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Dedico este trabalho a todas as professoras, professores, futuras professoras e futuros professores de Educação Infantil que acreditam e lutam para que as crianças tenham uma infância plena.

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Dedico este trabalho a todas as professoras, professores, futuras

professoras e futuros professores de Educação Infantil que

acreditam e lutam para que as crianças tenham uma infância

plena.

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AGRADECIMENTOS

À Profª. Drª. Patrícia Dias Prado, que, durante a pesquisa e antes dela, ajudou a ampliar

o meu olhar sobre a infância e suas diversas possibilidades.

À Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, pela oportunidade de

realização deste trabalho.

À Pró-Reitoria de Pesquisa da USP, que apoiou esta pesquisa.

A todas as profissionais e crianças que, durante a pesquisa de campo, permitiram

minhas observações e responderam as minhas perguntas, possibilitando as reflexões

presentes neste trabalho.

A todas as integrantes do grupo Pesquisa e Primeira Infância: linguagens e culturas

infantis (FEUSP/SP), que partilharam comigo suas experiências e descobertas,

contribuindo para a ampliação de meus conhecimentos.

A minha mãe, por possibilitar os caminhos que escolhi trilhar.

Ao Fábio, por estar sempre disposto a me ajudar.

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Resumo

A presente pesquisa de Iniciação Cientifica, realizada com apoio da Pró-Reitoria

de Pesquisa da USP, teve como finalidade conhecer quais são os livros disponibilizados

para as crianças de 0 a 4 anos da Educação Infantil e investigar os espaços, as formas e

as concepções educativas que definem como esses livros são apresentados às crianças

pequenas, seja nos momentos dirigidos pelas professoras, seja nos momentos livres

entre as próprias crianças, a partir do que fazem (crianças e professoras), quais suas

formas de leituras e de relações, quais culturas infantis estão ou não sendo produzidas e

quais suas implicações para a construção de uma Pedagogia da Educação Infantil que

permita as múltiplas leituras do mundo de crianças e professoras.

Os dados foram coletados a partir da observação da jornada educativa, de

entrevistas semi-estruturadas com a professora observada e com a coordenadora, de

conversas informais com a professora e crianças (de 2 e 3 anos de idade) e com registro

posterior em caderno de campo, em um Centro de Educação Infantil (CEI) localizado no

município de São Paulo. As análises dos dados foram realizadas de forma articulada, à

luz da produção recente no campo das pesquisas em Educação Infantil e Literatura

Infantil, e revelou que a centralidade educativa na professora como única leitora e

contadora de histórias impossibilita a livre exploração, invenção e o protagonismo das

crianças pequenas no contexto educativo, especialmente nos momentos planejados e

organizados para esta atividade.

As culturas infantis produzidas pelas crianças pesquisadas, entretanto, não se

inscreviam somente na reprodução das formas de interpretação dos livros pelas

professoras, mas também propondo outras maneiras de ler o mundo, por meio dos

livros, de suas letras e imagens, principalmente quando estavam nas atividades ditas

livres, brincando somente entre elas. As crianças pesquisadas transgrediram as formas

de interpretação da professora, recontaram e ressignificaram histórias contadas por ela,

mesmo contando com poucos espaços e tempos previstos e planejados na jornada

educativa do CEI para suas próprias criações e invenções.

A pesquisa apresenta a necessidade de um aprofundamento, por parte dos/as

profissionais da educação, dos estudos sobre a literatura infantil e sobre a especificidade

das diversas formas de leituras do mundo pelas crianças pequenas, mesmo antes de

lerem as palavras, para que as escolhas, leituras e planejamentos que envolvam a

literatura e os livros infantis sejam promovidas de forma plena, de modo a compreender

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e explorar todas as linguagens que os compõem, ou que são provocadas por meio deles.

Além disso, a pesquisa aponta a necessidade do planejamento de tempos e espaços para

que as crianças realizem e exponham suas próprias leituras, inclusive, sem a intervenção

de um/a adulto/a. Para isso, é fundamental que os/as profissionais de educação

percebam as crianças como protagonistas de suas infâncias e produtoras de culturas.

Palavras-chave: Educação Infantil - Literatura Infantil - formas de leitura - histórias -

relação professora-criança.

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SUMÁRIO

Introdução ............................................................................................................................... 06

1. Problemas e Justificativas .................................................................................................. 08

2. Objetivos ............................................................................................................................. 10

3. Metodologia ......................................................................................................................... 11

4. Qual o espaço da literatura dentro da instituição de Educação Infantil? ..................... 16

5. Relações entre o brincar e o livro. ..................................................................................... 21

6. Contos e recontos: análise de duas histórias e suas formas de leituras. ........................ 26

6.1. Análise teórica do livro A Verdadeira História dos Três

Porquinhos ................................................................................................................. 27

6.2. A Roda de História do livro A Verdadeira História dos Três

Porquinhos ................................................................................................................. 32

6.3. Análise teórica do livro O cabelo de Lelê ......................................................... 35

6.4. A Roda de História do livro O cabelo de Lelê ................................................. 40

7. Considerações Finais .......................................................................................................... 44

8. Cronograma de atividades ................................................................................................. 47

Referências ............................................................................................................................. 48

ANEXOS

Anexo 1 - Modelo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ...................................... 51

Anexo 2 - Roteiro da Entrevista Semi-estruturada com a Professora ...................................... 52

Anexo 3 - Roteiro da Entrevista Semi-estruturada com a Coordenadora ................................ 53

Anexo 4 - Certificado do I Seminário Internacional Educação Infantil e Diferença

(UFSCar) .................................................................................................................................. 54

Anexo 5 - Declaração de atividades junto ao Grupo de Estudos: Pesquisa e primeira

infância: linguagens e culturas infantis (FEUSP) no I Seminário Internacional sobre

Infâncias e Pós-Colonialismo (UNICAMP) ............................................................................. 55

Anexo 6 - Resumo apresentado ao 21º SIICUSP (USP/SP) ................................................... 56

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Introdução

O livro está presente nas instituições destinadas à Educação e não é diferente na

Educação Infantil. A Literatura Infantil é um campo difícil de delimitar, pois quais são

os livros que entram nessa categoria? Se considerarmos apenas os livros escritos para

crianças, excluiríamos os livros que não foram produzidos com esse intuito, mas que,

com o tempo, foram “adotados” por elas. “Assim, a Literatura Infantil, em lugar de ser a

que se escreve para as crianças, seria a que as crianças lêem com agrado” (MEIRELES,

1984, p.97).

Desta forma, esta pesquisa busca investigar se os livros disponibilizados para as

crianças pequenas nas instituições de Educação Infantil já passaram por algum tipo de

seleção prévia pelas professoras. Quais são os livros selecionados, escolhidos e

disponibilizados para as crianças pequenas? Quais os critérios para essa seleção?

A roda de histórias, por exemplo, é algo bastante frequente no dia a dia da

Educação Infantil e um importante momento no qual os livros são apresentados e lidos

às crianças pelas professoras. No Referencial Curricular Nacional para a Educação

Infantil (BRASIL, 1998), ela é considerada uma das Atividades Permanentes, que “são

aquelas que respondem às necessidades básicas de cuidados, aprendizagem e de prazer

para as crianças, cujos conteúdos necessitam de uma constância” (p.55). E os livros

estão na lista de recursos materiais que “devem ter presença obrigatória nas instituições

de Educação Infantil de forma cuidadosamente planejada” (p. 70-71), no conjunto com

outros objetos e materiais como massinhas, tintas, brinquedos, tecidos etc. sem

nenhuma especificidade sobre os conteúdos dos livros, ou seja, como mais um dos

objetos para as crianças manusearem e brincarem.

Isso significa que, como brinquedos, os livros devem estar disponíveis às

crianças em todos os momentos da jornada educativa da Educação Infantil, como forma

de garantia de seu direito à infância (BRASIL, 2009). Mas eles não são neutros e suas

escolhas também não. Portanto, as formas e as intencionalidades educativas de

planejamento e organização dos livros apresentam uma relação direta com as formas

como as crianças desfrutarão deles ou não, já que “a professora não ensina, mas, com

intencionalidade educativa, planeja, organiza e coloca à disposição das crianças tempos,

espaços e materiais que favoreçam provocações à imaginação e desafios ao

raciocínio...” (FARIA e RICHTER, 2009, p.110).

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As crianças, como produtoras de culturas (PERROTTI, 1990) desde o

nascimento (PRADO, 1999) e capazes de diversas leituras e relações, não podem ser

vistas como passivas diante dos livros apenas por ainda não dominarem a linguagem

escrita. Os livros que, muitas vezes, são tidos apenas como suporte das letras podem

trazer muitas outras linguagens dentro e fora de si. “Nos esquecemos que a escrita não é

a única, mas uma das linguagens de crianças e adultos” (GOBBI, 2007, p.34). Da

mesma maneira, “a prática da leitura não se restringe à leitura da palavra escrita, mas se

refere a qualquer atividade de ‘consumo cultural’, como sugere Pierre Bourdieu (1996),

ou à ‘leitura do mundo’, como propõe Paulo Freire (1995) ...” (FERRARO, 2001, p.

47).

Assim, sendo os livros objetos/brinquedos/atividades tão importantes, como as

professoras disponibilizam, apresentam, leem e contam suas histórias? Qual a

participação das crianças nesses momentos? Elas têm espaços e tempos para fazer suas

próprias leituras, questionar as histórias e contar outras? Quais culturas infantis estão

sendo construídas pelas crianças a partir do repertório literário que lhes é

disponibilizado, e quais estão sendo impedidas de ser criadas e inventadas por elas?

Estas foram algumas questões iniciais que nortearam esta pesquisa e que serão

aprofundadas a seguir.

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1. Problemas e Justificativas

Ao falar sobre “o lugar da criança na cultura”, PERROTTI (1990) chama a

atenção para o equívoco de considerar cultura apenas o produto, ignorando o processo e

o produtor, revelando uma determinada concepção de infância e de sua educação:

Tal concepção de cultura ajusta-se, por sua vez, com facilidade,

às concepções de criança vigentes em nossa sociedade. Assim,

enquanto faixa etária “incompleta”, a criança deve ser a

consumidora passiva de produtos culturais elaborados para ela

pelo grupo social, a fim de que possa tornar-se um ser humano

evoluído, “completo”, vale dizer, adulto. Sua inclusão social

(isto é, inclusão nas classes dominantes) está garantida pelo

consumo (ao menos simbolicamente) (PERROTTI, 1990, p.16).

O papel de consumidora passiva é atribuído às crianças também dentro das

instituições de Educação Infantil. E se pensarmos no livro e nas formas de contato com

ele, é possível que, como produto da cultura, seja apresentado e lido às crianças

contando com sua observação passiva, apenas ouvindo a leitura da professora ou, ao

contrário, sejam disponibilizados, escolhidos e lidos pelas crianças de maneira livre e

autêntica, já que “as pesquisas recentes têm mostrado que as crianças são

comunicadoras por excelência, são construtoras da história e da cultura, são capazes de

múltiplas relações (...), mesmo antes de ler e escrever” (FARIA e RICHTER, 2009,

p.109-10).

