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1 DEFINIÇÃO ESPACIAL DE CORREDORES ECOLÓGICOS PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA Rachele Andreozzi 1 Nuno Neves 1,2 1 Universidade de Évora 2 e-GEO Centro de Estudos de Geografia e Planeamento Regional Resumo A conservação da natureza tem um papel fundamental no desenvolvimento sustentável e na conciliação dos diferentes aspectos, naturais e antrópicos, que compõem a paisagem e o território, num sentido dinâmico. Para que os objectivos da conservação sejam alcançados (em particular a integração entre a manutenção da biodiversidade e das necessidades humanas) a escolha das áreas para a conservação da natureza tem que ser realizada tendo em conta um conjunto diversificado de factores, com particular ênfase nos aspectos biológicos e ecológicos. Os problemas que afectam a biodiversidade, ou seja a variedade total de vida na terra, dependem em particular da destruição de habitats, sua degradação e fragmentação, resultando em muitos casos da falta de conciliação entre as várias actividades que se cruzam num determinado território. Assim é importante criar uma interligação entre as diferentes áreas de conservação através de corredores ecológicos. A definição espacial de corredores ecológicos é bastante complexa, sobretudo considerando que os corredores se situam fora das áreas protegidas, devendo ser explicitados os critérios de análise espacial com uma base científica, tendo em conta a convivência das necessidades da conservação e das actividades humanas. O objectivo deste trabalho centra-se no desenvolvimento de uma metodologia de definição espacial destes corredores ecológicos, com base em dados geográficos, que torne possível uma gestão sustentável das áreas de conservação, bem como das actividades humanas que se verificam dentro das áreas e nas suas imediações. A metodologia utilizada recorre a uma avaliação dos factores relevantes para a conservação dentro das áreas classificadas, integrando as diversas perspectivas de avaliação numa superfície de custo acumulado. Os corredores ecológicos são gerados através de um modelo derivado da análise de distância-custo integrando superfícies de custo acumulado criadas a partir de pares de áreas protegidas previamente classificadas. O modelo espacial resultante permite a definição espacial contínua de um gradiente de aptidão para corredores ecológicos, de grande aplicabilidade em processos de gestão e ordenamento do território. Palavras-chave: conservação da natureza, corredores ecológicos, modelação geográfica, análise espacial. Abstract Nature conservation plays a fundamental role in sustainable development and in balance of different aspects, natural and antropics, that influence in landscape and territory, in a dynamic way. To reach conservation goals (particularly integration between biodiversity preservation and human necessities) conservation areas’ choices must be realized considering a set of several factors, with particular emphasis to biological and ecological aspects. Problems that affect biodiversity, id est total variability of life in earth, depend particularly from habitats’ destruction, its degradation and fragmentation, frequently resulting from lack of conciliation between the different activities that overlap in a territory. So, it’s important to create linkages between the different conservation areas through ecological corridors. Spatial definition of ecological corridors is quite complex, particularly considering that the corridors are located outside protected areas. Spatial analysis criteria must be defined under an explicit way, with a scientific base, considering coexistence of conservation necessities and human activities. The goal of this essay is centred in developing a spatial analyst methodology for the design of ecological corridors, based on geographic information, to permit a sustainable management of conservation areas, and of human activities that occurs inside the areas and surroundings. The methodology uses an assessment of relevant factors for conservation in the classified areas, integrating the different assessing perspectives in a surface of accumulation costs. Ecological corridors are created through a model that results from the distance-cost analysis through the integration of accumulation costs surfaces created from a pair of protected classified areas. Resulting spatial model allows the continuous spatial definition of an aptitude gradient for ecological corridors, with a significant impact in land use management and planning processes. Keywords: nature conservation, ecological corridors, geographic models, spatial analysis.

