De Dias selvagens a Amores expressos: corpo e construção ... · CIA – Comunicação, Imagem e...
Transcript of De Dias selvagens a Amores expressos: corpo e construção ... · CIA – Comunicação, Imagem e...
Estudante de graduação do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Es-
pírito Santo; pesquisadora bolsista vinculada ao CNPQ, participante do grupo de pesquisa
CIA – Comunicação, Imagem e Afeto, de 2014 a 2015.
Resumo
O presente artigo tem como objetivo analisar a construção narrativa espaço-temporal realiza-
da nos filmes Dias Selvagens (1992) e Amores Expressos (1994), ambos dirigidos pelo cineasta
chinês Wong Kar-Wai. Partindo do conceito de interculturalidade, será feita uma análise
sobre a utilização da cidade de Hong Kong como paisagem em ambos os filmes, objetivando
relacionar as características sociopolíticas e históricas da cidade às obras em questão. Ainda,
será discutido o papel da experiência corporal como mediadora da relação entre os perso-
nagens e a cidade-paisagem e da forma como essa abordagem contemporânea do corpo no
cinema, sobretudo através da mise-en-scène, flerta com diferentes possibilidades estéticas,
em especial o cinema narrativo clássico e o cinema de fluxo.
Palavras-chave
Interculturalidade, cinema contemporâneo, corpo; mise-en-scène, Wong Kar-Wai.
Abstract
This article aims to analyze the space-time narrative construction in the films Dias Selvagens
(1992) and Amores Expressos (1994), both directed by the Chinese filmmaker Wong Kar-Wai.
Starting from the concept of interculturality,the analysis will be made of the use of the city of Hong
Kong as landscape in both films, aiming to relate the socio-political and historical characteristics
of the city to the works in question. Furthermore, the role of body experience as a mediator of
the relationship between the characters and the city-landscape will be discussed, as well as the
way in which this contemperarez approach to the body in cinema, especially through the mise-
-en-scene, flirts with different aesthetic possibilities, especially The classic narrative cinema and
cinema de flujo.
Key-Words
Interculturality, Contemporary Cinema, Body, Mise-en-Scène, Wong Kar-Wai
De Dias selvagens a Amores expressos: corpo e construção narrativa espaço-termporal no cinema de Wong Kar-WaiLuana Mendoca
PUBLICACIÓN SEMESTRAL DEL SEMINARIO UNIVERSITARIO DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICONÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
1. IntroduçãoO ano de 1992 destaca-se na carreira de Wong Kar-Wai por marcar o lançamento do filme
Dias Selvagens (Ah fei zing zyun), fator determinante para que o cineasta passasse a receber
a atenção da crítica de cinema de seu país – ainda que o filme não tenha atingido o público
de forma positiva, resultando num fracasso de bilheteria. A partir de então, Kar-Wai passou
a realizar filmes autorais com uma proposta estética característica que ganharam populari-
dade internacional ao se inserirem no circuito comercial e em alguns dos mais prestigiados
festivais de cinema do mundo, como o Festival de Berlim (Alemanha) e o Festival de Cannes
(França), por exemplo.
O cineasta, residente em Hong Kong, possui uma expressiva filmografia que, tendo-se
iniciado no começo dos anos 1990, estendeu-se por toda essa década até alcançar os anos
2010 . Entre suas obras, destacam-se filmes como o já citado Dias Selvagens, Amores Expres-
sos (Chung Hing sam lam, 1994), Fallen Angels (Do lok tin sin, 1995), Felizes Juntos (Chun
gwong cha sit, 1997), Amor à Flor da Pele (Fa yeung nin wa, 2000), 2046: Os Segredos do
Amor (2046, 2004) e Um Beijo Roubado (My Blueberry Nights, 2007) – sendo este último
uma coprodução entre Hong Kong, China e França, inteiramente filmado nos Estados Uni-
dos da América e falado em língua inglesa, inclusive contando com a participação de atores
mundialmente conhecidos como Jude Law e Rachel Weisz, além da cantora Norah Jones.
Esse tipo de projeto foi possível, sobretudo, em razão do reconhecimento internacional da
obra do diretor que, à época, já havia conquistado uma certa fatia do público, principal-
mente fora de Hong Kong, em razão de suas já mencionadas participações em festivais pelo
mundo, que garantiram alguma popularidade aos seus filmes.
Um Beijo Roubado, contudo, não representa o início do flerte da obra do cineasta com
outras culturas além da de sua cidade natal, Hong Kong, dentro do universo fílmico cons-
truído por Wong Kar-Wai. Pelo contrário, talvez o filme seja, dentro de sua cinematografia,
De Dias selvagens a Amores expressos: corpo e construção narrativa espaço-termporal no cinema de Wong Kar-WaiLuana Mendoca
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
22
aquele que menos põe em cheque questões que se referem às identidades culturais dos
sujeitos e a temas correlatos – isso por razões às quais não me aprofundarei nesse artigo,
mas que dizem respeito, sobretudo, à trama do filme e às suas características estéticas, que
não trazem consigo elementos que façam menção tão especificamente a essa temática. O
fato é que a presença de elementos referentes às múltiplas nacionalidades, ou a uma ideia
de mundo globalizado, de um território que já não se delimita pelas barreiras nacionais,
tampouco pela fronteira entre Ocidente e Oriente, é um dos traços mais característicos
da obra de Wong Kar-Wai, estando presente em diferentes níveis de intensidade e formas
de atuação na maior parte de seus filmes. Felizes Juntos, de 1997, trabalha essa questão de
forma interessante ao retratar o deslocamento de um casal homossexual chinês que viaja
a Buenos Aires, na Argentina, local que passa a abrigar as tensões no relacionamento dos
dois. Ainda mais, a trilha musical materializa a questão do múltiplo embate cultural, como
ressalta Denilson Lopes:
Como no início de Felizes Juntos, de Wong Kar-Wai, onde podemos ver na tomada
aérea das cataratas do Iguaçu, na fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai, imagem
do desencontro entre os amantes, mas que traduz todo um encantamento, apesar de
toda a dor, ao som de Caetano Veloso, cantando em espanhol “Cucurrucurú Palo-
ma”, um clássico da música popular mexicana, composto por Tomáz Méndez. Mais
uma vez temos um interessante encontro entre Ásia e América Latina através da cir-
culação da música Latino-americana, desde a segunda metade do século passado,
seja via filmes Hollywoodianos, seja pela presença de cantores filipinos em Xangai,
o mais importante centro cultural da China nas décadas de 1930 e 1940, como tam-
bém podemos ver na obra de Stanley Kwan.[…] Esses trânsitos, especialmente entre
América Latina e Ásia, representam a gênese de um interessante caso de intercultu-
ralidade, desconstrutor de purismos nacionais, definido mais pelos processos midiá-
ticos do que por grandes fluxos migratórios, diásporas (cf. Canclini, 2000, p. 79), que
exigem, certamente, melhor estudo. (LOPES, 2010, p. 103).
