Design e Arte - Ampliando suas fontes de inspiração

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& outubro 2006 :: ano 3 :: nº 34 :: www.revistawebdesign.com.br Reportagem: Conheça as transformações ocorridas no design para web Estudo de caso: A era dos sites como estratégia de branding Especial: Cobertura do Fórum Internacional de Design e Tecnologia Digital R$ 8,90 9 771806 009009 4 3 0 0 0 ISSN 1806-0099 EDITORA DESIGN A RTE Ampliando suas fontes de inspiração

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Entrevista de Ronaldo Gazel (por Luis Rocha) para a Revista Webdesign número 34

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outubro 2006 :: ano 3 :: nº 34 :: www.revistawebdesign.com.br

Reportagem: Conheça as transformações ocorridas no design para webEstudo de caso: A era dos sites como estratégia de brandingEspecial: Cobertura do Fórum Internacional de Design e Tecnologia Digital

R$ 8,90

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I SSN 1806 - 0099

E D I T O R A

DESIGNARTEAmpliando suas fontes de inspiração

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“Vamos lá, Picasso, essa tela é pra ontem!!!”

Nossa última reunião de pauta aqui na Arteccom foi bastante

rica e estimulante: falaríamos sobre arte nesta edição! É um assunto

interessante e essencial.

Como Carol ina Lesl ie, da AgênciaCl ick (página 39) , expl ica

bem que a arte não tem que agradar nenhum públ ico e a função

do designer é justamente encontrar soluções ou, s implesmente,

“agradar” este mesmo públ ico, por que design e arte estão tão

próximos, andam tão juntos? A ponto do designer, numa agência de

publicidade, ser chamado de “diretor de arte”? Na minha cabeça,

fico imaginando um diretor de arte mais ou menos assim:

- “Vamos lá, Picasso, essa tela é pra ontem, viu?”

Brincadeiras à parte, acho que um designer deve, ao invés de

se sentir um artista, conhecer muito de arte e interpretá-la como

formas de expressão. Um art i s ta , no seu momento de cr iação,

chora, ri, sofre, sente angústia e, finalmente, encontra uma maneira

de extravasar seus sentimentos, através de formas, cores, sons,

ocupação do espaço...

Um designer também pode chorar, sorrir, sofrer, se o objetivo

for encontrar soluções inovadoras para seus cl ientes. Ou seja, a

arte deve servir apenas como uma grande fonte de inspiração. E,

com esse objetivo, preparamos várias páginas para a sua imersão

no mundo da arte.

Boa leitura.

Editorial Equipe

Criação e edição

Produção gráfica

Distribuição

www.arteccom.com.br

www.prolgrafi ca.com.br

www.chinaglia.com.br

A Arteccom é uma empresa de design, especializada na criação de sites e responsável pelos seguintes projetos:Revista Webdesign :: www.arteccom.com.br/webdesignCurso Web para Designers :: www.arteccom.com.br/cursoEncontro de Web Design :: www.arteccom.com.br/encontroPortal Banana Design :: www.bananadesign.com.brProjeto Social Magê-Malien :: www.arteccom.com.br/ong

Adriana Melo

:: A

Art

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Dire ção Geral Adriana [email protected]

Direção de RedaçãoLuis [email protected]

Criação e DiagramaçãoCamila [email protected] [email protected]

IlustraçãoBeto [email protected]

PublicidadeBruno Pettendorfer

Débora [email protected]

Gerência de TecnologiaFabio Pinheiro [email protected]

FinanceiroCristiane [email protected]

Atendimento e AssinaturasLuanna [email protected]

4 :: quem somos

9

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pág. 8 métricas e mercado

pág. 10 direito na web

pág. 11 post-it

e-mais

pág. 38 debate: Adaptar-se

pág. 44 e-mais: Virais na web

pág. 48 especial: FIND

pág. 51 estudo de caso: Bicmusic

pág. 54 tecnologia na web: CSS Hacks

pág. 56 tutorial: Caminhando pelo HTML - Parte 5

com a palavra

pág. 58 mercado de trabalho: Cesar Paz

pág. 60 marketing: René de Paula Jr.

pág. 62 bula da Catunda: Marcela Catunda

pág. 64 webdesign: Luli Radfahrer

portfólio

pág. 12 agência: Cappuccino/HZTA

pág. 18 freelancer: Renato Loose

matéria de capa

pág. 20 entrevista: Design e arte

pág. 28 reportagem: Design na web

Page 4: Design e Arte - Ampliando suas fontes de inspiração

vai usar. E é aí que nos encaixamos na história, e passamos

a fazer parte dela.

