Davi e o Vale Do Carvalho

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DAVI E O VALE DO CARVALHO Logo que o azeite da unção foi derramado sobre a ca- ça de David, ele foi chamado da sua solidão para estar pe- rante o rei Saul, agora abandonado de Deus e perturbado por um espírito mau. Este homem infeliz necessitava das notas calmant es da harpa de David para dissipar a influên- cia horrenda do espírito que agora o perseguia dia a dia. Desgraçado homem! Recordação triste dos resultados duma carreira obstinada! Contudo, David não hesitou ocupar o lugar de servo, até mesmo na casa daquele que havia mais tarde de se reve- lar o seu maior inimigo. Era-lhe indiferent e o lugar onde servia ou o que fazia: quer fosse guardar o rebanho de seu pai dos leões e dos ursos, ou afugentar um espírito mau de Saul. De fato, no próprio momento em que coma a his- tória de David, ele aparece como um servo, pronto para todo o serviço, e o Vale do Carvalho dá-nos um exemplo notável do seu caráter de servo. Saul parece não ter tido a mínima idéia de quem era aquele que comparecia na sua presença, e cuja música re- frescava o seu espírito perturbado: não sabia que tinha na sua presença o futuro rei de Israel. « ... Saul... o amou muito, e foi seu pajem de armas.» O egsta Saul empre- gava com alegria os serviços de David, embora estivesse pronto a derramar o seu sangue quando compreendeu quem ele era.

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Exemplos da vida de fé na vida de Davi e época de Davi - C. H. Mackintosh

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    Logo que o azeite da uno foi derramado sobre a ca- a de David, ele foi chamado da sua solido para estar pe- rante o rei Saul, agora abandonado de Deus e perturbado por um esprito mau. Este homem infeliz necessitava das notas calmantes da harpa de David para dissipar a influn- cia horrenda do esprito que agora o perseguia dia a dia. Desgraado homem! Recordao triste dos resultados duma carreira obstinada!

    Contudo, David no hesitou ocupar o lugar de servo, at mesmo na casa daquele que havia mais tarde de se reve- lar o seu maior inimigo. Era-lhe indiferente o lugar onde servia ou o que fazia: quer fosse guardar o rebanho de seu pai dos lees e dos ursos, ou afugentar um esprito mau de Saul. De fato, no prprio momento em que comea a his- tria de David, ele aparece como um servo, pronto para todo o servio, e o Vale do Carvalho d-nos um exemplo notvel do seu carter de servo.

    Saul parece no ter tido a mnima idia de quem era aquele que comparecia na sua presena, e cuja msica re- frescava o seu esprito perturbado: no sabia que tinha na sua presena o futuro rei de Israel. ... Saul... o amou muito, e foi seu pajem de armas. O egosta Saul empre- gava com alegria os servios de David, embora estivesse pronto a derramar o seu sangue quando compreendeu quem ele era.

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    Mas voltemos a nossa ateno para os acontecimentos profundamente interessantes do Vale do Carvalho.

    E os filisteus ajuntaram os seus arraiais para a guerra. Nestas palavras encontramos alguma coisa destinada are velar o verdadeiro carter e o valor de Saul e de David, o homem formal e o homem de poder. a provao que revela a realidade dos recursos do homem. Saul j havia sido experimentado, porque ... todo o povo veio atrs dele, tremendo (I Sam. 13 :7); nem to-pouco nesta ocasio ele ia mostrar-se um condutor enrgico. Um homem abando- nado por Deus e atormentado por um esprito mau estava pouco apto a conduzir um exrcito para a batalha, ou a en- frentar, por si s, o poderoso gigante Golias.

    A batalha do Vale do Carvalho tornou-se excessivamente peculiar pelo desafio, por parte de Golias, para se decidir a contenda por um combate individual; era o verdadeiro meio de um individuo se tornar notvel. No era, como em casos normais, uma luta de exrcito contra exrcito, mas sim uma questo de quem, de entre todo o arraial de Israel, se aventuraria a enfrentar o terrvel inimigo incircunciso. Com efeito, evidente que o bendito Deus estava prestes a mostrar a Israel, outra vez, que, como povo, eles eram intei- ramente impotentes, e que a sua nica libertao, como anti- gamente, era o brao do Senhor, que estava ainda pronto a actuar no Seu carter maravilhoso de varo de guerra, desde que a f o reconhecesse como tal.