Tais trocas culturais, definidas nas palavras do autor como “processos midiáticos”, vão
desde as referências aos produtos globalmente comercializados e consumidos na contem-
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
23
poraneidade (sendo o mais emblemático deles a Coca-Cola, com sua logomarca presente
em filmes como Dias Selvagens e Amores Expressos), passando pelas trilhas sonoras de
filmes como Felizes Juntos, citada por Lopes, e também de Amor à Flor da Pele e Amores
Expressos, das quais destaco, respectivamente, a presença do bolero Quizás, Quizás, Qui-
zás (cantado em espanhol por Nat King Cole) e da balada California Dreaming (interpretada
pelo grupo norte-americano The Mamas and The Papas).
O conceito de interculturalidade, apontado pelo autor, se apresenta como uma chave inte-
ressante para discutirmos a presença dos trânsitos entre culturas e países diferentes, que pro-
vocam a junção de elementos culturais e paisagísticos característicos de lugares (no sentido
estritamente geográfico do termo) separados. O cinema dito intercultural questiona o perten-
cimento a uma cultura, a uma comunidade (MOURA, 2010, p. 44), o que se alinha ao tipo de
construção narrativa e estética presente nos filmes de Kar-Wai, muito em razão das narrativas
centradas na questão dos deslocamentos, cujos personagens, suas respectivas identidades
enquanto sujeitos, estão diretamente ligadas a uma busca pela desterritorialização (Fei, em
Amores Expressos), pela mudança de país ou de cidade (o casal de Felizes Juntos), ou pela ati-
tude cínica em relação ao presente resultante da necessidade de ir de encontro a um passado
traumático (Yuddy, em Dias Selvagens).
Além de tudo, existe ainda a complexa questão da identidade cultural de Hong Kong,
cidade onde Wong Kar-Wai viveu boa parte de sua vida e a qual utilizou como paisagem e
personagem em muitos de seus filmes. Durante a Guerra do Ópio, Hong Kong, anteriormente
parte do Império Chinês, foi ocupada pelo Reino Unido. Após o estabelecimento da Repúbli-
ca da China, no ano de 1912, a região voltou a ser administrada pelos chineses. Contudo, na
ocasião da guerra sino-japonesa, durante a década de 1930, os ingleses voltaram a dominar
a região e assim se seguiu até 1997 quando, após 156 anos de colonização inglesa, Hong
Kong voltou a ser administrada pela China. [A passagem em questão necessita de fontes com
citações sobre a “Guerra do Ópio” e a “Guerra sino-japonesa”. Além disso, as datas parecem
confusas: a ocupação inglesa no território não data de meados do século XIX e chega até
1997, mas com intervalos? Os “156 anos de colonização inglesa” não foram sequenciais, con-
forme o texto afirma, uma vez que faz menção ao intervalo entre a década de 1930 e 1997]
Hoje, Hong Kong é uma Cidade-Estado que funciona como Região Administrativa Especial
(RAE) da República Popular da China, governada pela máxima de “um país, dois sistemas”
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
24
[Qual é a fonte da citação entre aspas?]. Assim, sua constituição socioeconômica, arquite-
tônica, política e cultural apresenta características que a diferem do restante da China em
razão de seu passado colonial (que moldou, sobretudo, a economia e a cultura da região) e
também da forma como é atualmente administrada (que é, apesar dos recentes esforços para
uma reaproximação com a China, caracterizada por uma autonomia concedida à região que
dá continuidade ao tipo de administração e de desenvolvimento instituído durante a época
da colonização inglesa). Todos esses fatores, somados a uma forte e desenvolvida economia
capitalista e neoliberal fazem daquela cidade um lugar onde “o Ocidente encontra o Orien-
te” [Qual é a fonte da citação entre aspas?], aberto para a influência cultural, econômica e
midiática do Ocidente.
Em seu artigo Like a Postcolonial Culture: Hong Kong Re-imagined, no qual aborda a
questão dos estudos culturais já no contexto do período pós-colonial, John Nguyet Erni fala
sobre o modo como escrever sobre Hong Kong requer uma articulação triangular entre o na-
cionalismo chinês, o colonialismo britânico e o globalismo (ERNI, 1997, p. 391 [A citação nas
Referências Bibliográficas é de 2001 e não de 1997]). No caso do cinema, segundo Ackbar
Abbas, a situação política e histórica de Hong Kong tem influência direta na obra de cineas-
tas atuantes, sobretudo, a partir dos anos 1980, como Stanley Kwan, John Woo e o próprio
Wong Kar-Wai. Ele afirma:
O que é interessante é que é um cinema que responde a uma situação histórica es-
pecífica e sem precedentes, o que chamei de espaço de desaparecimento, onde “im-
perialismo” e “globalismo” estão imbrincados um com o outro. A história agora passa
por estranhos movimentos e se torna difícil de representar nos termos do realismo
tradicional. Se a história real está se tornando mais incrível dia após dia, nós teremos
que lançar mão do incrível para acompanhá-la. (ABBAS, 2002, p.16, [A citação nas
Referências Bibliográficas é de 1997 e não de 2002])
Dessa forma, o autor propõe a existência de um tipo de cinema – ainda que comercial
e bastante popular, inclusive fora da China – que se utilize das características estéticas pró-
prias da linguagem cinematográfica para tecer um comentário acerca da história do lugar ao
qual sua identidade está ligada, sem a necessidade de apresentar essas questões na trama ou
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
25
no discurso de seus filmes, problematizando o visual para intervir em tais debates políticos,
e não abordando-os diretamente. (ABBAS, 2002, p. 4X).
No caso de Wong Kar-Wai, uma interessante chave para entender a forma como a histó-
ria política, econômica e cultural de Hong Kong tem influência na realização de seus filmes
é a construção de espacialidades e temporalidades que atuam como recursos narrativos, im-
pulsionando não apenas a trama do filme mas também seus aspectos plásticos, visuais, e sua
sonoridade (as trilhas musicais, citadas anteriormente, tem papel crucial nessa construção).
Destacam-se, nesse quesito, Dias Selvagens e Amores Expressos, dois filmes pertencentes à
fase inicial da carreira do cineasta, já citados anteriormente neste artigo.
