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SEGUE A RELAO DAS MATRIAS DA APOSTILA I DE DELEGADO FEDERAL

DIREITO CIVIL PARTE GERAL DIREITO CIVIL OBRIGAES DIREITO CIVIL CONTRATOS DIREITO CIVIL RESPONSABILIDADE CIVIL DIREITO COMERCIAL I DIREITO COMERCIAL II DIREITO PROCESSUAL CIVIL I DIREITO PROCESSUAL CIVIL II DIREITO PENAL PARTE GERAL I DIREITO PENAL PARTE GERAL II DIREITO PENAL PARTE GERAL III DIREITO PENAL PARTE ESPECIAL I DIREITO PENAL PARTE ESPECIAL II DIREITO PENAL PARTE ESPECIAL III DIREITO PROCESSUAL PENAL LEGISLAO PENAL ESPECIAL DIREITO CONSTITUCIONAL DIREITO ADMINISTRATIVO DIREITO TRIBUTRIO DIREITO PREVIDENCIRIO RACIOCNIO LGICO PORTUGUS INFORMTICA

DIREITO CIVIL PARTE GERAL

CURSO A DISTNCIA PARA DELEGADO FEDERAL MDULO I

1 CURSO A DISTNCIA PARA DELEGADO FEDERAL - MODULO I DIREITO CIVIL PARTE GERAL PROF. FLVIO MONTEIRO DE BARROS

LEI DE INTRODUO AO CDIGO CIVIL GENERALIDADES A Lei de Introduo ao Cdigo Civil (Decreto-lei 4.657/1942) no faz parte do Cdigo Civil. Embora anexada a ele, antecedendo-o, trata-se de um todo separado. Ademais, o Cdigo Civil regula os direitos e obrigaes de ordem privada, ao passo que a Lei de Introduo disciplina o mbito de aplicao das normas jurdicas. A Lei de Introduo ao Cdigo Civil norma de sobredireito ou de apoio, consistente num conjunto de normas cujo objetivo disciplinar as prprias normas jurdicas. De fato, norma de sobredireito a que disciplina a emisso e aplicao de outras normas jurdicas. CONTEDO A Lei de Introduo ao Cdigo Civil cuida dos seguintes assuntos: a. b. c. d. e. f. vigncia e eficcia das normas jurdicas; conflito de leis no tempo; conflito de leis no espao; critrios hermenuticos; critrios de integrao do ordenamento jurdico; normas de direito internacional privado (arts. 7. a 19).

Na verdade, como salienta Maria Helena Diniz, uma lei de introduo s leis, por conter princpios gerais sobre as normas sem qualquer discriminao. , pois, aplicvel a todos os ramos do direito. CONCEITO E CLASSIFICAO Lei a norma jurdica escrita, emanada do Poder Legislativo, com carter genrico e obrigatrio. A lei apresenta as seguintes caractersticas: a. generalidade ou impessoalidade: porque se dirige a todas as pessoas indistintamente. Abre-se exceo lei formal ou singular, que destinada a uma pessoa determinada, como, por exemplo, a lei que concede aposentadoria a uma grande personalidade pblica. A rigor, a lei formal, conquanto aprovada pelo Poder Legislativo, no propriamente uma lei, mas um ato administrativo; b. obrigatoriedade e imperatividade: porque o seu descumprimento autoriza a imposio de uma sano;

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c. permanncia ou persistncia: porque no se exaure numa s aplicao; d. autorizante: porque a sua violao legitima o ofendido a pleitear indenizao por perdas e danos. Nesse aspecto, a lei se distingue das normas sociais; Segundo a sua fora obrigatria, as leis podem ser: a. cogentes ou injuntivas: so as leis de ordem pblica, e, por isso, no podem ser modificadas pela vontade das partes ou do juiz. Essas leis so imperativas, quando ordenam um certo comportamento; e proibitivas, quando vedam um comportamento. b. supletivas ou permissivas: so as leis dispositivas, que visam tutelar interesses patrimoniais, e, por isso, podem ser modificadas pelas partes. Tal ocorre, por exemplo, com a maioria das leis contratuais. Segundo a intensidade da sano, as leis podem ser: a. perfeitas: so as que prevem como sano sua violao a nulidade ou anulabilidade do ato ou negcio jurdico. b. mais que perfeitas: so as que prevem como sano sua violao, alm da anulao ou anulabilidade, uma pena criminal. Tal ocorre, por exemplo, com a bigamia. c. menos perfeitas: so as que estabelecem como sano sua violao uma conseqncia diversa da nulidade ou anulabilidade. Exemplo: o divorciado que se casar sem realizar a partilha dos bens sofrer como sano o regime da separao dos bens, no obstante a validade do seu matrimnio. d. imperfeitas: so aquelas cuja violao no acarreta qualquer conseqncia jurdica. O ato no nulo; o agente no punido. LEI DE EFEITO CONCRETO Lei de efeito concreto a que produz efeitos imediatos, pois traz em si mesma o resultado especfico pretendido. Exemplo: lei que probe certa atividade. Em regra, no cabe mandado de segurana contra a lei, salvo quando se tratar de lei de efeito concreto. Aludida lei, no que tange aos seus efeitos, que so imediatos, assemelha-se aos atos administrativos. CDIGO, CONSOLIDAO, COMPILAO E ESTATUTO Cdigo o conjunto de normas estabelecidas por lei. , pois, a regulamentao unitria de um mesmo ramo do direito. Exemplos: Cdigo Civil, Cdigo Penal etc. Consolidao a regulamentao unitria de leis preexistentes. A Consolidao das Leis do Trabalho, por exemplo, formada

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por um conjunto de leis esparsas, que acabaram sendo reunidas num corpo nico. No podem ser objeto de consolidao as medidas provisrias ainda no convertidas em lei (art. 14, 1., da LC 95/1998, com redao alterada pela LC 107/2001). Assim, enquanto o Cdigo cria e revoga normas, a Consolidao apenas rene as j existentes, isto , no cria nem revoga as normas. O Cdigo estabelecido por lei; a Consolidao pode ser criada por mero decreto. Nada obsta, porm, que a Consolidao seja ordenada por lei, cuja iniciativa do projeto compete mesa diretora do Congresso Nacional, de qualquer de suas casas e qualquer membro ou comisso da Cmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional. Ser tambm admitido projeto de lei de consolidao destinado exclusivamente declarao de leis ou dispositivos implicitamente revogados ou cuja eficcia ou validade encontra-se completamente prejudicada, outrossim, para incluso de dispositivos ou diplomas esparsos em leis preexistentes (art. 14, 3., da LC 95/1998, com redao alterada pela LC 107/2001). Por outro lado, a compilao consiste num repertrio de normas organizadas pela ordem cronolgica ou matria. Finalmente, o Estatuto a regulamentao unitria dos interesses de uma categoria de pessoas. Exemplos: Estatuto do Idoso, Estatuto do ndio, Estatuto da Mulher Casada, Estatuto da Criana e do Adolescente. No concernente ao consumidor, o legislador optou pela denominao Cdigo do Consumidor, em vez de Estatuto, porque disciplina o interesse de todas as pessoas, e no de uma categoria especfica, tendo em vista que todos podem se enquadrar no conceito de consumidor. VIGNCIA DAS NORMAS SISTEMAS DE VIGNCIA O Direito uno. A sua diviso em diversos ramos apenas para fins didticos. Por isso, o estudo da vigncia e eficcia da lei aplicvel a todas as normas jurdicas e no apenas s do Direito Civil. Dispe o art. 1. da Lei de Introduo ao Cdigo Civil que: Salvo disposio contrria, a lei comea a vigorar em todo o pas 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada. Acrescenta seu 1.: Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, se inicia 3 (trs) meses depois de oficialmente publicada. V-se, portanto, que se adotou o sistema do prazo de vigncia nico ou sincrnico, ou simultneo, segundo o qual a lei entra em vigor de uma s vez em todo o pas. O sistema de vigncia sucessiva ou progressiva, pelo qual a lei entra em vigor aos poucos, era adotado pela antiga Lei de Introduo ao

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Cdigo Civil. Com efeito, trs dias depois de publicada, a lei entrava em vigor no Distrito Federal, 15 dias depois no Rio de Janeiro, 30 dias depois nos Estados martimos e em Minas Gerais, e 100 dias depois nos demais Estados. Conquanto adotado o sistema de vigncia nico, Oscar Tenrio sustenta que a lei pode fixar o sistema sucessivo. No silncio, porm, a lei entra em vigor simultaneamente em todo o territrio brasileiro. VACATIO LEGIS Vacatio legis o perodo que medeia entre a publicao da lei e a sua entrada em vigor. Tem a finalidade de fazer com que os futuros destinatrios da lei a conheam e se preparem para bem cumpri-la. A Constituio Federal no exige que as leis observem o perodo de vacatio legis. Alis, normalmente as leis entram em vigor na data da publicao. Em duas hipteses, porm, a vacatio legis obrigatria: a. Lei que cria ou aumenta contribuio social para a Seguridade Social. S pode entrar em vigor noventa dias aps sua publicao (art. 195, 6., da CF). b. Lei que cria ou aumenta tributo. S pode entrar em vigor noventa dias da data que haja sido publicada, conforme art. 150, III, c, da CF, com redao determinada pela EC 42/2003. Saliente-se, ainda, que deve ser observado o princpio da anterioridade. Em contrapartida, em trs hipteses, a vigncia imediata, sem que haja vacatio legis, a saber: a. Atos Administrativos. Salvo disposio em contrrio, entram em vigor na data da publicao (art. 103, I, do CTN). b. Emendas Constitucionais. No silncio, como esclarece Oscar Tenrio, entram em vigor no dia da sua publicao. c. Lei que cria ou altera o processo eleitoral. Tem vigncia imediata, na data da sua publicao, todavia, no se aplica eleio que ocorra at um ano da data de sua vigncia (art. 16 da CF). CLUSULA DE VIGNCIA Clusula de vigncia a que indica a data a partir da qual a lei entra em vigor. Na ausncia dessa clusula, a lei comea a vigorar em todo o pas 45 dias depois de oficialmente publicada. Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, inicia-se trs meses depois de oficialmente publicada. A obrigatoriedade da lei nos pases estrangeiros para

