Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto_1

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Universidade do Minho Escola de Engenharia Ana Catarina Fernandes Bentes Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto Dissertação de Mestrado Mestrado Integrado em Engenharia Biomédica Área de Especialização em Biomateriais, Reabilitação e Biomecânica Trabalho realizado sob a orientação do Professor Doutor José Manuel Ramos Gomes e coorientação do Professor Doutora Júlio Souza

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Universidade do Minho

Escola de Engenharia

Ana Catarina Fernandes Bentes

Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

Dissertação de Mestrado

Mestrado Integrado em Engenharia Biomédica

Área de Especialização em Biomateriais, Reabilitação e

Biomecânica

Trabalho realizado sob a orientação do

Professor Doutor José Manuel Ramos Gomes e coorientação do

Professor Doutora Júlio Souza

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Outubro 2014

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA DISSERTAÇÃO APENAS PARA EFEITOS

DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE

COMPROMETE;

Universidade do Minho, ___/___/______

Assinatura: ________________________________________________

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“A lei da mente é implacável. Aquilo que pensamos, criamos. Aquilo que sentimos,

atraímos. Aquilo em que acreditamos, torna-se realidade”

(Buddha)

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Agradecimentos

Em primeiro lugar quero agradecer ao meu orientador, o Professor Doutor José Manuel Ramos

Gomes, por todo o apoio, dedicação e conhecimento transmitido. Este trabalho não seria possível

sem a sua colaboração e sem os seus constantes incentivos.

Quero agradecer também ao Professor Doutor Júlio Souza que apesar de se encontrar longe,

compensou sempre essa distância e em nenhuma situação isso influenciou o desenvolvimento

do trabalho. Obrigado pela sua disponibilidade em efetuar a análise SEM, por todo o

conhecimento transmitido e por todo o seu apoio.

Ao Professor Doutor Filipe Samuel Silva, por ter proporcionado a oportunidade para desenvolver

este projeto e por ter ajudado o mesmo a vários níveis.

Um obrigado ao Sérgio Carvalho pelo excelente auxílio técnico e pelas constantes palavras de

apoio e incentivo. Foi um prazer trabalhar consigo.

À Kelly Reis, responsável pelo processamento das amostras, obrigado pela sua cooperação e

dedicação.

Obrigado também à Professora Doutora Ana Maria Pinto, pela sua disponibilidade e pelo auxílio

no manuseamento do microscópio ótico.

Um obrigado a todos os meus amigos, por me apoiarem nesta etapa, por serem pacientes e

ouvirem as minhas preocupações e desânimos, sempre dispostos a colocar um sorriso no meu

rosto. Um especial agradecimento à Marta Correia e à Joana Pires, por terem sido dois pilares

fundamentais durante os dois anos que estive em Braga, não seria fácil sem o vosso apoio.

Um obrigado também ao meu namorado, Ivo Café. Obrigado por seres a minha bussola quando

eu perdia o norte, pelo suporte e apoio incondicional ao longo de todo o percurso universitário.

Obrigado por fazeres parte da minha vida.

Obrigado aos meus avós, Armando e Elisa Fernandes, por todo o apoio, compreensão e por todos

os mimos que nunca faltaram.

Agradeço também às minhas irmãs, Rita e Inês Bentes. Não seria a pessoa que sou hoje se não

vos tivesse na minha vida. Sei que são e serão as pessoas com quem poderei sempre contar.

Por fim, quero agradecer especialmente aos meus pais, José e Rosário Bentes. Tudo isto não

seria possível sem a vossa ajuda e sacrifícios. Sempre dedicados a dar-me a melhor educação

possível, não poderia deixar de vos dedicar inteiramente esta vitória. Um muito obrigado pelos

pais especiais que são.

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Resumo

O desenvolvimento de resinas compostas como materiais de restauro dentário direto

surgiu através da necessidade de materiais com características óticas semelhantes à estrutura

dentária natural. Contudo, o desgaste destas resinas persiste como um dos principais problemas

clínicos. Através de vários estudos, verificou-se que a resistência ao desgaste destes materiais

depende fundamentalmente de aspetos relacionados com as partículas de carga, nomeadamente

do seu tamanho e distribuição, assim como a sua percentagem volumétrica.

O principal objetivo do presente trabalho consistiu na caracterização tribológica de resinas

compostas de restauro dentário através da avaliação da sua resistência ao desgaste abrasivo e

de deslizamento e pela identificação dos mecanismos de desgaste dominantes. Testes de

compressão permitiram determinar a resistência à compressão das resinas compostas assim

como o seu módulo de elasticidade. Foram efetuados testes de ball cratering utilizando uma

emulsão à base de pasta dentífrica Colgate®Anti-tártaro mais branqueamento como abrasivo,

com uma carga normal aplicada de 3 N e uma duração de 300 rotações. O estudo de

caracterização tribológica foi complementado com testes de deslizamento linear alternativo na

geometria esfera-placa em presença de saliva artificial à temperatura de 37 °. O deslizamento

ocorreu contra alumina, com frequência de 1 Hz e carga normal de 25 N.

Foi avaliado o volume de desgaste dos diferentes grupos de resinas compostas em

estudo o qual foi relacionado com as suas propriedades mecânicas e a composição em termos

de tamanho e percentagem volumétrica das partículas de carga. Como principal conclusão

destaca-se a confirmação do papel determinante das partículas de carga no comportamento

tribológico das resinas compostas, seja em consequência da ação abrasiva de uma pasta

dentífrica, seja como resultado do deslizamento contra uma superfície cerâmica.

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Abstract

The development of composite resins as dental restoration materials came through the

need for materials that were similar to natural tooth structure. However, wear of these resins still

remains as a major clinical problem. Through various studies conducted, it was found that the

wear resistance of these materials mainly depends on aspects related with the filler particles, in

particular their size and distribution as well as its volume percentage.

The main objective of this work was the tribological characterization of composite resins

for direct dental restoration by the evaluation of their resistance to abrasive and sliding wear as

well as by the identification of the dominant wear mechanisms. Compression tests have allowed

determine the compressive strength of the composites as well as their modulus of elasticity. Micro-

abrasion tests using slurry based on Colgate®Anti-tartar toothpaste whitening as abrasive, with a

normal applied load of 3 N and lasting 300 revolutions were made. The tribological

characterization was complemented by reciprocating sliding wear tests in a ball-on-plate geometry

in presence of artificial saliva at 37° C. Alumina was used as counterface and these tests were

carried out at constant frequency of 1 Hz and normal applied load of 25 N.

The wear volume was evaluated for the different groups of composite resins and correlated

with their mechanical properties and composition in terms of size and volume percentage of filler

particles. The determinant role of filler particles on the tribological behavior of composite resins

was confirmed both as a consequence of the abrasive action of a toothpaste or due to the sliding

against a ceramic surface.

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Índice geral

Agradecimentos ......................................................................................................................... v

Resumo .................................................................................................................................... vi

Abstract ................................................................................................................................... vii

Índice geral .............................................................................................................................. viii

Índice de Figuras ....................................................................................................................... x

Índice de Tabelas ..................................................................................................................... xii

Lista de símbolos ..................................................................................................................... xiii

Lista de abreviaturas ................................................................................................................ xiv

1. Introdução ...................................................................................................................... 15

2. Anatomia Dentária e Dentífricos ...................................................................................... 17

2.1 – Estrutura e anatomia do dente ................................................................................... 17

2.2 – Dentífricos ................................................................................................................. 22

3. Resinas Compostas ............................................................................................................ 25

3.1 – Estado da arte ........................................................................................................... 25

3.2 - Composição das resinas compostas ........................................................................... 27

3.3 – Propriedades das resinas compostas ......................................................................... 30

3.4 – Aplicações clínicas .................................................................................................... 31

4. Biotribologia Dentária .......................................................................................................... 33

4.1 – Tribologia .................................................................................................................. 33

4.2 – Comportamento tribológico da dentição natural ......................................................... 34

4.3 – Comportamento tribológico de materiais dentários artificiais ...................................... 35

5. Materiais e métodos ........................................................................................................... 37

5.1 – Preparação das amostras .......................................................................................... 37

5.2 – Testes de compressão ............................................................................................... 38

5.3 – Testes de micro-abrasão ............................................................................................ 38

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5.4 – Testes de deslizamento linear alternativo ................................................................... 40

5.5 – Microscopia Ótica ...................................................................................................... 44

5.6 – Microscopia Eletrónica de Varrimento (SEM) .............................................................. 46

6. Resultados e Discussão ...................................................................................................... 47

6.1 – Testes de compressão ............................................................................................... 47

6.2 – Testes de micro-abrasão ............................................................................................ 51

6.3 – Testes de Deslizamento Linear Alternativo ................................................................. 52

6.4 – Microscopia eletrónica de varrimento (SEM) ............................................................... 53

7. Conclusões ......................................................................................................................... 61

8. Bibliografia ......................................................................................................................... 63

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x

Índice de Figuras

Figura 1- Representação da dentição primária e permanente ................................................... 17

Figura 2 - – (A) Várias estruturas dentárias existentes na cavidade oral ; (B) Esquema da estrutura

do dente ................................................................................................................................. 18

Figura 3 - Estrutura do esmalte ............................................................................................... 19

Figura 4 - (A) Estrutura da dentina; (B) Estrutura da junção dentina-esmalte ............................ 20

Figura 5- Imagem de SEM do cemento; FS – Fibras de Sharpey .............................................. 21

Figura 6 - Amálgama utilizada numa restauração dentária ....................................................... 25

Figura 7- Evolução dos compósitos dentários. ......................................................................... 27

Figura 8- Estrutura do monómero Bis-GMA .............................................................................. 28

Figura 9 - Classificação das resinas compostas de acordo com as partículas utilizadas ............ 29

Figura 10 - Contração de polimerização que ocorre nas resinas compostas ............................. 30

Figura 11 - Restaurações diretas utilizando resinas compostas ................................................ 32

Figura 12- Fenómenos tribológicos em ambiente oral classificados de acordo com a literatura

dentária: A- abrasão, B- Atrito e erosão.................................................................................... 33

Figura 13- Abrasão em tecidos dentários naturais. A seta indica a exposição da dentina. ......... 34

Figura 14 - (A) Equipamento de micro-abrasão (Plint TE 66); (B) Representação esquemática dos

testes de micro-abrasão .......................................................................................................... 39

Figura 15 – Amostra preparada para colocação no equipamento ............................................. 39

Figura 16 - Representação esquemática dos testes de micro-abrasão ...................................... 40

Figura 17 – (A) Tribómetro CETR UMT-2 utilizado para os testes de deslizamento linear alternativo;

(B) Representação esquemática do tribómetro ........................................................................ 41

Figura 18 - Pormenor evidenciando o porta-esferas e a placa em resina compósita .................. 42

Figura 19 - Representação esquemática da formação da pista de desgaste .............................. 42

Figura 20 - Cálculo da profundidade da pista de desgaste ....................................................... 43

Figura 21 - Secção intermédia da pista de abrasão .................................................................. 43

Figura 22 - Microscopia ótica das amostras submetidas aos ensaios de deslizamento linear

alternativo .............................................................................................................................. 44

