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Deus se é em si, por si e para si a sua mesma razão de ser num ato coeterno e infinito de vida trinitária E olhando-se no que faz Ele ser Deus, cria o homem à sua imagem e semelhança, para que possa ser seu filho, herdeiro da sua glória e partícipe da vida divina Todas as criaturinhas e toda a criação vão expressando no Verbo sua só canção de Deus MÃE TRINIDAD DE LA SANTA MADRE IGLESIA SÁNCHEZ MORENO Fundadora de A Obra da Igreja

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Deus se é em si, por si e para sia sua mesma razão de ser

num ato coeterno e infinitode vida trinitária

E olhando-se no que faz Ele ser Deus,cria o homem à sua imagem e semelhança,

para que possa ser seu filho,herdeiro da sua glória

e partícipe da vida divina

Todas as criaturinhase toda a criação

vão expressando no Verbosua só canção de Deus

MÃE TRINIDAD DE LA SANTA MADRE IGLESIASÁNCHEZ MORENO

Fundadora de A Obra da Igreja

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27-08-2000

DEUS SE É EM SI, POR SI E PARA SI A SUA MESMA RAZÃO DE SER

NUM ATO COETERNO E INFINITO DE VIDA TRINITÁRIA.

E OLHANDO-SE NO QUE FAZ ELE SER DEUS,

CRIA O HOMEM À SUA IMAGEM E SEMELHANÇA,

PARA QUE POSSA SER SEU FILHO, HERDEIRO DA SUA GLÓRIA

E PARTÍCIPE DA VIDA DIVINA

Ó Soberania eternamente transcendente doInfinito Poder…! Como necessito expressar-tediante do que minha alma-Igreja, subjugada earrebatada pelo esplendor da tua glória, con-cebe do teu transcendente mistério!;

e que, iluminada pela penetração da tua in-finita sabedoria amorosa, hei de soletrar comminhas pobres palavras criadas, com temor deprofanar-te, ao não encontrar a maneira de di-zer o indizível e comunicar o incomunicável;

tendo-me que valer dos limitados modos hu-manos que estão ao alcance da pobreza de mi-nha pequenez, para dizer algo do que, impeli-

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Imprimatur: Joaquín Iniesta Calvo-ZataráinVigário GeralMadrid, 24-12-2004

2ª EDIÇÃO

Separata de livros inéditos da Mãe Trinidad de la SantaMadre Iglesia Sánchez Moreno e dos livros publicados:

«LA IGLESIA Y SU MISTERIO»«FRUTOS DE ORACIÓN»«VIVENCIAS DEL ALMA»

© 2004 EDITORIAL ECO DE LA IGLESIA1ª Edição espanhola: Setembro 2000

A OBRA DA IGREJAROMA - 00149 MADRID - 28006Via Vigna due Torri, 90 C/ Velázquez, 88Tel. 06.551.46.44 Tel. 91.435.41.45

E-mail: [email protected]

www.clerus.org Santa Sé: Congregação para o Clero(Librería - Espiritualidad)

ISBN: 978-84-86724-71-9Depósito legal: M. 48.262-2007

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fundando-me nas suas infinitas riquezas, impul-sa-me com força irresistível, em repetição de sa-piente sabedoria amorosa de quanto Deus pôse põe no meu espírito, somente como o Eco di-minuto da Santa Mãe Igreja, e recebido dela, aentoar meus cantares; participando da expres-são do Verbo, para proclamar como possa algodaquele insondável e coeterno mistério do Ser.

Do Ser que, sendo-se sido em si, por si e parasi em subsistência exuberante de Divindade, éo único Ser coeterno, o único Deus!, ao ter emsi o potente poderio de ser seu mesmo Prin-cípio, sem princípio e sem fim. «“Eu sou o alfae o ômega”, diz o Senhor Deus; “aquele que é,que era e que vem, o Todo-poderoso”»1.

Já que em Deus não existe o princípio, por-que nunca começou; nem terá fim, porque nun-ca termina; sendo-se Aquele que não tem prin-cípio, fora da abóbada da criação e da sucessãodo tempo.

Deus já era no princípio,ainda que dele carecia;Ele era o mesmo Princípio,e princípio não tinha.

O Pai o Filho geravaem conversação divina,

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da pela tua infinita vontade e sob o impulso demanifestá-lo, Tu pões no recôndito do meu es-pírito para que o comunique;

movida por aquele: «Vai e dize-o…!», «Istoé para todos…!» que impregna toda a minhavida e lança-a a proclamá-lo do modo quepode, diante do teu desejo sacrossanto, eternoe infinito de ser mais conhecido e, como con-seqüência, mais amado e reverenciado, segun-do corresponde à tua infinita Santidade, e semerece pela excelência do teu infinito ser.

Diante do que, minha pobre alma, anonada-da, trêmula e ultrapassada, tem que expressarcom ocasião e sem ela, como pode, através datartamudez da minha enrouquecida voz, os mis-térios divinos.

Porque a glória de Deus a mim o exige peloquerer premente da sua infinita vontade, queimprime seu coeterno pensamento em minhaprofundeza como «o Eco» da Santa Mãe Igrejaem repetição do mistério, repleto e saturado deDivindade, que nesta Santa Mãe se encerra, pa-ra saturar todos os homens da embriaguez des-sa mesma divindade que dimana da sua Cabe-ça, que é Cristo, o Unigênito do Pai, que,encarnando-se nas entranhas puríssimas da Vir-gem, fez-se homem por amor.

O qual, sendo um com o Pai e o Espírito San-to, morando no seio da Santa Mãe Igreja, apro-

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1 Ap 1, 8.

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exuberante e plena perfeição de si mesmo, oé num só ato de perfeição e de vida.

Ó, o que é Deus, que é tudo quanto infini-tamente pode ser em sua infinitude de coeter-na transcendência de ser!

Ó, o que se é Aquele que se É, em sua uni-dade de ser; na qual, pela perfeição da sua mes-ma natureza e pela plenitude infinita de ser-se,irrompe em seu ato de Contemplação Expres-sada em Amor!

E toda a sua exuberante e inexaurível per-feição, Ele se a vê, Ele se a olha, Ele se a con-templa, Ele se a abrange e se a possui em seuato de Contemplação rompendo em fecundi-dade de sabedoria explicativa.

Ó, o que é Deus!, que tudo quanto é, Elemesmo se o expressa em seu ser-se Palavra in-finita de inéditas e inexauríveis melodias; e Elese o ama em seu ser-se Amor infinito, coeternoe pessoal.

E Deus se é Pai e Deus se é Filho e Deus seé Espírito Santo! E se o é pelo seu ser subsis-tente e infinitamente suficiente em si mesmo,por si mesmo e para si mesmo!

Ó, o que é Deus, que tudo quanto pode serse o é em seu só ato familiar de vida trinitária!

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e o Filho ao Pai explicavaa mesma vida infinita.

Tudo no Verbo foi dito,e n’Ele mesmo continhatudo quanto foi criado,por ser-se Soberania.

Deus não cabe em nenhum sítio,e em todas partes habita,em sua vida trinitária,pela sua potência infinita.

E Deus mora no nosso tempo,e do tempo carecia.

6-3-1967

Deus é o Ser, o Ser…!, que, por ser-se, é tãosubsistente e suficiente, que é o único Ser sidoe possuído em si mesmo e por si mesmo. Eque, por ter em si e por si a sua mesma razãode ser, sida e possuída, é tudo o infinito eminfinitude de ser; sendo tudo quanto pode serna infinitude plena e exuberante da sua infini-ta perfeição, num só ato de vida e abrangên-cia coeterna de intercomunicação trinitária.

Deus é o Ser. E este Ser Ele se o é, Ele se otem, Ele se o possui como em miríadas e miría-das de infinitos atributos e perfeições; que, pela

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sua eterna Santidade, coberto e envolvido nomistério sacrossanto da sua vida transcendente;

«Ali» onde, em sabedoria amorosa, Deus seé, vivido e penetrado no seu só e infinito Olharpara dentro, para dentro!, o Ser que, de tantoser-se Ser, irrompe em Fecundidade infinita eplena de Explicação Canora em Abraço deAmor eterno.

«Assim diz Iahweh, o rei de Israel: A quemhaveis de assemelhar-me? Quem igualareis amim? A quem haveis de comparar-me, como sefôssemos semelhantes?

Eu sou o primeiro e o último, fora de mimnão há Deus. Quem é como Eu? As minhas tes-temunhas sois vós –oráculo de Iahweh– vóssois o servo que escolhi, a fim de que saibaise creiais em mim e que possais compreenderque “Eu Sou”. Eu, Eu sou “Aquele que É” e forade mim não há nenhum salvador».

«Se não crerdes que “Eu Sou” –diz Jesus–morrereis em vossos pecados»2.

Ó infinito e inacessível Ser!, anonadada emprostração de reverente adoração diante da ex-celência da tua coeterna santidade, e invadidapela luz do teu infinito pensamento, necessito,impulsada pelo teu sapiencial Cantar, expressaralgo do que, desde teu mesmo pensamento e

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Num saber transcendente,Deus se sabe o que ée o que, em si, pode ser-se, que é ser-se o que se sabeque, por si, Ele pode ser.

Pois é tanto o seu poder,que saber-se, n’Ele, é ser-se;já que n’Ele identifica-se a sua potência com o seu ser,e a sua existência infinitacom a sua maneira de ser.

Potência que é sem termo;vida que rebenta em ser;e ser que é tanta vida,que, sempre fluindo em Três,é todo sabedoriapelo seu infinito poder.

Deus se é o que se sabeque, pelo seu ser, pode ser.

27-1-1967

Ó plenitude de vida de subsistente e coeter-na Virgindade fecunda!, em separação infinita-mente distinta e distante de tudo o que não éDeus mesmo, sendo-se a sua Virgindade trans-cendente em desnecessidade infinita de tudo oque é criado; vivendo, em subsistente subsis-tência, oculto e velado no Sancta Sanctorum da

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2 Is 46, 5; 44, 6-7; 43, 10-11; Jo 8, 24.

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«O unigênito de Deus, que está na intimida-de do Pai, Ele no-lo deu a conhecer»3.

Em tal fruição amorosa de entre ambos que,em amor de retorno, faz surgir, em expiraçãoamorosa de infinita Sabedoria sabida em Expli-cação canora num só ato de ser, o Espírito San-to; Amor radiante paterno-filial de penetrante esapiencial sabedoria, recebida do Pai e do Fi-lho; que abraça, num romance infinito, o mis-tério transcendente, consubstancial e trinitáriodo ser, sido pelo Pai em sabedoria amorosa deContemplação, expressado pelo Verbo, e ama-do, como fruto de amor paterno-filial, em e pe-lo Espírito Santo; Beijo infinito do Pai e do Filhoem desfrute ditosíssimo de Família Divina.

Eu conheço o perfurard’Aquele que em meu peito aninha,porque, em sua vida escondida,consegui contemplar,fora de quanto é de cá,em seus lumes acendida,aquela ciência sabidada excelsa Trindade.

