DETERMINANTES DA EVASÃO DE ALUNOS E OS CUSTOS OCULTOS PARA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PRODUO E SISTEMAS PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ENGENHARIA DE PRODUO

FERNANDA CRISTINA BARBOSA PEREIRA

DETERMINANTES DA EVASO DE ALUNOS E OS CUSTOS OCULTOS PARA AS INSTITUIES DE ENSINO SUPERIOR: UMA APLICAO NA UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE

TESE DE DOUTORADO

Florianpolis Outubro de 2003

Fernanda Cristina Barbosa Pereira

DETERMINANTES DA EVASO DE ALUNOS E OS CUSTOS OCULTOS PARA AS INSTITUIES DE ENSINO SUPERIOR: UMA APLICAO NA UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE

Tese apresentada ao Programa de Ps-graduao em Engenharia de Produo, da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial para a obteno do grau de doutor em Engenharia de Produo.

Orientador: Prof. Robert Wayne Samohyl, Ph.D.

Florianpolis, outubro de 2003

FERNANDA CRISTINA BARBOSA PEREIRA

DETERMINANTES DA EVASO DE ALUNOS E OS CUSTOS OCULTOS PARA AS INSTITUIES DE ENSINO SUPERIOR: UMA APLICAO NA UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE

Esta tese foi julgada adequada para a obteno do ttulo de "DOUTOR EM ENGENHARIA DE PRODUO" e aprovada em sua forma final pelo Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa Catarina.

___________________________________ Prof. Edson Pacheco Paladini, Ph.D. Coordenador

BANCA EXAMINADORA

Robert Wayne Samohyl, Ph.D. Orientador UFSC

Silvio Antonio Ferraz Cario , Dr Co-Orientador UFSC

Gutemberg Hespana Brasil, Dr. Co-Orientador UFES

Luis Felipe Dias Lopes, Dr. Membro UFSM

_______________________________ Rosilene Marcon , Dr. Membro UNIVALI

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

P436d

Pereira, Fernanda Cristina Barbosa. Determinantes da evaso de alunos e os custos ocultos para as Instituies de Ensino Superior. / Fernanda Cristina Barbosa Pereira.; Orientador, Robert Wayne Samohyl. Florianpolis : Ed. do autor, 2003. 172 f. ; 30 cm. Tese (Doutorado) Engenharia de Produo Universidade Federal de Santa Catarina, 2003. 1.Evaso universitria. 2. Instituio de ensino superior Evaso Estudo de casos. I. Ttulo. CDD. 21 ed. 378.16

Aos meus pais Cida e Flvio. A minha v. Aos meus irmos Flvia e Fbio. E ao meu querido Jamerson.

AGRADECIMENTOS

Ao professor Robert Samohyl, pela confiana depositada em mim para a realizao deste trabalho. Ao professor Gutemberg, pela pacincia, disposio e ateno sempre presentes. Ao professor Slvio Ferraz Crio, pela amizade construda nestes anos de dvidas, erros, acertos e principalmente de aprendizagem. Ao professor Bornia pelos conhecimentos passados durante o mestrado e doutorado em Engenharia de Produo e pelas crticas e sugestes na banca de qualificao Ao professor Felipe pela participao na banca e contribuies com estes trabalho. professora Rosilene pela gentileza de participar da banca e pelas consideraes sugeridas. Aos demais professores e tcnicos do departamento de Engenharia de Produo da UFSC. Ao professor Lourival e famlia, que mesmo distantes sempre me apoiaram e torceram por mim. Aos dirigentes da UNESC, em especial o Reitor Prof. Antnio Milioli Filho, o ViceReitor Prof. Gildo Volpato e a Pr-Reitora Administrativa Prof. Maria Julita Volpato Gomes por possibilitar o estudo de caso e por acreditarem na realizao deste trabalho. Aos meus queridos amigos Anderson, Renato e Tatiana do IPAT/UNESC. Carminha pela amizade e companheirismo. Ao Rubson Rocha pela disponibilidade em auxiliar na anlise multivariada. Ao Prof. Mauro Braga da UFMG pela anlise do instrumento de coleta de dados e pelo envio do material solicitado. Aos funcionrios do INEP/MEC pelo material enviado. E, um agradecimento especial ao Jamerson, por tudo que construmos ao longo do desenvolvimento deste trabalho.

RESUMO

O cenrio atual do ensino superior no Brasil, caracterizado pelo excesso de vagas oferecidas, inadimplncia e sobretudo pela evaso dos alunos, requer estudos especficos na identificao das causas deste abandono e do custo oculto resultante da desero dos alunos para as instituies. Este trabalho tem o objetivo de desenvolver e aplicar uma metodologia utilizando anlise fatorial a fim de identificar os fatores que influenciam a deciso do acadmico de abandonar o sistema de ensino superior. Busca-se ainda calcular o custo desta evaso para as organizaes acadmicas. A implantao do mtodo na UNESC Universidade do Extremo Sul Catarinense - sediada em Cricima (SC) permitiu identificar os fatores que contribuem para o abandono discente. Os resultados encontrados indicam que a Instituio analisada deixa de aumentar em 10% seu faturamento em funo da perda dos alunos. Os fatores que mais influenciam a evaso so aqueles internos instituio como a infra-estrutura deficitria, acervo desatualizado, mtodos de avaliao e deficincia didtico-pedaggica dos docentes e aqueles externos ou inerentes ao estudantes tais como, as dificuldades financeiras, a escolha equivocada do curso, falta de base para acompanhar as atividades desenvolvidas no curso escolhido e o fato do aluno ter sido admitido em curso que no foi sua primeira opo. Para reduzir a influncia destes fatores e aumentar a rentabilidade, as Instituies de Ensino Superior (IES) devem avaliar continuamente as expectativas e satisfao dos acadmicos, identificando os problemas e implantando as solues, prevenindo a desero dos acadmicos.

Palavras chaves: evaso do ensino superior, anlise fatorial, custo oculto da qualidade

ABSTRACT

The setting of Brazilian higher educations system is characterized by the excess of offered vacancies, by default and by high dropout rates. Specific studies are necessary to identify the causes of these problems, as well as the hidden cost, which results from students'dropout, for the educational institutions. Therefore, the present study aims to develop and to apply a methodology, using factorial analysis, in order to identify the factors which influence student's decision on quitting university. The study also aims to calculate what the dropout cost is for the institutions. Through the applications of the method at UNESC (Universidade do Extremo Sul Catarinense - Criciuma - SC), it was possible to identify the factors that contribute to students's dropout, and the results show that the Institution has a 10% reductions in its revenue because are those internal to the Institution, as a deficient infraestructure, an out-of-date library, evaluation methods, and teachers'pedagogical didatic deficiency; and the external factors, or the ones that are inherent to students, such as financial difficulties, the mistaken choice of the course, a lack of basic knowledge to keep up with the activies carried out during the course, and the fact of having entered a course which was not their first option. To reduce the influence of theses factors and to increase profiability, higher educational institutions should evaluate students'expectations and satisfaction continually, identifyng problems and finding solutions as a way of preventing dropout. Keywords: dropout in higher education, factorial analysis, quality hidden cost.

SUMRIORESUMO......................................................................................................................vi ABSTRACT.................................................................................................................. vii SUMRIO .................................................................................................................. viii RELAO DE QUADROS, TABELAS E FIGURAS ................................................................09 1. INTRODUO.........................................................................................................12 1.1 APRESENTAO DO ASSUNTO ..........................................................................12 1.2 PROBLEMA DE PESQUISA ................................................................................14 1.3 OBJETIVOS DO TRABALHO ...............................................................................15 1.4 RELEVNCIA DO TEMA E INEDITISMO................................................................16 1.5 LIMITES DA TESE ............................................................................................18 1.6 ORGANIZAO DO TRABALHO ..........................................................................19 2. O ENSINO SUPERIOR COMO UM SETOR ECONMICO ..................................................20 2.1 O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL ......................................................................21 2.1.1 HISTRICO............................................................................................23 2.1.2 EVASO NO ENSINO SUPERIOR ...............................................................45 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS - UFMG.....................................50 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA - UFSC .................................52 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO - UFMT.....................................53 ASSOCIAO CATARINENSE DAS FUNDAES EDUCACIONAIS (ACAFE) .........54 2.2 CONSIDERAES ............................................................................................56 3. A GESTO DA QUALIDADE PARA AS INSTITUIES DE ENSINO SUPERIOR ...................57 3.1 DEFINIO E EVOLUO DA QUALIDADE ...........................................................58 3.2 O SETOR DE SERVIOS....................................................................................61 3.2.1 DETERMINANTES DA QUALIDADE NO SETOR DE SERVIOS.........................68 3.2.2 O CLIENTE NA AVALIAO DA QUALIDADE................................................70 3.3 PERCEPES DA QUALIDADE NAS ORGANIZAES ACADMICAS .........................74 3.3.1 ANLISE ENVOLTRIA DE DADOS ............................................................76 3.3.2 AVALIAO INSTITUCIONAL ....................................................................78 3.3.3 EXAME NACIONAL DE CURSOS.................................................................82 3.3.4 EXPERINCIAS RECENTES .......................................................................84

3.4 CUSTOS DA QUALIDADE ..................................................................................88 3.4.1 DEFINIO ............................................................................................88 3.4.2 CLASSIFICAO ....................................................................................90 A CATEGORIA: PREVENO, AVALIAO E FALHAS (PAF) ..............................90 OUTRAS CLASSIFICAES .........................................................................92 3.4.3 MENSURAO DOS CUSTOS DA QUALIDADE .............................................96 3.5 ANLISE ESTATSTICA MULTIVARIADA ............................................................101 3.5.1 ANLISE DE COMPONENTES PRINCIPAIS (ACP)........................................102 3.5.2 ANLISE DE CLUSTER (CLUSTER ANALYSIS)............................................104 3.5.3 ANLISE FATORIAL...............................................................................104 3.6 CONSIDERAES ..........................................................................................106 4. MTODO PROPOSTO ..............................................................................................108 4.1 IDENTIFICAO DAS CAUSAS DA M QUALIDADE .............................................108 4.2 CLCULO DO CUSTO OCULTO DA QUALIDADE PARA AS IES ...............................111 4.3 CONSIDERAES ..........................................................................................112 5. APLICAO DO MTODO E ANLISE DOS RESULTADOS .............................................113 5.1 APRESENTAO DA INSTITUIO: UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC .......................................................................................113 5.2 APRESENTAO DOS RESULTADOS E ANLISE DOS DADOS...............................117 5.2.1 APLICAO DO MTODO .....................................................................117 5.2.2 ANLISE DESCRITIVA ..........................................................................118 PERFIL DOS ENTREVISTADOS ..................................................................118 5.2.3 CAUSAS DA EVASO DO ENSINO SUPERIOR ...........................................128 MOTIVOS DA ESCOLHA DO CURSO SUPERIOR ............................................128 MOTIVOS DA EVASO NO ENSINO SUPERIOR.............................................134 5.2.4 CUSTO OCULTO DA QUALIDADE .............................................................140 5.3 CONSIDERAES .......................................................................................145 6. CONSIDERAES FINAIS E PROPOSTAS PARA TRABALHOS FUTUROS..........................148 6.1 CONCLUSES DA INVESTIGAO REALIZADA...................................................148 6.2 RESULTADOS DA APLICAO NA UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE150 6.3 SUGESTES PARA FUTUROS TRABALHOS .........................................................150 REFERNCIAS ...........................................................................................................153 APENDICE A - DEFINIO DOS TERMOS: .....................................................................162 APENDICE B INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS....................................................165 APENDICE C TAMANHO DA AMOSTRA........................................................................170 APNDICE D MUNICPIOS CONSIDERADOS NA PESQUISA ...........................................171 ANEXO I CRITRIO DE CLASSIFICAO ECONMICA ..................................................172

