DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO … · Com a palavra o Dr. Mozart ... agilizar e...
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CÂMARA DOS DEPUTADOS
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
TRANSCRIÇÃO IPSIS VERBISCPI - ESCUTAS TELEFÔNICAS CLANDESTINAS
EVENTO: Audiência Pública N°: 0109/08 DATA: 05/03/2008INÍCIO: 14h54min TÉRMINO: 18h30min DURAÇÃO: 03h36minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 03h36min PÁGINAS: 74 QUARTOS: 44
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO
MOZART VALADARES PIRES – Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB.WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR – Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil– AJUFE.
SUMÁRIO:Esclarecimentos acerca de escutas telefônicas clandestinas/ilegais, conformedenúncia publicada na revista Veja, Edição 2022, nº 33, de 22 de agosto de 2007.
OBSERVAÇÕES
Houve intervenções fora do microfone. Inaudíveis.Há falhas na gravação.Há palavras ininteligíveis.A reunião foi suspensa e reaberta.
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Declaro aberta a 11ª
reunião ordinária da Comissão Parlamentar de Inquérito, com a finalidade de
investigar escutas telefônicas clandestinas/ilegais, conforme denúncia publicada na
revista Veja, Edição 2022, nº 33, de 22 de agosto de 2007.
Esta reunião de audiência pública foi convocada para ouvirmos o Dr. Mozart
Valadares Pires, Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros — AMB; o
Dr. Walter Nunes da Silva Júnior, Presidente da Associação dos Juízes Federais do
Brasil — AJUFE; o Dr. Antônio Carlos Alpino Bigonha, Presidente da Associação
Nacional dos Procuradores da República — ANPR; e o Dr. José Carlos Cosenzo,
Presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público — CONAMP.
Convido o Dr. Mozart Valadares Pires a tomar assento à Mesa.
Antes de passar a palavra ao expositor, peço a atenção dos senhores
presentes para os procedimentos que vamos adotar.
O tempo concedido aos expositores será de 20 minutos, não podendo ser
aparteados. Os Deputados interessados em tecer considerações deverão
inscrever-se previamente junto à Secretaria. O Relator disporá do tempo que for
necessário para as suas considerações. O autor do requerimento terá o prazo de 15
minutos para tecer suas considerações, computado nesse tempo o prazo para as
respostas do expositor. Cada Deputado inscrito terá o prazo de 10 minutos para
tecer as suas considerações, computado nesse tempo o prazo para as respostas do
expositor.
Com a palavra o Dr. Mozart Valadares Pires por até 20 minutos.
Seja bem-vindo a esta Comissão Parlamentar de Inquérito. E, com certeza,
V.Exa. em muito contribuirá para os trabalhos que iremos desenvolver, tendo em
vista a experiência que V.Exa. tem no Poder Judiciário e pelo fato de estar aqui
representando toda uma categoria que, na verdade, é o poder concedente, neste
País, das escutas telefônicas.
Com a palavra V.Exa.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Boa-tarde. Quero cumprimentar o
Presidente da Comissão, Deputado Marcelo Itagiba; o Relator, Deputado Nelson
Pellegrino; todos os componentes da Comissão; os Promotores, Juízes Federais,
Procuradores. A todos uma boa-tarde. Inicio agradecendo, em nome da Associação
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dos Magistrados Brasileiros — AMB, a oportunidade que esta Comissão nos
concedeu para que nós possamos fazer algumas reflexões, colocar algumas
observações para esta CPI, para que esse tema possa ter o encaminhamento que a
sociedade brasileira, a Magistratura e o Parlamento desejam. Tenho 3 colegas que
irão também colocar suas reflexões aqui para a Comissão. Então, nós vamos tentar
agilizar e passar as nossas impressões sobre essa questão que atormenta não só o
Poder Judiciário, mas todo o cidadão brasileiro. É uma questão grave, é uma
questão que atinge a privacidade do cidadão brasileiro e causa insegurança à
sociedade brasileira. E nós não podemos admitir que esse crime esteja sendo
implantado, vamos dizer assim, no seio da sociedade brasileira. Eu tenho o grampo
telefônico, como é denominado, a quebra do sigilo telefônico, como um mecanismo
de investigação. Eu defendo que ele continue previsto, legalizado na nossa
legislação, que haja a possibilidade desse tipo de investigação pelo Poder Judiciário,
pela Polícia, pelo Ministério Público, mas que nós tenhamos muito cuidado com esse
tipo de colhimento de provas. Nós temos de ter em mente que, para se quebrar o
sigilo de um cidadão que está sendo investigado, é preciso que o juiz, ao analisar o
pedido que venha do Ministério Público ou da Polícia, tenha muita serenidade, muita
cautela na apreciação desse pedido, porque, obrigatoriamente, a concessão da
quebra do sigilo telefônico vai invadir a privacidade do cidadão que está sendo
investigado. E isso é uma das garantias do nosso texto constitucional. Então, essa
medida deve ser uma excepcionalidade. Essa medida deve ser uma exceção e não
uma regra. Nós não podemos banalizar, nós não podemos vulgarizar uma medida
extrema, que se torna, em alguns casos, necessária para que possamos ter uma
investigação que possa retratar a verdade sobre alguém que está sendo investigado.
Outra questão que trago para reflexão é a execução da medida. Ao ser concedida
essa medida por um magistrado, o executor da medida também tem de ter muita
cautela para cumprir a decisão judicial no estrito termo da decisão; nenhum
milímetro a mais do que foi determinado pela ordem judicial. Eu estava comentando
com os colegas: se alguém está investigado pelo contrabando de cocaína, não pode
haver gravação, e será totalmente apagada qualquer outra conversa, mesmo que
essa outra conversa possa se tornar um crime ou uma conduta ilícita por aquela
pessoa que está sendo investigada. A decisão judicial, o executor da decisão judicial
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— isso tem de ser bem acompanhado pelo Poder Judiciário, pelo juiz que concedeu
— não pode ir além, minimamente que seja, do que a decisão judicial contempla no
requerimento que foi feito ao Poder Judiciário. E aí nós temos de ter esse
acompanhamento e ter muito cuidado com a pessoa ou com o Poder que vai
executar a medida. Também nós não poderemos admitir que esse colhimento de
prova, que esse mecanismo de investigação seja utilizado pelo executor para
qualquer outro objetivo de vulnerar, de fragilizar aquela pessoa que está sendo
investigada, ou vazar qualquer tipo de informação para a imprensa, se assim não
houve na decisão judicial, se assim não foi concedida na decisão judicial. Eu posso
me antecipar a alguns questionamentos. Acho, como disse no início, válido esse tipo
de prova. Acho que é um mecanismo que ajuda na investigação. Em alguns casos
— não em todos —, é extremamente necessário esse tipo de investigação. E a AMB
se posiciona a favor da escuta telefônica, lógico, através de uma decisão judicial. Há
um questionamento — não é uma matéria pacificada na doutrina, principalmente,
dos estudiosos, dos doutrinadores — sobre a questão da prova que alguns
consideram como prova ilícita; ou seja, a gravação feita sem autorização judicial. E
não é pacificada essa questão naquela gravação que é feita não para chantagear,
não para prejudicar, vamos dizer, deliberadamente algum cidadão brasileiro, mas
naquela gravação que a pessoa faz, sem a autorização judicial, para se proteger de
uma chantagem, para se proteger de uma pessoa que está tentando uma
exploração financeira ou coisa dessa natureza. E aí ele grava como meio de prova,
para se proteger daquele agente público ou de qualquer outro cidadão que esteja
querendo tirar proveito financeiro ou qualquer outro proveito, chantageando alguma
pessoa. É comum que se veja — são cenas que não são estranhas à sociedade
brasileira — algum comerciante que, diante de um fiscal que está exigindo alguma
propina, que está exigindo alguma quantia para não fiscalizar... para não fiscalizar o
seu estabelecimento comercial... E aí ele grava aquela conversa, aquela chantagem
por parte daquele fiscal, daquele agente público e mostra que estava sendo
chantageado para cometer um crime. Alguns acham que essa prova é válida, porque
ele fez isso no intuito, única e exclusivamente, de se proteger, de se defender.
Outros acham que ela não é válida, porque ela não foi obtida através de uma
decisão judicial. Fica esse tema. Acho que é um bom tema para que nós possamos
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fazer uma reflexão. É um bom tema para que nós possamos aperfeiçoar a nossa
legislação, porque a própria Constituição diz que a gravação é válida, desde que
seja através de uma decisão judicial. E não conta, não vale para o processo
nenhuma prova que foi obtida de forma ilícita, que foi obtida sem autorização
judicial. Acho que é um tema que nós poderíamos aprofundar, é um tema em que
esta Comissão daria uma grande contribuição ao Poder Legislativo, debruçando-se
sobre essa questão e pacificando na nossa legislação essa questão da gravação
para proteção de quem está sendo chantageado, para proteção de quem está sendo
coagido por algum cidadão ou por algum agente público qualquer. Eu me coloco à
disposição. Temos mais 3 expositores, mas me coloco à disposição para qualquer
questionamento, mais uma vez, agradecendo à Comissão a participação da AMB. E
não cabe um debate, na minha visão, mais longo, porque também não quero colocar
os meus colegas... vamos dizer assim, para que eles possam explorar outros pontos
e não sejam repetitivos. Não quero aqui trazer qualquer tipo de desconforto ou
constrangimento, apesar de serem pessoas extremamente qualificadas e que darão
uma grande contribuição ao debate. Eu agradeço, mais uma vez, à Comissão e me
coloco à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Eu agradeço a V.Exa. os
esclarecimentos, bastante pertinentes. E acho que existem muitos questionamentos
a serem feitos, no que diz respeito a essa questão das interceptações.
Para celeridade dos trabalhos, eu vou solicitar que os demais palestrantes
venham à Mesa e façam as suas palestras, para depois nós podermos fazer as
perguntas a todos. Dessa forma, acho que teremos mais celeridade nos trabalhos.
Então, convido o representante do Ministério Público Federal para vir fazer a
sua exposição... da Associação do Ministério Público Federal para vir fazer a sua
observação. V.Exa. poderá permanecer aqui também pelo prazo de 20 minutos, se
assim o desejar. E depois, em seguida, os representantes do Ministério Público
Estadual e da Associação do Ministério Público.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Sr. Presidente, posso fazer um
pedido?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Pois não.
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O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Eu tenho uma viagem hoje
para São Paulo. Se pudesse antecipar a minha exposição...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Já está deferido.
Convido para compor a Mesa o representante da AJUFE. Convido também o
Dr. Cosenzo para vir fazer parte da Mesa, para o seu posterior pronunciamento.
Com a palavra V.Exa.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Sr. Presidente, Deputado
Marcelo Itagiba, Exmo. Sr. Deputado Nelson Pellegrino, Relator da Comissão,
primeiramente, agradeço a deferência por ter atendido a minha solicitação para que
pudesse fazer logo a exposição, em razão da necessidade de ausentar-me por volta
das 5 horas da tarde. Como o colega Mozart já se pronunciou, esse é um tema que
merece bastante atenção não só dos operadores do Direito, mas da sociedade
brasileira em geral, que naturalmente é o Parlamento brasileiro. A questão da escuta
telefônica, pela primeira vez, foi disciplinada no nosso sistema na Constituição de
88. Até então, nós não tínhamos nada a respeito do sigilo telefônico, até porque a
Constituição era de 67, e a tecnologia da telecomunicação, os telefones ainda eram
em menor número. Mas, a partir de então, começou a haver uma série de
ilegalidades, com escutas clandestinas dos contatos telefônicos. Em razão disso, a
Constituição de 88 elegeu uma diretriz: colocou o sigilo telefônico dentro dos direitos
fundamentais e alvitrou apenas a possibilidade da interceptação telefônica na
hipótese em que ... Ou mesmo a ordem judicial, mesmo o juiz não pode dar uma
autorização para interceptação na hipótese em que seja matéria cível ou trabalhista.
E é de se estranhar que aqui e ali a gente veja algum juiz, em questão de natureza
cível, geralmente envolvendo questão familiar, determinar autorização de quebra do
sigilo telefônico ou mesmo em questão trabalhista. Eu acho até que deveria partir
uma recomendação para que o Conselho Nacional de Justiça editasse um ato
normativo expondo a vedação expressa para que juizes que não tenham jurisdição
de natureza criminal dêem autorização dessa ordem. Mas, nada obstante a
Constituição... E a lei que regulamentou a possibilidade da quebra do sigilo
telefônico demorou. Se nós imaginarmos que a Constituição é de 88, a lei só veio
em 96. E mesmo assim depois daquele rumoroso caso SIVAM. Aí se sentiu a
necessidade de se estabelecerem regras, porque lá houve a revelação inclusive de
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questões de ordem privada. E veio a edição da Lei nº 9.296, de 1996. Nada obstante
a lei, nós continuamos com problema quanto à escuta ilegal. Ela persistiu no nosso
sistema. Ainda hoje a escuta ilegal existe, e piorou ainda com o problema dos
vazamentos. E vazamentos seletivos daquilo que se quer que a imprensa divulgue
ou que se quer que a sociedade saiba. E, pior ainda, uma manipulação no
vazamento, às vezes tirando determinadas afirmações de um contexto e colocando
em outro e arranhando de forma irreversível a imagem e mesmo a reputação de
muitas pessoas. O interessante é que essa Lei nº 9.296, para mim, é até
excessivamente rigorosa, porque o caput do art. 8º da lei veda a revelação do
conteúdo do contato telefônico mesmo depois do trânsito em julgado de uma
sentença, mesmo que a sentença seja condenatória, independentemente de
qualquer tipo de crime. Ou seja, a lei foi tão severa que ninguém respeita essa lei.
Hoje tem uma escuta telefônica, amanhã está nos jornais e está nos maiores meios
de comunicação da sociedade. E aí também há uma coisa que temos de eleger:
será que é correto estabelecer o sigilo dessas gravações ou degravações? Porque
geralmente isso ocorre em casos mais rumorosos, em que a sociedade tem o maior
interesse em acompanhar os processos. Será que não houve um rigor do nosso
sistema? A gente partiu de uma época ditatorial, em que não havia intimidade com a
publicidade, muito menos no ambiente criminal. E o interessante é que, quando um
processo é contra José Joaquim da Silva Xavier, o processo é o mais público
possível. Mas, quando se está tratando de questões de pessoas que têm maior
posição perante a sociedade, o processo é logo tratado em caráter sigiloso ou em
segredo de Justiça. Então, esse dispositivo 8º, pelo rigorismo dele, levou ao
descumprimento completo da referida lei. Acho que a gente precisa flexibilizar esse
discurso. Primeiro, a gente deveria permitir a revelação, sim, do conteúdo das
gravações telefônicas, após a pessoa ter o direito de se manifestar sobre, ou se
defender, ou se explicar em que contexto aquelas afirmações foram dadas. Eu acho
que depois disso, e mesmo antes do trânsito em julgado, porque a própria sociedade
brasileira e a imprensa não vão aguardar todo esse tempo para revelar algo que
está chamando a atenção de toda a sociedade. Queremos aprimorar o sistema
normativo brasileiro que regula a matéria. Primeiro, tratar desse art. 8º e definir o
que se quer, porque, na verdade, se acha que é o mais pertinente para um Estado
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Democrático de Direito em que os processos judiciais, de regra, têm de ser públicos,
até porque existe um princípio também, como direito fundamental, que é o direito de
acesso à informação, tão em voga agora, depois da questão dos cartões
corporativos. Um outro aspecto referente a essa questão é que o juiz que determina
a quebra do sigilo telefônico, na verdade, toma conhecimento daquilo que a
autoridade policial leva para ele. Segundo a lei brasileira, uma escuta telefônica só
pode ser determinada pelo período de 15 dias, prorrogável, se indispensável, em
casos excepcionais, por mais 15. A autoridade policial, quando faz um
monitoramento, fica lá as 24 horas dos 15 dias. Obviamente que ele não manda
para o juiz o conteúdo das 24 horas dos 15 dias. Ele seleciona aquilo que acha que
é pertinente e relevante para a apuração do caso e manda para o juiz. Até porque,
se nós imaginarmos o que é a degravação, a degravação de 1 dia de contato
telefônico, a gente vai ver o quanto isso seria impraticável, como isso seria irreal.
Mas aí nós entramos em um outro problema. O que a autoridade policial encaminha
para o juiz? É o que ele quer? Ele pode sonegar uma informação ou algo que seja
pertinente para a investigação. Para isso, hoje, geralmente, quando um juiz decreta,
determina a quebra do sigilo telefônico, ele também determina que a operadora
encaminhe um relatório, uma espécie de extrato — ele vem em forma eletrônica —
de todos os contatos mantidos por aquela linha telefônica. De modo que, na hora em
que o juiz recebe a degravação e, por exemplo, só vem determinado conteúdo, e ele
identifica naquele relatório que teve um contato numa determinada hora, que teve
uma tal duração e que não consta naquele relatório, se ele entender que tem alguma
suspeita relativa a isso, ele pode determinar que seja revelado esse conteúdo que
não veio naquele CD que ele encaminhou nem na degravação. Isso é um grande
instrumento que vem com o tal do guardião. Parece-me que a grande virtude do
guardião é ele manter todos esses dados referentes ao que foi monitorado durante
todo aquele período. Mas, ainda assim, os relatórios... E o que a autoridade policial,
via de regra, reclama bastante, no âmbito da Justiça Federal, os delegados federais
e quem atua nessa área, é com relação a esses relatórios das operadoras. Não há
uma padronização. Era importante que houvesse uma padronização e que isso
fosse de uma rapidez maior. Essa é uma grande reclamação para que se tenha um
melhor rastreamento de eventual contato telefônico que não foi mencionado pela
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autoridade policial. Um outro problema da nossa norma e que deve ser enfrentado é
quanto a esse espaço temporal de 15 dias. A interceptação telefônica é uma
excepcionalidade, e como excepcionalidade deve ser tratada. Mas a gente deve ver
o que ocorre na prática. Numa grande operação de uma organização criminosa,
você determinar o monitoramento de uma linha telefônica por 15 dias e depois
prorrogar por mais 15... Eu tenho experiência própria. Em muitos casos isso não é
suficiente. Por isso, a jurisprudência dos tribunais brasileiros, inclusive do STJ, tem
tergiversado. Bom, a lei diz que são 15 dias, prorrogáveis por mais 15, mas, se
houver necessidade, pode prorrogar mais. E nós temos prorrogado. Eu tenho casos
concretos — mais de um caso concreto, vários casos — em que determinei por mais
de 30 dias. Mandei 15, depois mais 15, depois mais 15, mais 15, até se resolver
isso. Isso acontece muito — Bigonha talvez tenha experiência — quando a polícia
está naquela investigação controlada. Quando ela está na investigação controlada,
esperando para agir no momento em que se dá uma grande operação da
organização criminosa, isso ocorre. A gente não sabe se vai acontecer hoje ou
amanhã. Então, está havendo um acompanhamento por 15 dias, depois prorroga
por mais 15, e a operação vai ocorrer daqui a mais 15 dias. Ninguém vai deixar de
conceder uma autorização de prorrogação desse prazo. Então, esse é um outro
problema. Mas essas questões todas não resolvem 2 problemas sérios.
Continuamos com o problema da escuta ilegal e dos vazamentos. E os vazamentos
têm um adicional. A autoridade policial ou o Ministério Público pedem ao juiz a
interceptação de uma linha telefônica. O juiz autoriza e, por incrível que pareça, a
operadora... Geralmente essa relação é entre o juiz e a autoridade policial, mas a
operadora é que exige que a autoridade policial passe por fax para a operadora.
Olha o sigilo... Esse fax, de repente, pode ser recebido até pelo vigilante que
trabalha lá nessa operadora. Então, nessa relação, nós já temos 3 personagens ou 3
instituições trabalhando. Temos a autoridade policial, o Judiciário e a operadora.
Pelo menos uma pessoa de cada uma dessas instituições sabe que uma
determinada linha está interceptada. E o vazamento aí pode ocorrer em razão de
qualquer um desses 3 personagens. É um problema que as operadoras... Eu sei que
há muitas operadoras que já têm um setor especializado nesse sentido, já têm um
funcionário de maior confiança, mas eu quero crer que deveria haver uma
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padronização nesse sistema, personalização mesmo de quem é o funcionário na
operadora responsável por um determinado monitoramento telefônico, porque, por
mais que haja... As operadoras dizem que fazem o desvio do contato daquela
comunicação da linha telefônica para o órgão da polícia, mas os técnicos dizem que
pode ser que a operadora fique captando todo aquele contato. Nada obstante ele
tenha desviado para o órgão policial, mas ele pode captar todo o contato daquela
linha telefônica. Acho que essa é outra questão que deveria merecer atenção de se
colocar ou pelo menos tentar normatizar, ou padronizar uma forma de evitar que isso
eventualmente pudesse vir a ocorrer.