Assim como as histórias contidas nos livros, suas estruturas (de que materiais

são feitos, se a capa é dura ou mole, se possui ilustrações ou se é composto apenas por

imagens), para quem se destinam, por quem são lidos, onde, como etc são elementos

que devem ser levados em consideração para o estudo, compreensão e análise de suas

formas de apresentação às crianças na Educação Infantil e, também, das leituras que

elas fazem deles. Portanto, as crianças não estão totalmente submetidas às formas e

escolhas propostas pelas professoras (PRADO, 1999). Nos momentos de leitura (não só

das palavras) e na manipulação dos livros pelas crianças, novas experiências humanas

podem vir à tona, pois:

Manipular, desde a infância, é extrair valores da dinâmica do

encontro tensivo do corpo com a plasticidade do mundo; é dar

forma – transformar; agregar à coisa um pensamento (imagens,

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sensações, lembranças, palavras) (FARIA e RICHTER, 2009,

p.109).

Desta forma, nos momentos dirigidos, as crianças são provocadas e desafiadas a

imaginar, indagar e inventar? E nos momentos livres, quais livros as crianças preferem?

Como leem e contam suas histórias? Quais brincadeiras reproduzem e quais inventam e

inovam? O que elas revelam?

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2. Objetivos da Pesquisa

Conhecer quais são os livros disponibilizados para as crianças pequenas de 0 a 4

anos da Educação Infantil e investigar os espaços, as formas e as concepções educativas

que definem como esses livros são apresentados às crianças pequenas, seja nos

momentos dirigidos pelas professoras, seja nos momentos livres entre as próprias

crianças, a partir do que fazem (crianças e professoras), quais suas formas de leituras e

de relações, quais culturas infantis estão ou não sendo produzidas e quais suas

implicações para a construção de uma Pedagogia da Educação Infantil que permita as

múltiplas leituras do mundo de crianças e professoras.

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3. Metodologia

Esta investigação, apoiada pela Pró-Reitoria de Pesquisa da USP, possui caráter

qualitativo e foi realizada a partir de uma pesquisa do tipo estudo de caso (LUDKE e

ANDRÉ, 1986), em uma instituição pública de Educação Infantil da cidade de São

Paulo, que desenvolvia um trabalho que envolvia o contato com o livro e com a

literatura para crianças de até quatro anos de idade. A coleta de dados foi possível pela

observação da jornada educativa, especialmente nos momentos em que as crianças

tinham contato com os livros, livremente ou com a mediação da professora, com

registro posterior em caderno de campo, por meio de conversas informais e de

entrevistas semi-estruturadas com a professora e a coordenadora do CEI, enfocando

questões relativas à escolha dos livros, ao planejamento dos momentos livres e

dirigidos, à formação das professoras pela coordenadora sobre o tema, entre outras.

Os dados coletados durante as observações, as conversas informais e as

entrevistas foram analisados de forma articulada, à luz da produção recente no campo

das pesquisas em Educação Infantil e em Literatura Infantil, discutidos individualmente

em orientação e coletivamente nos encontros do Grupo de Estudos: “Pesquisa e

primeira infância: linguagens e culturas infantis” (FEUSP), coordenado pela mesma

orientadora desta pesquisa.

Outras experiências formativas também compõem meu olhar e articulam-se

como fontes não-convencionais desta pesquisa, uma vez que possibilitaram ampliar

minhas concepções sobre Literatura Infantil e Educação Infantil. Destaco o curso

“Contar-brincando na Primeira Infância” ministrado por Daniel D’Andrea (GENS -

Instituto de Educação e Cultura/SP), o “I Seminário Internacional Sobre Infâncias e

Pós-colonialismo: Pesquisas em Busca de Pedagogias Descolonizadoras” (UNICAMP),

a oficina “Ilustração na Literatura Infantil” ministrada por Hanna Araújo (Biblioteca de

São Paulo/SP), o “IV Encontro WMF Martins Fontes de Literatura Infantil e Juvenil”

(Teatro União Cultural Brasil Estados Unidos/SP) e o “1º Encontro de Literatura

Infanto-juvenil: Ler é pra cima!” (Instituto Cervantes/SP), além das experiências que

vivenciei em estágios obrigatórios do curso de Pedagogia (FEUSP) e nas instituições de

Educação Infantil que trabalhei, desde 2011. Esses encontros com pesquisadores e

pesquisadoras das duas áreas, com autores e autoras de livros infantis, com professoras

e professores de crianças pequenas, com os livros destinados às crianças pequenas e

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com as crianças dentro das instituições destinadas a sua educação, também ampliaram

meus sentidos, tanto para a pesquisa de campo quanto para a análise dos dados.

Como o objetivo da pesquisa era observar e analisar o envolvimento de

professoras e crianças de 0 a 4 anos em instituições de Educação Infantil, optei por

realizá-la em um Centro de Educação Infantil (CEI), pois, na cidade de São Paulo, os

CEIs, juntamente com as Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEIs), são os

responsáveis pela Educação Infantil que educa crianças de zero a cinco anos e 11 meses.

Os CEIs recebem crianças de 0 a 3 anos e 11 meses e as EMEIs, crianças de 4 e 5 anos

completos, o que me levou a optar por um CEI.

Primeiramente, o foco desta pesquisa era observar um CEI que desenvolvesse o

Projeto Entorno de incentivo à leitura, da Secretaria Municipal de Educação de São

Paulo, porque este incluía um sub-projeto de Leitura para Bebês, justamente para as

crianças na faixa etária de interesse desta pesquisa. No entanto, não foi possível saber

quais instituições participavam deste projeto. No portal da Secretaria Municipal de

Educação de São Paulo1 tive a oportunidade de conhecer todo o projeto, mas sem

menção às instituições envolvidas. Tentei contato com a Secretaria Municipal de

Educação de São Paulo pelo seu portal na internet, pelo link “FALE CONOSCO” e com

a Fundação Victor Civita, criadora do projeto, mas não tive retorno de nenhuma das

duas instituições.

Por esses motivos, o Projeto Entorno deixou de ser o foco para a seleção da

instituição a ser pesquisada e passei a visitar alguns CEIs que desenvolvessem projetos

de literatura com os pequenos e não necessariamente junto ao Projeto Entorno de

Leitura para Bebês.

Foram visitadas algumas instituições nos bairros do Rio Pequeno e da Vila

Mariana, por facilitarem meu acesso e propiciarem um melhor aproveitamento de horas

de observação. Foram visitados sete CEIs. Em três deles não pude me encontrar com a

equipe gestora e apenas um deles participava do referido Projeto Entorno de Leitura

para Bebês.

Das quatro instituições restantes, foi possível conversar com as coordenadoras e

discutir sobre os projetos com literatura das escolas, se possuíam bibliotecas e,

principalmente, se haviam livros nas salas. Afinal, um dos enfoques dessa pesquisa era

o contato das crianças com os livros, também sem a intervenção da professora.

1http://www.portalsme.prefeitura.sp.gov.br/Projetos/ei/Anonimo/entorno.aspx?MenuID=54.

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Todos os quatro CEIs desenvolviam projetos que envolviam as famílias das

crianças. As crianças levavam um livro para ser lido em casa pela mãe, como falaram

as coordenadoras, evidenciando, em princípio, a quem atribuíam o papel de ler para as

crianças fora da escola - algo recorrente na Educação, cujas imagens de educar e

ensinar, dentro de casa, estão atreladas às mulheres, assim como no campo profissional

em toda a Educação Básica2 (VIANNA, 2002).

Os outros projetos de literatura apresentados envolviam uma questão moral, ou

seja, pretendiam passar ensinamentos acerca de temas como diversidade, inclusão e

bullying. No entanto, essa pesquisa teve a pretensão de observar o contato das crianças

com os livros, suas formas de leituras e apresentação pelas professoras, que poderiam

trazer estas e outras tantas temáticas, descartando, entretanto, sua função escolarizante

como livro-brinquedo-didático.

Dentre estes quatro CEIs, selecionei um localizado no bairro paulistano de Vila

Clementino, por desenvolver, desde agosto de 2012, um trabalho com as professoras

sobre literatura infantil. Segundo a coordenadora, primeiramente havia a necessidade de

sensibilizar as professoras sobre a importância da literatura, fazendo com que

refletissem sobre suas próprias experiências na infância e hoje. Por meio de poemas e

textos de autores/as que contam suas experiências com os livros, ela iniciou a discussão

com as professoras sobre a importância do contar histórias para as crianças.

A instituição selecionada também participava do Projeto Entorno. Porém, não o

desenvolvia com as crianças justamente pela necessidade prévia de formação das

professoras apontada pela coordenadora. Cada sala mantinha um pequeno acervo

literário que ficava ao alcance das crianças e, no segundo semestre de 2012, recebeu

novos títulos da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Esses foram os fatores

que me fizeram escolher este CEI para a pesquisa.

O primeiro contato com o CEI partiu da diretora da instituição que, depois de

uma breve conversa, me encaminhou para a coordenadora e esta me explicou seu

trabalho de formação com as professoras, o dia a dia da instituição e se interessou pela

pesquisa. Ela me deu liberdade para escolher a turma que eu observaria, mas sugeriu

que, antes, ficasse um dia em cada turma. Aceitei a proposta.

A instituição educava 113 crianças em período integral, das 8 às 18 horas,

divididas em nove turmas de acordo com a faixa etária, dentre elas:

2 A Educação Básica é composta pela Educação Infantil, pelo Ensino Fundamental e pelo Ensino Médio.

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Berçário I: crianças de zero a um ano;

Berçário II: crianças de um ano e um mês a dois anos;

Mini-Grupo I: crianças de dois anos a três anos;

Mini-Grupo II: crianças de três anos a três anos e onze meses;

Iniciei minhas observações em setembro de 2012, com frequência de duas vezes

por semana e, como sugerido pela coordenadora, primeiro observei o Berçário I por dois

dias, o Berçário II, o Mini-Grupo I e o Mini-Grupo II por um dia. Depois dessas

observações, tomei a decisão de observar um dos Mini-Grupos por perceber que os

breves momentos em que os livros e a literatura estavam presentes nos berçários não me

permitiriam aprofundar minhas observações.

Selecionei uma das turmas do Mini-Grupo I, pois, ao observar uma das reuniões

da professora com as famílias das crianças, chamou-me a atenção o fato dela iniciar a

reunião falando sobre cada uma das crianças, mostrando os livros que cada uma delas

mais se identificava e explicitando uma articulação direta entre a infância e a literatura.

Nesta mesma articulação, os dados coletados foram analisados à luz da produção

recente no campo das pesquisas em Educação Infantil, na interface com a Literatura

Infantil.

No início da pesquisa, o ponto principal era investigar os momentos livres das

crianças com os livros. No entanto, esses momentos foram raramente observados por

mim durante a jornada educativa, o que exigiu aprofundar minhas análises das

observações dos momentos dirigidos pela professora, na busca por conhecer e

problematizar a formação das professoras promovida pela coordenadora. As

dificuldades relatadas pela coordenadora no começo da pesquisa, relacionadas à

necessidade de convencer as professoras da importância da literatura para as crianças

pequenas, revelaram-se também nas observações de campo, visto que a professora

pesquisada percebia a literatura como parte de sua jornada educativa junto às crianças,

mas não como uma experiência livre para e das crianças, ou compartilhada entre ela e as

crianças.

