Defensoria Noite Aula 14 Penal - PG 1

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CURSO DEFENSORIA PÚBLICA - NOITE Nº 14 DATA 07/03/2012 DISCIPLINA DIREITO PENAL PARTE GERAL PROFESSOR MARCELO LEBRE MONITORA ANA MARIA MORAES AULA 01/08 Contatos do professor: [email protected] Marcelo Lebre facebook e twitter Bibliografia: Não ler livros de direito penal escritos por promotores de justiça. Não estude por livros escritos por autores de São Paulo, salvo se você for fazer prova para o estado de São Paulo. - Rogério Greco Manual (é fantástico) - César Roberto Bittencourt Manual (também é fantástico) - Direito Penal e Execução Penal (para a defensoria pública do Paraná). Editora Aprovare. Obs: Essa editora Aprovare é a única que tem apostilas para a Defensoria Pública. Está para sair a edição de 2013. Direito Penal parte geral Roteiro de todo o curso: 01) Introdução ao direito penal 02) Princípios garantistas 03) Teoria da norma 04) Teoria do delito

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CURSO – DEFENSORIA PÚBLICA - NOITE Nº 14 DATA – 07/03/2012 DISCIPLINA – DIREITO PENAL – PARTE GERAL PROFESSOR – MARCELO LEBRE MONITORA – ANA MARIA MORAES AULA 01/08

Contatos do professor: [email protected] Marcelo Lebre – facebook e twitter Bibliografia: Não ler livros de direito penal escritos por promotores de justiça. Não estude por livros escritos por autores de São Paulo, salvo se você for fazer prova para o estado de São Paulo. - Rogério Greco – Manual (é fantástico) - César Roberto Bittencourt – Manual (também é fantástico) - Direito Penal e Execução Penal (para a defensoria pública do Paraná). Editora Aprovare. Obs: Essa editora Aprovare é a única que tem apostilas para a Defensoria Pública. Está para sair a edição de 2013. Direito Penal – parte geral Roteiro de todo o curso: 01) Introdução ao direito penal 02) Princípios garantistas 03) Teoria da norma 04) Teoria do delito

05) Iter criminis 06) Concurso de agentes 07) Concurso de crimes 08) Teoria da pena 09) Punibilidade 1)Introdução ao direito penal 1.1) Conceito: direito penal é o ramo do saber jurídico que define, de um lado crimes e contravenções e, de outro penas e medidas de segurança (as várias espécies de sanções penais). 1.2) Finalidade: finalidade precípua de proteger bens jurídicos. Bens jurídicos: os valores que são importantes para uma sociedade em determinada época. Obs: Criminologia – tem um discurso crítico. Para essa ciência, o direito penal também serve para controle social. “Além da função oficial, o direito penal exerce uma função oculta, que é exercer o controle social”. 1.3) Missão constitucional do direito penal: sob a égide de um Estado democrático de direito, o direito penal é alçado a uma missão maior além de proteger bens jurídicos. Serve para limitar a incidência do poder punitivo do Estado. “Num Estado democrático de direito, o direito penal é alçado a uma função de garantidor. Serve para limitar o poder punitivo do Estado. Serve para limitar o jus puniendi”. Garantismo penal: (visão garantista – essa visão vai balizar toda a sua prova de defensoria) O grande expoente do garantismo é Luigi Ferrajoli – “Direito e razão: teoria do garantismo penal” Editora RT. - o garantismo é um modelo jurídico proposto por Ferrajoli com um objetivo: de limitar a estrutura do direito penal no âmbito de um Estado democrático de direito. Traduzindo: fazer uma leitura constitucional do direito penal e do processo penal. O garantismo prega como premissa básica: a defesa dos direitos individuais frente aqueles que governam. “O garantismo tem como premissa básica a tutela das liberdades individuais frente aos abusos no exercício do poder”. O garantismo de assenta sobre 2 pilares/ pilares de sustentação do garantismo: convencionalismo e cognetivismo. Convencionalismo: princípio da estrita legalidade. Todos os princípios do direito penal são frutos do princípio da estrita legalidade.

