiras do Royal! (...)

    O certo que o corpo dela ultrapassa

    as bordas da cadeira todo mundo se

    queixa das cadeiras do Royal. (AVI,

    p . 69)

    De primeiro era o dia inteirinho na

    rua, futebol, lies de ingls, de geo-

    grafia, de no-sei-que-mais e nata-

    o, tarde com os camaradas e inda

    por cima, depois da janta, cinema.

    (AVI, p.71 )

    Quando ele sentiu sobre os cabelos

    uma respirao quente de noroeste,

    principiou a imaginar e criticar. Cri-

    ticar comparar. Que gosto que teri-

    am esses beijos de cinema? (AVI,

    p . 91 )

    Laurita pensava que havia uma his-

    tria triste. Frulein com Carlos.Talqual na fita de Glria Swanson.

    (AVI, p.137 )

  • 7/25/2019 Dialogo s Cinema Escola

    29/50

    29BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    E se no quer gastar os cem, o cine-

    ma AVENIDA cerra aos poucos os olhos

    eltricos, gente que sai, gente na por-

    ta, bulha de empregados apressados.

    (AVI, p.143 )

    Na avenida Higienpolis o telefone-

    ma avisou que ele almoava com o

    Roberto. Mais um companheiro se

    juntava a eles. Passaram a tarde no

    cinema. (AVI, p .145 )

    L io d e Amor a adaptao de

    Eduardo Escorel, para o cinema (1976),

    do livro de Mrio de Andrade.

    Podemos averiguar, a partir das ce-

    nas iniciais do filme, como a linguagem

    do cinema, na conduo de Eduardo

    Escorel, traduz esse romance que j em

    sua raiz cinema.

    Quero me fixar no que estou cha-

    mando de a potica de Frulein (perso-

    nagem essencial do livro e filme, vivida

    pela atriz Llian Lemertz), em grande

    parte nascida do discurso indireto livre

    presente no romance, e indagar de que

    modo e com que recursos tcnicos/

    estilsticos o cinema a traduz, j que o

    cinema optou por prescindir da podero-

    sa voz narrativa literria e, conseqen-

    temente, de todos seus malabarismos

    discursivos.

    Algumas cen a s 6 iniciais marcam a

    apresentao e chegada de Frulein namanso. Tomando a parte inicial em que

    Souza Costa contrata o trabalho de

    Frulein e sua chegada de txi man-

    so, quero buscar nesses acontecimen-

    tos a soluo esttica encontrada para

    sua traduo ao cinema. E ainda inda-

    gar que densidade ontolgica de

    Frulein o cinema, com as solues es-tticas assumidas, torna visvel.

    Eduardo Escorel optou por ficar

    rente aos fatos e imagens narrados no

    texto, na produo do filme Lio d e

    Amor. O filme mantm-se obediente ao

    texto. difcil fugir de um texto em que

    fatos e imagens esto l, ntidos, ofere-

    cendo-se a serem reproduzidos. A mai-or parte das falas das personagens es-

    to no filme, tal qual esto no texto. Po-

    rm, o filme ter de lidar com a ausn-

    cia do narrador, figura expressiva e atu-

    ante no romance que garante a densi-

    dade dramtico-potica da narrativa.

    Uma opo do filme foi no sair das cer-

    canias da manso de Souza Costa, es-

    pao fundamental da ao dramtica,

    6 V.Pudovkin distingue Cena de Seqncia: O roteiro de filmagem completo dividido em seqncias, cada seqnciadividida em cenas e, finalmente, as cenas mesmas so construdas a partir de sries de planos, filmados de diversosngulos (...) esses pedaos ou planos, so trabalhados de maneira a dotar as cenas de uma ao que as interligue, ascenas separadas so agrupadas de forma a criar seqncias inteiras. A seqncia construda (montada) a partir dascenas. Suponhamos que temos a tarefa de construir a seguinte seqncia: dois espies se arrastam sorrateiramente emdireo a um paiol de plvora, no intuito de explodi-lo; no caminho, um deles perde um papel com as instrues.