E, por isso, minha alma enchidasaboreou o gostarque se dá em meu palpitar,

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ultrapassada pela luz da tua sabedoria, enten-do; compreendendo, sem abranger, o modo decomo Tu te és, ó Pai eterno!, Sapiencial Sabe-doria de Olhar amoroso.

Porque um só olhar Deus tem e se é em si,por si e para si no recôndito profundo do mis-tério do seu inesgotável e insondável ser.

E tão fecunda e inexaurivelmente to és, ó Pai!,que irrompes, pela fecundidade exuberante doteu ser, sido e possuído por Ti em teu ato devida repleto e saturado de Divindade, numFilho de Expressão Explicativa de inéditas Can-ções; dando-lhe tudo o que Tu és e ficandocom tudo em Ti mesmo e no fruto do teu ge-rar em Filho; Luz de Luz de luminosa clarida-de do teu mesmo pensamento, e Figura da tuasubstância, no princípio sem princípio do teuser-te a Fecundidade infinita estourando, de tan-to ser, em Paternidade geradora; dando à luz oeterno Oriens, Verbo em soletração amorosa deexplicação de resposta em doação de entrega,pelo mistério consubstancial do teu gerar divi-no, o Filho que estás gerando e que sempretens gerado, como Unigênito, fruto da tua con-templação.

«Iahweh me disse: “Tu és meu Filho, Eu hojete gerei”».

«No princípio era o Verbo e o Verbo estavacom Deus e o Verbo era Deus. No princípioEle estava com Deus».

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3 Sl 2, 7; Jo 1, 1-2. 18.

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fora das coisas de cá,levada pela potênciada sua coeterna bondade,e movida em sua forçapara que possa expressar-lhe,como o Eco da Igreja,afundada na realidadeda sua coeterna clemência.

15-1-1977

E Deus, que tem em si, por si e para si, tudoo que pudesse necessitar sido e possuído eminfinitude de sê-lo e possuí-lo, sem que nin-guém lhe possa aumentar, tirar ou diminuir adita essencial que em gozo eterno se é ; quer,num desejo voluntarioso do seu infinito poder,criar seres que participem d’Ele, para a mani-festação magnífica do esplendor da sua glória.«Façamos o homem à nossa imagem e seme-lhança», «para chegar a ser partícipe da Natu-reza divina»4.

E como num esbanjamento em derramamen-to do seu amor, para criar criaturas que pos-sam viver por participação do seu mesmo gozoem desfrute eterno e dita gloriosíssima de co-municação trinitária; faze-o de uma maneira tãoinfinitamente transcendente que, no mesmo eúnico Olhar que Deus se é e que, sendo-se-o,

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quando me abismo na vidadaquela Trina Unidadeque, em amores comprazida,da alteza em que ela habitame introduz em seu gozar.

Eu sei a meu Deus como éem seu ser-se grandeza,porque, sendo levantadapelo poder da sua força,me introduziu em sua morada,na profundeza da sua greta.

E ali bebi da torrenteda sua sapiencial sapiência,afundada em seus Mananciais,em tão aguda agudezaem que me mostrou seu ser-seem suas maneiras diversas.

Infinidade de atributosrompem daquela Beleza;sendo-se Deus Uno e Trinoquanto pode em sua potência,podendo tudo serpela sua infinita excelência.

Eu vi o Ser subsistirnesse instante que encerraa infinita Deidadeem sua Trindade excelsa;

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4 Gn 1, 26; 2 Pd 1, 4.

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mesma realidade. E, criados com capacidadepara poder possuir Deus e ser deuses por par-ticipação, por meio da graça santificante pode-mos chegar a realizar o fim para o qual Deusnos criou à sua imagem e semelhança.

Um só Olhar Deus temem subsistente Olhar,que de tanto ser-se sido,rompendo em fecundidade,é a razão subsistentedo seu ser-se a Divindade.

Um só Olhar Deus tem.E esse só Olharque o faz ser-se Vidairrompendo em Trindade;por sua potência infinitairrompendo em vontadecoeterna, amorosae infinita de criar,o faz olhar para fora,e assim poder-se plasmarem seres que o possuampara suas glórias cantar.

Ó, o que é o homem no pensamento divi-no, predestinado desde toda a eternidade à su-blimidade excelsa de ser filho de Deus; pelo

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é a razão de ser do mesmo Deus, olha-se, emvontade criadora, naquilo que a Ele faz serDeus;

tão íntima, amorosa e profundamente, e demodo tão surpreendente, que cria o homem àimagem e semelhança do que Ele mesmo se ée pelo que se o é, para que possa chegar a pos-suí-lo em participação desfrutadora; fazendo acriatura capaz de ser Deus por participação, fi-lho seu, herdeiro da sua glória, e, portanto, par-tícipe da mesma vida divina.

Pelo que Deus, ao criar a criatura racional ca-paz de viver da sua mesma vida por participa-ção, para poder plasmar nela, de alguma ma-neira, ainda que infinitamente distante e distinta,a sua mesma razão de ser; olha-se no que Eleé e pelo que se o é. E assim a criatura é ima-gem em reverberação do que Deus é e de por-que se o é.

E como, a Deus, o ser-se o que é, é o que ofaz ser Deus, ao plasmar em nós essa imagemdo que é e pelo que se o é, é pelo que nos fazcapazes de ser «deuses e filhos do Altíssimo»5

e herdeiros da sua mesma glória.

E à criatura racional, criada com esta capa-cidade, sendo imagem da mesma realidade di-vina em seu porquê, Deus infunde a graça san-tificante, que a faz conforme e adaptável a essa

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5 Sl 82, 6.

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Que alegria que Deus, não somente seja bomem si, por si e para si, mas que tenha querido,num ato de sua vontade amorosa, cheio de mi-sericórdia, manifestá-lo para fora!

Pelo que quando Deus nos criou, pôs em nóscapacidades imensas, inesgotáveis, com exigên-cias de plenitudes quase infinitas; já que criou-nos para Ele, para a sua posse, para a sua ditae para o seu gozo.

Fez-nos corpo e alma, e deu-nos capacida-des com as quais pudéssemos cumprir a exi-gência de possuir que Ele pôs no nosso ser.

É tão maravilhosa, tão rica, tão por cima donosso pequeno entender a criação do homem,que tampouco, sem uma luz sobrenatural, po-deríamos compreender sua grandeza.

Com as capacidades da alma, o homem tempossibilidade de possuir Deus, de adentrar-seem seu mistério, de viver da sua mesma vida,de saboreá-lo em seu mesmo gozo, de pene-trá-lo com a sua infinita Sabedoria, de expres-sá-lo com a sua inexaurível Palavra e de amá-lo nas chamas candentes e infinitas do EspíritoSanto.

O homem, por sua vida de graça, é capazde viver a mesma vida que Deus vive, em co-

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derramamento daquele que é bom, infinitamen-te bom e Santo!, e «necessita», sem necessitarnada para si, fazer felizes outros seres com amesma felicidade que Ele tem-se no gozo di-vino e sacrossanto da sua mesma vida.

Que feliz é Deus e que bom!, que, num der-ramamento desbordante da sua vontade, criaseres para que o possuam. Diante do qual,Deus mesmo, sem poder gozar mais do que emsi, por si e para si, tira do seu gozo essencialum gozo acidental que o faz gozar amorosa-mente em infinita complacência, e cria-nos àsua imagem e semelhança de um modo tão su-blime, que a criatura é elevada à dignidade ex-celsa de ser filho de Deus e herdeiro da suaglória.

«Pois aos que Ele conheceu desde sempre,também os predestinou a se configurarem coma imagem do seu Filho, para que este seja oprimogênito numa multidão de irmãos. E àque-les que predestinou, também os chamou, e aosque chamou, também os justificou, e aos quejustificou, também os glorificou»6.

Que feliz é Deus e que bom por ter em si asua felicidade e bondade infinitas! E que felizé Deus e que bom por ter querido manifestar-se como é, e ser eu a parte integrante e recep-tora dessa manifestação!

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6 Rm 8, 29-30.

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E, rompendo em expressão com o Verbo evolvida para Deus, expressasse, na minha medi-da, com a mesma Palavra do Pai, a sua riquís-sima, eterna e infinita perfeição; sentindo-mePalavra, expressão, manifestação jubilosa quenecessita cantar, num romance de amor, o mes-mo Amor infinito.

E, diante do saboreamento do que contem-plasse e expressasse, abrasasse-me no amor doEspírito Santo. «Todos nós, porém, com o ros-to descoberto, contemplamos e refletimos a gló-ria do Senhor e assim somos transformados àsua imagem, pelo seu Espírito, com uma glóriacada vez maior»8.

Vivendo assim com Deus mediante a minhavida de graça a mesma vida que Ele vive naintimidade do seu Lar; aqui em fé, e no dia di-tosíssimo da eternidade, na Luz gloriosa dosbem-aventurados.

Que bom é Deus, e que Santo!, que, quan-do criou-me como manifestação da sua bonda-de amorosa, num derramamento da sua doaçãopara fora, fez-me capaz não só de conhecê-lo,não só de vê-lo, não só de contemplá-lo, masque me deu possibilidade de olhá-lo com a suamesma Vista, de cantá-lo com a sua mesma Bo-ca, com a sua mesma Palavra, com a sua mes-

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municação íntima com a Família Divina, dentrodo Seio infinito da Trindade: «Vem participarda alegria do teu Senhor»7, na repleção desseLar eterno, para viver por participação em in-timidade de família como o mesmo Deus!

Pelo que eu posso ser feliz com o mesmogozo de Deus, que me criou, não para que ovisse como um espetáculo esplendoroso e es-magador, mas para que entrasse no seu festiminfinito e coeterno a viver por participação amesma vida que Ele vive em e por sua natu-reza divina; para que o contemplasse em suaSabedoria, cheia de gozo e felicidade, cheia depenetração e de profundeza; e de tanto con-templá-lo na intimidade jubilosa do seu ser, o-lhando-o na luz dos seus olhos e introduzindo-me nas divinas pupilas do seu olhar eterno,soubesse –de saborear–, num saboreamentoque é vida, a perfeição infinita da fartura, ple-nitude, formosura e riqueza eterna que Ele mes-mo se é em si, por si e para si.

Ao criar-me Deus, por uma complacência doseu amor e um derramamento da sua bonda-de, à imagem da sua mesma perfeição e paraque o possuísse; fez-me capaz de entrar naContemplação saborosa da sua vida, e ficandosubjugada e arrebatada pela formosura do seurosto, fosse transformada n’Ele.

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7 Mt 25, 21. 8 2 Cor 3, 18.

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Obrigada, Senhor…! Obrigada, Senhor…!Obrigada, Senhor…!, porque deste-nos por gra-ça, por participação, o que Tu és e tens pornatureza! Quem somos nós para ser criadospara viver a mesma vida que Deus vive, gozarem seu mesmo gozo, saborear em seu mesmosaboreamento, cantá-lo em sua mesma Cançãoe amá-lo no seu mesmo Fogo? Como agrade-ceremos a Deus o que fez conosco? O que fa-remos com o seu infinito presente? Como cor-responder-lhe?