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DEFINIÇÃO ESPACIAL DE CORREDORES ECOLÓGICOS PARA A

CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

Rachele Andreozzi1 Nuno Neves1,2

1 Universidade de Évora

2 e-GEO – Centro de Estudos de Geografia e Planeamento Regional

Resumo

A conservação da natureza tem um papel fundamental no desenvolvimento sustentável e na conciliação dos diferentes aspectos, naturais e antrópicos, que compõem a paisagem e o território, num sentido dinâmico. Para que os objectivos da conservação sejam alcançados (em particular a integração entre a manutenção da biodiversidade e das necessidades humanas) a escolha das áreas para a conservação da natureza tem que ser realizada tendo em conta um conjunto diversificado de factores, com particular ênfase nos aspectos biológicos e ecológicos. Os problemas que afectam a biodiversidade, ou seja a variedade total de vida na terra, dependem em particular da destruição de habitats, sua degradação e fragmentação, resultando em muitos casos da falta de conciliação entre as várias actividades que se cruzam num determinado território. Assim é importante criar uma interligação entre as diferentes áreas de conservação através de corredores ecológicos. A definição espacial de corredores ecológicos é bastante complexa, sobretudo considerando que os corredores se situam fora das áreas protegidas, devendo ser explicitados os critérios de análise espacial com uma base científica, tendo em conta a convivência das necessidades da conservação e das actividades humanas. O objectivo deste trabalho centra-se no desenvolvimento de uma metodologia de definição espacial destes corredores ecológicos, com base em dados geográficos, que torne possível uma gestão sustentável das áreas de conservação, bem como das actividades humanas que se verificam dentro das áreas e nas suas imediações. A metodologia utilizada recorre a uma avaliação dos factores relevantes para a conservação dentro das áreas classificadas, integrando as diversas perspectivas de avaliação numa superfície de custo acumulado.

Os corredores ecológicos são gerados através de um modelo derivado da análise de distância-custo integrando superfícies de custo acumulado criadas a partir de pares de áreas protegidas previamente classificadas. O modelo espacial resultante permite a definição espacial contínua de um gradiente de aptidão para corredores ecológicos, de grande aplicabilidade em processos de gestão e ordenamento do território. Palavras-chave: conservação da natureza, corredores ecológicos, modelação geográfica, análise espacial.

Abstract

Nature conservation plays a fundamental role in sustainable development and in balance of different aspects, natural and antropics, that influence in landscape and territory, in a dynamic way. To reach conservation goals (particularly integration between biodiversity preservation and human necessities) conservation areas’ choices must be realized considering a set of several factors, with particular emphasis to biological and ecological aspects. Problems that affect biodiversity, id est total variability of life in earth, depend particularly from habitats’ destruction, its degradation and fragmentation, frequently resulting from lack of conciliation between the different activities that overlap in a territory. So, it’s important to create linkages between the different conservation areas through ecological corridors. Spatial definition of ecological corridors is quite complex, particularly considering that the corridors are located outside protected areas. Spatial analysis criteria must be defined under an explicit way, with a scientific base, considering coexistence of conservation necessities and human activities. The goal of this essay is centred in developing a spatial analyst methodology for the design of ecological corridors, based on geographic information, to permit a sustainable management of conservation areas, and of human activities that occurs inside the areas and surroundings. The methodology uses an assessment of relevant factors for conservation in the classified areas, integrating the different assessing perspectives in a surface of accumulation costs. Ecological corridors are created through a model that results from the distance-cost analysis through the integration of accumulation costs surfaces created from a pair of protected classified areas. Resulting spatial model allows the continuous spatial definition of an aptitude gradient for ecological corridors, with a significant impact in land use management and planning processes.

Keywords: nature conservation, ecological corridors, geographic models, spatial analysis.

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1. INTRODUÇÃO

Tendo em consideração todos os elementos que intervêm na definição dos fenómenos

relacionados com a conservação da natureza, torna-se necessário utilizar uma abordagem

global, holística: isto porque todas as partes que compõem a natureza e o meio ambiente têm

uma influência sobre o global. É claro que o objectivo central da conservação da natureza é a

manutenção da biodiversidade, mas, assim como este conceito é muito geral, da mesma forma

a própria conservação terá que integrar um conjunto muito alargado de princípios.

Não existe uma definição unívoca e universalmente aceite de biodiversidade. Este é contudo

um conceito fundamental no âmbito da conservação da natureza, que integra toda a variedade

de vida existente na terra, incluindo os genes, os indivíduos, as espécies, os ecossistemas,

mas também os processos ecológicos nos quais aqueles intervêm, bem como as suas

interacções (entre as espécies e entre estas e o ambiente envolvente). E. O. Wilson (1992)

define biodiversidade como: “A variedade de organismos considerados a todos os níveis, desde

as variantes genéticas da mesma espécie até agrupamentos de espécies, géneros, famílias e

mesmo níveis taxonomicamente superiores; inclui a variedade dos ecossistemas a qual

compreende as comunidades de organismos nos respectivos habitat e as condições físicas do

meio.” (Wilson, E. O., “The diversity of life”, 1992)1.