Por outro lado, no que se entende por design hoje,

dentro de uma ótica artística, é plenamente possível

desenvolver projetos de utilização alternativa, que podem

ser altamente subjetivos e próximos até do antiuso. Nesse

cenário se enquadram os experimentalistas, que buscam

um tipo de reação mais sensorial, de semânticas totalmente

específicas, heterogêneas, dentro de universos distintos,

sejam eles culturais, comerciais, didáticos, humanistas,

matemáticos, psicológicos, estéticos.

O designer que pára de olhar o mundo com o olhar difuso,

amplo, capaz de compreender várias realidades, corre o risco

de virar uma engrenagem na linha de produção de sites, no

melhor estilo “corte e costura” de HTML. Vai passar a apertar

um parafuso, ao invés de compreender toda a engrenagem.

E é por isso que devemos, além de estudar a história da arte,

fi rmar nossa posição como artistas designers - mentes capazes

de compreender as expressões artísticas não apenas como

uma superfi cialidade decorativa ou bela, e sim, uma interface

capaz de comunicar utilizando modelos não-usuais, linguagens

não-verbais, fora do “logos”, da razão cotidiana; capazes de

questionar o que não se quer questionado; de propor o que

não se quer proposto; de causar o estranhamento, dando lugar

ao controverso. Enfi m, capazes de compreender o mundo

pictórico muito além da forma.

Wd :: Ao longo do tempo, os movimentos artísticos

vêm exercendo uma grande influência na produção do

design. Em termos de internet, talvez um dos melhores

Nesta entrevista, Ronaldo Gazel, artista plástico,

designer e diretor de arte na BHTEC e:house (www.bhtec.

com.br), fala como as referências fora do mundo tecnológico

podem contribuir na construção de ambientes digitais mais

criativos e funcionais, além de ressaltar a importância da

história da arte como base para o trabalho do designer.

Wd :: Por que e como o conhecimento da história

da arte serve como base para trabalho de um designer

na internet?

Gazel :: A arte reflete o tempo em que é produzida.

Conhecer a história da arte, ainda que apenas alguns pontos

dela, é fundamental para entendermos os questionamentos

e paradigmas que permearam as épocas e as respostas

que o homem/artista deu (e ainda dá) a elas. Na verdade,

a história da arte, estando intimamente ligada à literatura,

à filosofia, à antropologia, à história, à religião, enfim, a

um sem-número de expressões humanas, acaba tendo

uma importância fundamental na vida de todas as pessoas.

Quanto mais longe da arte, mais perto do controle, do

sistema, do pensar “massificado”, pasteurizado.

É preciso entender a história do design, para ser um

designer mais completo, mais consciente, mais coerente. É

preciso saber como surgiu o movimento do design; saber

como o relacionamento dos objetos e do ser humano foi se

sofisticando com o passar do tempo. É importante porque

uma interface é uma superfície de trabalho, de uso. E é

por isso que somos designers da web, projetamos, como

um designer projeta um espremedor de suco, ou uma

cadeira, interfaces que um grupo de pessoas certamente

Design e arte são campos distintos do conhecimento humano. Porém, nada impede que

ambos sejam utilizados em harmonia para a construção de representações que ajudem a tornar

mais compreensíveis e sofisticados os objetos e a maneira na qual vivemos em sociedade.

20 :: entrevista - design e arte

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entrevista- design e arte :: 21

exemplos esteja no site das Havaianas (www.havaianas.

com.br) e algumas campanhas on-line da Coca-Cola na

França (www.coca-colablak.fr e http://secure.coca-cola.

fr). Quando a arte deve ser aplicada em benefício do

design na web?

Gazel :: A arte pode trazer enormes benefícios para o

design na web, sendo uma linguagem não-verbal, capaz de

despertar naquele que tem contato com ela, percepções e

diálogos muito mais sofisticados (ou simples, diretos!) do

que as narrativas e approachings das interfaces focadas em

percepções utilitárias puras. E o maior desses benefícios

se chama coerência estética. Essa coerência pode ser

percebida no excelente site das Havaianas, evidenciando o

fato de que a ousadia em termos de linguagem, da difusão

de valores semióticos sutis, fora do padrão midiático

tradicional de informação, dispostos juntos a uma feliz

combinação de fatores estéticos e expectativas sensoriais

(revertidas de alguma forma em resultados positivos),

transforma o lugar-comum dos pressupostos, das “doxas”

pictóricas, dos pré-conceitos estabelecidos todos os dias.

