DC II - Caso Pr Tico 2 Resolvido

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Direito Constitucional II Caso prático 2 (resolvido com os contributos dos alunos Alexandra Carreira, João Maria Bismark e Luís Pidwell) Analise a seguinte hipótese prática: Em 15 de março de 2015, o Governo apresentou um projeto de lei de autorização legislativa à Assembleia da República para regular o exercício do direito de manifestação por profissionais da PSP e da GNR, com o objetivo de tornar esse direito dependente de uma autorização do Ministro da Administração Interna. Apreciado na generalidade, o projeto de autorização legislativa foi aprovado por larga maioria, com o voto favorável de 149 deputados, o voto contra de 30 e a abstenção dos restantes. Em seguida, a comissão parlamentar competente apreciou o projeto de autorização legislativa e introduziu uma modificação, explicitando que a autorização legislativa tinha de ser exercida no prazo máximo de 90 dias, quando antes não existia qualquer prazo para a mesma. O projeto foi depois aprovado em votação final global através do voto favorável de 151 deputados, o voto contra de 22 e a abstenção dos restantes.

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Direito Constitucional II

Caso prtico 2 (resolvido com os contributos dos alunos Alexandra Carreira, Joo Maria Bismark e Lus Pidwell)

Analise a seguinte hiptese prtica:

Em 15 de maro de 2015, o Governo apresentou um projeto de lei de autorizao legislativa Assembleia da Repblica para regular o exerccio do direito de manifestao por profissionais da PSP e da GNR, com o objetivo de tornar esse direito dependente de uma autorizao do Ministro da Administrao Interna.Apreciado na generalidade, o projeto de autorizao legislativa foi aprovado por larga maioria, com o voto favorvel de 149 deputados, o voto contra de 30 e a absteno dos restantes. Em seguida, a comisso parlamentar competente apreciou o projeto de autorizao legislativa e introduziu uma modificao, explicitando que a autorizao legislativa tinha de ser exercida no prazo mximo de 90 dias, quando antes no existia qualquer prazo para a mesma.O projeto foi depois aprovado em votao final global atravs do voto favorvel de 151 deputados, o voto contra de 22 e a absteno dos restantes.O decreto foi enviado ao Presidente da Repblica para promulgao que o promulgou ao fim de 20 dias. O decreto foi ento referendado pelo Primeiro-Ministro e publicado no Dirio da Repblica a 15 de maio de 2015.Porm, face a um pssimo resultado eleitoral autrquico, o Primeiro-Ministro apresentou ao Presidente da Repblica a sua demisso em 20 de junho de 2015, a qual foi aceite pelo Presidente. Na audincia concedida onde o Primeiro-Ministro apresentou a demisso, o Presidente manifestou-lhe a importncia em executar a autorizao legislativa ainda pendente, pois a mesma era de relevncia crucial.Assim, logo na semana seguinte, o Conselho de Ministros aprovou um decreto para ser publicado como decreto-lei onde se visava cumprir a autorizao legislativa em causa, onde se determinou que o direito de manifestao por profissionais da PSP e da GNR poderia ser exercido se fosse autorizado por despacho conjunto do Ministro da Defesa Nacional e do Ministro da Administrao Interna.O Presidente da Repblica, porm, teve dvidas acerca da constitucionalidade deste decreto e decidiu vet-lo. Face a esse veto, o Conselho de Ministros decidiu voltar a aprov-lo e a submet-lo ao Presidente.

Resoluo

No presente caso prtico pode ser feita uma diviso do mesmo em trs partes, correspondentes s trs principais situaes a analisar. So elas as seguintes:1. A Lei de autorizao legislativa2. A demissao do Primeiro-Ministro3. O Decreto-Lei do Governo (Decreto-Lei autorizado)

Vejamos separadamente cada uma destas situaes.