Portanto, aprofundei a análise dos dados coletados nas observações de campo da

primeira parte da pesquisa e voltei a campo para colher mais dados sobre a formação

sobre literatura que a coordenadora realizou com as professoras e as mudanças

percebidas com este trabalho. Elaborei um roteiro para condução de entrevistas semi-

estruturadas com a coordenadora (Anexo 3) e com a professora (Anexo 2) do grupo

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observado, abordando questões referentes às suas experiências e concepções sobre

infância, literatura e Educação Infantil, suas intenções e impressões sobre a formação

elaborada pela coordenadora, sobre o novo acervo de livros infantis recém-chegado à

escola, entre outros aspectos.

No entanto, não foi possível realizar as entrevistas pessoalmente porque ambas

se encontravam de licença médica no período em que foram procuradas para as

entrevistas. Para não haver prejuízo à pesquisa e por acreditar que a coleta desses dados

seria indispensável para as análises das observações de campo, optei por realizá-las via

e-mail, admitindo os limites desta ferramenta para uma coleta dialogada das questões

elaboradas, mas apontando alguns alcances possibilitados por meio delas.

Durante a pesquisa de campo, pude observar, mesmo que em raros momentos, as

crianças recontando uma história que já havia sido narrada pela professora, enquanto ela

contava outra história e em momentos de brincadeiras livres no parque. Assim, investi

na descrição e análise desses momentos, dada a necessidade construída no decorrer da

pesquisa, durante as orientações individuais e discussões junto ao grupo de estudos:

“Pesquisa e Primeira Infância: linguagens e culturas infantis” (FEUSP/SP), de conhecer

quais histórias e as formas como são lidas e contadas não somente pelas professoras,

mas também pelas próprias crianças.

O grupo de estudos citado é coordenado pela orientadora desta pesquisa e tem

como um de seus principais objetivos a construção de metodologias de pesquisa com

crianças pequenas e bem pequenas que se diferenciem dos modelos e procedimentos

investigativos convencionais e que legitimem as “vozes” das crianças. As pesquisas são

efetuadas no contexto de instituições públicas especializadas em Educação Infantil

(creches e pré-escolas) e fora delas, como em teatros e outros espaços educativos não-

formais e culturais.

A pesquisa de campo foi desenvolvida com o consentimento livre e esclarecido

das diretoras, professoras, crianças e seus responsáveis, respeitando os requisitos éticos

de participação voluntária, linguagem clara e acessível, confidencialidade das

informações, privacidade dos sujeitos e retorno da pesquisa (em Anexo 1).

Neste mês de julho de 2013, perto de concluir meu curso de Pedagogia e

finalizando este relatório final, também fiz minha inscrição para o 21º SIICUSP (em

Anexo 6), no qual pretendo apresentar e discutir a pesquisa finalizada e vislumbrar

desdobramentos possíveis às minhas novas investidas de pesquisa.

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4. Qual o espaço da literatura dentro da instituição de Educação Infantil?

Investigar as temáticas que envolvem a literatura infantil requer não só uma

reflexão e discussão sobre as concepções de literatura, mas também de criança e de

infância que estão diretamente relacionadas à sua delimitação, ou não, nos campos da

literatura e da educação para e das crianças pequenas.

A concepção de infância é algo socialmente e historicamente construído.

Segundo ARIÉS (1981), a infância é inventada a partir de sentimentos e não da

racionalidade. Portanto, não existe uma infância universal, genérica, do mesmo modo

que não existe uma criança única. As concepções de infância e criança mudam de

acordo com o contexto no qual elas estão inseridas. Da mesma forma, a concepção de

literatura depende do seu contexto histórico social.

Ao falar da busca de novos referenciais para a literatura infantil e juvenil,

referenciais que devem estar ligados ao contexto cultural do leitor, PERROTTI (1990)

afirma que estes:

[...] ainda que em gestação, já começaram a indicar, por

exemplo, que algumas expressões como “hábitos de leitura”,

“estímulos à leitura” serão colocadas em dúvida junto com a

realidade que encerram à medida que forem sendo reveladas

suas vinculações com projetos que pretendem inserir

aleatoriamente a leitura na vida dos grupos infanto-juvenis.

(PERROTTI, 1990, p.18)

Durante minhas observações ouvi a expressão “postura leitora” como algo

positivo que as crianças estavam adquirindo nas rodas de leitura. Dentro desta “postura

leitora”, eram listadas as seguintes atitudes: ficar quietas durante a leitura do livro,

sentadas e paradas, sempre vinculada à ideia de que tais atitudes demonstravam

interesse e maior concentração das crianças.

Da mesma maneira que as expressões “hábitos de leitura” e “estímulos à

leitura”, a expressão “postura leitora” também deve ser colocada em dúvida. Afinal, não

é possível afirmar que uma criança está realmente envolvida com a leitura ou com

qualquer outra atividade apenas porque está sentada, quieta e com os olhos voltados

para quem fala.

Enquanto a professora lê um livro ou disponibiliza-o para as crianças, ela

demonstra em suas falas e posturas qual a forma “correta” de praticar o ato da leitura.

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Segundo PERROTTI (1990) “a leitura não é um ato natural, mas cultural e

historicamente demarcado” (p.63).

A relação pretendida e observada, na pesquisa de campo, entre a leitura e a

exploração dos livros com o silêncio e os corpos parados das crianças pode revelar uma

concepção de literatura infantil atrelada apenas à mente, e “o que deriva da mente é

considerado nobre, possui status superior” (SAYÃO 2008, p.93). Por essa razão, o

corpo é deixado de lado e imobilizado. Entretanto, assim como SAYÃO (2008), atentei

para o fato de que corpos e mentes de crianças e professoras compunham um todo

indissociável que questiona os sentidos atribuídos à desejada “postura leitora”. Esta

relação já foi observada em minhas sondagens iniciais antes mesmo da definição do

grupo de crianças pequenas que seria investigado.

Quando cheguei à turma de crianças sob investigação, me espantou perceber que

a professora exigia silêncio e uma postura adequada definida por ela: sempre em roda,

em silêncio, com os olhos voltados para o livro e sentadas com as pernas cruzadas.

Terminada a história, a turma era direcionada para outro espaço da escola, onde podiam

gritar, conversar, rir, ser lobo, correr, deitar, fechar os olhos, enfim, desfrutar daquele

espaço e momento da forma que achassem melhor, revelando seus próprios jeitos de ser

criança, mas não no momento anterior.

No dia a dia da turma, a professora permitia que as crianças ficassem livres nos

momentos em que estavam nos espaços externos do CEI. No entanto, ela pouco

interagia com as crianças mesmo quando solicitada. Constatei que, muitas vezes, não

participava desses momentos, não por falta de interesse, mas sim por ser um momento

que utilizava para descansar, além de acreditar ser um momento em que as crianças

devessem brincar livremente. Por algumas vezes brincou com as crianças, balançou

alguma no balanço de pneus ou disponibilizou objetos e água para as brincadeiras na

areia. Na maioria das vezes em que interagiu com as crianças, esta se deu de forma

individual, com brincadeiras e estímulos à criança que se mantinha perto dela, inclusive

incentivando que esta interagisse com as outras e que fosse aproveitar o parque.

No entanto, sua postura mudava quando chegava o momento de leitura, das

histórias que observei apenas duas foram contadas fora da sala da turma, lugar mais

utilizado para esta atividade. O momento da história era de silêncio, era o momento de

sentar com a perna cruzada onde a professora escolheu. Segundo SAYÃO (2008):

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[...] Expressões como “isso não é para mexer”, “fique longe”,

“não toque”, “não faça isso, porque você já é mocinho ou

mocinha” ou “sente e preste atenção” entre outras, acentuam a

supressão dos movimentos corporais, aumentando a importância

do olhar e do ouvir. Passamos a ver e perceber muito e a nos

movimentar pouco (SAYÃO, 2008, p.102).

Foi justamente isso que observei nas rodas de história. Para a professora, era o

momento de valorizar o “olhar e o ouvir”, olhar o livro e ouvir a professora, e não a

história, porque quando se ouve a história, ela causa inquietação, perguntas, novas

posturas, a vontade de ser o personagem, alegrias, tristezas - coisas que refletem no

corpo e não só na mente.

O que mais me surpreendeu foi sua postura ao fim das histórias, pois não

proporcionava espaço para conversar sobre a história, o livro, as ilustrações, o momento

da história acabava com o fim desta. Se nos outros espaços as crianças comandavam

suas brincadeiras e as propunham, inclusive para a professora, no momento da história

somente havia espaço para a voz e vez da professora.

Isso pode significar que o espaço da sala era considerado pela professora como

espaço de escolarização (ARELARO, 2005), de controle e de racionalidade no qual os

corpos selvagens das crianças (LARROSA, 1998) necessitavam ser contidos, alinhados,

silenciados e obedientes.

Todavia, apesar de ter acontecido apenas uma vez durante minhas observações

de campo, a sala foi modificada pelas crianças. Nesta tarde, entramos na sala para a

história e as crianças começaram a subir nas mesas e nos caixotes de madeira da sala.

Também para minha admiração, a professora não pediu para pararem imediatamente e

ainda sugeriu às crianças que pegassem outros elementos para fazer parte da

brincadeira. Ela foi com as crianças para um pequeno corredor entre as salas dos Mini-

Grupos I e II e a salas dos Berçários I e II, onde ficam colchonetes, caixas de madeira e

grandes formas geométricas feitas de espuma, e as ajudou a levar esses objetos para a

sala. Neste dia, a sala passou a ser território das crianças, mas a história ficou para outro

dia.

Desta forma, apesar de aceitar e incentivar as brincadeiras sugeridas pelas

crianças, a proposta de leitura de histórias apresentou-se como uma modalidade única e

restrita dentro da jornada educativa, centrada na leitura exclusiva da professora,

desconsiderando as possíveis e múltiplas formas de linguagens e de leituras das crianças

e, portanto, seu protagonismo (EDWARDS et al 1999).

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As restrições em relação ao contato com a literatura e com os livros infantis que

observei, já foram denunciadas por FINCO (2007), quando analisa as formas de

didatização das brincadeiras e de escolarização dos corpos nas instituições de Educação

Infantil:

A pré-escola acaba escolarizando as brincadeiras e os corpos. É

possível perceber que o brincar ainda não é o eixo do trabalho

pedagógico, não permeia as práticas educativas nessa etapa da

educação. Muitas vezes o brincar é limitado a um tempo e a um

espaço, o que acaba por transformá-lo em uma atividade

educativa que se encerra apenas em seus aspectos externos e

superficiais - o jogo educativo. (FINCO, 2007, p. 95)

As histórias que observei a professora contar às crianças desenrolaram-se como

práticas educativas nas quais o brincar não fazia parte. Apesar do brincar livre ocupar

grande parte da jornada educativa das crianças e ser valorizado pela professora, ele era

excluído do momento da história, instante no qual as crianças deixavam de ser

protagonistas, como em suas brincadeiras, e passavam a ser vistas pela professora como

“alunas”. Portanto, a literatura não cabia na brincadeira, assim como a brincadeira não

cabia na literatura, como se fossem impossíveis de se realizarem no mesmo tempo e

espaço. Nesta contradição, a professora elevava o brincar como eixo de seu trabalho

educativo, mas o excluía durante as histórias, controlando os corpos das crianças, antes

livres nas brincadeiras.

