Debatendo o BRICS - Funag

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EvEntos

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MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES

Ministro de Estado Embaixador Antonio de Aguiar Patriota Secretário-Geral Embaixador Eduardo dos Santos

FUNDAÇÃO ALEXANDRE DE GUSMÃO

Presidente Embaixador José Vicente de Sá Pimentel

Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais

Centro de História e Documentação Diplomática

Diretor Embaixador Maurício E. Cortes Costa

A Fundação Alexandre de Gusmão, instituída em 1971, é uma fundação pública vinculada ao Ministério das Relações Exteriores e tem a finalidade de levar à sociedade civil informações sobre a realidade internacional e sobre aspectos da pauta diplomática brasileira. Sua missão é promover a sensibilização da opinião pública nacional para os temas de relações internacionais e para a política externa brasileira.

Ministério das Relações Exteriores Esplanada dos Ministérios, Bloco H Anexo II, Térreo, Sala 1 70170-900 Brasília, DF Telefones: (61) 2030-6033/6034/6847 Fax: (61) 2030-9125 Site: www.funag.gov.br

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Brasília – 2013

Debatendo o BRICS

Organizador: José Vicente de Sá Pimentel

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Direitos de publicação reservados à Fundação Alexandre de Gusmão Ministério das Relações Exteriores Esplanada dos Ministérios, Bloco H Anexo II, Térreo 70170-900 Brasília-DF Telefones: (61) 2030-6033/6034 Fax: (61) 2030-9125 Site: www.funag.gov.br E-mail: [email protected]

Equipe Técnica:

Eliane Miranda PaivaFernanda Antunes SiqueiraGuilherme Lucas Rodrigues MonteiroJessé Nóbrega CardosoVanusa dos Santos Silva

Projeto Gráfico: Daniela Barbosa

Programação Visual e Diagramação: Gráfica e Editora Ideal Ltda.

Debatendo o BRICS / José Vicente de Sá Pimentel (Org.). – Brasília : FUNAG, 2013.

284 p.; 23 cm.

ISBN: 978-85-7631-438-7

1. BRICS. 2.Cooperação econômica internacional. 3. Artigos.I. Fundação Alexandre de Gusmão. II. José Vicente de Sá Pimentel.

CDU: 339.92

Impresso no Brasil 2013

Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Talita Daemon James – CRB-7/6078 Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional conforme Lei nº 10.994, de 14/12/2004.

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Conselho editorial da Fundação alexandre de Gusmão

Presidente: Embaixador José Vicente de Sá Pimentel

Presidente da Fundação Alexandre de Gusmão

Membros: Embaixador Ronaldo Mota Sardenberg

Embaixador Jorio Dauster Magalhães

Embaixador José Humberto de Brito Cruz

Ministro Luís Felipe Silvério Fortuna

Professor Clodoaldo Bueno

Professor Francisco Fernando Monteoliva Doratioto

Professor José Flávio Sombra Saraiva

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aPresentação

Dando continuidade aos debates entre diplomatas, acadêmicos e outros formadores de opinião de várias regiões do Brasil, iniciados com o seminário que deu origem ao livro “O Brasil, os BRICS e a Agenda Internacional”, a Funag organizou, em 27 de abril de 2012, no Palácio Itamaraty do Rio de Janeiro, e em 31 de julho subse-quente, na sede da FIESP, em São Paulo, duas mesas-redondas para discutir o BRICS. A primeira voltou-se para a análise dos resultados da reunião de Ministros de Comércio e da quinta cúpula dos Che-fes de Governo dos BRICS, realizadas, respectivamente, em 28 e 29 de março de 2012, na capital indiana. Para a segunda, foram convi-dados também intelectuais da Rússia, Índia, China e África do Sul, com o objetivo de auscultar as percepções de acadêmicos dos demais BRICS e, na medida do possível, obter sugestões sobre medidas ca-pazes de fortalecer a cooperação entre os cinco países.

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Depois de degravadas, as intervenções dos debatedores foram editadas por mim. Constituem a primeira e a segunda parte deste livro e, a meu ver, oferecem um expressivo painel das dúvidas e expectativas que acadêmicos e jornalistas costumam nutrir com relação ao BRICS, seguidas de explicações detalhadas sobre os bas-tidores das tratativas entre os cinco países, fornecidas de viva voz por diplomatas e outros negociadores que participaram das reuni-ões do grupo.

Os debates foram intensos e proveitosos, creio eu, sobretudo para os diplomatas que, diante de certas provocações, tiveram es-tímulos para aprofundar reflexões e ajustar a mira nas respostas. Nesse exercício, revelou-se com clareza a existência de uma grande demanda por informações sobre o BRICS. De fato, uma das reco-mendações recorrentes, durante os trabalhos, foi a de que o Itama-raty faça um esforço de divulgação sobre os objetivos brasileiros no âmbito desse inovador mecanismo de política externa, e contem-ple também outras medidas com o objetivo de consolidar a adesão da sociedade civil. Esta seria, inclusive, a maneira recomendada de ampliar o sucesso da sexta reunião de cúpula do BRICS, que o Bra-sil sediará em 2014.

A fim de facilitar a divulgação dos temas debatidos, acrescen-tei ao livro uma terceira parte, em que resumi as principais inter-venções e procurei encadear os assuntos numa narrativa tão linear quanto possível. O breve resumo reproduz, no mais das vezes ipsis literis, as palavras dos debatedores.

Tendo em mente que esta publicação proporciona uma refe-rência bibliográfica para estudantes, professores, profissionais da imprensa, homens de negócios e outros possíveis interessados em informações sobre o BRICS, transcreve-se, num anexo, o texto dos comunicados dos chanceleres (16 de maio de 2008) e dos líderes (16 de junho de 2009), emitidos nas duas primeiras reuniões, am-bas em Ecaterimburgo, e os das declarações relativas às cúpulas de

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Brasília (15 de abril de 2010), Sanya (14 de abril de 2011) e Nova Delhi (29 de março de 2012).

A quinta e última parte do livro contém minibiografias dos participantes nos seminários, aos quais renovo os meus agradeci-mentos pelas contribuições que asseguram a qualidade e a utilida-de desta obra.

José Vicente de Sá PimentelEmbaixador, Presidente da Funag

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sumário

Mesa-Redonda no Palácio Itamaraty 15

RJ, 27 de abril de 2012

Mesa-Redonda na FIESP 105

SP, 31 de julho de 2012

Breve Resumo dos Debates 179

Comunicado Conjunto da Reunião Ministerial de Ecaterimburgo 193

Ecaterimburgo, Rússia,16 de maio de 2008

Comunicado Conjunto dos Líderes dos Países BRIC 199

Ecaterimburgo, Rússia, 16 de junho de 2009

Declaração Conjunta da II Cúpula de Chefes de Estado/Governo 205

Brasília, 15 de abril de 2010

Declaração Conjunta da III Cúpula de Chefes de Estado/Governo 217

Sanya, China, 14 de abril de 2011

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Declaração Conjunta da IV Cúpula de Chefes de Estado/Governo 229

Nova Delhi, Índia, 20 de março de 2012

Participantes das Mesas-Redondas 249

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mesa-redonda no PaláCio itamaraty

rJ, 27 de abril de 2012

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Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – É com gran-de prazer que dou as boas-vindas a todos os participantes desta segunda etapa do exercício que reúne Itamaraty e Academia para discutir o BRICS e sua importância para a agenda internacional. Tivemos a primeira reunião na sede da Fundação Armando Alvares Penteado – FAAP, em São Paulo. O livro com os textos escritos para essa mesa-redonda já foi publicado pela Funag1.

Lembro que um dos objetivos deste nosso exercício é juntar o maior número possível de acadêmicos de todo o país e não apenas do eixo São Paulo-Rio-Brasília. Temos nesta mesa representantes de universidades do ABC, da Amazônia, do Ceará, da Paraíba, entre ou-tros. Foram convidados, mas tiveram impedimentos de última hora, representantes do Rio Grande do Sul, de Minas Gerais, de Santa Catarina e de outros Estados, que estarão com certeza nos próximos debates, uma vez que os temas de política externa interessam de perto a um número cada vez maior de unidades da Federação.

No encontro de dezembro de 2011, em São Paulo, discutimos o BRICS por uma perspectiva mais teórica. Hoje, a ideia é examinar pragmaticamente os resultados da segunda Reunião de Ministros de Comércio e da quinta cúpula dos Chefes de Governo dos BRICS, realizadas, respectivamente, em 28 e 29 de março do corrente ano de 2012, em Nova Delhi. Quero propor que centremos nossos de-bates no que saiu desses dois encontros realizados na Índia.

1 O Brasil, os BRICS e a Agenda Internacional. Brasília: FUNAG, 2012. 344 p.

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Na próxima mesa-redonda, prevista para fins de julho próxi-mo, debateremos as perspectivas do BRICS e procuraremos trazer especialistas estrangeiros, pelo menos um representante de cada um dos outros quatro BRICS.

Dando início ao intercâmbio de hoje entre os negociadores do governo brasileiro e os analistas acadêmicos, teremos uma ex-posição da Embaixadora Maria Edileuza Fontenele dos Reis, que participou da cúpula de Delhi na condição de Subsecretária para Assuntos Políticos III e sherpa2 política dos BRICS no Itamaraty. Em seguida, a Secretária de Comércio Exterior do MDIC, Tatiana Prazeres, falará sobre reuniões de que participaram os Ministros do Comércio do BRICS, enquanto o Embaixador Carlos Márcio Cozendey, Secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, abordará o estado da arte das principais negociações financeiras conduzidas pelos cinco países. Após essas três exposi-ções iniciais, abriremos espaço para perguntas, comentários e su-gestões pertinentes.

Com a palavra, a Embaixadora Edileuza.

Embaixadora Maria Edileuza Fontenelle Reis – É uma satisfação estar novamente com os senhores e as senhoras para discutir esse tema tão fascinante que é o BRICS. Muito obrigada, Embaixador José Vicente, por organizar esses encontros. Acho ex-tremamente importante esse debate com ampla participação aca-dêmica, para que nós possamos enriquecer as nossas percepções sobre esse mecanismo, ainda em fase de formação, no qual, a cada cúpula, os líderes diversificam as áreas de atuação, aprofundam o diálogo e intensificam a cooperação.

2 N.E.: Funcionário governamental de alto nível que chefia uma delegação responsável por reuniões e conferências, principalmente no que se refere à condução de trabalhos preparatórios, antes de uma cúpula. Geralmente é auxiliado por sub-sherpas, responsáveis por assuntos específicos. Auxilia o Chefe de Estado ou o Ministro das Relações Exteriores no âmbito de sua competência.

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O BRICS, convém repetir, é um mecanismo muito novo; tem apenas três anos, pois a contagem começa a partir da cúpula de Ecaterimburgo, de junho de 2009. Um mecanismo que não pre-tende ser uma aliança geopolítica, nem uma organização interna-cional. É um foro político-diplomático, que tem atuado em duas vertentes. Uma é a de coordenação de posições em foros interna-cionais. Desse prisma, a vertente de maior sucesso até o momento, pelo menos a mais visível, é a área econômica. Meus colegas des-sa área terão oportunidade de falar sobre a coordenação dos cinco BRICS no G20 e sobre a sua contribuição para a reforma das insti-tuições financeiras internacionais.

A outra vertente de atuação dos BRICS é a que os chineses chamam de agenda pragmática, ou seja, a construção de uma agen-da própria dos BRICS, o desenvolvimento da cooperação entre os BRICS. Desse ponto de vista, já temos uma atuação importante nas áreas da agricultura, da saúde, da ciência e tecnologia e também dos negócios, visto que se amplia a cada cúpula o número de em-presários que participam do Foro Empresarial e que ali dispõem de um espaço privilegiado para potencializar parcerias lucrativas entre os países do BRICS.

Temos também o Foro Acadêmico, que foi concebido justa-mente para estimular a reflexão entre acadêmicos dos próprios BRICS. É importante lembrarmos que o nosso universo acadêmico continua muito centrado na matriz ocidental e recebe seus princi-pais insumos do pensamento desenvolvido e publicado na Europa e nos Estados Unidos. Pouco conhecemos e é preciso conhecer muito mais profundamente o que pensam os russos, os indianos, os chineses e os sul-africanos. O Foro Acadêmico tem a missão de difundir o pensamento dos outros quatro e promover o conheci-mento da produção de nossa comunidade acadêmica.

As três primeiras cúpulas avançaram bastante em ambas vertentes, a de coordenação de posições em foros diplomáticos e

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a da construção de uma agenda BRICS. A quarta cúpula, recente-mente realizada em Nova Delhi, acrescentou uma novidade, qual seja a criação, ou o anúncio da criação do Banco de Desenvolvi-mento do BRICS. Este estará voltado não só para a promoção do desenvolvimento sustentável dentro dos próprios BRICS, como também para projetos de infraestrutura em outros países em de-senvolvimento. Essa novidade agrega ao BRICS uma terceira ver-tente de atuação, a da cooperação e da ajuda internacional, via financiamento ao desenvolvimento.

Na cúpula de Nova Delhi, dois outros fatos marcantes fo-ram, primeiro a assinatura de um acordo para a promoção de investimento em moedas locais, negociado pelos Bancos de Desen-volvimento e pelos Bancos Centrais dos BRICS, e a assinatura de um outro acordo voltado para a facilitação de cartas de crédito, que deverá estimular ainda mais o comércio entre os cinco. Esse co-mércio tem crescido muito. Em 2002, era de 27 bilhões; em 2011, já ultrapassou dos 250 bilhões, e as projeções são de que em 2015 atinja 500 bilhões.

Cada cúpula ajuda o BRICS a se consolidar, aumenta sua pro-jeção internacional e amplia o interesse que desperta em todo o mundo. Vale a pena uma breve avaliação da evolução do interesse pelo BRICS na imprensa mundial e também na brasileira. A cúpula de Ecaterimburgo passou praticamente despercebida; quase não gerou notícias nem aqui nem lá fora. A cúpula de Brasília, que se realizou em abril de 2010, teve também pouca repercussão; na oca-sião, prevaleciam na imprensa brasileira as notícias sobre as cinzas do vulcão na Islândia. A terceira cúpula, na ilha chinesa de Hainan, teve uma repercussão ampla na imprensa internacional, porém no Brasil o número e o destaque das notícias continuaram modes-tos. A cúpula de Nova Delhi já teve uma repercussão mais intensa aqui também. Ou seja, à medida que o grupo se consolida e que as reuniões produzem resultados, a atenção sobre o BRICS tende

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a crescer. Um jornalista indiano calculou que 624 jornais de gran-de circulação em todo o mundo deram destaque à cúpula de Nova Delhi, sem falar da repercussão na TV e em outras mídias. O tom e o conteúdo das matérias, porém, foram diferentes. A cobertura foi factual nos Estados Unidos, enquanto bem mais positiva, por exemplo, na França, onde Le Figaro e Le Monde fizeram cobertu-ras muito interessantes. Vale mencionar que um dos comentários mais positivos foi feito por Robert Zoellick, que teve o cuidado de realçar que o Banco de Desenvolvimento dos BRICS não substitui-ria, e sim se somaria aos esforços do Banco Mundial, que deverá continuar a financiar projetos em países de renda média.

Mas é curioso que The Economist não tenha publicado nada sobre o BRICS. O silêncio dessa importante publicação inglesa realmente me surpreendeu. O The Economist preferiu dar destaque às eleições municipais na Espanha e na Alemanha, e a grande notí-cia daquela edição foi a viagem de George Bush à Coreia para a reu-nião sobre segurança nuclear. Por seu turno, o The Times, também do Reino Unido, publicou um texto muito interessante, que vou ler aqui para fazer a ponte para o comentário, que também pre-tendo fazer, muito rapidamente, sobre o Projeto de Relatório do Parlamento Europeu sobre o BRICS, documento que foi distribuí-do aos senhores. O editor diplomático do The Times sustentou que o BRICS não tem viabilidade porque é um grupo de países muito diferentes. Leio aqui o que ele escreveu:

Let’s anchor Russia in Europe, rather than encourage its

fuzzy ideas of using the BRICS as a new fanged version

of the International and let’s talk to Brazil about defense

cooperation, for example. Above all, let’s get rid of the

acronym that was never intended to be more than a snappy

résumé of a global trend. It is time to drop the BRICS.

Por seu turno, o Relatório do Parlamento Europeu, em seu parágrafo 8, admite que os BRICS poderão tentar agir como grupo

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em temas de política externa e reconhece que as dimensões indi-viduais dos cinco países-membros são relevantes. Considera, po-rém, que ao invés de colocar o enfoque nos BRICS como um grupo de Estados potencialmente coesos, a União Europeia – UE deve tratá-los “país a país”, mantendo simultaneamente “uma aborda-gem sistêmica e coordenada”. O Relatório arremata dizendo que “uma abordagem desse tipo capacitará a UE a desenvolver econo-mias de escala por meio de parcerias com o BRICS a nível indivi-dual, maximizar os seus interesses e seu papel nas diversas regi-ões e contribuir para a consolidação de uma ordem multipolar”. E ainda: “As divergências são consideráveis nos sistemas políticos e econômicos dos BRICS, nas tendências democráticas e sociais e nas perspectivas dos BRICS em matéria de política externa, e devem formar e refletir-se em uma política da UE com diversas nuanças”. Enfim, o relatório recomenda criar sinergias com cada um dos BRICS, individualmente, e desencorajar a consolidação de grupos de Estados potencialmente coesos. Mais adiante, o relató-rio recomenda uma intensificação do diálogo sobre o assunto nas cúpulas entre União Europeia e os Estados Unidos.

É interessante notar essa “torcida contra”. Os BRICS consoli-dam-se, a quinta cúpula já está marcada para 2013, na África do Sul, a sexta voltará ao Brasil. Parece muito difícil, a essa altura do campe-onato, que o pacto se desfaça. Mas opiniões como a do The Times e do Relatório do Parlamento Europeu nos colocam desde já um desafio: qual a interlocução adequada com centros localizados no Ocidente que, pelo visto, querem estabelecer uma posição coesa e contrária à formação de grupos como o BRICS? Acho que deveríamos aproveitar esta mesa-redonda para refletirmos sobre isto.

Secretária Tatiana Prazeres – Gostaria de apresentar alguns dados sobre o comércio exterior do Brasil com o conjunto dos países BRICS e com cada um deles, individualmente, e em seguida comentar

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a crescente importância da coordenação entre os cinco nos foros in-ternacionais na OMC. Darei as minhas impressões também sobre a articulação entre os BRICS na primeira reunião de Ministros do Comércio do G20, que ocorreu no México, na semana passada.

Quando analisamos a balança comercial do Brasil, fica evi-dente a importância crescente dos BRICS para o Brasil. Em 2001, as exportações brasileiras para os países do BRICS representavam 6,4% do total exportado e as importações brasileiras provenientes dos BRICS representavam 4,7% do total importado. Hoje, tanto as exportações quanto as importações brasileiras dos BRICS respon-dem por cerca de 20% do comércio do Brasil. Cerca de 20% do que o Brasil importa vem desses países e 20% do que o Brasil exporta é destinado a eles. Em 2011, as exportações em conjunto para China, Índia, Rússia e África do Sul superaram, pela primeira vez, as ex-portações brasileiras para o conjunto dos países da União Europeia.

No entanto, quando analisamos a qualidade e a diversidade do que o Brasil exporta, fica evidente que há muito a ser feito. Cerca de 80% das nossas exportações para os BRICS são produ-tos básicos, ao passo que 96% do que importamos são produtos industrializados.

É destacado o peso da China no comércio exterior do Brasil com os BRICS. Para terem uma ideia, a China recebeu 17,3% das exportações brasileiras em 2011; na sequência, aparecem a Rússia com 1,6%, a Índia com 1,3% e a África do Sul com 0,7%. Ou seja, quando falamos do comércio com os BRICS, estamos falando, so-bretudo, do comércio com a China.

Acontece que quando analisamos o comércio com a África do Sul, 64% dos itens da pauta de exportação são produtos industrializados. No entanto, as exportações do Brasil para a China são muito concentradas. Três produtos respondem por mais de 80% da pauta de exportações do Brasil para a China, e

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essa realidade também se reflete nas exportações brasileiras para a Índia e para a Rússia. O comércio exterior do Brasil com a Índia e com a Rússia precisa ser desenvolvido; há um potencial muito grande a ser explorado, mas a realidade, hoje, é que no comércio com a Rússia, o Brasil exporta carne e açúcar e importa fertilizan-tes; com a Índia, o Brasil exporta petróleo e importa combustíveis. A concentração do fluxo de comércio é excessiva quando analisa-mos a quantidade de produtos exportados e importados tanto da China, quanto da Rússia e da Índia.

As exportações brasileiras para esses países crescem em ritmo superior ao crescimento das exportações do Brasil para o mundo. As importações provenientes deles também crescem em ritmo ace-lerado. A conclusão é que os países do BRICS ganham cada vez mais importância na pauta do comércio exterior brasileiro. Contudo, permanece o desafio da qualidade e da diversidade da pauta, um desafio que não se diz respeito somente à China, mas também à Rússia e à Índia.

À luz desse panorama geral, partilharei com os senhores e se-nhoras algumas reflexões a respeito da articulação entre os cinco países em foros internacionais de comércio. Antes de mais nada, gostaria de me referir à reunião ministerial da OMC, que ocorreu em Genebra, em dezembro de 2011. Nessa reunião, os Ministros do Comércio do BRICS se reuniram à parte dos demais para discu-tir o futuro da Organização, trocar impressões a respeito da situa-ção internacional e articular posições sobre como levar adiante as discussões acerca do comércio. Em suma, os BRICS se reuniram de modo a se posicionarem como um bloco naquela conferência mi-nisterial, que estava na iminência de iniciar-se. Foi muito interes-sante perceber a importância que todos os cinco países concediam à coordenação entre eles. Assim, a despeito de presumíveis diver-gências em certas questões, foi possível lograr consenso no tocante a vários aspectos fundamentais. Por exemplo, foi possível chegar

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a uma visão de futuro comum, um consenso sobre a importância de avançar a agenda da OMC e sobre a centralidade do desenvolvi-mento no mandato de Doha, haja vista que esse foi o aspecto que motivou o lançamento da rodada. Combinaram-se também novas abordagens para fazer avançar aquela agenda.

Cabe notar também a importância que os cinco concedem ao policy space, ou seja, à margem de manobra que os países con-quistaram duramente em negociações anteriores. Assim, os BRICS concordaram que não lhes são convenientes as propostas de con-gelar a situação da maneira como está, com o pretexto de “evitar o crescimento do protecionismo”. Não porque os países BRICS apoiem o protecionismo – pelo contrário, todos eles se manifesta-ram fortemente contra os movimentos protecionistas –, mas sim porque a margem de manobra conquistada por eles em negocia-ções anteriores não poderia ser rotulada pelo resto do mundo de protecionismo e, ato contínuo, descartada.

A China vive o seu momento, que é diferente dos demais BRICS, e a Rússia terminava, naquele exato momento, o seu ingres-so na OMC. O Brasil, a Índia e a África do Sul eram os que se empe-nhavam para destacar a importância de poder, utilizar a margem de manobra e ter autonomia para, por exemplo, aumentar tarifas até o nível consolidado, sem que isso pudesse ser considerado prá-tica protecionista. O congelamento da situação, como propunha a Austrália, entre outros, significava, na visão dos três, um sério retrocesso. O congelamento da situação naquele nível equivaleria a antecipar os resultados da Rodada Doha para todos os demais membros, sem que obtivéssemos as contrapartidas que estávamos negociando, que continuamos a negociar no âmbito da rodada. E aqui é importante notar como a China e a Rússia apoiaram a vi-são dos três outros BRICS, que se tornou a posição de consenso.

Todas as discussões sobre a centralidade da agenda do de-senvolvimento e a importância de se poder utilizar a margem de

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manobra conquistada de maneira a lidar com a crise internacional foram claramente consubstanciadas em uma declaração, objeto de uma coletiva de imprensa, mostrando que, a despeito de posições divergentes sobre um ou outro aspecto, no seu conjunto os BRICS ti-nham sim uma agenda comum. Isso foi um importante contraponto às visões que surgiam no contexto daquela conferência ministerial.

Dito isso, passo a falar da 1ª. Reunião de Ministros do Comér-cio do G20, convocada pelo México, que hoje preside o grupo. Tam-bém às margens do encontro, conforme acordado na cúpula de Nova Delhi, os BRICS se reuniram e negociaram uma declaração conjunta, que refletia a sua posição a respeito de vários aspectos da agenda apresentada pelos mexicanos. Essa agenda contava, claramente, com o apoio dos demais membros da OCDE, mas na visão do Brasil e dos BRICS não tratava com equilíbrio os grandes desafios do comércio mundial no atual contexto de crise. A minha avaliação é de que a po-sição coordenada dos BRICS contribuiu de maneira decisiva para que o relatório final, apresentado pelo Ministro de Economia mexicano, fosse mais equilibrado e refletisse de uma maneira mais correta a visão do conjunto dos membros do G20. Isso foi muito importante, pois o relato do Ministro do México informará a presidência mexica-na na reunião de cúpula do G20, que ocorrerá em Los Cabos, dentro de poucos meses. Estou convencida de que a articulação dos BRICS foi fundamental para que cada um dos seus membros tivesse sua voz refletida na apreciação geral que será feita a respeito da Reunião dos Ministros de Comércio.

Embaixador Carlos Márcio Cozendey – No nosso encon-tro de dezembro passado, tive a oportunidade de dizer que uma das principais características comuns aos BRICS é o fato de serem grandes países, com recursos e interesses importantes na ordem internacional, mas que estavam fora dos processos decisórios dos principais regimes internacionais – excetuada a questão do

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Conselho de Segurança, que tem uma configuração particular. Por-tanto, é comum a esses países o objetivo de ter uma participação maior nesses processos decisórios. Esse propósito se reflete muito claramente na Declaração de Nova Delhi, haja vista o espaço que ocupam naquele documento tanto a questão da governança das instituições de Bretton Woods, quanto o posicionamento comum sobre as questões essenciais da OMC.

Nos parágrafos sobre o FMI, os BRICS colocam o seu peso na mesa ao insistir na questão dos recursos adicionais, a fim de provocar uma discussão sobre a sua participação na condução do organismo. Nas recentes discussões, que vocês devem ter acom-panhado pela imprensa, sobre a concessão de recursos adicionais para que o FMI faça frente a um eventual agravamento da crise eu-ropeia, ficou clara a percepção de que qualquer ação global do Fun-do Monetário e de outras instituições econômicas internacionais passa pelo apoio e pela participação, ou coparticipação dos BRICS.

Na reunião dos Ministros de Finanças do G20, ficou acerta-do que US$ 430 bilhões serão colocados à disposição do FMI. Es-ses são recursos adicionais àqueles das cotas e estarão disponíveis para quaisquer países que tenham necessidade de receber apoio do fundo nos próximos anos. Pensou-se, claramente, num volume de recursos suficiente para atender a eventual necessidade de países europeus maiores, como Espanha e Itália.

Por que esses recursos são temporários? Porque, entre outras razões, dizem os BRICS, o FMI é uma instituição cuja tomada de decisões é baseada em cotas. Ora, os recursos que estamos propor-cionando agora não vão aumentar as cotas e, consequentemente, não vão se refletir nos processos decisórios do organismo, portan-to só podem ser provisórios.

Sublinho que houve, ao mesmo tempo, a necessidade e a de-manda de que os BRICS participassem do exercício. Os próprios

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BRICS foram proponentes iniciais de um exercício que alavanque também uma participação maior nos processos decisórios. Ou seja, os BRICS tornaram a dinâmica de discussão dentro do Fundo Monetário bastante diferente do que acontecia no passado.

A Declaração de Delhi também traz um parágrafo sobre o Ban-co Mundial. Ali não se menciona a questão, que naquele momento era importante, da presidência do Banco. Traz, isso sim, uma série de considerações sobre como o Banco deve funcionar, traz a visão de que o Banco Mundial deve migrar da relação doador-tomador para a de cooperação. Isso tem a ver com o papel que os BRICS pas-saram a ter na instituição, ao papel que o Brasil, especificamente, passou a ter dentro do Banco Mundial. Tradicionalmente, o Brasil era um cliente. Mas o relacionamento entre cliente e emprestador cede lugar, cada vez mais, a uma relação de acionista, e assim o Bra-sil quer participar dos processos decisórios da instituição e assumir responsabilidades pela configuração das diretrizes de sua atuação.

O terceiro ponto a ressaltar é a proposta de criação de um Banco de Desenvolvimento dos BRICS, proposta que, por sua vez, tem relação com os outros dois temas anteriores. Em termos bre-ves, essa proposta foi inicialmente mencionada em um paper dos professores Stiglitz e Stern. Eles propuseram reciclar para o finan-ciamento de projetos de infraestrutura e de desenvolvimento sus-tentável nos países em desenvolvimento os recursos acumulados nos superávits obtidos por países emergentes, especialmente pelos BRICS e, em particular, pela China. Essa ideia foi lançada no ano passado e a Índia, aproveitando-se da sua presidência nos BRICS, retomou-a e promoveu sua discussão no interior dos BRICS.

A discussão ainda está em estágio inicial. Houve, na realidade, uma reunião técnica para discutir o que seria registrado no comuni-cado dos Chefes de Estado e o que se decidiu registrar foi a disposição de criar um grupo de trabalho para verificar a viabilidade desse Ban-co. Na prática, a reunião técnica já propiciou uma discussão inicial

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das visões que os países têm sobre tal instituição. Muitas coisas permanecem, porém, em aberto: quem participa do capital, só os BRICS, ou outros países em desenvolvimento também? Países de-senvolvidos participariam ou não? Para que serviria o Banco? Vocês verão que a Declaração de Delhi menciona infraestrutura e desen-volvimento sustentável. O Brasil defendeu que o Banco se dedicasse prioritariamente ao desenvolvimento sustentável, concebido como uma integração entre os aspectos ambiental, social e econômico.

Onde será a sede do Banco, qual será a forma de funcionamen-to – enfim, há muitos aspectos que terão de ser ainda discutidos, mas o que ficou registrado foi que os países do BRICS consideram existir uma possibilidade real e efetiva de criar-se o Banco.

Que espaço esse Banco ocuparia? Um espaço fundamentalmen-te complementar ao que o Banco Mundial ocupa hoje, atuando nos próprios BRICS e em outros países em desenvolvimento. O novo Banco supriria uma capacidade hoje limitada ao Banco Mundial, que está com evidentes dificuldades para ampliar a sua carteira, até por-que os países desenvolvidos debatem-se em situações fiscais difíceis e não parecem interessados numa uma nova rodada de capitaliza-ção. Por isso, a capacidade de empréstimos do Banco Mundial está hoje fortemente limitada, sobretudo para os países maiores.

Vamos tomar o caso do Brasil, por exemplo. O Brasil hoje se encontra muito próximo do limite que o Banco Mundial coloca para seus empréstimos por país. Existe o que eles chamam de Single Borrower Limit e o Brasil, a Índia e a China estão muito próximos desse limite. Assim, a capacidade de atuação do Banco Mundial nos países de renda média mais importantes, como o nosso, depende de nós mesmos abrirmos espaço na carteira. Quer dizer, o Gover-no Federal tem antecipado pagamentos de empréstimos feitos ao Governo Federal a fim de abrir espaço para o Banco Mundial atuar junto a estados e municípios brasileiros.

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Portanto, a capacidade de atuação do Banco Mundial tem hoje uma limitação financeira. O Banco de Desenvolvimento dos BRICS complementaria o BIRD nesse aspecto. Por outro lado, o Banco BRICS seria uma instituição controlada pelos seus acionistas prin-cipais, que não precisariam se preocupar em ganhar espaço den-tro do processo decisório do Banco Mundial, porque esse espaço já estaria naturalmente criado. A ideia é que o Banco BRICS tenha sustentabilidade, observando padrões de governabilidade e de sus-tentabilidade econômica que o capacitem a ganhar a confiança do mercado e a fazer captações.

Um tal Banco é perfeitamente viável. Demandará um inves-timento inicial dos países que o integrarem, mas os Bancos têm como característica principal a capacidade de multiplicar o capi-tal que é investido. É financeiramente realizável e, pelo menos nas discussões iniciais, não surgiu qualquer proposta de diferenciação entre os BRICS em termos da sua participação na instituição e con-sequentemente do seu poder decisório.

Sei que um jornal publicou uma matéria dizendo que, num encontro (não se sabe qual) entre Índia e China, os chineses teriam pleiteado a presidência do Banco e teriam divergido dos indianos, que defenderam uma presidência rotativa. Quero aqui deixar bem claro que essa discussão não existe no nível multilateral. Nunca se discutiu tal coisa entre os BRICS, não se chegou nem perto de ter--se tal discussão. Pelo contrário, o ponto de partida é a participação igualitária entre os cinco BRICS. Vai depender da capacidade de cada país, algum poderá até optar por não exercer essa capacidade, mas a ideia básica é de participação igualitária dos cinco BRICS.

Em resumo, a criação do Banco de Desenvolvimentos dos BRICS é uma proposta que foi bem recebida pelos cinco países, que é viável, mas que ainda está em um estágio muito inicial. A discus-são a respeito vai continuar ao longo do ano.

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Um último ponto, apenas para esclarecimento. Às vezes se fala muito na questão do comércio e moeda local e eu já vi um nú-mero grande de diferentes acepções desse tema. A discussão so-bre comércio em moeda efetivamente local não tem avançado nos BRICS devido às limitações das moedas dos BRICS, que não têm hoje uma aceitação global. Vou tentar fazer aqui um esclarecimen-to básico, uma diferenciação de esquemas possíveis.

Vejam que nós temos hoje com a Argentina um esquema de pagamentos em que o comércio é feito em moeda local da pers-pectiva do exportador e do importador, mas não da perspectiva dos Bancos Centrais. A compensação desse comércio é feita diaria-mente em dólares. Nem Brasil, nem Argentina acumulam saldos na moeda do outro país. Trata-se de um instrumento de facilitação do comércio, da perspectiva do exportador e do importador.

É diferente o esquema que existe hoje entre a China e alguns países, inclusive a Rússia. Ali, faz-se efetivamente comércio em moeda local. Como se trata de um comércio em moedas que não têm ampla circulação internacional, quando há superávit para um dos lados, o outro fica com aquele excedente da moeda do parceiro, e só poderá gastar tal valor em transações com aquele parceiro.

Os bancos de investimentos optaram por outro instrumento, um acordo-marco, que terá de ser especificado bilateralmente, so-bre a concessão de empréstimos na moeda local. Trata-se então de uma terceira modalidade em que, por exemplo, o BNDES daria um empréstimo em reais a um banco sul-africano, que reemprestaria a empresas sul-africanas que queiram investir no Brasil ou comprar produtos brasileiros. Embora utilize moeda local, trata-se de um ter-ceiro tipo de instrumento, que não se confunde com os outros dois.

Esses são os desenvolvimentos mais recente nos BRICS. Como vimos, a coordenação multilateral tem sido efetiva. Como eu já ti-nha comentado no nosso último encontro, não é uma coordenação

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universal, não cobre todos os temas e não pressupõe coincidência dos BRICS em todos os assuntos. Os cinco não falarão sempre com voz única, não terão um porta-voz, mas sim há uma coordenação permanente, que é extremamente útil dentro do G20, dentro do FMI e dentro do Banco Mundial, pois influencia a forma de funcio-namento desses processos decisórios. Uma nova fase se avizinha em que os BRICS caminham em direção a iniciativas mais concretas, como é o caso do acordo entre os bancos de investimento e a possibi-lidade de criação de um novo banco de desenvolvimento. Obrigado.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Obrigado, Carlos Márcio, obrigado Tatiana, obrigado Edileuza pelas exposi-ções sobre os mais recentes entendimentos entre os BRICS e as perspectivas que se abrem aos cinco países. As visões do Itamaraty, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exte-rior – MDIC e da Fazenda se complementam e realçam o grau de prioridade concedido pelo Governo brasileiro a esse tema.

Faço uma rápida observação, apenas para dar destaque à im-portância que os demais governos integrantes do grupo também concedem ao BRICS. Em Nova Delhi, os discursos do Primeiro-Mi-nistro russo Dmitry Medvedev, do Presidente sul-africano Jacob Zuma e do Primeiro-Ministro indiano Manmohan Singh eviden-ciam que eles consideram o BRICS um vetor de prestígio.

Já sabíamos da prioridade que o Governo russo confere ao tema; afinal a constituição do BRICS como instrumento de ação político-diplomática foi uma bandeira carregada com bravura pelo Chanceler russo Sergei Lavrov. Em Delhi, Medvedev fala como se o BRICS fosse um polo acabado de poder mundial, impulsionado, naturalmente, pela Rússia, cuja agenda externa se confundiria com a do agrupamento. O Presidente Zuma, em sua intervenção, sublinha a notoriedade mundial que adviria de ser ele o porta-voz da África e aproveita para sugerir que vai receber uma série de

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vantagens dos demais países do BRICS. O discurso de Manmohan Singh está inevitavelmente balizado pela situação interna da Índia, pelas eleições que tinham acabado de ocorrer em vários estados importantes, como Uttar Pradesh, em que o Partido do Congresso, que é o partido do Primeiro-Ministro, foi derrotado. Ele utiliza a circunstância de ser o anfitrião para falar do BRICS como se fosse um projeto nacional indiano e, na autoimposta posição de líder, toma a iniciativa de apresentar dez áreas de cooperação e um pro-grama de ação para os parceiros.

Tínhamos discutido muito em dezembro se o BRICS são de interesse do Brasil e de que maneira interessariam aos demais pa-íses. Os discursos da cúpula de Nova Delhi dão a impressão de que nossos parceiros não têm dúvidas a respeito da importância que o assunto tem para eles. O Presidente Hu Jintao é o de fala mais comedida, embora ele também mencione a importância dos BRICS como mercado e como força positiva para a promoção da paz e do desenvolvimento mundiais. O comedimento chinês é interpreta-do, algumas vezes, como reticência e falta de comprometimento. Por outro lado, o Governo chinês é também exaltado por saber o que quer e aonde vai chegar, pela capacidade de planejamento e de implementação do planejado. É difícil imaginar que o líder de um governo com essas características participaria de reuniões de cúpula por mero capricho.

A conclusão razoável é de que o BRICS é útil e valorizado como tal por todos os seus integrantes, os quais se associam porque que-rem. O Brasil ganha prestígio ao sair na foto com os demais BRICS, mas eles também valorizam e são valorizados por estarem em com-panhia do Brasil.

Passamos agora aos comentários, perguntas, provocações e su-gestões dos nossos convidados. Começaremos com o Embaixador Rubens Barbosa, hoje dirigente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – Fiesp, e em seguida passaremos a Renato

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Baumann, atualmente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplica-da – IPEA.

Embaixador Rubens Barbosa – Antes de mais nada, obrigado pelo convite para participar desta mesa-redonda. Vou deixar para o fim meu comentário sobre o interesse, que José Vicente mencio-nou, dos Presidentes no BRICS. Quero começar minha intervenção enfatizando que o sucesso de uma reunião como esta, pela segun-da vez convocada pela Funag, vinculada ao Ministério das Rela-ções Exteriores, deve ser medido pelas sugestões concretas que o Itamaraty vier a receber para subsidiar a política externa.

Este nosso exercício entre diplomatas e sociedade civil, em boa hora convocado pela Funag, é novo e é importantíssimo. Como já foi mencionado aqui, o BRICS é um organismo recente e é nor-mal que os cinco países ainda tateiem para ver como avançar. Parto do pressuposto de que o BRICS é importante para o Brasil, e mais, que o Brasil é o país que mais pode se beneficiar do BRICS, em ter-mos de política externa. Esses são meus pressupostos.

Dentro dessa perspectiva, temos que focalizar a ação dos BRICS sob dois aspectos: primeiro, a agenda interna, que implica amplia-ção do comércio, da cooperação, implica, desde Nova Delhi, a imple-mentação do plano de ação. Na agenda externa, o pronunciamento do Presidente da Rússia é muito explícito. Se o Primeiro-Ministro da Índia mencionou dez pontos, muitos deles relacionados com a política interna, o pronunciamento do Medvedev propõe uma agen-da externa para os BRICS. O peso dos BRICS, em minha opinião, vai depender da agenda externa, que é a novidade, não da agenda interna. Na agenda interna, todo mundo quer aumentar o comér-cio, promover investimentos, diminuir o desemprego; essa agenda já não desperta a atenção da mídia. O que despertaria as atenções gerais seria o peso político desse grupo, se ele falasse com uma úni-ca voz. Evidentemente, não seria necessário um consenso em todos

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os itens, porque, como já discutimos em dezembro, as prioridades são muito diferentes, mas vimos hoje que há uma coordenação em organismos multilaterais e isso pode ser o embrião de um projeto mais concreto, que dê ao BRICS o piso político que ainda não tem, mas poderá vir a ter no contexto internacional.

A percepção internacional, sobretudo da mídia, é biased. Não deixa de ser natural que governos de outros países, por várias ra-zões, procurem diminuir a influência e a importância dos BRICS. No meio acadêmico, muita gente, no mundo inteiro, examina os BRICS sob um ponto de vista negativo, porque não há antecedentes de uma agenda comum entre esses países, e há, sim, antece-dentes de rivalidade entre os integrantes, o que é interpretado como um impedimento a uma evolução positiva dos BRICS.

Ora, do ponto de vista da formulação da política externa bra-sileira, o que interessa saber é: primeiro, o que o Brasil quer do BRICS? Nós sabemos o que queremos? Temos que definir os nos-sos interesses e uma agenda brasileira para o grupo. Segundo, qual é a proposta do Brasil para a definição de uma agenda, não só do Brasil, mas do BRICS? Esses dois pontos são cruciais.

Eu li os cinco pronunciamentos da cúpula de Nova Delhi e não vi clareza no pronunciamento do Brasil. A parte mais substantiva foi a caracterização do BRICS como uma plataforma para o diálogo e a cooperação entre países que representam 43% da população mundial, para a promoção da paz, segurança e desenvolvimen-to em um mundo multipolar, interdependente, mais complexo e globalizado. Mas isso vale para qualquer instituição, qualquer ação coordenada internacional.

A meu ver, o que está faltando é, primeiramente, uma defini-ção do interesse brasileiro, para poder montar depois uma agenda propositiva, não só do ponto de vista interno, que já está atendido pelo plano de ação, mas também na parte internacional. As três

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iniciativas que foram tomadas agora, o banco, o comércio em moe-da local, os investimentos, são de difícil avanço, dificilmente vão sair do papel, pelo menos vai demorar muito tempo para isso.

Do ponto de vista do Brasil, como utilizar os BRICS para che-gar a algum lugar? Acho que falta uma visão objetiva dos nossos interesses e, em consequência, faltam propostas brasileiras. Tenho ideias concretas sobre essas propostas, que cabem ser discutidas no âmbito do BRICS, a partir de propostas do Brasil. Posso expor essas ideias mais tarde, se for o caso.

Este diálogo com a sociedade civil é muito bom, porque fica-mos sabendo o que está acontecendo por dentro, e assim podemos formar uma opinião bem informada. No entanto, me parece que, do ponto de vista do Itamaraty, o diálogo só será útil se houver contribuições substantivas, que os Chefes da Casa possam julgar positivas ou negativas, mas que sirvam de base de reflexão para os formuladores de política dentro do Itamaraty.

O BRICS é um exercício novo, inovador e oferece ao Brasil a possibilidade de ter mais presença, mais projeção no mundo. Seria importante que desta nossa discussão surgissem boas ideias para o Itamaraty. Obrigado.

Professor Renato Baumann – Vou partir de cinco proposi-ções da parte econômica da Declaração de Nova Delhi: banco de desenvolvimento, aposta na rodada Doha, facilitação de comércio com moedas nacionais, facilitação de confirmação de cartas mul-tilaterais de crédito e interação das bolsas de valores. A partir daí, peço licença para apresentar, não propriamente ideias, mas oito provocações que talvez contribuam para o debate.

A primeira provocação é recorrente e já foi parcialmente res-pondida pela Embaixadora Edileuza. No BRICS, são mais nítidos os consensos negativos do que a agenda positiva. Por tudo que já foi dito aqui, parece que há um esboço de algo positivo, mas continua

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válida, a meu ver, a provocação: é possível, nesta altura, depois de quatro cúpulas, identificar pelo menos os contornos do que seria uma agenda positiva?

A segunda é que a existência dos BRICS tem, obviamente, nítidas implicações geopolíticas, mas a participação nesse grupo parece se dar mais por inércia do que por interesse. Parece um pou-co com as negociações da Área de Livre Comércio das Américas – ALCA, de que alguns países não queriam participar, e participaram mais pelo medo de que outros o fizessem e houvesse custos em não participar. A provocação aqui é: temos hoje a ideia do custo de não participar dos BRICS? A pergunta é importante porque o esforço de participar pressupõe a noção de que não fazê-lo impli-ca um custo alto. Acho importante identificar os benefícios que a “carteirinha de sócio” dos BRICS nos dá. E se não fossemos sócios dos BRICS, como seria?

A terceira provocação se relaciona com o risco de uma percep-ção exacerbada dos BRICS, quase como se fosse uma nova Bretton Woods, na base do “vamos mudar o mundo”. É importante ter claro que as regras do jogo internacional continuam sendo as mesmas. Cabe definir as estratégias que permitirão uma melhor participa-ção nesse jogo. Às vezes, o noticiário dá a impressão de que existe uma percepção de que agora nós somos “os bacanas” e vamos mu-dar o mundo. Menos.

A quarta tem a ver com a ideia do banco de desenvolvimen-to. A meu ver, ele pode vir a suscitar dúvidas semelhantes às que existem com relação ao Banco do Sul. O risco de se usar politica-mente os recursos dessas instituições pode levar a um custo de captação maior do que a Triple A. Se for assim, ele passa a não ser competitivo com o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD e o Fundo Monetário Internacional – FMI e, se ele não é competitivo, poderá até ser complementar, mas a um custo muito mais alto.

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Paralelamente, existe a percepção, difundida pela imprensa, de que banco de desenvolvimento pode ser uma ferramenta para a universalização do uso do renminbi. Na minha quinta provocação, pergunto se já se pensou num antídoto a isso.

A sexta é ainda sobre o mesmo tema. A julgar pela Declaração de Nova Delhi, o banco de desenvolvimento financiará projetos de investimento nos próprios BRICS e também em outros países em desenvolvimento. Num mundo de cadeias de produção e intensifi-cação de complementaridades produtivas globais, impõe-se a ne-cessidade de definir critérios para a seleção de projetos e de países, critérios de governança, critérios para garantia de retorno dos re-cursos e, também, cuidar para que isso não reforce entre os BRICS, de forma diferenciada, a competitividade de alguns países – leia-se China –, que tenham apostado na interação produtiva regional e construíram parte de sua competitividade com base nessa comple-mentaridade produtiva. Reforçar esse processo pode ser para nós um tiro no pé. Assim, pergunto: qual o papel das bases regionais para os países BRICS? A China tem sido muito ativa nesse particu-lar, estimulando processos produtivos integrados; a Rússia tem a herança de relações desde os tempos soviéticos com seus vizinhos; a Índia tem algumas relações com seus vizinhos do sul da Ásia, e a África do Sul praticamente domina a SACU. O Brasil tem claro que é importante construir uma base econômica com os vizinhos regionais para aumentar a sua presença no cenário internacional? Essa provocação transcende a órbita BRICS e tem a ver com a di-mensão que a questão regional ocupa na política externa. O Brasil se considera importante para continuar sendo convidado aos ban-quetes dos principais Gs só pelo que é, ou sabe que para isso preci-sa consolidar uma constituency a médio e longo prazos?

Sétima: a não obtenção de consenso para lançar uma candi-datura à presidência do Banco Mundial foi um episódio isolado e

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justificável por ser o BRICS algo ainda nascente, ou reflete a dificul-dade de conseguir-se uma convergência de propósitos?

A última já foi parcialmente respondida por Tatiana. A De-claração de Delhi joga para a Rodada Doha o tratamento das ques-tões que dificultam o fluxo de comércio bilateral, como barreiras remanescentes e desvios de comércio produzidos por tratamentos preferenciais a países vizinhos. A pergunta é: a facilitação do co-mércio será uma dimensão a ser considerada pelos BRICS? O plano de ação sinaliza apenas flexibilidade no uso de moedas e interação de mercados financeiros, nada fala nada sobre as barreiras comer-ciais. Pode ser prematuro, mas se existem problemas de acesso a mercado entre os cinco, esse tema em algum momento deverá ser contemplado na agenda BRICS. Ou vai ser colocado debaixo do ta-pete e despachado para Doha?

Aqui temos um conjunto suficiente de provocações que po-dem animar a conversa.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Há uma quanti-dade de prismas levantados. Para manter o pique do debate, vamos seguir com Sérgio Leo, Oliver Stuenkel e Giorgio Romano, que le-vantaram os seus prismas há mais tempo. Depois, os meus colegas terão oportunidade de fazer os esclarecimentos necessários.

Jornalista Sérgio Leo – Obrigado pelo convite, Embaixador. Um dos participantes da mesa, a quem encontrei antes de vir para cá, comentou: “Eu ia falar tanta coisa, mas agora que sei que tem imprensa, vou ser obrigado a me conter”. Esperava que a minha presença não inibisse ninguém; pelo que já ouvi, não vai inibir.

Todas as vezes em que se falou das narrativas incompletas e de outras falhas da imprensa, os presentes olharam para mim. Por isso, eu me sinto na obrigação de explicar o que acontece do ponto de vista de um jornalista.

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Tem sido uma prática nas reuniões do BRICS a ausência de entre-vistas coletivas para explicar as decisões. Os Presidentes vêm, fazem um pronunciamento e, pronto, se retiram. E há pronunciamentos como o do Presidente Hu Jintao, que, ao falar, parece um oráculo: seu discurso é vago o suficiente para abrigar qualquer interpretação. Os analistas saem em busca alucinada de explicações, numa caça às fontes em luta contra o relógio, porque as redações têm hora para fechar. Faço um elogio pessoal à Embaixadora Edileuza, que tem tido uma paciência enorme com a nossa ignorância e o nosso assédio jor-nalístico em cima dessas questões, mas o fato é que muitas das vi-sões acabam não tendo uma explicação adequada. E parece que, em parte, isso decorre da própria falta de interesse dos governos, que não querem explicar os interesses divergentes dos países em algu-mas questões delicadas. Além do temor, entre os governantes, de que a coletiva dos BRICS acabe se revelando um tiroteio sobre temas nacionais que nada têm a ver com o evento em si.

Os BRICS têm tido uma dificuldade enorme para conseguir uma narrativa que dê conta da profundidade, diversidade e ampli-tude dos laços que estão sendo criados. Não existe uma narrativa clara do que seja o BRICS. As dúvidas colocadas aqui, tanto pelo Embaixador Rubens Barbosa quanto por Renato Baumann, ilus-tram a série de questões que surgem entre aqueles que acompa-nham o tema.

Chamou a minha atenção, no discurso da Presidente Dilma, a palavra “plataforma”. Como o Brasil define, e como outros países veem essa plataforma? Qual a diferença entre essa e as outras tan-tas plataformas que existem em outras instâncias internacionais? Será uma plataforma privilegiada porque ali a China encontra ami-gos para diluir a sua presença em alguns temas mais delicados para ela? Porque países como o Brasil e a Índia encontram uma legi-timação maior para as suas ambições de protagonismo? A Rússia se serve do BRICS para dizer que ainda está no jogo das potências

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mundiais, embora haja quem não creia nisso; e metade do discurso da África do Sul, no último encontro, foi quase um agradecimento por terem-na deixado entrar.

Se de fato interessa aos países que essa plataforma assuma uma grande dimensão, é preciso que diga a que veio e que tenha uma presença real, que se pronuncie de maneira efetiva sobre as questões mundiais. Acompanhei pessoalmente as reuniões do BRICS, menos a de Ecaterimburgo, na Rússia. Na cúpula de Sanya, percebi que havia uma novidade no ar. Nada que eu pudesse tra-duzir em matérias capazes de atrair muita atenção dos editores; mas ficou a impressão de que o esquema estava ganhando solidez. Essa impressão ficou mais forte em Nova Delhi, talvez pelo fato de que, então, surgiram propostas razoavelmente concretas. Senti ali, ainda sem poder traduzir em notícia, que os países buscam alguma liga. Vejo que há a procura de um campo comum em meio a um monte de claras divergências, e que começa a haver um movimento político real entre os países em busca da conformação de posições comuns. Como já foi dito, para um país como o Brasil, a possibili-dade de arrastar a China ou a Índia em apoio a nossas posições na OMC ou no G20 não é pouca coisa.

Outro lado positivo dos BRICS é a busca de ações com terceiros países, o que estimula uma demanda de outros agentes políticos sobre os próprios BRICS. Por conta de minha viagem à Índia, recebi documentação de um grupo chamado Iniciativas para Estratégia em Saúde Global, com uma análise sobre a ajuda prestada pelos BRICS a terceiros países em matéria de saúde. Ela verificou que todos os países do BRICS têm em comum a busca de autossuficiência na produção farmacêutica. Esse grupo, uma espécie de ONG no setor de saúde, tem interesse em trabalhar com os BRICS para coordenar iniciativas que hoje cada governo toma de forma isolada.

A imprensa busca narrativas, mas como os responsáveis pelos BRICS não lhes dão a munição necessária, ela vai procurar entre

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as interpretações que circulam por aí. A meu ver, uma narrativa fácil é essa sobre a capacidade de juntar interesses tão diversos, de dimensões tão distintas. Esse discurso oficial de que “nós so-mos tantos por cento da população mundial, tantos por cento do crescimento econômico, tantos do comércio” não vai longe, por-que quando se tira a China os números mínguam de uma maneira brutal. Não faz sentido ficar ouvindo a África do Sul, por exemplo, dizer esse tipo de coisas.