    Durante quarenta dias consecutivos o filisteu apresen- tou-se vista do infeliz Saul e do seu exrcito atacado de terror. E notemos o seu insulto mordaz: - No sou eu filisteu e vs servos de Saul? Desgraadamente, isto era verdade; tinham descido da sua posio elevada de servos do Senhor para se tornarem apenas servos de Saul. Samuel tinha-os prevenido de tudo isto - havia-lhes dito que nada mais seriam seno soldados, padeiros, cozinheiros e confei- teiros do senhor da sua escolha; e tudo isto por no terem contado com o Senhor Deus de Israel, como seu Senhor e

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    Rei. Nada, porm, pode ensinar o homem como a amarga experincia; e o escrnio humilhante de Golias mostrava, sem dvida, outra vez a Israel a verdadeira natureza da sua condio debaixo do domnio esmagador dos Filisteus.

    Escolhei de entre vs um homem que desa a mim, disse o gigante. Como estava longe de saber quem estava prestes a ser o seu antagonista. Em toda a sua fora vaidosa da carne, imaginava que nenhum israelita podia enfrent-lo.

    E aqui podemos perguntar, onde estava Jnatas? Aquele que havia agido com f simples e energia (I Samuel 14), porque no estava agora pronto a descer contra este cam- peo? No tenho dvidas, se pensarmos principalmente nas suas aes, que a sua f no era daquele carcter simp Ies, independente, que pode conduzir um homem atravs de todas as dificuldades. O defeito da sua f parece estar nas pala- vras: Se nos disseram assim... A f nunca diz se; s trata com Deus. Quando Jnatas disse, para com o Se- nhor nenhum impedimento h, ele proferiu um princpio precioso da verdade, e que devia lev-lo avante sem ses. Se a alma de Jnatas tivesse descansado simplesmente na competncia de Deus, no teria procurado um sinal. ver- dade que o Senhor deu-lhe graciosamente um sinal, do mesmo modo que havia dado um a Gedeo, tempos antes, porque Ele sempre satisfaz todas as necessidades dos Seus servos.

    Todavia, Jnatas no fez o seu aparecimento no Vale do Carvalho; havia feito, assim parece, o seu trabalho, e agiu segundo a sua competncia; porm, no caso presente, havia necessidade de alguma coisa muito mais profunda do que tudo que Jnatas havia conhecido.

    Contudo, Deus estava preparando secretamente um ins- trumento para esta nova e mais difcil tarefa. E, prezado leitor, no podemos dizer que sempre assim que o bendito Deus procede? Ele treina em segredo aqueles que vai usar em pblico. Familiariza os Seus servos Consigo na soleni- dade do Seu santurio, e faz passar a Sua grandeza perante

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    eles, para que deste modo eles possam olhar para as difi- culdades da sua carreira. Aconteceu assim com David. Ele havia estado sozinho com Deus enquanto guardava as ove- lhas no deserto; e a sua alma estava cheia com o pensa- mento do Seu poder; e agora faz o seu aparecimento no Vale do Carvalho com toda a dignidade de renncia prpria de um homem de f. O fracasso humano fora inteiramente provado durante os quarenta dias de jactncia de Golias. Saul nada pde fazer; os trs filhos de Jess nada puderam fazer; at o prprio Jnatas nada pde conseguir. Tudo estava, ou parecia estar, perdido quando o jovem David entrou em cena, vestido do poder d' Aquele que ia deitar por terra a pompa e glria do orgulho do filisteu.