RELAO DE QUADROS, TABELAS E FIGURASQuadro 1 Exemplo do pacote de servios para uma organizao universitria ........... 62 Quadro 2 Categoria de custo utilizando o modelo PAF ........................................... 92 Quadro 3 Indicadores do nmero de funcionrios tcnico-administrativos, docentes, alunos e cursos de graduao da - UNESC- 1997/2003 .......................................... 114 Quadro 4 Corpo Docente da UNESC por Titulao (1997-2003) ........................... 114 Quadro 5 Descrio das variveis utilizadas na identificao da escolha do curso superior .......................................................................................................... 128 Quadro 6 Mdia das variveis motivo da escolha do curso ................................... 129 Quadro 7 Matriz de Correlao das variveis Escolha .......................................... 130 Quadro 8 Comunalidades das variveis ............................................................. 131 Quadro 9 Comunalidades das variveis ............................................................. 131 Quadro 10 Matriz de Componentes................................................................... 132 Quadro 11 Matriz de Rotao .......................................................................... 133 Quadro 12 Descrio das variveis utilizadas para identificar os motivos da evaso. 134 Quadro 13 Mdia das Variveis Motivo da Evaso do Curso.................................. 135 Quadro 14 Matriz de correlao entre as variveis Motivo .................................... 136 Quadro 15 Comunalidades das variveis .......................................................... 137 Quadro 16 Total da varincia explicada .............................................................. 137 Quadro 17 Matriz de Componentes................................................................... 138 Quadro 18 Matriz de Rotao .......................................................................... 139 Quadro 19 - Custo oculto com a perda do cliente de acordo com a rea do conhecimento (2000/2002) - Valores em R$............................................................................. 143 Quadro 20 - Evoluo % do custo oculto com a perda do cliente de acordo com a rea do conhecimento (2000/2002) - ......................................................................... 144

Tabela 1 - Estabelecimentos e matrculas de ensino superior privado no Brasil (1933/1965)...................................................................................................... 27 Tabela 2 - Estabelecimentos e matrculas de ensino superior privado no Brasil (1965/2000)...................................................................................................... 29 Tabela 3 - Estabelecimentos e matrculas de ensino superior privado no Brasil (1980/2001)...................................................................................................... 32 Tabela 4 Condies mnimas de titulao e contrato do corpo docente de cada universidade Brasil (1998,2001 e 2004).............................................................. 35 Tabela 5 Distribuio dos alunos matriculados no ensino superior por regio Brasil 2001 ................................................................................................................ 37 Tabela 6 Instituies e alunos matriculados nos cursos de graduao por organizao acadmica, segundo a categoria administrativa daS IES Brasil 2001..................... 38 Tabela 7 N de concluintes em cursos de graduao presenciais e n de docentes por organizao acadmica, segundo a categoria administrativa daS IES Brasil 2001 .. 39 Tabela 8 Total de cursos oferecidos e instituies De ensino superior Brasil (1980, 1984, 1990, 1994 e 2001)................................................................................... 41 Tabela 9 Relao alunos formados por entrantes (no mesmo ano), por rea de conhecimento e tipo de instituio Brasil 2000 .................................................. 43 Tabela 10 Taxa de diplomao no Brasil .............................................................. 43 Tabela 11 - Faturamento da UNESC por atividade Em R$ -(1999/2002) ................. 116 Tabela 12 Evaso Total de alunos na UNESC 1999/2003 ................................... 117 Tabela 13 - Sexo e Estado Civil dos entrevistados ................................................. 119 Tabela 14 - Tipos de escola e curso freqentado pelos entrevistados durante o ensino mdio ............................................................................................................. 120 Tabela 15 Renda familiar dos entrevistados ....................................................... 121 Tabela 16 Classe Social dos entrevistados ......................................................... 121 Tabela 17 rea de conhecimento dos cursos com alunos evadidos UNESC - 2002 . 122 Tabela 18 Situao acadmica do entrevistado .................................................. 123 Tabela 19 Influncia do valor da mensalidade .................................................... 124 Tabela 20 - Custo das atividades desenvolvidas - UNESC (2002) ............................ 141

Figura 1 Mtodo de gesto da qualidade em servios ............................................ 73 Figura 2 Relao entre investimento e desperdcio................................................ 95 Figura 3 - Fluxo de consumo dos recursos............................................................. 97 Figura 4 Esquema de extrao dos componentes principais.................................. 103 Figura 5 Algoritmo explicativo do mtodo proposto ............................................. 109 Figura 6 Idade dos entrevistados ..................................................................... 119 Figura 7 Escolaridade dos pais ......................................................................... 123 Figura 8 Diagrama de Pareto para os itens que precisam ser corrigidos ................. 126 Figura 9 Aspectos que mais contribuem para a qualidade .................................... 127

1. INTRODUO

1.1 APRESENTAO DO ASSUNTO

A melhoria contnua da qualidade um dos fatores chaves para a sobrevivncia organizacional no ambiente atual, cada vez mais dinmico e competitivo. E muitas aes com esta finalidade vm sendo realizadas pelas organizaes, principalmente no que se refere s melhorias nas atividades desenvolvidas pelo setor industrial. medida que a economia mundial se desenvolve, a participao do setor de servios muda drasticamente. No Brasil, este setor j responsvel por 58%

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do PIB e emprega 60% da mo-de-obra. Um dos segmentos do setor de servios que vem despertando interesse ultimamente o educacional, sobretudo o das Instituies de Ensino Superior (IES) privadas. As IES so instituies complexas e multifinalistas onde os objetivos, em muitos casos, no so claramente definidos, dificultando o controle e a mensurao do desempenho. Para uma melhor compreenso dos termos, o Apndice A apresenta as diferenas legais e organizacionais entre as universidades, faculdades e centros universitrios, alm da definio de outros conceitos utilizados neste trabalho. No que se refere aos processos realizados pelas IES, pouco controle exercido. Apesar do acervo de conhecimentos e informaes que circulam no meio universitrio, nota-se que essas instituies insistem em utilizar mecanismos gerenciais burocrticos e defasados, dando pouca importncia para a gesto da qualidade. Esta mesma viso encontrada em Finger (1997), que sustenta que a universidade uma organizao conservadora por excelncia e tem resistido a examinar com mais profundidade a aplicao de um modelo organizacional para a realizao de seus objetivos. Visando contribuir com as organizaes universitrias, alguns ncleos de pesquisa no pas vm desenvolvendo estudos que auxiliam a administrao universitria, como o Ncleo de Pesquisa em Administrao Universitria (NUPEAU/UFSC), o Ncleo de Pesquisa sobre o Ensino Superior (NUPES/USP), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP/MEC), Instituto de Estudo e Projetos da Educao (IEPES), Grupo de Estudos sobre Universidade (GEU/UFRGS). Observa-se contudo, que a discusso entre gesto universitria e qualidade ainda assunto recente no pas, sobretudo quando se trata de mensurar os custos da qualidade. Desta forma, neste trabalho ser dada uma nfase nos custos e desperdcios das instituies particulares, por se tratarem de instituies sujeitas s turbulncias do mercado, pois neste novo cenrio um novo modo de pensar e agir comea a influenciar os dirigentes universitrios: preocupao com o mercado, com o negcio, com o cliente, com a gerncia dos servios para evitar a queda na produtividade, a perda de alunos, a perda de rentabilidade, a perda de espao, enfim, a marginalizao (Cardim, 2001).

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Nas organizaes acadmicas, os custos das atividades desenvolvidas so quase em sua totalidade fixos, destinados sobretudo ao pagamento de salrios e encargos dos docentes e tcnicos-administrativos, visto que a capacidade instalada para absorver o nmero de alunos que ingressam conforme as vagas oferecidas periodicamente em todos os cursos. Caso haja evaso num dado instante temporal, as vagas no preenchidas impedem a maximizao da receita e, por outro lado, as despesas iro ocorrer da mesma forma. Como menciona Santos (2001, p. 6), sabe-se que durante muito tempo as universidades no tiveram muita preocupao com a gesto dos seus custos, pois a receita sempre maior permitia que estes custos fossem absorvidos facilmente pelos aumentos nas mensalidades. Contudo, foi-se o tempo em que o aluno concorria a uma vaga pelo vestibular; atualmente a instituio universitria que precisa concorrer a uma escolha do aluno. Excetuando alguns cursos tradicionais, como medicina, odontologia e direito, e aquelas carreiras modernas, muitos cursos no conseguem ocupar as vagas oferecidas e, mesmo quando conseguem poucas aes so implantadas nas instituies a fim de evitar a desistncia do aluno. Quando existe problema de no-conformidade, a receita prevista diminui, pois o nmero de alunos matriculados menor que o previsto. preciso portanto identificar as causas deste problema. A literatura sobre evaso discente no Brasil est carente de modelos que contemplem os mltiplos itens envolvidos na deciso do aluno de maneira simultnea. A anlise conjunta de trs ou mais fatores gera um modelo n-dimensional, o que dificulta a visualizao. A pesquisa em torno desta questo poder contribuir, sobremaneira, para facilitar a tomada de deciso na busca da qualidade de ensino e aprendizagem.

1.2 PROBLEMA DE PESQUISA

Diante da necessidade de se desenvolver estudos que contribuam com a qualidade dos servios prestados pelas universidades, de modo a medir o desempenho e, principalmente, atender as expectativas da sociedade, definiu-se como problema de pesquisa a seguinte questo:

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A evaso no ensino superior est associada questo da m qualidade do ensino e insatisfao dos estudantes?

