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4357 DEFINIÇÃO DA PAUTA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E (AUTO)CRIAÇÃO DO PROCESSO OBJETIVO. DURATION OF LAWSUITS OF ABSTRACT JUDICIAL REVIEW BEFORE THE BRAZILIAN SUPREME FEDERAL COURT AND (AUTO)CREATION OF THE "OBJECTIVE PROCESS" Dimitri Dimoulis Soraya Regina Gasparetto Lunardi RESUMO O presente estudo analisa o fluxo de processos de controle abstrato de constitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal. Após reflexões iniciais sobre as formas de configuração do processo objetivo e, em particular, sobre os filtros criados pela/para a justiça constitucional (mecanismos de seletividade), é realizada uma pesquisa estatística do andamento de Ações diretas de inconstitucionalidade. Esse estudo, combinado com a pesquisa e apresentação de outros dados disponíveis, demonstra a particular importância das medidas cautelares que tem como resultado a postergação da decisão final. Mostra também o poder jurídico e político do Relator para determinar o momento de julgamento de cada processo de controle concentrado. PALAVRAS-CHAVES: PALAVRAS-CHAVE: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE – DURAÇÃO DO PROCESSO – MEDIDA CAUTELAR - PROCESSO CONSTITUCIONAL ABSTRACT Abstract: This paper analyses the duration of lawsuits of abstract judicial review before the Brazilian Supreme Federal Court (Supremo Tribunal Federal). After initial reflections on the forms of configuration of the “objective process” (abstract judicial review), we analyze the “filters”, i.e. the selectivity mechanisms created for/by the Constitutional Courts. Statistical analysis of the “Ações diretas de inconstitucionalidade” (Direct Action of Unconstitutionality) shows the importance of the preliminary injunction, that causes the delay of the final decision, as well as the legal (and political) power of the Rapporteur of each case (a member of the Court) who determines the moment for judgment of each case of abstract judicial review. Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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DEFINIÇÃO DA PAUTA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E (AUTO)CRIAÇÃO DO PROCESSO OBJETIVO.

DURATION OF LAWSUITS OF ABSTRACT JUDICIAL REVIEW BEFORE THE BRAZILIAN SUPREME FEDERAL COURT AND (AUTO)CREATION OF

THE "OBJECTIVE PROCESS"

Dimitri Dimoulis Soraya Regina Gasparetto Lunardi

RESUMO

O presente estudo analisa o fluxo de processos de controle abstrato de constitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal. Após reflexões iniciais sobre as formas de configuração do processo objetivo e, em particular, sobre os filtros criados pela/para a justiça constitucional (mecanismos de seletividade), é realizada uma pesquisa estatística do andamento de Ações diretas de inconstitucionalidade. Esse estudo, combinado com a pesquisa e apresentação de outros dados disponíveis, demonstra a particular importância das medidas cautelares que tem como resultado a postergação da decisão final. Mostra também o poder jurídico e político do Relator para determinar o momento de julgamento de cada processo de controle concentrado. PALAVRAS-CHAVES: PALAVRAS-CHAVE: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE – DURAÇÃO DO PROCESSO – MEDIDA CAUTELAR - PROCESSO CONSTITUCIONAL

ABSTRACT

Abstract: This paper analyses the duration of lawsuits of abstract judicial review before the Brazilian Supreme Federal Court (Supremo Tribunal Federal). After initial reflections on the forms of configuration of the “objective process” (abstract judicial review), we analyze the “filters”, i.e. the selectivity mechanisms created for/by the Constitutional Courts. Statistical analysis of the “Ações diretas de inconstitucionalidade” (Direct Action of Unconstitutionality) shows the importance of the preliminary injunction, that causes the delay of the final decision, as well as the legal (and political) power of the Rapporteur of each case (a member of the Court) who determines the moment for judgment of each case of abstract judicial review.

Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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KEYWORDS: KEYWORDS: CONSTITUTIONAL PROCESS - DURATION OF THE LEGAL PROCESS – JUDICIAL REVIEW –PRELIMINARY INJUNCTION

1. Introdução[1]

Ponto de partida do estudo constitui a concepção do processo judicial enquanto seqüência ordenada de atos previstos em normas vigentes no intuito de resolver conflitos de maneira célere, civilizada, racional, previsível, propiciando possibilidades de participação dos envolvidos no processo.[2]

A referência à “civilidade”, “celeridade”, “racionalidade”, “previsibilidade” e “participação-abertura” do processo deve ser feita com duas ressalvas:

a. Não podemos ignorar os conflitos internos, em particular o conflito entre o imperativo da celeridade e a necessidade de decisão tomada de maneira fundamentada e com a devida participação dos interessados, exigindo considerável dispêndio de tempo.

b. As referências a finalidades do processo não podem permanecer como simples afirmações “de princípio”. É necessário analisar se e como são perseguidas essas finalidades em determinados ordenamentos jurídicos e em que medida a prática processual merece tais predicados. Para tanto são necessários estudos empíricos, de cunho prevalentemente quantitativo, que após a devida interpretação, permitem um melhor conhecimento do sistema de justiça, verificando suas formas de organização e seu efetivo funcionamento.

Sabemos que o processo judicial além de um conjunto de regras e uma seqüência de atos que devem perseguir certas finalidades, é um espaço social no qual são elaboradas estratégias e são exercidos poderes das partes e, com maior intensidade, dos julgadores. Assim sendo, só a análise empírica da atuação dos participantes permite chegar a uma caracterização da estrutura do processo que não seja superficial (mera descrição de normas vigentes sem pensar em sua interpretação concreta e grau de eficácia) nem apologética-legitimadora (exaltação de “princípios” e demais “virtudes” do processo, sem pensar em sua realidade).

O presente estudo analisa o fluxo de processos de controle abstrato de constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, tentando encontrar regularidades e tendências que permitem responder com embasamento real a pergunta das finalidades desse tipo de processo.

2. Mecanismos de filtragem processual na justiça constitucional

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O controle abstrato de constitucionalidade pelo Poder Judiciário tem conseqüências de particular abrangência e relevância, podendo provocar o afastamento definitivo de leis e outros textos normativos do ordenamento jurídico. Isso gera a necessidade de limitar o acesso à justiça, permitindo controlar o volume de processos e garantindo certo grau de estabilidade normativa.

A doutrina identifica essa necessidade (e realidade) de limitação, referindo-se à justiça constitucional como bem escasso.[3] Entre as formas de filtragem institucional-normativo do acesso à justiça constitucional indicamos as seguintes.

Legitimidade. A limitação do acesso pode ser dada mediante limitação da legitimidade ativa para impetrar ações de controle concentrado. Um exemplo oferece a Constituição Francesa que permite o controle de constitucionalidade de lei ordinária somente depois do pedido do Presidente da República, do Primeiro Ministro, dos Presidentes das duas casas legislativas ou de um grupo de, no mínimo, sessenta senadores ou sessenta deputados.[4] Dessa maneira somente integrantes do Poder Legislativo e a cúpula do Poder Executivo podem promover o controle de constitucionalidade.