O discurso do Jim O’Neill, que foi quem criou o acrônimo BRICS, tampouco acerta, ao dizer que o BRICS devia se ampliar para a Turquia, Indonésia, México e outros. Para mim, os cinco BRICS não querem ter seu número ampliado. Por quê? Porque, res-pondo eu, a liga que os une provém não da circunstância de serem emergentes, e sim do fato de serem grandes países que se contra-põem aos interesses daqueles que, até hoje, ditaram as normas multilaterais. Não é o caso da Turquia, que está na OCDE, não é o caso dos outros países que o Jim O’Neill vem tentando enfiar dentro dos BRICS.

O fato de haver pouca atenção da mídia para os eventos se deve a que, de um lado, existe uma real dificuldade de lidar com processos. A imprensa quer relatar resultados. Os jornais não estão preparados para relatar “processos”, principalmente quando não há marcos do caminho suficientemente definidos, inquestionáveis; isso causa uma dificuldade enorme.

De outro lado, existe, sim, ceticismo. É o que um amigo meu, ex-secretário e negociador argentino, Felix Peña, apelidou, em es-panhol, de “cumbritis”, e que vem a ser a mania comum na América Latina, o vício de organizar cumbres, uma sucessão de encontros de presidentes que se sentem obrigados a fazer comunicados, alguns até interessantes, mas sem desdobramentos ou resultados práti-cos. Numa vez anterior em que estive em Nova Delhi – o Embaixa-dor Pimentel ainda estava lá – um dos resultados anunciados como

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mais marcantes da reunião, que era bilateral, entre Brasil e Índia, em 2007, foi a criação do Fórum dos CEOs. Pois um dos resultados mais trombeteados da última reunião entre Brasil e Índia, agora em 2012, foi a reativação do Fórum dos CEOs, que pouco funcio-nou até hoje. A falta de substância, a falta de um gerenciamento mais produtivo das várias iniciativas que se sucedem a cada cúpu-la gera um certo ceticismo. Não é de estranhar que houve ceticis-mo na imprensa em relação a esse banco de desenvolvimento dos BRICS e às outras iniciativas tomadas nesta mais recente cumbre.

Para terminar, o BRICS parece ter uma ambição gigantesca, mas os obstáculos  à sua frente são de igual porte, e daí vêm as dúvidas sobre como o Brasil vai lidar com o desafio. Na Índia, as ideias da criação do banco de desenvolvimento e da promoção de investimentos em moedas locais geraram declarações oficiais oti-mistas e declarações oficiosas muito cautelosas. Há desconfiança nas próprias delegações dos negociadores, que alguns jornais ra-pidamente reproduziram. Vamos dar créditos em renmimbi para importar mais produtos chineses? Ouvimos muito claramente que há grande interesse indiano nesse banco, para lidar com dificulda-des da Índia no acesso ao mercado de capitais. Para a África do Sul, o banco tem óbvio interesse. A China não precisa de um banco de desenvolvimento dos BRICS para emprestar a países aos quais já está emprestando. Hoje ela empresta com muito menos trabalho e com muito mais condicionalidades. Fica a impressão que isso foi colocado na agenda da reunião pela Índia e pela África do Sul. As-sim, a grande notícia, grande porque é um resultado concreto, gera também uma grande dúvida.

Reforço a impressão de Renato Baumann de que o Brasil en-trou nisso como entrou na discussão sobre o Banco do Sul. O Ban-co do Sul foi uma invenção da Venezuela, para canalizar os seus petrodólares de maneira mais tranquila, inclusive para a opinião pública interna. No começo, o Brasil foi absolutamente contrário

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– não publicamente, mas oficiosamente. Aos poucos, acabou se incorporando ao projeto e tentando moldá-lo. A impressão que me dá é de que, até pela necessidade que os BRICS têm de uma narrativa, vão acabar constituindo esse novo banco de alguma maneira e a minha grande dúvida é se o Brasil já tem clareza sobre como proceder quando isso acontecer.

Professor Oliver Stuenkel – Vou ser breve. Tive a honra de participar do Fórum Acadêmico dos BRICS, em Nova Delhi, algu-mas semanas antes da cúpula. Para resumir a minha experiência, eu diria que o desconhecimento recíproco é tão grande que iniciati-vas como essa são importantes e deveriam se multiplicar para criar laços e parcerias. Acho que, para o Brasil, o custo de não fazer parte dos BRICS seria alto, e que a sociedade civil se beneficiará muito dos contatos, que não existem ainda. O conceito dos BRICS ajuda o Brasil a criar essas parcerias.

Quantos professores brasileiros passaram um tempo como professor visitante na Índia? Quantos doutorandos brasileiros passam tempo em faculdades indianas com “bolsa sanduíche”? Não existe isso. O desconhecimento mútuo cria dificuldades tam-bém para criar um programa de cooperação entre os dois países. Criar esses contatos diretos já rende um benefício imenso para as instituições acadêmicas, para o pensamento brasileiro.

Isso tem muito a ver com a narrativa, porque a narrativa que temos aqui no Brasil sobre a Índia não é uma narrativa própria bra-sileira. Os livros que lemos para entender a Índia foram escritos em Cambridge, em Oxford. O Brasil tem menos de dez diplomatas em Nova Delhi, enquanto os Estados Unidos têm mais de quatro-centos. Aliás, a presença diplomática norte-americana em Nova Delhi equivale à presença diplomática indiana no mundo. Usamos o conhecimento norte-americano, britânico, europeu para inter-pretar os parceiros.

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A Embaixadora Edileuza comentou a hostilidade ao BRICS, que é muito visível na imprensa europeia e americana. Os jor-nais têm duas estratégias: a primeira é apontar as divergências, apostando que esses países não vão dar certo, porque têm agen-das muito diferentes. Por exemplo, usam o caso da Líbia e da Síria para dizer que os BRICS não concordam entre si, portanto não fazem sentido. Mas nem os países da Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN, nem os da União Europeia concordaram entre si no caso da Líbia. Existem divergências em todas as alian-ças, mas na narrativa americana e europeia essa divergência prova que o conceito inteiro dos BRICS não funciona. Temos que tomar cuidado e não comprar essa narrativa.

Existe nos EUA uma narrativa muito forte de que é inevitável que haja, mais cedo ou mais tarde, um conflito entre a Índia e a China, porque, entre outros fatores, os dois disputam o mesmo es-paço. É assim que vai ser, porque tem sempre sido assim. O proble-ma é que existe um grupo crescente na Índia que não pensa dessa maneira e tem planos de cooperação. Muitos intelectuais indianos estão apontando para os espaços que se abrem à cooperação com a China. É importante olhar essas narrativas novas. Quando um jor-nalista me pergunta: “Você não acha que haverá um conflito entre a Índia e a China, portanto os BRICS não fazem sentido?”, eu posso responder que “os BRICS fazem sentido porque podem ajudar a reduzir o potencial de conflito entre esses dois países, podem criar essa importante plataforma de entendimento”.

Se os BRICS realmente fossem uma ideia absurda, não sur-giriam dezenas, centenas de artigos no Financial Times, no Wall Street Journal e noutras grandes mídias americanas insistindo em negar sentido à iniciativa. Existe uma óbvia preocupação com a possibilidade de que os BRICS reduzam o controle sobre o discur-so global exercido hoje pelas potências estabelecidas. A verdade é que nos temas em que os BRICS conseguem assumir uma posição

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única, eles desafiam a narrativa defendida pelas grandes potências. Isso vale para qualquer grande tema, como mudança climática, re-dução da pobreza, etc.

A segunda estratégia usada pelas potências estabelecidas, a meu ver, será a de pressionar o Brasil a escolher entre uma aliança com os BRICS ou com o Ocidente. Ou seja, procurarão criar e forçar a escolha ou BRICS ou Estados Unidos, ou BRICS ou Ocidente. Um tipo parecido de raciocínio foi usado pelo jornal inglês The Times no comentário que a Embaixadora Edileuza nos leu sobre a conveniên-cia de incluir a Rússia na Europa novamente, para desestimular a adesão russa ao BRICS. Eu acho que essa é uma escolha falsa. O Bra-sil é um ator importante num sistema internacional complexo, onde já não existe essa escolha. O Brasil pode fortalecer as parcerias com os Estados Unidos, com a União Europeia e também com os BRICS.

Depois da experiência no Fórum Acadêmico, eu diria que o custo do Brasil participar do BRICS é muito baixo. Uma cúpula é um investimento, toda oportunidade tem um custo, mas eu não vejo o Brasil perdendo por fazer parte dos BRICS. Sim, há grandes diferenças entre os membros, mas ao mesmo tempo existe um po-tencial significativo. De fato, o anúncio brasileiro de que haveria uma escolha comum de um candidato à presidência do Banco Mun-dial se chocou com o anúncio da Rússia de que já havia compro-metido o seu voto, e esse tipo de coisa criou uma imagem de des-coordenação. No entanto, os encontros anuais devem aumentar a capacidade de definir agendas.

Concordo com o Embaixador Rubens Barbosa, o Brasil precisa de metas claras ao entrar nessas reuniões, e acho que a cada ano o foco brasileiro vem aparecendo com mais clareza. Depois de qua-tro anos de BRICS, o conhecimento da sociedade brasileira sobre as outras sociedades ainda é muito baixo. Precisamos continuar e estimular a interação para, em algum momento, definir melhor

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quais serão as metas da sociedade brasileira que terão sinergia com o conjunto dos países BRICS.

Professor Giorgio Romano – Não vou dar uma de Zuma e exa-gerar nos agradecimentos, mas também não quero deixar de agradecer ao Embaixador José Vicente por ter me convidado, como coordenador do curso de relações internacionais da Universidade Federal do ABC.

Vou me referir a duas ou três questões e fazer algumas suges-tões. A primeira tem a ver com o fato de que em todos os eventos de que participo lá fora, sempre me perguntam se há publicações brasi-leiras em inglês sobre o tema que está sendo tratado. Há pouco, esti-ve na África do Sul num encontro em que se discutiram as posições dos países do BRICS na Rio+20, e recebi várias perguntas desse tipo. A Funag daria uma grande contribuição à divulgação do pensamento brasileiro se começasse a traduzir livros, como esse do BRICS, para o inglês, a fim de que acadêmicos de outras partes do mundo saibam o que se pensa aqui. Há grande interesse no mundo sobre as experiên-cias e visões brasileiras, mas a língua é um obstáculo.

Sobre a questão da imprensa, Sérgio Léo é uma exceção aqui no Brasil. Poucos jornalistas cogitam de se aprofundar nos assun-tos sobre os quais escrevem. A minha sugestão, nesse particular, é que a Funag seja mais propositiva e, além de convocar discussões como estas sobre o BRICS, que vêm em boa hora, considere tam-bém realizar cursos sobre assuntos específicos. O IPEA fez um so-bre economia e estava lotado. Cursos específicos podem não ter um efeito direto, mas suscitam interesses. Fica a sugestão.

Quanto ao BRICS, o pessimismo do mundo acadêmico bra-sileiro talvez seja maior até que o da imprensa. Em encontro da Associação Brasileira de Relações Internacionais (ABRI) de que participei, os papers apresentados confundiram a questão e se con-centraram na comparação entre os países. Indo por esse caminho,

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chega-se à conclusão de que estamos comparando alhos com buga-lhos e, assim, o BRICS não tem futuro. Temos de enfatizar a ques-tão da articulação no interior do grupo BRICS, que é sem dúvida diferente daquela no IBAS, que na minha visão tem a vocação de fortalecer as trocas de experiências sobre cooperação técnica entre os países. Eu mesmo participei de algumas reuniões do IBAS com agendas relacionadas a desenvolvimento urbano e foi é muito inte-ressante. Mas o olhar dos BRICS se volta para os grandes temas da política internacional, como, por exemplo, as assimetrias existen-tes no mundo. É por isso que assusta alguns países, porque ajustar as assimetrias implica e tirar privilégios dos países do G7.

A questão não se relaciona somente ao privilégio de ganhar a presidência do Banco Mundial ou do FMI. O desafio real é propor um novo paradigma. Participei de encontros na Índia, na África do Sul, em Bruxelas, e notei que os próprios europeus queriam conhecer e entender a visão dos países BRICS. Eu mesmo ainda não entendi muito bem qual seria o novo paradigma de desenvol-vimento. É evidente que os BRICS têm diferenças, concepções de democracia diferentes, mas têm também posições comuns, que os leva a se articularam firmemente no G20. Penso que um dos mais importantes pontos em comum seja a pretensão a um desenvol-vimento diferente. É preciso explicar isso, pois a participação do BRICS no mundo e sua relevância para os países emergentes tende a crescer mais. Sendo assim, quais exatamente são as narrativas, propostas, os tipos de desenvolvimento? Qual a missão do Banco de Desenvolvimento, será apensa a de coadjuvar o Banco Mun-dial? Acho que existe entre os emergentes a expectativa de que os BRICS façam diferente e que contribuam efetivamente para se chegar a um mundo menos assimétrico, onde deixe de existir bi-lhões de pessoas na pobreza, 1 bilhão de pessoas passando fome ou perto disso. Sugiro, então, aprofundar mais a questão do que é esse novo paradigma.

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Embora sobre na turma, a China também tem a ganhar com o BRICS. Vejam, por exemplo, o já mencionado debate nos Estados Unidos sobre o que fazer com essa China que não para de cres-cer e de se fortalecer, inclusive militarmente. Para enfatizar que prioriza agora um crescimento pacífico, nada melhor para a China do que mostrar que deseja crescer junto com os outros países e diluir eventuais percepções de hegemonia dentro do BRICS. Seria interessante que países como o Brasil explorassem essa possível prioridade chinesa.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Obrigado, Giorgio, suas sugestões para a Funag são muito pertinentes, tomei a devida nota. Darei a palavra a Henrique Altemani, em seguida ao Affonso Ouro-Preto. Depois, eu convidaria Edileuza, Tatiana e Car-los Marcio, para termos um intercâmbio entre negociadores e aca-dêmicos, esclarecer certos aspectos e avançar em terreno seguro.

Professor Henrique Altemani – Estou atualmente na Uni-versidade Estadual da Paraíba e me sinto muito honrado pelo convite para participar desta mesa. Muito obrigado.

Acho inevitável repetir alguns dos conceitos que já foram apresentados. Reforçaria, primeiro, a ideia de que o BRICS é uma plataforma. Do meu ponto de vista, o que dá amálgama realmente ao BRICS é exatamente a dimensão política. É certo que se tem uma série de divergências, mas a convergência política decorre da importância, central ao BRICS, de uma contraposição ao grupo dos países desenvolvidos. O BRICS é formado por países que convi-vem com a vontade política de contraposição ao G7 há muito mais tempo. Nesse sentido, o núcleo duro do BRICS seria formado por Brasil, China e Índia.

Com a Índia, sempre tivemos uma parceria política forte nos foros multilaterais. Com a China, também há muito temos

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sinergias políticas. Em seu livro “A parceria estratégica sino-brasilei-ra: origens, evolução e perspectivas (1993-2006)”, Oswaldo Biato faz referência ao embaixador chinês no momento do estabelecimen-to de relações diplomáticas entre os dois países. A China via no Brasil a capacidade de se contrapor às posições norte-americanas em função dos nossos próprios interesses. Esta continua sendo a amálgama da relação Brasil-China, o laço que torna possível pensar na parceria estratégica. Apesar das nossas diferenças, a vontade política permanece.

Se o cimento que nos liga a esses países está na dimensão polí-tica, a questão comercial-econômica, a meu ver, poderia até ocupar uma posição marginal dentro do BRICS, poderiam ser tratadas bila-teralmente. Aliás, as assimetrias das exportações e importações não é fenômeno exclusivo das relações com a China, há muito tempo o mesmo se dá com outros parceiros da Ásia. Hoje, se nossas exporta-ções para a China são 80% de produtos básicos, para o Japão e Coreia permanecem na base de 65%. A Índia não tem expressão comercial para o Brasil. Existe a ideia da potencialidade, mas o comércio com a Índia ainda não tem maior expressão. Se não me engano, em 2009 o comércio cresceu 280%, mas isso porque nós vendemos uma mon-tanha de açúcar, devido à quebra da safra indiana. Depois, voltou ao normal, e o normal não é brilhante. Em resumo, o lado econômico--comercial não é o principal no BRICS. Tem a ver com a nossa relação bilateral com China, tem a ver com a nossa relação com a Ásia, mas é assunto para tratar no plano bilateral.

Oliver citou um ponto muito importante, que é a questão do desconhecimento mútuo. Nós não conhecemos os nossos parceiros no BRICS e vice-versa. Isso é algo que não é recente, é algo endêmi-co, por assim dizer. Quem trabalha com a Ásia bate nessa tecla há muito tempo e ainda hoje continuamos não nos conhecendo. Esta é uma questão muito séria, porque não poderemos aproveitar as oportunidades oferecidas pelos outros BRICS se não os conhecer-

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mos e para podermos diminuir esse desconhecimento, precisare-mos de apoio e de financiamento para os pesquisadores.

Embaixador Affonso Celso de Ouro-Preto – Felicito a nossa Fundação por ter organizado essa reunião tão oportuna, tão útil, sobre o tema dos BRICS.

Pedi a palavra para insistir justamente no tema da oportuni-dade e da utilidade dos BRICS. Na reunião de dezembro, houve uma longa discussão sobre as críticas ao BRICS no Primeiro Mundo, que se refletem em boa parte da imprensa brasileira. Os argumentos usados contra uma participação nossa nos BRICS são conhecidos. Distância geográfica, regimes políticos desencontrados uns dos outros, intercâmbio comercial nem sempre muito intenso, quando não se considera a China. Muitos argumentos levariam a pôr em dúvida a oportunidade, a necessidade ou a conveniência da exis-tência dos BRICS e da participação brasileira nesse grupo.

A reunião de dezembro parecia ter resolvido o assunto, mas vejo que vários amigos nossos aqui tornam a pôr em dúvida a conve-niência de uma participação brasileira nesse grupo. Eu me limitaria a dizer que os BRICS evidentemente não constituem uma aliança eco-nômica nem política, não formam uma área de livre-comércio, não visa a consolidar consensos sobre todos os itens, nem sequer todos os principais itens da agenda internacional. São apenas um fórum, que passa por um processo de consolidação, em que um grupo de países se reúne e discute questões de interesse comum.

Qual é a conveniência de que o Brasil participe desse fórum? Eu perguntaria: Qual é a alternativa? O Brasil não deveria partici-par dos BRICS? Deveria participar da OCDE? Do G7? Da OTAN? Ou deveria ficar totalmente isolado?

Foi feita a pergunta se o Brasil se contrapõe aos membros do G7. Eu diria que não se contrapõe, mas os seus interesses, como os dos outros membros dos BRICS, não coincidem sempre com os

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do G7. Não podemos dizer que os interesses brasileiros coincidem sempre com os da Grã-Bretanha, dos Estados Unidos, da França. No momento de crise que o mundo atravessa, essa falta de coinci-dência, que não significa hostilidade, é bem clara.

As reuniões dos BRICS tiveram a participação de autoridades do mais alto nível, como o Presidente da China, o Primeiro-Ministro da Índia, a nossa Presidenta. A forma indica a importância do grupo. Esse fórum está sendo levado a sério. Tomou uma decisão sobre o Banco de Desenvolvimento, sobre comércio em moeda local? Ainda não, mas o tema foi discutido. O que convém foi abordado. Foram abordados também, nos parágrafos 20 a 23 da Declaração Final, temas políticos espinhosos, como o Oriente Médio, a Síria, o Irã, e ainda que não se verifique uma coincidência de posições, percebe--se que as conversas entre os líderes facilitou uma aproximação de pontos de vista no interior do grupo. A Declaração deixou registrada a necessidade de dar um peso maior aos países em desenvolvimento nas organizações internacionais, como o FMI. Embora sem firmar um compromisso no tocante à alteração do número de membros do Conselho de Segurança, houve um pronunciamento sobre a neces-sidade de reforma das Nações Unidas. Todos esses temas interes-sam ao Brasil. Seria melhor não participar, não ir às reuniões, calar a boca, introspectivamente, e deixar que outros países digam o que eles querem? Eu penso que faz mais sentido participar.

Os BRICS constituem, portanto, um fórum que corresponde ao interesse do nosso país, bem como dos demais participantes; que nos coloca num patamar de maior visibilidade na comunidade internacional, até porque lá estão representados quatro grandes países, cujas populações equivalem a 40% da população mundial e cujo produto representa 20% do PNB do mundo, e um quinto país que representa um continente; um fórum cuja massa crítica tem que ser levada em conta cada vez mais pela comunidade interna-cional, e onde não serão tomadas decisões contrárias aos nossos

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interesses. Isso me faz crer que a presença brasileira no BRICS é muito oportuna, útil e corresponde ao interesse nacional.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Muito obriga-do, Affonso. Vamos à intervenção da sherpa brasileira do BRICS.

Embaixador Rubens Barbosa – Antes, tenho uma pergunta específica para a Edileuza. No seu discurso, Medvedev disse que o BRICS tem o objetivo estratégico de transformar-se gradualmente num mecanismo de interação no âmbito dos principais temas da po-lítica e da economia global, e que assim se converteria num foro para os Chanceleres. O Brasil está cogitando de ter posição sobre isso?

Embaixadora Maria Edileuza Fontenele Reis – Não há decisão no BRICS que não seja por consenso, só tomamos decisões por consenso. Por isso, propostas de um Chefe de Estado precisam ser discutidas entre os cinco, antes de serem aprovadas.

Quero endossar plenamente a exposição que acaba de ser feita pelo Embaixador Affonso Ouro-Preto, e acrescento que o BRICS não quer atuar em detrimento dos interesses de outros países. Pelo contrário, está aberto ao diálogo, à cooperação, à coordenação com outros países. Nesse sentido, eu gostaria de ressaltar que o Brasil é parceiro estratégico da União Europeia, assim como os Estados Unidos, o Canadá, a Coreia do Sul e também a Índia, a China, a Rússia e a África do Sul. Esses são os parceiros estratégicos da União Europeia, e somente esses.

Além da União Europeia, temos uma interlocução e uma re-lação muito densas com os Estados Unidos. Portanto, estar no BRICS não é excludente, em termos de política externa brasileira. O BRICS nos proporciona um fórum adicional de coordenação.

Quando se fala que falta um enredo para o BRICS, confes-so que fico um pouco perplexa. Até admitiria que um jornalista

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norte-americano ou europeu dissesse algo do estilo, mas depois de quatro cúpulas com ampla participação brasileira, seria de imagi-nar que a nossa narrativa já estivesse explícita. Dessa última cúpu-la resultou uma Declaração Conjunta com cinquenta parágrafos. Foi uma Declaração extremamente equilibrada entre a agenda política e a agenda econômica internacional. Em ambas as partes, consolidamos, no âmbito do BRICS, posições que já defendemos em outros foros. No que diz respeito à reforma das instituições financeiras internacionais, os pronunciamentos da Presidenta Dilma durante a cúpula sobre o excesso de liquidez nos países em desenvolvimento, no que ela denominou de “tsunami monetário”, tiveram ampla repercussão nos Estados Unidos e no resto do mun-do, inclusive no Brasil.

Boa parte da declaração foi dedicada a crises regionais – e aqui é preciso deixar claro que o BRICS é integrado não por países ca-pachos, e sim por países que têm tradição diplomática, que têm independência em suas posições de política externa, por isso se respeitam e discutem livremente seus pontos de vista. Não há país abaixando a cabeça para outro. Durante as negociações, fiquei até às quatro da manhã em um embate sobre o parágrafo relativo à re-forma do Conselho de Segurança, porque a China não queria falar do assunto. Afinal concordou e ali está.

Voltando ao tema da narrativa, o BRICS também dedicou am-plo espaço da Declaração de Nova Delhi ao desenvolvimento sus-tentável e ao meio ambiente. Três dos maiores eventos na área de desenvolvimento sustentável e meio ambiente se realizaram ulti-mamente em países do BRICS: o COP 17, em Durban, África do Sul; a Rio+20, que vai se realizar agora no Brasil e a COP 11, da conferência sobre biodiversidade, que vai se realizar na Índia, em outubro próximo.

Uma parte importantíssima da Declaração é dedicada à cons-trução da agenda própria do BRICS, ou seja, à implementação do

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plano de ação adotado na Cúpula de Sanya. A primeira vez que um plano de ação foi adotado em uma cúpula do BRICS foi na cúpula de 2010, em Brasília. Ali, o Brasil propôs adotar-se um plano de ação. Foi também proposta do Brasil a instituição de um fórum econômi-co e um fórum acadêmico que terá um papel crescente na conforma-ção e na divulgação do BRICS, inclusive entre os cinco países.

Em Sanya, fizemos um novo plano de ação, baseado no ante-rior, e já cumprimos esse plano todo. Isso está registrado na De-claração Conjunta de Delhi. Na Índia, fizemos um novo plano de ação, que novamente vamos cumprir. Essa é a narrativa do BRICS. A coordenação dos BRICS no âmbito do G20, a importância des-sa coordenação para se chegar a um acordo na cúpula do G20, em Seul, em si já são notícias eloquentes.

De novo, é bom estar no BRICS? Lembro de um comentário de um brilhante embaixador brasileiro, o Embaixador Marcos Azam-buja, que disse algo assim: “Eu não sei se é bom estar no BRICS, mas não estar no BRICS não é uma boa”.

Em 2012, o BRICS será responsável por 56% do crescimento da economia global. O G7, nesse mesmo ano, vai responder por 9%, menos do que a América Latina, 9,5%. É bom você estar junto a esses países que crescem a essas taxas elevadas, ou é melhor estar no G7?

O BRICS é um fórum de coordenação. Não estamos pagando uma contribuição anual para estar lá, como pagamos nas Nações Unidas e em várias outras organizações. Estamos pagando para estar nas Nações Unidas, mas não somos membros permanentes do Conselho de Segurança e é dificílimo reformar esse Conselho de Segurança.

Fala-se da diversidade, da diferença imensa entre os BRICS para sentenciar que aquilo não pode dar certo. Ora, se formos nos relacionar só com países que são iguais ou parecidos conosco, vai ser difícil ter relações internacionais produtivas. O BRICS nos

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oferece a oportunidade de atuar junto com outros países relevan-tes, em benefício não da destruição do sistema internacional, mas sim da reforma desse sistema, em benefício dos países em desen-volvimento. Obrigada.

Secretária Tatiana Prazeres – Vou procurar responder as provocações de Renato Baumann que dizem respeito ao comércio exterior, pelo menos algumas, pois foram muitas e posso não ter anotado todas.

A existência dos BRICS é um reconhecimento de que o mundo mudou, e a mudança favorece o Brasil. Os BRICS ilustram essa evo-lução. Contestar que o Brasil ganha ao fazer parte dessa nova reali-dade seria atuar contra os nossos interesses; nenhum dirigente, de nenhum partido ou facção política cometeria tal tolice. Concordo com Oliver Stuenkel, o custo de participar dos BRICS é muito bai-xo, se pensarmos na relação custo-benefício.

Há inúmeras razões para fortalecer os BRICS, para engajar o Brasil firmemente nesse processo e persuadir os demais das van-tagens em continuar a atuar em conjunto com os BRICS. De novo, atenho-me às questões econômico-comerciais.

Fazer parte dos BRICS permite que cada um dos membros vocalize suas posições de uma forma que, individualmente, não poderiam fazer. Permite que os países influenciem processos deci-sórios que, isoladamente, não influenciariam com o mesmo provei-to. Permite que possamos fazer contrapontos em relação a algumas agendas, facilita a vocalização de nossas preocupações em relação a visões de outros países. Não se trata, repito, de nos opormos a um país em especial, mas sim de fazer valer a nossa visão e ampliar a re-percussão de nossos pontos de vista sobre o sistema multilateral de comércio, ou nas discussões que hoje têm lugar no G20 comercial.

Quando analisamos o nosso interesse em questões relaciona-das aos demais membros dos BRICS, a minha avaliação é de que a

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percepção compartilhada dos membros sobre a importância do gru-po permanecer unido cria um incentivo importante para aproxima-ção de posições. Parece-me evidente o interesse da China em não ficar isolada em algumas discussões na OMC e no G20, e isso abre oportunidades importantes para o Brasil aproximar posições. Não iria tão longe a ponto de endossar o comentário do Sérgio Leo so-bre a nossa capacidade de “arrastar” uma China ou uma Índia, mas certamente a percepção compartilhada da conveniência de perma-necer no grupo ajuda as articulações no âmbito do BRICS, estimula uma articulação mais profunda de posições. Sabemos que a China pagou caro para entrar na OMC e por isso pode ter agora posições diferentes das nossas em certos assuntos. O BRICS proporciona uma oportunidade para todos considerarem melhor todas as facetas dos temas e calibrar os discursos, as visões e as posições individuais.

Isso sem mencionar a agenda comum, que está sendo cons-truída e da qual Carlos Marcio já falou e creio que voltará a falar.

Embaixador Carlos Márcio Cozendey – Ainda sobre a pro-vocação de Renato: nem sequer se coloca a oposição entre BRICS e G7. O G7 continua a existir no mesmo patamar do BRICS. Hoje exis-te o G20, do qual o Brasil participa em igualdade de condições com os países do G7. Dentro do G20 os membros do G7 se articulam mais estreitamente em alguns assuntos. Os BRICS, também.

Hoje, na dinâmica de funcionamento do G20 e na dinâmica de funcionamento do FMI, a articulação dos BRICS tem um papel re-levante, é capaz de incluir assuntos na agenda e de obter resultados independentemente de não contarem com poder formal de veto ou com poder de voto suficiente. Quer dizer, quando existe coincidên-cia de posição entre esses cinco países, os resultados acontecem quer esses países tenham poder de voto ou não.

Sobre a questão da competição com o Banco Mundial, se o Ban-co dos BRICS não tiver um rating no mercado que o habilite a uma

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captação eficiente, não vai cumprir o seu objetivo. Mas aí a compa-ração não é com o Banco Mundial, nem, dependendo do assunto, com o Fundo. Não é que vou perder clientes para o Banco Mundial, até porque hoje o problema do Banco Mundial é a sua dificuldade para expandir a sua carteira. Na verdade, a competição seria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, ou com o Banco da China. O novo banco terá uma capacidade de captação a custo menor do que os países sozinhos conseguem, ou não? A analogia seria a relação CAF-Brasil: o cliente vai para a CAF se a CAF consegue captar mais barato do que o Brasil.

Dependendo do seu desenho, o novo banco pode não ser um instrumento de captação necessariamente mais barato para a China, mas pode ser para os outros países em desenvolvimento. Nesse caso, ele passa a ser um instrumento de política dos BRICS para outros países em desenvolvimento. Nesse sentido há, sim, para a China o interesse de dar legitimidade a sua atuação em determinado cená-rio. Da mesma maneira que nós vamos pegar emprestado o poder de fogo da China, a China pega emprestadas do Brasil e da África do Sul dimensões de legitimidade na atuação internacional.

Qualquer um dos países poderá cooptar o banco para os seus objetivos, mas o Brasil também. Da mesma maneira que tem o ris-co de que a China o utilize para os seus propósitos, também existe a possibilidade de que o Brasil o utilize para os seus propósitos de promoção de política externa junto a outros países em desenvolvi-mento, com uma capacidade de projeção que o Brasil, sozinho, hoje não tem, sem falar que o Brasil sozinho não tem nem recursos nem instrumentos jurídicos para fazer.

Em minha maneira de ver, quando a universalização do ren-mimbi acontecer, será benéfica. Temos hoje um mundo multipolar, multimoedas. Quando a universalização do renmimbi se der, eu, que sou superavitário com a China, não terei mais problema em

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pagar com moeda local, pego os renmimbis que tenho em mãos e faço uso deles em outro lugar. Hoje existe um problema, porque com os renmimbis que tenho em mãos só posso comprar produtos chineses. Se puder usá-los em qualquer lugar, isso deixa de ser um problema e passa a ser positivo.

O real também tende, a longo prazo, a se internacionali-zar. Alguém vai logo dizer que o real não tem o mesmo poder do renmimbi. De fato, hoje não tem. No entanto, por questões que podem decorrer da conjuntura, existe uma enorme comercializa-ção de derivativos em reais no mundo, muito maior até do que em renmimbis. Não quero dizer que o real está internacionalizado, mas é forçoso reconhecer que a nossa moeda tem hoje uma pre-sença internacional relevante, no mercado de moedas. Em vista da perspectiva de apreciação, o real é comercializado no mercado de derivativos em volume muito grande, ainda que não tenha se in-ternacionalizado por causa disso. É uma moeda com uma presença internacional forte, mesmo se comparada ao renmimbi.

A candidatura do Banco Mundial é um exemplo ruim para ana-lisar a perspectiva dos BRICS atuarem em bloco. Afinal, nesse tipo de eleição você sabe do marco zero que o candidato americano vai ganhar. A despeito de todas as articulações que você fizer, você sabe que quem vai ganhar é o candidato americano. Assim, você tem que decidir se apoia o americano e fica com quem vai ganhar, ou se faz um statement de que a situação precisa mudar e por isso vota em outro candidato. Um cenário desses não é um teste para os BRICS.

A crítica é: “os BRICS não conseguem ter posição comum so-bre nada”. Ora, em várias situações eles terão, em outras não te-rão. Não existe um porta-voz dos BRICS, não existe uma posição unificada em tudo. Mas o exemplo da eleição para a presidência do Banco Mundial é particularmente ruim como teste, porque se trata de uma eleição viciada. Nesse contexto, até que o resultado

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foi bastante positivo, no sentido de que foi apresentada uma can-didatura reconhecida pela opinião pública internacional como ca-pacitada e válida, a ponto de desafiar e, de certa maneira, obrigar o próprio Governo americano a considerar opções na hora de definir seu candidato, o que é inusitado.

Como último ponto, vou me referir à eventualidade de ser o Brasil “arrastado” para o novo banco, como teria acontecido com o Banco do Sul. Quero deixar bem claro que o Banco do Sul que re-sultou é muito diferente do Banco do Sul que foi proposto. O Brasil era contra e continuou a ser contra o Banco do Sul que foi propos-to. O Banco do Sul que está agora submetido ao crivo do Congresso Nacional resultou de uma negociação, na qual transformamos uma bola quadrada numa bola redonda e chutamos para o gol.

Agora estamos na fase de definir a missão que se quer atri-buir ao Banco do Sul. Na nossa visão, ele deve ser complementar à atuação do BNDES na região. O BNDES pode apoiar empresas brasileiras no exterior, não pode apoiar empresas locais em parce-rias dentro do Brasil, e o Banco do Sul poderia entrar fortemente nessa dimensão. Até porque em outras dimensões, como nos gran-des projetos de infraestrutura, ele não vai ter força para entrar, ou entrará inevitavelmente associado à CAF, ao Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID e a outros bancos maiores. Acontece que nessa área já temos outras instituições atuando. Onde hoje não há ninguém é nos processos de integração produtiva na re-gião. Não temos instituições capacitadas. A CAF pode fazer alguma coisa, mas não é a sua área de atuação prioritária. Ou seja, a nossa meta é tentar criar um “Goldman do Sul”.

No caso do Banco dos BRICS, embora a proposta tenha sido indiana, a sua viabilização foi em boa parte ajudada pelo Brasil. Na reunião dos Ministros da Fazenda, à margem da reunião do G20, em fevereiro, o Brasil colocou o tema na agenda de discussão e isso

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ajudou a formação de consenso entre os BRICS. O que quero dizer é que, embora a proposta não tenha partido do Brasil, nós vimos nela uma oportunidade de ter um instrumento importante para favorecer os objetivos do BRICS.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Para continuar na área financeira, peço que Luís Balduino faça a sua exposição agora. Em seguida, Márcio Pochmann e João Pontes Nogueira fala-rão sobre a sua participação no Foro Acadêmico dos BRICS.

Ministro Luís Balduino – Começo pela boa provocação do Renato sobre a oportunidade de estar no BRICS. Na minha avalia-ção, a curiosidade sobre o BRICS antecedia a sua formação como grupo de concertação diplomática. Não criamos a marca e não in-vestimos nada inicialmente nela, mas ela já tinha um certo valor de mercado e uma respeitabilidade importante antes de se tornar o fórum de hoje, que tem vários efeitos práticos.

O primeiro se relaciona com a questão do conhecimento. Oliver mencionou o grande desconhecimento que existe entre os países. Ora, esse desconhecimento era muito maior antes. Quando fui Con-selheiro Econômico na embaixada em Nova Delhi, sob as ordens do Embaixador Pimentel, notávamos lá que o Brasil era muito pouco conhecido, e não havia muito interesse em conhecê-lo. Isso por vol-ta de 2003, 2004. A Índia já tinha um grande entusiasmo pelo acrô-nimo BRICS, criado por Jim O’Neill e a criação do fórum fez com que a imprensa indiana passasse a se interessar enormemente pelo assunto. Um dos principais jornais econômicos da Índia começou a publicar semanalmente duas páginas sobre notícias dos BRICS. Assim, o Brasil passou a ser muito mais conhecido. Nossa econo-mia, nossa indústria, coisas que ninguém nem sabia que nós tínha-mos passaram a ser conhecidas em função dessa marca, sem que o governo precisasse fazer investimentos em promoção de imagem.

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Veio de graça. Creio que se os países não aproveitassem a marca que já existia desperdiçariam um capital de imagem, no mínimo haveria um custo de desperdício de oportunidade.

Ocorre que a sigla incomodava antes mesmo da criação do fó-rum. Lembro-me de conversas, ainda na Índia, em que diploma-tas britânicos, alemães e japoneses diziam alegremente que seus países já estavam criando unidades governamentais para acom-panhar os BRICS, isso lá para 2004, 2005. Só isso dá uma ideia da importância que teria a efetiva consolidação do agrupamento. Já era esperado pelos demais países que os cinco BRICS, uma vez juntos e com uma agenda em comum, teriam sua capacidade de in-fluência potencializada. Acho que a avaliação negativa por parte de comentaristas e editorialistas, que Edileuza citou, é a outra face da respeitabilidade que a marca cria e de um certo temor de que novos tempos estão nascendo.

Gostaria agora de citar exemplos de efeitos concretos da co-ordenação entre os BRICS. Começo com a reforma do FMI. Quem colocou inicialmente o tema da reforma das instituições financei-ras internacionais na agenda do G20 foi o Brasil. Mas a reforma se concretizou depois, com o apoio dos BRICS, essencialmente.

Quando o G20 se reuniu pela primeira vez em Washington, em novembro de 2008, toda a ênfase, como não poderia deixar de ser, era sobre como lidar com a crise, como reforçar a regulamentação financeira, como fazer a coordenação macroeconômica para reativar a economia. Os países emergentes foram chamados a participar da-quele foro e nós argumentamos: “tudo bem, tratemos de regulação financeira e de coordenação macroeconômica, mas queremos tam-bém o mudar o FMI e o Banco Mundial”. Naquele momento, já havia algum reconhecimento da necessidade de atualizar a estrutura de poder e já estava em curso a reforma do FMI de 2008. Mas aquela foi uma reforma extremamente tímida, quase que só para “pay lip service”. Se não fossem os BRICS, a reforma de 2010 não teria saído,

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pois ela não estava nem na agenda. Foi interessante que, na cúpula de Pittsburgh, houve um momento em que os BRICS estavam senta-dos em uma sala, os europeus, que tinham mais a perder em poder de votos, em outra sala, e os americanos ficavam fazendo a ponte para aproximar as duas posições. Finda a negociação, o Brasil passou de vigésimo para, inicialmente, décimo oitavo, e agora figura entre os dez primeiros acionistas do Fundo. Este é um caso bastante con-creto da utilidade da atuação em conjunto com os BRICS.

Outro exemplo interessante foi a reforma do foro de estabili-dade financeira. Criado em 1999, era um foro basicamente do G7 com alguns outros países desenvolvidos, como Suíça, Holanda, Cingapura e alguns outros. Os países do G7 tinham três cadeiras, uma para o seu Banco Central, uma para o Ministério de Fazenda e uma para as respectivas CVMs. Os outros tinham só uma cadeira. Era uma assimetria curiosa. Quando a reforma foi à discussão, com a participação dos países emergentes, os BRICS disseram: “nós não aceitamos uma participação de segunda classe”. E sua reivindica-ção foi aceita. Nesse foro de estabilidade financeira cada um dos BRICS tem três cadeiras também. Acho provável que esses exem-plos aumentem no futuro.

Um comentário breve sobre a questão do Banco de Desenvol-vimento. A meu ver, ele pode vir a ser um instrumento poderoso, sobretudo na cooperação sul-sul, na cooperação com outros países em desenvolvimento não BRICS. Brasil, Índia e África do Sul são países com certa capacidade de acesso aos mercados internacionais e precisarão menos de um Banco dessa natureza. Mas como instru-mento para emprestar a países pobres da África e de outras regi-ões, o Banco pode ter um enorme efeito, sobretudo pela forma de atuação diferente daquela do Banco Mundial e dos outros bancos multilaterais de hoje, Banco Africano, o próprio BID, em que os pa-íses da OCDE são majoritários. O Banco dos BRICS seria o primeiro em que a própria definição dos instrumentos de empréstimo, além

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das políticas de condicionalidade, seriam totalmente distintas, o que poderia alterar o contexto da ajuda internacional, sobretudo no momento em que os países desenvolvidos estão se retraindo. O Banco dos BRICS tem, a meu ver, a missão de atuar no vácuo aber-to pela retração dos países ricos.

Márcio Pochmann – Olá, a todos nosso abraço fraterno. Agra-deço o convite e parabenizo o Embaixador José Vicente e sua equipe pela organização deste evento de grande relevância para nós do IPEA.

Vou resumir os resultados da reunião do Foro Acadêmico re-alizado na antevéspera da reunião de chefes de Estado dos BRICS. Foi o quarto encontro desse tipo e, a nosso modo de ver, o mais im-portante dos já realizados até aqui. Houve uma ampliação do nú-mero de estudiosos, pesquisadores e professores dos cinco países. Durante três dias, tivemos oportunidade de tratar de oito grandes temas: a perspectiva de longo prazo da cooperação entre os BRICS; a estrutura de coordenação e institucionalização dos BRICS; mudança climática, segurança alimentar e água; urbanização; acesso universal à saúde; capacitação e investimento direto no setor de educação; o banco de desenvolvimento e o fundo de investimentos do BRICS, e por fim a participação tecnológica e cooperação entre as indústrias.

Esses temas foram tratados por estudiosos, especialistas de cada um dos países, por intermédio de estudos previamente apresentados, que foram muito importantes na condução da dis-cussão temática.

A partir da apresentação dos estudos, foi construído um documento intitulado “Recomendações para a Quarta Cúpula dos BRICS, em Nova Delhi”. De maneira geral, esse documen-to tratou da perspectiva acadêmica sobre aspirações comuns aos países na trajetória em busca da superação dos gargalos de subdesenvolvimento que esses países ainda apresentam, os

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gargalos na perspectiva interna e também na internacional, es-pecialmente na questão das assimetrias.

O documento apresentou 17 recomendações. Vou citá-las, brevemente.

A primeira recomendação refere-se à problemática da crise in-ternacional e como os BRICS podem dar melhores respostas frente aos entraves internos e externos impostos por ela.

A segunda recomenda a criação de uma instituição alternativa para tratar a temática do crescimento inclusivo, mirando-se espe-cialmente em práticas exitosas internacionais.

Em seguida, vem a recomendação de estreitamento da coope-ração financeira entre os países, ressaltando a importância de um estudo a respeito da viabilidade de um banco de desenvolvimento e outras modalidades de instituições financeiras.

Uma quarta recomendação diz respeito à conveniência de trabalhar em conjunto para definir políticas multilaterais e mecanismos de consultas capazes de responder as turbulências in-ternacionais, como os que têm sido assistidos no Oriente Médio e África. Portanto, recomenda-se um posicionamento comum dos BRICS em relação a esses temas.

Quinta: elaboração de políticas apropriadas e consistentes com a legislação internacional para lidar com atores não estatais e com casos de diluição do princípio da não interferência.

Sexta: recomendação de troca de experiências com relação à preservação da biodiversidade.

Uma sétima recomendação enfatiza o desenvolvimento sus-tentável, socialmente inclusivo, preparando de certa maneira um possível posicionamento na Conferência Rio+20.

Uma oitava recomendação é a de estudar o papel de instru-mentos financeiros e não financeiros nas políticas de inovação, para estreitar os laços entre universidades e indústrias, incluindo-se

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discussão sobre a compatibilidade dessas políticas com aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio.

Uma nona recomendação diz respeito à realização de estudos conjuntos sobre sistematização e compartilhamento de informa-ções para enfrentar o crime organizado, o comércio ilícito de dro-gas, lavagem de dinheiro, tráfico de pessoas e outros problemas dessa mesma natureza.

Décima: utilizar o site do fórum BRICS criado na Índia como plataforma de disseminação entre as comunidades acadêmicas e governamentais de informações e pesquisas.

Undécima: criar mecanismos de cooperação entre países do BRICS para promover maior estabilidade aos preços das commodities.

Décima segunda: enfrentamento cooperativo das questões urbanas, especialmente estrutura, conglomerados urbanos e trans-porte de massas, entre outros.

Décima terceira: criar mecanismos de ensino à distância para promover maior conhecimento entre os países dos BRICS, inician-do com temas relativos à história e ao desenvolvimento econômico de cada um.

Décima quarta: promover maior cooperação cultural entre os países-membros, através de programas de intercâmbio entre todos os níveis.

Décima quinta: trocar experiências entre instituições dos cin-co países em temas como inovação e empreendedorismo, e desen-volvimento humano.

Décima sexta: trocar experiências sobre as melhores práticas no que diz respeito à agricultura, ao uso mais eficiente da água e à mobilização em situações de desastres naturais e humanitários.

Décima sétima e última: compartilhar experiências sobre o acesso universal à saúde, e promover a disseminação de medicinas tradicionais e práticas terapêuticas.

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O IPEA está em entendimento com instituições parceiras dos outros BRICS a fim de trabalhar em quatro áreas compreen-didas nos objetivos traçados pelo fórum acadêmico. O primeiro é a construção de um banco de dados sobre temas convergentes: econômicos, sociais e ambientais. O IPEA está liderando esse grupo e conta com o apoio de praticamente todas as instituições parceiras, com o objetivo de construir um método que permita a utilização de informações sobre aspectos relevantes que digam ao conjunto dos cinco países.

Em segundo lugar, estamos colocando em prática o estabele-cimento de um repositório comum de estudos sobre políticas pú-blicas nacionais em temas convergentes. A ideia é ter um grande repositório de estudos, realizados no interior de cada um desses países, sobre educação, saúde e outras experiências nacionais.

O terceiro é a produção de uma publicação técnica comum aos cinco países. A ideia é ter uma publicação comum, com conselho editorial e práticas tradicionais, que daria uma visão da produção do conhecimento dos cinco países.

O quarto é a tentativa de desenvolver um posicionamento co-mum sobre determinados temas em que há convergência entre os cinco países.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Passo agora a João Pontes Nogueira, a quem peço para fazer uma apreciação dos procedimentos utilizados no Foro Acadêmico de Nova Delhi, inclusive com o objetivo de balizar o que nós poderemos fazer dentro de dois anos, quando o Brasil voltar a hospedar a cúpula do BRICS.

Professor João Pontes Nogueira – É um prazer estar hoje com vocês, representando o BRICS Policy Center, da PUC-Rio, um projeto conjunto com a prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.

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Participei duas vezes do Foro Acadêmico do BRICS, em Pequim e em Nova Delhi. Nesta vez, a delegação brasileira foi mais ampla, tivemos não só representantes do IPEA, mas também da Fundação Getúlio Vargas, professores da Federal do Rio Grande do Sul e da própria PUC-Rio, um grupo de cerca de dez pessoas. Em Pequim, éramos só cinco representantes do Brasil.

Concordo com Marcio, o encontro da Índia foi mais rico do que o da China, na medida em que tivemos uma agenda mais in-teressante, com trocas de pontos de vista de pontos sobre como alimentar uma agenda de cooperação sul-sul, indo desde a questão da saúde até a da urbanização e a do meio ambiente. Em Pequim, houve uma única mesa em que diversos trabalhos foram apresen-tados, sem maior relação entre eles. As várias mesas temáticas em Nova Delhi ajudaram muito na discussão e na troca de informações entre as diferentes instituições e acadêmicos participantes.

Senti falta, porém, de uma discussão mais ampla sobre a di-mensão política e econômica dos BRICS em termos mais globais. Partia-se de uma espécie de diagnóstico definitivo de que “os BRICS vieram para transformar a ordem mundial e é assim que vamos fazer”. Este foi o tom que os indianos deram desde o início. Pode-se dizer que o contexto de crise na Europa e a exposição na mídia, a que Oliver se referiu, alimentavam uma grande expectati-va em relação ao papel dos BRICS na ordem internacional. O chefe da delegação russa entrou na onda indiana e também se manifes-tou otimista e grandiloquente. O tom era esse, “os BRICS vieram transformar a ordem internacional, vamos colocar em prática a nosso objetivo de reformar a ordem internacional”. O chinês é que foi sempre mais cauteloso.

O formato do Foro Acadêmico emula, de certa forma, os fóruns multilaterais oficiais, no sentido de que se espera que os países levem delegações. Em Pequim, nós brasileiros, que não esta-

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mos acostumados com esse formato, estranhamos bastante. Mas os chineses não quiseram conversa, disseram: “vocês são a dele-gação do Brasil e vão dar a contribuição brasileira ao documento final”. Para nós da academia, a fórmula é estranha. A expectativa, principalmente dos russos, dos indianos e dos chineses era de que esse documento aportasse subsídios aos temas da cúpula, fossem a expressão de uma vontade acadêmica coletiva a serviço dos atores principais. Percebia-se entre os chineses e os russos, principalmen-te entre esses, a presença de autoridades graduadas, ex-diplomatas e, no caso dos chineses, gente do partido. No caso indiano, a fun-dação que articula a posição no Foro Acadêmico é a Observatory Foundation, ligada ao Ministério das Relações Exteriores. Inevita-velmente, a influência oficial se manifestou em Nova Delhi, pois a agenda da reunião foi muito orgânica, muito calcada na agenda oficial do governo indiano.

O Foro é uma ideia positiva, amplia a participação da acade-mia. Mas o debate não é acadêmico, nos leva a tomar posições em relação à agenda oficial. Não sei se isso vai se reproduzir nos pró-ximos encontros. Se continuar assim, engessa o debate. Se o que se quer é oxigenar o debate, ou seja, ter uma pluralidade maior de posições, a necessidade de ter uma posição oficial complica.

Nós, na delegação brasileira, tratamos de relativizar esse for-mato de “delegação” e tivemos um diálogo muito proveitoso com as demais instituições presentes. Na hora que os indianos vieram com a agenda do Banco, tivemos de sair de lado, porque essa questão não tinha sido circulada suficientemente, só conhecíamos o assunto com base em notícias da imprensa. Por isso, não houve consenso, como o documento demonstra, em torno das questões do Banco.

A conclusão a que chegamos nas conversas com os colegas da PUC, da FGV e do IPEA é que seria útil uma reunião antes do Foro Acadêmico para tomar conhecimento da agenda e ver quais

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os pontos de coincidência e de discordância. Seria útil, na minha opinião, uma aproximação com o Itamaraty para inclusive discutir-mos essa agenda antes e depois do Foro Acadêmico. Antes, para que o próprio Governo saiba com o que discordamos, eventualmente. Depois, para pensarmos em que direção avançar, se for o caso.

No BRICS Policy Center fizemos uma série de reflexões sobre a agenda da cúpula. Organizamos uma série de eventos em torno dela. Há pouco, fizemos um seminário sobre a Rio+20, tema pouco discutido no Foro, infelizmente. Para falar do custo da oportuni-dade, a meu ver uma posição dos BRICS em relação à agenda da Rio+20 teria sido um ganho importante em termos de liderança na área do desenvolvimento sustentável, uma agenda que acho muito mais importante para os BRICS do que para o Ocidente. Pelo que ouvimos no seminário, pelo que li nos documentos oficiais e na im-prensa, a cúpula de Nova Delhi enfatizou os esforços de cada país no sentido de adotar políticas de desenvolvimento sustentável, ao invés de chegar a uma posição comum. Há no BRICS uma certa re-sistência a discutir a questão ambiental, o que pode ser contrapro-ducente, na medida em que vai haver sempre, presumivelmente, muita pressão da sociedade civil para discutir esse tema. O custo da oportunidade não é só o custo de não participar dos BRICS, é o que fazer com o crédito que temos participando dos BRICS, ou seja, o custo de não exercer a liderança que se espera do Brasil. No caso do desenvolvimento sustentável há um vácuo a ser preenchi-do, e que poderia ser preenchido pelos BRICS.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Marcelo Fer-nandes Guimarães participou da reunião dos especialistas em agri-cultura do BRICS. Para ter uma ideia da potencialidade do BRICS nessa área, ele veio nos brindar com o seu relato. Em seguida, Flávio Damico dará o testemunho de quem está com a mão na mas-sa, tratando do dia a dia do BRICS.

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Marcelo Fernandes Guimarães – Fui convidado a ser me-diador na sessão sobre segurança alimentar no âmbito do BRICS. Não sou especialista nessa matéria mas, de qualquer forma, foi muito proveitoso tomar conhecimento da realidade de cada um desses países e verificar como a segurança alimentar é vista por cada um dos membros do BRICS. Vou aqui compartilhar algumas das observações que fiz.

Minha primeira observação é que, apesar de ser muito impor-tante para cada um dos países, a segurança alimentar pouco apa-rece nas declarações das quatro cúpulas. Em Ecaterimburgo, houve uma declaração conjunta sobre a questão, devido aos problemas que surgiram na esteira da crise dos alimentos. Nas cúpulas de Brasília e de Sanya o assunto foi pouco comentado e agora em 2012 a ênfase caiu na volatilidade das commodities agrícolas e também energéticas, na preocupação com o aumento do preço do petróleo e, um pouco menos, na utilização de biocombustíveis.