As seguintes questes de pesquisa necessitam ser solucionadas a fim de responder o problema anterior: A evaso no ensino superior brasileiro fato recente? Como a estatstica multivariada pode ser utilizada a fim de identificar as causas da evaso no ensino superior? Quanto custa para a IES a evaso e o trancamento discente? Quais as estratgias que podem reduzir a evaso, economizando custos e maximizando o aproveitamento das oportunidades?

1.3 OBJETIVOS DO TRABALHO

OBJETIVO GERAL:

Desenvolver um mtodo para identificao das causas da evaso no ensino superior utilizando estatstica multivariada e aplic-lo em uma Instituio.

OBJETIVOS ESPECFICOS:

Apresentar a evoluo do ensino superior no pas; Investigar as percepes do termo qualidade no ambiente universitrio; Utilizar as ferramentas da qualidade e a estatstica multivariada para identificar as causas da m qualidade;

Aplicar o mtodo em uma Universidade;

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Calcular o custo da perda do aluno para a organizaes universitria analisada;

Propor meios de reduzir os custos ocultos da qualidade no setor educacional.

1.4 RELEVNCIA DO TEMA E INEDITISMO

Apesar de as universidades serem instituies antigas, - as primeiras Universidades surgiram na Europa entre os sculos XI e XIII: Bolonha (1150), Salerno (1189), Paris (1220) e Coimbra (1290), estas organizaes, principalmente no Brasil, carecem de instrumentos que auxiliem na soluo de seus problemas gerenciais, reduzam seus custos e garantam a fidelizao dos clientes. Dessa forma, a escolha do tema decorreu da necessidade de se desenvolver estudos mais especficos nesta rea, na tentativa de contribuir com a administrao universitria, superando os desafios impostos pelo ambiente competitivo, enfatizando a gesto da qualidade como um instrumento til para a consolidao destas organizaes. A gesto universitria aparece neste incio de sculo como um desafio. Por muitos anos as instituies universitrias, sobretudo as privadas, se preocuparam apenas com a ampliao do leque de cursos, bem como com a fragmentao de carreiras, visando atrair, ampliar e diversificar a clientela, eximindo-se da preocupao com a qualidade dos servios ofertados e das necessidades dos alunos e da sociedade. O momento atual caracterizado pela expanso contnua do nmero de instituies e cursos, pelo elevado nmero de vagas no preenchidas nos processos seletivos e pela baixa relao entre o nmero de entrantes e concluintes de um curso superior aponta a necessidade de que as IES sobretudo as privadas, dependentes das receitas das mensalidades, revejam suas estratgias de atuao e implantem aes a fim de diagnosticar os problemas e implantar a melhoria contnua. A relevncia deste trabalho consiste em apresentar aos gestores das organizaes universitrias um modelo que oriente na implantao da melhoria

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contnua. A relevncia terica ocorre em funo da pouca existncia de estudos sobre evaso e custos da qualidade para o setor educacional. A relevncia prtica ocorre ao vir ao encontro das necessidades das Organizaes Universitrias que se preocupam com as transformaes no ambiente onde esto inseridas. Procurou-se utilizar os conceitos de custos da qualidade por se tratarem de uma linguagem de fcil assimilao e por traduzirem os custos que as organizaes acadmicas despendem com a realizao de atividades de m qualidade e, principalmente, pelo fato de incorporar os custos ocultos das falhas externas, entendidos como a receita no auferida preenchimento das vagas oferecidas. Alm disso, este trabalho analisa as experincias j consagradas e as publicaes que apresentam os melhores resultados no campo da gesto da qualidade a fim de elaborar uma sistemtica de modo a reduzir os custos da qualidade no ensino de graduao. Como contribuio nessa perspectiva, pretende-se que o mtodo em funo do no-

colabore para suprir a lacuna que existe atualmente no Brasil sobre a qualidade no setor de ensino, na percepo do discente; obter os conhecimentos e, atravs da aplicao, disseminar a adoo de metodologias de anlise fatorial na educao e ampliao da receita nas organizaes de ensino sejam estas pblicas ou privadas. Escolheu-se este tema por entender que as caractersticas do setor de servios e sua importncia para o desenvolvimento do pas demandam metodologias manufatura. As descobertas aqui apresentadas permitiro que no apenas as IES privadas, como tambm as pblicas, dominadas pelas discusses a respeito da autonomia universitria, revejam os seus processos e se adaptem ao novo cenrio competitivo, reduzindo as ineficincias organizacionais e satisfazendo sociedade. Ao procurar mensurar os custos ocultos da qualidade e propor aes especficas e no apenas a transferncia de modelos da

para a reduo destes custos, busca-se tambm implantar aes de melhoria nas

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IES. Esta melhoria no ensino superior vem ao encontro das necessidades do pas, onde as polticas de avaliao do ensino superior so recentes. Este trabalho indito ao unir os aspectos acadmicos - a evaso - com aspectos financeiros - custos. Esta juno, apesar de indispensvel para uma gesto de qualidade dificultada no ambiente universitrio.

1.5 LIMITES DA TESE

A fim de cumprir o objetivo de trabalho e validar o mtodo proposto, o trabalho ser desenvolvido na Universidade do Extremo Sul Catarinense UNESC. Optou-se por desenvolver o trabalho em uma Universidade privada porque entende-se que neste tipo de Instituio a traduo de falhas em cifras monetrias causa um impacto mais imediato, pois, ao contrrio das instituies pblicas, a receita das instituies privadas vem da oferta de servios aos clientes e, desta forma, a busca constante pela maximizao destas receitas e pela reduo dos custos um desafio. Procurou-se desenvolver os trabalhos nesta Instituio em funo da facilidade na obteno dos dados, devido a disponibilidade da Administrao Superior em implantar aes que visem melhoria contnua, sobretudo, face ao momento que a Instituio atravessa, pois apesar de ser uma Universidade nova a UNESC v aumentar a cada dia a concorrncia e a exigncia dos seus alunos e outros clientes. Optou-se por no realizar um estudo comparativo pleno com outras IES em funo da dificuldade de obter informaes gerenciais e acadmicas, pois trata-se de informaes estratgicas no momento atual. Alm disso, tem-se como fatores limitantes os recursos financeiros e humanos para a realizao de pesquisas com os clientes de outras Instituies, diante da necessidade de se avaliar a satisfao destes em relao s suas universidades, apesar da importncia de um estudo comparativo. Procurou-se apenas realizar comparaes parciais com outras instituies, em relao s informaes comuns disponveis, a ttulo de referncia.

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1.6 ORGANIZAO DO TRABALHO

Este trabalho est estruturado em sete captulos, distribudos da seguinte forma: o captulo em questo apresenta o assunto abordado, assim como o problema de pesquisa, os objetivos, a justificativa para a realizao desse estudo e a presente estrutura. A seguir, realiza-se uma fundamentao terica sobre o assunto, de modo a aprofundar e conhecer os trabalhos realizados sobre o tema em questo: gesto universitria e qualidade no ambiente universitrio. Por estas razes, no captulo dois apresenta-se uma reviso dos conceitos da educao superior no pas, buscando destacar a evoluo histrica, caractersticas e tendncias como a concorrncia e a evaso. E no captulo trs so descritos os conceitos de qualidade em servios e custos da qualidade e apresentadas as percepes da qualidade no ambiente acadmico. No captulo quatro realizado o detalhamento do mtodo utilizado na busca da soluo para o problema de pesquisa. O captulo cinco destinado ao estudo de caso relatando-se as descobertas realizadas na Universidade do Extremo Sul Catarinense. E o captulo seis apresenta os resultados obtidos: o custo da perda do aluno e os motivos identificados atravs de anlises estatsticas. E, finalmente, no captulo sete so descritas as principais consideraes sobre a pesquisa e recomendaes para trabalhos futuros.

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2. O ENSINO SUPERIOR COMO UM SETOR ECONMICO

O desenvolvimento deste captulo tem como finalidade apresentar o referencial terico que auxilie a realizao da pesquisa, tanto na fase de estruturao inicial como na anlise posterior, dando sentido acadmico aos fatos a serem estudados. Apresentam-se os conceitos relacionados expanso do ensino superior no Brasil, sobretudo o setor privado, e a evaso neste nvel de ensino. Discutir qualidade na educao superior no uma tarefa recente e nem por isso torna-se mais fcil ou menos interessante. O ambiente universitrio marcado pela complexidade, pelas crticas e pelas divergncias e, como se pode antever, esta situao ocorre sobretudo quando se trata de uma discusso to profunda e polmica como este assunto. Este captulo resgata esta discusso, visto que o momento atual, caracterizado pelo crescimento acelerado do setor de ensino superior no pas, diversificao de carreiras, aumento do nmero de vagas ociosas, inadimplncia, aumento da concorrncia e maior exigncia da sociedade, suscita a implantao de estratgias que satisfaam o cliente das instituies de ensino superior, entendido aqui no apenas como o aluno, receptor do conhecimento, mas a sociedade em geral. A questo central est focada no ensino superior privado, por tratar-se do setor que mais absorve o estudante universitrio no Brasil, e pelo fato das IES privadas serem dependentes quase que exclusivamente das anuidades dos acadmicos. Apesar de o setor de ensino superior privado ser responsvel por mais de 2.000.000 (dois milhes) de estudantes matriculados, poucos so o estudos que

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tratam este setor como um setor econmico, uma rea do setor de servios, responsvel pela formao de 67% dos profissionais do pas, como afirmam Schwartzman e Schwartzman (2002), ao estimarem que o ensino superior privado brasileiro representa uma indstria de aproximadamente dez bilhes de reais anuais, empregando mais de 200 mil pessoas. Dividiu-se este captulo em duas sees. A primeira seo expe a evoluo do ensino superior no Brasil, enfatizando as transformaes ocorridas nos ltimos anos crescimento acelerado e excesso de vagas no preenchidas -, e apresenta os estudos a respeito da evaso e da ociosidade no ensino superior e na seo dois so feitas as consideraes finais.