Torna-se fundamental numa perspectiva de conservação da natureza, a avaliação da sua

relação com o desenvolvimento e a gestão sustentável.

Tendo como base áreas classificadas já existentes, importa definir espacialmente “redes” de

conectividade visando alcançar de uma forma mais completa os próprios objectivos da

conservação, permitindo ligar entre elas diferentes populações, aumentando assim a sua

variabilidade genética.

O objectivo central deste trabalho é a definição e implementação de um modelo espacial para

criar uma rede de conexões entre as áreas classificadas presentes numa área de estudo, por

forma a manter os processos ecológicos e tornar possível a movimentação das espécies que

existem na mesma2.

Os processos de modelação geográfica desenvolvidos foram aplicados à bacia hidrográfica do

Rio Mira, integrando as áreas classificadas incluídas nos Sítios da Lista Nacional da Rede

Natura 2000: Costa Sudoeste, Caldeirão e Monchique.

O trabalho desenvolvido permite modelar processos ecológicos e evolutivos complexos, que

estão na base da conservação da natureza e dos quais dependem a variabilidade biológica e os

sistemas naturais, ocorrendo num contexto geográfico, sendo fundamental para o seu estudo

ter em consideração a escala espacial, para além da escala temporal3.

1 Carvalho, 1996. 2 Beier, Majka, Jenness, 2007. 3 Diniz-Filho, Telles, Bonatto, Eizirik, Freitas, Marco Jr, Santos, Sole-Cava, Soares, 2008.

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Desta forma surge natural a aplicação de processos de análise espacial a temas relacionados

com a conservação da natureza, como a avaliação da qualidade de habitats para espécies

classificadas e das pressões sobre o ambiente natural, que pode levar à criação de mapas de

habitats potenciais ou de delimitação de unidades de conservação4.

Os processos de modelação geográfica permitem interpretar e compreender os fenómenos

naturais numa perspectiva espacial, tornando possível a avaliação das características e

capacidades do território em análise, bem como o estudo de cenários alternativos, duma forma

analítica através da informação geográfica5.

Existem diversas aproximações metodológicas de análise espacial e modelação geográfica em

conservação da natureza, nomeadamente estudos aplicados a situações específicas,

direccionados à definição de mapas de espécies e à avaliação de habitats e áreas classificadas.

A definição de estratégias e a criação de propostas de intervenção no âmbito do ordenamento,

nomeadamente no que diz respeito aos temas de conservação da natureza, torna-se assim

mais fácil, robusta e com critérios perfeitamente explicitados.

Imagem 1: Área de estudo.

4 Joost, 2006. 5 Gomes da Cruz, 2006.

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2. METODOLOGIA DE ANÁLISE ESPACIAL

2.1. Processos de análise espacial

Os processos de análise espacial integram um conjunto de fases e momentos distintos visando

o estabelecimento de um quadro sustentado de definição procedimental.

O esquema da Figura seguinte ilustra os grandes grupos de processos analíticos desenvolvidos

visando a definição de uma metodologia automática de geração de corredores ecológicos.

Figura 1: Esquema geral de processos de análise espacial.

2.2. Fluxogramas de análise espacial

No processo de desenho conceptual do modelo, foram primeiramente examinadas as fichas

que fazem parte do Plano Sectorial da Rede Natura 2000 (Volume III) do Instituto de

Conservação da Natureza, por forma a ter um conhecimento geral das referidas áreas. Com

base na análise destas fichas, foi definido um conjunto de espécies existentes nestas áreas (ou

potencialmente existentes numa óptica de possível reintrodução), cujo estatuto de protecção

e/ou cujas especificidades justificassem a definição de corredores de conexão entre as três

áreas em questão. Chegou-se assim a um grupo de sete espécies, incluídas no reino animal,

pertencentes às classes das aves, mamíferos e anfíbios: Águia de Bonelli Hieraaetus fasciatus,

Águia-cobreira Circaetus gallicus, Bufo-real Bubo bubo, Lagarto-de-Água Lacerta schreiberi,

Lince-ibérico Lynx pardinus, Lontra Lutra lutra, Morcego-de-ferradura-pequeno Rhinolophus

hipposideros.