Duplo controle de admissibilidade. As alegações de inconstitucionalidade são inicialmente controladas pelo juiz da causa que avalia a oportunidade de provocar decisão do tribunal constitucional. Isso ocorre na Itália,[5] onde os juízes desempenham esse papel, sendo alcunhados de “porteiros” da Corte constitucional. Impedem o acesso à Corte Constitucional se considerarem que a alegação não é fundamentada.[6]

Discricionariedade do julgador. O Tribunal constitucional não se submete ao princípio da indeclinabilidade do juízo: possui discricionariedade para decidir se julgará o caso. Nos EUA, a Suprema Corte não possui a obrigação de se pronunciar sobre recursos que questionam a constitucionalidade de leis (writ of certiorari). Os recursos são avaliados por assessores dos juízes que redigem relatórios, recomendando ou não a admissão do caso (“cert pool”). De acordo com regra costumeira, um pedido é levado ao plenário se quatro juízes votarem a favor da admissão, sendo que, na prática, os juízes seguem a recomendação dos assessores.[7] A decisão sobre a admissibilidade é irrecorrível.[8] Assim sendo, a Suprema Corte torna-se verdadeira “Senhora” de seu trabalho e isso explica porque nos últimos anos são julgados, no mérito, menos de 90 recursos por ano entre os aproximadamente 9.000 que chegam à Corte.[9]

Cabe esclarecer que esse mecanismo de intensa seletividade não impede que os demais tribunais dos EUA apreciem alegações de inconstitucionalidade. Trata-se, porém, de um claro exemplo das limitações impostas ao acesso à justiça constitucional quando se exerce um controle com amplos efeitos vinculantes, como ocorre no caso da Suprema Corte dos EUA.[10]

Objeto de controle. Há a possibilidade de isentar do controle de constitucionalidade determinadas categorias de atos normativos por serem politicamente “sensíveis”, de importância secundária ou por qualquer outro motivo. Isso ocorre no Brasil mediante explícitas previsões constitucionais, estipulando, por exemplo, a impossibilidade de pedir a fiscalização de leis municipais mediante ADIN junto ao STF.[11] Ocorre também mediante construções do próprio STF, como a negação de fiscalizar leis anteriores à promulgação da CF ou leis de “efeito concreto”.[12]

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Definição da pauta. Trata-se da possibilidade de o Tribunal constitucional (ou alguns de seus integrantes ou formações) determinar de maneira amplamente discricionária a ordem de julgamento, agilizando ou dificultando o efetivo acesso à justiça constitucional. Essa forma de filtragem, que está no centro do presente estudo, relaciona-se com a questão da celeridade, da previsibilidade e da racionalidade no processo constitucional. Formulada de maneira simples a pergunta é: Quem define a “pauta” de julgamento da justiça constitucional, com base em quais critérios e com quais conseqüências jurídicas e políticas?

Quando se pensa nos critérios de determinação da ordem de julgamento surgem, do ponto de vista lógico, duas possibilidades extremas.

Primeiro, julgar os processos na exata ordem de sua chegada (“modelo da fila de espera”). Não seria permitido instruir o processo n. 2 antes do término da instrução do processo n. 1 e assim por diante. Tal solução é inviável por uma série de razões, entre as quais, encontra-se a urgência e relevância de determinados casos ou sua complexidade que impõe, respectivamente, encurtar ou alongar o tempo do processo.

Outro sistema de determinação da pauta seria o puramente aleatório, onde se determina a ordem de julgamento mediante sorteio (“modelo da loteria”). Tal sistema oferece a todos as mesmas chances matemáticas de julgamento ágil. Mas apesar disso dificilmente se justifica, pois cria o risco de duração demasiadamente longa de determinados processos, podendo causar sérios danos e mesmo impedindo o acesso à justiça. Com efeito, levando em consideração a contínua entrada de novos processos não pode ser garantido com certeza matemática que determinado processo será julgado um dia!

Na perspectiva dos princípios constitucionais que regem o processo, a elaboração de critérios para a definição da pauta deve levar em consideração a celeridade processual, princípio introduzido na Constituição Federal em 2004 (art. 5º, inciso LXXVI), mas que, na verdade, sempre esteve no centro das preocupações da doutrina processualista, sendo deduzido do imperativo do devido processo legal.[13] Nessa perspectiva, a definição da pauta deve ser guiada pelo critério da ordem de chegada dos processos (“fila”), permitindo exceções, em nossa opinião, em duas situações.

Primeiro, quando a flexibilização favorece a celeridade processual global e, segundo, se houver razões imperiosas para introduzir modificações na ordem de julgamento, tais como a urgência de certas categorias de processos ou a conveniência de julgar simultaneamente processos relacionados entre si ou idênticos na substância. Esse seria uma combinação dos dois modelos extremos que pode ser denominada de “modelo da fila flexibilizada” e faz lembrar o sistema adotado nos caixas de supermercados. Os clientes são normalmente atendidos na ordem de chegada, dando, porém, acesso prioritário a pessoas com necessidades especiais e a compradores de poucos itens, no intuito de garantir um atendimento mais ágil e adaptado às diferentes necessidades dos clientes.

Do ponto de vista normativo, a ordem de julgamento pode ser determinada por lei, por normas internas do Poder Judiciário ou pode ser deixada à discrição da presidência, do relator ou de algum órgão colegiado. Quando a determinação da pauta depende de decisão discricionária dos julgadores torna-se necessário analisar a eventual

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cristalização de padrões de atuação, assim como refletir sobre as conseqüências dessa liberdade dos julgadores.

Desconhecemos estudos que problematizem e pesquisem o tema da definição da ordem de julgamento (“pauta”) no processo judicial, refletindo sobre as dimensões jurídico-políticas da variável “tempo”.[14] Em particular as publicações nacionais dedicadas ao estudo do processo constitucional não fazem referências aos critérios adotados para definir a ordem de julgamento, apesar de esmiuçar as etapas e os elementos processuais.[15] Isso é digno de nota, pois a reflexão sobre o exercício do poder de determinar a pauta possui uma evidente dimensão política no âmbito do processo constitucional. Quem exerce, de iure ou de facto, o poder de determinar a ordem de julgamento de ações, cujo resultado pode ser o afastamento de atos normativos, influencia, de maneira decisiva, a vida econômica e política. Uma célere declaração de inconstitucionalidade pode inviabilizar um projeto político, sendo que a mesma decisão ocorrida anos ou décadas depois normalmente tem efeitos muito mais limitados.