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os juzes, embaixadas, consulados, brasileiros residentes no estrangeiro e para todos os que fora do Brasil tenham interesses regulados pela lei brasileira. Saliente-se, contudo, que o alto mar no territrio estrangeiro, logo, no silncio, a lei entra em vigor 45 dias depois da publicao (Oscar Tenrio). Os prazos de 45 dias e de trs meses, mencionados acima, aplicam-se s leis de direito pblico e de direito privado, outrossim, s leis federais, estaduais e municipais, bem como aos Tratados e Convenes, pois estes so leis e no atos administrativos. Conforme preceitua o 2. do art. 8. da LC 95/1998, as leis que estabelecem perodo de vacncia devero utilizar a clusula esta lei entra em vigor aps decorridos (o nmero de) dias de sua publicao oficial. No silncio, porm, o prazo de vacncia de 45 dias, de modo que continua em vigor o art. 1. da LICC. FORMA DE CONTAGEM Quanto contagem do prazo de vacatio legis, dispe o art. 8., 1., da LC 95/1998, que deve ser includo o dia da publicao e o ltimo dia, devendo a lei entrar em vigor no dia seguinte. Conta-se o prazo dia a dia, inclusive domingos e feriados, como salienta Caio Mrio da Silva Pereira. O aludido prazo no se suspende nem se interrompe, entrando em vigor no dia seguinte ao ltimo dia, ainda que se trate de domingo e feriado. Convm esclarecer que se a execuo da lei depender de regulamento, o prazo de 45 dias, em relao a essa parte da lei, conta-se a partir da publicao do regulamento (Serpa Lopes). LEI CORRETIVA Pode ocorrer de a lei ser publicada com incorrees e erros materiais. Nesse caso, se a lei ainda no entrou em vigor, para corrigi-la, no necessria nova lei, bastando a repetio da publicao, sanando-se os erros, reabrindo-se, destarte, o prazo da vacatio legis em relao aos artigos republicados. Entretanto, se a lei j entrou em vigor, urge, para corrigi-la, a edio de uma nova lei, que denominada lei corretiva, cujo efeito, no silncio, se d aps o decurso do prazo de 45 dias a contar da sua publicao. Enquanto no sobrevm essa lei corretiva, a lei continua em vigor, apesar de seus erros materiais, ressalvando-se, porm, ao juiz, conforme esclarece Washington de Barros Monteiro, o poder de corrigi-la, ainda que faa sentido o texto errado. Por outro lado, se o Poder Legislativo aprova um determinado projeto de lei, submetendo-o sano do Presidente da Repblica, e este acrescenta determinados dispositivos, publicando em seguida o texto, a hiptese ser de inconstitucionalidade, por violao do princpio da separao dos poderes. De fato, o Presidente da Repblica no pode acrescentar ou modificar os dispositivos aprovados pelo Poder Legislativo, devendo limitar-se a suprimi-los, pois, no Brasil, vedado o veto aditivo ou translativo, admitindo-se apenas o veto supressivo.

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LOCAL DE PUBLICAO DAS LEIS A lei publicada no Dirio Oficial do Executivo. Nada obsta a sua publicao no Dirio Oficial do Legislativo ou Judicirio. Todavia, o termo inicial da vacatio legis a publicao no Dirio Oficial do Executivo. Caso o Municpio ou o Estado-membro no tenham imprensa oficial, a lei pode ser publicada na imprensa particular. Nos municpios em que no h imprensa oficial nem particular, a publicao pode ser feita mediante fixao em lugar pblico ou ento em jornal vizinho ou no rgo oficial do Estado. PRINCPIO DA OBRIGATORIEDADE DAS LEIS De acordo com esse princpio, consagrado no art. 3. da LICC, ningum se escusa de cumprir a lei, alegando que no a conhece. Trata-se da mxima: nemine excusat ignorantia legis. Assim, uma vez em vigor, todas as pessoas sem distino devem obedecer a lei, inclusive os incapazes, pois ela se dirige a todos. Diversas teorias procuram justificar a regra acima. Para uns, trata-se de uma presuno jure et jure, legalmente estabelecida (teoria da presuno). Outros defendem a teoria da fico jurdica. H ainda os adeptos da teoria da necessidade social, segundo a qual a norma do art. 3. da LICC uma regra ditada por uma razo de ordem social e jurdica, sendo, pois, um atributo da prpria norma. Aludido princpio encontra exceo no art. 8. da Lei das Contravenes Penais, que permite ao juiz deixar de aplicar a pena se reconhecer que o acusado no tinha pleno conhecimento do carter ilcito do fato. PRINCPIO JURA NOVIT CURIA O princpio do jura novit curia significa que o juiz conhece a lei. Conseqentemente, torna-se desnecessrio provar em juzo a existncia da lei. Esse princpio comporta as seguintes excees: a. b. c. d. direito estrangeiro; direito municipal; direito estadual; direito consuetudinrio. Nesses casos, a parte precisa provar o teor e a vigncia do direito.

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PRINCPIO DA CONTINUIDADE DAS LEIS De acordo com esse princpio, a lei ter vigor at que outra a modifique ou revogue (art. 2. da LICC). Assim, s a lei pode revogar a lei. Esta no pode ser revogada por deciso judicial ou por ato do Poder Executivo. Em regra, as leis tm efeito permanente, isto , uma vigncia por prazo indeterminado, salvo quanto as leis de vigncia temporria. A no aplicao da lei no implica na renncia do Estado em atribuir-lhe efeito, pois a lei s pode ser revogada por outra lei. REPRISTINAO Repristinao a restaurao da vigncia de uma lei anteriormente revogada em virtude da revogao da lei revogadora. Sobre o assunto, dispe o 3. do art. 2. da LICC: salvo disposio em contrrio, a lei revogada no se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigncia. Assim, o efeito repristinatrio no automtico; s possvel mediante clusula expressa. No silncio da lei, no h falar-se em repristinao. Se, por exemplo, uma terceira lei revogar a segunda, a primeira no volta a viger, a no ser mediante clusula expressa. EFICCIA DA NORMA HIPTESES A norma jurdica perde a sua validade em duas hipteses: revogao e ineficcia. Desde j cumpre registrar que a lei revogada pode manter a sua eficcia em determinados casos. De fato, ela continua sendo aplicada aos casos em que h direito adquirido, ato jurdico perfeito e coisa julgada. Em contrapartida, a lei em vigor, s vezes, no goza de eficcia, conforme veremos adiante. REVOGAO Revogao a cessao definitiva da vigncia de uma lei em razo de uma nova lei. S a lei revoga a lei, conforme o princpio da continuidade das leis. Saliente-se que o legislador no pode inserir na lei a proibio de sua revogao. A revogao pode ser total (ab-rogao) ou parcial (derrogao). A revogao ainda pode ser expressa, tcita ou global.

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A revogao expressa ou direta aquela em que a lei indica os dispositivos que esto sendo por ela revogados. A propsito, dispe o art. 9 da LC 107/2001: A clusula de revogao dever enumerar, expressamente, as leis ou disposies legais revogadas. A revogao tcita ou indireta ocorre quando a nova lei incompatvel com a lei anterior, contrariando-a de forma absoluta. A revogao tcita no se presume, pois preciso demonstrar essa incompatibilidade. Saliente-se, contudo, que a lei posterior geral no revoga lei especial. Igualmente, a lei especial no revoga a geral. (2 do art. 2 da LICC). Assim, o princpio da conciliao ou das esferas autnomas consiste na possibilidade de convivncia das normas gerais com as especiais que versem sobre o mesmo assunto. Esse princpio, porm, no absoluto. De fato, a lei geral pode revogar a especial e vice-versa, quando houver incompatibilidade absoluta entre essas normas; essa incompatibilidade no se presume; na dvida, se considerar uma norma concilivel com a outra, vale dizer, a lei posterior se ligar anterior, coexistindo ambas. Sobre o significado da expresso revogam-se as disposies em contrrio, Serpa Lopes sustenta que se trata de uma revogao expressa, enquanto Caio Mrio da Silva Pereira, acertadamente, preconiza que essa frmula designa a revogao tcita. Trata-se de uma clusula incua, pois de qualquer maneira as disposies so revogadas, por fora da revogao tcita prevista no 1 do art. 2 da LICC. Convm lembrar que o art. 9 da LC 107/2001 determina que a clusula de revogao dever enumerar, expressamente, as leis ou disposies legais revogadas, de modo que o legislador no deve mais se valer daquela vaga expresso revogam-se as disposies em contrrio. A revogao global ocorre quando a lei revogadora disciplina inteiramente a matria disciplinada pela lei antiga. Nesse caso, os dispositivos legais no repetidos so revogados, ainda que compatveis com a nova lei. Regular inteiramente a matria significa disciplin-la de maneira global, no mesmo texto. COMPETNCIA PARA REVOGAR AS LEIS Federao autonomia recproca entre a Unio, Estadosmembros e Municpios. Trata-se de um dos mais slidos princpios constitucionais. Por fora disso, no h hierarquia entre lei federal, lei estadual e lei municipal. Cada uma das pessoas polticas integrantes da Federao s pode legislar sobre matrias que a Constituio Federal lhes reservou. A usurpao de competncia gera a inconstitucionalidade da lei. Assim, por exemplo, a lei federal no pode versar sobre matria estadual. Igualmente, a lei federal e estadual no podem tratar de assunto reservado aos Municpios.

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Fora convir, portanto, que lei federal s pode ser revogada por lei federal; lei estadual s por lei estadual; e lei municipal s por lei municipal. No que tange s competncias exclusivas, reservadas pela Magna Carta a cada uma dessas pessoas polticas, no h falar-se em hierarquia entre leis federais, estaduais e municipais, pois deve ser observado o campo prprio de incidncia sobre as matrias previstas na CF. Tratando-se, porm, de competncia concorrente, referentemente s matrias previstas no art. 24 da CF, atribudas simultaneamente Unio, aos Estados e ao Distrito Federal, reina a hierarquia entre as leis. Com efeito, Unio compete estabelecer normas gerais, ao passo que aos Estados-membros e ao Distrito Federal competem legislar de maneira suplementar, preenchendo os vazios deixados pela lei federal. Todavia, inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercero a competncia legislativa plena, para atender as suas peculiaridades. A supervenincia de lei federal sobre normas gerais suspende a eficcia da lei estadual, no que lhe for contrrio. Finalmente, as normas previstas na CF s podem ser revogadas por emendas constitucionais, desde que no sejam violadas as clusulas ptreas. PRINCPIO DA SEGURANA E DA ESTABILIDADE SOCIAL De acordo com esse princpio, previsto no art. 5, inc. XXXVI da CF, a lei no pode retroagir para violar o direito adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada. Devem ser respeitadas, portanto, as relaes jurdicas constitudas sob a gide da lei revogada. Atente-se que a Magna Carta no impede a edio de leis retroativas; veda apenas a retroatividade que atinja o direito adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada. A retroatividade, consistente na aplicao da lei a fatos ocorridos antes da sua vigncia, conforme ensinamento do Min. Celso de Melo, possvel mediante dois requisitos: a. clusula expressa de retroatividade; b. respeito ao direito adquirido, ato jurdico perfeito e coisa julgada. Assim, a retroatividade no se presume, deve resultar de texto expresso em lei e desde que no viole o direito adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada. Abre-se exceo lei penal benfica, cuja retroatividade automtica, vale dizer, independe de texto expresso, violando inclusive a coisa julgada. Podemos ento elencar trs situaes de retroatividade da lei: a. lei penal benfica; b. lei com clusula expressa de retroatividade, desde que no viole o direito