Para cada espécie seleccionada foi realizada uma ficha-resumo na qual são referidas as

características principais de cada espécie, relativamente ao estatuto de protecção, à sua

distribuição, aos requisitos ecológicos e aos principais factores de ameaças. A selecção e a

definição das características e das necessidades de cada espécie foram auxiliadas pela leitura e

pela análise das Fichas de Caracterização Ecológica e de Gestão, que também fazem parte do

Plano Sectorial da Rede Natura 2000 (Volume II).

A título ilustrativo é apresentado o fluxograma de análise espacial para avaliação do potencial

de localização/movimentação da Águia de Bonelli.

CondiçõesBiofísicas

DadosEspécies

Análise

Avaliação

Modelo geográfico

Corredores

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Águia de Bonelli

Figura 2: Fluxograma de análise espacial para avaliação do potencial de localização/movimentação da Águia de Bonelli.

2.3. Geração de corredores ecológicos

Foram consideradas como ponto de partida e como ponto de chegada dos corredores as áreas

classificadas que já existem. Desta forma as áreas de partida e chegada serão as mesmas para

todas as espécies consideradas na análise; os corredores gerados para cada espécie serão

finalmente integrados gerando um corredor único.

A escala utilizada para a classificação e avaliação de todos os factores de

localização/movimentação foi de 0 a 10, onde o valor máximo significa a melhor qualidade

para a espécie em análise e o valor mínimo só se utilizará para casos de completa

incompatibilidade com a presença da espécie. Para cada espécie, o resultado da avaliação de

cada factor será combinado com o dos outros factores através da aplicação duma função

aditiva simples, na qual todos os factores terão a mesma ponderação.

Na sequência da aplicação das funções apresentadas para cada espécie, obtiveram-se como

resultado sete mapas de avaliação (um para cada espécie): estes mapas foram invertidos por

forma a obter-se mapas de custo/resistência, que descrevem de uma forma quantitativa o

custo de passagem de cada espécie em cada célula da área de estudo.

Foram calculados, com base no custo de passagem, três corredores ecológicos para cada

espécie, de forma a conectar as três áreas classificadas existentes na área de estudo.

Convert to Raster

Slope

Ocupação do solo

DEM Declive

Rede hidrográfica

Find distanceReclassify

Rede viária

Find distanceReclassify

Convert to Raster

Solo

Função de integraçãof (a,b,c,d,e)

a

b

c

d

e

Avaliação Águia de Bonelli

Aval Ocupação do solo

DistRede hidrográfica

Reclass DistRede hidrográfica

Dist Rede viáriaReclass DistRede viária

Aval Solo

AvaliaçãoAvaliação

AvaliaçãoAvaliação

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Figura 3: Fluxograma de análise espacial para geração dos corredores ecológicos.

Posteriormente à análise a nível de espécie, foi realizada a análise com base nos corredores:

ou seja, para cada par de áreas classificadas foram integrados os sete corredores relativos (um

por cada espécie), e foi definido um corredor geral de ligação entre aquelas duas áreas

classificadas. Os valores resultantes da definição destes corredores (que foram calibrados, com

base no número de espécies) também foram reclassificados em cinco classes qualitativas que

descrevem a aptidão geral do corredor relativamente ao conjunto de espécies. Resultam assim

três cartas, uma relativa ao corredor entre o Sítio da Costa Sudoeste e o Sítio de Monchique,

uma relativa ao corredor entre o Sítio de Monchique e o Sítio do Caldeirão e outra relativa ao

corredor entre o Sítio do Caldeirão e o Sítio da Costa Sudoeste, que se apresentam nas

páginas seguintes, juntamente com o resumo dos sete corredores que estão na base da sua

definição.

Cost Distance 1

SuperfícieCusto

Cost Distance 2

Área protegida 1

Área protegida 2

CorridorCorridor

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2.4. Resultados

Imagem 2: Corredores ecológicos parciais criados entre o Sítio do Caldeirão e o Sítio de Monchique.

Imagem 3: Corredor ecológico entre o Sítio do Caldeirão e o Sítio de Monchique.

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Imagem 4: Corredores ecológicos parciais criados entre o Sítio do Caldeirão e o Sítio da Costa Sudoeste.