No caso do primeiro título, cuja trama é ambientada na Hong Kong dos anos 1960, há
uma minuciosa construção espaço-temporal realizada através de detalhes nos figurinos e
objetos de cena, bem como no uso coreografado das possibilidades de mise-en-scène que,
principalmente, procede com comentários sobre a arquitetura e a paisagem da cidade àque-
la época, além de impulsionar dramaturgicamente o filme (visto que a movimentação dos
personagens em cena, sobretudo a interação entre os corpos uns dos outros, se dá como
produto da própria interação entre os personagens e o espaço). Já no caso do segundo filme,
é representada uma Hong Kong contemporânea, retratada por meio de elipses e suspensões
temporais que garantem, através de uma montagem ágil e dinâmica, um ritmo peculiar ao
filme (que remete à própria velocidade do mundo contemporâneo).
Observa-se, assim, um ponto em comum entre os dois filmes: como a presença de Hong
Kong enquanto paisagem, com seus espaços, suas características, formas, cores e demais
elementos plásticos, interfere na maneira como a trama se desenvolve, sobretudo, na forma
como os personagens atuam e se relacionam entre si, para além da forma como interagem
com o espaço. A interculturalidade, nesse sentido (tendo em vista a própria história política,
econômica e cultural do local), se apresenta como um elemento atrelado à identidade da
cidade que é representada esteticamente por Wong Kar-Wai nos dois filmes aqui estudados,
sobretudo, em sua trilha musical e, pontualmente, em objetos e elementos diegéticos (como
citado anteriormente, as logos de marcas multinacionais como a Coca-Cola e, em menor
escala, outras imagens de marcas famosas que se referem a um mundo globalizado). Os dois
filmes ainda tratam de questões ligadas à busca pela identidade através dos deslocamentos,
das viagens e dos encontros; da busca por uma mudança na paisagem e no tempo – se a
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
26
personagem Faye [na página 3 a personagem aparece com o nome de Fei], em Amores
Expressos, sonha em ir viajar para a Califórnia, numa perspectiva ligada ao futuro, ao que
está porvir, o personagem Yuddy, em Dias Selvagens, não quer apenas seguir em frente, mas
também e principalmente voltar ao passado (sua mãe) para “curar” as feridas do presente.
Identificada a presença de tais similaridades em ambos os filmes faz-se necessário, tam-
bém, estabelecer as diferenças existentes entre eles. Aqui, proponho que nos concentremos
numa questão estética, sobretudo relativa ao modo como o realizador pensa a mise-en-
-scène nos dois filmes e que, por esse motivo, se relaciona diretamente com o modo como o
corpo e o espaço são representados em ambos. Observa-se, ao colocar-se os dois filmes em
comparação, que Dias Selvagens desenvolve sua trama em sequências de longa ou média
duração, dramatizadas e quase totalmente narrativas, ao passo que a trama em Amores Ex-
pressos desenvolve-se sobretudo nas relações de ritmo e temporalidade estabelecidas pela
montagem, como os cortes secos e as elipses, que são recursos utilizados frequentemente
ao longo do filme, além da técnica de congelamento da imagem utilizada em sua fotografia,
que garante um aspecto de velocidade aumentada às imagens, como se o fluxo contínuo
fosse incapturável pela câmera ou pelo que ela representa – nossos olhos, nossa visão –,
tamanha a sua rapidez, sua efemeridade. É possível, a partir disso, compreender Dias Selva-
gens como uma experiência cinematográfica que se aproxima mais do que convencionou-
-se chamar por cinema narrativo clássico, sobretudo ao filão denominado melodrama e, na
contramão, analisar Amores Expressos como uma narrativa mais fluida, menos dependente
das noções de plano e mise-en-scène do que de um desejo de sensorialidade expresso por
meio de imagens bidimensionais em movimento e de sons.
Dito isso, pretendo aqui realizar uma investigação acerca da forma como o cineasta
Wong Kar-Wai, em Dias Selvagens e Amores Expressos, dois filmes pertencentes à fase ini-
cial de sua filmografia, desenvolve esteticamente a relação entre os corpos e Hong Kong,
buscando compreender as maneiras como esses elementos afetam uma ao outro através
dessa interação, que pode ser pacífica, amena, ou um embate. Sobrepondo os tempos e os
espaços e aglutinando, muitas vezes em um único plano, passado, presente e alguma ideia
ou desejo de futuro, o realizador tece, no mínimo, um comentário acerca da cidade na qual
realiza seus filmes e das relações que nela se estabelecem, o que já seria, por si só, algo
passível de estudo e reflexão. Porém, é a maneira como Kar-Wai se utiliza de elementos
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
27
formais da linguagem cinematográfica para construir não menos que um universo fílmico
próprio e autoral, mas não desvinculado da realidade, e que, mais tarde, seria incorporado
ao seu modo de fazer filmes, estando presente quase que na totalidade de suas obras poste-
riores, que torna a reflexão acerca do trabalho do cineasta, sobretudo dos dois filmes aqui
estudados, necessária.
2. Manupulação espaço-temporal: A construção narrativa e a (re)contrução de Hong Kong
Vemos um homem que veste trajes de policial. Ele está na rua, algumas pessoas se movimen-
tam à sua volta. Enquanto ele caminha em direção a uma lanchonete, ouvimos uma música
alta, sem ter clara noção de onde ela está vindo (se faz parte da diegese do filme ou não).
Apenas quando ele adentra a lanchonete a origem do som fica clara: a atendente está ouvin-
do California Dreaming, da banda The Mamas and the Papas, enquanto trabalha. A jovem e
o policial iniciam, então, um breve diálogo, dificultado pelo volume alto da música. Apenas
quando ele chama a moça para mais perto de si os dois conseguem fazer-se entender, no
momento em que um plano das faces de ambos muito próximas invade a tela, ao mesmo
tempo em que o volume da música é reduzido consideravelmente. O policial, então, sai de
cena, e a atendente permanece atrás do balcão, enquanto a música, novamente em volume
alto, continua a tocar. Por meio de um corte brusco, suavizado pelo movimento da câmera e
da personagem, somos transportados para um outro dia, permanecendo no mesmo local – a
mudança de tempo é perceptível, principalmente, pela troca de roupa da jovem. Ela trabalha
ouvindo a música e dançando, enquanto o policial está do lado de fora. O dono da lancho-
nete desliga a música e, em seguida, o policial entra no estabelecimento. Os dois iniciam um
diálogo e a cena passa a se concentrar nisso, desviando da conversa apenas para mostrar a
atendente, ao fundo, tornando a ligar o rádio e a dançar. O policial, então, vai embora, e a
atendente observa sua saída.