    As palavras de Golias foram transmitidas a David, e nelas ele reconheceu imediatamente um desafio blasfemo ao Deus vivo. Quem, disse ele, , pois, este incircunciso filis- teu para afrontar os exrcitos do Deus vivo? A f de David reconheceu no exrcito amedrontado, que estava perante si, o exrcito do Deus vivo, e fez do caso imediatamente uma questo entre o Senhor e o filisteu. Este fato cheio de instruo. No h mudana alguma de circunstncias que possa roubar a dignidade que o povo de Deus tem aos olhos da f. Podem estar humilhados, aos olhos do homem, como no caso de Israel na presente ocasio, mas nunca podero perder aquilo que Deus lhes d; e por isso David, vendo desanimar os pobres irmos vista do seu terrvel inimigo, pde reconhecer aqueles com quem o Deus vivo Se havia identificado, e que no podiam, portanto, ser derrotados por um filisteu incircunciso.

    Quando a alma est em exerccio, pe-se em ligao di- recta com a graa e fidelidade de Deus, e os Seus prop- sitos para com o Seu povo. verdade que Israel tinha lan- ado toda esta tristeza e humilhao sobre si por meio da sua infidelidade; no era da vontade do Senhor que os israelitas desanimassem na presena do inimigo; era tudo resultado da sua prpria culpa, e a f deve sempre conhecer

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    e admitir isto. Ainda assim, a questo esta: quem este incircunciso filisteu? Esta a pergunta da f. No era o exrcito de Saul que ocupava a mente do homem da f. No, era o exrcito do Deus vivo - um exrcito sob o comando do mesmo Capito que havia conduzido as suas hostes atravs do mar Vermelho, pelo deserto terrvel, e por meio do Jordo, Nada menos, nada mais do que isto podia satisfazer a f.

    Porm, como so to pouco compreendidos ou apreciados os atos e as aes da f quando as coisas so humildes entre o povo de Deus! Isto evidente nas pginas da hist- ria de Israel, e, podemos dizer, nas pginas da histria da Igreja, tambm. A conduta de f simples, f infantil, est muito longe da vista humana; e se os servos do Senhor caem num estado baixo, carnal, nunca podero compreen- der o princpio de poder na alma de algum que se conduz realmente pela f. Uma tal pessoa nunca ser compreendida e ser-lhe-o atribudos motivos censurveis; ser acusada de se impor a si prpria ou de agir obstinadamente. Todas estas coisas devem ser esperadas por todo aquele que est na luta quando as coisas esto em declnio. Por falta de f, na maioria dos casos, um homem deixado s, e depois, quando guiado por Deus para atuar, certo ser mal compreendido.

    Foi assim no caso de David. No s foi deixado s numa ocasio de dificuldades, como teve que suportar o escrnio da carne, por meio de Eliab, seu irmo mais velho. E, ouvindo Eliab, seu irmo mais velho, falar queles homens, acendeu-se a ira de Eliab contra David, e disse: Porque desceste aqui? e a quem deixaste aquelas poucas ovelhas no deserto? bem conheo a tua presuno e a maldade do teu corao, que desceste para ver a peleja (I Samuel 17 :28). Este era o critrio de Eliab quanto ao procedimento de David. Ento disse David: Que fiz eu agora? porventura no h razo para isso? David foi levado por uma energia inteiramente desconhecida de Eliab, nem to-pouco teve ele

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    a preocupao de se justificar para com o seu orgulhoso irmo. Porque no tinha o prprio Eliab agido em defesa de seus irmos? Porque no tinham Abinadab ou Sama actuado? Simplesmente porque no tinham f. No somente estes trs homens se mostraram incapazes de agir, como toda a congregao estava aterrorizada na presena do ini- migo; e agora que aparecia no seu meio um a quem Deus estava prestes a usar maravilhosamente, ningum pde corn- preend-lo. E David disse a Saul: No desfalea o corao de nino gum por causa dele: teu servo ir, e pelejar contra este filisteu. F preciosa! no h dificuldade que a detenha. Nada pode impedir o seu caminho. O que era o filisteu para David? Nada. A sua imensa altura, a sua armadura formi- dvel, eram apenas circunstncias; e a f nunca olha para as circunstncias, mas espera em Deus. Se a alma de David no estivesse ancorada pela f, ele no teria podido pro- ferir as palavras o teu servo ir; porque, atendei s pala- vras daquele que devia ter sido o primeiro a enfrentar o terrvel inimigo de Israel: Contra este filisteu no poders ir para pelejar com ele. Que linguagem para o rei de Israel! Que contraste entre o homem de governo e o homem de poder! Certamente Saul deveria ter sado em defesa do rebanho que fora confiado ao seu cuidado: mas, ah! ele no se preocupava com Israel, a no ser naquilo em que Israel estava ligado consigo, e por isso o expor-se em favor deles nunca, podemos dizer sem receio, subiu ao seu cora- o egosta; e no somente era incapaz de agir 'e no tinha o desejo de o fazer, como embaraaria de bom grado as energias de quem, nesse mesmo momento, mostrava os frutos desse princpio divino implantado em si, e que em breve provaria estar apto para o cargo elevado que o propsito de Deus lhe havia dado, e para o qual o havia destinado.