Por isso mesmo, sites como esse, que felizmente têm

surgido em número cada vez maior, fazem tanto sucesso:

eles mostram que o caminho da arte no design na web é

muito promissor, e dá resultados.

Wd :: Sobre a interação entre design e arte, podemos

afirmar que a principal diferença entre estes dois campos

do conhecimento seja o compromisso com o público, ou

seja, o designer tem compromisso com o público e o artista

vive sem a necessidade e a pressão de fazer concessões?

Gazel :: O perfil do artista hoje não pode ser traçado

de modo simples, porque na pós-modernidade - período

no qual vivemos, e que resgata todas as motivações e

contradições do passado recente (movimentos modernos)

em um timing assombrosamente rápido - há uma tal

especificidade de propostas, conceitos e estéticas que

permite ao artista, virtualmente, qualquer tipo de relação

com o público, inclusive compromisso e descompromisso.

Mesmo que uma proposta, em princípio, nos conduza

a uma percepção romantizada do artista, como se ele

não estivesse se importando para o público, não sofresse

qualquer tipo de pressão, isso na verdade pode mostrar

o contrário: a adequação do artista a nichos de mercado

preparados para receber/consumir as suas características

sui-generis, ou seja: para o artista, há um mercado em

qualquer situação. Veja que paradoxo, digamos quase

zen-budista: o artista busca gerar um reflexo altamente

pessoal; uma linguagem, uma “poiesis” própria, buscando

o coeficiente de “arte” em um trabalho artístico, seja ela

um vídeo, uma pintura, uma performance, um website

- linguagem essa que, apesar de desuniversalizada na

origem, tende a se comunicar com o senso-comum, tanto

na aceitação, quanto no estranhamento.

Já o designer normalmente trabalha com fins

utilitários extremamente bem definidos, e por isso a

pressão por coerência artística passa a ser mínima, em

favor de uma adequação máxima aos padrões estéticos

aceitos por um grupo majoritário - ou pseudomajoritário;

padrões estéticos que são verdadeiros “lugares comuns”.

Então, voltamos à história da “doxa”, do “ouvi dizer”, da

informação não-questionada e não-questionável. Quanto

menos vontade de reavaliar os valores e conceitos tidos

como inexoráveis, mais subvalorizada será a profissão de

design, pois a pressão que passa a se exercer sobre nós,

designers, acaba sendo a mesma que um carregador de

caixas: produção braçal, e não mental.

Wd :: A interação homem-computador é considerada

por especialistas mais fria e distante, além de criar um

sentimento individualista entre as pessoas. Buscar

referências nos movimentos artísticos pode ser um

caminho para proporcionar emoção e afinidade dentro

de um projeto digital?

Page 6: Design e Arte - Ampliando suas fontes de inspiração

22 :: entrevista - design e arte

Gazel :: O cubismo representa o atonal, um universo

no qual o simbolismo é completamente descartado,

cujas formas não remetem ao mundo e a seus símbolos,

mas sim à personalidade pura do geométrico. Alexander

Calder (http://tinyurl.com/fbqu9), com seus mobiles, foi

o artista que mais conseguiu se aproximar desse ideal

cubista, na minha opinião: suas esculturas remetem a um

mundo absolutamente próprio, que não dá margens a

interpretações baseadas nas questões do cotidiano.

O site internacional da Leo Burnett, apesar de gerar

uma ótima sensação de profundidade, não tem uma

influência cubista acentuada, já que, cognitivamente, ele

é permeado por símbolos e letras, para a compreensão do

conteúdo. Um site genuinamente cubista haveria de ser

muito abstrato, com o mínimo de textos e imagens reais.

Ainda que fosse em uma camada específica da interface,

separando a arte cubista do conteúdo publicitário.

Wd :: Considerando o contexto político-econômico

atual, permeado por guerras, intolerância religiosa

e injustiças sociais, é possível imaginar um resgate de

conceitos aplicados pelo movimento Dadaísta como

referência para projetos interativos?

Gazel :: Se analisarmos bem, todos os períodos da

história foram permeados por esse tipo de acontecimento.

Sempre houve muitas guerras, muita intolerância - e

para cada época, uma contestação própria. Os artistas

modernistas eram naturalmente “engajados”.