Talvez fosse bom ter um fórum mais apropriado para as ques-tões técnicas, em busca de uma harmonização de alguns pontos, já que na parte agrícola muitas vezes mantemos posições de competi-ção, com interesses antagônicos, na medida em que, por exemplo, nós somos exportadores líquidos de alimentos e a China importa-dora líquida.

Um ponto a destacar é a importância real da agricultura em cada um desses países. O setor agrícola tem um peso próprio nes-ses países como gerador de empregos, e os BRICS são importantes produtores e consumidores agrícolas. Os números mostram que quatro membros do BRICS se encontram entre os cinco maiores produtores de grãos do mundo, e na ótica do consumo a situação se repete: os BRICS são responsáveis por 40% da produção de arroz, milho, soja e trigo, e o consumo está muito próximo a isso, 39%. A produção de carne dos BRICS aumentou e hoje responde por

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45% da produção mundial, ao passo que o consumo está em torno de 44%. Só isso já dá uma ideia da dimensão da questão agrícola em cada um desses países.

Com relação à segurança alimentar, vou ser breve e começarei pela China, passando em seguida ao caso da Índia, dado o peso desses países na questão alimentar.

Apesar de ter tirado da pobreza centenas de milhões de pes-soas, na China ainda há entre 130 a 150 milhões de pessoas em estado de insegurança alimentar, o que representa entre 10 a 12% da população. Na minha forma de ver, a China tem dois desafios nessa questão. O primeiro é debelar ou minimizar o problema da fome; o outro é fazer frente às crescentes exigências dos consu-midores por alimentos mais ricos, a crescente demanda por ali-mentos proteicos mais sofisticados. Tanto a quantidade quanto a qualidade estão na pauta.

A meta oficial do Governo chinês é a de alcançar um nível de autossuficiência em torno de 95% do consumo até 2020. Isso fará com que a China tenha que produzir algo em torno de 600 milhões de toneladas de grãos. Ela produz hoje 480 milhões, e as-sim terá em torno de 8 anos para aumentar a produção em pelo menos 100 milhões de toneladas. Não é uma tarefa simples, tendo em vista o comportamento errático da produção de grãos na China e as dificuldades que eles têm em decorrência de problemas am-bientais, de infraestrutura deficiente e de dificuldades de crédito. O principal obstáculo, porém, são mesmo as dificuldades de solo e de capacidade de produção. O nível de degradação do solo na China é muito alto, a erosão é muito grande e os chineses têm problemas com a disponibilidade de água para produção, pois há desertifica-ção em muitas áreas e isso tem gerado uma redução na taxa de crescimento da produção de grãos, fundamentalmente de arroz. Sendo assim, parece que muito dificilmente eles conseguirão alcan-

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çar a meta de 95% de autossuficiência. Em consequência, a China vai continuar pressionando as importações e os preços, a despeito da conjuntura de crescimento econômico menos pujante, em com-paração com os últimos anos. Mesmo com um nível de crescimento em torno de 7,5%, haverá na China um importante aumento de importações, principalmente de oleaginosas.

Passemos à Índia. Também lá a questão da segurança alimen-tar é um problema muito sério. Ainda hoje, um terço da população indiana se encontra em situação de extrema pobreza. Encontram-se em estado de desnutrição 21% dos indianos, o que daria em torno de 270 milhões de pessoas, um contingente muito grande em situação de insegurança alimentar. A responsabilidade de alimentar um nú-mero tão grande de pessoas preocupa qualquer governo. Suprir as deficiências de alimentação desse enorme batalhão que ainda não está minimamente alimentado é uma árdua tarefa.

Já do ponto de vista da produção de grãos, a Índia fez enor-mes progressos. Acredita-se que até 2020 ela se tornará pratica-mente autossuficiente. O problema, assim como na China, é que as camadas que hoje têm o maior poder de consumo também come-çam a demandar produtos mais nobres. Como produzi-los, como distribuí-los num país que enfrenta sérios gargalos ao longo da ca-deia de distribuição de produtos? Os problemas não estão tanto na produção, mas sim na distribuição desses produtos.

No Brasil, nós nos acostumamos a taxas crescentes de pro-dutividade agrícola. Graças aos esforços que envidou no campo da pesquisa e da tecnologia, muito em função da criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa, e na esteira da uti-lização proveitosa dos cerrados, a taxa de produtividade brasileira vem crescendo ano após ano, de maneira geral. No mundo como um todo, isso não acontece. A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura – FAO aponta a falta de crescimento da

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produção mundial como uma das causas para o aumento perma-nente do preço dos alimentos. Não que a produtividade não esteja crescendo; ela continua crescendo, mas a taxas cada vez menores, decrescentes.

Na Índia, assim como na China, esse é um grave problema, principalmente diante da obrigação de alimentar enormes contin-gentes humanos, e da conveniência de não agravar os também gra-ves problemas ambientais. Na Índia, uma preocupação adicional é com a água. Um excesso de bombeamento para a utilização da água para irrigação vem causando um preocupante desgaste dos manan-ciais. Os aquíferos indianos já estão bastante comprometidos.

Há também um processo de fragmentação, que conhecemos no Brasil, principalmente no sul do país, onde, por força de heran-ças, as terras são progressivamente divididas. A fragmentação e a redução do tamanho das propriedades rurais inviabilizam ganhos de escala. Na Índia, a redução do tamanho médio das propriedades diminui os ganhos de escala e, consequentemente, a produtividade.

Um ponto que me chamou a atenção é de como evoluiu a questão da participação do consumo de alimentos no orçamento geral das famílias. Era de se esperar que, com o crescimento da ren-da das famílias, o consumo se deslocasse de produtos básicos para outros mais elaborados. Na Índia, o consumo de alimentos corres-pondia, na década de 70, a 38% do orçamento familiar, percentual que caiu para cerca de 18%, no meio rural. Segundo dados da FAO e do BAD, na África a percentagem é em torno de 10%. Ou seja, a participação do consumo de alimentos no orçamento das famílias indianas ainda é muito alta, mesmo em comparação à África. Ape-sar de terem evoluído, ainda hoje os indianos têm um dispêndio muito grande com gastos em cereais.

Para tentar minimizar a questão da insegurança alimen-tar, os indianos criaram diversos programas de proteção social.

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Na área específica do combate à fome, o maior deles é o Public Distribution System, PDS. Esse programa é diferente dos brasilei-ros. Trata, basicamente, da venda de grãos diretamente à popu-lação por preços bastante subsidiados. A despesa é gigantesca. Eles têm no país 500 mil pontos de distribuição, atendem 160 milhões de famílias, e como as famílias são numerosas é até difícil ter uma ideia da magnitude do programa. As transações superam 60 bilhões de dólares por ano. Provavelmente é o maior programa desse gênero no mundo.

Do ponto de vista da operacionalização, o PDS classifica as fa-mílias indianas em três categorias, em função de estarem acima ou abaixo da linha de pobreza. O fato de estar acima não quer dizer que esteja em situação confortável, apenas que está acima da linha de pobreza. Abaixo da linha de pobreza, há dois níveis, um para os que eles chamam de abaixo do limite da linha, e outro para os chamados destituídos. Somando essas três categorias, o Governo da Índia gasta em torno de 18% dos seus programas de alimentos com a população acima do nível de pobreza, 46% com os considera-dos abaixo da linha de pobreza, e 36% com os destituídos.

Esses programas têm um altíssimo grau de ineficiência. Mui-tos erros de exclusão. É muito difícil levar os alimentos a quem efetivamente necessita, há muito problema de corrupção, de in-terrupção de fornecimento, de baixa qualidade dos alimentos, de alimentos que se estragam por serem mal conservados, além dos gargalos da contabilidade e da fiscalização. Uma recente lei de segurança alimentar procura institucionalizar esses programas, garantindo a distribuição de 25 quilos de trigo e arroz para cada uma das famílias indianas que estão abaixo da linha de pobreza, a preços subsidiados.

Em conclusão, eu diria que apesar do tema ser muito impor-tante para os países do BRICS, a reflexão sobre eles é insuficiente.

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Se não ocorrer nenhuma crise grave, no meio ambiente ou no mer-cado, se não acontecer alguma nova tragédia que venha a causar algum risco maior de abastecimento, acho pouco provável que a segurança alimentar tenha mais do que um papel coadjuvante nas estratégias de desenvolvimento desses dois países.

Por isso mesmo, seria útil se os BRICS tentassem aprofundar as discussões sobre esse tema. No âmbito das discussões dos Mi-nistros de Agricultura, esse debate possivelmente poderá alcançar um patamar mais objetivo.

Ministro Flávio Damico – Vou tratar de quatro temas, que me chamaram a atenção neste debate de hoje. O primeiro é o caráter e o estado do projeto do BRICS, que tem uma vinculação com a nar-rativa, de que falava Sérgio Leo. O segundo está vinculado à aguda provocação de Renato sobre o custo de oportunidade dos BRICS. Um terceiro seria a possível integração comercial entre os BRICS. Por último, como os projetos nacionais poderiam se benefi-ciar da iniciativa do BRICS.

Acho que ficou bastante evidente pelas exposições do Embai-xador Ouro-Preto e da Embaixadora Edileuza o fato de que o BRICS é um fórum em construção, um projeto que ainda se encontra em estado de maturação. A última cúpula conseguiu avançar e elevou o patamar do BRICS, na medida em que consolidou uma clara oferta de soluções, ou de encaminhamentos de solução para a demanda de ordem, a que já se referiu o Embaixador Gelson Fonseca, em todo sistema internacional, especialmente à luz da perda de rele-vância das antigas potências.

A narrativa que os jornalistas buscam está muito vinculada à busca do dramático. Sendo um projeto conduzido no mais alto nível, ou seja, no nível das diplomacias presidenciais, em que tudo é planeja-do, administrado e staged, os BRICS não se prestam muito ao drama. Ao invés de um projeto de nível carismático, o BRICS se caracteriza

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pelo nível burocrático, conduzido pelos serviços diplomáticos, com a cautela típica na condução dos debates. Não vejo como alterar isso. Na verdade, é um sinal de maturidade e responsabilidade a maneira como esses países levam adiante as iniciativas.

Na questão do custo de oportunidade, cabe verificar se temos ou não ganhos com a iniciativa. Acho que o incômodo e a curiosida-de que a iniciativa causa na imprensa ocidental e nos serviços diplo-máticos de todo o mundo são indícios relevantes da relevância da iniciativa. Uma das nossas reclamações históricas era justamente do benign neglect com que os centros desenvolvidos nos tratavam. Agora já não há neglect, eles já não nos olham com complacência, estão com a pulga atrás da orelha. Quando os BRICS fazem uma tentativa de soft balancing, como, por exemplo, no caso do FMI, em que se trata de conseguir cotas que garantiriam o direito de veto em questões nas quais todos os cinco somassem forças, percebe-se que os países que detêm hoje essas cotas defendem seus interesses com unhas e dentes. A enormidade da crise europeia é que abre al-gum tipo de disponibilidade, a partir da qual será previsivelmente possível alavancar a nossa demanda antiga pela reforma do sistema financeiro. O ganho com essa oportunidade vale o custo da luta.

A outra questão guarda, a meu juízo, vinculação com a questão identitária. Ter a carteirinha de membro dos BRICS pode ser impor-tante por si, independentemente dos acessos que elas nos permitam. O Brasil não cabe em um único recorte, veste-se em vários estilos, tem a identidade sul-americana, a identidade ocidental e agora a identidade BRICS, uma vestimenta que nos cai cada vez melhor.

Quanto a um aumento da integração comercial entre os BRICS, é indiscutível que houve um crescimento do ponto de vista quanti-tativo, mas talvez haja dúvidas sobre a qualidade do comércio. Isso, a meu juízo, guarda vinculação com o fato de que estamos exploran-do ao máximo as vantagens comparativas existentes e a dúvida é se há apetite nos setores abertos e nem tão abertos para aprofundar a

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aproximação. Nesse ponto, o Foro Empresarial pode desempenhar um papel importante, à medida que vier a se constituir num catali-sador de demandas junto aos setores privados ou à OMC.

A grande discussão é: como maximizar os ganhos dos países que fazem parte do BRICS Aí, é importante se ter presente o caráter catalisador das cúpulas. Como comentou a Embaixadora Edileuza, ao terminar a cúpula em Nova Delhi, “Flávio, temos que trabalhar muito porque os indianos colocaram o sarrafo lá em cima”. Para mantermos o nível, precisamos avançar naquilo que resta a fazer. Por isso, a iniciativa da Funag de realizar esses debates é funda-mental no sentido de colocar os negociadores brasileiros em conta-to com as ideias, as dúvidas e as ambições da sociedade civil, para aprofundarmos juntos o projeto brasileiro de maximização dos be-nefícios da participação no BRICS.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Passemos ago-ra a comentários dos acadêmicos, começando com Anna Jaguaribe e depois, em sequência, Alberto Pfeifer, Vera Thorstensen, Antonio Jorge Ramalho, Sandra Rios e Lenina Pomeranz.

Professora Anna Jaguaribe – Represento o Instituto Brasil-China (IBRACH) e este debate está sendo particularmente útil para mim, pois infelizmente não pude estar em Nova Delhi e também porque a China é o convidado invisível em todas as discus-sões sobre validade ou não validade do BRICS.

Tenho três pontos apenas para submeter à discussão sobre a definição do BRICS na geopolítica de hoje. Antes de mais nada, o que está acontecendo de mais interessante na discussão sobre relações internacionais é o fato de que hoje, mais do que nunca, as definições clássicas sobre o poder e sobre o exercício do poder estão em jogo. O BRICS, na verdade, é um fato histórico que está gerando uma re-consideração de como se define o poder na agenda internacional e

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quem o exerce. É importante discernir, portanto, entre a negative press, que engloba as Chancelarias das potências estabelecidas, e a discussão acadêmica criativa que, aliás, está se desenvolvendo justa-mente nos Estados Unidos, que é o país que se depara com a emer-gência da China e tem necessidade de lidar com a novidade.

Meu segundo ponto tem a ver com a agenda do BRICS. Quem são os interlocutores? Não se pode pensar no BRICS como um fórum funcional, como os que existiam durante o período da Guerra Fria. O BRICS não é um G77, não é um grupo de não alinhados. É um processo de repensar instituições internacionais e multilaterais. Eu não concordaria com a ideia de que as instituições vigentes vão indo bem e o objetivo dos BRICS deve ser acomodar-se dentro delas. As instituições não estão bem, e as novidades interessantes que vêm surgindo, desde a criação do G20 comercial, na OMC, até as novas iniciativas com relação à crise financeira mundial são evoluções ins-titucionais. O BRICS pode lidar com essas instituições, mas no senti-do de apressar a institucionalização de sua transformação.

Se o BRICS é um fórum de reforma, de repensamento das con-dições mundiais, a agenda nacional e a agenda internacional têm muito a ver uma com a outra. A linha divisória entre a política e a economia ficou tênue. Aquilo que é agenda econômica nacional tem implicações geopolíticas importantes, e isso traz consigo a pergunta: qual é a agenda de longo prazo do BRICS? Será que a agenda de longo prazo do BRICS implicaria a sua extinção, quando os países que o integram julgarem estar completa a transição para uma nova agenda internacional? A meu ver, há tantos temas en-trelaçados que a sua transformação numa agenda funcional levará muito tempo. O BRICS tem uma agenda muito grande, o desafio que se coloca é de como transformar essa agenda em oportunidade política, e esse é para mim um ponto fundamental.

Um terceiro ponto subjacente é o regionalismo. Essa questão é fundamental, porque estamos sempre lidando com dois patamares.

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Um é o patamar internacional, que está mudando, o outro é a cen-tralidade do patamar regional. O professor indiano Amitav Acharya diz que, no mundo atual, todos os poderes globais são antes poderes regionais. Na América Latina, temos uma situação anômala, porque o poder americano nunca foi um poder regional, foi desde o começo um poder global. Mas o BRICS ajuda também a repensar a questão regional. Esta é uma dimensão muito importante para a China, e creio ser da maior prioridade também para o Brasil. Saber lidar com a nova forma de produção fragmentada, que faz parte de uma revi-são geopolítica internacional, é um tema prioritário e o BRICS pode ajudar o Brasil a se situar a repensar essa questão regional.

Professor Alberto Pfeifer – Tivemos aqui mais de uma dezena de definições do BRICS. Talvez a dificuldade de defini-lo decorra de ser um projeto aberto, uma construção que vai sendo feita pelos cinco países. É importante analisar o papel dos BRICS porque possibilita uma visão de como se vai operando a reforma das instituições internacionais, com as agendas propositivas que resultam das cúpulas e também das reuniões às margens de or-ganismos internacionais. Acho que a maioria aqui está de acordo, porém, que falta informação sobre os BRICS. Está ficando urgente a questão da comunicação com a sociedade brasileira sobre esse tema, já que em 2014 nós vamos hospedar o encontro dos Chefes de Governo e seria bom que, até lá, a nossa população esteja mais atenta às vantagens e desvantagens do exercício.

Uma observação adicional é que, do ponto de vista do custo--benefício, as vantagens do BRICS me parecem patentes. O Brasil tem muito a oferecer aos demais BRICS, tem seus abundantes re-cursos naturais, a sua produtiva agricultura e tantos outros atrati-vos. Mas eu queria realçar a vantagem que o Brasil oferece por ser a porta de entrada na América do Sul, que é uma grande reserva energética e de alimentos do mundo. A meu ver, é muito impor-

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tante pensar em como, eu não diria vendermo-nos melhor, mas talvez em como utilizar essa entrada regional de uma maneira que nos granjeie um pouco mais de cacife nas negociações internas aos BRICS e em outros foros.

Ainda dentro da lógica regional, é interessante observar que coexistem no BRICS cinco países, dos quais três são potências asiáti-cas continentais. A Ásia é um espaço pouco conhecido por nós. A ló-gica continental asiática é de grande complexidade, mas é também da maior importância na dinâmica capitalista contemporânea. Não temos alternativa senão aprender a lidar com ela da melhor maneira possível, e até por isso o BRICS merece ser tratado com prioridade, seja pelo Governo brasileiro, seja pela comunidade acadêmica.

Por fim, duas perguntas. A primeira é: o IBAS será absorvido pelos BRICS? Será um exercício à parte? Existe convergência entre eles ou não?

A segunda é sobre o Foro Empresarial. Gostaria de ter mais informações sobre a representação chinesa e também a russa, so-bretudo essas duas. Existe alguma análise, algum relatório sobre como elas atuam nesse foro e como o Brasil se capacita para lidar com as representações empresariais desses dois países? Se não há, alguém deveria fazer.

Professora Vera Thorstensen – Quero partilhar com os se-nhores e senhoras os trabalhos relacionados ao BRICS que estamos desenvolvendo na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo.

Desde o encontro de dezembro passado nós trabalhamos bas-tante, no espírito de primeiro conhecer para depois discutir se é bom ou mau para o Brasil. O nosso grupo da FGV contou para isso com o apoio do IPEA. Daí surgiu uma publicação sobre políticas co-merciais comparadas, quer dizer, como atuam os BRICS na Organi-zação Mundial do Comércio – OMC. Dados interessantíssimos apa-receram. O material é riquíssimo e, em função do comportamento

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dos cinco na OMC, leva a considerações sobre poder construir uma agenda de articulação entre eles.

Outra iniciativa, em fase de elaboração, é a análise comparati-va dos acordos comerciais preferenciais dos BRICS com os acordos de União Europeia e Estados Unidos. Como sempre digo, a OMC está parada, mas os acordos negociados estão criando regras, e é a novidade das regras que me interessa. Analisando China e Ín-dia – depois vou trabalhar com os outros – em relação aos Estados Unidos e à Comunidade, descobri uma quantidade de cláusulas de salvaguardas, inclusive cambiais. As salvaguardas estão criando um outro mundo. Estão resolvendo entre dois países literalmente tudo aquilo que não se consegue resolver multilateralmente.

Outro dado que me surpreendeu diz respeito aos novos te-mas, principalmente meio ambiente e cláusula social. A Índia mantém o discurso da OMC, aquilo de que “não faço nada novo”. A surpresa vem ao descobrir que a China está trabalhando esses temas novos, está se comprometendo a dar continuidade às ne-gociações. É surpreendente a China entrar em negociações sobre temas como cláusula social e meio ambiente. Minha hipótese de trabalho é que os chineses estariam se aproximando a um modelo da Transpacific Partnership. Quando estive em Xangai, recentemen-te, o assunto era TPP, os chineses preocupadíssimos com a Part-nership. Estamos tentando comparar e ver se a disputa das noivas são as mesmas que nos países da Associação de Nações do Sudeste Asiático – Asean, ver se o modelo da China de acordo regional e o dos Estados Unidos se aproximam, porque facilitaria o diálogo com as noivas. Esta é uma hipótese de trabalho.

Estamos também trabalhando pesado em modelagem, para sentir o que acontece do Brasil e com cada um dos outros quatro membros do BRICS, para depois entrar num exercício de imaginar um acordo regional de proteção tarifária entre os BRICS, analisar quais setores desapareceriam, quais eventualmente surgiriam,

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como se daria o equilíbrio dinâmico, ver como isso aconteceria. Já de início verificamos que o que acontece entre Brasil e Índia é mais complicado do que podemos imaginar, em termos de modelagem.

A nossa última atividade é o observatório de câmbio. Já es-tamos replicando de novo os dados para 2011. A surpresa, neste particular, é perceber que a moeda da Índia está mais desvalori-zada do que a da China. Qual será o impacto disso em relação aos instrumentos de comércio?

Várias dessas atividades da FGV são feitas com o apoio do IPEA. Nosso propósito é colocar as informações todas à disposi-ção do Governo e da sociedade brasileira, para estimular um bom debate. É do bom debate que as ideias boas aparecem e é assim que poderemos criar uma agenda positiva entre os cinco BRICS.

Professor Antonio Jorge Ramalho – Observando as provo-cações e as respostas, me veio à mente a definição do poeta Mário Quintana de que o diálogo são monólogos intercalados... Brincadei-ras à parte, não me surpreende que haja tantos ataques aos BRICS. Só se atira pedra em árvores que dão frutos. É normal que haja re-sistência. A exposição da narrativa fica complicada diante da conve-niência de manter sobriedade e perfil baixo, mais eficazes do ponto de vista de ganhar tempo para construir uma agenda de longo prazo.

Meu tema central é essa necessidade de construir uma agenda de longo prazo que seja comum a todos, que traga aportes a esses países e os coloque em harmonia. Mesmo sem ter um porta-voz, parece possível fechar acordo em torno de três ou quatro temas numa perspectiva global de longo prazo. Com isso, pode-se ter um discurso coeso, atende-se essa ansiedade da imprensa e se reduz o ceticismo de alguns. O que me parece é que essa agenda é bastante clara. Todos os cinco BRICS enfrentam problemas demográficos, todos têm necessidade de inclusão social e de redução da pobreza. A questão das energias renováveis se impõe, assim como a questão

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da inovação, em termos de tecnologias sociais, cooperação na área de saúde, produção de alimentos e, eu diria, também na área de de-fesa. Esses são setores em que existe uma agenda comum, ou pelo menos consideráveis interesses comuns, mas falta ainda encontrar uma estrutura que lhe permita florescer.

Se tudo se restringe ao texto de uma Declaração, fica perdido em meio a outras dezenas de temas que são importantes, relevan-tes. Enquanto tivermos uma quinzena de prioridades, o ceticismo vai prevalecer. Talvez valha a pena refletir sobre a concertação de uma agenda de longo prazo coesa e sucinta, mas objetiva e que se atenha apenas àquilo que nós todos sabemos que não colocará es-ses países em conflito. No discurso, cabe tudo, na realidade políti-ca, não se sabe. Na medida em que organizem e fortaleçam a arti-culação de interesses, ficará mais fácil partir para ações conjuntas.

O que aconteceu no caso FMI é emblemático e serve como o modelo a ser perseguido pelos BRICS. Ou seja, só atuamos em con-junto quando isso puder significar, pragmaticamente, uma mudan-ça concreta das instituições. Não existe uma percepção semelhante, por exemplo, com respeito à rodada Doha. Em quais outros temas pode haver importantes sinergias? Caberia escolher e focar neles.

Gostaria de fazer uma pergunta e deixar uma sugestão. Uma é mais para o Embaixador Carlos Márcio: qual o tamanho do banco que se está pensando? Dependendo do tamanho do Banco BRICS, o seu significado aumenta ou diminui. Qual é o aporte que se pre-tende fazer? Isso já foi discutido?

Com relação à preocupação do Embaixador Pimentel de tra-zer acadêmicos estrangeiros para minicursos no Brasil, já existe uma estrutura montada na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes que facilita a vinda principal-mente de seniores, ou seja, pessoas com reconhecida produção e capacidade de contribuir para o debate acadêmico. Tais missões

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podem variar de 3 semanas a 3 meses, e a bolsa é significativa. Mas isso precisa ser encaixado num contexto de articulação aca-dêmica mais profunda entre programas de pós-graduação daqui e do outro país, com balizas claras de produção científica e de for-mação de recursos humanos. As embaixadas talvez possam aju-dar na identificação dos possíveis candidatos a programas dessa natureza, dentro de suas respectivas jurisdições. Com isso, seria possível trazer indianos, chineses, russos e sul-africanos para vá-rios lugares do Brasil e desenvolver pesquisas conjuntas, para exa-minar os temas em que há possibilidade concreta de uma agenda conjunta. No mundo acadêmico, acho eu, a melhor estratégia é a da indução. Se aparecer um edital colocando essa perspectiva, aca-dêmicos com interesses convergentes vão identificar seus pares do outro lado, e produzir um resultado.

Professora Sandra Rios – Queria usar a palavra para comen-tar uma iniciativa que envolve alguns dos presentes e que pode ser potencializada por esta mesa-redonda e, eventualmente, pelo Foro Acadêmico do BRICS.

Alguns de nós estivemos no fórum público da OMC em se-tembro do ano passado e ouvimos as discussões sobre o futuro do multilateralismo, governança, necessidades de reformar proce-dimentos e possibilidades de ampliar a abrangência de temas co-bertos pela Organização. Ocorreu-nos então organizar um esforço conjunto, aqui no Brasil, para pensar o futuro da OMC, do ponto de vista brasileiro, e em seguida ampliar essa discussão para incluir a perspectiva dos demais países BRICS.

A partir daí, organizamos uma força tarefa que está agora em marcha. Com o apoio do IPEA, do BRICS Policy Center, da Embraer e da CNI, reunimos um conjunto de especialistas interessados nos temas da OMC, cerca de quinze pessoas, e estamos produzindo um

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documento sobre o que poderia ser uma visão brasileira sobre a reforma da OMC.

O passo seguinte será buscar uma reação de acadêmicos dos demais países BRICS ao estudo brasileiro. Gostaríamos de chegar ao próximo fórum público da OMC, que ocorre em setembro, com um painel em que especialistas brasileiros e dos demais países dis-cutam esse tema.

Acho que conseguimos reunir um grupo plural e interessante para discutir aqui no Brasil. Gostaríamos de contar com diferentes visões dos demais países. Se alguém tiver alguma ideia ou puder contribuir para o êxito desse projeto, será muito bem-vindo.

Professora Lenina Pomeranz – A Rússia tem interesses geopo-líticos regionais importantes. A sua agenda regional deve fortalecer a internacional. Precisaríamos tentar ver de que maneira essa agenda internacional, que envolve os BRICS, casa com a agenda da Rússia. Creio que o interesse é numa plataforma que fortaleça sua posição internacional. A Rússia está se voltando para fora e precisa de muitos fóruns para expressar o seu pensamento em termos de manutenção da paz, o Conselho de Segurança da ONU, a questão da Síria, questões que a colocam, em termos gerais, em posição delicada. Se ela pudesse falar em conjunto com a China e com os demais BRICS – e na decla-ração de Nova Delhi já existe alguma coisa nesse sentido –, a Rússia ficaria mais tranquila para se expressar sobre essas questões que a incomodam. A meu ver, então, o BRICS é muito útil para a diplomacia russa, tanto ou mais do que para qualquer dos outros quatro.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Passo a palavra ao Embaixador Gelson Fonseca. Gelson foi o autor da tese para o Curso de Altos Estudos do Itamaraty que deu origem ao Institu-to de Pesquisas de Relações Internacionais e consolidou a vocação da Funag para intermediar as relações do MRE com a academia.

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O título do trabalho era, justamente, “Diplomacia e Academia” e foi publicada recentemente pela Funag. A tese do Gelson, escrita no início dos anos 80, portanto ainda sob o regime militar – e é bom lembrar que mesmo no tempo da ditadura respeitava-se o direito dos diplomatas a manifestar opiniões – era a de que a re-democratização do país demandaria uma interlocução constante e desimpedida entre operadores e estudiosos de política externa, em benefício mútuo. Para se beneficiar das análises, o Itamaraty não deveria ter a pretensão de cooptar a academia, deveria aprender a ouvir e a retirar ensinamentos mesmo das dúvidas e das críticas. Este é o pano de fundo desta série de seminários que estamos con-duzindo três décadas depois da redação da tese.

Embaixador Gelson Fonseca Jr. – Agradeço as palavras do Embaixador Pimentel sobre a minha tese apresentadas no Curso de Altos Estudos – CAE, escrita no início dos anos 80. A minha pro-posta era simples: sugeria que o Itamaraty se abrisse para o mundo acadêmico, pois, naquele momento, começavam a surgir os cursos regulares de relações internacionais na universidade brasileira e as pesquisas sobre questões diplomáticas se tornavam mais frequen-tes. Havia sinais claros de que a área de relações internacionais ia se consolidar na universidade. Nesse contexto, eu acreditava que o diálogo com a academia poderia constituir um aporte rico para a for-mulação da política externa e a primeira razão era a perspectiva da democratização, que exigiria um convívio mais aberto, um diálogo real com os setores da sociedade civil que tivessem o que dizer sobre a ação diplomática do país. De outro lado, a agenda internacional se tornava cada vez mais ampla, mais técnica, e nós, diplomatas, começávamos a perceber que encontraríamos limitações para com-preender a trama da ordem internacional que se desenhava naquele momento. Na academia, se encontraria um interlocutor importante para o conhecimento sobre a realidade internacional.

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As duas tendências se mostraram verdadeiras. A área de rela-ções internacionais se consolidou na universidade brasileira e, não preciso sublinhar, a complexidade e a diversidade da agenda in-ternacional só se aprofundam nestes últimos anos. A presença do Brasil também tem outro peso e é fundamental que expresse o que quer a sociedade. Para isto, um dos fatores é o diálogo com os espe-cialistas, com os que podem ampliar o conhecimento de um tema e, ao mesmo tempo, divulgá-los objetivamente para a sociedade.

Daí, a importância de encontros como este. A facilidade com que acadêmicos e diplomatas conversam aqui e em outros foros re-presenta um ganho extraordinário, espero que para os acadêmicos, mas certamente para os diplomatas. O diálogo enriquece a nossa perspectiva dos problemas, amplia o horizonte da formulação de estratégias de ação, especialmente quando nos debruçamos sobre questões novas, como a do BRICS.

Estou na mesma situação da Lenina, não sou especialista na matéria. O que posso fazer são dois ou três comentários muito gerais em torno da observação inicial do Rubens Barbosa: o que desejamos em relação ao BRICS? No sistema internacional, é mais fácil desejar objetos conhecidos, que trariam vantagens visíveis e evidentes de prestígio, como o assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. É um lugar conhecido, há caminhos a per-correr e a aspiração se ampara em razões bem definidas, sem am-biguidades. É verdade que as resistências e os obstáculos também são mais conhecidos.

Com o BRICS, ainda temos que estabelecer claramente o nos-so “objeto de desejo”, o que, como vimos nas exposições até aqui, não é nada simples; sabemos, sim, que é importante que a experi-ência prossiga e tenha êxito. Não há receita para criar um objeto de desejo e encontrar os caminhos para realizá-lo. Isto vale certa-mente para os indivíduos, como nos ensinam as lições de Freud, e talvez valha para as nações. Chegar ao Conselho de Segurança

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é difícil, pode causar frustrações, mas o Conselho está lá, é um objetivo bem determinado. O sucesso e o fracasso são bem me-didos. Quando ainda não está claro o objeto de desejo, ainda não está plenamente identificado, as frustrações podem ser adiadas ou disfarçadas. Argumentar sobre as frustrações de desejos claros e não realizados pode ser penoso, mas tem a vantagem de indicar caminhos alternativos, novas perspectivas. Racionalizar desejos artificiais, ou sem objeto, pode não ser tão penoso (afinal, não se confrontam com a realidade), mas desvia o indivíduo dos desejos realmente necessários, dos que reforçam a identidade. O risco é que, como a capacidade de realizar é sempre limitada, escassa, a energia é gasta onde não se deve.

A última Declaração Conjunta define o BRICS como o mais simples dos processos internacionais, uma plataforma. Uma pla-taforma pode ser tudo e pode não ser nada. A plataforma revela um ponto de encontro, a existência de um foro, de um processo de articulação; o problema é como construir esse foro, dar-lhe sentido político. Ainda estamos em estágio muito preliminar e, assim, é como se as duas posições possíveis com relação ao BRICS, ou seja, a cética e a confiante, fossem hoje possíveis e tivessem argumentos suficientes a sustentá-las.

A meu ver, é muito difícil projetar o que vai acontecer, que vi-são prevalecerá, porque é muito difícil projetar o que cinco países extremamente diferentes vão querer “juntos” nos próximos anos. O que se sabe – e isto não é pouco relevante – é que, se projetamos as condições atuais, deverão ser atores ainda mais importantes da-qui a dez ou vinte anos. Se vão atuar de modo convergente ou não depende de muitos fatores. Assim, o primeiro trunfo do BRICS é a própria existência do foro e, consequentemente, a possibilidade de que o foro sirva para aproximá-los, sirva para construir convergên-cias. A convergência pode nascer de algum estímulo externo e o foro, ao induzir a reflexão conjunta sobre temas como a confrontação na

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Síria, ou os problemas de proliferação nuclear da Coreia do Norte ou Irã, ou mesmo a reforma do FMI, pode ajudar a formar uma visão convergente, que certamente terá peso no sistema internacional, já que expressará a soma dos pesos de atores relevantes. A convergên-cia não é uma garantia, nem, a esta altura, tem contornos evidentes, mas é uma possibilidade, digamos, atraente.

Outro problema é que a ausência de objetivo “forte” pode con-fundir as avaliações sobre a trajetória do BRICS. É relativamente fácil julgar o Mercosul, que tem seus objetivos fixados em trata-dos, resoluções, etc. A meta de estabelecer um mercado comum se converte automaticamente em parâmetro crítico para avaliá-lo, definir se está progredindo para alcançar os seus objetivos ou não. Quais os parâmetros críticos para julgar o BRICS? Ainda não estão claros, não existem parâmetros evidentes para julgar uma platafor-ma. É verdade que o que a posição definida na Declaração de Nova Delhi sobre a Síria e sobre o Conselho de Segurança tem relevância, mas seria possível dizer mais, ser mais contundente? O que se diz tem peso político? Atingiu-se o limite e o limite é modesto? É pos-sível esperar mais do BRICS? Se a meta for um mercado comum, a ausência de uma tarifa externa comum revela que o projeto anda mal, não está no caminho certo. No caso dos BRICS, como julgar?

Nesse ponto, gostaria de me referir à crítica de Renato Baumann, que se concentrou no lado financeiro, porque é no plano da economia e das finanças internacionais que os BRICS avança-ram mais. Por isso, supunha-se que os BRICS deveriam ter uma po-sição comum sobre a presidência do Banco Mundial. Carlos Márcio explicou que o objetivo não era exatamente esse. Mas, na mídia, na opinião pública, havia essa suposição, e a avaliação de proces-sos como o do BRICS tem que partir de certas suposições, certas premissas, certos ideais (mesmo quando não encontram articula-ção completa) e, também, de expectativas que a opinião pública fo-menta. Pensou-se que o BRICS atuaria junto na escolha do Diretor

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Geral do FMI, mas isto não ocorreu. Havia a ideia de que poderia atuar como grupo em relação ao problema da Síria, mas o grupo não o fez de forma contundente. Vai atuar em relação à Coreia do Norte? Vai haver convergência em matéria de direitos humanos? Hoje, parece pouco provável que as respostas sejam positivas.

Uma outra linha de indagações diz respeito ao valor que o BRICS vai agregar a cada um de seus membros. Vamos deixar de lado a indagação mais ampla e difícil, que alguns formularam aqui, sobre a contribuição do BRICS ao processo de reorganização da or-dem internacional. Ainda é cedo para abrir especulações sobre o tema. Mas, o valor que o BRICS pode, em tese, agregar a cada um dos países participantes parece mais fácil de identificar. É eviden-temente positivo para o Brasil estar num foro privilegiado com a presença de países de influência mundial. A Embaixadora Edileuza lembrou o comentário definitivo de Marcos Azambuja: “Eu não sei se é bom estar no BRICS, mas não estar no BRICS não é uma boa”. A presença no grupo eleva o nosso status internacional, e esse é um efeito imediatamente positivo, mas de alcance limitado ainda. Como a Lenina observou, um efeito similar vai ocorrer para a Rússia, Índia e África do Sul que também ganham. Mesmo para a China haverá interesse porque, no processo de expansão pelo mundo, os chineses precisam de bons parceiros, que contribuam para dar sentido de legitimidade ao movimento. A amizade com o Brasil pode ajudar a China a ter uma posição melhor na América do Sul. Em suma, cada parceiro deve antever um ganho próprio que derive da presença no grupo; é uma condição prévia e necessária para a formação de qualquer grupo ou foro no plano internacional. Uma das razões para a constituição do BRICS é, portanto, a pers-pectiva de ganhos específicos que começariam simplesmente pelo fato de estarem todos juntos ao lado de parceiros importantes, com peso internacional. Serão tais ganhos suficientes? Serão sus-tentáveis? Podem se ampliar?

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Para responder à pergunta, vale considerar que o BRICS é hoje um movimento com ganhos potenciais e pouco custo. A convergên-cia mais profunda certamente implicará custos maiores como con-dição para que se amplie o potencial de influência do grupo. Para ter uma posição comum em relação à Síria ou a Coreia do Norte, alguns dos membros teriam que mudar atitudes atuais, formadas de uma perspectiva de interesses nacionais. A passagem de uma plataforma que enuncia posições para uma que as articule com ob-jetivo político é dada justamente pela medida do “sacrifício”: a ar-ticulação envolve um preço, uma negociação que pode trazer, para que se alcance um benefício maior, sistêmico, algum sacrifício em termos de concepção de interesses específicos.

Acho que o BRICS ainda está longe de exigir isto dos países que o compõem. No curto prazo, seguirá como uma plataforma, que pro-porá posições comuns, eventualmente ações comuns, às vezes com mais sucesso, às vezes com menos. Será limitado, porém, enquanto não passar da plataforma (que é boa mas de alcance restrito) à insti-tuição (com sentido político mais claro, com objetivos negociados e específicos). Os meus colegas que trabalham nessa área, me descul-parão se faço uma análise externa ao processo BRICS, que me leva a uma conclusão central, a de que ainda não temos muita clareza em relação ao BRICS porque o foro não proporciona essa clareza, não mostrou plenamente a que veio. Tem realizações, é inegável, o ponto de partida existe e parece sólido, e, com tão pouco tempo de vida, não se deve esperar mais do que realmente pode fazer. Sabemos que pretende e eventualmente pode ter influência na agenda internacio-nal. Não sabemos ainda com que potencial e com que limites.

De qualquer maneira, pelas exposições aqui feitas, percebe-se que tem o potencial de influência, o que, para nós, sem dúvida, já é importante. Ajudou a constituir uma nova imagem do Brasil no sistema internacional.

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Por isso mesmo, aproveito para fazer uma última observação sobre o desconhecimento mútuo entre os membros, de que se falou tanto aqui. É verdade, existe um grande desconhecimento mútuo. Para mudar isso, para que tenhamos um conhecimento adequado dos demais, o esforço não será pequeno e o trabalho acadêmico terá um papel central. Estamos partindo de uma base muito mo-desta, sobretudo se nos compararmos a dois dos nossos parceiros que tiveram atuação global, a Rússia (especialmente a URSS) e a China. Ora, para promover uma presença global, a condição míni-ma é conhecer a sociedade onde se vai atuar, aprender a sua língua. Lembro-me de ter ido à China ainda nos anos 80 e visitado um cen-tro de relações internacionais em que havia uns cem estudantes de português. A impressão com que fiquei é a de que, já naquela época, os chineses sabiam do Brasil muito mais do que nós sabemos deles. Este é um outro dado da realidade que precisamos corrigir. Aliás, isto é um dado positivo do BRICS, o de nos estimular a entender, e de forma precisa e profunda, os nossos parceiros.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – A sua pro-posta é da maior importância, Gelson. Ao estudar nossos parcei-ros com maior profundidade talvez percebamos que nem tudo é heterogeneidade, pode haver muitas semelhanças entre nós. Afinal, nossos parceiros não são ETs. Estou certo de que Rubens Barbosa tem outros comentários a fazer.

Embaixador Rubens Barbosa – Sempre parto do ponto de vista do Brasil e meu primeiro ponto é que ninguém aqui discordou da premissa básica de que o BRICS abre uma oportunidade impor-tante para a nossa diplomacia e para o nosso país.

O meu segundo comentário é que a indefinição do que quere-mos está hoje em todos os lugares. O que queremos da relação com os Estados Unidos? O que queremos da relação com a Rússia, com

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a China? O que queremos da relação com aos BRICS? É normal que haja indefinições, agora temos que formular posições para um país que subiu de patamar e no qual se depositam expectativas, tanto aqui na nossa região, quanto fora.

Em vista disso, eu concluo que não se trata mais de discutir o que deveria ser o BRICS, essa fase está superada, na minha vi-são. O que temos que ter claro é o que o Brasil quer. Este nosso exercício é muito importante exatamente por isso. Não se trata mais de discutir qual é a natureza do BRICS, o BRICS é o que se fez nas quatro cúpulas, no FMI, nas reuniões de Ministros em que os cinco acertaram posições comuns. O BRICS é um fato. Pode ser importante para a nova projeção do Brasil, se o Brasil conseguir passar uma agenda que tenha um mínimo de consenso. O Presi-dente Medvedev tem uma visão estratégica e tem lá as suas razões para justificá-la. Qual é a visão estratégica que o Brasil tem dos BRICS? É isso que precisamos discutir. Para mim foi muito útil esta discussão, assim como a de dezembro último, mas agora temos que passar para uma outra etapa, não mais questionar o BRICS, não mais debater se é do interesse do Brasil ou não. A maioria concorda que o interesse existe, então vamos discutir a melhor estratégia para garantir os nossos interesses.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – É sempre útil discutir os desafios e as oportunidades. No mínimo, conhecem-se as opiniões contrárias e se tem a oportunidade de rechaçá-las ou de aprofundar uma reflexão sobre elas. Mas concordo com Rubens, para efeitos deste nosso exercício precisamos pensar nas medi-das práticas e objetivas que, justamente, fariam o BRICS avançar. Sergio Léo tem a palavra.

Jornalista Sérgio Leo – Peço perdão por abusar do espaço da imprensa, mas já que a questão da narrativa incomodou a Embai-xadora Edileuza, tenho a obrigação de me explicar melhor.

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Quando me refiro à necessidade de uma narrativa, não que-ro dizer que o BRICS não tenha lógica, nem que não tenha resul-tados. Por exemplo, a página sobre os BRICS da Universidade de Toronto apresenta um trabalho interessante, feito por dois grupos de estudos, o BRICS Research Group e o 2011 Sanya BRICS Summit Compliance Report. O trabalho chega à conclusão de que a maior parte dos compromissos assumidos pelos Chefes de Estado foi rea-lizada. A maior parte dos compromissos que esses grupos de estu-dos analisaram, porque o número de itens das Declarações é muito grande e eles tiveram de escolher alguns. Houve, portanto, realiza-ções e a imprensa, inclusive ela, deveria divulgar isso melhor.

Tampouco se trata só de criar manchetes. A imprensa quer notícias que interessem ao leitor. Uma parte do meu trabalho na Índia foi procurar o pessoal do governo para falar sobre o regime automotivo brasileiro que ia ser anunciado. Os leitores estavam interessados no efeito do regime sobre os seus bolsos. Não tinha nada a ver com o BRICS, mas despertou muito mais interesse no meu jornal do que os resultados da cúpula. As minhas longas ma-térias sobre o banco de desenvolvimento acabavam sendo cortadas e reduzidas a um espaço menor. Há imediatismo na imprensa, sim, mas para lidar com ela é preciso saber encarar isso.

A narrativa seria mais atraente e conquistaria mais espaço se estivessem claros os objetos de desejo a que se referiu o Embaixador Gelson. Até hoje, a narrativa que está prevalecendo é a da heteroge-neidade. A avaliação feita pelo Embaixador Cozendey é fantástica, mas é uma pena que não tenha ficado explícita quando ocorreu o episódio da escolha do presidente do Banco Mundial. Na questão do Conselho de Segurança, o que se vê é também um desencontro de posições e de ambições. O que parece é que os BRICS existem para fazer uma contraposição aos países ricos, e aí a interpretação de-pende do viés ideológico: uns vão falar que o BRICS é um exemplo de terceiro-mundismo, outros que é uma visão de independência e

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autonomia. O espaço de articulação criado pelo BRICS se manifesta com mais clareza contra, o grupo funciona como uma plataforma que se contrapõe a situações contrárias a certos interesses nossos. É o caso do G20 na OMC, é o caso do G20 financeiro.

O que está faltando, talvez, é explicitar melhor alguns objetos de desejo, para pegar a expressão, desejos que já existem. Há interes-ses comuns na área da saúde, em questões de propriedade intelectu-al, existe uma potencialidade em agricultura, talvez na área de segu-rança alimentar, além do controle dos mercados financeiros. Tudo isso aproxima os países e abre espaço para a construção de uma ação e de uma narrativa concretas, reais. Como observador, não tenho visto muitas ações conjuntas. Em parte, talvez, por ser melhor que algumas aproximações não fiquem tão explícitas, como diz o profes-sor Antonio Jorge; em parte porque existem de fato problemas. Por exemplo, quando falamos em assistência técnica em terceiros países, sempre me lembro que esse setor está subordinado na China à pasta de comércio, e não à pasta de relações exteriores. Por aí se vê qual a prioridade daquele país com essa “assistência”.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Vamos passar à rodada final. Pediria a meus colegas Edileuza, Balduino e Carlos Márcio para fazerem suas intervenções finais.

Embaixadora Maria Edileuza Fontenele Reis – Em pri-meiro lugar, quero agradecer a Funag pela organização deste en-contro. A complexidade da agenda do BRICS e a necessidade de esclarecer as dúvidas que ainda pairam justifica amplamente esta iniciativa. A definição do objeto de desejo do BRICS não é simples. Não se trata de um grupo criado para debater mudança de clima ou agricultura, por mais importantes que esses temas sejam. Tal-vez precisássemos de seminários setoriais, pois há muitas áreas de atuação possível para os BRICS. O grupo está se formando gradual-mente, é muito jovem ainda para se sentar no divã do psicanalista.

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Depois que estiver realmente formado, avaliaremos se conseguiu ou não cumprir seus objetivos.

Como funcionária da Chancelaria brasileira e operária do BRICS, enfim, encarregada do assunto, posso afirmar que aqui co-lhi impressões muito importantes sobre o formato do Foro Acadê-mico. Sobre a substância eu já tinha lido, mas achei importante o relato aqui apresentado por Márcio Pochmann. Fiquei muito aten-ta aos comentários feitos por João Pontes Nogueira sobre a neces-sidade de que, antes de participar do próximo Foro, os integrantes da delegação acadêmica brasileira mantenham entendimentos en-tre si, até porque os demais países estão procedendo assim. O ob-jetivo do Foro seria gerar subsídios para apreciação dos Chefes de Estado durante a cúpula, mas é feito com tão pouca antecedência que não dá tempo. Seria conveniente fazer uma coordenação da Chancelaria com os acadêmicos brasileiros pelo menos dois ou três meses antes da reunião do Foro.

O Foro Empresarial tem sido um sucesso de público. O nú-mero de participantes é superado a cada edição. Este ano, levamos a Nova Delhi 120 empresários brasileiros, de diferentes áreas, e aproveitamos para fazer também uma visita bilateral. Como Sérgio Leo recordou com muita propriedade, havíamos lançado um foro empresarial bilateral com a Índia em 2007, se não me engano. Esse foro não decolou. Agora, tivemos quase 400 empresários partici-pando do novo foro, o que provoca uma dinâmica de interação ex-traordinária, e os resultados vão ser palpáveis.

Gostaria de fazer uma menção também à exposição feita por Marcelo Fernandes Guimarães. Você tem toda razão, o tema da segurança energética alimentar, assim como o da segurança ener-gética estão presentes em todas as cúpulas e podem evoluir melhor. Em Ecaterimburgo, chegamos a emitir uma declaração específica sobre segurança alimentar, mas a partir de então tem sido difícil despertar nos Ministérios encarregados do assunto esse desejo,

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de que falou Gelson, para realmente levar adiante uma cooperação efetiva na área de agricultura.

Quando eu digo que talvez precisássemos de reuniões se-toriais, é porque há tanta coisa em gestação, assuntos que não chegam ao conhecimento dos senhores, que talvez fosse o caso de fazer sessões específicas sobre cada uma das vertentes. Sérgio Leo fez referência à saúde, área em que nós temos uma iniciativa bra-sileira de estabelecer um banco de dados sobre preços e patentes de medicamentos para promover intercâmbio de informações e transferência de tecnologia, utilizando as flexibilidades previstas no acordo tríplice. Essa é uma iniciativa brasileira que ainda não está madura, não entrou na Declaração Conjunta porque não está pronta ainda, mas já estamos levando isso adiante.

Seria muito interessante fazer um debate sobre a agenda po-lítica, por exemplo. Será que os BRICS têm que ter uma posição conjunta sobre o Irã? O que eles ganham com isso? Será que inte-ressa aos BRICS ter uma posição comum sobre a Síria? Afinal, um país como o Brasil tem ambições e preocupações que vão além do BRICS. Não temos uma política externa exclusiva do BRICS. Mas seria muito estranho se os Presidentes da China, da Rússia, do Brasil e da África do Sul, e o Primeiro-Ministro da Índia se reunis-sem em uma cúpula e nada falassem nada sobre o Irã, sobre a Pa-lestina, sobre o que está acontecendo na Síria. Haveria a percepção de um vazio. Por isso, acho que é preciso ter uma agenda política, sim. Aliás, os cinco BRICS estiveram juntos no Conselho de Segu-rança, no ano passado, e ali tiveram posições coincidentes.

Talvez devêssemos fazer um painel exclusivamente sobre a agenda econômica. Será que o Brasil sozinho teria condições de impulsionar uma reforma nas instituições financeiras internacio-nais? Embora fosse o Brasil o país que iniciou esse processo, a for-ça agregada dos BRICS facilitou os avanços no FMI, na OMC. De modo que o BRICS já está nos servindo bem.

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Lenina fez alusão aos projetos geopolíticos russos. Todos os países têm os seus projetos geopolíticos. Nós temos o nosso pró-prio projeto de integração regional, prioridade de nossa política externa. A África é outra prioridade. O estabelecimento de uma dialogue partnership com a Asean é outro projeto em que eu mesma estou, no momento, empenhada. Cada país tem suas prioridades, mas não é no contexto do BRICS que vamos tratar de reconheci-mento da Ossétia do Sul ou da Abcásia. A Índia acabou de estabele-cer uma parceria estratégica com o Afeganistão e, com a saída dos Estados Unidos e das tropas da OTAN, tenderá a cumprir um papel crescente naquela região. A China tem interesses muito importan-tes, todos têm o seu projeto geopolítico próprio, que não precisa ser discutido no BRICS. O BRICS só funciona por consenso. Há fe-lizmente vários temas importantes que se prestam a consenso e permitem que os países se coordenem naquilo em que eles podem se beneficiar mutuamente.

São inúmeras as provocações feitas aqui às quais eu gosta-ria de reagir, apesar do cansaço. Acho que o Embaixador Rubens Barbosa toca num ponto sensível quando diz que seria convenien-te colocar com mais clareza o que o Brasil quer tirar do BRICS. Es-tamos construindo consensos, vários por iniciativa do Brasil. Se o Embaixador tiver um projeto importante e julgar que ele deve entrar na plataforma do BRICS, teremos todo o interesse de re-cebê-lo, para discuti-lo e de levá-lo adiante, se for viável.

Nós ainda estamos em um momento de construção e já esta-mos obtendo lucros importantes. A exposição de Carlos Márcio foi muito clara nesse sentido. Volto a dizer, no tocante à presidência do Banco Mundial, que não chegou ainda o momento de apresentar uma candidatura comum. No momento atual, a prioridade é refor-mar o Banco Mundial de forma a que os BRICS possam ter poder de voto para eleger um presidente. Hoje, qualquer candidatura que desafie o status quo vai fracassar, porque os norte-americanos,

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junto com os europeus e os japoneses, têm um poder de voto avas-salador. Ainda que a África do Sul, a Colômbia ou algum país do BRICS tivesse o melhor candidato, seria hoje derrotado.

O Professor Altemani é um pioneiro do discurso sobre a falta de conhecimento e a necessidade de criarmos mais pontes com a Ásia. O Itamaraty sempre esteve muito atento a isso. Em 1994, quando trabalhava em planejamento político no Itamaraty, tive a satisfação de integrar, juntamente com o Professor Severino Cabral, a primeira missão acadêmica brasileira à Ásia, um ano de-pois de termos lançado a mais antiga parceria estratégica do Brasil com países em desenvolvimento, que foi a parceria estratégica com a China. Estamos atentos à necessidade de reduzir a distância, con-sideramos a interlocução com a Ásia muito importante.