Quanto ao vazamento de informações, nós temos um problema sério, porque
a lei, embora aqui o art. 10 fale que isso se trata de crime, ele não impõe e, pela
leitura mesmo — há uma discussão a esse respeito —, ele não prevê nenhuma
punição para o veículo de comunicação que faz a divulgação. E, por isso mesmo,
ninguém sabe quem foi que vazou para a imprensa, mas todos os dias a imprensa
veicula essas informações. Penso que aqui, primeiro, a gente teria que quebrar a
rigidez do art. 8º. Não se pode impor o sigilo absoluto, tal como está, flexibilizar a
norma, dizer da possibilidade de haver a divulgação depois que a pessoa tiver o
direito de se defender e se explicar a respeito de que em que contexto foram dadas
aquelas declarações. Depois disso, deveria ser complementado que o órgão de
imprensa que fizer essa divulgação antes desse momento será punido civilmente,
multa alta. Porque não adianta acrescentar que a pena é de “x” e botar mais “x”,
porque isso não vai resolver. Tem que haver uma punição também para o órgão de
comunicação que está fazendo a divulgação indevidamente, tal como está previsto
na norma. Eu acho que era uma outra questão que deveria merecer atenção no
aperfeiçoamento de nosso sistema de se colocar aí a previsão de uma sanção
pecuniária para os órgãos de imprensa que violarem a norma depois dessa
flexibilização do art. 8º. Se o art. 8º não for flexibilizado, continuar o sigilo absoluto,
aí nem essa norma — porque ela vai contra a natureza das coisas — vai ter eficácia
no plano real.
Por fim, gostaria de chamar a atenção que o problema da escuta ilegal é
porque a gente tem uma gama imensa de possibilidades de fazer escuta ilegal com
equipamentos eletrônicos que estão dispostos no mercado. Precisa haver um
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controle da comercialização desses instrumentos, desses equipamentos de
interceptação. O cidadão entra na Internet, e qualquer um pode comprar um
equipamento de escuta telefônica. Ora, para que o cidadão quer um equipamento de
escuta telefônica, se só quem pode fazer é a autoridade policial com ordem judicial?
Então, se nós queremos enfrentar essa parte, vamos ter de tratar de ter uma
regulação melhor desse mercado. Os senhores sabem muito mais do que eu como é
que isso poderia se dar ou se isso é viável, mas eu acho que... Senão, nós vamos
ficar aqui falando amanhã de novo do problema das escutas ilegais, hoje mais do
que corriqueiras em nosso sistema. Chega a ponto de, numa operação importante,
como a Operação Navalha, o Ministro Gilmar, quando foi analisar um habeas
corpus, ele verificou que existia prova que estava lá nos autos que tinha sido colhida
como intercepção telefônica antes da autorização judicial. Infelizmente, também
algumas coisas que a gente sente... Às vezes, quando a autoridade policial vem
conversar conosco e vem pedir a autorização para a interceptação, eu fico querendo
saber de onde são as notícias, e diz: “Não, nós temos... É um informante”. Que
informante é esse? Muitas vezes, é por uma interceptação ilícita mesmo. Ele não
tem aquilo concretamente — esse seria o informante eletrônico —, e aí depois ele
vem e pede a autorização da interceptação, que nós damos, e realmente vem a se
descobrir.
Eu acho que a escuta telefônica é um modo inteligente de investigação, é um
instrumento mais do que importante para os grandes crimes e de organização
criminosa, é o instrumento expedito para tal, mas a gente precisa aperfeiçoar o
nosso sistema normativo.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Atendendo à solicitação do
Relator, eu primeiro farei os debates com os representantes do Judiciário e, em
seguida, com os representantes do Ministério Público. Àqueles que ainda não deram
suas presenças no plenário, informo que está havendo necessidade de fazê-lo.
Então, antes de passar a palavra ao Relator, eu só gostaria de fazer 3 colocações
que eu acho que são bastante importantes, tendo em vista o teor daquilo que nós
estamos apurando nesta CPI e até para que V.Exas. tenham conhecimento de quais
são os nossos objetivos. Primeiro, as escutas chamadas legais e suas formas de
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controle; segundo, as escutas chamadas ilegais propriamente ditas; e, terceiro, a
questão dos equipamentos, como muito bem V.Exa. assinalou — quem os fiscaliza,
quem os cria, de que forma são utilizados. Eu acho que essas questões estão dentro
do escopo da nossa Comissão Parlamentar de Inquérito.
E uma das dúvidas, que acho seria interessante se V.Exas. pudessem nos
dizer, seria no seguinte sentido: primeiro, os senhores acham que o juiz deve ouvir o
todo ou também será o juiz um objeto da censura daquele que encaminha a
gravação de só ouvir os melhores trechos? E se todo o gravado também deve ser
periciado. Porque eu acho que, se aquele é instrumento de prova, aí fica a pergunta
de se a convicção do juiz não deveria ser em função do todo. Então, quando a lei
estabelece 15 mais 15, é porque a lei é sábia, porque a lei sabe que ninguém vai
conseguir ouvir, para julgar um caso, 360 dias, como hoje é uma proposta que talvez
venha ao Congresso Nacional. A outra questão é se o todo deve ser degravado e
periciado ou não. A terceira posição é a questão — que V.Exa. muito bem o disse —
de que só a autoridade policial pode fazer a escuta.
Então, eu gostaria de, para iniciar, e depois passando em seguida a palavra
ao Relator, ouvir as considerações de V.Exas. a respeito desses 3 tópicos.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Boa-tarde a todos e a todas.
Sr. Presidente da Comissão, Deputado Marcelo Itagiba; demais integrantes; todos
que têm acompanhado aqui os nossos trabalhos; Dr. Mozart Valadares, Presidente
da AMB; Dr. Walter Júnior, Presidente da AJUFE; demais representantes do
Ministério Público, que logo se posicionarão, penso que esta Comissão Parlamentar
de Inquérito — tenho dito isso e quero até reafirmar — tem um papel muito
importante. Talvez uma das CPIs mais importantes que este Congresso já teve,
embora talvez não tenha a notoriedade e o barulho que outras fizeram. A
importância dela é porque ela mexe hoje com um direito que é fundamental, que é o
direito ao sigilo das suas ligações telefônicas. Esse é um direito constitucional.
Sendo um direito, ele deve ser assegurado. Assegurado pela nossa Constituição,
como o é, assegurado pela Lei nº 9.296, como também o é, assegurado
primeiramente pela autoridade judiciária, a quem cabe a flexibilização desse direito,
a quem cabe autorização da suspensão desse direito — portanto, uma medida
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excepcional —, e também pelas autoridades encarregadas de executar a quebra
desse direito, no caso o Ministério Público ou a autoridade policial.
Ao curso dos trabalhos aqui, de uma certa forma, um senso comum que
tomou conta da sociedade brasileira hoje é estarmos vivendo na era do big brother.
Não do Big Brother da Globo, mas o big brother daquele Estado que constantemente
investiga o cidadão, daquele Estado que controla 24 horas por dia, através de
câmera, a vida do cidadão. E a sensação que temos hoje na nossa sociedade é a
sensação de que todos estamos grampeados — essa é a sensação —, legal ou
ilegalmente. É senso comum isso na nossa sociedade. É evidente que há algum
conteúdo, digamos assim, de exagero nessa ação, embora, no curso dos trabalhos
aqui, muitas das suspeitas que tínhamos vêm sendo confirmadas: primeiro, que é
muito fácil grampear neste País, seja a linha fixa, seja a linha móvel, é muito fácil
fazer um grampo; segundo, há todo um aparato tecnológico posto no mercado, sem
nenhum tipo de fiscalização, que é oferecido para esse tipo de trabalho. Os
procedimentos que as operadores estabelecem não são suficientes para garantir o
sigilo dessas ligações telefônicas. E aí, um pouco para polemizar, a sensação que
também nós ficamos é de que isso...
Volta e meia chega ao ouvido desta Comissão e ao do Relator que tem
havido uma permissividade grande na concessão de pedidos de interceptações
telefônicas. Aí eu queria um pouco, sem ser redundante, para que a gente possa
fazer o diálogo... Eu penso que a presença aqui da AMB e da AJUFE, que são
entidades que representam os magistrados brasileiros, é bastante importante, como
também a da Associação do Ministério Público Federal e dos Ministérios Públicos
Estaduais é importante. Como foi dito aqui pelo Deputado Marcelo Itagiba, a nossa
intenção não é só apurar o fato, mas acima de tudo — talvez essa seja a grande
contribuição da Comissão — é dar contribuições para aprimorar a legislação, para
aprimorar o sistema, para poder ter esse direito constitucional, que está assegurado.
Mas, vejam bem, no art. 2º da Lei nº 9.296, já chama a atenção no inciso I. O
que diz o inciso I? O art. 2º está transcrito nos seguintes termos:
“Art. 2° Não será admitida a interceptação de
comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das
seguintes hipóteses:
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É um direito constitucional, é uma exceção.
I - não houver indícios razoáveis da autoria ou
participação em infração penal;”
Bom, esta é a primeira pergunta que eu teria a fazer ao Dr. Mozart e ao Dr.
Walter Júnior: os nossos magistrados, os magistrados brasileiros estão nas
concessões dessas autorizações observando o art. 2º? Estão sendo cautelosos na
concessão dessas medidas, que eu considero excepcionais? O inciso II também é
muito claro. Ele fala que não será admitida essa interceptação quando for possível
fazer essa prova por outros meios disponíveis. Portanto, o que o legislador quis?
Quis que esse meio fosse o meio excepcional, não uma regra, não o primeiro meio.
Se você tem condições de elucidar aquele crime por outros meios, não se deve
lançar mão desse? Porque, ao interceptar uma ligação telefônica, que, volto a dizer,
é um direito constitucional, vai-se invadir a vida de um cidadão, vai-se invadir a vida
de outras pessoas que poderão ligar para ele — e que não têm nada a ver com a
história — e poderão estar expondo a sua vida pessoal. E poderão, por força de
mecanismos que quero abordar mais adiante — o Dr. Walter também teve
oportunidade de falar sobre isso, e o Dr. Mozart —, que é garantir o sigilo do que é
interceptado, porque o sigilo do que se é interceptado não é só o problema do
conteúdo criminoso, mas tem o conteúdo pessoal, o conteúdo de terceiros que
também ligam.
Então, a primeira indagação que eu queria dialogar com ambos os
representantes da magistratura é sobre justamente o art. 2º, como está sendo o
critério, a preocupação na observação do art. 2º. Como também tem o art. 4º, que
tem muito a ver com o art. 2º, que é a fundamentação da decisão que concede esse
tipo de violência, porque é uma violência do Estado, necessária, indiscutivelmente,
mas é uma violência do Estado, se as decisões estão sendo fundamentadas e, até
de forma antecedente, se há uma preocupação da autoridade judiciária, com a
fundamentação inclusive da autoridade policial ou do Ministério Público. A lei
estabelece isso, a necessidade da devida fundamentação, porque, volto a dizer, já
ouvi: “Não, tudo o que a gente pede o juiz dá. Às vezes até dá o que não há,
entendeu?” Esse é um problema.
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Tem um outro elemento que também para mim é importante e gostaria que
fosse objeto de comentário também é essa questão do prazo. Já foi observado aí.
Mas o fato é o seguinte: a lei, quando estabeleceu 15 mais 15, ela tinha algum
sentido. O Deputado Marcelo Itagiba já procurou abordar. Mas é preciso que haja
uma razoabilidade também nisso. Mas, independente até de chegarmos, digamos
assim, à opinião de que esse prazo possa ser dilatado, possa ser amplificado — o
Dr. Walter discorreu aí sobre a jurisprudência do STJ —, mas eu temo que seja
ilegal a interceptação que exceda 30 dias, ao teor da lei. Esse é um debate, porque
isso vai bater no Supremo, se é constitucional ou não é constitucional essa prova.
Esse é um outro debate que eu considero de suma importância.
A lei não é explícita em relação a isso, mas a leitura do conteúdo dela — eu
gostaria que o Dr. Mozart e o Dr. Walter comentassem sobre isso —, o espírito da lei
é que o grande guardião, além da nossa Constituição, do sigilo telefônico, é o juiz.
Ele é o grande guardião, ele é quem recebe o pedido, ele é quem verifica se tem
fundamentação, se há outro meio de prova que pode ser obtido, se há necessidade.
E a autoridade inclusive ela é obrigada a encaminhar um relatório ao juiz de tudo o
que aconteceu.
Então, a grande discussão é a seguinte: será que alguns dos nossos juízes
estão autorizando essas interceptações? E o fato só de autorizar eles se consideram
desobrigados a acompanhar todo esse procedimento? Será que não é o juiz o
guardião? Os procedimentos dessa lei — e eu entendo que é o juiz o grande
guardião de que esse roteiro que está estabelecido aqui na lei se ele está sendo
cumprido, se está assegurando, se o sigilo está sendo assegurado, se a operadora
está ou não está verificando se tem uma ordem judicial, porque já chegaram
denúncias aqui inclusive por pessoas das operadoras de que mandados são
falsificados. Chegam nas operadoras mandados falsificados. Ou será que o juiz não
tem obrigação de ser uma espécie de corregedor do Ministério Público e da
autoridade policial no cumprimento da determinação dele? Será que, ao final desse
procedimento, ele também não teria um caráter correcional para saber se essa
interceptação se deu dentro dos parâmetros da legislação pertinente? Eu penso que
sim, eu penso que sim. A outra questão é a questão do sigilo. Eu entendo que, a não
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ser que flexibilizemos a legislação, como aqui sugeriu o Dr. Mozart, eu entendo que
é um crime divulgar o conteúdo do que é interceptado.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Eu que sugeri.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Hein?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Fui eu que sugeri.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Pois é. É um crime, é um
crime. Porque eu entendo o seguinte: ontem, nós ouvimos aqui, Dr. Walter, o
representante da empresa que fabrica o guardião. Algumas informações aqui que
foram prestadas foram informações relevantes. A primeira é de que o guardião tem
um sistema, digamos assim, de que ele registra tudo o que acontece. No momento
em que a interceptação ocorre, ele registra que aquela interceptação está ocorrendo
por determinação judicial. Parece-me até que registra quem foi o juiz que autorizou.
Ele registra a data do início da operação. E talvez até por isso que o Ministro Gilmar
Mendes possa ter verificado que ele tem a data do início da operação, o horário em
que a operação ela ocorreu. E, segundo inclusive ontem o representante da
empresa, o profissional que acessa o sistema estava registrado. O próprio sistema
permite uma auditoria dele próprio.
Então, o juiz pode verificar, inclusive ele pode auditar o sistema e ver se a sua
determinação foi cumprida nos termos que a lei estabelece. Então, eu penso o
seguinte — o Deputado Marcelo Itagiba é o Presidente da Comissão Parlamentar de
Inquérito: se nós recebemos documentos sigilos, esses documentos vazam, a
responsabilidade é de quem? Do Presidente da Comissão de Inquérito. A não ser
que, no curso da apuração, fique comprovado que algum Parlamentar obteve essa
informação e vazou, a responsabilidade é dele. Então, o vazamento dessas
informações — e aí é um diálogo que eu quero inclusive estabelecer com o
Ministério Público a posteriori — constitui crime por tal, porque seja quem vaze,
inclusive pela imprensa, porque esse é o teor da lei. Isso tem que ser objeto de
algum nível de providência.
Por último, tem um elemento que eu penso que também é muito importante,
que nós precisávamos dialogar sobre ele, que é o problema da edição do conteúdo
do que é objeto do relatório, a edição e a interpretação. Como isso é visto também,
porque a transcrição teria que ser na íntegra, com garantias de que não há edição,
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porque pode chegar ao magistrado um conteúdo editado, onde a supressão de uma
frase, a supressão de uma expressão pode alterar... Uma vírgula altera o sentido de
uma frase, de um parágrafo. Imagine uma edição. Qual é a garantia que se tem, que
o magistrado tem? Qual é a supervisão que ele estabelece para saber se aquele
conteúdo foi ou não foi editado? Que é fundamental para a formação da prova. Não
só a edição, como também a interpretação, porque há uma interpretação também,
que, evidentemente, tem que se harmonizar com o conjunto da prova, com o
conjunto do inquérito policial. Portanto, são essas as primeiras indagações que eu
gostaria de fazer aí aos representantes da magistratura.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Eu gostaria apenas de
aproveitar as colocações pertinentes e perfeitas do Relator para colocar um pouco
mais de pimenta nessa questão, que é a questão relativa ao procedimento brasileiro,
que é acusatório. E, enquanto acusatório... Eu sou defensor de um sistema que gera
muita polêmica, que é o sistema do DIPO paulista, porque há um juiz vinculado às
chamadas medidas cautelares, porque hoje não se faz polícia sem o exercício das
medidas cautelares de busca e apreensão, de prisão preventiva, de interceptação
telefônica, para que o juiz que vai julgar a causa não esteja comprometido com a
busca no processo acusatório. Então, é uma outra questão que eu coloco que seria
importante para que o juiz pudesse de fato ter a isenção necessária e não se
contaminou na busca da prova, junto com a autoridade policial, para formar a sua
convicção. Então, eu acho que essa é uma questão também que é importante. E eu
gostaria de colocar na discussão.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Se V.Exa. me permite, inclusive
fazia parte até parte do objeto da minha inquirição, porque eu não sou advogado,
mas militante, mas, até onde aprendi na faculdade — pode ser que a jurisprudência
tenha estabelecido algo de inovador, até alguma legislação esparsa que eu
desconheça —, mas a quem cabe colher a prova no inquérito é a autoridade policial.
Ao juiz cabe fazer a instrução criminal. Então, o que está havendo? Eu tenho ouvido
aí algumas operações. Magistrados presidindo a colheita da prova. Como é que o
magistrado preside a colheita da prova e depois vai julgar? Eu presenciei isso. É
como se fosse um juizado de instrução. A instituição do juizado de instrução, a
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introdução do juizado de instrução dentro do procedimento processual brasileiro,
sem que haja amparo na lei. Então, é um contágio irremediável. É como se...
E aí é uma espécie de confusão entre o interrogatório, que é o primeiro ato da
peça do processo penal, com a colheita da prova, até para poder depois decidir se
libera ou se não libera. Então, eu gostaria também que essa questão fosse posta,
porque também faz parte dessa discussão, como também a questão da destruição
da prova. A lei é clara em relação a isso. Inclusive o interceptado tem direito a
presenciar o ato de destruição da prova, se isso ocorre. Aquela prova que, segundo
a lei, é imprestável para o processo, para o inquérito e que não seja de utilidade.
Não tenho conhecimento de nenhum ato de destruição de prova, que é uma coisa
que também gostaria que houvesse um comentário. É o que estabelece a lei,
inclusive, um ato que deva ser determinado pela autoridade judiciária. E, voltando ao
meu ponto de vista, o grande guardião desse direito constitucional, além da
Constituição, é, sem dúvida nenhuma, o magistrado. Ele é o verdadeiro guardião.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Com a palavra... Há algum
questionamento da parte dos Srs. Deputados?
(Intervenções fora do microfone. Inaudíveis.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Então, seria importante se
V.Exas... As inscrições, por favor.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Então, a primeira inscrita é
a Deputada Marina Maggessi, do PPS, Rio de Janeiro.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Primeiramente, quero pedir
desculpas a todos aqui porque eu não pude permanecer por causa da eleição do
Presidente da Comissão de Segurança Pública e Crime Organizado, da qual faço
parte.
Mais ou menos, escutei sua fala final, principalmente. Concordo em gênero,
número e grau com o senhor. Também gostei muito do que disse o Relator. Nós já
tivemos uma conversa hoje à tarde, e o Dr. Marcelo Itagiba dispensa comentários
porque nos conhecemos há muito tempo, inclusive, trabalhamos juntos na profissão
policial. Acho que todo mundo me conhece, sou policial há 18 anos, sempre
trabalhei com grampo eletrônico, enfim.
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Hoje, o que tenho visto acontecer no Brasil... Graças a Deus, esta CPI chegou
ao grampo legal, porque eu sempre falei ao Dr. Marcelo que a minha meta aqui era
mostrar ao País o que está sendo feito com o grampo legal. Se V.Exas. soubessem
o quanto são induzidos a erro, todas essas operações seriam anuladas. Todas, sem
exceção. E me dirijo ao senhor, Presidente da AJUFE, inclusive.