Pois, não só meteu-nos na sua vida dando-nos participar da sua atividade eterna, mas que,ademais, criou-nos para que participássemosdas infinitas perfeições do seu ser. Pelo que pôsem nós capacidades e exigências quase infini-tas de beleza, de riqueza, de formosura, de pos-se, de felicidade e de amor, que Ele nos sacia-ria com a participação da sua riqueza e, assim,fôssemos formosos com a sua formosura, feli-zes com a sua felicidade e repletos com a ple-nitude participativa da sua mesma Divindade.

E também Deus deu ao homem capacidadesde possuir toda a criação, de tal forma que ofez mais perfeito que toda ela: rei, dominador,contentor e recopilador de toda ela; abrangen-do, tendo e contendo plasmada em si de al-guma maneira a exuberante, plena e variadís-

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ma Expressão, e de amá-lo com o mesmo Amorcom o qual Ele se ama: o Espírito Santo, Pessoaamor do Pai e do Filho em Beijo infinito defruição em caridade eterna; de tal forma quepudesse viver sua vida, que é conhecer-se, ex-pressar-se e amar-se, na comunicação familiare ditosíssima da sua vida trinitária!

O que pôde fazer o Criador, pelo homem,que não fizesse? Como poderá caber na men-te humana que este homem seja capaz de en-trar dentro de Deus, de ser Deus por participa-ção, filho do Infinito e repleto com a repleçãodo gozo eterno?

Que alegria, que júbilo para o homem, que,no mesmo momento de ser criado, encontra-sevolvido para o seu Criador, com umas cavernasimensas em necessidade de plenitude do Eterno!Já que o homem, criatura à distância infinita doSer transcendente, é criado, não para contem-plá-lo de longe, não para entrar em sua casacomo convidado de honra, mas para viver naprofundidade profunda e recôndita do Seio daTrindade, para engolfar-se e saturar-se nas suasinfinitas perfeições, para embriagar-se nas cor-rentes daquele divino Manancial de águas vivasque saltam até a vida eterna. «Que o sedentovenha, e quem o deseja, receba gratuitamenteágua da vida»9.

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9 Ap 22, 17.

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si a sabedoria do Pai que as fez tão formosas,sendo com o Verbo expressão da riqueza divi-na, obrada mediante o amor do Espírito Santoque se reflete na diversidade incontável de to-das e cada uma das criaturinhas do universo.Sendo toda a criação um grito de expressão emanifestação das grandezas de Deus.

Como reflete-se em toda ela a imensidade doCriador! Como manifestam-se as suas riquíssi-mas perfeições! «São insensatos por naturezatodos os homens que ignoram a Deus, os que,partindo dos bens visíveis, não foram capazesde conhecer “Aquele que é”; nem tampouco,pela consideração das obras, chegaram a reco-nhecer o Artífice… De fato, partindo da gran-deza e da beleza das criaturas, pode-se chegara ver, por analogia, Aquele que as criou. Por-tanto, eles não têm desculpas»10.

Em toda a criação, foi derramando-se Deusem seu esplendor infinito, em seu poder, emsua força, em sua beleza, em sua riqueza, fa-zendo de toda ela uma explicação canora queo refletisse.

A criação inteira está gritando: «Deus», estáexpressando: «Infinitude»! Toda ela, de modofinito, está cantando o Infinito. «Os céus nar-ram a glória de Deus, o firmamento anuncia aobra de suas mãos»11.

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sima riqueza da criação inteira, que só pode serdescoberta, conhecida e penetrada saboreavel-mente através dos dons do Espírito Santo.

Sendo o homem capaz de interpretar, des-cobrir, manifestar e dar sentido a essa realida-de esplendorosa que, como manifestação daperfeição infinita, expressa a glória de Deus.

Que plenitude de matizes! Que imensidadede riquezas as do universo! Que profundeza ado seu descobrimento!

A criação inteira é um grito que, rebentandoem perfeições, expressa algo, em sua maneirafinita de ser, da infinitude exuberante da per-feição do ser de Deus.

Milhões e milhões de folhinhas das árvo-res…! Milhões de criaturas que, em seu cantoe do seu modo, manifestam as grandezas doEterno: o rugido do mar…, a imensidade dosbosques…, a grandeza do firmamento em suadiversidade quase infinita de mundos…, a or-dem do universo…, o rugido do vento…, ocântico do pássaro…, a simplicidade da flor…,o esplendor do trovão, o sibilar da brisa…, osilêncio da noite..., a beleza da luz…! Tudo vaiexpressando, em seu modo de ser, em seu es-tilo, a terribilidade do Eterno em sua majesta-de simplicíssima de concerto de amor!

E a criação inteira e todas as criaturinhas porpequenas e insignificantes que pareçam, têm em

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10 Sb 13, 1. 5.; Rm 1, 21. 11 Sl 18, 2.

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Todo meu Deus é Silêncio…! Silêncio emExplicação, num ser-se silencioso de tão silen-ciosa Voz, que, de tanto ser Silêncio o ser eter-no de Deus, rompe, por seu ser-se eterno, emsublime Explicação…!

Explicação que, em silêncio, diz o ser domeu Senhor, em tão íntimo silêncio, que é emsilêncio a sua Voz!

Ó, que ser mais silencioso é o ser-se de meuDeus…! Eu já encontrei meu silêncio em teuser-te, meu Senhor, em teu ser-te silencioso si-lenciosa Explicação que diz, numa Palavra, oser-se eterno de Deus…!

Ai, que estouro de vida é o ser-se do meuDeus…! É todo vida fecunda! É todo amor emCanção…! E por Ele todas as coisas, por ser-seEle a Expressão, foram feitas à imagem da suamesma perfeição!

Ó, que criação suprema saiu desta Voz, comoexplicação finita do mesmo ser-se de Deus…!

Homem, criado para dar sentido à criação,para ser a voz que responda por toda ela dian-te do Criador…! Toda a criação está em espe-ra de que tu glorifiques a Deus por ela. PorqueDeus, quando formou as criaturas irracionais,fê-las para o homem, para o seu desfrute, paraa sua posse, para o seu gozo; e por isso criou-as sem voz, sem entendimento, para que o ho-mem, sendo voz e intérprete de todas elas,

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Todas as coisas cantando vão a vida do meuDeus; tudo no Verbo expressando, em sua in-finita Expressão, o inesgotável canto do ser-sedo meu Senhor…

Vamos, que cantem as flores, o ar com seurumor, o mar com as suas ondas bravas…!; quevá tudo explicando, em seu ser-se explicação,em seu romance de vida, sua só canção deDeus!

Todas as coisas criadas vão-me cantando omeu Deus. Tudo, em seu ser-se criado saindodo Criador, num estouro de vida, diz a glóriade Deus.

Venham…! Venham todos os poetas, e até omesmo Salomão, vejamos se fazem um poemacomo o que meu Deus criou…!

Calai, calai, passarinhos…!; calai todos vossavoz…!; porque, ouvindo seu concerto, só ex-pressão do meu Deus, ficando transcendendo,quero o silêncio de Deus…

Calai, calai, florzinhas! Não interrompais estaunião que, entre minha alma e o Verbo, fun-diu o mesmo Deus…!

Que eu me sinto entranhada no ser-se de meuDeus, cantando toda a sua vida em sua mesmaExplicação…!

Que calem as harmonias…! Que não se ouçaa sua voz…! Que interrompem o concerto queestou ouvindo em meu Deus…!

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penetrava intuindo as profundidades dos seussegredos, e dominava-a submetendo-a sob o es-cabelo dos seus pés. Pelo que era capaz dedescobrir nela o seu verdadeiro sentido e o por-quê da sua riqueza, de todas e cada uma dassuas criaturas.

Por isso o homem, no princípio dos tempos,no Paraíso terrestre, soube dar a cada coisa oseu verdadeiro sentido com a luz do EspíritoSanto que, repletando-o com seus dons e fru-tos, fazia-o ser ditoso, sem nada desejar, semnada apetecer, em espera serena e amorosa dodia do encontro definitivo, em luz clara, com adivina Sabedoria, em seu abraço de eternidade.

Era tão feliz que, segundo vemos pelo Gê-nesis, Deus descia pelas tardes a falar com ele.Com isto, o autor sagrado tenta descrever-nosa comunicação amistosa, íntima, em que o ho-mem vivia com relação a Deus. E no-lo des-creve, ademais, como estava entre animais fe-rozes, sem ter que defender-se deles, massendo seu dominador. E comprovamos como oCriador, ao ver-se refletido em suas criaturas,gozava nelas: «Deus viu que tudo era bom»13.

No encaixamento da vontade divina, o ho-mem era feliz com Deus e Deus gozava com ohomem. Este tinha tudo quando necessitava, emplenitude. Nada, nada pôde o ser criado por

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dera-lhes o seu verdadeiro sentido diante deDeus e diante dos mesmos homens.

«Criaturas todas do Senhor, bendizei ao Se-nhor, exaltai-o com hinos pelos séculos... Ben-dizei a Iahweh, todas as suas obras, nos luga-res todos que Ele governa»12.

Alma do homem, tão grande, tão transcen-dente, criada para o mesmo Deus para possuiro mesmo Infinito no modo que Ele se possuie na maneira que Ele se vive; tendo, partici-pando e possuindo por graça o que Ele tempor natureza…!

Deus presenteou-te seus dons de sabedoria,de ciência, de fortaleza… Para que fosses ca-paz, com o dom de sabedoria, de possuí-lo;com o dom de ciência, de dominar, possuir edar sentido a toda a criação…; e como fruto daposse de Deus e a posse perfeita também dascoisas, vivesses repleto na paz, no gozo, na es-pera, na plenitude e na alegria do encaixa-mento completo dos planos de Deus, dianted’Ele e das criaturas.

Desta maneira criou Deus o homem no prin-cípio, com estas capacidades quase infinitasdiante d’Ele, e com estas capacidades imensas,de domínio do entendimento, diante da cria-ção: sendo o rei dominador de toda ela, que a

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12 Dn 3, 57; Sl 102, 22. 13 Gn 1, 10. 31.

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volvendo-se ao seu Criador respondeu-lhe: nãome submeterei ao teu plano!

Terrível momento…!, arrepiante…!; tão incom-preensível como absurdo…! Com este «não»monstruoso, o homem rompera os planos deDeus sobre ele, como rompeu-os Lúcifer. «Maseles violaram o pacto em Adão, lá me foram in-fiéis»14.

Volta novamente a olhar para Deus e, ó sur-presa!, perdeu-o…! E, ao perdê-lo, ficou semsentido, sem razão de ser. Busca-o e não o en-contra, porque, diante do seu «não» arrepiantede soberba cheia de suficiência, Deus deixou-osó e, ao ir embora, foi-se com todos os seusdons. Ficando o homem obscurecido por ter-serebelado contra Deus pela sua soberba; a qualobscurece a sua mente deixando-o em trevas dedesconcertadora amargura, em noites de mortee terrível e tenebrosa desolação. E, ao olhar-se,o homem encontra-se sem a sabedoria que ilu-minava e enchia seu ser dando sentido a todaa sua vida, sem ciência, sem dons, sem frutos,sem gozo, sem posse do Infinito, sem razão deser…! Já nunca poderia possuir Deus! Já nãopodia contemplar com o Pai a sua infinita per-feição…! Já nunca expressaria com o Verbo acanção infinita do Amor eterno…! Já não sabe-ria de posse de Espírito Santo…! Perdeu Deus

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Deus apetecer que o Infinito não lhe dera porgraça, e não fosse a conceder-lhe um dia nãolongínquo em luz de eternidade. E tudo era dita,tudo era luz, tudo era paz…!