    No poders. Sem dvida, mas Deus podia, e David apoiava-se apenas no poder do Seu brao. A sua f lanou mo da competncia d' Aquele que havia a parecido a Josu,

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    abaixo dos muros de Jeric, com uma espada desembainhada na Sua mo, como prncipe do exrcito do Senhor. David sentiu que Israel no tinha deixado de ser o exrcito do Senhor, embora tivesse baixado muito daquilo que era nos dias de Josu. No, eles eram ainda o exrcito do Senhor, e a batalha era tanto a batalha do Senhor como quando o sol e a lua pararam no seu curso, a fim de que Josu pudesse executar o juzo de Deus sobre os cananeus. Esta convico fortaleceu o esprito de David, embora Eliab o acusasse de vaidade, e Saul pudesse falar da sua falta de talento.

    Nada h que possa dar tanta energia e poder perseve rante como a compreenso de atuarmos por Deus e que Deus est atuando conosco. isto que remove todos os obstculos, eleva a alma acima das influncias humanas, e tr-Ia para a prpria esfera de poder onipotente. Tenha- mos somente a certeza de que estamos do lado do Senhor, e que a Sua mo est atuando conosco, e nada nos po- der afastar do caminho do servio e testemunho, leve-nos onde nos levar. Posso todas as coisas, disse o apstolo, n' Aquele que me fortalece. (Fil, 4:13). E tambm, De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas, para que em mim habite o poder de Cristo (11 Cor. 12 :9).

    O crente mais fraco pode fazer todas as coisas por Cristo; porm se a ateno do homem for chamada para este crente fraco, pode parecer presuno falar de poder para fazer todas as coisas. Assim, quando Saul considera David, e o compara com Golias, julga bem quando diz, Contra este filisteu no poders ir para pelejar com ele: pois tu s ainda moo, e ele homem de guerra desde a sua mocidade. Era uma comparao de carne com carne, e, como tal, era per- feitamente correta. Comparar um moo com um gigante no deixa lugar para dvidas quanto aos resultados da compa- rao; contudo ele devia ter comparado a fora de Golias com o poder do Deus dos exrcitos de Israel. Foi isto que David fez.

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    Ento disse David a Saul: Teu servo apascentava as ovelhas de seu pai; e vinha um leo e um urso, e tomava uma ovelha do rebanho; e eu sai aps ele e o feri, e livrei-a da sua boca; e, levantando-se ele contra mim, lancei-lhe mo da barba, e o feri, e o matei. Assim feriu o teu servo o leo, como o urso: assim ser este incircunciso filisteu como um deles, porquanto afrontou os exrcitos do Deus vivo. Este era o argumento da f. A mesma mo que o havia libertado de uma dificuldade livr-lo-ia da outra. No h se em tudo isto. David no esperou por um sinal; ele disse sim- plesmente, teu servo ir. David tinha sentido o poder da presena de Deus com ele em segredo antes de se apresen- tar em pblico como servo do Deus de Israel; e, como algum disse, David no se havia gabado do seu triunfo sobre o leo e o urso; ningum jamais havia ouvido falar nisso antes, nem to-pouco ele teria falado no caso, sem dvida, se no fosse com o propsito de mostrar o funda- mento slido de confiana que tinha a respeito do grande trabalho que estava prestes a fazer.

    Estava desejoso por mostrar que no era na sua prpria fora que ia enfrentar o inimigo. Assim aconteceu com o arrebatamento de Paulo ao terceiro cu; durante catorze anos essa circunstncia permaneceu sepultada como um se- gredo na mente do apstolo, nem ele a teria jamais divul- gado, se os argumentos carnais dos Corntios no o tives- sem compelido a faz-lo.

