DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando...

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DEPARTAMENTO DE DIREITO MESTRADO EM DIREITO Especialidade em Ciências Jurídico-Criminais JUSTIÇA RESTAURATIVA A MEDIAÇÃO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATÉ 2012 Mestrando: Leonel Madaíl dos Santos Orientador: Juiz Desembargador Carlos Alberto Gameiro Campos Lobo Lisboa Novembro 2013

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Page 1: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

DEPARTAMENTO DE DIREITO

MESTRADO EM DIREITO

Especialidade em Ciecircncias Juriacutedico-Criminais

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL

EM PORTUGAL ATEacute 2012

Mestrando Leonel Madaiacutel dos Santos

Orientador Juiz Desembargador Carlos Alberto Gameiro Campos Lobo

Lisboa ndash Novembro 2013

1

Dedico este estudo agrave minha esposa Lurdes e agrave minha filha

Beatriz pelo esforccedilo compreensatildeo e paciecircncia que sempre

demonstraram ao longo desta minha vida acadeacutemica

Aos meus pais pelo apoio prestado no momento certo

o qual me catapultou para o ensino superior

Agrave minha irmatilde Ceacuteu Madaiacutel

pela ajuda crucial nas traduccedilotildees

Aos meus colegas e chefe de serviccedilo os quais muitas

vezes ficaram sobrecarregados de trabalho em

prol de meu projeto pessoal nunca demonstrando

qualquer mau estar pelo sucedido

Sem estes magniacuteficos seres humanos nunca teria alcanccedilado

este patamar por muito que me esforccedilar-se

Obrigado a todos

Um bem haja

2

AGRADECIMENTOS

Para realizar este trabalho contei com o apoio de diversas entidades oficiais e

pessoas individuais das quais destaco o meu orientador Juiz Desembargador Carlos

Alberto Gameiro Campos Lobo o qual aceitou este desafio desde o primeiro momento e

me acompanhou ao longo da elaboraccedilatildeo de todo este trabalho com muita paciecircncia e

sapiecircncia

Ao Professor Doutor Fernando Silva ao Professor Doutor Maacuterio Ferreira Monte e

ao Mestre Carlos Casimiro (Procurador do Ministeacuterio Puacuteblico) os quais mesmo natildeo sendo

os orientadores desta dissertaccedilatildeo sempre se mostraram disponiacuteveis para indicar

bibliografia para consulta

Ao Subcomissaacuterio Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa da Poliacutecia

de Seguranccedila Puacuteblica agrave Dra Alexandra Ribeiro Psicoacuteloga em estaacutegio na PSP e agrave Dra

Soacutenia Sousa Pereira Jurista da Comissatildeo Nacional de Proteccedilatildeo de Dados pela

disponibilizaccedilatildeo de material bibliograacutefico

Agradeccedilo ainda agrave Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila concretamente agrave Divisatildeo dos

Julgados de Paz e da Mediaccedilatildeo ndash Gabinete para a Resoluccedilatildeo de Litiacutegios o qual colocou agrave

minha disposiccedilatildeo toda a informaccedilatildeo solicitada

Agrave biblioteca da Universidade Autoacutenoma de Lisboa a qual me permitiu o acesso agrave

informaccedilatildeo que possui sobre o tema em questatildeo

3

RESUMO

O trabalho realizado e aqui apresentado visa explorar um dos meios de Resoluccedilatildeo

Alternativa de Litiacutegios em mateacuteria penal - a Mediaccedilatildeo Penal

Exploraacutemos o conceito que define o estatuto do mediador penal e a sua posiccedilatildeo

face agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica a admissibilidade na utilizaccedilatildeo do termo ldquopartesrdquo em

Mediaccedilatildeo Penal o caraacutecter voluntaacuterio e confidencial das sessotildees de mediaccedilatildeo e as

consequecircncias do cumprimento e incumprimento do acordo firmado

Neste estudo analisaacutemos a Lei vigente de forma criacutetica e apontamos lacunas que

deveratildeo ser discutidas pelo poder legislativo de forma a tornar a Mediaccedilatildeo Penal numa

alternativa eficaz ao sistema tradicional sem que este se demita da sua funccedilatildeo

Propusemo-nos ainda a efetuar uma viagem histoacuterica percorrendo a evoluccedilatildeo da

mediaccedilatildeo Penal em Portugal desde o surgimento passando pelos vaacuterios avanccedilos e recuos

e pelas visotildees das vaacuterias instituiccedilotildees envolvidas na aplicaccedilatildeo da Justiccedila Penal ateacute ao ano

de 2012

Recorremos a dados estatiacutesticos fornecidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da

Justiccedila de forma a apresentar um panorama do recurso agrave Mediaccedilatildeo Penal entre 2008 e

2012 em Portugal Atraveacutes destes nuacutemeros chegamos agrave conclusatildeo da taxa de sucesso e de

insucesso desta ferramenta juriacutedica e aos crimes de maior incidecircncia

Entendemos que a Mediaccedilatildeo Penal poderaacute ser uma excelente alternativa aos

Tribunais para resolver contendas em pequenos crimes nos quais ofensor e ofendido

estejam dispostos a sentarem-se agrave mesma mesa a discutir o problema sempre mediados por

uma figura imparcial e idoacutenea e em que a verdade a honestidade e o arrependimento

sejam valores que alicerccedilam todo o processo

Palavras-Chave Mediaccedilatildeo Penal Justiccedila Restaurativa Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

Direito

4

ABSTRACT

The elaboration of this work pretends to explore the sources to the alternative

dispute resolution in criminal matters -The Penal Mediation

We explore the concept to define the status to penal mediator and his public

administration position the admissibility use to ldquopiecesrdquo term in Penal Mediation the

volunteer and confidential character of mediation sessions and the accomplishment and

failure of the signed agreement consequences

In this study we examined in a critical way the governing law and we denounce

fails to be discussed by legislative power This way we pretend to make the Penal

Mediation as a serious alternative to the traditional system without it ever resign from

their function

We propose to ourselves to make an historical retrospective through the Portuguese

Penal Mediation evolution since his emergence through the various advances and retreats

and through the vary institutions visions involves in the Penal Justice application since

2012

We use the statistics provided by the ldquoDireccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedilardquo

pretending to show a retrospective of Penal Mediation use between 2008 and 2012 in

Portugal Through this numbers we elaborate the conclusion of the success rate and failure

of this legal tool and the higher incidence of crimes

We conclude that the Penal Mediation can be an excellent alternative to courts to

solve disputes in small crimes in which the offender and offended are willing to sit at the

same table to discuss the problem always mediated by an impartial and suitable figure and

where truth honesty and repentance are values that underpin the entire process

Keywords Criminal Mediation Restorative Justice Alternative Dispute Resolution law

5

INDICE GERAL

LISTA DE ABREVIATURAS helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 7

INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 8

CAPIacuteTULO I ndash JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL helliphelliphellip 10

11 ndash Justiccedila Restaurativa e Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 10

12 ndash Partes em Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 17

13 - O Mediador helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 20

14 - O Acordo helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 25

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphellip 33

CAPIacuteTULO II ndash ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO helliphellip 36

CAPIacuteTULO III ndash ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL hellip 48

CONCLUSAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 53

BIBLIOGRAFIAhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 55

ANEXOShelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 58

Lei nordm 212007 de 12 de junho helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 59

Portaria nordm 68-A de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 64

Portaria nordm 68-B de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 67

Portaria nordm 68-C de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 71

6

LISTA DE ABREVIATURAS

APAV ndash Associaccedilatildeo Portuguesa de Apoio agrave Viacutetima

CC ndash Coacutedigo Civil

CP ndash Coacutedigo Penal

CPP ndash Coacutedigo de Processo Penal

CRP ndash Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa

CSM ndash Conselho Superior de Magistratura

CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil

DL ndash Decreto-Lei

DR ndash Diaacuterio da Repuacuteblica

GRAL ndash Gabinete de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

MP ndash Ministeacuterio Puacuteblico

OA ndash Ordem dos Advogados

PJ ndash Poliacutecia Judiciaacuteria

PSP ndash Poliacutecia de Seguranccedila Puacuteblica

SMMP ndash Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico

SMP ndash Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

RAL ndash Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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COacuteDIGO penal e legislaccedilatildeo complementar 3ordf ed Lisboa Quid Juris 2009 ISBN

978-972-724-469-0

CONSTITUICcedilAtildeO da Repuacuteblica Portuguesa Lisboa Quid Juris 2009 ISBN 978-

972-724-456-0

COSTA Joseacute de Faria ndash Diversatildeo (desjudicializaccedilatildeo) e mediaccedilatildeo Que rumos

Coimbra Graacutefica de Coimbra Novembro-2006

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate

em Portugal Lisboa ISCTE-IUL 2009 53 f Dissertaccedilatildeo de mestrado em sociologia

Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal Oficial das Comunidades

Europeias Nordm L 821 (22-03-01)

FERREIRA Francisco Amado ndash Justiccedila Restaurativa Natureza Finalidades e

Instrumentos Coimbra Coimbra Editora - 2006

Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3798-3801

Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4267-4274

LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de

Justiccedila Coimbra Coimbra Editora - 2008 ISBN 978-972-32-1606-6

MESQUITA Miguel - Coacutedigo de Processo Civil 26ordf ed Coimbra Almedina setembro

- 2010 ISBN 978-972-40-4341-8

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Ministeacuterio Puacuteblico Nordm 112 Out-Dez 2007

Portaria nordm 68-A2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(2) - 634-

(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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PRIBERAM ndash Dicionaacuterio online [Em linha] Lisboa 2012 [Consult 14 ago 2013]

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SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo

setembro - 2000

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 1ordf ed Lisboa Verbo 1997

ISBN 972-22-1828-X

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo 2001

VARGAS Luacutecia Dias ndash Julgados de Paz e Mediaccedilatildeo Uma nova face da justiccedila

Coimbra Almedina 2006 ISBN 972-40-2891-7

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ZEHR H TOEWS B ndash Ways of knowing for a restorative worldview In

WEITEKAMP E KERNER H ndash J Restorative in context international practice and

directions Devon OK Wilan Publishing 2003

57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

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75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 2: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

1

Dedico este estudo agrave minha esposa Lurdes e agrave minha filha

Beatriz pelo esforccedilo compreensatildeo e paciecircncia que sempre

demonstraram ao longo desta minha vida acadeacutemica

Aos meus pais pelo apoio prestado no momento certo

o qual me catapultou para o ensino superior

Agrave minha irmatilde Ceacuteu Madaiacutel

pela ajuda crucial nas traduccedilotildees

Aos meus colegas e chefe de serviccedilo os quais muitas

vezes ficaram sobrecarregados de trabalho em

prol de meu projeto pessoal nunca demonstrando

qualquer mau estar pelo sucedido

Sem estes magniacuteficos seres humanos nunca teria alcanccedilado

este patamar por muito que me esforccedilar-se

Obrigado a todos

Um bem haja

2

AGRADECIMENTOS

Para realizar este trabalho contei com o apoio de diversas entidades oficiais e

pessoas individuais das quais destaco o meu orientador Juiz Desembargador Carlos

Alberto Gameiro Campos Lobo o qual aceitou este desafio desde o primeiro momento e

me acompanhou ao longo da elaboraccedilatildeo de todo este trabalho com muita paciecircncia e

sapiecircncia

Ao Professor Doutor Fernando Silva ao Professor Doutor Maacuterio Ferreira Monte e

ao Mestre Carlos Casimiro (Procurador do Ministeacuterio Puacuteblico) os quais mesmo natildeo sendo

os orientadores desta dissertaccedilatildeo sempre se mostraram disponiacuteveis para indicar

bibliografia para consulta

Ao Subcomissaacuterio Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa da Poliacutecia

de Seguranccedila Puacuteblica agrave Dra Alexandra Ribeiro Psicoacuteloga em estaacutegio na PSP e agrave Dra

Soacutenia Sousa Pereira Jurista da Comissatildeo Nacional de Proteccedilatildeo de Dados pela

disponibilizaccedilatildeo de material bibliograacutefico

Agradeccedilo ainda agrave Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila concretamente agrave Divisatildeo dos

Julgados de Paz e da Mediaccedilatildeo ndash Gabinete para a Resoluccedilatildeo de Litiacutegios o qual colocou agrave

minha disposiccedilatildeo toda a informaccedilatildeo solicitada

Agrave biblioteca da Universidade Autoacutenoma de Lisboa a qual me permitiu o acesso agrave

informaccedilatildeo que possui sobre o tema em questatildeo

3

RESUMO

O trabalho realizado e aqui apresentado visa explorar um dos meios de Resoluccedilatildeo

Alternativa de Litiacutegios em mateacuteria penal - a Mediaccedilatildeo Penal

Exploraacutemos o conceito que define o estatuto do mediador penal e a sua posiccedilatildeo

face agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica a admissibilidade na utilizaccedilatildeo do termo ldquopartesrdquo em

Mediaccedilatildeo Penal o caraacutecter voluntaacuterio e confidencial das sessotildees de mediaccedilatildeo e as

consequecircncias do cumprimento e incumprimento do acordo firmado

Neste estudo analisaacutemos a Lei vigente de forma criacutetica e apontamos lacunas que

deveratildeo ser discutidas pelo poder legislativo de forma a tornar a Mediaccedilatildeo Penal numa

alternativa eficaz ao sistema tradicional sem que este se demita da sua funccedilatildeo

Propusemo-nos ainda a efetuar uma viagem histoacuterica percorrendo a evoluccedilatildeo da

mediaccedilatildeo Penal em Portugal desde o surgimento passando pelos vaacuterios avanccedilos e recuos

e pelas visotildees das vaacuterias instituiccedilotildees envolvidas na aplicaccedilatildeo da Justiccedila Penal ateacute ao ano

de 2012

Recorremos a dados estatiacutesticos fornecidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da

Justiccedila de forma a apresentar um panorama do recurso agrave Mediaccedilatildeo Penal entre 2008 e

2012 em Portugal Atraveacutes destes nuacutemeros chegamos agrave conclusatildeo da taxa de sucesso e de

insucesso desta ferramenta juriacutedica e aos crimes de maior incidecircncia

Entendemos que a Mediaccedilatildeo Penal poderaacute ser uma excelente alternativa aos

Tribunais para resolver contendas em pequenos crimes nos quais ofensor e ofendido

estejam dispostos a sentarem-se agrave mesma mesa a discutir o problema sempre mediados por

uma figura imparcial e idoacutenea e em que a verdade a honestidade e o arrependimento

sejam valores que alicerccedilam todo o processo

Palavras-Chave Mediaccedilatildeo Penal Justiccedila Restaurativa Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

Direito

4

ABSTRACT

The elaboration of this work pretends to explore the sources to the alternative

dispute resolution in criminal matters -The Penal Mediation

We explore the concept to define the status to penal mediator and his public

administration position the admissibility use to ldquopiecesrdquo term in Penal Mediation the

volunteer and confidential character of mediation sessions and the accomplishment and

failure of the signed agreement consequences

In this study we examined in a critical way the governing law and we denounce

fails to be discussed by legislative power This way we pretend to make the Penal

Mediation as a serious alternative to the traditional system without it ever resign from

their function

We propose to ourselves to make an historical retrospective through the Portuguese

Penal Mediation evolution since his emergence through the various advances and retreats

and through the vary institutions visions involves in the Penal Justice application since

2012

We use the statistics provided by the ldquoDireccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedilardquo

pretending to show a retrospective of Penal Mediation use between 2008 and 2012 in

Portugal Through this numbers we elaborate the conclusion of the success rate and failure

of this legal tool and the higher incidence of crimes

We conclude that the Penal Mediation can be an excellent alternative to courts to

solve disputes in small crimes in which the offender and offended are willing to sit at the

same table to discuss the problem always mediated by an impartial and suitable figure and

where truth honesty and repentance are values that underpin the entire process

Keywords Criminal Mediation Restorative Justice Alternative Dispute Resolution law

5

INDICE GERAL

LISTA DE ABREVIATURAS helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 7

INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 8

CAPIacuteTULO I ndash JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL helliphelliphellip 10

11 ndash Justiccedila Restaurativa e Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 10

12 ndash Partes em Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 17

13 - O Mediador helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 20

14 - O Acordo helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 25

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphellip 33

CAPIacuteTULO II ndash ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO helliphellip 36

CAPIacuteTULO III ndash ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL hellip 48

CONCLUSAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 53

BIBLIOGRAFIAhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 55

ANEXOShelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 58

Lei nordm 212007 de 12 de junho helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 59

Portaria nordm 68-A de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 64

Portaria nordm 68-B de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 67

Portaria nordm 68-C de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 71

6

LISTA DE ABREVIATURAS

APAV ndash Associaccedilatildeo Portuguesa de Apoio agrave Viacutetima

CC ndash Coacutedigo Civil

CP ndash Coacutedigo Penal

CPP ndash Coacutedigo de Processo Penal

CRP ndash Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa

CSM ndash Conselho Superior de Magistratura

CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil

DL ndash Decreto-Lei

DR ndash Diaacuterio da Repuacuteblica

GRAL ndash Gabinete de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

MP ndash Ministeacuterio Puacuteblico

OA ndash Ordem dos Advogados

PJ ndash Poliacutecia Judiciaacuteria

PSP ndash Poliacutecia de Seguranccedila Puacuteblica

SMMP ndash Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico

SMP ndash Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

RAL ndash Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 3: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

2

AGRADECIMENTOS

Para realizar este trabalho contei com o apoio de diversas entidades oficiais e

pessoas individuais das quais destaco o meu orientador Juiz Desembargador Carlos

Alberto Gameiro Campos Lobo o qual aceitou este desafio desde o primeiro momento e

me acompanhou ao longo da elaboraccedilatildeo de todo este trabalho com muita paciecircncia e

sapiecircncia

Ao Professor Doutor Fernando Silva ao Professor Doutor Maacuterio Ferreira Monte e

ao Mestre Carlos Casimiro (Procurador do Ministeacuterio Puacuteblico) os quais mesmo natildeo sendo

os orientadores desta dissertaccedilatildeo sempre se mostraram disponiacuteveis para indicar

bibliografia para consulta

Ao Subcomissaacuterio Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa da Poliacutecia

de Seguranccedila Puacuteblica agrave Dra Alexandra Ribeiro Psicoacuteloga em estaacutegio na PSP e agrave Dra

Soacutenia Sousa Pereira Jurista da Comissatildeo Nacional de Proteccedilatildeo de Dados pela

disponibilizaccedilatildeo de material bibliograacutefico

Agradeccedilo ainda agrave Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila concretamente agrave Divisatildeo dos