Até que um dia a mente do homem ofuscou-se, como Lúcifer, diante da mesma grandezaque Deus operara nele.

Deus fez ver ao homem o que Ele era emsi, por si e para si, como Princípio de todo ser,como Incriado diante da criatura, manifestan-do-lhe: Isto sou Eu, isto fiz contigo. Reconheceque Eu sou por mim mesmo e que tu és o queés por mim mesmo. Tudo quanto Eu tenho, pormim mesmo, em mim e para mim o sou; tudoquanto tu és e tens, de mim o recebeste comomanifestação do meu amor infinito por ti.Reconhece-o!

E o homem olhou para Deus, e o viu tão es-plendoroso, tão rico, que caindo subjugado,cheio de reverente respeito, em retorno deagradecimento e amor, adorou-o!

Mas, olhou-se a si e viu-se reflexo vivo deDeus, manifestação das suas infinitas perfeições;viu-se Deus por participação, rei da criação, do-minador, possuidor dela, feliz…

E, ó loucura da mente da criatura diante doCriador!, creu-se suficiente, como Deus, e, numdelírio de inimaginável insensatez e loucura,

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14 Os 6, 7.

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e como não está; buscam a felicidade, a posse,a alegria, o gozo, a justiça, a paz que só Deuspode dar; mas, ao terem-se torcido, enchem-nascontra a vontade divina; com o que, em vez dedar-lhe paz, posse e felicidade, dão-lhe amar-gura, desassossego e perda.

Isto mesmo sucede-lhe diante da criação, quea possui do modo torcido e distinto de comoDeus quer. «Toda a criação está esperando an-siosamente o momento de se revelarem os fi-lhos de Deus. Pois a criação ficou sujeita à vai-dade, não por sua livre vontade, mas por suadependência daquele que a sujeitou»15. E daíprocedem as injustiças, os pecados, os ódios, adesgraça em que nos encontramos diante domesmo Deus, diante dos demais e diante dacriação, por encher ou tentar encher as exi-gências do nosso ser com o que Deus não quere do modo que a Ele não lhe agrada.

E assim o homem perdeu tudo e para sempre,ficando «em trevas e em sombras de morte»16,buscando, numa sede insaciável e implacável,novamente e com novas torturas, a plenitude dascapacidades que só no encaixamento dos planosdivinos tinham seu verdadeiro sentido.

Que terrível é dizer a Deus «não»! Que irra-cionável não reconhecer a realidade perfeita de

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e perdeu-o para sempre…, para sempre…! E,com Ele, perdeu tudo!

Este homem, na angústia terrível da perda doBem amado, volve-se para a criação para pe-dir-lhe ajuda, e experimenta o «não» de todaela que lhe diz: «não te servirei», e que se re-bela contra ele; experimentando que perdeu oseu domínio e que, em sinal de protesta, já nãose submete a ele.

Pobrezinho do homem…! Que fará agora?Porque toda esta criação exuberante, cheia deplenitude, de vida, de juventude, ficou em si-lêncio e sem sentido, ao romper o homem oplano de Deus de que fosse a sua voz em ex-plicação de resposta ao Criador; pois não temquem expresse a perfeição da sua riqueza, jáque, desde este momento, a mente do homem,ofuscada, dá à sua própria vida e a todas ascriaturas um sentido distinto do que têm.

Já o homem é conhecedor por experiência,não só da ciência do bem, mas da ciência domal!

Terrível situação a do homem!, arrepiante…!,que experimenta que as suas próprias capaci-dades, criadas para encher-se com a posse deDeus e de toda a criação, exigem-lhe, clamam-lhe, em torturas insaciáveis, a sua plenitude; e,desorientadas e torcidas, buscam o amor aonde

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15 Rm 8, 19-20. 16 Lc 1, 79.

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Que terrível é dizer a Deus «não»!! Que ar-repiante é dizer a Deus «não»!!

Que bom é Deus, que fez em mim e de mimtais maravilhas…! Que terrível é a mente dacriatura, que disse a Deus «não» e, com isso,perdeu tudo, e para sempre…!

Mas Deus, cheio de infinito amor misericor-dioso, novamente volveu-se para o homemque, desterrado, vagava sem rumo nem senti-do por este peregrinar. E, movido pela com-paixão, passando junto dele, olhou-o; e incli-nando-se para ele, falou-lhe de novo, enchendoa sua alma de esperança mediante a promessade uma Nova e eterna Aliança; feita ao Povoeleito, do qual nasceria o Messias, o Libertadore o Restaurador da humanidade. «Éramos pornatureza como os demais, filhos da ira. MasDeus, que é rico em misericórdia, pelo grandeamor com que nos amou, quando estávamosmortos em nossos delitos, nos vivificou junta-mente com Cristo: pela graça fostes salvos»18.

No Verbo e pelo Verbo foram feitas todas ascoisas. E pelo Verbo feito homem –que me-diante o mistério da Encarnação, e pela uniãohipostática da natureza divina e a natureza hu-mana em sua Pessoa divina, uniu Deus com o

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Deus em si e de Deus conosco! Que mons-truoso é rebelar-se contra o Amor infinito, que,em manifestação de doação amorosa e eterna,criou-nos para possuí-lo, enchendo todas asnossas capacidades quase em infinito, e parapossuir todas as coisas na verdadeira posse, fe-licidade e desfrute de todas elas! «Reconhece evê como é ruim e amargo teres abandonado aIahweh, teu Deus, e não teres mais o seu te-mor –oráculo do Senhor–. Não é de hoje quequebraste o jugo e rompeste as amarras. Dis-seste: Não quero sujeitar-me»17.

Por dizer a Deus «não», o homem perdeu-opara sempre, para sempre…!; ficou sem senti-do!; deixou a criação em silêncio e em torturasde morte, gemendo toda ela pelo Libertadorque a restaure dando-lhe novamente seu ver-dadeiro e único sentido.

E, como o céu fechou-se para ele, se a mor-te chega-lhe nesta terrível e arrepiante situação,perpetuar-se-á caindo naquele lugar onde osque disseram a Deus «não», como Lúcifer, man-tém-se nesse «não» de rebelião perpétua comtodas as suas conseqüências; e, portanto, emseparação de Deus para sempre, no abismo daescuridão perpétua, em alaridos de desesperoe torturas eternas, para sempre!

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17 Jr 2, 19-20. 18 Ef 2, 3-5.

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mesmo seio do Pai, pelo esvoaçar amoroso doEspírito Santo…

Voz de vida divina do Homem-Deus que, nomesmo seio do Pai e desde o seio do Pai, élançada amorosamente através da humanidadede Cristo, em vibrações infinitas, até os últimosconfins da terra. «Aclamai a Deus, terra inteira,cantai hinos à glória do seu nome; dai glóriaem seu louvor. À tua frente toda a terra se pros-tra, e canta para Ti, canta para o teu nome»20.

Ó meu Esposo, Verbo divino, Canção eterna,que cantas o eterno ser-se do Deus altíssimo…!Por seres Tu Palavra, a Palavra infinita da Trin-dade na Unidade e do seu ser-se eterno, tinhaque ser em Ti, não somente pelo que o ho-mem fosse criado à imagem e semelhança domesmo Deus para que o possuísse, mas tam-bém restaurado.

Porque, feito em Ti e por Ti expressão fini-ta do teu ser-te eterno, ao cessar sua cançãopelo pecado, tinhas que ser Tu, Palavra infini-ta, a que, encarnando-te, restaurasses o homemcaído e deixasses ouvir neste, novamente, a tuaPalavra canora de amor eterno…

Se em Ti foram criados, em Ti tinham queser restaurados!, já que o pecado fizera calar ne-les a voz que só Tu, Palavra eterna, podias vol-

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homem num abraço compassivo, cheio de mi-sericórdia e amor–, depois da ruptura do pla-no de Deus, todas as coisas, não só já foramcriadas, mas restauradas, pelo mistério da vida,morte e ressurreição de Cristo.

O qual, pelo preço do seu sangue derramadona cruz para a glória do Pai, em reparação infi-nita do Deus ofendido, remiu o homem; e, naplenitude e pela plenitude do seu Sacerdócio,trouxe a salvação para todo aquele que queirabeneficiar-se dos méritos infinitos da sua reden-ção. «Pois n’Ele aprouve a Deus fazer habitartoda a plenitude e reconciliar por Ele e para Eletodos os seres, os da terra e os dos céus, reali-zando a paz pelo sangue da sua cruz»19.

E aquela voz que se apagara diante do «não»da criatura ao seu Criador, volta a ressoar vi-gorosa, infinitamente mais clara e sonora, peloUnigênito do Pai feito homem, em Expressãocanora do mesmo Deus e de tudo o que porEle e n’Ele foi criado.

E toda a criação, como num estouro de ale-gria, regozija-se tão esplendorosamente no Ver-bo Encarnado, que o homem, que cantava aInfinitude de modo finito, dá agora, por Cristo,n’Ele e com Ele, um grito infinito que, che-gando ao peito do Altíssimo, em seu vibrar di-vino dá a sua nota de eternidade, pulsada no

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19 Cl 1, 19-20. 20 Sl 65, 1-2. 4.

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8-12-1974

REQUEBROS EM SILÊNCIO

Quando entendo os mistérios do Deus vivo,eu o adoro e, em seu ser-se, o venero,em resposta que é um canto de louvor,entoando meus cantares como posso.

Com promessas de acesas petições,Deus é doce na profundeza do meu peito,em requebros de conquistas silenciadasque me deixam, com minhas noites,

transcendendo.

Eu o chamo com clamores de amor puro,e Ele responde com a brisa do seu vôo,e se acerca com imenso poderio,remontando minhas vivências ao seu seio.

E ali vivo no silêncio o que Ele vive, no toque delicado do seu beijo.Que palavras de requebros nos dizemos,sem dizer-nos mais que amor em modo quedo!

O silêncio é o mistério da minha vidacom claustrais melodias de segredo.Que sonoras são as vozes do Deus vivo!;em minha profundeza pronunciadas eu as sinto.

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tar a dar mediante a Encarnação. E já por Ti,em Ti e contigo, Jesus, unigênito do Pai, comtua mesma Voz, o homem, não somente cantafinitamente a vida do seu Pai Deus, mas que,por tua Encarnação, o raio da tua luz iluminoua sua mente, fazendo-o dar contigo o som deamor eterno que só Deus pode cantar-se.