Quero dizer aqui nesta Comissão e ao Presidente que chegou às minhas
mãos um vídeo onde um Procurador da República e um Delegado da Polícia Federal
interrogam uma testemunha que é um policial federal preso, os 3 numa sala. O
Policial preso com um celular na mão, e ele diz ao preso: “Eu te solto, eu consigo
resolver o teu problema no Rio de Janeiro. Você pode falar o que você quiser que eu
te solto, porque a Juíza faz o que a gente quer. É: pede, defere; pede, defere”. Vou
apresentar esse vídeo aqui semana que vem.
Então, o Judiciário é induzido a erro não só na hora em que dá o número de
telefone, que o Judiciário nunca vê se aquele telefone é daquela pessoa mesmo! Se
eu quero ouvir o Dr. Marcelo Itagiba, eu escuto. Eu estou no grampo de um bandido
ou de alguém suspeito e, aí, esse bandido fala com alguém chamado Marcelo, ou
mais: coloco alguém para falar, para ligar para esse bandido e falar: “Quem está
falando aqui é o Marcelo”. Aí, eu digo para o... que o Marcelo com quem ele está
falando é o Marcelo Itagiba! E não mostro para o Judiciário. Quando eu uso a
primeira palavra é por causa da minha experiência e pelo que eu estou vendo
acontecer.
Estou com muito material, tenho material demais para apresentar nesta CPI.
Acho que isso vai revolucionar o grampo legal no Brasil e mostrar como os
magistrados são induzidos a erro e como a maioria dos procuradores também são.
Porque, como o Relator disse, a autoridade policial e os agentes têm como colher
prova, mas têm como inventar prova, têm como retirar frases de contexto e colocar o
que querem, têm como acabar com a vida de uma pessoa. O próprio Ministro Gilmar
Mendes foi colocado como fazendo parte de uma quadrilha, e era um homônimo. De
quem é essa responsabilidade? É do delegado que assina.
Mas os senhores sabem, por acaso, como é feita a escuta, hoje? Algum de
vocês sabe como é feita? É um revezamento de agentes que não tem nenhum
compromisso com a investigação. O cara é um agente policial. Ele senta, escuta,
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levanta. Acabou o turno dele de 6 horas, ele vai para casa, senta um outro que não
escuta aquilo que ele escutou. Aquilo vai passando. Aí, senta outro, mais 6 horas,
senta outro. O absurdo, hoje, é tanto que chega a haver interpretação, onde o
policial coloca, assim, entre parênteses: “(A voz meio amedrontada)”. V.Exas. não
escutam o áudio. Não escutam o áudio.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - (Intervenção fora do microfone.
Inaudível.)
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Bom, quando o senhor pede. O
senhor trabalha com criminal?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Trabalho.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - E o senhor desconfia às vezes
dessas provas?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Desconfio.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Que bom. Escutei no final o
senhor falando isso.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Não é só o meu caso, não,
mas vários.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Por quê? Eu vou trazer, aqui, as
duas grandes operações realizadas no Rio de Janeiro, e eu vou mostrar, pretendo
mostrar aqui. Ah, vou começar por esse vídeo, para mostrar a manipulação do
Judiciário, pelo menos, nesse caso, como se coloca o Judiciário manipulado, vamos
dizer assim, e o total descompromisso desse agente. Não sei no caso de V.Exa.,
mas eu, no Rio de Janeiro, não vejo os agentes irem depor, quem vai é o delegado.
Entendeu? E que muitas vezes também não está de tanta má-fé, às vezes, é só
incompetência, porque ele também não tem condições, nem tempo, nem quer.
Agora, eu sei que essa coisa do guardião que liga aqui direto, que liga vários
números, isso eu sei que não existe. Até porque quem quer grampear ilegalmente
não faz isso, manda jogar no gravador. E grampo ilegal só serve para chantagem.
Grampo ilegal serve para chantagem, serve para monitorar pessoas traídas, como
eu falei, aqui, outro dia, é para isso, espionagem industrial. Não é o que vem...
Como agora está a Gautama, de novo, na revista ISTOÉ. Entendeu? Então, não é...
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Só com o grampo legal se faz isso, porque a imprensa quer vender jornal. Está lá no
papel dela. Ela não tem que apurar se aquilo é verdade ou não.
Então, o que eu gostaria de perguntar a vocês era isso. O senhor, eu acho até
que já me respondeu. Até onde os senhores, como é que se diz, aprofundam-se
numa investigação policial? Até onde vocês escolhem aquilo que vale ou não como
prova e verificam o que foi que faltou num contexto? O senhor sabe o que se pode
mudar. Se o Dr. Marcelo fala: “Eu amo a minha mulher, mas eu detesto fulana”, e
sai: “Eu detesto minha mulher”.
E vou dizer mais, Sr. Presidente. Eu tenho também um laudo do perito Molina
mostrando todas as edições da operação. É tudo editado, sem exceção. E ontem,
quando eu perguntei à diretora da Dígitro se o guardião ficava com a memória ou se
quando a mídia é destruída se perdia a prova, ela esclareceu a todos aqui que não,
que o guardião fica com todas as provas. Isso também para mim foi um alívio porque
eu já recebi como resposta que o áudio estava com problemas técnicos e aquilo
havia se perdido.
Bom, então, a minha pergunta a vocês é esta: até que ponto vocês se
aprofundam nisso?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - O Deputado Maurício é o
próximo inscrito. Com a palavra.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Sr. Presidente, Dr.
Walter, Dr. Mozart, membros do Ministério Público, vou ser breve porque eu fui
informado que alguns dos nossos convidados terão que se ausentar, e nós também
estamos em sessão extraordinária do Congresso. O que é uma pena, porque eu
acho que esta é uma das audiências mais importantes desta Comissão. Acho que
nós vamos ter que fazer uma nova audiência quando o Relator estiver finalizando o
marco legal a que se propõe esta CPI.
Então, eu vou tratar, basicamente, de 2 temas da lei. Eles já foram tratados
num certo contexto, mas eu queria a opinião dos membros do Poder Judiciário sobre
duas questões principalmente. A primeira é essa questão da contextualização feita
pela autoridade policial.
O § 2º do art. 6º da lei diz que:
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“Cumprida a diligência, a autoridade policial
encaminhará o resultado da interceptação ao juiz,
acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter
o resumo das operações realizadas”.
Mas o que a gente verifica é que a autoridade policial está fazendo a
interpretação, quando não faz o julgamento daquelas interpretações. E aí os
senhores são levados ao erro.
Eu fico sinceramente muito mais tranqüilo — ao contrário da opinião do
Relator — quando o próprio juiz está fazendo o tratamento dos dados da
interceptação. Eu acho que ele tem muito mais condições de fazer isso do que a
autoridade policial. Então, eu primeiro pergunto a V.Exa. o que acha disso e como é
que isso tem sido tratado.
Vou dar um exemplo. Aconteceu uma operação lá em Maceió, e nessas
interceptações, um dos investigados foi pego conversando sobre um bolão de loteria
esportiva — da loteria esportiva ou da Mega-Sena — com os funcionários da sua
empresa. E a autoridade policial assim coloca: “Não é objeto da investigação, mas
apenas para corroborar com as investigações e mostrar o caráter do investigado
praticante de jogo de azar”.
Então, isso... Eu estou dando um exemplo, mas nós temos vários exemplos
do contexto da interceptação interpretado pela autoridade policial, que me parece
que não é a sua atribuição. E a lei diz claramente que não é.
Então, esses inquéritos precisam ser, não digo anulados, mas, a partir de
agora, tratados da forma como a lei determina. E eu pergunto o que a Associação
dos Juízes Federais, o que os magistrados do Brasil têm feito em relação a isso.
A outra questão é sobre os vazamentos. A lei é absolutamente clara: ela
criminaliza o vazamento dessas informações. E o que a gente tem acompanhado é
que durante essas operações, principalmente a autoridade policial promove esse
vazamento. Ela, a autoridade policial, é que promove esse vazamento. E eu não
conheço, eu não tenho conhecimento aqui de ninguém, nenhum agente, nenhum
delegado de Polícia Federal que esteja sendo processado neste País ou
respondendo a inquérito administrativo porque tem vazado informação. E também a
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gente não verifica a reação do magistrado em relação a isso. Parece que é bom
vazar informação.
Aliás, hoje eu vi, pela primeira vez, um juiz federal, aqui do Distrito Federal,
que mandou quebrar o sigilo do site do You Tube porque tinham sido colocadas,
vinculadas escutas telefônicas da operação aqui do Banco de Brasília. É o único juiz
federal que eu vi fazer isso, por enquanto.
Então, são essas duas questões que eu queria saber.
E como é que está se dando hoje a questão do descarte dessas operações.
Ontem a representante da empresa que fornece o guardião disse o seguinte: que o
guardião é um instrumento, é um gravador. Você pode descartar o guardião, mas a
polícia tem como gravar aquelas informações e deixar lá num arquivo ab aeterno.
Então, é preciso talvez que a norma especifique como é que vai se dar esse
descarte e como é que vai ser tratada essa questão das informações. Porque a
gente sabe que vaza. Quem vaza é autoridade policial, advogado, não é? Advogado
das partes vaza essas informações. Então, nós precisamos verificar uma forma de
esse sigilo ser preservado.
E aqui eu queria... É uma opinião minha, mas eu acho que o Congresso
Nacional deu à sociedade brasileira um instrumento importantíssimo, que é a
possibilidade da interceptação telefônica em processos criminais. Apenas por conta
disso é que nós conseguimos desbaratar milhares de organizações criminosas no
País. Mas, lamentavelmente, acho que o Poder Judiciário banalizou essa legislação,
ou por ser uma legislação muito nova, frouxa, mas banalizou o serviço. A gente tem
que ter muito cuidado para que um instrumento tão precioso como esse não se torne
objeto de voyeurismo por parte de agentes e até de juízes também federais.
Então, eu pergunto a V.Exa.: na sua opinião, quais são os instrumentos legais
que esta CPI pode dar, contribuir, para que a gente fortaleça essa norma e ela seja
usada, daqui para a frente, de forma mais eficiente?
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Com a palavra o Deputado
Laerte Bessa, o próximo inscrito.
O SR. DEPUTADO LAERTE BESSA - Sr. Presidente, primeiro eu queria
cumprimentar os nossos magistrados representando aqui o Judiciário. É um prazer
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recebê-los. Cumprimento também os representantes do Ministério Público, já
conhecidos por nós, amigos, companheiros.
Sr. Presidente, eu queria apenas fazer um comentário do que a nossa colega
Marina falou aqui. Eu queria esclarecer que essas denúncias da Deputada Marina
são muito graves. Muito graves. Eu acredito, pelo que ela falou, que isso acontece
no Rio de Janeiro, porque ela é policial lá há 18 anos e ela sabe o que realmente
acontece.
Mas quero esclarecer, Sr. Presidente, que isso não é uma normal geral, não.
Não é uma norma geral porque eu conheço as investigações de vários Estados e
posso afirmar que aqui no Distrito Federal não existe isso. As investigações e as
interceptações telefônicas aqui são muito bem conduzidas. Nós temos uma central
que conduz essa interceptação. E quando ela não é coordenada e fiscalizada pelo
delegado chefe, ela tem a participação do Ministério Público para dar uma maior
transparência a esse tipo de investigação. Então, eu quero esclarecer que essa
situação do Rio de Janeiro é grave, mas não é um caso geral no país. Acredito que
seja até um fato isolado do Rio de Janeiro porque... Bom, não vamos discutir isso,
não.
A minha pergunta é para o Dr. Walter.
Dr. Walter, o senhor declarou que está muito contrariado ao ver na Internet
anúncio de venda de equipamentos que interceptam freqüência e ligações
telefônicas.
Eu queria o posicionamento V.Exa, e até do Dr. Mozart, com respeito a hoje
estarem adquirindo esse equipamento o Ministério Público e a Polícia Militar. V.Exa.
disse que é de competência do delegado a autoridade policial requerer ao Judiciário
a interceptação. Hoje, em nosso País está acontecendo que o Ministério Público
está comprando equipamento e está usando, está, no meu entender, usurpando a
função da Polícia Civil, e a Polícia Militar também está fazendo esse tipo de escuta.
Eu queria o parecer de V.Exa.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Mais algum inscrito para
questionamento?
O Deputado Simão Sessim está com a palavra. Em seguida, o Deputado
Couto.
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O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - (Intervenção fora do microfone.
Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - V.Exa. é o último? Então, o
Deputado Couto com a palavra. Depois, V.Exa.
V.Exa. me disse e eu confio na sua palavra de que é o último. Eu confio na
palavra de V.Exa. O Deputado Luiz Couto ainda não assinou a lista. Então, o
Deputado Simão Sessim com a palavra.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Sr. Presidente, eu queria antes saudar
essa Mesa que hoje traz para nós figuras ilustres, tenho certeza que todas imbuídas
do mesmo espírito de colaborar com esta Comissão.
Esta CPI surgiu por inspiração de V.Exa., Deputado Marcelo Itagiba,
preocupado não só com o clima que começou a se formar através de escutas legais
e ilegais, e principalmente porque já está atingindo o Supremo Tribunal Federal.
Então, nós estamos diante, talvez aqui, das peças principais. Como disse o
Deputado Maurício, nós estamos diante das principais figuras que podem nos
esclarecer o que é legal e o que é ilegal. Estamos diante de autoridades,
naturalmente, de associação, mas que labutam, que têm a experiência da passagem
pela função de juiz, ou de procurador, ou de membro do Ministério Público.
Mas eu queria dizer o seguinte: o arcabouço legal, pela Constituição, no seu
art. 5º, incisos X, XI e XII, depois regulamentada pela lei — na época, 1996, era
Ministro da Justiça Nelson Jobim —, parece que nós estamos restritos a isso, em
termos legais.
Eu cheguei agora. Costumo me nortear pelas perguntas, pelas exposições
sempre didáticas dos nossos convidados e pelo nosso Relator, que coloca de
maneira bem objetiva as perguntas depois servirão para seu relatório. Então, não sei
se serei intempestivo nas minhas perguntas. Lamentavelmente, esta Casa... Neste
instante, acabei de votar. Nós estamos na ordem do dia, votando,
concomitantemente com uma CPI funcionando. O Regimento não permite, mas,
como se trata de oitiva, nada atrapalha. Fosse deliberativa, nós teríamos que
suspender a sessão.
Então, queria aproveitar, pedindo desculpas inicialmente se, por acaso, estou
sendo intempestivo, estou fazendo pergunta já respondida ou nas explicações ou
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pelo Relator. Primeiro, dentro desse arcabouço legal, da Constituição, da lei de
1996, eu pergunto: V.Exas. se sentem — e faço a pergunta dirigida a todos —
confortáveis para apreciar essa matéria, que virou uma paranóia dentro da
sociedade brasileira? Ou nós, legisladores, precisamos alterá-la, complementá-la ou
amarrá-la de maneira mais precisa para que os senhores tenham condições de
enxugar esse caos que se instalou? Dentro da própria exigência legal, erros são
cometidos, às vezes, de forma até gritante.
Eu não sei se passou por vocês, mas tem casos de convite, de pedido de
interceptação, a polícia pede, o Ministério Público dá a favor, o juiz dá diretamente,
não sei como é que faz. O problema é que acontecem coisas mais ou menos assim:
interceptação de fatos já passados, que são esquentados posteriormente e que
ninguém sabe se está sendo ouvido dali para a frente ou para trás. A operadora é
que vai depois explicar ou, então, o assunto vem à baila posteriormente. Às vezes a
polícia já tem até a gravação feita ilegalmente e, depois, ela esquenta pedindo à
Justiça, e a Justiça dá, pensando que é dali para a frente, quando o fato já
aconteceu.
As prorrogações que se dão. A lei fala em 15 dias mais 15, mas as
prorrogações se sucedem de tal forma que chegam a 1 ano, 2 anos. Pelo menos, é
o que se conhece pelos jornais.
A outra é, se nesse pedido de interceptação, ele é constituído apenas do
nome ou do telefone da pessoa que deve ser interceptada, ou se há CPF, se há
filiação, de maneira que não aconteça o que aconteceu. Eu trago aqui, se
necessário, o inquérito em que a pessoa foi gravada durante um tempo enorme. O
nome eu deixo a critério para quando achar interessante falar. Mas foi gravado. E,
na hora do interrogatório, o próprio réu disse que não era a voz dele. E aí o
advogado pediu que fosse... Não, ele disse que não tinha conhecimento dos fatos. A
juíza novamente disse: não, o senhor tem que falar, tem que dizer, tem que falar a
verdade e tal. Depois de apertar, ele insistiu dizendo que não era a voz dele, que
não era assunto ligado a ele. O advogado então pediu que a gravação fosse
colocada para que ouvisse, e ele então disse: “Essa voz não é minha”. E sem
precisar de perito ou de quem quer que seja, a própria juíza disse: “Realmente, a
voz não é sua”.
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Como é que se intercepta, como é que se obtém uma autorização judicial de
interceptação de uma pessoa homônima? Isso pode acontecer? O instrumento legal
que pede a interceptação não é caracterizado de maneira que não haja esse tipo de
engano? Os juízes não examinam isso? Há espaço suficiente nos ofícios que
permita que sejam inseridos números que não estão no pedido inicial, o que
constituiria fraude de quem pede? E, quando acontecem esses fatos, o processo fica
viciado de maneira tal que reduz a pó todo o trabalho realizado de investigação. E o
juiz assume, ou o Ministério Público assume o pedido das partes para que seja
anulada a investigação.
Enfim, eu deixaria aqui a grande indagação sobre que colaboração poderia vir
do Ministério Público, da Associação dos Juízes e da Associação dos Magistrados e
dos Procuradores, o que poderia vir de maneira que se possa... O Maurício já falou
sobre o vazamento. Eu nem vou falar sobre vazamento. Mas eu queria que saísse
dos senhores alguma sugestão que pudesse melhorar ou, quem sabe, enxugar esse
clima que invade a privacidade e que deixa hoje a sociedade...
Eu contei aqui, na primeira reunião, e repito hoje, que liguei, antes de chegar
aqui, na primeira reunião nossa, para um dos melhores criminalistas de Brasília,
para que respondesse algumas dessas perguntas que eu estou fazendo agora. O
que você sugere para eu apresentar na CPI em termos de melhorar a legislação?
Ele disse: “Deputado, eu não falo no telefone, eu prefiro falar pessoalmente com o
senhor”. Aí eu fiquei me indagando. Tive que desligar em respeito a ele. É um dos
homens mais íntegros que eu conheço. E aí eu fiquei me indagando: será que era o
meu telefone de Deputado que estava grampeado e eu não sabia que estou sendo
investigado, porque precisaria de o Supremo Tribunal autorizar, ou o era dele, um
advogado emérito? Qual era a preocupação dele? Ou seria apenas uma paranóia?
E quem é que consegue viver debaixo de uma paranóia, quando o próprio Supremo
Tribunal Federal está recebendo informações de grampos? Aí já não falo mais dos
legais, mas dos ilegais.
Quanto aos ilegais nem falo com os senhores, porque dos ilegais a Comissão
vai tratar e está tratando muito bem. Nós chegaremos pelo menos à
responsabilidade daqueles que utilizam essa mesquinhez para denegrir pessoas ou
então para ganhar dinheiro.
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Sr. Presidente, eu não vou me alongar, porque eu acho que o Relator e os
nossos colegas devem ter avançado nas perguntas que eram pertinentes aos
nossos convidados.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Obrigado, Deputado Simão
Sessim.
Com a palavra o Deputado Luiz Couto.
O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Sr. Presidente, queria apenas fazer
alguns comentários. Em primeiro lugar, dizer que, hoje, as escutas telefônicas ilegais
ou legais, clandestinas ou não-clandestinas, são um pingo d’água dentro da (falha
na gravação) ou seja, de equipamentos de escutas de ambiente e tudo o mais,
onde, por exemplo... Vou dar um exemplo: a delegada Marina prendeu fulano e
fulano. Fulano sabe que está sendo grampeado, porque há um vazamento, e aí ele
aproveita para desqualificar e para fazer todo um forjamento de denúncia contra
(falha na gravação) e aquilo — o pior é isso —, quando já... Marina nem sabe, a
mídia toda já sabe. Já no outro dia ela sabe pelo... ou pelas ondas das rádios ou
pela TV ou, então, pelos jornais. E para desmascarar ou para desmentir aquilo, ela
faz um trabalho para tentar... E aparece uma manchetezinha: “Não, não tinha nada.”.