Julgados de Paz e da Mediaccedilatildeo ndash Gabinete para a Resoluccedilatildeo de Litiacutegios o qual colocou agrave

minha disposiccedilatildeo toda a informaccedilatildeo solicitada

Agrave biblioteca da Universidade Autoacutenoma de Lisboa a qual me permitiu o acesso agrave

informaccedilatildeo que possui sobre o tema em questatildeo

3

RESUMO

O trabalho realizado e aqui apresentado visa explorar um dos meios de Resoluccedilatildeo

Alternativa de Litiacutegios em mateacuteria penal - a Mediaccedilatildeo Penal

Exploraacutemos o conceito que define o estatuto do mediador penal e a sua posiccedilatildeo

face agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica a admissibilidade na utilizaccedilatildeo do termo ldquopartesrdquo em

Mediaccedilatildeo Penal o caraacutecter voluntaacuterio e confidencial das sessotildees de mediaccedilatildeo e as

consequecircncias do cumprimento e incumprimento do acordo firmado

Neste estudo analisaacutemos a Lei vigente de forma criacutetica e apontamos lacunas que

deveratildeo ser discutidas pelo poder legislativo de forma a tornar a Mediaccedilatildeo Penal numa

alternativa eficaz ao sistema tradicional sem que este se demita da sua funccedilatildeo

Propusemo-nos ainda a efetuar uma viagem histoacuterica percorrendo a evoluccedilatildeo da

mediaccedilatildeo Penal em Portugal desde o surgimento passando pelos vaacuterios avanccedilos e recuos

e pelas visotildees das vaacuterias instituiccedilotildees envolvidas na aplicaccedilatildeo da Justiccedila Penal ateacute ao ano

de 2012

Recorremos a dados estatiacutesticos fornecidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da

Justiccedila de forma a apresentar um panorama do recurso agrave Mediaccedilatildeo Penal entre 2008 e

2012 em Portugal Atraveacutes destes nuacutemeros chegamos agrave conclusatildeo da taxa de sucesso e de

insucesso desta ferramenta juriacutedica e aos crimes de maior incidecircncia

Entendemos que a Mediaccedilatildeo Penal poderaacute ser uma excelente alternativa aos

Tribunais para resolver contendas em pequenos crimes nos quais ofensor e ofendido

estejam dispostos a sentarem-se agrave mesma mesa a discutir o problema sempre mediados por

uma figura imparcial e idoacutenea e em que a verdade a honestidade e o arrependimento

sejam valores que alicerccedilam todo o processo

Palavras-Chave Mediaccedilatildeo Penal Justiccedila Restaurativa Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

Direito

4

ABSTRACT

The elaboration of this work pretends to explore the sources to the alternative

dispute resolution in criminal matters -The Penal Mediation

We explore the concept to define the status to penal mediator and his public

administration position the admissibility use to ldquopiecesrdquo term in Penal Mediation the

volunteer and confidential character of mediation sessions and the accomplishment and

failure of the signed agreement consequences

In this study we examined in a critical way the governing law and we denounce

fails to be discussed by legislative power This way we pretend to make the Penal

Mediation as a serious alternative to the traditional system without it ever resign from

their function

We propose to ourselves to make an historical retrospective through the Portuguese

Penal Mediation evolution since his emergence through the various advances and retreats

and through the vary institutions visions involves in the Penal Justice application since

2012

We use the statistics provided by the ldquoDireccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedilardquo

pretending to show a retrospective of Penal Mediation use between 2008 and 2012 in

Portugal Through this numbers we elaborate the conclusion of the success rate and failure

of this legal tool and the higher incidence of crimes

We conclude that the Penal Mediation can be an excellent alternative to courts to

solve disputes in small crimes in which the offender and offended are willing to sit at the

same table to discuss the problem always mediated by an impartial and suitable figure and

where truth honesty and repentance are values that underpin the entire process

Keywords Criminal Mediation Restorative Justice Alternative Dispute Resolution law

5

INDICE GERAL

LISTA DE ABREVIATURAS helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 7

INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 8

CAPIacuteTULO I ndash JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL helliphelliphellip 10

11 ndash Justiccedila Restaurativa e Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 10

12 ndash Partes em Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 17

13 - O Mediador helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 20

14 - O Acordo helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 25

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphellip 33

CAPIacuteTULO II ndash ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO helliphellip 36

CAPIacuteTULO III ndash ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL hellip 48

CONCLUSAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 53

BIBLIOGRAFIAhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 55

ANEXOShelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 58

Lei nordm 212007 de 12 de junho helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 59

Portaria nordm 68-A de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 64

Portaria nordm 68-B de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 67

Portaria nordm 68-C de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 71

6

LISTA DE ABREVIATURAS

APAV ndash Associaccedilatildeo Portuguesa de Apoio agrave Viacutetima

CC ndash Coacutedigo Civil

CP ndash Coacutedigo Penal

CPP ndash Coacutedigo de Processo Penal

CRP ndash Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa

CSM ndash Conselho Superior de Magistratura

CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil

DL ndash Decreto-Lei

DR ndash Diaacuterio da Repuacuteblica

GRAL ndash Gabinete de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

MP ndash Ministeacuterio Puacuteblico

OA ndash Ordem dos Advogados

PJ ndash Poliacutecia Judiciaacuteria

PSP ndash Poliacutecia de Seguranccedila Puacuteblica

SMMP ndash Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico

SMP ndash Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

RAL ndash Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 4: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

3

RESUMO

O trabalho realizado e aqui apresentado visa explorar um dos meios de Resoluccedilatildeo

Alternativa de Litiacutegios em mateacuteria penal - a Mediaccedilatildeo Penal

Exploraacutemos o conceito que define o estatuto do mediador penal e a sua posiccedilatildeo

face agrave Administraccedilatildeo Puacuteblica a admissibilidade na utilizaccedilatildeo do termo ldquopartesrdquo em

Mediaccedilatildeo Penal o caraacutecter voluntaacuterio e confidencial das sessotildees de mediaccedilatildeo e as

consequecircncias do cumprimento e incumprimento do acordo firmado

Neste estudo analisaacutemos a Lei vigente de forma criacutetica e apontamos lacunas que

deveratildeo ser discutidas pelo poder legislativo de forma a tornar a Mediaccedilatildeo Penal numa

alternativa eficaz ao sistema tradicional sem que este se demita da sua funccedilatildeo

Propusemo-nos ainda a efetuar uma viagem histoacuterica percorrendo a evoluccedilatildeo da

mediaccedilatildeo Penal em Portugal desde o surgimento passando pelos vaacuterios avanccedilos e recuos

e pelas visotildees das vaacuterias instituiccedilotildees envolvidas na aplicaccedilatildeo da Justiccedila Penal ateacute ao ano

de 2012

Recorremos a dados estatiacutesticos fornecidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da

Justiccedila de forma a apresentar um panorama do recurso agrave Mediaccedilatildeo Penal entre 2008 e

2012 em Portugal Atraveacutes destes nuacutemeros chegamos agrave conclusatildeo da taxa de sucesso e de

insucesso desta ferramenta juriacutedica e aos crimes de maior incidecircncia

Entendemos que a Mediaccedilatildeo Penal poderaacute ser uma excelente alternativa aos

Tribunais para resolver contendas em pequenos crimes nos quais ofensor e ofendido

estejam dispostos a sentarem-se agrave mesma mesa a discutir o problema sempre mediados por

uma figura imparcial e idoacutenea e em que a verdade a honestidade e o arrependimento

sejam valores que alicerccedilam todo o processo

Palavras-Chave Mediaccedilatildeo Penal Justiccedila Restaurativa Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

Direito

4

ABSTRACT

The elaboration of this work pretends to explore the sources to the alternative

dispute resolution in criminal matters -The Penal Mediation

We explore the concept to define the status to penal mediator and his public

administration position the admissibility use to ldquopiecesrdquo term in Penal Mediation the

volunteer and confidential character of mediation sessions and the accomplishment and

failure of the signed agreement consequences

In this study we examined in a critical way the governing law and we denounce

fails to be discussed by legislative power This way we pretend to make the Penal

Mediation as a serious alternative to the traditional system without it ever resign from

their function

We propose to ourselves to make an historical retrospective through the Portuguese

Penal Mediation evolution since his emergence through the various advances and retreats

and through the vary institutions visions involves in the Penal Justice application since

2012

We use the statistics provided by the ldquoDireccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedilardquo

pretending to show a retrospective of Penal Mediation use between 2008 and 2012 in

Portugal Through this numbers we elaborate the conclusion of the success rate and failure

of this legal tool and the higher incidence of crimes

We conclude that the Penal Mediation can be an excellent alternative to courts to

solve disputes in small crimes in which the offender and offended are willing to sit at the

same table to discuss the problem always mediated by an impartial and suitable figure and

where truth honesty and repentance are values that underpin the entire process

Keywords Criminal Mediation Restorative Justice Alternative Dispute Resolution law

5

INDICE GERAL

LISTA DE ABREVIATURAS helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 7

INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 8

CAPIacuteTULO I ndash JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL helliphelliphellip 10

11 ndash Justiccedila Restaurativa e Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 10

12 ndash Partes em Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 17

13 - O Mediador helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 20

14 - O Acordo helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 25

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphellip 33

CAPIacuteTULO II ndash ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO helliphellip 36

CAPIacuteTULO III ndash ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL hellip 48

CONCLUSAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 53

BIBLIOGRAFIAhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 55

ANEXOShelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 58

Lei nordm 212007 de 12 de junho helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 59

Portaria nordm 68-A de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 64

Portaria nordm 68-B de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 67

Portaria nordm 68-C de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 71

6

LISTA DE ABREVIATURAS

APAV ndash Associaccedilatildeo Portuguesa de Apoio agrave Viacutetima

CC ndash Coacutedigo Civil

CP ndash Coacutedigo Penal

CPP ndash Coacutedigo de Processo Penal

CRP ndash Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa

CSM ndash Conselho Superior de Magistratura

CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil

DL ndash Decreto-Lei

DR ndash Diaacuterio da Repuacuteblica

GRAL ndash Gabinete de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

MP ndash Ministeacuterio Puacuteblico

OA ndash Ordem dos Advogados

PJ ndash Poliacutecia Judiciaacuteria

PSP ndash Poliacutecia de Seguranccedila Puacuteblica

SMMP ndash Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico

SMP ndash Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

RAL ndash Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 5: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

4

ABSTRACT

The elaboration of this work pretends to explore the sources to the alternative

dispute resolution in criminal matters -The Penal Mediation

We explore the concept to define the status to penal mediator and his public

administration position the admissibility use to ldquopiecesrdquo term in Penal Mediation the

volunteer and confidential character of mediation sessions and the accomplishment and

failure of the signed agreement consequences

In this study we examined in a critical way the governing law and we denounce

fails to be discussed by legislative power This way we pretend to make the Penal

Mediation as a serious alternative to the traditional system without it ever resign from

their function

We propose to ourselves to make an historical retrospective through the Portuguese

Penal Mediation evolution since his emergence through the various advances and retreats

and through the vary institutions visions involves in the Penal Justice application since

2012

We use the statistics provided by the ldquoDireccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedilardquo

pretending to show a retrospective of Penal Mediation use between 2008 and 2012 in

Portugal Through this numbers we elaborate the conclusion of the success rate and failure

of this legal tool and the higher incidence of crimes

We conclude that the Penal Mediation can be an excellent alternative to courts to

solve disputes in small crimes in which the offender and offended are willing to sit at the

same table to discuss the problem always mediated by an impartial and suitable figure and

where truth honesty and repentance are values that underpin the entire process

Keywords Criminal Mediation Restorative Justice Alternative Dispute Resolution law

5

INDICE GERAL

LISTA DE ABREVIATURAS helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 7

INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 8

CAPIacuteTULO I ndash JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL helliphelliphellip 10

11 ndash Justiccedila Restaurativa e Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 10

12 ndash Partes em Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 17

13 - O Mediador helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 20

14 - O Acordo helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 25

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphellip 33

CAPIacuteTULO II ndash ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO helliphellip 36

CAPIacuteTULO III ndash ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL hellip 48

CONCLUSAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 53

BIBLIOGRAFIAhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 55

ANEXOShelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 58

Lei nordm 212007 de 12 de junho helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 59

Portaria nordm 68-A de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 64

Portaria nordm 68-B de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 67

Portaria nordm 68-C de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 71

6

LISTA DE ABREVIATURAS

APAV ndash Associaccedilatildeo Portuguesa de Apoio agrave Viacutetima

CC ndash Coacutedigo Civil

CP ndash Coacutedigo Penal

CPP ndash Coacutedigo de Processo Penal

CRP ndash Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa

CSM ndash Conselho Superior de Magistratura

CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil

DL ndash Decreto-Lei

DR ndash Diaacuterio da Repuacuteblica

GRAL ndash Gabinete de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

MP ndash Ministeacuterio Puacuteblico

OA ndash Ordem dos Advogados

PJ ndash Poliacutecia Judiciaacuteria

PSP ndash Poliacutecia de Seguranccedila Puacuteblica

SMMP ndash Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico

SMP ndash Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

RAL ndash Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

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65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

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69

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PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

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75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 6: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

5

INDICE GERAL

LISTA DE ABREVIATURAS helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 7

INTRODUCcedilAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 8

CAPIacuteTULO I ndash JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL helliphelliphellip 10

11 ndash Justiccedila Restaurativa e Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 10

12 ndash Partes em Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 17

13 - O Mediador helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 20

14 - O Acordo helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 25

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal helliphelliphelliphellip 33

CAPIacuteTULO II ndash ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO helliphellip 36

CAPIacuteTULO III ndash ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL hellip 48

CONCLUSAtildeOhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 53

BIBLIOGRAFIAhelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 55

ANEXOShelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 58

Lei nordm 212007 de 12 de junho helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 59

Portaria nordm 68-A de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 64

Portaria nordm 68-B de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 67

Portaria nordm 68-C de 2008 helliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphelliphellip 71

6

LISTA DE ABREVIATURAS

APAV ndash Associaccedilatildeo Portuguesa de Apoio agrave Viacutetima

CC ndash Coacutedigo Civil

CP ndash Coacutedigo Penal

CPP ndash Coacutedigo de Processo Penal

CRP ndash Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa

CSM ndash Conselho Superior de Magistratura

CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil

DL ndash Decreto-Lei

DR ndash Diaacuterio da Repuacuteblica

GRAL ndash Gabinete de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

MP ndash Ministeacuterio Puacuteblico

OA ndash Ordem dos Advogados

PJ ndash Poliacutecia Judiciaacuteria

PSP ndash Poliacutecia de Seguranccedila Puacuteblica

SMMP ndash Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico

SMP ndash Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

RAL ndash Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo

setembro - 2000

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 1ordf ed Lisboa Verbo 1997

ISBN 972-22-1828-X

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo 2001

VARGAS Luacutecia Dias ndash Julgados de Paz e Mediaccedilatildeo Uma nova face da justiccedila

Coimbra Almedina 2006 ISBN 972-40-2891-7

WIKIPEacuteDIA ndash A enciclopeacutedia livre [Em linha] Lisboa 2013 [Consult 14 ago 2013]

Disponiacutevel em lt httpptwikipediaorgwikiDiC3A1logogt

ZEHR H TOEWS B ndash Ways of knowing for a restorative worldview In

WEITEKAMP E KERNER H ndash J Restorative in context international practice and

directions Devon OK Wilan Publishing 2003

57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

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66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

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69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

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75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 7: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

6

LISTA DE ABREVIATURAS

APAV ndash Associaccedilatildeo Portuguesa de Apoio agrave Viacutetima

CC ndash Coacutedigo Civil

CP ndash Coacutedigo Penal

CPP ndash Coacutedigo de Processo Penal

CRP ndash Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa

CSM ndash Conselho Superior de Magistratura

CPC ndash Coacutedigo de Processo Civil

DL ndash Decreto-Lei

DR ndash Diaacuterio da Repuacuteblica

GRAL ndash Gabinete de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

MP ndash Ministeacuterio Puacuteblico

OA ndash Ordem dos Advogados

PJ ndash Poliacutecia Judiciaacuteria

PSP ndash Poliacutecia de Seguranccedila Puacuteblica

SMMP ndash Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico

SMP ndash Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

RAL ndash Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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PRIBERAM ndash Dicionaacuterio online [Em linha] Lisboa 2012 [Consult 14 ago 2013]

Disponiacutevel em lt httpwwwpriberamptdlpodefaultaspxpal=diu00e1logogt

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo

setembro - 2000

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 1ordf ed Lisboa Verbo 1997

ISBN 972-22-1828-X

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo 2001

VARGAS Luacutecia Dias ndash Julgados de Paz e Mediaccedilatildeo Uma nova face da justiccedila

Coimbra Almedina 2006 ISBN 972-40-2891-7

WIKIPEacuteDIA ndash A enciclopeacutedia livre [Em linha] Lisboa 2013 [Consult 14 ago 2013]

Disponiacutevel em lt httpptwikipediaorgwikiDiC3A1logogt

ZEHR H TOEWS B ndash Ways of knowing for a restorative worldview In

WEITEKAMP E KERNER H ndash J Restorative in context international practice and

directions Devon OK Wilan Publishing 2003

57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

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66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

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PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

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75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

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79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 8: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