Diferentemente do que aponta ZURK (2008), a professora escolhia o livro, lia a

história, apontava elementos na ilustração e direcionava trechos ou nomes para

determinada criança, chamando a atenção para suas preferências, tipos físicos ou

comportamentos que apareciam na história. Entretanto:

A tensão da arte narrativa reside na estética do conto, ou melhor,

no narrador. Não, ainda melhor: na relação história – narrador –

ouvintes. Esses se compõem por atos, gestos, emoções, imagens,

olhares, pensamentos, anseios e palavras...Não é possível

entender a estética e a experiência estética da narração oral sem

levar em consideração esse “triângulo amoroso”. Sim, há algo

de amoroso em narrar, há algo de amoroso em ouvir, há algo de

amoroso nas histórias. Há algo que vai além da aparente

passividade do ouvinte, pois a arte narrativa só se constitui,

como toda arte, em algo que só pode ter sentido quando

socializado. O ouvinte não é um ser passivo, ao contrário do que

alguns podem pensar. (ZURK, 2008, p. 126)

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Desta maneira, além da necessidade de intenção educativa, pesquisa e interesse

das professoras em despertar a atenção das crianças por meio das narrativas, seja pela

história, ilustração ou personagens, como fazia a professora observada, as crianças

precisam ser concebidas como ouvintes ativas e não passivas. E como as crianças não

ouvem apenas com os ouvidos, é contraditório esperar que se envolvam com a história e

se encantem com os elementos direcionados a elas se não lhes for permitido participar

de corpo inteiro.

A professora observada preocupava-se em indicar os momentos e elementos que

cada criança tinha de identificar durante a leitura e não deixava espaço para que as

crianças expressassem suas percepções da história, demonstrando desacreditar nas

capacidades das crianças que percebiam esses momentos e seus elementos para além

daqueles percebidos pela própria professora. Com essa postura, demonstrava o quanto

acreditava que a narrativa estava distante das crianças e consolidada como um campo de

domínio exclusivo dos adultos, os quais, portanto, indicam e determinam os caminhos e

formas para sua realização.

Logo, a literatura, apesar de presente na jornada educativa do CEI observado,

não estava disponível às crianças em todos os momentos desta jornada e era colocada

em um lugar no qual apenas a professora detinha o tempo, o espaço e as possibilidades

para sua utilização e apropriação pelas crianças. Assim, as crianças eram vistas como

passivas diante da literatura, a despeito de ser o brincar o eixo do planejamento e as

crianças concebidas como ativas e consideradas de corpo inteiro em outras atividades

planejadas pela professora da turma observada.

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5. Relações entre o brincar e o livro

Certo dia, após a apresentação de uma contadora de histórias no CEI, uma das

meninas da turma que observei direcionou-se ao canto da sala onde ficava a biblioteca e

começou a brincar com os livros. Pegou todos os títulos e passou a organizá-los no

chão, um do lado do outro, enquanto falava algumas coisas que não pude ouvir por estar

do outro lado da sala. Quando me aproximei para melhor observar sua brincadeira, a

professora de outra turma3 aproximou-se e falou para a menina que ela tinha de cuidar

dos livros. A garota acenou com a cabeça e continuou sua brincadeira, demonstrando

que, em sua concepção, estava cuidando dos livros. Afinal, ela os colocava

cuidadosamente no chão, lado a lado, inventando uma brincadeira com os livros sem

precisar abri-los ou ler suas histórias. A professora, entretanto, pela rápida olhada ao

que fazia a menina, não pode considerar outras formas de brincar com os livros que

fossem diferentes dessas, tradicionalmente incentivadas pelos adultos.

Quando questionada sobre os objetivos da referida formação (em Anexo 3), a

coordenadora ressaltou a necessidade de possibilitar às professoras contato com o relato

de escritores sobre a importância da literatura em suas infâncias e ao longo de suas

vidas, além da “(...) reflexão sobre o papel da literatura como linguagem essencial no

currículo de Educação Infantil (...) através da leitura e estudo de diversos textos, através

de vídeos e também através de vivências literárias” (Entrevista com a Coordenadora -

17/06/2013)

Um dos textos que a coordenadora4 utilizou nas reuniões pedagógicas, nas quais

realizou a formação das professoras do CEI sobre Literatura Infantil, abordava, de

forma poética, a importância do brincar com os livros, de autoria de Lygia Bojunga:

Livro: a troca, que me foi disponibilizado pela coordenadora:

Pra mim, livro é vida; desde que eu era muito pequena os livros

me deram casa e comida.

Foi assim: eu brincava de construtora, livro era tijolo; em pé,

fazia parede, deitado, fazia degrau de escada; inclinado,

encostava num outro e fazia telhado.

E quando a casinha ficava pronta eu me espremia lá dentro pra

brincar de morar em livro.

3 Neste dia, a professora da turma que observei faltou e essa professora ficou responsável pela turma.

4A coordenadora do CEI onde foi realizada a pesquisa de campo é formada em Pedagogia e

Psicopedagogia. Atualmente, está cursando Pós-Graduação na Arte de Contar Histórias.

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De casa em casa eu fui descobrindo o mundo (de tanto olhar

pras paredes). Primeiro, olhando desenhos; depois, decifrando

palavras. (...) (BOJUNGA, 2001, p.07)

A cena descrita no início deste item finaliza com a professora solicitando que a

menina guardasse os livros na biblioteca da sala e revela que o processo de formação

docente é lento, pois precisa desconstruir conceitos e preconceitos em relação à infância

e sua educação, incluindo a ampliação destes conceitos e das formas de leituras

possíveis dos livros pelos adultos e pelas crianças, rompendo com as formas ditas

“corretas”, que didatizam sua utilização pelas crianças.

Contrariada, a menina obedeceu a professora, guardando os livros com um ar

triste de quem era impedida de brincar. Tentei perguntar do que estava brincando, mas

ela não quis conversa. Dirigiu-se para o espaço ao lado da biblioteca, onde ficava uma

pequena representação de casa, composta por uma pequena cama, um fogão, um baú

com roupas e bonecas, lá pôde brincar sem restrições.

Ao responder sobre a formação pedagógica sobre literatura (em Anexo 2)

realizada pela coordenadora, a professora5 observada alegou que esta modificou sua

prática, já que uma das propostas da formação foi fazer uma leitura por dia para as

crianças:

(...) antes da proposta de todos os dias uma leitura eu fazia

apenas uma rotina que privilegiava conversas e músicas, sendo

apenas três vezes por semana a leitura do livro. Ao modificar

esta rotina percebi que as crianças começaram a pedir a cesta de

livros e recontar histórias mais vezes. Em determinado dia no

final do dia uma aluna organizou as bonecas no canto da sala e

pegou um livro que ela tinha gostado muito e começou a contar

para as bonecas (Entrevista com a Professora – 16/06/2013).

A mudança em sua rotina não apenas aumentou a quantidade de histórias lidas,

mas também possibilitou espaços, mesmo que pequenos, para as crianças começarem a

se organizar por si próprias e de acordo com suas preferências. Da mesma forma,

possibilitou para ela, a professora, um olhar mais sensível, capaz de perceber a

importância da ação da menina, que cita no final de sua resposta.

5 A professora da turma observada na pesquisa de campo é pedagoga e psicomotricista, especialista em

alfabetização e letramento.

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Importantíssima e necessária para mudanças de posturas de adultos e de adultas

responsáveis pela educação das crianças em instituições especializadas é a seguinte

afirmação de PERROTTI (1990):

(...) se na nova situação os grupos infanto-juvenis já não podem

estar totalmente distantes das vistas adultas, eles necessitam,

todavia, estar sujeitos a condições que lhes possibilitem

organizar-se sem imposições, tão presentes nos atuais espaços

especializados, decorrentes de interesses hegemônicos que

pouco ou nada têm a ver com os da infância enquanto classe de

idade. (PERROTTI, 1990, p.101)

Um momento, pouco observado durante a pesquisa de campo, que possibilitaria

condições para as crianças se organizarem sem imposições diante dos livros seria a

manipulação livre desses objetos, sem interferências de um adulto ou de uma adulta.

Sobre esses momentos, a coordenadora considera fundamental que as crianças

manipulem livremente os livros, segundo ela:

(...) pela necessidade de contato físico com o portador, muitas

vezes até para prolongar o prazer que a leitura do livro

proporcionou. A criança pequena se relaciona com o mundo

através de todos os sentidos. Manipular o livro também é uma

possibilidade de aprender sobre as características da escrita e

sobre os procedimentos de leitura. Esta relação mais próxima

desenvolve o comportamento leitor e o desejo de aprender a ler.

(Entrevista com a Coordenadora – 17/06/2013)

Já a professora, embora considerasse importante que as crianças manipulem os

livros livremente, como destacou: “(...) o momento em que a criança pode fazer uma

livre interpretação, reconta a história e ainda busca elementos nesta história que lhe

desperta o letramento, elemento fundamental para a alfabetização” (Entrevista com a

Professora – 16/06/2013), apenas uma vez, durante as observações de campo, abriu

espaço para esse momento livre das crianças com os livros.

Ambas, professora e coordenadora, afirmam ser importante esse momento livre

das crianças com os livros. No entanto, observei uma forte presença de uma motivação

didática e pedagógica em suas afirmações, com referências à questão da alfabetização e

ao aprender a ler - o que se explica pela própria história da literatura infantil, que:

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(...) como seleção, publicação e distribuição de textos destinados

à criança teve seu início vinculado à pedagogia. O aspecto

meramente lúdico de um texto não justificava a publicação,

apenas o critério de utilidade educativa legitimava a difusão de

histórias infantis. Este didatismo prepondera maciçamente até o

surgimento de obras como Alice no país das maravilhas, de

Lewis Carrol, A ilha do tesouro, de Robert L. Stevenson e as

histórias de Mark Twain: As aventuras de Tom Sawyer e As

aventuras de Huckleberry Finn. Com esses autores, o moralismo

conformativo perde terreno, embora isso não signifique a

remoção do jugo pedagógico a que tem estado submetida a

literatura infantil. (ZILBERMAN; MAGALHÃES, 1984, p. 41)

O CEI contém um acervo diversificado de livros infantis, de títulos simples a

livros com elaboração gráfica de alta qualidade. Foi possível encontrar livros de grandes

autoras e autores brasileiros e estrangeiros, livros-imagem, releituras de contos

clássicos, histórias sobre diferentes culturas, livros de poemas, livros sobre artistas

plásticos, histórias simplistas, emancipatórias e adultocêntricas. No entanto, a qualidade

do trabalho que foi e será realizado com esses livros não depende apenas de sua

qualidade, mas também da abordagem, das formas como serão apresentados e

apropriados pelas crianças.

Para a professora observada, os livros do acervo da instituição são adequados

para a faixa etária das crianças do CEI, pois: “há histórias diversificadas para os

diferentes públicos, princesas, bruxas, animais e outros.” (Entrevista com a Professora –

16/06/2013). A coordenadora afirma que os livros do acervo do CEI são adequados

apenas para as crianças entre 2 e 4 anos de idade, “porém, os títulos disponíveis no

acervo são insuficientes e inadequados para as crianças do Berçário I e Berçário II.