Através de mais uma elipse temporal, somos transportados para outro dia. O policial está
do lado de fora da lanchonete, fazendo suas anotações. A música já não toca mais. Ele en-
tra na lanchonete e vai até o balcão, onde o dono do estabelecimento está, para fazer seu
pedido. Vemos a ação pelo ponto de vista de alguém que presumivelmente está atrás do
balcão contemplando, assim, as costas do senhor e o rosto do policial. A atendente, então,
surge, também de costas, nesse mesmo quadro. Sua presença não é estranha somente ao es-
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
28
pectador: os dois outros personagens olham-na e param de falar até que ela, desconcertada,
vai para outra parte da lanchonete. A câmera acompanha o deslocamento da atendente e
permanece com ela atrás de um vidro, de onde vemos a imagem do policial encostado no
balcão ser sobreposta pela da própria jovem, que limpa o vidro com a ajuda de um pano. Em
dado momento, a junção do primeiro plano (ela) e do segundo plano (ele) é tão coreografa
que temos a impressão de que a jovem desliza suas mãos sobre a superfície do corpo do po-
licial. É realizado um outro corte brusco, dessa vez suavizado por um raccord de movimento
realizado por meio da continuidade do gesto da garota, que limpa um outro setor da lancho-
nete. Voltamos a olhar por detrás do balcão. A atendente permanece limpando ao passo que
o policial toma seu café, servido num copo de plástico estampado com a logo da Coca-Cola.
A sequência, pertencente ao filme Amores Expressos, marca uma divisão na narrativa
fílmica, quando o policial 233 é “substituído” pelo policial 633 e a história, então, abandona
os protagonistas da primeira parte e passa a se concentrar na relação entre a garçonete Faye
e o policial 633. Em poucos minutos, três dias (representados pelas idas do policial à lan-
chonete, que somam três encontros com a moça) são narrados através de elipses temporais
realizadas, sobretudo, por meio de uma articulação entre fotografia e montagem: os cortes
duros são atenuados pelo raccord de movimento estabelecido pela manipulação da câmera
na mão, que reconfigura os quadros por meio do emprego de diferentes angulações, fazendo
com que o espectador perca, momentaneamente, o referencial de tempo e espaço; e pela
mise-en-scène, através da continuidade de gestos e ações dos personagens que ligam uma
cena à outra, conferindo fluidez e movimento às imagens. A trilha musical, exaustivamente
repetida em volume alto, por vezes até mais alto do que a voz dos personagens, ajuda a
estabelecer esse fluxo de continuidade. Sua importância, contudo, vai muito além de uma
questão rítmica: A entrada de Faye em cena se dá, primeiramente, pela entrada da canção
California Dreaming na trilha sonora do filme, posto que é ela o principal marco da persona-
gem, relacionado à sua pulsão de viajar e se deslocar, e diretamente ligada à sua curiosidade
específica em relação ao estado norte-americano da Califórnia.
Faye é uma personagem emblemática do filme por representar a necessidade de um des-
locamento, de transitar. Ela realiza trabalhos temporários com o objetivo de juntar dinheiro
para viajar. O modo como a personagem é filmada também se relaciona a essa caracterís-
tica: um dos únicos momentos no qual a vemos parada, sem se movimentar, é quando a
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
29
jovem adormece na casa do policial 633. Na maior parte das cenas, Faye anda de um lugar
para o outro, geralmente apressada. Ainda, mesmo que fixo em um local, seu corpo está
em constante movimento, traduzindo uma certa ansiedade, inquietação, ou necessidade de
movimentação, de exteriorizar uma energia contida dentro de si. Na trama, ela abandona o
emprego como atendente de lanchonete para se tornar aeromoça (não fica claro, porém, se
é algo temporário ou permanente). Temos, aí, a confirmação dramática das inclinações de
Faye, visto que a profissão por ela escolhida lhe permitirá viajar e transitar por vários lugares
diferentes, estando em um constante estado de deslocamento, uma vez que passará a maior
parte de seu tempo dentro de um avião, que é um meio de transporte, ou seja, uma estru-
tura que, em seu uso funcional, não possui um lugar fixo e trata justamente de viabilizar os
deslocamentos.
Hudson Moura entende o cinema intercultural não como “um dado fixo que pede uma
análise, mas um processo, uma comunicação, uma correlação: a análise ela mesma.” (MOU-
RA, 2010, p. 49). Apesar disso, podemos estabelecer ao menos uma característica definidora
desse cinema que é o fato de os filmes ditos interculturais sempre falarem sobre a relação
entre duas ou mais culturas que interagem entre si. Estendendo essa definição a uma análise
da paisagem sonora do filme, é possível compreender a presença de California Dreaming na
trilha sonora de Amores Expressos como sendo também um recurso midiático que remete à
ideia de interculturalidade, primeiramente por conectar Faye a um outro lugar e a uma outra
cultura, e também por ser produto de uma cultura nacional estrangeira (no caso, norte-ameri-
cana) ou, em última análise, de uma cultura globalizada. A infiltração de um produto cultural
dessa natureza no universo de uma personagem que, apesar da vontade e da necessidade de
transitar pelos lugares, não é necessariamente cosmopolita, dá pistas sobre uma certa aber-
tura – ainda que não institucional, ao menos ideológica –, à cultura de outras localidades ou
a uma cultural global. A logo da Coca-Cola, que aparece no final da sequência descrita, tam-
bém remete a essa ideia de globalização e interculturalidade, por ser uma marca ocidental,
norte-americana, que possui representatividade em praticamente todo o território capitalista.
A presença desta imagem também é bastante evidente na sequência de abertura de Dias
Selvagens, na qual vemos um encontro entre Yuddy, protagonista do filme, e uma das duas
mulheres com as quais ele se envolve romanticamente ao longo da história. Su Lizhen é uma
jovem séria e de poucas palavras – total oposto do outro par de Yuddy, a extrovertida dança-
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
30
rina Mimi –, que trabalha como atendente de lanchonete numa central de esportes em Hong
Kong: é nesse espaço que vemos a logo da famosa marca, estampada não só na embalagem
de seu próprio produto, mas também em publicidades espalhadas pelo estabelecimento.
Inicialmente, vemos o primeiro contato entre os dois personagens, já sendo apresentados à
frieza do comportamento de Yuddy. Após a entrada dos créditos iniciais, vemos mais dois
encontros, em dias diferentes, entre os dois personagens, que deixam explícitas as investidas
afetivas constantes do rapaz para com a garota. Ao final da cena, pela narração em off da
própria Su Lizhen, a narrativa nos é antecipada e ficamos sabendo que, a partir daquele dia,
os encontros tornaram-se constantes e os dois passaram a se relacionar sexualmente.