7

INTRODUCcedilAtildeO

Diariamente os Oacutergatildeos de Poliacutecia Criminal (OPC) e os Tribunais satildeo ldquoinundadosrdquo

de denuacutencias sobre alegados crimes que ocorreram Na sua maioria estas denuacutencias natildeo

passam disso mesmo de meras denuacutencias e rdquo morremrdquo no Ministeacuterio Puacuteblico (MP) dado

que natildeo satildeo respeitados os tracircmites para o processo seguir o seu normal percurso dando

origem ao seu inevitaacutevel arquivamento

O cidadatildeo em determinados casos sente que a mera denuacutencia aos OPCrsquos ou a sua

presenccedila eacute suficiente para se precaver de incidentes futuros eou para fazer cessar a

ameaccedila

Em meios rurais o facto de algueacutem ser chamado ao posto policial para prestar

declaraccedilotildees ou a presenccedila da autoridade policial na sua residecircncia por exemplo para

efeitos de notificaccedilatildeo eacute bastante constrangedor e cumpre uma missatildeo de prevenccedilatildeo

passiva da pequena criminalidade

Na pequena criminalidade grande parte das viacutetimas natildeo apresenta denuacutencia ou

demonstra uma intenccedilatildeo inicial de prosseguir com o processo para os tribunais mas nunca

se constitui assistente ou simplesmente desiste da denuacutencia

Baseando-me numa simples perceccedilatildeo pessoal julgo que o fator econoacutemico eacute

bastante desmotivador assim como o fator temporal ou seja o tempo que o processo

demora ateacute ser proferida uma decisatildeo Para que o fator dissuasor seja eficaz eacute necessaacuterio

que entre a praacutetica do facto e a sua puniccedilatildeo decorra um tempo aceitaacutevel o que natildeo estaacute a

acontecer

Eacute necessaacuterio tambeacutem que economicamente o cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes

natildeo tenha custos superiores ao por si espectaacutevel O facto de se ter de deslocar inuacutemeras

vezes aos OPCrsquos ao seu advogado e aos tribunais acarreta custos monetaacuterios e temporais

que poderatildeo natildeo compensar relativamente agraves vantagens que teraacute se simplesmente

ldquoesquecerrdquo o sucedido

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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VARGAS Luacutecia Dias ndash Julgados de Paz e Mediaccedilatildeo Uma nova face da justiccedila

Coimbra Almedina 2006 ISBN 972-40-2891-7

WIKIPEacuteDIA ndash A enciclopeacutedia livre [Em linha] Lisboa 2013 [Consult 14 ago 2013]

Disponiacutevel em lt httpptwikipediaorgwikiDiC3A1logogt

ZEHR H TOEWS B ndash Ways of knowing for a restorative worldview In

WEITEKAMP E KERNER H ndash J Restorative in context international practice and

directions Devon OK Wilan Publishing 2003

57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

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63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

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PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

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PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

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Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

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DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 9: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

8

A tiacutetulo de exemplo poderemos falar em furto simples injuacuterias difamaccedilatildeo etc

Neste tipo de crimes a viacutetima pretenderaacute que o ldquodelinquenterdquo seja punido mesmo que com

uma mera advertecircncia ou um pedido de desculpas mas sempre num curto espaccedilo de

tempo Se o espaccedilo temporal decorrido for grande a viacutetima tenderaacute a esquecer o assunto e

desistir do processo Natildeo adiantaraacute o infrator pedir desculpas agrave viacutetima por palavras

indevidamente proferidas 3 anos depois de a accedilatildeo ter decorrido e apoacutes ter obrigado a

viacutetima a inuacutemeras deslocaccedilotildees aos oacutergatildeos competentes e aos custos daiacute decorrentes

Os tribunais tecircm um avolumar de processos com pequenos delitos os quais tornam

a Justiccedila morosa acarretando custos elevadiacutessimos para o Estado Com o aliviar deste

volume de processos eacute possiacutevel que os tribunais se tornem mais ceacuteleres para os processos

de crimes mais relevantes dignificando a imagem da Justiccedila

Assim pretendemos com este trabalho de investigaccedilatildeo analisar a mediaccedilatildeo em

Processo Penal como alternativa ao cidadatildeo viacutetima deste tipo de crimes e dissecar a Lei

vigente a fim de apurar se eacute suficientemente motivadora e eficaz para se recorrer a este tipo

de procedimento em alternativa aos Tribunais ditos tradicionais garantindo sempre a

defesa do arguido e da Justiccedila e afianccedilando a eficaacutecia do Coacutedigo Penal

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 10: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

9

CAPIacuteTULO I

JUSTICcedilA RESTAURATIVA E MEDIACcedilAtildeO PENAL

11 ndash Justiccedila restaurativa e mediaccedilatildeo penal

Para podermos perscrutar acerca da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal em Portugal e o

seu preacutestimo para a justiccedila teremos de a enquadrar num outro conceito ndash o de justiccedila

restaurativa e distinguir esta da justiccedila retributiva

De referir que o conceito de justiccedila restaurativa eacute mais restrito do que o conceito de

mediaccedilatildeo dado que se confina agrave aacuterea criminal enquanto que a mediaccedilatildeo se aplica a uma

panoacuteplia de aacutereas de vaacuterios ramos do Direito1 Assim balizamos tambeacutem o conceito de

mediaccedilatildeo apenas para analisarmos o prisma da mediaccedilatildeo na aacuterea penal

ldquoTem sido algumas vezes referido que a mediaccedilatildeo eacute um conceito

europeu enquanto a justiccedila restaurativa eacute um conceito anglo-

americanordquo2

Pretende-se que a justiccedila restaurativa seja assente num modelo de justiccedila informal

que apela agrave colaboraccedilatildeo e agrave reintegraccedilatildeo em alternativa agrave coerccedilatildeo

Por oposiccedilatildeo agrave justiccedila retributiva com a justiccedila restaurativa pretende-se

restabelecer a paz social de forma ceacutelere permitindo a todos os cidadatildeos uma participaccedilatildeo

ativa na administraccedilatildeo da justiccedila

1 David Miers manifesta uma visatildeo mais abrangente sobre este conceito ldquoO conceito de justiccedila restaurativa eacute

mais restrito do que o conceito de mediaccedilatildeo uma vez que se confina agrave aacuterea criminal Mas eacute mais amplo pelo

facto de contemplar uma variedade de possiacuteveis respostas por parte do infractor que nada tecircm que ver com

mediaccedilatildeo como sejam a indemnizaccedilatildeo determinada pelo tribunal ou a prestaccedilatildeo de trabalho tendente agrave

reparaccedilatildeo quer como medida de diversatildeo quer como parte de um acordo integrado na sentenccedila com uma

entidade estatal O conceito de mediaccedilatildeo eacute mais amplo do que o de justiccedila restaurativa uma vez que abrange

conflitos em contextos natildeo criminais Eacute no entanto mais restrito porquanto em contexto criminal se centra

apenas nas relaccedilotildees estabelecidas entre viacutetima e infractor em sede de mediaccedilatildeo Mesmo aqui pode ser ainda

mais restrito caso abranja apenas a mediaccedilatildeo directa e natildeo a indirectardquo in APAV ndash Projecto Dikecirc [Em

linha] Lisboa 2003 [Consult 06 ago 2013] Disponiacutevel em wwwapavpt p 52 2 MIERS op cit p 52

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 11: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

10

A esquematizaccedilatildeo da diferenccedila entre a justiccedila retributiva e a justiccedila restaurativa foi

desenvolvida entre outros por Howard Zehr (1990) a qual aqui reproduzimos

Justiccedila Retributiva Justiccedila Restaurativa O crime eacute definido como violaccedilatildeo ao Estado O crime eacute definido como a violaccedilatildeo de uma pessoa por

outra

Foca-se no estabelecimento da culpa e no passado Foca-se na resoluccedilatildeo do problema nas responsabilidades

nas obrigaccedilotildees e no futuro

Relaccedilatildeo adversarial e processo normativo Diaacutelogo e negociaccedilatildeo normativa

Imposiccedilatildeo da dor para punir e dissuadirprevenir Restituiccedilatildeo como um meio de restauraccedilatildeo para ambas as

partes objetivo de reconciliarrestaurar

Justiccedila definida pelo propoacutesito e pelo processo regras de

direito

Justiccedila definida como relacionamento correto julgada

pelo resultado

A natureza interpessoal e conflitual do crime obscurecida

reprimida conflito opotildee individuo e Estado

Crime reconhecido como um conflito interpessoal valor

do conflito eacute reconhecido

Um prejuiacutezo social eacute substituiacutedo por outro Focaliza a reparaccedilatildeo do prejuiacutezo social

Comunidade eacute deixada agrave margem sendo representada

abstratamente pelo Estado

Comunidade eacute facilitadora no processo restaurador

Encorajamento aos valores competitivos e individualistas Encorajamento a valores de reciprocidade

Accedilotildees direcionadas do Estado para o ofensor - viacutetima

ignorada - ofensor passivo

Reconhecimento da participaccedilatildeo da viacutetima e do ofensor no

problemasoluccedilatildeo ndash direitosdeveres da viacutetima

reconhecidos ndash ofensor encorajado a assumir a

responsabilidade

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida como o

cumprimento da puniccedilatildeo

Responsabilizaccedilatildeo do ofensor eacute definida no entendimento

do impacto da sua accedilatildeo e na ajuda para determinar a

melhor maneira de consertar seus erros

O crime eacute definido puramente em termos legais

desprovido de aspetos morais sociais econoacutemicos ou

poliacuteticos

O crime eacute entendido como parte de um contexto-moral

econoacutemico e poliacutetico

Estado e sociedade em abstrato como credores da ldquodiacutevidardquo Viacutetima particular como credora da ldquodiacutevidardquo

Reaccedilatildeo baseada no comportamento passado do ofensor Reaccedilatildeo baseada nas consequecircncias prejudiciais do

comportamento do ofensor

Estigma de crime irremoviacutevel Estigma de resoluccedilatildeo do crime por meio de accedilotildees

restaurativas

Natildeo se encoraja o perdatildeo e o arrependimento Possibilidade para o perdatildeo e arrependimento

Participaccedilatildeo dependente de procuradores profissionais Envolvimento direto dos participantes

Fonte Howard Zehr (1985)3

A justiccedila restaurativa baseia-se em valores de respeito entre ldquopartesrdquo procura

estimular a participaccedilatildeo ativa de ambas no processo e da descentralizaccedilatildeo na

administraccedilatildeo da justiccedila penal O saber manter-se em silecircncio e escutar o outro eacute uma

demonstraccedilatildeo de respeito por este A proacutepria definiccedilatildeo do termo diaacutelogo - ldquoDiscussatildeo ou

negociaccedilatildeo entre duas ou mais partes geralmente com vista a um acordo4rdquo - define o

objetivo da mediaccedilatildeo sempre com vista a um entendimento entre as partes atraveacutes do uso

da palavra de amenas discussotildees e trocas de argumentos O termo diaacutelogo ldquovem do grego

diaacutelogos διά = atraveacutes e λογόι = palavra conhecimento pelo latim dialogus5rdquo

3 ARCOS ndash Estudos de Arbitragem Mediaccedilatildeo e Negociaccedilatildeo Vol 4 [Em linha] Brasil 2012 [consult 12 de

dez 2012] Disponiacutevel em httpwwwarcosorgbr 4 PRIBERAM [Em linha] Lisboa 2012 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwpriberampt

5 WIKIPEacuteDIA [Em linha] Lisboa 2013 [consult 14 de ago 2013] Disponiacutevel em httpptwikipediaorg

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 12: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

11

Na justiccedila retributiva o arguido e a viacutetima satildeo muitas vezes colocados agrave margem

do processo ficando o discurso delegado nos seus advogados tornando-o impessoal Ao

serem envolvidos nesta dualidade de escuta e diaacutelogo o discurso torna-se pessoal levando

a que estes iniciem um processo de empenhamento na resoluccedilatildeo do mesmo A viacutetima teraacute

oportunidade de expor os seus sentimentos os seus medos e as suas necessidades o que a

iraacute fortalecer ao niacutevel emocional sentindo que algueacutem se interessa pelos seus sentimentos

e emoccedilotildees Estas satildeo reconhecidas consideradas e algueacutem lhes oferece uma possibilidade

de soluccedilatildeo do problema que apresentam Por seu lado o arguido teraacute tambeacutem a

oportunidade de expor as razotildees e as motivaccedilotildees que o levaram a praticar aquele ato iliacutecito

Atraveacutes do uso da palavra teraacute oportunidade de assumir a responsabilidade pelas suas

accedilotildees e de se justificar eou redimir perante a viacutetima e perante a sociedade

O facto de tanto a viacutetima como o arguido terem a oportunidade de falar e serem

escutados poderaacute ser suficiente para que deste diaacutelogo se extraia um ldquoacordordquo que

coloque termo ao processo Por vezes a viacutetima fica satisfeita com uma assunccedilatildeo de

responsabilidade e um pedido de desculpas por parte do arguido o que se poderaacute obter

apenas atraveacutes do diaacutelogo entre ambos A mediaccedilatildeo assume particular relevacircncia nos casos

em que se verifica algum tipo de dano psicoloacutegico ou moral As viacutetimas sentem-se

verdadeiramente compensadas ao serem capazes de se expressar num ambiente sereno ao

sentirem a diferenccedila de comportamento do agressor e ao ouvi-lo assumir e verbalizar o seu

erro e o seu compromisso para o futuro

Devemos primar pela aplicaccedilatildeo de medidas natildeo privativas da liberdade e aceites

pela sociedade e pelas partes como sendo suficientes para a sanaccedilatildeo do problema e pela

reposiccedilatildeo da paz social Montesquieu jaacute apregoava que ldquo Toda a pena que natildeo deriva de

absoluta necessidade eacute tiracircnicardquo6 e Cesare Beccaria defendia que o fim das penas ldquonatildeo eacute

outro senatildeo o de impedir o reacuteu de fazer novos danos aos seus concidadatildeos e de dissuadir

os outros de fazer o mesmo Devem assim escolher-se as penas e o meacutetodo de infligi-las

de tal maneira que observadas as devidas proporccedilotildees se produziraacute um efeito mais eficaz

e mais duradouro sobre o espiacuterito dos homens e menos torturante sobre o corpo do

reacuteurdquo7

6 BECCARIA Cesare ndash Dos delitos e das penas 3ordf Ed Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste Gulbenkian ndash 2009 p 64

7 Ibidem p85

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal

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ISBN 978-972-724-549-9

55

COacuteDIGO Civil e diplomas complementares 9ordf ed Lisboa Quid Juris 2008 ISBN

978-972-724-393-8

COacuteDIGO de processo penal e legislaccedilatildeo complementar 4ordf ed Lisboa Quid Juris

2010 ISBN 978-972-724-524-6

COacuteDIGO penal e legislaccedilatildeo complementar 3ordf ed Lisboa Quid Juris 2009 ISBN

978-972-724-469-0

CONSTITUICcedilAtildeO da Repuacuteblica Portuguesa Lisboa Quid Juris 2009 ISBN 978-

972-724-456-0

COSTA Joseacute de Faria ndash Diversatildeo (desjudicializaccedilatildeo) e mediaccedilatildeo Que rumos

Coimbra Graacutefica de Coimbra Novembro-2006

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate

em Portugal Lisboa ISCTE-IUL 2009 53 f Dissertaccedilatildeo de mestrado em sociologia

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Europeias Nordm L 821 (22-03-01)

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LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de

Justiccedila Coimbra Coimbra Editora - 2008 ISBN 978-972-32-1606-6

MESQUITA Miguel - Coacutedigo de Processo Civil 26ordf ed Coimbra Almedina setembro

- 2010 ISBN 978-972-40-4341-8

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Ministeacuterio Puacuteblico Nordm 112 Out-Dez 2007

Portaria nordm 68-A2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(2) - 634-

(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo

setembro - 2000

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 1ordf ed Lisboa Verbo 1997

ISBN 972-22-1828-X

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo 2001

VARGAS Luacutecia Dias ndash Julgados de Paz e Mediaccedilatildeo Uma nova face da justiccedila

Coimbra Almedina 2006 ISBN 972-40-2891-7

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 13: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

12

Mais recentemente Germano Marques da Silva utiliza a expressatildeo ldquotodo o castigo

que vaacute aleacutem do indispensaacutevel para conservar esses laccedilos (da sociabilidade) eacute

desnecessaacuterio logo injustordquo8

Natildeo perfilhamos a ideia defendida por alguns autores de que a mediaccedilatildeo penal

poderaacute ser uma forma de ldquoprivatizar o Direito Penalrdquo9 e que corremos o risco de ldquoo nosso

seacuteculo ficar para a Histoacuteria (hellip) como aquele em que a viacutetima passa de desprezada

excrescecircncia a deacutespota esclarecidardquo10

Consideramos que determinados conflitos

abrangidos por esta forma de RAL podem ser sanados sem a intervenccedilatildeo direta do

Tribunal podendo aligeirar a carga processual econoacutemica e os atrasos na administraccedilatildeo da

Justiccedila A satisfaccedilatildeo para as partes envolvidas eacute maior uma vez que sentem a justiccedila mais

perto de si

Conveacutem ainda exaltar o valor preventivo da mediaccedilatildeo a qual se revela com uma

justiccedila horizontal e natildeo vertical oferecendo elementos restaurativos e convidando os

cidadatildeos a participarem ativamente da realizaccedilatildeo da justiccedila

Partilha desta opiniatildeo o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH)

tomando uma atidude proacute-mediaccedilatildeo nos seus arestos11

ou as Naccedilotildees Unidas atraveacutes da

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e

de Abuso de Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo nordm 4034

de 29 novembro de 1985

Nesta declaraccedilatildeo a ONU defende a aplicaccedilatildeo de mecanismos informais quando

adequados agrave resoluccedilatildeo de conflitos

ldquo7 Os meios extrajudiciaacuterios de soluccedilatildeo de diferendos incluindo a

mediaccedilatildeo a arbitragem e as praacuteticas de direito consuetudinaacuterio ou as

praacuteticas autoacutectones de justiccedila devem ser utilizados quando se revelem

8 SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo ndash 2001 p 182

9 LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de Justiccedila Coimbra

Coimbra Editora ndash 2008 p 15 10

Ibidem 11

THEO Gavrielideacutes ndash Restorative Justice Are We There Yet Responding to the Home Officersquos

Consultation Questions in LEITE op cit p 14

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 14: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

13

adequados para facilitar a conciliaccedilatildeo e obter a reparaccedilatildeo em favor das

viacutetimasrdquo12

Entre outras Recomendaccedilotildees e Resoluccedilotildees destacamos a que consideramos ser a

pedra angular que impulsionou a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em Processo Penal em

Portugal falamos da Decisatildeo-Quadro nordm2001220JAI do Conselho da Uniatildeo Europeia a

qual determinou com caraacutecter vinculativo a implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo em mateacuteria penal

em todos os Estados-Membros ateacute 22 de marccedilo de 200613

O termo mediaccedilatildeo em latim mediatio tem origem no termo mediari que significa

estar no meio intervir colocar-se entre duas partes ou de medius que significa meio14

A mediaccedilatildeo no seu conceito amplo ldquoeacute uma modalidade extrajudicial de resoluccedilatildeo

de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio e de natureza natildeo

contenciosa em que as partes com a sua participaccedilatildeo ativa e direta satildeo auxiliadas por

um mediador a encontrar por si proacuteprias uma soluccedilatildeo negociada e amigaacutevel para o

conflito que as opotildeerdquo15

O conceito de mediaccedilatildeo penal vem previsto no artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de