(entre 0 e 2 anos).” (Entrevista com a Coordenadora – 17/06/2013), pois tem:

(...) observado que os bebês revelam grande interesse e

necessidade de se relacionar sensorialmente com os livros:

tocando, manuseando, levando à boca, sentindo...ou seja, os

pequenos exploram os livros das mais diversas formas. Assim,

percebemos que é importante que os livros para os bebes sejam

mais reforçados, com páginas mais firmes e que promovam

diferentes sensações táteis, sonoras, visuais, etc...Os livros tipo

Pop Up é a grande sensação para o berçário e temos

pouquíssimos exemplares. Os livros sonoros e até mesmo

aqueles com diferentes texturas também são os preferidos dos

bebês e temos poucos exemplares. Eles demonstram muito

interesse pelas imagens e portanto a ilustração também é um

critério de qualidade dos livros para bebês. Neste sentido,

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precisamos ampliar e qualificar o acervo do CEI com livros

destas características. (Entrevista com a Coordenadora –

17/06/2013)

As afirmações da coordenadora suscitam alguns questionamentos: só os bebês

têm interesse de se relacionar sensorialmente com os livros? Os bebês são os únicos ou

os que mais demonstram grande interesse pelas ilustrações? A qualidade das ilustrações

é critério importante somente na seleção dos livros destinados aos bebês?

A coordenadora cita os livros que acredita serem os ideais para os bebês de 0 a 2

anos de idade e descreve os livros-brinquedos (livros Pop-up, sonoros, com texturas,

com aromas), que privilegiam mais a durabilidade e os atrativos do que o texto literário

e a ilustração artística. Entretanto, além do caráter emancipatório dos livros-brinquedos,

recentemente pensados para as crianças de 0 a 2 anos de idade, os livros que não são

resistentes à baba, à água, às mãos hábeis, à curiosidade plástica ou aos pequenos dentes

recém-adquiridos dos bebês não podem compor sua biblioteca? Do mesmo modo, as

crianças que ainda não dominam a leitura da palavra escrita devem ser privadas de

livros que contêm grandes textos? Como conceber, de fato, as crianças pequenas e bem

pequenas como sujeitos de direito ao universo diverso da literatura: textual,

iconográfica, bidimensional, tridimensional e as suas diferentes formas de leitura?

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6. Contos e recontos: análise de duas histórias e suas formas de leituras

Neste capítulo analisarei a história de dois livros infantis, A Verdadeira História

dos Três Porquinhos e O cabelo de Lelê, a partir dos próprios livros e da leitura que a

professora observada realizou para sua turma.

De todas as histórias que ouvi a professora contar durante a pesquisa de campo,

optei por fazer a análise dessas duas por acreditar que ambas trazem à tona assuntos

importantes para serem discutidos pela perspectiva da Literatura e da Educação Infantil.

Uma é analisada a partir da apropriação do folclore estrangeiro pela literatura infantil

brasileira e a outra propõe a discussão das relações étnico-raciais na primeira infância.

Apesar de os livros apresentarem esses importantes assuntos, a professora

considerou outros aspectos, como a paixão por lobos de uma das crianças e a

coincidência de nomes dos personagens com os de algumas crianças da turma, para a

sua seleção, abordando de forma superficial temas latentes nas duas obras.

As duas publicações faziam parte do acervo literário do CEI, mas não

compunham o acervo da biblioteca de sala na época em que foram lidos, permanecendo

à disposição das crianças da turma apenas no dia em que foram lidos pela professora.

Era comum a professora escolher livros que não pertenciam ao acervo da biblioteca de

sala. Afinal, o acervo literário da escola era bastante amplo, embora contasse somente

com um exemplar de muitas dessas obras. Isso revela que era preocupação latente da

professora ampliar o seu repertório literal e o das crianças para além dos livros

disponibilizados em sua sala.

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6.1 Análise teórica do livro A Verdadeira História dos Três Porquinhos

Autor: Jon Scieszka

Ilustrador: Lane Smith

Tradutor: Pedro Maia

Editora: Companhia das Letrinhas

Ano: 2005

O livro começa com a seguinte introdução: “Em todo o mundo, as pessoas

conhecem a história dos Três Porquinhos. Ou, pelo menos, acham que conhecem. Mas

eu vou contar um segredo. Ninguém conhece a história verdadeira, porque ninguém

jamais escutou o meu lado da história” (SCIESZKA, 2005, s/n). Quem fala é o lobo da

tão conhecida história dos três irmãos porquinhos que viviam na floresta, cada um na

casa que construiu: a do mais novo de palha, a do porquinho do meio de madeira e a do

porquinho mais velho de tijolos.

O lobo está certo, pois o “aproveitamento da tradição popular, de transmissão

originalmente oral e vinculada às populações dependentes da economia agrícola, vem

sendo uma constante da literatura infantil desde seu aparecimento na Europa dos séculos

XVIII e XIX” (LAJOLO; ZILBERMAN, 2006, p.68). No entanto, os autores afirmam

que o mesmo não ocorreu com o folclore brasileiro, que se apropriou de elementos da

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literatura infantil europeia, quando esta já havia se apropriado do material folclórico

local, e deixou de lado o material cultural popular brasileiro.

A Verdadeira História dos Três Porquinhos (SCIESZKA, 2005) é outra versão

do conto clássico Os Três Porquinhos, contada agora pelo lobo. O personagem afirma

que ganhou o titulo de lobo mau por um mal-entendido. Nesse livro, o lobo confirma

que come animais fofinhos, mas que se dirigiu à casa dos porquinhos somente para

pedir uma xícara de açúcar que lhe permitira preparar um bolo para a sua avó.

Chegando à casa do primeiro porquinho, espirrou e a casa caiu. Diante disso, o lobo

alega que o porquinho no meio da palha já estava morto quando o comeu. O mesmo

aconteceu com o segundo porquinho. Na casa do terceiro irmão, o lobo ficou irritado

com a recusa do porco em lhe dar uma xícara de açúcar. Quando a polícia chegou,

encontrou o lobo bufando e ele diz que o resto é história.

Tive um azar: os repórteres descobriram que eu tinha jantado os

outros dois porcos. E acharam que a história de um sujeito

doente pedindo açúcar emprestado não era muito emocionante.

Então enfeitaram e exageraram a história com todo aquele

negócio de “bufar, assoprar e derrubar sua casa”. E fizeram de

mim o Lobo Mau. (SCIESZKA, 2005, s/n)

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Diferentemente do conto clássico, o lobo conta sua versão buscando inocentar-se

da acusação de mau, mas sem tentar criar uma imagem de bonzinho. O que ele revela é

que, quando foi às casas dos porquinhos, não tinha a intenção de invadi-las, destruí-las e

de comer os animais. Foi apenas com a intenção de pedir uma xícara de açúcar.

As crianças, de tanto ouvirem histórias assemelhadas às dos Três Porquinhos,

ficaram acostumadas com a estrutura dos contos de fadas ou fábulas, adaptações de

contos orais, nos quais o bem e o mal são claramente definidos e opostos. COLOMER

(2003) relata o estudo de BETTELHEIM, na obra A psicanálise dos contos de fadas

(1975), no qual o autor estabelece características positivas dos contos de fada para a

literatura infantil:

As principais destas características são: a simplicidade das

situações descritas, a clara distinção entre o bem e o mal, a

facilidade de identificação do leitor com o herói positivo e o

desenlace feliz da história. A mensagem moral transmitida por

esta literatura parece ser a de proporcionar uma “ordem” em

relação à “confusão da vida interior”, e iria reforçar diretamente

uma crença necessária para o desenvolvimento pessoal da

criança: “que crescendo e trabalhando durante e chegando à

maturidade, algum dia sairá vitoriosa” (COLOMER, 2003, p.

63).

Os contos folclóricos brasileiros não se enquadram nessas “características

positivas”, pois nas histórias do Saci, do Curupira, da Iara e de outros personagens do

nosso folclore, não encontramos um herói positivo ou uma clara distinção entre o bem e

o mal. Talvez por esse motivo, estão menos presentes no repertório infantil do que os

contos do folclore de outros países. Segundo LAJOLO e ZILBERMAN (2006), no

Brasil:

Com a disseminação do Modernismo, que incluía o folclore

entre suas fontes inspiradoras, aumentaram consideravelmente

as chances de que esse material viesse a ser também aproveitado

na literatura para crianças, repetindo-se nela o que ocorrera com

as narrativas produzidas pelos segmentos antropofágicos e

verde-amarelo do movimento, como Macunaíma e Martim-

Cererê, respectivamente. No entanto, a incorporação do acervo

lendário e popular à literatura infantil, nessa época, não impediu

a permanência do processo de adaptação de obras estrangeiras, e

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não apenas de tradução [...].(LAJOLO; ZILBERMAN, 2006,

p.68)

Portanto, não é apenas na transmissão oral que esses contos folclóricos

estrangeiros aparecem. São inúmeros os filmes de animação e os livros infantis que

trazem releituras dos contos. As crianças já conhecem as histórias de trás para frente,

contadas em casa, nos cinemas, teatros e nas instituições de Educação Infantil. Para

ZILBERMAN e MAGALHÃES (1984), “a sobrevivência desse gênero narrativo, em

nossos dias, depende de modificações que o compatibilizem com o caráter

emancipatório da literatura.” (ZILBERMAN e MAGALHÃES, 1984, p. 141), já que os

contos perderam todo o caráter de rebeldia quando foram apropriados pela literatura

infantil e por serem “reflexo de uma forma social ultrapassada” (ZILBERMAN e

MAGALHÃES, 1984, p. 141), a feudal.

No entanto, essas modificações, que para ZILBERMAN e MAGALHÃES

(1984) são necessárias para manter esse gênero nos dias atuais, enfrentam dificuldades.

O livro A Verdadeira História dos Três Porquinhos foi escrito em 1989 e rejeitado por

várias editoras. As muitas releituras dos contos clássicos que mantêm suas

características moralistas, estereotipadas e preconceituosas continuam a surgir e gerar

expressivas vendas:

A que se deve isto: ao fato de, ainda assim, agradarem aos

pequenos? Ou porque satisfazem principalmente os adultos, que

se valem dos textos como veículo de manipulação da criança e

motivação da dependência infantil? Ou ainda porque, sendo eles

encontráveis no mercado, os leitores consomem-nos e, por

inércia, fica assegurada sua circulação maciça?

As respostas talvez estejam nas mãos de uma sociologia da

leitura ainda por constituir-se; de todo modo, não pertencem à

história, nem à crítica literária. Mas, como lição para estas duas

áreas, mostram que a qualidade não é condição do consumo,

nem a crítica, filtro do mercado. Limitações da teoria literária,

algumas mais fortes talvez que as limitações artísticas das obras

que examina. (LAJOLO; ZILBERMAN, 2006, p.117)

O livro em análise termina com a seguinte fala do lobo: “Mas talvez você possa

me emprestar uma xícara de açúcar” (SCIESZKA, 2005, s/n), acompanhada pela

ilustração do lobo atrás das grades segurando uma caneca gravada com a palavra

CADEIA e um porco vestido de policial do lado de fora da cela. A frase soa como uma

pergunta. Você acreditou na história do lobo Alex? Pergunta que poderia ser estendida

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para uma discussão. Por que acreditar ou não acreditar na história que o lobo nos

contou?

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6.2 A Roda de História do livro A Verdadeira História dos Três Porquinhos

A Verdadeira História dos Três Porquinhos (SCIESZKA, 2005) foi a primeira

história que ouvi durante a pesquisa de campo. A professora reuniu as crianças no tapete

que marcava o espaço da biblioteca da sala. Os livros ficavam dispostos em uma espécie

de prateleira fixada na parede de um dos cantos da sala, ao alcance das crianças. Eram

cerca de dez títulos, mas este livro fazia parte do acervo da biblioteca da escola.