2.1 O ENSINO SUPERIOR NO BRASIL

As empresas brasileiras operaram, at o incio dos anos 90, em um ambiente protecionista e fechado, caracterizado pela reserva de mercado e pelas restries importao de produtos. Com a abertura da economia brasileira ao exterior os empresrios se viram diante da necessidade de implementar aes visando a inovao tanto no produto como no processo produtivo, assim como, realizar investimentos em pesquisa e desenvolvimento, para que o pas tivesse condies de competir no mercado globalizado. Diante do novo cenrio, a qualificao da mo-de-obra no Brasil apareceu como um fator imperioso para aumentar a produtividade, melhorar a qualidade de vida da populao e enfrentar os problemas sociais, urbanos e ambientais. A educao tornou-se o foco da competitividade, uma vez que as aes voltadas para a melhoria da capacitao da fora de trabalho contribuem para a insero das empresas no mercado globalizado e para a gerao de emprego e renda. Todos os pases que romperam a barreira do desenvolvimento atriburam especial ateno educao, salientam Coutinho e Ferraz (1995, p.13). Ferraz, Kupfer e Haguenauer (1997), ao analisarem a competitividade da indstria nacional, esclarecem que os nveis de eficincia e padres de qualidade das empresas so condicionados pelas caractersticas do sistema econmico, denominados de determinantes sistmicos da competitividade, os quais so: i)

22

determinantes determinantes

macroecmicos;

ii)

determinantes iv)

poltico-institucionais; infra-estruturais;

iii) v)

legais-regulatrios;

determinantes

determinantes internacionais e vi) determinantes sociais, com destaque para a educao e qualificao da mo-de obra.Os nveis de produtividade e a qualidade dos produtos dependem fortemente do nvel de educao e qualificao da mo-de-obra. Da mesma forma, a gerao e incorporao de certas inovaes mais sofisticadas so impensveis sem uma massa crtica de tcnicos e cientistas de alto nvel de qualificao (Ferraz, Kupfer e Haguenauer, 1997, p. 30).

Desse modo, a melhoria da qualidade do ensino e da pesquisa deixou de ser uma preocupao exclusiva dos pases desenvolvidos e passou a ser uma exigncia imposta mesmo aos pases com nveis de renda menos elevados, que buscam seu desenvolvimento sustentvel e tentam promover uma reestruturao produtiva eficaz. Existe uma literatura extensa que explica os benefcios gerados pela educao superior no desenvolvimento de um pas. A Teoria do Capital Humano, criada na dcada de 60, e que influenciou a expanso do ensino superior no perodo de 1960 a 1980 estabelece que a educao capaz de aumentar a produtividade e consequentemente os diferencias de renda dos indivduos (Schultz, 1967; Langoni, 1973; Medeiros, 1982; Pereira, 1997). A Teoria da Sinalizao defende que a educao no influencia a produtividade, mas sinaliza outras caractersticas do indivduo que afetam a produtividade. E a Teoria Credencialista, por sua vez, apesar de negar qualquer relao entre educao e produtividade, estabelece que a educao superior importante para diferenciar os indivduos e possibilitar o acesso a determinados crculos e a partir da possibilitar ganhos de salrios (Ramos e Vieira, 1996). Atualmente, a United Nations Educational, Scientific and Cultural

Organization (UNESCO) estabelece que a Teoria do Capital Humano predomina nos pases, e o conhecimento visto como gerador de riqueza. No caso brasileiro, contudo, os diferenciais de renda proporcionados pela educao so muito maiores que os encontrados nos pases mais desenvolvidos.

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O que explica esta diferena no parece ser que os diplomas de nvel superior nos pases em desenvolvimento estejam associados a nveis mais altos de produtividade, mas sim relativa escassez de educao superior, e a possibilidade que as pessoas mais educadas nestes pases encontram de garantir, para si, rendas mais altas, que decorrem sobretudo da posio social que ocupam ou conseguem atingir (Schwartzman, 2001).

Esta influncia da educao nos salrios dos brasileiros reflete no aumento das matrculas no ensino superior, a partir dos anos 90, o que fez com que este perodo se tornasse conhecido como a Dcada da Educao. Contudo, para se compreender esta nova realidade, faz-se necessrio acompanhar brevemente a evoluo do ensino superior no pas. Para tanto, dividiu-se a evoluo do ensino superior em 4 fases: i) ii) iii) iv) Antes de 1930: Predomnio das instituies pblicas; 1930 1964: Consolidao e estabilidade no crescimento relativo do setor privado no sistema de ensino superior; 1964 1980: Reforma do ensino superior e predominncia do setor privado; 1980 2003: Aumento da oferta de vagas pelo setor privado, crescimento do nmero de vagas no preenchidas e evaso. 2.1.1 HISTRICO

Antes de 1930

O ensino superior no Brasil teve incio no sculo XVI, com a introduo dos cursos de filosofia e teologia que, de acordo com Cunha (1983, p. 18), s pode ser entendido como atividade de um aparelho educacional posto a servio da explorao da colnia pela metrpole. Os estabelecimentos de ensino da poca eram dirigidos pelos padres jesutas e seguiam normas padronizadas onde se estabelecia um currculo nico para os estudos escolares, divido em dois grupos: os studia inferiora,

24

correspondentes ao atual ensino mdio, e os studia superiora, correspondendo aos estudos universitrios. At 1759, quando os padres jesutas foram expulsos do reino portugus e do Brasil1, os colgios Jesutas foram os responsveis pelo ensino superior no pas. A partir desta data, surgiram novos currculos, novos mtodos de ensino e nova estrutura da educao escolar (Cunha, 1983). Foram fechados 17 colgios e no seu lugar foram criadas as aulas rgias, que correspondiam a aulas de grego, hebraico, filosofia, teologia, desenho, aritmtica, geometria, francs, quase todas independentes, funcionando em locais distintos e por mestres nomeados. A partir de 1808, com a vinda da corte portuguesa para a colnia, surge uma nova etapa do ensino superior no Brasil com o objetivo de formar profissionais para atuar no setor pblico e ainda profissionais liberais. Os cursos que preparavam os burocratas para o Estado eram os dos estabelecimentos militares, os cursos de medicina e cirurgia e o de matemtica, que contribuiu para a implantao dos cursos de engenharia. Outros cursos foram criados para a formao de profissionais no militares para a burocracia do Estado, como os de agronomia, de qumica, de desenho tcnico, de economia, poltica e arquitetura (Cunha, 1983; Sarmento, 1991; Sampaio, 2000). A Constituio da Repblica, de 1891, descentralizou o ensino superior, que era exclusivo do poder central, delegando-o para os governos estaduais, e permitiu a criao de instituies privadas. At 1900, no existiam mais do que 24 escolas de ensino superior no pas. E, a partir desta data, as instituies particulares comearam a se consolidar no pas, sendo que na dcada de 20 o sistema educacional j contava com quase 150 instituies de ensino superior, boa parte delas privadas (Sampaio, 2000, p.37). As instituies privadas que surgiram nessa poca eram, basicamente, de iniciativa confessional catlica, ou de iniciativa de elites locais que buscavam dotar seus estados de estabelecimentos de ensino superior. Deve-se registrar ainda o surgimento do sistema educacional paulista, por volta de 1880/1900,

Na tentativa de que Portugal criasse condies de se industrializar, a ideologia dos padres Jesutas, orientada para uma sociedade feudal, foi substituda por uma ideologia capitalista.

1

25

que representou a primeira ruptura com o controle burocrtico do governo central.

1930 1964 Aps a Proclamao da Repblica os estabelecimentos de ensino superior comearam a se expandir, sendo que somente aps a Revoluo de 302, conscientes da importncia estratgica da educao, a idia de universidade passou a ser imposta3 e o Estado procura assumir o controle. Logo aps a instalao do Governo Provisrio, em 1930, foi criado o Ministrio da Educao e Sade, e logo no ano seguinte foram assinados os decretos reformando o ensino secundrio, o superior, o comercial e criando o Conselho Nacional de Educao (Sarmento, 1991). Em 1931, foi aprovado o Estatuto das Universidades Brasileiras, o qual vigorou at 1961: a universidade poderia ser oficial, isto , pblica (federal, estadual ou municipal) ou livre, ou seja, particular; deveria incluir trs dos seguintes cursos: Direito, Medicina, Engenharia, Educao, Cincias e Letras. A reforma educacional de 1931 apenas veio a corroborar o que a primeira Constituio da Repblica j fizera: mantinha o sistema de ensino superior aberto iniciativa privada e insistia que o ensino superior se organizasse em instituies universitrias. vlido destacar que nesta poca, o estado de So Paulo caracterizavase como uma regio de elevado crescimento industrial e uma forte presena de imigrantes europeus e japoneses. A elite paulista era contrria centralizao poltica, econmica e cultural no Rio de Janeiro, capital do pas na poca, e os2

A revoluo de 1930 levou Getlio Vargas chefia do Governo Provisrio. Nos 100 anos que antecederam a revoluo, a economia brasileira vinha se desenvolvendo como exportadora de bens primrios e importadora de bens industrializados. A partir de 1930, o Estado assumiu um novo papel, promovendo a industrializao. 3 No h consenso na literatura especializada a respeito da data de criao da primeira Universidade. Para Tobias (1980), a primeira Universidade foi criada em 1909 em Manaus, para Vahl et al (1989) a primeira Universidade do pas foi a do Paran, criada em 1912, e para Marcovith (1998) a primeira Universidade do pas a Universidade de So Paulo, fundada em 1911. Cunha (1980) classifica as Universidades de Manaus, Paran e So Paulo como passageiras, uma vez que, por situaes diversas, estes estabelecimentos tiveram durao reduzida. E, segundo o autor, a primeira instituio de ensino superior do Brasil que prosperou com o nome de universidade foi a Universidade do Rio de Janeiro, criada em 1920.

26

conflitos entre os dois estados faz surgir a Universidade de So Paulo. Tal instituio se consolida como um dos mais importantes centros de pesquisa do pas, atraindo profissionais sobretudo da Itlia, Alemanha e Frana. A partir de 1933, o setor privado de ensino superior comeou a se consolidar no Brasil; naquela poca este setor respondia por 64,4% dos estabelecimentos e por 43,7% das matrculas no ensino superior (Sampaio, 1999). Em 1945, a participao das matrculas no ensino privado chegava a quase 50%, em um sistema que contava com cerca de 40.000 estudantes. Com a implantao do Estado Novo regime poltico que predominou no pas entre 1937 e 1945 o populismo clamava por reformas de base para auxiliar o desenvolvimento do pas. A reforma universitria se daria pela modernizao do ensino superior e a sua reorientao pedaggica em funo dos interesses populares (Cunha, 1983, p. 52). Vislumbra-se primrio-exportador nesse por perodo, um quando de da substituio do modelo na

modelo

desenvolvimento

baseado

industrializao, a educao como um fator capaz de promover a ascenso social. Alm desta mudana no modelo econmico, outros fatores intensificaram o crescimento da demanda:

i)

a transferncia das populaes rurais para as zonas urbanas em funo do crescimento acelerado das cidades;

ii)

a escolarizao das mulheres, inicialmente por motivos ideolgicos, ligados promoo da cultura, e depois por motivos econmicos, como forma de evitar a proletarizao, e

iii)

as leis de equivalncia4 que asseguravam o direito de matrcula nos cursos clssicos e cientficos aos egressos dos cursos comercial, industrial e agrcola e determinava a equivalncia do diploma de concluso dos cursos tcnicos comerciais e normal ao 2 ciclo do secundrio, o que ampliava o nmero de pessoas aptas a cursar um curso superior.