E agora o homem já tem no céu um Homem,o Primogênito entre todos os irmãos da suamesma natureza, que, sendo Homem, é Deus;e já Deus tem na terra o seu mesmo Filho que,sem deixar de ser Deus, é Homem… E já oHomem está cantando ao Infinito sendo Deus,e Deus está cantando na terra infinitamente aoinfinito Ser, sendo homem…

Obrigada, Senhor! Obrigada, Senhor…! Meuespírito, reverente, anonadado e ultrapassadode agradecimento, quer ser um hino de louvorda tua glória, que manifeste de alguma manei-ra, desde a miséria da minha ruindade, a ex-celsitude excelsa da tua infinita e coeterna San-tidade, que nos pede, em frase de Jesus: «sedeperfeitos como vosso Pai celeste é perfeito», e«sede santos, porque Eu sou Santo»21, dianteda exigência da sublimidade do fim para o qualfomos criados.

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21 Mt 5, 48; 1 Pd 1, 16.

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Do livro «Frutos de oración»«Frutos de oração»

969. Eu fui criada para escutar, posta na bocada Fonte do gerar divino, aquela rompente deinexaurível Explicação que, na fluidez do seumistério, rompe dizendo em infinitude de con-certos de ser, pelo Verbo, toda a plena e exu-berante perfeição d’Aquele que É eternamenteem seu ser-se, envolto e penetrado no abraçoarrulhador, carinhoso e infinito do Beijo do Es-pírito Santo. (14-9-74)

971. Meu Deus, há distância infinita entre teuser e meu ser, entre a tua divindade e a minhapequenez… Distância de natureza, sim, mas naunião estreitíssima do amor do Espírito Santo.(11-10-74)

972. Sou Igreja e, por isso, tudo quanto Deusé em seu ser-se eterno eu o desfruto, partici-pando da sua felicidade, sob o impulso amo-roso do Espírito Santo. (14-9-74)

413. Deus quer dar-se-nos, e se dá em suaTrindade, porque a obra de Deus para fora sem-pre é realizada em conjunto: o Pai se dá peloseu Verbo no Espírito Santo. (9-1-65)

411. As três divinas Pessoas querem dar-se-nosem sua vontade única; então o Pai deseja-o, o

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Que zeloso é o Herói dos meus amoresque, em conquistas, me reclama por inteiro!Se o busco, Ele se lança à minha chamada,e me beija com marcas de mistério.

Está dentro meu Amador, sinto-o perto,pois o tenho descansando e satisfeito.Que me importam os penares da vida,se respira meu Senhor dentro, em meu peito?

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como é três divinas Pessoas num só ser, assimatua como Trindade unicíssima, e o que vivedentro manifesta-se ao atuar para fora; e assim,pela Igreja, mostra-se-nos a multiforme sabedo-ria de Deus oculta n’Ele desde sempre. (9-1-65)

418. Todo Deus é Palavra de infinita explica-ção, pelo que o seu dizer em nós é atuar-secomo é e no que diz, fazendo-nos ser capta-ção do seu dizer eterno. (6-10-74)

419. Quando o Pai e o Filho dão-se para fora,é com o Espírito Santo, e por isso, os dons efrutos do amor de Deus sobre nós são comu-nicados pelo Espírito Santo em sabedoria amo-rosa. (23-1-65)

420. Deus, atuando sempre em comum paradentro e para fora, o faz como é: um só Deusem três Pessoas; Pessoas que dizem relaçãoumas com as outras. Acontece igual quando asdivinas Pessoas atuam na alma, que o fazem emcomum, mas com a sua personalidade própria.Os Três amam-nos, os Três ensinam-nos e dão-se-nos em comunicação única, mas trinitária deSabedoria Expressada em Amor. (11-9-65)

970. Anseio entrar nos insondáveis mananciaisdo Ser eterno, onde Aquele que É infinitamen-te está sendo-se por si mesmo quanto é e quan-to pode ser, na potência plena da sua inexau-

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Filho cumpre-o e o Espírito Santo termina-o; eassim os Três o fazem, mas na sua maneira pes-soal; pelo que, incluído nesse querer trinitário,cada um atua do seu modo: o Espírito Santo,impulsando o Pai e o Verbo a fazê-lo, e impul-sando-nos a recebê-lo e a escutar o que o Pai,pelo Verbo, quer dizer-nos; o Verbo, expres-sando tudo às divinas Pessoas e a nós; e o Pai,dando-nos em Explicação e em Amor sua vida,ou seja, no-la dando em Sabedoria Amorosa.(9-1-65)

412. As três divinas Pessoas são sabedoriaamorosa; mas como, ao atuar para fora fazem-no em conjunto, o seu plano realiza-se pela sa-bedoria do Pai Expressada em Amor, ou seja,em conjunto; e por isso, o Pai quer uma coi-sa, o Verbo expressa-a e o Espírito Santo con-suma-a, sem ser em Deus uma atuação antesque outra, ainda que, ao submeter-se ao tem-po, efetua-se no tempo; e por isso o Pai dá-nos o Filho, Este se encarna pelo Espírito Santo,o qual depois consuma a obra. (9-1-65)

416. Deus vive a sua vida e, vindo a nós, se-gue vivendo-a conosco e, abraçando-nos, faz-nos viver a nossa vida com Ele e n’Ele. (9-1-65)

417. Deus atua como vive e como é, pois, porperfeição da sua grande realidade, Ele vive oque é, é o que vive, e atua como vive e é. E

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16-3-1969

TEU TOQUE EM MISTÉRIO

Teu toque em minha alma me dizsilêncio,e, quando calo, –mistério!–,te sinto.

E, diante do teu contato divino, me abismo, me perco,e na tua profundeza profunda, ali no profundo,te vejo entre véus.

E no meu peito ferveuma chama de eterno segredo.E com a tua substância repleto minhas ânsiasna luz do teu fogoque me cauterizamuito dentro,onde, sem saber como é,eu te tenhonum saborearde eterno mistério;que é vida sem coisas daqui,e sem tempo,numa harmonia que é luz, que é amor e é concerto.

Que doce ter-te sem coisas de aqui, sentindo teu toque em silêncio!

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rível perfeição. E «ali», afundada em sua pro-fundidade, beber nas veias da concavidade da-quela Fluente eterna, saturando-me na embria-guez do seu saborosíssimo saboreamento.(14-9-74)

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«Frutos de oración»

961. O Amor infinito ama-nos com todo o seuinesgotável ser, já que em Deus não há partes,e quando derrama-se sobre nós, é toda aTrindade quem se dá a nos, para fazer-nos fi-lhos de Deus e herdeiros da sua glória; mas, amedida da nossa divinização depende da me-dida da nossa entrega ao seu amor santificador.(26-6-61)

962. Até onde chegou Deus no excesso do seuamor que, querendo ser meu Pai, fez-me seufilho…! (25-9-63)

963. Deus me faz seu filho, para que o amee o tenha que chamar Pai. (25-9-63)

964. O Pai, o Filho e o Espírito Santo são meuPai Deus em sua Unidade e em sua Trindade.Todo Deus quer comunicar-se à minha alma;todo Deus é meu, para mim, porque eu souIgreja católica, apostólica e romana; e, na me-dida que o seja, viverei minha filiação divina.(15-9-63)

965. Jesus veio para fazer-nos filhos de Deus,e de que modo…! Deu-nos o olhar do Pai paraque o olhássemos; sua canção, como Verbo,para que o cantássemos; e o amor do Espírito

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26-12-1974

DOÇURAS INEFÁVEIS

Doçuras inefáveis, em passos do Imenso,que, de maneira queda, ferem

em lento penetrar…É Deus que, em poderio, lança-se

à alma amante,beijando docemente em terno requeimar.

Doçuras do Deus vivo que, em tênues teclares,

convidam ao silêncio, para poder atuarcom passos de mistério em espírito ferido que clama de maneira queda

em nostálgico amar…

Deus é Amor e Amante, e não tem quem sejaigual a Ele

quando passa em carinho, querendo ficar.Meu peito é um romance de ternas melodias,que responde, do seu modo, ao divino Jogral.

Canções de Aquele que É Ele diz no meu interior,

e, em seu divino acento, expressa-me a sua Divindade.

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Santo para que o amássemos e nos amássemosentre nós. Que grande é ser Igreja! (25-1-75)

966. Na medida em que vivas a tua filiação di-vina, serás Igreja, membro de Cristo, receben-do a sua missão para comunicá-la a todos oshomens. (15-10-63)

967. Meu Pai Deus dá-se-me em sabedoriae amor, para que eu o saiba amorosamente.(26-9-63)

968. Deus é sabedoria e amor em sua vida di-vina, e ao criar-me para ser seu filho, chama-me a viver a sua mesma vida de amor sapien-cial. (26-9-63)

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Prostrada diante do sacrário, escutando o Silêncio

do imenso Segredo em eterno expressar, adora, alma querida; não tentes com palavrasdizer o Indizível em seu modo de atuar.

Responde como possas!,que Deus passa em beijar…

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Minha alma já é conquista do Lutador glorioso,troféu do seu Sangue, que o faz repousar.

Jesus dos meus afãs, escuta no meu interior,vibrante de saudades, um só palpitar:tuas glórias são minhas glórias e,

em ordem de batalha,disposta a defender-te, minha hoste

em guarda está.

Dispõe, como te agrade, de quanto me entregaste;

minha vida é responder em doação de entregasem nada reclamar;

tudo quanto possuo é teu, Amor de meus amores,

e nada nisso busco: só teu descansar!

Se algo eu tivesse que Tu não me tenhas dado,

retorno-o inteiro a Ti em doação total!Mistério de segredo em horas silenciadas,profundos pensamentos que passam por acaso…

Nada é tão doce e terno como sentir o beijode Deus que está passando com beijos de paz.Que doce é a carícia da roçadura

do seu peito…!Que inédito mistério se vive diante do altar…!

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«Frutos de oración»

545. Deus, que se é por si mesmo, cria criatu-ras tão perfeitas, que são capazes de possuí-lopor ter-lhes dado um ser à sua imagem. E acriatura, ao ver-se tão perfeita e que é, dizquando peca: «Não quero submeter meu eu anada». Com isso perde a razão do seu eu de-pendente do Eu divino e, ficando sem razão deser eternamente, não podendo já viver doInfinito, único capaz de fazê-la feliz, tudo con-verte-se-lhe em tortura eterna. (15-9-66)

547. Deus é o Bem supremo, pelo que o ho-mem, criado com liberdade de escolher, quan-do não o vê em luz, busca seu bem própriofora do sumo Bem e, por isto, cai. (9-1-65)

549. O inferno é para os que voluntariamen-te não queiram estar com Deus, mas não parati que anelantemente o buscas. (21-4-67)

550. Terror…! Que abismo tão insondável oda condenação…! Quem cai nele, nunca maispoderá sair da profundidade profunda das gre-tas do seu seio! (1-10-72)

551. Acabou-se o tempo…, chegou o fim…,estás nas portas do abismo! Se caísses nele, ja-mais poderias sair… Olha como vives, porqueo termo está perto! (1-10-72)

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30-1-1973

NADA DIZ NADA…O HOMEM ESTÁ CEGO!

Tudo, no desterro, envolve em suas sombrasos grandes mistérios.Tudo, atrás de suas noites, fica escurecidoe envolto entre véus.Tudo, até as coisas que são mais sublimes,ainda que seja o céu.Tudo, porque o homem,no universo,rompeu, ao rebelar-se contra o Infinito,os planos eternos.