Quando apresentou o livro, antes de iniciar a leitura, a professora explicou que a

história era contada pelo lobo e chamou a atenção para o fato de o nome do lobo ser o

mesmo de uma das crianças da turma. Posteriormente, ao responder as questões

propostas (em Anexo 2), questionei a professora sobre os critérios que utilizou para a

seleção das duas histórias, além dos nomes em comuns das personagens e das crianças:

“Então, na verdade, procurei ler um livro para o gosto de cada criança, por exemplo, o

Leandro6 tinha paixão pelo Lobo e os 3 porquinhos (...)” (Entrevista com a Professora –

16/06/2013).

As crianças estranharam a versão desde o início e interromperam a leitura da

professora em diversos momentos, na tentativa de encontrar nela a velha história que

lhes foi contada inúmeras vezes. Essa foi uma reação já esperada, visto que os contos

folclóricos de outros países são repetidamente contados, principalmente, na Educação

Infantil. Os contos recolhidos por Perrault e pelos irmãos Grimm ainda estão presentes

no repertório da produção cultural e no imaginário infantil de tal forma que uma versão

que nubla a clareza dos lugares de bem e de mal, ocupados pelos personagens, não é

aceita e entendida pelas crianças de imediato. Essa ligação do folclore com a literatura

infantil é explicada historicamente por COLOMER (2003):

Embora a literatura de tradição oral não fosse especialmente

dirigida a crianças no momento de sua criação e difusão, é certo

que, desde o início de sua fixação escrita, houve uma vontade

explícita de apelar a estes ouvintes. (COLOMER, 2003, p. 55)

No livro A Verdadeira História dos Três Porquinhos, a característica maldosa

explícita do lobo é posta à prova e as crianças manifestaram-se contra essa possível

6 Os nomes das crianças presentes nesse trabalho são fictícios.

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mudança. Como aceitar um conto em que os porquinhos são comidos pelo lobo por

acidente e não por maldade?

No entanto, depois da leitura e diante das dúvidas das crianças, a professora

apenas resumiu a história falando: “- Esse lobo não é mau”, e finalizou a contação do

livro. A rica discussão que poderia se suceder a partir das dúvidas e indignações das

crianças, lançando um segundo olhar para a história e para suas ilustrações, perdeu-se

quando o livro foi colocado no meio da roda juntamente com os outros da biblioteca da

turma, momento raro de espaço para a manipulação livre dos livros pelas crianças.

Após explorarem os livros da biblioteca da sala, a professora encaminhou a

turma para o parque maior, onde havia escorregadores, balanços e tanque de areia.

Nesse momento, Leandro, o menino que a professora citou como tendo “paixão” pela

história dos três porquinhos e pelo lobo, iniciou uma brincadeira de perseguição, na qual

o lobo mau perseguia as crianças da turma. Outras crianças juntaram-se à brincadeira e,

entre corridas e esgueiradas meticulosas para não chamar a atenção do lobo, Leandro

por vezes era lobo e em outras era alvo do lobo. Em um misto de fantasia e realidade, o

menino e outras crianças pareciam acreditar na existência do lobo que ele mesmo

invocou ludicamente, demonstrando medo desse animal tido como feroz. Portanto, a

história do livro A Verdadeira História dos Três Porquinhos aparentemente não

repercutiu na imagem já enraizada e estereotipada de lobo (mau) pelas crianças – ao

mesmo tempo em que, mesmo se mantendo perigoso e assustador, o lobo também e

rapidamente transformava-se em porquinho e invertia seu papel numa mesma

brincadeira.

A obra em questão não parece, entretanto, buscar somente retirar da história

posturas maldosas do lobo, mas sim modificar um conto clássico abalando as rígidas

estruturas de bem e mal. O lobo não é mau tampouco bom, é um animal que não tem

culpa “se os lobos comem bichos engraçadinhos como coelhos e porquinhos.”

(SCIESZKA, 2005, s/n).

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Segundo SARMENTO (1997):

As culturas infantis não nascem no universo simbólico exclusivo

da infância, este universo não é fechado – pelo contrário, é, mais

do que qualquer outro, extremamente permeável – nem lhes é

alheia a reflexividade social global.

A interpretação das culturas infantis, em síntese, não pode ser

realizada no vazio social, e necessita de se sustentar na análise

das condições sociais em que as crianças vivem, interagem e dão

sentido ao que fazem. (SARMENTO, 1997, p.22)

Portanto, as crianças não se apropriaram da imagem de lobo construída por

SCIESZKA (2005), não por não aceitarem sua proposta, mas por não terem espaço e

tempo para confrontar, se aproximar e se distanciar dela. As dúvidas e questionamentos

surgiram durante a leitura e as crianças, nesse momento, iniciaram o tempo do

confronto entre a nova concepção de bem e mal que lhes era apresentada e a já

conhecida e enraizada. No entanto, sozinhas não conseguiram levar em frente à

discussão, pois esta não foi considerada pela professora. Afinal, “(...) isolada nos

espaços privados, ao ver reduzidas suas possibilidades de experimentar e de expor-se à

diversidade, a infância acha-se pauperizada culturalmente e é nessas condições que se

relaciona com os textos que lhe são propostos nos espaços institucionais.” (PERROTTI,

1990, p.95).

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6.3 Análise teórica do livro: O cabelo de Lelê

Título: O cabelo de Lelê

Autora: Valéria Belém

Ilustradora: Adriana Mendonça

Editora: IBEP

Ano: 2012

O livro conta a história da aceitação e da descoberta de uma menina negra sobre

a origem de seus cabelos crespos. A capa do livro já traz importantes informações: uma

menina negra de volumoso cabelo crespo, que ocupa a maior parte da capa da frente e

se estende à capa detrás do livro, lê sozinha um livro cujo titulo é Países Africanos. O

título da história, O cabelo de Lelê, assim como a ilustração da capa, enfatiza a

existência de um tipo de cabelo que também carrega consigo uma história, além daquela

que será contada. Segundo GOMES (2003):

O cabelo é um dos elementos mais visíveis e destacados do

corpo. Em todo e qualquer grupo étnico ele é tratado e

manipulado, todavia a sua simbologia difere de cultura para

cultura. Esse caráter universal e particular do cabelo atesta a sua

importância como símbolo identitário. (GOMES, 2003, p.174)

É como símbolo identitário que o cabelo é tratado nesse livro, como

característica física de uma raça e símbolo que é construído histórica e socialmente por

meio da cultura de um determinado território. Afinal:

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Se o conceito de raça nos remete a características estéticas,

físicas, tais como formatos de rosto, de nariz, tipos de cabelo,

diferentes graus de concentração de melanina, o de etnia diz

respeito a uma cultura que ocupa um território, ou se encontra

em busca de um, a exemplo dos índios do Brasil, ou dos judeus

e palestinos na Faixa de Gaza. (ABRAMOWICZ e MORUZZI,

2010, p.90)

No inicio do livro, a personagem questiona-se sobre a origem de seu cabelo

crespo: “-De onde vêm tantos cachinhos?, pergunta, sem saber o que fazer.” (BELÉM,

2012, p.05). Nenhum adulto aparece na história. Logo, a menina não recorre a um

adulto para responder seu questionamento, o que demonstra a autonomia da personagem

e a familiaridade com os livros. Afinal, a criança que não tem uma relação cotidiana e

ativa com diferentes tipos de livros conseguiria, sozinha, cogitar a hipótese de encontrar

em um livro a resposta para sua pergunta?

A autora optou por construir uma personagem criança que não depende de um

adulto ou de uma criança mais velha para realizar suas ações, nesse caso, conseguir a

resposta para sua pergunta sobre a origem de seu cabelo crespo. É em um livro que a

personagem busca elucidar sua dúvida, objeto que, muitas vezes, é disponibilizado para

as crianças apenas com o intermédio de um adulto. Essas escolhas da autora sugerem

sua concepção de infância, na qual a criança é protagonista.

No artigo “Os Três Porquinhos e as temporalidades da infância”, PRADO

(2012) utiliza uma versão clássica deste conto infantil para analisar, dentre outros

elementos, a relação hierárquica entre os três porquinhos irmãos, na qual o porquinho

mais velho aparece como o único dos irmãos com conhecimentos e inteligência

necessários para construir uma casa segura para os ataques de um lobo. Propõe, “com

isso, um sentimento de dependência dos irmãos mais novos em relação ao mais velho,

que conquista o poder sobre os mais novos, aparentemente salvando suas vidas.” (p.83).

Assim, a autora afirma que nesse conto a infância é vista como “estado imperfeito,

posto que transitória, inacabada, a infância, assim qualificada na linearidade do tempo

cronológico, parece autorizar a opressão, a dominação, o controle e o adultocentrismo”

(p.83).

Essa concepção de infância é facilmente encontrada em livros infantis nos quais

a personagem criança, que decide se aventurar, tem:

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(...) finais desastrosos ou inquietantes, de modo que acaba por

reforçar a estrutura familiar e a reclusão da personagem no

âmbito doméstico, recanto seguro, mas, ao mesmo tempo, ao

alcance dos pais, que mantêm tranqüilos sua soberania. Nesta

medida, realçando a égide familiar e condenando o herói

buscador, o texto assume um papel normativo, indicando ao

leitor comportamentos preferenciais e reprovando as posturas

interrogadoras.

A veiculação de normas pertence, portanto, à natureza da

literatura infantil, podendo aparecer em graus diferentes, o que

depende de seu comprometimento ideológico com os interesses

do adulto. (ZILBERMAN e MAGALHÃES, 1984, p.110-111).

No entanto, este caso não se aplica à personagem Lelê, que se aventura sozinha

por entre os livros e no fim, em vez de ter que recorrer a um adulto, ela tem sua

pergunta respondida por suas próprias ações - o que fica explicito no seguinte trecho do

livro: “Toda pergunta exige resposta. Em um livro vou procurar!’, pensa Lelê, no canto,

a cismar. Fuça aqui, fuça lá. Mexe e remexe até encontrar o tal livro, muito sabido!, que

tudo aquilo pode explicar.” (BELÉM, 2012, p. 10 e 13).

Para as autoras ZILBERMAN e MAGALHÃES (1984), existe uma:

(...) duplicidade congênita à natureza da literatura infantil: de

um lado, percebida sob a ótica do adulto, desvela-se sua

participação no processo de dominação do jovem, assumindo

um caráter pedagógico, por transmitir normas e envolver-se com

sua formação moral. De outro, quando se compromete com o

interesse da criança, transforma-se num meio de acesso ao real,

na medida em que lhe facilita a ordenação de experiências

existenciais, através do conhecimento de histórias, e a expansão

de seu domínio linguístico. (ZILBERMAN; MAGALHÃES,

1984, p. 14)

Valéria Belém escreveu o livro O cabelo de Lelê e, dentro dele, colocou a

imagem do livro que é capaz de se transformar para a criança que o lê: “num meio de

acesso ao real, na medida em que lhe facilita a ordenação de experiências existenciais,

através do conhecimento de histórias [...]”. Histórias que, no livro Países Africanos, que

simboliza a imagem do objeto livro e seu potencial, são reais.