Imagem 5: Corredor ecológico entre o Sítio do Caldeirão e o Sítio da Costa Sudoeste.

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Imagem 6: Corredores ecológicos parciais criados entre o Sítio de Monchique e o Sítio da Costa Sudoeste.

Imagem 7: Corredor ecológico entre o Sítio de Monchique e o Sítio da Costa Sudoeste.

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2.5. Avaliação de resultados

Podemos facilmente verificar como os corredores gerados são claramente influenciados pelas

diferenças entre as necessidades das diferentes espécies, nomeadamente no que diz respeito

ao corredor criado entre o Sítio da Costa Sudoeste e o Sítio do Caldeirão, que, provavelmente

devido ao seu maior comprimento, afasta-se mais da forma de corredor único que resultou nos

outros casos.

Relativamente aos corredores criados para as diferentes espécies, podemos verificar que eles

têm características comuns e características próprias. Por exemplo no que diz respeito aos

corredores gerados para a Águia de Bonelli Hieraaetus fasciatus e para o Bufo-real Bubo bubo

eles revelam claramente o facto que estas duas espécies preferem habitats mais acidentados,

com declive mais acentuado e de mais difícil acesso. Podemos facilmente verificar a diferença

entre os corredores gerados para estas duas espécies e os gerados para o Lagarto-de-Água

Lacerta schreiberi e para a Lontra Lutra lutra, que preferem habitats relacionados com a

presença de água. Os corredores gerados para as duas primeiras espécies afastam-se do curso

do rio Mira, para as zonas com altimetria mais elevada, enquanto os gerados para as segundas

acompanham o curso do rio.

Ainda podemos sublinhar como o corredor gerado entre o Sítio de Monchique e o Sítio do

Caldeirão para a Águia de Bonelli Hieraaetus fasciatus e para o Bufo-real Bubo bubo, também

pela mesma razão, percorre um caminho bastante mais comprido do que para as outras

espécies, procurando as zonas menos acessíveis e com maior declive.

3. PROCESSOS DE MODELAÇÃO EXPLORATÓRIOS

Um projecto de investigação deve integrar uma dimensão prospectiva e de experimentação.

Neste projecto, os resultados alcançados e as metodologias testadas suscitaram um elevado

número de questões e de novas ideias de desenvolvimento do estudo realizado.

São de seguida descritos dois estudos complementares efectuados: um decorrente da

exploração directa da metodologia base desenvolvida; outro recorrendo a uma abordagem

diversa explorando uma extensão de software de última geração especializada na geração e

avaliação de corredores ecológicos.

3.1. Geração de corredor único

Procedeu-se à criação de um corredor único na área de estudo, através da integração dos três

corredores finais obtidos. É de sublinhar que este não é propriamente um corredor ecológico

de ligação entre duas áreas classificadas como os precedentemente criados, porque na sua

base não existem um só ponto de partida e um só ponto de chegada. De facto o resultado vem

confirmar as dúvidas relativamente a esta integração final: os valores resultantes não

estruturam um verdadeiro corredor, mas sim uma mancha maior cujos valores mais elevados

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se situam nas áreas intermédias.

Imagem 8: Corredor ecológico resultado da integração final.

3.2. Avaliação dos corredores gerados

Visando proceder a uma avaliação exploratória decidiu-se efectuar uma avaliação dos

resultados alcançados através da extensão CorridorDesign desenvolvida por Paul Beier, Dan

Majka e Jeff Jenness em 2008. Neste caso específico foi avaliada a qualidade do corredor

criado para ligar o Sítio da Costa Sudoeste e o Sítio do Caldeirão. A escolha prendeu-se apenas

com o facto de este corredor ser, entre os três gerados, o de extensão maior, possibilitando

assim um conjunto maior de situações.

A aplicação da função P – Patch Analysis efectua-se através da escolha das duas áreas a

interligar e do corredor. É preciso sublinhar que, na sequência de diferentes experiências

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aplicativas desta ferramenta, se verificou que, para que se obtenha um resultado da aplicação

é preciso que o corredor definido seja constituído por uma área com continuidade espacial

entre as duas áreas classificadas. Ou seja neste caso foi necessário proceder-se a uma nova

reclassificação: isto porque, com base nos resultados da avaliação efectuada, o corredor criado

entre o Sítio da Costa Sudoeste e o Sítio do Caldeirão, constituído por áreas com diferentes

graus de aptidão, inclui zonas que pertencem às duas primeiras classes de aptidão, sem

continuidade espacial na classe de aptidão mais elevada. Graças à nova reclassificação obteve-

se um corredor constituído por apenas uma classe, capaz de criar uma continuidade espacial

entre as duas áreas classificadas.