Já nessa sequência, é possível observar pequenos detalhes que nos afastam da contem-
poraneidade, remetendo a uma atmosfera sessentista, carregada de nostalgia. Os recursos
utilizados para isso, além da trilha sonora (que será utilizada ainda mais enfaticamente ao
longo do filme), se concentram nos detalhes das vestimentas e da aparência dos personagens,
como penteados e cortes de cabelo, e nos objetos de cena que aparecem recorrentemente,
como telefones, relógios, entre outros, todos característicos de uma outra época, de um certo
passado. Além disso, é dado um tratamento à imagem, filtrada por tons de sépia que, ainda
que sejam bastante sutis, remetem à utilização de película ou mesmo ao ato de olhar uma
fotografia já envelhecida. São maneiras de se definir a história por meio do estilo e da imagem
(ABBAS, 1997, p. 53), tornando a presença do passado e o diálogo com essa temporalidade
já perdida algo material e plástico, e não apenas um discurso.
Em ambos os filmes, a inscrição dos personagens nos espaços cênicos e a interação entre
esses dois elementos da linguagem fílmica são utilizados para construir uma narrativa dire-
tamente relacionada às espacialidades e temporalidades específicas de cada um. A forma
como os personagens se deslocam e se movimentam pelos espaços diz muito sobre a orga-
nização social e arquitetônica de Hong Kong em cada uma dessas duas épocas. Abbas en-
fatiza a importância desse tipo de concepção espacial dentro do contexto do novo cinema
de Hong Kong:
Uma das características do novo cinema de Hong Kong é sua sensibilidade às ques-
tões espaciais, em outras palavras, aos deslocamentos e às descontinuidades, e sua
adoção de narrativas espaciais tanto para enfatizar quanto para entrar em acordo
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
31
com esses anacronismos e acronismos históricos: o espaço como um meio de ler a
indefinição da história. Nós podemos ter uma melhor ideia da história de Hong Kong
através de seu novo cinema (e arquitetura) do que consultando o que geralmente
está disponível em qualquer livro de história. (ABBAS, 1997, p. 27, tradução nossa).
No caso de Dias Selvagens, a reconstrução de uma Hong Kong sessentista perpassa
toda a realização do filme em termos de mise-en-scène. Nas cenas internas, principalmen-
te as que se passam dentro do prédio ou do apartamento de Yuddy, o tamanho reduzido
dos espaços privados, que é uma característica das construções da cidade, é descrito pela
proximidade dos personagens, que aparecem juntos, por vezes excessivamente próximos,
na maior parte dos planos. A recorrência de close ups que eliminam os espaços “livres”
dos enquadramentos e privilegiam o rosto dos personagens, contribui para a sensação de
sufocamento e de falta de espaço. Isso fica evidente na sequência em que Yuddy leva Mimi
ao seu apartamento pela primeira vez, na qual os personagens quase sempre aparecem
juntos nos planos, ainda que estejam em cômodos distintos, ressaltando a pouca distância
entre os espaços e as dimensões limitadas do apartamento. Nela também são enfatizadas
as características de verticalização e o estreitamento das construções, sobretudo em um
momento no qual um personagem escala o prédio de Yuddy e percebemos a proximidade
entre os apartamentos, já que ele se equilibra entre eles para chegar até lá, e já no fim da
sequência, quando Mimi dança no estreito corredor do prédio de seu amante, plano no qual
a falta de espaço horizontal fica evidente. Vale aqui mencionar que, posteriormente, Wong
Kar-Wai mergulharia ainda mais em seu próprio estilo, sobretudo nos filmes Amor à Flor
da Pele (Fa Yeung Nin Wa, 2000) e 2046: Os segredos do amor (2046, 2004), levando esse
tipo de construção espacial, que busca um resgate da memória e da identidade por meio da
arquitetura e da reconstrução dos espaços, ao seu ápice estético.
Em Amores Expressos, o recorte temporal contemporâneo é também traduzido através
de relações de espaço e mise-en-scène mas, nesse caso, se adequando às características de
Hong Kong já nos anos 1990. A questão do espaço continua a ser trabalhada, com ênfase
na própria cidade e no caos urbano. A temática do trânsito e dos deslocamentos é abordada
também visualmente: os personagens passam boa parte do filme se movimentando pela
cidade, indo de um local para o outro e, inclusive, alguns dos encontros que impulsionam
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
32
narrativa se dão por meio de colisões literais, físicas: choques de corpos que se dão mate-
rialmente na tela. Assim como em Dias Selvagens, somos apresentados às características da
cidade pelo movimento dos personagens, seja acompanhando seus constantes deslocamen-
tos, seja através da maneira confusa e errante como se comportam. São os desencontros e
os encontros que não resultam positivamente que se tornam importantes para a narrativa e
para as motivações dos próprios personagens.
É fundamental ressaltar que o que aqui chamamos de interculturalidade possui poucas
semelhanças com o conceito pós-estruturalista de multiculturalismo, que traz uma perspec-
tiva descolonizada das representações, sobretudo das relações de poder entre comunidades
(SHOHAT e STAM, 2006, p. 26). Perpassa de maneira potente o conceito de interculturali-
dade a própria tensão entre as culturas postas em choque, que não necessariamente irão se
fundir em algo maior e “multicultural”, mas que, ao se encontrarem, sempre realizarão um
choque, conforme discorre Hudson Moura:
O cinema intercultural não pode ser entendido simplesmente como multicultural
ou como pluralista (cultura, religião, política), pois ele atribui uma tensão que se
deixa perceber pela imposição do prefixo “inter”. Isso significa que o intercultural
determina sempre uma fronteira e uma tensão do 'entre' duas ou mais culturas (ou,
em termos cinematográficos, 'entre' planos). Essas culturas não são amalgamadas ou
juntadas num num discurso uniforme e homogêneo, como poderíamos caracterizar
o hibridismo e o multiculturalismo. Num discurso heterogêneo e único no seu gêne-
ro, interculturalidade é colocar em relação duas ou várias culturas e identidade. Ela
pode ser também aquela que não compartilha. Isto é, um processo que marca uma
tensão dos diferentes, o que pode ser mesmo da ordem do intransponível e gerar a
incompreensão. (Moura, 2010, p. 49).
De fato, a partir da análise dos filmes Dias Selvagens e Amores Expressos é possível
observar que os elementos anteriormente citados nesse texto que possuem algum tipo de
referência cultural de alguma forma desterritorializada – a saber, as trilhas sonoras latino-
americanas, os bens de consumo importados dos EUA, entre outros – não se conciliam
no discurso fílmico de modo a traduzirem, a partir da sua junção, a síntese advinda de
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
33
uma relação intercultural. Diferentemente disso, a atmosfera de ambos os filmes permanece
permeada por essa tensão entre culturas que, apesar de se relacionarem, não formam uma
terceira identidade a partir de seu encontro mas, no máximo, são aglomeradas como partes
constituintes da identidade de um local (no caso, Hong Kong) e dos sujeitos que o habitam.
