Depois do Carnaval, coluna publicada n'O Diário do Norte do Paraná

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O DIÁRIO DO NORTE DO PARANÁ Domingo, 22 de fevereiro de 2015 CULTURA D3 TAVARES y - Sérgio Tavares Depois daquele Carnaval nos tornamos uma família exaustivamente feliz. Depois do Carnaval eu pai era bronco. Não feito o Bron- co, o personagem cômico interpre- tado pelo Golias, na Família Trapo, que assistíamos à noite na tevê. Deitado de bruços sobre o tapete da sala, eu ria. Sentada no sofá ao lado do meu pai, minha mãe ria. Só meu pai que não ria. Meu pai era bronco e nunca ria. A verdade é que fui encontrar a palavra anos depois. Mas não há definição melhor para meu pai. Um homem áspero, desafeito ao diálogo, que passava o dia vestido de um silêncio gros- so e impermeável. As vezes em que interagia co- migo era para me castigar. Meu pai me batia muito. Um deslize, uma demora, uma nota ver- melha na caderneta eram alguns dos motivos para me aplicar correções físicas. Meu pai me batia com cinto e doía bastante. Por isso, não me incomodava suas constantes viagens. Meu pai era inspetor de uma companhia de cigarros. Passava semanas completas fora de casa. Em muitos casos, durante datas comemo- rativas. Recordo-me de sua ausência num dos meus aniversários. Na manhã seguinte ao re- torno dele, despertei com um pacote ao pé da cama. Era um carrinho de fricção, tipo Mus- tang, que eu tanto queria. Minha mãe que havia deixado soube ao tirar o papel. Meu pai nunca teria adivinhado. A ele mal cabia um parabéns afônico e um abraço frouxo, onde eu nunca es- tava. Naquele Carnaval, meu pai também tinha via- jado. Morávamos no subúrbio, uma casa de va- randa vizinha a uma vila, para onde havia se mudado a família do Cláudio. Logo nos torna- mos amigos e, devido às ausências do meu pai, nossas mães também. Foi a mãe do Cláudio que me convidou para conhecer o Carnaval de Ipa- nema. Eles tinham um Fusca azul-claro, ano 68. Meu pai nunca teria autorizado, mas, como es- tava fora, minha mãe permitiu. Era um domin- go, e foi a primeira vez que vi o mar. As ruas estavam frequentadas. Havia banda e pessoas com costumes. A mãe do Cláudio nos monitorava, até que nos deparamos com um bloco que vinha no sentido contrário. O fluxo me levou para outra margem, onde me protegi atrás de um poste, esperando a turba passar. Foi então que o vi. Fantasiado de marinheiro junto a uma mulher mascarada e a um menino vesti- do de pirata. Dançava, lançava serpentina, ria. Meu pai ria muito. Eu me perdi de mim, por um tempo. Daí o meni- no-pirata se separou do casal e saí no seu encal- ço. Consegui alcançá-lo numa banquinha que vendia apitos de pierrô. Apontei para o homem. Quem é aquele fantasiado de marinheiro? É o meu pai, respondeu. Ele te bate? Não, disse num misto de surpresa e de asserto. Afastei-me e segui em direção ao meu pai. Ele ainda dança- va e ria. Estava de costas e segurei a mão dele. Vem, Dudu, vamos voltar pra folia! Virou-se e os músculos do seu rosto vieram abaixo. Meu pai nunca mais me bateu. Viajava cada vez menos, até que um dia parou. Deixou de ser o homem áspero, irascível, que ficava mudo quan- do assistíamos a comédia do Bronco na tevê. Deitado de bruços sobre o tapete da sala, eu ria. Sentada no sofá ao lado do meu pai, minha mãe ria. Meu pai também ria, ria muito. De- pois daquele Carnaval nos tornamos uma famí- lia exaustivamente feliz. M A partir desta segunda-feira, a ilustradora maringaense e cartunista de O Diário, Cibele Santos, estará em São Paulo participando da Gift Fair e Feira de Decoração – consi- derado maior evento de hou- seware e giftware da Améri- ca Latina e uma das maio- res e mais representativas do mundo. A feira, que começa amanhã, vai até quinta-feira, na Expo Center Norte, pavi- lhão de exposições na região norte da capital paulistana. Durante a feira, Cibele anun- cia mais uma conquista da marca “Mulher de 30”, que fe- chou recentemente uma nova parceria com a empresa Top Store. Com a parceria, a em- presa fica agora responsável pela produção e distribuição Wilame Prado [email protected] y ‘Mulher de 30’ vai para SP QUADRINHOS/NEGÓCIO O Ilustradora maringaense, Cibele Santos participa de evento do setor de houseware e gifware DIVIRTA-SE V MULHER DE 30 As tirinhas da ilustradora maringaense Cibele Santos, que levam a marca “Mulher de 30”, podem ser conferidas em todas as edições do caderno Cultura, e também no site da autora: www.mulher30.com.br para o mercado de redes vare- jistas dos produtos que vão a marca. “Nada melhor que mar- car essa parceria na maior feira de houseware e giftwa- re da América Latina, onde a Top Store terá um estande”, comemora a ilustradora, que publica diariamente no cader- no Cultura cartuns da série “Mulher de 30”. “Para a ‘Mulher de 30’ é im- portantíssima a participação numa feira deste porte. O obje- tivo é tornar nossos produtos e marca conhecidos nacional- mente. Durante a feira teremos a chance de firmar novos conta- tos e parcerias. Em 2015, vamos dar atenção especial à loja e produtos da marca”, diz . Para a artista, que ano passa- do estreou na literatura lançan- do o livro de quadrinhos “Não Tenho Roupa!”, ter o espaço no jornal para mostrar o seu traba- lho também é outra grande con- quista recente na carreira. “É muito gratificante ter o tra- balho reconhecido em minha própria cidade. Muitos leitores e amigos me mandaram men- sagens de como está bacana acompanhar as tiras pelo jor- nal, e isso é a maior satisfação do meu trabalho, chegar até os leitores e divertir um pouco o dia a dia das pessoas”, afirma Ci- bele. ARTE. Cibele em seu ateliê, no Centro de Maringá: com parcerias fechadas, produtos com a marca “Mulher de 30” deverão ser distribuídos nacionalmente.—FOTO: RICARDO LOPES A Editor: Eduardo Xavier Tel. (44) 3221-6614 Email: [email protected]