    Algum acha o papel e avisa o guarda que chega a tempo de prender os espies e evitar a exploso. Neste caso, oroteirista tem que lidar com a simultaneidade das vrias aes acontecendo em lugares diferentes. , emA Experinciado Cinema (org. Ismail Xavier) - Mtodos de Tratamento do Material (Montagem estrutural), p.57/65.

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    30/50

    30BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    diferente do livro que fotografa cenas e

    costumes do centro urbano paulistano.

    Logo no incio do filme, deparamo-

    nos com uma cmera ou um foco com-prometido, como se fizesse s vezes dos

    olhos da personagem. O ponto de vista

    assumido logo no incio conduzir o es-

    pectador pelo resto do filme. Vejamos

    como isso ocorre.

    O filme abre-se com os primeiros

    crditos, em fundo vermelho. Nessa tela

    vermelha vemos o esboo, em linhas on-duladas brancas, de um livro onde se l:

    Lio d e Amor

    A da p t a d o d o r oma n c e Amar,Verbo

    Intransitivo

    d e Mrio de A nd rad e

    Rote iro : Edu ard o Cout inh o e Eduard o

    Escorel

    A im agem mostr ad a em s ilncio e d ur a

    l5 segu nd os ap roxim adam ent e. A lio

    de amor ter somad a a o seu aprend iza-

    do uma cor quent e a cor vermelha .

    CORTE

    7

    A primeira cena passa-se no quar-

    to de penso de Frulein, com apenas

    uma tomada de cmera. Iluminao dis-

    creta, acentuando a modstia das aco-

    modaes. So utilizados plano ameri-

    cano e plano mdio e a cmera movi-

    menta-se seguindo o movimento dos

    personagens. Souza Costa e Frulein

    dialogam sobre os acertos finais do con-trato de trabalho de Frulein. O quar-

    to, embora pequeno, est muito bem

    organizado. Frulein veste um conjun-

    to simples, blusa de manga longa, saia

    e colete. O cabelo est preso. Seu ar

    profissional e suas falas so seguras e

    decididas, revelando uma mulher que

    no se intimida diante do homem e quetem clareza quanto aos seus desejos, no

    plano profissional. O dilogo muito

    prximo ao dilogo do livro e a cena dura

    aproximadamente l minuto e 20 segun-

    dos.

    Os dois esto sentados junto mesa,

    finalizando o ch:

    SC:Ento, estamos entendidos, srta. Elga. So

    oito contos pelo servio. Pagos no final, quando

    tudo estiver concludo.

    F:Perfeitamente, Sr. Souza Costa.

    Levantam-se e dirigem-se porta e

    no trajeto:

    SC:Est frio!

    FFFFF: Estes fins de inverno so perigosos em So

    Paulo.

    7 Corte=> passagem direta de uma cena para outra. Ver Doc Comparato,Da Criao ao Roteiro,p.276.

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    31BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

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    CINEMA E ESCOLA

    Frulein abre a porta do quarto. Sou-

    za Costa estende a mo em despedida.

    Antes de oferecer sua mo:

    F:E... Senhor, sua esposa est avisada?

    SC: No, a srta. compreende... ela me.

    Esta nossa educao brasileira... Alm do mais,

    com trs meninas em casa...

    FFFFF: Peo-lhe que avise sua esposa, senhor. No

    posso compreender tantos mistrios.

    SC:Mas, senhorita...F: Desculpe insistir. No me agradaria ser tomada

    por uma aventureira. Certamente no irei, se sua

    esposa no souber o que vou fazer l.

    SC:Muito bem. Se assim que a srta. deseja,

    pode ficar tranqila. Estaremos sua espera,

    senhorita.