Figura 23 - Cálculo da área da base da secção intermédia da pista de abrasão ........................ 44

Figura 24 - Microscópio Ótico .................................................................................................. 45

Figura 25- Imagens de microscopia ótica de amostras submetidas a: A,B – testes de micro-

abrasão; C,D - testes de deslizamento linear alternativo ........................................................... 46

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xi

Figura 26 - Gráficos carga (N) versus extensão (mm) obtidos após ensaio de compressão. A-

Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®. ............................................. 48

Figura 27- Resistência à compressão dos quatro grupos de resinas compostas em estudo. A-

Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®. ............................................. 49

Figura 28 - Valores para o módulo de elasticidade de cada grupo de resinas compostas. A-

Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®. ............................................. 49

Figura 29 – Volume de desgaste das crateras de desgaste resultantes dos testes de deslizamento

linear alternativo. A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®. ............... 51

Figura 30 - Volume de desgaste das pistas resultantes dos testes de deslizamento linear

alternativo. A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®. ........................ 52

Figura 31 -Imagens SEM dos quatro grupos de resinas compostas em estudo: A-Grandio®So, B-

Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®. ...................................................................... 54

Figura 32 - Imagem SEM da cratera de desgaste da resina composta D - Natural elegance® após

teste de micro-abrasão. A seta indica a presença de fissuras. .................................................. 55

Figura 33 - Imagem SEM das crateras de desgaste de resinas compostas após teste de micro-

abrasão: A-Grandio®So, B- Ceram-X™. ................................................................................... 56

Figura 34- Imagens SEM dos quatro grupos de resinas compostas após testes de deslizamento

linear alternativo: A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®. ............... 59

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xii

Índice de Tabelas

Tabela 1- Composição dos dentífricos e função de cada componente ...................................... 23

Tabela 2- Valores de RDA e respetiva abrasividade .................................................................. 24

Tabela 3- Monómeros utilizados para fabrico de resinas compósitas ........................................ 28

Tabela 4 - Composição das resinas compósitas ....................................................................... 37

Tabela 5 - Saliva artificial de Fusayama ................................................................................... 41

Tabela 6 - Propriedades mecânicas do esmalte e dentina. ....................................................... 50

Tabela 7 - Valores médios do coeficiente de atrito em regime estacionário das resinas compostas

durante o teste de deslizamento linear alternativo contra alumina na presença de saliva

artificial .................................................................................................................................. 53

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Lista de símbolos

Mm - milimetro

µm – micrómetro

nm - nanómetro

mPa.s – milipascal segundo

GPa – gigapascal

mV/cm2 – milivolt por centímetro quadrado

s – segundo

N – Newton

kN – kilonewton

mm/min – milímetro por minuto

F – carga máxima suportada pelo material

r – raio da secção transversal dos provetes

π – pi

E – módulo de elasticidade

𝛿 – tensão de cedência

휀 – deformação

rpm – rotações por minuto

b – diâmetro externo da cratera de desgaste

R – raio da esfera de aço

°C – graus centígrados

Hz – Hertz

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xiv

Lista de abreviaturas

SEM – Microscopia Ótica de Varrimento

FS – Fibras de Sharpey

A.C – Antes de Cristo

ADA - American Dental Association

RDA - Relative Dentin Abrasion

Bis-GMA - Bisfenol Glicidil Metacrilato

TEGDMA – Trietileno Glicol Dimetacrilato

UDMA – Uretano Dimetacrilato

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1. Introdução

A dentição humana tem um papel importante na rotina diária, não só pela função

mastigatória como também está associado com a fala e a estética facial. Com o envelhecimento,

fatores patológicos e traumas, lesões como cáries e perda total ou parcial de tecido são

dependentes de hábitos, condições gerais de saúde, dieta e higiene do indivíduo.

Consequentemente, materiais dentários sintéticos têm sido desenvolvidos e utilizados para

restauro e tratamento de lesões da dentição humana. A procura de um material com

características óticas semelhantes à estrutura dentária culminou no desenvolvimento das resinas

compostas. Este material tem vindo a substituir o amálgama de prata, uma vez que este acarreta

algumas desvantagens como o facto polémico de ser composta por mercúrio que é altamente

tóxico, a sua cor escura e comportamento mecânico bastante diferente das estruturas dentárias

[1].

As resinas compostas têm tido uma grande evolução nos últimos anos a partir de

desenvolvimentos tecnológicos na sua composição química resultando em melhor estética e

maior resistência mecânica, principalmente ao desgaste. Entretanto, o processo de abrasão

resultante da mastigação e escovagem ainda é um problema clínico inevitável para este tipo de

materiais para restauros levando a falhas e substituições prematuras do restauro [2,3].

Considerando o processo de escovagem, as pastas dentífricas podem acelerar o processo

de abrasão dependendo das propriedades das partículas abrasivas presentes na sua composição.

Torna-se importante que as pastas dentífricas sejam aprimoradas consoante as propriedades do

esmalte e resinas compostas mantendo o objetivo de remover os resíduos, pigmentos e biofilme

oral [4].

Este trabalho tem como principal objetivo o estudo do desgaste e resistência mecânica

em resinas compostas de restauro dentário. Para isso, foram efetuados três tipos testes

mecânicos: testes de compressão, testes de micro-abrasão e testes de deslizamento linear

alternativo. O estudo do desgaste em resinas compostas torna-se importante uma vez que estas

têm vindo a substituir outros materiais existentes e são cada vez mais utilizadas na prática clínica.

Compreender o processo de desgaste destes materiais, simulando práticas diárias de higiene

dentária, ajuda ao desenvolvimento de melhores materiais de restauro dentário.

A presente dissertação encontra-se estruturada em 7 capítulos. O primeiro capítulo

envolve uma introdução e contextualização do problema relacionado ao desgaste das resinas

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compostas. São também descritos os objetivos do projeto assim como motivação que levou ao

seu desenvolvimento.

Os capítulos 2, 3 e 4 são capítulos dedicados à revisão bibliográfica. O capítulo 2 consiste

na revisão bibliográfica relativa à anatomia dentária e dentífricos. Com efeito, torna-se importante

abordar o conhecimento relativo às estruturas dentárias e tecidos naturais de forma a

compreender o comportamento dos materiais dentários artificiais no ambiente oral quando

colocados nestas estruturas, assim como a formulação dos dentífricos. O capítulo 3 é referente

às resinas compostas e nele se descreve o estado da arte, a composição, as propriedades e

aplicações clínicas das resinas compostas. O capítulo 4 é dedicado à biotribologia dentária, onde

se descreve o comportamento tribológico da dentição natural assim como as propriedades

tribológica dos materiais artificiais para restauros dentários diretos.

O capítulo 5 consiste nos materiais e métodos. Neste capítulo são descritos os materiais

utilizados, nomeadamente o processamento de diferentes grupos de resinas compostas e

equipamentos utilizados nos testes de desgaste, assim como os métodos utilizados no tratamento

dos resultados obtidos através dos vários testes mecânicos efetuados.

O capítulo 6 é dedicado à análise e discussão dos resultados. Neste capítulo procura-se

compreender o comportamento de desgaste e resistência mecânica dos grupos de resinas

compostas em estudo.

Por fim, no último capítulo, são referidas as conclusões a retirar após a análise dos

resultados obtidos assim como a apresentação de sugestões para futuros desenvolvimentos.

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17

2. Anatomia Dentária e Dentífricos

2.1 – Estrutura e anatomia do dente

A dentição humana é importante para o bom desempenho de funções mastigatórias,

articulação, fonação e oclusão. Para além destas funções, a dentição tem um papel fundamental

no desenvolvimento dos maxilares e músculos da face [5]. De forma cronológica, dois conjuntos

de dentição humana são apresentados ao longo da vida. O primeiro conjunto, denominado

primário ou decíduo, começa a desenvolver-se na décima quarta semana de gestação e torna-se

completo aos 3 anos de idade. A fase de transição entre o conjunto primário e o segundo conjunto,

o permanente, dá-se por volta dos seis anos até aos doze anos de idade. A partir desta idade

inicia-se a formação da dentição permanente completa, sendo no total 32 dentes (Figura 1) [6].

Figura 1- Representação da dentição primária e permanente [6]

Existem quatro estruturas dentárias distintas: os incisivos (1,2), caninos (3,4), pré-

molares (5,6) e molares (7,8) (Figura 2A). Cada dente possui uma porção acima da gengiva,

denominada de coroa e uma ou mais porções abaixo da gengiva, as raízes, que unem os dentes

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18

ao osso alveolar. A coroa é revestida por um tecido mineralizado extremamente duro, o esmalte,

e as raízes por outro tecido mineralizado denominado cemento. Na parte interna do dente, abaixo

do esmalte encontra-se a dentina que compõe a maior parte da estrutura dentária. A dentina

delimita uma região denominada cavidade pulpar que é preenchido por tecido altamente

vascularizado e inervado, a polpa dental (Figura 2B) [6].

Figura 2 - – (A) Várias estruturas dentárias existentes na cavidade oral [e2]; (B) Esquema da estrutura do dente [6]

O esmalte dentário é a estrutura mais mineralizada do organismo sendo formada,

considerando a odontogénese, por uma matriz extracelular única que resulta da síntese e

secreção de proteínas pelas células epiteliais do esmalte. A formação deste tecido é efetuada em

de duas fases: a fase secretória que envolve a formação de proteínas e da matriz orgânica

formando o esmalte parcialmente mineralizado e a fase de maturação onde se completa a

mineralização do tecido. As células responsáveis pela formação do esmalte são denominadas

ameloblastos e são caracterizadas por possuírem uma extensão conhecida como processo de

Tomes que contém numerosos grânulos de secreção contendo as proteínas que constituem a

matriz do esmalte. Após a síntese do esmalte, os ameloblastos formam um epitélio protetor que

recobre a coroa até a erupção do dente, importante na prevenção de vários defeitos do esmalte.

A unidade básica do esmalte são os prismas que estão unidos entre si pelo esmalte

interprismático. Tanto os prismas como o esmalte são formados por cristais de hidroxiapatita

diferindo apenas na orientação dos cristais. Cada prisma estende-se ao longo do esmalte sendo

que o agrupamento dos prismas é importante para as propriedades mecânicas do esmalte. Este

tecido tem uma forma complexa resultando numa estrutura capaz de resistir mecanicamente a

cargas mecânicas essenciais assim como fenómenos abrasivos ao longo de toda a vida do

indivíduo [7, 8]. O esmalte difere de outros tecidos mineralizados do organismo (como a

cartilagem óssea e a dentina) uma vez que não apresenta colagénio na sua composição, é de

A B

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origem epitelial e não sofre reabsorção nem regeneração. É constituído por cerca de 92-96% de

matéria inorgânica (essencialmente hidroxiapatita), 1-2% de matéria orgânica e 3-4% de água. A

elevada dureza do esmalte é consequência da elevada percentagem de matéria inorgânica sendo

o tecido mais duro do organismo [9, 10]. Na Figura 3 é possível observar uma imagem resultante

da análise SEM da estrutura do esmalte. As setas indicam a presença de prismas neste tecido.