    Ora estes dois casos so plenos de instruo prtica para ns. Com a maioria de ns, enfim, h uma prontido para falar dos nossos pobres feitos, ou, pelo menos, para pen- sarmos neles, A carne est pronta a gloriar-se em qualquer coisa que possa exaltar a personalidade; e se o Senhor, a despeito do mal em ns, consegue algum pequeno servio por nossa instrumental idade logo rpidamente apregoado num esprito de orgulho e vaidade. muito bom falar-se da graa do Senhor, e termos os nossos coraes cheios de

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    grata adorao por isso; porm isto diferente da jactncia quanto s coisas ligadas com a personalidade.

    David, porm, guardou o segredo do seu triunfo sobre o leo e o urso em seu corao, e no o revelou at ao mo- mento apropriado: nem to-pouco ele fala, at mesmo neste momento, de si como tendo conseguido um grande feito, mas diz simplesmente, O Senhor me livrou da mo do leo, e da do urso; ele me livrar da mo deste filisteu, Isto era f preciosa de renncia! - Aquela f que conta com Deus para tudo, e no confia na carne em coisa alguma -, f que conta com Deus em todas as dificuldades, e nos leva, com gratido profunda, a escondermos a personalidade e a dar a glria ao Senhor. Que as nossas almas conheam mais e mais desta bendita f,

    Contudo necessria freqentemente muita simplicidade para descobrir a grande diferena entre a linguagem da f e a linguagem formal e comum da religiosidade. Saul tomou a aparncia e a fraseologia da religio; vemos isto no s na sua histria, como na entrevista que teve com David. A mera religio e a f brilham aqui em contraste notvel. Quando David deu testemunho claro e inequvoco da sua f na presena do Senhor, Saul acrescentou, Vai-te embora, e o Senhor seja contigo. Mas ha! quo pouco ele sabia o que representava David ter o Senhor consigo! Saul parecia confiar no Senhor, mas, na realidade, confiava na sua arma- dura. Se ele tivesse compreendido o que dissera, porque havia de usar a sua armadura? O Senhor seja contigo era, nos lbios de Saul, uma expresso banal! na realidade nada queria dizer, porque no fazia a mnima idia de David ir com o Senhor.

    conveniente acentuarmos e frisarmos o mal do em- prego de palavras que, tanto quanto nos diz respeito, nada querem dizer, mas que apenas importam num gracejo com o nome do Senhor e a verdade. Quantas vezes falamos em confiar no Senhor, quando, na realidade, confiamos em qualquer circunstncia ou nas circunstncias. Quantas vezes

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    falamos em viver dia a dia em simples dependncia de Deus, quando a verdade que, se julgarmos a condio positiva das nossas almas diante de Deus, estamos esperando nal- guma origem humana ou terrena de suprimento. um mal triste, contra o qual devemos vigiar cuidadosamente. Foi isto precisamente que Saul mostrou, quando, depois de ter feito uso da expresso aparentemente devota O Senhor seja contigo, disps-se a vestir David dos seus vestidos, e ps- -lhe sobre a cabea um capacete de bronze: e o vestiu de uma couraa. No fazia outra idia seno de que David devia lutar do modo vulgar. Sem dvida, isto era feito em nome do Senhor; contudo, Sau1 pensou que David devia usar meios.

    Mas o fato que ns muitas vezes falamos em usar meios, quando a verdade que pomos Deus inteiramente de parte; professamos empregar meios, em dependncia de Deus, e, na realidade, usamos apenas o nome de Deus em dependncia dos meios. Isto virtualmente, e segundo o juzo da f, fazer um deus dos nossos meios. O que isto seno idolatria? Em que depositava Saul mais confiana, no Se- nhor ou na armadura? Na armadura, sem dvida; e assim com todos aqueles que no andam verdadeiramente por f; apeiam-se nos meios, e no em Deus.

    O leitor perceber, incontestavelmente, como tudo isto est de acordo com o ttulo deste livro, isto : Exemplos da Vida da F.