Houve uma indagação sobre o Fórum Índia, Brasil e África do Sul-IBAS. Eu diria que o IBAS inspirou o BRICS. Alguns dizem que o BRICS não decorreu de uma obra da diplomacia, já veio pron-to. Eu acho que isso é uma injustiça, porque a própria concepção do BRICS decorreu da visão do Chanceler Celso Amorim, inspira-do na construção do IBAS. O IBAS é muito respeitado como um foro que reúne três democracias, três continentes, nós do IBAS nos orgulhamos dessa diversidade. Porque são três democracias, a opinião pública internacional não critica o IBAS, que já foi pre-miado duas vezes pelas Nações Unidas por sua contribuição nos esforços de cooperação Sul-Sul através do Fundo IBAS. Sim, o IBAS influencia e inspira o BRICS. O Foro Acadêmico foi primeiro cons-tituído no IBAS, o Foro Empresarial idem. Os dois, IBAS e BRICS, deverão ainda continuar. Devo até dizer que há um grande núme-ro de interessados em participar do IBAS, integrando-se a ele ou associando-se de alguma forma. Países tão diversos quanto Japão e Alemanha teriam interesse em se associar ao IBAS, mas este é um tema para outra discussão, outro encontro.

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No IBAS há uma outra iniciativa que penso introduzir no BRICS, que é o Foro de Editores. Uma outra ideia seria estimular a interlocução de jornalistas, porque os nossos jornalistas conhecem muito pouco os jornalistas dos países dos BRICS. Sérgio Léo dizia que, na falta de um enredo, repetimos aqui o que está na mídia inter-nacional. A imprensa internacional, de certa forma e com honrosas exceções, pauta a imprensa brasileira, de uma maneira geral, no que diz respeito à política internacional. Na questão de diretos huma-nos, isso é muito claro. Lemos frequentes críticas a desrespeitos de direitos humanos na China, mas não sai nada sobre a violação de di-reitos humanos que a pena de morte nos Estados Unidos representa.

Já foi dito que os livros que lemos no Brasil sobre relações internacionais foram escritos ou por europeus ou por americanos. Já o Primeiro-Ministro da Índia conhece profundamente a obra de Celso Furtado. O Foro Acadêmico deve facilitar a aproximação en-tre estudiosos dos cinco países. Um Foro de Editores e um Foro de Jornalistas contribuiriam para o mesmo fim. O país-membro que menos publicou notícias sobre os BRICS foi o Brasil. A China, a Rússia, a África do Sul, todos publicaram mais notícias.

Sugiro que possamos fazer, no futuro, reuniões mais focadas, até para divulgar o que está ocorrendo em termos de formulação, mas ainda não está maduro para ser anunciado, portanto não chega ao conhecimento dos senhores. Assim poderemos debater aqueles que poderiam vir a ser nossos objetos de desejo em termos políti-cos, em termos econômicos e em termos da agenda de cooperação.

Acho, porém, que do ponto de vista do formulador, não vale a pena fazermos outro encontro para repetirmos as mesmas coisas. Este encontro de hoje, de certa forma, repetiu 80% das perplexi-dades sobre o BRICS que foram colocadas no encontro que tive-mos na FAAP. As mesmas perguntas foram colocadas, o mesmo ceticismo foi expresso, enfim, parece que não houve absorção da

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mesa-redonda anterior. Talvez fosse mais útil fazer um debate mais focado, mais centrado e talvez mais orientado por temas.

Ministro Luís Balduino – Uma das vantagens deste exercício, como já disse o Embaixador Pimentel, é que a gente tem um tempo só para pensar e para saber o que os outros pensam. Seria excelente se daqui pudessem sair propostas que ajudassem o governo a de-finir com cristalina clareza os objetivos e os meios para atingi-los. Isso seria excelente, mas mesmo que não se chegue a tanto, a para-da para pensar já ajuda bastante.

Na vida real, tudo tem que ser feito com muita rapidez. De 2008 para cá, o processo se acelerou sensivelmente. Muitas vezes as decisões precisam ser tomadas com base na intuição. Um obje-tivo que fundamenta muitas de nossas decisões é, precisamente, o de participar. O BRICS não é contra os países desenvolvidos, ele é contra estruturas que estão engessadas e que não nos permitem participar. Esse objetivo está claro e estamos tendo sucesso, esta-mos ganhando essa participação.

Mas a crise ainda não acabou. Pode ser que surjam novos eventos, toda hora surgem, e demandam novas decisões. É preci-so mais mesas-redondas como esta, para que se possa pensar com antecipação, ver os vários lados e elaborar, refinar o pensamento, porque o processo é acelerado.

Embaixador Carlos Márcio Cozendey – Final e breve, só para responder a pergunta sobre a dimensão que se quer dar ao Ban-co de Desenvolvimento BRICS. Neste estágio de discussão inicial, tudo está em aberto. As propostas que foram levantadas, seja pelo paper Stern-Stiglitz, seja pelos indianos, mencionam cifras em torno de 30 ou 40 bilhões de dólares, com uma estrutura de capital em que os recursos efetivos equivalentes a 10% e 90% para capital em garantia. Isso equivale à mesma estrutura que tem o Banco Mundial

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hoje. O Banco BRICS será, necessariamente, uma instituição conser-vadora em termos de empréstimos, por isso o poder inicial de mul-tiplicação não será muito grande, para garantir um rating elevado e obter um custo de captação baixo. Estamos falando de uma capaci-dade total de emprestar em torno de US$ 80 bilhões, integralizados ao capital em cinco anos e crescendo gradualmente. Se funcionar, como espero, em dez anos teremos um banco respeitável em termos de atuação internacional, fazendo par com o Banco Mundial.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Terminamos nessa nota positiva. Obrigado a todos. Tivemos uma troca intensa e, a meu juízo, muito produtiva. Aos poucos, vamos ajustando a pontaria em direção ao que interessa aos acadêmicos e, ao mes-mo tempo, aos diplomatas e demais negociadores. Acredito que a transcrição dos debates de hoje demonstrará que nesta reu-nião de hoje já houve uma evolução, já estamos falando de uma maneira mais propositiva. Dúvidas são inevitáveis na atividade político-diplomática, e as críticas, por menos agradáveis, no míni-mo melhoram a nossa capacidade de responder.

Agradeço a participação de todos e espero contar com sua par-ticipação na próxima rodada de discussões, em fins de julho. Até lá, a Funag estará aberta às sugestões que queiram apresentar.

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sP, 31 de Julho de 2012

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Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Conforme combinado, encerraremos hoje o primeiro ciclo de debates sobre o BRICS com uma tentativa de identificar mecanismos mais con-cretos de cooperação e possibilidades mais efetivas de concertação, do ponto de vista do Brasil e também dos nossos parceiros no gru-po. Para isso, teremos a participação de quatro convidados espe-ciais, intelectuais de alto calibre que, a convite da Funag, vieram da Rússia, da China, da Índia e da África do Sul para expor a visão de cada um de seus países sobre o BRICS.

Uma das questões que fica no ar quando discutimos o assunto aqui no Brasil é: qual o interesse dos outros países no BRICS? O que países como a China e a Rússia lucram com o BRICS? Quando se fala do BRICS, as observações iniciais ressaltam as diferenças e as assimetrias e nem sempre fica claro porque os cinco estão juntos. Teremos hoje a oportunidade de verificar como os demais BRICS encaram essas e outras questões.

Antes de dar início aos trabalhos, gostaria de ressaltar que foi com grande satisfação que a Funag aceitou o convite da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) para realizar a ter-ceira rodada deste exercício na sede da Federação. Em fins de 2011, organizamos em parceria com o Instituto Brasil-China (IBRACH), aqui representado pelo Embaixador Affonso Ouro-Preto e pela Pro-fessora Anna Jaguaribe, um seminário sobre a China. Na ocasião, vários dos palestrantes, entre os quais o saudoso professor Antonio Barros de Castro, sublinharam que o empresário brasileiro em geral não investe em planejamento e com isso desperdiça a contribuição

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que o mundo acadêmico poderia lhe dar com análises de conjuntu-ra, pesquisas sobre elementos de interesse específico das empresas e reflexões que seriam muito úteis ao seu planejamento. É com prazer que vejo a FIESP procurar, de certa maneira, desmentir aquele diag-nóstico, ao sediar este encontro. Ao procurar informar-se sobre um assunto ainda pouco conhecido, mas com evidente potencial de im-pacto sobre interesses brasileiros, e ao mesmo tempo informar-nos de suas ambições e preocupações relativas ao BRICS, a FIESP está dando um testemunho de que deseja engajar-se com o meio acadê-mico e com o Ministério das Relações Exteriores (MRE) na procura conjunta dos melhores caminhos ou dos mais curtos atalhos para atingir resultados positivos para o nosso país.

Faço, portanto, um especial agradecimento ao Embaixador Rubens Barbosa, representante da FIESP e nosso anfitrião, a quem passo a palavra.

Embaixador Rubens Barbosa – Bom dia a todos, em nome da presidência da FIESP. Como disse o José Vicente, este é um exem-plo concreto da cooperação entre a Funag, o MRE, a academia e o setor privado, representado aqui pela FIESP, que congrega mais de 150 sindicatos de indústrias de São Paulo. A ocasião é propícia para darmos um passo adiante e complementar o que já foi feito nas duas primeiras mesas-redondas sobre o BRICS. Participei dessas duas pri-meiras reuniões e concordo com a ênfase colocada pela Funag, ao fazer o convite, na necessidade de apresentarmos sugestões de me-didas práticas que possam ser implementadas pelo Itamaraty.

Recentemente, têm aparecido comentários sobre a evolução da economia dos países BRICS feitos por economistas importan-tes, estimulados pela crise econômica. O próprio Jim O’Neill fez comentários sobre a composição do grupo, rent agencies fizeram ameaças em relação ao grau de investimento na Índia. Mas qual-quer que seja a evolução das economias dos países-membros, os

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BRICS estão aqui para ficar. A sua institucionalização é um fato político e vai se desdobrar em ações políticas e econômicas.

A ideia hoje é verificar como cada um dos países-membros pode se beneficiar da existência do grupo. Medvedev já disse que a visão da Rússia é de que o BRICS será um veículo para o diálogo e para a cooperação. Concordo com isso, mas nós temos que avançar e rechear essa moldura com ações de nosso interesse.

Na última reunião de cúpula dos BRICS, na Índia, e em encon-tros à margem de outras reuniões multilaterais, como a do G20 em Los Cabos, foram anunciadas medidas para ampliar a cooperação em várias áreas, em especial a financeira e a fiscal. Venho acompa-nhando a questão dos BRICS, que considero uma das mais impor-tantes iniciativas da política externa brasileira. Se verificarmos o grau de aproximação propiciado, desde a primeira reunião, pelos sucessivos planos de ação, vemos que em pouco tempo muita coisa foi feita para melhorar o conhecimento e o entrosamento entre os cinco. Apesar de serem grandes países e apesar de sua presença internacional, o conhecimento mútuo era restrito e isso começa a ser reparado. Depois da reunião da Índia, algumas ações de co-operação foram concretamente agendadas: a coordenação prévia nas reuniões do Fundo Monetário, do Banco Mundial e do G20; o desafio à atual governança global com a reforma do Banco Mun-dial; a criação de um fundo virtual de reservas para permitir ope-rações de swap, ou troca de moedas e uma notória atuação na crise da Europa, com aportes dos países dos BRICS ao FMI. Além disso, China e Índia anunciaram medidas para fortalecer as reservas em moeda estrangeira e, na área comercial, a China propôs a negocia-ção de um acordo de livre-comércio com os países do Mercosul.

Os comunicados das quatro reuniões indicam progressos no tocante à cooperação entre os países-membros e à concertação nos organismos financeiros internacionais. Os BRICS estão aqui para

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ficar. A sua institucionalização é um fato político e vai se desdobrar em ações políticas e econômicas.

Na última reunião que nós tivemos, respondendo à provo-cação do Embaixador José Vicente, eu apresentei um policy paper com sugestões específicas sobre três pontos:

• definir o que o Brasil quer dos BRICS;

• identificar os interesses do Brasil e de sua agenda no grupo;

• definir uma agenda própria dos BRICS.

Esse texto está publicado no livro O Brasil, os BRICS e a Agenda Internacional3, não preciso entrar em detalhes aqui. Só vou men-cionar uma das sugestões desse meu policy paper sobre a definição de uma agenda própria dos BRICS. Sustento que o grupo vai ter uma influência crescente no cenário internacional na medida em que possa apresentar propostas comuns e negociar em bloco esses pontos específicos. Essas propostas devem ser realistas e pragmá-ticas e começar logo, nas próximas reuniões, de preferência agora na cúpula da África do Sul.

Na minha visão, há vários temas que seria possível incluir na agenda política e na agenda econômico-comercial. Na agenda polí-tica, o BRICS poderia ter uma ação conjunta de grande impacto in-ternacional se, por exemplo, os cinco países pudessem ressuscitar o plano da Arábia Saudita para o Oriente Médio. Todos sabemos que as negociações de paz no Oriente Médio são muito complexas, estão paralisadas por uma séria de razões e uma ação conjunta dos BRICS poderia quebrar essa inércia. Por que escolhi esse exemplo? Ora, a Rússia é membro do “quarteto” e todos os países do BRICS são favoráveis ao plano que a Arábia Saudita apresentou em 2002 aos Estados Unidos, plano que não foi levado adiante pelo então presidente Bush e que, basicamente, cria o Estado Palestino, em

3 Pimentel, José Vicente de Sá (organizador). O Brasil, os BRICS e a Agenda Internacional, 2. ed. revista e ampliada. Brasília: Funag, 2013.

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troca do reconhecimento de Israel por todos os países árabes, o que não é pouca coisa. Repor na mesa de negociações a proposta feita em 2002 pelo Príncipe Abdullah poderia ter um impacto tremendo nas negociações internacionais, porque quebraria o deadlock que ocorre hoje. Se os BRICS tivessem uma voz única neste ponto, poderiam dar uma contribuição impactante. Esse é um exemplo concreto de como os BRICS podem atuar. Há outros; quem tiver interesse, sugiro consultar o meu policy paper no livro.

A agenda do Brasil, por enquanto, na minha visão, ainda é rea-tiva e, sempre na minha maneira de ver, o Brasil é de todos os BRICS aquele que apresenta as melhores condições para ser um consensus builder e dar ao grupo uma orientação de soft power. Poderíamos ter uma ação mais efetiva, mais concreta e com benefícios para o Brasil. Vocês vão ver no meu paper que o Brasil se beneficiará mais do que os outros desse exercício se partir de uma posição pró-ativa e se puder fazer com que os BRICS falem com uma única voz em pontos específicos das agendas internacionais, para marcar uma presença ativa do grupo no cenário mundial.

Concluo agradecendo mais uma vez a presença de todos e o prazer que sentimos aqui na FIESP ao poder organizar junto à Funag este encontro que reputamos de grande interesse para a so-ciedade brasileira.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Para informa-ção dos nossos convidados estrangeiros, Rubens Barbosa foi Em-baixador brasileiro em Londres e em Washington e agora é mem-bro da diretoria da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. Ele é um formador de opinião e defende uma ousada ação dos BRICS, liderada pelo Brasil, em alguns temas sensíveis da atu-alidade internacional.

Vamos primeiro ouvir os nossos convidados estrangeiros, depois passaremos aos debates. Começo com o “R” do BRICS.

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O representante da Rússia, Fyodor Lukyanov é editor de uma das mais importantes revistas de política externa da Rússia, que se chama, numa tradução para o português, “Assuntos Globais”. Fyodor tem uma larga experiência no jornalismo, seus artigos são lidos no mundo inteiro e é um prazer que ele tenha aceitado o con-vite para vir ao Brasil e participar dessa mesa-redonda.

Fyodor Lukyanov4 – Muito obrigado. Talvez a melhor maneira de começar este debate seja mesmo com a visão russa, porque a Rússia é, sem dúvida, uma estranha criatura no BRICS. Comen-taristas ocidentais dizem a toda hora que a Rússia não tem nada a fazer nesse grupo, “vejam a economia russa, vejam a psicologia russa, vejam o império em declínio juntando-se a países emergen-tes”. Um jovem Primeiro-Ministro europeu recentemente publicou um artigo para o Financial Times que provocou uma reação russa muito negativa, porque o artigo dizia, basicamente, que “ninguém se interessa mais pela Rússia, a Rússia já não é mais nada e deve-ria ser retirada do BRICS”. É interessante, portanto, começar justo com esse país.

O que mais chama atenção no BRICS é o fato de que ele ainda existe. O acrônimo foi inventado há dez anos puramente para ins-trumentalizar os esforços de um banco de investimentos que que-ria atrair clientes. Nada de especial, nenhum raciocínio político, apenas interesse em fazer negócios. Desde então, muitos escreve-ram artigos e até livros para dizer que esse grupo é absolutamente absurdo, não faz sentido e, portanto, não pode existir. Os autores desses textos têm vários argumentos convincentes, pois na verda-de os integrantes do BRICS têm pouco, quase nada em comum: cul-turas diferentes, geografias não complementares e, alguns deles, pelo menos, péssimo retrospecto histórico. Índia e China, China

4 A intervenção dos convidados estrangeiros aparece nesta edição editada e vertida para a língua portuguesa. Uma edição em inglês do presente volume será também publicada pela Funag.

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e Rússia, esses relacionamentos ainda têm muitas pendências mal resolvidas, herdadas de um passado nem tão distante assim.

É de certa maneira um paradoxo que uma construção artificial com o BRICS ainda exista. Do ponto de vista russo, é importante entender esse fenômeno e explicar por que o BRICS continua vivo.

Para tanto, é preciso olhar para o grupo não do prisma econômico, como fez o Goldman Sachs e como ainda fazem observadores nos Estados Unidos e na Europa, mas sim do prisma político e geopolítico. O BRICS é visto na Rússia pelo seu potencial político – e, no caso, não há nada de estranho. A moldura teóri-ca da visão russa se baseia no realismo estrutural e dessa ótica o BRICS surge como um ator relativamente independente num sis-tema cuja lógica deveria torná-los dependentes. O BRICS permite a seus membros uma autonomia maior dentro do sistema; assim ele é percebido e por isso ele é valorizado na Rússia.

Vladimir Putin, nossa principal figura política, que se conside-ra também um filósofo, escreveu um artigo para a revista Foreign Affairs, publicado uma semana antes das eleições presidenciais, que reflete a confusão em que se encontra a política externa russa atualmente. A parte interessante desse artigo é justamente aquela dedicada ao BRICS. Putin saúda o grupo com efusão e a chave do entusiasmo é o seu conceito de soberania do BRICS. O que uniria os cinco países seria o fato de serem todos soberanos e de exerce-rem sua soberania.

Talvez os Estados Unidos se considerem o único país realmen-te soberano no mundo, uma vez que para ser de fato soberano um país não deveria depender de alianças limitadoras do seu raio de ação. Os cinco BRICS têm uma autonomia relativa e a exercem em graus diferentes, mas todos são orgulhosamente soberanos. Este é, aliás, o fator que impediria a participação de países como México e Turquia. Embora esses dois tenham políticas externas aguerridas, são ligados demais aos Estados Unidos e à OTAN.

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A segunda razão para a importância atribuída pela Rússia ao BRICS é a percepção de crescente multipolaridade nas relações in-ternacionais. Essa é uma noção de que se abusou nos anos 90. O primeiro a falar de multipolaridade na Rússia, talvez no mundo, foi Yevgeni Primakov, então Chanceler e depois Primeiro-Ministro russo. Na sua maneira de ver, multipolaridade era uma noção para legitimar a Rússia como potência mundial. Nos anos 90, era muito questionável que a Rússia permanecesse como potência e Primakov tentou esse recurso retórico para contrabalançar a noção de que viví-amos num mundo dominado pelos Estados Unidos. Hoje, o conceito de multipolaridade usado em Moscou é muito mais amplo. Com a globalização, vários problemas se tornaram inadministráveis pelas antigas regras de convivência. O meio ambiente, por exemplo, acu-mula problemas cujas soluções demandam a junção de esforços de países que têm capacidade de influenciar estruturalmente a questão. Grupos de países regionais, ou com capacidade de liderar uma região tornam-se centrais para encontrar soluções para problemas tão difu-sos. Do ponto de vista russo, o BRICS pode estimular o tipo de ação em cadeia de que o meio ambiente necessita cada vez mais.

Assim, o BRICS continua de pé em grande parte devido à incapacidade das lideranças e das instituições mundiais atuais para solucionar os problemas que vão se acumulando no âmbito econômico e no político. As instituições globais precisam ser redis-cutidas e, nesse sentido, os BRICS têm uma importante colaboração a dar, até por serem tão diferentes entre si. Não sei se eles serão ca-pazes de concordar em certos pontos essenciais, mas se lograrem colocar-se de acordo terão uma participação decisiva, teoricamente.

Não tenho dúvida de que a Rússia vê o BRICS, antes de mais nada, como um instrumento ou uma oportunidade para reconquistar a sua preeminência no mundo. A prioridade da política externa rus-sa é convencer o Ocidente de que a Rússia ainda existe como grande potência. O BRICS pode contribuir para a recuperação desse status.

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A segunda angústia da política externa russa é como se situar num mundo em que o Ocidente não será mais o único, nem se-quer o principal centro de desenvolvimento e progresso. O BRICS é muito útil para readaptar a psique russa à nova situação, que é difícil, porque apesar de tudo a Rússia é muito europeia na mente e no comportamento. O BRICS desponta nesse quadro como um exercício a fazer, um vestibular a passar.

Finalmente, penso que a existência do BRICS não decorre de uma necessidade fundamental de seus integrantes. Todos eles po-dem funcionar perfeitamente sem o BRICS, mas a situação atual do mundo dá um grande incentivo à permanência do BRICS. Nin-guém sabe o que eles poderão verdadeiramente produzir, se serão realmente um veículo de mudanças nas relações internacionais. Mas a conveniência de mudar existe e talvez daí emerja a esperan-ça de que o BRICS evolua e se transforme num gerador de alterna-tivas, num impulsionador de novos meios e modos de lidar com os problemas do mundo.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Ouviremos agora o Professor Varun Sahni, da Universidade de Nova Delhi. A comunidade acadêmica indiana é imensa e é muito difícil sobres-sair em meio a tantos. O Professor Sahni é um dos nomes que se destacam, e de uma maneira muito simpática para nós, porque no início de sua carreira universitária ele se aprofundou no estudo da América do Sul, mais especificamente na análise dos militares na América Latina, em geral, na América do Sul, em particular e na Argentina, mais especificamente – ele fala espanhol com sotaque portenho. Passo a palavra ao Professor Varun Sahni, para que ele nos dê suas avaliações sobre os BRICS.

Professor Varun Sahni – Muito obrigado. Agradeço muito aos Embaixadores Pimentel e Barbosa pelo convite para participar desse importante evento organizado pela Funag e pela FIESP, em

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companhia de meus colegas dos países BRICS e de tantos intelectuais e empresários brasileiros. Faço um agradecimento especial ao Côn-sul-Geral da Índia em São Paulo, que me honra com sua presença.

Senhoras e senhores, começamos bem a parte expositiva da mesa-redonda com a letra “R”. O que é básico já foi dito com pro-priedade por Fyodor Lukyanov. Agora é a hora do fator “I”.

O BRICS partiu de uma projeção futurística de estrategistas de investimentos, antes de uma avaliação de seus integrantes en-quanto Estados. Este é um ponto que precisaremos manter em mente. Pretendo voltar a ele e já antecipo que farei algumas obser-vações que podem gerar contovérsias.

De início, opino que o BRICS faz menos sentido do que alguns supõem. A segunda premissa é que, enquanto a Índia, na super-fície, pode parecer engajada e até entusiasmada com o BRICS, na verdade o Governo indiano tem razões concretas, baseadas na lógi-ca da política internacional, para retrair-se em temas de substância da agenda do grupo.

Primeiramente, dedicarei algum tempo à discussão da posição oficial indiana, e farei isso pela desconstrução do discurso do Pri-meiro-Ministro Manmohan Singh, feito em Nova Delhi, em 29 de março, na cúpula do BRICS. Tentarei decompor esse discurso para apreender, com a exatidão possível, o sentido daquilo que a Índia está dizendo oficialmente sobre o BRICS. Feito isso, dedicarei algum tempo à análise dos problemas derivados da construção do BRICS.

Quanto ao primeiro ponto, qual seja a posição oficial indiana, deveríamos começar com uma questão teórica, como os acadêmicos gostam de fazer. A pergunta é: por que os Estados se juntam? Por que precisam se agrupar? Respondo que há apenas três razões para tanto. Eles se juntam para agregar poder, para resolver problemas, ou uma combinação das hipóteses acima. Além disso, há uma certa sequência nas motivações que fazem os Estados desejarem atuar

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em conjunto. Não se pode avançar em direção à construção de uma comunidade de Estados sem que certas condições sejam atendidas.

Assim, ao analisar e desconstruir o discurso do Primeiro-Mi-nistro indiano, deveríamos perguntar: quais são os elementos de agregação de poder que aparecem na fala? Quais os exemplos de resolução de problemas? Quais as indicações do interesse em cons-truir uma comunidade de nações?

O Primeiro-Ministro se refere ao fato das emergentes econo-mias de mercado crescerem a taxas saudáveis e ao aumento de sua participação no comércio mundial. Isso dá a impressão de que os BRICS têm poder e capacidade para atuarem conjuntamente na área econômica. A visão indiana parece ser diferente da visão rus-sa, que foi aqui apresentada. Como esse poder agregado seria usa-do? Em que direção? Para os indianos, um objetivo seria estimular o crescimento da demanda global. Isso implicaria canalizar investi-mentos para países carentes de capital, especialmente capital para projetos de infraestrutura. O Primeiro-Ministro argumenta que o Banco Mundial e os bancos multilaterais de desenvolvimento já não têm como fazer isso, e que a outra maneira de lograr o objetivo seria mediante a agregação de recursos pelo BRICS, que para tanto deve criar um Banco de Desenvolvimento Sul-Sul, sob o gerencia-mento dos cinco países do grupo. Não me parece tratar-se de uma filosofia inovadora, da qual os BRICS seriam os mensageiros. Não existe a ideia de um tipo novo de desenvolvimento, e sim de criação de um mecanismo adicional ao Banco Mundial.

Mais adiante, o Primeiro-Ministro levanta a questão da defici-ência da governança global e avalia que nas últimas seis décadas o mundo mudou em muitos aspectos, enquanto as instituições mul-tilaterais permaneceram as mesmas. O desafio aqui é de natureza política e Manmohan Singh manifesta a esperança de que os BRICS possam falar com uma só voz sobre temas importantes, tais como a reforma da ONU e do Conselho de Segurança.

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Justamente aqui a capacidade do BRICS agregar poder encon-tra seu limite. No tocante à reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, os BRICS têm interesses opostos. O que diz a Decla-ração de Delhi? Vou ler: “A China e a Rússia reiteram a importância que concedem ao status do Brasil, Índia e África do Sul nas relações internacionais e apoiam sua aspiração a um papel mais importante na ONU”. O que significa isso? É muito vago, insuficiente, mas não pode ser de outro jeito. É o máximo de acordo a que se pode chegar numa Declaração consensual, porque existe uma clara contradição entre os interesses da Rússia e da China, de um lado, e de Brasil, Índia e África do Sul, do outro.

Na parte comercial, o interesse comum tampouco é evidente. Tomando como exemplo o comércio indiano com os BRICS, vemos que a China é o maior parceiro indiano, a África do Sul é o décimo nono, o Brasil o vigésimo quinto e a Rússia o trigésimo segundo. Depois do fim da guerra fria, a participação russa no comércio com a Índia caiu chocantemente. Os números sugerem que é imprová-vel agregar substância ao comércio e, portanto, não será por aí que se vai agregar poder aos BRICS.

A segunda razão pela qual os Estados se agrupam é para resol-ver problemas comuns. Nesse quesito, o menu é variado. Os itens vão da recessão econômica à volatilidade dos preços dos alimentos e da energia, do desafio de reconciliar desenvolvimento e preserva-ção do meio ambiente à contenção do terrorismo. Em todos esses assuntos, o Primeiro-Ministro indiano assume uma atitude talvez construtiva, porém identificada com objetivos indianos, e afirma que os BRICS podem desempenhar um papel relevante no encami-nhamento de soluções, e que isso seria possível se todos estives-sem representados permanentemente no Conselho de Segurança. Mas, convenhamos, essa possibilidade é no mínimo nebulosa.

Serão os BRICS capazes de construir uma comunidade? Quase nada existe sobre essa eventualidade no discurso de Manmohan

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Singh, a não ser referências esparsas à partilha de experiências, em particular nas áreas de energia, alimentos, utilização da água, desigualdades sociais. Além de um possível aprendizado mútuo, nenhum outro atrativo da criação de uma comunidade BRICS é mencionado. Para mim, isso é significativo.

Há pelo menos quatro problemas que atrapalham a consolida-ção do BRICS. Primeiro: o BRICS é uma categoria imposta de fora a para dentro, que os cinco tentam agora desesperadamente inter-nalizar. A gênese do BRICS está nos esquemas do Goldman Sachs e o objetivo, como Lukyanov já disse aqui, era profetizar a evolução do capitalismo global. Para mim, é curioso que cinco países tão in-teressados em transformar o sistema corram para assegurar um lugar que lhes foi imposto a partir de fora. Ao contrastar o BRICS com o IBAS5, vemos que as reuniões entre os Chefes de Governo dos três países impulsionaram um processo com uma dinâmica en-dógena, um processo impelido pela lógica interna dos três, pelos interesses compartilhados dos três.

O segundo problema é que os cinco têm diferentes interesses e abordagens diante dos principais problemas internacionais do século XXI. Que tipo de harmonização política pode haver, se os cinco divergem sobre questões básicas? O interesse russo, como exposto por Fyodor Lukyanov, é robusto, mas há importantes graus de oposição à hegemonia ocidental dentro do BRICS. As di-ferenças decorrem de motivos variados e profundos, por isso não creio que o BRICS possa ir longe como vetor de transformações de interesse dos cinco países.

A terceira causa para ceticismo são as assimetrias entre os participantes. A Rússia, para começar com o país do professor

5 O Fórum IBAS é uma iniciativa trilateral entre Índia, Brasil e África do Sul. Estabelecido em junho de 2003, quando foi emitido o primeiro documento do Grupo, a “Declaração de Brasília”, o IBAS é um mecanismo de coordenação entre três países emergentes, desenvolvida no intuito de promo-ver a cooperação Sul-Sul.

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Lukyanov, é um país em relativo declínio. Foi uma grande potên-cia, mas há muito deixou de ser. Por outro lado, a China já é uma potência e muito crescerá ainda. Os outros três, África do Sul, Brasil e Índia são países emergentes. Nos meus escritos, procurei distinguir entre potências emergentes e países emergentes. Em espanhol, seria potencias en auge e potencias emergentes e as dife-renças entre elas é considerável. Uma potência emergente já causa um impacto sistêmico nos dias de hoje, como faz a China. Países emergentes são países de poder mediano, que trabalham conscien-temente para conseguir resultados em negociações multilaterais e promover políticas capazes de transformar o sistema mundial de maneira que lhes seja favorável.

Dois BRICS têm assento permanente e poder de veto no Con-selho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), três lutam para entrar. Um é uma superpotência manufatureira, dois são exporta-dores importantes, dois têm problemas profundos e um terceiro, o Brasil, tem uma economia diversificada, um pouco de indústria, um pouco de agroprodução, um pouco de serviços. Em matéria de volume, um dos cinco é bem menor em escala. E a diferença mais crítica é a de que um dos BRICS já é desenvolvido e quatro são paí-ses em desenvolvimento.

Meu último argumento a favor de Brasil e África do Sul terem muita cautela com o BRICS é que esses dois países não precisam e não devem se complicar com a geopolítica extremamente com-plexa da Ásia. Rússia, Índia e China tiveram regimes que queriam transformar as massas de todo o mundo. É uma ideia antiga, mas volta de vez em quando à baila. O Pentágono norte-americano re-fere-se a esses três países, num documento interno, como os três transition states. Porque a transição não se consuma? Há vários fa-tores que atuam contra, como a falta de coesão social, de unidade nacional e de integridade territorial. As políticas dos três acabam impactando negativamente nos outros dois. O argumento que

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quero sublinhar é que o BRICS abriga três colossais dores de cabe-ça. A eventualidade dos três atuarem concertadamente é remota.

Se me permitirem, farei uma última reflexão sobre a preferên-cia pela democracia no interior do IBAS. Brasil, África do Sul e Índia são democracias. Por isso, o IBAS tem coesão interna e o BRICS não. Mas me parece importante destacar que a perspectiva democrática nunca havia antes figurado entre as diretrizes da política externa in-diana. Embora seja democrática há seis décadas, a Índia não promo-via a democracia externamente. Há três razões para isso.

A primeira é que a democracia tem um sentido bem indiano para a maioria dos indianos. É difícil traduzir o que significa a de-mocracia indiana para os não indianos.

Em segundo lugar, em momentos de extrema necessidade, a Índia não contou com a ajuda das potências democráticas oci-dentais. Apesar de ser uma democracia, a solidariedade das po-tências ocidentais democráticas não se manifestou, por exemplo, em 1962, quando da invasão da China. Assim, chegamos à con-clusão de que a nossa autonomia estratégica não está conectada à democracia.

A terceira é que a vizinhança indiana tem sido não democrática ao longo dos tempos. Desde a independência, a Índia perdeu a pa-ciência de esperar que os seus vizinhos se tornassem democráticos.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Uma interroga-ção que emerge com frequência nas discussões sobre o BRICS é: e a China? O que a China quer do BRICS? Qual a motivação da China para seguir no BRICS? Quem vai tratar dessa questão aqui hoje é o Professor Jin Canrong, que atua não apenas no meio acadêmico chinês, mas também na imprensa, em que publica frequentes arti-gos e se destaca como formador de opinião. Sua área de estudos se volta para o lado dos Estados Unidos, mas ele se interessa também pela América do Sul e pelo Brasil, especificamente.

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O Professor Jin Canrong tem ideias claras e comentários que normalmente não associamos com os acadêmicos chineses, em ge-ral tão disciplinados. Vou compartilhar com os senhores uma com-paração curiosa que ele fez entre a China e os EUA. A China está em vésperas de uma eleição que o preocupa, porque, a seu juízo, em países como os nossos são raros os casos de uma transição política que não altere em nada a linha de governo; a continuidade só exis-tiria em países com sistemas políticos consolidados, estabilizados. Segundo Canrong, nas eleições nos EUA os candidatos prometem mudanças e depois fazem exatamente a mesma coisa. Na China, os candidatos prometem que vai ser tudo igual e a partir do momento em que assumem o poder, começam a fazer mudanças. Estou certo de que ele terá observações instigantes também sobre o BRICS.

Professor Jin Canrong – Agradeço à Funag e à FIESP o con-vite, que muito me honra. Ultimamente, recebemos na China, bem mais do que antes, muitas notícias sobre o Brasil, o povo brasileiro, a beleza deste país e sobre São Paulo, que é uma me-trópole impressionante.

Antes de vir, procurei informações em sites chineses sobre o BRICS e fiquei impressionado com o número de artigos e de in-formações que encontrei em revistas populares e em publicações especializadas. Sem muita pesquisa, encontrei cinquenta e duas monografias sobre o BRICS. Há poucos dias atrás, entrou em cir-culação um novo livro, editado pela Academia Chinesa de Ciências Sociais. O interesse da mídia e das universidades no BRICS é cres-cente. Isso me surpreendeu, confesso, e me fez pensar sobre quais seriam as causas desse recente interesse.

Nas últimas três décadas, a China fez o possível para conhe-cer e explorar as possibilidades de negócios com os Estados Uni-dos, a Europa e o Japão, mas a crise fez com que esses mercados

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se encolhessem. A busca de novos parceiros econômicos seria uma primeira explicação do interesse no BRICS.

A segunda é a necessidade de reformar o sistema de comércio internacional. A necessidade é patente e a China precisa participar da reforma. Sozinha, é mais difícil.

A terceira é a necessidade de parceiros para promover uma governança global de acordo com os nossos interesses. A China, para falar com franqueza, vem tendo muitas decepções com os Três Grandes – EUA, UE e Japão – e precisa de apoio para mudar certas regras do sistema e defender as posições chinesas nas gran-des questões do século, a começar pelo uso do meio ambiente e da água, sem perder o ímpeto do crescimento econômico.

O que faz os BRICS seguirem juntos? Na minha opinião, há pelo menos quatro fortes motivos. Antes de mais nada, são países geo-graficamente muito extensos, com muitos recursos naturais, além de boas perspectivas de progresso na área tecnológica. Nos EUA, fa-la-se muito, há tempos, sobre cenários futuros de oferta de energia e isso será crucial no futuro. Como utilizar esses recursos é um tema importante para todo mundo. A população da Índia é imensa, o ter-ritório e a população russa também, o Brasil tem de tudo, inclusive o melhor time de futebol, e a África do Sul abre a porta de entrada para a África, oferece uma oportunidade de aproximação com o continen-te africano. Esses países são muito atraentes para a China.

Além disso, a China tem a sensação de que contribui muito para a economia internacional, mas não tem capacidade de influenciar as decisões que são tomadas nas organizações internacionais que cui-dam do comércio e das finanças. Na governança do mundo, a Assem-bleia Geral das Nações Unidas seria o órgão mais representativo, mas quem manda é o Conselho de Segurança. A meu ver, os países BRICS são os naturais aspirantes a uma ampliação do Conselho de Seguran-ça. Até por isso, a China se beneficia ao juntar-se a eles desde já.

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Nesta altura, gostaria de dizer que a China não tem pro-blema com a entrada de nenhum dos BRICS no CSNU. Somos a favor de uma reforma do Conselho e não nos opomos à entra-da dos países do BRICS. Mas sempre nos oporemos à entrada do Japão. A opinião pública chinesa nunca vai aceitar a entrada do Japão como membro permanente do Conselho de Segurança.

Para o futuro, o teste do BRICS é a capacidade de continu-ar como um bloco nas negociações inevitáveis com os Três Gran-des. Para ter suficiente poder de barganha e influenciar o processo de tomada de decisões políticas e econômicas, os cinco precisam uns dos outros. É necessário assumir mais responsabilidades na governança global. Em março, visitei os EUA e, conversando com conhecidos do Departamento do Tesouro, me interei de que eles acreditam que a economia americana voltará ao normal somente depois de 2020. Isso se aplicaria também à Europa e ao Japão. Ou seja, teremos mais uma década para que os Três Grandes voltem a empurrar a economia mundial na direção do crescimento. Se for assim, será difícil que assumam o ônus da liderança da governança global. Fisicamente, não terão condições, financeiramente depen-derão da ajuda dos outros.

Todos nós precisamos de ajuda, não é? Embora a China não es-teja pronta para assumir responsabilidades na escala mundial, não há alternativa. Junto com os BRICS, a tarefa se tornará mais factível.

Para isso, os cinco terão, primeiro, de encaminhar com sabe-doria as suas situações no interior de seus países. Todos os países BRICS estão em processo de modernização, com os desafios que vêm juntos. A situação chinesa está em evolução. A população ur-bana da China ultrapassou a rural, e a nova classe média, que não para de crescer em números e em influência, tem melhor educação, e tem mais reivindicações a fazer no tocante a direitos individuais. São mais críticos dos governantes do que jamais foram.

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Outra coisa a ter em mente é que na China temos uma eco-nomia de mercado sob o controle do governo. Funcionou até aqui, mas há sinais de que a situação evolui e que o tradicional controle governamental deve se alterar, só não se sabe como, nem quando. Mas está em curso uma mudança.

Na China, em 2012, teremos um novo governo. Não sabe-mos o que pensam os novos líderes, até porque é comum que os governantes digam uma coisa antes e, digamos assim, depois de assumirem o governo as condições existentes fazem com que as suas opções sejam outras. Há problemas internos, que deverão ser tratados com cuidado. Teremos, portanto, de colocar a agenda do-méstica em primeiro lugar.

Mas a agenda externa também é crucial. Há desafios na área ex-terna, questões de segurança terão de ser administradas. Por exem-plo, os EUA estão entrando na Ásia e isso vai possivelmente tornar as nossas relações com os países vizinhos ainda mais complexas.

Para concluir, gostaria de fazer três sugestões práticas. A pri-meira é a de que os BRICS escolham metas realistas. Não devemos basear esse foro num novelo de regras e regulamentos legais. O BRICS deve se basear em cooperação funcional e não em obriga-ções de ordem legalista.

A segunda é que, embora o BRICS venha ganhando uma cres-cente notoriedade, embora muita gente nas universidades e nos negócios tenha começado a prestar atenção aos parceiros do bloco, acredito que a sociedade chinesa ainda não tem informação sufi-ciente a respeito e, portanto, o BRICS ainda não conta com apoio popular. O homem comum não sabe o que é o BRICS e não com-preende o seu valor. Sendo assim, precisaríamos investir em divul-gação. Creio que todos os demais BRICS sofrem do mesmo mal e deveriam, portanto, dedicar talentos e recursos a um trabalho de popularização da sigla e de seus atrativos.

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A terceira sugestão é que o BRICS crie um secretariado per-manente. Não na China, certamente não na China, isso deixaria nossos amigos nos Estados Unidos e mais ainda em outros países preocupados. Não precisa ser um secretariado com uma folha de pagamentos extensa. Um secretariado serviria inclusive para dar direção à divulgação de que falei.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – A África do Sul foi o último país a entrar no BRICS, o único que não foi escolhi-do por Jim O’Neill e sim pelos próprios parceiros. Por isso mes-mo, muitos consideram a entrada sul-africana como o atestado de maioridade política do BRICS.

A última intervenção deste módulo será de Elizabeth Sidiro-poulos, que dirige um importante think-tank sul-africano, o South African Institute of International Affairs (SAIIA) e faz um trabalho notável, que eu próprio testemunhei, durante a minha permanên-cia em Pretória.

Professora Elizabeth Sidiropoulos – Muito obrigada pelo convite para vir a São Paulo. Alguns acadêmicos que participaram de um recente workshop comentaram que a África do Sul deveria ser denominada a “brickette”. Seja como for, permitam-me fazer algumas observações e comentários sobre o BRICS do ponto de vis-ta sul-africano.

O primeiro ponto a ser destacado é a importância do BRICS para a África do Sul. Esse é, provavelmente, o mais relevante fó-rum de engajamento plurilateral depois da União Africana – peça central de nosso envolvimento na agenda africana, que é, por sua vez, a prioridade de nossa política externa. A África do Sul vê o BRICS como um elemento crescentemente central na abordagem dos problemas socioeconômicos do país, e também dos da África. Há imperativos de desenvolvimento, domésticos e continentais,

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que a diplomacia sul-africana considera convergentes com a atu-ação do BRICS.

O segundo ponto é a percepção sul-africana de que o BRICS terá um impacto transformacional na ordem global. Essa agenda global de transformação tem sido o principal elemento da política externa da África do Sul desde 1994. Eu diria que o tempo tornou esse aspecto transformacional ainda mais saliente na abordagem diplomática da África do Sul, embora os sul-africanos possam ser bastante pragmáticos quando operam em ambiente multilateral. O discurso do partido governante é, contudo, bastante radical quanto à necessidade de transformações.

Assim, as duas questões que devem ser avaliadas pela diplo-macia sul-africana são, em primeiro lugar, se a África do Sul preci-sa do auxílio do BRICS em questões econômicas domésticas e em questões de desenvolvimento no continente, ou se seria melhor tratá-las bilateralmente. A segunda questão é se o BRICS seria o melhor fórum para se alcançar a segunda etapa da agenda de trans-formação da ordem mundial.

Já ouvimos alguns comentários sobre o desnivelamento que decorre da circunstância de serem a Índia, o Brasil e a África do Sul países aspirantes a um assento permanente no Conselho de Segu-rança das Nações Unidas, enquanto a Rússia e a China já estão lá, embora não em função de uma deliberação do sistema global atual. A outra importante diferenciação entre os BRICS é a evidência de que, de todos os países do grupo, a África do Sul é o menor, muito menor economicamente e demograficamente. Claro, é um poder regional no sul da África e tem um papel relevante no continen-te, mas não pode desempenhar o poder da mesma maneira que a China, o Brasil, a Índia e a Rússia podem.

Sendo assim, como as ambições da África do Sul no cenário internacional podem ser promovidas pelo uso desse e de outros

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foros, como o IBAS, por exemplo? Não deveriam ser privilegiadas as alianças com a União Europeia e os Estados Unidos, pelo menos em certas agendas de nível multilateral? Até onde o BRICS podem formar um fórum efetivo sobre questões de governança econômica global, especialmente no âmbito da agenda do G20?

Do ponto de vista do Governo Zuma, há questões domésticas e aspectos de desenvolvimento que tornam o BRICS importante para a África do Sul. Empregos, crescimento econômico e problemas de desigualdade têm sido prioridade na agenda sul-africana desde 1994. Este é um grande desafio econômico e estrutural que a África do Sul vem enfrentando há anos. A participação do país no BRICS é vista como uma oportunidade para potencializar investimentos e promo-ver um aumento no comércio dentro do grupo que compense o declí-nio dos mercados tradicionais dos Estados Unidos e da Europa. Creio que esse é o principal atrativo do BRICS para o governo sul-africano – a prioridade econômica, a percepção de vantagens concretas.

Existe também uma linha de pensamento segundo a qual isso é uma fantasia. Para os que pensam nessa linha, as questões de comércio e investimento seriam mais bem resolvidas bilateralmen-te e, para ilustrar seu raciocínio, citam pendências concretas nas quais o BRICS não funciona como foro para resolver o acesso a mer-cados. Sei que alguns colegas do Ministério das Relações Exteriores e da Embaixada indiana em Pretória teriam bastante a dizer sobre a dificuldade de negociar questões comerciais, como por exemplo, a venda de vinho sul-africano no mercado da Índia. Também sei que há disputas sobre questões comerciais com o Brasil, que se-rão inclusive levadas à Organização Mundial do Comércio (OMC). O discurso oficial sul-africano é dúbio a esse respeito, mas me pa-rece que os nossos diplomatas ficam duplamente frustrados por não conseguirem resolver problemas práticos no BRICS, primeiro pela falta de solução em si mesma e, segundo, pela oportunidade que isso oferece aos oposicionistas para criticarem o governo.

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Um dos desafios da África do Sul nos níveis bilateral e mul-tilateral é a necessidade de um comércio mais equilibrado, menos exportações de matérias-primas e mais exportações de produtos de valor agregado para estimular nossa própria produção industrial in-terna. Esse problema se coloca também para outros países do BRICS. Supõe-se na África do Sul que o foro poderá induzir a criação de sis-temas de cooperação que beneficiem as matérias-primas. Esse é um dos elementos que sobressaem também na parceria bilateral que assinamos com a China, há dois anos. O interesse sul-africano foi reiterado pelo Presidente Zuma na recente Cúpula de Pequim.

No nível continental e regional, novamente surge a questão do desenvolvimento, e aqui falamos especificamente de infraes-trutura material. Sendo a África do Sul a líder em iniciativas de infraestrutura na União Africana, essas iniciativas podem utilizar as enormes reservas que os países do BRIC – e eu omito intencio-nalmente a letra “S” – possuem para auxiliar no desenvolvimento do continente. Para apresentar-lhes um valor concreto, as neces-sidades de infraestrutura no continente somam cerca de noventa bilhões de dólares por ano, dos quais somente metade é financia-da. Há enormes oportunidades para cooperação nesta área, pois os países do grupo possuem reservas financeiras que podem ser exploradas, e o governo Zuma espera que elas sejam exploradas nesse sentido. Creio que esta seja a área em que o Banco de Desen-volvimento do BRICS poderá justificar as expectativas da África do Sul. A opção preferida seria dirigir as reservas para investimentos em infraestrutura ligados à industrialização e à infraestrutura so-cial. O Banco BRICS, ou o Banco Sul-Sul administrado pelo BRICS, é muito importante para os governantes sul-africanos. O seu argu-mento é que a próxima fase de transformação africana apresenta o desafio de captar empréstimos de quarenta, cinquenta ou sessenta anos, e o Banco BRICS seria um financiador fundamental desse esforço, uma vez que daria à África do Sul e à África as melhores

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condições para este tipo de discussão, melhores do que as obtidas bilateralmente ou nos organismos financeiros tradicionais.

Assim, identifico otimismo na percepção nacional e continen-tal sobre o BRICS, otimismo ligado à obtenção de vantagens em uma série de iniciativas de colaboração, que não versam necessa-riamente sobre a alta política, mas sobre iniciativas concretas na área da economia. A África é considerada a próxima fronteira de crescimento, há enormes oportunidades no crescimento do merca-do consumidor, e, assim, os parceiros não estariam fazendo favor, e sim se engajando em parcerias rentáveis de longo prazo.

Uma agenda de desenvolvimento como parte da agenda do BRICS e do G20 traria mais legitimidade para esses clubes que são, por definição, exclusivos. Quando discutimos o G20 ou o BRICS, falamos de clubes exclusivos. Não há dúvida de que é mais fácil operar com clubes menores, quando queremos tratar de avançar em áreas que estão interligadas com as agendas globais, mas há a questão de legitimidade. Como enfrentá-la? Assegurando que os elementos da sua agenda abordem alguns dos outros desafios ou outros problemas no ambiente global, como a pobreza, a desigual-dade, as deficiências, que afetam metade da população mundial. Tanto nos ambientes do G20 como, penso eu, no BRICS, a solida-riedade é um elemento que confere legitimidade.

Um outro aspecto que é importante mencionar aqui é a exis-tência, eu diria mesmo a militância, de uma corrente ideológica anti-imperialista no projeto da África do Sul para o BRICS. Não acho que se deva subestimar essa corrente. Nem sempre o fator ideológico aparece claramente articulado, mas surgem aqui e ali no discurso sul-africano menções ao BRICS como um opositor ao G7, e não um contrapeso no sentido de criar uma visão nova e alternativa do mundo. Acredito que haverá grandes dificuldades para que essa visão se torne a política do grupo, mas o Governo da

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África do Sul entende que o BRICS pode ser, no futuro, um concor-rente ao poder dentro do sistema global.

A política externa da África do Sul considera o BRICS como uma base de apoio para a estratégia Sul-Sul na agenda global de transformação. É interessante que, nas discussões desta manhã, a questão da cooperação Sul-Sul não tenha sido mencionada, mas ela é uma corrente constante nas declarações ministeriais e pre-sidenciais da África do Sul. Pode ser contraposto que o mundo é agora muito mais complexo e que as velhas fronteiras entre Norte e Sul precisam ser mais flexíveis e sensíveis a enquadramentos es-pecíficos. Mas esta é uma corrente muito importante na política externa da África do Sul, que assim impulsiona a crença na neces-sidade de uma confrontação com os detentores da governança glo-bal, até em função do argumento de que o equilíbrio do poder está se transferindo para o leste, e até certo ponto o BRICS é o motor capaz de impulsionar essa tendência.

A meu ver, deve-se fazer a necessária distinção entre multila-teralismo e multipolaridade. A África do Sul identificou o multilate-ralismo como um dos principais elementos de sua política externa desde 1994. A importância do desenvolvimento de um sistema glo-bal internacional baseado em regras equitativas, em que as opiniões dos países em desenvolvimento tenham o direito a serem expressas e ouvidas, vem sendo reiterada pelos governantes sul-africanos. Por sua vez, a multipolaridade pode contribuir para uma abordagem me-nos unilateral na elaboração de políticas globais, mas não deve ser um fim em si mesma. Um sistema global baseado em regras e mais igualitário é uma meta desejável, e a multipolaridade como auxiliar em sua formação também é, mas a multipolaridade apenas pela mul-tipolaridade não me parece uma meta a se perseguir.

Eu argumentaria que há limites para a promoção das refor-mas do sistema global a partir do BRICS, dada a composição e os diferentes interesses dentro do grupo. O engajamento não parece

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se manifestar no que tange à reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU). Mas creio que possa haver colabora-ção e suporte do BRICS às questões da África, seja no contexto do CSNU, seja no multilateralismo econômico. Talvez a África e seus desafios sejam uma área de consenso e colaboração. Um apoio con-sensual e concreto aos interesses africanos daria inclusive maior legitimidade ao BRICS. Por seu turno, um maior engajamento eco-nômico e político poderá gerar competição entre os BRICS, e entre alguns deles e a África do Sul, por influência política e econômica na África. Esta dicotomia os sul-africanos terão de enfrentar.

A África do Sul é importante no continente africano, mas tem pouca influência global e econômica. A economia sul-africana não é comparável às dos outros membros do BRICS. Desde Man-dela, contudo, o país tem sido um cidadão global muito ativo, o que pode até gerar críticas de que temos mordido mais do que podemos mastigar, mas por outro lado justifica a nossa entrada num foro onde a transformação sistêmica é discutida. Poder con-tribuir com ideias, e ganhar certa influência entre seus pares por isso, é extremamente importante para o modo como a África do Sul vem se posicionando desde 1994. É importante do lado do prestígio que se conquista com a participação, mas também do lado da confirmação da validade dos princípios que vêm guian-do a política externa desde a presidência de Mandela. Embora a Chancelaria sul-africana não fale em termos de liderança, o fato é que os países fora da África, e algumas vezes os países africa-nos também, veem a África do Sul como líder, e quando insere na agenda global importantes interesses africanos, a diplomacia sul-africana desempenha um papel relevante, que provavelmente ninguém mais na região poderia desempenhar.

Mas nem sempre o BRICS tem sido de valia para os interesses africanos ou sul-africanos. Por exemplo, a África tem dado impor-tante apoio às reformas propostas no contexto do FMI sobre cotas.