3. Dados normativos sobre a ordem de julgamentos das Ações Diretas de Inconstitucionalidade pelo STF

Pesquisaremos aqui os critérios de definição da pauta para julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN). Escolhemos a ADIN por duas razões. Primeiro, por ser a ação de controle abstrato-concentrado mais efetiva e intensivamente utilizada no Brasil. Na vigência da Constituição de 1988 foram interpostas mais de 4.000 ADINs. Em comparação, houve 141 Argüições de Descumprimento de Preceito Fundamental entre dezembro de 1999 e junho de 2008, das quais só duas foram julgadas procedentes. Menor ainda foi o número de Ações Declaratórias de Constitucionalidade: 20 ações interpostas entre agosto de 1993 e junho de 2008.[16]

Segundo, porque o número das ADINs é relativamente limitado, permitindo um estudo quantitativo completo, algo impossível para o gigantesco volume de decisões do STF em sede de controle concreto (mais de 1.000.000 de processos protocolados ao STF na década 1998-2007).[17]

A definição da ordem de julgamento das ADINs deve seguir regras fixadas no Regimento interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF). Trata-se de texto normativo editado pelo STF em 1980 e que o próprio Tribunal considerou recepcionado pela Constituição Federal de 1988,[18] apesar das fortes dúvidas dogmáticas a esse respeito.[19] Seja como for, o RISTF é a única referência normativa nesse âmbito, pois faltam previsões sobre a ordem de julgamento na Constituição e na legislação ordinária.

O RISTF inclui as seguintes regras:

- cabe ao Relator pedir dia para julgamento dos feitos “nos quais estiver habilitado a proferir voto” (art. 21, X);

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- estipula-se prazo de 30 dias “para o visto do Relator”, não se aplicando essa limitação em caso de “acúmulo de serviço” (art. 111, inciso III e caput);

- as ações diretas de inconstitucionalidade[20] encontram-se entre as classes processuais que têm “prioridade” para julgamento no Plenário (art. 145 caput e inciso VIII).

Esses dispositivos indicam que não há efetiva limitação da possibilidade do relator de escolher o tempo de apresentação do relatório e de seu voto. Como na prática sempre se verifica “acúmulo de serviço” há motivo legal para que o prazo de 30 dias não seja mantido. Uma consulta do andamento processual das ADINs indica que são raríssimos os casos nos quais o relator respeita tal prazo. Além disso, o RISTF permite que o relator decida quando está “habilitado” para julgar, sem que seja imposta limitação temporal ou obrigação de respeitar a ordem de distribuição dos processos. Finalmente a indicação da “prioridade” das ADINs permanece sem relevância prática, pois uma longa lista de ações e recursos julgados pelo STF são igualmente prioritários. Dito de outra maneira, o RISTF delega ao Relator a competência de determinar a pauta. Certamente vale o imperativo da celeridade processual, mas isso não indica o prazo para julgamento nem oferece meios legais para impor que o relator apresente seu relatório e voto em determinado processo.

Essa tácita delegação do poder de determinar a pauta contrasta claramente com o cuidado que o RISFT teve ao estabelecer, de maneira taxativa, limites temporais para a atuação dos demais participantes do processo objetivo. O art. 170 RISTF prevê que após a propositura da representação de inconstitucionalidade (hodiernamente: ADIN) são solicitadas informações à autoridade que editou o ato impugnado e, eventualmente, ao Congresso Nacional ou à Assembléia Legislativa interessada, devendo essas informações ser prestadas no prazo de 30 dias. Da mesma forma, o Procurador-Geral da República deve se manifestar no prazo de 15 dias. Mas do momento em que as informações e manifestações são recebidas e os autos encontram-se conclusos ao Relator o RISTF não estipula limites temporais.

A Lei 9.868 que disciplinou em 1999 o processo de julgamento da ADIN (e da ADECON) também estabeleceu uma série de prazos para a atuação dos participantes do processo objetivo, recepcionando, de forma geral, os referidos dispositivos do RISTF. A autoridade que editou o ato impugnado tem prazo de 30 dias para prestar informações (art. 6º § único), devendo, em seguida, se manifestar, sucessivamente, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, cada um no prazo de 15 dias (art. 8º). O prazo de 30 dias é estipulado também para o oferecimento de informações, perícia ou audiência pública (art. 11). Mas no que diz respeito à atuação do próprio relator a lei é omissa, ao contrário do que ocorre em outros países.[21] Seu art. 9º prevê tão somente que “vencidos os prazos do artigo anterior, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento”. Isso corrobora o poder discricionário do relator em relação à determinação do momento do julgamento.

Apresentaremos em seguida dados estatísticos que indicam as conseqüências práticas dessa liberdade do relator.

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4. Dados estatísticos sobre a duração dos processos de controle abstrato junto ao STF

A ADIN n. 1 foi distribuída em 6-10-1988; a ADIN n. 4.068 em 14-4-2008. Nesse universo de mais de quatro mil ações encontramos fortes disparidades na duração do processo. Indicamos a seguir alguns dados extremos.

A ADIN 3.685 que questionava a aplicação de Emenda constitucional sobre alianças partidárias foi distribuída em 9-3-2006 e o Plenário tomou a decisão definitiva em 23-3-2006, mostrando uma celeridade inusitada no processo constitucional brasileiro e que internacionalmente talvez só rivalize com a rapidez decisória do Conselho Constitucional francês.

No outro extremo encontramos uma série da ADINs cujo processo se caracteriza pela excessiva duração. Atualmente as “decanas” entre as ADINs pendentes são a n. 73, distribuída em 7-8-1989, questionando a constitucionalidade de decreto estadual que regulamenta questões ambientais; a n. 94, distribuída em 5-10-1989, questionando artigos da Constituição da Rondônia sobre a carreira nas Procuradorias daquele Estado e a n. 127, distribuída em 31-10-1989 e questionado dispositivos da Constituição de Alagoas.

No primeiro caso, o Plenário do STF deferiu plenamente o pedido de liminar dois dias após a distribuição; no segundo caso, o pedido de liminar foi deferido parcialmente sete dias após a distribuição; no terceiro caso houve deferimento parcial do mesmo pedido em 20 dias. Passados 19 anos, o STF não decidiu definitivamente sobre a constitucionalidade, vigorando ainda as suspensões “cautelares” dos dispositivos questionados.

Um outro grupo é formado pelas ADINs n. 136, distribuída em 14-11-1989, n. 179 e 185, distribuídas em 1-2-1990, todas questionando leis estaduais de pouca relevância política e social. Houve sucessivas substituições do relator em razão da aposentadoria de Ministros e até hoje não foi realizado o julgamento definitivo.

Indiquemos finalmente que, na ADIN n. 494, interposta em 29-4-1991 para questionar dispositivos de lei complementar estadual, foi concedida liminar em 16-8-1991 suspendendo a eficácia de um artigo da lei e após sucessivos pedidos de vista (entre os quais o do Min. Nelson Jobim entre 19-12-1997 e 29-3-2006), ainda não houve decisão. Não foi diferente a trajetória processual da ADIN n. 1.648. Distribuída em 7-8-1997, houve pedido de vista do Procurador-Geral da República que se estendeu por quase três anos e, em seguida, do Min. Nelson Jobim, por dois anos, não havendo, até hoje, decisão definitiva.