Cognetivismo: princípio da estrita jurisdicionalidade. Todos os princípios do processo penal são frutos da estrita jurisdicionalidade. 5 axiomas do garantismo firmados por Ferrajoli (sempre cai um dos axiomas, vale lembrar) 1º) Não há sanção sem crime, nem crime sem lei. 2º) Só há lei se for necessária e só há necessidade se houver ofensa. 3º) Só há ofensa se houver ação e só há ação se constatada a culpa. 4º) Não há culpa sem juízo e não há juízo sem uma acusação. 5º) Não há acusação sem prova e não há prova sem defesa. Conforme esses axiomas vão sendo incorporados na legislação de um país, nós sabemos em que tipo de Estado nós estamos. Estado democrático, autoritário, etc. Na CF/88 estão previstos – estamos num Estado democrático. Na CF/69 não estavam previstos – estávamos num Estado autoritário. 2) Princípios garantistas Como o direito penal consegue cumprir essa função? Como consegue freiar o Estado na sua função punidora? Através dos princípios garantistas. Princípios basilares/sustentam o direito penal 2.1) Princípio da Legalidade – é o princípio mais importante do direito penal A legalidade é o princípio mater/mãe do direito penal. A lei é a fonte primária e imediata de todo o direito penal. Tudo que é direito penal incriminador está escrito na lei. Art. 1º, CP – princípio da legalidade “Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)” Feuerbach – “ nullum crimen nulla poena sine lege” Reserva legal: tudo que é direito penal incriminador está reservado ao legislador. Deixar reservado para o legislador o direito penal. Art. 5º, XXXIX, CF/88 – direito fundamental princípio da reserva legal. “Art. 5º. XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;” Maurach: além da ideia de reserva legal, o princípio da legalidade é permeado por facetas. Facetas do princípio da legalidade:

- Lex Praevia – traduz a ideia de: anterioridade (ninguém pode ser punido por lei posterior) - Lex Scripta – a lei pena tem que ser formalmente perfeita – tem que estar no papel, emanada do ente correto (Congresso Nacional), através de processo legislativo adequado (lei ordinária). - Lex Scricta – intepretação restritiva das normas penais. A lei penal deve ser interpretada de forma restritiva para limitar sua aplicabilidade, salvo no caso de beneficiar o réu. - Lex Certa – a lei penal tem que ser clara, precisa, objetiva, de fácil compreensão. Se reunir todas essas facetas com a ideia de reserva legal – posso dizer que o princípio da legalidade está sendo respeitado. 2.2) Princípio da Intervenção Mínima O direito penal é a última ratio/útlima razão. O direito penal será o último a ser chamado para proteger um bem jurídico, pois é o mais rigoroso. Nelson Hungria: o direito penal é como um soldado que está na reserva. 2.3) Princípio da Fragmentariedade O direito penal serve apenas para proteger alguns bens jurídicos, somente os mais importantes para uma sociedade: a vida, a honra, a dignidade sexual, etc. Não são todos os bens jurídicos que o direito penal irá proteger. 2.4) Princípio da Lesividade ou da ofensividade Só interessa para o direito penal as condutas que geram ou que podem gerar lesão a bem jurídico de terceiro/de outrem. Consequências que podem ser extraídas desse princípio: - A autolesão é criminalmente punível? Não, a autolesão é impunível, não interessa ao direito penal – porque só interessa a lesão à bem jurídico de terceiro. - Princípio da lesividade rege direito penal? Sim. E o que fala o princípio da lesividade? (ditou conceito rapidamente) Usuário de drogas (art. 28, Lei 11343/06): esse crime fere o princípio da lesividade? O art. 28, Lei 11343/06 não fere o princípio da lesividade (não desrespeita) porque o bem jurídico tutelado é a saúde pública. - A “cogitacio”/pensamento é criminalmente punível? Não, pois só interessa para o direito penal as condutas que geram lesão. O pensamento é impunível criminalmente, graças ao princípio da lesividade. 2.5) Princípio da Culpabilidade Três grandes consequências deste princípio: 1ª) A culpabilidade é o fundamento e o limite da pena. Para aplicar pena, o sujeito tem que ser culpado. O juiz ao aplicar a pena tem que seguir o critério trifásico, avaliando circunstâncias judiciais: a primeira é a culpabilidade.