Figura 3 - Estrutura do esmalte [9]

A dentina é um compósito biológico complexo em termos fisiológicos e anatómicos. É

composta por tecido conjuntivo mineralizado e especializado. Entre a dentina e o esmalte existe

uma zona de transição que apresenta um gradiente de propriedades compensando a fragilidade

do esmalte. O processo de formação da dentina, a dentinogenese, é efetuada em duas etapas. A

primeira etapa consiste na formação da pré-dentina onde ocorre a deposição da matriz orgânica

e das substâncias inorgânicas sendo finalizada pela formação da dentina radicular. A matriz

orgânica é segregada por odontoblastos, células localizadas na periferia da polpa junto à dentina.

Estas células possuem uma extensão ramificada que penetra na dentina denominada de

prolongamento ondontoblástico. Estes prolongamentos tornam-se mais longos à medida que a

dentina se torna mais espessa ocupando canais estreitos existentes na estrutura dentária, os

túbulos dentários. A sua espessura é maior quanto mais próxima do corpo do odontoblasto. A

segunda etapa da dentinogenese é a mineralização que consiste na deposição de cristais de

hidroxiapatita na superfície das fibras de colagénio. Esta etapa ocorre na junção dentina/pré-

dentina formando uma nova camada denominada dentina primária. Após a formação da dentina

primária os cristais de hidroxiapatita são depositados no interior das fibras de colagénio [7, 8]. Ao

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contrário do tecido ósseo, a dentina não é vascularizada e é constituída por 70% de matéria

inorgânica (cristais de hidroxiapatita), 18% pela matriz orgânica (fibras de colagénio) e 12% de

água (% wt). Na Figura 4A é possível observar uma imagem obtida por microscopia eletrónica de

varrimento da estrutura da dentina. As setas indicam as áreas onde a dentina intertubular e

peritubular se encontram enquanto os símbolos (*) indicam apenas a dentina intertubular.

As propriedades mecânicas e estrutura da dentina variam de acordo com a localização. É

um tecido com dureza superior ao osso e inferior ao esmalte sendo por isso mais radiolúcido. Os

prolongamentos odontoblásticos são responsáveis pela percepção de alterações de temperatura,

pH, pressão e cargas o que resulta em sensibilidade dolorosa. A dentina é sensível a diversos

estímulos como temperatura, trauma e pH ácido, sendo todos estes estímulos percetíveis como

dor [9, 11]. A junção dentina-esmalte tem elevada importância na medida em que inibe a

propagação de fissuras dissipando as tensões a que os dentes poderão estar sujeitos. Esta junção

apresenta elevada resistência à fratura sendo que na camada mais interior do dente a dentina

tem maior elasticidade suportando melhor a integridade do esmalte e prevenindo a fratura deste

[9]. Na Figura 4B é possível observar a estrutura desta junção onde “D” representa a dentina,

“E” o esmalte e as setas indicam a presença dos prismas do esmalte.

Figura 4 - (A) Estrutura da dentina; (B) Estrutura da junção dentina-esmalte [9]

A polpa dentária é um tecido conjuntivo mole, ricamente vascularizado e inervado. Contem

na sua composição várias células como odontoblastos, fibroblastos e uma matriz que contem

fibras de colagénio assim como vários glicosaminoglicanos [7, 8]. Este tecido é formado a partir

das células mesenquimais e tem várias funções: formação, nutrição, sensorial e defensiva. A

função mais importante da polpa é a formação da dentina durante o período de desenvolvimento

e o seu complexo sistema sensorial controla o fluxo sanguíneo e é responsável pelo alívio da

sensação de dor [6, 12].

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O periodonto é uma estrutura dinâmica composta por tecidos que apoiam e envolvem o

dente. É constituído pela gengiva, ligamento periodontal, cemento e osso alveolar. A estrutura e

função dos tecidos do periodonto são mutuamente dependentes [12].

O cemento é um tecido duro complexo responsável pela junção da raiz do dente e do osso

alveolar através de um ligamento periodontal. Este tecido cobre a superfície da raiz do dente e

não contem vasos sanguíneos nem linfáticos, não possui inervação e não regenera. É

caracterizado por uma contínua deposição ao longo da vida. Tem como principal função a

contribuição para o processo de reparação após dano na superfície radicular. Pode ser

classificado de duas formas: cemento acelular que se forma durante a formação da raiz e na

erupção do dente e o cemento celular que se forma em resposta às solicitações funcionais sobre

o cemento acelular. As células do cemento celular são incorporadas ao cementoide que se

mineraliza para formar cemento. Os cementócitos comunicam entre si através de processos

citoplasmáticos. A presença de cementócitos permite o transporte de nutrientes para o cemento

e contribuem para a manutenção da vitalidade deste tecido. As fibras inseridas no cemento da

raiz e do osso alveolar são denominadas de fibras de Sharpey (FS) (Figura 5) e consistem em

fibras de colagénio que penetram no tecido ósseo e prendem o dente ao osso. É constituído por

65% de matéria inorgânica (hidroxiapatita), 23% de matéria orgânica (essencialmente fibras de

colagénio do tipo I) e 12% de água [7, 8].

Figura 5- Imagem de SEM do cemento; FS – Fibras de Sharpey [9]

O ligamento periodontal é o sistema que liga o dente ao osso alveolar. É formado

essencialmente por fibras de Sharpey, vasos sanguíneos e linfáticos assim como terminações

nervosas que circundam a raiz do dente unindo-a ao osso alveolar. É também constituída por

diversas células como fibroblastos, cementoblastos, osteoblastos, macrófagos e células

endoteliais. Tem várias funções como a formação, nutrição, física e sensorial. As fibras do

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

22

ligamento são organizadas para suportar pressões exercidas durante a mastigação e

consequentemente evita a transmissão direta da pressão para o osso que poderia ocasionar uma

reabsorção óssea localizada [7, 8].

O osso alveolar é um tecido conjuntivo mineralizado que está em contato direto com o

ligamento periodontal. É um osso imaturo no qual as fibras de colagénio não estão organizadas

no padrão típico do osso adulto. Estas fibras de colagénio estão dispostas em feixes que penetram

neste tecido e no cemento, formando uma espécie de ponte entre estas duas estruturas. Os vasos

sanguíneos atravessam o osso alveolar e penetram no ligamento periodontal ao longo da raiz.

Este tecido é constituído por 33% de matriz orgânica e 67% de matéria inorgânica (hidroxiapatita).

Além de ser responsável por manter a estrutura dentária, o osso alveolar tem a função de

proteção, locomoção e reservatório [7, 8].

2.2 – Dentífricos

Os dentífricos são utilizados como veículo de flúor e agentes químicos de forma a controlar

o acúmulo de biofilme oral e consequentemente prevenir o desenvolvimento de cáries e doenças

periodontais. Têm como função a limpeza e polimento das superfícies do dente utilizando uma

escova para esse fim [13].

Os dentífricos têm sido utilizados desde a antiguidade e são atualmente um elemento

indispensável dos cuidados de saúde dentária. O desenvolvimento dos dentífricos teve início na

China e Índia em 300 – 500 A.C e os abrasivos utilizados eram bastante simples tais como osso

e cascas de ovo esmagadas. Os dentífricos modernos foram desenvolvidos em 1800 e a sua

formulação continha sabão e giz. No entanto, após a segunda guerra mundial, devido aos avanços

na síntese de diferentes detergentes o sabão foi substituído por sulfato de sódio. Recentemente

existem formulações que libertam agentes ativos e previnem e/ou tratam doenças periodontais.

O primeiro agente ativo utilizado foi o fluoreto em 1914 mas a ADA (American Dental Association)

só consentiu a sua utilização em 1960. Para além do fluoreto, responsável por reduzir cáries

dentárias existem outros agentes terapêuticos como o nitrato de potássio para tratar a

hipersensibilidade dentária e o triclosan para reduzir inflamação da gengiva [14,15].

Atualmente os dentífricos são produzidos de forma a servirem vários propósitos em

simultâneo e possuem uma composição química complexa. São também utilizados como veículos

para agentes anti-microbianos que previnem doenças periodontais [14,15].

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

23

Os dentífricos são compostos por uma variedade de componentes que permitem que

estes desempenhem a sua função sem causar problemas nomeadamente o desgaste do esmalte

(Tabela 1) [13].

Tabela 1- Composição dos dentífricos e função de cada componente [13]

Componente Função

Humectante Melhora consistência e facilita dispersão na

saliva

Água Solvente

Espessante Evita separação de elementos sólidos e

líquidos

Detergente Facilita limpeza mecânica

Flavorizante Sabor

Conservantes Evita contaminação microbiana

Agentes preventivos e terapêuticos Prevenção de doenças periodontais.

Os abrasivos também estão presentes na composição dos dentífricos com o objetivo de

garantir a limpeza e polimento dos dentes sendo que os mais utilizados são a sílica, o carbonato

de cálcio e o bicarbonato de cálcio. No entanto estes abrasivos têm sido relacionados com o

desgaste dental. As manchas nos dentes estão associados à pigmentação da pelicula adquirida,

a qual se forma na superfície do dente provocada pela acumulação de proteínas salivares.

Enquanto a placa bacteriana pode ser removida utilizando apenas uma escova, para a remoção

da pelicula adquirida é necessário um abrasivo.

É necessário estabelecer um limite de abrasividade considerando a dureza das estruturas

dentárias. Este limite de abrasividade é denominado de RDA (relative dentin abrasion) [13, 16].

O RDA consiste num método in vitro que permite determinar a capacidade do dentífrico em

remover a dentina. O valor depende do tamanho, quantidade e estrutura de superfície do abrasivo

utilizado [17]. O conhecimento do RDA do dentífrico é importante uma vez que a abrasividade do

produto deve ser determinada de forma a assegurar que durante a sua utilização os tecidos não

sejam comprometidos. No entanto, o significado clinico do RDA ainda não está completamente

avaliado [18]. Na Tabela 2 é possível observar os valores de RDA e respetiva abrasividade.

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24

Tabela 2- Valores de RDA e respetiva abrasividade [18]

RDA Abrasividade

0 – 70 Baixa

70 – 100 Média

100 – 150 Elevada

150 – 250 Limite máximo permitido

Existem vários tipos de dentífricos disponíveis no mercado entre os quais: anticárie e

antiplaca, anti-tártaro, anti-sensibilidade por fim os clareadores dentais que utilizam peróxidos

associados a agentes abrasivos e removem pigmentos extrínsecos do esmalte [13, 16].

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25

3. Resinas Compostas

3.1 – Estado da arte

Previamente ao desenvolvimento das resinas compostas, o amálgama de prata era o material

d primeira escolha para proceder a restauros diretos (Figura 6). Este material consiste

essencialmente em partículas de Ag-Sn-Cu combinado com mercúrio. A reação de cristalização

entre o mercúrio e a liga resulta na formação de um material de restauro mas no entanto

apresenta uma cor escura o que afeta o resultado da restauração. O amálgama de prata tem sido

utilizada com sucesso durante vários anos. Porém, por diversas razões, incluindo o

desenvolvimento de resinas compostas e o facto do nível de bocompatibilidade ser dúbio e

frequentemente questionável, a sua utilização clínica tem vindo a diminuir [19].