Nesses casos a duração excessiva do processo se relaciona com dois fatores:

O primeiro é a não apresentação do relatório em prazo razoável. O segundo, evidenciado nos últimos casos, relaciona-se com a falta de limitação temporal para o pedido de vista. Sabemos que essa prática foi definitivamente erradicada em 2003 após regulamentação interna do STF que limitou drasticamente a duração do pedido de vista.[22] Observa-se também que muitas ADINs de excessiva duração questionam atos

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normativos de limitada transcendência, deixando supor que foram preteridos diante de casos de maior relevância. Finalmente chama atenção a relevância processual da decisão cautelar que, em muitos casos, acaba se tornando, de fato, definitiva.

As fortes discrepâncias na duração do processo, constatadas aqui de maneira ainda superficial, justificam uma pesquisa quantitativa no intuito de verificar se há regularidades na ordem de julgamento de processos. Uma primeira tentativa nesse sentido constitui a pesquisa que apresentaremos em seguida.

4.1. Observações metodológicas

Realizamos uma pesquisa quantitativa utilizando dados disponíveis no site oficial do STF (www.stf.gov.br). Consultamos, em particular, o andamento processual das ADINs e, em muitos casos, a íntegra das decisões e da petição inicial. Data limite para as informações colhidas foi o dia 15 de abril de 2008. Analisamos o andamento processual de 100 ADINs investigando um grupo que corresponde ao 2,5 % da totalidade das ADINs interpostas, porcentagem pequena, mas não desprezível.

Optamos por analisar o andamento processual das ADINs de 2.000 a 2.099, todas distribuídas em 1999, por três razões. Primeiro, considerando que, por terem sido interpostas em 1999 teriam, em sua grande maioria, transitado em julgado, permitindo a análise completa de sua trajetória processual (algo que, como veremos, não se verificou). Segundo, por terem sido julgadas no período de consolidação da ADIN, tendo-se formado uma tradição decenal. Terceiro, por terem sido praticamente todas as ADINs julgadas sob a autoridade da Lei 9.868 de 1999 que disciplinou o processo constitucional.

Optamos por analisar as ADINs serialmente por duas razões. Em primeiro lugar, porque a escolha de ADINs de maneira randômica, conforme opção adotada em outro estudo do fator “tempo” nas ADINs,[23] não nos parece indicado. O método randômico só permite inferências válidas se o universo da pesquisa for razoavelmente homogêneo. Caso contrário, cria a ilusão de representatividade, em razão de seu caráter aleatório, mas não garante que espelhará a real disparidade dos elementos que compõem o universo de pesquisa.[24] Ora, as ADINs, apesar da aparência linear, apresentam grande diversidade na natureza e origem da norma impugnada assim como na importância política e econômica do litígio. Uma ADIN que questiona dispositivo de lei estadual que lesa interesses salariais de limitado grupo de funcionários não é comparável com ADIN que impugna a alíquota do imposto de renda. Também é comum o fenômeno de ADINs que questionam os mesmos dispositivos, aumentando injustificadamente as chances de sua inclusão na amostra randômica.

Em segundo lugar, quando o universo de pesquisa é limitado aconselha-se fazer o esforço de realizar um levantamento completo, evitando os riscos de inferência inválida em razão de distorções causadas pelo método de amostragem.[25] O presente estudo

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parte da constatação da necessidade de um estudo do andamento de todas as ADINs. A limitação ao estudo de 100 ADINs indica seu caráter “exploratório”, cuja finalidade é formular reflexões e propor um método de pesquisa, no intuito de seu aperfeiçoamento para aplicação em futuro estudo que englobará todas as ADINs interpostas.

Observamos, finalmente, que um estudo completo das estratégias de definição da pauta não deve se limitar à abordagem quantitativa. O ideal seria analisar as características e circunstâncias de cada ADIN para verificar quais fatores de cunho político e econômico influenciam a determinação do tempo de julgamento. Será que o Tribunal posterga decisões em casos de particular relevância? Ou, ao contrário, atribui menor atenção a casos de repercussão limitada, por exemplo, a impugnações de normas estaduais? Será que a identidade do requerente influencia o andamento do processo? A pertença da norma a certo ramo do direito influencia a ordem de julgamento, havendo, por exemplo, prioridade de normas tributárias e sendo relegadas em segundo plano normas penais ou trabalhistas? Tais perguntas só podem ser respondidas com base na análise qualitativa dos elementos de cada processo, enriquecendo nosso entendimento sobre as determinantes do poder discricionário do relator em definir a ordem de julgamento.

4.2. Resultados da pesquisa

4.2.1. Duração do processo

Para analisar a duração do processo se faz necessário analisar separadamente as ADINs nas quais houve decisão liminar.

Nas ADINs com pedido de liminar indeferido pelo Relator ou pelo Pleno (24 casos), a liminar foi apreciada no prazo médio de 3,5 meses.[26] Nesses casos, a duração do processo até o trânsito em julgado foi de, em média, 76 meses, ou seja, um pouco mais de seis anos.[27] Como há ainda muitos processos não decididos definitivamente, essa média aumenta com o passar do tempo.

Nos casos de deferimento da liminar (27), o prazo médio para apreciação foi de 2,5 meses, sendo menor do que nos casos de indeferimento. Nesse grupo, a duração total do processo foi de 69 meses, sendo também menor do que nos casos de indeferimento da liminar.

A menor duração dos processos com deferimento da liminar pode indicar uma prática de seletividade no sentido de que se dá preferência ao julgamento de casos de inconstitucionalidade flagrante. Mas essa hipótese só pode ser confirmada mediante estudo completo do andamento processual das ADINs.

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Somando os processos nos quais houve decisão em sede liminar, temos uma duração média para apreciação da liminar[28] de aproximadamente três meses;[29] a duração média do processo chega a 74 meses (um pouco mais de 6 anos).

Em 49 dos 100 processos não houve decisão em sede cautelar. Em 4 casos não foi formulado pedido de liminar;[30] em 3 casos tratou-se de ADIN por omissão,[31] na qual não é admitido pedido de liminar, conforme orientação jurisprudencial.[32] Nos demais 42 casos o pedido de liminar não foi apreciado pelo STF por variadas razões processuais, em particular devido à perda de objeto ou à falta de legitimidade.

Nos processos sem decisão liminar, a duração média do processo até o trânsito em julgado foi de 35 meses (aproximadamente três anos).[33] Nesse grupo também haverá aumento da média na medida em que findarem os processos ainda pendentes. Mas impressiona o fato de a duração média do processo cair pela metade em comparação com os processos com decisão em sede liminar.