12 de Junho como sendo ldquoum processo informal e flexiacutevel conduzido por um terceiro

imparcial o mediador que promove a aproximaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido e os

apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparaccedilatildeo dos danos

causados pelo facto iliacutecito e contribua para a restauraccedilatildeo da paz social16

rdquo

Pretende-se com a mediaccedilatildeo que as partes envolvidas num determinado conflito se

entendam e o resolvam amenamente pelo que deveratildeo ter um domiacutenio absoluto do

procedimento de mediaccedilatildeo podendo desistir dele sempre que o desejarem

12

Declaraccedilatildeo sobre os Princiacutepios Baacutesicos de Justiccedila Relativos agraves Viacutetimas da Criminalidade e de Abuso de

Poder adotada pela Assembleia das Naccedilotildees Unidas na sua resoluccedilatildeo 4034 de 29 novembro de 1985 nordm 7

do anexo 13

Artigo 17ordm conjugado com o artigo 10ordm da Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal

Oficial das Comunidades Europeias Nordm L 821 (22-03-01) 14

LEXICO [Em linha] Lisboa 2013 [consult 20 de ago 2013] Disponiacutevel em httpwwwlexicopt 15

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 16

Artigo 4ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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COacuteDIGO de processo penal e legislaccedilatildeo complementar 4ordf ed Lisboa Quid Juris

2010 ISBN 978-972-724-524-6

COacuteDIGO penal e legislaccedilatildeo complementar 3ordf ed Lisboa Quid Juris 2009 ISBN

978-972-724-469-0

CONSTITUICcedilAtildeO da Repuacuteblica Portuguesa Lisboa Quid Juris 2009 ISBN 978-

972-724-456-0

COSTA Joseacute de Faria ndash Diversatildeo (desjudicializaccedilatildeo) e mediaccedilatildeo Que rumos

Coimbra Graacutefica de Coimbra Novembro-2006

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate

em Portugal Lisboa ISCTE-IUL 2009 53 f Dissertaccedilatildeo de mestrado em sociologia

Decisatildeo-Quadro do Conselho da Uniatildeo Europeia Jornal Oficial das Comunidades

Europeias Nordm L 821 (22-03-01)

FERREIRA Francisco Amado ndash Justiccedila Restaurativa Natureza Finalidades e

Instrumentos Coimbra Coimbra Editora - 2006

Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3798-3801

Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4267-4274

LEITE Andreacute Lamas ndash A Mediaccedilatildeo Penal de Adultos Um Novo ldquoParadigmardquo de

Justiccedila Coimbra Coimbra Editora - 2008 ISBN 978-972-32-1606-6

MESQUITA Miguel - Coacutedigo de Processo Civil 26ordf ed Coimbra Almedina setembro

- 2010 ISBN 978-972-40-4341-8

56

O papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penal Revista do

Ministeacuterio Puacuteblico Nordm 112 Out-Dez 2007

Portaria nordm 68-A2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(2) - 634-

(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

(8)

PRIBERAM ndash Dicionaacuterio online [Em linha] Lisboa 2012 [Consult 14 ago 2013]

Disponiacutevel em lt httpwwwpriberamptdlpodefaultaspxpal=diu00e1logogt

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo

setembro - 2000

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 1ordf ed Lisboa Verbo 1997

ISBN 972-22-1828-X

SILVA Germano Marques da ndash Direito Penal Portuguecircs 2ordf ed Lisboa Verbo 2001

VARGAS Luacutecia Dias ndash Julgados de Paz e Mediaccedilatildeo Uma nova face da justiccedila

Coimbra Almedina 2006 ISBN 972-40-2891-7

WIKIPEacuteDIA ndash A enciclopeacutedia livre [Em linha] Lisboa 2013 [Consult 14 ago 2013]

Disponiacutevel em lt httpptwikipediaorgwikiDiC3A1logogt

ZEHR H TOEWS B ndash Ways of knowing for a restorative worldview In

WEITEKAMP E KERNER H ndash J Restorative in context international practice and

directions Devon OK Wilan Publishing 2003

57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 15: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

14

Natildeo compete ao mediador julgar ou decidir mas sim estimular o diaacutelogo entre as

partes para que se atinja um consenso de vontades conforme desenvolveremos em

capiacutetulo proacuteprio

O processo de mediaccedilatildeo parte do princiacutepio de que as partes tecircm capacidade e

responsabilidade para determinar de forma consensual o que eacute melhor para ambas

Nos anos 60 surgiu o primeiro embriatildeo internacional do que atualmente chamamos

de mediaccedilatildeo penal Inicialmente nos Estados Unidos da Ameacuterica atraveacutes de um

movimento apelidado de Alternative Dispute Resolution dando posteriormente origem ao

Victim Offender Reconciliation Program Em 1976 no Canadaacute surge o programa Victim

ofender mediation na Nova Zelacircndia em 1989 foi aprovado o Children Young Persons

and their families Act e a partir dos anos 90 comeccedilam a surgir por toda a Europa

programas de justiccedila restaurativa17

Em Portugal inicia-se o debate sobre esta temaacutetica em

1990 sendo as primeiras pedras da mediaccedilatildeo penal lanccediladas em 2001 com a Lei de

Proteccedilatildeo de Crianccedilas e Jovens em Perigo e a Lei Tutelar Educativa nesta primeira fase

ainda no acircmbito dos menores e de forma superficial

A 12 de abril foi aprovada na Assembleia da Repuacuteblica a Lei nordm 212007 com os

votos a favor do PS PSD CDS-PP e Bloco de Esquerda e com os votos contra dos Verdes

e do PCP Foi posteriormente publicada a 12 de junho tendo entrado em vigor a 12 de

julho do mesmo ano atraveacutes da qual foi instituiacutedo o regime de mediaccedilatildeo penal em

processo penal18

Posteriormente foram publicadas vaacuterias Portarias e Despachos no

sentido de regulamentar a sua implementaccedilatildeo

Portaria nordm 68-A2008 de 22 de janeiro ndash Modelo de notificaccedilatildeo de envio do

processo para mediaccedilatildeo penal

Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do procedimento de seleccedilatildeo

de mediadores penais

Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro ndash Regulamento do sistema de mediaccedilatildeo

penal

17

COSTA Soacutenia Isabel Teixeira ndash Mediaccedilatildeo Penal e Justiccedila Restaurativa O debate em Portugal

Lisboa ISCTE-IUL 2009 18

Artigo 1ordm da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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(3)

Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 16: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

15

Despacho nordm 2168-A2008 de 22 de janeiro ndash Remuneraccedilatildeo do mediador penal

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 162008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

A2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 172008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

B2008

Declaraccedilatildeo de Retificaccedilatildeo nordm 182008 de 20 de marccedilo ndash Altera a Portaria nordm 68-

C2008

Portaria nordm 7322009 de 8 de julho ndash Altera a Portaria nordm 68-C2008 alargando as

comarcas abrangidas pelo funcionamento a tiacutetulo experimental da mediaccedilatildeo penal

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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Portaria nordm 68-B2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(3) - 634-

(5)

Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(5) - 634-

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57

ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

71

72

73

74

75

Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

76

77

78

79

80

81

DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

82

DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

Page 17: DEPARTAMENTO DE DIREITO - Universidade Autónoma...Ao Subcomissário Nuno Ferreira do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Pública, à Dra. Alexandra Ribeiro,

16

12 ndash Partes em mediaccedilatildeo penal

Importa indagar se podemos falar em ldquopartesrdquo quando estamos num contexto de

mediaccedilatildeo penal Esta eacute uma questatildeo pertinente dado que a doutrina se opotildee agrave utilizaccedilatildeo

deste termo quando estamos na alccedilada da mateacuteria penal Se no acircmbito do processo civil a

utilizaccedilatildeo do conceito de parte eacute paciacutefica e estaacute expressamente referida na lei19

jaacute no

direito processual penal o conceito de parte natildeo estaacute relacionado com a titularidade do

direito substantivo mas tatildeo soacute com a titularidade de poderes processuais20

Germano Marques da Silva define o processo de partes como ldquoum pressuposto do

direito do contraditoacuterio direito que para ser efectivo exige a igualdade entre a acusaccedilatildeo e

a defesa igualdade que mais natildeo eacute do que a oportunidade para intervir no processo em

paridade de condiccedilotildees desfrutando portanto de idecircnticas possibilidades para

sustentarem as suas posiccedilotildeesrdquo21

Quando estamos no acircmbito do processo penal os sujeitos processuais natildeo estatildeo em

igualdade de posiccedilotildees desde logo porque estamos perante o ius punniedi do estado mas

aconteceraacute em todas as fases do processo Natildeo nos iremos debruccedilar aprofundadamente

sobre este assunto dado natildeo ser objeto do presente estudo no entanto poderemos aflorar

que a proacutepria Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa subordina ao princiacutepio do

contraditoacuterio a audiecircncia de julgamento e alguns atos instrutoacuterios22

Poderemos entatildeo afirmar que o presente Coacutedigo de Processo Penal em algumas

fases do processo estaacute estruturado como um processo de partes Eacute desta opiniatildeo Germano

Marques da Silva quando se refere a esta temaacutetica ldquoDas normas referidas parece resultar

indubitavelmente que o Coacutedigo pelo menos relativamente a algumas fases deve assegurar

a parificaccedilatildeo dos poderes processuais da acusaccedilatildeo e da defesa ou seja deve estar

estruturado como um processo de partes no entendimento acima referido23

rdquo

19

Exemplo do artigo 26ordm nordm1 do Coacutedigo de Processo Civil ldquoO autor eacute parte legiacutetima quando tem interesse

directo em demandar o reacuteu eacute parte legiacutetima quanto tem interesse directo em contradizerrdquo (sublinhado

nosso) 20

SILVA Germano Marques da ndash Curso de Processo Penal 4ordf ed Lisboa Verbo ndash 2000 p 149 21

Ibidem 22

Artordm 32 nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica Portuguesa ldquoO processo criminal tem estrutura acusatoacuteria

estando a audiecircncia de julgamento e os actos instrutoacuterios que a lei determinar subordinados ao princiacutepio do

contraditoacuteriordquo 23

SILVA op cit p 150

17

Na esteira do Professor Germano Marques da Silva24

cumpre ressalvar que natildeo

poderemos falar em parificaccedilatildeo da acusaccedilatildeo e da defesa quando ainda estamos na fase de

inqueacuterito dado que nesta fase tambeacutem natildeo poderemos falar no princiacutepio do contraditoacuterio

Na fase de inqueacuterito o Ministeacuterio Puacuteblico age como o dominus do processo natildeo sendo

sequer equacionaacutevel a utilizaccedilatildeo do termos partes no sentido que temos vindo a referir

Poderiacuteamos dissertar sobre a admissibilidade da terminologia na fase instrutoacuteria ou

apenas no debate instrutoacuterio no entanto iriacuteamos afastarmo-nos do objeto da presente

dissertaccedilatildeo e limitarmo-nos a citar outros autores que jaacute investigaram e escreveram sobre

este assunto

Debrucemo-nos entatildeo sobre a mediaccedilatildeo penal e na admissibilidade de utilizaccedilatildeo do

termo ldquopartesrdquo neste processo

Conforme apresentamos no esquema da paacutegina 31 e referido no artigo 3ordm da Lei nordm

212007 de 12 de Junho a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal acontece no decurso

do inqueacuterito Se anteriormente afastaacutemos a hipoacutetese de utilizar esta terminologia no

inqueacuterito caberaacute agora apurar se a poderemos utilizar em Mediaccedilatildeo Penal

Julgamos que seraacute o mais adequado contrariamente ao inqueacuterito propriamente dito

na mediaccedilatildeo penal existe uma paridade entre as partes envolvidas no processo e uma

igualdade de poderes processuais Arguido e ofendido encontram-se em igualdade de

armas sendo imposto pelo artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 de 12 de junho que ambos

deem o seu consentimento para a prossecuccedilatildeo do processo nesta forma de RAL Ambos

podem desistir em qualquer altura deste processo ndash artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12

de junho O acordo tem de ser livremente fixado por ambos os sujeitos processuais ndash artordm

6ordm nordm 1 da Lei nordm 212007 de 12 de junho entre outros exemplos que aqui poderiam ser

enumerados

24

SILVA op cit p 149

18

Um dos argumentos utilizados para que o processo penal natildeo possa ser considerado

um processo de partes eacute o de que o processo seja ldquoestruturado com uma discussatildeo entre o

acusador e o defensor perante a passividade do juiz e em que as partes representam

interesses contrapostosrdquo25

Ora esta eacute precisamente a definiccedilatildeo do processo da mediaccedilatildeo

penal

Somos da opiniatildeo que quando nos encontramos no acircmbito da mediaccedilatildeo penal

podemos efetivamente falar em partes dado que temos duas faccedilotildees a dirimir um conflito

Se de um lado temos o ofendido do outro temos o ofensor Caiem por terra os argumentos

apresentados por doutos juristas e a semelhanccedila com a mateacuteria civil eacute flagrante O que

diferencia estas duas aacutereas no caso concreto da mediaccedilatildeo penal eacute apenas o objeto do

litiacutegio Se na mateacuteria civil as partes litigam pela posse de um bem ou pelo cumprimento

de uma obrigaccedilatildeo em mateacuteria de mediaccedilatildeo penal as partes ldquolitigamrdquo pelo reconhecimento

e eventual puniccedilatildeo de uma violaccedilatildeo de um direito ou pela omissatildeo de um dever Natildeo

estamos perante o intimidante ius punniende do Estado que impotildee uma determinada

sanccedilatildeo ao arguido pela praacutetica de uma determinada conduta ignorando por completo a

viacutetima dessa conduta Estamos sim perante duas partes que perante um mediador

dialogam assumem a conduta erradamente praticada (por vezes por ambas as partes) e

tentam chegar a um acordo que satisfaccedila ambas as espectativas Podemos assim em nossa

opiniatildeo utilizar livremente este termo quando estamos no contexto da mediaccedilatildeo penal

25

SILVA op cit p 151

19

13 ndash O mediador

O artigo 12ordm26

da Lei nordm 212007 de 12 de junho eacute taxativo quanto aos requisitos

exigidos para os candidatos ao exerciacutecio da funccedilatildeo de mediador penal vindo depois a

portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro regulamentar o acesso agrave atividade

A referir como lacuna legislativa a natildeo indicaccedilatildeo taxativa das licenciaturas

admitidas para acesso a esta atividade o que natildeo foi previsto na Lei nordm 212007 nem no

artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro Eacute importante limitar este acesso a

cursos na aacuterea de direito sob pena de abarcarmos um universo de tal forma vasto que

apenas desvirtuaraacute a essecircncia da mediaccedilatildeo penal

A Portaria nordm 68-B2008 de 22 de janeiro define os criteacuterios e as regras a que deve

obedecer este procedimento de seleccedilatildeo para mediadores penais Consideramos assim

como ponto de partida a definiccedilatildeo do conceito de mediador penal Recorremos ao

preacircmbulo desta portaria que se refere ao mediador como sendo ldquoum terceiro imparcial e

especificamente formado para o efeitordquo este deve ldquoauxiliar as partes na tentativa de obter

um acordo que permita pocircr termo ao litiacutegio e restaurar a paz socialrdquo

Ainda no decorrer do preacircmbulo o legislador exige ao mediador que observe ldquoos

deveres de imparcialidade independecircncia confidencialidade e diligecircnciardquo e refere-se a

este como um novo agente participante nas tarefas de realizaccedilatildeo da justiccedila penal Teremos

que definir o mediador como um mero participante processual dado que tem um papel

secundaacuterio no processo dependendo sempre da decisatildeo final de cada uma das partes O

mediador natildeo estaacute investido de qualquer ius imperium o que se encontra bem claro ao

26

ldquoArtigo 12ordm

Pessoas habilitadas a exercer as funccedilotildees de mediador penal 1 - As listas de mediadores penais satildeo preenchidas mediante um procedimento de seleccedilatildeo podendo

candidatar-se quem satisfizer os seguintes requisitos

a) Ter mais de 25 anos de idade

b) Estar no pleno gozo dos seus direitos civis e poliacuteticos

c) Ter licenciatura ou experiecircncia profissional adequadas

d) Estar habilitado com um curso de mediaccedilatildeo penal reconhecido pelo Ministeacuterio da Justiccedila

e) Ser pessoa idoacutenea para o exerciacutecio da atividade de mediador penal

f) Ter o domiacutenio da liacutengua portuguesa

2 - Entre outras circunstacircncias eacute indiciador de falta de idoneidade para inscriccedilatildeo nas listas oficiais

o facto de o requerente ter sido condenado por sentenccedila transitada em julgado pela praacutetica de crime doloso

3 - Os criteacuterios de graduaccedilatildeo e os termos do procedimento de seleccedilatildeo satildeo aprovados por portaria

do Ministro da Justiccedila ldquo- Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800

20

permitir o acesso esta funccedilatildeo por parte de cidadatildeos estrangeiros (artigo 12ordm nordm 1 al f) da

Lei nordm 212007 e artigo 7ordm da Portaria nordm 68-B2008)

Natildeo cabe ao mediador conduzir o litiacutegio penal cabendo-lhe apenas uma funccedilatildeo de

laquofacilitador do diaacutelogo27

raquo sendo a doutrina portuguesa unacircnime ao natildeo o considerar como

sujeito processual28

Relativamente agrave remuneraccedilatildeo dos mediadores estes natildeo auferem de remuneraccedilatildeo

fixa por parte do Estado sendo remunerados a tiacutetulo de prestaccedilatildeo de serviccedilos ocasionais

especializados conforme artigo 17ordm da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro natildeo

adquirindo por esta via a qualidade de funcionaacuterio da administraccedilatildeo puacuteblica Vem depois o

Despacho nordm 2168-A2008 publicado no Diaacuterio da Repuacuteblica 2ordf seacuterie nordm 15 de 22 de

janeiro fixar a remuneraccedilatildeo a auferir pelos mediadores penais

O artigo 1ordm deste despacho atribui a remuneraccedilatildeo ao mediador penal

independentemente das sessotildees realizadas no entanto premeia-o no caso de ser alcanccedilado

um acordo entre as partes A bem da verdade teremos que ressalvar que este preacutemio eacute na

ordem dos 25 relativamente agrave remuneraccedilatildeo de natildeo chegarem a acordo mas estamos a

falar de um valor de 25 euro Fica no entanto plasmado na Lei a intenccedilatildeo do legislador em

premiar o mediador no caso de conseguir um acordo entre as partes tentando desta forma

incentivar para que este seja alcanccedilado

Teremos de equacionar as vantagens e desvantagens desta classificaccedilatildeo do

mediador penal como mero prestador de serviccedilos

Como vantagens temos o afastamento do poder interventivo do estado levando a

mediaccedilatildeo penal para um plano informal O mediador natildeo seraacute visto como um Juiz estando

desprovido da tradicional beca e de todo o formalismo inerente ao processo tradicional