1. A Lei de Autorizao Legislativa

1. O Governo pode (ter iniciativa de) pedir uma autorizao legislativa?Na hiptese referida o Governo apresentou uma iniciativa legislativa Assembleia da Repblica (AR), na qual solicita uma autorizao legislativa ao abrigo do artigo 167.-1 CRP. No suscita dvidas a possibilidade de o Governo apresentar propostas de Lei AR para solicitar a aprovao de uma autorizao legislativa.Porm, esta matria consta do artigo 164.-o) CRP, onde se determina que esta matria se increve no mbito da reserva absoluta da Assembleia da Repblica. Ora, fazendo esta matria parte da reserva absoluta e no da reserva relativa da Assembleia da Repblica, no poderia ser apresentada e menos ainda aprovada uma Lei de Autorizao Legislativa do Governo.

1. Saber se o Governo pode apresentar um projeto de lei.No da competncia do Governo apresentar projetos de lei (artigo 197. CRP). A iniciativa legislativa do Governo exercida atravs de propostas de lei, sendo essa a forma atravs da qual as entidades externas Assembleia da Repblica (Governo, assembleias legislativas regionais e grupos de cidados eleitores) apresentam iniciativas legislativas.

1. Pode o Governo apresentar uma iniciativa legislativa nesta matria?O Governo pode apresentar uma iniciativa legislativa nesta matria. A iniciativa legislativa do Governo no se encontra especialmente limitada, podendo a mesma ser exercida mesmo em matrias da reserva de competncia absoluta da AR, como veremos que o caso (artigos 167.-1 e 197.-1-d) CRP).

1. O direito de manifestao pode ser limitado desta forma, em relao a profissionais da GNR e da PSP?A CRP protege o direito de manifestao enquanto direito fundamental com a natureza de direito, liberdade e garantia no seu artigo 45. CRP. No entanto, o artigo 270. CRP prev a possibilidade de restringir especialmente este direito relativamente a agentes militarizados (GNR) e agentes e dos servios e das foras de segurana (PSP). Consequentemente, o direito de manifestao pode, nestes casos, ser restringido, desde que o mesmo se contenha dentro dos limites do Princpio da Proporcionalidade. A exig~encia de uma autorizao ministerial prvia no parece constituir uma restrio excessiva ou desproporcionada, atendendo aos especiais valores em presena.

1. Qual a maioria necessria para a aprovao do diploma na generalidade?Enquadrando-se esta matria no artigo 164.-o) CRP, torna.se necessria uma maioria de dois teros dos deputados em efetividade de funes, segundo o artigo 168.-6-e) CRP. Assim, seria necessrio o voto favorvel de 153 deputados para o diploma ser aprovado, o que no ocorreu. que se verificaram apenas 149 votos favorveis, pelo que o diploma padece de uma inconstitucionalidade formal.

1. A comisso parlamentar podia ter introduzido alteraes proposta apreciada?Sim. As comisses parlamentares podem apresentar alteraes ao texto do projeto e vot-las (artigo 167.-8 CRP).

1. obrigatrio estabelecer um prazo para as autorizaes legislativas?

Todas as autorizaes legislativas devem ter um prazo, nos termos do artigo 165.-2 CRP. Portanto, a iniciativa legislativa apresentada continha um vcio grave, consistente na inexistncia de prazo para a execuo da autorizao legislativa.

1. A maioria exigvel para a votao final global foi respeitada?Dado que estamos perante uma matria prevista na alnea o) do artigo 164. CRP, prev o artigo 168-6-e) CRP que ter de se verificar existir maioria de dois teros dos deputados em efetividade de funes para o diploma ser aprovado. Portanto, seriam necessrios 153 votos favorveis, o que no se verificou. Deste modo, o diploma no obteve a maioria exigvel, verificando-se uma inconstitucionalidade formal.

1. Qual o prazo que o Presidente da Repblica (PR) tem para promulgar?O PR tem, segundo o artigo 136.-1 CRP, vinte dias para promulgar ou exercer o direito de veto poltico a partir do momento que recebe o diploma. Ele pode, igualmente, solicitar ao Tribunal Constitucional a fiscalizao preventiva da constitucionalidade de normas do diploma, mas terde o efetuar em oito dias (artigo 278.-3 CRP).