2ª) A responsabilidade penal é sempre subjetiva. Para que possa punir alguém é necessário provar dolo ou culpa, que são elementos subjetivos do tipo. 3ª) Adoção do direito penal do fato e não do autor. No Brasil a gente pune o sujeito pelo o que ele fez e não pelo que ele é. Pune por algo que fez; algo que é culpado. Lombroso – fez uma pesquisa com os presos e decidiu que eles tinham caracterísiticas que indicavam quem seria criminoso. Devia mandar prender antes de cometer o crime – direito penal do autor. 2.6) Princípios relacionados à sanção penal (da sanção penal) - Princípio da pessoalidade ou da intranscedência: a pena não passará da pessoa do acusado. Art. 5º, inciso XLV, CF/88 “Art. 5º. XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;” - Princípio da individualização: cada crime é um crime, cada um tem a sua particularidade, razão pela qual cada um tem a sua pena, a pena que lhe é justa. Art. 5º, XLVI, CF/88 “Art. 5º. XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos;” STF – andou reconhecendo a inconstitucionalidade de diversas leis com base nesse princípio (regime fechado, progressão) - Princípio da proporcionalidade: quanto mais grave o crime, mais grave a pena. - Princípio da proibição do bis in idem: proibição da dupla punição; ninguém pode ser punido duas vezes pelo mesmo fato. Segunda parte da aula 2.7) Princípios da insignificância e adequação social Insignificância: se o direito penal é de intervenção mínima, existem alguns casos em que a conduta até feriu um bem jurídico, mas foi tão pequeno, que não vale a pena punir. É um princípio doutrinário, não tem previsão em nenhuma legislação.

“O princípio da insignificância consagra que as condutas devem ser consideradas atípicas se não geram efetiva lesão a relevante bem jurídico.” A irrelevância de algumas lesões faz com que algumas condutas não sejam punidas pelo direito penal. A conduta perde a roupagem da tipicidade. Obs: tipicidade (vai falar detalhadamente depois): composta por 2 aspectos: formal e material. A aplicação da insignificância afasta o aspecto material da tipicidade. Adequação social: é muito próximo do princípio da insignificância. Não tem fonte legislativa, também é uma criação doutrinária (Welzel). (nasceu primeiro) Por mais que a conduta pareça criminosa, se ela for socialmente aceita/tolerável/reconhecida, ela deixa de ser típica, não interessa mais para o direito penal. Por quê? Também afasta o aspecto material da tipicidade – conduta atípica. Os dois princípios tornam a conduta atípica, mas por fundamentos diferentes: um é lesão mínima (insignificância) e o outro por ser socialmente tolerável (adequação social). CONDUTAS ATÍPICAS. Questões jurisprudenciais sobre esses dois princípios: - requisitos da insignificância (STF): 4 requisitos – CUMULATIVOS, jurisprudenciais (não há previsão da insignificância nas leis) 1º) Mínima ofensividade da conduta 2º) Nenhuma periculosidade social 3º) Reduzido grau de reprovação 4º) Inexpressividade da lesão - Condições pessoais do acusado: desfavoráveis, por si só, não são empencilhos para a aplicação da insignificância (entendimento do STF e do STJ) – pode ser um dos fatores, só não pode ser o único. - Bem relevante para a vítima: (não é pacífico) Se o bem é relevante para a vítima, a incidência da insignificância pode ficar obstada – corrente majoritária. O bem tem que ser analisado dentro do contexto social – corrente minoritária. - Crime violento: não cabe insignificância. - Insignificância e atos infracionais (art. 103, ECA): desde 2009, o STJ tem permitido a aplicação em alguns tipos de atos infracionais (claro que não são todos).

- Insignificância em crimes ambientais: lei 9605/98 (crimes ambientais). Para o STJ e o STF: dependendo do crime ambiental é possível a aplicação da insignificância. - Tráfico de drogas: não cabe insignificância. - Insignificância e o crime de contrabando ou descaminho: art. 334, CP. Contrabando: entrada de produto proibido não aplica insignificância. Descaminho: entrada de produto lícito, sem pagamento dos tributos. aplica-se a insignificância, dependendo do valor do tributo devido. Qual o valor do tributo? Acima de R$ 10.000,00 – art. 20, Lei 10522/2002 estabelece o piso para o fisco mover ação fiscal para quem está devendo tributo. Até R$ 10.000,00 é insignificante. 2012 – foi publicada uma portaria, alterando o piso de ação fiscal: subiu para R$ 20.000,00 - Insignificância e crimes contra a Administração Pública: tem jurisprudência para os dois lados. Majoritária: dependendo do crime contra a AP é cabível a aplicação. - Furto qualificado: a jurisprudência tem impedido a aplicação da insignificância. É conduta mais grave, prevista pelo próprio legislador, logo o judiciário não pode minimizar a conduta. - Princípio da adequação social: CD’s e DVD’s falsificados. Para o STJ e STF não é cabível adequação social para os cd’s e dvd’s falsificados. 2.8) Princípio da Humanização Prega o respeito irrestrito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, CF/88). Graças a esse princípio: proibição das penas cruéis. É dever primário do defensor público velar pela dignidade. 3) Teoria da norma 3.1) Fontes, características e espécies Fontes da norma jurídico-penal: materiais e formais. Fontes materiais: é a União (responsável pela criação do direito penal incriminador, ela que possui a competência legislativa – art. 22, CF/88). Fontes formais: a Lei – é a fonte formal primária e imediata de todo o direito penal. Além desta fonte formal, primária, há também: Fontes formais secundádias: costume e princípios gerais do direito. (não criam crimes e penas) Ex. Insignificância e adequação social. Características das normas penais: 1ª) Exclusividade: somente uma norma jurídico-penal pode estabelecer crimes e sanções penais.