4

As leis de equivalncia iniciaram-se em 1950, com a Lei 1076/50; posteriormente, outras leis e decretos foram elaborados (lei 1821/53; Decreto 34330/53; Lei 3104/57) at a promulgao da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, em 1961.

27

A conjugao dos processos geradores da demanda e da oferta de vagas no ensino superior resultou num intenso crescimento das matrculas. De 1945 a 1960, ao mesmo tempo que triplicou o nmero de matrculas totais, a participao relativa das matrculas privadas diminuiu: passou de 48%, em 1945, para 41,2% em 1960, conforme Tabela 1.

Tabela 1 - Estabelecimentos e matrculas de ensino superior privado no Brasil (1933/1965)

Ano

1933 1935 1940 1945 1950 1955 1960

Estabelecimentos de ensino superior privado Nmero % sobre o total 265 64,4 259 293 391n/d

Estudantes matriculados nas IES privadas Nmero % sobre o total 14.737 16.590 12.485 19.668n/d

43,7 48,5 45,1 48,0n/d

67,7 62,5 63,1n/d

381n/d

53,3n/d

30.755 39.400

42,3 41,2

Fonte: Elaborado com base nos dados obtidos em MEC (1965), Cunha (1983) e Sampaio (2000) Essa reduo est associada a trs processos quase simultneos: o primeiro, de criao de universidades estaduais, reunindo institutos estaduais, federais e particulares; o segundo, de federalizao das instituies de ensino superior, sendo que apenas em 1950 foram federalizadas 28 faculdades; e por ltimo, o progressivo barateamento das taxas cobradas pelas instituies pblicas, chegando, no incio dos anos 50, gratuidade total. A partir de 1955, com a implantao do Plano de Metas do Governo Juscelino Kubitschek, o pas atravessou uma srie de transformaes econmicas e sociais e, a educao superior tornou-se um elemento de cobia pela populao que vislumbrava a possibilidade de mobilidade social.

28

As dcadas de 50 e 60 se notabilizaram pelo surgimento de iniciativas para o desempenho das atividades de formao de pesquisadores e de aperfeioamento docente. Considerava-se como responsabilidade das universidades elevar os seus padres de ensino e promover o desenvolvimento da cincia. Surgiram em 1951 o Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq) e a Coordenadoria de Aperfeioamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES). Nos anos 60, embora o sistema de ensino superior estivesse ampliando gradualmente o nmero de vagas em estabelecimentos pblicos e privados, a demanda por formao superior parecia crescer mais do que a oferta. Eram pessoas dispostas a trabalhar na burocaria estatal e nas indstrias de base que se instalavam no pas. Cunha (1988) informa que em 1960 existiam 28.728 alunos vaga. Diferentemente da reforma educacional de 1931, a Lei n 4.024, Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, de 1961, no mais insistia em que o sistema de ensino superior deveria organizar-se, preferencialmente, em instituies universitrias. A novidade foi a preocupao com a regulamentao dos mecanismos de expanso do ensino superior, estabelecendo as trs instituies que poderiam decidir acerca da criao de novos cursos: as universidades que gozavam de autonomia; os Conselhos Estaduais de Educao e o Conselho Federal de Educao (CFE). Dois anos depois, a Portaria n 4163, fundamentada no Parecer-CFE 92/63, fixou as normas para autorizao e reconhecimento das escolas de nvel superior. Pela primeira vez, os requisitos mnimos foram definidos: condio jurdica da mantenedora; condies fiscais e materiais, capacidade financeira; recursos docentes, comprovantes das condies materiais e culturais do meio; comprovante da real necessidade do curso para a regio; apresentao de regimento contendo currculo e normas acadmicas de funcionamento da escola (Tramontim e Braga apud Sampaio, 2000). A natureza burocrtica dessas exigncias favoreceu a abertura de novos estabelecimentos privados e a criao de cursos pelas instituies j existentes nos anos subseqentes a essa nova legislao. excedentes, que embora tivessem sido aprovados nos exames vestibulares para as universidades pblicas no foram admitidos por falta de

29

1964- 1980

No perodo 1964-1980, o nmero total de matrculas no ensino superior passou de cerca de 200.000 para 1,4 milho, sendo os anos de 1968, 1970 e 1980 os que apresentaram maiores taxas de crescimento. Em 1965, o setor privado absorvia 43,8% das matrculas e no incio dos anos 80, respondia por 63,3%. O nmero de estabelecimentos de ensino superior privado saltou de 463 para 682 na dcada de 70, chegando a representar 77,3% do total do pas em 1980, conforme se verifica na Tabela 2.

Tabela 2 - Estabelecimentos e matrculas de ensino superior privado no Brasil (1965/2000)

Ano

1965 1970 1975 1980

Estabelecimentos de ensino superior privados Nmero % sobre o total ... .... 463 645 682 43,4 75,0 77,3

Estudantes matriculados nas IES privadas Nmero % sobre o total 142.386 43,8 214.865 300.657 885.054 50,5 61,8 63,3

Fonte: Elaborado com base nos dados do INEP (1998; 2001)

Enquanto as universidades pblicas passaram a ser objeto de uma interveno direta do governo federal, a expanso dos cursos de graduao das universidades privadas eram incentivadas pelo governo militar. A pulverizao das faculdades isoladas dificultava a mobilizao poltica dos estudantes (Oliven, 2002). De acordo com Silva (2003), a partir de 1960, e principalmente aps o Golpe Militar em 1964, o Estado procurou criar os pilares de uma poltica de cincia e tecnologia tomando como base as universidades pblicas e os institutos de pesquisa pblicos. A carreira docente, no setor pblico, passou a estimular a titulao e a produo cientfica dos professores universitrios, contribuindo para atrair jovens mestres e doutores para as atividades acadmicas.

30

Em 1967, foi instituda a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), que passou a gerir o Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (FNDCT). A partir de 1970, com a reforma universitria instalada e sob controle, a poltica do governo para a rea foi estimular a Ps-Graduao. A Lei n 5.540/68, que instituiu a reforma universitria, foi extensa e profunda, rompendo com a estrutura vigente at ento. Schwartzman (2001) esclarece que antes da reforma de 1968 a educao superior era organizada em escolas profissionais independentes e com pouca nfase para a pesquisa. Entre outras medidas, pode-se destacar a eliminao da ctedra; a criao do sistema de institutos bsicos e instituio do departamento como unidade mnima de ensino e pesquisa; a alterao do vestibular, decretando o sistema de crdito e semestralidade. A reforma de 68, a partir da presso dos movimentos estudantis e de professores, sob a tutela do Estado, mas que no contou com a presena de seus elementos mais crticos e criativos que haviam sido afastados pelo regime militar, levou intensa centralizao, estabeleceu mecanismos de controle burocrticos, excluindo os docentes dos centros de deciso, levando-os a perder a viso de conjunto da instituio e reforando o isolamento das unidades acadmicas (Sarmento, 1991; Moraes, 1999). Uma das conseqncias imediatas da reforma foi a proliferao de cursos nas reas sociais e humanas. Estas reas foram preferidas pelo setor privado dada a sua facilidade para implantao, visto que o seu funcionamento no exige investimentos com laboratrios e instalaes especficas. Apesar de ter sido dada nfase para que as instituies desenvolvessem a pesquisa, a legislao no considerou a enorme presso para a educao de massa que existia at ento. Sendo assim, conforme Schwartzman (2002, p. 18),

A soluo, na prtica, foi a reduo de restries e controle para a criao de instituies privadas. Como conseqncia, teve-se uma polarizao, de um lado ficaram as instituies pblicas, que adotaram um modelo baseado na pesquisa, absorvendo um tero dos estudantes; e de outro lado as instituies privadas proporcionando ensino rotineiro e medocre, principalmente nas carreiras gerenciais administrao, direito, contabilidade absorvendo os outros dois teros.

31

A expanso do setor privado nas dcadas de 1960 e 1970 deu-se mediante a multiplicao de instituies de pequeno porte, muitas das quais resultantes da transformao de antigas escolas secundrias, visto que a preocupao quase que exclusiva do setor privado era com o atendimento da demanda por ensino. Schwartzman (1990) cita que os cursos que foram criados nos anos 60 e 70 faziam parte de carreiras modernas, podendo-se citar os cursos noturnos de Direito, de Administrao e de Pedagogia, que eram oferecidos por escolas isoladas, nas pequenas cidades do interior, e tinham clientela certa: jovens recm-egressos do curso secundrio sem condies financeiras e/ou domsticas para prosseguir estudos em centros urbanos maiores; pessoas mais velhas j empregadas, que no tinham tido oportunidade de melhoria no mercado ocupacional; jovens mulheres que j passavam a aspirar a uma formao de nvel superior, mas sem que isso implicasse o rompimento com a famlia de origem. A expanso do setor privado de ensino superior nos anos 60 e 70 ocorreu de forma localizada e quase restrita s regies Sudeste e Sul do pas, influenciado pela expanso demogrfica, expanso da escolarizao do 2 grau, expectativas de promoo social e pela existncia de uma demanda reprimida os excedentes do ensino pblico (Vahl, 1990; Cunha, 1988). Nos centros urbanos maiores ou nas capitais dos estados, os estabelecimentos de ensino superior que estavam abrindo cursos seguiam trs tendncias (Vahl, 1980; Sampaio, 2000):

i)

continuavam a tradio de escolas voltadas para a formao em profisses liberais, sobretudo nas reas de sade, como Odontologia e Medicina, para os quais, por insuficincia da rede pblica e por sua tradio de prestgio social, sempre houve grande demanda;

ii)

ampliavam o leque de cursos, pelas instituies j reconhecidas, com a finalidade de cobrir todas as reas do conhecimento, ainda que fosse por meio da criao de cursos de licenciatura;

32

iii)

visam a atingir segmentos mais jovens e de maior poder aquisitivo, por meio da criao de cursos diurnos.