3. Do cinema de fluxo à narrativa clàssica: diàlogos entre o corpo e a cidade
Como já foi dito anteriormente, a cidade enquanto paisagem espaço-temporal tem grande
importância para a totalidade da experiência cinematográfica proporcionada por Dias Sel-
vagens e Amores Expressos. Cabe aqui enfatizar, a partir desses exemplos, a forma como
o novo cinema de Hong Kong descobriu a própria cidade como um de seus temas princi-
pais (ABBAS, 1997, p. 23) e, a partir disso, observar que uma das formas pelas quais essa
paisagem se torna parte da narrativa é através do corpos dos personagens nela inseridos,
que são afetados por suas características e também interagem com ela, modificando-a. O
corpo torna-se, dessa forma, uma instância mediadora da relação entre o sujeito, o perso-
nagem, e ao espaço da cidade. Analisemos, como exemplo, uma sequência do filme Dias
Selvagens, que se desenvolve em espaços bastante explorados durante todo o filme, que é
o apartamento do personagem principal e, em menor escala, o espaço que compreende as
dependências de seu prédio
É noite e Mimi e Yuddy estão na cama. Enquanto ela dança sensualmente sobre o colo
do rapaz, os dois cantarolam uma música. Então, um homem entra por uma janela, que está
em segundo plano, no fundo do quadro. Mimi leva um susto e grita, mas logo se acalma
após os dois perceberem que se trata de uma amigo de Yuddy, o qual se aproxima da janela
para falar com o rapaz, enquanto a moça permanece na cama. Assim que o rapaz decide ir
embora e Yuddy se afasta, Mimi se aproxima da janela para observá-lo. Ele desce se apoian-
do nas janelas e tubos localizados na parte exterior do prédio de Yuddy e dos outros pré-
dios em volta. O corte é realizado e, a partir dele, é feita uma elipse temporal: estamos no
mesmo apartamento, com os personagens da cena anterior, mas num momento distinto da
noite. Yuddy está deitado na cama, com um ventilador de chão posicionado em sua direção,
enquanto Mimi lava o rosto na pia do banheiro. Como o espaço é pequeno, conseguimos
ver os dois no mesmo quadro – ou, melhor dizendo, vemos os dois no mesmo quadro para
que entendamos que o espaço é pequeno. Ouvimos um barulho de tic-tac constante, que
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
34
parece preencher todo o espaço da cena. Mimi, então, se aproxima de Yuddy e senta na
mesa ao lado da cama onde ele está e, assim, os dois estão novamente juntos no mesmo
quadro. Ela vai até a geladeira, muito próxima do quarto, e em seguida se dirige até a cama.
Enquanto conversam, Mimi e Yuddy começam um jogo de provocações corporais, no qual
o afeto se mistura com a agressividade por meio de mordidas, beliscões e carícias, entre
outras provocações.
A sequência termina com Mimi saindo do apartamento e chegando ao hall do prédio. Ela
desce as escadas e se depara com um rapaz, enquanto uma música toca no rádio. O rapaz,
então, questiona a moça sobre sua ocupação, sobre o que ela faz para viver. A resposta de
Mimi vem em formato de dança, acompanhando o ritmo da música que está a tocar no hall
do prédio. Ao terminar sua performance, diz seu nome para o rapaz e vai embora. Temos,
então, um close no rosto dele, que traduz o êxtase do rapaz em relação ao que acabou de
acontecer.
Nessa sequência, o contato físico entre os dois personagens é quase uma batalha: os
corpos estão constantemente sendo postos à prova pela interação bruta e provocativa com
o corpo do parceiro ou por fatores externos, como a presença do ventilador que age sobre
os corpos dos personagens, presente não apenas nesse trecho, mas em outros momentos do
filme. Ainda, eles não só respondem a essas interações, mas também a impulsos internos,
como no momento ao final da sequência quando a personagem dança no corredor do pré-
dio: ela poderia expressar-se verbalmente, uma vez que lhe foi feita uma pergunta clara e
objetiva, mas prefere deixar que seu corpo e seu movimento respondam à dúvida do rapaz.
Mais uma vez, Hong Kong é construída em tempo, espaço e detalhes. A arquitetura da
época reverbera pela estrutura do apartamento e é ajudada por uma mise-en-scène que
denuncia as limitações de espaço: o caminho coreografado dos personagens e a “dança”
de seus movimentos, até mesmo a dança propriamente dita realizada por Mimi no final da
sequência, dependem do formato e das limitações desses espaços internos para serem reali-
zados. Em última análise, é como se a relação entre corpo e espaço fosse impreterivelmente
pautada pelos limites estabelecidos pelos objetos e pelas formas dos espaços e relação ao
corpo dos personagens. É como se a figura humana, especificamente do corpo humano, ain-
da que dotada do poder da ação, estivesse condicionada pela paisagem no grau zero de sua
inserção na mesma. Estar na cidade, ao menos nesse caso, é estar sob sua influência direta,
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
35
ainda que o inverso dessa relação, ou seja, a ação do corpo sobre o espaço, também exista.
Os dois filmes, apesar das semelhanças já mencionadas, são diferentes quanto ao ritmo
e ao tempo de seus acontecimentos, sobretudo em razão do trabalho de montagem, rea-
lizado a partir de duas abordagens distintas. Em ambos os casos, o tempo é um tema de
extrema importância – o uso constante de relógios como objeto de cena de destaque em
diversos planos é uma pista disso –, mas que é tratado de maneira diferente em cada um
deles. No primeiro, o tempo é um universo a ser explorado, uma presença notável e quase
materializada através dos silêncios duros e constantes, muitas vezes preenchidos pelo tic-
-tac insistente de um relógio. A organização do filme em blocos de cena mais extensos, nos
quais a duração é crucial para a dramaturgia, para a encenação e a mise-en-scène, garante
ao filme um ritmo mais lento e pausado, como se devêssemos habitá-lo, adentrá-lo, e não
apenas observá-lo; como se o cinema fosse uma experiência que expressa outra experiência
(ELSAESSER, HAGENER, 2010, p. 119).
Em Amores Expressos, a relação estabelecida entre o filme e o espectador é outra: já
não é mais interessante que se habite as cenas, mas sim que se deixe levar por um fluxo de
imagens que se sobrepõem à própria narrativa e se colocam antes dela. O tempo, que é
explorado em Dias Selvagens, é nele suprimido, e isso se traduz na imagem total do filme.