Mas já fez todo o estrago, que foi acabar com a vida, com a honra das pessoas.
Então, eu fico, às vezes... Por exemplo, a questão da privacidade, da
intimidade. Como é que fica essa questão hoje, com esse sistema todo onde
efetivamente nós podemos comprar, na Feira do Paraguai, aqui, qualquer
instrumento para fazer isso? Não precisam ser colocados anúncios no jornal. Eu
acho que porque muitos arapongas ficaram desempregados agora estão vendendo
os equipamentos para outros. Talvez seja isso.
Nesse aspecto, o vazamento se dá não no momento da escuta, depois da
escuta. O vazamento acontece entre a entrega do documento para o juiz, depois de
passar por diversas mãos. E aí significa o seguinte: que, muitas vezes, para que
aquela escuta legal seja colocada, houve uma escuta clandestina ou ilegal para dar
elementos para fazer o arrazoado para pedir a quebra do sigilo telefônico. E aí a
pessoa sabe que, durante 15 dias, não vai falar nada, não sai nada, e também não
corrobora aquilo que estava lá. Então, nesse sentido, tem se que encontrar um jeito
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de a entrega ser direta ao juiz. Não pode passar por diversas mãos, porque se
passar, com certeza, o vazamento ocorre.
Eu tenho um exemplo lá do meu Estado. A Polícia Federal estava com uma
operação para pegar uma quadrilha. O juiz disse: “Olha, eu vou para casa, mas se
vocês precisarem de alguma coisa, vocês se comuniquem com este oficial, que é de
minha extrema confiança”. Acontece que, quando o juiz sai, a polícia, desconfiando
de que aquele oficial não era tão de confiança, faz uma escuta, e ele passa
informação para a quadrilha e diz: “Cuidado que hoje de madrugada a Polícia
Federal vai dar uma batida aí na fazenda e vai pegar vocês.” A operação teve que
ser impedida, deixou de ser realizada; só foi feita depois, em outro momento.
Então, na realidade, o esquema é muito forte. Tenho certeza de que aprender
como a clandestinidade acontece... Mas o que existe, de fato, hoje é a tentativa de
desqualificar ações de algumas pessoas íntegras, honestas, que trabalham e que
estão lutando. Daí vem todo o trabalho para desqualificar a sua atuação. Eu me
lembro aqui...
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - V.Exa. me permite um aparte?
O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Pois não.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - É só para ilustrar o que V.Exa.
está falando. Tem casos piores do que esse. Houve uma época... Fernandinho
Beira-Mar, preso, falava ao telefone, e as conversas dele vazavam todas no mesmo
dia. Então, de noite, ele via, no Jornal Nacional, lá na cadeia, as ordens que ele
dava. O cara estava devendo um dinheiro a ele, o Roque, um dos maiores
traficantes, e ele falava assim... Ele ligava par um comparsa dele e falava: “Avisa a
ele que eu estou preso, mas não estou morto. Eu sei onde os filhos dele estão. Ele
está me devendo 1 milhão de dólares”. No dia seguinte, o Jornal Nacional abria:
“Fernandinho cobra 1 milhão de dólares se não vai matar”. Aí o cara pagava ele.
Então, ainda virava propaganda de bandido para o senhor ter idéia.
O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Isso. Muito obrigado, Sr. Presidente. Eram
esses os comentários que eu queria fazer. Não fiz nenhuma pergunta, mas gostaria
de ter também o comentário dos juízes e também dos promotores e procuradores
sobre essa realidade.
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Muito importante o
comentário de V.Exa., para esclarecimento, como as demais manifestações de
todos os Deputados.
Então, agora, no momento, passo a palavra ao Dr. Mozart e ao Dr. Walter
para que dêem suas respostas.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Dr. Walter, que tem uma agenda marcada
para logo em seguida.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Primeiro, agradeço ao meu
colega Mozart, que me deu a preferência em razão de um problema que eu tenho de
horário. Eu vou tentar responder todas as indagações que foram feitas. Algumas, no
conjunto da resposta, creio que farei abordagem. Primeiro, eu quero dizer que a
circunstância de um juiz autorizar 15 dias, mais 15 e mais 15 eu não entendo como
ilegalidade. Lei é feita para ser interpretada com flexibilização. Respeito a posição
do Deputado, mas não é assim que as coisas se dão no ambiente da interpretação
do sistema normativo brasileiro. Se fosse assim também, quando a Constituição diz
que o preso tem o direito de ficar em silêncio, então só o preso, uma pessoa outra
que não fosse preso também não teria. E a jurisprudência é que flexibiliza, que dá
uma harmonia, uma interpretação harmônica do sistema normativo. E aí também dá
a interpretação. Quem faz a interpretação, a uma última palavra do direito
infraconstitucional brasileiro é o STJ, não é o Supremo. E essa é uma matéria...
Quando se delimitou o prazo de 15 dias e mais 15 não foi na Constituição, foi na lei
infraconstitucional. Então, quem dá a última palavra interpretativa nessa matéria é o
STJ. E a jurisprudência que vem se consolidando no STJ tem sido nesse sentido. E
em casos excepcionais, se puder, 15, 15 e até mais 15 e até mais 15, dependendo
das circunstâncias. É porque, quando se faz uma norma, se imaginam determinados
cenários que, depois, na realidade prática, ela não tem como ser aplicável. E aí vem
a jurisprudência para adequar a norma à fertilidade dos fatos. A esterilidade da
norma nem sempre pode fazer todas as previsões que podem ocorrer no ambiente
fático. Então, isso muitas vezes ocorre. Então, eu, com todo o respeito ao Deputado,
mas no meu ponto de vista não há nenhuma ilegalidade praticada pelo juiz quando
ele determina, neste caso, até um prazo superior. E também eu gostaria...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Sr. Presidente, me permite...
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Pois não. Deputado Simão
Sessim com a palavra.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Eu acho, então, que a primeira
sugestão é retirar os 15 mais 15.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Eu já fiz essa observação. Eu
ia dizer ao senhor.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - O senhor acha que tem que ser...
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Eu acho. Eu acho,
principalmente, Deputado...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Não incompatibiliza com os prazos de
investigações e dos inquéritos?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - E eu acho o seguinte:
principalmente determinados casos de apuração: organização criminosa, tráfico
ilícito de entorpecentes, até mesmo, se começarmos a imaginar, situações de
terrorismo e seqüestro. Então, nós temos casos... Eu acho que até poderia
expressamente... Nós temos, inclusive, uma sugestão num projeto de lei que está
tramitando no Senado em que a gente faz essa proposição. Mas aí eu quero
também dizer que se a idéia da lei dos 15 mais 15 foi da possibilidade de se
degravar tudo e de o juiz escutar tudo, então ela errou, porque é humanamente
impossível um juiz passar 15 dias sentado e escutar tudo que foi gravado durante 15
dias. Nenhum juiz vai fazer isso, e ninguém vai degravar 15 dias, porque dos 15 dias
tem um telefonema que foi da mãe dele. Ora, isso ninguém vai degravar. E quando
ele vai mandar para o juiz, no CD, ele não vai mandar isso também, ele não manda.
Na prática, ele não manda. Ah, está desobedecendo à lei? É fazendo uma
interpretação razoável da lei. Então, se a filha dele ligou: “Papai, venha me buscar
agora”. Ele não vai botar isso, porque eu também não quero saber. E até
respeitando a questão da privacidade. Se ele recebe telefonema de quem quer que
seja, isso é da ordem dele. Isso, na realidade prática, quem... Talvez a senhora,
certamente o Deputado Laerte Bessa... na prática a gente vê isso. Eu sou juiz
criminal há 16 anos e vejo muito essas coisas.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Mas se o senhor me
permitir, apenas para ajudar no raciocínio...
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O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Eu sou delegado de
Polícia Federal e compreendo o lado policial, mas eu estou ampliando esse
raciocínio. Vamos imaginar o seguinte, dentro da linha que V.Exa. está traçando:
que eu receba um telefonema de minha mãe pedindo para comprar farinha. E,
posteriormente, me liga alguém que está sendo investigado e eu digo: “Eu vou sair
para comprar farinha”. Então, isso dentro de um contexto, onde tudo é ouvido, a
farinha pode não significar a cocaína que está sendo investigada, mas a farinha que
me foi determinada. Então, por isso que eu digo que eu acho que é fundamental —
quer dizer, no meu entender, e V.Exa. obviamente tem todo o direito de discordar —
que o juiz tenha, sim — e aí não pode abrir mão desse dever —, de ver o conjunto
probatório e não apenas aquilo que foi editado.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Concordo plenamente com
V.Exa. que o juiz tem de ver o conjunto. Mas a gente não pode ficar desconfiando
dos homens a todo momento, porque a gente não encontra solução. No mundo do
Direito ou da norma, não vai encontrar solução. E aí eu repito a V.Exa: não tem
como um juiz passar 15 dias escutando uma fita, porque se foram gravados 15 dias,
o juiz, para escutar 15 dias, vai ter de ficar 15 dias escutando. É só a gente ver como
é que seria isso na prática. É por isso que não acontece.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - O senhor me permite? Olha só...
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Não, na defesa também é
muito difícil ouvir, Deputado.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Dr. Walter, o senhor me permite?
O que o Dr. Itagiba falou... Eu vou lhe dar um caso concreto. Eu tenho um amigo
policial, com 18 anos de polícia, que nunca respondeu a nada. Ele foi preso por 45
dias, exatamente por isso. Uma pessoa que estava sendo investigada ligou para ele
no dia da eleição e perguntou — outro policial —: “Qual é o número da Marina?” E
ele responde: “2315”. Aí, ele falou: “Consegui mais 30 votos para ela”. Entre
parênteses — entre parênteses — escrito: 30 mil reais. E ele foi preso por isso.
Então, o que o Dr. Marcelo está falando para o senhor é isso. O senhor não precisa
sentar para escutar, mas aceitar uma interpretação dessa é um absurdo.
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O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Então, eu quero responder. A
minha resposta ao Deputado não foi dentro desse contexto. Nesse contexto, o juiz
tem como saber todo o contexto. O que o Deputado colocou e que pode ocorrer é
que, como ele não vai reportar tudo, eu posso ficar sem saber do saco de farinha
que ele foi comprar lá e que pode ser cocaína. Pode. Pode ocorrer. Agora, na
situação que V.Exa. colocou, Deputada, não, porque todo o conteúdo fica no
guardião e fica por 5 anos.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Mas...
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Não, mas aí eu peço tudo, aí
eu quero o todo. Aí eu quero o todo. Aí é diferente. Agora...
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Mas a palavra foi voto, a palavra
foi voto. Não houve outra palavra.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - V.Exa. conhece o Guardião,
eu conheço um pouquinho o Guardião. Eu como juiz visito a Polícia Federal e sei
como é feito. Então, lá no Guardião, Deputado, só para fazer essa explicitação...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Pode concluir.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Do Guardião vem também o
extrato, com as ligações que foram feitas e o tempo de duração. Se ele só
degravou... se ele só captou e depois degravou 5 minutos da conversa de V.Exa.,
mas se lá no relatório — e vem o relatório, que é mandado pela operadora — tem lá
que foram 10 minutos, eu só quero os 10 minutos. E se depois tem alguma ligação
de alguma linha telefônica da senhora também dentro daquele contexto, daquele
período que foi monitorada a interceptação de comunicação de V.Exa., eu quero
também todo o conteúdo a respeito dessa linha telefônica. Eu tenho como fazer isso.
Agora, que pode haver manipulação, pode haver má-fé, pode. Não tem norma
nenhuma que impeça a má-fé. Não tem. A gente pode ter indícios, pode ser levado
numa interpretação lógica ou numa apreciação lógica chegar a que houve
manipulação. Sempre vai ser possível. O ser humano é capaz. Se a gente pensar
numa norma que vai tirar a possibilidade de qualquer ação humana modificar algum
conteúdo verdadeiro, a gente não vai chegar, não vai conseguir fazer isso.
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O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Dr. Walter, mas nesse contexto
dessa discussão entra o debate sobre a edição. Como a edição é tratada hoje no
Judiciário? Como o Judiciário vê esse problema da edição, que é supressão, são
textos. O senhor aqui reafirmou — e nós também tínhamos essa informação — que
o Guardião armazena. O que foi dito aqui pelo pessoal ontem...
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Não, não é que eles não
editam, eles salvam em backup, em discos, a informação, e o conteúdo é destruído
no final da operação, se o comando for esse, que é o que manda a lei. Agora, o que
está se discutindo justamente aí já é um problema da defesa. A defesa deveria ter
acesso a todo o conteúdo para que ela pudesse, inclusive, contrapor eventuais
adições, eventuais interpretações, para que isso pudesse fazer parte do
comprobatório. Esse é o debate.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputado Laerte Bessa.
O SR. DEPUTADO LAERTE BESSA - Vou ser rápido. Eu só queria
cumprimentar o Dr. Walter por essa explicação que ele deu aí, porque a realidade é
que é impossível degravar toda a escuta telefônica, principalmente aquela de 15
dias. Se ela for prorrogada por mais 15, ela é impossível.
Há muitos anos atrás... Eu queria só mostrar esse exemplo, Dr. Walter. Em
1992, quando aconteceu o caso dos Sete Anões — o senhor se lembra? —, o caso
do José Carlos Alves dos Santos, que matou a mulher e simulou um seqüestro, na
época, nós já suspeitávamos que ele tinha matado a mulher. O que nós fizemos?
Grampeamos os telefones dele. Seis telefones nós grampeamos na época. Na
época não tinha prazo, e nós ficamos... Com autorização judicial, nós conseguimos
grampear esses telefones. As ligações que ele recebia nos 6 telefones eram todas
daqui do Congresso Nacional, basicamente do Senado, para saber como estavam
as investigações e para saber se já tinha notícia da esposa dele. Aí nós gravamos.
Gravamos todas as fitas. Quando chegamos ao final da investigação, e nós
solucionamos o problema, chegamos aos Sete Anões e solucionamos o problema,
e, realmente, ele tinha matado e escondido o corpo, nós mandamos o inquérito para
o Judiciário. O juiz pediu a mim todas as fitas daquele período de um ano. Eu
mandei para ele só aquelas partes que interessavam. Não tem cabimento. Ele me
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pediu. Aí eu respondi a ele que ele tinha que mandar uma carreta para eu mandar
as fitas para ele numa carreta. Aí ele mandou me denunciar por isso. Mas eu estou
explicando isso para clarear o que o senhor está falando, que é uma realidade, e
que o nosso colega Itagiba está errado e o nosso amigo Pellegrino está errado. Tem
que se degravar o que interessa. Isso é um caso em que temos que trabalhar em
cima disso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputado Laerte Bessa,
eu aceito a posição de V.Exa. no sentido de achar que nós estamos errados, mas eu
não tenho a visão do uso do cachimbo que faz a boca torta. E, na minha visão,
apenas para contrapor o que V.Exa. disse sobre certo e errado, eu acho que,
quando uma prova é permitida, isso está no processo, na história do processo, ela
tem que ser toda analisada e avaliada pelo juiz. Então, não importa se são 2
minutos, se são 100 horas ou 200 horas, se aquilo é um instrumento probatório.
Para nós policiais o que basta é aquilo que faz a nossa convicção daquela
investigação que nós estamos fazendo. Mas o juiz está acima daquilo que nós
achamos. Ao juiz cabe fazer a justiça e dar o direito. E a única forma, no meu
entender, que ele terá de fazer isso é apreciando todo o conjunto probatório e tudo o
que foi dito, porque é ele, o juiz, que vai aplicar a pena ou absolver. Então, na nossa
visão de policial, eu concordo que nós temos a forma de fazer a triagem e separar
aquilo que é importante para nós. Mas existe algo que é muito mais importe do que
a nossa única e exclusiva visão, que é a visão do Direito e a visão da Justiça, que
está acima daquilo que a polícia pensa.
O SR. DEPUTADO LAERTE BESSA - Quero esclarecer, Sr. Presidente, que
nós estamos procurando... nós estamos debatendo muito na Comissão de
Segurança Pública as formas de agilizar o inquérito policial. Dessa forma nós não
vamos agilizar o inquérito policial.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Vamos acabar com a
discussão paralela e vamos passar a palavra aos expositores para que eles possam
concluir, porque eles têm um avião para pegar.
O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Sr. Presidente, uma questão de ordem.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Só uma coisa, Sr. Presidente. Só
uma coisa.
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O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Questão de ordem.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Questão de ordem,
Deputado Luiz Couto.
O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - O Regimento diz que nós temos o direito
de fazer as perguntas e que aquele que está respondendo tem o direito também de
não ser interrompido durante (falha na gravação) depois nós tenhamos... a partir da
resposta dele, nós possamos fazer a réplica. É isso que está definido.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Mas acontece que desenvolve
mais o raciocínio.
O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Mas atrapalha, porque o raciocínio vai e
atrapalha. Então, quem tiver suas questões para réplica exponha-as após a fala
daquele que foi convidado ou convocado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - V.Exa. está trazendo a
grande experiência que tem de presidir a Comissão de Direitos Humanos, auxiliando
os trabalhos desta Presidência, e eu agradeço em saber que V.Exa. conduziu os
trabalhos daquela Comissão dessa forma.
Muito obrigado.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Sr. Presidente.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Acho que, com toda a
sabedoria, às vezes, determinadas flexibilizações...
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - V.Exa. me permite?
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Com todo o respeito,
respeitando o direito de síntese, o direito de concluir idéias, mas, às vezes, uma
flexibilização contribui mais para o trabalho da Comissão do que...
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Exatamente. Até porque o
debate cresce com isso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Pois não, Deputada.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - O senhor me permite?
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Sr. Presidente, eu indeferiria.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputado Luiz Couto, já
ouvi, já concordei com V.Exa., e agora está com a palavra a Deputada Marina.
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A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Eu quero esclarecer uma coisa.
Eu estou entendendo o que...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - O Deputado Luiz Couto cansou de
debater aqui.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputado Simão Sessim, a
palavra está com a Deputada Marina.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - O que o Deputado Laerte falou
eu entendo e o que V.Exa. e o Relator falaram eu entendo também. O que está
havendo, Sr. Juiz, é que nós estamos falando de 2 coisas diferentes. O que o
Deputado Itagiba está dizendo não é defendendo que seja tudo totalmente
degravado. Acontece que, o senhor sabe, quando se faz um contexto, se eu pego
uma conversa... V.Exa. já disse que se o senhor olha uma coisa que não parece
muito certa, vê que a ligação demorou mais tempo, o senhor pede a ligação toda.
Isso é quase degravar tudo. E eu vou falar um outro caso aqui.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputada Marina, o caso
vamos deixar para depois.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Não, não, é rápido! Sabe por
quê? Porque isso corrobora com o que o senhor disse, para ele entender. O
Deputado Colbert gritou muito bem aqui: a defesa fica completamente roubada. Se
uma pessoa está conversando com a outra e está falando, por exemplo, de bens,
como aconteceu no caso de que eu estou falando, de um outro policial preso e que a
esposa é diretora internacional da BRASCAN...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputada Marina, vamos
nos ater aqui aos nossos questionamentos.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Só que a conversa não
continuou. O diálogo dele foi retirado do contexto, e a conversa de que a esposa
dele era essa não está no inquérito.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Isso já foi registrado,
Deputada Marina. V.Exa. tem toda a razão. Vou passar para nossos expositores,
porque eles têm inclusive um avião a pegar.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Vou tentar ser rápido. Mas
também não me importuno com as intervenções, até porque eu acho que realmente
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alimentam mais o debate. Só que com a interceptação do Deputado Presidente, ele
não deixou eu concluir a minha parte, porque a defesa não pode ficar ao léu, nem
estou defendendo isso. A defesa tem o direito de saber todo o conteúdo que está no
Guardião sobre o tempo do monitoramento a respeito dele, Relator. Então eu não
complementei. Seria um absurdo que a gente não permitisse isso. Eu não estou
advogando isso, muito pelo contrário. E acho que tem que ser aperfeiçoada a lei
nesse ponto também. Não tenho dúvidas. E aí não tem problema. Ora, eu sou a
defesa, estou fazendo a minha defesa, só tenho esse conteúdo... Ah, eu quero saber
o restante do conteúdo. Inclusive, o processo eletrônico serve para isso. Tudo o que
foi para ali, que está armazenado no Guardião e diz respeito àquele processo,
àquele réu, ele tem o direito de ter acesso a ele, on-line. O processo eletrônico é
isso. De uma forma sigilosa, só ele entra, ele tem a senha. Ele vai lá e ele tem o
conteúdo disso aí. Concordo plenamente com V.Exa. Nessa parte nós não
divergimos. Eu acho que aí evita essa situação de a autoridade policial selecionar
aquilo que só interessa a ele e prejudicaria a defesa. Aí não há como. Então eu
concordo plenamente com V.Exa. E estamos nesse passo andando em harmonia.