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adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada. Na rea penal, porm, terminantemente vedada a retroatividade de lei desfavorvel ao ru. c. lei interpretativa: a que esclarece o contedo de outra lei, tornando obrigatria uma exegese, que j era plausvel antes de sua edio. a chamada interpretao autntica ou legislativa. A lei interpretativa no cria situao nova; ela simplesmente torna obrigatria uma exegese que o juiz, antes mesmo de sua publicao, j podia adotar. Aludida lei retroage at a data de entrada em vigor da lei interpretada, aplicando-se, inclusive, aos casos pendentes de julgamento, respeitando apenas a coisa julgada. Cumpre, porm, no confundir lei interpretativa, que simplesmente opta por uma exegese razovel, que j era admitida antes da sua edio, com lei que cria situao nova, albergando exegese at ento inadmissvel. Neste ltimo caso, a retroatividade s possvel mediante clusula expressa, desde que no viole o direito adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada. INEFICCIA Vimos que a lei s revogada em razo da supervenincia de uma nova lei. Em certas hipteses, porm, a lei perde a sua validade, deixando de ser aplicada ao caso concreto, no obstante conserve a sua vigncia em razo da inexistncia da lei superveniente revogadora. Assim, possvel a ineficcia de uma lei vigente, bem como a eficcia de uma lei revogada. Essa ltima hiptese ocorre quando a lei revogada aplicada aos casos em que h direito adquirido, ato jurdico perfeito e coisa julgada. Malgrado a sua vigncia, a lei ineficaz, isto , inaplicvel nas seguintes hipteses: a. caducidade: ocorre pela supervenincia de uma situao cronolgica ou factual que torna a norma invlida, sem que ela precise ser revogada. Exemplo: leis de vigncia temporria. b. desuso: a cessao do pressuposto de aplicao da norma. Exemplo: a lei que probe a caa da baleia deixar de ser aplicada se porventura desaparecerem todas as baleias do planeta. c. costume negativo ou contra legem: o que contraria a lei. O costume no pode revogar a lei, por fora do princpio da continuidade das leis. Todavia, prevalece a opinio de que ele pode gerar a ineficcia da lei, desde que no se trate de lei de ordem pblica. Como ensina Rubens Requio, verificada que a inteno das partes foi a de adotar certos costumes, o julgador deve aplic-lo, sobrepondo-o norma legal no imperativa. De acordo com Serpa Lopes, a realidade, atravs de um costume reiterado, enraizado nos dados sociolgicos, em harmonia com as necessidades econmicas e morais de um povo, capaz de revogar a norma. No se

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d.

e.

f. g.

trata, data venia, de revogao, pois esta s produzida pelo advento de uma nova lei; a hiptese de ineficcia. Como exemplos de costumes contra legem, podemos citar: a emisso de cheque pr-datado; a expedio de triplicata pelo fato da duplicata no ter sido devolvida tornouse praxe, embora a lei preveja para a hiptese o protesto por indicaes, ao invs da triplicata; admissibilidade de prova testemunhal em contrato superior a dez salrios mnimos, nos casos em que o costume dispensar a prova escrita exigida pela lei. deciso do STF declarando a lei inconstitucional em ao direta de inconstitucionalidade (controle por via de ao ou aberto). Cumpre observar que essa deciso judicial no revoga a lei, apenas retira a sua eficcia. resoluo do Senado Federal cancelando a eficcia de lei declarada incidentalmente inconstitucional pelo STF (controle por via de exceo ou difuso). princpio da anterioridade da lei tributria, pois, uma vez publicada, sua eficcia permanece suspensa at o exerccio financeiro seguinte. a lei que altera o processo eleitoral entra em vigor na data de sua publicao, mas no tem eficcia em relao eleio que ocorra at um ano da data de sua vigncia.

MECANISMOS DE INTEGRAO DO ORDENAMENTO JURDICO INTRODUO De acordo com o princpio da indeclinabilidade da jurisdio, o juiz obrigado a decidir, ainda que no haja lei disciplinando o caso concreto. Diante da lacuna, isto , ausncia de lei regulando determinada situao jurdica, torna-se necessrio ao magistrado valer-se dos mecanismos de integrao do ordenamento jurdico, que so a analogia, os costumes, os princpios gerais do direito e a eqidade. certo, pois, que o art. 4 da LICC no se refere eqidade. Todavia, caso os outros mecanismos de integrao sejam insuficientes, outra sada no h a no ser solucionar a lide pela equidade. ANALOGIA INTEGRAO DO ORDENAMENTO JURDICO O legislador no poderia prever, de antemo, todas as hipteses passveis de ocorrncia na vida real. , pois, natural que a lei contenha lacunas.

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Na ausncia ou lacuna da lei, surgem os mecanismos de integrao do ordenamento jurdico: analogia, costumes, princpios gerais do direito e eqidade. O direito no tem lacunas porque ele no se expressa apenas atravs da lei. Esta, sim, pode ser lacunosa e at ausente na disciplina do caso concreto. Analogia, costumes, princpios gerais do direito e eqidade so outras formas de expresso do direito, aplicveis somente na ausncia ou lacuna da lei. Efetivamente, dispe o art. 4 da Lei de Introduo ao Cdigo Civil: Quando a lei for omissa, o juiz decidir o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princpios gerais de direito. A integrao da lei penal, porm, s acontece no campo das normas no incriminadoras, que beneficiam o ru. O nullum crimen, nulla poena sine lege impede que, na ausncia ou lacuna da lei, o delito seja criado pela analogia, costumes ou princpios gerais do direito. CONCEITO E FUNDAMENTO A analogia a aplicao, ao caso no previsto em lei, de lei reguladora de caso semelhante. No se trata de mera interpretao da lei, mas, sim, de um mecanismo de integrao do ordenamento jurdico. O fundamento da analogia o argumento pari ratione, da lgica dedutiva, segundo o qual para a soluo do caso omisso aplica-se o mesmo raciocnio do caso semelhante. ESPCIES DE ANALOGIA A doutrina ainda costuma distinguir a analogia em: legal e jurdica. A primeira aplica, ao caso omisso, lei que regula caso semelhante. A segunda aplica, ao caso omisso, um princpio geral do direito. A analogia jurdica distingue-se da aplicao direta do princpio geral do direito. Com efeito, na analogia jurdica, aplica-se, ao caso no previsto em lei, um princpio geral do direito que rege caso semelhante. J o princpio geral do direito aplicado diretamente ao caso omisso. NORMAS QUE NO ADMITEM ANALOGIA No admitem o emprego da analogia: a. leis restritivas de direito: so as que probem certa conduta. Por fora do princpio da legalidade, previsto no art. 5, inc. II, da CF, o que no for proibido por lei permitido, vedando-se, por conseqncia, a analogia.

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b. leis excepcionais: so as que regulam de modo contrrio regra geral. A capacidade civil, por exemplo, uma regra geral, sendo, pois, presumida. As excees, vale dizer, os casos de incapacidade, encontram-se nos arts. 3 e 4 do CC, cujos ris no podem ser ampliados por analogia. Com efeito, o pressuposto da analogia a lacuna da lei, isto , a ausncia de lei que regule determinada situao jurdica. No caso, no h falar-se em lacuna, porquanto as situaes no elencadas na lei excepcional encontram-se automaticamente abrangidas pela norma geral. c. leis administrativas: so as que disciplinam a atividade administrativa do Estado. O direito administrativo regido pelo princpio da legalidade, segundo o qual o administrador pblico s pode fazer aquilo que a lei o autoriza, de forma expressa ou implcita. Administrar , portanto, cumprir a lei. Se a lei no autoriza porque o fato proibido, razo pela qual tornase invivel o emprego da analogia. COSTUMES Costume a repetio da conduta, de maneira constante e uniforme, em razo da convico de sua obrigatoriedade. O costume requer dois elementos: o objetivo (repetio do comportamento) e o subjetivo (convico de sua obrigatoriedade). A norma costumeira, que tambm norma jurdica, pois uma das formas de manifestao do direito, no surge ex abrupto, e, sim, paulatinamente, medida que o povo vai tomando conscincia de sua necessidade jurdica. No Brasil, h o predomnio da lei escrita sobre a norma consuetudinria. E, no aspecto penal, o costume nunca pode ser empregado para criar delitos ou aumentar penas. Sua intromisso nesse campo, que restrito lei, barrada pelo princpio da reserva legal. Os costumes distinguem-se em: a. Costume secundum legem: o que auxilia a esclarecer o contedo de certos elementos da lei . b. Costume contra legem ou negativo: o que contraria a lei. c. Costume praeter legem: o que supre a ausncia ou lacuna da lei. o chamado costume integrativo. Acrescente-se ainda que os costumes auxiliam na anlise dos chamados standard jurdico. De acordo com Limongi Frana, standard jurdico o critrio bsico de avaliao de certos preceitos jurdicos indefinidos, variveis no tempo e no espao, como, por exemplo, a noo de castigar imoderadamente o filho a que faz meno o art. 1638, inc. I, do CC. Finalmente, o costume judicirio ou jurisprudncia o conjunto de decises judiciais no mesmo sentido, prolatadas de maneira

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uniforme e constante. Nem toda deciso judicial constitui jurisprudncia. Esta no se confunde com ato jurisprudencial particularmente considerado. Urge, para caracterizao da jurisprudncia, que a deciso se repita de maneira uniforme e constante. No Brasil, em regra, a jurisprudncia no tem valor vinculante, de modo que o magistrado pode afastar-se de sua orientao. Em certos casos, porm, a deciso judicial tem efeito vinculante, aplicando-se, a outros casos concretos. Refiro-me s seguintes hipteses: a. lei declarada inconstitucional em ao direta de inconstitucionalidade movida perante o STF. Nesse caso, todos os magistrados devem observar essa deciso, abstendo-se de aplicar essa lei. b. lei declarada constitucional em ao declaratria de constitucionalidade movida perante o STF. c. decises normativas da Justia do Trabalho acerca dos dissdios coletivos. d. juzo de admissibilidade dos recursos. Com efeito, dispe o art. 557 do CPC que o relator negar seguimento a recurso que confronta com smula ou jurisprudncia dominante do respectivo Tribunal. e. smula vinculante do STF. Com efeito, dispe o art. 103-A da EC n. 45/2004 que o Supremo Tribunal Federal poder, de ofcio ou por provocao, mediante deciso de dois teros dos seus membros, aps reiteradas decises sobre matria constitucional, aprovar smula que, a partir de sua publicao na imprensa oficial, ter efeito vinculante em relao aos demais rgos do Poder Judicirio e administrao pblica direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder sua reviso ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. No 1 dispe que a Smula ter por objetivo a validade, a interpretao e a eficcia de normas determinadas, acerca das quais haja controvrsia atual entre rgos judicirios ou entre esses e a administrao pblica que acarrete grave insegurana jurdica e relevante multiplicao de processos sobre questo idntica. O 2 estabelece que sem prejuzo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovao, reviso ou cancelamento de smula poder ser provocada por aqueles que podem propor a ao de inconstitucionalidade. E em seu 3 que do ato administrativo ou deciso judicial que contrariar a smula aplicvel ou que indevidamente a aplicar, caber reclamao ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anular o ato administrativo ou cassar a deciso judicial reclamada, e determinar que outra seja proferida com ou sem a aplicao da smula, conforme o caso. PRINCPIOS GERAIS DE DIREITO Divergem os juristas em torno do que se deve entender por princpios gerais do direito. De acordo com Serpa Lopes, os critrios propostos pela doutrina so os seguintes:

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a. os princpios gerais do direito so os relacionados ao prprio direito de cada pas; b. os princpios gerais do direito so os provindos do direito natural, ensinados pela cincia, admitidos pela conscincia geral como preexistentes a toda lei positiva; c. os princpios gerais do direito so os princpios de eqidade; d. os princpios gerais do direito so os preceitos bsicos do direito romano. Esses princpios so: viver honestamente; no lesar o prximo; dar a cada um o que seu. A nosso ver, princpios gerais do direito so os postulados que compem o substractum comum a diversas normas jurdicas. So as premissas ticas que inspiram a elaborao das normas jurdicas. Vejamos alguns exemplos de princpios gerais do direito: ningum pode transferir mais direitos do que tem; ningum pode invocar a prpria malcia; ningum deve ser condenado sem ser ouvido etc. EQIDADE INTRODUO O direito no se restringe ao complexo de leis, e sim ao complexo de normas jurdicas que disciplinam a vida em sociedade. A lei a forma escrita de expresso de direito. Na sua falta, o direito se projeta atravs de outras formas de expresso, quais sejam, a analogia, os costumes, os princpios gerais do direito e a eqidade. Na sua essncia, como salienta Miguel Reale, a eqidade a justia bem aplicada, ou seja, prudentemente aplicada ao caso. No se deve dissoci-la do direito, pois uma das suas formas de expresso, completando-o, seja como valor interpretativo subordinado lei, seja ditando a regra de conduta de um caso particular no previsto em lei. No obstante a sua relevante importncia em face do Direito, a Lei de Introduo ao Cdigo Civil, ao referir-se aos mecanismos de integrao do ordenamento jurdico, no fez meno expressa eqidade. A Constituio Federal tambm silente. No seguiu a orientao da Constituio de 1934, que, no art. 113, n. 37, dispunha que nenhum juiz deixar de sentenciar por motivo de omisso na lei. Em tal caso dever decidir por analogia, pelos princpios gerais de direito e por eqidade. No plano jurdico, a eqidade tem trs funes: a. na elaborao das leis; b. na aplicao do direito; c. na interpretao das leis.

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Seu conceito varia, conforme a funo assumida, embora na essncia a eqidade seja sempre uma forma de justia. A EQIDADE NA ELABORAO DAS LEIS A eqidade em sua funo de elaborao das leis confundese com a idia de justia, tendo em vista que as leis so genricas e a justia tambm. Essa funo de eqidade dirigida ao legislador. Este, na elaborao das leis, deve inspirar-se no senso de justia, atento s necessidades sociais e ao equilbrio dos interesses. A EQIDADE E A APLICAO DO DIREITO Na funo de aplicao do direito, eqidade significa a norma elaborada pelo magistrado para o caso concreto como se fosse o legislador. Cumpre relembrar o conceito de Aristteles, segundo o qual eqidade a norma que o legislador teria prescrito para um caso concreto. No se pense, porm, que o magistrado possa elaborar uma norma especfica para o caso concreto em colidncia com a norma legal. Semelhante raciocnio consagraria o conflito entre a eqidade e o direito positivo, desprestigiando as normas legais. A lei, no obstante as suas deficincias, deve ser prestigiada e respeitada, porque ela que d sentido s instituies, representando um papel essencial segurana jurdica. No se deve, portanto, admitir a eqidade contra legem, a menos que a prpria lei a autorize expressamente. Por outro lado, na hiptese de lacuna da lei, a eqidade como aplicao do direito, consistente na norma elaborada pelo magistrado para solucionar o caso concreto, perfeitamente admissvel na rea penal, desde que em benefcio do ru. Assim, o juiz pode elaborar a norma de eqidade, desde que presentes os seguintes requisitos: a. que o fato no esteja previsto em lei, isto , que haja uma lacuna na lei; b. que no seja possvel suprir a lacuna pela analogia, costumes e princpios gerais do direito. A despeito de o art. 4 da Lei de Introduo ao Cdigo Civil no se referir eqidade, urge reconhecer que ela pode tambm funcionar como a ultima ratio dos mecanismos de integrao do ordenamento jurdico. Com efeito, o princpio da obrigatoriedade ou indeclinabilidade da jurisdio ordena que o juiz decida o caso concreto, ainda que no previsto em lei. O juiz no pode escusar-se de decidir. Se, diante da ausncia da lei, for invivel a analogia, os costumes e os princpios gerais do direito, o magistrado, para fazer valer o princpio da obrigatoriedade da jurisdio, deve inspirar-se na eqidade e elaborar a norma para o caso concreto.

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Ao elaborar a dita norma no h qualquer violao ao princpio da separao dos poderes, pois o magistrado no est exercendo a funo de legislador. Norma legal e norma de eqidade distinguem-se nitidamente. A norma legal, isto , a lei, genrica e obrigatria para todos os casos. A norma de eqidade individual, especfica para o caso concreto. Como se v, no se trata de lei, de modo que no h afronta ao princpio da separao dos poderes. Alm disso, a eqidade no extrada de sentimentos pessoais e emotivos do magistrado, e muito menos de convices ideolgicas, que s caracterizariam uma eqidade cerebrina, isto , uma falsa eqidade. A norma de eqidade deve ser fruto de um raciocnio jurdico universal. Deve ser obra de um trabalho cientfico. A norma h de ser elaborada com base nos princpios jurdicos existentes. A rigor, a norma j existe em estado latente, competindo ao magistrado apenas descobr-la, e no propriamente cri-la. A EQIDADE NA INTERPRETAO DAS LEIS A eqidade como elemento interpretativo da lei perfeitamente admissvel. Como ensina Serpa Lopes, no se golpeia o Direito positivo, no se abre a menor brecha na norma, cuja essncia respeitada, mas simplesmente esta, ao sopro vivificador da eqidade, recebe nova colorao, rejuvenesce mais adaptada s exigncias da vida. Trata-se de um movimento natural de interpretao, movimento cientfico que prescinde do lastreamento de uma autorizao legal. A eqidade, na sua funo de interpretar as leis, tem o significado de amenizao do vigor excessivo das leis, dulcificando-as, adaptando-as ao caso concreto. No se trata de elaborao de uma norma, mas de mera interpretao da lei, suavizando-a com o fito de desvendar a ratio legis. Modernamente, no se sustenta o pensamento dos exegetas que negam eqidade qualquer valor, fundados na idia de que dentro da lei se encontra todo o sistema do direito. Esse tipo de raciocnio impede o progresso do direito, porque se encontra apegado excessivamente na vontade do legislador, transformando em permanente uma realidade social provisria. O fim da lei, como adverte Serpa Lopes, no buscado nela mesma ou no legislador, mas em funo da sua adaptao aos fins sociais. Assim, a vontade do legislador no pode ser considerada seno na proporo de sua fora interpretativa das necessidades sociais. Destinada a reger as relaes dos indivduos em sociedade, a lei deve ter um contedo dctil, fluido, flexvel, de modo a torn-la adaptvel a todas as necessidades jurdicas e sociais que sobrevierem.

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A JUSTIA ALTERNATIVA A justia alternativa o movimento que preconiza a aplicao do direito, valendo-se de duas premissas: 1. O juiz deve deixar de aplicar uma lei inconstitucional; 2. A interpretao da lei deve atender aos fins sociais e s exigncias do bem comum. A primeira premissa nada mais do que o controle difuso ou aberto de constitucionalidade das leis. Qualquer magistrado, para decidir o caso concreto, pode declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade de uma lei, de modo que nenhuma novidade, nesse aspecto, apresenta a justia alternativa. A segunda premissa encontra-se prevista no art. 5 da Lei de Introduo ao Cdigo Civil. Portanto, o prprio ordenamento jurdico recomenda que a lei seja interpretada de acordo com os fins sociais e as exigncias do bem comum. Por conseqncia, no se trata de uma inovao da justia alternativa. O aludido movimento ganhou corpo no Poder Judicirio do Rio Grande do Sul. O mrito da escola gacha no consiste propriamente na fixao das duas premissas acima, mas no questionamento do modelo tradicional de interpretao do direito. Com efeito, no modelo tradicional o julgamento feito pelo processo de subsuno da norma ao fato concreto. A justia alternativa inverte a relao entre a norma e o fato, tomando o fato como objeto principal do conhecimento. Noutras palavras, a justia alternativa parte do pressuposto de que a norma regula uma situao padro de fato, escusando-a de aplic-la em relao a certos fatos que destoam da situao normal para qual a lei foi criada. BREVE ESTUDO DAS ANTINOMIAS OU LACUNAS DE CONFLITO DAS NORMAS JURDICAS, SEGUNDO O PROF. FLVIO TARTUCE Com o surgimento de qualquer lei nova, ganha relevncia o estudo das antinomias, tambm denominadas lacunas de conflito. Isso porque devemos conceber o ordenamento jurdico como um sistema aberto, em que h lacunas. Dessa forma, a antinomia a presena de duas normas conflitantes, vlidas e emanadas de autoridade competente, sem que se possa dizer qual delas merecer aplicao em determinado caso concreto. No presente estudo, utilizaremos as regras muito bem expostas na obra Conflito de Normas, de Maria Helena Diniz (Conflito de Normas. So Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 34 a 51), bem como os ensinamentos que foram transmitidas pela renomada professora na disciplina teoria geral do direito no curso de mestrado da PUC/SP. No h dvidas que, por diversas vezes, esse trabalho ser fundamental para a compreenso dos novos conceitos privados, que emergiram com a nova codificao.

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Na anlise das antinomias, trs critrios devem ser levados em conta para a soluo dos conflitos: a. critrio cronolgico: norma posterior prevalece sobre norma anterior; b. critrio da especialidade: norma especial prevalece sobre norma geral; c. critrio hierrquico: norma superior prevalece sobre norma inferior. Dos trs critrios acima, o cronolgico, constante do art. 1 da LICC, o mais fraco de todos, sucumbindo frente aos demais. O critrio da especialidade o intermedirio e o da hierarquia o mais forte de todos, tendo em vista a importncia do Texto Constitucional, em ambos os casos. Superada essa anlise, interessante visualizar a classificao das antinomias, quanto aos critrios que envolvem, conforme esquema a seguir: - Antinomia de 1 grau: conflito de normas que envolve apenas um dos critrios acima expostos. - Antinomia de 2 grau: choque de normas vlidas que envolve dois dos critrios antes analisados. Ademais, havendo a possibilidade ou no de soluo, conforme os meta-critrios de soluo de conflito, pertinente a seguinte visualizao: - Antinomia aparente: situao em que h meta-critrio para soluo de conflito. - Antinomia real: situao em que no h meta-critrio para soluo de conflito, pelo menos inicial, dentro dos que foram anteriormente expostos. De acordo com essas classificaes, devem ser analisados os casos prticos em que esto presentes os conflitos: No caso de conflito entre norma posterior e norma anterior, valer a primeira, pelo critrio cronolgico (art. 1 LICC), caso de antinomia de primeiro grau aparente. Norma especial dever prevalecer sobre norma geral, emergencial que o critrio da especialidade, outra situao de antinomia de primeiro grau aparente. Havendo conflito entre norma superior e norma inferior, prevalecer a primeira, pelo critrio hierrquico, tambm situao de antinomia de primeiro grau aparente. Esses so os casos de antinomia de primeiro grau, todos de antinomia aparente, eis que presente soluo, dentro das meta-regras para soluo de conflito. Passamos ento ao estudo das antinomias de segundo grau: Em um primeiro caso de antinomia de segundo grau aparente, quando se tem um conflito de uma norma especial anterior e outra geral posterior, prevalecer o critrio da especialidade, valendo a primeira norma. Havendo conflito entre norma superior anterior e outra inferior posterior, prevalece tambm a primeira (critrio hierrquico), outro caso de antinomia de segundo grau aparente.