Figura 4: Aplicação da Patch Analysis ao corredor entre o Sítio da Costa Sudoeste e o Sítio do Caldeirão.

O resultado obtido pela aplicação é constituído por um segmento, interno ao corredor, cujas

características são apresentadas num relatório.

De seguida foi aplicada a função B – Bottleneck Analysis, cujo objectivo é avaliar a largura do

corredor gerado, nomeadamente no que diz respeito aos potenciais pontos mais estreitos, que

poderão ser prejudiciais à passagem de algumas espécies que, por diferentes razões,

necessitam de corredores mais largos.

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Figura 5: Aplicação do Bottleneck Analysis ao corredor entre o Sítio da Costa Sudoeste e o Sítio do Caldeirão.

A aplicação desta ferramenta gera um novo segmento de conexão. O resultado mais

interessante desta aplicação é constituído por um gráfico que representa a largura do corredor

a avaliar, nomeadamente através da definição de um limite (neste caso de 800m) e da

representação da largura relativamente ao valor do limite. Da mesma forma, da aplicação

resulta a criação de uma representação geográfica dos pontos de estrangulamento

(relativamente ao limite definido) no corredor.

Figura 6: Resultados da aplicação da Bottleneck Analysis ao corredor entre o Sítio da Costa Sudoeste e o Sítio do Caldeirão.

Com base nesta aplicação foi produzida uma carta de síntese que representa os dois

resultados obtidos, bem como o gráfico de avaliação dos pontos mais estreitos do corredor.

Podemos observar como as duas ferramentas produzam dois corredores diferentes, devido às

hipóteses de base que a própria extensão aplica nas duas ferramentas: percurso mais curtos

para a Patch Analyses, percurso central relativamente à largura do corredor para a Bottleneck

Analysis. Assim podemos concluir que a parte central (no sentido longitudinal) do corredor

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avaliado é a que apresenta maiores problemáticas, nomeadamente no que diz respeito às

curvas e a passagem mais estreitas.

Imagem 9: Resultado da avaliação do corredor ecológico.

4. NOTA FINAL

Na realização deste trabalho foram utilizadas diversas ferramentas de modelação geográfica,

integrando ferramentas inovadoras criadas especificamente para aplicações no âmbito da

conservação da natureza.

A base do trabalho é contudo mais metodológica que de desenvolvimento aplicacional,

permitindo a definição de um método que pode ser aplicado a diferentes aproximações

teóricas. Como já referido, todas as escolhas efectuadas no trabalho (quais factores adoptar, a

avaliação a realizar para cada factor, a escala a utilizar e o tipo de função) poderão ser

alterados e/ou adaptados caso as condições específicas da área em análise o necessitem.

De facto é importante sublinhar que, para que os resultados sejam robustos sob todos os

pontos de vista, a avaliação precisa de ser realizada por uma equipa multidisciplinar,

integrante especialistas nas espécies a considerar, bem como nas características da área em

questão; a avaliação assim realizada permite ter um conhecimento amplo e correcto dos

valores e das espécies que melhor caracterizam a área em questão.

Neste trabalho, este aspecto não foi aprofundado, considerando a sua essência metodológica

exploratória. Desta forma os resultados alcançados terão que ser considerados apenas sob um

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ponto de vista ilustrativo da metodologia descrita, não sendo representativos do ponto de vista

da gestão do território em questão.

Através da modelação de análise espacial desenvolvida, a avaliação das problemáticas

relacionadas com as temáticas da conservação e dos factores relevantes para a conservação

da natureza na área de estudo, permitiu a definição de corredores ecológicos baseados em

critérios científicos, constituindo um contributo inovador de larga aplicabilidade.

Considera-se ainda que o trabalho desenvolvido permite abrir novas perspectivas de

desenvolvimentos futuros, relacionados com o aprofundamento, aperfeiçoamento e

generalização da metodologia aplicada.

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