Figura 6 - Amálgama utilizado para restauração dentária [19]

As primeiras resinas desenvolvidas, destinadas a restauros dentários diretos, foram as resinas

acrílicas quimicamente ativas. Eram resultado da combinação de metilmetacrilatos e polímeros.

No entanto a alta contração de polimerização associada a baixa estabilidade de cor prejudicaram

o seu desempenho a curto e médio prazo. Na tentativa de reduzir a elevada contração de

polimerização foram inseridas partículas inorgânicas de carga que geram uma redução relativa

do volume ocupado pelo monómero. O insucesso clínico das resinas acrílicas foi determinado

pela falta de união química entre as partículas de carga e o polímero após polimerização o que

gerava fissuras entre a matriz polimérica e as partículas inorgânicas resultando num material com

baixa resistência ao desgaste e pouca estabilidade de cor [20, 21].

Na década de 50, foram desenvolvidas as resinas epóxicas. Estas resinas têm algumas

vantagens tais como baixa contração de polimerização, baixa solubilidade do polímero e alta

resistência mecânica. No entanto, os longos períodos de polimerização tornaram-se uma

desvantagem para a utilização destas resinas [20, 21].

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26

Com o intuito de unir as características desejáveis das resinas acrílicas com as resinas

epóxicas foi desenvolvido um novo monómero denominado de bisfenol glicidil metacrilato (Bis-

GMA). Este monómero tem alto peso molecular e significante menor contração de polimerização.

O Bis-GMA contém a espinha dorsal das resinas epóxicas com terminações de grupos

metacrilatos. A união deste monómero com cargas inorgânicas deu origem às resinas compostas.

Uma vez que este monómero tem viscosidade elevada, é habitualmente misturado com outros

dimetacrilatos tais como TEGDMA ou UDMA. [20, 21]

Desde o aparecimento das resinas compostas, têm sido desenvolvidas mudanças que

envolvem as partículas de carga, as quais têm sido reduzidas em tamanho, para produzir

materiais que demonstram maior resistência ao desgaste. As propriedades dos restauros

utilizando resinas são consideravelmente influenciadas pelas partículas de carga utilizadas e as

resinas compostas são distinguidas pelas características destas partículas e em particular pelo

seu tamanho. De facto, as partículas de carga em compósitos dentários influencia diretamente a

radiopacidade, resistência ao desgaste, módulo de flexão e coeficiente de expansão térmica. A

contração de polimerização correlaciona-se com a quantidade volumétrica das partículas de carga

no compósito pois afeta na proporção de matriz polimérica susceptivel à contracção [22, 23].

As primeiras resinas compostas, desenvolvidas no fim da década de 70, continham partículas

de carga em escala macrométrica alcançando um tamanho médio até 50 µm. os materiais que

continham estas partículas eram bastante mais resistentes mas muito difíceis de polir e

consequentemente obter uma superfície com baixa rugosidade. Atualmente as partículas

inorgânicas apresentam um tamanho médio entre 0,2 e 5 µm [22, 23].

No início da década de 80, foram desenvolvidas partículas de carga esféricas com tamanho

micrométrico. No entanto estas partículas alcançavam um tamanho médio de 40nm. As

partículas de carga de tamanho micrométrico teriam sido denominadas partículas de carga

nanométricas mas devido à falta de conhecimento da escala nano na altura tal não foi possível.

Estes compósitos permitiam excelente polimento mas apresentavam baixa resistência mecânica

devido à baixa quantidade de partículas de carga [22, 23].

No fim da década de 80 foram desenvolvidos compósitos com partículas inorgânicas com

tamanho aproximado de 1 µm juntamente com uma porção de sílica coloidal com tamanho médio

de 40nm. Estes compósitos foram denominados de resinas compostas híbridas.

Desenvolvimentos no tamanho das partículas resultaram em compósitos com tamanho de

partículas entre 0,4 e 1 µm, denominadas resinas compostas micro híbridas. Estes materiais

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27

Figura 7- Evolução dos compósitos dentários [22].

foram considerados universais uma vez que podem ser utilizados para aplicações de restauro

anteriores e posteriores baseados na sua combinação de resistência mecânica e baixa rugosidade

promovendo adequado efeito estético. O desenvolvimento mais recente são os compósitos com

partículas de carga de tamanho nanométrico. Muitos fabricantes têm modificado as formulações

das resinas compostas micro-híbridos para incluírem maior quantidade de nano partículas sendo

denominados de nano-híbridos. Em geral, torna-se difícil distinguir entre os nano-híbridos e os

micro-híbridos uma vez que as propriedades mecânicas de ambos tendem a ser semelhantes

[22, 23]. Na Figura 7 é possível observar a evolução dos compósitos dentários.

3.2 - Composição das resinas compostas

Na maioria das resinas compostas existentes o monómero utilizado é o Bis-GMA (Figura

8). Este monómero possui baixo peso molecular, elevada viscosidade (1 000 000 mPa.s) e baixa

flexibilidade. Estas duas últimas características conferem um baixo grau de conversão a

temperatura ambiente. Devido à alta viscosidade do BISGMA dois outros monómeros de baixo

peso molecular, TEGDMA e EGDMA, são adicionados de forma a diminuir a viscosidade da matriz

polimérica facilitando a sua manipulação. Além da diminuição da viscosidade esta mistura de

monómeros permite uma maior incorporação de partículas de carga e um maior grau de

conversão dos monómeros em polímeros. No entanto, a mistura apresenta também a

desvantagem de aumentar a contração de polimerização da matriz polimérica influenciando

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negativamente as propriedades mecânicas das resinas compostas. A magnitude da contração de

polimerização depende do peso molecular e do grau de conversão da molécula. Quanto maior o

peso molecular do monómero, menor a contração de polimerização assim como quanto maior a

reatividade, maior o grau de conversão dos monómeros em polímeros e consequentemente maior

a contração de polimerização [20, 24].

Figura 8- Estrutura do monómero Bis-GMA [24]

Outro monómero utilizado para a matriz orgânica é o UDMA com peso molecular

semelhante ao Bis-GMA (470,56) mas com menor viscosidade (11 000 mPa.s) o que permite a

sua utilização isolada, ou seja, não existe a necessidade de utilizar monómeros diluentes. Quanto

menor for a viscosidade da matriz, maior quantidade de carga pode ser incorporada aumentando

a rigidez e a resistência mecânica e diminuindo o coeficiente de expansão térmica e a solubilidade

[20]. Na Tabela 3 apresentam-se os monómeros utilizados no fabrico de resinas compostas.

Tabela 3- Monómeros utilizados para fabrico de resinas compostas [25]

Substância Nome Espécie química Peso molecular

BisGMA Bisfenol glicidil

metacrilato

C29H36O8 513,0

TEGDMA Trietileno glicol

dimetacrilato

C14H22O6 286,32

UDMA Uretano

dimetacrilato

C23H38N2O8 470,56

Os inibidores estão presentes na constituição das resinas compostas unicamente com

dois objetivos: evitam a polimerização espontânea dos monómeros e aumentam o tempo de vida

útil da resina [20].

Os modificadores de cor permitem às resinas atingirem diferentes cores de forma a

mimetizar as estruturas dentárias de cada paciente. São adicionados pigmentos inorgânicos,

nomeadamente óxidos metálicos com alto peso molecular. As resinas compostas com reduzida

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quantidade de óxidos são translúcidas tornando-as ideais para mimetizar o esmalte. Por outro

lado, resinas que contêm maior quantidade de óxido são mais opacas sendo ideias para

substituição da dentina [20, 26].

Os monómeros polimerizam por reação de adição que é iniciada pela formação de

radicais livres. Esta reação é efetuada pelo sistema iniciador/ativador que está presente na

constituição da resina. Dois grupos de resinas são comercialmente apresentadas: resinas

compostas quimicamente ativas e resinas compostas fotoativadas. A maioria das resinas

utilizadas atualmente sofre uma polimerização por fotoativação sendo comercializadas com uma

consistência pastosa e armazenadas em bisnagas [20, 26].

De facto, a adição de partículas inorgânicas é o mais importante pois reduz a quantidade

de matriz orgânica diminuindo assim algumas desvantagens como a contração de polimerização,

alto coeficiente de expansão térmica e a absorção de água. Na maioria das resinas disponíveis

atualmente é utilizada sílica coloidal como partícula de carga. Juntamente com a sílica coloidal

são utilizados outros tipos de partículas de carga como partículas de vidro de bário, estrôncio,

zircónia e fluoreto de itérbio. Estas substituíram as partículas de quartzo pois têm uma dureza

menor permitindo também melhor moagem para atingir tamanhos inferiores a 6 µm. As partículas

contribuem para a radiopacidade das resinas facilitando a deteção de cáries [20, 26]. Na Figura

9 é possível observar a classificação das resinas compostas de acordo com as suas partículas de

carga.

Figura 9 - Classificação das resinas compostas de acordo com as partículas utilizadas [27]

Para que as partículas de carga cumpram a sua função é necessário que estejam unidas

quimicamente à matriz orgânica. Esta união garante uma distribuição mais uniforme das tensões

geradas no ambiente oral. Falhas no estabelecimento desta união provocam a concentração de

tensões na interface carga/matriz dando origem à formação de fissuras. Estas fissuras são

responsáveis pela redução das propriedades mecânicas, facilitando a entrada de fluídos e

acelerando a degradação das resinas [20].

As resinas compostas podem ser classificadas em 3 grupos distintos:

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30

Resinas de classe 1: compreendem todas as resinas autopolimerizáveis, isto é, a

polimerização ocorre durante a mistura entre o iniciador e o ativador;

Resinas de classe 2: polimerização das resinas é efetuada a partir da energia de uma

fonte externa sendo que estes materiais estão subdivididos:

o Classe 2 grupo 1 – materiais que requerem aplicação de energia intra-oral;

o Classe 2 grupo 2 – materiais que requerem aplicação de energia extra-oral; a

Resinas de classe 3: compreendem materiais de polimerização dual, ou seja, materiais

que polimerizam tanto por mecanismos químicos como físicos.

3.3 – Propriedades das resinas compostas

Como reportado previamente, a adição de partículas inorgânicas traz vantagens a estas

resinas compostas como a rigidez, dureza, resistência e baixo coeficiente de expansão térmico

linear [25].

A polimerização das resinas compostas ocorre aquando a conversão do monómero em

polímero e depende de vários fatores tais como a composição das resinas, a radiopacidade e a

concentração do sistema iniciador/ativador. O grau de conversão depende em grande parte das

propriedades e características do material sendo que materiais com elevado grau de conversão

demonstram melhores propriedades mecânicas. A contração de polimerização é determinada

pela percentagem volumétrica das partículas de carga e pela composição da matriz. Este

fenómeno ocorre quando os monómeros reagem entre si e estabelecem uma ligação covalente

resultando uma redução de volume. Esta redução volumétrica origina microinfiltrações entre a

resina e a estrutura dentária podendo resultar em doenças periodontais, nomeadamente a cárie

dentária e podendo ainda comprometer a viabilidade da restauração. Na Figura 10 encontra-se

representada a contração da resina durante a polimerização resultando na formação de uma

fenda marginal [25].