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Paradoxalmente, de todos os países presentes no G20, a África do Sul é a única que tem a perder com reformas de cotas. Sua influência no FMI será reduzida quando as reformas das cotas forem imple-mentadas. O ponto que a África do Sul apresentou para discussão é a questão de que, dada a redução de seu próprio poder de voto, e dado que a África é geralmente sub-representada nas organizações financeiras multilaterais, seria preferível que uma terceira posição na diretoria do FMI fosse acordada. No BRICS, o apoio a esta rei-vindicação tem sido equivalente ao apoio da Declaração de Nova Delhi à reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Outra instância de falta de apoio do BRICS à África deu-se no caso da candidatura ao Banco Mundial. Houve, sem dúvida, uma atuação proativa do grupo na indicação de candidatos de países em desenvolvimento, mas não houve unanimidade no efetivo apoio a tais candidatos. É compreensível, o BRICS ainda é uma organiza-ção em sua infância, mas aquela eleição põe em destaque algumas das dificuldades do grupo.

O desenvolvimento mais positivo até agora foi a proposta do banco de desenvolvimento, que será útil até mesmo como agente de renovação dos métodos de trabalho do Banco Mundial.

A estagnação da Rodada Doha serve, pelo menos, para des-tacar a centralidade da OMC no sistema mundial de comércio. A proliferação de iniciativas comerciais regionais e plurilaterais, na ausência de avanços na rodada, é a prova disso. Um recente relató-rio do Fórum Econômico Mundial sugere que o fato de o comércio mundial desenvolver-se hoje à base de cadeias regionais mudou a forma de pensar a questão comercial. Nesse quadro, que papel o BRICS pode desempenhar para trazer a OMC de volta ao centro do sistema mundial de comércio? Apesar de seus interesses agrícolas divergirem em muitos níveis, vimos em Cancun, em 2003, que a Índia, o Brasil e a África do Sul podem atuar sobre uma agenda

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comum. Podemos ter uma discussão no BRICS, incluindo a Rússia e a China, sobre como ressuscitar a Rodada de Doha, antes que ela morra definitivamente?

E, finalmente, temos de encarar a questão da China, que é o grande elefante na sala, ou talvez eu deva dizer o grande dragão. O décimo segundo plano quinquenal chinês envolve a reforma mo-netária, e por isso tem implicações para todos os demais BRICS – embora alguns de nós admitamos essa realidade mais claramente que outros. Cada um de nós está ansioso para desenvolver indús-trias manufatureiras nacionais, que atualmente são, intencional ou acidentalmente, superadas pelo preço chinês. Sei que algumas dessas limitações são domésticas, mas também decorrem do modo como competimos no nível global, e esta é uma discussão difícil, porém incontornável, no seio do BRICS.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Ouviremos agora o Embaixador Valdemar Carneiro Leão, que é o sherpa do Itamaraty para as negociações econômico-financeiras no G20, em que o BRICS tem uma participação inegavelmente importan-te. Em seguida, o Conselheiro Fernando Pimentel, Secretário--Adjunto de Relações Internacionais do Ministério da Fazenda, e o representante brasileiro no FMI, Paulo Nogueira Batista Jr., apresentarão suas avaliações sobre a concertação do BRICS nas instituições de Bretton Woods. Para fechar este bloco, o Embai-xador Ronaldo Sardenberg fará considerações a respeito da face política do BRICS.

Com a palavra o Embaixador Valdemar Carneiro Leão, Subse-cretário de Assuntos Econômicos do Itamaraty.

Embaixador Valdemar Carneiro Leão – Começo com um disclaimer. Nem tudo que eu disser representa necessariamente o pensamento do Ministério das Relações Exteriores. Vou me despir

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aqui das minhas vestes rituais e tentar fugir um pouco do que seria o evangelho oficial. Portanto, por favor, não me vejam aqui como representante do Ministério.

Poucos questionam a existência do G20, mas muitos ques-tionam a existência do BRICS. No entanto, os dois estão profun-damente, intimamente, umbilicalmente ligados. O G20 gera o BRICS. A meu ver, não há dúvida de que o fato de o BRICS vir a constituir-se em nível de Chefes de Estado poucos meses depois do aparecimento do G20 não é fortuito.

O BRICS não somente provoca a criação do G20, como tam-bém oferece o cenário dentro do qual o BRICS vai operar, sobretu-do naquilo que diz respeito às mudanças na governança mundial.

Em última instância, eu diria que o G20 reforça o BRICS. Não que os cinco BRICS não pudessem produzir as reformas no FMI e no Banco Mundial. Mas o ritmo com que isso se deu só foi possível graças à existência do G20, caso contrário essas reformas encon-trariam resistências muito maiores dentro da engrenagem das ins-tituições financeiras internacionais.

Apesar de todas as críticas ao BRICS, devido às assimetrias e outras incongruências que já foram apontadas aqui e nas nossas reuniões anteriores, o BRICS é uma realidade. Acho até fútil a dis-cussão quanto à afinidade dos países que decidiram se reunir. Se existisse uma incongruência incontornável, os Chefes de Estado desses países insistiriam em se reunir? As razões pelas quais eles se reúnem merecem algum esforço de análise.

Nesse sentido, uma ilação que me parece muito curiosa e pou-co mencionada, não vi ainda nenhuma análise a esse respeito, é que a criação do BRICS representa o que eu denominaria de um “reconhecimento cruzado de autoavaliações”. Eu me considero potência emergente, você me considera potência emergente e eu considero você potência emergente. Ou seja, todos se autoavaliam

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como potências emergentes e são reconhecidos como tal por seus pares. Politicamente, isso tem uma importância extraordinária, porque os BRICS se destacam, se descolam dos outros países em desenvolvimento, se autoinvestem de um status especial. Do ponto de vista político e até mesmo para a política externa brasileira, não se trata de uma confirmação trivial. Sempre trabalhamos em torno da ideia do G77 mais a China e, de repente, surge esse processo endógeno, ou quase, de que eu não sou apenas uma potência emer-gente, mas sim uma potência emergente especial, e me reúno com os outros que também são e que me reconhecem como tal.

O BRICS aporta valor para cada um de seus integrantes. Esse valor difere de país para país, mas seria um absurdo, política e eco-nomicamente falando, que os Chefes de Estado se reunissem sem que tirassem disso algum benefício. O valor embutido no BRICS seria, do ponto de vista analítico, o aspecto mais estimulante. Des-cobrir o que vale para cada país é missão comum aos críticos e aos operadores políticos.

Como hipótese de trabalho, avalio que existe um denominador comum nesse valor, que teria dois componentes: o primeiro é intrín-seco, é o que se entenderia por poder e capacidade de ação acrescida; o segundo seria um componente que eu chamaria de exteriorizado, que é o da imagem à qual estaria associada uma certa marca, para falar em termos de marketing. O BRICS pode ser visto hoje como uma marca de prestígio. Cada um dos seus membros faz uso da ca-pacidade acrescida de poder e ação e da imagem de prestígio, só que de formas diferenciadas. Esse uso diferenciado é observado e obser-vável nos diversos momentos em que o BRICS se manifesta.

Última observação sobre isso. Por conta dessas diferenças, digamos, de valor e de uso, a agenda do BRICS passa a ser mui-to seletiva e restrita. O BRICS não negocia intramuros, o BRICS expressa unanimidades. Essa é a minha opinião. Quando essa unanimidade ou semiunanimidade não existe, o BRICS se omite,

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silencia. Os integrantes não se confrontam em torno de questões que podem gerar divisões dentro do grupo, preferem atuar onde há unanimidade ou uma certa indiferença em relação ao tema. Isso sem dúvida restringe a agenda do BRICS, que parecem shy away de determinados temas, sobretudo, na temática política, pela diferença, já apontada aqui, de poder institucional que existe entre os diferentes membros do grupo.

Dito isso, passo para a terceira parte da minha intervenção, tentando ver que valor teria o BRICS para o Brasil. Como para os outros, o BRICS representa uma potencialização da capacidade de ação do país e também representa uma marca. É claro que o Brasil estava em franca ascensão em 2008, quando se criou o G20, e em 2009, quando se criou o BRICS. A ascensão brasileira era reco-nhecida, mas a criação do G20 e a transformação do BRICS num foro diplomático aceleraram consideravelmente o reconhecimen-to do Brasil como potência emergente. Nós sabemos que havia um processo de cooptação em curso no G7; o Brasil vinha sendo sistematicamente convidado ao G7 – na verdade, ao G8 – para o que se chamava, diplomaticamente, de “cafezinho”. Ou seja, o Brasil não tinha direito ao “jantar”, mas era chamado para tomar um “cafezinho” com o G7, durante o qual podia falar sobre aque-les temas em que os 7 julgavam apropriada a nossa participação. De repente, o “cafezinho” desaparece e ficam todos participando do “jantar”: o Brasil chegava ao G20 de próprio direito, no primei-ro salto de imagem de reconhecimento, por assim dizer, institu-cional. Logo em seguida vem o BRICS, que é um segundo salto, porque o BRICS faz do Brasil uma potência emergente especial no âmbito do G20. Há uma dupla oportunidade, da qual o Brasil se vale e que também tem reflexos.

Que reflexos são esses? De poder, obviamente, já que o Bra-sil, como outros, estava interessado na mudança da governança financeira. Mas também na área comercial, embora a Rússia não

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estivesse na OMC. De fato, a situação do BRICS ficava capenga na OMC, devido a não participação da Rússia. Mas eu estive presente em todas as reuniões de Ministros de Comércio que o BRICS reali-zou e o tema sempre foi a Rodada Doha, não obstante a Rússia não ser ainda país-membro da OMC.

Portanto, o poder brasileiro se potencializa ao aumentar a ca-pacidade de bloquear um rumo da rodada que não lhe interesse, como também se potencializa na reforma do FMI.

Na marca, o Brasil ganha. O Brasil decerto já estava na mira dos investidores, mas o BRICS sem dúvida acrescenta um selo especial, porque a marca BRICS está associada a um crescimento acelerado, projetado numa escala territorial e populacional sem precedentes. Isto acrescenta uma dimensão que não estaria pre-sente se o Brasil estivesse sozinho no mundo.

Reitero, em conclusão, que a discussão sobre se vale ou não vale a pena estar no BRICS é fútil. Vale a pena, sim, e por isso as reuni-ões prosseguem. Quem tem dúvida deveria investigar e descobrir as razões por que vale a pena para cada país. Dessa maneira, poderá descobrir também se é possível melhorar o que se faz no BRICS.

Nessa altura, eu me aventuraria a fazer duas ou três ob-servações sobre o que é possível e o que não é possível fazer no plano econômico. Não se pode negar que o brilho do BRICS vem sobretudo de uma estrela maior, que se chama China. O comércio intra-BRICS se situa hoje na casa dos US$ 300 bilhões, dos quais 140 bilhões são com a China. O comércio extra-BRICS, ou seja, de cada um dos BRICS para fora, está hoje em US$ 3 trilhões, dos quais US$ 1,9 trilhão é exportado pela China. Vemos que o sistema comercial da China funciona quase como um sistema radial, com um núcleo de que partem e para o qual convergem produtos. Não existe, ainda, uma teia de interesses complementares que envolva todos os membros do BRICS. Todos os BRICS estão envolvidos com a China e a China se envolve, separadamente, com cada um.

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Nem o mercado brasileiro, nem o russo, nem o indiano, nem o sul-africano significa muito para a China, individualmente, mas os quatro somados já representam hoje quase 45% de tudo que a China vende aos Estados Unidos, o que não é pouco. Nossos países crescem de interesse para a China também como mercados, embo-ra ainda em escala pequena. Mas, não se pode negar, o que existe é um grande dinamismo comercial chinês, ao qual os outros quatro estão, de alguma maneira, atrelados. Sendo assim, eu não vejo ne-nhuma iniciativa viável na área comercial, a curto e médio prazo, até porque a competitividade chinesa torna o comércio um ponto sensível dentro do grupo.

Iniciativas recentes, como a do acordo de pool de reservas e a do Banco de Desenvolvimento têm em comum a tentativa de mo-bilização de recursos públicos. Talvez o grande salto do BRICS se-ria encontrar um meio de mobilizar os recursos privados entre os cinco membros. Os públicos estão sendo mobilizados; os privados, nós precisamos encontrar um canal de mobilização.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Muito obri-gado, Valdemar. É oportuna a sua sugestão de dar continuidade a esse diálogo entre o governo, o mundo acadêmico, o mundo em-presarial, a mídia e a sociedade brasileira em geral, por meio de pesquisas e debates sobre o valor do BRICS para cada um dos paí-ses. Está anotada a proposta.

Vamos ouvir agora o representante da Fazenda.

Conselheiro Fernando Pimentel – Também faço o disclaimer de que o que vou dizer não é, necessariamente, a visão oficial. Farei considerações com base na minha percepção pessoal sobre as nego-ciações em que venho trabalhando.

Concordo com o Embaixador Carneiro Leão, o debate sobre a conveniência de entrar no BRICS já está superado no Brasil,

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como está superada a questão de quem deveria ser parte do BRICS. Os governos dos cinco BRICS se apropriaram da marca, que agora nos pertence. Isso foi definido com base não só em critérios eco-nômicos. Um outro requisito essencial seria a predisposição para apresentar visões alternativas ao atual ordenamento global. Os pa-íses do BRICS têm essa capacidade. Talvez em diferentes graus, mas todos priorizam essa ambição.

Alguns críticos querem submeter os BRICS a um teste impos-sível, ao dizerem que o grupo só seria realmente relevante se pu-desse coordenar todas as posições em todas as esferas da agenda mundial, do Conselho de Segurança à reforma de Bretton Woods, sobre o que fazer para superar a crise global, os entraves na OMC e a instabilidade no Oriente Médio. Nesse teste nenhum agrupa-mento, nenhuma organização multilateral passa. Nem a União Eu-ropeia, nem a OTAN, nem o Conselho de Segurança sairiam apro-vados desse teste.

Na minha apresentação, tentarei transmitir minhas impres-sões sobre a experiência do Ministério da Fazenda na negociação de posições com os outros membros do BRICS. Procurarei relatar como o BRICS vem operando desde o começo da crise, principal-mente na área financeira, no G20 e na questão da reforma das ins-tituições de Bretton Woods.

Desde Ecaterimburgo, a agenda econômico-financeira do BRICS tem sido uma fértil catalisadora. Quase metade dos pará-grafos operativos da Declaração de Ecaterimburgo dizia respeito às questões financeiras, às crises e às maneiras de combater a crise. Se formos ver hoje, três anos depois, quase tudo que o BRICS pe-dia em Ecaterimburgo nessa parte financeira foi atendido. A con-solidação do G20 como órgão de decisão econômico-financeiro é um dos principais objetivos atingidos. O BRICS vem tendo sucesso nas suas tentativas de imprimir maior transparência nos processos

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decisórios, com ênfase na regulação financeira. Isso foi incorpora-do à agenda do G20.

Depois de Ecaterimburgo, a interação em nichos de finanças tem sido muito intensa, o que deve ser atribuído em parte ao sucesso do BRICS na agenda econômico-financeira global. Além das duas reu-niões dos líderes do BRICS à margem de reuniões de cúpula do G20, como ocorreu em Los Cabos, em junho de 2012, houve mais onze reuniões dos Ministros de Finanças do BRICS nos últimos três anos. São mais frequentes do que reunião de condomínio. Em cada uma dessas reuniões há todo um processo de coordenação em níveis técni-cos, onde os temas são trabalhados, e onde se começa a coordenação.

Assim, o G20 se tornou o lugar mais visível de coordenação do BRICS. Nesse foro, como diz a própria Declaração de Ecaterimburgo, o BRICS tem um grande potencial para ação conjunta. Destrinchan-do um pouco os principais temas do G20, na parte de coordenação macroeconômica, que é conhecida como framework, nós temos dois debates importantes: um versa sobre a correção dos desequilíbrios globais e o outro focaliza a questão dos estímulos versus consoli-dação fiscal como estratégia para combater a crise. Nesse segundo ponto, o BRICS tem logrado uma grande coordenação e, a meu ver, não se trata de um ponto menor. Ter um foro como o G20, em que o BRICS, em conjunto, mas também seus integrantes individualmen-te, pode apresentar sua visão de como deveria ser o mundo, é muito importante. Isso influencia ou, pelo menos, matiza posições que an-tigamente vinham prontas de fora. Antigamente, o G7 se reunia e dizia como a economia global deveria se ordenar, aos demais países restava se adaptar ou confrontar, na base do “eu rejeito tudo isso”. Agora, não. Agora colocamos a semente do nosso pensamento no início de um processo de formação de consensos.

A visão dos países emergentes agora é levada em consideração antes de se tomar uma decisão. Por exemplo, no caso do debate sobre

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consolidação fiscal ou estímulos, os BRICS atuaram em contraposi-ção ao que os europeus estavam pensando. O debate foi muito im-portante. Em 2010, achou-se que a crise estava basicamente supera-da, mas em seguida veio o risco de um estouro da boiada. O BRICS contribuiu para matizar isso, o que lhe dá ainda mais credibilidade agora com o recrudescimento da crise, com foco na Europa.

O BRICS tem uma posição comum bastante forte em relação à ideia do rebalancing, a estratégia do reequilíbrio. Os países mais avan-çados do G20, União Europeia e Estados Unidos, propunham que os países emergentes deveriam ser não só as locomotivas, mas também deveriam compensar a falta de demanda, a falta de dinamismo dos países avançados. Desde o começo, o BRICS disse que isso não seria viável, todos os países têm que crescer juntos. Esta posição comum reforça outra posição comum importante do BRICS no G20, que é a ideia de que outros países em desenvolvimento, países extra-G20, têm um papel importantíssimo para a demanda global, e sendo as-sim as iniciativas para o desenvolvimento dos países não membros do G20 podem combater os principais fatores de debilidade na eco-nomia global, que se encontram, no entender do BRICS, no lado da falta de demanda. O BRICS defende a criação de demanda boa, em países que precisam de demanda. Isso foi transportado para o grupo de trabalho de desenvolvimento, que está no trilho dos sherpas.

Na questão dos desequilíbrios, há pontos de menor comple-mentaridade na posição do BRICS, que não chegam, porém, a im-pedir uma coordenação mais ampla entre os membros. O ponto em evidência é a responsabilidade dos países superavitários no G20. Os Estados Unidos apontaram o dedo para a China, mas os países supe-ravitários do G20 incluem a China, o Japão, a Alemanha e a Coreia do Sul. Qual seria então a responsabilidade desses países no reequi-líbrio global? Durante um certo tempo, o foco dos países desenvol-vidos, principalmente dos Estados Unidos, recaiu no câmbio chinês. O BRICS não atuou de maneira a defender a China; houve uma certa

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diferença de posições, que foi, contudo, acomodada no diálogo entre os BRICS. O Brasil defende um câmbio flexível para todos os países, mas ao mesmo tempo diz que é irrealista esperar que a China, os BRICS, ou os países emergentes carreguem sozinhos a economia glo-bal, principalmente se os países europeus não conseguirem sair da crise e apresentar crescimento. Ou seja, mesmo nos casos em que as posições econômicas não são exatamente as mesmas, o BRICS vem atuando com racionalidade, contribuindo para o debate.

O BRICS é uma plataforma dentro do G20 e os dois juntos influenciam outros foros. Há uma legitimidade complementada, pois se o BRICS já é importante no G20, que é um foro criado para cuidar das respostas à crise global, como se explica que países tão importantes não tenham um peso relevante no FMI e no Banco Mundial? A partir do G20, o BRICS tem lutado muito e sua iden-tidade é reconhecida e respeitada. Quando estávamos discutindo, em Pittsburgh, os caminhos da reforma das instituições de Bretton Woods, houve uma pausa e, nos bastidores, reuniram-se numa sala os países europeus e noutra o BRICS, enquanto os delegados dos Estados Unidos ficavam de correio entre os dois, negociando po-sições. De um lado o BRICS, do outro os europeus e os Estados Unidos tentando fazer o meio de campo. Ou seja, o BRICS tem uma identidade, uma diferenciação no interior do G20 que é reconheci-da pelos europeus e pelos americanos.

A partir do G20 e da maior interação entre Chefes de Governo, Ministros e técnicos dos cinco governos, o BRICS está começando a explorar outros aspectos da cooperação econômico-financeira. Para concretizar a iniciativa do Banco de Desenvolvimento, os cin-co precisarão negociar intramuros e chegar a um consenso sobre o papel que esse banco vai desempenhar. A discussão está ainda em uma fase preliminar, mas em alguns pontos já existe consenso, um dos quais é que não será um banco contra o sistema, mas sim ocupa-rá uma lacuna importante, pois há, atualmente, um esgotamento

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da capacidade de financiamento dos bancos e há também mais de uma interpretação sobre o papel dos bancos na economia mundial moderna.

No auge da crise houve uma recapitalização dos bancos mul-tilaterais. Os países avançados consideram que essa recapitaliza-ção foi mais do que suficiente. Os emergentes discordam. Entre os países em desenvolvimento, em geral, prevalece a percepção de esgotamento da capacidade de financiamento dos bancos regionais e multilaterais.

Quanto à visão do que os bancos devem fazer, recordo que o Banco Mundial parou de financiar a agricultura no começo da dé-cada e só voltou há pouco. Durante anos, obedecendo a uma deci-são dos seus principais acionistas, que eram os países avançados, o BIRD não financiou a agricultura na África, o que levou a uma crise na agricultura mundial.

Há outras idiossincrasias. Os bancos multilaterais, hoje em dia, dificilmente financiam uma hidrelétrica, porque ali se abraça a teoria de que a energia eólica é a energia do futuro. Um banco do BRICS poderia desenvolver as suas próprias idiossincrasias, mas sua atuação seria sempre produtiva caso se tornasse complemen-tar à de outros bancos multilaterais, e se complementasse inclusive os debates sobre as prioridades a atender.

Para mim, há um claro processo de desenvolvimento da agenda do BRICS. Começou com uma tentativa de coordena-ção de posições para solucionar uma emergência, passou, com o amadurecimento do G20, a uma exploração de posições e à defesa de interesses comuns, e agora evolui para uma fase de iniciativas concretas, negociadas intra-BRICS. Isso dando certo, talvez enco-raje o desenvolvimento do potencial em outras áreas também.

Paulo Nogueira Batista Júnior – Vou fazer algumas obser-vações baseadas na minha experiência direta na diretoria do FMI

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e como integrante de delegações brasileiras junto ao G20 nos úl-timos anos. Vou explicar brevemente qual é a posição do BRICS nessas duas instâncias.

Na diretoria do FMI, os quatro BRIC originais são todos ca-beças de cadeira. A Índia e o Brasil, desde a criação do Fundo, têm assentos permanentes na condição de líderes das chamadas contituencies, ao passo que a Rússia e a China têm cadeiras próprias, criadas mais recentemente, quando aderiram ao Fundo Monetário. Já a África do Sul faz parte de uma cadeira anglófona subsaariana, junto com muitos outros países, e gira lentamente no comando da diretoria. Nas articulações entre os BRICS no Fundo Monetário, a África do Sul é com frequência representada pelo diretor executivo dessa cadeira, que não é necessariamente um sul-africano. A África do Sul está sub-representada em termos de diretoria.

Como já foi dito aqui antes, há controvérsias sobre o real sig-nificado do BRICS. Os céticos sustentam que o agrupamento é artificial, mais emblema do que realidade política. Esses críticos apontam as enormes e óbvias diferenças históricas, culturais, polí-ticas e econômicas entre as cinco nações, e isso me lembra de uma história do historiador inglês A. J. P. Taylor, sobre um inglês, no século XIX, que ao ser informado da existência da girafa, respon-deu: there is no such animal!6 O BRICS é heterogêneo, sim, mas tem funcionado. Não vou negar que as dificuldades de coordenação do BRICS são consideráveis. Mas os avanços também foram conside-ráveis nos últimos anos.

Tenho vivenciado esse processo desde 2008, no âmbito do Fundo Monetário e do G20. O processo demanda uma intensa preparação, a coordenação e a articulação são trabalhosas. Quando cheguei a Washington e assumi, em abril de 2007, o cargo de Di-retor Executivo pelo Brasil e mais oito países, o BRICS não existia

6 Em português: “não existe esse animal!”.

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como realidade política. A sigla já tinha sido inventada, vocês sa-bem por quem, mas os BRICS não atuavam coordenadamente nem na diretoria do Fundo, nem no G20. A atuação conjunta do BRICS – na verdade, do BRIC, porque a África do Sul só se juntou ao grupo em 2011 – começou em 2008. Pouca gente sabe disso, mas a inicia-tiva foi da Rússia. Não é por acaso que a primeira cúpula do BRICS foi na Rússia, em 2009. A iniciativa foi bem recebida pelos outros essa iniciativa e o processo deslanchou.

Vou dizer a vocês, com clareza, que o BRICS tem altos e baixos, momentos de maior proximidade e de maior distância também, mas uma coisa é certa: tem sido a nossa principal aliança desde 2008 no FMI e também no G20. Ressalto que, para nós, a aliança com os BRICS no FMI é muito mais importante do que a aliança com os outros países latino-americanos. Não que o Brasil não quei-ra atuar juntamente com México e Argentina, os outros dois lati-no-americanos que têm cadeira no G20 e na Diretoria. Por razões diferentes, esses dois países não estão sempre disponíveis para ações conjuntas com o Brasil. A Argentina é mais próxima, muito mais, mas com menos eficácia, por motivos que não vou desenvol-ver aqui. O México, por outros motivos, piores, que também não vou desenvolver aqui. Numa reunião na Brookings Institution, em Washington, Aleksey Mozhin, que é o Diretor Executivo da Rússia no FMI há mais de vinte anos – ele é o equivalente ao que Kafka foi para o Brasil – avaliou que, nesses anos todos, a maior mudan-ça de governança no Fundo Monetário resultou da articulação dos BRICS. Eu também posso afirmar que nos meus cinco anos lá o BRICS tem sido a alavanca mais importante para o Diretor brasilei-ro nas discussões internas de vários temas estratégicos.

Os diretores do BRICS se reúnem constantemente. A articula-ção é mais fácil porque estamos todos no mesmo andar do edifício sede do Fundo Monetário. Para falar com os outros sherpas, Guido Mantega tem que marcar hora, porque a diferença de fuso horário

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é tremenda, tem que combinar com antecedência. No nosso caso, estamos permanentemente em contato no décimo terceiro andar do FMI. O fluxo de coordenação é trabalhoso, mas tem rendido frutos. Por exemplo, os Ministros de Finanças e os Presidentes de Banco Central do BRICS vêm tendo reuniões três vezes por ano, em média. Segundo as contas de Fernando Pimentel, foram onze reuniões desde 2008, onze encontros de Ministros de Finanças e Presidentes de Banco Central do BRICS. Além disso, eles se falam com frequência, ao longo do ano, por telefone. Fernando contou o que aconteceu em Pittsburgh, na Cúpula do G20; a cena foi de fato marcante, o BRICS de um lado, os europeus de outro e os america-nos fazendo a ponte, de uma sala para outra. O reconhecimento do BRICS como instância é notável. Por exemplo, o Secretário do Te-souro americano, Tim Geithner, pediu duas vezes para comparecer como convidado a uma reunião ministerial do BRICS. Eu me lem-bro que a primeira vez em que isso aconteceu, um dos assessores brasileiros me telefonou com a voz trêmula, dizendo “o Geithner pediu para comparecer...”. Causou impacto naquela época, mas hoje esse tipo de pedido já é considerado uma coisa comum.

Para vocês terem uma ideia de como é intenso o contato en-tre os BRICS, nos últimos sete meses os líderes dos cinco países se reuniram nada menos que três vezes: uma em Cairns, sob coorde-nação da Presidente brasileira; outra na Cúpula de Nova Delhi e a terceira vez em Los Cabos, à margem da Cúpula do G20, sob coor-denação do Primeiro-Ministro da Índia.

O que os BRICS têm em comum? As diferenças são tão gran-des? Na minha opinião, o Professor Lukyanov botou o dedo na fe-rida: eles têm em comum o fato de serem nações com capacidade de atuar de forma autônoma. São países de grande dimensão eco-nômica, geográfica e populacional e podem, sem adotar necessaria-mente uma atitude de confrontação, agir com autonomia em relação às potências tradicionais do Atlântico Norte, os Estados Unidos e a

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Europa Ocidental. Isso vale, sobretudo, para os quatro integrantes originais, mas crescentemente também para a África do Sul. A capa-cidade de agir de forma independente é ingrediente crucial. A grande maioria dos países de mercado emergente e em desenvolvimento, mesmo os de um certo porte, não têm essa capacidade. Em muitos casos, o que se vê ainda é uma relação de estreita dependência e ali-nhamento mais ou menos automático seja com os Estados Unidos, seja com os principais países da Europa Ocidental.

Só para tornar um pouco mais concreta a minha apresenta-ção, mencionarei um exemplo mais recente dos resultados da co-ordenação do BRICS. Em junho passado, antes da cúpula do G20, os cinco líderes estavam em Los Cabos. Da reunião, coordenada pelo Primeiro-Ministro Singhe com a participação dos Presidentes da Rússia, da China, da África do Sul e da Presidente brasileira, resultou um comunicado curto. Mas aquela reunião foi antecedida por muitos debates entre os cinco Diretores no FMI, por telefone e por e-mail. Houve uma preparação intensa que pavimentou o ca-minho para o diálogo entre os cinco líderes em Los Cabos.

Duas decisões anunciadas nessa curta declaração me parece-ram particularmente significativas: a primeira foi a decisão – to-mada nessa reunião e não antes – de anunciar uma contribuição adicional ao financiamento do Fundo Monetário. A China entrou com U$ 43 bilhões, o Brasil, a Rússia e a Índia com US$ 10 bilhões e a África do Sul com US$ 2 bilhões. Na rodada anterior de levan-tamento de recursos profundos, em 2009, o BRICS entrou com US$ 92 bilhões: a China com US$ 50 bilhões e Brasil, Rússia e Ín-dia com US$ 14 bilhões cada um. Esse total ficou condicionado ao entendimento de que as reformas de 2010, que foram menciona-das pela professora Siridopoulos, serão implementadas conforme combinado no âmbito do G20. Um segundo compromisso é que esses recursos formarão uma segunda linha de defesa do Fundo

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Monetário e só serão utilizados quando os recursos atualmente existentes estiverem esgotados ou utilizados muito intensamente.

Mas o segundo assunto foi, no meu entender, a novidade da reu-nião de Los Cabos. Os líderes decidiram iniciar um processo de discus-são conjunta sobre a formação de uma rede de swaps e de um fundo de reservas comum entre os BRICS. Essa decisão quer dizer o seguinte: os líderes pediram que os Ministros de Finanças e os Presidentes de Ban-cos Centrais trabalhem nesse tema e tragam os resultados para a pró-xima cúpula no BRICS, na África do Sul, em março de 2013. Estamos formando um grupo de trabalho técnico, com a co-chairmanship do Brasil e de um outro país ainda não definido, provavelmente a China.

Alguns meses antes, na cúpula de Nova Delhi, o BRICS anun-ciara o Banco de Desenvolvimento. A esse banco deverá juntar-se o fundo de reservas. O fundo vem a ser uma decisão de nature-za preventiva, que cria mecanismos de solidariedade financeira entre os cinco. Somadas, as reservas dos cinco países chegam a US$ 4,5 trilhões, uma base mais do que suficiente para respaldar iniciativas desse tipo. Quando vier a ser constituído, o fundo será acionado por qualquer país que tenha, eventualmente, dificulda-des de financiamento. Poderá ser um fundo virtual, no sentido de que as reservas continuariam nos Bancos Centrais dos BRICS e só seriam disponibilizadas ao surgir uma necessidade concreta. Isso teria a grande vantagem de dispensar a criação de uma nova buro-cracia. Como a posição dos cinco BRICS é sólida, esse mecanismo dificilmente seria acionado na prática, mas a sua existência propor-ciona um reforço de confiança que pode ser importante.

A disposição de formalizar o início de uma discussão conjunta sobre a criação de um banco de desenvolvimento e de um fundo de reservas sinaliza o estreitamento dos laços entre os cinco países. O Banco do BRICS funcionará como uma espécie de banco pluri-lateral, como o Banco Mundial. O fundo de reserva do BRICS será

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semelhante ao Fundo Monetário, só que em nível plurilateral. Se vier a se concretizar, criará um caminho próprio, fora das institui-ções de Bretton Woods, que estarão sob pressão para se adequarem à realidade do mundo contemporâneo.

Para finalizar, eu queria dizer que, na minha opinião, o Mi-nistro Patriota acertou na mosca ao comparar a atual coordenação com o BRICS à aproximação com os Estados Unidos conduzida, no início do século XX, pelo Barão do Rio Branco. Para orientação de nossos convidados estrangeiros, o Barão do Rio Branco foi um no-tável Ministro das Relações Exteriores, de 1902 a 1912, e ficou na história como o patrono da diplomacia do Brasil. Disse o Ministro Patriota numa conferência, há algum tempo, que o grande legado do Barão foi sua capacidade de apreender as mudanças. Na época em que o dinamismo econômico e o eixo do poder migravam da Eu-ropa Ocidental para os Estados Unidos, teve o Barão do Rio Branco a capacidade de estabelecer uma relação boa e forte com os Estados Unidos. Hoje, a capacidade brasileira de enxergar o futuro é mos-trada pela nossa coordenação com os amigos do BRICS.

Embaixador Ronaldo Sardenberg – Esta é a primeira vez que falo num evento público a respeito do BRICS. Falo por mim mesmo. Embora seja embaixador, estou aposentado e não recebi qualquer tipo de instrução do Ministério das Relações Exteriores sobre o que dizer.

Vou especular sobre o lado político do BRICS, embora seja difí-cil diferenciar entre política e economia nesse assunto. Para pensar de maneira abrangente o que deve ser feito pelo BRICS no futuro, temos primeiro que avaliar a contribuição do BRICS no momento imediato, que se caracteriza por essas várias crises que aparecem e às vezes desaparecem. Olhando adiante, podemos afastar, por absurdas, tanto as predições de que o BRICS irá buscar a hegemo-nia mundial, quanto as de que se tornará meramente irrelevante.

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As hipóteses extremas são muito improváveis. Entretanto, é possí-vel que a criação do BRICS aumente a probabilidade de uma ordem internacional voltada para a multilateralização e até para a multi-polaridade, que são, naturalmente, duas coisas distintas.

A multipolaridade é um daqueles temas que aparecem na nossa vida em determinada fase, desparecem e depois reaparecem misteriosamente. No caso, a multipolaridade era originalmente uma posição da Iugoslávia. Vou dar três exemplos curtos de como o mundo muda. Por exemplo, na época pré-crise, estimava-se que a China alcançaria o PIB dos Estados Unidos em cinquenta anos. Hoje em dia já dizem que vinte anos devem ser suficientes.

Outro exemplo. Nem sequer se especulava, há alguns anos, que o PIB do Brasil viesse a ultrapassar, em curto prazo, o do Reino Unido, ou que pudesse alcançar até mesmo, dentro de alguns anos, o PIB da França. Evoluções rápidas nesse particular terão um im-pacto certeiro no campo político-estratégico. Quando coordenei, em 1996, no governo Fernando Henrique Cardoso, o projeto “Bra-sil 2020”, havia um cenário, dado como extremamente otimista, de que o Brasil poderia chegar àquele ano como um país “desenvol-vido”, com todos os matizes que se possam imaginar. Nos últimos anos, os desenvolvimentos do quadro da crise tornam crível a ideia de que é possível acelerar relativamente o crescimento do Brasil.

Entre 2009 e 2012, o BRICS mudou de patamar. Ele se forta-leceu graças ao mecanismo das cúpulas. Na diplomacia contempo-rânea, o que dá o tom são as reuniões de cúpula. Quando ocorrem quatro cúpulas seguidas num período de quatro anos, sai todo mun-do correndo e começa-se a trabalhar para valer. Até 2009, o BRICS era uma fantasia de Jim O’Neill, que apenas ensaiou a ideia, vinda de um ponto fora da curva. Nenhum dos BRICS teria coragem de pro-por o BRICS. Como O’Neill estava defendendo interesses comerciais, do ponto de vista do capitalismo, ele deu-se ao luxo de fantasiar. Mas isso foi em outra época, foi antes mesmo dos eventos terroristas em

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Nova York. O’Neill se concentrou nos fundamentos e vantagens eco-nômicas desse grupo, mas a sua ideia acabou tendo uma repercussão muito maior quando veio a crise econômica de 2008 e se descobriu que o BRICS poderia ser um instrumento importante, primeiramen-te do ponto de vista econômico e depois do ponto de vista político. O que O’Neill disse em 2001 não tem nada mais a ver com o BRICS de hoje. O que ele disse ficou no passado remoto do BRICS.

A adesão da África do Sul provocou uma onda de críticas, in-clusive do próprio O’Neill. Mas concluí, após pesquisar o assunto, que a maioria foi favorável à iniciativa. Um artigo de Ian Bremmer, do Eurasia Group, apresenta uma série muito interessante de dados para justificar o argumento de que a África está mudando. Mencio-na que a população africana está em 1 bilhão de habitantes, simi-lar à da Índia em número, sendo que os africanos tendem a gastar mais em bens de serviço. Constata que a porcentagem de africanos urbanizados hoje é igual à de chineses urbanizados. Calcula que no fim deste ano haja 735 milhões de telefones na África e diz que o investimento estrangeiro direto total no continente cresceu de US$ 9,4 bilhões, em 2000, para mais de US$ 60 bilhões, em 2011. O mais importante é que a absorção da África do Sul no BRICS veio a confirmar os fundamentos políticos do grupo e evitou que ex-potências coloniais explorassem a ausência de uma representa-ção africana como evidência de desprezo por parte dos países do grupo em relação aos africanos.

Vários aspectos do BRICS complicam as análises. O BRICS realmente é diferente dos demais grupos. Dois países asiáticos, um que é simultaneamente europeu e asiático, um africano e um sul-americano. A rapidez com que as coisas andaram, depois de 2009, é realmente surpreendente, e demonstra que nossos gover-nos são capazes de responder a uma situação de crise com medidas inovadoras, inteligentes e úteis. No plano econômico, já havia a tradição de negociações econômicas entre países do Sul e do Norte,

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mas de toda maneira o BRICS adicionou um instrumento negocia-dor importante, até porque, como foi dito aqui, os cinco se alçaram à categoria de países emergentes especiais.

Na parte política há, na relação do BRICS com o sistema de segurança coletiva das Nações Unidas, a originalidade de três dos seus membros não se colocarem a abrigo do Conselho de Seguran-ça, enquanto dois são membros permanentes. Para o Brasil, a atua-ção do BRICS configura um novo e original veículo para a execução de alguns objetivos da política externa, inclusive a do encaminha-mento do pleito para ocupar um assento permanente no Conselho. Em entrevista recente em Adis Abeba – o fato de ter sido em Adis Abeba já mostra uma mudança muito importante – o Chanceler Patriota explicou com exatidão que esse pleito do Brasil está vin-culado à meta de fazer com que o Conselho seja mais transparente e responsável, menos tendente à adoção de medidas coercitivas e mais disposto a exaurir as possibilidades que se oferecem à diplomacia e à negociação. Em suma, mais disposto ao diálogo e oposto a uma das tendências atuais do Conselho, que é a de deixar de lado as técnicas de soluções de controvérsias.

O futuro do BRICS depende da evolução de seus membros. O desempenho econômico atual de cada membro gera efeitos para a atuação externa do país e do grupo. A economia e a política se interpenetram. No caso do Brasil, se a posição econômica brasileira se deteriorar, a execução da política externa esbarrará em percep-ções de falta de credibilidade.

A minha impressão, olhando para o futuro, é de que a crise eco-nômica proporciona uma espécie de interregno na ordem mundial, um intervalo inesperado. Esse intervalo, que pode se estender por mais dez anos, providencia uma janela de oportunidade para o BRICS se estabelecer na ordem internacional. Nessa fase, o BRICS só tem a ganhar se se consolidar como um grupo que favorece a mudança pacífica da ordem internacional, favorece a negociação.

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Até hoje, não há nenhuma instância, em nenhum momento, de destempero por parte do BRICS.

Seria um tanto prematuro prever se o BRICS será politica-mente conservador ou progressista, até porque os parágrafos po-líticos realmente relevantes são os da última reunião de cúpula, e são ainda poucos e imprecisos. A imprecisão é parte do processo. Não poderíamos esperar que o BRICS saltasse da não existência para, quatro anos depois, tornar-se absolutamente preciso em suas posições sobre assuntos de alta complexidade.

A coordenação do BRICS vai precisar de realismo nas projeções. A iniciativa de tratar questões estatísticas é muito bem pensada, nós efetivamente precisaremos de elementos estatísticos para planejar projetos conjuntos. Outro desafio importante é a questão da seleti-vidade. É preciso evitar a tendência de grupos informais e de muitos subcomitês. De repente, descobre-se que não há nos órgãos governa-mentais tripulação adequada para tantos grupos de trabalho.

Deixo a sugestão de que, no início do ano que vem, antes da cúpula na África do Sul, aproveitemos aqui no Brasil para ampliar a base de apoio ao BRICS. Se compararmos com outras iniciativas que o Brasil tomou através de sua história e que foram objeto de um grande bombardeio por parte da mídia e da comunidade econô-mica brasileiras, a margem de apoio ao BRICS já é, a meu ver, bem considerável. Hoje, o bombardeio vem de fora. The New York Times publicou, em maio, seis artigos num só dia sobre o BRICS, cinco contra (o sexto não era contra, mas o autor era brasileiro). Mes-mo assim, ou por isso mesmo, deveríamos divulgar mais nossos objetivos com o BRICS, dar continuidade a esta boa iniciativa da Funag e realizar mais reuniões com jovens e com outros grupos da sociedade. Por exemplo, podíamos pedir uma audiência, provavel-mente com o Senador Collor, que preside a Comissão de Relações Exteriores do Senado, e pedir o apoio dele. O apoio pode demorar

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um pouco, porque está muito agitada a vida no Senado, mas pode-ríamos conseguir uma audiência pública no Congresso, de maneira a mobilizar o setor político e a mídia também. É bom fazer eventos com jornalistas e com outros formadores de opinião, enfim, conti-nuar e aumentar o que a Funag começou a fazer.

Mas antes de terminar, eu não queria deixar de mencionar que o debate sobre política externa no Brasil está se tornando mais in-teressante. Se você pegar livros editados até poucos anos atrás, verá apenas elocubrações sobre assuntos econômicos, nenhum articulis-ta entrava no tema político. Agora, nesse e noutros livros editados pela Funag já há um equilíbrio, e isso sugere que hoje em dia já está se entendendo que a abrangência do fenômeno é muito maior.

Rezkallah Tuma – Sou membro do Conselho de Comércio Exte-rior, presidido pelo Embaixador Barbosa. Estive numa reunião em Brasília, na semana retrasada, a convite do Ministro Patriota, que reuniu representantes das comunidades árabes e judaicas. Embora não seja pertinente a este debate específico, eu não posso deixar de dizer que achei a iniciativa formidável, porque o Presidente do Conselho das Entidades Árabes da América Latina e o Presidente da Confederação Brasileira Judaica já tinham examinado a hipó-tese de criarmos uma reunião conjunta, na América do Sul, das comunidades árabes e judaicas, mostrando aos países árabes e a Israel que se as comunidades podem conviver fraternal e amigavel-mente, como se vive no Brasil, também lá eles poderão conviver. Aproveito a deixa para ver com o Embaixador Barbosa se nós não podemos ter, aqui na FIESP, uma reunião das lideranças de todas as comunidades árabes e judaicas no mundo. O Brasil ocupa uma posição de vanguarda de imigração. No Brasil, as fronteiras foram definidas há mais de um século, a imigração árabe e judaica têm mais de um século e as famílias, na terceira e quarta geração, sen-tem que do Brasil deve partir o exemplo, que nós devemos ter uma

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política internacional mais agressiva. Eu nem ia tocar no assunto, mas o Ministro Patriota foi mencionado e eu fiquei pensando que o Brasil poderia liderar a discussão desse assunto no BRICS e em todos os foros mundiais possíveis.

Eliane Cantanhêde – Sou jornalista, economista, escrevo para a Folha de S. Paulo e também trabalho na Globo News. Quando o BRICS foi criado, a conotação era profundamente econômico-comercial. Mas o Embaixador Sardenberg, com toda sua sabedoria, diz que hoje não se pode falar em diferenciação entre economia e política, porque na verdade tudo se pode traduzir em poder e interesses. Sendo as-sim, os observadores especulam sobre os interesses que juntam os cinco países. A Rússia precisa voltar à superfície, mas a China e a Ín-dia estão de acordo? Já o Brasil, apesar de todas essas potencialida-des que comemoramos, poderá ter um papel de liderança no mundo carregando nas costas o Paraguai, Uruguai, a Argentina de Cristina Kirchner e a Venezuela de Hugo Chávez? Vamos ter condições de li-derar esse time? E se não formos os líderes regionais, teremos cacife para jogar nos tabuleiros internacionais?

O que desequilibra o BRICS? A China. Aí vem a minha pergun-ta – por vício jornalístico o meu negócio é pergunta e não certeza. O centro do BRICS é a China e o interesse da China no BRICS pare-ce claro. A China tem uma política comercial agressiva, ela já está ameaçando o Mercosul, com suas empresas e seus preços baixos, e está comprando terras na África e na América Latina, na Amé-rica do Sul, sobretudo, para se abastecer de recursos naturais que lá são escassos. A China, tradicionalmente, historicamente, não tinha poder político, nunca teve voz política, era um país isolado, até pelo seu regime político interno, que para nós outros aqui é su-percomplicado de entender. O BRICS aproxima a China de recursos naturais de que ela precisa e aumenta o tom de voz que ela pode usar em reuniões internacionais, por isso interessa aos chineses.

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Hoje é do interesse de todos os BRICS ter uma voz conjunta no G20, na OMC, no Banco Mundial, no FMI, na ONU. Mas daqui a dez anos, quando a China já tiver consolidado o seu papel de lí-der mundial, não só comercial e econômico, como vai ser? Ontem, vimos pela televisão que os Estados Unidos, que sempre ganharam todas as Olimpíadas, eram os campeões de medalhas, cederam o primeiro lugar para a China. A China, que era agressiva na área comercial, agora tem uma política agressiva de poder político no mundo todo, sendo que nós não sabemos o que o regime chinês pretende fazer, uma vez obtida a preeminência política no mundo.

Minha pergunta é: o BRICS será uma escada, uma parte da estratégia da China para atingir o poder mundial? Estaremos fa-zendo a transposição de um mundo unipolar dos Estados Unidos para a China? Deixo a provocação.

Embaixador Luís Augusto Castro Neves – É um privilégio estar aqui com vocês. No momento presido o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), no Rio de Janeiro.

Assistindo às excelentes palestras até aqui, verifiquei que há uma percepção generalizada de que a função essencial do BRICS tem sido a de grupo de pressão para se obter mais voz e poder em questões internacionais, o que não quer dizer que atuare-mos em uníssono no dia em que tivermos esse poder e essa voz. No caso do Brasil, por exemplo, que tem tradição de vocalizar seu empenho em obter maior participação nas negociações internacio-nais, alguns têm até mesmo o temor de que, no dia em que tiver-mos essa voz, não saberemos o que dizer.

Um tema que não foi muito coberto aqui foi o papel dos Es-tados Unidos em um mundo pós-Guerra Fria. Uma intenção não explícita do BRICS, implícita nas suas ações, é servir como agente de uma espécie de soft balancing em relação aos Estados Unidos. Na verdade, o BRICS é uma arregimentação de potências emergentes,

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ou de países com um certo peso internacional, que buscam se livrar da liderança americana, embora reconheçam nos Estados Unidos o ponto central das suas relações internacionais.

Paulo Nogueira Batista Jr. mencionou aqui algo também muito importante, que é a existência de uma série de países importantes, do ponto de vista econômico e político, que não participam, nem ja-mais se cogitou de sua participação no BRICS, porque são países que têm alianças com os Estados Unidos. É o caso do Japão, da Coreia do Sul, da Austrália, países que poderiam até formar uma plataforma de potências médias importantes, mas estão mais vinculados à lide-rança dos Estados Unidos, sobretudo desde o final da Guerra Fria.

Nesse sentido, vale a pena examinar o BRICS como esfor-ço de soft balancing da influência americana. O que devem fazer para consolidar, ou melhor, para apressar a multipolaridade a que Ronaldo Sardenberg aludiu.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Essa questão foi estudada por Andrew Hurrell, que destacou a importância que os países soft balancers dedicam às instituições internacionais. O trabalho de Gelson Fonseca, no primeiro seminário, mencionava o curioso insight de Hurrell, com a imagem de Gulliver acorrentado por várias cordas, ou por várias regras de organismos internacio-nais, arguidas por países como Brasil, Índia e China, para forçar mudanças na OMC ou para impedir no CSNU o uso da força pelos EUA. Mas não deixa de ser pertinente questionar neste debate se, dentro de alguns anos, o Gulliver será sempre os EUA ou, como sugeriu Eliane, se será a China.

Um outro ponto importante, já que os assuntos diplomá-ticos de hoje se tornam cada vez mais complexos, é a menção a problemas regionais nas discussões sobre o BRICS. Um trabalho da professora Lenina Pomeranz, incluído no livro já mencionado sobre a primeira mesa-redonda que organizamos sobre o BRICS,

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avaliava que todos os integrantes do grupo, exceto o Brasil, têm nas suas regiões um ponto fulcral de sua atuação internacional. O modelo desenvolvido pela China nas cadeias produtivas asiáticas é um outro tema que, no meu entender, seria útil incluir nos nossos debates entre o governo, a academia e o empresariado nacional.

São observações que faço en passant, antes de passar a palavra ao Embaixador Affonso Ouro-Preto e, em seguida, a quem mais quiser fazer uso dela.

Embaixador Affonso Ouro-Preto – Tendo a dar mais im-portância ao ângulo político do BRICS. No curso da minha carreira, tive a satisfação de servir cinco anos na China. Não pretendo ser um conhecedor profundo da China, mas tenho um grande interes-se pelo tema, tanto que hoje presido uma instituição chamada Ins-tituto Brasil-China, ou IBRACH, uma empresa sem fins lucrativos, destinada a estreitar as relações entre o Brasil e a China.

Saber o que será a política chinesa no futuro constitui, eviden-temente, um exercício de futurologia. No entanto, eu não classifi-caria a política chinesa, quer no plano econômico, quer no político, como agressiva. No plano econômico, a China tem defendido seus interesses. Para conseguir o desenvolvimento econômico que vem alcançando desde o final dos anos 70, a China precisou e precisa ainda de produtos de base e de commodities. A China dispõe apenas de 9% de território apto para agricultura, não possui reservas mi-nerais em grande escala, por isso a procura de minérios e de com-modities é uma questão de vida ou de morte para um país tão ex-tenso e com uma população tão grande. Sem um comércio intenso de commodities, teria sido totalmente impossível a expansão eco-nômica chinesa. Expansão esta que nos beneficiou bastante, a nós, Brasil, e a outros países em desenvolvimento.

Mais do que agressividade, eu diria que houve muita compe-tência da China na defesa dos seus interesses.

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Do ponto de vista político, a maioria dos sinólogos norte-ame-ricanos, por exemplo, não identifica propósitos imperiais, visando a uma liderança mundial, por parte da China. Há poucos meses foi traduzido e lançado aqui no Brasil, um livro de Henry Kissinger, cujo título em inglês é On China7, em que ele fala da China em termos extremamente favoráveis, sem expressar preocupação com qual-quer forma de imperialismo ou de agressividade política por parte dos chineses. Kissinger não é o único grande intelectual americano ou europeu a expressar essa opinião. A China não tem a tradição de construir impérios ultramarinos. Não vou entrar em questões da história da China porque poderia durar muito. Mas sublinho que a tradição chinesa não é a de constituir impérios além-mar. A política externa chinesa não está impregnada de qualquer ideologia. A China visa apenas garantir seu desenvolvimento econômico.

Não creio que se possa falar de uma corrida da China para as-sumir uma liderança mundial, tal como existiu certamente na época da Guerra Fria. Não há hoje uma Guerra Fria envolvendo a China.

Era só isso que eu queria dizer. Obrigado.

Fyodor Lukyanov – Obrigado por me dar a palavra, Embaixa-dor. Gostaria de fazer um comentário que me parece necessário. Mesmo que a China continue fazendo grandes esforços para de-monstrar que não é agressiva e não está interessada em expansão territorial ou em hegemonias – e esse tipo de afirmação os chineses fazem a toda hora –, o fato é que, pelo seu próprio tamanho, o país está envolvido numa série de questões regionais que já começam a vir à tona e com mais força deverão emergir, mais e mais, e que num futuro não tão distante causarão tensões crescentes entre chineses e norte-americanos. Isso é absolutamente inevitável. Posso estar sendo rude, mas estou convencido de que o aumento de tensões entre os dois países é inevitável.

7 Kissinger, Henry. Sobre a China. Tradução de Cássio de Arantes Leite. Editora Objetiva. 2011

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Sei que há intelectuais nos Estados Unidos que aconselham moderação a Washington no trato com a China, mas não concordo que seja a maioria. A maioria está preocupada, se não assustada. Os mais recentes pronunciamentos de Obama e Hillary Clinton demonstram que eles já se decidiram a favor de uma política de containment. Será, naturalmente, um containment diferente daque-le aplicado à União Soviética, mas a ideia central será a de conten-ção dentro de certos limites.

Receio que a China não esteja preparada para isso. A China parece acreditar ainda ser possível construir um relacionamento pragmático com os EUA, baseado na aceitação de uma interdepen-dência global. Essa falha de percepção pode contribuir para que, num dado momento, a constatação da interdependência inalcan-çável descambe para a confrontação. Um tal desenvolvimento não é de forma nenhuma improvável, infelizmente.