27

LEITE op cit p 122 28

DIAS Jorge Figueiredo ndash Direito Processual Penal reimp da1ordf ed de 1974 Coimbra Coimbra Editora ndash

2004 p 239 e ss citado por LEITE op cit p 122

21

Como desvantagens temos o facto de desta forma a mediaccedilatildeo penal estar

ldquoenxertadardquo29

no inqueacuterito A mediaccedilatildeo apenas se poderaacute iniciar nas situaccedilotildees enumeradas

no artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho ou seja exclusivamente durante o

inqueacuterito

O cidadatildeo que pretender recorrer a esta forma de RAL tem sempre de apresentar

queixa30

e no caso dos crimes particulares constituir-se como assistente deduzir acusaccedilatildeo

particular31

e fazerem-se representar por advogado32

Soacute desta forma se poderaacute iniciar o

inqueacuterito podendo depois fazer uso do nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ou seja requerer a mediaccedilatildeo juntamente com o arguido

Se o ofendido e o ofensor pretenderem chegar a um acordo ldquomediadordquo pela justiccedila

apenas o conseguem fazer desta forma o que implicaraacute custos e delonga na sua resoluccedilatildeo

Inclusivamente a natildeo obrigatoriedade de se fazer representar por advogado33

nas sessotildees de

mediaccedilatildeo fica beliscada dado que o impulso processual soacute seraacute vaacutelido com a intervenccedilatildeo

deste

Uma alternativa seria a possibilidade de a mediaccedilatildeo penal funcionar numa fase

ldquopreacute-inqueacuteritordquo podendo o cidadatildeo recorrer a esta forma de RAL em alternativa aos

tribunais suspendendo de igual forma os prazos de prescriccedilatildeo do processo

Podemos tomar como exemplo ldquoa chamada mandatory mediation existente nos

EUA mediante a qual os sujeitos satildeo remetidos para este mecanismo de RAL

obrigatoriamente antes do recurso agrave via judicial em relaccedilatildeo a dados tipos legaisrdquo34

Ou da

Nova Zelacircndia em que a poliacutecia ou o procurador tecircm de encaminhar o caso para mediaccedilatildeo

ou para outro tipo de intervenccedilatildeo de diversatildeo

29

LEITE op cit p 45 30

Artigo 49ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoeacute necessaacuterio que essas pessoas decircem conhecimento do facto ao Ministeacuterio

Puacuteblico para que este promova o processordquo 31

Artigo 50ordm nordm 1 do CPP ndash ldquohellipeacute necessaacuterio que essas pessoas se queixem se constituam assistentes e

deduzam acusaccedilatildeo particularrdquo 32

Artigo 70ordm nordm 1 do CPP ndash ldquoOs assistentes satildeo sempre representados por advogadordquo 33

ldquo Artigo 8ordm - Nas sessotildees de mediaccedilatildeo o arguido e o ofendido devem comparecer pessoalmente podendo

fazer-se acompanhar de advogado ou de advogado estagiaacuteriordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I

Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3800 (sublinhado nosso) 34

LEITE op cit p 45 ndash nota 79

22

Natildeo apregoamos a totalidade destas soluccedilotildees dado que afetaria o caraacutecter

voluntaacuterio a que a mediaccedilatildeo penal portuguesa estaacute subsumida Consideramos no entanto

que a possibilidade de recurso agrave mediaccedilatildeo penal antes do recurso agrave via judicial de forma

voluntaacuteria a tornava mais acessiacutevel ao comum dos cidadatildeos

Para que fosse possiacutevel esta forma de procedimento o mediador teria de estar

investido nas suas funccedilotildees de poderes reforccedilados no que toca agrave parte processual sem

nunca perder a sua faceta informal de forma a ter a capacidade de iniciar o processo de

mediaccedilatildeo a pedido de uma das partes

O nordm 2 do artigo 3ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho tem como condiccedilatildeo que o

ofendido e o arguido requeiram a mediaccedilatildeo para se dar iniacutecio ao processo Mas se se

considera que a mediaccedilatildeo eacute beneacutefica para as viacutetimas de crime parece evidente atribuir-lhes

a possibilidade de dar o primeiro passo As poliacutecias e as organizaccedilotildees de apoio agrave viacutetima

estatildeo numa posiccedilatildeo privilegiada para informar as viacutetimas de crime sobre esta possibilidade

e para as motivar e apoiar a efetuarem o primeiro contacto Eacute compreensiacutevel que dar a

possibilidade de a viacutetima dar iniacutecio ao processo natildeo estaacute livre de riscos sendo o mais

presumiacutevel o de desapontamento e de frustraccedilatildeo das espectativas iniciais no entanto

estamos convictos que uma boa parte dos processos vingaria

Na Alemanha o encaminhamento para a mediaccedilatildeo penal depende de iniciativa

exclusiva do tribunal em Espanha este encaminhamento carece apenas de aprovaccedilatildeo

judicial Na Aacuteustria o tribunal tem o poder residual de por iniciativa proacutepria propor a

mediaccedilatildeo sendo que nestes casos o procurador tem sempre que se pronunciar ou ateacute que

aprovar a intervenccedilatildeo Na Finlacircndia Holanda e Sueacutecia podem ser as proacuteprias viacutetimas ou

agressores a ldquoauto-encaminhar-serdquo para esta forma de RAL

Na Aacuteustria Beacutelgica Holanda Espanha e Sueacutecia os mediadores satildeo nomeados por

organismos puacuteblicos e empregam maioritariamente mediadores profissionais ou outro

pessoal jaacute dos quadros da administraccedilatildeo puacuteblica ou em organizaccedilotildees privadas

reconhecidas

23

Jaacute na Dinamarca Finlacircndia Franccedila Itaacutelia e Luxemburgo ao serem nomeados por

organizaccedilotildees privadas estas recorrem frequentemente a voluntaacuterios submetidos a diversos

niacuteveis de formaccedilatildeo mas tambeacutem nestes casos se exige por vezes a acreditaccedilatildeo ou

aprovaccedilatildeo pelo tribunal ou pelo Ministro da Justiccedila ou seu equivalente

24

14 ndash O acordo

Todo o processo de mediaccedilatildeo penal tem em vista um acordo entre as partes A Lei

nordm 212007 de 12 de junho no seu artigo 6ordm enuncia que ldquoo conteuacutedo do acordo eacute

livremente fixado pelos sujeitos processuais participantes (hellip)rdquo subsistem no entanto as

necessaacuterias limitaccedilotildees legais O nordm 2 deste artigo plasma a proibiccedilatildeo de este ldquoincluir

sanccedilotildees privativas da liberdade ou deveres que ofendam a dignidade do arguido ou cujo

cumprimento se deva prolongar por mais de seis mesesrdquo Estas limitaccedilotildees satildeo fulcrais sob

pena de corrermos o risco de regressar agrave Lei de Taliatildeo onde prevaleceria a maacutexima ldquoOlho

por olho dente por denterdquo

Este acordo tem de ser ldquoreduzido a escrito e assinado pelos sujeitos processuais

participantes e pelo mediadorrdquo35

teraacute ainda de conter uma ldquoclaacuteusula relativa agraves

consequecircncias juriacutedicas da sua assinatura designadamente de que esta equivale a

desistecircncia de queixa por parte do ofendido e agrave natildeo oposiccedilatildeo por parte do arguido e de

que o ofendido pode caso o acordo natildeo seja cumprido no prazo fixado renovar a queixa

no prazo de um mecircs sendo reaberto o inqueacuteritordquo36

Relativamente ao nuacutemero de exemplares este ldquoeacute redigido em nuacutemero de

exemplares igual ao nuacutemero de sujeitos processuais participantes ficando um exemplar

para cada um dos sujeitosrdquo37

A obtenccedilatildeo de acordo eacute comunicada ao Ministeacuterio Puacuteblico atraveacutes de sistema

informaacutetico a fim de este o analisar e ldquoverificar se (hellip) respeita o disposto no artordm 6ordm e em

caso afirmativo homologa a desistecircncia de queixa no prazo de cinco dias devendo a

secretaria notificar imediatamente a homologaccedilatildeo ao mediador ao arguido e ao

ofendidordquo38

Este controlo por parte do Ministeacuterio Puacuteblico limita-se a questotildees formais

sendo apelidado por Andreacute Lamas Leite como um controlo miacutenimo de legalidade39

35

Artordm 11ordm nordm 1 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(7) 36

Artordm 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 37

Artordm 11ordm nordm 3 da Portaria nordm 68-C2008 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 15 (22-01-08) p 634-(8) 38

Artordm 5ordm nordm 5 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 39

LEITE op cit p 95

25

Os processos sujeitos a mediaccedilatildeo e em que tenha resultado acordo entre as partes

satildeo tramitados como urgentes40

No caso de o Ministeacuterio Puacuteblico ldquoverificar que o acordo natildeo respeita o disposto no

artigo 6ordm devolve o processo ao mediador para que este no prazo de 30 dias juntamente

com o ofendido e o arguido sane a ilegalidaderdquo41

A Lei refere no nordm 4 do artordm 5ordm que ldquoa assinatura do acordo equivale a desistecircncia

de queixardquo Andreacute Lamas Leite faz o reparo de que ldquonatildeo eacute a assinatura do acordo (hellip)

que faz cessar um conflito penal mas sim a posterior homologaccedilatildeo in casu pelo MP42

rdquo

Tomamos a liberdade no entanto de ir mais longe Esta desistecircncia de queixa apenas iraacute

produzir os seus efeitos quando o acordo foi convenientemente cumprido Se este natildeo for

cumprido poderaacute o ofendido renovar a queixa no prazo de um mecircs sendo reaberto o

inqueacuterito Encontramos aqui uma incongruecircncia dado que uma desistecircncia de queixa eacute

sempre incondicional43

o que natildeo acontece na mediaccedilatildeo penal Assim deveremos adiar a

desistecircncia de queixa para quando o acordo for efetivamente cumprido ateacute esse momento

estaremos num periacuteodo de suspensatildeo do procedimento criminal por tempo determinado e

sob a condiccedilatildeo de cumprimento do acordo firmado entre ambos e homologado pelo MP

O artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de junho daacute guarida a esta interpretaccedilatildeo

quando refere que ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde

a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio

Puacuteblico ou tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu

cumprimentordquo

Analisemos esta atuaccedilatildeo com algum cuidado reforccedilado Pelo que dissemos

anteriormente os mediados assinam um acordo em que existem determinadas condiccedilotildees e

em que consta uma intenccedilatildeo inequiacutevoca de desistecircncia de queixa no entanto esta

desistecircncia de queixa soacute iraacute produzir os seus efeitos no caso de o acordo ser integralmente

cumprido Caso tal natildeo aconteccedila a desistecircncia de queixa natildeo iraacute operar e o processo segue

os seus tracircmites tradicionais

40

Artordm 5ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 41

Artordm 5ordm nordm 8 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 42

LEITE op cit p 96 43

DIAS op cit p 680 Citado por LEITE op cit p 96

26

Pelo exposto estamos perante um ldquodesistecircncia de queixa condicionadardquo44

estando

plasmado no artordm 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal que ldquoA desistecircncia impede que a queixa seja

renovadardquo e o artordm 51ordm do Coacutedigo de Processo Penal que faz ldquocessar a intervenccedilatildeo do MP

no processo com a homologaccedilatildeo da desistecircncia de queixardquo

Outra questatildeo se poderaacute levantar relativamente aos prazos previstos no artigo 115ordm

nordm1 do Coacutedigo Penal o qual extingue o direito de queixa passados ldquoseis meses a contar da

data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

Suponhamos que o ofendido apenas exerce o seu direito de queixa nos uacuteltimos 30

dias do prazo que lhe eacute concedido pelo artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal O processo

segue para mediaccedilatildeo por consentimento do arguido e do ofendido chegam a assinar o

acordo o qual tem sanccedilotildees que se prolongam por mais seis meses (maacuteximo legal)

Ateacute aqui nenhuma questatildeo eacute suscitada no entanto quase a terminar este prazo o

acordo eacute incumprido O artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro atribuiacute

um prazo maacuteximo de 1 mecircs para o ofendido renovar a queixa Dado que a queixa inicial jaacute

foi apresentada no final dos seis meses e tendo em conta que a Lei atribuiacute mais um mecircs

para esta ser renovada em caso de incumprimento poderemos estar perante um prazo que

ultrapassa o previsto no artigo 115ordm nordm 1 do Coacutedigo Penal

Natildeo estamos perante as condiccedilotildees de suspensatildeo de prazos do artigo 7ordm nordm 245

da

Lei nordm 212007 de 12 de junho estamos assim fora do prazo legal previsto sendo

totalmente extemporacircneo tendo como consequecircncia a extinccedilatildeo do direito de queixa por

forccedila do artigo 115ordm n ordm146

do Coacutedigo Penal

44

LEITE op cit p 98 45

ldquoArtigo 7ordm

Suspensatildeo de prazos

(hellip)2 - Os prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa do

processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou tendo resultado da

mediaccedilatildeo acordo ateacute agrave data fixada para o seu cumprimentordquo 46

ldquoArtigo 115ordm

Extinccedilatildeo do direito de queixa

1 ndash O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver

tido conhecimento do facto e dos seus autores (hellip)rdquo

27

Quando o legislador atribuiacute o prazo de um mecircs para o ofendido renovar a queixa

conforme artigo 11ordm nordm 2 da Portaria nordm 68-C2008 de 22 de janeiro entendemos que este

prazo eacute dado para que o ofendido pondere se efetivamente o pretende fazer

Pela interpretaccedilatildeo que anteriormente fizemos e de forma a natildeo ultrapassar o prazo

de 6 meses do artigo 115ordm do Coacutedigo Penal o ofendido apenas teria agrave sua disposiccedilatildeo o

prazo que restava desde a remessa do processo para mediaccedilatildeo ateacute ao teacuterminos dos 6 meses

referidos

Tal interpretaccedilatildeo tambeacutem tem guarida no artigo 7ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 de 12 de

junho ldquoos prazos de prescriccedilatildeo do procedimento criminal suspendem-se desde a remessa

do processo para mediaccedilatildeo ateacute agrave sua devoluccedilatildeo pelo mediador ao Ministeacuterio Puacuteblico ou

tendo resultado da mediaccedilatildeo acordo ateacute aacute data fixada para o seu cumprimentordquo

Suponhamos entatildeo que o processo apenas eacute remetido para mediaccedilatildeo 1 dia antes do

teacutermino dos 6 meses natildeo faria qualquer sentido que no caso de ser incumprido o acordo

nas mesmas condiccedilotildees que temos vindo a abordar o ofendido apenas dispusesse de 1 dia

para renovar a queixa administrativamente tal seria impraticaacutevel

28

Entendemos assim que a intenccedilatildeo do legislador seria a de dar um prazo razoaacutevel

para que o ofendido ponderasse a sua intenccedilatildeo aceitamos no entanto que o prazo para

renovaccedilatildeo da queixa entra em colisatildeo com o previsto no Coacutedigo Penal

Uma perspetiva para ultrapassar este conflito legal seraacute o de recorrer ao facto de a

Lei da Mediaccedilatildeo Penal ser uma lei especial logo prevalecendo em relaccedilatildeo agrave Lei geral

Desta forma forma o ofendido dispotildee sempre de um mecircs apoacutes o incumprimento antes de o

processo retomar os prazos do sistema tradicional que ficaram suspensos com a remissatildeo

para mediaccedilatildeo

Deveraacute o legislador ser especiacutefico no que a esta mateacuteria diz respeito por forma a

natildeo subsistirem quaisquer duacutevidas relativamente aos prazos de prescriccedilatildeo do processo e

qual das interpretaccedilotildees deveraacute subsistir

Alguns autores defendem ainda que o processo natildeo se extingue com a homologaccedilatildeo

do acordo por parte do MP ficando suspenso ateacute ao cumprimento deste Deveria o

legislador ter previsto a possibilidade de oficiosamente o MP determinar o

prosseguimento do processo em caso de incumprimento e apenas notificar o arguido e o

ofendido De referir que a queixa inicialmente apresentada pelo ofendido nunca perdeu a

sua validade tendo o MP legitimidade para prosseguir com o processo

ldquoMelhor teria andado o legislador se tivesse introduzido um inciso com uma

redaccedilatildeo semelhante a esta laquoEm caso de incumprimento do acordo de

mediaccedilatildeo o magistrado do MP determina oficiosamente o prosseguimento

do processo criminalraquo - Andreacute Lamas Leite47

ldquoAquando da reduccedilatildeo do acordo a escrito teria sempre de constar do

mesmo que o processo se daria por definitivamente encerrado por

desistecircncia de queixa a partir desse momento (uacuteltimo dia do cumprimento

dos deveres acrescido de um mecircs) a menos que o ofendido se manifestasse

47

LEITE op cit p 100

29

expressamente em sentido oposto por natildeo ter o arguido cumprido as

obrigaccedilotildees que assumirardquo ndash Claacuteudia Santos48

Este sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios visa essencialmente a assunccedilatildeo

de culpa e a apresentaccedilatildeo de um pedido de desculpas pelo arguido eventualmente

conjugado com alguma forma de reparaccedilatildeo material seja em dinheiro espeacutecie ou serviccedilos

Os legisladores da Alemanha e da Esloveacutenia deram particularmente importacircncia a este

aspeto Tambeacutem a Aacuteustria e a Beacutelgica preveem igualmente resultados orientados para o

arguido

Qualquer forma de reparaccedilatildeo eacute registada formalmente atraveacutes de um acordo

embora por exemplo na Finlacircndia natildeo sejam impostos por lei estes acordos repercutem-

se sobre o procedimento criminal seja motivando o seu arquivamento seja enquanto

alternativa agrave puniccedilatildeo

O acordo escrito conteacutem muito mais do que simples contrapartidas financeiras para

os prejuiacutezos materiais ou morais provocados Nas suas linhas cristalizam-se conversas e

encontros precedentes assumem-se compromissos futuros entre o agressor e o ofendido

ou perante a sociedade em geral como horas de trabalho voluntaacuterio a favor da

comunidade aceitaccedilatildeo de assistecircncia para resoluccedilatildeo de problemas pessoais (alcoolismo

toxicodependecircncia etc) o compromisso de se manter afastado de determinada pessoa ou

local ou outroshellip O acordo deveraacute ser assinado em consciecircncia e com a convicccedilatildeo de ser

cumprido nunca levianamente Para que tal seja assegurado deveraacute ser funccedilatildeo do

mediador esclarecer as partes do que estatildeo a assinar e das consequecircncias do seu natildeo

cumprimento

48

SANTOS Claacuteudia ndash A Mediaccedilatildeo Penal a Justiccedila Restaurativa e o Sistema Criminal ndash Algumas