Agora repito como fez o Deputado Laerte Bessa. Não tem como degravar tudo, não
tem! Não há possibilidade. E aí, foi uma indagação que eu também escutei já lá na
frente que diz: mas a autoridade policial contextualiza da forma que quer. Não é bem
assim. Por quê? A autoridade policial encaminha o CD com tudo o que ele achou
que é pertinente para a apuração do fato criminoso, encaminha para o Judiciário. E
ele pega, faz um relatório, em que ele faz comentários, sim, mas ele degrava tudo o
que está nesse CD. Tudo o que está nesse CD ele degrava. Agora não é tudo o que
foi gravado. Mas está lá no Guardião. O conteúdo inteiro de todo o período
monitorado está lá no Guardião. Então o sistema tem alguma segurança. Não é bem
assim. O juiz não é manipulado dessa forma como pode se pensar que é. O
Judiciário, principalmente... Aqui eu digo com muita tranqüilidade que o Judiciário
Federal, o Conselho da Justiça Federal tem um programa de aperfeiçoamento, de
qualificação do juiz que atua em área criminal, porque a criminalidade que freqüenta
o ambiente da Justiça Federal é a macrocriminalidade — crime organizado, tráfico
internacional de entorpecentes, corrupção generalizada e lavagem de dinheiro. Se o
juiz não se especificar nisso aí... Por isso que quando a gente vem aqui ao
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Parlamento dizer que precisamos criar mais Varas para o Judiciário é porque se
você pegar uma Vara Criminal hoje da Justiça Federal e ela tiver mil, mil e duzentos
processos, esse juiz não vai prestar uma jurisdição de qualidade, porque ele não
tem como avaliar esses processos. Processos na Justiça Federal não são de 1, 2
réus, não, são 10, 20, 30, 40, e com diversos incidentes das mais diversas
naturezas. Então, se a gente quer combater a criminalidade neste País, e está se
investindo muito nisso, a gente tem que ver a questão da estrutura do Poder
Judiciário para poder dar a resposta que a sociedade quer para aplacar esse
sentimento de impunidade. E aí eu já queria colocar uma outra coisa. Eu concordo,
Deputado, que houve uma certa banalização do instituto, mas ela começou a partir
da edição da norma. Eu acho que quando a norma estabeleceu que não cabe a
interceptação apenas nos casos de crimes apenados com detenção, ela foi muito
longe, vulnerou demais a norma. Como foi bem colocado por V.Exa., Relator, a
interceptação é um instrumento de força. Ele é para ser utilizado excepcionalmente,
num processo em que haja necessidade de um instrumento mais contundente para
poder se apurar o crime e que o crime seja de uma magnitude que justifique a
utilização dessa força. Então ele não pode ser previsto genericamente para todos os
crimes de reclusão. Nós temos crimes de reclusão que não justificam utilizar um
instrumento desse, porque é um direito fundamental e está aí catalogado no nosso
sistema como tal. Eu... pelo que eu conheço da magistratura brasileira, da
magistratura federal, estadual, nós temos sim um compromisso muito sério com a
Constituição, principalmente com os direitos fundamentais. Basta ver a riqueza da
jurisprudência produzida pelo Judiciário brasileiro a esse respeito. Mas só que essa
questão de dizer que nós somos os guardiães do sigilo... Eu comentei aqui que o
sigilo na verdade tem 3 instituições que dele participam. E um dos Deputados, eu
não me recordo agora... que infelizmente o que tem sido muito freqüente é que o
vazamento tem ocorrido pela autoridade policial. E a despeito de autoridade policial,
tem havido também e há possibilidade de ocorrer na operadora. Vamos cercar o
sistema? Vamos. Como? Na operadora? Tecnicamente eu não sei como, e não é
questão de norma. Não é questão de se colocar na lei. É questão de se regular o
setor e dizer como a operadora deverá prestar o serviço e quais os itens de
segurança que ela deve adotar, especialmente nessa questão de interceptação
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telefônica. Então, eu acho que nós temos... pelo que eu conheço, os casos de
vazamento que sejam decorrentes do Judiciário são ínfimos. E tem mais: quando
ocorre vazamento, Deputado Marcelo, V.Exa. perguntou... Eu já tive casos de
determinar apuração de fato, de muito provavelmente vazamento que decorreu da
polícia. Já. E sabe qual é o resultado? Nenhum. E aí nós vamos entrar na pergunta
de V.Exa., Deputado Laerte Bessa. É uma... E nós temos um caso emblemático...
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - E da defesa, Dr.
Walter? Vocês têm constatado também vazamento por parte da defesa?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Temos. Nós temos um caso
emblemático que foi o caso da Operação Navalha. Quando o Ministro Peluso
disponibilizou para a defesa todas as informações do que tinha sido apurado com
escuta telefônica, no outro dia estava no Correio Braziliense. A gente sabe. Eu
estava em Brasília, na época, começou o zunzunzum, eu recebi uma ligação de um
jornalista, dizendo: “Olha, um advogado passou por tanto isso aqui”. Até preço
disseram quanto foi. E disseram que era mais do que o cliente estava pagando a ele
para defendê-lo. Mas a circunstância... Aí, respondendo a pergunta do Deputado
Laerte Bessa, a gente passa por outra questão: o Ministério Público tem ou não
poderes investigatórios? Eu, particularmente, acho que sim. Doutrinariamente tenho
essa concepção, nada obstante em nosso sistema acusatório haver uma divisão
nessa apuração, primeiro a extrajudicial pela autoridade policial, e a judicial, pelo
Ministério Público. Mas eu acho, sim, em alguns casos, que o Ministério Público não
só pode como deve mesmo, principalmente em situações assim, em que eu vou
apurar um vazamento que deve ter ocorrido pelo órgão policial, um agente da
polícia. Então para evitar até uma possibilidade de a apuração não chegar a bom
termo por um eventual corporativismo, que pode existir, é melhor que uma instituição
externa faça essa apuração. Então... E até foi uma indagação também do Deputado
Itagiba. Eu acho que quando eu falei aqui, foi um ato falho, é porque é o gênero. Eu
acho o gênero. O gênero, quem vai fazer, é sempre a autoridade policial. Agora,
também respondendo a V.Exa., Deputado Laerte Bessa, eu acho que não tem
sentido nenhum a Polícia Militar ter equipamentos de escuta telefônica. Não tem
nenhum, nenhum. Porque eu acho... Ela não faz a apuração. A gente tem que ter a
divisão muito bem clara dos instrumentos de que tipo... de qual é o papel da Polícia
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Militar e qual é o papel da Polícia Civil. No meu entender, e para a interpretação que
eu acho que tem da Constituição, ela tem lá a polícia ostensiva. Toda a atuação da
Polícia Militar na área de apuração de ilícito é anômala. E ela, pela, sua anomalia,
não justifica que faça esse tipo de investigação.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Dr. Walter, e a questão
da interceptação telefônica em juízo cível e trabalhista, que foi colocado aqui ontem?
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Ah, já falou sobre isso?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Falei. E acho até que deveria
sair uma recomendação desta Comissão para o Conselho Nacional de Justiça, a fim
de que fosse editado um ato normativo explicitando, proibindo ou sei lá, dizendo o
que a lei já diz, o que a Constituição diz: que eles não podem determinar a
interceptação telefônica.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Aproveitando uma fala de
V.Exa...
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputado Colbert, só um
minutinho. Passo a palavra em seguida a V.Exa.
Estamos tratando aqui da questão dos vazamentos havidos, e com grande
ênfase, no âmbito policial, e até vi V.Exa. advogar que isso deveria ser feito por um
outro órgão — a apuração desse desvio —, embora saibamos que a lei não autoriza
que nenhum outro órgão instaure procedimento investigatório. Mas, de qualquer
maneira, aí fica a mesma pergunta: quando esse vazamento se dá no âmbito do
Ministério Público, ou se dá no âmbito do Judiciário, quem vai investigar esses 2
órgãos, essas 2 instituições? Porque aí fica sempre se criando um órgão externo,
porque os órgãos próprios não seriam capazes de fazê-lo. Então, acho que essa é
uma questão importante para a discussão.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Aí, respondendo a V.Exa.,
essa questão é a mesma coisa: quando há interesse da magistratura, quem julga é o
Supremo. E o interesse do Supremo, quem julga? O próprio Supremo. Tem uma
hora que basta, tem hora que pára, porque, infelizmente, é como as coisas se dão. E
no plano prático você tem que chegar num momento que se é o Ministério Público
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vai ser o próprio Ministério Público. Eu queria ainda falar de uma questão sobre juiz
presidir inquérito. Concordo plenamente com o que foi colocado aqui, acho que pelo
Deputado Pellegrino.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Pois é. Eu acho... Uma coisa é
o juiz determinar. Ele é o guardião, ele controla. Toda e qualquer diligência da
autoridade policial que precisa da flexibilização de um direito fundamental tem que
ter autorização judicial, decisão fundamentada e tal. Depois disso, quando se trata
de situação mesmo de alguém que tenha foro privilegiado, não entendo... para mim
não decorre da Constituição que autoridade judiciária deva presidir o inquérito, como
vimos na Operação Navalha, por exemplo. Acho que aí estamos utilizando o sistema
inquisitório, extremamente perigoso no nosso sistema. Acho que o juiz, se assim
está no Regimento Interno do Supremo e do STJ — o Supremo também está
fazendo a mesma coisa na Operação Hurricane —, se ele procede à instrução — e
aquilo é inquérito, sim, não policial, mas judiciário —, se ele está fazendo aquele
inquérito...
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Fazendo uma complementação
da fase do inquérito policial.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Sem dúvida. Para mim ele está
impedido de julgar o processo. Não sei. Talvez... Ainda anotei mais algumas coisas,
mas acho que já me alonguei demais...
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - O Dr. Mozart vai falar, mas
ficaram 2 questões que queria também que o Dr. Mozart comentasse e o Dr. Walter
também, que é sobre o relatório. Ao final a autoridade policial encaminha o relatório,
que não é só conteúdo, parece-me, do que é apurado, mas como é que o
procedimento e a interceptação ocorrem. Seria assim? Entendo que deveria ser não
só o conteúdo do que é apurado, mas como foi apurado, para que a autoridade
judiciária, se não será objeto de recomendação da nossa parte, que a autoridade
policial naquela missão de guardiã, de corregedora, que ela possa ter certeza de
que aquela interceptação ocorreu nos limites do que estabelece a lei e nos ditames
que ela determinou. Seria importante o comentário de V.Exa. até como experiente
juiz na área criminal. E também se V.Exa. no exercício da sua atividade judicante já
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presidiu alguma solenidade — se posso chamar de solenidade — de destruição da
prova que não é emprestada, mas que se presta.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - O Deputado Simão Sessim
parece que gostaria de complementar alguma coisa.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Sr. Presidente, tinha feito algumas
indagações com relação à autorização judicial para interceptação, porque eu
conheço um caso de homônimo que foi gravado. O juiz quando recebe o pedido ele
vem de forma bem amarrada, no sentido de que a pessoa que vai ser interceptada é
fulano e não o homônimo dele?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Agora vamos passar a
palavra ao Dr. Walter.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Vou responder primeiro a
última pergunta do Deputado Simão Sessim. Geralmente, isso vem bem
caracterizado, individualizado. O juiz tem que...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - CPF.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Isso, CPF. Geralmente, o juiz
pede o CPF. Agora, tem gente que pratica crime que não tem nem CPF, não tem
nem identidade. Então, às vezes não dá. Ou vai apurar... E, às vezes, chega assim,
Deputado. Às vezes, chega, embora não aconteça. E muitas vezes o celular não é
dele, ou o telefone não é dele, porque ele também não tem, é no nome de outra
pessoa. A questão é mais complicada do que na hora em que você... Você está
apurando um crime de uma organização criminosa, o cidadão, às vezes, tem uma
movimentação financeira altíssima, mas ele não tem nada no nome dele,
absolutamente nada. E ele não tem CPF. Quanto a isso não precisaria dizer muita
coisa, porque o jogador Edmundo, até outro dia, não tinha CPF e nunca tinha
declarado Imposto de Renda na vida dele.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Mas e quando acontece de, ao ouvir...
quando se foi fazer a degravação, no interrogatório, chegou-se à conclusão de que a
voz não era do réu, é anulado?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Uma situação como essa pode
ocorrer. Eu posso dizer ao senhor que é uma excepcionalidade. Mas, obviamente,
ela não tem validade.
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O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Não tem validade.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Não tem problema nenhum,
ela não teria validade. Eu me esqueci a outra pergunta.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - É só sobre o relatório.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Ah, sim.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Como é que o relatório é
encaminhado, se a autoridade judiciária estabelece o seu papel correicional, para
ver não só o conteúdo do que é encaminhado, mas se o rito foi observado.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - É isso que talvez inquieta
muito, porque se pensa que o juiz só lê aquela contextualização que a autoridade
policial faz. Ela faz... E V.Exa. tem experiência como autoridade policial federal. Se
faz uma contextualização. Ele pega e diz: a farinha não farinha, é cocaína. Aquilo
que ele diz que faz na sexta-feira, não é na sexta, é na segunda, ou sei lá. Ele faz a
interpretação. Mas a despeito de ele fazer essa interpretação, vai dizendo lá: “Olhe,
João, na verdade, é Francisco”. Ele chama de João para ninguém pensar que é o
João e se confundir lá. Ele vai fazendo essa contextualização, mas ele, depois,
transcreve tudo o que está naquele CD. Por quê? Para permitir... Quem lê a
degravação sabe que, muitas vezes, você lê a degravação e não a entende direito.
Fica com uma confusão imensa. E aqui e ali você tem que ir ao áudio, porque senão
você não entende mesmo não. É a entonação, não sei o que lá. Quem faz a
degravação, se não fizer a degravação bem feita também, fica um pandemônio.
Você não contempla... Precisa-se ter um talento imenso para fazer a degravação. A
degravação é muito difícil para quem a faz. Na polícia tem um pessoal que faz,
especializado nesse mister, mas é muito difícil. Então, acontece isso. Ele faz essa
confusão...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - O senhor acha que tem muita
subjetividade?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Na degravação, eu escuto,
entendo a entonação... Eu vou botar uma vírgula ou interjeição, qualquer coisa, e
pode mudar o conteúdo. Pode! Pode mudar o conteúdo.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Pois é, mas, por exemplo, a
gente tem aqui um mecanismo muito antigo, que é a taquigrafia. A taquigrafia é
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usada nesta Casa não só nesta CPI, como em todos os dias. São 513 falando, e é
uma vírgula, uma respiração. É uma coisa meio antiga. Não precisa ser o Guardião.
Poderia ser usada a taquigrafia.
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Mas a defesa vê o conteúdo e
diz: “Olha, o conteúdo não é esse”. A defesa tem essa possibilidade. Aí, se a gente
entrasse naquela de que a defesa não tivesse... Ela vai ter acesso, primeiro, ao CD
que está dentro dos autos, depois ao que foi degravado. A defesa tem como fazer.
Agora, eu até concordo numa coisa, também. Não é o caso das organizações
criminosas e também não é caso dessas diligências, porque, infelizmente, na
maioria, em boa parte dos casos, quando é de réu pobre, que não tem condições
financeiras, a defesa dele é muito ruim e pode não atentar para um detalhe desses.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - O que a gente talvez não
tenha atentado — já vou lhe passar a palavra, Deputado Maurício — é que existem
2 situações, e quem opera na atividade policial sabe. Existe a interceptação
telefônica com objetivo operacional e a interceptação telefônica como meio de prova.
Então, aquela que tem objetivo operacional resulta num flagrante ou numa busca
onde se acham os documentos relativos àquela ação delituosa que havia sido
acertada, e a outra, que se destina única e exclusivamente — e tem sido utilizada
cada vez mais — à produção de prova. E aí, muitas vezes, existe o choque, porque
no início da interceptação, na grande maioria delas, no início da vigência da lei, era
com objetivo operacional e, raramente — raramente — eram encaminhadas como
instrumento probatório, o que também, a meu ver, era uma forma equivocada de se
fazer justiça, porque resultou num flagrante. E o flagrante, em tese, apagou todo o
passado. Então, existe essa diferença também que é importante frisar.
Deputado Maurício com a palavra.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Apenas nessa questão
da contextualização, o que eu queria, Dr. Walter, era uma opinião de V.Exa. V.Exa.
não acha que essa contextualização, quer dizer, a forma como esse relatório é
apresentado ao juiz, isso não poderia ser dispensado, para evitar a contaminação do
magistrado, com uma interpretação policial? Porque o policial tem uma natureza, o
policial tem uma natureza. A natureza é ir pegar. Ele valoriza muito mais aquilo que
está acusando do que aquilo que pode defender, absolver. E, pelo volume de
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informações de um processo, pelo volume de réus que tem no processo, muitas
vezes, o juiz absorve justamente aquilo que está no relatório, feito pela autoridade
policial. Se o acusado não tiver uma defesa diligente, que faça a contraprova daquilo
que está no relatório, o acusado pode se prejudicar. E se o juiz não tivesse essa
intervenção do policial na interpretação dos dados, seria obrigado a ele mesmo fazer
essa interpretação, manusear essa prova. Por isso lhe pergunto: Essa
contextualização por parte da autoridade policial não seria dispensável?
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Eu acho que não, Deputado.
Tem umas observações que são feitas — e ele contextualiza como se deu aquele
processo —, que eu acho que são importantes de serem trazidos como elementos.
Ele quem participou da diligência e quem observou. O juiz não se contamina com
isso. É a mesma coisa de a gente dizer que na Casa, aqui. Olha, eu escutei,
Deputada, quando V.Exa. disse, aqui, que o delegado disse: “Olha, a juíza faz tudo o
que a gente quer.” Todo mundo quer um juiz desses. E é comum o cidadão dizer:
“Ah, o que eu digo ele faz.” E não é bem assim. Eu conheço muito advogado que
diz: “Ah, quando faço...” não sei o que lá... Às vezes, algum membro do Ministério
Público diz o seguinte: “Quando eu dou o parecer num sentido, o juiz vai.” Não é
bem assim. Às vezes, a pessoa diz por diletantismo ou pela importância que ela
quer ter no cenário. Mas um juiz que fizer assim, não merece vestir a toga. Um juiz
que se influenciar por uma contextualização feita por uma autoridade policial não
está preparado para ser juiz, ele é péssimo juiz. Acho que a gente não tem que tirar
essa possibilidade, porque pode contaminar o juiz. Esse juiz é que não pode estar
lá. Eu conheço bem, como o Mozart conhece bem, a gente está em trabalho
associativo há muito tempo. A gente conhece os colegas, a gente vai no contado
com colegas, e não há inocentes nesse meio, há um pessoal muito preparado, na
verdade.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Dr. Walter, V.Exa. mencionou
aí que há uma preocupação do Conselho, principalmente dos juízes da área
criminal, de haver um processo de reciclagem e treinamento.
Eu queria até que V.Exa. e o Dr. Mozart, de uma certa forma, comentassem
sobre isso, se há essa preocupação, pela natureza dessa atividade, que tem uma
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série de especificidades, se há essa preocupação com uma constante reciclagem,
para assegurar os termos da lei.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Com a palavra o Deputado
Colbert, no que lhe couber.
O SR. DEPUTADO COLBERT MARTINS - Quando o Dr. Walter concluir, eu
falarei. O Deputado Nelson fez a colocação, qualquer coisa, eu falarei.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Muito bem, vamos
aguardar.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Pode perguntar e eu respondo
depois.
O SR. DEPUTADO COLBERT MARTINS - Vou fazer uma consideração com
relação à questão do que nós ouvimos aqui dos juízes cíveis e trabalhistas.
(Ininteligível.) Antes da recomendação, eu sugiro que oficiemos o Conselho Nacional
de Justiça, esses juízes venham aqui explicar por que o fizeram, o que fizeram, para
tomarmos conhecimento do fato. Além, depois, possa ser proposto algum tipo
(ininteligível). Mas, neste momento, eu acho que nós devemos trazê-los, aqui, para
termos idéia exata de que tipo de ação trabalhista justificou o grampo telefônico ou
que tipo de ação cível justificou.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Muito bem colocado.