E, ao cair prostrado, o homem nublou, com seu desconcerto,a luz que irrompiado seu pensamento,a qual dominava,com um grande império,o mundo criadosegundo o Imenso.E assim, as trevasa mente do homem cobriram;e este confundiutudo o que é bom,dando-lhe um sentidoprofano e rasteiro,

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552. Duvidas de que existe o abismo e porisso vives como se não existisse? Que farásquando, pela inconsciência do teu voluntárioolvido, talvez te vejas nele? (1-10-72)

553. Convém-te pensar que não existe o abis-mo do vulcão aberto onde caem os que se se-param de Deus, para assim poder viver, comose não existisse, sob a escravidão de tuas pró-prias concupiscências? Que farás quando, aodescobrir que erraste, já não estejas em tempo?(1-10-72)

556. Que reinado mais pobre e mais absurdoo do demônio! Tanto como o daqueles que, emtrevas como ele e cegos, seguem-no. É tão tos-ca e ruidosa a sua atuação e a dos que o se-guem, como fina, silenciosa, sagrada e profun-da nas almas, é a de Deus. (27-3-76)

557. O plano de Deus é que não vás ao pur-gatório; se vais, é vontade permissiva sua, masnão a sua complacência. (29-9-65)

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Nada diz nada,tudo está em silênciopara quem não entrou,com seu pensamento,com a luz eterna, nas variedadesdo grande universo.Nada diz nada,nem sequer o céu…!Nada diz nada, nem talvez a mortecom seu desconcerto,para o homem cego que se separoudo caminho aberto.

Nada diz nada…!,por fundos que sejam os grandes mistériosque envolve a vida; nem um sacrário

em sombrasque oprime em sua profundeza a Glória do céu…

Nada diz nada…!,o homem está cego!

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ficando em silêncioa voz do Eterno,que se manifesta nas criaturase na criação com vozes de fogo.

E por isso o mundovaga no mistério,já que, cego, o homemcegou o pensamentoque Deus lhe infundira para que expressasse,em sabedoria, com seu dom imenso,quanto é criado,em modo certeiro;e desde aquele dia que envolvem as sombraso que é deste solo,tudo o infinitoficou no segredo.Só assim se explica que um sacrário fiquesumido em silêncio,como aprisionando, com grandes cadeias,a luz radiante que envolve o Excelso…! Um sacrário em sombras que não diz nadaao homem profano que não descobriua chama candente, oculta entre sombrasatrás da portinha desse cativeiro…Nem a criação com sua voz de trovão,com mares profundos,com bosques imensos,na variedadedo seu grande concerto…

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11-7-1974

OPRIME-ME O CÍRCULODA CRIAÇÃO

Sou criada para a Eternidade, para a imensi-dade imensa do Ser, para a vida perfeita d’A-quele que É eternamente, para a posse semtempo, sem limites e sem fronteiras da inesgo-tável Perfeição.

Deus fez-me para Ele, para seus modos e es-tilos, para suas maneiras e formas; para entrarcom seu entendimento na luz plena da sua luz,na contenção dos seus imensos sóis, na abran-gência infinitamente abrangente da sua FamíliaDivina.

Fui criada para saber de que sabe Deus emsabedoria de entendimento saboroso, e em pe-netração intuitiva de seu gozo simultâneo eeterno; para cantar com a Canção que, em in-finitude de maneiras de ser, o Verbo se é, e en-trar no concerto das suas infinitas perfeições;para amar com o amor substancialmente per-feito do Espírito Santo.

«“O que Deus preparou para os que o amamé algo que os olhos jamais viram, nem os ou-vidos ouviram, nem coração algum jamais pres-

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pudesse necessitar, num ato simplicíssimo desubsistência infinita de vida trinitária. «Que te-nho eu em meu favor no céu? Fora de ti, nin-guém mais desejo sobre a terra. Minha carne emeu coração desfalecem; rochedo do meu co-ração e minha porção é Deus para sempre!»2.

Às vezes, ao surpreender as exigências domeu espírito e as apetências do meu pobre ser,eu mesma fico perplexa com medo de expres-sar meus sentimentos. Porque, a quem podereidizer que me resulta pequeno o universo, queme oprime a limitação das suas fronteiras e quee que me encerra o apertamento da sua abran-gência? Como manifestar que me sinto oprimi-da e como encerrada diante da contemplaçãoda imensidade do mar, diante da plenitude eexuberância dos bosques, com necessidade dedar um salto e sair, libertando-me de tudo oque é criado, e encontrar a liberdade só namansão infinita do infinito Ser?

Obrigada, Senhor, de que vivas em Ti mes-mo sem mansão, sem limites e sem fronteiras…!

Obrigada de que Tu sejas em Ti a Eternidadee a Posse, a Plenitude e a Imensidade; de quetenhas em Ti o poder de ser-te o que te és, semque em Ti exista um princípio, sem que te con-

2 Sl 72, 25-26.1 1 Cor 2, 9-10; 1 Pd 1, 3-4.

sentiu”. A nós, Deus revelou esse mistério atra-vés do Espírito. Pois o Espírito sonda tudo, mes-mo as profundezas de Deus.

Bendito seja o Deus… que em sua grandemisericórdia, nos gerou de novo para uma es-perança viva, para uma herança incorruptível,imaculada e imarcescível reservada nos céuspara vós»1.

Não fui destinada a arrastar-me pela terra, masa viver na elevação coeterna da minha FamíliaDivina. E eu tenho ânsias como eternas de le-vantar meu vôo e encaixar-me no centro da mi-nha razão de ser.

Pelo que a terra, e ainda mais, a imensidadeesmagadora do universo, resulta-me estreita,apertada!; fazendo-me perceber a sensação deque me oprime em seu círculo, de que me en-cerra no cárcere da sua limitação…; de que nãome deixa sair da finitude de suas muralhas!,para voar para a liberdade livre, para a possesem limites, onde não existem fronteiras, ondenunca teve um princípio e não existirá o fim,e onde respira-se com os pulmões do espírito,abertos em espaciosidades imensas, na possedo imenso Ser em seu ser-se por si mesmoAquele que se É, sem necessitar de nada nemde ninguém, de tempo nem de lugar…; ali!onde Ele se é tudo quanto pode ser e quanto

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Se os homens soubessem o que são para omeu olhar espiritual todas as criaturinhas emsua diversidade de espécies, em sua plenitudede beleza, reflexos todas da infinita Perfeição…!Se os que me acompanham em meu peregri-nar pela terra percebessem o concerto que, emsua exuberante explicação, eu intuo em todasas criaturinhas…!

Porque todas e cada uma das coisinhas cria-das por Deus encerram em si e manifestam àalma que desfruta do dom de ciência, como sãoreflexo, não só do Ser em sua diversidade deinfinitude de matizes, mas também das divinasPessoas em seu modo e maneira pessoal. Pois,quando o homem penetra profundamente acriação, descobre nela a mão do Ser vivente,que, derramando-se em sabedoria, a fez ex-pressão canora de suas maravilhosas perfeições,sendo todas elas manifestação do seu concertoeterno. E tanto a criação inteira, na imensidadedo seu conjunto, como cada um dos átomosmais pequeninos, contêm em si, em seu modo,forma e estilo, a sabedoria do Pai, a expressãodo Verbo e o amor do Espírito Santo.

Deus tem possibilidade de criar imensosmundos em diversidade de maneiras, modos eestilos. Porque Ele é grande, não pelo que nósvemos que fez, mas pela possibilidade que tem,não só de ser, mas de fazer criaturas e coisas.E quando, em sua mente divina, entornou-se

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trole um fim, sem que te abranja nada que nãosejas Tu mesmo em tua eterna e perfeita abran-gência…!

Obrigada, Senhor, por fazer-me experimentar,no círculo circunscrito da criação, a necessida-de eminente de minha próxima libertação…!

Obrigada por fazer-me semelhante a Ti, in-fundindo-me a desnecessidade de coisas, queTu tens para ser-te por Ti mesmo o que te és…!

Obrigada, Senhor, por esta experiência comode claustrofobia que sinto na terra pelo encer-ramento que experimento diante da opressãode todas as coisas, que aprisionam minha almacriada para a eterna Perfeição…!

Tudo na terra fica para mim pequeno; tudoaumenta minhas angústias, oprime minha li-bertação e corta o vôo da minha ascendentecarreira.

Às vezes sinto medo de expressar minhas vi-vências, porque a compreensão do homemtambém está encerrada no limite do seu pe-quenino entender. E, como dizer-lhe as tortu-rantes apetências do meu coração, ansiando ebuscando a libertação do cárcere em que metem encerrada a criação? Como decifrar, aos quevivem subjugados pela imensidade plena douniverso, meus sentimentos diante dele?

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Hoje minha alma sente-se cheia em necessi-dade de repleção d’Aquele que É eternamente.Clamo irresistivelmente por Ele, e expressocomo posso os sentimentos, as necessidades,as apetências do meu coração, que, transbor-dadas, buscam a liberdade do País da Vida; es-perando dia a dia em meus tempos de Sacrário,junto às portas largas da minha eternidade naterra, a hora da minha total libertação.

Vivo tranqüila e espero. Mas, a minha espe-rança, às vezes, se faz tão veemente como anecessidade que Deus pôs em mim por pos-suí-lo, como a urgência que meu espírito, cria-do por Deus, tem de viver só daquele que seÉ, e com Ele e por Ele, na posse mais ou me-nos saboreável de quanto Ele queira dar-me.

«Minh’alma suspira por Ti de noite, sim nomeu íntimo, meu espírito te busca»4.

Que formosa é a criação inanimada, feita porDeus para a manifestação de suas perfeições…!Mas, que imensamente maior e mais transcen-dente é a alma do homem, que tem impressaem si a necessidade subjugante de viver doIncriado; e que foi criada para palpitar, em suavivência real, ao uníssono com o coração deDeus, entrando na comunicação de sua vida evivendo, na medida da sua capacidade criadae finita, do mesmo Infinito…!

4 Is 26, 9.

sobre as criaturas que, dentro da sua possibili-dade de criar, Ele quis que existissem, a sa-pientíssima sabedoria do Pai derramou-se so-bre elas, fazendo-as imagem da sua Palavracanora com o Verbo, e sendo realizadas peloamor coeterno do Espírito Santo.

Pela vontade do Pai, na expressão do Verbo,e pelo Amor pessoal dos dois, que é o EspíritoSanto, Deus realizou, num derramamento doseu esplendor, a magnificência magnífica e es-plendorosa da criação. E por isso, todas as cria-turas «vestidas as deixou da sua formosura»3,contendo em si cada uma delas a riqueza ple-na da canção do Verbo; e aparecendo, diantedo olhar espiritual de quem possui Deus, tãorica a realidade simples da folhinha de uma ár-vore, como a imensidade esmagadora de todaa abrangência do universo. Porque Deus estáem essência, presença e potência dando seuhálito de vida a quanto é, e mantendo em suaexistência quanto existe.

Mas a alma do homem, criada com capaci-dade de possuir o Infinito, anseia remontar seuvôo à posse d’Aquele que é eternamente, quese é por si mesmo; estorvando-lhe tudo quan-to intente aprisionar a sua liberdade ou cortaro seu vôo em ascensão delirante para a eter-nidade.