    Dificilmente poderemos tratar de algum ponto do nosso assunto mais importante do que aquele que sugerido pela cena interessante que vamos agora considerar. O homem dos meios e o homem da f esto realmente diante de ns, e ns percebemos imediatamente como o ltimo est longe de agir segundo os meios. Os meios so para ser usados, sem dvida, mas s aqueles que so perfeitamente consistentes com a aco bendita e plena da f, e tambm com a glria ima- culada do Deus de todo o poder e graa. Ora David sentiu que os vestidos de Saul e a sua couraa no representavam

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    esses meios, e portanto recusou-os. Se ele tivesse partido com eles, a vitria no teria sido to claramente do Senhor. Mas David havia confessado a sua f na libertao do Se- nhor, e no na armadura de Saul. Verdade seja que deve- mos usar meios; porm tenhamos muito cuidado que os meios no ponham Deus de parte (1).

    E David cingiu a espada sobre os seus vestidos, e co- meou a andar; porm nunca o havia experimentado: ento disse David a Saul: No posso andar com isto, pois nunca o experimentei. E David tirou aquilo de sobre si. Liber- tao feliz dos estorvos miserveis do expediente humano! Tem-se dito, e muito bem, que o perigo para David no foi quando se encontrou com o gigante, mas quando se viu ten- tado a usar a armadura de Saul. Se o inimigo tivesse sido bem sucedido em o induzir a ir com ela, tudo estava per- dido; mas, mediante a graa, ele rejeitou-a, e assim entre- gou-se inteiramente nas mos do Senhor, e ns sabemos qual a segurana quc encontrou nelas. isto que a f sem- pre faz: deixa tudo, inteiramente, ao cuidado de Deus. No se trata de confiar no Senhor e na armadura de Saul, mas somente no Senhor.

    E no podemos ns aplicar este princpio ao caso de um pobre pecador desamparado, a respeito do perdo dos seus pecados? Creio que sim. Satans procura tentar o pecador a acrescentar alguma coisa obra consumada de Cristo- alguma coisa que diminua a glria do Filho de Deus como o nico Salvador de pecadores. Ora queles que assim fazem eu gostaria de dizer que seja o que for que se acrescente obra de Cristo s consegue inutiliz-la. Se fosse permitido juntar-lhe alguma coisa, ento certamente que a circunciso teria sido admitida, visto ser uma ordenao de instituio

    (') A f espera em Deus, e consente que Ele use quaisquer meios que lhe agradem. No pede a Deus para abenoar os nossos meios, mas consente que Ele use os Seus prprios meios.

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    divina; porm, o apstolo diz: Eis que eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar Cristo de nada vos apro- veitar. E de novo protesto a todo o homem que se deixa circuncidar que est obrigado a guardar a lei. Separados estais de Cristo, vs, os que vos justificais pela lei; da graa tendes cado (Gal. 5:2 a 4,) _ Em resumo: devemos ter, por tanto, somente Cristo; e no Cristo e as nossas obras, mas simplesmente Cristo, porque Ele suficiente; no precisamos de nada mais, e no podemos passar com menos. Desonra- mos a suficincia do Seu sacrifcio expiatrio sempre que procuramos ligar alguma coisa nossa com ele, precisamente como David teria desonrado o Senhor indo ao encontro do gigante filisteu com a armadura de Saul.

    Sem dvida, muitos israelitas considerados como pru- dentes teriam condenado aquilo que lhes parecia precipi- tao descarada daquele moo; de fato, quanto mais expe- rimentado um homem fosse na arte da guerra tanto mais pronto estaria a condenar o modo de proceder do homem de f. Porm, David sabia em quem tinha crido - sabia que no era a precipitao que o impelia, mas a f simples na vontade e no poder de Deus para o socorrer. Talvez, poucos, no exrcito de Saul, conhecessem a fraqueza de David como ele prprio a conhecia nesse momento de provao. Embora os olhos de todos estivessem postos nele como aquele que tinha muita confiana em si mesmo, contudo ns sabemos o que era que sustinha o seu corao, e dava fir- meza aos seus passos, medida que avanava para enfren- tar o terrvel inimigo. Sabemos que o poder de Deus estava ali to real como quando as guas do mar foram divididas para abrir um caminho para os remidos passarem; e quando a f pe o poder de Deus em ao nada pode opor-se no caminho, nem por um momento.