Peço a V.Exa. que faça o requerimento.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. WALTER NUNES DA SILVA JÚNIOR - Deputado Pellegrino, o
Conselho de Justiça Federal até, inclusive, vai fazer o lançamento do Plano Nacional
de Aperfeiçoamento de Juízes Federais, em que há toda uma programação das
Escolas de Magistratura. E há uma preocupação específica com a temática da
criminalidade, porque a criminalidade da Justiça Federal mudou sobremaneira, a
partir da segunda metade dos anos 90. O perfil é totalmente diferente. Por quê?
Porque o Brasil aperfeiçoou a legislação. A lei de lavagem de dinheiro foi um grande
avanço na sofisticação ou na qualificação da investigação do sistema brasileiro.
Houve a necessidade também de qualificar a Justiça Federal, para que os juízes
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possam atuar em uma área extremamente complexa. A área criminal hoje, acho, e
gosto de dizer muito uma coisa, Deputado: acho que estamos precisando dar a
devida atenção à questão do crime organizado, porque se ontem lutamos contra a
ditadura política, hoje estamos lutando contra a ditadura das organizações
criminosas. É a ditadura da criminalidade, porque estamos enfrentando isso, os
Juízes Federais do Brasil. Inclusive, temos um projeto, o Deputado Laerte Bessa
bem sabe disso, o Deputado é o Relator, que os juízes estão, em uma freqüência
cada vez maior, sendo ameaçados. E não só ameaçados, mas com plano de
execução sendo colocado em prática, por causa desse combate à criminalidade. Foi
uma coisa interessante. Nós melhoramos o nosso sistema normativo, criamos até
uma lei de proteção à vítima, à testemunha, que protege até o réu, mas não tem
nada para proteger o juiz. O juiz dá uma decisão e amanhã batem no carro dele,
entram na casa dele, ameaçam o juiz, e de forma dissimulada. Muitas vezes, até
com dossiê, Deputado, até com monitoramento do que o juiz está falando: “Ah, Juiz,
a gente está sabendo de tudo seu aqui e de sua vida privada também”. E, quando se
dá proteção, é o juiz que fica preso, o preso é o juiz. E a gente está acabando com
quem está na linha de frente para efetuar esse trabalho. A gente precisa pensar
seriamente nisso. O Estado precisa se organizar para poder enfrentar o crime
organizado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Acho que V.Exa. terminou
as respostas. Vou passar agora a palavra ao Dr. Mozart, para que possa fazer
também suas repostas e, posteriormente...
O SR. DEPUTADO LAERTE BESSA - Presidente, votação nominal.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - O.k.! Então, vamos nos
revezando.
Vou suspender por 5 minutos.
(A reunião é suspensa.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Finda a interrupção, vamos
dar a palavra ao Dr. Mozart, para que responda aos questionamentos que foram
feitos pelo Relator e pelos demais Deputados, ressaltando a importância desse
depoimento. E também para dizer que, tendo em vista o adiantado da hora, o grupo
que representa as associações do Ministério Público serão ouvidos em outra
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oportunidade. Então, fica cancelado, no que diz respeito a hoje, a oitiva dos
membros do Ministério Público, e vamos concluir ouvindo o Dr. Mozart.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Obrigado, mais uma vez, ao
Presidente da Comissão, Deputado Marcelo Itagiba. Nós acabamos, antes do
intervalo da sessão, nós acabamos de ouvir o depoimento de um magistrado, Dr.
Walter Nunes, que demonstrou conhecimento, profundo conhecimento que ele tem
da legislação que disciplina a matéria. Ele deu uma verdadeira aula sobre o assunto.
E foi mais além, ele relatou aqui para todos a sua experiência, o seu dia-a-dia na
prática, como ocorrem os desvios e os riscos que esse mecanismo de investigação
pode ocasionar à sociedade brasileira. Então, fica aqui, Sr. Presidente, um registro
da AMB em elogio à explanação e à contribuição que o Dr. Walter Nunes deu a esta
Comissão e, com certeza, ao Parlamento brasileiro. Eu gostaria de fazer algumas
observações dos temas e das reflexões que foram colocadas aqui pelo Presidente e
pelos demais membros da Comissão. E eu pude observar que em todas as
manifestações, a preocupação maior de todos é a questão de — uma expressão que
eu usei no início da minha intervenção e que foi citada também pelo Deputado
Maurício — banalização, a vulgarização desse mecanismo investigatório. Isso —
como foi dito e repetido e nunca é demais — é a questão da excepcionalidade. Isso
não é regra, isso é uma excepcionalidade. E o juiz tem que ter, tem que se exigir do
juiz muita cautela, muita serenidade na apreciação do pedido, seja do Ministério
Público, seja da autoridade policial na concessão. Como disse o Deputado Nelson
Pellegrino, isso é uma agressão, isso vai de encontro a um dispositivo constitucional
que protege a privacidade do cidadão brasileiro, da sociedade brasileira. Então,
precisamos, primeiro, analisar a motivação. Qual o motivo? Quais são as razões que
estão embasando o pedido de quebra do sigilo? Eu até poderia argumentar que
essas razões podem ser positivas, ou elas podem ser negativas. Eles já podem ter
indícios de que aquela pessoa está cometendo crime, está no mundo da
clandestinidade. E pode ser negativa dizendo que não tem indício, não tem, vamos
dizer, razões suficientes, mas o comportamento daquela pessoa, a relação daquela
pessoa com pessoas que respondem a processos, que estão sendo investigadas
pela polícia pode, só pode investigar e só pode colher a prova única e
exclusivamente através daquele instrumento. Mas é preciso que o juiz tenha
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bastante serenidade e cautela. A outra questão que o Deputado Nelson Pellegrino
levanta é a questão do juiz acompanhar a execução, ter diariamente, se possível,
um acompanhamento de como está ocorrendo a execução daquela ordem judicial.
Nós temos que acabar com a cultura de transferência de responsabilidade. Quando
o juiz concede aquela ordem, quando o juiz concede a quebra, a obrigação dele não
terminou ali. Ele pode até dizer: “Agora o problema é policial, não é mais comigo”.
Não pode transferir essa responsabilidade, a responsabilidade é dele, e ele tem que
acompanhar permanentemente como um corregedor, como assim classificou o
Nelson Pellegrino, um corregedor daquela decisão, se está sendo cumprida, se não
está sendo desviada, se não está sendo utilizada senão para investigar o crime de
que está sendo acusada a pessoa que teve o seu sigilo quebrado. Então, é
responsabilidade do juiz o acompanhamento e não pode transferir essa
responsabilidade para a autoridade policial nem para a empresa que for
operacionalizar essa ligação. O juiz — e aí eu acho que aí há uma comunhão de
idéias e há uma harmonia de pensamento —, o juiz não pode colher provas. O que o
juiz pode é emprestar suporte jurídico, suporte legal à investigação, mas ele não
pode colher a prova e sentenciar nesse processo. Ele está contaminado — como foi
aqui utilizado o termo —, ele fica contaminado, ele foi a pessoa que investigou e ao
mesmo tempo querer sentenciar, querer condenar ou absolver aquela pessoa.
Então, o juiz tem que estar distante no sentido de colhimento, de investigação. E sim
única e exclusivamente dando suporte jurídico, suporte legal às investigações que
são desenvolvidas pela polícia. Descompromisso dos agentes. A Deputada falou
aqui, é um caso que o Walter colocou muito bem. Eu parto da presunção de
honestidade das pessoas. Nós temos, nós fomos investidos no cargo público, temos
os nossos compromissos, os nossos deveres funcionais, e parto da premissa e da
honestidade, tanto do Ministério Público, quando requer uma medida dessas, como
da Polícia. Se você identificar que está sendo induzido a erro ou identificar que
aquela investigação está desviada, você tem obrigatoriamente de tomar as
providências. E, aí, fica fragilizado o discurso, Deputada, de alguns colegas seus de
que poderia fazer-se a escuta sem autorização judicial. Ora, se os agentes estão
induzindo alguns magistrados a um equívoco, a um erro, se estão banalizando esse
mecanismo de investigação, seria muito risco, no discurso da senhora, entregar sem
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autorização judicial à autoridade policial fazer a escuta quando bem entendesse,
quando bem achasse que era conveniente para investigar um determinado acusado.
Mas...
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - O senhor me permite, só para
terminar com essa discussão?
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Pois não.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - O que eu disse foi o seguinte:
prefiro acreditar que existem juizes induzidos ao erro, porque isso acontece em
qualquer profissão...
O SR. MOZART VALADARES PIRES a Lógico.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - ... a que exista má-fé. Quanto às
investigações policiais, digo que há muita incompetência de certos agentes. E
quando falei sobre esse vídeo, que é uma pena que o Dr. Walter não esteja aqui,
não falei do vídeo de um simples interrogatório, em que uma autoridade e um
Procurador da República induzem um policial preso a falar o que ele quer. Esse
vídeo tem 3 anos, esse vídeo desencadeou uma das maiores operações, e tudo o
que ele promete para o policial bandido que está ali, de celular na mão, ele cumpre.
Aquilo que ele disse: “pede, defere; pede, defere”, foi cumprido. Então, é uma coisa
muito mais grave do que eu dizer que é um policial que está lá mentindo para uma
testemunha. Então, o que eu digo é que cabe ao agente ouvir, interpretar e entregar
para o delegado. Por trás disso, tem muitas coisas envolvidas, e prefiro continuar
acreditando que o Judiciário é induzido a erro. Até porque o Dr. Walter disse que
vocês têm uma deficiência enorme de juizes e que há juizes que têm 1.200, 1.300 e
não dão conta disso. Então, essa seria, inclusive, uma das coisas que a gente teria
de consertar aqui.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu quero também externar aqui ao
Deputado Nelson Pellegrino que a nossa Escola Nacional da Magistratura tem uma
grande preocupação em habilitar, em qualificar mais a magistratura sobre esses
temas, que são temas muito delicados, e nós precisamos ter uma margem de
segurança muito grande quando formos investigar e julgar alguma pessoa. Estamos
tratando da liberdade das pessoas, estamos tratando do patrimônio ético e moral de
uma pessoa que é construída ao longo do tempo e não pode, por uma
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irresponsabilidade de qualquer que seja a autoridade, inclusive da magistratura, ser
jogado na vala comum como se fosse um marginal. Então, há essa preocupação das
Escolas da Magistratura. Estamos promovendo cursos de especialização com
profissionais do ramo, passando essas experiências e discutindo, para que o juiz
tenha também mais segurança quando for apreciar, quando for julgar um caso dessa
natureza. Um Deputado que estava aqui falou se nós nos sentíamos confortáveis em
decidir a quebra de um sigilo de um cidadão. Ora, a missão de um magistrado já é
uma missão muito difícil, de julgar o próximo. Então, essa decisão também o
magistrado tem de ter a consciência de que estamos tentando combater ou
esclarecer um crime que está ocorrendo ou que pode ocorrer e trazer um dano ao
País, trazer um dano à sociedade. Então, o Magistrado não pode sentir-se inibido ou
intimidado quando for analisar isso. O que ele tem de ter é cautela, é serenidade,
saber quais as conseqüências de sua decisão judicial, não só nesse caso. Mas num
mandado de segurança com um pedido de liminar, uma antecipação de tutela, nós
temos de saber as conseqüências daquela decisão judicial, quais os danos que
aquela decisão judicial pode causar. Também não vejo a menor necessidade, e
parece que aí vamos discordar do Presidente da Comissão na questão de o
Ministério Público e a Polícia estarem adquirindo aparelhos que possam efetuar
essa quebra do sigilo telefônico. Peço perdão, foi confusão minha. O vazamento da
informação. Eu acho, Deputado Nelson Pellegrino, que a investigação requer um
sigilo, até porque você não tem elemento suficiente para fazer uma acusação ou
para concluir durante a investigação se aquela pessoa é culpada e se aquela pessoa
cometeu aquele crime. Isso nós só vamos fazer depois da apreciação e do
julgamento da sentença de mérito. Agora, com o recebimento da denúncia — e a
denúncia é um resumo da peça policial, é baseada em todas as provas colhidas na
peça policial —, com o recebimento da denúncia pelo Judiciário — e aí começa
efetivamente a ação penal —, acho que, a partir daí, poderemos, na maioria dos
casos, abrir essa informação, para que as pessoas saibam que o Judiciário, o
Ministério Público, a Polícia têm compromisso no combate à corrupção neste País. E
poderemos dar esse atestado. O País é testemunha de que o Ministério Público,
através do Procurador-Geral da República e do Supremo Tribunal Federal, tem dado
grande contribuição em diminuir esse sentimento de impunidade na sociedade
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brasileira. Jamais imaginaríamos, há pouco tempo atrás, que tivéssemos o
recebimento de uma denúncia com 40 acusados, pessoas que exerceram
efetivamente o poder neste País, que efetivamente tiveram o poder político deste
País. Então, acho que, a partir do recebimento da denúncia, quando se esgotou
completamente a investigação policial, não vejo nenhum prejuízo na divulgação de
algumas provas já colhidas. Mais uma vez, fiz um relato muito sucinto, porque o Dr.
Walter, como disse no início, já esgotou o tema e relatou aqui a experiência dele
como Juiz Criminal. Mas gostaria de destacar que foram colocadas aqui pelo
Deputado Nelson Pellegrino as 2 coisas que acho que merecem atenção, que são
exatamente o equilíbrio, a serenidade e a excepcionalidade da medida judicial. Não
podemos... temos de combater que essas, que esse tipo de investigação, que esse
tipo de mecanismo se torne regra no País, porque, aí, vai aumentar a insegurança
do cidadão brasileiro, que ele não sabe, não tem certeza se sua privacidade está
sendo invadida. E a questão do acompanhamento pelo Magistrado é de
responsabilidade do Magistrado. Não se esgota sua responsabilidade única e
exclusivamente depois de conceder a medida judicial. Ele tem a responsabilidade do
acompanhamento, para saber se não está havendo desvio daquela decisão judicial.
E não aceitamos, parta do Judiciário, parta de qualquer Magistrado, que seja
transferida essa responsabilidade. Que ele transfira para a Polícia ou para a
operadora que está efetuando a operação. Então, são essas as minhas...
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Eu gostaria de aproveitar a
oportunidade, antes de V.Exa. concluir, algo que debatemos aqui que acho
importante ser colocado. V.Exa. fez agora uma divisão muito interessante e muito
pertinente. Existe a fase da investigação, dentro do processo acusatório, que leva a
um processo de denúncia e que, depois, vai ao recebimento dessa denúncia e
vamos efetivamente para a instrução processual. E aí fica a minha indagação não
como policial, mas como alguém que cultua o direito e o equilíbrio que devem existir
entre quem acusa e quem defende. Pergunto eu a V.Exa.: V.Exa. é daqueles que
acredita que toda interceptação que serviu de base ao exercício da denúncia e ao
recebimento deva ser ela analisada pelo Juiz dentro do processo ou apenas aquilo
que foi editado e acompanha o procedimento com a denúncia? Ou seja, se houver
um requerimento da parte da defesa no sentido de que o juiz tome conhecimento do
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todo, para que, a partir do conhecimento do todo possa formar seu juízo para
decidir. V.Exa. acha que isso é necessário ou não?
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu acho que uma das características,
uma das obrigações de um magistrado é que ele tenha uma margem de segurança
muito grande na apreciação e sentenciar para absolver ou para condenar. Então, eu
acho que deve vir tudo o que foi interceptado, todo o diálogo. Eu não posso admitir,
eu não estou convencido, apesar de respeitar a opinião contrária, mas eu não estou
convencido de que o tempo justifique um açodamento e não possa analisar por
completo aquilo que foi apurado, para que o juiz possa ter a segurança em
fundamentar a sua absolvição ou a sua condenação de um cidadão brasileiro. Eu
não... A essa questão de tempo, nós temos de dar uma estrutura, nós temos de
botar um juiz auxiliar, se for necessário, mas não posso admitir que o juiz seja uma
gincana, que eu tenho que terminar daqui para amanhã, que eu tenho... Não. Nós
temos de primar pela segurança, porque a liberdade de uma pessoa, como eu disse,
é o patrimônio ético e moral que ela construiu ao longo do tempo e que está em
jogo. E essa pessoa pode ser destruída pelo açodamento, pela não-análise profunda
do que foi colhido nessas investigações. Agora, quero fazer uma referência ao
Deputado Maurício. Tudo o que foi apurado deve vir aos autos; mas tudo o que foi
apurado não pode fazer parte da motivação, da fundamentação, da sentença. Tem
de se restringir àquela investigação. Aquele rapaz que foi investigado sobre tráfico
de cocaína ou sobre crime organizado, de eliminação, vamos dizer, de trabalhadores
rurais, ele foi e, depois, estava numa escuta com o jogo de bicho ou com loteria,
aquilo não pode motivar a sentença, porque ele não estava sendo investigado por
aquele objeto. O objeto da investigação não era aquele. Agora, ele também não
pode apagar aquilo. Agora, a motivação era que ele fazia parte de uma gangue, que
fazia parte de uma organização criminosa, que estava traficando cocaína. E foi
baseado nisso que o juiz concedeu a quebra do sigilo telefônico.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Pela ordem.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deputado Maurício
Quintella Lessa.
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O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Eu concordo. Eu
trouxe esse caso apenas para ilustrar até que ponto a contextualização pode
chegar...
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Exatamente. Um perigo!
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA -... por parte da
autoridade policial.
É claro que, obviamente, eu não sei. Eu não sei nem se o caso é exatamente
esse e não sei qual foi o final desse processo. Se eu entendi, Dr. Mozart, o senhor
defende que o sigilo das interceptações se dê apenas até a fase do recebimento da
denúncia.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Ah, sim!
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - A partir disso, o senhor
acha que poderia haver uma flexibilização para que esses dados fossem divulgados.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Certo.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - É isso?
O SR. MOZART VALADARES PIRES - É. O que eu quero dizer é o seguinte:
com o recebimento da denúncia, que é baseada na prova colhida na peça policial, e
começa, aí, só tem início a ação penal com o recebimento da denúncia. Algumas
pessoas, às vezes, acham que a ação penal começa com o oferecimento da
denúncia. E não é com o oferecimento.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Com o recebimento.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - É. Com o recebimento, por parte do
Judiciário, daquela denúncia. O que eu quero dizer é que, a partir daí, a partir do
recebimento, que se transforma em ação penal, o juiz pode, não é que ele deva
divulgar tudo, mas ele pode flexibilizar e quebrar, vamos dizer assim, aquele
segredo em alguns aspectos.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Eu queria fazer um
questionamento em relação a isso, porque eu acho isso fundamental, porque nós
vamos tratar dessa questão do marco legal.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Lógico.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Se vamos flexibilizar
essa questão da publicidade das provas ali colhidas com a intercepção, se vamos
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ser mais duros em relação a isso. Eu discordo, particularmente, da posição do
senhor e vou lhe dizer por quê. E, aí, vamos fazer o debate...
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Lógico.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - ...que eu acho
extremamente salutar.
Eu acho que há institutos, hoje, que estão banalizados. E acho que a
Associação dos Magistrados e a Associação dos Juízes Federais têm uma
importância fundamental em fazer com que isso acabe, pelo próprio bem dos
institutos.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Lógico. Para apresentar os institutos.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Acho que são institutos
fundamentais, claro. A interceptação telefônica é fundamental para a investigação no
País, como também acho que há uma banalização da prisão preventiva no País. A
gente está cansado de ver — e a Deputada Marina citou aqui um exemplo claro de
um policial que teria sido, não conheço o caso, que teria sido preso por conta de
uma má interpretação do policial, ou talvez o juiz tenha sido levado a erro. Mas
estamos cansados de ver gente sendo presa nessas operações, e com 2 dias, 3
dias, 4 dias, serem soltas, porque realmente não tinham nada a ver com a operação.
Com um pouquinho mais de cuidado, o juiz, na frente, verifica que aquela pessoa
realmente não tinha nada a ver com a operação. Mas, as conseqüências na vida de
um cidadão, de uma família, por conta de uma prisão preventiva no meio de uma
operação, com toda divulgação que é dada hoje no País, elas são inimagináveis. E,
aí, eu pergunto ao senhor: quando há o recebimento da denúncia, aí se começa a
investigação, aliás, o processo penal. Começa o processo penal. Se, nessa fase,
essas conversas de um determinado acusado são expostas — e normalmente são
— na mídia nacional, causam um prejuízo irreparável. E, lá na frente, depois, com
muito cuidado, talvez numa segunda instância, porque eu acho que tem muito juiz
novo demais, principalmente juiz federal novo demais, que sai dos bancos da
faculdade, estuda demais, mas não tem vivência nenhuma, e, aí está, usando a
caneta pesada para mandar prender, enfim, chega lá na frente, e esse acusado é
absolvido. Quem é que vai pagar pela sua honra, ou da sua família que foi naquele
período exposta? Eu acho que ...