3 São João da Cruz.

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18-7-1974

ÂNSIAS DE UM NOVO ENCONTRO

São ânsias como infinitasas que em minhas profundezas tenhopor achar meu Amador,por morar com o Eterno;

Ânsias de noites caladas, ânsias de longos silênciose de dias prolongadosem vivências de mistério,

de segredos transcendentescom sabores de cautérios,sabendo do que sabe Deusna profundeza do meu peito.

Intimidade do Deus vivoem soletrações de céu,em conversação caladacom expressões de Verbo…

Vivências de meus vulcões…apetências de meu anelo…Saudades de possuire de abraçar o Imenso…!

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Que grande é quanto tenho, que imensoquanto espero, e que necessidade mais pre-mente a do meu pobrezinho ser de conseguirquanto anseio…! Porque fui criada só para Deus,e só com Ele e por Ele, encontrarei o gozo ple-no e acabado da perfeição que desejo.

Por isso, Senhor, o dia que te encontre naluz luminosa das tuas eternas pupilas, terei tudoem Ti, para sempre, para sempre…!, na posseperfeita do teu ser e na plenitude completa dequanto apeteço.

Obrigada, Senhor, por ter-me feito seme-lhante a Ti, para viver por participação na sa-ciedade perfeita de tua infinita capacidade.

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Comunicação de vidapor Aquele que É em meu encerro…!Eu necessito, em minhas ânsias,com impetuosos anelos,adentrar-me em tuas profundezas,fora de quanto aqui tenho!

Quero olhar-te em teus lumese cantar-te em teu Concerto,sendo palavra em teu Canto,que, em amores de recreio,

beija com meu Esposo amante,nas chamas de seu Fogo,a Entranha, sempre gerandoem divina ocultação!

O gerar do Deus vivoé de tanto acatamento,que está envolvido nos cendaisdo seu virginal portento.

Quem ousará introduzir-senaquele sagrado templo,sem que o convide a glóriasubjugante do Coeterno?

Quem poderá, sem ser levada,introduzir-se no seiodo Amor que a sustenta,e gozar em degustação

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Ouço ansiosa e ofeganterumores de um novo encontro.E, quando apercebo o toquedo Infinito no meu centro,remonto o vôo afanosapara abraçar a quem espero.

Mistério de minhas plenitudesque vivo em rangidos,em esperas prolongadasde divinais encontros!

Deus vem e volta a ir emborasem deixar-me, ainda que o percona posse secretaque oculto no meu encerramento.

Glória de minhas esperanças!,Conquistador dos meus zelos!,só apeteço ter-te!,só entrever-te desejonos lumes infinitosdo teu eterno pensamento!

Penetração possuídad’Aquele que É em soletração…Conversação do Deus vivoem beijo de amor perfeito…Fogaréu de meus afãs…!Resplendores do Excelso…!

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28-1-1974

A ALMA E O CORPO

Por que me tiras quanto me envolve,deixando-me só, pendurada de Ti?Por que só alma me sinto em minha vida,perdida para as coisas que são e que foram,estranha e ausente delas sem mim?

Por que nada é nada de quanto me cerca, e todas as coisas não sãosenão um eco longínquo ficado em olvidoe sem dom?

Estranheza que aterra sinto em meu contorno,

só e desprendida da criação,alheia a suas coisas e desencaixada,sem nada que freie minha marcha para o Sol.

Doce e de maneira queda meu espírito voaurgente para Deus,ficando minha mente perdida e nublada,e como dormida, em separação.

A vida, a morte, o dia e a noite,a sombra e a luz, a terra, o Seol…

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da festa que, em Família,Deus vive em arcano eterno?

Apetências vão e vêmdentro da alma em desterro;saudades por possuiro Poderoso em mistério.

Clamores de minhas pobrezas…!Suspiros de meus anelos…!Mostra-te a mim novamente,ainda que vás embora de novo!

Não vês que, se Tu não vensa visitar-me no solo,meu viver entre os homensé de tão forte tormento,que ou vens a recolher-me,o meu ser voa ao teu encontro?

Por isso, vem, não tardes!,calma meu indizível anelo!,se teu desejo é que vivacontemplando-te entre véus.

Senhor, porque te escondeste?Quando te mostras de novo?

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Já nada lhe importa!,está submergida e corre veloz,toda subjugada pelos esplendoresde quem a roubou.

Mistério sagrado do poder de Deus!Tudo ficou oculto nas sombrasque detrás deixou;nada, nem a recordaçãode quanto passou,corta sua carreira veloz de fragata,porque nada é nada de quanto olvidou.

Não há luta em seu centro,tudo está tranqüilo em seu redor:A alma, a terra, o corpo,o Céu…, o Senhor…Grande separação se obra em meu centro,quando rumorejo o passo potente

do Imenso em dom.

Estranheza cadente, sonho de sentidos,vazio,perda de coisas…;tudo está em silêncio e em adoração,porque o Infinito, passando mui quedo,mui lento, mui suave, a alma roubou.

Que doce é sentir-me levada e trazida,pegada e embalada em braços de Deus…!

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A alma e o corpo, veredas distintas e estranhas seguem ao passar o Senhor;mistério em segredo, quando o Infinitose embala na profundeza do meu coração…

A vida não é vida nem é morte tampouco;do corpo e a alma é separação,sem a grande ruptura que envolve a mortequando deixa ouvir sua voz;poder do Deus vivo, como ímã candente, que atrai o espírito como força em conquistacom passo veloz…

O corpo sente-se levado e trazidosem vida e calor,deixado e perdido em profundidadesde vazio.

Sonho sem dormir-se, saudades sagradasem pressentimentos de algo que roubouas capacidades das suas energias,ficando como barco sem tripulação,e sacudido pelo marulho,só e sem timão.

A alma é sua força, e correu atraídapelas investidas do passo de Deus;e, atrás d’Ele, voando, perdeu seu caminho,seguindo sem rumo para o Sol.

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2-6-1962

AMAR-TE A TI POR TI

Amor…!, que eu te necessito a Ti sem mim…!;a Ti, em Ti e por Ti…!; porque eu estou criadasomente para gozar eternamente em que Tu se-jas feliz, em que Tu sejas ditoso, em que Tu se-jas…! Sim, Amor, em que Tu te sejas !

Eu necessito gozar na eternidade somente emque Tu és a Alegria eterna em comunicação in-finita de luz gloriosa e de amor contente…!; abis-mar-me no abismo da tua infinita felicidade…!

Eu necessito, porque te amo, gozar somenteem que Tu és a Felicidade incriada em comu-nicação ditosa de vida trinitária. Meu amor re-clama estar sempre contemplando-te em teucontento jubiloso de felicidade eterna…

Eu necessito gozar somente, somente, emque Tu sejas Deus, em que Tu sejas feliz, emque Tu te sejas tão glorioso que Tu mesmo teés a tua glória; e de tanto ser-to, não só saciasa exigência infinita de Tu ser-ta eternamente,mas que, por infinitude de perfeição do teu sercontente, excederás infinitamente de felicidadetodas as criaturas criadas com capacidade quaseinfinita para possuir-te.

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seja Deus, em que Deus seja o que é por si eem si mesmo.

Como a alma está criada para glorificar aDeus segundo o seu grau de amor, e no céutodas o terão no máximo grau de sua capaci-dade, a glória essencialíssima de cada uma, se-gundo seu grau de amor, será gozar em queDeus se seja tão glorioso.

Por isso, Amor, que te espero…! Que clamopor amar-te eternamente em meu centro deamor…; nesse ponto de pureza de amor queTu infundes em minha alma…! Que necessitoque meu amor seja o mais puro possível, se-gundo a minha capacidade, e amar-te ondemais te ame, onde a minha pureza de amor sejamais perfeita…!

Sei que isso será na região dos perfeitos,onde se vive em perfeição absoluta de amor.Por isso eu reclamo com urgência amar-te naeternidade; e necessito-o já!, porque cada se-gundo que passa não te amei, estando aqui,nessa perfeição que minha alma almeja.

Estou sedenta e te busco dilacerantemente semplenitude, porque anseio gozar somente em queTu sejas Deus, em que sejas feliz, em que nãosofres, em que Tu és a dita incriada de perfei-

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És tão ditoso…, tanto…, tanto…, tanto!, quefarás consistir nosso gozo essencialíssimo emgozar em que Tu sejas tão feliz; já que trans-bordas, diante da contemplação do teu eternojúbilo, as capacidades de todas as criaturas ra-cionais de tal forma, que terão seu gozo es-sencial em ver-te a Ti tão contente; porque aliestarão no centro do amor puro e no encaixa-mento completo desse mesmo amor.

Sim, és tão feliz, tão infinito, tão glorioso etão Ser… tão Ser…!, que, no céu, essa perfei-ção tua exige nos bem-aventurados que este-jam sempre no máximo grau de amor puro se-gundo a sua capacidade. És tão perfeito e tãoglorioso, que, ao contemplar-te a Ti, a nossacapacidade ficará tão roubada, excedida e so-bejada, que não poderá desejar nada, essencia-lissimamente, fora de gloriar-se em que Tu tesejas tão feliz e tão contente por ser-te Aqueleque te és; tendo todas as almas seu primeiro eessencialíssimo contento em gozar, esquecidasde si, de ver-te a Ti tão ditoso.

Tua alegria eterna de perfeição infinita sub-jugá-las-á tão transcendentemente, que o quenão seja contemplar-te a Ti por Ti, gozando emque Tu sejas Deus, serão segundos gozos aci-dentais que elas possuirão como conseqüênciadisto. O gozo dos gozos, que fará estar a almana eternidade no centro do seu amor e numato de amor puríssimo, será gozar em que Deus

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Amor…!, que contento o da minha alma emque sejas assim…! Que contento o de podergozar eternamente a dita de ver-te tão feliz…!Que alegria tão grande que tua glória seja amesma essencialmente com o amor das tuascriaturas ou sem ele! Que gozo tão completoque, diante da tua incapacidade de sofrer, parapoder fazê-lo, tiveste que encarnar-te!; e aindaassim, sofreste em tua humanidade, mas a tuadivindade ficou impassível.

Ó…! Que venha o que saiba de amor, va-mos ver se pode amar com a pureza de amorque a Deus se ama…! Vamos ver se ele ama oser amado como se ama a Deus…! Vamos verse tem algum ser que tenha em si tal amor, talfelicidade e que seja tão ser em sua perfeição,que exceda infinitamente o desejo de amar detodos os amantes!

Assim é Deus…! É de tal perfeição gloriosa,que excedendo nossa capacidade de tudo oque possamos apetecer, nos fará ter nossa glo-rificação máxima em gozar no que Ele é.

Diz-me, que amas e por que o amas…? Emque te ocupas quando teu amor não é Deus…?Em amar porque te correspondem, que, no fi-nal das contas, é procurar-te; em amar para go-zar tu, que é amor egoísta; em gozar no bem

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ção felicíssima… em que Tu te és… em que Tute és…!, em que Tu te és aquele que és e eu aque não sou…!