1. O diploma precisa de ser referendado ou no?O presente diploma carece de referenda ministerial, nos termos do artigo 140.-1 CRP. Com efeito, a promulgao de leis ou decretos-leis exige sempre a referenda ministerial do Primeiro-Ministro, pelo que tudo parece ter-se passado corretamente.A falta de refenda ministral resultaria em inexistncia jurdica do acto, como prev o n. 2 do artigo 140. CRP.

1. O diploma deve ser publicado? O diploma em questo tem de ser publicado em Dirio da Repblica, ao abrigo do artigo 119.-1-c) CRP.

1. A demisso do Primeiro Ministro

1. O Primeiro Ministro pode apresentar a sua demisso?O Primeiro-Ministro pode apresentar a sua demisso ao PR. O artigo 195.-1-b) CRP determina que, se o Primeiro-Ministro apresentar a sua demisso ao PR e este a aceitar, de tal ato resultar a demisso do Governo.

1. Quais as consequncias do pedido de demisso, uma vez aceite pelo Presidente da Repblica?Uma vez aceite o pedido de demisso do Primeiro-Ministro pelo PR, verificam-se importantes consequncias. Em primeiro lugar, a aceitao do pedido de demisso do Primeiro-Ministro provoca a demisso do Governo, nos termos do artigo 195.-1- b) CRP. Em segundo lugar, o Governo permanece em funes, mas apenas com competncia para a prtica de atos de mera gesto at que um novo governo tome posse. Finalmente, em terceiro lugar, caducam as autorizaes legislativas que se encontravam pendentes (artigo 165.-4 CRP).

1. O Decreto-Lei Autorizado

1. A autorizao legislativa ainda podia ser utilizada?A lei de autorizao legislativa que havia sido concedida no podia ser utilizada, uma vez que a mesma caduca com a demisso do Governo (artigo 165.-4 CRP). O Decreto-Lei aprovado pelo Governo , pois, inconstitucional a dois ttulos: por um lado porque versa sobre matria da reserva de competncia absoluta da AR 8artigo 164.-o) CRP), por outro porque, caso fosse possvel emitir uma autorizao legislativa (o que no era), a mesma j havia caducado (artigo 165.-4 CRP).Verifica-se, pois, uma inconstitucionalidade orgnica por o Governo ter legislado quando a competncia pertencia AR.

1. O DL poderia estabelecer de forma diferente do consagrado na Lei de Autorizao Legislativa?

O DL no pode contrariar o sentido e extenso da autorizao legislativa, devendo observ-la (artigo 165.-2 CRP). Ora, determinar que o direito de manifestao de profissionais da GNR e PSP s pode ser exercido mediante despacho conjunto do Ministro da Defesa Nacional e do Ministro da Administrao Interna, quando a Lei de Autorizao Legislativa apenas previa um nico despacho, de um nico ministro, significa contrari-la de forma ilegtima.Verifica-se, pois, uma inobservncia da autorizao legislativa concedida, consistindo a mesma em inconstitucionalidade ou ilegalidade.

1. O PR pode vetar politicamente invocando questes de constitucionalidade?O Presidente da Repblica pode vetar politicamente sobre toda e qualquer razo, de acordo com o artigo 136.-1 CRP, no estando limitado quanto s razes que o levem a vetar. O veto poltico relativamente a um diploma do Governo deve ser exercido no prazo de quarenta dias (artigo 136.-4 CRP).Portanto, mesmo em questes de inconstitucionalidade de aceitar esta possibilidade, podendo o PR utiliz-la em vez de pedir a fiscalizao preventiva da constitucionalidade ao TC.

1. O Conselho de Ministros pode confirmar o diploma?O Conselho de Ministros no pode confirmar o diploma. O Conselho de Ministros pode reformular o diploma e voltar a apresenta-lo ao PR para promulgao ou desistir do mesmo, nada fazendo.