A personagem que, no início, se mostra insatisfeita com seu cabelo: “Joga pra lá,

puxa pra cá. Jeito não dá, jeito não tem” (BELÉM, 2012, p.07), não só descobre

penteados que pode fazer, como também toda a história que esses penteados e seu

cabelo crespo carregam. Trata-se da descoberta de sua herança étnico/racial. Herança

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presente no seu tipo de cabelo “Herança trocada no ventre da raça. Do pai, do avô, de

além-mar até” (BELÉM, 2012, p.23) e na história de seu povo que muitas coisas viveu,

boas e ruins, e tantos penteados criou.

Depois do Atlântico, a África chama

E conta uma trama de sonhos e medos

De guerras e vidas e mortes no enredo

Também de amor no enrolado cabelo

Puxado, armado, crescido, enfeitado

Torcido, virado, batido, rodado

São tantos cabelos, tão lindos, tão belos! (BELÉM, 2012, p.14)

Lelê passou então a reconhecer seu volumoso e crespo cabelo como herança de

uma raça e se aproximou de sua herança étnica ao ler sobre a cultura e história de seu

povo, demonstrada aqui nos penteados que aprendeu e na história a que teve acesso.

Passou a conhecer e reconhecer seu pertencimento étnico-racial.

O livro termina com a ilustração de três meninas sorridentes e abraçadas: Lelê

com um novo penteado em seu crespo e volumoso cabelo, uma menina de longo e liso

cabelo ruivo e uma menina de cabelo loiro, crespo e volumoso. A ilustração é

acompanhada do seguinte texto: “Lelê amo o que vê! E você?” (BELÉM, 2012, p.29).

A pergunta final faz os leitores, ou pelo menos espera fazer, pensarem sobre si,

sobre as suas características, sobre marcas e incômodos que podem ser consequências

do racismo que, muitas vezes, é velado:

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O mito da democracia racial, norteador de parte das noções que

temos sobre as relações raciais, nos impossibilita de ver a

maneira como o pacto social instituído, o qual diz que vivemos

harmonicamente e que o racismo não existe, influencia e impede

de fazer emergir os efeitos do racismo. Tal ideia impossibilita

que percebamos a valorização estética da brancura que leva

quem não corresponde a esse ideal a constantes mutilações

físicas e psicológicas para ser reconhecido. (ABRAMOWICZ e

MORUZZI, 2010, p.88-89)

As relações étnico-raciais na infância precisam compor a formação docente, o

planejamento dos tempos e espaços educativos com as crianças, as brincadeiras e

brinquedos, livros, histórias, desenhos, danças, decorações, festas etc, não como tema

exótico ou transversal, mas como fundamento educativo das creches e pré-escolas e das

relações na diversidade de idade, de gênero, de classe social, não só étnico-raciais,

constitutivas da formação brasileira, pois, infelizmente, “Há estudos demonstrando o

racismo na escola. Na verdade o racismo aparece já na creche” (ABRAMOWICZ e

MORUZZI, 2010, 89). O livro O cabelo de Lelê traz uma interessante abordagem sobre

esse tema fundamental na educação das crianças e professoras.

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6.4 A Roda de História do livro O cabelo de Lelê

A professora, que trouxe o livro, enfatizou já no início da apresentação o fato de

existir na turma uma menina com o mesmo nome da personagem do livro, negra e de

cabelos crespos assim como a personagem. Em outras leituras, pude perceber que a

professora, algumas vezes, procurava ler histórias com as quais as crianças poderiam se

identificar de alguma forma, como o nome dos personagens ou características destes.

Uma vez trouxe uma história chamada Chega de Beijos, escrita e ilustrada por Emma

Chichester Clark, porque uma das crianças da turma, no início do ano, segundo relato da

professora, não gostava de ser beijada por ela ou pelas outras crianças da turma. Essa

minha constatação foi confirmada pela professora quando esta respondeu a pergunta

sobre como e por quem era feita a seleção dos livros da biblioteca da sala: “É feita por

mim,em alguns momentos são histórias de acordo com as preferências do grupo em

outras indicações de colegas.” (Entrevista com a Professora – 16/06/2013)

Outras duas meninas da turma também tinham os cabelos crespos e a professora,

logo no começo da história, chamou a atenção das crianças para essa semelhança. A

leitura foi feita com entusiasmo e as crianças interessaram-se pela história. A roda,

realizada fora da sala, deixou as crianças à vontade.

Quando chegou a parte do livro que continha uma ilustração de várias garotas

com diferentes penteados, que ocupava duas páginas, a professora pausou a leitura para

que as crianças pudessem admirar a ilustração. Foi um momento divertido e delicado no

qual a professora abriu espaço para que as crianças vissem e lessem a ilustração do

livro. Ela apontou alguns penteados e lembrou aqueles já feitos pelas meninas, quando

surgiram curiosidades sobre os tipos de cabelo de cada uma a professora seguiu na

conversa, falando sobre os diferentes tipos de cabelos, inclusive os dela: “- (...) lisos e

loiros”. Para GOMES (2003):

Destacar a existência de uma positividade nas práticas do negro

diante do cabelo, hoje, quer seja trançando, implantando ou

alisando-o, pode ser um interessante exercício intelectual que

nos afasta das análises que primam pelo olhar da introjeção do

branqueamento. Poderemos resgatar e encontrar muitas

semelhanças entre algumas técnicas de manipulação do cabelo

realizadas pelos negros contemporâneos e aquelas que eram

desenvolvidas pelos nossos ancestrais africanos, a despeito do

tempo e das mudanças tecnológicas. (GOMES, 2003, p.174)

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A história segue com Lelê descobrindo a origem de seus cabelos e encantando-

se com “a beleza de ser como é Herança trocada no ventre da raça. Do pai, do avô, de

além-mar até” (BELÉM, 2012, p. 23). Antes da descoberta, a menina é ilustrada triste e

confusa, sem entender e saber o que fazer com seu cabelo “cheio de cachinhos”. Depois

de ler o livro Países Africanos, no qual encontra a resposta para seu questionamento,

Lelê aparece feliz, com os cabelos livres ao vento e/ou com penteados diferentes.

No entanto, a leitura rica, aberta e delicada perdeu-se no trecho em que Lelê

aparece vestida de branco dançando com um menino, juntamente com o texto: “O negro

cabelo é pura magia/ Encanta o menino e a quem se avizinha” (BELÉM, 2012, p. 24). A

ilustração é sugestiva, pois antes e depois dessa parte, a menina é sempre ilustrada com

shorts laranja e camiseta listrada e, apenas nesse instante, aparece com um vestido

branco. Ao ler essa parte, a professora mudou o tom e continuou a história, dando mais

ênfase ao encontro de Lelê com o menino, que tomou a conotação de namorado, do que

à descoberta da origem de seus cachinhos, de sua beleza, de suas possibilidades e de sua

consequente aceitação.

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A escolha desse livro demonstrou a sensibilidade da professora para perceber as

características do grupo de crianças de sua turma e sua ousadia em abordar um tema

negligenciado, tratado de forma preconceituosa e discriminatória, quando não

silenciado, que trata das relações étnico-raciais na infância e na Educação Infantil.

Escolha que não deveria ser exceção para esse assunto, já que:

A escola é um espaço que deve acolher e promover diferenças.

Para isso acontecer na prática, ela deve se orientar por uma

equalização na qualidade do atendimento que oferece. Os

serviços, as instalações e os equipamentos, o currículo, a

formação de pessoal e tantos outros componentes educacionais

devem ser projetados e executados levando em conta as

diferentes identidades. Não se trata de premiar um segmento da

sociedade em detrimento de outro, mas privilegiar atitudes

voltadas para a valorização das diferenças étnico-raciais.

(ABRAMOWICZ e MORUZZI, 2010, p.86)

Contudo, a questão étnico-racial não foi enfatizada pela professora a partir das

questões e comentários das crianças. A curta conversa que aconteceu posteriormente

entre as crianças e a professora restringiu-se à questão do casamento. A professora

começou cantando a música: “-Siriri pra cá. Siriri pra lá. A Ana7é feia e quer casar”,

colocando o nome de cada criança e perguntado se ela, quando crescesse, casaria. A

brincadeira proposta não aprofundou as relações étnico-raciais, mas quando cesssou a

leitura para a apreciação e leitura das crianças das ilustrações dos diferentes penteados,

a professora considerou a diversidade racial como algo positivo.

7Os nomes das crianças presentes nesse trabalho são fictícios.

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A “conversa” acabou e as crianças foram liberadas para brincar livremente no

parque ao lado, nesse momento, uma das meninas negras de cabelos crespos da turma

resistiu à brincadeira de correr livremente e sentou-se na mureta do parque com o livro

aberto em seu colo. Por vezes, olhava os amigos brincando e ensaiava levantar, mas os

seus olhos e todo o seu corpo concentravam-se novamente e irresistivelmente às páginas

e às ilustrações do livro. Ela não se deteve às ilustrações de Lelê dançando, mas às das

duas páginas que traziam as imagens dos diferentes penteados, alguns que ela própria já

experimentara.

Se, de um lado, o exemplo serve para mostrar que a imaginação

infantil, apesar de tudo, resiste heroicamente às pressões da

uniformidade, ao jogo de forças da instituição, serve também

para mostrar as dificuldades que o confinamento acarreta à

expressão pessoal da criança, ás interpretações divergentes dos

códigos, na medida em que estas, no âmbito institucional, estão

sujeitas aos interesses promotores da privatização. (PERROTTI,

1990, p. 97)

Essa menina, acompanhada de Lelê, descobriu seus “cachinhos” também?

Encantou-se com as múltiplas possibilidades de pentear e despentear seu crespo cabelo

conforme as ilustrações mostraram? Identificou-se com Lelê na construção de seu

pertencimento étnico-racial? Foi finalmente reconhecida como modelo estético de

beleza e de admiração numa sociedade excludente, racista e preconceituosa? Passou a

sentir-se incluída pela professora e pelas outras crianças no contexto educativo do CEI?

Não será possível descobrir o que se passou na imaginação da menina, mas é certo que a

apresentação, a leitura e a conversa sobre o livro em questão, escolhido pela professora,

poderia ter sido ampliada a partir das infinitas e inventivas hipóteses das crianças. Logo,

a menina observada deixou o livro na mureta e se uniu às outras crianças no parque.

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7. Considerações Finais

E se as histórias para crianças passassem a ser de leitura

obrigatória para os adultos?

Seriam eles capazes de aprender realmente o que há tanto tempo

têm andado a ensinar?

(SARAMAGO, 2001, p. 17)

A partir deste estudo, foi possível perceber que ler um livro ou contar uma

história para crianças, por menores que elas sejam, não pode ser um ato aleatório e

despreocupado. A leitura e a exploração dos livros para adultos e crianças podem e

devem ter o caráter de lazer e prazer, de apreciação dessa arte que, principalmente na

literatura infantil, envolve não apenas a arte da palavra e da poesia, mas também das

artes plásticas nas ilustrações e composições dos livros, objetos artísticos que contêm

outros elementos além dos gráficos. No entanto, devemos lembrar, como professoras e

professores e como adultos e adultas, que todo e qualquer livro e toda e qualquer

história lida com o intuito de entreter e dar prazer traz consigo ideologias, práticas

disciplinares, de controle e indicativos de comportamentos.

Sabe-se que:

A educação da infância, não apenas em nosso país, tem

profundas raízes em concepções tão disciplinadoras do

pensamento quanto corretivas dos movimentos dos corpos.