Para o BRICS, esse cenário tende a se transformar num gran-de desafio, porque quanto maior a contenção americana de inicia-tivas chinesas, maior a pressão dos EUA para engajar os demais parceiros, em particular a Índia, e a Rússia também, antes dos de-mais, no processo de limitação da margem de manobra da China. Alguém poderá dizer que isso abrirá oportunidades para o BRICS. Pode ser, e não vou dizer que o cenário é necessariamente bom ou ruim. Só digo que é necessário estar preparado para ele, porque a probabilidade é muito grande, é um desses facts of life.

Professor Varun Sahni – Também quero reagir à questão do futuro da China. O que acontece é que se você se relaciona de alguma forma com a Ásia, a questão chinesa se torna um tema incontorná-vel nas suas relações internacionais. Não há opção. Isso vale para todos os países da Ásia. Nenhum dos BRICS pode prever o futuro, mas é inevitável que a China vai se tornar o tema mais importante da política externa dos países-membros. No caso da Índia, é preciso

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entender que o Governo indiano não vai fazer uma oposição em al-tos brados, mas desde já está claro que, num determinado momento, vai ser preciso escolher entre Washington e Beijing.

A Índia já inventou um bom sistema para lidar com essas es-colhas, que é a chamada política de não alinhamento. A Índia já fez essa escolha uma vez e fará tudo igual outra vez. Não é impossível imaginar que a solução indiana para um aumento de tensões no Pacífico seja tentar um acordo de segurança coletiva nos moldes, por exemplo, do processo de Helsinki, com algumas variações. Pode funcionar ou não.

Há um outro ponto que eu gostaria de reiterar. A categoria BRICS foi criada pelo Goldman Sachs para um objetivo específico, e aquele propósito não pode transmutar para a esfera política como num passe de mágica. Talvez com o tempo tudo se ajeite, mas o tema exige uma detida avaliação de algumas questões fundamen-tais. Por que não agregar outros países? Por que não a Indonésia? Por que não a Turquia?

Há questões que demandam análise em profundidade. Posso entender que a discussão de hoje escolheu a orientação pragmá-tica de que o BRICS existe e precisa ser encarado como um dado da realidade. É uma escolha perfeitamente válida, sobretudo para quem trabalha com assuntos do Estado. Mas da perspectiva analí-tica, várias perguntas ainda podem ser feitas. Por exemplo, se são possíveis outras configurações futuras. Do ponto de vista indiano, uma outra configuração já existe e é chamada IBAS. Esta faz mais sentido, sempre da ótica indiana.

Mencionou-se aqui que o fato de se reunirem os Chefes de Governo todos os anos demonstra que o BRICS não tem volta. Trata-se de um fato importante, sem dúvida, mas me parece que logo se terá de fazer uma escolha, porque não sei se será possível para a Presidente brasileira participar todo ano de duas cúpulas

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com o Primeiro-Ministro indiano e o Presidente sul-africano, ou ela vai à do BRICS, ou à do IBAS. A escolha terá de ser feita cedo ou tarde entre um e outro e, como eu disse, o IBAS faz mais sen-tido. Muito obrigado.

Professor Antonio Jorge Ramalho – Sou professor da Uni-versidade de Brasília, agora assessorando o Ministro da Defesa. Agradeço muitíssimo pelo convite e felicito a Funag pela organização do evento e pela escolha dos palestrantes. Estou aprendendo muito.

Paulo Nogueira Batista Jr. interpretou as propostas do banco e do fundo como uma provocação e um empurrão no sentido da transformação mais profunda das instituições de Bretton Woods. Mas as propostas podem ser vistas também como uma alternativa. Ou seja, todos os países têm interesse na reforma do Banco Mun-dial e do FMI, para torná-los mais representativos, mas aquelas iniciativas podem também esvaziar essas instituições. Pergunto se os senhores enxergam esse risco ou não.

Uma ameaça comum a esses países são as agendas internas. As disparidades, o hiato enorme entre as expectativas das popu-lações e as possibilidades de respostas de seus respectivos gover-nos é a grande ameaça. No Brasil, talvez isso esteja se tornando menos forte, porque nosso país foi o único do BRICS em que hou-ve crescimento com redução das desigualdades. Todos os outros enfrentam o dilema, bastante conhecido por nós, e não têm os instrumentos para fazer frente às pressões sociais, que podem se elevar politicamente, colocando em risco várias políticas que vêm sendo continuamente implementadas nesses países, inclusive a aproximação via BRICS. Qual a percepção dos senhores sobre essa eventual ameaça? Os senhores encaram o BRICS como um espaço para oferecer aos demais parceiros informações sobre como fazer frente às demandas políticas, decorrentes de pressões sociais?

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Professor Oliver Stuenkel – Sou da Fundação Getúlio Vargas, aqui em São Paulo. Fiz parte da delegação brasileira ao Foro Acadêmico na cúpula de Nova Delhi. A minha observação é que existe uma desconexão entre o que os governos fazem e o que os acadêmicos e analistas pensam. Em Nova Delhi, sentamos ho-ras debatendo se o BRICS Development Bank faz sentido, mas esse debate os governos haviam tido provavelmente dois ou três anos atrás. Aquelas ideias já estavam bastante desenvolvidas no nível de governo, mas nem a sociedade, nem as faculdades, nem os think--tanks conheciam as iniciativas. Isto também é típico do BRICS, ou seja, continua sendo uma iniciativa das elites governamentais. Acabei de passar um mês na Índia. Nas conversas que mantive com autoridades do governo indiano, obtinha ideias muito mais avan-çadas do que nas universidades e nos think-tanks.

Identifico uma grande necessidade de os governos comunica-rem às suas sociedades, de forma mais eficiente do que está acon-tecendo agora, os planos sobre o BRICS e também as conexões com o G20, o FMI e o Banco Mundial, além de outras eventuais institui-ções internacionais.

O BRICS enfrenta uma dificuldade adicional, por serem pa-íses culturalmente, e em vários casos geograficamente, distantes uns dos outros. É importante que os governos criem estímulos ao congraçamento de suas sociedades. Penso, por exemplo, num visto BRICS em passaportes de acadêmicos brasileiros que queiram pas-sar tempo na China ou na Índia. Existe pouca ajuda nesse contexto.

Acho que as ideias novas sobre o futuro do BRICS devem surgir dentro dos governos, e não fora. Mas se é para dar sugestões, sugiro melhorar a comunicação com a sociedade e criar medidas que esti-mulem e facilitem a circulação de pessoas entre os países BRICS.

Professora Anna Jaguaribe – Junto com o Embaixador Ouro-Preto, represento aqui o IBRACH. Como todos os que me

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precederam, gostaria de agradecer o convite para participar deste intercâmbio, que está sendo realmente muito interessante. O Em-baixador Pimentel deve estar pensando em como dar prossegui-mento a essa série de ótimas conversas sobre o BRICS e as minhas observações aqui têm a ver com isso.

Antes de mais nada, como foi habilmente dito pelo Embai-xador Valdemar, a questão de discutir como nasceu e onde está o BRICS é fútil, porque ele existe e está atuando. Agora, é importan-te também ver que a atuação do BRICS está muito diferente hoje, evoluiu bastante. O BRICS nasceu na longa onda da globalização, e começa a fazer a diferença justamente agora, quando aquela gran-de onda de prosperidade termina. Estamos num momento de crise e o BRICS se afirma porque muda os termos da discussão.

Na semana passada, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) proporcionou um debate sobre o que poderia ser o Brasil em 2020, depois desta crise econômica glo-bal. Uma das conclusões é a de que os termos em que estávamos acostumados a pensar o desenvolvimento dos países emergentes mudaram, claramente. A crise de hoje impõe taxas de crescimento muito lentas nos próximos 10 anos, pelo menos, o que instaura aquilo que o Professor Jin Canrong já chamou de “japonização do mundo”. São aparentemente inevitáveis uma diminuição da im-portância do comércio e, sobretudo, da relação entre o crescimento do comércio e o PIB, e também uma grande instabilidade com rela-ção às moedas de referência internacional.

Assim, a agenda do BRICS não se dirige apenas à reforma de um sistema que não combina com uma nova configuração multipo-lar, mas é também uma agenda de inovação frente às novas exigên-cias de desenvolvimento.

Um ponto importante que foi mencionado em várias inter-venções de hoje é a importância da região na agenda do BRICS. Se é

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verdade que a crise e as referências da multipolaridade mudaram e, de certa forma, brecaram o curso das negociações globais, também é certo que vêm contribuindo para aumentar a inovação regional frente aos problemas.

A sugestão que eu deixaria é que, ao considerar a agenda de policy making do BRICS, o Embaixador Pimentel considere o qua-dro de possibilidades que o BRICS terá a sua frente nos próximos anos, e as inovações regionais que serão importantes para estimu-lar possíveis projetos comuns, ou gerar novas tensões.

Professora Vera Thorstensen – Obrigada, Embaixador. É um prazer, como sempre, participar desses debates.

Dois pontos rapidíssimos. Hoje, ouvimos a descrição de duas importantes iniciativas, a do embrião de um novo banco comple-mentar ao Banco Mundial e a de um Fundo, tipo FMI, via BRICS. A grande ausente foi a OMC. Mas se a rodada Doha está morta, a OMC não está e é urgente ver o que está acontecendo dentro dela. Se não implodir, a OMC será transformada. As entradas da China e agora, na semana passada, da Rússia vão determinar uma nova OMC. Quer dizer, teremos novidades também nessa área.

Nessa área, o grande desafio para o BRICS será a discussão dos desalinhamentos cambiais. A China melhorou, relativamente: a moeda chinesa desvalorizou-se só em mais 10%, enquanto a da Índia está desvalorizada em 20%. O real brasileiro está sobrevalo-rizado, ainda, em cerca de 15%, e o rand sul-africano também está valorizado. A grande novidade é que o FMI calculou que o dólar dos Estados Unidos está 10% desvalorizado. O desnível entre os acordos bilaterais e as regras multilaterais está mudando o comér-cio internacional, e este é um desafio que se insere no coração do BRICS, visto que a própria OMC pode tratar de encontrar antído-tos, com salvaguardas bilaterais, ou gatilhos rápidos, por exemplo.

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Veja, Embaixador Pimentel, que o mundo acadêmico está reagindo ao seu convite. Acabamos de fazer uma simulação, na qual juntamos os BRICS e vamos testar o que aconteceria se fosse criado um acordo de livre-comércio intra-BRICS. O surpreenden-te, em termos macro, é que a simulação inicial verificou ser pior casar com a Índia do que casar com a China. Mas os resultados finais não estão ainda disponíveis. O que estamos fazendo é dar um choque de câmbio na simulação. Na hora em que se traz o câmbio para dentro, tem-se todo um quadro diferente para ser analisado. Isso fica para o próximo seminário e para o próximo livro sobre o BRICS.

Como o BRICS resolverá o problema de câmbio intra-BRICS? A solução poderá impactar o mundo. Toda desvalorização mone-tária é um brutal subsídio à exportação, e toda moeda valorizada, como as do Brasil e da África do Sul, são um tiro no pé. Abrimos mão dos instrumentos de defesa negociados na OMC. Os interes-ses Brasil/África do Sul, de um lado, China/Índia do outro, vão colidir, e esse choque deveria ser um ponto interessante para de-bates intra-BRICS.

Professor Alberto Pfeifer – Gostaria de ouvir dos integran-tes da mesa e também dos convidados estrangeiros algumas con-siderações sobre aspectos que até agora parecem distantes, mas dada a velocidade com que avançam os entendimentos no interior do BRICS e a rapidez das transformações no cenário internacional, talvez não devam ser deixados à margem. Refiro-me aos temas re-lacionados à defesa, segurança e tecnologia militar.

A principal aliança militar existente no mundo de hoje é a OTAN, uma remanescente da Guerra Fria. Entre os BRICS, creio que nada foi conversado, pelo menos nada transpirou ainda sobre entendimentos nessa área. No entanto, há programas de coope-ração bilateral em matéria de tecnologia militar e espacial entre

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alguns dos participantes do BRICS. Talvez o eixo de referência da nossa nova postura no mundo migre dos Estados Unidos e da França em direção à busca de outros paradigmas e conceitos.

Do ponto de vista da projeção no Atlântico Sul, Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), agora se complementa pelo interesse econômico energético gerado pelos hidrocarbonetos descobertos, e isso nos aproxima ainda mais da África do Sul. Há possibilidades de cooperação entre os cinco, ou em outras geome-trias dentro do BRICS, no plano da defesa e da segurança? E já se considerou, nos entendimentos no BRICS, um cenário com o even-tual surgimento de uma confrontação no mundo a partir dos des-dobramentos das diversas crises em curso?

Professor Walber Muniz – Sou professor na Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Além de agradecer à Funag pelo convite para participar de mais este seminário, gostaria de reforçar a inter-venção de Pfeiffer. Se o professor Lukyanov considera inevitável o surgimento de tensões entre a China e os EUA, creio que seria con-veniente trazer o tema da segurança mundial para o nosso debate. Há deliberações no BRICS sobre esse tema? Há alguma iniciativa intra-BRICS sobre direito nuclear, por exemplo?

Professor Renato Baumann – Quero enfatizar uma dimen-são que já foi mencionada aqui. O BRICS é um exercício que tem três, quatro anos. Estamos todos empolgados com seu sucesso. Como economista, vejo, no entanto, que uma das questões a ter em mente é se essas coisas vão funcionar a médio e longo prazo. O risco de que o Banco BRICS e os swaps afetem as instituições de Breton Woods é real. O desafio que se coloca para cada um dos cinco países é o grau de preparo para participar no BRICS. Estarão preparados para enfrentar a questão cambial, a questão comercial, e particularmente a dimensão regional?

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Foi dito e repetido aqui que as questões da Rússia, da China e da Índia são antigas e complexas. Existe um plano BRICS para enfrentar o perigo de novas pendências entre elas?

Dos cinco, o que tem menos claro o que quer e o que pode fazer com seus vizinhos é o Brasil, e isso não é uma coisa menor, sobretudo porque estamos observando a entrada de produtos, não diria nem chineses, são produtos asiáticos que competem com os nossos produtos, de uma forma muito intensa. Falta-nos conhecimentos sobre a experiência do leste asiático em termos de complementaridade produtiva e do quanto isso tem sido impor-tante para promover o crescimento regional. Estão acontecendo coisas muito importantes no resto do mundo, e nós não temos internalizado essa dimensão.

Quero reforçar a sugestão da Anna Jaguaribe com relação a próximas reuniões. Parece-me necessário debater se a economia brasileira é grande e forte o suficiente para continuar a ser convida-da para os Gs relevantes daqui ao futuro, ou se para isso é preciso ela consolidar sua constituency regional. Tendo a pensar que nos faz falta uma atuação regional que possa consolidar a nossa posi-ção e nos alçar a um nível mais alto de competitividade com nossos parceiros. No âmbito comercial e no financeiro, na minha opinião, não se deveria deixar de considerar a dimensão regional.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Vamos aos co-mentários finais. Começaremos com Paulo Nogueira Batista Jr. Em seguida, passarei a palavra aos demais membros da mesa.

Paulo Nogueira Batista Junior – Obrigado, Embaixador. Vou me dirigir a três questões que foram levantadas. Quanto ao desalinhamento cambial, mencionado por Vera, os técnicos do Fundo Monetário estão fazendo uma reforma das metodologias de cálculo. O modelo tradicional, que era o do consultative group on

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exchange, está sendo reformulado. Recentemente isso foi discutido na diretoria e vários diretores insistiram, inclusive eu, que tudo deve ser divulgado, toda base de dados, as estatísticas, para que especialistas externos possam avaliar a qualidade do trabalho que o staff do Fundo está fazendo. Espero que em dois meses, no máxi-mo, tudo isso esteja disponível para que não seja considerado uma caixa-preta do Fundo Monetário Internacional.

A Renato Baumann gostaria de dizer que no Fundo Monetá-rio Internacional toda nossa constituency, que é Brasil+8, é forma-da de países da América do Sul, América Central e Caribe. Aliás, grande parte do tempo do Diretor brasileiro é com esses países e com sua relação desses com o Fundo. Quero mencionar breve-mente, que o fundo de reservas entre os BRICS não exclui, e pelo contrário, pode até reforçar a ideia de um fundo de reservas no modelo Chiang Mai, virtual, no âmbito do Brasil, América do Sul, Caribe e América Central. Pessoalmente, há anos venho dizendo que o Brasil precisa de um esforço maior para desenvolver uma iniciativa tipo Chiang Mai, aberta à participação, técnica, sólida, gradual, nada para fazer discurso.

Por último, eu diria que as duas iniciativas recentes dos líde-res dos BRICS não são uma provocação, nem uma alternativa ao Banco Mundial e ao FMI. Iniciativas desses tipos podem ser vistas como complemento às entidades de Bretton Woods e, ao mesmo tempo, como competição saudável. Os países do leste da Ásia de-senvolveram essa sutileza quando criaram a iniciativa de Chiang Mai, no ano de 2000. É muito diferente de levantar uma bandeira. Aliás, eu não me preocuparia com o esvaziamento das entidades de Bretton Woods. Elas estão lá, são burocracias sólidas, existem desde o final da II Guerra Mundial e é muito difícil que o BRICS consiga esvaziá-las. Um subproduto dessas iniciativas, embora não o objetivo principal, seria impulsionar certas transformações no

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interior das instituições de Bretton Woods, que estão ficando ana-crônicas em vários aspectos.

Na sucessão do presidente do Banco Mundial se viu o anacro-nismo. Permaneceu a regra anacrônica, absurdamente anacrônica, de que o cargo de presidente do Banco Mundial está reservado a um americano, assim como o cargo de diretor-gerente do Fundo está reservado a um europeu. Nesse ponto, penso que a atuação conjun-ta do BRICS não foi boa. Os diretores dos BRICS e de outros países em desenvolvimento apoiaram dois candidatos, um colombiano e uma nigeriana, e a Rússia, poucos dias antes da eleição, saiu sozinha apoiando o candidato americano; isso foi lamentável. O Brasil, como vocês sabem, declarou seu voto em favor da candidata nigeriana. Um voto absolutamente correto, porque do ponto de vista do méri-to, a nigeriana era mais qualificada do que o candidato americano, os americanos tiveram muita dificuldade para aparecer com um nome conhecido e convincente. A meu juízo, não é defensável que numa disputa desse tipo os BRICS não tenham votado em bloco na can-didata nigeriana. Mas as três cadeiras africanas do Banco Mundial votaram nela, Argentina, Brasil e, se não me falha a memória, duas cadeiras europeias também votaram nela. Foram 7 votos em 25, o que é considerável numa eleição com resultado pré-determinado, de-vido ao acordo entre Estados Unidos e Europa.

Embaixador Ronaldo Sardenberg – Este debate mostrou o que já sabíamos, mas sempre é bom confirmarmos: a complexidade do tema e a extensão da agenda, que é absolutamente gigantesca. Tocamos aqui em muitos dos problemas do mundo. Não há dúvida de que o BRICS será um grande desafio para nós. Acho necessário aumentar o conhecimento entre os países, quer dizer, não só entre os governantes, mas também entre as sociedades. As populações devem se conhecer melhor, pois temos à frente um esforço muito grande para podermos nos entender. Não acredito em diplomacia

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sem que haja conhecimento entre as pessoas. É mais difícil confiar em alguém que você nunca viu, não é?

Queria dizer também que não é demais manter uma certa mo-déstia em relação ao que se pode fazer com o BRICS. A construção será feita gradualmente, à medida que formos nos entendendo me-lhor. A próxima reunião de cúpula deverá ser um período crítico para que nós aceleremos o processo.

Conselheiro Fernando Pimentel – Já criamos um grupo para debater o Banco do BRICS. Já temos uma espécie de questionário, trabalhamos agora nas respostas. Algumas ideias estão claras, a começar da certeza de que não se trata de um banco contra nada, e sim de um banco que busca eleger nichos de atuação e explorar perspectivas, embora tenha também o subproduto da competição, do desafio para que o Banco Mundial se modernize. Hoje, boa parte do capital e da agenda do Banco Mundial está sendo cada vez mais coordenada por alguns países doadores, o que é talvez bom para o clima, mas restringe a atuação da entidade. Um caso típico: um país africano pediu um financiamento para criar corredores de ôni-bus em uma capital cujo trânsito era e continua sendo supercom-plicado. O argumento era de que o projeto era “bom para o clima”, “vai melhorar a situação do trânsito, economizar combustível”. A reação dos países donos do Fundo foi negativa, porque os ôni-bus eram a diesel. Exageros desse tipo podem ser contestados pelo BRICS, com um nível tão alto de exigência não se promove melho-rias necessitadas a curto prazo. As possibilidades reais de certos países não permite exigir a solução ótima, não pode absorver de pronto a melhor tecnologia dos países ricos. Não adianta querer impor ônibus a hidrogênio na África de hoje. A modernização é um processo, exige sensibilidade para incorporar as condições dos países em desenvolvimento, e os BRICS têm essa sensibilidade.

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Em relação ao soft balancing, na questão financeira há várias geometrias. Em certas lutas para a reforma do Fundo Monetário, os Estados Unidos são aliados importantes do BRICS, pois na ver-dade existe hoje uma sobrerrepresentação europeia muito grande. É flexível a plataforma de mudança das instituições de Bretton Woods. Não se trata necessariamente de soft balance, mas sim de buscar um espaço mais razoável de distribuição de poder.

A última observação é que acho um pouco exagerado dizer que, de todos os países do BRICS, o Brasil é o que está pior em sua inserção regional. Os demais BRICS não primam por uma inserção regional excelente, têm vários conflitos de fronteira. Em alguns casos existe uma boa complementação econômica, mas não sempre, e os proble-mas políticos atrapalham. Todos os países estão buscando melhorar sua inserção nas suas respectivas regiões, é uma prioridade comum a todos, e o Brasil parte de uma coordenação regional muito razoável.

Embaixador Valdemar Carneiro Leão – Vou responder a duas perguntas apenas. Com relação à eleição do diretor-gerente do FMI e do presidente do Banco Mundial, retomo aquela ideia que defendi no princípio. O BRICS acerta e consegue resultados quando a unanimidade é clara. Nesse caso, a unanimidade não era clara e o BRICS tem extrema dificuldade para resolver conflitos intramuros.

Sempre entendi como uma declaração de princípios a posição do BRICS de que é necessário acabar com a ideia de que um euro-peu ocuparia a direção do Fundo. A declaração não revelava as reais intenções ou as preferências dos diversos membros. Ou seja, não vi naquela declaração, e acho que ninguém viu, uma manifestação de unanimidade entre os BRICS. E o BRICS não funciona quando a unanimidade não está consolidada.

Também se percebem problemas em temas políticos. Existe o interesse dos diversos membros de atuar na agenda política, mas a longo prazo a divisão dos membros em duas categorias de poder

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dentro do BRICS, uma institucionalmente consolidada e consagra-da na ONU e outra não, vai fatalmente gerar tensões. Não me pa-rece normal que os não membros aceitem por mais muito tempo coordenar posições políticas com dois países que têm uma posição privilegiada dentro da institucionalidade política internacional. Até quando os países não membros permanentes do CSNU vão achar normal sentar-se à mesa e discutir com países que têm um diferencial de poder? Tenho minhas dúvidas sobre até quando isso pode subsistir.

Quanto tempo o BRICS durará? Há forças centrífugas den-tro do BRICS e uma delas é o descolamento da China, que vai se assumindo uma ordem de grandeza diferente, e é possível que isso se acentue. Outra é o ingresso da Rússia na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). É um pouco desconcertante para o BRICS ver um de seus membros em pro-cesso de aproximação com o propósito declarado de ingressar na OCDE. A OCDE não é só um conjunto de regras, é uma cultura. A tentativa russa de assimilar a cultura ocediana representa outra força centrífuga dentro do BRICS.

Volto a minha ideia original: o BRICS sobreviverá enquanto re-presentar valor para cada um de seus membros. Não importa muito se o valor é diferenciado; enquanto representar algum valor de peso significativo para cada um dos membros, o BRICS sobreviverá, e é bem possível que isso o leve adiante por muito tempo ainda.

Ministro Flávio Damico – Esta terceira mesa-redonda mar-cou um avanço em nossos debates, constatamos que em boa me-dida a reflexão dos nossos parceiros no BRICS é similar à nossa. A discussão colocada pelo Embaixador Pimentel sobre os ganhos que cada um dos países retira do BRICS é muito pertinente. Todos percebem vantagens, essa é a realidade. Pudemos também fazer uma espécie de inventário daquilo em que se pôde avançar, de

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modo muito significativo na área econômico-financeira, em que já temos um acervo de realizações e uma agenda para o futuro bastante relevante.

Na área política, as complicações são maiores, porque o pró-prio estado do sistema internacional não nos permite ver perspec-tivas de avanço imediato. O BRICS, como foi dito aqui, abarca uma grande parcela da agenda da humanidade.

Este exercício de diplomacia pública tem desdobramentos, de acordo com os estilos institucionais de cada país. No Brasil, uma sociedade aberta, em que o Itamaraty não detém o monopólio da formulação da política externa global ou da definição dos interes-ses do país, há uma série de agências competidoras com suas pró-prias perspectivas, o mundo político, o empresarial e o acadêmico. O resultado final decorre do embate entre essas percepções. Ano-tamos aqui uma série de sugestões e vamos continuar interagindo com todos os setores, pois o BRICS não é uma obra acabada, é um processo em andamento.

Nessa linha, creio que seria proveitoso mantermos esse tipo de interação sobretudo quando começarmos a desenvolver as pro-postas para a Cúpula de 2014, que será no Brasil.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Para o encerra-mento desta sessão, dou a palavra ao nosso anfitrião, Embaixador Rubens Barbosa.

Embaixador Rubens Barbosa – Em primeiro lugar, faço ques-tão de cumprimentar a Funag pela organização deste e dos outros dois seminários. Concordo que os três debates propiciaram um avanço na análise do BRICS. A discussão ficou mais sofisticada e talvez menos acadêmica do que no início do exercício. Hoje tivemos uma excelente discussão, sobretudo de dois pontos. Primeiro, o que é o BRICS, o seu valor e seu papel no mundo. Segundo, a sua

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significação para a política externa brasileira. Vou fazer breves co-mentários sobre esses dois aspectos.

A maioria das manifestações deixou evidente que o BRICS é um fato diplomático nas relações internacionais de hoje. Foram co-mentados aqui muitos exemplos da ação do BRICS, sobretudo na área econômica, e mais ainda no âmbito do G20 e do Fundo Mone-tário Internacional. Até o momento, a coordenação se dá preferen-cialmente na área econômico-financeira e, como diz Valdemar, em torno de temas em que há consenso. Quando não há consenso, não se ensaia uma posição conjunta.

A meu ver, o BRICS é até muito comportado na área econômi-ca. Está buscando reformas dentro do sistema. Como Paulo mencio-nou, não há maior contestação, o que está havendo é uma briga pela reforma, não uma revolução dentro do sistema financeiro, e este é um ponto importante. O BRICS procura modificar o sistema em que está inserido, não atua para destruí-lo ou para substituí-lo. A mesma atitude prevalece nas relações dos BRICS com os Estados Unidos.

Não parece que o BRICS possa tornar-se uma escada para a China. Como discutimos aqui, cada um dos cinco países tem a sua própria agenda. A soma dos quatro não vai fornecer uma escada para o crescimento da China, porque as agendas tornam difíceis as convergências.

Pelas dificuldades de atingir posições conjuntas, a não ser em determinadas matérias econômico-financeiras, até hoje as ques-tões de defesa, segurança, tecnologia militar e a questão nuclear não tiveram espaço. Parece distante o momento em que se poderá avançar nessas áreas.

O último ponto a mencionar é que ficou ainda faltando um foco na política externa brasileira. O que o Brasil quer do BRICS? Qual é a agenda que interessa ao Brasil no BRICS? Eu vejo o BRICS como um meio de o Brasil reforçar objetivos da política externa,

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como fazem a China e a Rússia. A China tem uma política osten-siva de low profile and never lead. Atento a isso, o representante da China neste seminário, Jin Canrong, sugeriu a criação de um se-cretariado, mas não na China. O russo Fyodor Lukyanov referiu-se à importância estratégica que os líderes do seu país atribuem ao BRICS em situações reais de política externa.

Quais são os interesses do Brasil? Na área econômica, temos interesses concretos. Na área política, a única ideia nova que apa-receu aqui foi a questão do visto especial para os BRICS, que seria uma ação de política externa conjunta. Sugiro, então, que focali-zemos, num próximo encontro, as questões de política externa de nosso interesse primordial e seu desenvolvimento dentro do BRICS. Este não é um exercício apenas acadêmico. A posição da Subsecretária Edileuza no seminário precedente sublinhava este ponto. A carta-convite que recebemos de José Vicente ia ao mes-mo sentido, dizia que deveríamos nos esforçar para apresentar sugestões, a serem examinadas pelo Itamaraty. Tivemos poucas propostas e poucos comentários sobre elas. Esta é uma provocação que fica para o próximo encontro.

Embaixador José Vicente de Sá Pimentel – Obrigado a to-dos, obrigado à FIESP por nos acolher aqui. Meus agradecimentos especiais a cada um dos nossos convidados estrangeiros, que vieram de bem longe para enriquecer nosso debate. Sou mais otimista do que o nosso anfitrião, julgo que as nossas discussões de hoje e aquelas de abril último vão fornecer muita munição para os analistas acadêmi-cos e também para os formuladores e operadores de política externa. Seria bastante útil, a meu ver, tentar fazer uma síntese das principais críticas, sugestões e propostas que permearam os debates. Mais uma vez obrigado, espero revê-los todos em uma próxima ocasião.

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breve resumo dos debates

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A diplomacia brasileira concede alta prioridade ao BRICS. Em entrevista à Folha de São Paulo, em 10 de fevereiro de 20121, o Ministro Antonio Patriota comparou a atual coordenação com os integrantes do grupo à aproximação articulada pelo Barão do Rio Branco com os Estados Unidos no início do século XX. No entan-to, as mesas-redondas organizadas pela Funag em abril e julho do mesmo ano demonstraram uma boa dose de desconhecimento e de desconfiança entre formadores de opinião brasileiros quanto à importância do BRICS para o Brasil. Assim, os debates ofereceram uma valiosa oportunidade para tomar conhecimento das dúvidas e esclarecê-las. Sugeriram também a conveniência de uma divulga-ção mais ampla das razões do Governo.

As Diferentes VisõesVários acadêmicos e jornalistas ressaltaram as assimetrias

no interior do grupo e sublinharam que as diferenças históricas, políticas, econômicas e civilizacionais entre os BRICS colocariam em dúvida a viabilidade do grupo. As estatísticas citadas em dis-cursos oficiais para ressaltar a importância dos cinco países não impressionam os céticos, segundo os quais os números relativos às

1 “A coordenação no fórum Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) é atualmente para o Brasil o que a aproximação com os EUA representou para o barão do Rio Branco, segundo o chanceler Antonio Patriota. Um grande legado dele é a capacidade de apreensão das mudanças. Na época em que o dinamismo econômico e o eixo de poder mudavam da Europa para os EUA, teve a capacidade de estabelecer uma boa relação com os Estados Unidos. Transferido para hoje, seria a capacidade de você se coordenar com os Brics” (PATRIOTA, Antonio. Os Brics são hoje os EUA da época do Rio Branco. Rio de Janeiro: Folha de São Paulo, 10 de janeiro de 2012).

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Breve Resumo dos Debates

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dimensões populacionais, territoriais, econômicas e comerciais do BRICS caem vertiginosamente quando se retira a China.

Os críticos realçaram que os BRICS têm diferentes interesses e abordagens diante dos principais problemas internacionais do século XXI. Por isso, visualizam com dificuldade uma agenda posi-tiva que os mantenha unidos. Que tipo de harmonização política pode haver, perguntam, se os cinco divergem sobre questões bási-cas, como a da ampliação do CSNU?

No extremo oposto, há os que percebem no BRICS o potencial de uma nova Bretton Woods, capaz de mudar o mundo. Alguns veem no BRICS um opositor do G7, e não um movimento para ex-pandir e democratizar a governança global. Outros contrapõem, sobriamente, que o grupo terá uma influência crescente no cenário internacional, desde que apresente propostas comuns e as negocie em bloco. Vozes respeitáveis aconselham que se limitem tais ações à área econômico-financeira. Há quem favorize, porém, a adoção de uma ousada agenda política.

O que parece ser consensual é o diagnóstico de que o BRICS, como outros recentes agrupamentos minilaterais, veio à luz em de-corrência da incapacidade das lideranças mundiais de renovar seus métodos de trabalho e incorporar nos diretórios dos organismos multilaterais países sem os quais não é mais possível solucionar os problemas que vão penalizando as relações econômicas, comerciais e ambientais, entre outras, do mundo de hoje. Com a globalização, vários desafios se tornaram inadministráveis pelas antigas regras de convivência. A narrativa do BRICS tem início, assim, no empe-nho de cada um de seus participantes em juntarem suas vozes para serem melhor ouvidos nos órgãos encarregados de buscar soluções para os problemas globais.

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Visão Brasileira do BRICSNos debates, os diplomatas e negociadores brasileiros assinala-

ram que uma das dificuldades para que o público compreenda o valor do BRICS decorre do fato de ser ele um projeto aberto, que vai sendo construído progressivamente pelos cinco países-membros. Dada a sua singularidade, é com frequência mais fácil explicar o que o BRICS não é: não é uma organização ou uma instituição formal, não é uma aliança econômica nem política, não é uma área de livre comércio, não almeja pronunciar-se sobre todos os principais itens da agenda internacional. Constitui um fórum de coordenação, em processo de consolidação, no qual um grupo de países, cuja especial relevância já havia sido destacada num livro de George Kennan publicado em 19932 − antes, portanto, do artigo de 2001 em que Jim O’Neill criou o acrônimo BRIC. Os líderes desses cinco países reúnem-se para dis-cutir questões de interesse comum e, quando julgam conveniente, adotam decisões conjuntas. Os líderes não falaram sempre a uma só voz, mas há entre eles uma coordenação frequente, que é muito útil em vários foros econômicos e políticos. A percepção compartilhada pelos cinco sobre a importância do grupo permanecer unido cria um incentivo à aproximação de posições.

Um aspecto sublinhado nos debates é o de que a institucio-nalização do BRICS embute um reconhecimento cruzado de au-toavaliações. Cada um dos membros se autoinveste de um status especial, que é confirmado pelos outros quatro. Isso tem um valor intrínseco, que se manifesta por uma capacidade de atuação acres-cida. Além disso, cada um tem o benefício da marca, que individu-aliza e dá prestígio.

2 Intitulado Around the Cragged Hill: A Personal and Political Philosophy e se referia a cinco monster countries − quatro dos quais compõem o atual BRICS, a saber, Brasil, China, Índia, Rússia; o quinto era os EUA −, cujos recursos territoriais e populacionais lhes concederia particular importância no contexto internacional.

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De fato, a curiosidade sobre os BRICS antecedia a formação do grupo. A marca já tinha valor de mercado e respeitabilidade antes de se tornar o fórum de hoje. Se os países não a aproveitassem, no mínimo haveria um desperdício de oportunidade.

Cumpre notar que a participação no grupo eleva o prestígio internacional não só do Brasil, mas também o da Rússia, o da Ín-dia, o da África do Sul e mesmo o da China. Embora esta última tenha um peso diferenciado, também ganha, via BRICS, soft power e legitimidade na ampliação do seu raio de ação no mundo.

Os negociadores brasileiros minimizam o risco de que a China utilize o BRICS como uma escada para promover seus interesses econômico-comerciais. Argumentam que o grupo tem, na termi-nologia de Prebisch, características hacia afuera, que lhes permi-te falar em coro nos organismos multilaterais, mas também hacia adentro, ao identificarem áreas de cooperação mútua. Estabelece--se dessa forma suficiente intimidade para discutirem-se tanto as ações conjuntas quanto as iniciativas individuais de seus partici-pantes. Cada um dos cinco países tem a sua própria agenda, o que acrescenta dificuldades para que qualquer um deles manipule o BRICS em seu exclusivo benefício.

O BRICS convém, portanto, a cada um dos cinco participantes, que se alçam a um patamar de maior visibilidade e credenciam-se a defender interesses comuns com uma eficácia que seria mais difícil de conseguir sozinhos. Aumenta a influência de seus membros em pro-cessos decisórios e facilita a vocalização de críticas a visões de outros países, principalmente daqueles que detêm as rédeas dos órgãos de governança mundial, haja vista que um objetivo primordial dos BRICS é ampliar a sua participação nos órgãos de governança mundial.

A esta altura, diplomatas e negociadores brasileiros fazem duas ressalvas. Assinalam, primeiramente, que o Brasil tem no BRICS uma plataforma adicional, e não exclusiva, para a sua atuação ex-

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terna. À luz do fluido diálogo que mantém com os Estados Unidos, a União Europeia e o Japão, bem como com o mundo emergente, o Brasil vê no BRICS mais uma plataforma para exercer a sua vo-cação para articular consensos. Em segundo lugar, sublinham que os cinco procuram modificar o sistema internacional em que estão inseridos, e não destruí-lo; visam à evolução do sistema, não a uma revolução.

Áreas de Atuação do BRICSA agenda econômica tem sido uma catalizadora de ações no

BRICS. Desde a cúpula de Ecaterimburgo, os parágrafos operativos das declarações emitidas pelos líderes dos cinco países vêm desta-cando as questões financeiras e o combate à crise internacional ini-ciada em 2008. A consolidação do G20 como órgão de decisão em matérias econômico-financeiras é um dos principais objetivos via-bilizados com decisivo apoio dos BRICS. O BRICS é influente dentro do G20, e os dois grupos juntos influenciam outros foros. Sendo o G20 um foro criado para dar respostas à crise global, é natural que os membros do BRICS tenham um peso relevante também nos órgãos de governança financeira, como o FMI e o Banco Mundial.

Os Ministros de Finanças e os Presidentes de Banco Central do BRICS vêm tendo reuniões três vezes por ano, em média. De 2008 a 2012, encontraram-se onze vezes. Entre as reuniões, falaram-se com frequência por telefone. Um efeito concreto da coordenação entre eles se deu na reforma das quotas do FMI. Quem colocou inicialmente o tema da reforma das instituições financeiras inter-nacionais na agenda do G20 foi o Brasil. A reforma concretizou-se depois, e para tanto o apoio dos BRICS foi essencial.

Outras decisões recentes na área financeira afirmam-se parti-cularmente significativas. A disposição de criar um banco de desen-volvimento e de um fundo de reservas revela o estreitamento dos laços entre os cinco países. O banco do BRICS funcionará de forma

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semelhante à do Banco Mundial e o fundo de reserva do BRICS terá regras parecidas com as do Fundo Monetário. Tanto um quanto outro pretendem complementar e não substituir as instituições de Bretton Woods − sem, contudo deixar de pressioná-las no sentido de que se adequem à realidade do mundo contemporâneo.

Em paralelo, a coordenação na área política vem aumentan-do a sua visibilidade. A declaração conjunta emitida na reunião de cúpula de Nova Delhi reflete os consensos possíveis em torno de questões complexas, como a violência na Síria e o programa nucle-ar do Irã, por exemplo. Alguns acadêmicos e jornalistas reclamaram maior assertividade nas decisões sobre esses temas e sobre outros mais, como desenvolvimento sustentável, segurança alimentar, inovações regionais, combate ao narcotráfico, defesa, segurança e facilitação do comércio internacional e o futuro da OMC, para não mencionar a reforma do Conselho de Segurança das Nações Uni-das. Outros sugeriram que o BRICS optasse por um foco preciso, em torno de uma agenda concisa e realista.

A Sustentabilidade do BRICSOs debatedores avaliaram que a atual crise econômica pro-

porciona uma espécie de interregno na ordem mundial. Esse inter-valo, que pode se estender por vários anos ainda, providenciaria uma janela de oportunidade para o BRICS se estabelecer na ordem internacional como um grupo que favorece a mudança pacífica e negociada da ordem internacional.

Entretanto, identificaram-se forças centrífugas no interior do BRICS. Uma delas é o descolamento da China, cuja ordem de gran-deza já é superior ao dos demais membros do grupo, superioridade que pode se acentuar nos próximos anos. A irresistível irrupção chinesa no cenário mundial causa receios que são amplamente

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difundidos por formadores de opinião, localizados, sobretudo, nos países cujo poder declina, relativamente.

Outra diz respeito à evolução da Rússia. Como o presidente Vladimir Putin, vários observadores admitiram que o cimento entre os BRICS é o conceito de soberania, pois todos os integrantes são orgulhosamente soberanos. Este seria, aliás, o fator que impediria a absorção de países como México e Turquia, os quais, apesar de terem uma projeção diplomática importante, manteriam ligações conside-radas excessivas com os Estados Unidos e a OTAN. Ora, se é assim, houve quem considerasse desconcertante para o BRICS a aproxima-ção da Rússia com a OCDE. A tentativa russa de assimilar a cultura ocediana representaria outra força centrífuga dentro do BRICS.

Uma terceira seria a sensível questão do diferencial de poder político que existe no interior do grupo. A prazo mais longo, uma divisão dos países-membros em duas categorias de poder dentro do BRICS, uma consolidada e consagrada na ONU e outra não, ten-de a gerar crescentes tensões. Caberia perguntar, assim, até quan-do os membros que aspiram a um assento permanente no Conse-lho de Segurança vão admitir hesitações em seus parceiros quanto à oportunidade de proceder à reforma do órgão.

No entanto, na visão de vários observadores, a longevidade do BRICS pareceria estar mais intimamente vinculada a sua capacida-de de servir como agente de um soft balancing com relação aos Es-tados Unidos. Formado por países que já têm um certo peso inter-nacional, mas são mantidos longe das esferas decisórias, o objetivo central do grupo seria equilibrar a liderança norte-americana e, se possível, neutralizá-la, embora reconheçam nos Estados Unidos o ponto central das suas relações internacionais. Visto dessa pers-pectiva, o grande teste futuro do BRICS seria o de manter-se como um bloco nas negociações inevitáveis com os EUA, a UE e o Japão. Para ter suficiente poder de barganha e influenciar o processo de

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tomada de decisões políticas e econômicas, os cinco precisam uns dos outros, mas a capacidade de coesão será crescentemente testa-da à medida que o BRICS seja chamado a assumir mais responsabi-lidades na governança global.

Há um outro teste, porém, que envolve a questão da legiti-midade. A missão de reformar a governança global não deve ser percebida, no entender de vários debatedores, como um objetivo oportunista. Os BRICS teriam a sua longevidade ligada também a sua capacidade de interpretar e defender os interesses do mundo emergente, em benefício de procedimentos mais democráticos nos processos decisórios dos órgãos de governança global. A agenda do BRICS deveria contemplar, portanto, os desafios sócioambien-tais, a pobreza, a desigualdade e as deficiências que afetam metade da população mundial. Ainda que norteados por metas realistas, os cinco deveriam ser capazes de propor medidas e representar interesses reais da humanidade, caso contrário correm o risco de tornarem-se irrelevantes.

Em suma, hoje não se pode prever se os cinco se converte-rão de fato num veículo de mudança estrutural nas relações in-ternacionais. Mas a conveniência de mudar existe e daí emerge a esperança de que o BRICS evolua e se transforme num gerador de alternativas, num impulsionador de novos meios e modos de li-dar com os problemas do mundo. A criação do BRICS robustece a admissibilidade de uma ordem internacional voltada para maior multilateralização e, mesmo, para a multipolaridade.

Propostas para Ampliar a DivulgaçãoNo curto prazo, o mais provável é que o BRICS siga como uma

plataforma de coordenação, que proporá posições comuns e, even-tualmente, ações comuns, às vezes com mais sucesso, às vezes com menos. A evolução para uma instituição com objetivos negocia-

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dos e sentido político específico implicará o aprofundamento da convergência entre seus membros o que, por sua vez, demandará mudanças em atitudes individuais, formadas de uma perspectiva de interesses nacionais. Para impulsionar tais mudanças, o BRICS precisaria ser valorizado não só pelos governos, mas também pelas sociedades dos países-membros.

Uma das condições indispensáveis para tanto é a ampliação do conhecimento de cada um dos cinco sobre os demais. Para promo-ver uma presença global, a condição mínima é conhecer a sociedade onde se vai atuar, conhecer a sua história, aprender a sua língua.

Nesse sentido, os debatedores recomendaram que o Governo brasileiro desenvolva um esforço de comunicação com a sociedade para informá-la de sua visão do BRICS e também as suas conexões com o G20, as instituições de Bretton Woods e outros órgãos da governança global. Como o Brasil hospedará, em 2014, a reunião dos cinco Chefes de Governo do BRICS, a ocasião é propícia para que o Governo se empenhe no sentido de divulgar a profundidade, a diversidade e a amplitude dos laços que estão sendo criados.

Jornalistas que participaram das discussões assinalaram que a imprensa se aliará a esse esforço de divulgação, desde que seja ali-mentada com as informações apropriadas. A imprensa quer relatar resultados. Os jornais não estão preparados para relatar “processos”, principalmente quando não há definições claras sobre os objetivos perseguidos. Sugeriu-se que os BRICS reflitam sobre a possibilida-de de darem a público uma agenda de longo prazo coesa, sucinta. A par disso, argumentaram os debatedores, as entrevistas aos diversos meios de comunicação, as palestras diante de públicos prestigiosos e outras iniciativas e promoções, ademais das conversas de background deveriam ser multiplicadas. A divulgação não deveria se restringir a comunicados de imprensa, nem ao texto de uma declaração conjunta.

Uma outra sugestão concreta, destinada a fortalecer a per-cepção popular da relevância que os governos lhe atribuem, seria

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a criação de estímulos ao congraçamento de suas sociedades, por meio de medidas que facilitem a circulação de pessoas entre os pa-íses BRICS. Neste particular, e tendo em vista a importância que os segmentos empresarial e acadêmico assumem como formadores de opinião, cogitou-se da criação de vistos BRICS em passaportes de homens de negócios, professores e pesquisadores.

Uma divulgação mais ampla dos resultados dos foros empre-sarial e acadêmico também foi recomendada. Vários dos presentes manifestaram curiosidade em saber, por exemplo, como as repre-sentações da China e da Rússia atuam no Foro Empresarial. Reco-mendou-se, nesse contexto, que seja redigido um relatório sobre esse foro, em que se explique, inclusive, como o Brasil se capacita para lidar com as representações empresariais dos demais BRICS.

Os participantes consideraram o Foro Acadêmico como uma ideia positiva, na medida em que amplia a participação da acade-mia, cujo aporte assume proporções verdadeiramente estratégicas para o esforço de aproximação das sociedades. Ponderou-se, no en-tanto, que a forma atual dos debates não é acadêmica, já que cons-trange os debatedores a tomar posições em relação à agenda oficial, como se fossem delegados governamentais em alguma negociação internacional.

Foram propostas reuniões entre os organizadores da edição brasileira do Foro e os acadêmicos que dele deverão participar. Es-sas reuniões teriam lugar antes e depois do evento, a primeira para que o próprio Governo saiba os pontos de coincidência e de even-tual discordância, e a segunda para definir que direção tomar, em função dos resultados.

Pensou-se também em atrair acadêmicos estrangeiros para minicursos no Brasil, beneficiando-se de estrutura já montada na CAPES, que facilitaria a vinda de professores com reconhecida pro-

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dução e capacidade de contribuir para o debate acadêmico. Tais mis-sões podem variar de 3 semanas a 3 meses, e a bolsa é significativa.

A Funag recebeu duas sugestões muito oportunas. A fim de contribuir para uma divulgação fora do Brasil, conviria traduzir para a língua inglesa livros, como este, de maneira a familiarizar leitores de outras partes do mundo com o que se pensa aqui. Há grande interesse no mundo sobre as experiências e visões brasilei-ras, mas a língua é um obstáculo.

Além disso, a Funag poderia organizar, possivelmente em parceria com órgãos como o IPEA, cursos sobre aspectos especí-ficos do BRICS, ou sobre assuntos correlatos. Os cursos deveriam suscitar interesse e estimular debates que podem ser produtivos, ajudando a divulgação dos assuntos.

ConclusãoA maioria das intervenções nas mesas-redondas de 27 de abril

e de 31 de julho de 2012 reconheceu que o BRICS é um fato diplo-mático com impacto modernizador e democratizante nas relações internacionais, e importante para os seus integrantes. Até o mo-mento, a coordenação se dá preferencialmente na área econômico--financeira e em torno de temas em que há consenso. A ampliação da faixa de consensos demandaria o comprometimento da opinião pública com a ideia do BRICS, comprometimento que se beneficia-ria de uma divulgação adequada de seus métodos e objetivos, que passaria, por sua vez, pelo engajamento da academia, ademais dos meios empresariais, bem como da imprensa. Os debates sugerem que existe uma expectativa de que o esforço de comunicação pre-ceda a sexta reunião de cúpula do BRICS, a ser realizada no Brasil em 2014, mesmo ano da Copa do Mundo, coincidência que pode favorecer a criação de um ambiente propício aos interesses da di-plomacia brasileira.

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ComuniCado ConJunto da reunião ministerial de eCaterimburGo

eCaterimburGo, rússia, 16 de maio de 2008

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Os Ministros das Relações Exteriores do Brasil, da Rússia, da Índia, e da China, reuniram-se em Ecaterimburgo, Rússia, em 16 de maio de 2008.

1. Foram enfatizadas as perspectivas de diálogo entre os BRICs com base na confiança e no respeito mútuos, no interesse co-mum, em enfoques coincidentes ou semelhantes em relação aos problemas urgentes do desenvolvimento global.

2. Os Ministros concordaram que a construção de um sistema internacional fundado sob o estado de direito e a diplomacia multilateral é um imperativo de nosso tempo. Reafirmaram o compromisso dos BRICS em trabalhar de maneira conjunta e com outros estados a fim de fortalecer a segurança e a es-tabilidade internacionais e garantir iguais oportunidades de desenvolvimento para todos os países.

3. Os Ministros reiteram que a ordem atual do mundo deveria basear-se no estado de direito internacional e no fortaleci-mento do multilateralismo, com o papel central sendo de-sempenhado pela Organização das Nações Unidas, com vistas a torná-la mais eficiente para que possa lidar com os atuais desafios globais de maneira mais eficaz. Os Ministros da Rús-sia e da China reiteraram que seus países atribuem importân-cia à posição da Índia e do Brasil no sistema internacional, e compreendem e apoiam as aspirações da Índia e do Brasil para desempenharem papel de maior relevo nas Nações Unidas.

4. Os Ministros observaram que o desenvolvimento sustentá-vel da economia global no longo prazo, bem como soluções aos problemas críticos de nosso tempo, tais como a pobreza, a fome e as doenças, são apenas possíveis se forem levados em

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Comunicado Conjunto da Reunião Ministerial de Ecaterimburgo

Debatendo o BRICS

conta os interesses de todas as nações e no contexto de siste-ma econômico global justo. Entre outros assuntos, discutiram a atual crise mundial de alimentos. Os Chanceleres da Rússia, Índia e China saudaram a iniciativa do Brasil de organizar reu-nião de ministros da economia e/ou finanças dos países BRIC para debater temas econômicos e financeiros globais.

5. Os Ministros expressaram seu firme compromisso com a di-plomacia multilateral para lidar com desafios comuns à segu-rança internacional. Reiteraram seu apoio aos esforços polí-ticos e diplomáticos para a resolução pacífica de disputas no âmbito das relações internacionais. É necessário um enfoque cooperativo para a segurança internacional que leve em con-sideração as preocupações de todos e trate-as no espírito de diálogo e entendimento. Os Ministros enfatizaram que o de-sarmamento e a não proliferação reforçam-se mutuamente. Também coincidiram quanto à necessidade de esforços multi-laterais para prevenção contra uma corrida armamentista no espaço sideral.

6. Os Ministros condenaram de maneira inequívoca o terroris-mo em todas suas formas e manifestações, cometido não im-porta com quais propósitos. Reiteraram que sua percepção de que o terrorismo constitui uma das ameaças mais sérias à paz e à segurança internacionais e de que a comunidade interna-cional deveria adotar as medidas necessárias para prevenir e combater o terrorismo. Salientaram, em particular, a coopera-ção no âmbito da ONU e a necessidade de que todos os Esta-dos-membros implementem as convenções internacionais das Nações Unidos e as resoluções do Conselho de Segurança da ONU sobre o combate ao terrorismo. Os Ministros enfatiza-ram a importância de implementar a Estratégia Global contra o Terrorismo da ONU em todos seus aspectos e expressaram a opinião de que todos Estados membros devem concertar os esforços com vistas à rápida finalização da Convenção Univer-sal sobre o Terrorismo Internacional no âmbito da ONU.

7. Os Ministros observaram estreita interconexão entre a segu-rança energética, desenvolvimento socioeconômico e proteção

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Comunicado Conjunto da Reunião Ministerial de Ecaterimburgo

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ambiental. Reafirmaram seu compromisso com os esforços multilaterais que visam a atingir o equilíbrio entre interesses de produtores, Estados por onde recursos transitam (“transit states”) e consumidores de recursos energéticos. Nesse senti-do, as partes enfatizaram a necessidade de apoiar programas que ampliem o acesso à energia, a eficiência energética, bem como o desenvolvimento e a utilização de fontes de energia novas e renováveis, incluindo o biocombustível, que sejam compatíveis com o desenvolvimento sustentável.

8. Os Ministros apoiaram o fortalecimento da cooperação in-ternacional para tratar de mudança climática no contexto da Convenção-Quadro sobre Mudança Climática da ONU e de seu Protocolo de Quioto. Expressaram seu desejo de trabalhar conjuntamente de maneira estreita com vistas a realizar os compromissos de Bali.

9. Os Ministros apoiaram a intensificação do diálogo com vistas a alcançar as metas de desenvolvimento acordadas internacio-nalmente, primordialmente as Metas de Desenvolvimento do Milênio, com base em parceria global. Conferem seu apoio a esforços internacionais de combate à fome e à pobreza.