Mas, nos dias de hoje, na dita pós-modernidade, tudo

é fragmentado - inclusive a crítica social. Encontram-se

vários exemplos de movimentos de caráter contestador

intrínseco, que fazem a crítica dentro de cenários

específicos, quase nunca universais. O artista pode não

falar da guerra como fez Picasso ao pintar “Guernica” -

até porque o impacto de uma pintura como guernica, nos

dias de hoje, seria outro (afinal, muita água passou desde

então) - mas ele critica a seu modo, uma crítica que se

desuniversalizou desde a pop art, mas que se mantém viva

em movimentos como o “sticker art” ou o “street bombing”

- a arte urbana que envolve tantos artistas de diferentes

áreas, que pintam, grafitam pela cidade, em superfícies

autorizadas (ou não!), levantando questões urbanas ou

simplesmente rasgando o cinza das ruas com cores vivas,

intensas, volumes e tipografias sui-generis.

Na internet, se houvesse um “street bombing”, seria

Gazel :: Um cão, um cavalo, um boi são incapazes de

realizar gestos e ações que não sejam voltadas para a sua

própria existência física, sua preservação. Já o ser humano

é capaz de observar, gestualizar, modificar a natureza

pelo simples prazer estético, pela necessidade natural de

mimese, sem qualquer relação com a sobrevivência.

Quando a interface digital (homem-computador)

passa a desconsiderar ações e reações menos utilitárias,

aumentando o caráter prático em detrimento do

sensorial, não-prático, corremos o risco de nos

robotizarmos, perdendo a habilidade de questionar, de

trocar pontos-de-vista, de negar o utilitário e promover o

puramente estético/existencial. Por isso, sim, é louvável

buscarmos referências nos movimentos artísticos para

criarmos interfaces um pouco mais humanas, que tornem

o ato de interagir um processo cada vez mais semelhante

ao agir natural do homem.

Wd :: No livro “Vanguarda Européia e Modernismo

Brasileiro”, Gilberto Mendonça Teles explica

que a técnica da pintura cubista procurava

“apresentar a realidade através de estruturas

geométricas, desmontando os objetos

para que, remontados pelo espectador,

deixasse transparecer uma estrutura

superior, a forma plástica essencial e

verdadeira da beleza”. De que forma

esta técnica pode ser utilizada

pelo design na web? O site

internacional da Leo Burnett

(www. leobur net t . com)

pode ser apontado como

um exemplo?

Page 7: Design e Arte - Ampliando suas fontes de inspiração

entrevista - design e arte :: 23

algo como uma área completamente livre dentro das

interfaces (ou invadida!), que pudesse ser preenchida com

arte. E, de certa maneira, eles também escandalizam, ao

seu modo, como pretendiam os dadaístas. A diferença é

que o engajamento é desnecessário, o mais importante é

desenvolver a linguagem.

Quanto ao resgate do Dadaísmo em projetos

interativos, sim, é sempre uma ótima idéia! Afinal, Dadaísmo

é sempre bem-vindo em qualquer situação, justamente para

nos deslocar da linearidade dos ponteiros do relógio, do

logos, do racionalismo. Ele é um movimento absolutamente

atual, contestador em essência, e seus “jogos”, experiências

como o “cadáver delicioso” (http://tinyurl.com/mrbgf)

- espécie de colcha de retalhos de palavras, frases e

desenhos, ajudam-nos a reconstruir o pensar e o perceber.

Um “cadáver delicioso” é um ótimo ponto de partida para a

criação de um projeto interativo digital dadaísta.

Wd :: Acessando o site da agência Modernista!

(www.modernista.com), somos remetidos aos anos

20, período no qual o mundo assistiria ao ápice do

surrealismo (http://tinyurl.com/kurew), considerado

um dos últimos movimentos de arte moderna. Como a

aplicação do inconsciente pode ajudar no processo de

criação de uma interface digital?

Gazel :: Esse site da Modernista! é um bom exemplo

de como se comporta a arte nos dias de hoje, tanto no

meio internet, quanto em qualquer outro. É perfeitamente

possível voltar no tempo e fazer uma releitura dos valores

peculiares que formam o cerne de cada “manifesto” do

período moderno. A diferença é que, naquela época, havia

a nítida impressão de que o universalismo das propostas

poderia ser percebido e vivenciado como uma verdade, uma

razão, sem prever suas contradições, sua transformação em

outras verdades, tão efêmeras quanto o próprio homem.