1980 - 2003

A crise econmica da Dcada Perdida, caracterizada pelo elevado endividamento externo do pas e pelas incertezas criadas pelos altos ndices de inflao, refletiram-se no ensino superior. O nmero de inscritos em exames vestibulares baixou de 1,8 milhes em 1980 para 1,5 milhes em 1985, retornando a 1,8 milhes em 1989. O nmero total de vagas saiu de 404.814 em 1980 para 466.794 em 1989. O nmero de matrculas nas IES privadas aumentou apenas 8,6% nos anos 80, saltando de 885.054 em 1980 para 961.455 em 1990, sendo que em 1985 apenas 810.929 pessoas estavam matriculadas no ensino superior privado. Este indicativo de queda do nmero de alunos matriculados na metade dos anos 80 evidenciado tambm quando se analisa que o nmero de instituies privadas em 1985 menor que em 1980 (Tabela 3).Tabela 3 - Estabelecimentos e matrculas de ensino superior privado no Brasil (1980/2002)

Ano

Estabelecimentos de ensino Estudantes matriculados nas IES superior privados privadas Nmero % sobre o total Nmero % sobre o total 682 626 696 684 1.004 1.208 1.442 77,3 72,9 75,8 76,5 85,0 87,0 88,0 885.054 810.929 961.455 1.059.163 1.807.219 2.091.529 2.428.258 63,3 59,3 62,4 60,2 67,0 69,0 69,7

1980 1985 1990 1995 2000 2001 2002

Fonte: Elaborado com base nos dados do INEP (1998; 2001; 2003)

33

A partir da segunda metade da dcada de 1970 inicia-se uma mudana gradativa na configurao do setor privado de ensino superior no que diz respeito natureza institucional dos estabelecimentos que o compem. Em um primeiro momento, alguns estabelecimentos isolados transformaram-se isoladas ou de incorporao de um ou mais estabelecimentos. No momento seguinte, a partir do final da dcada de 1980, o movimento para a transformao de escolas isoladas em universidades particulares. Assim, o nmero de universidades particulares elevou-se de 20, em 1985, para 85 em 2000, tornando-se maioria no total de instituies desta categoria no pas (INEP, 2001). A Constituio Federal de 1988 estabeleceu um mnimo de 18% da receita anual, resultante de impostos da Unio, para a manuteno e o desenvolvimento do ensino. Assegurou tambm, a gratuidade do ensino pblico nos estabelecimentos oficiais em todos os nveis e criou o Regime Jurdico nico, estabelecendo pagamento igual para as mesmas funes e aposentadoria integral para aos funcionrios federais. No incio dos anos 90, pautado no discurso de modernizao defendido pelo presidente Collor de Mello, coube s instituies de ensino superior a formao de recursos humanos demandados por um mercado que emergia diante da insero do Brasil na economia globalizada. O programa de governo do presidente Fernando Collor de Mello teve como pressuposto o fato de o ensino superior brasileiro apresentar as seguintes distores: i) formao de profissionais no voltada para a gerao de riquezas; ii) pequena formao na rea de cincias exatas; e (iii) gasto excessivo com o ensino superior em detrimento dos demais nveis de ensino (Corbucci, 2002). A fim de superar tais problemas identificados no ensino superior brasileiro, foram definidas cinco linhas de ao: i) ampliao do acesso; (ii) respeito autonomia universitria; (iii) maior estmulo ao desenvolvimento de pesquisas entre universidades e empresas; (iv) ampliao dos programas de ps-graduao; (v) capacitao e valorizao dos profissionais de educao. O resultado alcanado, contudo, mostra que as linhas de ao no foram cumpridas. No perodo 1990/1992 houve uma reduo do nmero de matrculas em federaes de escolas integradas, mediante processos de fuso de escolas

34

nos cursos de graduao e constatou-se a baixa remunerao dos profissionais da educao. No governo Itamar Franco a educao assume a condio de poderoso instrumento de promoo social, tendo como objetivo a preparao do pas para um novo paradigma de desenvolvimento (Corbucci, 2002, p. 10). O diagnstico do Ministrio da Educao naquela poca identificava que o ensino superior vinha apresentando vrias distores desde a dcada de 1960. Um delas foi em decorrncia da rpida expanso, que, por sua vez, no teve como contrapartida a qualidade. O principal foco de desequilbrio estaria no setor privado, na medida em que este possua estrutura frgil no que tange qualificao do corpo docente, o que inviabilizava o atendimento de massa aliado qualidade. O governo Fernando Henrique Cardoso destacava dois pressupostos que deveriam nortear as aes na rea do ensino superior: (i) a importncia do setor para a melhoria da qualidade do ensino, e (ii) a modernizao do pas passaria pela formao de recursos humanos qualificados. Alm disso, revelava preocupao com a necessidade de se criar um sistema de avaliao da qualidade dos servios ofertados pela esfera privada. Com a extino do Conselho Federal de Educao, no Governo Itamar, a poltica de governo para o ensino superior adotada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso foi marcada pelo conduo da expanso do ensino superior privado pelo Ministrio da Educao. Em 1996, a Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educao LDB) introduziu o processo regular de avaliao dos cursos de graduao e das prprias instituies e de ensino superior, ao condicionando desempenho seus respectivos nesta credenciamentos recredenciamentos mensurado

avaliao. Alm disso, a LDB estabeleceu os nveis escolares e as modalidades de educao e ensino, bem como suas respectivas finalidades. A partir de um ano da publicao da LDB instituiu-se no pas a Dcada da Educao. A Unio definiu diretrizes e metas para os dez anos seguintes, visando matricular todos os educandos a partir dos sete anos, promover cursos presenciais ou a distncia e qualificar os docentes.

35

Posteriormente, com a edio do decreto 2.306/97, algumas mudanas referentes ao percentual mnimo de titulao docente e ao quadro de docentes em tempo integral impuseram patamares mnimos para a existncia das universidades; caso no atinjam esse patamar mnimo, elas sero reclassificadas como Centros Universitrios. A tabela 4 esclarece essas condies. Tem-se que at o ano de 2004, as universidades devem possuir no seu quadro de pessoal, um tero de professores com tempo integral e um tero de professores com titulao mnima de mestrado, sendo que do total de docentes 15% devem possuir titulao de doutor.Tabela 4 Condies mnimas de titulao e contrato do corpo docente de cada universidade Brasil (1998,2001 e 2004)

Prazo

Professores em tempo integral 15% 25% 1/3

Dezembro 1998 Dezembro 2001 Dezembro 2004Fonte: Cunha (1998, p.31)

Professores com ps-graduao stricto sensu 15% 25% 1/3

Professores com doutorado 5% 10% 15%

Obs: Em qualquer poca, 30% dos mestres e doutores devero atuar em tempo integral.

Dadas as exigncias impostas pela legislao, o setor privado de ensino superior percebeu que os centros universitrios so uma opo mais apropriada s suas possibilidades financeiras e que as universidades, por exigirem o ensino, a pesquisa e a extenso, e principalmente pelas exigncias em relao a titulao docente, podem se tornar difceis de serem gerenciadas, em virtude das restries oramentrias. Desde 1997, o Governo Federal credenciou apenas 8 universidades e 60 centros universitrios e apenas de 2000 para 2002 o nmero de centros universitrios privados instalados no pas saltou de 49 para 74 (INEP, 2003). Outra caracterstica marcante dos anos 90 foi o aumento contnuo da educao a distncia ancorada em ambientes interativos. A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Universidade Anhembi Morumbi (UAM) e a Universidade Federal de So Paulo (UNIFESP) foram as pioneiras no Brasil na

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criao de ambientes prprios para o uso da Internet como mdia educacional qualificada. Vrias outras instituies se aperfeioaram e atualmente oferecem principalmente cursos de educao continuada e ps-graduao a distncia ou na modalidade semi-presencial. No existem estudos especficos sobre a viabilidade econmica para a educao a distncia (EAD) no ensino superior brasileiro. Se por um lado, a EAD reduz os investimentos fixos em instalaes fsicas para as IES e os custos de deslocamento, moradia e transportes para os alunos; por outro lado, os investimentos em equipamentos e estruturas de telecomunicao eficientes e em recursos humanos qualificados constituem barreiras entrada das IES privadas neste segmento de ensino. Sendo assim, as IES privadas tm se esforado em criar parcerias e estabelecer redes de cooperao para desenvolver a EAD. No que se refere desconcentrao regional, entre 1985 e 1990, constata-se um aumento significativo no numero de estabelecimentos particulares, em especial na regio Centro Oeste. A partir da dcada de 90, o ensino superior brasileiro entrou em uma fase de crescimento acelerado e de diversificao. Nos ltimos dez anos, a matrcula nos cursos de graduao apresentou uma taxa de expanso anual de 7%, em mdia. Em 2001, o aumento atingiu 12% se comparado com o ano anterior. Outra tendncia que tem acompanhado a desconcentrao regional dos estabelecimentos privados de ensino superior sua interiorizao nos estados. Em Minas Gerais, a interiorizao ocorreu sobretudo mediante a expanso de instituies pblicas federais. Na Paraba, ampliaram-se a rede pblica federal e a estadual, que absorvem tambm instituies municipais. Em Santa Catarina, o processo de interiorizao do ensino superior prendeu-se instalao de instituies de ensino superior municipais. No Paran, predominam os estabelecimentos de ensino superior estaduais. No Rio Grande do Sul predominou o desenvolvimento de uma rede de instituies comunitrias. Em Gois, a interiorizao do ensino superior mais recente, sendo caracterstica dos anos 80, e est associada instalao de instituies fundacionais municipais (Sampaio, 2000). A anlise da distribuio regional das matrculas do ensino superior, conforme tabela 5, mostra que as matrculas do setor privado se concentram nas

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regies de maior poder aquisitivo, revelando acentuada desigualdade regional. A regio sudeste possui a maior renda per capita do pais, R$ 5.327,00, e absorve 50,18% do total de alunos matriculados no ensino superior, sendo que 80,89% destes esto em instituies privadas. A regio Nordeste, por sua vez, apresenta a menor renda per capita, R$ 2.461.00, sendo que 41,62% dos estudantes matriculados esto nas IES privadas.Tabela 5 Distribuio dos alunos matriculados no ensino superior por regio Brasil 2002

Regies

Renda per capita (R$)

Alunos matriculados

% sobre o Total

Alunos matriculados nas IES privadas

Relao privada/ Total 39,01% 41,62% 66,62% 73,81% 80,89% 69,78%

Norte Nordeste Centro Oeste Sul Sudeste Total

3.176 2.461 4.932 6.337 7.314 5.327

190.111,00 542.409,00 323.461,00 677.655,00 1.746.277,00 3.479.913,00

5,46% 15,59% 9,30% 19,47% 50,18% 100,00%

74.168,00 225.764,00 215.497,00 500.183,00 1.412.646,00 2.428.258,00

Fonte: Elaborado pelo autor com dados do INEP (2003) e IBGE (2002)

Atualmente, como segue na Tabela 6, verifica-se que o setor privado formado por 1.442 (88%) instituies de ensino superior no pas, medida que o setor pblico abrange 195 (12%) instituies. Dos 3.479.913 alunos matriculados no ensino superior, 70% encontram-se matriculados em instituies privadas e o restante nas pblicas.