    Souza Costa sai, Frulein fecha a

    porta, encosta-se nela, com olhar alon-

    gado e perdido, ouve-se, ento, sua voz,

    numa espcie de monlogo interior:

    F: Mais oito contos. Se a situao na Alemanha

    melhorasse... Mais um ou dois servios e possopartir. E casar. Ter uma casa sossegada. Um

    rendimento certo.

    Ao mesmo tempo em que se ouve o

    pensamento de Frulein, comea a cres-

    cer um som musical que se funde ao seu

    pensamento. A msica tem uma estru-

    tura meldica que aflora sentimentos

    nostlgico-melanclicos. somente or-

    questrada com destaque ao som do pia-

    no. Essa composio de Francis Hime

    tornar-se- uma espcie de tema de

    Frulein e ser um centro de fora nacriao da subjetividade da personagem,

    construda pelo cinema. A msica atra-

    vessar as duas cenas seguintes, de for-

    ma que o final da segunda cena coinci-

    de com o final da msica. Como se subs-

    titusse a voz narrativa, a msica, alm

    de ligar as cenas, introduz com sua car-

    ga dramtica a personagem Frulein.(Quero chamar ateno para a atmosfe-

    ra romntico-sentimental que a msica

    sugere, pois ela se fixar imagem de

    Frulein.) Frulein no apenas uma

    imagem visual, mas a imagem visual so-

    mada a uma imagem auditiva.

    CORTE

    A prxima imagem retoma aquela

    primeira livro sobre fundo vermelho

    continuando a apresentao da equipe

    de atores, de produo, de direo etc.

    uma imagem longa com 2 minutos e

    10 segundos de durao. Durante essa

    apresentao, a msica que havia come-

    ado baixa, na seqncia do quarto, jun-

    to com o pensamento de Frulein, as-

    cende e atravessa toda essa tomada, con-

    tinuando na cena seguinte, abrandan-

    do, agora, sua altura de som. O especta-

    dor, enquanto l os crditos vai sendo

    enredado nessa narrativa musical muda

    de palavras.

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    32BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

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    CINEMA E ESCOLA

    CORTE

    A cena que se segue focaliza, em giro

    de travelling-panormico lentoascensional, o amplo espao onde se lo-

    caliza a grande casa branca dos Souza

    Costa, plantada em meio a uma extensa

    rea verde, com grades e jardins. A cena

    externa e a luminosidade do dia ope-

    se quela interna do quarto. Os olhos

    do espectador movimentam-se nesse giro

    panormico, so levados a apreciar a ma-

    jestosa residncia. Se o espectador tiver

    retido na memria a fala de Souza Cos-

    ta: estaremos sua espera senhorita,

    logo ligar a casa figura masculina da

    cena inicial. Se retomarmos as falas e

    imagens da cena do quarto, veremos

    como rica em informaes de apresen-

    tao do quadro scio-cultural-brasilei-

    ro, no qual Frulein far interveno. A

    msica, que tivera incio h duas cenas

    anteriores, invade tambm toda essa

    cena, que dura aproximadamente 50

    segundos.

    CORTE

    A cena seguinte mostra, em close-

    up8 , uma outra Frulein, agora elegan-

    te, de chapu negro, blusa branca de

    gola alta, broche na gola, luvas, colete e

    casaco negros, olhando obliquamente.

    Uma luz suave e impressionista acentua

    a atmosfera criada pelo olhar e trajes de

    Frulein. Diferente daquela do quarto de

    penso, vemos uma mulher que olhacom uma curiosidade suspensa no olhar.

    Os ltimos acordes da msica encerram-

    se sobre sua figura.