No período da modernidade, havia uma visão

romantizada, de um mundo inteiro para ser conquistado

pela arte, ainda que por caminhos completamente

opostos, como os futuristas italianos, que traziam

o fascismo como uma grande virtude, um caminho;

e o cubismo, que desconsiderava qualquer valor do

mundo real, auto-suficiente em sua atonalidade. Eles

não poderiam existir sozinhos como verdade maior,

como comprovou o tempo, mas foram absolutamente

fundamentais, como todo movimento dentro da história.

E se descobriu, findando-se a modernidade, que nenhum

dos movimentos estava mais ou menos próximo de uma

“verdade” artística - justamente porque essa “verdade”,

ao ser encontrada, logo estaria superada.

Podemos, então, conhecendo as características, as

razões estéticas de cada movimento moderno, entender

suas circunstâncias, seus cenários - não simplesmente

reviver aquilo - mas criar uma relação entre uma questão

atual vista sob aquela ótica. Essa é a receita para se

beber da fonte moderna e criar algo novo. E é por isso

que não basta ter o conhecimento “dóxico”, superficial,

sensorial, sobre uma época (apesar disso ser fundamental),

entender sua picturalidade, suas formas, seu movimento,

sua disposição, seu equilíbrio. É preciso conhecer a história

da arte e ver que nenhum estilo surgiu ao acaso, mas sim

possuem origens claras - e desdobramentos que chegam

até os dias de hoje, conseqüentemente. A partir desse

estudo fica muito fácil associar um projeto conceitualizado

hoje a uma estética moderna, seja qual for o movimento:

cubismo, surrealismo, expressionismo etc.

No caso do surrealismo, é preciso mergulhar de cabeça

na psicanálise, e estar pronto para ir além da linguagem

comum, das percepções concretas, sensibilizando-se para

os reflexos do inconsciente como feedback emocional para

a interface - o que parece bem subjetivo, porém plenamente

possível com interesse e muito estudo.

Wd :: No livro “Iniciação à História da Arte”, da

Martins Fontes Editora, H.W.Janson e Anthony F.Janson

apontam que “ao contrário do Dadaísmo, a Pop Art não

é motivada pelo desespero ou animosidade contra a

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24 :: entrevista - design e arte

civilização atual; considera a cultura comercial sua matéria-

prima, uma fonte inesgotável de material pictórico, mais do

que um mal a ser combatido”. O uso da cultura de massa, tão

emanada pelos seguidores da Pop Art, é uma linha conceitual

que pode ajudar a aproximar os ambientes digitais de seu

público-alvo?

Gazel :: A Pop Art foi o último dos grandes movimentos

modernos, e sua contribuição mais importante para a história

da arte, ao meu ver, foi a mudança de percepção a respeito da

apropriação e transformação de “memes” coletivos, ícones de

massa, considerando uma “cultura pop”. A cultura pop, por

sua vez, surgiu graças aos métodos industriais de criação e

produção pictórica, a prevalescência da imagem de massa, em

detrimento do conteúdo (também de massa, no entanto, de

segunda ordem).

Os clássicos exemplos “lata de sopa campbells” e as

interferências na Marilyn Monroe e Mao Tse Tung demonstram isso

com perfeição. É o início da era do consumo de imagens, à maneira

industrial. Que vivemos até hoje, como num “pop” transgênico e

muito acelerado. Poderíamos incluir aqui o kitsch e o neopop, mas

seriam apenas categorizações para as transgenias diversas pelas

quais passa a Pop Art até hoje. Continuamos consumindo o pop,

construindo e desconstruindo sua forma e conteúdo de forma

compulsiva, caótica, de modo cada vez mais veloz. Os ícones pop

surgem e morrem quase no mesmo instante.

O que mais me atrai na Pop Art é sua possibilidade de

“cheating art”, ou seja, de fazer uma arte “trapaceando”, através

dos meios de massa - inclua-se nessa categoria o sampling e a

intervenção sobre todo tipo de imagem “lugar-comum”, desde

logotipos conhecidos por todo o mundo até personagens

(humanos ou não) pop extremamente regionalizados. A

identificação com os “memes” acaba por facilitar a transmissão

do que está agregado a ela - no caso, a arte. E é justamente nisso

que vejo a grande possibilidade de se trabalhar o pop dentro

dos ambientes digitais, aproveitar essa identificação quase

insuperável (felizmente, quase) para se fazer ouvir. Uma

espécie de comensalismo.