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Tabela 6 Instituies e alunos matriculados nos cursos de graduao por organizao acadmica, segundo a categoria administrativa das IES Brasil 2002

Organizao acadmica / Categoria AdministrativaUniversidades Centros Universitrios Faculdades Integradas Faculdades, Escolas, Institutos Centros de Educao Tecnolgica Total Geral Absoluto Total Geral Relativo

Instituies Pblica78 3 3 80 31 195 12%

Alunos Matriculados Pblica915.902 14.646 7.179 76.813 37.115 1.051.655 30%

Privada84 74 102 1.160 22 1442 88%

Privada1.234.757 415.669 172.528 599.240 6.064 2.428.258 70%

Fonte: Elaborado pelo autor com base nos dados do INEP (2003)

As instituies privadas no Brasil formam mais de 315.000 alunos por ano, 68% do total, e empregam 150.260 docentes, sendo 84% destes tempo parcial e horista (TP) e o restante em tempo integral (TI). J nas IES pblicas 151.101 estudantes concluram o ensino superior em 2002, 32% do total de formandos do pas. Nestas instituies, predomina os professores com tempo integral, sendo que dos 90.215 docentes, 75% so contratados por tempo integral, conforme se verifica na Tabela 7.

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Tabela 7 N de concluintes em cursos de graduao presenciais e n de docentes por organizao acadmica, segundo a categoria administrativa daS IES Brasil 2002

Organizao acadmica / Categoria Administrativa TI Universidades Centros Universitrios Faculdades Integradas Faculdades, Escolas, Institutos Centros de Educao Tecnolgica Total1.776 65.808 191 0 229

Docentes

Alunos Concluintes

Pblica

Privada

Pblica

Privada

TP17.119 420 445 3.459

TI14.545 4.039 1.102 4.711

TP55.531 19.275 9.708 40.573 130.868 2.330 1.295 12.184 173.413 50.023 28.543 62.872

768

63

713

4424

308

68.004 22.211 24.460 125.800 151.101

315.159

Observao: TI refere-se a tempo integral e TP refere-se a tempo parcial e horistas. Fonte: Elaborado com base nos dados do INEP (2003)

A principal caracterstica do setor privado de ensino superior sua heterogeneidade. Um estabelecimento privado de ensino superior pode distinguir-se de outro, tambm particular, sob vrios aspectos formais: sua natureza institucional (universidade, centro universitrio, federao de escolas ou escolas integradas, ou faculdade isolada); a personalidade jurdica de sua mantenedora (fundao, associao civil, sociedade civil de direito privado), se tem ou no fim lucrativo, sua definio como instituio laica ou confessional e, se confessional, a religio qual est vinculada. Esta distino principal a respeito do ensino superior privado

compartilhada por Schwartzman e Schwartzman (2002) ao constatarem que um nmero relativamente pequeno de instituies, 5%, concentra quase a metade da matrcula do ensino superior privado no pas, enquanto que, no outro extremo, 50% das instituies absorvem somente 5% da matrcula. A relao ensino privado com o mercado refere-se, em um primeiro nvel, capacidade do setor de suprir, mobilizando recursos privados, a demanda de

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massa por ensino superior. O mercado e a dinmica da competio entre os prprios estabelecimentos privados so o determinante na ocorrncia dos grandes movimentos de expanso e estagnao que se verificam na trajetria do setor privado no pas nos ltimos trinta anos. No tocante ao financiamento, os empreendimentos educacionais tm elevados custos de manuteno e de investimento e, no caso das IES privadas particulares visam obteno de lucro para os seus proprietrios. Ao contrrio do setor pblico, onde a criao de cursos ou instituies pblicas atende aos critrios de necessidade social, no setor privado, por sua vez, a existncia de mercado que antecede a criao de novos estabelecimentos e cursos. A partir dos anos 80, este cenrio de competitividade passou a influenciar as decises e atitudes dos dirigentes das IES privadas. De acordo com a tabela 8, o setor privado responsvel atualmente pela oferta de 64% dos cursos de ensino superior no pas. Esta importncia relativa vem aumentando com o passar do tempo, sendo que em 1984, dos 3.806 cursos de ensino superior existentes no pas, 54% eram oferecidos pelo setor privado. Em relao ao nmero de instituies, observa-se que o setor privado teve uma participao mdia de 75% em relao ao total do pas durante os anos 80. A partir de 1995, esta participao aumentou significativamente por um lado devido instalao de novas instituies, e por outro lado, em funo da classificao de algumas instituies criadas pelos municpio que at o momento eram consideradas pblicas e foram classificadas como privadas. Nos ltimos anos, mais de cem novos cursos so oferecidos a cada ano nas IES privadas. Essa estratgia de ampliao da oferta de cursos, acompanhado do aumento no nmero de carreiras oferecidas, apontando para a maior diferenciao da oferta, uma das estratgias adotadas pelo setor para enfrentar a competio entre as instituies. Em 1984, dos 3.806 cursos oferecidos no pais, 54% eram realizados pela iniciativa privada. Em 2002, o nmero total de cursos oferecidos saltou para 14.399, sendo o setor privado o responsvel por 64% da oferta, como pode ser analisado na Tabela 8.

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Tabela 8 Total de cursos oferecidos e instituies de ensino superior Brasil (1980, 1984, 1990, 1994 e 2002)

Anos Total 1980 1984 1990 1994 2001 2002... 3.806 4.712 5.562 12.155 14.399

Cursos Pblica... 1.737 (46%) 2.001 (42%) 2.412 (43%) 4.401(36%) 5.252 (36%)

Instituies Privada... 2.069 (54%) 2.711 (58%) 3.150 (57%) 7.754 (64%) 9.147 (64%)

Total882 847 918 851 1.391 1.637

Pblica (*)200 (23%) 238 (28%) 222 (24%) 218 (26%) 183 (13%) 195 (12%)

Privada682 (77%) 609 (72%) 696 (76%) 633 (74%) 1.208(74%) 1.442 (88%)

Fonte: Elaborado pelo autor com base nos dados do INEP (1998, 2000,2003)

Em 2001, existiam no pas 12.155 cursos superiores, portanto houve um aumento de 2.244 cursos em apenas um ano no pas, o que indica que em mdia seis cursos foram criados diariamente. As duas direes seguidas pelo setor privado de ensino superior para a ampliao da oferta consistem, em primeiro lugar, suprir uma demanda de formao de profisses liberais de prestgio nas reas de cincias exatas e tecnolgicas, como as de engenharia, e na rea da sade, em especial com cursos de Medicina e Odontologia. E a segunda direo a ampliao do nmero de cursos mediante a fragmentao das carreiras, em geral das reas de cincias sociais aplicadas e da sade (Sampaio, 2000). Contudo, a ampliao no planejada das instituies de ensino superior esconde informaes valiosas para a anlise deste setor como um setor econmico. Embora a perspectiva de crescimento potencial do ensino superior brasileiro seja grande, na prtica a demanda no dever crescer muito. J pode estar ocorrendo um superdimensionamento do sistema, que se manifesta nas mais de trezentas e setenta mil vagas no preenchidas no ano de 2001, sobretudo pelo setor privado (Tabela 9). Em 2002, das 1.773.087 vagas abertas pelo setor privado, apenas 1.205.140 foram preenchidas, criando uma enorme capacidade ociosa.

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Tabela 9 Vagas oferecidas e no preenchidas no ensino superior Brasil (1980 /2002)

Anos 1980 1984 1990 1994 2000 2001 2002

Vagas oferecidas 404.814 442.314 502.784 574.135 1.216.281 1.408.492 1.773.087

Vagas no preenchidas 48.147 66.486 95.636 110.895 318.724 371.802 567.947

Percentual de vagas no preenchidas 11,9% 15,0% 19,0% 19,3% 26,2% 26,4% 32,0%

Fonte: Elaborado pelo autor com base nos dados do INEP (1998, 2000,2003)

Aliado a este desafio, a crescente participao de alunos de menor poder aquisitivo tem levado a ndices de inadimplncia prximos de 20% ao longo do semestre. A legislao veda instituio que os alunos inadimplentes sejam impedidos de freqentar aulas ou prestar exame e as IES no podem negar aos alunos em atraso os documentos necessrios sua transferncia ao final do perodo letivo, o que implica a possibilidade de sua sada sem a quitao da dvida (Schwartzman e Schwartzman, 2002). A relao existente entre o nmero total de alunos que entram e os que se formam num determinado perodo nas diferentes instituies do pas se situa em 36,2%. Este indicador menor para as IES privadas e religiosas sendo que as IES Federais apresentam uma relao de 50,3%. Se o nmero de matrculas iniciais no tiver aumentando, esta relao deve ser prxima de 100%. Contudo, muitos desses alunos desistem do curso, alguns da instituio e outros do sistema de ensino superior (Tabela 10).

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Tabela 10 Relao alunos formados por entrantes (no mesmo ano), por rea de conhecimento e tipo de instituio Brasil 2000

Instituio Agricult. e Cincias / rea

Cincias

Educao Engenharia Humanidade Sade Servios

Total

veterinria sociais matemtica

Federal Estadual Municipal Religiosas Privadas Total

55,4 45,2 35,8 23,7 27,8 40,8

63,0 54,4 44,7 34,9 29,8 35,4

38,4 43,1 40,1 29,0 29,0 32,2

35,4 42,3 40,9 35,7 41,2 38,9

41,8 48,4 32,7 31,9 22,5 33,9

51,8 81,6 51,8 71,8 29,8 30,1 34,0 38,6 21,0 27,2 37,6 43,0

33,6 36,4 0,00 14,7 9,1 12,4

50,3 47,7 40,2 34,1 30,0 36,2

Fonte: INEP (2001), Schwartzman e Schwartzman (2002) Prosseguindo com a anlise por rea de conhecimento, tem-se que as maiores relaes entre formados e entrantes esto nos cursos das reas de sade e agricultura e veterinria. A menor relao encontrada nos cursos da rea de servios, onde o nmero de novas vagas tem aumentado consideravelmente nos ltimos anos. A relao matrcula por vaga perde eficincia medida que na ltima dcada o nmero de entrantes tem se elevado muito, em funo do nmero macio de instituies e cursos implantados, como visto anteriormente. Analisando-se a taxa de diplomao no Brasil, a partir da dcada de 80, tem-se que em mdia 64% dos alunos que ingressaram no curso superior conseguiram conclu-lo aps cinco anos de estudo (Tabela 11). A evaso destes alunos gera custos sociais e privados para o pas. Os primeiros so mais difceis de mensurao, pois sinalizam de um lado que os trabalhadores brasileiros permanecem com uma baixa qualificao e, de outro, que a disponibilidade de vagas nas instituies pblicas, apesar de gratuitas, no contribui eficazmente para a formao de pesquisadores e tcnicos capacitados que o pas tanto almeja, visto que muitos interrompem definitivamente seus estudos.