A relação com as luzes, cores e movimentos é anterior ao envolvimento com a própria
narrativa e, aliado a isso, o ritmo da montagem não permite que seja construída a atmos-
fera necessária para que se adentre a dramaturgia da mesma forma como ocorre em Dias
Selvagens. Isso não quer dizer, entretanto, que o filme de 1994 seja inferior ao anterior em
termos de encenação. Como afirma Jacques Aumont, “a encenação faz-se tanto na monta-
gem e na planificação como na filmagem” (2001, p. 71 [Há nas Referências Bibliográficas
duas entradas para Aumont, uma de 1995 e outra de 2008, mas nenhuma de 2001]). Ainda,
não significa que a experiência na qual se constitui Dias Selvagens se resuma a uma lógica
narrativa restrita que serve à trama do filme. Existem transbordamentos afetivos e sensoriais
que a própria mise-en-scène trata de transparecer. Percebemos isso, por exemplo, nas cenas
em que Yuddy e Mimi estão juntos, nas quais a própria experimentação de seus corpos – o
toque, o olhar, a transpiração e a respiração ofegante constituem-se em gestos que agem
diretamente sobre os sentidos do espectador e são evidenciados pela forma como os corpos
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
36
dos personagens interagem e se movem, e também pela expansão temporal realizada para
que se adentre aquela atmosfera mais profundamente. Conforme Jacques Aumont afirma:
A encenação no cinema não é uma técnica: graças à restrição benéfica do quadro,
torna-se uma força (ou, noutras passagens de seu texto, uma energia). Tudo se pas-
sa como se passa como se o quadro, ao condicionar a encenação, ao clarificá-la,
ao torná-la definitiva, se tornasse uma espécie de lente que foca sua energia. (AU-
MONT, 2008, p. 89).
É justamente no que diz respeito à encenação ou, para usar um termo caro aos estudos
de cinema, à mise-en-scène, que os dois filmes se diferem. Ambos os filmes, como já foi
mencionado, tratam da relação entre corpo e paisagem através dos aspectos formais de sua
linguagem. Além disso, ambos possuem tramas com início, desenvolvimento e desfecho e,
sobretudo, tratam de narrar um ou vários acontecimentos, o que os caracteriza como filmes
narrativos – ainda que cada um ao seu modo, por meio, cada qual, de uma maneira específi-
ca de narrar (AUMONT, 2009, p. 109 [Há nas Referências Bibliográficas duas entradas para
Aumont, uma de 1995 e outra de 2008, mas nenhuma de 2009]). É, pois, a mise-en-scène,
aquilo que Luís Carlos Oliveira Júnior trata como um dos elementos mais importantes da
linguagem cinematográfica e, ao mesmo tempo, um dos mais difíceis de se definir (2013, p.
23), que marca a diferença entre a proposta de Dias Selvagens e Amores Expressos, confor-
me discutiremos a seguir.
Já foi dito anteriormente que Dias Selvagens possui um ritmo mais lento do que Amores
Expressos estabelecido, sobretudo, pela montagem e pela duração de seus planos. Para
além disso, a constituição própria desses planos, ou seja, a organização dos elementos die-
géticos dentro do quadro, que também compreende as movimentações e coreografias dos
mesmos, remete a uma forma de encenação que narra a partir das relações de poder entre
os objetos dentro do plano – o que está em primeiro ou segundo plano, os close-ups, os
planos conjuntos etc. – obedecendo, assim, às prerrogativas do cinema narrativo clássico.
Sobretudo, o que mais aproxima a maneira como Kar-Wai concebe a ideia de mise-en-scène
para esse filme especificamente é o fato de que tudo está nela é dramaticamente importante:
trata-se, essencialmente, dos elementos que se traz à cena e da importância que se dá a
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
37
cada um deles, a partir da forma como são organizados. Dessa forma, a eficácia narrativa,
assim como a própria contemplação da cena, se apresentam como questões centrais para
esse determinado uso da mise-en-scène (OLIVEIRA JR, 2013, p. 41).
Já em Amores Expressos a organização dos elementos no plano se dá de forma mais
aberta e dinâmica, muito em razão da quebra de uma relação de contemplação, no cinema
comumente exigida pela ação do plano sobre o espectador, e que já não se faz tão presente
aqui, em razão, sobretudo, da velocidade com que as imagens se colocam, que dificulta
o estabelecimento de uma relação desse tipo. Embora algumas cenas possuam uma decu-
pagem, por assim dizer, que mais se aproxima da narrativa clássica, boa parte do filme se
desenvolve a partir de imagens imprecisas, rápidas, confusas e, sobretudo, que ganham seu
sentido apenas a partir da imagem total do filme, “do fluxo de sensações visualmente pro-
porcionado” (OLIVEIRA JR, 2013, p. 53).
Em artigo intitulado “Que plano é esse?”, publicado na revista Cahiers du Cinema em 2002,
Jean-Marc Lalanne [As citações não constam nas Referências Bibliográficas] faz referência
a um artigo escrito pelo crítico de cinema Stéphane Bouquet para a mesma publicação, no
qual ele lançava o conceito de “cinema de fluxo”, que seria adotado, posteriormente, por
diversos outros críticos e teóricos de cinema. Lalanne faz um apanhado das características
gerais observadas nesse conjunto recente de filmes que apresentam similaridades estéticas:o.
Um fluxo esticado, contínuo, um escorrer de imagens na qual se abismam todos os
instrumentos clássicos mantidos pela própria definição da mise-en-scène: o quadro
como composição pictural, o raccord como agente de significação, a montagem
como sistema retórico, a elipse como condição da narrativa. (Lallane, 2002, p. 26,
tradução de Ruy Gardnier).
A aproximação entre a percepção estética de Amores Expressos e o conjunto de elementos
característicos do cinema de fluxo descrito acima é inevitável, ainda que o filme em muito
pouco se assemelhe a outras obras comumente identificadas como representantes dessa es-
tética, sobretudo as obras de cineastas como Hou Hsiao Hsien, Claire Dennis e Apitchatpong
Weerasethakul. Talvez o elemento que torne mais evidente o diálogo entre o filme e o cinema
de fluxo seja justamente o uso da montagem enquanto sistema retórico, que exprime a partir
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
38
de si próprio o significado do filme, e também a concepção da elipse e do raccord como
condição de existência da narrativa uma vez que, como foi dito anteriormente, a construção
espaço-temporal em Amores Expressos se dá, sobretudo, em razão da utilização conjunta e
combinada desses dois recursos da linguagem cinematográfica. Ao final, o que permanece
no espectador, como produto de toda a experiência, traduz-se mais como uma imagem, uma
sensação, do que como um significado.