Reflexotildees Suscitadas pelo Anteprojeto que Introduz a Mediaccedilatildeo Penal ldquode Adultosrdquo em Portugal in

RPCC 16 1 2006 pp 85-113 Citada por LEITE op cit p 100

30

Para finalizar este ponto rematamos com uma comparaccedilatildeo dos principais efeitos

sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida em diversos paiacuteses

Extinccedilatildeo do procedimento criminal se o arguido

aceitar a responsabilidade pelo ato e se

disponibilizar a efetuar a reparaccedilatildeo dependendo de

determinadas condiccedilotildees relacionadas com o tipo de

crime praticado

Aacuteustria Beacutelgica Inglaterra e Gales Finlacircndia

Alemanha Itaacutelia Poloacutenia Portugal Esloveacutenia

Espanha

Suspensatildeo provisoacuteria do processo por um periacuteodo de

tempo determinado

Repuacuteblica Checa 6-24 meses Itaacutelia 2 meses

Luxemburgo 8 meses

A suspensatildeo anterior fica dependente do

cumprimento do acordo de reparaccedilatildeo e de boa

conduta

Repuacuteblica Checa

Efeito de diversatildeo na fase preacute-acusatoacuteria Franccedila Luxemburgo

Arquivamento da queixa na condiccedilatildeo de o agressor

cumprir o acordo de reparaccedilatildeo Repuacuteblica Checa e Portugal

Natildeo extinccedilatildeo do procedimento criminal mas

possibilidade de o resultado da mediaccedilatildeo ser tomado

em consideraccedilatildeo na sentenccedila

Dinamarca

Resultado da mediaccedilatildeo enquanto parte do processo

decisoacuterio - limitado a determinados casos Finlacircndia

Adiamento Itaacutelia Espanha

substituiccedilatildeo Alemanha

ou a reduccedilatildeo Alemanha Poloacutenia

da sentenccedila na condiccedilatildeo de o agressor cumprir as obrigaccedilotildees restaurativas

31

32

15 - O caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

Conforme jaacute referimos neste trabalho a mediaccedilatildeo eacute ldquouma modalidade extrajudicial

de resoluccedilatildeo de litiacutegios de caraacutecter privado informal confidencial voluntaacuterio (hellip)49

rdquo a

proacutepria lei que rege a mediaccedilatildeo penal em Portugal refere taxativamente a possibilidade de

qualquer uma das partes revogarem o seu consentimento na participaccedilatildeo nesta forma de

RAL em qualquer altura do processo50

Abordemos primeiramente o caraacutecter voluntaacuterio

da mediaccedilatildeo penal e posteriormente o caraacutecter confidencial

Soacute poderaacute existir mediaccedilatildeo penal se o arguido e o ofendido assentirem caso um

deles natildeo manifeste o seu consentimento livre e esclarecido (natildeo eacute necessaacuterio que se

oponha) a mediaccedilatildeo natildeo poderaacute ocorrer O mediador informa o ministeacuterio puacuteblico e o

processo penal prossegue51

Este consentimento eacute manifestado por escrito sendo o termo

de consentimento assinado por ambas as partes o qual deveraacute conter as regras a que

obedece a mediaccedilatildeo52

Se estiverem reunidos os requisitos ou seja se houver consentimento escrito de

ambas as partes e se verifique que ambos reuacutenem condiccedilotildees para a participaccedilatildeo iniciam-se

as sessotildees de mediaccedilatildeo

De referir que a qualquer momento pode qualquer uma das partes revogar este

consentimento terminando de imediato a mediaccedilatildeo e prosseguindo o processo pelos

tracircmites ditos tradicionais

Fica assim claro o caraacuteter voluntaacuterio da mediaccedilatildeo penal dado que eacute sempre

necessaacuterio existir o consentimento do ofendido e do arguido podendo este ser revogado a

todo o instante

49

Artigo 35ordm nordm 1 da Lei nordm 782001 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie-A Nordm 161 (13-07-01) p 4270 (negrito

da nossa autoria) 50

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 51

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 52

Artigo 3ordm nordm 7 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799

33

Relativamente agrave confidencialidade da mediaccedilatildeo penal natildeo resistimos em

transcrever um artigo da proposta de Lei nordm 116XII e recentemente publicada na Lei nordm

292013 de 19 de Abril

ldquoArtigo 5ordm

Princiacutepio da confidencialidade

1 mdash O procedimento de mediaccedilatildeo tem natureza confidencial devendo o mediador

de conflitos manter sob sigilo todas as informaccedilotildees de que tenha conhecimento no acircmbito

do procedimento de mediaccedilatildeo delas natildeo podendo fazer uso em proveito proacuteprio ou de

outrem

2 mdash As informaccedilotildees prestadas a tiacutetulo confidencial ao mediador de conflitos por

uma das partes natildeo podem ser comunicadas sem o seu consentimento agraves restantes partes

envolvidas no procedimento

3 mdash O dever de confidencialidade sobre a informaccedilatildeo respeitante ao conteuacutedo da

mediaccedilatildeo soacute pode cessar por razotildees de ordem puacuteblica nomeadamente para assegurar

a proteccedilatildeo do superior interesse da crianccedila quando esteja em causa a proteccedilatildeo da

integridade fiacutesica ou psiacutequica de qualquer pessoa ou quando tal seja necessaacuterio para

efeitos de aplicaccedilatildeo ou execuccedilatildeo do acordo obtido por via da mediaccedilatildeo na estrita medida

do que em concreto se revelar necessaacuterio para a proteccedilatildeo dos referidos interesses

4 mdash Exceto nas situaccedilotildees previstas no nuacutemero anterior ou no que diz respeito ao

acordo obtido o conteuacutedo das sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo pode ser valorado em tribunal ou

em sede de arbitragemrdquo

A confidencialidade eacute fulcral para o sucesso da mediaccedilatildeo penal as partes tecircm de ter

a certeza de que tudo o que disserem nas sessotildees de mediaccedilatildeo nunca poderaacute ser usado agrave

posteriori no caso de natildeo resultar em acordo Suponhamos que ocorre uma confissatildeo

durante as sessotildees de mediaccedilatildeo e que esta natildeo culmina num acordo nunca poderaacute esta

confissatildeo ser valorada como prova nem deveraacute sequer chegar ao conhecimento do

Tribunal Soacute desta forma podemos garantir honestidade e sinceridade nas sessotildees caso

contraacuterio e dado que natildeo estatildeo sujeitos a qualquer imposiccedilatildeo legal de dizer a verdade as

sessotildees de mediaccedilatildeo natildeo teriam qualquer sucesso e fracassariam na sua essecircncia

34

Outro ponto a ter em conta e que necessitaria de estar legalmente acautelado eacute o

facto de o tribunal natildeo ter acesso agrave informaccedilatildeo relativamente agrave submissatildeo daquele processo

a tentativa de acordo em mediaccedilatildeo penal Em nossa opiniatildeo tal influenciaraacute o juiz na sua

decisatildeo Se natildeo vejamos um arguido que eacute inocente nunca aceitaraacute envolver-se num

processo de mediaccedilatildeo mesmo que as provas estejam contra si dado que tem a certeza da

sua inocecircncia acreditando que a justiccedila funcionaraacute em pleno e que seraacute absolvido

Pelo contraacuterio se for culpado poderaacute tentar alcanccedilar um acordo com o ofendido de

forma a minimizar a sua pena Quando este acordo natildeo eacute atingido e o processo segue para

tribunal por forccedila do princiacutepio da confidencialidade sabemos que o teor das sessotildees natildeo

poderaacute ser usado no entanto o juiz teraacute a informaccedilatildeo sobre o estado do processo antes de

chegar agraves suas matildeos podendo desta forma condicionar a sua decisatildeo

O nordm 17 da Declaraccedilatildeo da ONU proclama ldquoo falhanccedilo em atingir um acordo [de

mediaccedilatildeo] (hellip) natildeo deve ser usado como justificaccedilatildeo para uma decisatildeo mais severa no

subsequente processo criminalrdquo53

A mediaccedilatildeo penal deveraacute estar legalmente blindada para que quem nela participar

natildeo seja prejudicado no caso de natildeo culminar em acordo

53

LEITE op cit p 82

35

CAPIacuteTULO II

ANAacuteLISE CRIacuteTICA DA LEI 212007 DE 12 DE JUNHO

Neste capiacutetulo pretendemos analisar criticamente a Lei nordm 212007 de 12 junho a

qual veio criar o regime de mediaccedilatildeo penal em Portugal que se encontra atualmente em

vigor

Somos da opiniatildeo de que um trabalho de investigaccedilatildeo acadeacutemica da iacutendole de uma

dissertaccedilatildeo de mestrado deveraacute analisar e questionar com o uacutenico objetivo de melhorar a

sua aplicaccedilatildeo em contexto real

Atualmente o artigo 2ordm54

refere-se apenas a crimes semipuacuteblicos contra pessoas ou

contra o patrimoacutenio e a crimes particulares no entanto inicialmente estava prevista

tambeacutem a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes puacuteblicos

A Decisatildeo-Quadro deixa grande margem de liberdade aos Estados-Membros

quanto aos tipos legais de crime a abranger pelos regimes de mediaccedilatildeo penal nacionais

A inclusatildeo dos crimes puacuteblicos na mediaccedilatildeo penal portuguesa levantou a oposiccedilatildeo

de vaacuterias vozes de entre as quais o Conselho Superior de Magistratura (CSM)

No seu comentaacuterio ao anteprojeto de diploma sobre mediaccedilatildeo penal55

o CSM

aponta algumas duacutevidas e reservas acerca desta abrangecircncia

54

ldquoArtordm 2ordm - Acircmbito

1 - A mediaccedilatildeo em processo penal pode ter lugar em processo por crime cujo procedimento

dependa de queixa ou de acusaccedilatildeo particular

2 - A mediaccedilatildeo em processo penal soacute pode ter lugar em processo por crime que dependa apenas de

queixa quando se trate de crime contra as pessoas ou de crime contra o patrimoacutenio

3 - Independentemente da natureza do crime a mediaccedilatildeo em processo penal natildeo pode ter lugar nos

seguintes casos

a) O tipo legal de crime preveja pena de prisatildeo superior a 5 anos

b) Se trate de processo por crime contra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo sexual

c) Se trate de processo por crime de peculato corrupccedilatildeo ou traacutefico de influecircncia

d) O ofendido seja menor de 16 anos

e) Seja aplicaacutevel processo sumaacuterio ou sumariacutessimo

4 - Nos casos em que o ofendido natildeo possua o discernimento para entender o alcance e o

significado do exerciacutecio do direito de queixa ou tenha morrido sem ter renunciado agrave queixa a mediaccedilatildeo

pode ter lugar com intervenccedilatildeo do queixoso em lugar do ofendido

5 - Nos casos referidos no nuacutemero anterior as referecircncias efectuadas na presente lei ao ofendido

devem ter-se por efectuadas ao queixosordquo - Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-

07) p 3798

36

Para o CSM a mediaccedilatildeo penal visa essencialmente ldquocolocar o agente do crime face

agrave viacutetima por forma a que aquele tome consciecircncia do mal feito repare os danos e se

ressocialize mais facilmente atraveacutes de medidas natildeo detentivasrdquo O CSM colocou reservas

acerca da possibilidade de aplicar a mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos tendo em conta que

ldquoenquanto nos crimes semi-puacuteblicos o processo soacute se inicia com a queixa e antes da

decisatildeo final o queixoso pode desistir dela com o consentimento do arguido o que se

adequa agrave mediaccedilatildeo tal jaacute natildeo eacute possiacutevel nos crimes puacuteblicos em que a vontade da viacutetima eacute

inoperante e irrelevanterdquo

O proacuteprio acordo poliacutetico-parlamentar entre o Partido Socialista - PS e o Partido

Social Democrata - PSD apenas refere que ldquohellipa mediaccedilatildeo penal deve ser aplicaacutevel a

todos os crimes particulares bem como aos crimes semi-puacuteblicos que o justifiquem em

razatildeo da sua naturezardquo

A Ordem dos Advogados (OA) veio tambeacutem manifestar-se nesta mateacuteria

considerando que ldquohellip tambeacutem para promover o recurso agrave mediaccedilatildeo penal nos crimes

puacuteblicos eacute necessaacuterio que o Ministeacuterio Puacuteblico deva justificar a razatildeo pela qual natildeo

recorre a esse instrumento processual de natureza consensual quando se verifiquem os

respectivos pressupostos Deveria pelo menos justificar por natildeo o faz56

rdquo

A OA vai mais longe sugerindo que tenha de existir a concordacircncia do juiz de

instruccedilatildeo para remeter o processo para mediaccedilatildeo ou mesmo quando haacute acordo a fim de

suspender provisoriamente o processo Esta uacuteltima opccedilatildeo levantaria um grave obstaacuteculo agrave

implementaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal dado que os contendores poderiam estar de acordo

quanto ao resultado da mediaccedilatildeo no entanto este poderia natildeo ter o acordo do juiz

55

Comentaacuterio datado de 01 de Marccedilo de 2006 e assinado por maria Joseacute Machado agrave data vogal do distrito

judicial de Eacutevora do CSM 56

Parecer nordm 0506 da Ordem dos Advogados datado de 09 de marccedilo de 2006 e assinado por Germano

Marques da Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

37

A proposta de lei nordm 107X veio de encontro agraves vaacuterias posiccedilotildees tomadas apenas

considerando passiacuteveis de serem sujeitos ao processo de mediaccedilatildeo penal ldquotodos os crimes

particulares e a certos crimes semi-puacuteblicos ndash os crimes contra as pessoas ou contra o

patrimoacutenio passiacuteveis de serem punidos com pena de prisatildeo natildeo superior a cinco anos ou

com sanccedilatildeo diferente da pena de prisatildeordquo57

Esta proposta de Lei vem a ser confirmada agrave posteriori atraveacutes da Lei nordm 212007

de 12 de Junho a qual no seu artigo 2ordm limita a sua aplicaccedilatildeo aos crimes particulares e a

alguns crimes semipuacuteblicos

Apoacutes a publicaccedilatildeo desta proposta de lei vem a OA dar ldquoparecer positivo plenordquo

justificando que ldquoO projecto em anaacutelise agora limitado aos crimes semi-puacuteblicos e

particulares merece a nossa concordacircncia As dificuldades que assinalaacutemos em anterior

parecer foram ultrapassadas dada a exclusatildeo dos crimes puacuteblicos do acircmbito da

mediaccedilatildeo58

rdquo

Aparentemente natildeo faria qualquer sentido termos a possibilidade de aplicar a

mediaccedilatildeo penal a crimes puacuteblicos dada a sua especificidade processual Como vimos

anteriormente a mediaccedilatildeo penal exige a existecircncia de duas partes para que a possibilidade

de um acordo esteja a ser debatida Nos crimes puacuteblicos como se identificaria

materialmente o ofendido Natildeo estariam desta forma reunidas as condiccedilotildees para se

recorrer agrave Mediaccedilatildeo Penal nem seria possiacutevel quando uma das partes eacute o proacuteprio Estado

em representaccedilatildeo da sociedade

Analisemos no entanto o crime de furto a tiacutetulo de exemplo acadeacutemico

O artigo 203ordm nordm 3 do CP classifica o crime de furto como crime semipuacuteblico No

caso de se enquadrar nas condiccedilotildees do artigo 207ordm do CP eacute mesmo considerado como um

crime de natureza particular Ou seja enquadra-se nas condicionantes da mediaccedilatildeo penal

referidas no artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho sendo admitido o recurso a esta

forma de RAL

57

Preacircmbulo da Lei nordm 107X 58

Parecer da Ordem dos Advogados datado de 09 de outubro de 2006 e assinado por Germano Marques da

Silva enquanto relator e presidente do gabinete de estudos da OA

38

Suponhamos agora que as condiccedilotildees em que o crime de furto ocorre satildeo

exatamente as mesmas exceto no valor da coisa furtada que eacute de valor elevado ou seja

excede as 50 unidades de conta59

O crime de furto eacute entatildeo qualificado por forccedila do artigo

nordm 204ordm nordm 1 al a) do CP passando a um crime de natureza puacuteblica e deixando de ser

admitido o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

Neste caso apenas estamos a falar da alteraccedilatildeo do valor da coisa furtada e da

qualificaccedilatildeo ou desqualificaccedilatildeo do respetivo crime Apesar de natildeo ser facilmente

entendiacutevel para o cidadatildeo comum consideramos esta questatildeo do foro exclusivo da poliacutetica

criminal Natildeo nos devemos assim imiscuir nessa mateacuteria Serve o exemplo que aqui

apresentamos para ilustrar as limitaccedilotildees da mediaccedilatildeo penal mesmo em crimes em que

aparentemente poderiacuteamos aplicar esta forma de RAL

Ao limitar a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes cuja moldura penal maacutexima seja

igual ou inferior a cinco anos no caso dos crimes particulares implica referir que todos os

crimes particulares estatildeo abrangidos dada a inexistecircncia de molduras penais superiores60

Estando sanada a limitaccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos crimes particulares

e a alguns crimes semipuacuteblicos logo ad contrarium sensu a proibir a sua aplicaccedilatildeo em

crimes puacuteblicos levanta-se uma questatildeo relativamente aacute aliacutenea c) nordm 3 do artigo 2ordm da Lei

nordm 212007 de 12 de Junho

Se nos nuacutemeros 1 e 2 do artigo 2ordm a Lei proiacutebe a aplicaccedilatildeo aos crimes puacuteblicos e

sendo o crime de peculato61

corrupccedilatildeo62

e traacutefico de influecircncias63

crimes puacuteblicos estamos

perante uma redundacircncia legislativa ou uma dupla proibiccedilatildeo

59

Artigo 202ordm al) a) do CP ndash ldquoa) Valor elevado ndash aquele que exceder 50 unidades de conta avaliadas no

momento da praacutetica do factordquo 60

As portarias nordms 68-A2008 68-B2008 e 68-C2008 de 22 de janeiro previam erradamente a aplicaccedilatildeo da

mediaccedilatildeo penal a crimes cuja pena de prisatildeo fosse ldquosuperior a 5 anosrdquo Erro parcialmente corrigido pelas