Tal situação autoriza a tese de que a apreciação da liminar funciona como válvula de escape da pressão para solução do caso. Independentemente do resultado da liminar, o processo em que foi dada uma resposta substancial é relegado a uma “segunda fila de espera”, dobrando o tempo de sua duração.[34] Quando, ao contrário, não há decisão em sede liminar, o Tribunal costuma decidir em prazo muito mais curto. Isso oferece uma indicação da lógica de construção da pauta que seleciona os processos com base no critério da necessidade de decisão dentro de um prazo razoável.

Isso indica a relevância processual do julgamento cautelar no processo objetivo. Cabem a esse respeito duas observações.

- A afirmação da possibilidade jurídica de medidas cautelares no controle abstrato deu-se em razão de autocriação processual do STF[35] que, em seguida, foi recepcionada pela Constituição e regulamentada pelo legislador ordinário.[36] Tanto a nossa pesquisa como especial estudo sobre o tema[37] indicam que o julgamento liminar tem grande relevância para a administração do fluxo de ADINs pelo STF.

Sabe-se que as petições iniciais de ADINs quase sempre formulam pedido de suspensão cautelar da vigência do ato normativo impugnado. Das 3.650 ADINs interpostas entre outubro de 1988 e janeiro 2006 esse pedido estava presente em 87% dos casos (3.185 ADINs).[38] Na nossa pesquisa, das 97 ADINs genéricas não houve pedido de liminar em 4 casos. Mas constatamos que, freqüentemente, o STF não chega a apreciar o pedido de cautelar. Na nossa pesquisa houve decisão em sede cautelar em 51 casos e o pedido não foi apreciado em 42 processos. Isso significa que o STF estabelece um filtro de acesso bastante eficiente, facilmente manipulável e pouco visível, selecionando os casos nos quais haverá decisão (cautelar) em curtíssimo prazo.

- A utilização das liminares como ferramenta para administrar o fluxo das ADINs parece estar em declínio nos últimos anos. Após o surgimento da possibilidade de remeter diretamente ao plenário a decisão sem apreciar a liminar,[39] diminuiu de maneira considerável o número de liminares julgadas no mérito. Calculou-se que, até 2002, 62% dos pedidos de cautelar nas ADINs recebiam julgamento de mérito; a porcentagem caiu para 8% após 2002.[40] Temos aqui uma mudança nas práticas da Corte apontada por integrantes do próprio STF: “ultimamente, para evitar verdadeiro

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duplo julgamento, vem-se acionando, nas ações diretas de inconstitucionalidade, o artigo 12 da Lei 9.868 de 1999, partindo-se para o julgamento definitivo da ação”.[41]

Seria necessária uma análise mais detida para determinar o exato papel do julgamento cautelar e refletir sobre as causas das mudanças. Mas fica desde já claro que ocorrem significativas mudanças nas construções que determinam a seletividade processual.

Na perspectiva da configuração racional e previsível do processo objetivo deve ser saudada a tendência de minimizar os julgamentos cautelares no controle abstrato. Isso ocorre por razões teóricas, pois é impossível aplicar os requisitos de concessão de medida cautelar no processo objetivo, em particular porque há presunção de constitucionalidade, a urgência em impedir a constitucionalidade é igual em todos os casos e o risco de lesão de interesses subjetivos não deveria ser relevante no processo objetivo.[42]

Em paralelo, há razões eminentemente práticas que desaconselham a decisão liminar. Caso a liminar vigore por curto prazo sendo logo seguida por uma decisão definitiva, sua concessão é contraprodutiva por dois motivos. Primeiro, porque se corre o risco de ser prolatada uma segunda decisão pelo mesmo tribunal, em curto espaço de tempo e em sentido contrário. Se o STF concede a liminar e poucos meses depois indefere o pedido (e vice-versa) a legitimidade de suas decisões pode ficar abalada. Segundo, porque, ao invés de o STF decidir duas vezes sobre o mesmo pedido, é preferível “economizar” o tempo dedicado à preparação da decisão liminar e decidir com maior rapidez definitivamente.

Caso a liminar for destinada a vigorar por longo período, como costuma ocorrer na prática do STF onde encontramos liminares em ADINs vigorando há quase duas décadas, cria-se uma situação extremamente problemática. Se o STF tiver confirmado em sede liminar a constitucionalidade das normas impugnadas, entrará em indesejável contradição se proclamar sua inconstitucionalidade anos ou décadas depois, deixando claro que a construção da nulidade, num caso como esse, gerando efeitos ex tunc (para o passado eliminando todos os efeitos produzidos pela norma) criaria uma grave insegurança jurídica.

Além disso, a declaração da inconstitucionalidade em sede de cautelar, que depois viesse a ser julgada no mérito improcedente com a conseqüente declaração de constitucionalidade da norma equivaleria, na prática, a uma ADECON suscitada de ofício. Se, ao contrário, o STF suspender liminarmente a norma, eventual decisão definitiva no sentido da constitucionalidade significa que o tribunal impediu por longo período a aplicação de norma que ele mesmo acabou declarando constitucional.

Mas independentemente do caráter problemático da concessão de liminares em todas as possíveis hipóteses, a análise da prática processual deve registrar a intensa utilização dessa ferramenta pelo menos na primeira década de vigência da CF 1988. A duração média do processo nos 100 casos analisados foi de 54 meses (4 anos e meio), sendo que, como dissemos, os processos ainda pendentes farão crescer essa média. Tal dado não está muito longe do resultado de pesquisa mais abrangente que apurou uma duração média das ADINs de 4 anos e 9 meses (sem contar eventuais embargos e agravos).[43]

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Esses dados indicam que o processo objetivo brasileiro está longe de garantir a celeridade processual. Aguardar, em média, mais de quatro anos para ter uma decisão judicial não satisfaz exigências mínimas de eficiência,especialmente por ser o controle de constitucionalidade questão com conseqüências tão graves e amplas. A notória sobrecarga do Tribunal certamente não pode ser desconsiderada, mas não justifica as fortes discrepâncias na duração das ADINs, podendo o STF ser extremamente célere em alguns casos e inexplicavelmente lento em outros. Na série examinada encontramos 26 ADINs que continuam pendentes nove anos após a sua interposição, havendo, por outro lado, 14 ADINs nas quais a decisão transitou em julgado em menos de seis meses.

Cabe também observar que entre os 26 processos ainda pendentes houve decisão liminar em 16 casos. Pensando que no total dos processos houve decisão liminar em 49% dos casos temos uma sobre-representação dessa categoria nos processos pendentes. A diferença é significativa e, apesar do número reduzido de processos analisados, indica que o STF tende a considerar na maioria dos casos a cautelar como decisão “final”.