Concepções que encontram nas teorias psicológicas do

desenvolvimento biológico e cognitivo a sustentação ou

legitimação para a modelagem pedagógica das condutas sociais,

relegando tanto o esforço quanto a astúcia do pensamento a

planos de subalternidade nos processos de aprendizagem.

(RICHTER, 2007, p.05)

Porém, proporcionar às crianças pequenas espaços e tempos de contato com a

literatura e com os livros, não se resume a promover uma roda de histórias, a determinar

a postura e condicionar as crianças a ficarem quietas para adquirirem a tão esperada

“postura leitora”. É preciso mais tempo e paciência do que apenas disciplinar os corpos

das crianças. Mas somente na condição de protagonistas é que as crianças poderão

aprender com as professoras e vice-versa – o que nesta pesquisa se revela fundamental e

necessário à formação continuada das professoras.

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Fica deste estudo, para mim e espero que também para os leitores e leitoras, a

clareza de que mesmo que consideremos o livro e a história ruins ou superficiais, não

podemos ignorar que eles carregam outras histórias, da mesma forma, os livros e

histórias que consideramos excelentes. Portanto, ler e contar histórias para as crianças,

da mesma forma que escolher os livros que serão disponibilizados para elas, devem ser

ações realizadas com atenção a todas as linguagens presentes nos livros (literária,

gráfica, plástica, explicita, implícita), e as ideias e valores que podem ser reproduzidos,

discutidos e distorcidos. Mesmo com alguma atenção das professoras na escolha e/ou

leitura dos livros, a Educação Infantil exige ainda mais dessas profissionais docentes,

que devem explorar os livros em todas as suas possibilidades, para uma roda de

histórias que apresente diferentes leituras em diferentes linguagens, de forma dialogada,

com espaço para as opiniões, interpretações e hipóteses das crianças em relação a várias

temáticas, como o exemplo das relações étnico-raciais de O cabelo de Lelê e/ou das

questões paradoxais da Verdadeira História dos Três Porquinhos.

É essencial possibilitar que as crianças façam suas próprias leituras. A leitura do

adulto deve ser prévia a sua ação com as crianças, mas não deve ser determinada nesse

momento, e sim ser aberta às interpretações dos pequenos. Assim, negaremos os:

(...) exercícios de interpretação de textos a que são submetidas

as crianças no dia-a-dia escolar. No geral, as respostas já estão

dadas e não podem fugir ao padrão fixado a priori, situação que

impõe ao signo uma única direção, obrigando que todos o

interpretem na mesma perspectiva, a da instituição. Leituras

divergentes quase nunca são reconhecidas, devendo, se

existirem, ser silenciadas, guardadas, caso o leitor não queira se

expor a algum tipo de sanção. E situações como essa ocorrem a

todo momento no interior das instituições; ali, a todo momento

está-se interpretando, codificando, lendo o mundo para as

crianças. (PERROTTI, 1990, p.96)

É preciso compreender e acreditar que as crianças podem trazer discussões,

problemáticas e percepções de alguns elementos percebidos previamente pelos adultos e

adultas, de outros que passaram e passariam despercebidos sem o olhar dos pequenos e

pequenas. Deste modo, as ligações, interpretações e hipóteses de uma determinada

criança a partir de seu contexto social, econômico e cultural não podem ser ignoradas ou

permanecer ocultas no contexto educativo, público e coletivo da Educação Infantil.

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Que as rodas de histórias na Educação Infantil sejam espaço para as múltiplas

leituras e, também, para as múltiplas vozes do grupo, de professoras e crianças. Apenas

assim será possível que a literatura e os livros infantis façam parte da jornada educativa

das instituições de Educação Infantil de forma plena. O encontro com os livros e as

diversas linguagens presentes neles devem ser expandidas para além das rodas de

história, com mais espaços e tempos para a exploração livre das crianças e para a

construção de formas legítimas de apropriação das linguagens neles presentes e também

ausentes, provocadas, inventadas e transformadas no contexto educativo.

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8. Cronograma de Atividades

PERÍODO

ATIVIDADES

Agosto de 2012 Levantamento e estudo bibliográfico;

Estudo exploratório para seleção do CEI

para realização da pesquisa de campo.

Setembro a novembro de 2012 Levantamento e estudo bibliográfico;

Pesquisa de campo; Observação.

Dezembro de 2012 Levantamento e estudo bibliográfico;

Primeiras análises dos dados coletados.

Janeiro a fevereiro de 2013 Levantamento e estudo bibliográfico;

Elaboração e Entrega do Relatório Parcial

da pesquisa.

Março a maio de 2013 Levantamento e estudo bibliográfico;

Continuidade da Pesquisa de campo;

Elaboração dos Roteiros para as

entrevistas semi-estruturadas com a

coordenadora e com a professora;

Continuidade da Análise dos dados.

Junho a julho de 2013 Realização das entrevistas;

Análise Final dos dados coletados;

Elaboração e Entrega do Relatório Final

da pesquisa.

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Referências

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Associados, 2005, p.23-50.

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Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. Porto Alegre/RS: Contrabando,

1998, p. 229-246.

LÜDKE, Menga e ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens

qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MARIN, Lara C. P. Este Castelo será meu: o consumo infantil como produtor de

significados e definidor de identidades na sociedade contemporânea. Trabalho de

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MEIRELES, Cecília. Problemas da literatura infantil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,

1984.

PAULA, Bianca B. de. Narrar, Imaginar e se movimentar: Um estudo sobre a

“inseparabilidade linguageira entre corpo, imagem e palavra” na Educação Infantil.

Trabalho de Iniciação Científica, FEUSP, São Paulo, 2010.

PERROTTI, Edmir. A criança e a produção cultural. In: ZILBERMAN, Regina. (org) A

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_______. Confinamento cultural, infância e leitura. São Paulo: Summus, 1990.

PRADO, Patrícia D. As crianças pequeninas produzem cultura? Considerações sobre

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RICHTER, Sandra. Experiência poética e linguagem plástica na infância. ANPED,

(GE: Educação e Arte) Caxambu, 2007.

RODARI, Gianni. Gramática da Fantasia. São Paulo: Summus. 1982.

SARAMAGO, José. A Maior Flor do Mundo. Lisboa: Editorial Caminho, 2011.

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identidades. Braga/Portugal: Centro de Estudos da Criança da Universidade do Minho,

1997, p.07-28.

SAYÃO, Deborah Thomé. Cabeças e corpos, adultos e crianças: cadê o movimento e

quem separou tudo isso? Revista Eletrônica de Educação. São Carlos/SP: UFSCar. V.2,

n.2: 92-105, Nov. 2008.

SCIESZKA, Jon. A Verdadeira História dos Três Porquinhos. São Paulo: Companhia

das Letrinhas, 1993.

VIANNA, Cláudia Pereira. O sexo e o gênero da docência. Cad. Pagu. Campinas/SP,

n.17-18, p. 81-103. 2002.

ZILBERMAN, Regina e MAGALHÃES, Ligia C. Literatura infantil: autoritarismo e

emancipação. São Paulo: Ática, 1984.

ZURK, Bernardo. Imagina enquanto eu te conto. In: FRITZEN, Celdon; MOREIRA,

Janine (orgs). Educação e Arte: as linguagens artísticas na formação humana.

Campinas/SP: Papirus, 2008, p. 119-129.

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http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/Escolas/400232/Default.aspx, acessado em

28/02/2013

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ANEXO 1 - MODELO DO TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E

ESCLARECIDO

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu, _____________________________________________

RG____________________________

______________________________________________________________________

_________

(parentesco e nome da criança – se familiar e/ou responsável)

Ou

______________________________________________________________________

________

(função – se profissional da unidade)

da

______________________________________________________________________

_____, na cidade de São Paulo/SP, autorizo a realização da pesquisa: Quem lê, o que e

como?: um estudo sobre livros, histórias, imagens e Educação Infantil, assim como, a

coleta e a utilização dos dados coletados no ano de 2012 (observações, entrevistas,

depoimentos, materiais produzidos, etc.) pela aluna Lara Fernandes Moreira da

Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, RG:45.019.432-2, e-mail:

[email protected], telefone: 8056-1180, para âmbito restrito de sua pesquisa de

Iniciação Científica (IC) e seus desdobramentos de divulgação científica (publicações e

apresentação em congressos acadêmicos), comprometendo-se a disponibilizar todos os

dados coletados, retornar e discutir os resultados obtidos na presente pesquisa com esta

unidade, assim como colocar-se a disposição para qualquer dúvida e esclarecimentos.

Data ___/___/______.

Assinatura_______________________________________________________

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ANEXO 2: ROTEIRO DA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM A

PROFESSORA

1- Qual a sua formação acadêmica?

2- Já fez ou faria cursos e práticas relacionados à literatura?

3- Há quanto tempo é professora? Sempre na Educação Infantil?

4- Qual a importância da literatura e dos livros na jornada educativa?

5- Você acredita ser importante as rodas de história. Por quê?

6- Você acredita ser importante para as crianças que elas manipulem os livros

livremente? Por quê?

7- Em sua opinião, os livros do acervo da instituição são adequados para crianças

dessa faixa etária?

8- Como e por quem é feita a seleção dos livros da biblioteca da sua sala?

9- Qual a importância da literatura no seu cotidiano?

10- Fale a respeito da formação pedagógica sobre literatura que a coordenadora

organizou. Modificou a sua prática?

11- Durante minhas observações, você leu os livros A Verdadeira História dos Três

Porquinhos e O cabelo de Lelê para sua turma. Por que você escolheu esses

livros para ler para a sua turma? Na época, mencionou os nomes dos

personagens dos livros que eram iguais aos de duas crianças da turma, Alex e

Lelê. Esse foi um dos critérios para a seleção?

12- Esses livros pertenciam ao acervo da escola?

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ANEXO 3: ROTEIRO DA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA COM A

COORDENADORA

1- Qual a sua formação acadêmica?

2- Já fez ou faria cursos e práticas relacionados à literatura?

3- Há quanto tempo é coordenadora? Sempre na Educação Infantil?

4- Qual a importância da literatura e dos livros na sua jornada educativa?

5- Qual a importância da literatura no seu cotidiano?

6- Você acredita ser importante a prática de rodas de história. Por quê?

7- Você acredita ser importante para as crianças que elas manipulem os livros

livremente? Por quê?

8- Em sua opinião, os livros do acervo da instituição são adequados para crianças

dessa faixa etária?

9- Por que você acha que os livros do acervo são insuficientes e inadequados para

as crianças dos berçários? Quais seriam os livros adequados para essa faixa

etária?

10- Como as professoras utilizam o acervo literário da escola? Com qual frequência

trocam os livros da biblioteca de sala?

11- Fale a respeito da formação pedagógica sobre literatura que coordenou.

12- No inicio da pesquisa, relatou que encontrou dificuldades para trabalhar o tema

(literatura) com as professoras. Ao longo do curso, houve mudanças?

13- Os livros que chegaram no segundo semestre do ano passado promoveram

alguma mudança na jornada educativa do CEI?

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Anexo 4 - Certificado do I Seminário Internacional Educação Infantil e Diferença

(UFSCAR)

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Anexo 5 - Declaração de Atividades junto ao Grupo de Estudos: Pesquisa e

primeira infância: linguagens e culturas infantis (FEUSP) no I Seminário

Internacional sobre Infâncias e Pós-Colonialismo (UNICAMP)

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Anexo 6 - Resumo apresentado ao 21º SIICUSP (USP/SP)