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Finalizando, quando se tem conflito entre uma norma geral superior e outra norma, especial e inferior, qual deve prevalecer? Ora, em casos tais, como bem expe Maria Helena Diniz no h uma meta-regra geral de soluo do conflito sendo caso da presena de antinomia real. So suas palavras: No conflito entre o critrio hierrquico e o de especialidade, havendo uma norma superior-geral e outra norma inferior especial, no ser possvel estabelecer uma meta-regra geral, preferindo o critrio hierrquico ao da especialidade ou vice-versa, sem contrariar a adaptabilidade do direito. Poder-se-, ento, preferir qualquer um dos critrios, no existindo, portanto, qualquer prevalncia. Todavia, segundo Bobbio, dever-se- optar, teoricamente, pelo hierrquico; uma lei constitucional geral dever prevalecer sobre uma lei ordinria especial, pois se se admitisse o princpio de que uma lei ordinria especial pudesse derrogar normas constitucionais, os princpios fundamentais do ordenamento jurdico estariam destinados a esvaziar-se, rapidamente, de seu contedo. Mas, na prtica, a exigncia de se adotarem as normas gerais de uma Constituio a situaes novas levaria, s vezes, aplicao de uma lei especial, ainda que ordinria, sobre a Constituio. A supremacia do critrio da especialidade s se justificaria, nessa hiptese, a partir do mais alto princpio da justia: suum cuique tribuere, baseado na interpretao de que o que igual deve ser tratado como igual e o que diferente, de maneira diferente. Esse princpio serviria numa certa medida para solucionar antinomia, tratando igualmente o que igual e desigualmente o que desigual, fazendo as diferenciaes exigidas ftica e valorativamente. (Conflito de normas, cit., p. 50) Na realidade, o critrio da especialidade de suma importncia, pois tambm est previsto na Constituio Federal de 1988. O art. 5 do Texto Maior consagra o princpio da isonomia ou igualdade lato sensu, reconhecido como clusula ptrea, pelo qual a lei deve tratar de maneira igual os iguais, e de maneira desigual os desiguais. Na parte destacada est o princpio da especialidade, que dever sempre prevalecer sobre o cronolgico, estando justificado esse domnio. Mesmo quanto ao critrio da hierarquia, discute-se se o critrio da especialidade deve mesmo sucumbir. Desse modo, havendo essa antinomia real, dois caminhos de soluo podem ser percorridos, um pela via do Poder Legislativo e outro pelo Poder Judicirio. Pelo Poder Legislativo, cabe a edio de uma terceira norma, dizendo qual das duas normas em conflito deve ser aplicada. Mas, para o mbito jurdico, o que mais interessa a soluo do Judicirio. Assim, o caminho a adoo do princpio mximo de justia, podendo o magistrado, o juiz da causa, de acordo com a sua

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convico e aplicando os arts. 4 e 5 da LICC, adotar uma das duas normas, para solucionar o problema. Mais uma vez entram em cena esses importantes preceitos da Lei de Introduo ao Cdigo Civil. Pelo art. 4, deve o magistrado aplicar, pela ordem, a analogia, os costumes e os princpios gerais do direito. Seguindo o que preceitua o seu art. 5, deve o juiz buscar a funo social da norma e as exigncias do bem comum, a pacificao social.

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QUESTES 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35. 36. 37. 38. 39. 40. O que norma de sobredireito ou de apoio? A LICC faz parte do Cdigo Civil? aplicvel apenas ao Direito Civil? O que lei formal ou singular? O que so leis cogentes? Qual a diferena entre lei imperativa e lei proibitiva? O que so leis supletivas? O que so leis perfeitas, leis mais que perfeitas, leis menos perfeitas e leis imperfeitas? O que lei de efeito concreto? cabvel mandado de segurana contra lei? Qual a diferena entre Cdigo e Consolidao? O que estatuto? O que sistema de vigncia nico ou sincrnico? O que vacatio legis? A vacatio legis obrigatria? No silncio, a vacatio legis sempre obrigatria? O que clusula de vigncia? No silncio, qual o prazo de vacncia? Qual a forma de contagem do prazo de vacatio legis? O que lei corretiva? Para corrigir os erros materiais de uma lei, necessria lei corretiva? O que o princpio da obrigatoriedade das leis? H exceo a esse princpio? O que o princpio da continuidade das leis? O que repristinao? possvel a sua ocorrncia? Quais as duas hipteses de perda da validade da norma? A lei revogada pode surtir efeitos? O que revogao? Qual a diferena entre ab-rogao e derrogao? Quais as espcies de revogao? O que revogao expressa? O que revogao tcita? O que o princpio da conciliao ou das esferas autnomas? O que revogao global? A lei federal revoga a lei estadual? O que o princpio da segurana das relaes jurdicas? A lei pode retroagir? A lei vigente pode ser ineficaz? O que caducidade? O que desuso? O que costume negativo? Quais os mecanismos de integrao do ordenamento jurdico?

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41. 42. 43. 44. 45. 46. 47. 48. 49. 50. 51. 52. 53. 54. 55. 56. 57. 58. 59. 60. 61. 62. 63. 64. 65. 66. 67. 68.

O Direito tem lacunas? O que analogia e qual o seu fundamento? Qual a diferena entre analogia legal e analogia jurdica? Quais as leis que no admitem analogia? O que costume e quais as suas espcies? O que standard jurdico? O que costume judicirio? possvel a smula vinculante? Qual o procedimento para aprovao da smula vinculante? Qual a abrangncia do efeito vinculante? Qual o objetivo da smula vinculante? Quem tem legitimidade para provocar a aprovao, reviso ou cancelamento da smula vinculante? O que acontece ao ato administrativo ou deciso judicial que contraria a smula vinculante? O que so princpios gerais de direito? Quais as funes da equidade? O juiz pode decidir por equidade? O que justia alternativa? O que so antinomias ou lacunas de conflito? Quais os trs critrios que solucionam as antinomias? Qual a diferena entre os critrios cronolgico, da especialidade e hierrquico? Dos critrios acima, qual o mais forte e o mais fraco? O que antinomia de 1 grau? O que antinomia de 2 grau? O que antinomia aparente? O que antinomia real? Cite trs casos de antinomias de 1 grau aparente. Cite dois casos de antinomias de 2 grau aparente. Em que hiptese ocorre a antinomia real? Como Bobbio soluciona o problema?

DIREITO CIVIL OBRIGAES

CURSO A DISTNCIA PARA DELEGADO FEDERAL MDULO I

1CURSO A DISTNCIA PARA DELEGADO FEDERAL- MDULO I DIREITO CIVIL OBRIGAES PROF. FLVIO MONTEIRO DE BARROS

DIREITO DAS OBRIGAES CONCEITO O Cdigo Civil no define obrigao, relegando, acertadamente, essa tarefa doutrina. Obrigao o vnculo jurdico pelo qual o devedor (sujeito passivo) compromete-se a realizar em favor do credor (sujeito ativo) uma prestao economicamente aprecivel de dar, fazer ou no fazer. Dessa definio extraem-se os seguintes elementos constitutivos: a. o vnculo jurdico; b. as partes; c. a prestao. A ausncia de um desses elementos implica na inexistncia da obrigao ou em sua extino. VNCULO JURDICO A palavra obrigao vem de ob ligatio, que significa liame. Nos primrdios do direito romano, esse vnculo recaa sobre a pessoa fsica do devedor, pois, na hiptese de inadimplemento, o credor podia reduzi-lo escravido, ou at mat-lo, de modo que a execuo da obrigao consistia em sacrifcio corporal. A partir da Lex Poetelia, de 326 a.C., o vnculo obrigacional deixa de ter carter pessoal, corporal, e passa a assumir o perfil impessoal, patrimonial, recaindo a responsabilidade sobre os bens do devedor. Modernamente, esse vnculo jurdico, tambm chamado de situao ou relao jurdica, consiste no poder atribudo ao credor de exigir judicialmente o cumprimento da prestao, sob pena de execuo do patrimnio do devedor. Diz-se jurdico esse vnculo, porque encontra-se disciplinado pelo Direito, que comina sano ao inadimplemento. O poder atribudo ao credor de exigir judicialmente o cumprimento da prestao confere ao vnculo obrigacional o atributo da coercibibilidade, distinguindo-se dos vnculos puramente morais, isto , dos meros deveres de conscincia, cujo inadimplemento incapaz de gerar qualquer coao jurdica. Finalmente, cumpre registrar que, no Brasil, ainda h resqucios do carter pessoal, corporal, da obrigao, no concernente ao devedor de alimentos e ao depositrio infiel, que podem ser presos civilmente pelo no-pagamento dessas dvidas (CF, art. 5, inciso LXVII).