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Tabela 11 Taxa de diplomao5 no Brasil

Ano 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001

Ingressosn/d

Concluintes 222.896 226.423 229.856 244.639 238.096 227.824 234.173 228.074 224.809 227.037 232.275 230.206 236.377 234.267 240.269 245.887 254.401 260.224 274.384 300.761 324.734 352.305n/d

Conc t./Ing.n/d n/d n/d n/d n/d

(t-5)

356.667 357.043 361.558n/d n/d

63,88% 65,59% 63,08%n/d n/d

346.380 378.828 395.418 395.189 382.221 407.148 426.558 410.910 439.801 463.240 510.377 513.842 573.900 651.353 750.168 897.557 944.157

67,06% 60,77% 59,78% 59,28% 62,86% 60,39% 59,64% 63,33% 62,39% 64,93% 63,63% 68,56%n/d

Fonte: INEP (1998, 2001, 2002); Dados elaborados pelo autor

No que tange aos custos privados, os mesmos so assumidos pelas instituies que oferecem os cursos superiores e, quando possvel, so repassados aos alunos que permaneceram no sistema universitrio. Diante da impossibilidade de aumentar continuamente as mensalidades, a soluo encontrada pelas IES tem sido manter as vagas iniciais elevadas, que hoje dificilmente so inferiores a 50 para cada turma; captar alunos via transferncia e fundir turmas dos ltimos perodos.

Relao entre alunos que se formam num ano (concluintes t) e alunos que ingressaram no sistema cinco anos antes (ingressantes t-5).

5

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A reao das entidades privadas tem sido a de acirrar a concorrncia entre si, atravs de agressivas campanhas publicitrias, localizao das unidades de ensino perto da residncia dos alunos, facilidades de ingresso, ampliao dos cursos superiores na modalidade tecnologia e seqencial. A poltica de conquistar e manter os alunos satisfeitos ainda excepcionalidade neste setor; raras so as iniciativas de IES que acompanham e avaliam continuamente seus cursos de acordo com a percepo do discente. O que se verifica que, apesar da ociosidade, a estratgia das IES atrair o mximo possvel de alunos nas sries iniciais, sem se preocupar com quantos iro terminar os seus cursos. Por entender a importncia do assunto evaso para os dirigentes das IES, este item tem por finalidade apresentar e difundir algumas pesquisas sobre a evaso no ensino superior realizadas no mundo. Contudo, no se tem a pretenso de esgotar o assunto, visto que, com certeza diversos outros estudos foram realizados e, apesar da pesquisa, no so de conhecimento da autora.

2.1.2 EVASO NO ENSINO SUPERIOR

Os ndices de evaso em cursos de graduao no pas esto elevados e no se constituem num fenmeno novo, pois nem todas as pessoas que ingressam em um curso o concluem. Nos dias atuais, face a situao da constatao de nmero reduzido de pessoas com nvel superior e da necessidade do pas de qualificar sua populao, o fenmeno evaso adquire uma importncia iminente, dada sua complexidade e abrangncia. (SESu/MEC, 1997; Costa e Campos, 2000, 2001). Diante deste cenrio, Veloso (2000,p,14) assegura que:A evaso de estudantes um fenmeno complexo, comum s instituies universitrias no mundo contemporneo. Nos ltimos anos, esse tema tem sido objeto de alguns estudos e anlises, especialmente nos pases do primeiro mundo, e tm demonstrado no s a universalidade do fenmeno como a relativa homogeneidade de seu comportamento em determinadas reas do saber, apesar das diferenas entre as instituies de ensino e das peculiaridades scio-econmicoculturais de cada pais.

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A evaso em curso superior tem sido tradicionalmente estudada a partir de uma perspectiva demogrfica, buscando identificar suas origens em fatores de natureza socioeconmica, no tipo de escola secundria, da qual o estudante proveniente, e at mesmo se a varivel sexo seria determinante do comportamento de evadir-se do curso ou escola superior (Peixoto, Braga e Bogutchi, 2000). A concluso ou no do curso dentro do prazo determinado pela instituio, no nmero de semestres curricularmente programado, pode ser entendida como um dos indicadores da eficincia do sistema universitrio. Uma discrepncia acentuada entre a durao terica (prevista) e a durao efetiva (real) dos cursos afeta os ndices de produtividade e indica deficincia no sistema cujas causas necessitam ser estudadas (Hotza, 2000). Na literatura consultada, no se identificou teorias formais a respeito do abandono de um curso universitrio. Contudo, pode-se considerar que o referencial terico pertence s seguintes disciplinas do conhecimento: educao, psicologia, sociologia, economia, entre outras, evidenciando que o assunto deve ser tratado por uma abordagem multidisciplinar. No que se refere ao trancamento ou o abandono temporrio do aluno, apesar de no ter sido encontrado teorias e trabalhos que discutissem sobre o tema, entende-se que o objeto de estudo tambm deva ser amplo. A partir de 1995, com o Seminrio sobre Evaso nas Universidades Brasileiras, promovido pelo Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB), a discusso sobre a evaso nas Instituies Federais de Ensino Superior (IFES) tornou-se mais ampla. Na ocasio, a Secretaria de Educao Superior (SESu) divulgou indicadores globais que apontavam para uma evaso mdia nacional de 50% nas IFES. Como resultado deste seminrio, formou-se uma comisso especial de estudos sobre evaso nas IES pblicas A Comisso preocupou-se com a definio de conceitos bsicos do objeto do estudo e em estabelecer os primeiros parmetros metodolgicos, de forma a garantir a exatido e comparabilidade dos resultados. Desta forma, mesmo reconhecendo as limitaes possveis, a Comisso decidiu caracterizar evaso distinguindo:

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Evaso de curso quando o estudante desliga-se do curso superior em situaes diversas tais como: abandono (deixa de matricular-se), desistncia (oficial), transferncia ou reopo (mudana de curso), trancamento, excluso por norma institucional; Evaso da instituio quando o estudante desliga-se da instituio na qual est matriculado; Evaso do sistema quando o estudante abandona de forma definitiva ou temporria o ensino superior.

Os estudos sobre o assunto encontrados no Brasil, permitem afirmar que a evaso apresenta-se sob trs faces distintas (SESu/MEC, 1997):

fatores referentes a caractersticas individuais do estudante: fatores relativos habilidade de estudo, personalidade, desencanto com cursos escolhidos em segunda ou terceira opo, desinformao no momento da escolha do curso; fatores internos s instituies: relativos a questes acadmicas, tais como currculos desatualizados, rgida cadeia de pr-requisitos para as disciplinas; falta de formao pedaggica ou desinteresse do docente; insuficincia de estrutura de apoio como laboratrios de ensino e de informtica; fatores externos s instituies: relacionados s condies da profisso no mercado de trabalho, conjunturas econmicas especficas, vinculados a dificuldades financeiras do estudante.

Se por um lado a evaso resulta de uma deciso do aluno, tomada com base em motivaes prioritariamente de ordem pessoal, por outro lado ela pode ser resultante de uma combinao de fatores escolares, socioeconmicos e pessoais, caracterizando-se, neste caso, mais como excluso do que propriamente como evaso. Isto , so as prprias condies institucionais composio curricular, professores, organizao das escolas muitas vezes os

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principais responsveis pela ocorrncia do fenmeno, expulsando o aluno da escola (Peixoto, Braga e Bogutchi, 2000). Vislumbra-se que a evaso do curso pode ser influenciada por motivos pessoais. Ao mesmo tempo, pode ser influenciada por fatores institucionais, que afetam a percepo do aluno em relao qualidade dos servios oferecidos. Esta mesma viso compartilhada por Assuno, Soares e Caldeira (2000), ao agruparem, de um lado, os fatores exgenos universidade, tais como o nvel educacional e econmico dos pais, a expectativa prvia do aluno e sua habilidade intrnseca. E, no outro grupo, os fatores endgenos universidade, tais como a composio curricular, a qualidade do corpo docente, a organizao da universidade e a infra-estrutura da instituio. Costa e Campos (2000) salientam que a deciso de escolha de um determinado curso superior no se d em um vazio de significados. O ingressante, mesmo de maneira pouco explcita e consciente para si, tem algumas expectativas quanto profisso que busca, suas condies de sucesso profissional, alm de um conjunto de crenas quanto s suas possibilidades de conseguir os resultados desejados. Prosseguem os autores afirmando que os alunos tm tambm um leque de expectativas e de crenas sobre o curso e a instituio na qual ingressam. A experincia vivida diariamente no curso, o contato com profissionais, o confronto de suas expectativas com a realidade experimentada podem resultar num desconforto, o que d ao aluno a alternativa provvel de desistncia do curso, resultando em evaso em suas vrias possibilidades: abandono do curso, trancamento provisrio, reopo e transferncia para outra instituio.Ao considerarmos a evaso como um comportamento motivado, luz desses dois modelos tericos, estamos postulando que sua compreenso e conseqente preveno ou reduo tornam-se possveis se identificarmos as expectativas e experincias quanto ao curso, profisso e instituio, s prvias do ingresso nele, e se pudermos verificar as dissonncias cognitivas experimentadas entre as expectativas e crenas iniciais e ao longo de um dado perodo de curso, no qual se constatam desistncias, trancamentos e evaso (Costa e Campos, 2000, p. 35).

Mesmo considerando a evaso como um fenmeno de causas variadas, a interveno da universidade atravs de alteraes em currculos, adequao de metodologias de ensino e de processos de avaliao, alm da introduo de

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mecanismos de acompanhamento de estudantes, podem reduzir sensivelmente as dimenses deste problema, sobretudo naqueles cursos em que as taxas so mais elevadas. Tais modificaes devem ser orientadas para atuar sobre o ensino nos primeiros semestres, uma vez que o rendimento escolar nesse perodo parece ser determinante para a evaso. Conforme Dias Sobrinho (1996, p. 12),[...] as expectativas e a percepo dos clientes podem ser administradas. As instituies de ensino superior no tm se preocupado com esta questo, pois, em geral, os discentes optam por um curso sem possuir as informaes necessrias, ou com informaes distorcidas, de modo a gerar uma expectativa que no condiz com a realidade do curso escolhido. Diante da percepo do que o curso realmente oferece, o discente, decepcionado, no consegue concluir o curso, ou, quando consegue, o faz de forma precria, prejudicando a qualidade de sua formao e sua produo social

Evidencia-se assim que as aes para diminuir as taxas de evaso podem e devem ser implantadas pelas IES como forma de prevenir a sada temporria ou definitiva do aluno, reduzindo os custos de perda do cliente. De acordo com o estudo de Latiesa apud SESu/MEC (1997) que abrangeu universidades europias e norte-americanas e investigou seu desempenho numa srie histrica de 1960 a 1986, os melhores rendimentos do sistema universitrio so apresentados pela Finlndia, Alemanha, Holanda e Sua e os piores resultados se verificaram nos Estados Unidos, ustria, Frana e Espanha. Nos EUA, por exemplo, apontava a autora, as taxas