No lugar da densidade psicológica, enxertam-se blocos de afetos, fragmentos de vida
sem significados fechados, uma primazia do sensorial e do corpóreo em detrimento
da psicologia e do discurso. Filmes sem clímax, sem oscilação dramática, marcando
uma certa indiferença ao tempo à passagem dos fatos. Mais importante que o enca-
deamento das ações é a invenção de uma “nova rítmica do olhar”, é criar a sensação
mais que o sentido. (OLIVEIRA JR, 2013, p. 147).
A partir disso, é possível estabelecer a predominância de pelo menos uma abordagem
estética, no que diz respeito à mise-en-scène, em cada um dos filmes estudados: se Dias
Selvagens aproxima-se daquilo que chamamos de cinema narrativo clássico, Amores Expres-
sos caminha na direção oposta, aproximando-se de uma estética contemporânea, presente
sobretudo em filmes realizados a partir dos anos 1990, cunhada pela crítica como “cinema
de fluxo” ou, ainda, “estética do fluxo”. Vale ressaltar que tais definições são utilizadas como
ponto de partida de uma tentativa de compreender a linguagem desses filmes e o efeito que
exercem sobre o espectador, mas que as mesmas não são e não devem ser aplicadas, de
forma alguma, para limitá-los.
4. ConclusãoesEm ambos os filmes, são construídas narrativas e atmosferas que traduzem, estética e dis-
cursivamente, um determinado recorte espaço-temporal da China – Hong Kong nos anos
1960, moderna, e já nos anos 1990, contemporânea. Esse recorte, muito embora construído
minuciosamente através de recursos formais e narrativos, não se pretende uma fiel recons-
trução do passado ou um retrato irretocável e realista do presente: é expressão de uma visão
bastante específica de um lugar e de seus tempos, que tenta traduzir em linguagem e estilo
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I
39
as várias camadas políticas e históricas do lugar ao qual se pertence, bem como da multipli-
cidade de “lugares” que o constituem.
Os A interculturalidade, nesse contexto, é expressa no novo cinema de Hong Kong, sobre-
tudo na obra de Wong Kar-Wai, em razão das questões políticas e econômicas que moldaram
a sociedade e a cultura da cidade-Estado, colônia histórica da Inglaterra aberta ao ocidente
cultural e economicamente de uma forma não vista na maior parte dos países orientais. Um
dos aspectos interessantes desse movimento de representação de Hong Kong em sua nova
cinematografia é a tradução da visão dos próprios cineastas sobre seu lugar realizada através
da linguagem do cinema, sendo que em boa parte deles a trama do filme não busca discorrer
sobre aspectos políticos da cidade; é na própria forma do filme e em sua realização – foto-
grafia, arte, mise-en-scène – que a discussão sobre esses temas é levantada, sempre carregada
pelos aspectos autorais da visão do cineasta.
Observando o fato de serem Dias Selvagens e Amores Expressos obras quase inaugurais
da filmografia do cineasta, é possível notar como seus temas, sobretudo a representação e a
(re)construção de Hong Kong, estão presentes desde o início de seus trabalhos. Ao longo do
tempo, a forma como essas questões são impressas nos filmes se aprimora e torna-se parte
fundamental do estilo característico de Wong Kar-Wai. Não à toa, seus filmes mais celebra-
dos pela crítica e pelo público são os que se apropriam dessa abordagem política do local e
inscrevem-na em sua própria forma. Em destaque, citemos Amor à Flor da Pele e 2046: Os
segredos do amor, realizados já durante os anos 2000, que possuem a marca autoral do cine-
asta de forma intensa, unindo a forma ao discurso dos filmes de maneira quase indissociável.
Além disso, a forma como o cineasta se utiliza de diferentes regimes estéticos da imagem
para construir suas narrativas, aqui comentada através da análise da relação entre Amores
Expressos e Dias Selvagens com o cinema de fluxo e o cinema clássico, respectivamente,
permanece como uma questão cara ao seu cinema, que flerta com diferentes gêneros e
estilos, desde a Wuxia, gênero de origem chinesa que mistura fantasia ao universo da artes
marciais, até o melodrama clássico, de acordo especificamente com a proposta de cada obra.
Seu estilo, já consolidado, torna-se autorreferencial ao propor um diálogo entre toda a sua
obra em conjunto; Wong Kar-Wai constrói algo que ultrapassa a forma e se comunica com
o espectador através de uma linguagem própria e independente, que serve aos seus filmes e
apenas a eles; cinema autoral, de fato.
NÚMERO 005 ENERO-JUNIO DE 2017, P. 20-40
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I L U A N A M E N D O C A
40
Referências
Aumont, Jacques. O Cinema e a Encenação. Lisboa: Edições Texto e Grafia, 2008.
________________ et al. A Estética do filme. Campinas, SP: Papirus, 1995.
Abbas, Ackbar. Hong Kong: Culture and the politics of disappearance. Londres: University of
Minesota Press, 1997.
Elsaesser, Thomas; Hagener, Malte. Film Theory. Nova York: Taylor & Francis, 2010.
Erni, John Nguyet. Like a Postcolonial Culture: Hong Kong re-imagined. In: Cultural Studies 15. 2001.
p. 389-418.
Lallane, Jean Marc. “C’est quoi ce plan?”. In: Cahiérs du Cinema, n. 569, junho de 2002. Paris:
2002, pp.26-27.
Lopes, Denilson. Paisagens transculturais. In: França, Vera; Lopes, Denilson. Cinema, Globalização
e Interculturalidade. Unochapecó: Argos, 2010.
Moura, Hudson. O cinema intercultural na era da globalização. In: França, Vera; lopes, Denilson.
Cinema, Globalização e Interculturalidade. Unochapecó: Argos, 2010.
Oliveira Jr, Luis Carlos. A Mise-en-Scène no Cinema: do clássico ao cinema de fluxo. Campinas:
Papirus, 2013.
Shohat, Ella e Stam, Robert. Crítica da imagem eurocêntrica: Multiculturalismo e representação. São
Paulo: Cosac Naify, 2006.
Artículo recibido 28 de Noviembre de 2015 y aprobado 13 de Mayo de 2016.
MONTAJES, REVISTA DE ANÁLISIS CINEMATOGRÁFICO
D E D I A S S E LV A G E N S A A M O R E S E X P R E S S O S C O R P O E C O N S T R U Ç Ã O N A R R AT I V A E S P A Ç O - T E R M P O R A L N O C I N E M A D E W O N G K A R - W A I