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AS PARTES NA RELAO OBRIGACIONAL Em toda obrigao encontram-se presentes duas partes: um sujeito ativo (credor) e um sujeito passivo (devedor). Qualquer pessoa, maior ou menor, capaz ou incapaz, fsica ou jurdica, pode ser sujeito ativo ou passivo de uma obrigao. Excepcionalmente, admite-se at mesmo a obrigao envolvendo pessoa ainda no existente, como a doao feita em favor de nascituro, outrossim, o testamento contemplando prole eventual ou pessoa jurdica em formao. PRESTAO O objeto da obrigao a prestao, consistente numa atividade do devedor, de dar, fazer ou no fazer, destinada a satisfazer o interesse do credor. Por outro lado, o objeto da prestao consiste no bem ou servio a ser prestado pelo devedor. Assim, por exemplo, na compra e venda de um carro, o objeto da obrigao do vendedor o ato de entregar, ao passo que o carro o objeto da prestao. A prestao deve ser lcita, possvel, determinada ou determinvel, e ainda economicamente aprecivel. Assim, em toda a obrigao a prestao deve ser econmica, caso contrrio no ser obrigao, mas sim dever, como, por exemplo, os deveres conjugais (fidelidade, mtua assistncia etc.). Convm, porm, salientar que o interesse do credor pode ser moral, afinal o dano moral indenizvel, todavia, a prestao, isto , a coisa ou servio devido, deve ser econmica, avalivel em dinheiro, embora, claro, no haja necessidade de consistir em dinheiro. CONTEDO DO VNCULO OBRIGACIONAL O contedo da obrigao a relao crdito-dbito, consistente no poder de o credor exigir a prestao e na necessidade jurdica de o devedor cumpri-la. O crdito existe to logo contrada a obrigao, mas a pretenso, consistente no direito de exigir o seu cumprimento, nasce apenas com o inadimplemento. Essa pretenso, que se encontra implcita em toda obrigao, exercida contra o patrimnio do devedor, mediante ao judicial, embora s vezes tambm possa ser exercida extrajudicialmente como ocorre com o protesto do ttulo de crdito. Por outro lado, a relao jurdica obrigacional de carter transitrio. Satisfeita a prestao, amigvel ou judicialmente, extingue-se a

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obrigao. Toda obrigao nasce fadada extino. No h obrigao perptua. O prprio contrato de sociedade por tempo indeterminado pode extinguir-se com a ocorrncia de algum dos motivos de sua dissoluo (art. 1033, incisos I a V do CC). No h, pois, obrigaes perptuas; com a solutio o devedor se exonera do vnculo. Note-se, porm, que o elemento transitoriedade ocorre comumente, mas no necessariamente e sempre, razo pela qual no o inclu no conceito de obrigao. De fato, h obrigaes que no so transitrias, mas sim permanentes. Refiro-me s obrigaes de no fazer (non faciendi). Finalmente, ainda examinando o contedo da obrigao, vislumbra-se a existncia de dois elementos: a dvida e a responsabilidade. A dvida consiste na obrigao de o devedor cumprir espontaneamente a prestao, ao passo que a responsabilidade o fato de a pessoa (devedor ou terceiro) ser compelida judicialmente a responder com seu patrimnio pelo adimplemento da obrigao. H dvidas sem responsabilidade, como as dvidas de jogo e apostas e as dvidas prescritas, que so inexigveis judicialmente. H tambm responsabilidade sem dvida, como, por exemplo, o fiador e o avalista. O elemento dvida, como esclarece Slvio Rodrigues, supe a atividade espontnea do devedor, que a pode descumprir, mas da responsabilidade no se pode ele esquivar. DISTINO ENTRE OS DIREITOS REAIS E PESSOAIS O direito pessoal o vnculo entre pessoas. O direito das obrigaes uma espcie do gnero direitos pessoais. A caracterstica das obrigaes a patrimonialidade, distinguindo-se, nesse aspecto, de outros direitos pessoais sem contedo patrimonial, como alguns pertencentes ao direito de famlia. Os direitos reais, por sua vez, tambm tm contedo patrimonial, mas no se trata de um vnculo entre pessoas, mas da subordinao de uma coisa a uma pessoa. Acrescente-se ainda que o cumprimento da obrigao depende de um comportamento do devedor em favor do credor, ao passo que o direito real exerce-se diretamente e imediatamente sobre a coisa, independentemente do comportamento de qualquer pessoa. Assim, por exemplo, o proprietrio de uma casa, para exercer o direito de propriedade (usar, gozar etc.), no precisa da participao de outrem. O objeto dos direitos reais uma coisa corprea (tangvel), ao passo que o direito das obrigaes pode ter por objeto coisas corpreas ou incorpreas (direitos) e servios. Os direitos reais so absolutos, isto , oponveis erga omnes, podendo ser invocados contra todas as pessoas, ao passo que os direitos obrigacionais so relativos, de modo que s podem ser exercidos em face do devedor.

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Assim, por exemplo, o contrato de hipoteca sem a respectiva inscrio no Registro de Imveis um mero direito pessoal, obrigacional, de modo que se o bem for alienado o credor no poder exercer o seu direito perante o terceiro adquirente do imvel. Se, ao revs, o contrato de hipoteca estivesse inscrito no Registro de Imveis, haveria um direito real, permitindose, destarte, que o credor exercesse o direito real de hipoteca em face de qualquer pessoa que viesse a adquirir o imvel. O titular de direito real tem o direito de seqela, consistente no poder de perseguir e reaver a coisa, esteja ela em poder de quem quer que seja. No direito pessoal, no h se falar em seqela. FONTES DAS OBRIGAES No direito romano, as fontes, isto , as causas de nascimento das obrigaes eram quatro, a saber: a. contrato: a obrigao nasce pelo acordo entre as partes; b. quase-contrato: a obrigao nasce de um ato humano lcito, assemelhado ao contrato. Exemplos: gesto de negcios e repetio de indbito; c. delito: a obrigao nasce de atos dolosos lesivos. Exemplos: furto, calnia etc; d. quase-delito: a obrigao nasce de atos culposos lesivos. O Cdigo Civil brasileiro, embora no tenha um dispositivo expresso onde declara quais so as fontes das obrigaes, contempla trs fontes de obrigaes, a saber: a. o contrato; b. os atos unilaterais: consistem na promessa de pagamento (art. 854 e ss.); a gesto de negcios (art. 861 e ss.); o pagamento indevido (art. 876 e ss.) e o enriquecimento sem causa (arts. 884 e ss.); c. os atos ilcitos: consistem nos atos dolosos ou culposos causadores de dano a outrem. Diversos civilistas elencam as fontes de obrigaes da seguinte forma: a. a vontade humana. Exemplos: contratos; declaraes unilaterais da vontade; testamento; b. os atos ilcitos, isto , os danos dolosos ou culposos causados a outrem; c. a lei. Conquanto a lei seja fonte mediata, indireta, de toda e qualquer obrigao, s vezes funciona tambm como fonte direta, produzindo, por si s, a obrigao. Exemplos: obrigao de alimentos; de pagar tributo; de indenizar nos casos em que h responsabilidade objetiva. Quanto sentena, cremos que no fonte de obrigao, pois no cria o direito, mas apenas declara o direito preexistente. H sempre uma causa preexistente sentena, cuja funo declarativa e no propriamente criadora, pois limita-se a declarar direito j existente.

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CLASSIFICAO DAS OBRIGAES QUANTO AO OBJETO DA OBRIGAO As obrigaes podem ser: a. positivas: de dar e de fazer; b. negativas: de no-fazer. Dessas modalidades cuidaremos oportunamente. QUANTO AO OBJETO DA PRESTAO As obrigaes podem ser: a. simples: quando a obrigao abrange um nico ato ou uma s coisa. Exemplo: entrega de um livro ou confeco de um quadro. A obrigao de entregar uma biblioteca tambm simples, porque a biblioteca uma universalidade de fato com destinao nica, devendo ser encarada como uma s coisa. Cumpre ressaltar que alguns civilistas definem como obrigao simples aquela que, alm de abranger uma nica prestao, contm apenas um s credor e um s devedor; b. conjuntas ou cumulativas: quando, tendo por objeto mais de uma prestao, todas devem ser cumpridas pelo devedor. Exemplo: no contrato de empreitada de materiais e mo-de-obra, o empreiteiro assume a obrigao de dar (fornecimento do material) e de fazer (realizar o servio). Outro exemplo: o vendedor compromete-se a entregar o automvel e a motocicleta; c. alternativa ou disjuntiva: quando, tendo por objeto mais de uma prestao, o devedor se libera cumprindo qualquer uma delas. Exemplo: o vendedor assume a obrigao de entregar um cavalo ou um bezerro; d. facultativas: quando tem por objeto apenas uma prestao, conferindo-se, porm, ao devedor a opo de substitu-la por outra previamente determinada. Exemplo: obrigo-me a entregar-lhe uma bicicleta, reservando-me, porm, o direito de substitu-la por um bezerro. Outro exemplo: a seguradora obriga-se a reparar o dano causado no veculo, mas tem a opo de entregar um veculo novo ao segurado. Mais um exemplo: o dono da coisa perdida deve indenizar o inventor, isto , a pessoa que a encontrou, pelas despesas que houver feito com a conservao e transporte da coisa, mas tem a opo de abandon-la, ao invs de arcar com a indenizao (art. 1.234). A obrigao facultativa assemelha-se dao em pagamento, porque em ambas o credor substitui a prestao devida por outra. Diferem apenas quanto ao momento da estipulao. Com efeito, ter-se- uma obrigao facultativa, quando a opo conferida ao credor de trocar a prestao devida por outra, for estipulada antes do vencimento, mas haver dao em pagamento, se esta opo for avenada, aps o vencimento da obrigao.

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A obrigao facultativa assemelha-se tambm com a obrigao alternativa. Todavia, distinguem-se nitidamente. Com efeito, na obrigao facultativa, perecendo a prestao principal, o credor no pode exigir a outra prestao, cuja opo de entrega exclusiva do devedor, ao passo que na obrigao alternativa, perecendo uma das prestaes, o credor pode exigir a entrega da remanescente. QUANTO AO SUJEITO As obrigaes podem ser: a. nica: quando h um s devedor e um s credor; b. mltipla: quando h mais de um devedor ou mais de um credor. Exemplos: obrigaes solidrias, divisveis e indivisveis. Cumpre destacar que alguns civilistas denominam de obrigaes complexas aquelas em que h multiplicidade de sujeitos ou de objeto. Exemplos: obrigaes cumulativas, alternativas, facultativas, solidrias, divisveis e indivisveis. QUANTO AO NUS DA PROVA DA CULPA As obrigaes podem ser: a. de meio: o credor deve comprovar que o objetivo visado no foi atingido por culpa do devedor. Este compromete-se apenas a realizar o esforo necessrio para atingir a meta colimada e no propriamente a atingi-la. o caso dos mdicos e advogados. Na ao de indenizao em face desses profissionais, o paciente ou cliente deve comprovar que o resultado no foi atingido por culpa deles. b. de resultado: presume-se que o objetivo visado no foi atingido por culpa do devedor. Este compromete-se a atingir a meta colimada, e no apenas envidar esforo para tanto. o caso do mecnico e do transportador. Na ao de indenizao em face desses profissionais, a pessoa que os contratou deve apenas comprovar que o resultado no foi atingido, isto , que o automvel continua estragado ou que a mudana no chegou no destino avenado. Quanto culpa, presumida, de modo que o devedor s se libera se comprovar que o resultado no foi atingido por caso fortuito ou fora maior. Cumpre consignar que a jurisprudncia considera de resultado a obrigao do cirurgio plstico. Alguns julgados, porm, limitam-se a admitir como de resultado apenas a cirurgia plstica esttica, mantendo-se de meio a cirurgia plstica reparadora. QUANTO AOS ELEMENTOS ACIDENTAIS As obrigaes podem ser: a. pura ou simples: quando produzem efeitos desde logo, porque no sujeitas a termo, condio ou encargo;

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b. condicional: quando a sua eficcia encontra-se subordinada a evento futuro e incerto; c. modal ou gravada ou com encargo: quando se impe um encargo a uma das partes. Exemplo: doao de um terreno para nele se construir uma igreja; d. a termo: quando a sua eficcia encontra-se subordinada a evento futuro e certo. QUANTO AUTONOMIA DA EXISTNCIA As obrigaes, quando so reciprocamente consideradas, podem ser: 1. principal: quando existe por si s; 2. acessria: quando a sua existncia pressupe uma outra. Exemplos: clusula penal, juros etc. QUANTO EXECUO OU CUMPRIMENTO As obrigaes podem ser: a. instantneas ou transeuntes ou isoladas: as que se cumprem num s ato ou fato. Exemplo: entrega de um quadro; b. peridicas ou permanentes ou contnuas, as que se cumprem sucessivamente, isto , em mais de um ato ou fato. Exemplos: penso alimentcia; pagamento de aluguis etc. QUANTO EXIGIBILIDADE DA PRESTAO A obrigao pode ser: a. perfeita ou civil ou completa: quando o credor pode acionar judicialmente o devedor para obter o cumprimento da prestao devida. Nesse tipo de obrigao, que a regra, o direito material encontra-se guarnecido pelo direito de ao; b. imperfeita ou incompleta: quando o credor no pode acionar o devedor para obter o cumprimento da prestao devida. So as obrigaes morais ou sociais e naturais. Nas obrigaes morais ou sociais o devedor movido por uma liberalidade. Exemplos: dar gorjeta; pagar alimentos a quem no tem direito. Nas obrigaes naturais, h o direito material desguarnecido da respectiva ao. o caso das dvidas prescritas e das dvidas de jogo. Anote-se que, na obrigao moral, no h direito material nem direito de ao, de modo que a pessoa que a cumpre movida por mera liberalidade, ao passo que, na obrigao natural, existe o direito material, embora desprovido do direito de ao, de modo que o seu cumprimento um verdadeiro pagamento e no uma simples liberalidade.