Declaraccedilotildees de Retificaccedilatildeo nordms 16 17 e 18 de 2008 publicadas no Diaacuterio da Repuacuteblica I seacuterie de 20 de

marccedilo A portaria nordm 68-C2008 natildeo foi corretamente corrigida constando ainda esta referecircncia Somos da

opiniatildeo que deveraacute ser interpretada ao abrigo da al a) nordm 2 artordm 2ordm da Lei nordm 212007 e aplicada a crimes cuja

pena de prisatildeo ldquonatildeo seja superior a cinco anosrdquo Esta interpretaccedilatildeo eacute reforccedilada pelas alteraccedilotildees agraves portarias

anteriormente referidas e devido agrave hierarquia da legislaccedilatildeo portuguesa dado que nunca poderia uma portaria

contrariar uma Lei 61

Artigo 375ordm do Coacutedigo Penal 62

Capiacutetulo IV Secccedilatildeo I do Coacutedigo Penal 63

Artigo 335ordm do Coacutedigo Penal

39

Acerca deste assunto vem o Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico tomar

uma posiccedilatildeo ldquoNestes termos em boa disciplina legislativa e esperando que natildeo haja ideia

de alterar o regime puacuteblico de tais crimes ou diminuir a sua moldura penal a aliacutenea c) do

nordm 3 deveria simplesmente ser suprimidardquo64

Deixa no entanto o SMMP a ressalva de que ldquoAgrave cautela poreacutem mais vale deixar

permanecer aquela proibiccedilatildeordquo65

O texto manteve-se sendo que na Lei nordm 212007 se manteacutem esta dupla proibiccedilatildeo

Em nosso entender eacute uma proibiccedilatildeo redundante e que deveria ser eliminada da letra de Lei

Mesmo especulando que no futuro se pudessem tornar crimes semipuacuteblicos nunca seriam

abrangidos pelo regime da mediaccedilatildeo penal por forccedila do artigo 2ordm nordm 2 da Lei nordm 212007

dado que o bem protegido neste tipo de crimes natildeo satildeo as pessoas nem o patrimoacutenio

Tambeacutem a limitaccedilatildeo a alguns crimes semipuacuteblicos poderaacutedeveraacute ser debatida Em

primeiro lugar porque a mediaccedilatildeo penal eacute de caraacutecter voluntaacuterio logo o ofendido ou o

arguido tecircm sempre a possibilidade de se opor agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal bastando

que natildeo deem o seu consentimento66

ou que o revoguem no decorrer desta67

O

acionamento destas ferramentas legislativas eacute suficiente para que o processo siga a forma

comum e salvaguarde a vontade das partes envolvidas

O proacuteprio regime aplicaacutevel aos crimes semipuacuteblicos permitem que o queixoso

desista da queixa desde que natildeo haja oposiccedilatildeo do arguido ateacute agrave publicaccedilatildeo da sentenccedila em

primeira instacircncia68

Ora pelas razotildees anteriormente expostas poderia o nordm 2 do artigo 2ordm da Lei nordm

212007 de 12 de junho abranger todo o tipo de crimes semipuacuteblicos protegendo de igual

forma os direitos do ofendido e do arguido

64

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 65

Ibidem 66

Artigo 3ordm nordm 6 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 67

Artigo 4ordm nordm 2 da Lei nordm 212007 Diaacuterio da Repuacuteblica I Seacuterie Nordm 112 (12-06-07) p 3799 68

Artigo 116ordm nordm 2 do Coacutedigo Penal

40

ldquoO ofendido mais que qualquer outra pessoa saberaacute se a mediaccedilatildeo serve

os seus interesses e se eacute ou natildeo meio com suficiente idoneidade para

reparar a lesatildeo consumada com a praacutetica do crime69

rdquo

Ressalvamos que deveraacute de existir uma vaacutelvula legal de escape para eventuais

crimes semipuacuteblicos existentes ou que venham a ser previstos no Coacutedigo Penal e aos quais

natildeo se adequaraacute a mediaccedilatildeo penal Nesta situaccedilatildeo o Ministeacuterio Puacuteblico poderaacute natildeo aceitar

a mediaccedilatildeo penal justificando os motivos da sua rejeiccedilatildeo

Na aliacutenea b) do nordm 3 do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o legislador

proiacutebe a aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal a crimes ldquocontra a liberdade ou autodeterminaccedilatildeo

sexualrdquo Julgamos que esta proibiccedilatildeo eacute consensual no entanto chegou a ser debatida na

discussatildeo parlamentar na fase da generalidade70

O argumento ao qual se apelou foi o de que o ofendido poderia nunca apresentar

queixa ou simplesmente desistir dela Natildeo subscrevemos este ponto de vista e reforccedilamos a

ideia base da mediaccedilatildeo penal da resoluccedilatildeo de um conflito frente a frente entre o arguido e

o ofendido de forma pacificadora e direta

Ao facultarmos a possibilidade de existir uma mediaccedilatildeo neste tipo de crimes

estariacuteamos a correr o risco de transmitir a imagem da pouca importacircncia deste tipo de

crimes para a sociedade o que obviamente repudiamos Poderiacuteamos ainda estar a infligir

um novo sofrimento agrave viacutetima a qual seria confrontada com o seu agressor sexual e com as

suas justificaccedilotildees tendo esta que se expor para as contrariar Neste tipo de crimes somos

da opiniatildeo que deveremos recorrer ao sistema tradicional por forma a proteger os

interesses do ofendido

Outra questatildeo controversa levantada acerca do texto do artigo 2ordm tem a ver com o

facto do nordm 3 al e) da proposta de lei nordm 107X proibir que o arguido fosse uma pessoa

coletiva sendo no entanto permitido que o ofendido tivesse essa qualidade Esta proibiccedilatildeo

provinha do facto de estas natildeo poderem assumir a responsabilidade dos factos imputados

69

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4 70

Conforme consta no nordm 51 I seacuterie do Diaacuterio da Assembleia da Repuacuteblica de 22 de fevereiro de 2007

41

Tal proibiccedilatildeo levantaria algumas questotildees umas das quais no caso de haver dois

arguidos sendo um deles pessoa coletiva Nesta situaccedilatildeo a mediaccedilatildeo seria possiacutevel apenas

relativamente ao arguido singular impedindo a pessoa coletiva de aceder a esta forma de

RAL

Tomemos como exemplo acadeacutemico uma pessoa coletiva que comete o crime de

difamaccedilatildeo sobre uma pessoa singular Ao subsistir esta proibiccedilatildeo a mediaccedilatildeo penal natildeo

poderia ser acionada no entanto a pessoa coletiva poderia chegar a acordo ldquoextra-

mediaccedilatildeordquo com o ofendido e este uacuteltimo desistir da queixa sendo o processo arquivado de

igual forma Seraacute sempre preferiacutevel que este acordo seja ldquosupervisionadordquo pela justiccedila

nomeadamente pelo Ministeacuterio Puacuteblico

Vem o SMMP tomar posiccedilatildeo quanto a esta mateacuteria alegando que ldquonatildeo se entende a

opccedilatildeo de deixar fora do processo de mediaccedilatildeo os crimes praticados por pessoas

colectivas uma vez que inexiste qualquer obstaacuteculo dogmaacutetico ou pragmaacutetico agrave mediaccedilatildeo

quando o arguido eacute pessoa colectiva71

rdquo

Efetivamente esse foi tambeacutem o entendimento do legislador pelo que a Lei nordm

212007 de 12 de junho veio a permitir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal por parte de pessoas

coletivas como arguidos ou ofendidos Relativamente agrave responsabilidade penal das

pessoas coletivas veio a sua capacidade plasmada no artigo 11ordm nordms 2 a 11 da Lei nordm

592007 de 4 de setembro

Poderemos estar tambeacutem perante outra questatildeo o facto de durante o inqueacuterito

estarem a ser investigados diversos crimes ou contra o mesmo agente ou por forccedila das

vaacuterias aliacuteneas do nordm 1 do artigo 24ordm do Coacutedigo de Processo Penal

71

Parecer do SMMP relativo agrave proposta de Lei 107X do Coacutedigo de Mediaccedilatildeo Penal 26 de Fevereiro de

2007 p4

42

Para Rui do Carmo72

ldquoNestes casos pode haver lugar agrave separaccedilatildeo de processos

se a) coexistirem crimes a que eacute aplicaacutevel a mediaccedilatildeo penal e crimes a que tal modo de

resoluccedilatildeo do conflito penal natildeo eacute aplicaacutevel ou b) havendo uma pluralidade de arguidos

eou ofendidos a mediaccedilatildeo possa ter lugar apenas relativamente a algum ou alguns

delesrdquo Esta posiccedilatildeo assenta para Rui do Carmo nas aliacuteneas a) e b) do nordm 1 do artigo 30ordm

do Coacutedigo de Processo Penal dado que se enquadra no ldquointeresse ponderoso e atendiacutevel de

qualquer arguido73

rdquo sendo que poderia ldquorepresentar um grave risco para () o ofendido

()rdquo74

Opiniatildeo contraacuteria tem Joatildeo Conde Correia o qual defende que ldquono caso de

pluralidade de crimes seraacute tambeacutem difiacutecil aplicar o regime de mediaccedilatildeo penal porque a

moldura penal abstracta prevista para os crimes em causa ultrapassaraacute normalmente o

limite maacuteximo de cinco anos previsto no artordm 2ordm nordm 3 al a)rdquo75

Rui do Carmo rebate esta posiccedilatildeo alegando que ldquoO preceito legal referido reporta-

se a ldquotipo legal de crime[que] preveja pena de prisatildeo superior a cinco anosrdquo e natildeo agrave pena

do eventual concurso de crimesrdquo76

Ainda acerca desta questatildeo reiteramos um dos princiacutepios da mediaccedilatildeo penal ndash a

voluntariedade assim se a situaccedilatildeo for a inversa ou seja se um arguido praticar um iliacutecito

penal contra vaacuterios ofendidos apenas poderaacute haver recurso agrave mediaccedilatildeo penal caso haja

unanimidade e consenso por parte destes Assentamos esta posiccedilatildeo no artigo 3ordm nordm 6 da

Lei nordm 212007 de 12 de Junho ndash ldquoCaso natildeo obtenha consentimento (hellip) o mediador

informa disso o Ministeacuterio Puacuteblico prosseguindo o processo penalrdquo Caso assim natildeo

fosse corriacuteamos o risco de o arguido ser punido duas vezes pelo mesmo crimes o que estaacute

constitucionalmente vedado pelo artigo 29ordm nordm 5 da Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica

Portuguesa77

72

CARMO Rui - Procurador da Repuacuteblica e Diretor adjunto do Centro de Estudos Judiciaacuterio in Um

exerciacutecio de leitura do Regime Juriacutedica da mediaccedilatildeo Penal [Em linha] 2012 P 6 [consult 08 de agosto de

2012] Disponiacutevel em httpptscribdcomdoc47613009Mediacao-Penal 73

Artigo 30ordm nordm1 al a) do Coacutedigo de Processo Penal 74

Artigo 30ordm nordm1 al b) do Coacutedigo de Processo Penal 75

ldquoO papel do Ministeacuterio Puacuteblico no regime legal da mediaccedilatildeo penalrdquo Revista do Ministeacuterio Puacuteblico nordm

112 Out-Dez 2007 p68 nota 24 76

CARMO op cit p 7 (rodapeacute) 77

ldquo5 - Ningueacutem pode ser julgado mais do que uma vez pela praacutetica do mesmo crimerdquo artigo 29ordm CRP

43

Resta-nos analisar uma uacuteltima hipoacutetese o caso de existir apenas um ofendido um

iliacutecito criminal praticado e vaacuterios agentes Na situaccedilatildeo elencada estamos perante um caso

de comparticipaccedilatildeo criminosa Assim a questatildeo a analisar eacute se poderemos aplicar a

mediaccedilatildeo penal num caso de comparticipaccedilatildeo e apenas envolvendo parte dos agentes

Exemplo de trecircs agentes (A B e C) em que um (A) pretende o recurso agrave mediaccedilatildeo penal e

os restantes dois natildeo pretendem (B e C)

Tendo por base a voluntariedade da mediaccedilatildeo penal desde jaacute podemos dar como

assente que natildeo pode a lei ldquoobrigarrdquo os agentes B e C a aceitarem o recurso agrave mediaccedilatildeo

Cumpriraacute avaliar qual o procedimento relativamente ao agente A

Somos da opiniatildeo de que o procedimento seraacute o semelhante ao referido

anteriormente a mediaccedilatildeo realizar-se-aacute com o arguido que a pretende (A) e o processo

comum para com os restantes agentes (B e C) ndash artigo 264ordm nordm 5 e artordm 30ordm nordm 1 al a)78

do

CPP

Pode no entanto ocorrer que os arguidos B e C venham a ser absolvidos em sede de

julgamento enquanto que o arguido A jaacute se encontra a cumprir o acordo

Esta decisatildeo aproveitaraacute ao arguido A devendo este ser notificado da decisatildeo do

julgador cessando de imediato o acordo anteriormente firmado no acircmbito da mediaccedilatildeo

penal dado que lhe eacute mais favoraacutevel

O artigo 2ordm aliacutenea d) deste diploma vem ainda proibir o recurso agrave mediaccedilatildeo penal

no caso de o ofendido ser menor de 16 anos Haveria a possibilidade de estes se fazerem

representar conforme os nordms 8 e 12 da Recomendaccedilatildeo Entendeu no entanto o legislador

portuguecircs contrariar a recomendaccedilatildeo a respeito desta mateacuteria79

Concordamos com a

posiccedilatildeo perfilhada dado que a sua representaccedilatildeo desvirtuava a ideia base da mediaccedilatildeo

78

ldquoArtigo 30ordm

Separaccedilatildeo dos processos

1 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico do arguido do assistente ou do lesado o

tribunal faz cessar a conexatildeo e ordena a separaccedilatildeo de algum ou alguns processos sempre que

a) Houver na separaccedilatildeo um interesse ponderoso e atendiacutevel de qualquer arguido (hellip)rdquo 79

ldquo8 Fundamental procedural safeguards should be applied to mediation in particular the

parties should have the right to legal assistance and where necessary to translationinterpretation Minors

should in addition have the right to parental assistancerdquo ldquo12 Special regulations and legal safeguards

governing minors participation in legal proceedings should also be applied to their participation in

mediation in penal mattersrdquo

44

uma confrontaccedilatildeo entre o arguido e o ofendido Deve o Estado primar para que o superior

interesse da crianccedila seja respeitado e natildeo poderaacute delegar esta responsabilidade Apesar de

o eventual acordo ser sempre sujeito ao escrutiacutenio do Ministeacuterio Puacuteblico este deve ter uma

intervenccedilatildeo direta em todo o processo pelo que apenas o poderaacute fazer em sede de

julgamento num processo comum e natildeo num processo alternativo de resoluccedilatildeo de litiacutegios

como a Mediaccedilatildeo Penal

Aventuramo-nos a ir mais aleacutem do previsto na Lei nordm 212007 de 12 de Junho e

aplicar analogicamente a aliacutenea d) do nordm 2 do artordm 2ordm deste diploma aos interditos e

inabilitados Os argumentos seratildeo semelhantes aos anteriormente apresentados em relaccedilatildeo

aos menores sempre primando pela resoluccedilatildeo direta entre o ofendido e o arguido o que

natildeo aconteceria se estes se fizessem representar Neste sentido remetemos para o nordm 13 da

Recomendaccedilatildeo ldquo A mediaccedilatildeo natildeo deveraacute prosseguir se algumas das partes envolvidas

natildeo for capaz de entender o significado do processordquo (traduccedilatildeo nossa)80

e para o nordm 15

ldquoDisparidade oacutebvias referentes a fatores como hellip a capacidade intelectual devem ser tidas

em conta antes de remeter o processo para mediaccedilatildeordquo (traduccedilatildeo nossa)81

Outro impedimento do regime da mediaccedilatildeo penal vem plasmado no artigo 2ordm nordm 3

aliacutenea e) a qual proiacutebe o recurso agrave mediaccedilatildeo penal no caso de ser aplicaacutevel o processo

sumaacuterio ou sumariacutessimo

Para percebermos melhor a razatildeo de ser desta aliacutenea importa definir mesmo que

superficialmente os conceitos de processo sumaacuterio e de processo sumariacutessimo

O processo sumaacuterio estaacute previsto no Livro VIII tiacutetulo I do Coacutedigo de Processo

Penal e na sua essecircncia aplica-se a crimes cujo limite maacuteximo natildeo ultrapasse os cinco

anos82

desde que detidos em flagrante delito83

ou caso o Ministeacuterio Puacuteblico na acusaccedilatildeo

entender que natildeo deva ser aplicada em concreto pena de prisatildeo superior a cinco anos84

80

ldquo13 Mediation should not proceed if any of the main parties involved is not capable of understanding the

meaning of the processrdquo ndash nordm 13 da Recomendaccedilatildeo 81

ldquo15 Obvious disparities with respect to factors such as the parties age maturity orintellectual capacity

should be taken into consideration before a case is referred to mediationrdquo ndash nordm 15 da Recomendaccedilatildeo 82

Artigo 381ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 83

Nos termos do disposto nos artigos 255ordm e 256ordm do Coacutedigo de Processo Penal 84

Artigo 381ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

45

O facto de o Ministeacuterio Puacuteblico ter a possibilidade de na acusaccedilatildeo requerer uma

pena de prisatildeo inferior ou igual a cinco anos natildeo influencia a impossibilidade de recorrer a

esta modalidade de RAL Em primeiro lugar devido ao momento processual em que

decorre a mediaccedilatildeo sendo que o recurso a este mecanismo legal apenas poderaacute decorrer

durante a fase de inqueacuterito sendo a acusaccedilatildeo que dita o final deste Em segundo lugar e

em seguimento deste primeiro argumento no decorrer do inqueacuterito o arguido estaacute

indiciado por um crime de pena maacutexima superior a 5 anos o que jaacute se encontra previsto na

aliacutenea a) do nordm 3 da Lei 212007 ou estaacute perante um concurso de crimes situaccedilatildeo jaacute

analisada anteriormente

Jaacute quanto agrave primeira preposiccedilatildeo do nordm 1 do artigo 381ordm poderiacuteamos estar perante

uma situaccedilatildeo de eventual recurso ao regime da mediaccedilatildeo penal no entanto nesta situaccedilatildeo

partimos de imediato para o processo sumaacuterio O detido eacute apresentado imediatamente ou

no mais curto prazo possiacutevel ao Ministeacuterio Puacuteblico junto do tribunal competente para o

julgamento85

Por sua vez o Ministeacuterio Puacuteblico tem a possibilidade de interrogar o detido

sumariamente e apresenta-o imediatamente ou no mais curto prazo possiacutevel ao tribunal

para o seu julgamento86

Por estes motivos no processo sumaacuterio natildeo haacute lugar a inqueacuterito

logo natildeo poderaacute haver lugar a mediaccedilatildeo penal por proibiccedilatildeo do artigo 3ordm nordm 1 da Lei nordm