Figura 10 - Contração de polimerização que ocorre nas resinas compostas [25]

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31

As resinas têm uma resistência à flexão, tenacidade à fratura e resistência à tração

próximas à amálgama de prata. No entanto têm menor módulo de elasticidade (6-14 GPa) o que

poderá permitir o aumento da deformação plástica e/ou desgaste durante o seu desempenho

[22].

O efeito das partículas inorgânicas nas propriedades das resinas compósitas depende do

tipo, forma, tamanho e quantidade de partículas incorporadas e a união destas partículas com a

matriz da resina. As propriedades térmicas e mecânicas variam de acordo com as características

das resinas. A resistência à compressão e o módulo de elasticidade aumentam com o aumento

da quantidade das partículas de carga assim como a resistência à abrasão, provavelmente

consequência do aumento da dureza. Se as partículas de carga adicionadas forem translúcidas,

as propriedades óticas da resina são melhoradas e é produzida uma aparência semelhante à

dentição natural [25]. Relativamente às propriedades térmicas, também influenciadas pelas

partículas de carga, sabe-se que com o aumento do conteúdo de carga o coeficiente de expansão

térmica diminui. A difusidade térmica também depende da quantidade de partículas de carga

presentes. As resinas compostas não possuem capacidade de adesão às estruturas dentárias e

por este motivo é necessário a aplicação de um sistema adesivo sobre o esmalte e dentina [25].

3.4 – Aplicações clínicas

As restaurações dentárias podem ser classificadas de duas formas: restaurações anteriores ou

posteriores. A escolha do material a utilizar numa restauração depende de como o defeito é

classificado. As resinas compostas são o material ideal tanto para restaurações anteriores como

para restaurações posteriores uma vez que para restauros anteriores os fatores a ter em conta

são principalmente a aparência estética, a combinação de cor e polimento. Enquanto para os

restauros posteriores é importante ter em conta fatores como a resistência mecânica ao desgaste

e elevada resistência à fratura [25]. Na Figura 11 podem observar-se duas restaurações diretas

efetuadas com resinas compostas.

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32

Figura 11 - Restaurações diretas utilizando resinas compostas [25]

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33

4. Biotribologia Dentária

4.1 – Tribologia

A tribologia consiste na ciência que estuda os fenómenos do atrito, desgaste e lubrificação

de sistemas em que superfícies com movimento relativo se contatam [28]. Os três termos atrito,

abrasão e erosão são utilizados na literatura dentária para descrever o desgaste de dentes e

materiais dentários. O atrito descreve o desgaste em locais de contacto entre dentes; o conceito

de abrasão é utilizado para desgaste em locais sem contacto e erosão descreve a perda de

material atribuído a efeitos químicos (Figura 12). Estes termos são bastante diferentes dos termos

de engenharia utilizados em tribologia para descrever processos similares de desgaste uma vez

que estes descrevem as manifestações clinicas em vez de descreverem os mecanismos de

desgaste [29].

Figura 12- Fenómenos tribológicos em ambiente oral classificados de acordo com a literatura dentária: A- abrasão, B- Atrito e erosão [30]

No presente estudo é dada preferência à terminologia de engenharia para descrever os

conceitos de tribologia. Assim, sob o ponto de vista de engenharia, o desgaste por abrasão é o

tipo de desgaste mais comum. Com efeito, a uma escala microscópica nenhuma superfície é

completamente lisa, sendo constituída por uma distribuição aleatória de picos e vales formando

as asperidades. Dependendo da micro-rugosidade das superfícies são originados micro contactos

cujo número e dimensão determinam a área real de contacto. Quando ocorre contato entre

superfícies de diferente dureza, as asperidades da superfície mais dura comportam-se como

protuberâncias abrasivas. Dependendo da presença ou não de partículas soltas na interface de

contato, a tribologia distingue dois tipos de abrasão: abrasão a dois corpos e abrasão a três corpos

[31].

A B

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34

4.2 – Comportamento tribológico da dentição natural

O ambiente oral tem um papel extremamente importante no comportamento tribológico

tanto da dentição natural como artificial. Neste ambiente ocorrem vários fenómenos, entre eles a

abrasão [32].

Na dentária a definição de abrasão consiste na fricção entre dente ou restauro e um

agente exógeno causando uma forma de desgaste que normalmente é resultante de interações a

três corpos. A fricção e abrasão podem resultar do contacto direto entre os dentes e quaisquer

partículas abrasivas durante a mastigação e escovagem. Os benefícios da escovagem são muito

maiores que as desvantagens, no entanto a abrasão pode ocorrer como resultado de uma

escovagem demasiado agressiva e a utilização inapropriada de fio dental. A abrasão é dividida

em diferentes categorias: abrasão patológica, fisiológica e profilática. A abrasão no ambiente oral

pode variar consideravelmente devido a diferentes substratos, superfícies de abrasão opostas,

sistemas de lubrificação e abrasivos [32].

O desgaste dentário tem consequências clínicas significativas tanto estéticas como

funcionais. A perda da superfície do dente causada por abrasão é o problema clínico mais comum

com diversos estudos epidemiológicos a estimar uma prevalência de 97%, com 7% da população

a necessitar de tratamento. Se o desgaste não for controlado, o esmalte irá eventualmente fissurar

causando a exposição da dentina que consequentemente irá acelerar as taxas de desgaste (Figura

13) [32].

Figura 13- Abrasão em tecidos dentários naturais. A seta indica a exposição da dentina [32].

O desgaste excessivo dos dentes pode resultar em consequências desastrosas tais como

danos inaceitáveis às superfícies de oclusão, alteração do movimento mastigatório,

hipersensibilidade da dentina e patologias da polpa dentária. A boca providencia um sistema

tribológico extremamente complexo. Por este motivo, a abrasão de dentes e restauros é

multifatorial onde ocorrem processos físicos e químicos [32].

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

35

A fricção ocorre durante as funções orais normais, no entanto o desgaste dentário, um

processo cumulativo e multifatorial, é irreversível. Foi demonstrado que a taxa de desgaste

dentário está associado a fatores como idade, género, distúrbios gastrointestinais, toma excessiva

de frutos cítricos ou alimentos com baixo pH, fatores ambientais, fatores associados à saliva e

anomalias congénitas de tecido dentário [32].

O esmalte dentário não pode ser substituído por materiais de restauro artificiais. Um

estudo efetuado da fricção e desgaste do esmalte e dentina contra esferas de titânio utilizando

saliva artificial como lubrificante demonstrou que a zona do esmalte sofre menor fricção em

comparação com a zona da dentina do mesmo dente [32].

4.3 – Comportamento tribológico de materiais dentários artificiais

Considerando o complexo ambiente oral e a sua biomecânica, os processos de desgaste

em materiais dentários artificiais são complicados e normalmente incluem fenómenos de atrito,

adesão, abrasão, corrosão e fadiga. Estes processos causam a perda de superfície dos materiais

artificiais presentes na boca. O desgaste tem demonstrado ser um grande problema na utilização

de materiais artificiais, especialmente em restauros com resinas compostas, levando a falhas

prematuras e substituição do restauro [32].

A resistência ao desgaste de materiais dentários artificiais é importante para a

longevidade clínica, estética e resistência à placa dental. Os estudos estão fundamentalmente

virados para a resistência ao desgaste de materiais dentários artificiais e a predisposição destes

materiais para criar desgaste nas superfícies opostas, especialmente o esmalte [32].

O principal problema da utilização de materiais compostos é a resistência inadequada ao

desgaste quando utilizados como restauros posteriores, devido à existência de cargas mais

elevadas nesta zona, que consequentemente resulta na perda da forma anatómica. O desgaste

pode ocorrer devido a fatores materiais ou clínicos. Os fatores materiais consistem no tamanho,

forma e dureza das partículas inorgânicas, a percentagem volumétrica destas partículas, o espaço

entre elas, a distribuição das partículas e o seu grau de conversão. [32,33].

Uma vez que o processo de abrasão a três corpos envolve a desintegração de material

através de abrasivos com elevada dureza, a adição de partículas inorgânicas com maior dureza a

uma matriz com dureza menor permite melhorar a resistência à abrasão do material. Um fator

importante é o tamanho das partículas. Testes efetuados in vitro indicam que resinas compostas

que continham partículas esféricas com 0,2 µm de diâmetro exibiam uma maior resistência ao

desgaste comparado com resinas que continhas partículas inorgânicas de tamanho superior. Um

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

36

aspeto importante de referir também é a fragilidade das partículas. Por outro lado, sob elevadas

tensões, as partículas inorgânicas frágeis podem fraturar ou serem ejetadas da superfície

causando rápida abrasão da resina composta [33].

Além da adição de partículas inorgânicas à matriz da resina composta, as interações entre

partículas e a matriz têm grande efeito no aumento da resistência ao desgaste. Estudos indicam

que à medida que a percentagem volumétrica das partículas de enchimento aumenta, o desgaste

foi reduzido independentemente do tratamento efetuado às partículas inorgânicas. O

espaçamento entre partículas e a distribuição destas na matriz também influencia as

propriedades físicas e o comportamento ao desgaste das resinas compostas. Ao diminuir o

espaçamento entre partículas há consequentemente uma diminuição do desgaste, uma vez que

partículas inorgânicas localizadas muito próximas entre si protegem a matriz da resina. Estudos

indicam que o espaçamento crítico entre as partículas deve ser entre 0,1 – 0,2 µm [33].

A composição da matriz polimérica é também um fator importante que afeta a taxa de

desgaste das resinas compostas. Assim, por exemplo, a maior resistência ao desgaste associada

ao par de monómeros UEDMA/TEGDMA pode ser relacionado com o seu grau de conversão mais

elevado do que no caso do par BisGMA/TEGDMA [33].

O desgaste em materiais de restauro dentário pode originar consequências sistémicas

através da ingestão ou inalação de partículas resultantes do desgaste. Em resinas compostas,

além da preocupação existente com as partículas que se libertam do monómero, as partículas

inorgânicas de tamanho nano e micro que se podem aglomerar nos tecidos biológicos podem

originar patologias no fígado, rins e intestinos. Alguns resultados da simulação do desgaste

mostram que a maioria das resinas compostas que são desintegradas durante fenómenos de

atrito ou abrasão têm diâmetros menores que 100 µm, o que corresponde ao valor para absorção

de partículas no trato respiratório e digestivo [34].

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

37

5. Materiais e métodos

5.1 – Preparação das amostras

Neste estudo foram utilizados quatro grupos de resinas compostas disponíveis

comercialmente: Grandio®So (Voco, Alemanha); Ceram-X TM (Dentsply, Alemanha); Clearfil ™

(Kuraray, Japão); e Natural Elegance® (Henry Schein, EUA). Na Tabela 4 está descrita a

composição de cada uma das resinas utilizadas, de acordo com o fabricante.