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O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Se o senhor me permite, só
para o Dr. Mozart comentar isso aqui...
O SR. MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Eu termino rápido. Eu acho que o
instituto...
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - É o instituto da presunção da
inocência.
O SR. MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Não, da presunção da inocência e
da preservação do sigilo telefônico, que é um instituto constitucional, eles são muito
mais fortes — e devem ser preservados — do que essa publicidade que se dá ou
que poderá se dar de um acusado ainda em fase de processo judicial. Eu acho que
transitado em julgado, aí, sim. A população tem todo o direito de saber quem é
político ladrão, quem é delegado corrupto, quem é juiz ladrão que vende sentença,
eu acho que tem todo direito...
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Ou, então, se o fato for público
e notório.
O SR. MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Ou, então, num processo... Mas
pode ser público e notório para uns e não para outros. Isso está ainda no caráter da
interpretação.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Se V.Exa. me permitir, até
para aduzir algo mais nesse caminho, uma visão interessante. O senhor sabe que
eu advogo o uso da algema. Eu acho que todo preso deve ser conduzido algemado,
por ser um princípio erga omnes. Porque, se não, nós vamos botar algemas nuns e
noutros não colocaremos. Porque a violência não está no uso da algema. A violência
— eu defendo e digo — está na decretação da prisão. Porque se nós temos uma
ordem de prisão, a forma de eu garantir a integridade do preso e a forma de eu
garantir a integridade do agente condutor é ter aquele indivíduo sob domínio.
Eu nunca vou me esquecer do velho filme do FBI, que passava na Academia
Nacional de Polícia nos idos dos anos 70 e anos 80, de uma ação policial que fazia
revista na casa de uma velhinha de uns 70 anos. Os policiais lhe apresentaram um
mandado de busca e começaram a fazer a busca. Quando os policiais se viraram de
costas, a velhinha puxou um revólver e matou os 2 policiais.
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Então, essa é a questão que acho fundamental trazida nesse depoimento do
Deputado Maurício. Por quê? Porque se está preso, ele será conduzido erga omnes
para todos, através de algema. Ou, então, preso ele não está. Inclusive, é uma
garantia daquele indivíduo de que ele foi preso, para amanhã não ser solto, sob a
alegação de que foi contido, foi detido, algemado, mas não resultou em nenhum
procedimento por parte do policial ou da autoridade policial. Então, essa é uma
questão que eu acho que é interessante de ser discutida dentro daquilo que ele
levantou.
E a outra questão é essa específica da disponibilidade do que foi gravado.
Porque — eu digo —, hoje, a imprensa é manipulada. A imprensa hoje só consegue
colocar ao olho público, no que diz respeito aos grampos telefônicos legais e
vazados, aquilo que quem vazou quis que fosse divulgado. Por quê? Porque se ela,
a imprensa, tivesse recebido o todo, e do todo fizesse a sua interpretação, e da sua
interpretação, levasse aquele fato à opinião pública, aquela seria a opinião
publicável pela imprensa, através da sua análise.
Mas, a partir do momento em que ela divulga apenas o trecho que lhe foi
vazado, ela se submeteu a uma censura prévia feita por uma rede policial, por um
membro do Ministério Público — que todo mundo esqueceu de citar aqui e que
também é conhecedor, como vazador de escutas telefônicas —, ou até mesmo
membros do Judiciário, que vai dar à imprensa aquilo que pode ou que deve ser
vazado.
Então, eu acho que essa providência que V.Exa. coloca é bastante pertinente.
Quer dizer, tudo aquilo que serviu à prova, a partir do momento da condenação,
deve ser colocado a público, a todos, e não a um veículo de informação ou a outro
veículo de informação selecionado para, muitas vezes, criar uma relação
interpessoal entre aquele repórter e aquele policial, ou entre aquele repórter e
aquele procurador, entre aquele repórter...
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - V.Exa. me permite?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Deixa eu só concluir meu
raciocínio. Ou entre aquele repórter e o membro do Judiciário. Essas são algumas
considerações que gostaria de fazer e passo a palavra aqui ao Relator.
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O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - É só para complementar,
porque é um perigo esse tipo de divulgação, porque, dependendo do conteúdo que
for divulgado, isso interfere na opinião pública e interfere na mente do magistrado.
Isso é indiscutível.
O Dr. Mozart sabe muito bem, e eu tenho formação jurídica, a gente... Era
muito comum aprender na faculdade que a mente do magistrado é uma coisa
hermética, é uma coisa que não está influenciada pela sua cultura, pela sua história
de vida, pela sua história familiar, pela sua história de convivência social. Isso tudo
interfere na mente do magistrado.
Eu conheço um caso — não sei se a Deputada Marina, que é do Rio conhece
também — que eu protagonizei quando era Presidente da Comissão de Direitos
Humanos. Há uma intolerância muito grande e justificada no Rio de Janeiro com o
desaparecimento de crianças. Desapareceu uma criança no Rio de Janeiro, e uma
pessoa que era de uma ONG — Cristina Leonardo. Ela passou a investigar o
desaparecimento dessa criança. A mãe da criança recebeu uma ligação em que
ninguém falava do outro lado, mas, ao fundo, ouvia-se uma criança chorando e tal. A
partir daí, foram rastrear de onde era essa ligação, e era de um município do interior
da Bahia chamado Catu. A partir daí, a PM-2 fazendo a investigação, chegou a um
petroleiro, depois chegou a um senhor de 60 anos que estava em Feira de Santana.
Os 2 foram presos. Foram levados... Os 2 foram apresentados como seqüestradores
da menina, e, em 5 meses, a partir de um material produzido pela Polícia Militar,
pela 2ª seção — portanto não foi um inquérito policial —, os 2 foram condenados
com um linchamento público. Foram condenados em 5 meses. O processo penal
tramitou em 5 meses. Esse caso me chegou ao conhecimento quando Presidente da
Comissão de Direitos Humanos.
Eu achei que era absurdo, porque a primeira informação que me deram foi a
de que, no dia do desaparecimento da menina, um estava embarcado no Rio
Grande do Norte, e o outro estava em Feira de Santana. Mas, devido a como a
apuração foi feita de forma atabalhoada, a defesa também, e houve comoção, esses
2 foram condenados.
Quando eu comecei a ir para o Rio de Janeiro fazer uma contraprova,
comecei a trabalhar a opinião pública, a Cristina Leonardo entendeu que havia sido
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cometido um grande erro judiciário, inclusive com a ajuda dela, e aí se foi formando
a convicção na cabeça do magistrado, ele começou a ver o outro lado, e os dois
foram absolvidos, em segunda instância.
Então, é evidente que o magistrado não tem só esse como elemento de
convencimento. O magistrado tem como elemento de conhecimento o que está nos
autos. Aliás, o que não está nos autos não está na vida. Essa é a regra. Mas a
opinião pública também influencia, acaba também influenciando, acaba... Uma
investigação malfeita é um brocado também nos bancos de faculdade: um bom
inquérito é uma meia condenação, também o inquérito ruim é uma meia absolvição.
Isso é uma verdade. Se não houver...
Com todo o assoberbamento que... Foi dito aqui pelo Dr. Walter Júnior que as
varas judiciárias estão abarrotadas de processo. Muitas vezes, o magistrado não
pode dar atenção àquela ação penal...
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Exato.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - ...inclusive no curso que
deveria dar.
Então, eu penso que essa é uma matéria que precisa ser discutida, porque
envolve o direito à presunção da inocência, envolve o direito a se ter o seu sigilo
telefônico resguardado e envolve o direito à informação da sociedade.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Sr. Relator?
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Qual o bem maior a ser
tutelado aí? Esse é um debate interessante.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Tem de haver um
equilíbrio.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Sr. Relator?
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Tem de haver um equilíbrio.
Então, esse equilíbrio — só para concluir, porque a minha fala vai ao encontro da do
Deputado Marcelo Itagiba. Se vai liberar, é para todo mundo, e o conteúdo todo. E,
aí, vem uma discussão que temos de trabalhar nesta Casa. Porque se eu sou dono
de um órgão de comunicação, a partir do momento em que eu recebo todo o
conjunto da informação e eu levo ao ar uma matéria tendenciosa, uma matéria
dirigida, se eu tenho todo o conteúdo, eu tenho de responder por isso depois. E, se a
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pessoa é inocente, esse conteúdo foi levado ao ar, e isso acabou criando um
prejuízo à sua imagem, o órgão de comunicação vai responder por isso. Então, ele
tem de ter a dimensão da responsabilidade dele ao divulgar a notícia, para saber se
ele levou a notícia de forma isenta ou se ele direcionou ou se ele fez mau uso do
conteúdo que lhe foi colocado.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Sr. Relator, permite-me um
aparte?
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Pois não.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Isso que o senhor está falando é
muito grave, até porque depois que vai para a mídia já há uma pré-condenação.
Várias vezes, vimos aí o Ministro Marco Aurélio tomando cacetada da imprensa
porque se atém ao texto da lei, e se... Quando casos assim muito midiáticos caem
na mão dele, é o único que tem coragem de falar: “Não, isso aqui está errado e vou
soltar”.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu vou apresentar a minha defesa.
Tenho direito à defesa, não é? A todo réu, a legislação oferece o direito.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Não só V.Exa., mas toda a
briosa classe dos magistrados.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu vou relembrar o que eu disse
aqui. Eu disse que do recebimento da denúncia começa a ação penal. O que é a
denúncia? A denúncia é o resumo da peça policial. O juiz, quando recebe a
denúncia, Deputado Maurício — e, aí, eu não estou dizendo nenhuma novidade —,
ele não recebe — e, se fizer assim, é um irresponsável — recebe porque o promotor
está denunciando, ele tem de ler a peça policial, ele tem de ver se a denúncia retrata
as provas que estão contidas na peça policial, porque, se isso não ocorrer, ele pode
rejeitar a denúncia, ele pode não receber a denúncia. Aliás, se ele receber, e a
defesa entrar com uma medida judicial no tribunal, pode trancar aquela ação penal.
Então, eu imagino e estou convencido da responsabilidade de um membro do
Ministério Público, estou convencido da responsabilidade da autoridade policial e do
magistrado, quando há o recebimento da denúncia, essa peça policial foi estudada,
toda a peça policial foi estudada pelo Ministério Público e, depois, foi revisada e
estudada pelo magistrado, sob pena de ele não receber a denúncia. E, a partir daí, a
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margem de segurança... E, se o senhor fizer um levantamento sobre as
condenações e as absolvições, vai ver que a coisa é gritante. Então, há uma
margem de segurança, e, a partir dessa margem de segurança, o juiz, apreciando
um pedido, pode abrir, quebrar algum segredo, alguma gravação. Pode. Isso
depende da conveniência, depende do requerimento, da motivação, da
fundamentação do juiz. E a essa decisão do juiz cabe recurso. Ou seja, o tribunal
pode revogar essa decisão do juiz e não permitir a divulgação. Eu não estou aqui
defendendo que toda informação seja jogada irresponsavelmente.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Só um minuto, para não perder o
raciocínio. Antônio João da Silva, lá em Penedo, em Alagoas, está sendo acusado e
processado por homicídio. Esse processo é público, a esse processo qualquer
pessoa pode assistir, pode assistir o júri, pode assistir as audiências e ouvir a
testemunha de acusação e de defesa. Aí, eu pergunto: e se o juiz chegar à
conclusão, e houver recurso para o tribunal, e o tribunal ratificar a sentença que não
foi um homicídio e, sim, uma legítima defesa? Esse rapaz também não teve a sua
privacidade ou não passou, durante certo tempo, como se fosse um marginal?
Então, vamos proibir para todo mundo. Então, vamos proibir que os acusados
tenham os seus nomes revelados, qualquer que seja o crime, porque se ele for
absolvido quem vai pagar no final? Ora, eu estou defendendo isso, Deputado
Maurício, porque a magistratura brasileira era acusada de corporativismo na
investigação de um magistrado. Se V.Exa. pegar o Diário Oficial de Pernambuco, o
meu Estado — e vou citar o meu Estado porque eu conheço —, está lá: “O tribunal
recebeu a denúncia de fulano contra o juiz fulano, fulano e fulano”, estão o nome e
a comarca, a partir do recebimento da denúncia. A sociedade tem o direito de saber
que aquele cidadão está sendo investigado e que não há impunidade e
corporativismo. Temos 3 juízes presos em Pernambuco, 3 juízes presos da minha
idade, do meu concurso. Ora, e como é que a gente poderia esconder um negócio
desse? Como é que a sociedade, que paga e que me remunera, não tem o direito de
saber que há vontade política e determinação de punir o mau juiz?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - V.Exa. não acha que seria
importante uma recomendação da própria AMB no sentido de que, todas as vezes
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em que houver vazamento de escuta telefônica autorizada por juiz, ele deveria fazer
a requisição de instauração de inquérito policial para apurar esse vazamento?
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Sim. Agora, o que eu quero dizer
também é que nós somos seres humanos, o juiz não é um extraterrestre, nós somos
seres humanos. O político... Quando vejo uma crítica generalizada à classe política
brasileira, digo: “Mas o político sai da sua casa, é seu irmão”. Tenho um irmão que é
Presidente da Câmara de Vereadores, no interior de Pernambuco. Ora, ele teve a
mesma educação e, por ser político, ele é corrupto, e eu, por ser juiz, sou honesto?
Quem definiu isso? Ora, quando vejo isso digo que não pode acontecer. Nós somos
seres humanos. A colocação do Deputado Nelson Pellegrino causa alguma
preocupação, mas juiz tem de receber pressão mesmo, e tem de suportar a pressão.
Quando chega um advogado de uma das partes, ele não está fazendo mais do que
lobby ali, ele quer me convencer do direito dele. E eu tenho de ouvir e tenho de ter a
independência de, na hora de julgar, afastar, se não me convencer. Não posso ter
medo da opinião pública, a opinião pública não pode julgar o processo que eu estou
presidindo, quem vai julgar o processo que estou presidindo é o magistrado. O
magistrado independente é aquele que tem a coragem de absolver quando um
segmento da sociedade quer a condenação. E, se não merecer a condenação, aí,
sim, ele é um juiz independente porque ele teve a coragem de não sacrificar o
inocente em virtude da sociedade ou da mídia. E cito um caso que muito me
orgulha, em Pernambuco. Houve um escândalo no meu Estado — a questão da
hemodiálise num laboratório em Caruaru, em que morreram vários pernambucanos
e várias pernambucanas —, e a sociedade exigia a punição de alguns médicos e do
dono do laboratório, e o juiz absolveu. O juiz absolveu baseado em tudo o que foi
apurado. E o juiz não sofreu nenhum tipo de retaliação, porque ele teve a coragem e
a independência de dizer: ”Não. Eu não vou sacrificar alguém porque a mídia quer,
porque a sociedade quer. Não”. Esse é o juiz de que estamos precisando, esse é o
juiz que honra a magistratura brasileira. Não posso me negar a receber a parte, não
posso me negar a receber o advogado. Agora, eu vou ouvir; se ele me convencer,
tudo bem. Se ele não me convencer, acabou. Eu vou julgar com o que há nos autos
e a minha conveniência, a minha convicção, ali na sentença, está expressada, ali
está a minha convicção. Então, eu queria trazer esse depoimento e exatamente
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essa questão. Outra questão que o Deputado Maurício levanta — e é merecedora a
crítica a alguns colegas, alguns colegas merecem a crítica — é que estão fazendo
da prisão preventiva uma antecipação da pena. O Código de Processo Penal
enumera em que condições se pode decretar uma prisão preventiva, porque quem
obstaculiza uma prova e ameaça uma testemunha está ali, não é antecipação de
pena. A mesma coisa é liminar em antecipação tutela. A crise do Judiciário chegou a
um tamanho, o caos, a morosidade do Judiciário, a quantidade de processo... Só
para se ter idéia, o Supremo Tribunal Federal, no ano passado, julgou próximo a 150
mil processos. Se o senhor disser isso fora do País vai causar uma indignação, uma
vergonha. Como é que um tribunal julga 150 mil processos em um ano, como fez o
Supremo Tribunal Federal? Tive, uma vez, audiência com o Ministro Moreira Alves,
ele ainda estava na ativa, e ele disse: “Nós não julgamos, nós estamos decidindo,
não temos mais condição de julgar, estamos apenas decidindo, pela quantidade e
pelo volume de processo”. Ora, o que está acontecendo é a concessão de liminar
em antecipação de tutela, o juiz está concedendo liminar em antecipação de tutela, e
não julga mais o mérito. Aquelas medidas provisórias ficam como se fosse
julgamento de mérito, e a pessoa utilizando aquelas medidas provisórias. Então, o
juiz tem de ter a responsabilidade de saber as conseqüências. Como a quebra do
sigilo telefônico é uma exceção, a preventiva também é exceção, não é regra. A
liminar é exceção, não é regra, a antecipação de tutela é exceção, não é regra. É
preciso que o juiz esteja consciente disso. E, aí, não há corporativismo, não sou
presidente de ordem ou de classe para defender o que não é possível defender, mas
acho que a grande maioria da magistratura brasileira tem essa consciência, tem
esse equilíbrio, tem essa responsabilidade. E gostaria de dizer mais uma coisa:
participo da vida associativa. Fui 3 vezes Presidente da Associação dos Magistrados
de Pernambuco. Estou presidindo, agora, a entidade nacional. E não se engane,
Deputado Maurício: a magistratura jovem deste País está dando um retorno muito
bom não só na magistratura, mas no Ministério Público, na magistratura, nas
carreiras de Estado. Há uma renovação, há uma oxigenação. A mentalidade, o
compromisso social é bem mais aguçado, é muito maior. Nós vivemos numa
democracia. Nós vivemos, hoje, período em que o juiz não se contenta mais em
receber a parte e proferir uma sentença, ele quer discutir, ele quer participar da
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discussão e da solução dos grandes temas nacionais. Nós temos visto isso hoje em
todas as carreiras de Estado. Então, o juiz jovem, apesar de, em parte, a sua
juventude poder levá-lo a... E aquela autoridade, aquela caneta, aquele poder pode
levar a ato um pouco inconseqüente. Mas tenha certeza absoluta de que o que está
modificando este País é exatamente o concurso público e essa renovação nas
carreiras de Estado. Obrigado.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Eu só queria deixar
bem claro que eu não... Não, nada, ao contrário. Até porque eu já fui muito criticado,
quando assumi...
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Alguns cargos públicos.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - ... alguns cargos
públicos muito novo. Fui Secretário de Educação do Estado e do Município e
Presidente da Câmara de Vereadores com vinte e poucos anos de idade. Então, sei
o valor, sei a importância de a juventude estar chegando. Eu falei dos excessos que,
às vezes, são cometidos. Dos excessos. E os excessos podem ser cometidos por
velhos e por novos.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - É lógico.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Aliás, os velhos, às
vezes, têm vícios muito piores do que os excessos cometidos pelos novos. Por isso
é que eu queria deixar claro.
Porém, a intervenção... E, nessa questão da...
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Parece que fui absolvido. Parece.
(Risos.)
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Não. Quase absolvido.
Nessa questão da possibilidade da divulgação, sobre os argumentos que V.Exa.
trouxe aqui, confesso que vou refletir... Vou refletir sobre esses argumentos.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - V.Exa. me permite, só um exemplo?
Se os Deputados me permitem, serei rápido. Havia uma coisa que incomodava
muito a mim e à Diretoria da Associação de Magistrados de Pernambuco: 6 ou 7
juízes estavam respondendo a processos, e o tribunal não julgava. Nós entramos no
Conselho Nacional de Justiça pedindo que o tribunal julgasse. Eu não pedi
condenação, não pedi absolvição, mas pedi que ele julgasse. Que desse, inclusive,
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preferência. A sociedade tem o direito de saber se o juiz é corrupto ou não. E o
próprio juiz deve ter interesse em ser julgado. Sabem o que aconteceu? O Alexandre
de Moraes, que era conselheiro —isso foi na primeira composição do Conselho
Nacional — concedeu. Ele queria restaurar o exercício de todo o mundo. E um
conselheiro, o Jirair, perguntou: “Mas qual é a acusação que pesa contra esse juiz?”