Wd :: Segundo a Wikipédia (http://tinyurl.

com/go7pj), o minimalismo representa uma

série de movimentos artísticos e culturais

ocorridos durante o século XX. Analisando

a parte conceitual do movimento (“jogo de

volumes e formas que esteja reduzido às suas

configurações não mais que essenciais as suas

Page 9: Design e Arte - Ampliando suas fontes de inspiração

entrevista - design e arte :: 25

funções”), é certo dizer que a criação e o desenvolvimento

de sites focados na usabilidade segue a mesma linha de

pensamento?

Gazel :: De certa maneira sim, o movimento pró-

usabilidade busca enxergar e remover qualquer tipo

de ruído dentro da interface, com objetivo de chegar a

um coeficiente mínimo ideal de uso. É uma ótima causa.

O problema é que, assim como o próprio movimento

Minimalista (e todos os demais movimentos modernos),

o movimento pró-usabilidade, na minha percepção,

acaba por acreditar (pela força da doutrina e do hábito)

que só existe a realidade do uso, desconsiderando

o contraditório - que seria, nesse caso, a corrente

experimentalista, e que, na publicidade, poderíamos

encontrar dividida em vários sub-movimentos, sendo o

mais importante deles o da “inversão de expectativa”

- modo menos traumático de apresentar estéticas

pouco usuais a um público heterogêneo, abrangente,

valendo-se de um gradiente entre o antiuso e o próprio

uso, deixando o espectador/consumidor transtornado

sensorialmente, abalado por alguns instantes, para,

no melhor estilo catártico, trazê-lo de volta ao mundo

cartesiano. Pronto, fez-se a mágica.

O mundo está girando numa velocidade espantosa,

enquanto escrevo esse texto. Nós também, nossa

mente, nossos gostos, nossos paradigmas estão prontos

para mudança, a cada instante. Acreditar numa linha

unidirecional, em relação ao ideal do design na web, é

pura ilusão. É preciso considerar o antiuso, os reflexos da

própria frustração e a transformação que ela gera. Existem

também sites que não têm qualquer relação com uma boa

usabilidade (no sentido atual a que esse termo remete),

mas que usam a estética minimalista de modo primoroso,

cada qual a seu modo.

Wd :: A Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais

revela que “a liberdade de experimentação, o retorno

às intenções expressivas e o resgate da subjetividade”

são algumas das principais linhas de pensamento do

Neoconcretismo (http://tinyurl.com/gtnad). Diante de

sua experiência na área, você acredita que os projetos

experimentais on-line ainda são um campo pouco

explorado? Quais conceitos do Neoconcretismo poderiam

ser aplicados no design na web?

Gazel :: Em se tratando de design na web comercial,

que precisa se ater a objetivos e regras já

muito bem estabelecidas pela publicidade

(ou pela gerência de TI), sim. É quando a

interface precisa ser o mais racional possível,

controlável, categorizada, sistemática. Isso

pode ser visto com mais intensidade nas

interfaces unicamente funcionais, que de tão

sistematizadas, acabam por virar “monstros”

de organização, desumanizando ao máximo a

linguagem entre o usuário e a interface.

A habilidade do designer em compreender

os princípios dos quais a interface pode - e

deve - se utilizar, sem se ater a regras gerais,

“doxas” incontestáveis, clichês pictóricos - que

normalmente nos levam a uma pasteurização das

interfaces - é que vai fazer a diferença na hora de

conceitualizar a proposta.

A partir do conceito certo, sem subestimar

e nem superestimar o público (e a própria

interface), encontraremos o caminho mais

interessante, mais adequado aos objetivos

(práticos e subjetivos) - pautando-se, dessa

forma, por diversos valores semióticos e também

por necessidades utilitárias, cada qual com sua

maneira de ser avaliada - ainda que o resultado

disso seja, esteticamente, um picturalismo

abstrato, uma subjetividade irritante (aos olhos do

ser cartesiano), contrária aos critérios universais de

avaliação atuais.

Se esse for o caminho encontrado, é preciso

encará-lo de forma corajosa. Isso porque nenhum

sistema de análise de interfaces que conheço

consegue sair da esfera racional, do empirismo

utilitário, até mesmo para lidar com os valores mais

sensoriais, menos racionais - quando tratam destes,

fazem-no de modo rasteiro.

Tenho em mente que devemos mudar nossa

opinião a cada instante, girar em torno da idéia

inicial pelo menos uma dezena de vezes antes de nos

definirmos pelo conceito final. Assim, por exemplo,

se optamos por usar a simplicidade da forma básica,

dos planos geométricos simples, podemos pesquisar o

cubismo ou o neoconcretismo. O importante é saber o

porquê da escolha.

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