212007 de 12 de Junho Mais uma vez entendemos existir uma redundacircncia nestas

proibiccedilotildees apenas entendendo a sua referecircncia como forma de facilitar a compreensatildeo por

parte do inteacuterprete

Analisemos brevemente o processo sumariacutessimo previsto no tiacutetulo III do Livro

VIII do Coacutedigo de Processo Penal O processo sumariacutessimo eacute aplicaacutevel a crimes puniacuteveis

com pena de prisatildeo natildeo superior a 5 anos ou soacute com pena de multa em que o Ministeacuterio

Puacuteblico entenda que ldquodeve ser concretamente aplicada pena ou medida de seguranccedila natildeo

privativas da liberdade87

rdquo O Ministeacuterio Puacuteblico deveraacute apresentar requerimento escrito

contendo ldquoas indicaccedilotildees tendentes agrave identificaccedilatildeo do arguido a descriccedilatildeo dos factos

imputados e a menccedilatildeo das disposiccedilotildees legais violadas a prova existente e o enunciado

sumaacuterio das razotildees pelas quais entende que ao caso natildeo deve concretamente ser aplicada

85

Artigo 382ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 86

Artigo 382ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal 87

Artigo 392ordm nordm 2 do Coacutedigo de Processo Penal

46

pena de prisatildeo88

rdquo Caso o arguido natildeo se oponha conforme o artigo 397ordm nordm 1 do CPP o

juiz ldquoprocede agrave aplicaccedilatildeo da sanccedilatildeo e agrave condenaccedilatildeordquo

O artigo 393ordm nordm 2 do CPP permite ainda que ldquoateacute ao momento da apresentaccedilatildeo

do requerimento do Ministeacuterio Puacuteblico (hellip) pode o lesado manifestar intenccedilatildeo de obter a

reparaccedilatildeo dos danos sofridos (hellip)rdquo

Pelo exposto anteriormente natildeo encontramos qualquer impedimento a que se

recorra agrave mediaccedilatildeo penal em processos sumariacutessimos Partilhamos a opiniatildeo de Rui do

Carmo89

ldquonatildeo se vislumbra qualquer razatildeo substantiva justificativa destas (hellip) excepccedilotildees

agrave aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penalrdquo

Na eventualidade de ser requerida a mediaccedilatildeo penal durante o inqueacuterito e para

fazer funcionar a aliacutenea e) do artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho o Ministeacuterio

Puacuteblico teraacute de rejeitar o requerimento alegando que vai recorrer ao processo sumariacutessimo

Frisamos que o arguido tem a possibilidade de se opor ao requerimento pelo que o

processo seguiraacute para ldquooutra forma que lhe caiba90

rdquo Nesta situaccedilatildeo o processo seguiraacute

para uma forma em que lhe seria possiacutevel aplicar o regime da mediaccedilatildeo penal tendo-lhe

sido jaacute negada essa possibilidade

Assim e quanto aacute aliacutenea e) do nordm 3 artigo 2ordm da Lei nordm 212007 de 12 de junho

somos da opiniatildeo que eacute plausiacutevel a proibiccedilatildeo da aplicaccedilatildeo da mediaccedilatildeo penal aos processos

sumaacuterios no entanto quanto aos processos sumariacutessimos esta devia ser permitida

Contrariamos desta forma em parte a posiccedilatildeo tomada por Andreacute Lamas Leite o

qual aborda levemente o assunto na sua anaacutelise criacutetica agrave Lei nordm 212007 de 12 de junho91

88

Artigo 394ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 89

CARMO op cit p 21 90

Artigo 398ordm nordm 1 do Coacutedigo de Processo Penal 91

ldquo(hellip) muito dificilmente se configura como poderia a mediaccedilatildeo ser compatiacutevel com o raacutepido

processamento imprimido (processo sumaacuterio) ou com o consenso jaacute exigido (ao niacutevel do processo

sumariacutessimo)rdquo- LEITE Op Cit

47

CAPIacuteTULO III

ESTATIacuteSTICAS DO SISTEMA DE MEDIACcedilAtildeO PENAL

Dados referentes agraves estatiacutesticas gerais do Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

compreendido pelo periacuteodo de 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

Relativamente aos processos que deram entrada no Ministeacuterio Puacuteblico podemos

apontar o nuacutemero total de 73592

dos quais 188 (2558) foram terminados com sucesso

(nuacutemero de processos terminados com acordo)

A natureza dos conflitos no que respeita ao total de processos que deram entrada

em mediaccedilatildeo penal descriminam-se na tabela abaixo indicada

92

Fonte Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila

Artigo Qtd Natureza

Artordm 143ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica simples 389 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 148ordm - Ofensa agrave integridade fiacutesica por negligecircncia 8 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 153ordm - Ameaccedila 81 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 154ordm nordm 4 ndash Coaccedilatildeo 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 156ordm - Intervenccedilotildees e tratamentos Meacutedico-ciruacutergicos arbitraacuterios 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 180ordm - Difamaccedilatildeo 7 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 181ordm - Injuacuteria 26 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 183ordm - Publicidade e caluacutenia 1 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 185ordm - Ofensa agrave memoacuteria de pessoa falecida 0 Particular Crime contra as pessoas

Artordm 187ordm - Ofensa a organismo serviccedilo ou pessoa coletiva 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra as pessoas

Artordm 190ordm - Violaccedilatildeo de domiciacutelio ou perturbaccedilatildeo da vida privada 6 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 191ordm - Introduccedilatildeo em lugar vedado ao puacuteblico 3 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 192ordm - Devassa da vida privada 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 194ordm - Violaccedilatildeo de correspondecircncia ou de telecomunicaccedilotildees 1 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 195ordm - Violaccedilatildeo de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 196ordm - Aproveitamento indevido de segredo 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 199ordm - Gravaccedilotildees e fotografias iliacutecitas 0 Semipuacuteblico Crime contra as pessoas

Artordm 203ordm - Furto simples 63 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 205ordm - Abuso de confianccedila 27 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 208ordm - Furto de uso de veiacuteculo 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 209ordm - Apropriaccedilatildeo ilegiacutetima em caso de acessatildeo ou de coisa achada 4 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 212ordm - Dano 69 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 215ordm - Usurpaccedilatildeo de coisa imoacutevel 1 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 216ordm - Alteraccedilatildeo de marcos 0 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 217ordm - Burla 27 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 219ordm - Burla relativa a seguros 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 220ordm - Burla para obtenccedilatildeo de alimentos bebidas ou serviccedilos 5 SemipuacuteblicoParticular Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 221ordm - Burla informaacutetica e nas comunicaccedilotildees 2 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 224ordm - Infidelidade 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 225ordm - Abuso de cartatildeo de garantia ou de creacutedito 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Artordm 226ordm - Usura 0 Semipuacuteblico Crime contra o patrimoacutenio

Decreto-Lei nordm 31697 - Emissatildeo de cheque sem provisatildeo 10 Semipuacuteblico

Total 735 Com acordo 188

Restantes 547

Taxa de sucesso 2558

Taxa de insucesso 7442

Dados cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica de Justiccedila referentes agrave natureza dos conflitos de processos de mediaccedilatildeo penal no periacuteodo

compreendido entre 23 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2012

48

Graacutefico

Com base nos dados apresentados podemos indicar o crime de ofensas agrave

integridade fiacutesica simples ndash artordm 143ordm do Coacutedigo Penal como aquele em que mais se

recorreu agrave mediaccedilatildeo penal com 389 processos Eacute seguido do crime de ameaccedila ndash artordm 153ordm

do CP com 81 processos do crime de dano ndash artordm 212ordm do CP com 69 processos e do

crime de furto simples ndash artordm 203ordm do CP com 63 processos

Cerca de 53 dos processos que deram entrada no Sistema de Mediaccedilatildeo Penal

referem-se ao crime de ofensas agrave integridade fiacutesica simples

Como ponto negativo teremos de referir a baixa taxa de sucesso na ordem dos

2558 contra 7442 de processos cujo insucesso prevaleceu

Estes valores indicam que muito trabalho ainda haacute por fazer na mediaccedilatildeo penal natildeo

soacute na expansatildeo a outros crimes cuja ldquoprocurardquo foi na ordem dos 0 como na investigaccedilatildeo

e anaacutelise das causas que levam ao insucesso da mediaccedilatildeo penal Teremos tambeacutem de ter

em conta apesar da ausecircncia de nuacutemeros oficiais de que no sistema dito tradicional

alguns destes crimes tecircm soacute por si uma taxa bastante baixa de processos o que poderaacute

influenciar estes valores

Art 143ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica simples

Art 148ordm - Ofensa agrave integridadefiacutesica por Negligecircncia

Art 153ordm - Ameaccedila

Art 154ordm nordm4 - Coacccedilatildeo

Art 156ordm - Intervenccedilotildees etratamentos Meacutedico- ciruacutergicosarbitraacuterios

Art 180ordm - Difamaccedilatildeo

49

Eacute ainda importante referir que a maioria dos recursos agrave mediaccedilatildeo penal ocorre em

crimes contra as pessoas em detrimento aos crimes contra o patrimoacutenio Evidenciando a

necessidade e a tendecircncia para a resoluccedilatildeo fora dos tribunais deste tipo de crimes

50

51

52

CONCLUSAtildeO

A Mediaccedilatildeo Penal em Portugal jaacute eacute uma realidade implementada no entanto natildeo

passa ainda de uma crianccedila em franco crescimento Demos agora os primeiros passos nesta

caminhada sempre com a plena consciecircncia de que muito ainda existe para percorrer

Acreditamos que a seu tempo poderaacute vir a tornar-se uma alternativa ao Sistema

Penal dito tradicional com evidentes vantagens para todos os intervenientes e para a

sociedade em geral E ressalvamos ldquoa seu tempordquo pois a elevada taxa de insucesso da

Mediaccedilatildeo Penal demonstra que muito ainda falta fazer neste campo para que a possamos

apelidar de alternativa

No presente estudo optaacutemos por realizar trecircs viagens distintas no entanto sempre

com um ponto em comum ndash A Mediaccedilatildeo Penal

A primeira viagem incidiu numa perspetiva sobre a Justiccedila Restaurativa em geral e

a Mediaccedilatildeo Penal em particular o seu percurso histoacuterico e legislativo criacuteticas e alteraccedilotildees

ocorridas ao longo do tempo Analisaacutemos a admissibilidade da utilizaccedilatildeo do termo

ldquopartesrdquo em mediaccedilatildeo penal a funccedilatildeo do mediador formas de acesso a esta funccedilatildeo

obrigaccedilotildees e deveres deste Realizaacutemos um breve estudo comparativo da mediaccedilatildeo penal

em Portugal em relaccedilatildeo a outros paiacuteses onde tambeacutem se encontra implementado este

sistema de RAL nomeadamente no que concerne aos poderes do mediador e agrave forma como

estes satildeo vistos pela administraccedilatildeo puacuteblica Avanccedilaacutemos depois para o objetivo primordial

de qualquer mediaccedilatildeo o acordo

Analisaacutemos os requisitos do acordo formas de controlo e de elaboraccedilatildeo prazos e

consequecircncias do natildeo cumprimento e a resposta do sistema tradicional a este

incumprimento Tambeacutem neste ponto optaacutemos por uma breve anaacutelise internacional acerca

dos principais efeitos sobre o procedimento criminal de uma intervenccedilatildeo bem-sucedida

53

Finalizaacutemos com a anaacutelise do caraacuteter voluntaacuterio e confidencial da Mediaccedilatildeo Penal

pedras basilares neste Sistema de Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios sem as quais todo o

edifiacutecio ruiria

Na segunda viagem analisaacutemos de uma forma criacutetica a Lei nordm 212007 de

12 de junho Desde os pareceres do Conselho Superior de Magistratura Ordem dos

Advogados Sindicato dos Magistrados do Ministeacuterio Puacuteblico acordos poliacutetico-

parlamentares entre outros documentos que foram moldando a lei vigente Tivemos o

cuidado de percorrer artigo a artigo toda a Lei da Mediaccedilatildeo Penal e respetivas portarias e

apontar algumas incongruecircncias ou erros teacutecnicos que merecem ser discutidos de forma a

puderem corrigir algumas lacunas apontadas

Na terceira e uacuteltima viagem limitaacutemo-nos a apresentar nuacutemeros gentilmente

cedidos pela Direccedilatildeo-Geral da Poliacutetica da Justiccedila e a conceber uma breve anaacutelise factual

destes

Fazemos votos para que este trabalho sirva de base para uma anaacutelise cuidada e

aprofundada sobre a Mediaccedilatildeo Penal em Portugal Em nossa opiniatildeo esta forma de

Resoluccedilatildeo Alternativa de Litiacutegios traz vantagens para a Administraccedilatildeo Puacuteblica em geral e

para o Sistema Penal em Portugal em particular com uma desburocratizaccedilatildeo e celeridade

processual evidente Tambeacutem os intervenientes neste processo viacutetima e agressores razatildeo

de ser de todo o sistema satildeo aqui chamados a assumir a sua responsabilidade e a sua culpa

trazendo para ambos vantagens colossais em relaccedilatildeo ao sistema dito tradicional

54

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ANEXOS

58

LEI Nordm 212007

DE 12 DE JUNHO

59

60

61

62

63

PORTARIA Nordm 68-A 2008

DE 22 DE JANEIRO

64

65

66

PORTARIA Nordm 68-B 2008

DE 22 DE JANEIRO

67

68

69

70

PORTARIA Nordm 68-C 2008

DE 22 DE JANEIRO

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Curriculum Vitae

Leonel Madaiacutel dos Santos

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DECLARACcedilAtildeO

MESTRADO X

DOUTORAMENTO

Autor LEONEL MADAIacuteL DOS SANTOS

Telefone 919228827 Nordm do Bilhete de Identidade 11599798

E-mail MADAILDOSSANTOS_UALHOTMAILCOM

Tiacutetulo da dissertaccedilatildeo

JUSTICcedilA RESTAURATIVA

A MEDIACcedilAtildeO EM PROCESSO PENAL EM PORTUGAL ATEacute 2012

Orientador JUIZ DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO GAMEIRO

CAMPOS LOBO

Departamento DIREITO Aacuterea CIEcircNCIAS JURIacuteDICO-CRIMINAIS

Data de Defesa ___ ___ ____

1) Declaro sob compromisso de honra que dissertaccedilatildeo entregue corresponde agrave versatildeo

final apresentada ao juacuteri

2) Declaro que a dissertaccedilatildeo eacute original e natildeo viola quaisquer direitos de autor

3) Declaro que autorizo a Universidade Autoacutenoma de Lisboa atraveacutes dos seus

serviccedilos a arquivar difundir e integrar no repositoacuterio institucional sem alterar o

conteuacutedo a minha dissertaccedilatildeo em suporte digital

Incluir referecircncia + Resumo

Incluir referecircncia + Texto Completo

Lisboa 11 de novembro de 2013

Assinatura do Autor________________________________________________

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DECLARACcedilAtildeO93

1- O plaacutegio consiste na utilizaccedilatildeo de ideias opiniotildees palavras resultados e

conclusotildees de outro ou outros autores apresentando-as como suas

2- Considerando que o plaacutegio eacute uma forma de fraude e um crime acadeacutemico grave

todas as suspeitas de plaacutegio seratildeo analisadas e caso provadas punidas de acordo com os

regulamentos em vigor

3- O desenvolvimento das ideias e as conclusotildees dos trabalhos apresentados pelos

candidatos a provas puacuteblicas de mestrado e doutoramento deveratildeo ser da autoria dos

proacuteprios

4- Citaccedilatildeo direta ou literal de trabalho (s) de outro(s) publicados ou natildeo deve

estar adequadamente delimitada por aspas e reproduzida com exatidatildeo sendo obrigatoacuterio

apresentar a referecircncia da fonte incluindo a (s) paacutegina (s) consultada(s) segundo o

sistema ou estilo de citaccedilatildeo adotado (citaccedilatildeo-nota ou autor-data) Na citaccedilatildeo indireta

(paraacutefrase ou reproduccedilatildeo de ideias e conclusotildees de outro(s) por outras palavras) deveraacute ser

tambeacutem indicada a fonte (em nota de rodapeacute segundo o estilo citaccedilatildeo-nota ou entre

parecircnteses curvos conforme o estilo autor-data) O mesmo procedimento deveraacute ser

seguido para o caso de imagens e apresentaccedilotildees audiovisuais

5- Natildeo deveraacute ser apresentado um mesmo trabalho (ou parte dele) repetidas vezes

pois seraacute considerado auto-plaacutegio

6- A apresentaccedilatildeo de um trabalho realizado com a colaboraccedilatildeo de outro(s) sem que

este(s) seja(m) referido(s) como autor(es) seraacute considerada plaacutegio ou cumplicidade

Declaro que li o texto anterior referente ao plaacutegio e que a dissertaccedilatildeo que

apresento a provas puacuteblicas no Mestrado em Direito especialidade em Ciecircncias

Juriacutedico-Criminais com o tiacutetulo rdquoJusticcedila Restaurativa ndash A mediaccedilatildeo em processo penal

em Portugal ateacute 2012rdquo eacute da minha autoria sem qualquer plaacutegio

Data 11 de novembro de 2013

Assinatura

93

Esta declaraccedilatildeo teraacute que ser assinada e anexada a todas as dissertaccedilotildees ou teses apresentadas para provas

puacuteblicas comprovando que o candidato leu e compreendeu as regras sobre o plaacutegio e que os seus trabalhos

seratildeo sujeitos a verificaccedilatildeo por meio de ferramentas eletroacutenicas Caso natildeo entregue a declaraccedilatildeo natildeo seratildeo

nomeados os juacuteris das provas

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