Tabela 4 - Composição das resinas compósitas

Compósito Composição Composição

Inorgânica

Orgânica Tipo Dimensão (µm) Fração

(v/w)

Grandio®So Bis-GMA, Bis-EMA Vidro de bário 1 73%

(Voco) UDMA, TEGDMA Sílica 20 x 10-3 – 40 x 10-3

Ceram-X™ Bis-GMA Vidro de bário 1 56%

(Dentsply) TEGDMA Sílica 10 x 10-3

Clearfil™ Bis-GMA Vidro de bário 0,1 - 2,5 82%

(Kuraray) TEGDMA Sílica 20 x 10-3 - 60 x 10-3

Natural

elegance®

Bis-GMA Vidro de bário 0,01 - 0,7 54%

(Henry Schein) Sílica 20 x 10-3 – 60 x 10-3

As amostras dos quatro grupos de resinas compostas foram processadas de acordo com

as instruções do fabricante. Foram produzidas 40 amostras com dimensões 10 x 10 x 2 mm para

efetuar os testes de desgaste e 40 amostras com dimensões 6 x 4 mm para os testes mecânicos.

As resinas foram inseridas em incrementos de 2 mm em silicone de adição (Aquasil Soft Putty,

Dentsply) com uma espátula de Heidemann. Os incrementos de resina foram posicionados com

o brunidor e fotopolimerizados durante 40 s com o aparelho calibrado (Cicada CV-215-I Stilight,

1200 mV/cm2). Foi colocada uma placa de vidro de 1 mm de espessura sobre a última camada

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

38

de resina para alisar a superfície e de seguida a camada foi polimerizada por 40 s. As amostras

de resina foram retiradas do molde e fotopolimerizada por mais 40 segundos no lado oposto.

Após polimerização as amostras foram submetidas a lixamento com lixas de carboneto

de silício entre 180 e 4000 Mesh. Após o lixamento, as amostras foram polidas com uma

suspensão de partículas de diamante (1 µm). Posteriormente, as amostras foram lavadas em

água destilada durante 15 minutos em banho ultra-sônico.

5.2 – Testes de compressão

Os provetes de resina composta (4 x 5 mm) foram imersos em água destilada 24 horas

antes dos ensaios de compressão. Os testes de compressão foram efetuados com uma máquina

de testes mecânicos universal (Instron 8874, MA, EUA), operada com o auxílio de um programa

de computador (Instron Bluehill 2.6). A compressão sobre os provetes foi efetuada com um

deslocamento de 1 mm/min e uma célula de carga de 25 kN. Foram testadas 20 provetes por

cada grupo de resinas compostas, obtendo-se o respetivo gráfico com valores de carga (N) versus

extensão 8mm). A resistência à compressão foi calculada pela fórmula F/πr2, onde F é a carga

máxima suportada pelo material e r o raio da secção transversal do provete.

Além dos testes de compressão permitirem determinar a resistência dos materiais à

compressão é também possível determinar o módulo de elasticidade dos materiais. O módulo de

elasticidade pode ser definido como sendo a relação entre a tensão aplicada e a deformação

instantânea dentro de um limite proporcional. Deste modo, é utilizada a lei de Hooke para a

determinação do módulo de elasticidade ou módulo de Young: 𝐸 =𝛿

5.3 – Testes de micro-abrasão

Os testes de micro-abrasão foram efetuados utilizando o equipamento Plint TE 66 (Figura

14A).

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

39

Figura 14 - (A) Equipamento de micro-abrasão (Plint TE 66); (B) Representação esquemática dos testes de micro-abrasão

Após limpeza por 5 minutos em álcool isopropílico em banho ultra-sônico, as amostras

de resina composta foram coladas numa placa em liga de alumínio de forma e dimensões

compatíveis com a sua fixação no porta-provetes (Figura 15).

Figura 15 – Amostra preparada para colocação no equipamento

O abrasivo utilizado nos testes de micro-abrasão consistiu numa solução de água

destilada com pasta dentífrica (Colgate-Palmolive®, Anti-tártaro + braqueamento) na proporção

de 2:1 a qual foi mantida homogénea durante a realização dos testes mediante a colocação do

recipiente em vidro que a continha sobre um agitador magnético em operação. A pasta utilizada

apresenta um RDA de 200. Foi preparada uma solução abrasiva nova sempre que se iniciaram

testes com um grupo distinto de amostras.

Os testes de micro-abrasão foram realizados com uma esfera de aço (ASTM 52 100), com 25

mm de diâmetro (Figura 16). A carga normal adotada foi sempre de 3N e a sua velocidade de

rotação foi mantida constante, assumindo o valor de 50 rpm. Cada teste teve uma duração

A B

Alimentação do abrasivo Aplicação

da carga

normal

Esfera em rotação

Porta amostra

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

40

correspondente a 300 rotações e foram efetuados 3 testes para cada tipo de resina composta.

Após o teste de microabrasão as amostras foram lavadas com água destilada por 5 minutos em

banho de ultra-som e armazenadas para posterior caracterização superficial.

Figura 16 - Representação esquemática dos testes de micro-abrasão

Através da medição do diâmetro da cratera de abrasão formada é possível determinar o volume

de material perdido através da equação: 𝑉 = 𝜋𝑏4

64𝑅 onde b corresponde ao diâmetro externo da

cratera e R o raio da esfera utilizada. As medições foram efetuadas através das imagens de

microscopia ótica e utilizando o software Image J.

5.4 – Testes de deslizamento linear alternativo

Os testes de deslizamento linear alternativo foram efetuados num tribómetro CETR UMT-

2 (Figura 17A).

F

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

41

Figura 17 – (A) Tribómetro CETR UMT-2 utilizado para os testes de deslizamento linear alternativo; (B) Representação esquemática do tribómetro

As amostras de resina composta destinadas aos testes de deslizamento foram polidas e

lavadas em banho de ultra-sons imersas em álcool isopropílico por 5 minutos e depois em água

destilada 24 horas antes do ensaio. Os testes decorreram na presença de saliva artificial de

Fusayama (Tabela 5) a qual foi mantida à temperatura de 37 °C ±1 °C. Como superfície oponente

foi utilizada uma esfera de alumina 10 mm de diâmetro.

Tabela 5 - Saliva artificial de Fusayama

Componentes g/L

NaCl 0,4

KCl 0,4

CaCl2 . 2H2O 0,795

Na2S . 9H2O 0,005

NaH2PO4 . 2H2O 0,69

Ureia 1

Cada teste de deslizamento linear alternativo teve a duração de 90 minutos e foi utilizada uma

carga normal de 20 N. A frequência e amplitude do movimento de oscilação da placa foram

fixadas em 1 Hz e 2,5 mm, respetivamente. Foram efetuados 3 testes por material a caracterizar,

A B

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

42

perfazendo um total de 12 testes. Durante os testes de deslizamento foram continuamente

registados os valores do coeficiente de atrito, força normal (Fn) e força tangencial no contacto (Ft)

utilizando o programa de computador específico para o tribómetro, UMT2 (Marca, PAIS). Na

Figura 18 é possível observar um pormenor mostrando o porta-esferas e a placa em resina

composta.

Figura 18 - Pormenor evidenciando o porta-esferas e a placa em resina compósita

Estes testes consistem no deslizamento da amostra em contacto com uma superfície

oponente, neste caso uma esfera de alumina, resultando numa depressão denominada pista de

desgaste (Figura 19).

Figura 19 - Representação esquemática da formação da pista de desgaste

É possível calcular o volume de desgaste, através de uma série de medições efetuadas à

amostra. As pistas de desgaste correspondem a marcas provocadas pela esfera de alumina

quando penetra no material. As extremidades da pista correspondem a calotes esféricas e

Placa (resina composta)

Porta-esferas

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

43

consequentemente a largura da pista de abrasão corresponde ao diâmetro da calote (Figura 20A).

Sabendo o raio da esfera de alumina (R), assim como o raio da calote (s), pelo teorema de

Pitágoras consegue-se calcular a profundidade da pista de abrasão (h) (Figura 20B).

Figura 20 - Cálculo da profundidade da pista de desgaste

Calculando o valor de h’ através da equação ℎ′ = √𝑅2 − 𝑠2, é possível determinar a

profundidade da pista de abrasão, h = R − h’.

O volume de material perdido nas extremidades corresponde a uma calote (meia calote em

cada uma das duas extremidades) e pode ser calculado através da equação utilizada no

tratamento dos testes de micro-abrasão, 𝑉 = 𝜋𝑏4

64𝑅 , sendo que b corresponde à largura da pista

de abrasão.

Relativamente ao cálculo do volume da parte intermédia da pista de abrasão (Figura 21),

através da multiplicação da área da base pela altura (amplitude da pista de desgaste) é possível

determinar o volume de material perdido. As imagens resultantes da microscopia ótica podem

ser observadas na Figura 22.

Figura 21 - Secção intermédia da pista de abrasão

h’ R

s h

A B

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

44

Figura 22 - Microscopia ótica das amostras submetidas aos ensaios de deslizamento linear alternativo

Para a determinação da área da base é necessário calcular a área da secção circular

(Figura 23A) 𝐴(𝑠𝑒𝑐ç𝑎𝑜) = 1

2× 𝑅2 × 𝜃, sendo 𝜃 = arcsin

𝑠

𝑅 , e a área do triângulo formado

(Figura 23B) 𝐴(𝑡𝑟𝑖â𝑛𝑔𝑢𝑙𝑜) = 𝑏 ×ℎ

2, sendo que a área real é dada por: A(real) = A(secção) –

A(triangulo) (Figura 23C).

O volume total da pista de abrasão corresponde desta forma à seguinte equação:

𝑉𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑑𝑎 𝑝𝑖𝑠𝑡𝑎 𝑑𝑒 𝑎𝑏𝑟𝑎𝑠ã𝑜 (𝑚𝑚3) = (𝐴𝑟𝑒𝑎(𝑟𝑒𝑎𝑙) × 𝐴𝑚𝑝𝑙𝑖𝑡𝑢𝑑𝑒) + 𝜋𝑏4

64𝑅

Além de permitirem calcular o volume de desgaste, os testes de deslizamento linear alternativo

permitem também calcular a taxa de desgaste, dividindo o volume perdido pela distância total

percorrida.

5.5 – Microscopia Ótica

De forma a ser possível fazer as medições necessárias à quantificação do volume de

desgaste, as amostras em forma de placa dos testes de micro-abrasão e dos testes deslizamento

A B C

Figura 23 - Cálculo da área da base da secção intermédia da pista de abrasão

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

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linear alternativo foram observadas em microscópio ótico (Leica DM 2500M, Leica Microsystems,

Alemanha) (Figura 24).

Figura 24 - Microscópio Ótico

As imagens obtidas por microscopia ótica foram analisadas com recurso ao software Image J

(National Institutes of Health, EUA) a fim de medir o diâmetro das marcas de desgaste resultantes

dos testes de abrasão assim como medir os parâmetros geométricos necessários à quantificação

nas pistas de desgaste dos testes de deslizamento. Na Figura 25 apresentam-se, a título de

exemplo, imagens de microscopia ótica correspondentes a marcas de desgaste resultantes de

testes de micro-abrasão e testes de deslizamento.