4.2.2. Pedido de vista. Uma prática em desuso

Iniciamos a pesquisa compartilhando a difusa impressão de que a excessiva duração dos pedidos de vista é um fator decisivo para a demora dos processos de controle abstrato de constitucionalidade, sendo o pedido de vista utilizado como meio para retardar decisões. No início do item 4 desse estudo indicamos alguns processos nos quais a excessiva duração do pedido de vista impediu uma decisão em tempo razoável.

Mas essa impressão revelou-se sem fundamento nos processos analisados, pois só houve pedido de vista em 4 entre os 100 casos. A duração do pedido foi muito curta, excetuando a ADIN 2.077 na qual foram registrados três pedidos de vista de grande duração e o processo ainda não foi concluído.

Aqui também seria necessário analisar um número maior de processos para confirmar a tendência de desuso da ferramenta “pedido de vista” como meio para influenciar a duração do processo. Seja como for, merece destaque a escassa utilização do pedido de vista em processos iniciados em 1999, isto é, bem antes da referida regulamentação restritiva do pedido de vista em 2003.

4.2.3. Estatística de êxito

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Pensando nos resultados das ADINs pesquisadas, o primeiro dado que não deixa de surpreender é o elevado número de ADINs ainda pendentes. Como dissemos, entre as 100 ADINs examinadas, 26 continuam pendentes 9 anos depois. A esse quadro de morosidade acrescenta-se o fato de que somente quatro ADINs foram julgadas entre janeiro de 2006 e abril de 2008. Isso deixa margens para a conclusão da existência de um filtro de seletividade. Um grupo de ADINs parece entrar em uma espécie de “coma induzido”. Os autos permanecem conclusos ao Relator por vários anos sem que haja movimentação processual - e faltando meios legais para impor um julgamento. Em sua grande maioria, esses processos “inertes” findam, normalmente, após a revogação do ato normativo que provoca a extinção do processo por perda de objeto.

Chama atenção o fato de termos 47 casos (63% do total dos processos transitados em julgado), nos quais o pedido foi considerado prejudicado após revogação do ato normativo. E esse parece ser o destino final dos 26 processos que, formalmente, estão ainda tramitando. Encontramos aqui uma clara manifestação do poder do relator que pode imobilizar por anos determinados processos, deixando o pedido de inconstitucionalidade sem resposta substancial.

Entre os 74 processos que transitaram em julgado, o pedido de inconstitucionalidade foi deferido, total ou parcialmente, em 12 casos (16%). A duração média desses processos foi de 49 meses, permanecendo próximo à média geral.

O pedido foi indeferido em 5 casos e não conhecido em 12. A duração média dos processos com indeferimento foi de 78 meses, situando-se bem acima da média geral. Ao contrário, a duração dos processos não conhecidos foi de 23,5 meses, isto é, muito abaixo da média.[44]

Uma possível explicação é que a decisão de não conhecimento não exige, normalmente, dispendiosa fundamentação nem obriga o Tribunal a se posicionar sobre o mérito da controvérsia constitucional, sendo tomada com maior facilidade. Quando ao contrário, o Tribunal indefere o pedido com decisão de mérito, a duração do processo é maior provavelmente em razão da necessidade de fundamentação específica. Em paralelo podemos pensar que o Tribunal opta por decidir sobre casos de normas inconstitucionais por serem mais urgentes, deixando em segundo plano casos que, em uma análise perfunctória, não indicam inconstitucionalidade (representam portanto menor risco).

Essas tendências e explicações não podem ser confirmadas sem análise completa do andamento das ADINs. Mas caso sejam confirmadas teremos uma importante indicação de critérios na escolha de processos para inclusão na pauta, tendo prioridade casos nos quais o pedido não deve ser conhecido, vindo em segundo lugar casos nos quais a inconstitucionalidade é evidente e somente em terceiro lugar casos nos quais o pedido deverá ser indeferido.

De acordo com estatística realizada pelo STF, entre as 2.673 ADINs definitivamente julgadas até maio de 2008 o pedido foi deferido, total ou parcialmente, em 30% dos casos; houve indeferimento em 6% e o pedido não foi conhecido em 63%.[45] Finalmente, 943 ADINs (23% do total) aguardam julgamento.[46]

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Finalmente, no que diz respeito à filtragem processual baseada no poder de definir a pauta de maneira discricionária, pesquisa sobre o andamento processual das ADINs de 1 a 3.650 mostrou que aproximadamente a metade das ADINs não recebeu decisão no mérito, em razão da utilização de sucessivos “filtros” processuais, entre as quais o mais comum é a perda de objeto por revogação do ato normativo.[47]

Esses dados confirmam três tendências fundamentais na administração do fluxo das ADINs pelo STF:

- o relativamente grande volume de declarações de inconstitucionalidade;

- a baixíssima porcentagem de processos julgados no mérito e indeferidos;

- a altíssima porcentagem de processos extintos sem julgamento de mérito ou ainda pendentes.

Para a configuração dessas três tendências revela-se fundamental o fator “tempo”. A possibilidade de retardar a apresentação do relatório, logo o julgamento, é um mecanismo de seletividade que faculta o indeferimento da maioria dos pedidos sem julgamento de mérito por perda de objeto.

5. Celeridade, previsibilidade e racionalidade do processo constitucional?

Nos últimos anos, dedicamos uma série de trabalhos à observação do processo objetivo no Brasil, tentando entender e apresentar seus mecanismos de funcionamento que muitas vezes contrastam com o discurso doutrinário sobre o tema. No centro desses estudos encontra-se o conceito de autocriação de regras processuais pelos tribunais constitucionais.

Os teóricos da justiça constitucional possuem consciência da atuação criativa dos juízes constitucionais. Essa tese é enunciada muitas vezes adotando uma postura jusrealista (a Constituição seria aquilo que o juiz constitucional define como tal)[48] ou de maneira mais específica, indicando concretamente as funções legiferantes da justiça constitucional,[49] em particular a interação (e limitação recíproca) entre o legislador e a justiça constitucional[50] que torna essa última um “legislador adjunto”.[51]

Mas a doutrina, normalmente, concentra sua atenção na função legislativa (“criativa”, “ativista”) dos julgadores em seu aspecto material. São analisadas interpretações criativas ou mesmo contra legem de dispositivos constitucionais, observam-se “técnicas interpretativas” que permitem modificar conteúdos normativos, ou são estudados casos nos quais as Cortes orientam o legislador para que crie normas de acordo com a Constituição.

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Em nossa opinião, não é menos importante (mas é menos estudada)[52] a atuação autocriativa dos juízes constitucionais que se manifesta em relação às regras processuais. Temos autocriação de uma regra jurídica quando certa autoridade estatal estabelece normas e padrões que ela mesma deve seguir. No decorrer do tempo, tais normas e padrões se consolidam e formam uma tradição ou costume que a mesma autoridade reconhece como juridicamente vinculante.