    CORTE

    Em plano geral e cmera alta, vemosum carro parado em frente ao porto de

    ferro, ouvimos o rudo do motor, indi-

    cando o carro ligado, malas sobre o cap,

    um empregado vindo apressado abrir o

    porto. Sem que soubssemos vimos

    todo o giro em torno da manso da cena

    anterior, da perspectiva de Frulein que,

    de dentro do carro, observava o lugarpara onde estava indo. Ser o seu olhar,

    o seu ponto de vista, a sua subjetividade

    que nos guiar at o final do filme. Sua

    presena ativa orientar o desvenda-

    mento dos outros personagens e o

    surgimento da atmosfera scio-cultural

    em que vivem. E se a primeira cena em

    que Frulein faz o acordo de trabalho

    com Souza Costa nos mostra a mulher

    dividida entre o homem-da-vida e o ho-

    mem-do-sonho alemo como faz o

    romance, essa Frulein de chapu ne-

    gro ir, no decorrer do filme, muito por

    causa da msica que a tematiza, recor-

    8 A figura humana enquadrada de meio busto para cima. Em A . Costa, Compreender o Cinema, p. 181.

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    33/50

    33BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

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    CINEMA E ESCOLA

    tando-se aos nossos olhos mais como

    mulher-do-sonho, j delineada pelo

    olhar da mulher que se encosta na por-

    ta, quando Souza Costa sai, pela esco-lha de seus trajes e seu jeito de olhar,

    quando se apresenta na casa.

    Uma mulher-imagem, mulher-som,

    mulher-luz, ir se recortando ao espec-

    tador. Quase uma realidade onrica. Ci-

    nema. Mais audiovisual do que escrita.

    Justa aos movimentos da criao cine-

    matogrfica. Fato revelador de que, em-bora literatura e cinema construam sin-

    taxes transitivas, cada linguagem sem-

    pre traar suas especficas rotas de cria-

    o artstica.

    Se o cinema est impregnado da li-

    teratura, a literatura moderna sorve os

    ritmos e modos do fazer cinematogrfi-

    co. Linguagens convergentes, cinema e

    literatura so linguagens do nosso viver

    urbano, contemporneo, que se fixam em

    nossa memria e nos educam cotidiana-

    mente.

    Obviamente, a arte literria narrati-

    va com sculos de elaborao estilstica,

    constitui-se em uma referncia ao ci-

    nema. Interessante notar o caminho

    inverso: a esttica do cinema, aos pou-cos, invadindo e interagindo com a est-

    tica literria. Pasolini, autor de obras li-

    terrias e cinematogrficas, reconhece

    em sua literatura, o modo de criao do

    cinema: Min ha pa ixo pelo cinema est

    in timamen te liga d a m in ha f orm ao,

    a ta l ponto que, quan do releio hoje cer-

    tas obra s l i terrias min ha s, produzid asbem an tes de meu pr im eiro f i lme, elas

    me pa recem ter sid o escritas com a des-

    crio dos t ra vel li ngs , seqncia s et c.

    preciso repetir que essas duas lin-

    guagens da arte influenciam-se mutua-

    mente e participam da educao do ho-

    mem contemporneo. Educao que se

    processa de forma espontnea, naturalou formalizada nas instituies educa-

    cionais.

    Educao espontnea, pois a litera-

    tura e o cinema esto ao alcance de quem

    estiver interessado em ler um livro ou

    assistir a um filme dentro de casa ou nos

    lugares que se freqentam diariamente.

    Um garoto de sete anos sabe ler um fi lme

    a t ra vs d e su a m on t a gem, nos diz

    Marguerite. Duras. E se o livro supe um

    acessoa ele para que nos tornemos lei-

    tores, o cinema requer uma prticapara

    que nos tornemos espectadores.

    Educao formal, quando essas lin-

    guagens, migradas para as instituies

    educacionais, passam pelo crivo de uma

    equipe ou de um professor que planeja

  • 7/25/2019 Dialogo s Cinema Escola

    34/50

    34BOLETIM PGM 3 - CINEMA E LITERATURA

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    uma metodologia de abordagem tanto a

    um livro programado para leitura, quan-

    to a um filme.