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

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Figura 25- Imagens de microscopia ótica de amostras submetidas a: A,B – testes de micro-abrasão; C,D - testes de deslizamento linear alternativo

5.6 – Microscopia Eletrónica de Varrimento (SEM)

As imagens SEM foram obtidas através do equipamento JSM-6390LV (JEOL, USA).

Foram obtidas imagens com ampliações de 35x, 1000x e 200x correspondentes ao centro

das marcas de desgaste. Estas imagens permitem determinar o fenómeno de desgaste que

ocorreu tanto nos testes de micro-abrasão como nos testes de deslizamento linear

alternativo.

D C

B A

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

47

6. Resultados e Discussão

6.1 – Testes de compressão

A realização de testes de compressão teve como objetivo a determinação da capacidade

de resistência à compressão de cada resina composta quando submetida a forças compressivas.

Uma vez que as forças que ocorrem no ambiente oral são maioritariamente de natureza

compressiva é importante estudar os materiais de restauro sob esta condição. Por outro lado, é

um teste adequado para comparar materiais frágeis, que demonstram resultados baixos quando

sujeitos a forças de tração [35].

De acordo com a norma ISO 9917, para testar a força compressiva do material são

aplicadas duas forças axiais em direções opostas. As amostras têm de estar sob a forma de um

provete cilíndrico onde as dimensões devem ter uma relação de 2:1 relativamente à altura e

diâmetro. Quando esta proporção é excedida pode resultar numa flexão indesejada da amostra

[36].

A curva tensão compressiva versus extensão do material é determinada da mesma forma

que nos testes convencionais de tensão sendo que o módulo de elasticidade pode ser determinado

pela razão entre a tensão e deformação na região elástica [37].

Na Figura 26 apresentam-se os gráficos obtidos após os testes de compressão efetuados

aos quatro grupos de resinas compostas em estudo.

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

48

Através da observação do respetivo gráfico carga versus extensão, verifica-se que o grupo C é

o material que sofre maior extensão (2,01 mm), assim como é o material que suporta maior

carga, ou seja, apresenta maor resistência à compressão, antes da fratura. Por outro lado o grupo

D é o grupo que apresenta menor capacidade de deformação (extensão 0,46 mm) entre os

quatro grupos de resinas compostas estudadas.

As Figuras 27 e 28 apresentam, respetivamente, os resultados obtidos para a resistência à

compressão e para o módulo de elasticidade de cada grupo de resina composta.

Figura 26 - Gráficos carga (N) versus extensão (mm) obtidos após ensaio de compressão. A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®.

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Figura 27- Resistência à compressão dos quatro grupos de resinas compostas em estudo. A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®.

Figura 28 - Valores para o módulo de elasticidade de cada grupo de resinas compostas. A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®.

O comportamento mecânico de um material depende em grande parte da sua resposta

(deformação elástica e plástica) à carga a que é submetido. Um valor mais elevado do módulo de

elasticidade corresponde a uma maior rigidez do material, ou seja, o material possui baixa

deformação elástica em determinada carga aplicada [38].

A quantidade de partículas de carga e o seu tamanho determinam diretamente as propriedades

físicas e mecânicas de materiais compósitos. O módulo de elasticidade longitudinal, ou módulo

de Young, é um parâmetro muito sensível para avaliar compósitos com partículas de carga. No

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

50

presente estudo, a maior percentagem volumétrica de partículas inorgânicas do grupo C (83%)

resultou numa maior resistência à compressão (Figura 27) e um menor módulo de elasticidade

(Figura 28). Por outro lado, o grupo D, sendo a resina composta com a menor percentagem

volumétrica de partículas de carga (54%), é a que apresenta maior módulo de elasticidade.

Verifica-se assim que as propriedades mecânicas das resinas compostas, e em particular o

módulo de elasticidade, são em larga medida determinadas pela presença das partículas

inorgânicas [39, 40].

Comparando os resultados apresentados na Figura 28 para os grupos A e B, constata-se que

o grupo B caracteriza-se por um menor módulo de elasticidade inferior ao grupo A, embora

possuindo menor percentagem volumétrica de partículas (56%) do que o grupo A (73%). Este

facto, parecendo contraditório, pode justificar-se pela diferença no tamanho das partículas de

carga entre os dois grupos de materiais, sendo que o grupo B possui partículas de carga com

menores dimensões do que as partículas presentes no grupo A (Tabela 1 do capítulo Materiais e

Métodos).

Outro fator importante nas propriedades mecânicas e de desgaste de materiais compostos é

a ligação entre os constituintes do reforço e a matriz. Uma boa adesão entre as partículas de

carga e a matriz promove a capacidade de transferência de tensão, protege a matriz e inibe a

propagação de fissuras, reduzindo assim o desgaste [40].

Na Tabela 6 apresentam-se os valores relativos às propriedades mecânicas dos tecidos

dentários naturais (dentina e esmalte) [38]. A partir dos resultados obtidos neste estudo, verifica-

se que os valores médios para a resistência à compressão de todas as resinas (112 – 120 MPa)

são inferiores aos valores médios da resistência à compressão da dentina e do esmalte (295 –

384 MPa) sendo que os valores obtidos para o módulo de elasticidade (60 – 240 MPa) são

superiores aos correspondentes à dentina e ao esmalte.

Tabela 6 - Propriedades mecânicas do esmalte e dentina [38].

Material Resistência à

compressão

(MPa)

Resistência à

tração (MPa)

Módulo de

elasticidade

(MPa)

Dentina 295 51,7 18,2

Esmalte 384 10,3 82,4

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

51

6.2 – Testes de micro-abrasão

Os resultados de desgaste nos materiais compostos obtidos pelos testes de micro-abrasão

apresentam-se na Figura 29 para os grupos A, B e D.

Figura 29 – Volume de desgaste das crateras de desgaste resultantes dos testes de micro-abrasão. A-Grandio®So, B- Ceram-X™, D - Natural elegance®.

Uma vez que as amostras pertencentes ao grupo C não revelaram crateras de abrasão bem

definidas, concluiu-se que o desgaste não é mensurável neste caso e por isso, o grupo C não é

apresentado na Figura 29.

Como referido anteriormente, o volume de desgaste está diretamente relacionado com a

percentagem volumétrica e tamanho das partículas de carga. Contudo estes dois parâmetros são

ambos variáveis para os quatro grupos de materiais em estudo, o que dificulta a correlação direta

entre cada um desses parâmetros e o desgaste. O grupo C é o grupo com maior percentagem

volumétrica (82%) e com partículas de vidro de bário que podem assumir a maior dispersão de

tamanhos (0,1 – 2,5 µm) sendo o grupo que sofre menos desgaste. Nestes testes verificou-se

que o desgaste sofrido por este grupo de materiais compostos é extremamente baixo não tendo

sido produzidas crateras de abrasão mensuráveis. Por outro lado, o grupo A, com 73% de

partículas de carga, demonstrou ser o material com maior desgaste na presença de abrasivo. No

entanto, devido à sua elevada percentagem de partículas de carga seria de esperar um menor

volume perdido se apenas o parâmetro percentagem volumétrica fosse considerado isoladamente

na análise. Porém, o tamanho das partículas de vidro de bário não é considerado variável neste

material composto, sendo de 1 µm, tal como no grupo B. Assim, o desgaste mais elevado por

micro-abrasão sofrido pelos grupos A e B pode ser justificado pelo elevado tamanho das partículas

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

52

de vidro de bário, sendo este efeito complementado pela sua uniformidade dimensional. Com

efeito, a resistência ao desgaste depende do volume existente entre as partículas de carga e a

presença de partículas com menores dimensões contribui para reduzir os espaços vazios entre

elas aumentando assim a resistência ao desgaste. Relativamente ao grupo D, apesar de ser o

grupo com menor percentagem volumétrica (54%) apresenta partículas de vidro de bário que

podem assumir grande dispersão de tamanhos (0,01-0,7µm), com particular destaque para o

limite inferior do intervalo de variação dimensional. Ora, conforme já referido, este facto favorece

o preenchimento de espaços vazios entre partículas, contribuindo para uma maior resistência ao

desgaste.

6.3 – Testes de Deslizamento Linear Alternativo

Na Figura 30 apresentam-se os resultados obtidos para o volume de desgaste para cada grupo

de materiais compostos.

Figura 30 - Volume de desgaste das pistas resultantes dos testes de deslizamento linear alternativo. A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®.

Conforme se pode constatar pela análise da Figura 30, o grupo C apresenta maior

resistência ao desgaste, enquanto o grupo A se caracteriza pelo maior volume de desgaste. Assim,

os resultados dos testes de deslizamento linear alternativo são concordantes com os resultados

previamente apresentados para os testes de micro-abrasão, verificando-se ainda que a ordenação

das resinas compostas em termos de resistência ao desgaste é a mesma para ambos os tipos de

teste. Fica deste modo reforçada a importância desempenhada pela percentagem volumétrica e

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

53

tamanho das partículas de carga na determinação da resistência ao desgaste abrasivo e de

deslizamento das resinas compostas para restauro dentário direto.

Na Tabela 7 apresentam-se os valores obtidos para o coeficiente de atrito em regime

estacionário para os contactos envolvendo o deslizamento dos quatro grupos de amostras de

resinas compostas em estudo contra alumina e na presença de saliva artificial.

Tabela 7 - Valores médios do coeficiente de atrito em regime estacionário das resinas compostas durante o teste de deslizamento linear alternativo contra alumina na presença de saliva artificial

Resina Composta Coeficiente de atrito Desvio padrão

A- Grandio®So 0,52 0,02

B- Ceram-X™, 0,31 0,01

C- Clearfil™ 0,26 0,005

D- Natural elegance® 0,32 0,01

Como se pode verificar, a resina composta que sofreu menor desgaste (C- Clearfil™) é

também a resina que, nas condições de teste consideradas, apresenta menor valor do

coeficiente de atrito (0,26). Do mesmo modo, o material que sofreu maior desgaste (A-

Grandio®So) corresponde ao material composto que proporcionou o maior coeficiente de atrito

(0,52).

O atrito entre superfícies deslizantes deve-se a vários efeitos combinados de adesão e

sulcagem, sendo estes os fenómenos que determinam a componente mecânica do atrito.

Assim, quanto maior é o valor do desgaste maior poderá ser também o coeficiente de atrito uma

vez que há maior dificuldade de ocorrer deslizamento entre as superfícies devido à

intensificação da componente mecânica do atrito. Neste estudo os resultados obtidos relativos à

taxa de desgaste seguem uma variação concordante com os resultados de atrito.

6.4 – Microscopia eletrónica de varrimento (SEM)

A utilização de microscopia eletrónica de varrimento permitiu identificar os mecanismos

de desgaste que ocorreram nas resinas compostas sujeitas a testes de micro-abrasão e testes de

deslizamento linear alternativo. Foram efetuadas análises SEM no modo de operação em eletrões

secundários (SE) permitindo a identificação de detalhes tais como fissuras, e no modo eletrões

retrodifundidos (BSE) que permite analisar a distribuição e dimensões das partículas inorgânicas

das resinas compostas. A análise através de SEM é eficiente para observar não só os mecanismos

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

54

de desgaste, mas também características topográficas da superfície e o tamanho e distribuição

das partículas de carga [41].