10. Os Ministros observaram que a cooperação Sul-Sul é elemento importante dos esforços internacionais no campo do desen-volvimento. Enfatizou-se que a cooperação Sul-Sul não subs-titui, mas complementa, as formas tradicionais de ajuda ao desenvolvimento.

11. Os Ministros expressaram seu desejo de continuar a coopera-ção entre o G-8 e seus parceiros tradicionais de diálogo.

12. Os Chanceleres do Brasil, Rússia e Índia reafirmaram o apoio de seus países aos Jogos Olímpicos de 2008 em Pequim.

13. Os Ministros alcançaram entendimento para realizar a próxi-ma reunião ministerial dos BRICs às margens da 63ª sessão da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque, em setembro de 2008. A próxima Reunião Ministerial independente dos BRICs terá a Índia como anfitriã.

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eCaterimburGo, rússia, 16 de Junho de 2009

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Nós, os líderes da República Federativa do Brasil, da Federa-ção Russa, da República da Índia e da República Popular da China, discutimos a situação atual da economia global e outros temas pre-mentes de desenvolvimento global, e também perspectivas para o fortalecimento da cooperação no âmbito do BRIC, em nossa reu-nião em Ecaterimburgo, em 16 de junho de 2009.

Nós chegamos às seguintes conclusões:

1. Enfatizamos o papel central desempenhado pelas Cúpulas do G20 em lidar com a crise financeira. Elas estabeleceram cooperação, coordenação de políticas e diálogo político no que se refere aos assuntos econômicos e financeiros mundiais.

2. Apelamos a todos os Estados e organismos internacionais competentes para agirem vigorosamente para implementar as decisões adotadas na Cúpula do G20 em Londres em 2 de abril de 2009. Devemos cooperar de forma estreita entre nós mesmos e com outros parceiros para garantir maior progres-so de ações coletivas na próxima Cúpula do G20, a ser rea-lizada em Pittsburgh em setembro de 2009. Esperamos um resultado positivo da Conferência das Nações Unidas sobre a Crise Econômica e Financeira Mundial e seu Impacto sobre o Desenvolvimento, que será realizada em Nova York em 24 a 26 de junho de 2009.

3. Estamos comprometidos com a promoção da reforma das instituições financeiras internacionais, de modo a que refli-tam as mudanças ocorridas na economia mundial. As econo-mias emergentes e em desenvolvimento devem ter voz mais ativa e maior representatividade em instituições financeiras internacionais, e seus diretores e lideranças sênior deveriam

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ser designados por meio de um processo de seleção aberto, transparente e baseado no mérito. Também acreditamos que há forte necessidade de que seja criado um sistema monetário internacional estável, previsível e mais diversificado.

4. Estamos convencidos de que uma arquitetura financeira e eco-nômica reformada deveria basear-se, inter alia, nos seguintes princípios: • tomada de decisões e processo de implementação democráticos

e transparentes nas organizações financeiras internacionais;• base legal sólida;• compatibilidade de atividades de instituições regulatórias na-

cionais efetivas e órgãos internacionais de definição de padrões;• fortalecimento de gerenciamento de risco e de práticas de su-

pervisão.

5. Reconhecemos o importante papel desempenhado pelo co-mércio internacional e pelos investimentos estrangeiros di-retos na recuperação econômica mundial. Instamos todas as partes a trabalharem juntas para aperfeiçoar o ambiente para o comércio internacional e para o investimento. Exortamos a comunidade internacional a manter estável o sistema mul-tilateral de comércio, a refrear o protecionismo comercial, e a impulsionar resultados abrangentes e equilibrados para a Agenda de Desenvolvimento de Doha, da OMC.

6. Os países mais pobres foram afetados de forma mais severa pela crise financeira. A comunidade internacional necessita intensificar os esforços com vistas a prover liquidez para es-ses países. A comunidade internacional deveria igualmente empenhar-se em minimizar o impacto da crise sobre o de-senvolvimento e em assegurar a realização dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Os países desenvolvidos deve-riam cumprir o compromisso de destinar 0,7% de seu Produto Nacional Bruto à Assistência Oficial para o Desenvolvimento, e envidar esforços adicionais para aumentar a assistência, o alívio de dívidas, o acesso a mercados e a transferência de tec-nologia para países em desenvolvimento.

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7. A implementação do conceito de desenvolvimento sustentá-vel, incluindo, inter alia, a Declaração do Rio, a Agenda para o Século XXI e os acordos ambientais multilaterais, deveria constituir vetor principal na mudança de paradigma de desen-volvimento econômico.

8. Apoiamos o fortalecimento da coordenação e da cooperação entre os Estados no campo da energia, inclusive entre pro-dutores e consumidores de energia e Estados de trânsito, em um esforço para reduzir a incerteza e garantir a estabilidade e a sustentabilidade. Favorecemos a diversificação de fontes e suprimento de energia, incluindo energia renovável, seguran-ça das rotas de trânsito de energia e criação de novos investi-mentos e infraestrutura energética.

9. Apoiamos a cooperação internacional no campo da eficiência energética. Estamos prontos para um diálogo construtivo so-bre como lidar com a mudança do clima, baseado no princípio das responsabilidades comuns porém diferenciadas, levando em conta a necessidade de combinar medidas de proteção do clima com as medidas necessárias ao cumprimento de nossas incumbências de desenvolvimento socioeconômico.

10. Reiteramos nosso compromisso de elevar a cooperação entre nossos países em áreas socialmente vitais, e a aumentar os es-forços para a provisão de assistência humanitária internacio-nal e para a redução de riscos de desastres naturais. Tomamos nota do comunicado sobre segurança alimentar global emiti-do hoje como contribuição fundamental dos países BRIC aos esforços multilaterais para definir as condições sustentáveis para que se alcance essa meta.

11. Reafirmamos o avanço da cooperação entre nossos países em ciência e educação com o objetivo de, inter alia, nos engajarmos em pesquisa básica e desenvolvimento de tecnologias avançadas.

12. Sublinhamos nosso apoio a uma ordem mundial multipolar mais democrática e justa baseada no respeito ao direito interna-cional, igualdade, respeito mútuo, cooperação, ação coordenada e tomada de decisões coletiva por todos os Estados. Reiteramos

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nosso apoio aos esforços políticos e diplomáticos para solucio-nar pacificamente controvérsias nas relações internacionais.

13. Condenamos fortemente o terrorismo em todas as suas for-mas e manifestações, e reiteramos que não pode haver jus-tificativa para atos de terrorismo em qualquer parte e por qualquer razão. Notamos que o rascunho da Convenção Abrangente contra o Terrorismo Internacional encontra-se atualmente sob consideração da Assembleia Geral da ONU, e pedimos sua adoção em caráter urgente.

14. Expressamos nosso sincero compromisso com a diplomacia multilateral, com a Organização das Nações Unidas como ator central no tratamento dos desafios e das ameaças globais. Nesse sentido, reafirmamos a necessidade de uma reforma abrangente da ONU com vistas a torná-la mais eficiente para que ela possa lidar com os desafios globais atuais de forma mais efetiva. Reiteramos a importância que concedemos ao status da Índia e do Brasil nas questões internacionais, e en-tendemos e apoiamos suas aspirações no sentido de desempe-nhar papel mais relevante na Organização das Nações Unidas.

15. Concordamos com os passos necessários à promoção de diá-logo e cooperação entre nossos países de maneira crescente, proativa, pragmática, aberta e transparente. O diálogo e a coo-peração entre os países BRIC não apenas servem a interesses comuns de economias de mercado emergentes e países em de-senvolvimento, mas também para a construção de um mundo harmonioso de paz duradoura e prosperidade comum.

16. Rússia, Índia e China apreciam o convite feito pelo Brasil de sediar a próxima Cúpula do BRIC em 2010.

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deClaração ConJunta da ii CúPula de CheFes de estado/Governo

brasília, 15 de abril de 2010

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Nós, os líderes da República Federativa do Brasil, da Federação Russa, da República da Índia e da República Popular da China, reu-nimo-nos em Brasília, em 15 de abril de 2010, para discutir as prin-cipais questões da agenda internacional, bem como medidas concre-tas para avançar na cooperação e coordenação dentro do BRIC.

Chegamos a acordo sobre o seguinte:

Governança Global e Visão Comum1. Nós compartilhamos a percepção de que o mundo está pas-

sando por mudanças importantes e rápidas, que realçam a ne-cessidade de transformações correspondentes na governança global, em todas as áreas relevantes.

2. Sublinhamos o nosso apoio a uma ordem mundial multipolar, equitativa e democrática, baseada no Direito Internacional, na igualdade, no respeito mútuo, na cooperação, na ação coor-denada e na tomada de decisão coletiva de todos os Estados.

3. Ressaltamos o papel central desempenhado pelo G-20 no com-bate à crise através de níveis de ação coordenada sem preceden-tes. Congratulamo-nos com o fato de o G-20 ter sido confir-mado como o principal fórum de coordenação econômica e de cooperação internacional de todos os seus Estados-membros. Comparado ao regime anterior, o G-20 é mais amplo, mais in-clusivo, diversificado, representativo e eficaz. Apelamos a todos os seus Estados-membros a realizarem esforços para imple-mentar conjuntamente as decisões tomadas nas três cimeiras do G-20. Defendemos a necessidade de o G-20 ser proativo e formular uma estratégia coerente para o período pós-crise. Es-tamos prontos para contribuir para este esforço comum.

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4. Manifestamos o nosso forte compromisso com a diplomacia multilateral, com as Nações Unidas no papel central de lidar com os desafios e ameaças globais. Nesse sentido, reafirma-mos a necessidade de uma reforma abrangente da ONU, com vistas a torná-la mais eficaz, eficiente e representativa, para que ela possa lidar com os desafios globais contemporâneos de forma mais eficaz. Reiteramos a importância que atribuímos ao status da Índia e do Brasil nas questões internacionais, e compreendemos e apoiamos as suas aspirações no sentido de desempenhar um papel maior nas Nações Unidas.

5. Acreditamos ser a cooperação e o diálogo aprofundado e am-pliado entre os países do BRIC propício não apenas para servir aos interesses comuns das economias emergentes de mercado e dos países em desenvolvimento, mas também para a cons-trução de um mundo harmonioso, de paz duradoura e prospe-ridade comum. Acordamos medidas para promover o diálogo e a cooperação entre os nossos países de modo incremental, proativo, pragmático, aberto e transparente.

6. A situação econômica mundial melhorou desde a nossa primei-ra reunião, em Junho de 2009, em Ecaterinburgo. Saudamos a retomada do crescimento econômico, em que as economias emergentes estão desempenhando um papel muito importante. No entanto, reconhecemos que a fundação da recuperação eco-nômica mundial ainda não é sólida, permanecendo incertezas. Apelamos a todos os Estados a reforçar a cooperação macroe-conômica, conjuntamente assegurar a recuperação econômica mundial e alcançar um crescimento forte, sustentável e equi-librado. Reiteramos nossa determinação de fazer esforços po-sitivos na manutenção da recuperação econômica doméstica e promover o desenvolvimento nos nossos países e no mundo.

7. Destacamos a importância de manter a estabilidade relativa das principais moedas de reserva e sustentabilidade das polí-ticas fiscais, a fim de alcançar um crescimento forte, de longo prazo e equilibrado.

8. Estamos convencidos de que as economias emergentes e os paí-ses em desenvolvimento têm o potencial de desempenhar um

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papel ainda maior e mais ativo como motor de crescimento eco-nômico e de prosperidade, e de comprometer-se a trabalhar em conjunto com outros países para reduzir os desequilíbrios no desenvolvimento econômico global e promover inclusão social.

9. Os membros do G-20, com uma contribuição significativa dos países do BRIC, aumentaram muito os recursos disponí-veis ao FMI. Apoiamos o aumento de capital, sob o princípio da justa repartição de encargos, do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento e da Corporação Financeira Internacional, além de um apoio mais robusto, ágil e flexível às economias em desenvolvimento por parte dos bancos de desenvolvimento multilaterais.

10. Apesar de promissores sinais positivos, ainda há muito a ser feito. Acreditamos que o mundo precisa, hoje, de uma arqui-tetura financeira reformada e mais estável, que fará a econo-mia global menos propensa a crises futuras e mais resistente a elas, e que há maior necessidade de um sistema monetário internacional mais estável, previsível e diversificado.

11. Nós nos esforçaremos para alcançar uma conclusão ambiciosa para as reformas em curso, e há muito esperadas, das institui-ções de Bretton Woods. O FMI e o Banco Mundial precisam urgentemente resolver seus déficits de legitimidade. Refor-mar as estruturas de governança dessas instituições requer, em primeiro lugar, uma mudança substancial no poder de voto, em favor das economias emergentes de mercado e dos países em desenvolvimento, de modo a adequar sua participa-ção nos processos decisórios ao seu peso relativo na economia mundial. Conclamamos que a reforma no poder de voto no Banco Mundial seja realizada nas reuniões que se realizarão na próxima primavera, e esperamos que a reforma de cotas do FMI seja concluída na Cúpula do G-20, em novembro próxi-mo. Também concordamos com a necessidade de um método de seleção aberto e baseado em mérito, independentemente da nacionalidade, para os cargos de chefia do FMI e do Banco Mundial. Além disso, o pessoal dessas instituições deve refle-tir melhor a diversidade de seus membros. Há uma especial

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necessidade de aumentar a participação dos países em desen-volvimento. A comunidade internacional deve apresentar um resultado digno da confiança que todos nós depositamos nes-sas instituições, dentro do prazo acordado, ou correr o risco de vê-las desaparecer por obsolescência.

12. No interesse de promover a estabilidade econômica inter-nacional, nós pedimos aos nossos ministros das Finanças e Governadores de Bancos Centrais para analisar os acordos monetários regionais e discutir modalidades de cooperação entre nossos países nesta área. A fim de facilitar o comércio e o investimento, vamos estudar possibilidades de cooperação monetária, incluindo mecanismo de compensação comercial em moeda local entre nossos países.

13. Os acontecimentos recentes abalaram a crença na natureza de autorregulação dos mercados financeiros. Portanto, há uma necessidade premente de promover e reforçar a cooperação em matéria de regulação e supervisão de todos os segmentos, instituições e instrumentos dos mercados financeiros. Conti-nuamos empenhados em melhorar a nossa própria legislação nacional, para impulsionar a reforma do sistema financeiro internacional de regulação e de trabalhar em estreita colabo-ração com organismos internacionais de regulação, incluindo o Conselho de Estabilidade Financeira.

Comércio Internacional 14. Ressaltamos a importância do sistema de comércio multilate-

ral, consubstanciado na Organização Mundial do Comércio, para proporcionar um diálogo aberto, estável, equitativo e não discriminatório para o ambiente do comércio internacional. Neste contexto, nós nos comprometemos e instar todos os Es-tados a resistir a todas as formas de protecionismo comercial e a lutar contra restrições disfarçadas ao comércio. Concordamos na necessidade de uma solução global e equilibrada de nego-ciações comerciais multilaterais da Rodada Doha, de forma a que se cumpra o seu mandato como rodada do desenvolvimen-to, com base nos progressos já realizados, inclusive no que diz

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respeito à questão das modalidades. Tomamos nota e apoiamos fortemente a candidatura de adesão da Rússia à OMC.

Desenvolvimento 15. Reiteramos a importância da Declaração do Milênio das Na-

ções Unidas e a necessidade de alcançar os Objetivos do Milê-nio (ODM). Ressaltamos a importância de prevenir um poten-cial revés para os esforços dos países pobres que visem atingir os ODM, devido aos efeitos da crise econômica e financeira. Devemos também continuar a desenvolver esforços para al-cançar os ODM até 2015, inclusive através da cooperação técnica e do apoio financeiro aos países pobres na execução das políticas de desenvolvimento e proteção social para suas populações. Esperamos que a Cimeira dos ODM das Nações Unidas, em setembro de 2010, sirva para promover a imple-mentação, com o impulso de recomendações políticas. Ressal-tamos que os modelos de desenvolvimento sustentável e os caminhos dos países em desenvolvimento devem ser plena-mente respeitados e que é necessário que espaço político para os países em desenvolvimento seja garantido.

16. Os países mais pobres foram os mais afetados pela crise econô-mica e financeira. Os compromissos relativos à ajuda aos países em desenvolvimento, especialmente aqueles relacionados com os ODM, devem ser cumpridos, e não deve haver redução na ajuda ao desenvolvimento. Um processo inclusivo de cresci-mento para a economia mundial não é apenas uma questão de solidariedade, mas também uma questão de importância estra-tégica para a estabilidade política e econômica global.

17. Manifestamos a nossa satisfação com a Reunião de Ministros da Agricultura e de Desenvolvimento Agrário, em Moscou, onde discutiram maneiras de promover a cooperação quadri-partite, com especial atenção à agricultura familiar. Estamos convencidos de que isso irá contribuir para a produção global de alimentos e para a segurança alimentar. Congratulamo-nos com a sua decisão de criar um sistema de base de dados agrícolas dos países BRIC, de desenvolver uma estratégia para

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garantir o acesso aos alimentos para as populações mais vul-neráveis, de reduzir o impacto negativo da mudança do clima na segurança alimentar e reforçar a cooperação em agricultu-ra, tecnologia e inovação.

Combate à pobreza18. Instamos a comunidade internacional a fazer todos os esfor-

ços necessários para combater a pobreza, a exclusão social e a desigualdade, tendo em conta as necessidades especiais dos países em desenvolvimento, especialmente os países menos desenvolvidos, pequenas ilhas e países africanos. Apoiamos a cooperação técnica e financeira como forma de contribuir para a consecução do desenvolvimento social sustentável, com pro-teção social, pleno emprego e políticas e programas de traba-lho digno, dando especial atenção aos grupos mais vulnerá-veis, como os pobres, as mulheres, os jovens, os migrantes e as pessoas com deficiência.

Energia19. Reconhecemos que a energia é um recurso essencial para a

melhoria do padrão de vida de nossos povos e que o acesso à energia é de extrema importância para o crescimento eco-nômico com equidade e inclusão social. Nós buscaremos de-senvolver sistemas energéticos mais limpos, mais acessíveis e sustentáveis, promover o acesso à energia e tecnologias e práticas energéticas eficientes em todos os setores. Procurare-mos diversificar nossa matriz energética, aumentando, quan-do apropriado, a contribuição das fontes de energia renová-veis, e encorajaremos um uso mais limpo e mais eficiente dos combustíveis fósseis e outros combustíveis. Nesse sentido, reiteramos nosso apoio à cooperação internacional no domí-nio da eficiência energética.

20. Reconhecemos o potencial de tecnologias novas, emergentes e ambientalmente sustentáveis para a diversificação da matriz energética e a criação de postos de trabalho. Nesse sentido, pro-moveremos, conforme o caso, o desenvolvimento sustentável, a produção e a utilização de biocombustíveis. De acordo com as

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prioridades nacionais, vamos trabalhar em conjunto para facili-tar o uso de energias renováveis, por meio da cooperação inter-nacional e da troca de experiências sobre energias renováveis, incluindo tecnologias e políticas de biocombustíveis.

21. Acreditamos que os países-membros do BRIC podem coope-rar nas áreas de treinamento, pesquisa e desenvolvimento, serviços de consultoria e transferência de tecnologia no se-tor energético.

Mudança do Clima22. Reconhecemos que a mudança climática é uma ameaça grave

que requer ação global fortalecida. Nós nos comprometemos a promover a 16ª Conferência das Partes para a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e a 6ª Conferência das Partes servindo como Reunião das Partes do Protocolo de Kyoto, no México, para alcançar um acordo abrangente, equilibrado e vinculante que fortaleça a imple-mentação da Convenção e do Protocolo. Acreditamos que a Convenção e o Protocolo estabelecem o quadro para as nego-ciações internacionais sobre mudanças climáticas. As negocia-ções no México deveriam ser mais inclusivas, transparentes e deveriam levar a resultados justos e eficazes para enfrentar o desafio das mudanças climáticas, ao mesmo tempo refletin-do os princípios da Convenção, especialmente o princípio da equidade e responsabilidades comuns, porém diferenciadas.

Terrorismo23. Nós condenamos atos terroristas em todas as formas e ma-

nifestações. Observamos que a luta contra o terrorismo in-ternacional deve ser empreendida com o devido respeito à Carta da ONU, as convenções e protocolos internacionais, a Assembleia Geral da ONU e as resoluções do Conselho de Se-gurança relativas ao terrorismo internacional, e que a preven-ção de atos terroristas é tão importante quanto à repressão do terrorismo e seu financiamento. Neste contexto, apelamos para a rápida conclusão das negociações na Assembleia Geral

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da ONU da Convenção Global sobre Terrorismo Internacional e sua adoção por todos os Estados-Membros.

24. Brasil e China expressam seu pesar e solidariedade com os po-vos e governos da Rússia e Índia, que sofreram ataques ter-roristas bárbaros. O terrorismo não pode ser justificado por nenhum motivo.

Aliança das Civilizações25. Afirmamos a importância de incentivar o diálogo entre civili-

zações, culturas, religiões e povos. Neste contexto, apoiamos a “Aliança de Civilizações”, uma iniciativa das Nações Unidas, destinada à construção de pontes e à promoção do conheci-mento mútuo. Louvamos a decisão brasileira de sediar, no Rio de Janeiro, em maio de 2010, o 3º Fórum Global e confirma-mos a nossa intenção de estar presentes no evento, com repre-sentação de alto nível.

Haiti26. Reafirmamos nossa solidariedade ao povo haitiano, que tem

lutado sob circunstâncias terríveis desde o terremoto de 12 de janeiro e reiteramos nosso compromisso de reunir esforços com a comunidade internacional para ajudar a reconstruir o país, sob a orientação do governo haitiano, e de acordo com as prioridades estabelecidas pelo Plano de Ação para a Recupera-ção e o Desenvolvimento do Haiti.

27. Congratulamo-nos com as seguintes iniciativas setoriais que visam o reforço da cooperação entre nossos países: a. a primeira Reunião de Ministros da Agricultura e do Desen-

volvimento Agrário; b. Reuniões de Ministros das Finanças e Governadores dos Ban-

cos Centrais; c. Reuniões de Altos Representantes para questões de segurança; d. o I Programa de Intercâmbio de magistrados e juízes dos

países BRIC, realizada em março de 2010, no Brasil, após a assinatura, em 2009, do Protocolo de Intenções entre as Su-premas Cortes dos países do BRIC;

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e. o primeiro Encontro dos Bancos de Desenvolvimento; f. A primeira reunião dos Chefes de Instituições Estatísticas Na-

cionais; g. a Conferência das Autoridades de Concorrência; h. o primeiro Encontro das Cooperativas; i. o primeiro Fórum Empresarial; j. a Conferência de think tanks.

28. Apoiamos igualmente outras manifestações importantes do nosso desejo de aprofundar o nosso relacionamento, tais como: a. a publicação conjunta de nossas respectivas instituições esta-

tísticas nacionais, que será lançada hoje; b. um estudo de viabilidade para o desenvolvimento de uma en-

ciclopédia comum BRIC.

29. Reafirmamos nosso compromisso de promover a cooperação entre os países BRIC na ciência, cultura e esportes.

30. Expressamos nossa confiança no sucesso da Exposição Mundial em Xangai, em 2010; dos Jogos da Commonwealth de 2010 em Nova Deli; dos Jogos Mundiais de Estudantes em Kazan; da Olimpíada de Inverno de 2014; dos Jogos Paraolímpicos em Sochi; da Copa do Mundo de 2014 no Brasil; e das Olimpíadas e Jogos Paraolímpicos, de 2016 no Rio de Janeiro.

31. Reafirmamos os esforços para reforçar a nossa cooperação e assistência para a redução dos desastres naturais. Rússia e Ín-dia expressam suas condolências e solidariedade com o povo e os governos do Brasil e da China, pelas vidas perdidas no des-lizamento de terra no Rio de Janeiro, Brasil, e no terremoto em Yushu, China.

III Cúpula BRIC 32. Brasil, Rússia e Índia agradecem a proposta da China para se-

diar a III Cúpula do BRIC em 2011. 33. Rússia, Índia e China expressam sua profunda gratidão ao Go-

verno e ao povo do Brasil por sediar a II Cúpula do BRIC.

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sanya, China, 14 de abril de 2011

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1. Nós, os Chefes de Estado e de Governo da República Federa-tiva do Brasil, da Federação Russa, da República da Índia, da República Popular da China e da República da África do Sul, reunimo-nos em Sanya, Hainan, na China, para a Reunião dos Líderes do BRICS em 14 de abril de 2011.

2. Os Chefes de Estado e de Governo do Brasil, Rússia, Índia e China expressam sua satisfação com o ingresso da África do Sul no BRICS, e registram sua expectativa de reforçar o diálo-go e a cooperação com a África do Sul no âmbito do Fórum.

3. É o forte desejo comum por paz, segurança, desenvolvimento e cooperação que uniu os países do BRICS, com uma popula-ção de cerca 3 bilhões de cidadãos de diferentes continentes. O BRICS visa a contribuir para o desenvolvimento da huma-nidade e para o estabelecimento de um mundo mais justo e equânime.

4. O século XXI deve ser marcado pela paz, harmonia, coopera-ção e desenvolvimento científico. Sob o tema “Visão Ampla, Prosperidade Compartilhada”, conduzimos discussões francas e aprofundadas, alcançando abrangente consenso sobre o for-talecimento da cooperação no BRICS, bem como sobre a pro-moção da coordenação em questões internacionais e regionais de interesse comum.

5. Constatamos que o BRICS e outros países emergentes têm desempenhado importante papel, contribuindo de maneira significativa para a paz mundial, a segurança e a estabilidade, impulsionando o crescimento econômico global, reforçando o multilateralismo e promovendo maior democratização das relações internacionais.

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6. Nos planos econômico, financeiro e de desenvolvimento, o BRI-CS é uma importante plataforma de diálogo e cooperação. Esta-mos determinados a reforçar a parceria BRICS para o desenvol-vimento comum e a avançar, de forma gradual e pragmática, a cooperação intrabloco, refletindo os princípios de transpa-rência, solidariedade e assistência mútua. Reiteramos que essa cooperação é inclusiva e sem elemento de confronto. Estamos abertos a um crescente engajamento e cooperação com tercei-ros-países, em especial os emergentes e em desenvolvimento, assim como organizações internacionais e regionais.

7. Compartilhamos a visão de que o mundo está passando por amplas, complexas e profundas mudanças, marcadas pelo for-talecimento da multipolaridade, pela globalização econômica e pela crescente interdependência. Ao enfrentar esse ambien-te global em transição e uma infinidade de ameaças e desafios globais, a comunidade internacional deve unir esforços para fortalecer a cooperação em benefício do desenvolvimento comum. Com base em normas universalmente reconhecidas pelo direito internacional e com espírito de respeito mútuo e decisão coletiva, a governança econômica global deve ser re-forçada, a democracia nas relações internacionais deve ser es-timulada, e a voz dos países emergentes e em desenvolvimen-to deve ganhar maior ressonância nas relações internacionais.

8. Manifestamos o nosso forte compromisso com a diplomacia multilateral, com a Organização das Nações Unidas desempe-nhando papel central no trato dos desafios e ameaças globais. Nesse sentido, reafirmamos a necessidade de uma reforma abrangente das Nações Unidas, incluindo seu Conselho de Se-gurança, para assegurar maior eficácia, eficiência e represen-tatividade de modo a que possa melhor enfrentar os desafios globais da atualidade. China e Rússia reiteram a importância que atribuem a Brasil, Índia e África do Sul em assuntos inter-nacionais, e compreendem e apóiam sua aspiração de desem-penhar papel mais protagônico nas Nações Unidas.

9. Destacamos que a presença simultânea dos cinco países do BRICS no Conselho de Segurança durante o ano de 2011

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oferece valiosa oportunidade de se trabalhar de forma conjun-ta e estreita sobre questões de paz e segurança, com vistas a reforçar as abordagens multilaterais e a facilitar futura coor-denação sobre temas da agenda do Conselho de Segurança da ONU. Manifestamos nossa profunda preocupação com a tur-bulência no Oriente Médio, no Norte e no Oeste da África e desejamos sinceramente que os países afetados alcancem paz, estabilidade, prosperidade e progresso e que recuperem sua posição e sua dignidade no mundo de acordo com as legítimas aspirações de seus povos. Compartilhamos o princípio de que o uso da força deve ser evitado. Afirmamos que a independên-cia, a soberania, a unidade e a integridade territorial de cada nação devem ser respeitadas.

10. Desejamos dar continuidade a nossa cooperação no Conse-lho de Segurança das Nações Unidas sobre a questão na Líbia. Concordamos que todas as partes devem resolver suas diver-gências por meios pacíficos e pelo diálogo com a ONU e or-ganizações regionais competentes desempenhando os papéis que lhes cabem. Expressamos igualmente apoio ao Painel de Alto Nível da União Africana sobre a Líbia.

11. Reiteramos nossa firme condenação ao terrorismo em todas suas formas e manifestações e enfatizamos não haver justi-ficativa alguma a quaisquer atos de terrorismo. Acreditamos que as Nações Unidas têm papel central na coordenação da ação internacional contra o terrorismo, de acordo com a Car-ta das Nações Unidas e em conformidade com os princípios e normas do direito internacional. Nesse contexto, instamos a rápida conclusão das negociações, no âmbito da Assem-bléia Geral da ONU, da Convenção Global sobre Terrorismo Internacional e sua adoção por todos os Estados-Membros. Estamos determinados a reforçar nossa cooperação na luta contra essa ameaça global. Manifestamos nosso compromis-so de cooperar para o reforço da segurança internacional da informação. Conferiremos especial atenção à luta contra o crime cibernético.

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12. Observamos que a economia mundial se está recuperando gradualmente da crise financeira, mas ainda enfrenta incer-tezas. As principais economias devem continuar a reforçar a coordenação de suas políticas macro-econômicas e trabalhar conjuntamente para alcançar um crescimento forte, sustentá-vel e equilibrado.

13. Estamos empenhados em garantir que os países BRICS con-tinuarão a ter crescimento econômico forte e sustentado, apoiado por nossa crescente cooperação nas áreas econômica, financeira e comercial, o que contribuirá para o crescimento de longo prazo estável, consistente e equilibrado da economia mundial.

14. Apoiamos o Grupo dos Vinte (G-20), para que tenha papel cada vez maior nas questões de governança econômica global como o principal fórum para a cooperação econômica internacional. Esperamos da Cúpula do G-20 em Cannes, em 2011, resulta-dos positivos nos campos da economia, finanças, comércio e desenvolvimento. Apoiamos os esforços em curso dos mem-bros do G-20 para estabilizar os mercados financeiros inter-nacionais, para conseguir um crescimento forte, sustentável e equilibrado e para atingir o crescimento e desenvolvimento da economia global. A Rússia oferta para ser anfitriã da Cúpula do G-20 em 2013. Brasil, Índia, China e África do Sul expres-sam sua satisfação e apreço em relação à oferta russa.

15. Instamos a que sejam atingidas de maneira rápida as metas de reforma do Fundo Monetário Internacional, acordadas em Cúpulas anteriores do G-20, e reiteramos que a estrutura de direção das instituições financeiras internacionais deve refle-tir as mudanças na economia mundial, ampliando a voz e a representação dos países emergentes e em desenvolvimento.

16. Ao reconhecer que a crise financeira internacional evidenciou as inadequações e deficiências do sistema monetário e finan-ceiro internacional existente, apoiamos a reforma e aperfei-çoamento do sistema monetário internacional, por meio de um sistema de reservas internacionais abrangente e capaz de proporcionar estabilidade e segurança. Vemos com satisfação

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o debate em curso sobre o papel dos Diretos Especiais de Sa-que (SDR, na sigla em inglês) no sistema monetário interna-cional, incluindo a composição da cesta de moedas dos SDRs. Sublinhamos a necessidade de maior atenção para os riscos que os volumosos fluxos transnacionais de capitais represen-tam para os países emergentes. Propugnamos por reforma e supervisão regulatória financeira internacional adicional, por meio do fortalecimento da coordenação de políticas, da regu-lação financeira e de cooperação na supervisão, bem como por meio da promoção de um desenvolvimento consistente dos mercados financeiros globais e dos sistemas bancários.

17. A volatilidade excessiva dos preços das commodities, particu-larmente no caso dos alimentos e energia, apresenta novos riscos para a recuperação em curso da economia mundial. Apoiamos a comunidade internacional no reforço da coope-ração para garantir a estabilidade e o forte desenvolvimento de mercados físicos, reduzindo distorções em ampliando a re-gulação do mercado financeiro. A comunidade internacional deve trabalhar em conjunto para aumentar a capacidade de produção, fortalecer o diálogo entre produtores e consumido-res para equilibrar a oferta e a demanda e aumentar o apoio aos países em desenvolvimento em termos de financiamento e tecnologias. A regulação do mercado de derivativos de com-modities deverá ser adequadamente reforçado de modo a evi-tar atividades capazes de desestabilizar os mercados. Também é necessário abordar o problema da escassez de informação confiável e atualizada sobre a oferta e a demanda em nível in-ternacional, regional e nacional. O BRICS promoverá coopera-ção mais estreita em matéria de segurança alimentar.

18. Apoiamos o desenvolvimento e o uso de recursos energéticos renováveis. Reconhecemos o importante papel das energias renováveis como meio para fazer face à mudança do clima. Es-tamos convencidos da importância da cooperação e do inter-câmbio de informações na área do desenvolvimento de fontes de energias renováveis.

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19. A energia nuclear deverá a ser elemento importante na compo-sição da matriz energética dos países do BRICS. A cooperação internacional no desenvolvimento seguro da energia nuclear para fins pacíficos deve ter continuidade em condições de estri-ta observância dos pertinentes requisitos e padrões no que se refere ao projeto, construção e operação de usinas nucleares.

20. Acelerar o crescimento sustentável dos países em desenvolvi-mento é um dos principais desafios para o mundo. Acredita-mos que o crescimento e o desenvolvimento são fundamentais para enfrentar a pobreza e alcançar as Metas de Desenvolvi-mento do Milênio. Erradicar a pobreza extrema e a fome é um imperativo moral, social, político e econômico da humanidade e um dos maiores desafios globais que o mundo enfrenta hoje, especialmente os países de menor desenvolvimento relativo na África e em outros continentes.

21. Instamos a comunidade internacional a implementar ativa-mente o documento final adotado pelo Plenário da Reunião de Alto Nível da Assembléia Geral das Nações Unidas sobre o De-senvolvimento do Milênio realizada em setembro de 2010 e a alcançar as Metas de Desenvolvimento do Milênio até 2015, como previsto.

22. A mudança do clima é uma das ameaças globais que desa-fia comunidades e países. Brasil, China, Rússia e Índia apre-ciam e apóiam a África do Sul como sede da COP17/CMP7 da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima. Apoiamos os acordos de Cancún e estamos prontos a concertar esforços com a comunidade internacional com vistas à conclusão exitosa das negociações na Conferência de Durban, de acordo com o mandato do “Mapa do Caminho de Bali” e em consonância com o princípio da equidade e das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Nós nos comprometemos a trabalhar para um resultado global, equi-librado e vinculante com vistas a reforçar a implementação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e seu Protocolo de Quioto. O BRICS intensificara a cooperação na Conferência de Durban. Reforçaremos nossa

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cooperação pragmática com vistas a adaptar nossas econo-mias e sociedades às mudanças do clima.

23. A realização do desenvolvimento sustentável, como ilustram a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimen-to, a Agenda 21, o Plano de Implementação de Joanesburgo e os tratados multilaterais ambientais, deve ser importante veículo para a promoção do desenvolvimento econômico. Chi-na, Rússia, Índia e África do Sul manifestam seu apoio para a realização no Brasil da Conferência das Nações Unidas de 2012 sobre Desenvolvimento Sustentável e estão dispostos a trabalhar com o Brasil para chegar a um compromisso político novo e alcançar resultados positivos e práticos nas áreas de crescimento econômico, desenvolvimento social e proteção ambiental no quadro do desenvolvimento sustentável. Brasil, Rússia, China e África do Sul apreciam e apóiam a Índia como sede da XI Conferência das Partes (COP-11) da Convenção sobre Diversidade Biológica e da VI Conferência das Partes - Reunião das Partes (CoP/MoP-6) do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, a ser realizada em outubro de 2012.

24. Sublinhamos nosso firme compromisso em reforçar o diálogo e a cooperação nos domínios da proteção social, trabalho de-cente, igualdade de gênero, juventude e saúde pública, incluin-do a luta contra o HIV / AIDS.

25. Apoiamos o desenvolvimento de infraestruturas na África e sua industrialização no quadro da NEPAD (Nova Parceria para o Desenvolvimento da África).

26. Concordamos em continuar expandindo e aprofundando a coo-peração, econômico-comercial e em investimentos entre nossos países. Encorajamos todos os países a se absterem de recorrer a medidas protecionistas. Congratulamo-nos com os resultados da reunião de Ministros do Comércio do BRICS, realizada em Sanya, em 13 de abril de 2011. Brasil, China, Índia e África do Sul continuam empenhados – e instam outros membros a se-gui-los – na promoção de um sistema multilateral de comércio forte, aberto e apoiado em sistema multilateral baseado em re-gras e centrado na organização mundial de comércio. Da mesma

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forma, defendem a conclusão bem sucedida, abrangente e equi-librada da Rodada de Doha de desenvolvimento, a partir dos progressos já alcançados e em consonância com seu mandato de promoção do desenvolvimento. Brasil, Índia, China e África do Sul estendem seu total apoio para a rápida adesão da Rússia à Organização Mundial do Comércio.

27. Analisamos os progressos da cooperação no BRICS em vários campos e compartilhamos a percepção de que essa cooperação tem sido enriquecedora e mutuamente benéfica e que há um vasto campo para o estreitamento da cooperação no âmbito do BRICS. Estamos concentrados na consolidação da coope-ração intra-BRICS e no desenvolvimento de uma agenda pró-pria. Estamos determinados a traduzir nossa visão política em ações concretas e endossamos o Plano de Ação em anexo, que servirá como base para a cooperação futura. Revisaremos a implementação do Plano de Ação durante nossa próxima Reu-nião de Cúpula.

28. Tencionamos explorar a cooperação na esfera da ciência, tec-nologia e inovação, incluindo a utilização pacífica do espaço exterior. Felicitamos o povo russo e o governo sobre o 50º ani-versário do voo de Yuri Gagarin ao espaço, que inaugurou uma nova era no desenvolvimento da ciência e da tecnologia.

29. Expressamos nossa confiança no sucesso da Universíada de 2011, em Shenzhen; os Jogos Mundiais Estudantis de 2013, em Kazan; os Jogos Olímpicos da Juventude em Nanjing, em 2014; os Jogos Olímpicos de Inverno e Jogos Paraolímpicos em Sochi, em 2014; a Copa do Mundo do Brasil em 2014; os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos no Rio de Janeiro, em 2016; e da Copa do Mundo de 2018, na Rússia.

30. Estendemos nossas mais profundas condolências ao povo do Japão pela grande perda de vidas na catástrofe que assolou o país. Continuamos a apoiar o Japão a superar as consequên-cias dessas catástrofes.

31. Os líderes de Brasil, Rússia, Índia e África do Sul estendem seus mais sinceros agradecimentos à China por sediar a

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Reunião de Cúpula do BRICS e ao Governo Provincial de Hai-nan e ao Governo Municipal de Sanya e a seu povo por seu apoio ao encontro.

32. Brasil, Rússia, China e África do Sul agradecem a Índia pela oferta de sediar a Reunião de Líderes do BRICS em 2012, ofe-recem-lhe seu apoio total.

Plano de AçãoFormulamos o “Plano de Ação”, que estabelece as bases para a

cooperação no âmbito do BRICS e que tem como objetivo de forta-lecer a cooperação BRICS e beneficiar nossos povos.

I. Reforçar os programas de cooperação existentes1. Realizar o III Encontro de Altos Representantes para questões

de segurança no segundo semestre de 2011, na China.2. Realizar a reunião dos Ministros das Relações Exteriores à

margem da Sessão 66ª da Assembleia Geral da ONU.3. Manter reunião de sherpas / sub-sherpas no devido tempo.4. Promover reuniões periódicas e informais de representantes

de organizações internacionais com sede em Nova York e Ge-nebra.

5. Realizar reuniões Ministros das Finanças e Governadores dos Bancos Centrais no âmbito do G-20 e durante as reuniões anuais do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional.

6. Realizar o Encontro de Peritos em Agricultura e a Segunda Reunião de Ministros da Agricultura, em 2011, na China, com vistas à cooperação em temas agrícolas incluindo a criação do Sistema de Informação Agrícola do BRICS e a realização de se-minário sobre segurança alimentar.

7. Realizar Encontro dos Chefes de Instituições Nacionais de Es-tatística em setembro de 2011, na China.

8. Realizar a II Conferência Internacional do BRICS sobre Con-corrência em setembro de 2011, na China, e explorar a possi-bilidade de assinar um acordo de cooperação entre agências de antimonopólio.

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9. Continuar a realizar simpósios de think-tanks do BRICS.10. Promover o estabelecimento de contatos entre instituições

empresariais e realizar outro Foro Empresarial previamente à próxima Cúpula do BRICS.

11. Fortalecer a cooperação financeira entre os bancos de desen-volvimento do BRICS.

12. Implementar o Protocolo de Intenção entre as Cortes Supre-mas do BRICS.

13. Lançar a Publicação Conjunta Estatística por países do BRICS.14. Continuar a realizar o Encontro de Cooperativas.

II. Novas áreas de cooperação1. Realizar o primeiro encontro de Cidades Irmãs e Governos Lo-

cais do BRICS em 2011, na China.2. Realizar reunião de Ministros da Saúde em 2011, na China.3. Fomentar pesquisas conjuntas sobre questões econômicas e

comerciais.4. Atualizar, quando cabível, o Catálogo Bibliográfico do BRICS.

III. Novas propostas 1. Implementar cooperação no campo cultural, em consonância

com a determinação dos líderes BRICS;2. Incentivar a cooperação esportiva;3. Explorar a viabilidade da cooperação no domínio da economia

verde;4. Realizar uma reunião de Altos Funcionários para exploras as

possibilidades de promover a cooperação científica, tecnológi-ca e de inovação no âmbito do BRICS, incluindo o estabeleci-mento de um grupo de trabalho sobre cooperação na indústria farmacêutica;

5. Estabelecer, na UNESCO, o “Grupo BRICS-UNESCO”, com vis-tas a desenvolver estratégias comuns no âmbito do mandato da Organização.

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nova delhi, índia, 20 de março de 2012

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Parceria dos BRICS para a Estabilidade, Segurança e Prosperidade

Declaração de Nova Delhi

1. Nós, os líderes da República Federativa do Brasil, da Federa-ção da Rússia, da República da Índia, da República Popular da China e da República da África do Sul, reunimo-nos em Nova Delhi, na Índia, em 29 de março de 2012, para a quarta Cúpu-la do BRICS. Nossas discussões, sob o tema “BRICS Parceria para a Estabilidade Global, Segurança e Prosperidade”, foram conduzidas em atmosfera calorosa e de cordialidade, e inspi-radas pela vontade comum de reforçar nossa parceria para o desenvolvimento comum e de desenvolver nossa cooperação, na base da abertura, solidariedade, cooperação, compreensão e confiança mútuas.

2. Nós nos reunimos sob o pano de fundo de desenvolvimentos e mudanças de grande importância global e regional - uma re-cuperação vacilante da economia global tornada mais comple-xa devido à situação na zona do euro; preocupações quanto ao desenvolvimento sustentável e à mudança do clima, que assu-mem maior relevância à medida que nos aproximamos da Con-ferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentá-vel (Rio+20) e da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, que serão sediados no Brasil e na Índia, respectivamente, ao longo deste ano; a próxima Cúpula do G-20 no México e a recém-realizada 8ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra; e o ce-

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nário político em curso no Oriente Médio e no Norte da África, que vemos com preocupação crescente. Nossas deliberações de hoje refletem nosso consenso no sentido de mantermos nosso engajamento com a comunidade mundial no momento em que fazemos face, de forma responsável e construtiva, a esses desa-fios ao bem-estar e à estabilidade globais.

3. O BRICS é uma plataforma para o diálogo e a cooperação entre países que representam 43% da população do mundo, para a promoção da paz, segurança e desenvolvimento em um mun-do multipolar, interdependente e cada vez mais complexo e globalizado. Por sermos provenientes de Ásia, África, Europa e América Latina, a dimensão transcontinental de nossa inte-ração ganha em valor e significado.

4. Nós vislumbramos um futuro marcado pela paz mundial, pro-gresso econômico e social e de atitude realista e esclarecida. Estamos prontos a trabalhar em conjunto com outros países desenvolvidos e em desenvolvimento, com base em normas uni-versalmente reconhecidas do direito internacional e decisões multilaterais, para lidar com os desafios e as oportunidades do mundo atual. A representação ampliada de países emergentes e em desenvolvimento nas instituições de governança global au-mentará a sua eficácia na consecução desse objetivo.

5. Estamos preocupados com a atual situação econômica internacional. Enquanto os BRICS se recuperaram da cri-se internacional de modo relativamente rápido, as perspecti-vas de crescimento em todo o mundo têm sido afetadas pela instabilidade dos mercados, especialmente na zona do euro. A acumulação de dívidas soberanas e preocupações quanto ao ajuste fiscal de médio e longo prazos em economias avan-çadas estão criando um ambiente de incertezas quanto ao crescimento global. Ademais, a excessiva liquidez decorrente de agressivas políticas adotadas por bancos centrais para es-tabilizar suas economias têm se espraiado para as economias emergentes, provocando excessiva volatilidade nos fluxos de capital e nos preços de commodities. A prioridade imediata é restaurar a confiança dos mercados e retomar o crescimento

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econômico. Trabalharemos com a comunidade internacional para assegurar a coordenação ampla de políticas com vistas a manter estabilidade macroeconômica visando à recuperação saudável da economia.

6. Nós acreditamos ser crucial para as economias avançadas adotar políticas macroeconômicas e fiscais responsáveis, que evitem acumulação excessiva de liquidez internacional e que empreendam reformas estruturais para estimular o cresci-mento que gera empregos. Chamamos a atenção para o risco de volumosos e voláteis fluxos transfronteiriços de capital que enfrentam economias emergentes. Instamos por mais ampla reforma com maior supervisão financeira internacional, com o fortalecimento de políticas de coordenação e regulação e de cooperação, bem como a promoção de sólidos desenvolvimen-tos dos mercados financeiros globais e sistemas bancários.

7. Nesse contexto, acreditamos que o papel central do G-20 como principal foro para a cooperação econômica internacional é de facilitar a ampla coordenação de políticas macroeconômicas, de forma a permitir a recuperação econômica internacional e assegurar a estabilidade financeira, inclusive por intermédio de uma arquitetura monetária e financeira internacional mais aperfeiçoada. Aproximamo-nos da próxima Cúpula do G-20 no México com o compromisso de trabalhar juntamente com a Presidência do Grupo, com todos os seus membros e com a comunidade internacional para alcançar resultados positivos e consistentes com o arcabouço de políticas nacionais, para as-segurar o crescimento forte, sustentável e equilibrado.

8. Reconhecemos a importância da arquitetura financeira global para a manutenção da estabilidade e da integridade do siste-ma monetário e financeiro internacional. Em consequência, demandamos uma arquitetura financeira mais representativa, com a ampliação da voz e da representação de países em de-senvolvimento e o estabelecimento de um sistema monetário internacional justo e aprimorado, que possa atender o inte-resse de todos os países e apoiar o desenvolvimento de eco-nomias emergentes e em desenvolvimento. Essas economias

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têm apresentado um expressivo crescimento, contribuindo de forma significativa para a recuperação da economia global.

9. Preocupa-nos, contudo, o ritmo lento das reformas das cotas e da governança do FMI. Torna-se urgente a necessidade de implementar, antes da Reunião Anual do FMI/Banco Mun-dial de 2012, a Reforma de Governança e de Cota acordada em 2010, assim como uma revisão abrangente da fórmula de cota de forma a melhor refletir os pesos econômicos e ampliar a voz e a representação dos mercados emergentes e países em desenvolvimento até janeiro de 2013, seguida de finalização da próxima revisão geral de cotas até janeiro de 2014. Esse processo dinâmico de reforma é necessário para assegurar a legitimidade e eficácia do Fundo. Enfatizamos que os esforço em andamento para aumentar a capacidade de empréstimo do FMI somente serão exitosos se houver confiança de que todos os membros da instituição estão verdadeiramente empenha-dos em fielmente implementar a Reforma de 2010. Trabalha-remos junto com a comunidade internacional para garantir que suficientes recursos poderão ser mobilizados para o FMI em tempo hábil, enquanto o Fundo continua sua transição para aperfeiçoar sua governança e sua legitimidade. Reitera-mos nosso apoio a medidas voltadas para a proteção de voz e representatividade dos países mais pobres do FMI.

10. Conclamamos o FMI a tornar sua estrutura de supervisão mais integrada e equilibrada, observando que as propostas do FMI para uma nova decisão integrada sobre supervisão sejam consideradas antes da reunião do FMI em abril.

11. No presente ambiente econômico internacional, nós reco-nhecemos que há uma necessidade premente de se ampliar a disponibilidade de recursos para financiamento do desen-volvimento de economias emergentes e em desenvolvimento. Conclamamos, portanto, o Banco Mundial a atribuir crescente prioridade à mobilização de recursos e ao atendimento das ne-cessidades de financiamento ao desenvolvimento, bem como à redução de custos de empréstimos e à adoção de mecanis-mos inovadores de empréstimo.

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12. Acolhemos positivamente as candidaturas do mundo em desenvolvimento para o cargo de Presidente do Banco Mun-dial. Reiteramos que as Direções do FMI e do Banco Mundial devem ser escolhidas com base em um processo aberto e ba-seado no mérito. Adicionalmente, a nova liderança do Banco Mundial deve se comprometer a transformar o Banco em uma instituição multilateral que verdadeiramente reflita a visão de todos seus membros, incluindo a estrutura da governan-ça de forma a refletir a atual realidade política e econômica. Ademais, a natureza do Banco deve evoluir de uma instituição que atua essencialmente como intermediária da cooperação Norte-Sul para uma instituição que promova parcerias iguali-tárias com todos os países, de forma a incorporar a temática do desenvolvimento e superar a ultrapassada dicotomia entre doadores-receptores.

13. Consideramos a possibilidade de estabelecimento de um novo Banco de Desenvolvimento voltado para a mobilização de recur-sos para projetos de infraestrutura e de desenvolvimento sus-tentável em países do BRICS e em outras economias emergentes e países em desenvolvimento, com vistas a suplementar os es-forços correntes de instituições financeiras multilaterais e regio-nais de promoção do crescimento e do desenvolvimento inter-nacionais. Instruímos nossos Ministros de Finanças a examinar a viabilidade e possibilidade de implementação dessa iniciativa e a estabelecer um grupo de trabalho conjunto para realizar os estudos necessários e reportá-los na próxima Cúpula.

14. O Brasil, a Índia, a China e a África do Sul aguardam com ex-pectativa a Presidência russa do G-20 em 2013 e oferecem sua cooperação.

15. O Brasil, a Índia, a China e a África do Sul congratulam a Fe-deração da Rússia por sua acessão à OMC. Esse fato torna a OMC mais representativa e fortalece o sistema multilateral de comércio baseado em regras. Nós nos comprometemos a trabalhar juntos para proteger esse sistema, e conclamamos outros países a resistir a todas as formas de protecionismo co-mercial e restrições disfarçadas ao comércio.

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16. Continuaremos nossos esforços para uma conclusão bem su-cedida da Rodada Doha, com base no progresso já alcançado e mantendo seu mandato original. Para tanto, exploraremos resultados em áreas específicas onde progressos sejam possí-veis, preservando, ao mesmo tempo, a centralidade do desen-volvimento e mantendo o arcabouço geral do empreendimento único (“single undertaking”). Não apoiamos iniciativas plurila-terais contrárias aos princípios fundamentais da transparência, da inclusão e do multilateralismo. Acreditamos que tais iniciati-vas não apenas desviam os membros da busca de um resultado coletivo, mas também deixam de resolver o déficit de desenvol-vimento herdado de rodadas anteriores. Uma vez concluído o processo de ratificação, a Rússia tenciona participar de forma ativa e construtiva da Rodada Doha visando um resultado equi-librado da Rodada que auxiliará no fortalecimento e desenvol-vimento do sistema multilateral de comércio.

17. Considerando que a UNCTAD é o ponto focal do sistema das Nações Unidas para o tratamento dos temas de comércio e desenvolvimento, tencionamos investir no aprimoramento de suas atividades tradicionais de construção de consensos, cooperação técnica e pesquisa em temas de desenvolvimento econômico e comércio. Reiteramos nosso desejo de contribuir ativamente para o sucesso da UNCTAD XIII, em abril de 2012.

18. Concordamos em mobilizar nossas sinergias e em trabalhar juntos para intensificar os fluxos de comércio e investimento entre nossos países, de modo a fazer avançar nossos respecti-vos objetivos de desenvolvimento industrial e de geração de emprego. Acolhemos positivamente os resultados da segunda reunião de Ministros do Comércio dos países do BRICS rea-lizada em Nova Delhi, em 28 de março de 2012. Apoiamos a realização de consultas regulares entre nossos Ministros de Comércio e examinamos a adoção de medidas adequadas para facilitar a progressiva consolidação de nossos laços comerciais e econômicos. Também com satisfação, acolhemos a conclu-são, entre nossos bancos de desenvolvimento/eximbanks, do Acordo-Quadro para Extensão de Facilitação de Crédito

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em Moeda Local no âmbito do Mecanismo Interbancário de Cooperação do BRICS e do Acordo para Facilitação de Confir-mação de Cartas Multilaterais de Crédito. Estamos certos de que esses acordos servirão como instrumentos úteis para esti-mular o comércio intra-BRICS nos próximos anos.