Eu disse: “Ele pode estar roubando. O que não justifica é ele estar há 4 anos sem
ser julgado pelo seu tribunal”. Eles concederam 90 dias de prazo para julgarem.
Vejam a falta de informação a que levou o Tribunal de Justiça. Eles passaram 90
dias... A decisão do Conselho, por unanimidade, foi a de conceder um prazo de 90
dias para que todos fossem julgados, e mandou as peças do processo para a
Corregedoria, para apurar a responsabilidade, por que não haviam sido julgados.
Uma juíza de Palmares, Hydia Landim –– posso dizer o nome, porque Pernambuco
já conhece –– teve restaurado o seu exercício. Ela estava afastada há 4 anos, e
todos os processos a que ela respondia –– todos, sem exceção! –– foram
arquivados pela prescrição. Imagina se nós tivéssemos, se a sociedade tivesse
conhecimento, talvez o Tribunal não tivesse engavetado esse processo. Ou seja, ela
hoje não sabe... Quer dizer, ela sabe, mas a sociedade não sabe se justifica ou não
o afastamento dela, se ela é honesta ou se ela é desonesta.
(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Não. Foi arquivado esse processo,
pela prescrição.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Já o que o Deputado Maurício havia
perguntado, eu só queria saber o seguinte: quais as providências quando os
excessos existem, seja no sigilo, na quebra de sigilo, na interceptação, seja na
banalização das prisões preventivas? Quem aciona? A quem chega a reclamação?
À parte? Ao advogado? Quem pode...? A própria associação recebe a reclamação?
O SR. MOZART VALADARES PIRES - A associação não tem o poder de
punir, nem de...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Tem de ser o Conselho Nacional de
Justiça?
O SR. MOZART VALADARES PIRES - O Conselho Nacional. Eu ia lhe
dizer... a contribuição... e aqui estou dizendo isso, porque a magistratura... Inclusive,
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a entidade que presido hoje entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade
sobre a composição do Conselho. Nós recebemos com receio o Conselho. Nós
pensávamos, nós imaginávamos que o Conselho pudesse adotar as políticas de
algumas das cúpulas do Judiciário, e aquele Juiz independente, aquele Juiz que não
alimenta a política da cúpula pudesse ser punido, aquele Juiz independente. Porque,
em algumas oportunidades, a pessoa diz: “Mas aquele juiz é muito preparado, é um
juiz que preste um bom serviço, como é que ele não chegou ao Tribunal? Por que
ele não é desembargador? — “Ele é muito independente para ser desembargador”,
respondem, como se isso fosse um defeito, quando é uma virtude. Então, nós
tínhamos medo que esse controle pudesse atingir a independência do magistrado, a
independência do Poder Judiciário, mas eu quero dizer que o Conselho Nacional
hoje está dando, emprestou ao Judiciário, coibiu alguns abusos de alguns
magistrados de alguns tribunais. Nós tivemos a capacidade de combater o próprio
nepotismo dentro do Judiciário. Nós tivemos a capacidade de abrir o voto. A
movimentação da carreira do juizes hoje é baseada no voto aberto e fundamentado.
Ou seja, o meu sobrenome, o meu parentesco como desembargador não é mais
critério para que ele seja promovido. Há de se fundamentar o voto. Aquele juiz tem a
certeza agora de que só recai o merecimento sobre sua promoção se trabalhar. Não
é preciso fazer peregrinação em gabinetes de desembargador. Então, o Conselho
está emprestando impessoalidade, ética e transparência ao Poder Judiciário. Então,
qualquer cidadão que se sinta prejudicado por um tribunal ou por um magistrado
pode ir ao Conselho Nacional de Justiça, e com a certeza absoluta que o Conselho
não permitirá desvios, não permitirá abusos, partam de onde partirem.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Uma coisa importante que V.Exa. falou
é o seguinte: na primeira instância, acontece uma decisão de excesso, em vez de
exceção de interceptação, ou, então, de exceção na prisão preventiva, há o
excesso. Aí, caracteriza para a mídia importância nessa decisão, nessa sentença,
nessa decretação da prisão preventiva. E isso vai para a mídia, e, se vai para mídia,
e os recursos vão para o Tribunal, vão para o STJ, vão para o Supremo, aí, a mídia
começa a forçar decisões, porque a decisão da primeira foi errada, mas a própria
mídia a sustenta. Eu pergunto: essa independência do juiz, a que V.Exa. tanto se
referiu e deve existir, essa consciência de que não deve acompanhar a mídia, isso
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começa a formar uma cultura diferente? Porque o que nós sentimos é que a mídia
conduz, às vezes, a sentença, conduz, às vezes, a decisão.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu não tenho essa impressão, não. A
impressão que eu tenho em alguns casos é a de que a mídia julga, mas não
interfere no julgamento. A mídia tem o julgamento dela, mas não interfere no
julgamento. A mídia tem o julgamento dela, a judicial pode ser totalmente diferente.
A mídia faz, em alguns casos — e eu não posso também generalizar a mídia —, em
algumas oportunidades, um prejulgamento dela, ela tem o julgamento dela, ela tem
a sentença dela, que obrigatoriamente pode não coincidir com a sentença judicial.
Eu quero dizer que somos seres humanos. E, ao juiz, absolutamente nada, nenhum
fator externo, nenhum fator político nem de crença religiosa, de convicção política...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Deveria.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Porque eu tenho convicção política,
eu sou um cidadão, eu tenho minhas preferências. Quando eu vou votar, eu escolho
meu candidatos por afinidade ideológica, mas essas convicções não podem jamais
interferir, nenhum fator externo pode interferir, apesar...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Nem opinião.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - A legislação me dá esse poder, eu
posso me averbar de suspeito. Há impedimento quando é parentesco, amigo ou
inimigo, e há suspeição quando eu não tenho controle — não é? — quando alguma
coisa externa, quando algum fator externo pode interferir no meu julgamento.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Então, a opinião pública ou a opinião
publicada deve ser sempre alijada de qualquer ...
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Lógico.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - ... sentimento nesse sentido.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - E nós temos de compreender, ter um
pouco de compreensão dos exageros da mídia, dessa ânsia de fazer o
prejulgamento, o linchamento. Nós vivemos numa democracia muito jovem. Nós
precisamos consolidar o Estado Democrático de Direito, nós precisamos consolidar
mais esta democracia brasileira. Nós passamos um período muito longo de regime
fechado, no qual estava proibido se expressar livremente e a imprensa não tinha o
direito de divulgar os fatos ou levar ao conhecimento da sociedade os fatos de
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interesse da própria sociedade. Então, nós vivemos esse exagero.... O tempo.... O
amadurecimento da democracia, o fortalecimento das instituições vai, pouco a
pouco, diminuindo isso. Eu gostaria que isso já tivesse sido construído, mas isso é
uma mudança de mentalidade, uma mudança de cultura. E isso não se faz do dia
para a noite. Isso é um processo de construção, e nós temos avanços. E, em
algumas oportunidades, infelizmente, nós temos algum retrocesso.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Parabenizo V.Exa.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu agradeço.
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Essas afirmações nos deixam bastante
tranqüilos em relação ao novo movimento, pelo menos dos jovens, como diz V.Exa.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu agradeço. Obrigado.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Eu gostaria... Bom, primeiro, eu
acho que essa discussão em torno da mídia, ela também é uma coisa de jogar um
para o outro. A mídia só publica aquilo que alguém fala. A mídia não inventa as
coisas. É lógico que alguma autoridade, alguns falam em off, e, aí, a mídia aproveita
o off, e o jornalista escreve o que quer. Mas, na verdade, tudo parte de alguma
autoridade, como disse o Deputado Marcelo Itagiba, que vazou aquelas informações
por razões suas. A mídia aproveita e vai publicando. Nós vimos a história, por
exemplo, da Escola Base, em que uma família inteira foi destruída. Como o senhor
mesmo disse, a Justiça absolveu todo mundo, mas 3 membros da família já haviam
morrido. E aquela família... O pai foi linchado, a escola foi destruída, porque uma
criança disse que havia sido bolinada. Então, são perdas, como disse o Deputado
Maurício, irreversíveis, mas não é culpa da mídia. A mídia é como o senhor mesmo
diz, nós estamos num Estado Democrático de Direito, e a mídia tem de ser livre, ela
tem de poder, o tempo todo, noticiar ao povo aquilo que alguém está dizendo para
ela, ou seja, uma autoridade.
Outra coisa que eu queria dizer é que o senhor não foi réu aqui. Muito pelo
contrário...
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Não. Fui eu que me intitulei.
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Foi. Foi, sim. O senhor disse que
o Dr. Walter deu uma aula aqui. Eu achei o senhor muito mais sincero, menos
defensivo, como dizemos na gíria, sem papas na língua, fazendo o mea-culpa, onde
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há erros. Como o senhor disse, somos seres humanos todos — porque o seu irmão
é Vereador, é político, é corrupto, e o senhor é o anjinho? — entendeu? Eu gostei
muito de ouvir. Nós estamos aqui há 4 horas e, para mim, foi uma maravilha. Quero
parabenizar o Dr. Marcelo por essa Mesa, por esta oportunidade de se discutir o
Judiciário, as relações entre a polícia, o Ministério Público e a magistratura.
Muito obrigada pela sua presença.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Eu queria dizer só que sacrifiquei —
e aqui, agora, não vou passar de réu para vítima...
A SRA. DEPUTADA MARINA MAGGESSI - Não.
O SR. MOZART VALADARES PIRES - Não. Eu estou dizendo que eu me
sacrifiquei, eu sacrifiquei minha família, sacrifico minha família pelo movimento
associativo, sacrifiquei minha carreira. Para V.Exa. ter idéia, 4 colegas meus de
concursos são desembargadores em municípios de Pernambuco, e eu não estou
nem no quinto, nem votado eu posso ser ainda. Por quê? Porque faço a defesa de
algumas coisas e condeno outras. Mas queria dizer que estou muito feliz no
movimento associativo, porque as entidades de classe hoje da magistratura — eu
posso dar esse atestado —, nós não temos compromisso para com quem se utiliza
do cargo para condutas ilícitas. Se o magistrado cometeu um erro, nós vamos
exigir.... Não damos o atestado de inocência, mas também não aceitamos um
prejulgamento. Agora, vamos exigir a apuração rigorosa e, se for encontrada culpa,
que seja punido exemplarmente.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - Para concluir, Sr.
Presidente. Para concluir, vou fazer uma pergunta aqui ao Dr. Mozart: essa questão
da influência que a mídia pode exercer no magistrado é uma coisa muito
preocupante, principalmente depois de lermos Saulo Ramos. O senhor leu o Saulo
Ramos?
O SR. MOZART VALADARES PIRES - O Código da Vida.
O SR. DEPUTADO MAURÍCIO QUINTELLA LESSA - O Código da Vida.
Bom, aí não vou me alongar, se o senhor leu, sabe do que eu estou falando. Eu
queria só fazer minhas as palavras da Deputada Marina e parabenizá-lo pela
palestra. E dizer que ajudou muito esta Comissão. Eu acho que depois de passado o
período de investigação, quando formos definir o novo marco legal, quando formos
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sugerir o novo marco legal, acho que, antes disso, deveríamos fazer uma nova
reunião com as associações de magistrados e também com o Ministério Público.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Bom, antes de encerrar,
gostaria também de fazer algumas considerações.
Eu me sinto sempre muito à vontade quando faço a autocrítica da atividade
policial, quando critico o Ministério Público e quando elogio o Ministério Público e
quando critico e quando elogio a magistratura, porque, por essas coisas do destino,
meu pai teve o privilégio de exercer as 3 funções. Meu pai foi Delegado Regional de
Polícia, na época dos anos 20; meu pai foi Procurador-Geral de Justiça, no Estado
do Rio de Janeiro, e foi Presidente do Tribunal de Justiça, no Rio de Janeiro. Então,
portanto, ele percorreu todos esses caminhos, e eu convivi de alguma forma com
parte desses caminhos por ele exercido. E o que eu tenho sempre procurado fazer é
buscar o caminho do Direito. Exerci durante muitos anos o cargo de Delegado da
Polícia Federal — por mais de 25 anos — e, hoje, estou Deputado Federal. E ainda
sou Delegado da Polícia Federal.
Mas eu vejo que essa discussão transcende a questão da legalidade ou da
ilegalidade do grampo. Ela está vinculada diretamente à questão das garantias e
direitos individuais — garantias e direitos individuais, que são, de alguma forma,
violados legalmente por esses 3 personagens: o delegado de polícia, o Ministério
Público e o Judiciário. São os 3 atores.
Daí a importância dos depoimentos que estamos colhendo nesta CPI. O
marco desta CPI não é procurar o culpado. Penso que o marco desta CPI é a busca
do aperfeiçoamento legislativo. E isso nós só poderemos fazer dentro do processo
dialético. E esse processo dialético se dá a partir do momento em que nós temos a
capacidade de escutar representantes do Judiciário e representantes do Ministério
Público, que trazem as experiências que, muitas vezes, não são as nossas
experiências, para que, daí, nós possamos fazer a síntese hegeliana e termos
efetivamente uma melhor peça legislativa para o exercício do controle da atividade
de interceptação telefônica.
Eu não tenho dúvida de que todos nós, de alguma forma, por mais certeza
que tenhamos, sempre procuramos fazer o melhor. E o melhor não está sendo feito.
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Daí o escopo desta Comissão Parlamentar de Inquérito, que tem por objetivo,
primeiro, fazer a radiografia do que é interceptação telefônica no País, porque
ninguém hoje tem condições — e eu espero que esta CPI tenha em função das
respostas que nós vamos receber — de dizer quantos mil grampos existem hoje no
País legalmente autorizados pela Justiça.
Nós não temos condições, hoje, de dizer que os juízes, efetivamente — o
depoimento ficou patente aqui —, exercem, embora devessem exercer, o controle
das medidas autorizativas de interceptação telefônica. Como eu digo, o uso do
cachimbo faz a boca torta, e o Ministério Público, hoje, parece-me, às vezes se
esquiva de exercer aquela que é a mais importante atividade do Ministério Público
em toda a sua existência, que não é o papel de acusador, mas o papel de custus
legis. O papel de efetivo fiscal da aplicação da lei.
E, na minha visão, entendo que o Ministério Público se afastou muito dessa
função custus legis. E está exercendo — talvez até em função do movimento
pendular, que é muito natural nas nossas vidas e nas nossas carreiras e até mesmo
no nosso processo democrático e político do País — muito mais o papel acusatório.
Então, eu fiquei muito feliz hoje de poder ter recebido esses 2 ilustres
magistrados, dignos representantes da categoria do Judiciário brasileiro, que, com
certeza, trouxeram de forma latente aquilo que nós precisávamos ouvir, que é a
realidade dos fatos, para que nós possamos, cada vez mais, aprimorar os nossos
trabalhos.
Então, em nome desta Comissão, agradeço a V.Exas., o tempo, o
depoimento feito, a sinceridade e a honestidade com que colocaram os vossos
pontos de vistas.
Concedo um parte ao nosso Relator para, em seguida, poder concluir minha
palavra.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - E autor do requerimento
também.
Primeiro, quero agradecer ao Dr. Mozart e ao Dr. Walter por essa contribuição, como
disse bem o nosso Presidente, os depoimentos que colhemos aqui hoje não são só
de homens públicos, mas também de pessoas que estão no exercício da profissão;
estão do outro lado, digamos assim, em um dos lados da questão. Então, a vivência
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é muito importante, tanto a do Dr. Mozart, quanto do Dr. Walter, inclusive com
questionamentos de alguns pontos da lei em relação ao prazo, em relação à
publicidade do conteúdo que é interceptado, que é um debate que faz parte do
âmbito não só da investigação, mas também das recomendações da Comissão.
O próximo passo, Sr. Presidente, é ouvir o Ministério Público. Eu peguei o
final de seu repto em relação ao Ministério Público. Concordo, acho que... Queria
agradecer também a presença aos 2 representantes do Ministério Público que
estiveram aqui e que se disponibilizaram a vir a uma nova sessão. Vamos agendar
em breve em relação a isso. Mas continuo insistindo.
Estas são minhas palavras finais, inclusive ao Dr. Mozart, que é
representante... Na verdade, a AMB representa todos os magistrados brasileiros. Ela
tem essa característica. Todos os segmentos do Judiciário estão representados pela
AMB.
Penso até que nas recomendações nós devemos reforçar este papel guardião
do magistrado na quebra desse direito fundamental. Portanto, a Constituição e a lei
deu ao magistrado a guarda desse direito constitucional, a flexibilização dele quando
isso depender do interesse do Estado ou da sociedade, para sua proteção e para a
proteção de uma comunidade, mas penso que o magistrado deva não só autorizar
de forma fundamentada, mas que deva fazer todo um acompanhamento de como
aquela determinação está sendo cumprida. E é o responsável, inclusive, por auditar
a regularidade daquele processo interceptatório.
Inclusive, minha interpelação a V.Exa. e ao Dr. Walter foi nesse sentido. E é
uma coisa que eu quero, depois, até examinar como é que é feito o relatório da
autoridade policial que é encaminhado ao magistrado ao final dos trabalhos de
interceptação. E eu penso que esse relatório não tem que ser apenas do conteúdo
do que foi interceptado, mas o dia que foi autorizado, quem foi interceptado, a hora
que foi interceptado, quem participou da interceptação, quem fez as degravações,
quem fez os comentários...
O SR. DEPUTADO SIMÃO SESSIM - Quem editou.
O SR. DEPUTADO NELSON PELLEGRINO - Quem editou... Quem editou,
não. Quem degravou e quem fez o relatório, porque uma das coisas que eu hoje
questiono é justamente isso. Aqui, com a devida vênia do Deputado Marcelo Itagiba,
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: CPI - Escutas Telefônicas ClandestinasNúmero: 0109/08 TRANSCRIÇÃO IPSIS VERBIS Data: 05/03/2008
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nem tanto da Deputada Marina, que é agente policial, mas hoje os relatórios policiais
se constituem em verdadeiras denúncias. A autoridade policial tem que só apenas
classificar a autoria e a materialidade do fato. Muitas das vezes estamos assistindo a
alguns relatórios policiais que não só se limitam a identificar se houve um fato
criminoso e quem é o autor, mas tipificam, qualificam, recomendam. Então, são
questões que nós precisamos também... Talvez não seja no âmbito desta CPI, mas,
como V.Exa., também faço parte da Comissão de Constituição e Justiça, e é um
debate que eu quero enfrentar nesta Casa, porque acho que há uma pequena
invasão aí. Acho que a regularidade de todo o processo interceptatório precisa ser
relatada à autoridade, que é a guardiã desse direito, a ela a lei confiou, porque a lei
remete à Constituição. A Constituição previu essa possibilidade, remeteu à
autoridade judiciária essa guarda desse direito, que é um direito fundamental de
todo cidadão.
Queria agradecer a contribuição ao Dr. Mozart e ao Dr. Walter, que já se
ausentou, e elogiar mais uma vez V.Exa., Sr. Presidente, pela condução dos
trabalhos e pela firmeza das opiniões, que têm sido contribuições importantes para a
nossa Comissão Parlamentar de Inquérito.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Marcelo Itagiba) - Obrigado, Deputado
Nelson Pellegrino.
Apenas para ilustrar o que V.Exa. disse, me lembra muito bem uma
passagem de um livro de meu pai chamado Homicídio, exclusão de crime e isenção
de pena, em que ele retrata um fato do qual ele foi parte. Um indivíduo matou um
burro na via pública porque havia empacado e a autoridade policial autuou aquele
indivíduo no crime de homicídio e pediu, ao final do relatório, uma pena de 30 anos.
Ao receber aqueles autos, meu pai pediu que se mudasse a autuação de homicídio
para “burricídio”. Então, às vezes existem excessos que são cometidos e que não
deveriam ser.
Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos, antes convocando os
Srs. Deputados para a próxima reunião ordinária, a realizar-se amanhã, dia 6 de
março, às 10h, no Plenário 11, Anexo 2, para tomada de depoimento dos Srs. Paulo
Edson Pioner, Gustavo Fleichman, Delmar Nicoletti, Tula Peters, Diogo Rio Neves e
Guilherme Henriques de Araújo, todos representantes de empresas de telefonia já
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previamente convocados; e, ainda, para a deliberação de requerimentos, razão pela
qual peço que o maior número possível de companheiros estejam presentes.
Está encerrada a presente reunião.