Na Figura 31 podem observar-se as quatro amostras de resina composta antes de serem

submetidas a qualquer tipo de teste.

Figura 31 -Imagens SEM dos quatro grupos de resinas compostas em estudo: A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®.

Através da análise da Figura 31, é possível confirmar os valores dos tamanhos das partículas

de carga anteriormente apresentados na Tabela 1 (Materiais e métodos). Os grupos C e D

apresentam partículas de sílica de maiores dimensões que variam numa gama de 20 – 60 µm

sendo que esta gama pode ser confirmada através da Figura 31C e 31D.

O desgaste das resinas compostas pode ocorrer por diversos mecanismos: desgaste da matriz,

perda de partículas inorgânicas por falta de adesão à matriz, perda de material pelo corte de

partículas expostas, perda de material por propagação de fissuras e falha da matriz e ainda a

exposição de bolhas de ar aprisionadas [41].

Nas Figuras 32 e 33 apresentam-se fotomicrografias SEM representativas das superfícies

de desgaste das resinas compostas dos grupos A, B e D após o desgaste por teste de micro-

A B

D C

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55

abrasão. Atendendo a que no caso do grupo D não se observou desgaste mensurável, não se

apresenta micrografia da respetiva superfície de contacto.

Figura 32 - Imagem SEM da cratera de desgaste da resina composta D - Natural elegance® após teste de micro-abrasão. A seta indica a presença de fissuras.

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

56

Figura 33 - Imagem SEM das crateras de desgaste de resinas compostas após teste de micro-abrasão: A-Grandio®So, B- Ceram-X™.

Com base na análise das micrografias das Figuras 32 e 33 é possível observar distintos

aspetos morfológicos, particularmente quando se consideram as imagens que traduzem

pormenores ampliados. Com efeito, estes pormenores evidenciam uma grande semelhança no

caso dos materiais compostos B e D onde os pormenores ampliados mostram um aspeto

granuloso em que as partículas de carga são visíveis e apresentam faces polidas paralelas à

superfície. Isso significa que se mantêm aderentes à matriz, proporcionando capacidade de

A

B

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Desgaste de Materiais Dentários de Restauro Direto

57

suporte de carga, e sofrendo desgaste por microabrasão promovido pelas partículas abrasivas

presentes na emulsão de pasta dentífrica apenas nas partículas mais protuberantes. Em

concordância com este aspeto morfológico comum aos materiais compostos B e D, o volume de

desgaste por micro-abrasão sofrido por estas resinas de restauro dentário é relativamente próximo

(Figura 29). Já no caso do material composto A, o volume de desgaste aproximadamente duplica,

sendo o aspeto morfológico da superfície de contacto observada em pormenor bem distinto do

reportado anteriormente, pois apresenta-se monótona, sem ser possível identificar partículas de

reforço. Este facto é revelador de uma ação abrasiva das partículas da emulsão dentífrica

uniformemente ativa por toda a área de contacto (matriz e partículas de carga) e não dominante

nas partículas de carga protuberantes como descrito nos dois casos previamente analisados, o

que se traduziu num aumento do volume de desgaste por abrasão à escala fina.

Um outro aspeto que convém referir é que embora a resina composta D, apresente uma

ligeira tendência para a fissuração na superfície de contacto após o desgaste por testes de micro-

abrasão (Figura 32), este facto não encontra correlação com os resultados de atrito e desgaste

obtidos. Com efeito, dado que o sentido do movimento das partículas presentes na emulsão

abrasiva nunca é alterado, mantendo assim constante o sentido da força tangencial de atrito, e

tendo em consideração que a carga normal adotada foi baixo (3 N), não seria expectável que

fenómenos de fissuração assumissem significado na afetação dos resultados dos testes de micro-

abrasão.

Os testes de micro-abrasão foram efetuados utilizando a pasta dentífrica Colgate®

Antitártaro mais branqueamento. Os abrasivos presentes nesta pasta são a sílica hidratada,

hidróxido de sódio e pirofosfato de sódio. A sílica é o componente utilizado em dentífricos com

menor abrasividade, no entanto em combinação com outros abrasivos como o pirofosfato de

sódio torna-se altamente abrasivo. A sílica tem uma resistência à compressão de 700 – 1400

MPa e um módulo de elasticidade de 73 MPa. A abrasividade de um dentífrico depende de vários

fatores tais como a dureza do abrasivo, tamanho e forma as partículas e do pH do dentífrico. As

partículas abrasivas utilizadas nas pastas dentífricas da Colgate® são arredondadas e

apresentam uma forma irregular. A distribuição destas partículas na pasta dentífrica é homogénea

sendo que o tamanho varia bastante e algumas partículas apresentam gumes agudos [41].

Na Figura 34 apresentam-se imagens SEM das pistas de desgaste das resinas compostas

resultantes dos testes de deslizamento linear alternativo.

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A

B

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Figura 34- Imagens SEM dos quatro grupos de resinas compostas após testes de deslizamento linear alternativo: A-Grandio®So, B- Ceram-X™, C- Clearfil™, D - Natural elegance®.

Relativamente aos mecanismos de desgaste que se manifestaram através de testes de

deslizamento linear alternativo, é possível observar que em todos os grupos de resinas compostas

estudadas ocorre a formação de fissuras, as quais se revelam mais acentuadas na resina

composta A, que se caracterizou pela menor resistência ao desgaste, e mais suaves no caso da

resina composta C, a mais resistente ao desgaste. Uma vez que todos os testes de deslizamento

foram realizados nas mesmas condições, a diferente intensidade com que as fissuras se

formaram na pista de desgaste resultou necessariamente de diferenças na coesão entre as

C

D

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partículas de carga e a matriz das resinas compostas. Assim, a remoção de material das resinas

compostas configura um mecanismo de fadiga pelo facto de evidenciar fissuras, de que resultou

uma perda progressiva de material (desgaste) determinada pela taxa de crescimento das fissuras.

Em conformidade com o crescimento de fissuras e consequente intensidade de desgaste, a

superfície de contacto do material composto tornou-se tanto mais rugosa quanto maior o desgaste

sofrido. Uma vez que sobre a superfície oponente (alumina) não foi detetada qualquer alteração

da sua topografia, a componente mecânica do atrito foi essencialmente determinada pela

rugosidade da superfície de desgaste do material composto, a qual aumentou em direta relação

com o crescimento de fissuras, ou seja do desgaste. Deste modo, justifica-se a direta relação

encontrada neste estudo entre os resultados de atrito e de desgaste que foram obtidos através

dos testes de deslizamento linear alternativo.

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7. Conclusões

Relativamente aos testes de compressão, efetuados com um deslocamento de 1 mm/min

a uma carga de 25 kN, permitiram obter resultados relativamente à resistência de compressão e

módulo de elasticidade das resinas compostas. Através destes resultados pode concluir-se que o

grupo C é o que apresenta maior resistência à compressão e menor módulo de elasticidade sendo

por isso considerado o material com melhor desempenho nos testes de compressão.

Os testes de micro-abrasão permitiram concluir que o grupo C é o grupo de resina

composta que não apresenta qualquer marca de desgaste quando submetida às condições de

teste impostas, uma solução abrasiva composta por pasta dentífrica e uma carga de 3 N. Todos

os restantes grupos demonstraram crateras de desgaste após serem submetidas às mesmas

condições de testes. É importante referir que o grupo A foi o grupo que sofreu maior desgaste

sendo que o seu volume de desgaste foi de 2,22 x 10-3 mm3. A observação das micrografias SEM

permitiu a identificação dos mecanismos de desgaste. Nos grupos B e D é possível observar

partículas de carga o que significam que estas se mantêm aderentes à matriz melhorando a

capacidade destas resinas ao desgaste por abrasão. Relativamente ao grupo A, não foi possível a

observação de partículas de carga o que permite concluir que o desgaste sofrido por este grupo

é uniforme em toda a área de contato.

Os resultados obtidos após a realização de testes de deslizamento linear alternativo

permitiram calcular o volume de desgaste de cada grupo de resina composta assim como

determinar o coeficiente de atrito que cada grupo sofreu. Conclui-se após observação dos

resultados, que o grupo que sofreu menor desgaste, grupo C, foi também o grupo que apresentou

menor coeficiente de atrito. Por outro lado, o grupo A foi mais uma vez o grupo que apresentou

maior volume de desgaste (5,55 x 10-2) assim como maior coeficiente de atrito (0,52). Foi também

efetuada a análise SEM dos quatro grupos de resinas compostas de forma a identificar os

mecanismos de desgaste. Em todos os grupos de resinas compostas estudados verificou-se a

formação de fissuras. No entanto, no grupo que sofreu maior desgaste, grupo A, as fissuras

apresentadas são mais acentuadas que nos restantes grupos de resinas compostas. Pode então

concluir-se que as resinas compostas sofreram desgaste por fadiga que ocorreu devido à remoção

das partículas de carga existentes na composição das resinas compostas.

O grupo C foi o grupo que revelou um maior potencial enquanto restauro dentário devido

ao menor volume de desgaste sofrido, tanto em testes de micro-abrasão como em testes de

deslizamento linear alternativo. Este grupo de resinas compostas é o grupo com maior

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percentagem volumétrica de partículas de carga (83%) apresentando no entanto partículas de

maiores dimensões (20 -60 x 10-3 µm) Por outro lado, o grupo A revelou ser o grupo de resinas

compostas com propriedades mecânicas mais fracas, sendo o grupo com uma percentagem

volumétrica intermédia (73%) e apresentando partículas de carga com dimensões que variam

entre 20 – 40 x 10-3 µm.

É possível concluir que as propriedades mecânicas das resinas compostas relacionam-se

com a percentagem volumétrica de partículas de carga e com o seu tamanho. As resinas com

maior percentagem volumétrica de partículas de carga e com partículas de tamanho reduzido

melhoram o seu desempenho, reduzindo o volume de desgaste e melhorando o seu

comportamento quando presentes em ambiente oral e sujeitas e diversas tensões provenientes

deste ambiente. É também importante referir que não é apenas a percentagem volumétrica e o

tamanho das partículas de carga que afetam o desgaste destas resinas. A boa adesão entre as

partículas de carga e a matriz é também um fator fundamental para determinar as propriedades

mecânicas das resinas assim como a sua resistência ao desgaste.

Devido à potencialidade das resinas compostas enquanto restauros dentários diretos

deverão surgir desenvolvimentos futuros. Para trabalho futuro recomenda-se a medição da micro-

dureza das resinas compostas de forma a relacionar esta propriedade com a capacidade de

desgaste destes materiais. O estudo da micro-abrasão poderá ser efetuado com diferentes cargas

(superiores a 3 N) e a diferentes durações de forma a compreender se o comportamento dos

materiais a diferentes cargas se mantém. Relativamente aos testes de deslizamento linear

alternativo seria interessante testar os materiais com durações de teste diferentes.

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