2ª) Anterioridade: lex praevia. A lei tem que ser anterior aos fatos. 3ª) Imperatividade: ela é imposta para todos, independente da vontade do particular. Imperatória observância. 4ª) Impessoalidade: feita para todos, eficácia erga omnes. Ideia de generalidade. 5ª) Taxatividade: tem que ser precisa, completa. Tem que delimitar tudo aquilo que é proibido (lex certa). Não pode dar margens a interpretações dispares. Espécies de norma penal: 2 grandes espécies de normas penais. Normas penais incriminadoras: aquelas que definem crimes e penas. Ex. Art. 121, CP. Preceito primário – a conduta proibida/ o crime. Preceito secundário – a pena. Normas penais não incriminadoras: normas explicativas, complementares, procedimentais. Não definem crime nem penas. Art. 327, CP – conceito de funcionário público. Art. 68, CP – critério trifásico. Normas incriminadoras podem ser perfeitas ou imperfeitas. Perfeitas: aquelas que são completas; autoexplicativas. Não demandam nenhuma tipo de complementação. Ex. Art. 212, CP: Homicídio. Imperfeitas: aquelas que precisam de complementação; não é autoexplicativo. Ex. Art. 312, CP: peculato. Explica o crime, mas precisa do 327, CP para saber quem é funcionário público para o CP. Tipos abertos e Normas penais em branco: os dois dependem de complementação; alguém precisa de explicar. A diferença está em quem vai dar a complementação. Tipo aberto: a responsabilidade de complementar é do juiz, analisando o caso concreto. Ex. Ato obsceno. Norma penal em branco: demanda complementação, fornecida por outra norma. Uma norma complementando outra norma. Art. 312, CP – crime de peculato. Precisa do 327, CP. Art. 33, Lei 11.343/06 (drogas). Uma portaria do Ministério da Saúde que define o que são drogas. Normas penais em branco podem ser homogêneas ou heterogêneas: Homogêneas: aquelas em que o complemento é oriundo de uma mesma fonte legislativa. Ex. Peculato e funcionário público – ambos no CP. Heterogêneas: aquelas em que o complemento é oriundo de fonte normativa diversa.

Ex. Tráfica do drogas que é lei federal e a portaria do Ministério da Saúde (poder executivo complementando norma do poder legislativo). Para alguns doutrinadores: as normas homogêneas podem ser homovitelinas ou heterovitelinas. Homovitelinas: quando a norma complementar é do mesmo ramo do direito da norma complementada. Ex. Peculato e funcionário público – ambos do direito penal Heterovitelinas: norma penal de outro ramo do direito complementa o direito penal. EX. Estelionato e outras fraudes do estelionato. Normas civis e empresariais complementam norma penal. Norma penal em branco ao avesso (invertida): algumas normas em que o legislador traz só o preceito primário, ou seja, traz só o crime. O tipo penal define a conduta incriminada, mas não estipula a pena (remete para outro artigo). Ex. Crime de genocídio. Art. 1º, Lei 2889/56. Ex. Uso de documento falso – CP. Remete para falsificação de documento particular e público para ver a pena. Obs: existe uma crítica doutrinária que diz: As normas penais em branco são inconstitucionais, pois ferem a legalidade, prega uma taxatividade das normas penais proibitivas. O STF não reconhece a inscontitucionalidade. Prova objetiva: seguir STF. Prova aberta: seguir a doutrina (Zaffaroni).