O STF, assim como os demais tribunais constitucionais, desempenha um papel de legislador positivo criando também regras processuais que em seguida ele mesmo aplica. Configura o processo objetivo em grande parte com iniciativa própria, preenchendo lacunas legislativas ou mesmo contrariando orientações legais.[53] Analisar esse tipo de atuação dos tribunais constitucionais permite entender a função de um poderoso instrumento de exercício de poder que, por ser menos visível do que o “ativismo” em decisões de direito material, é mais eficiente e permanente.

No caso do STF, o poder autocriativo é frequentemente utilizado, como meio de autocontenção do Tribunal. Mediante a criação de sucessivos filtros processuais o Tribunal dificulta o acesso à justiça constitucional, diminuindo o volume de processos de controle abstrato que são julgados no mérito e diminuindo o alcance de suas decisões, no intuito de minimizar os conflitos com os demais poderes.

Mas o uso prevalentemente limitador da autocriação processual não significa que o Tribunal não utilize seus poderes materialmente legislativos para ampliar suas competências ou a vinculatividade de suas decisões. Tal utilização ficou clara na opção do STF por controlar sistematicamente a constitucionalidade das Emendas constitucionais, apesar da falta de base normativa para tanto.[54] O mesmo ocorreu com a discussão sobre o efeito transcendente das decisões do STF no controle abstrato e mesmo no controle concreto, mediante alegação de “mutação constitucional”.[55]

Nesse contexto autocriativo insere-se o poder do relator em determinar a ordem de julgamento das ADINs (pois o legislador não fixou regras a respeito). Com base nisso e nos dados colhidos sobre o andamento processual das ADINs podemos oferecer respostas, ainda que incompletas e provisórias, a duas perguntas.

Primeiro. Quais são os critérios utilizados pelos Relatores para determinar a ordem de apresentação de relatório e voto, influenciando, de maneira decisiva, a duração das ADINs? Uma hipótese[56] é que a decisão é postergada em casos nos quais a medida impugnada é socialmente controvertida (como recentemente ocorreu nos casos do aborto de feto anencéfalo, das pesquisas com células tronco ou da legislação sobre armas) ou envolve grandes interesses políticos ou econômicos (julgamento de normas tributárias ou ambientais). Em tais casos, a decisão do Tribunal pode estar vinculada a um alto risco-custo político, tentando os Ministros postergar a decisão, na expectativa de solução do conflito de outra forma ou pelo menos de arrefecimento das controvérsias.

Uma segunda hipótese seria pensar que os relatores, tentando enfrentar o problema de sobrecarga, optam por postergar decisões em casos de menor repercussão, por exemplo, quando se trata de leis estaduais de menor importância, quando a lei é visivelmente constitucional ou quando o legitimado não tem particular representatividade e/ou poder

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de mobilização social, como ocorre com muitas entidades sindicais e alguns partidos políticos.

Essas são hipóteses plausíveis, mas necessitam de comprovação mediante estudo detalhado do conteúdo das ADINs, criando um perfil das práticas decisórias de cada relator. A nossa pesquisa só permite indicar com clareza que nos casos em que foi dada uma primeira resposta mediante liminar, o relator tenta a postergar a apresentação do relatório para a decisão definitiva, dobrando a duração total do processo. Há também indicações de que nos processos em que o pedido de inconstitucionalidade é deferido a tramitação é mais rápida.

Segundo. Tendo indicado (item 1) as finalidades gerais do processo judicial, pergunta-se como essas finalidades são afetadas pelo exercício do poder de definir a pauta pelos Ministros do STF? A nossa pesquisa e a estatística do próprio STF indicam claramente que o processo objetivo, bem como o volume e a diversidade de processos sob responsabilidade do STF não satisfazem o requisito da celeridade. Uma duração média acima de quatro anos com relevante porcentagem de processos tramitando por quase uma década mostra um grave problema, conflitando a prática processual do STF com o mandamento constitucional de solução célere dos litígios.

A previsibilidade fica também prejudicada, pois não há critérios legais ou infralegais suficientes para determinar a ordem de julgamento, podendo os interessados prever, ainda que aproximadamente, a duração do processo. Tampouco o Tribunal ou os relatores explicitam os critérios efetivamente utilizados para tanto, gerando um grave problema de transparência.

Algo semelhante pode ser dito em relação à finalidade de tomada de decisão racional. Apesar de a racionalidade estar principalmente vinculada à qualidade da fundamentação jurídica da decisão, a ausência de critérios para determinação da pauta torna o processo de controle abstrato pouco satisfatório. Como repetidamente constatamos, há racionalidade na tendência de priorizar processos que não receberam resposta em sede liminar e também na tendência de antecipar processos nos quais o pedido de inconstitucionalidade será deferido. Mas em ambos os casos, a racionalidade permanece latente, faltando explicitação dos critérios para determinar a pauta do processo objetivo.

Em conclusão, o poder discricionário de determinar a ordem de julgamento é uma poderosa ferramenta manuseada pelos ministros do STF de maneira pouco visível e muito menos normatizada. Estamos diante de uma arcana iuris que conflita com exigências do Estado constitucional de direito.

Bibliografia

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[1] Devemos particular agradecimento ao Professor Carlos Ari Sundfeld, presidente da Sociedade Brasileira de Direito Público, e aos Professores Oscar Vieira Vilhena, Conrado Hübner Mendes e Marcos Paulo Verissimo que, na qualidade de coordenadores do curso de direito constitucional da Sociedade Brasileira de Direito Público, incentivaram a realização da presente pesquisa. Alunos desse curso produziram monografias pesquisando a variável “tempo” na atuação do STF, todas disponíveis na internet: Alves, 2006; Alimonti, 2006; Nascimento Filho, 2007. Agradecemos também as observações do Professor Paulo Eduardo Alves da Silva (Direito-GV, São Paulo).

[2] Sobre as possíveis definições de “processo” cf. Lunardi, 2007.

[3] Tavares, 2005, p. 410.

[4] Artigo 61 da Constituição Francesa de 1958.

[5] Art. 1 da “Lei constitucional” italiana n. 1 de 1948.

[6] Cf. Lunardi, 2008, cap. 3.3.3.2.

[7] http://www.law.com/jsp/article.jsp?id=1144330162287.

[8] Regra n. 10 do Regimento da Suprema Corte. http://www.supremecourtus.gov/ctrules/2007rulesofthecourt.pdf.

[9] Cfr. o relatório de atividades de 2007 em: http://www.supremecourtus.gov/publicinfo/year-end/2007year-endreport.pdf.

[10] Lunardi, 2008, cap. 3.1.

[11] Art. 102 I a CF (a contrario).

[12] Mendes et al., 2008, p. 1114-1117.

[13] Tavares, 2005-a, p. 30-33: Alarcón, 2005, p. 31-38.

[14] Conforme observamos, foram elaboradas monografias sobre o tema no âmbito das atividades de pesquisa da SBDP. Mais especificamente dedicado ao tema é o trabalho de Alves, 2006.