19. Reconhecemos a importância vital que a estabilidade, a paz e a segurança do Oriente Médio e do Norte da África têm para todos nós, para a comunidade internacional e, acima de tudo, para esses próprios países e seus cidadãos, cujas vidas têm sido afetadas pela turbulência que eclodiu na região. Deseja-mos ver esses países vivendo em paz, recuperando a estabili-dade e prosperidade, como respeitáveis membros da comuni-dade internacional.

20. Concordamos que esse período de transformação em curso no Oriente Médio e no Norte da África não deve ser usado como pretexto para o adiamento de resoluções de conflitos duradouros, mas sim que sirva como incentivo para solucio-ná-los, em particular o conflito árabe-israelense. A resolução desse e de outros temas regionais de longa duração melhoria, de forma geral, a situação no Oriente Médio e no Norte da África. Assim, reiteramos nosso compromisso de uma solução abrangente, justa e duradoura para o conflito árabe-israelen-se que esteja baseada no arcabouço legal internacionalmente reconhecido, incluindo as resoluções relevantes das Nações Unidas, os princípios de Madri e a Iniciativa Árabe para a Paz. Encorajamos o Quarteto a intensificar seus esforços, e requeremos maior envolvimento do Conselho de Segurança das Nações Unidas na busca da resolução desse conflito. Tam-bém sublinhamos a importância de negociações diretas entre as partes para se alcançar soluções definitivas. Conclamamos palestinos e israelenses a adotar medidas construtivas, res-tabelecer a confiança mútua e criar as condições favoráveis à retomada das negociações, evitando medidas unilaterais, em particular atividades de assentamento nos Territórios Palesti-nos Ocupados.

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21. Manifestamos nossa profunda preocupação com a atual situa-ção na Síria e apelamos pelo fim imediato de toda violência e violações de direitos humanos naquele país. O interesse de to-dos seria mais bem atendido mediante o tratamento da crise por meios pacíficos que encorajem amplos diálogos nacionais refletindo as legítimas aspirações de todos os setores da socie-dade síria e o respeito à independência, à integridade territorial e à soberania da Síria. Nosso objetivo é facilitar um processo político inclusivo conduzido pelos sírios, e acolhemos positi-vamente os esforços das Nações Unidas e da Liga Árabe nes-se sentido. Incentivamos o governo sírio e todos os setores da sociedade síria a demonstrar disposição política para iniciar tal processo, o único capaz de criar um novo ambiente para a paz. Acolhemos positivamente a nomeação do Sr. Kofi Annan como Enviado Especial para a crise da Síria, bem como o progresso em curso na busca de uma solução política para a crise.

22. A situação relativa ao Irã não pode permitir escalada rumo ao conflito, com consequências desastrosas que não interessam a ninguém. O Irã tem um papel crucial a desempenhar no de-senvolvimento pacífico e na prosperidade de sua região, de grande relevância política e econômica, e esperamos que faça sua parte como membro responsável da comunidade interna-cional. Preocupa-nos a situação que envolve a questão nuclear iraniana. Reconhecemos o direito do Irã ao uso pacífico da energia nuclear, consistente com suas obrigações internacio-nais, e apoiamos a resolução das questões envolvidas median-te diálogo e meios políticos e diplomáticos entre as partes, inclusive entre a AIEA e o Irã, e de acordo com as resoluções relevantes do Conselho de Segurança.

23. O Afeganistão necessita de tempo, assistência ao desenvolvi-mento e cooperação, acesso preferencial a mercados interna-cionais, investimentos estrangeiros e clara estratégia nacional com vistas à obtenção da paz duradoura e estabilidade. Apoia-mos o compromisso da comunidade internacional com o Afe-ganistão, anunciado na Conferência Internacional de Bonn, em dezembro de 2011, no sentido de manter o engajamento

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durante a década de transformação de 2015 a 2024. Afirma-mos nosso compromisso em apoiar a emergência do Afega-nistão como um Estado pacífico, estável e democrático, livre do terrorismo e do extremismo, e sublinhamos a necessida-de de cooperação regional e internacional mais eficaz para a estabilização do Afeganistão, inclusive no que diz respeito ao combate ao terrorismo.

24. Estendemos nosso apoio aos esforços no sentido de combater o tráfico ilícito de ópio originário do Afeganistão no âmbito do Pacto de Paris.

25. Reiteramos não existir justificativa de qualquer ordem para atos de terrorismo em todas as formas de manifestação. Rea-firmamos nossa determinação de reforçar a cooperação no enfrentamento dessa ameaça, e acreditamos que as Nações Unidas desempenham papel central na coordenação de ações internacionais contra o terrorismo, no marco da Carta das Nações Unidas e em consonância com os princípios e normas do direito internacional. Sublinhamos a necessidade de uma próxima conclusão do projeto da Convenção Abrangente so-bre Terrorismo Internacional durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, e sua adoção por todos os estados-membros de forma a propiciar uma abrangente estrutura legal para en-frentar esse flagelo internacional.

26. Manifestamos nosso forte compromisso com a diplomacia multilateral, com a Organização das Nações Unidas desempe-nhando papel central no trato dos desafios e ameaças globais. Nesse sentido, reafirmamos a necessidade de uma reforma abrangente das Nações Unidas, incluindo seu Conselho de Segurança, para assegurar maior eficácia, eficiência e repre-sentativa, de modo a que possa melhor enfrentar os desafios globais da atualidade. China e Rússia reiteram a importância que atribuem a Brasil, Índia e África do Sul nos assuntos inter-nacionais e apoiam sua aspiração de desempenhar papel mais protagônico nas Nações Unidas.

27. Recordamos nossa coordenação no Conselho de Segurança durante o ano de 2011 e sublinhamos nosso compromisso de

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atuar conjuntamente nas Nações Unidas, de continuar nossa cooperação e de reforçar o tratamento multilateral de temas re-lativos à paz e à segurança internacionais nos próximos anos.

28. A aceleração do crescimento e desenvolvimento sustentável, em conjunto com segurança alimentar e energética, encon-tram-se entre os desafios mais importantes da atualidade e são centrais para o tratamento do desenvolvimento econômi-co, erradicação da pobreza, combate à fome e desnutrição em muitos países em desenvolvimento. Faz-se premente a criação de empregos necessários à melhoria dos níveis de vida. O de-senvolvimento sustentável é também um elemento-chave de nossa agenda para a recuperação global e investimentos para estimular o crescimento futuro. Temos essa responsabilidade para com nossas futuras gerações.

29. Congratulamos a África do Sul pelo êxito como sede da 17ª Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Cli-ma e da 7ª Conferência das Partes na qualidade de reunião das Partes do Protocolo de Quioto (COP17/CMP17), em dezem-bro de 2011. Acolhemos positivamente os significativos resul-tados da Conferência e estamos dispostos a trabalhar com a comunidade internacional para a implementação dessas deci-sões, de acordo com os princípios de equidade e responsabili-dades comuns porém diferenciadas e respectivas capacidades.

30. Estamos inteiramente comprometidos a fazer nossa parte na luta internacional para enfrentamento das questões de mu-dança do clima e contribuiremos para os esforços interna-cionais no tratamento da temática de mudança do clima por meio de crescimento sustentável e inclusivo e não limitativo ao desenvolvimento. Sublinhamos que os países desenvolvi-dos que são Parte da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima devem prover ampliado apoio financeiro, tecnológico e capacitação para a preparação e implementação, por parte dos países em desenvolvimento, de ações nacional-mente apropriadas de mitigação.

31. Estamos certos de que a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Ri0+20) oferece oportunidade

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única para que a comunidade internacional renove seu compro-misso político de alto-nível de apoiar a ampla estrutura de de-senvolvimento sustentável, abrangendo crescimento e desen-volvimento econômico sustentável, progresso social e proteção ambiental, de acordo com os princípios e provisões da Declara-ção do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, incluindo o princípio de responsabilidades comuns porém diferenciadas, a Agenda 21 e o Plano de Implementação de Joannesburgo.

32. Consideramos que o desenvolvimento sustentável deve ser o principal paradigma em questões ambientais, assim como para estratégias econômicas e sociais. Reconhecemos a rele-vância e foco dos principais temas da Conferência, especial-mente a Economia Verde no contexto do Desenvolvimento Sustentável e da Erradicação da Pobreza assim como a Estru-tura Institucional para o Desenvolvimento Sustentável.

33. A China, a Rússia, a Índia e a África do Sul esperam trabalhar com o Brasil, sede dessa importante Conferência, em junho, para um resultado exitoso e prático do encontro. O Brasil, a Rússia, a China e a África do Sul também empenham seu apoio à Índia, que sediará a 11ª reunião da Conferência entre as Partes para a Convenção sobre Diversidade Biológica, em outubro de 2012, e esperam um resultado positivo. Continua-remos nossos esforços para a implementação da Convenção e seus Protocolos, com especial atenção ao Protocolo de Na-góia sobre o Acesso a Recursos Genéticos e Repartição Justa e Equitativa de Benefícios Derivados de sua Utilização, ao Plano Estratégico para a Biodiversidade 2011-2020 e à Estratégia para a Mobilização de Recursos.

34. Afirmamos que o conceito de “economia verde”, ainda a ser de-finido na Rio+20, deve ser entendido no contexto mais abran-gente de desenvolvimento sustentável e erradicação da pobre-za, como um meio para se alcançar essas prioridades de maior hierarquia e não um fim em si mesmo. Deve-se dar às autori-dades nacionais flexibilidade e espaço político para que façam suas próprias escolhas com amplo leque de opções, e definam caminhos rumo ao desenvolvimento sustentável, baseado no

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estágio de desenvolvimento do país, estratégias nacionais, cir-cunstâncias e prioridades. Resistimos a introdução de barreiras de comércio e investimento, independentemente de seu forma-to, vinculada ao desenvolvimento da economia verde.

35. Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) perma-necem um marco fundamental na agenda de desenvolvimen-to. De forma a capacitar os países em desenvolvimento a obter os máximos resultados no alcance dos Objetivos de Desen-volvimento do Milênio no prazo acordado de 2015, devemos assegurar que o crescimento desses países não será afetado. Qualquer desaceleração aportará sérias consequências para a economia mundial. Alcançar os ODMs é fundamental para assegurar o crescimento inclusivo, equitativo e sustentável, e requererá continuado foco nesses objetivos mesmo depois de 2015, requerendo ampliados esforços de financiamento.

36. Atribuímos a mais alta importância ao crescimento econô-mico que apoie o desenvolvimento e a estabilidade na África, dado que muitos desses países ainda não realizaram comple-tamente seu potencial econômico. Levaremos adiante nossa cooperação em apoio aos esforços de aceleração da diversifica-ção e modernização de suas economias. Isso se fará por meio do desenvolvimento de infraestrutura, intercâmbio de conhe-cimento e apoio à ampliação do acesso à tecnologia, aumento da capacitação com investimento em capital humano, inclusi-ve no contexto da Nova Parceria para o Desenvolvimento da África (NEPAD).

37. Expressamos nosso compromisso com o alívio da crise huma-nitária que ainda afeta milhões de pessoas no Chifre da África e apoiamos os esforços internacionais nesse sentido.

38. A excessiva volatilidade nos preços dos produtos de base, par-ticularmente de alimentos e energia, coloca riscos adicionais para a recuperação da economia mundial. A regulamentação aprimorada dos mercados derivados de produtos de base é essencial para evitar impactos desestabilizadores sobre o su-primento de alimentos e energia. Consideramos que a capaci-dade ampliada de produção de energia e o fortalecimento do

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diálogo produtor-consumidor são importantes iniciativas que contribuirão para diminuir essa volatilidade de preços.

39. A energia baseada em combustíveis fósseis continuará a domi-nar as matrizes energéticas em futuro previsível. Expandire-mos as fontes de energia limpa e renovável e o uso de tecnolo-gias alternativas eficientes para atender a demanda crescente de nossas economias e nossos povos, e também para respon-der às preocupações relativas ao clima. Nesse contexto, enfa-tizamos que a cooperação internacional no desenvolvimento de energia nuclear segura para fins pacíficos deve continuar sob condições de estreita observância dos padrões relevantes de segurança e requisitos relativos a desenho, construção e operação de plantas de energia nuclear. Sublinhamos o pa-pel essencial da AIEA nos esforços conjuntos da comunidade internacional no sentido de ampliar os padrões de segurança nuclear, com o objetivo de aumentar a confiança pública na energia nuclear como uma fonte de energia limpa, economica-mente acessível e segura, vital para atender à demanda mun-dial de energia.

40. Tomamos nota dos substantivos esforços realizados para aprofundar a cooperação intra-BRICS em inúmeros setores. Estamos convencidos de que há um grande estoque de conhe-cimento, know-how, capacidades e “boas práticas” disponível em nossos países que podemos compartilhar e a partir do qual podemos construir uma significativa cooperação para o bene-fício de nossos povos. Com esse objetivo, endossamos o Plano de Ação para o próximo ano.

41. Apreciamos os resultados do Segundo Encontro dos Minis-tros de Agricultura e de Desenvolvimento Agrário do BRICS, realizado em Chengdu, China, em outubro de 2011. Instruí-mos nossos Ministros a levar esse processo adiante com foco particular no potencial de cooperação entre os BRICS para contribuir efetivamente para a segurança alimentar e a nu-trição mundiais por meio da produção agrícola aprimorada e da produtividade, transparência em mercados, reduzindo a excessiva volatilidade nos preços dos produtos de base, de for-

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ma a elevar a qualidade de vida dos povos, particularmente do mundo em desenvolvimento.

42. A maioria dos países do BRICS faz face a numerosos desafios similares no campo da saúde pública, incluindo o acesso uni-versal aos serviços de saúde, o acesso a tecnologias de saúde, inclusive medicamentos, os custos crescentes e o aumento nos gastos com doenças transmissíveis e não transmissíveis. Recomendamos que os encontros de Ministros de Saúde do BRICS, cujo primeiro realizou-se em Pequim, em julho de 2011, sejam de agora em diante institucionalizados de forma a enfrentar esses desafios comuns da maneira mais eficaz em termos de custos, mais equitativa e sustentável.

43. Tomamos nota do encontro de Altos Funcionários em Ciência e Tecnologia em Dalian, China, em setembro de 2011, e, em particular, da crescente capacidade de pesquisa e desenvolvi-mento e inovação em nossos países. Incentivamos esse pro-cesso tanto em áreas prioritárias como alimentos, produtos farmacêuticos, saúde e energia, quanto em pesquisa básica nos campos inter-disciplinares emergentes de nanotecnolo-gia, biotecnologia, ciência de materiais avançados etc. Incen-tivamos o fluxo de conhecimentos entre nossas instituições por meio de projetos conjuntos, seminários e intercâmbio de jovens cientistas.

44. Os desafios da rápida urbanização, enfrentados por todas as sociedades em desenvolvimento, inclusive as nossas próprias, são de natureza multidimensional e cobrem uma diversidade de temas interligados. Instruímos nossas respectivas autori-dades a coordenar esforços e aprender com as “melhores prá-ticas” e tecnologias disponíveis, de modo a trazer benefícios para nossas sociedades. Constatamos, com satisfação, a rea-lização do primeiro encontro de Cidades Irmãs no âmbito do BRICS, em Sanya, em dezembro de 2011, e levaremos adiante esse processo com a realização de um Fórum de Urbanização e Infraestrutura Urbana conjuntamente com a realização do Segundo Encontro de Cidades Irmãs no âmbito do BRICS e do Fórum de Cooperação de Governos Locais.

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45. Dadas nossas crescentes necessidades de fontes de energia renovável e de energia eficiente e de tecnologias favoráveis ao meio ambiente, assim como nossas potencialidades com-plementares nessas áreas, concordamos em intercambiar conhecimento, know-how, tecnologia e “melhores práticas” nesses setores.

46. Temos satisfação em lançar o primeiro Relatório do BRICS, coordenado pela Índia, com foco especial nas sinergias e com-plementaridades de nossas economias. Acolhemos com sa-tisfação os resultados da cooperação entre os Institutos Na-cionais de Estatística do BRICS e tomamos nota que a edição atualizada da Publicação Estatística do BRICS, lançada hoje, serve como uma útil referência sobre os países do BRICS.

47. Expressamos nossa satisfação com a realização do III Fórum Empresarial do BRICS e do II Fórum Financeiro e reconhece-mos seu papel para estimular relações comerciais entre nossos países. Nesse contexto, acolhemos com satisfação o estabele-cimento da “BRICS Exchange Alliance”, uma iniciativa de bol-sas de valores relacionadas com o BRICS.

48. Incentivamos os canais de comunicação, troca e contatos dire-tos entre as pessoas, inclusive nas áreas de juventude, educa-ção, cultura, turismo e esporte.

49. O Brasil, a Rússia, a China e a África do Sul estendem seu ca-loroso apreço e seus sinceros agradecimentos ao Governo e ao povo da Índia por sediar a IV Cúpula do BRICS em Nova Delhi.

50. O Brasil, a Rússia, a Índia e a China agradecem a África do Sul pelo oferecimento de sediar a V Cúpula do BRICS em 2013 e oferecem seu pleno apoio.

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Plano de Ação de Nova Delhi

1. Encontros de Ministros de Relações Exteriores à margem da AGNU.

2. Encontros de Ministros de Finanças e Governadores de Ban-cos Centrais à margem das reuniões do G20/outras reuniões multilaterais (FMI/BIRD).

3. Encontros de autoridades financeiras e fiscais à margem de eventos multilaterais ou, quando requeridos, encontros espe-cíficos.

4. Encontros de Ministros de Comércio à margem de eventos multilaterais, ou, quando requeridos, encontros específicos.

5. Terceiro Encontro de Ministros de Agricultura do BRICS, pre-cedido de reunião preparatória de especialistas em produtos agrícolas e segurança alimentar e do segundo encontro do Grupo de Trabalho de Especialistas em Agricultura.

6. Encontro de Altos Representantes responsáveis por seguran-ça nacional.

7. Segundo Encontro do BRICS de Altos Funcionários em C&T.8. Primeiro Encontro do Fórum de Urbanização do BRICS e o

segundo encontro de Cidades Irmãs no âmbito do BRICS e o Fórum de Cooperação de Governos Locais em 2012 na Índia.

9. Segundo Encontro dos Ministros de Saúde do BRICS.10. Encontro intermediário de Sub-Sherpas e Sherpas.11. Encontro intermediário do GCTEC (Grupo de Contato para

Temas Econômicos e Comerciais).12. Terceiro Encontro de Autoridades de Concorrência do BRICS

em 2013.13. Encontro de Especialistas sobre o novo Banco de Desenvolvi-

mento.14. Encontro de autoridades financeiras para acompanhamento

dos resultados do Relatório do BRICS.

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Declaração Conjunta da IV Cúpula de Chefes de Estado/Governo

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15. Consultas entre as Missões Permanentes dos países do BRICS em Nova York, Viena e Genebra, quando requeridas.

16. Encontros de consultas entre Altos Funcionários do BRICS à margem dos foros internacionais relevantes relacionados a meio ambiente e mudança do clima, quando requeridos.

17. Novas áreas de cooperação a serem exploradas:i. Cooperação multilateral em energia no âmbito do BRICS.

ii. Avaliação acadêmica geral sobre a futura estratégia de lon-go termo para o BRICS.

iii. Diálogo do BRICS sobre Políticas para a Juventude.

iv. Cooperação sobre temas relacionados à População. 

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PartiCiPantes das mesas-redondas

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Affonso Celso de Ouro-Preto

Formou-se no Instituto de Estudos Políticos de Paris em 1956 e graduou-se no Instituto Rio Branco em 1963. Serviu na Divisão de Europa Oriental, em 1963, na Secretaria-Geral-Adjunta para As-suntos da Europa Oriental e Ásia e no Gabinete do Ministro de Es-tado, em 1964. Serviu na Embaixada em Washington, entre 1966 e 1969, na Embaixada em Viena, entre 1970 e 1973, e na Embaixada em Bissau até 1974. Posteriormente, serviu na Divisão de África até 1977, quando passou a servir na delegação permanente em Genebra. Tornou-se chefe da Divisão de África em 1979. Embaixador em Bissau em 1983, Chefe da Delegação brasileira na Conferência Técnica sobre a Institucionalização do Parlamento Latino-Americano em 1987, Em-baixador em Estocolmo de 1990 a 1993, Chefe de Gabinete do Minis-tro de Estado de 1993 a 1995, Embaixador em Viena, de 1995 a 1999, e em Pequim, de 1999 a 2003. Em 2004 assumiu o posto de Represen-tante brasileiro para Assuntos do Oriente Médio na Secretaria-Geral das Relações Exteriores, posto que ocupou até 2010. Atualmente, é Diretor do Instituto de Estudos Brasil-China (IBRACH).

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Alberto pfeifer

Formou-se em Direito e em Engenharia Agronômica pela Uni-versidade de São Paulo. Especialização em Finanças (MBA), pelo Co-mitê para Divulgação do Mercado de Capitais (CODIMEC), Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ) e Instituto Brasileiro do Mercado de Capitais (IBMEC). Mestrado em Economia Aplicada (Agrária) pela ESALQ/USP, com dissertação a respeito da agricultura e o ajuste do setor externo da economia brasileira nas décadas de 1970 e 1980. Mestrado em Re-lações Internacionais pela Fletcher School of Law and Diplomacy da Tufts University (EUA), com dissertação sobre a negociação do acordo de associação entre o MERCOSUL e a União Europeia. Graduou-se Doutor em Ciências em 2000, pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo (FFLCH/USP), na área de Geografia Humana, com tese acerca dos efeitos do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA) no México. Atual-mente é Diretor Executivo Internacional e do Capítulo Brasileiro do Conselho Empresarial da América Latina (CEAL), Assessor da Presi-dência da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, Professor do MBA em Comércio Internacional da Fundação Instituto de Administração (FIA) da Universidade de São Paulo, Membro do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional (GACINT) da Universidade de São Paulo, Colaborador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) e Membro da International Studies Association (ISA) e da American Political Science Association (APSA).

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Anna Jaguaribe

Possui mestrado e doutorado em Sociologia pela Universidade de Nova Iorque e pós-graduação na École Pratique des Hautes Études. Trabalhou no escritório das Nações Unidas em Nova Iorque no perí-odo de 1977 a 1983 e como consultora para a UNCTAD em Genebra. Foi pesquisadora na China no período de 1998 a 2003 e, atualmen-te, professora visitante do Programa de Políticas Públicas, Estraté-gias e Desenvolvimento da UFRJ e diretora do Instituto de Estudos Brasil-China (IBRACH).

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Antonio Jorge Ramalho da Costa

É graduado em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (1989), mestre em em Ciência Política pelo IUPERJ (1992) e em Relações Internacionais pela Maxwell School of Citizenship and Public Affairs – Syracuse University (1999) e doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (2002). É professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília desde 1993, onde exerceu os cargos de coordenador de graduação e de pós-graduação, além de Chefe de Departamento. Dirigiu o Departamento de Coo-peração/SEC do Ministério da Defesa e a implantação do Centro de Estudos Brasileiros em Porto Príncipe, Haiti. Integrou a Assesso-ria de Defesa da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. É autor de Relações internacionais: Teorias e agendas (IBRI-FUNAG, 2002). Representa a área de Relações Internacionais junto ao Comitê de Área da CAPES e coordena as atividades da área na Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP). Sua pesquisa e produção científica concentram-se nas áreas de Teoria das Relações Internacionais, Segurança Internacional, Defesa Nacional e Política Externa dos Estados Unidos.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Antonio Walber Matias Muniz

Doutorando do Programa de Integração da América Latina (USP, 2011). Mestre em Direito Constitucional (UNIFOR, 2008). Especia-lista em: Negócios Internacionais (UNIFOR, 2005), Direito Público (UFPE, 2003), Literatura Brasileira (UECE, 1992), Língua Portugue-sa (UECE, 1988). Graduado em: Direito (UNIFOR 1998); Pedago-gia, Administração Escolar (UECE 1991); Letras, Língua Portuguesa (UECE 1984) e Língua Espanhola (UECE 1987). Professor. Membro do Núcleo de Estudos Internacionais – NEI/UNIFOR/FUNAG-MRE. Membro da Comissão de Direito da Integração do IAB-RJ. Especiali-dade: Direito Constitucional, Direito Internacional Público – Proces-sos de Integração Regional, Relações Internacionais Contemporâneas – Brasil com América Latina.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Carlos Márcio Bicalho Cozendey

Diplomata brasileiro. Graduou-se em Ciências Econômicas pela Faculdade de Economia e Administração da UFRJ. Terceiro Se-cretário em 16/12/1986; Segundo Secretário em 18/6/1991; Pri-meiro Secretário, por merecimento, em 26/12/1997; Conselheiro, por merecimento, em 30/12/2002; e Ministro de Segunda Classe, por merecimento, em 22/12/2006. Fez o Curso de Preparação à Carreira Diplomática do Instituto Rio Branco (1985), Mestrado em Relações Internacionais pela UnB (1994), o Curso de Aper-feiçoamento de Diplomatas (1994) e o Curso de Altos Estudos (2005). Serviu na Delegação Permanente em Genebra (1992), na Delegação Permanente junto à ALADI, em Montevidéu (1993), e na Missão junto à CEE, em Bruxelas (2003). Assessor na Divisão de Política Comercial (1987), Assessor Especial da Presidência da República, na Secretaria Executiva da Câmara de Comércio Exte-rior (1998), Chefe da Divisão do Mercado Comum do Sul (1999), Professor de Economia do Instituto Rio Branco (2000) e Diretor do Departamento Econômico (2007). Tese para o Curso de Altos Es-tudos: MERCOSUL: União Aduaneira?. Atualmente é Secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda e Vice-Ministro de Finanças (Deputy Finance Minister) do Brasil no G20.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Eliane Cantanhêde

Eliane Cantanhêde é colunista da “Folha” em Brasília. Foi di-retora da sucursal da “Folha” em Brasília de 1997 a 2003. Jorna-lista carioca formada pela Universidade de Brasília, foi repórter da “Veja”, chefe de redação do “Jornal do Brasil”, colunista de “O Es-tado de S. Paulo” e diretora de redação do “O Globo” e da “Gazeta Mercantil”.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Elizabeth Sidiropoulos

Diretora do South African Institute of International Affairs (SAIIA) desde 2005. Entre 1999 e 2005 foi Diretora de Pesquisa na referida instituição. Foi Diretora de Pesquisa do South African Institute of Race Relations e Editora do periódico South Africa Survey. Atualmente, edita o periódico South African Journal of International Affairs. Possui um mes-trado em Relações Internacionais pela Universidade de Witwatersrand. Suas áreas de especialidade são política externa sul-africana, governan-ça global e o papel de potências emergentes na África.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Fernando Meireles de Azevedo Pimentel

Diplomata brasileiro. Formou-se em Ciências Econômicas pela Universidade de São Paulo (1991) e graduou-se no curso do Instituto Rio Branco em 1995. Foi coordenador-alterno no Grupo de Serviços do Mercosul entre 1997 e 1999, professor-assistente de política exter-na brasileira nos anos de 1999 e 2000, assessor no Gabinete do Minis-tro de Estado entre 1999 e 2001. Serviu nas Embaixadas Brasileiras em Washington (2001), em Nova Delhi (2004) e em Assunção (2007). Desde 2009 trabalha na Secretaria de Assuntos Internacionais do Mi-nistério da Fazenda. Foi representante do Brasil no Grupo de Peritos do G20 sobre “financiamento das mudanças do clima” (2009) e so-bre “eliminação dos subsídios aos combustíveis fósseis” (2009). Foi chefe de delegação no grupo de trabalho do G20 sobre marco para crescimento forte, sustentável e equilibrado (2010) e presidente do subgrupo de trabalho do G20 sobre controle de capitais (2010), presi-dente do subgrupo de trabalho do G20 sobre mercados de commodities (2012) e presidente do grupo de trabalho sobre fundo contingente de reservadas dos BRICS (2012). É secretário adjunto da Assessoria Internacional do Ministério da Fazenda desde 2010.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Flávio Soares Damico

Diplomata brasileiro. Graduou-se em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1982). Especialista em Economia pelo Centro de Estudos e Pesquisas Econômicas da UFRGS (1984). Terceiro Secretário em 16/12/1987; Segundo Secretário em 20/12/1993; Primeiro Secretário, por merecimento, em 22/12/1999; Conselheiro, por merecimento, em 30/6/2004; Ministro de Segun-da Classe, por merecimento, em 29/6/2007. Serviu na Missão junto à ONU, em Nova Iorque (1992); na Embaixada em Montevidéu (1995); na Delegação Permanente em Genebra (2001) e na Delegação junto à Organização Mundial do Comércio (2008). Foi assistente na Divisão de Ciência e Tecnologia (1988); assessor na Secretaria-Geral de Controle (1990) e na Secretaria-Geral Executiva (1991); assistente na Divisão das Nações Unidas (1998); secretário do Conselho Consultivo Nacional das Nações Unidas, Timor Leste – colocado à disposição da UNTAET (2000); assessor no Departamento de Organismos Internacionais (2000); chefe da Delegação na 32ª Sessão do Comitê de Aditivos e Contaminantes do Codex Alimentarius, em Rotterdam (2002); chefe da Divisão de Agri-cultura e Produtos de Base (2004); presidente do Comitê de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias da OMC durante 48ª, 49ª e 50ª Sessões (2010-2011); presidente do Comitê de Licenciamento de Importações da OMC (2011); chefe da Delegação na Reunião de Altos Funcionários da ASPA, em Cairo (2012); chefe da Delegação na Reunião de Altos Fun-cionários da ASPA, em Nova Iorque (2012) e chefe da Delegação na XIII Reunião de Altos Funcionários do Focalal, em Bogotá (2012). Tese para o Curso de Altos Estudos: O G-20 de Cancún a Hong Kong: interações en-tre as diplomacias pública e comercial (2007). Coautor do livro Agricultural Expansion and Policies in Brazil (Stanford, Califórnia, 2007). Atualmente é diretor do Departamento de Mecanismos Inter-regionais (2011).

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Fyodor Lukyanov

Acadêmico e editor-chefe da revista Russia in Global Affairs desde 2002. Graduou-se em 1991 na Universidade Estatal de Moscou em relações internacionais. Além disso, possuiu graduação em línguas germânicas. É colunista sobre assuntos internacionais para vários veículos de comunicação, como The Moscow Times e a edição russa da Forbes Megazine. É membro do Comitê Executivo do Conselho so-bre Política Externa e de Defesa, uma organização independente que provê expertise em temas de política externa, membro do Conselho Presidencial sobre Direitos Humanos e membro do conselho de peri-tos da agência de notícias RIA Novosti.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Gelson Fonseca Júnior

Diplomata de carreira. Foi Presidente da Fundação Alexandre de Gusmão – FUNAG (1992-1995), Representante Permanente do Brasil junto às Nações Unidas (1999-2003), Embaixador em Santiago (2003-2006) e Cônsul-Geral em Madri (2006-2009). É autor de A legi-timidade e outras questões internacionais (Paz e Terra, 1998), O interesse e a regra: ensaios sobre o multilateralismo (Paz e Terra, 2008) e diversos artigos sobre política externa brasileira e relações internacionais.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Giorgio Romano Schutte

Atualmente é Professor Adjunto, Coordenador do Curso de Re-lações Internacionais e membro do corpo docente do Programa de pós-graduação em Ciências Humanas e Sociais (PCHS) da Universida-de Federal do ABC (UFABC). Possui graduação e mestrado em Relações Internacionais pela Universidade de Amsterdam (1987) e doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (2003). Foi Técnico em Planejamento e Pesquisa e Coordenador da área de estudo de econo-mia e política internacional do IPEA. Atuou como professor de Rela-ções Internacionais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo e consultor sênior do Banco Mundial como Regional Advisor da Aliança de Cidades/Cities Alliance. Ocupou cargos na administração pública fe-deral (Presidência da República) e municipal (Prefeituras de São Paulo e Santo André). Tem experiência na área de ciências sociais, com ênfa-se em relações internacionais, atuando principalmente nos seguintes temas: economia política internacional, globalização, geopolítica da energia, governança internacional, políticas públicas, sindicalismo, em-presas multinacionais, reestruturação produtiva e integração. Membro do Grupo de Estudos da Conjuntura da Fundação Perseu Abramo e do Grupo de Conjuntura Internacional da USP (GACINT).

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Henrique Altemani de Oliveira

Atualmente é Professor no Programa de Relações Internacionais da Universidade Estadual da Paraíba e Professor de Relações Interna-cionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Coordenador do Grupo de Estudos Ásia Pacífico, Membro da Red de Estudios de América Latina y el Caribe sobre Asia del Pacífico (REDEALAP), Pes-quisador do Observatório Iberoamericano de Ásia-Pacífico e membro da Rede Iberoamericana de Sinologia. Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (1970), mestrado em Sociolo-gia pela Universidade de São Paulo (1979) e doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (1988). Tem experiência na área de Relações Internacionais, com ênfase em Política Externa do Brasil, atuando principalmente nos seguintes temas: China, Política Externa Brasileira, Ásia-Pacífico e Segurança Estratégica. 

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Jin Canrong

Professor e Vice-Reitor da Escola de Estudos Internacionais da Universidade Chinesa de Renmin e Professor-Visitante da Universi-dade de Michigan, nos Estados Unidos. Graduou-se em ciência polí-tica pela Universidade de Fundan, em Xangai, mestre pela Academia de Ciências Sociais da China e Ph.D pela Universidade de Pequim. É Vice-Presidente da Associação Chinesa de Estudos Internacionais, da Associação para Estudos do Pacífico, Conselheiro do Escritório de Planejamento de Políticas Públicas e Conselheiro Permanente do Congresso Nacional do Povo. Suas áreas de interesse incluem política norte-americana, política externa dos Estados Unidos, relações Chi-na-Estados Unidos e política externa chinesa.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

João Pontes Nogueira

Professor-assistente da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e supervisor geral do BRICS Policy Center. Possui graduação em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1984), mestrado em relações internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1994), doutorado em rela-ções internacionais pela University of Denver (1998) e pós-doutorado pela University of Victoria (2008). É coautor de Teoria das Relações Internacionais: Correntes e debates (com Nizar Messari, Campus, 2005) e diversos artigos e capítulos de livro sobre relações internacionais. É membro do corpo editorial de publicações acadêmicas de relações internacionais (Contexto Internacional, International Political Sociology, Cena Internacional) e diretor da Associação Brasileira de Relações In-ternacionais.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

José Vicente de Sá Pimentel

Embaixador. Graduou-se em Direito pela Universidade de Brasí-lia (1970). Serviu nas Embaixadas em Washington (1973), Santiago (1976), Paris (1982), Guatemala (1985), Nova Delhi (2004) e Pretória (2008). Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI) de maio de 2011 a junho de 2012. Atualmente é o Presidente da Fundação Alexandre de Gusmão.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Lenina Pomeranz

Professora-associada da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (USP). Possui gradua-ção em Ciências Econômicas pela Universidade de São Paulo (1959) e doutorado em Planificação Econômica pelo Instituto Plejanov de Moscou de Planificação da Economia Nacional (1967). É organizado-ra dos volumes Dinâmica do capitalismo contemporâneo: Homenagem a M. Kalecki (EdUSP, 2001) e Perestroika: Os desafios da transformação social na URSS (EdUSP, 1990). Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia Internacional, atuando principalmente nos seguintes temas: Rússia, Rússia Pós-Soviética, URSS, Países Pós-So-cialistas e Socialismo.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Luis Augusto Castro Neves

Diplomata de carreira, atualmente é Presidente do Centro Brasi-leiro de Relações Internacionais (CEBRI). Graduou-se no Instituto Rio Branco em 1968. Graduou-se, também, em ciências econômicas em 1969 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em economia pela University of London (1977). Foi Professor de economia no Instituto Rio Branco (1969), na Universidade de Brasília (1979) e assessor do Ministro de Estado (1969). Serviu nas embaixadas em Buenos Aires (1972), Londres (1974), Ottawa (1994) e nas divisões de Produtos de Base (1977). e Recursos Minerais e Energia (1978). Chefiou o Departamento das Américas (1995). Na Presidência da República, foi Subchefe de Assuntos Econômicos da Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional (1985) e Secretário-Executivo de Assuntos Estratégicos (1992). Foi membro do Conselho de Adminis-tração de Itaipu Binacional (1996). Foi Secretário-Geral Adjunto das Relações Exteriores (1998) e Embaixador do Brasil nas embaixadas em Assunção (2000), Pequim (2004) e Tóquio (2008).

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Luis Antônio Balduino Carneiro

Atualmente é Diretor do Departamento de Assuntos Financei-ros e Serviços do Ministério das Relações Exteriores. Graduou-se em Ciências Econômicas pela Universidade de Brasília (UnB) em 1987. Trabalhou no Departamento de Administração, (1987), na Divisão de Política Comercial (1988), foi Professor Assistente de Política Externa Brasileira Contemporânea no Instituto Rio Branco (1989). Serviu na Delegação Permanente em Genebra (1991) e na Delegação Permanente Junto à ALADI, em Montevidéu (1994), na Embaixada em Washington (1998) e na Embaixada em Nova Delhi (2004). Foi Diretor-Executivo Alterno para a cadeira brasileira no Banco Mundial (2001), Chefe-Substituto na Divisão de Acesso a Mercados (2003), Coordenador Nacional do Grupo Negociador de Acesso a Mercados no âmbito da ALCA (2003) e Chefe da Coordenação-Geral de Assun-tos Financeiros (2007-2009). Concluiu o Curso de Altos Estudos em 2007, com tese acerca do SGP-C entre os países em desenvolvimento.

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Participantes das Mesas-Redondas

Debatendo o BRICS

Marcio Pochmann

Presidente da Fundação Perseu Abramo. Foi presidente do Ins-tituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) de 2007 a 2012. Economista formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com especialização em ciências políticas e em relações do traba-lho. É doutor em economia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Docente da Unicamp desde 1995, Pochmann é profes-sor livre-docente licenciado na área de economia social e do trabalho e também pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Econo-mia do Trabalho da UNICAMP desde 1989. Foi diretor executivo do centro entre 1997 e 1998. Também já foi consultor do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e de organismos multilaterais das Nações Unidas, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Foi ainda secretário municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade de São Paulo entre 2001 e 2004. Já escreveu e organizou mais de 30 livros, entre eles A década dos mitos, vencedor do Prêmio Jabuti na área de economia em 2002, e a série Atlas da exclusão no Brasil.

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Maria Edileuza Fontenele Reis

Diplomata brasileira. Graduou-se em Comunicação Social pela Universidade de Brasília (UnB) e em Culture et Civilisation Française pela École International de Langue et Civilisation Française, Paris, em 20/2/1976. Terceira-Secretária em 1/12/1978; Segunda-Secretária em 1/12/1980; Primeira-Secretária, por merecimento, em 30/6/1989; Con-selheira, por merecimento, 23/6/1995; Ministra de Segunda Classe, por merecimento, 28/6/2000; Ministra de Primeira Classe em 22/12/2006. Cursos realizados: Instituto Rio Branco (1978); Curso de Aperfeiçoa-mento de Diplomatas (1982); Curso de Altos Estudos (1998); Especiali-zação em Relações Internacionais, no Centro Studi Diplomatici Strategici Roma/École des Hautes Études en Relations Internationales (2002). Serviu nas Embaixadas em Bridgetown (1980), Kingston (1982) e São Domingos (1993); e nos Consulados em Tóquio (1996) e Roma (2001). Assistente da Divisão de Atos Internacionais (1978), Assessora do De-partamento de Comunicação e Documentação (1980), Chefe do Serviço de Seleção e Aperfeiçoamento da Divisão do Pessoal (1981), Assessora do Departamento do Serviço Exterior (1988), Assessora da Subsecretaria--Geral de Administração (1989), Chefe substituta da Divisão Especial de Avaliação Política e de Programas Bilaterais (1990), Assessora da Subse-cretaria-Geral de Planejamento Político e Econômico (1992), Assessora da Subsecretaria-Geral de Planejamento Diplomático (1994), Coordena-dora Geral da Coordenação Geral de Modernização (2004), Diretora do Departamento da Europa (2006), Coordenadora da Comissão Técnica Brasil-França para a Construção da Ponte sobre o Rio Oiapoque (2006), Alta Funcionária do Brasil para a Cúpula América Latina e Caribe-União Europeia (2007), Coordenadora Nacional da Cúpula Ibero-America-na(2007), Coordenadora do lançamento do Diálogo Político de Alto Nível Brasil-União Europeia (2007), Subsecretária-Geral Política II (2010).

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Marcelo Fernandes Guimarães

Coordenador-Geral de Análises Econômicas, na Secretaria de Po-lítica Agrícola do Ministério da Agricultura. É funcionário de Carreira da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) e exerceu fun-ções de assessoria e coordenação nos Ministérios do Planejamento e da Agricultura. Foi Professor da Associação de Ensino Unificado de Brasília (Uneb). Trabalhou em empresas de consultoria e instituições financeiras. Graduado em ciências econômicas pela Universidade de Brasília, com especialização em economia agrícola pelo Wye College da Universidade de Londres e mestrado em agronegócios pela Univer-sidade de Brasília.

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Oliver Stuenkel

Oliver Stuenkel é professor adjunto de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, com atuação em São Paulo. Tem inte-resse em potências emergentes, especificamente na política externa do Brasil e da Índia e seu impacto sobre a governança global. Sua ex-periência de trabalho inclui projetos com as Nações Unidas no Bra-sil, a Cooperação Técnica Alemã (GTZ) nas Ilhas Fidji e a Secretaria do MERCOSUL em Montevidéu. Ele foi professor visitante na Uni-versidade de São Paulo (USP), na School of International Studies na Jawaharlal Nehru University (JNU) e professor de colégio no interior do Rajasthan, na Índia. Dr. Stuenkel fala alemão, holandês, francês, hindi, italiano, espanhol, inglês e português e tem conhecimento bási-co de urdu. Tem graduação pela Universidade de Valência na Espanha, mestrado em Políticas Públicas pela Kennedy School da Harvard Uni-versity, onde foi McCloy Scholar, e doutorado em ciência política pela Universidade Duisburg-Essen, na Alemanha.

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Paulo Nogueira Batista Júnior

É diretor-executivo no Fundo Monetário Internacional, onde representa o Brasil, a Colômbia, a República Dominicana, o Equa-dor, a Guiana, o Haiti, o Panamá, o Suriname e Trindade e Tobago. Formou-se em ciências econômicas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, em 1977. Em 1978, concluiu o mestrado em história econômica pela London School of Economics and Political Science. Foi subsecretário de planejamento econômico do Ministério do Planejamento (1985-1986), assessor especial do ministro para assuntos de dívida externa do Ministério da Fazenda (1986-1987), chefe do Centro de Estudos Monetários Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, (1986-1989) e professor e pesqui-sador do Departamento Econômico da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo (1989-2006).

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Renato Baumann

Professor de Economia Internacional da Universidade de Brasília (UnB) e técnico do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Bacharel e Mestre em Economia pela Universidade de Brasília (1972 e 1976). Doutor em Economia pela Universidade de Oxford, Inglaterra (1982). Diretor do Escritório de Representação da CEPAL no Brasil (1995-2010). Assessor da Vice-Presidência (PREM) do Banco Mun-dial, de junho a novembro de 2010. Flemings Visiting Professor em Economia, Centre for Brazilian Studies, Universidade de Oxford, de maio a junho de 1999. Professor na Maestría en Desarrollo Econó-mico en América Latina – Universidad Internacional de Andalucía – Campus La Rábida, Espanha, de 25 a 29 de setembro de 2006 e de 6 a 10 de outubro de 2008.

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Rezkalla Tuma

Conselheiro do Conselho Superior de Comércio Exterior da Fe-deração das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Foi Presidente do Conselho Estadual Parlamentar de Comunidades de Raízes e Cul-turas Estrangeiras – CONSCRE – no biênio 2004-2005. Foi parte da delegação brasileira durante o XVI Congresso Pan-americano Árabe, em 2010, no qual foi eleito parte do Conselho Executivo da Federação de Entidades Americano-Árabes. Rezkalla Tuma é formado em direito.

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Ronaldo Mota Sardenberg

Diplomata brasileiro. Formou-se pela Faculdade Nacional de Di-reito – Universidade do Brasil (RJ), em 1963. Foi aprovado em concur-so pelo Instituto Rio Branco (IRBr), em 1964, e promovido a Ministro de Primeira Classe em 1983. Atuou como Embaixador do Brasil em Moscou e em Madri. Foi, por duas vezes, Representante Permanen-te do Brasil junto às Nações Unidas (ONU), em Nova York. Chefiou, nos biênios 1993-94 e 2004-05, a Delegação Brasileira ao Conselho de Segurança da ONU, Exerceu a função de Chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, responsável pelas políticas nuclear e espacial, e pelos temas do Projeto Sipam/Sivam, da pesquisa sobre segurança das comunicações, do Projeto Brasil 2020 e do Programa Calha Norte (PCN). Foi Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, de julho de 1999 a 2002, couberam-lhe realizações da presidência da Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inova-ção; lançamento e institucionalização dos Fundos Setoriais de Desen-volvimento Científico e Tecnológico; criação do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), dos Programas Nacionais da Sociedade da Informação, Tecnologia Industrial Básica, e dos Serviços Tecnoló-gicos para a Inovação e Competitividade, Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Social. Também foram de sua responsabilidade a estruturação da cooperação internacional do MCT , as políticas nucle-ar e espacial e a presidência da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima.

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Rubens Antônio Barbosa

Diplomata brasileiro. Graduou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro (1960). Terceiro Secretário em 7/11/1962; Segundo Secretá-rio, em 1/12/1966; Primeiro Secretário, em 1/1/1973; Conselheiro, em 19/3/1976, Ministro de Segunda Classe, em 12/12/1979; Ministro de Pri-meira Classe, em 29/6/1984. Fez o Curso de Preparação à Carreira Diplo-mática do Instituto Rio Branco (1961) e Mestrado em Estudos Regionais, América Latina, pela London School of Economics (1971). Serviu nas Em-baixadas em Londres (1966 e 1994) e Washington (1999). Cônsul Adjunto no Consulado-Geral em Londres (1972). Oficial de Gabinete no Gabinete do Ministro de Estado (1963 e 1964), Assistente na Secretaria de relações com o Congresso (1963), Assistente no Departamento da Ásia, África e Oceania (1972), Assessor no Departamento Econômico (1973), Chefe de Gabinete da Secretaria de Educação e Cultura/DF (1974), Assessor no Departamento da Europa (1974), Chefe da Divisão da Europa II (1976), Secretário Executivo da FUNAG (1982), Chefe do Programa Nacional de Desburocratização, Comissão de Facilitação de Comércio Exterior da Presidência da República (1984), Membro do Conselho Diretor Itaipu Binacional (1985), Secretário da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda (1987), Embaixador na missão junto à ALADI (1988), Chefe do Departamento de Integração Latino Americano (1991), Subsecretário-Geral da Subsecretaria-Geral de Assuntos de Integração, Econômicos e de Comércio Exterior (1992). Entre os trabalhos publicados, Latina América em perspectiva: a integração regional da retórica à realidade, Panorama visto de Londres, The Mercosur Code, O Brasil dos brasilianistas, Relações Brasil-Estados Unidos: assimetrias e convergências e MERCOSUL 15 anos. Aposentou-se como Ministro de Primeira Classe, do Quadro Espe-cial, em 6/2/2003. Membro do Gacint da USP e editor responsável pela revista Interesse Nacional.

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Sandra Maria Carreira Polónia Rios

Mestre em Economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1986), com tese intitulada Um modelo para as expor-tações brasileiras de manufaturados; Bacharel em Economia pela Ponti-fícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1981). Atividades: Di-retora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento desde março de 2006; Sócia do Ecostrat Consultores desde agosto de 2003; Consultora da Unidade de Negociações Internacionais na Confedera-ção Nacional da Indústria (CNI) desde agosto de 2003; Coordenadora da Unidade de Integração Internacional, de abril de 1994 a agosto de 2003; Coordenadora da Coalizão Empresarial Brasileira entre 1996 e 2003; Assessora da chefia do Departamento Econômico, entre feve-reiro de 1988 a abril de 1994; Pesquisadora no Instituto de Pesquisas/Instituto de Planejamento Econômico e Social de junho de 1985 a ja-neiro de 1988, trabalhando com modelos econométricos para o setor externo da economia brasileira; Assistente de Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro entre junho de 1983 a junho de 1985. Atividades docentes: Professora do Departamento de Eco-nomia da PUC/RJ nas seguintes cadeiras: Teoria Microeconômica, de 1984 a 1988; Economia Internacional, de 1991 a 1994 e 2010; Política Comercial, desde 2004; Professora do MBA em Comércio Exterior do IBMEC em 2000/2001. Integrante da Lista Indicativa de Painelistas da OMC por indicação do governo brasileiro.

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Sérgio Leo

Atualmente é jornalista e colunista do jornal “Valor Econômi-co”. É especialista em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e graduado em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Desde 1985 em Brasília, foi diretor da revis-ta “Isto É Dinheiro”, editor regional de “O Estado de S. Paulo”, repór-ter especial na “TV Globo” e nos jornais “O Globo”, “Folha de S. Paulo” e “Jornal do Brasil”. Colaborou com as revistas “Notícias” (Argentina), “Manchete” e “Ciência Hoje”. Foi professor no Curso de Extensão de Jornalismo Econômico da UnB e no Ceub. Escritor, ganhou o Prêmio Sesc de Literatura 2009 com o livro de contos “Mentiras do Rio”.

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Tatiana Prazeres

Atualmente, é Secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) e Gerente Geral do Projeto Expo Xangai na Apex-Brasil. É doutora em Relações Inter-nacionais pela Universidade de Brasília (2007). Possui graduação em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (2001), gradu-ação em Relações Internacionais pela Universidade do Vale do Itajaí (2000), especialização em Comércio Exterior pela Universidade Ca-tólica de Brasília (2004), mestrado em Direito com concentração em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Santa Catari-na (2002). Foi Gerente de Projetos do “International Trade Centre” (WTO / Unctad), em Genebra. Tem experiência na área de comércio internacional, atuando principalmente nos seguintes temas: Organi-zação Mundial do Comércio, direito internacional e comércio exterior.

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Valdemar Carneiro Leão Neto

Diplomata brasileiro. Graduou-se em Relações Internacionais pelo Institut d’Etudes Politiques (Sciences-Po) da Universidade de Pa-ris (1967). Terceiro Secretário em 11/1/1972; Segundo Secretário, por merecimento, em 22/1/1976; Primeiro Secretário, por merecimento, em 21/6/1979; Conselheiro, por merecimento, em 22/06/1983; Mi-nistro de Segunda Classe, por merecimento, em 30/6/1989; Ministro de Primeira Classe, por merecimento, em 29/12/1998. Fez o Curso de Preparação à Carreira Diplomática do Instituto Rio Branco (1970) e o Curso de Altos Estudos (1987). Serviu nas Embaixadas em Londres (1976), Tóquio (1979), Londres (1990), Washington (1993), Ottawa (2003) e Bogotá (2008). Foi Assistente na Divisão de Agricultura e Produtos de Base (1973), Chefe da Divisão de Agricultura e Produtos de Base (1983), Coordenador Executivo da Secretaria-Geral (1988), Coordenador do Projeto MRE-BID, na Secretaria-Geral (1995) e Di-retor-Geral do Departamento Econômico (1998). Tese para o Curso de Altos Estudos: A crise da imigração japonesa no Brasil, 1930-1934: contornos diplomáticos. Atualmente é Subsecretário-Geral de Assuntos Econômicos e Financeiros.

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Varun Sahni

Professor de política internacional do Centre of International Politics, Organization and Disarmament (CIPOD) na Jawaharlal Nehru University (JNU), Nova Delhi. É editor do periódico South Asian Survey e membro dos conselhos editoriais do Chinese Journal of International Politics, Asian Security Series e do International Studies Quarterly. Ph.D pela Universidade de Oxford, em 1991 escreveu tese de doutorado acerca da história política da Marinha argentina. Varun Sahni é pales-trante regular do National Defence College e do Foreign Service Institute de Nova Delhi, além do College of Naval Warfare, em Mumbai, do Army War College, em Mhow, da Lal Bahadur Shastri National Academy of Administration, em Mussoorie, do Royal Naval Staff College, em Greenwich e do Australian Defence College, em Canberra. Antes de ingressar na JNU, foi professor e pesquisador no Lincoln College de Oxford, no Rajiv Gandhi Institute for Contemporary Studies, em Nova Delhi e professor de política latino-americana na Universidade de Goa.

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Vera Thorstensen

Mestra e Doutora em Administração de Empresas pela Funda-ção Getúlio Vargas. Pós-doutora pela Universidades de Harvard e pelo Instituto de Estudos Europeus, em Lisboa. Também obteve o título de Pós-doutora pelo Centre for European Policy Studies, em Bruxelas, e InterAmerican Development Bank.  Assessora econômica da Missão do Brasil junto à OMC, em Genebra, de 1995 a 2010. Editora da Carta de Genebra da Missão do Brasil de 2001 a 2008. Presidente do Comitê de Regras de Origem da OMC de 2004 a 2010. Professora de Políti-ca de Comércio Externo em nível de mestrado no IELPO Barcelona (2009-2010), Sciences-Po Paris (2003-2008), IIE Lisboa (1990-2010) e palestrante na FIA e FGV/SP (1995 a 2010).

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Formato 15,5cm x 22,5cm

Mancha gráfica 10,9cm x 17,0cm

Papel pólen soft 80g (miolo), cartão supremo 250g (capa)

Fontes Gentium Book Basic 20 (títulos)

Chaparral Pro 11,5 (textos)

Cronos Pro 8 (notas de rodapé)