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Depois do Carnaval, de Sérgio Tavares, publicado n'O Diário do Norte do Paraná, em 22 de fevereiro de 2015

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O DIÁRIO DO NORTE DO PARANÁ Domingo, 22 de fevereiro de 2015 CULTURA D3

TAVARES

y-

Sérgio Tavares

Depois daquele Carnaval nos tornamos uma família exaustivamente feliz.

Depois do Carnaval eu pai era bronco. Não feito o Bron-co, o personagem cômico interpre-tado pelo Golias, na Família Trapo, que assistíamos à noite na tevê.

Deitado de bruços sobre o tapete da sala, eu ria. Sentada no sofá ao lado do meu pai, minha mãe ria. Só meu pai que não ria. Meu pai era bronco e nunca ria. A verdade é que fui encontrar a palavra anos depois. Mas não há definição melhor para meu pai. Um homem áspero, desafeito ao diálogo, que passava o dia vestido de um silêncio gros-so e impermeável. As vezes em que interagia co-migo era para me castigar. Meu pai me batia muito. Um deslize, uma demora, uma nota ver-melha na caderneta eram alguns dos motivos para me aplicar correções físicas. Meu pai me batia com cinto e doía bastante. Por isso, não me incomodava suas constantes viagens. Meu pai era inspetor de uma companhia de cigarros. Passava semanas completas fora de casa. Em muitos casos, durante datas comemo-rativas. Recordo-me de sua ausência num dos meus aniversários. Na manhã seguinte ao re-

torno dele, despertei com um pacote ao pé da cama. Era um carrinho de fricção, tipo Mus-tang, que eu tanto queria. Minha mãe que havia deixado soube ao tirar o papel. Meu pai nunca teria adivinhado. A ele mal cabia um parabéns afônico e um abraço frouxo, onde eu nunca es-tava. Naquele Carnaval, meu pai também tinha via-jado. Morávamos no subúrbio, uma casa de va-randa vizinha a uma vila, para onde havia se mudado a família do Cláudio. Logo nos torna-mos amigos e, devido às ausências do meu pai, nossas mães também. Foi a mãe do Cláudio que me convidou para conhecer o Carnaval de Ipa-nema. Eles tinham um Fusca azul-claro, ano 68. Meu pai nunca teria autorizado, mas, como es-tava fora, minha mãe permitiu. Era um domin-go, e foi a primeira vez que vi o mar. As ruas estavam frequentadas. Havia banda e pessoas com costumes. A mãe do Cláudio nos monitorava, até que nos deparamos com um bloco que vinha no sentido contrário. O fluxo me levou para outra margem, onde me protegi atrás de um poste, esperando a turba passar. Foi