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Orlando Gomes faz distino entre a obrigao moral ou social e a doao, sustentando que na primeira no h o animus donandi. A linha divisria, porm, muito tnue, sobretudo, porque muitas doaes so realizadas em cumprimento do dever moral, isto , o dever de conscincia de ajudar o prximo. Quanto obrigao natural, diversos civilistas negam o seu carter jurdico. Argumentam que se trata de uma mera relao de fato, porque no se pode admitir o direito sem coero. Ora, conquanto o descumprimento da obrigao natural no gere nenhuma sano jurdica, trata-se, a nosso ver, de uma obrigao no sentido tcnico-jurdico, porque encontra-se protegida pelo ordenamento jurdico, embora de forma rudimentar. Com efeito, vlido o pagamento voluntrio de uma obrigao natural; o devedor no poder requerer a restituio do que pagou, pois a obrigao era devida. O direito atribui ao credor a soluti retentio, isto , a defesa para repelir a restituio do pagamento. V-se, portanto, que a obrigao natural recebe uma ligeira proteo do ordenamento jurdico. Por outro lado, cumpre registrar que o Cdigo Civil cuida da obrigao natural em trs dispositivos legais, a saber: a. No se pode repetir o que se pagou para solver dvida prescrita, ou cumprir obrigao judicialmente inexigvel (art. 882). V-se, portanto, que o credor de obrigao moral tambm pode argir a soluti retentio. De fato, a expresso obrigao judicialmente inexigvel compreende as obrigaes morais ou sociais. b. No se revogam por ingratido as doaes que se fizerem em cumprimento de obrigao natural (art. 564, III). c. As dvidas de jogo ou de aposta no obrigam a pagamento; mas no se pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o perdente menor ou interdito (art. 814). Trata-se da soluti retentio. Finalmente, no Cdigo de 1916, os juros s podiam ser cobrados judicialmente quando convencionados pelas partes, ainda que o contrato fosse omisso acerca da taxa. Se, porm, apesar de no convencionados, a parte efetuasse o pagamento, este era vlido, por fora do art. 1263. Portanto, os juros no convencionados ingressavam tambm no rol das obrigaes naturais. Com o advento do novo Cdigo, os juros so sempre devidos, ainda que no convencionados, conforme preceitua o art. 406, sendo, pois, exigveis judicialmente. Portanto, no se trata mais de uma mera obrigao natural. OBRIGAO PROPTER REM OU REAIS Obrigao propter rem, tambm denominada reipersecutria, a que se origina do fato da pessoa ser titular de um direito real. Exemplos:

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a. obrigao de pagar o IPTU; b. obrigao de pagar o condomnio; c. obrigao de contribuir para as despesas de demarcao entre os imveis contguos (art. 1297); d. obrigao de o condmino concorrer para as despesas de conservao ou diviso da coisa (art. 1315). Em todas essas hipteses, verificam-se os seguintes caracteres: a. o devedor no se obrigou por sua vontade, e sim pelo fato de ser proprietrio do bem; b. o devedor se exonera da obrigao se renunciar ao direito de propriedade ou abandonar a coisa; c. o sucessor a ttulo singular assume automaticamente a dvida, ainda que no saiba da sua existncia. Portanto, opera-se uma cesso de dbito mesmo sem a anuncia do credor ou do adquirente do bem. Assim, a transmissibilidade automtica uma das caractersticas da obrigao propter rem. Trata-se de uma obrigao ambulatria. Em regra, o passivo do devedor s transmitido ao sucessor a ttulo universal. O sucessor a ttulo singular, por exemplo, o legatrio, no responsvel pelas dvidas do antecessor, salvo quando se tratar de obrigao propter rem. Por outro lado, como esclarece Slvio Rodrigues, muitos dos aspectos surgidos com a difuso da venda de terrenos, em lotes, podem ser explicados pela noo em estudo. As obrigaes do adquirente, de no construir em todo o terreno, ou de s construir prdios residenciais, ou de no levantar mais do que dois andares, ou deixar recuo determinado, so propter rem, pois, ambulat cum domino, transmitem-se ao sucessor a ttulo singular e so inexigveis se houver o abandono da coisa. Sem discordar do ilustre civilista, acrescentamos apenas que essas obrigaes, de no construir em todo o terreno, de no levantar mais do que dois andares ou de no construir prdios comerciais, s sero propter rem, vinculando o adquirente, quando constar expressamente na matrcula do imvel, na forma de servido. Caso contrrio, no ser obrigao propter rem e o novo adquirente, por fora do princpio da relatividade dos contratos, no se submeter a essas restries. Sobre a sua natureza jurdica, as obrigaes propter rem assemelham-se aos direitos reais e aos direitos pessoais. Na verdade, so obrigaes hbridas, pois constituem um ponto intermedirio entre o direito real e o direito pessoal. A nosso ver, prepondera o direito pessoal no contedo dessa obrigao, porque o seu objeto uma prestao do devedor

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e no uma coisa; de fato, h um vnculo entre credor e devedor, tendo por objeto uma prestao. Apenas nos seus aspectos secundrios, apresenta caracteres do direito real, como, por exemplo, a extino pelo abandono. Embora os direitos pessoais no se extingam pelo abandono e a cesso de dbito dependa da anuncia do credor, a obrigao propter rem, na essncia, um direito pessoal. OBRIGAO DE DAR CONCEITO A obrigao de dar consiste na entrega ou restituio de uma coisa pelo devedor ao credor. ESPCIES A obrigao de dar pode ser: a. obrigao de dar em sentido estrito: quando a entrega implica em transferncia da propriedade da coisa. Exemplo: A vende para Bum cavalo de corrida. b. obrigao de entregar: quando o devedor transfere apenas a posse (uso e gozo) da coisa. Exemplo: A aluga para B um automvel. c. obrigao de restituir: quando o devedor devolve a coisa que recebeu do credor. o caso dos depositrios, comodatrios, locatrios etc. Note-se que, na obrigao de restituir, o credor o dono da coisa, ao passo que, na obrigao de dar propriamente dita e de entregar, o dono o devedor. Esse detalhe repercutir nas hipteses de risco, isto , perda ou deteriorao da coisa sem culpa do devedor. O civilista Antunes Varela sustenta que, na hiptese do devedor recusar-se a entregar a coisa, o credor poder mover ao de busca e apreenso, desde que a obrigao seja de entregar ou restituir, negando-lhe essa ao na obrigao de dar propriamente dita. Assim, por exemplo, se A vende um automvel para B, mas se recusa a entregar-lhe o veculo, aps o recebimento do preo, no poderia se valer da ao de busca e apreenso nem da reivindicatria, de acordo com o ilustre civilista, porque a propriedade se transfere apenas com a tradio, sendo certo que a ao reivindicatria s pode ser ajuizada pelo dono da coisa, restando ao comprador apenas a ao de indenizao por perdas e danos. De fato, no realmente cabvel a ao reivindicatria, que exclusiva do proprietrio do bem, mas, data venia, nada obsta que o comprador ajuize ao de entrega da coisa, visando a tutela especfica ou in natura, com base no pacta sunt servanda, apoiado ainda nos arts. 621 e seguintes do CPC, que permite a execuo para a entrega de coisa. Como dizia Agostinho Alvim, muito imperfeito seria o direito se, havendo meio de compelir o devedor a executar a obrigao assumida, sem atingir a sua pessoa, tolerasse a sua recusa, deixando insatisfeito o credor.

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A obrigao de dar ainda pode ser: a. obrigao de dar coisa certa ou obrigao especfica: quando o devedor compromete-se a entregar ou restituir um bem individualizado. Exemplo: A vende o seu automvel para B. b. obrigao de dar coisa incerta ou obrigao genrica: quando o devedor compromete-se a entregar um bem considerado no gnero a que pertence, e no em sua individualidade. Exemplo: obrigao de entregar 10 (dez) sacas de caf de determinada marca. OBRIGAO DE DAR COISA CERTA Na obrigao de dar coisa certa, o credor no pode ser obrigado a receber outra, ainda que mais valiosa (art. 313 do CC.). Portanto, a dao em pagamento, isto , a entrega de prestao diversa da devida, depende da concordncia do credor. A obrigao de dar coisa certa abrange os acessrios dela embora no mencionados, salvo se o contrrio resultar do ttulo ou das circunstncias do caso (art. 233 do CC.). claro, pois o acessrio segue o principal (art. 92 do CC). Assim, na venda de um pomar encontra-se implcita a obrigao de entregar os frutos pendentes. Anote-se, porm, que as pertenas, conquanto acessrios, so excludas do negcio, isto , no seguem a sorte do principal, salvo se o contrrio resulta da lei, da manifestao da vontade, ou das circunstncias do caso (art. 94 do CC.). Assim, na venda de uma casa no est compreendida a obrigao de entregar as pertenas, tais como, telefone, sof, quadros etc. Os demais acessrios, porm, so transferidos junto com a coisa. Dentre os acessrios, vale mencionar a servido, hipoteca, dvidas referentes a multa e condomnio, frutos, produtos, benfeitorias, acesses etc. At a tradio pertence ao devedor a coisa, com seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poder exigir aumento no preo; se o credor no anuir, poder o devedor resolver a obrigao (art. 237 do CC). Igualmente, os frutos percebidos so do devedor, cabendo ao credor os pendentes. Assim, a cria do animal negociado, que nasce antes da tradio, pertence ao vendedor, mas se nascer aps a entrega ser do comprador. No tocante ao perecimento e deteriorao da coisa, as hipteses so bem variadas. O perecimento da coisa pode ser: a. natural: quando a coisa perde as suas qualidades essenciais. Exemplo: morte do cavalo. b. jurdico: quando a coisa perde o seu valor econmico ou ento torna-se inalienvel. Exemplo: desapropriao da casa que se prometera alienar a outrem. Quando a coisa perece antes da tradio extingue-se a obrigao, pois esta no pode subsistir sem objeto. Em caso de culpa, o