    Walter Benjamin, j em 1931, dizem sua Pequena H istria d a Fotogra fia

    que o an a l fa beto d o fu tu ro no ser

    aqu ele que no sabe escrever, e sim quem

    no sabe fotogra fa r, pois sejamos de di-

    rei ta ou de esquerd a, temos de nos habi-

    tuar a ser vistos.Temos de nos educar a

    ver os outros, em close-up, em plan o ge-

    ra l, em cmera lentae em tantas outrastcnicas de captao das imagens. Te-

    mos de nos educara ver a realidade

    construda e mediada pelas tecnologias

    de reproduo das imagens e dos sons.

    Uma realidade montada de forma nada

    inocente dentro dos estdios do cinema

    e da televiso.

    Se a Escola j carrega uma tradiode alfabetizao da linguagem literria,

    tem, agora, o desafio de alfabetizar-se e

    alfabetizar na linguagem das imagens e

    sons em movimento. Aprender a v-las

    demoradamente, quadro a quadro,

    interagindo com sua sintaxe. Se ns

    olhamos as imagens, elas tambm nos

    observam e nos perguntam: Trouxeste

    a cha ve?.

    E, quando a Escola realiza um tra-

    balho, conjugando harmoniosamente

    a linguagem literria com as imagens

    e sons em movimento do cinema, oaluno/leitor/espectador quem ganha.

    Tanto o leitor-espectador de literatu-

    ra poder ver iluminadas e animadas

    as cenas e imagens descritas no texto

    escrito, quanto o espectador-leitor de

    cinema poder imaginar em palavras

    as imagens e sons materializados na

    tela.

    Referncias biblio-filmogrficas:

    Andrade , Mrio de. Ama r, Verbo Intransi t ivo,

    BH/RJ, Villa Rica, 1995.

    C o s t a, Antonio. Compreend er o C inema,

    coleo dirigida por Umberto Eco, 2

    ed., SP , Globo, 1989.

    Comparato , Doc. Da Cr iao ao Roteir o, Lis-

    boa, Editora Pergaminho, 1993.

    L i o d e A m or, direo de Eduardo

    Escorel, baseado na obra de

    Mrio de Andrade,Ama r , Verbo

    Intransi t ivo, Brasil, 1976.

    Xavier, Ismail (org.). A Exper incia d o Ci-nema, Rio de Janeiro, Edies Graal:

    Embrafilme, 1983.

  • 7/25/2019 Dialogo s Cinema Escola

    35/50

    35BOLETIM

    D I L O G O S

    CINEMA E ESCOLA

    PGM 4 CINEMA NA ESCOLACINEMA NAESCOLA: A VOCAO EDUCATIVA DOS FILMES

    MARIALVAMONTEIRO1

    O ideal que o cinema e o rdio fossem, no Brasil, escolas

    dos que no tm escolas.

    (Roquette Pinto, 1936)

    A nossa televiso tem 50 anos de existncia. Nesse tempo,

    ela poderia ter alfabetizado todo o nosso povo, contado a nossa

    histria, criando um sentimento de nacionalidade.

    (Fernan do Barbosa Lima , 2002)

    Para se esboar a histria do Cinema

    Educativo entre ns, importante

    remetermo-nos Lei n 378, que cria o

    Instituto Nacional de Cinema Educativo,

    que refere, na Seo III Dos servios re-

    lativos educao item 2) Instituies

    de educao escolar - Art. 40: Fica creadoo Instituto Nacional de Cinema Educativo,

    destinado a promover e orientar a utili-

    zao da cinematographia, especialmen-

    te como processo auxiliar do ensino, e

    ainda como meio de educao popular em

    geral. Assinavam a lei o ento Presiden-

    te Getlio Vargas e o Ministro da Educa-

    o e Sade Gustavo Capanema, na data

    de 13 de janeiro de 1937.

    Neste mesmo ato, ficou o Poder Exe-

    cutivo autorizado a despender, no exer-

    ccio de 1937, com despesas de material

    necessrio ao Instituto Nacional de Ci-

    nema Educativo a importncia de qua-trocentos mil reis (400:000$). curioso

    observar que, neste mesmo ano, a mes-

    ma lei destinava s despesas necessri-

    as ao desenvolvimento do theatro