então que o vi. Fantasiado de marinheiro junto a uma mulher mascarada e a um menino vesti-do de pirata. Dançava, lançava serpentina, ria. Meu pai ria muito. Eu me perdi de mim, por um tempo. Daí o meni-no-pirata se separou do casal e saí no seu encal-ço. Consegui alcançá-lo numa banquinha que vendia apitos de pierrô. Apontei para o homem. Quem é aquele fantasiado de marinheiro? É o meu pai, respondeu. Ele te bate? Não, disse num misto de surpresa e de asserto. Afastei-me e segui em direção ao meu pai. Ele ainda dança-va e ria. Estava de costas e segurei a mão dele. Vem, Dudu, vamos voltar pra folia! Virou-se e os músculos do seu rosto vieram abaixo. Meu pai nunca mais me bateu. Viajava cada vez menos, até que um dia parou. Deixou de ser o homem áspero, irascível, que ficava mudo quan-do assistíamos a comédia do Bronco na tevê. Deitado de bruços sobre o tapete da sala, eu ria. Sentada no sofá ao lado do meu pai, minha mãe ria. Meu pai também ria, ria muito. De-pois daquele Carnaval nos tornamos uma famí-lia exaustivamente feliz.

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A partir desta segunda-feira, a ilustradora maringaense e cartunista de O Diário, Cibele Santos, estará em São Paulo participando da Gift Fair e Feira de Decoração – consi-derado maior evento de hou-seware e giftware da Améri-ca Latina e uma das maio-res e mais representativas do mundo. A feira, que começa amanhã, vai até quinta-feira, na Expo Center Norte, pavi-lhão de exposições na região norte da capital paulistana.

Durante a feira, Cibele anun-cia mais uma conquista da marca “Mulher de 30”, que fe-chou recentemente uma nova parceria com a empresa Top Store. Com a parceria, a em-presa fica agora responsável pela produção e distribuição

Wilame Prado [email protected] y

‘Mulher de 30’ vai para SP

QUADRINHOS/NEGÓCIO

Ilustradora maringaense, Cibele Santos participa de evento do setor de houseware e gifware

DIVIRTA-SE VMULHER DE 30 As tirinhas da ilustradora maringaense Cibele Santos, que levam a marca “Mulher de 30”, podem ser conferidas em todas as edições do caderno Cultura, e também no site da autora: www.mulher30.com.br

para o mercado de redes vare-jistas dos produtos que vão a marca. “Nada melhor que mar-car essa parceria na maior feira de houseware e giftwa-re da América Latina, onde a Top Store terá um estande”, comemora a ilustradora, que publica diariamente no cader-no Cultura cartuns da série “Mulher de 30”.

“Para a ‘Mulher de 30’ é im-

portantíssima a participação numa feira deste porte. O obje-tivo é tornar nossos produtos e marca conhecidos nacional-mente. Durante a feira teremos a chance de firmar novos conta-tos e parcerias. Em 2015, vamos dar atenção especial à loja e produtos da marca”, diz .

Para a artista, que ano passa-do estreou na literatura lançan-do o livro de quadrinhos “Não Tenho Roupa!”, ter o espaço no jornal para mostrar o seu traba-lho também é outra grande con-quista recente na carreira.

“É muito gratificante ter o tra-balho reconhecido em minha própria cidade. Muitos leitores e amigos me mandaram men-sagens de como está bacana acompanhar as tiras pelo jor-nal, e isso é a maior satisfação do meu trabalho, chegar até os leitores e divertir um pouco o dia a dia das pessoas”, afirma Ci-bele.

ARTE. Cibele em seu ateliê, no Centro de Maringá: com parcerias fechadas, produtos com a marca “Mulher de 30” deverão ser distribuídos nacionalmente.—FOTO: RICARDO LOPES

A Editor: Eduardo XavierTel. (44) 3221-6614 Email: [email protected]