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[15] Ver, por exemplo, Barroso (2004, p. 141): “Vencidos esses prazos, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento”. Igualmente lacônicas as referências em Almeida, 2007, p. 796. Falta referência ao tema em Mendes et al., 2008 e Tavares, 2006.

[16] www.stf.gov.br, item Estatísticas. Acesso 20-6-2008.

[17] www.stf.gov.br, item Estatísticas. Acesso 20-6-2008.

[18] Ação originária, n. 32 (Agravo Regimental), rel. Min. Marco Aurélio, j. 30-8-1990. Ementa: “As normas processuais contidas no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal foram recepcionadas pela atual Carta, no que com ela se revelam compatíveis. O fato de não se ter mais a outorga constitucional para edição das citadas normas mediante ato regimental apenas obstaculiza novas inserções no Regimento, ficando aquém da derrogação quanto às existentes à época da promulgação da Carta.”

[19] Se a Constituição de 1988 não permite que o STF crie normas processuais como considerar que a mesma CF tenha recepcionado normas processuais criadas pelo STF no período da ditadura militar de acordo com a Constituição de 1967?

[20] O RISTF refere-se a “Representações“, equivalente processual da ADIN no momento de sua redação.

[21] O Art. 65 da Lei do Tribunal constitucional português estabelece prazo rígido para o relator, concedendo certo poder de flexibilização da pauta ao Presidente do Tribunal: “1. Concluso o processo ao relator, é por este elaborado, no prazo de 40 dias, um projecto de acórdão, de harmonia com a orientação fixada pelo Tribunal. 2. A secretaria distribui por todos os juízes cópias do projecto referido no número anterior e conclui o processo ao presidente, com a entrega da cópia que lhe é destinada, para inscrição em tabela na sessão do Tribunal que se realize decorridos 15 dias, pelo menos, sobre a distribuição das cópias. 3. Quando ponderosas razões o justifiquem, pode o presidente, ouvido o Tribunal, encurtar até metade os prazos referidos nos números anteriores. 4. Havendo solicitação fundamentada do requerente nesse sentido e acordo do órgão autor da norma, o presidente, ouvido o Tribunal, decidirá sobre a atribuição de prioridade à apreciação e decisão do processo.” Fonte: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/legislacao01.html.

[22] Resolução 278 de 2003 do STF.

[23] Alves, 2006, p. 9-10.

[24] Schnell et al., 1999, p. 247-250.

[25] Schnell et al., 1999, p. 249.

[26] Excluímos do cálculo o caso atípico da ADIN 2.066, na qual o pedido de liminar foi julgado (e indeferido) 5 anos após a distribuição.

[27] Excluímos do cálculo a ADIN 2.003 que em razão do inusitado atraso na publicação do acórdão transitou em julgado 7 anos após a decisão do Pleno.

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[28] Excluímos novamente do cálculo o caso atípico da ADIN 2.066, na qual o pedido de liminar foi julgado (e indeferido) 5 anos após a distribuição.

[29] Em estudo do andamento processual das 3.640 ADINs interpostas entre outubro de 1988 e janeiro de 2006, constatou-se que a duração média para julgamento da liminar é de 8 meses (Nascimento Filho, 2007, p. 16). Temos aqui uma diferença significativa em relação à duração do processo em sede liminar em nosso estudo.

[30] ADINs 2.032, 2.051, 2.089, 2.092.

[31] ADINs 2.017, 2061, 2.076.

[32] Mendes et al. 2008, p. 1195-1196. Nas ADINs por omissão é possível formular pedido de liminar em casos absolutamente excepcionais. Adicionamos aqui as ADINs por omissão com as genéricas, pois interessa constatar a influência de uma decisão em sede liminar na duração do processo, independentemente das razões processuais que possibilitam (ou impedem) a formulação e o julgamento de um pedido de liminar.

[33] Excluímos do cálculo a ADIN 2.003 que em razão da demora na publicação do acórdão transitou em julgado 7 anos após a decisão do Pleno.

[34] Cf. Alves, 2006, p. 57.

[35] Sobre o conceito cf. item 7.

[36] Cf. Lunardi, 2008, cap. 5.2.13; Dimoulis e Lunardi, 2008, cap. 3.2.

[37] Nascimento Filho, 2007.

[38] Nascimento Filho, 2007, p. 13-14.

[39] O artigo 12 da Lei 9.868 de 1999 prevê: “Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá (...) submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação”. A baixa densidade normativa dos critérios indicados no dispositivo (“relevância”, “especial significado”, “faculdade do Plenário”) permite que seja ativado em maior ou menor medida e mesmo chegue a impedir as decisões cautelares, de acordo com apreciações subjetivas do relator.

[40] Nascimento Filho, 2007, p. 24-25.

[41] RE 505477, Rel. Min. Marco Aurélio, decisão monocrática, j. 25-5-2007.

[42] Lunardi, 2008, cap. 5.2.13.

[43] Pesquisa do andamento processual das ADINs 1 a 3.650 (Nascimento Filho, 2007, p. 16).

[44] Excluímos do cálculo a ADIN 2.003 que em razão da demora na publicação do acórdão transitou em julgado 7 anos após a decisão do Pleno.

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[45] A estatística do STF não especifica a razão de não conhecimento do pedido, mas na maioria dos casos é devido à revogação do ato impugnado.

[46] www.stf.gov.br, item Estatísticas. Acesso 20-6-2008. O cálculo das porcentagens é nosso.

[47] Nascimento Filho, 2007, p. 23.

[48] Tese enunciada pelo juiz Hughes da Suprema Corte dos EUA: “We live under a Constitution, but the Constitution is what the judges say it is” (apud MONATERI, Pier Giuseppe. “All of this and so much more”. Original intent, antagonism and non-interpretivism. Cardozo Law Bulletin, http://www.jus.unitn.it/CARDOZO/users/pigi/Allofthis.htm.)

[49] Análises e indicações bibliográficas em Sweet, 2000, p. 61-91, 136-138; Tavares, 2005, p. 321-341.

[50] Sweet, 2000, p. 73-91.

[51] Sweet, 2000, p. 151.

[52] Sweet dedica dezenas de páginas à atuação legislativa das cortes constitucionais, mas em relação ao aspecto processual só observa laconicamente que as Cortes adotam o contraditório para dar aparência judicial ao processo de decisão (2000, p. 142-143).

[53] Lunardi, 2008 (baseada em tese de doutoramento defendida em 2006); Dimoulis/Lunardi, 2008; Lunardi/ Dimoulis, 2008.

[54] Dimoulis, 2005, p. 27-29.

[55] Análise e bibliografia em Lunardi/Dimoulis, 2008.

[56] Hipótese formulada por Alves, 2006, p. 22, mas não comprovada naquele estudo.