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devedor indenizar o credor, restituindo-lhe o preo mais as perdas e danos. Se, porm, no teve culpa, apenas restituir o preo, porventura recebido, mas no arcar com perdas e danos. Na hiptese de a coisa perecer aps a tradio, subsiste a obrigao de o adquirente efetuar o pagamento, ainda que no tenha tido culpa. Note-se que o problema solucionado pela mxima res perit domino, isto , o dono suporta os prejuzos. Assim, na compra e venda, por exemplo, antes da tradio, isto , da entrega, o dono o vendedor; aps, o dono o comprador. Por outro lado, ao invs do perecimento, pode ocorrer apenas a deteriorao da coisa, sendo a mesma em sua essncia, ocorrendo apenas a perda de qualidades no essenciais, que diminuem a sua utilidade ou o valor. Quando a coisa se deteriora antes da tradio, com ou sem culpa do devedor, o credor pode optar pela extino do contrato, exigindo a restituio do que pagou, ou ento pode aceitar a coisa, abatido no preo o valor do estrago. Quanto s perdas e danos, s ter direito na hiptese de a deteriorao emanar de culpa do devedor. Se, ao revs, a deteriorao ocorrer aps a tradio, subsiste a obrigao de o adquirente efetuar o pagamento do preo, ainda que no tenha tido culpa, por fora da mxima res perit domino. OBRIGAO DE RESTITUIR Vimos que a obrigao de restituir implica na devoluo da coisa ao proprietrio. Tal obrigao assumida pelo depositrio, locatrio, comodatrio etc. Se a coisa perecer antes da tradio, isto , da devoluo, extingue-se a obrigao, pois esta no pode subsistir sem objeto, quer haja ou no culpa do devedor. Se no teve culpa no arcar sequer com as perdas e danos; estas s sero devidas na hiptese de culpa. Exemplo: A empresta o automvel para B, mas o veculo destrudo por um raio, antes da restituio; nesse caso, o comodatrio B no responder por perdas e danos. Se, porm, agiu com culpa, colidindo, por exemplo, o automvel, culminando pela sua perda total, arcar com as perdas e danos, consistentes no pagamento do valor do veculo e outros prejuzos causados ao comodante A. Cumpre ressaltar que se por ocasio do perecimento da coisa o comodatrio B estava em mora, porque j havia ultrapassado o prazo de devoluo, subsiste a obrigao de indenizar, arcando com todos os prejuzos, ainda que o perecimento tenha emanado de caso fortuito ou fora maior, por fora do art. 399, que prev a perpetuatio obligationis para o devedor em mora, excepcionando a mxima res perit domino.

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Por outro lado, quando a coisa apenas se deteriora, antes da tradio, isto , da sua devoluo, sem culpa do devedor, o credor no ter direito a indenizao, devendo contentar-se em receb-la no estado em que se encontra. Se, ao revs, a deteriorao ocorrer por culpa do devedor, abre-se ao credor duas opes: receber a coisa no estado em que est mais as perdas e danos; ou ento, rejeit-la e exigir o equivalente ao seu valor mais as perdas e danos. Anote-se, porm, que, por questo de bom senso, os pequenos estragos, que no comprometem em nada a utilidade da coisa, no podem conferir ao credor o direito de rejeit-la. OBRIGAO DE DAR COISA INCERTA OU OBRIGAO GENRICA Vimos que, nessa obrigao, a coisa indicada pelo gnero e quantidade. Dois so os requisitos dessa obrigao: 1. indicao do gnero prximo a que pertence a coisa; 2. indicao da quantidade. No basta, pois, a indicao do gnero, urge ainda que se delimite a quantidade, sob pena de inexistncia da obrigao, por falta de determinao do objeto. Assim, inexistente a obrigao em que A promete vender caf a B, pois a quantidade no foi delimitada. Por outro lado, o gnero sob o prisma jurdico, o conjunto de seres semelhantes, isto , a classe de objetos com caracteres comuns. O cdigo, ao cuidar da obrigao de dar coisa incerta, refere-se, evidentemente, ao gnero prximo, indicativo da espcie. vlido, por exemplo, a obrigao em que A promete vender para B 10 (dez) sacas de caf, ainda que no especifique a marca. Tratando-se, porm, do chamado gnero remoto, isto , indeterminado, que no indica sequer a espcie, a obrigao ser inexistente. Exemplos: A promete vender 10 (dez) animais para B ou ento 20 Kg de alimentos. Por outro lado, na obrigao de dar coisa incerta, h a fase da escolha, que, no silncio do negcio, ser efetuada pelo devedor (art. 244). A escolha, isto , a separao das coisas, s se consuma, vinculando o devedor, quando o credor dela cientificado (art. 245 do CC.). A partir da, o devedor no poder mais alter-la unilateralmente. Quando o credor cientificado da escolha ocorre a chamada concentrao do dbito; desde ento, a obrigao de dar coisa incerta transforma-se em obrigao de dar coisa certa, regendo-se pelas normas que disciplinam essa ltima obrigao. Sobre o critrio da escolha, quando esta feita pelo devedor, deve seguir o princpio do meio-termo, isto , ele dever escolher, pela mdia, nem as piores nem as melhores, de modo que essa liberdade de escolha relativa. Se, porm, a escolha for deferida ao credor, este poder escolher as melhores, a nata do gnero, salvo se esta no era a inteno das partes.

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equivocado o raciocnio de que a obrigao de dar coisa incerta s compatvel com os bens fungveis. Conquanto isso seja mais usual, nada obsta compreenda tambm bens infungveis, como, por exemplo, a promessa de vender por um preo certo um dos trs quadros de determinado pintor. No concernente ao perecimento ou deteriorao da coisa antes da entrega, irrelevante que haja ou no culpa do devedor, subsistindo na ntegra a obrigao, porque o gnero no perece (genus non perit). Assim, o sujeito que vende 100 (cem) sacas de caf, no se exonera da obrigao, alegando o perecimento da coisa por caso fortuito ou fora maior, pois, em tese, como ensina Silvio Rodrigues, poder obter alhures tal mercadoria, a fim de proceder entrega a que se comprometeu. Essa mxima genus non perit aplicvel apenas s coisas pertencentes a gnero ilimitado. Exemplos: dinheiro, caf, acar etc. Se a coisa pertencer a gnero limitado, o perecimento de todas as espcies que a componham acarretar a extino da obrigao, responsabilizando-se o devedor pelas perdas e danos apenas na hiptese de ter procedido com culpa. A propsito, quando o gnero limitado a obrigao de dar coisa incerta denomina-se obrigao quase-genrica. O gnero limitado quando existe uma delimitao, quer porque a quantidade escassa, quer porque o negcio faz referncia a coisas que se acham num certo local ou que pertenam a certa pessoa ou ainda que sejam referentes a determinada poca ou acontecimento. Exemplo: A vende para B 10(dez) garrafas de vinho de sua safra de 1970.

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QUESTES 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35. 36. O que obrigao? E quais os seus elementos? Qual a distino de deveres puramente morais? H resqucio do carter pessoal da obrigao? possvel a obrigao contemplar pessoa ainda no existente? Qual a distino entre objeto da obrigao e objeto da prestao? Quais as caractersticas da prestao? Qual o contedo do vnculo obrigacional? H alguma obrigao permanente? Qual distino entre dvida e responsabilidade ? possvel dvida sem responsabilidade e responsabilidade sem dvida? Qual distino entre direitos reais e direitos pessoais? Quais as fontes da obrigao? A sentena fonte de obrigao? O que so obrigaes simples? O que so obrigaes conjuntas? O que so obrigaes alternativas e como se distinguem das obrigaes facultativas? Qual a distino entre obrigaes facultativas e dao em pagamento? Qual a distino entre obrigaes nicas e mltiplas? Qual a distino entre obrigaes de meio e de resultado? Qual a distino entre obrigaes pura ou simples, condicional, modal e a termo? Qual a distino entre obrigaes principais e acessrias? Qual a distino entre obrigaes instantneas e permanentes? Qual a distino entre obrigaes perfeitas e imperfeitas? Qual a distino entre obrigaes naturais e morais? A obrigao natural uma relao jurdica ou ftica? Cite 3 hipteses legais de obrigaes naturais? O que obrigao propter rem? D exemplos. Cite as caractersticas. Qual a sua natureza jurdica? O que obrigao de dar e quais as suas espcies? Qual a diferena entre obrigao de dar e obrigao de entregar? Qual a distino entre obrigao de dar coisa certa e obrigao de dar coisa incerta? Qual distino entre perecimento natural e jurdico? Na hiptese da coisa perecer, a obrigao persiste ou extinta? Em que consiste a mxima res perit domino ? O que deteriorao? E qual o seu efeito? Qual o efeito do perecimento da coisa na obrigao de restituir? Qual o efeito da deteriorao na obrigao de restituir?

DIREITO CIVIL CONTRATOS

CURSO A DISTNCIA PARA DELEGADO FEDERAL MDULO I

1CURSO A DISTNCIA PARA DELEGADO FEDERAL MDULO I DIREITO CIVIL - CONTRATOS - PROF. FLVIO MONTEIRO DE BARROS

CONTRATOS INTRODUO Os negcios jurdicos, quanto manifestao da vontade, dividem-se em: a. unilaterais: quando a vontade emana de um s sujeito ou ento mais de um, mas sempre direcionada ao mesmo fim. Exemplos: promessa de recompensa, ttulo ao portador etc. Esses negcios unilaterais subdividemse em receptcios, quando os seus efeitos s se produzirem aps o conhecimento da declarao pelo destinatrio, e no-receptcios, se sua efetivao independer do endereo a certo destinatrio, como por exemplo, aceitao e renncia da herana; b. bilaterais ou plurilaterais: quando a declarao de vontade emanar de duas ou mais pessoas, porm direcionadas em sentido contrrio. Podem ser: 1) simples, quando concede benefcio a apenas uma das partes e encargo outra, como, por exemplo, a doao; 2) sinalagmticos, quando atribui vantagens e nus para ambos os sujeitos, como, por exemplo, a compra e venda. V-se, portanto, que os contratos integram os chamados negcios jurdicos bilaterais, ou plurilaterais, formando-se pelo acordo de vontades. CONCEITOS A palavra contrato costuma apresentar duas acepes. Com efeito, em sentido amplo, o contrato compreende todo negcio jurdico bilateral, isto , que se forma pelo concurso de vontades, abrangendo, por exemplo, o casamento. Em sentido estrito, que seu verdadeiro sentido, a expresso, contrato abrange apenas o negcio jurdico bilateral ou plurilateral que tem por escopo a criao de uma obrigao de contedo patrimonial. De acordo com Antunes Varela, contrato o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurdica, destinada a estabelecer uma relao de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relaes jurdicas de natureza patrimonial. DISTINO ENTRE PACTO E CONTRATO O pacto a clusula que se ape a certos contratos para lhe emprestar feitio especial. Exemplos: pacto de retrovenda, pacto comissrio, pacto adjecto de