Necessito gozar em que Tu te sejas, e só nis-so, sem ocupar-me de mais; e nisto está o cen-tro e a perfeição do meu amor. E eu sei queesta exigência de amor puro que puseste naminha alma, só a poderei encher no lugar doamor puro e perfeito: a eternidade.

Amor, eu não clamo pela eternidade para serfeliz; pois ainda que toda a minha alma estácriada para sê-lo, há algo que ultrapassa quaseinfinitamente esta urgência, e é a de gozar so-mente em que Tu sejas feliz, em que Tu te se-jas, em que Tu te gozes, em que tu te ames,em que Tu sejas a Vida gloriosa em Trindadede Pessoas.

Que alegria tão grande que Tu te sejas tãoditoso…!, que Tu te sejas tão feliz!, que Tu tesejas por Ti mesmo, sem mim…! Que gozo,que, quando eu te ofendi, meu Incriado, nãote desse pena, não te tirasse contento, não tetirasse tua glória essencial…!

Amor…!, que júbilo tão gozoso que Tu te se-jas tão Ser, que o que não és Tu, não te im-porta nada…!; que Tu te sejas tão imutável emteu gozo infinito, que nada te turbe, que nadate toque…; que eu com toda a minha imper-feição, diante de Ti, como se não fosse…

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lo, que num êxtase de amor te diz: Obrigada,Amor, de que Tu sejas Aquele que te és. Obri-gada, Amor, obrigada…!

Toda minha alma, num puro ato de amor, es-tando roubada somente pelo agradecimento aoDeus contente, gozando em que Ele se seja tãocontente…!

Que contente é Deus…! Que feliz se é o Serem seu ser, em seus Três…! Que alegria tãogrande tenho de que Deus se seja tão feliz, tãoSer…!, tão Ser…!; de que Deus, de tanto ser-sea Felicidade incriada de perfeição infinita, sejaUno e seja Três.

[…]1 Amor… de onde a mim que eu possasaber o contente que Tu te és para Ti em teuseio…? Meu amor está contente, está em seucentro gozando em que Deus se é feliz, em queEle se é a dita incriada, o gozo infinito, a ale-gria eterna…

Amor…!, que te espero…! Que eu busco an-siosa estar na eternidade para encher a exi-gência que Tu, ao criar-me, plasmaste em mim,e esta necessidade de amor puro que, como es-posa do teu divino ser, Tu me deste. Não por-

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do amado porque encontras um gozo… Mas,tu sabes o que é Deus, e de que perfeição será,e que glória terá em si, que a alegria de vê-lotão contente e tão feliz será a tua bem-aventu-rança eterna…?

Que será Deus, alma criada pelo Infinito,quando é capaz de saciar infinitamente toda aexigência de amor e felicidade que tu sentes…!E esta exigência satisfá-la-á em tal grau que nãote recordarás de ti; excedendo a felicidade doInfinito tão infinitamente a tua capacidade deamor, que diante da tua impotência por nãopoder gozar em que Deus seja Deus como Elese merece, a tua eternidade será adorar, esma-gada pela glória gloriosa que Ele se é.

Amor…!, toda a minha eternidade dando-tegraças por ser Tu quem és, agradecendo-te queTu te sejas…! Não porque eu o goze, mas por-que Tu o sejas! Toda a minha eternidade go-zando sempre, sempre, sempre!, essencialissi-mamente, em que Tu és feliz, em que és ditoso,em que és Aquele que te és, e em que Tu toés por Ti mesmo, e em que te tens a tua feli-cidade em Ti mesmo, e em que Tu ta és, ta go-zas e ta possuis em Ti e sem mim.

Meu Deus, que alegria tão grande tem mi-nha alma de que sejas tão feliz…! Todo o meuser, um louvor gozoso da tua glória…! Toda euum cântico de ação de graças, porque sejas tãofeliz e tão ditoso; toda eu um cântico de júbi-

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1 Com este sinal indica-se a supressão de pedaços maisou menos amplos que não se julga oportuno publicarna vida da autora.

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E como sei que aqui não o posso fazer tão purae constantemente como ali, por isso quero es-tar ali; já que desejo amar-te onde mais pura-mente possa, e gozar em que Tu sejas Deusonde mais pureza de amor tenha.

Amor, se eu posso amar-te aqui e glorificar-te com a pureza de amor que minha alma an-seia, para mim é o mesmo aqui e ali, já quenecessito amar-te no lugar onde mais puro sejameu amor; não para desfrutar eu, mas por ver-te gozar Tu, ainda que eu não gozasse; nãoporque eu esteja participando do teu contentoao ver-te a Ti gozar, mas porque ali será ondemais puramente eu poderei alegrar-me em queTu sejas Deus…

É que eu não quero gozar de Ti…? Se paraisso fui criada…! Se minha alma anseia viverda tua Trindade e engolfar-me em teu ser paragozar dele…! Mas, diante da urgência quase in-finita que me roubou por gozar somente emque Tu sejas Deus, todo o demais como se nãofosse.

Amor, eu necessito, por exigência de ter sidocriada para gozar de Ti, ser feliz… Eu tenhoimpressa em minha alma a necessidade de pos-suir-te e gozar-te, a de conhecer-te e expres-sar-te, a de amar-te e ser amada com a minhaparticipação de Ti… Clamo com urgências deviver só para Ti, de roubar-te e apanhar-te para2 Jo 6, 57; 14, 31; 12, 28.

que aqui não possa amar-te, já que minha vidaé toda ela um ato de amor; mas porque sei evejo por experiência que este grau de amornem sempre está em seu centro como meuamor a Ti o reclama; porque eu necessito amar-te com a perfeição dos bem-aventurados, e vejoque te amo com o amor dos desterrados quemuitas vezes é imperfeito. Somente para poder-te amar gozando em que Tu sejas feliz e emque Tu sejas Deus, somente para isso!, anseioeu estar na eternidade, e assim amar-te na má-xima perfeição segundo minha capacidade…

Amor…!, eu não sei se me explico… Eu seique não te sei dizer a Ti em Ti, mas vejo quetampouco sei expressar o que sinto por Ti e deTi. Eu só sei que, quando te desejo na tua gló-ria, que quando a urgência de glorificar-te nocéu me rouba e a exigência de gozar em queTu te gozas me faz gemer com gemidos quesão inenarráveis pela eternidade para glorificar-te em minha máxima pureza de amor; então,segundo minha capacidade pessoal de dester-rada, estou no grau máximo de amor puro queeu por Ti posso ter.

«Eu vivo pelo Pai –diz Jesus–... Eu amo oPai... Pai, glorifica o teu Nome!»2.

Já não necessito ir ao céu senão para gozarem ver-te a Ti gozar sem ocupar-me de mais.

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E tudo isto, ó minha Trindade Una, para tuaglória e teu gozo, que é meu gozo e minhaglória.

Este escrito, ó minha Trindade Una, o dedi-co a Ti, como hino de louvor supremo e glo-rificação máxima que na terra posso dar-te, jáque busco o dar-te a conhecer e amar a Ti, porTi, sem mim.

3 Sl 39, 9.

mim, de gozar em que Tu sejas Tu para gozá-lo eu!

Mas, diante da distância como infinita destapureza de amor que Tu infundes na minhaalma, de amar-te só por seres quem és, tudo oque não seja esta pureza de amor sabe-mecomo de profanação; já que minha alma, quan-do está no seu centro, necessita amar-te a Ti,por Ti, sem mim, em Ti.

Mas, ainda que a necessidade de gozar porser-te Tu Aquele que te és me faz viver mor-rendo, sei que aumentar este grau de amor sóaqui na terra posso consegui-lo. Já que cadasegundo, vivendo neste estado de amor em queo Amor me tem, eu alcanço um aumento deamor para mim e para todos os membros daIgreja até o fim dos tempos; e vivendo assim,posso conseguir que aumente o amor puro decada alma, mediante o qual e por toda a eter-nidade, elas gozarão somente em que Deus sejaDeus.

E diante deste programa que se apresenta àminha vista de minha glorificação de Deus e deminha maternidade espiritual, o que é mais per-feito para mim, desejar o Céu ou a terra…? «Queeu cumpra tua vontade. Meu Deus, é isto quedesejo. Tua lei está no fundo do meu coração»3.

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Espera!, que são minhas glóriaspelas que aqui te retenho.Que não é minha falta de amor,porque me abraso em meus zelosde introduzir-te em meus sóisremovendo-te os véus.

Mas é tua glória e minha glória…Os cantares que em ti puspara que mostres minha vida,são freios a meus desejosde adentrar-te no profundoda minha eterna ocultação.

Canta a tua canção, Igreja!Espera em teu cativeiro!,que Eu repleto teus triunfosem frutos de extensão.

Ressurge, esposa, e entoao cantar de teus mistérios!Não cales porque te oprimamos que não entendem teus ecos!

Não temas, Igreja amada,as hostes do infernoquando tentam sufocarteu glorioso ascendimento!,que Eu te tenho encerradana profundeza do meu seio.

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11-8-1974

NÃO ME CHAMES TÃO URGENTE!

Eu chamo a eternidade,e a mim chama-me o Eterno.Eu reclamo seus contatos,e meu ser se abrasa neles.

Deus me lança a possuí-lo,e caminha para o meu encontro.Os dois vivemos buscandoo que exige um mesmo anelo!

Deus necessita ter-menos lumes de seus fogos,para mostrar-me suas glórias,para introduzir-me em seu seioe iluminar-me nas fráguasdo seu infinito silêncio;

porque seus zelos são fortescomo o vulcão do seu peito,e não resiste às penasde meu penar lastimeiro.

Por isso, quando se mostraao meu espírito sedento,sempre lhe diz em amoresinflamado por seu fogos:

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para que alegres a Igrejacom cantares de mistério!

Não olvides, esposa amada,em teu gemer lastimeiro,que na Igreja te fiz Mãee tens que dar vida morrendo.

Espera, porque ainda é pronto!Eu já sei de teus tormentos!

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Não titubeie teu braço,nem teu peito rompa em dó!Esposa, Eu me comprazoem teu lutar lastimeiro.

Mas, não clames tão forteem teu lamentar sincero,porque teu clamor é doce,tanto, que me ponho em vôopelos zelos acesosque, diante de teus penares, sinto!

Não me chames tão urgente,pois reter-me não possoà tua voz que me reclamaentre soluços de encerro!

Espera, Igreja, que, no fim,Eu me lançarei a teu encontroe te levarei ás bodasdo meu infinito segredo!

Não penes, esposa amada,porque me consumo em zelose em ímpetos por tirar-tedo cárcere do desterro!

Não me reclames, tão forte,porque não chegou o tempo,e minhas glórias são ter-tetodavia neste solo,

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NOTA:

Peço veementemente que tudo o que é ex-presso através dos meus escritos, por crê-lovontade de Deus e por fidelidade a quanto omesmo Deus me confiou, quando na traduçãopara outras línguas não se entenda bem ou sedeseje esclarecimento, recorra-se à autenticida-de de quanto ditado por mim no texto espa-nhol; já que pude comprovar que algumas ex-pressões nas traduções não são as mais aptaspara exprimir o meu pensamento.

A autora:

Trinidad de la Santa Madre Iglesia