    Eis a armadura de David. E tomou o seu cajado na mo, e escolheu para si cinco

    seixos do ribeiro, e p-los no alforje de pastor, que trazia, a saber: no surro, e lanou mo da sua funda: e foi-se che-

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    gando ao filisteu. Vemos, assim, que David usou meios; mas ah! que meios! Que desdm mostrou David pela arma- dura importante do seu inimigo! Como a sua funda devia ter sido um contraste com a lana do Golias, como se ela fosse a lana de um tecelo! De facto, David no podia ter infligido um golpe mais profundo no orgulho do filisteu do que vir contra ele com tais armas. Era simplesmente escarnecer da sua pesada armadura. Golias sentiu isto mesmo. Sou eu algum co ... ?, disse ele. No importa, no juzo da f, o que ele era; co ou gigante, ele era um ini- migo do povo de Deus, e David ia frit-lo com as armas da f.

    David, porm, disse ao filisteu: tu vens a mim com espada e com lana, e com escudo; porm eu venho a ti em nome do Senhor dos exrcitos, o Deus dos exrcitos de Israel, a quem tens afrontado. Hoje mesmo o Senhor te entregar na minha mo... e toda a terra saber que h Deus em Israel. E saber toda esta congregao que o Se- nhor salva, no com espada, nem com lana; porque do Senhor a guerra, e ele vos entregar na nossa mo (2). Aqui temos o verdadeiro objetivo do homem de f, a saber: que Israel e toda a terra possam ter uma prova gloriosa do poder e da presena de Deus no meio do Seu povo. O que alis nunca teriam tido se David tivesse usado a arma- dura de Saul. No teriam sabido que o Senhor salva no com espada nem com lana se ele as tivesse usado, e a sua luta teria sido apenas como qualquer outra. Porm, a funda e os seixos no deixaram lugar para dvidas quanto origem do poder da vitria (3).

    (') Veja-se o captulo 2 de Estudos sobre o Livro de Gnesis quanto distino das expresses Senhor e Deus - Jeov e Elohim.

    (') interessante notar as palavras de David. No diz, venho a ti com uma funda e uma pedra, mas, sim, em nome do Senhor dos exrcitos. Para si os meios nada representavam: mas Deus era tudo.

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    A f honra sempre a Deus, e Deus honra sempre a f. David, como tivemos ocasio de frisar, ps-se nas mos de Deus, e o feliz resultado disso foi a vitria completa e glo- riosa. Assim David prevaleceu contra o filisteu, com uma funda e com uma pedra, e feriu o filisteu, e o matou, sem que David tivesse uma espada na sua mo.

    Que triunfo magnfico! Fruto precioso de f simples em Deus! Como deve encorajar o corao a afastar de si toda a confiana carnal, e apegar-se verdadeira origem do po- der. David foi o feliz instrumento usado para libertar os seus irmos das ameaas atormentadoras e terrveis do filis- teu incircunciso; viera da vida pastoril ao seu meio, desco- nhecido e desprezado, embora fosse o rei ungido de Israel; fora com as mos vazias ao encontro do inimigo da congre- gao; prostrara-o e exibira-o publicamente; e tudo isto, no se esquea, como servo de Deus, e servo de Israel, na ener- gia da f que as circunstncias no podiam mover. Foi uma libertao gloriosa, ganha por um s golpe: sem manobras de exrcitos ou talento de generais ou proezas de soldados. No; um seixo de um ribeiro, arremessado pela mo de um pastor, arrumou todo o assunto. - Foi a vitria da f. ... Vendo ento os filisteus que o seu campeo era morto fugiram. Como so vs aquelas esperanas que so ba- seadas nos recursos falveis da carne, na sua maior fora e energia!

    Quem de entre aqueles que viram o gigante e o jovem prestes a entrarem em luta no teria tremido pela sorte deste? Quem poderia ter imaginado que toda aquela arma- dura nada seria para uma funda e uma pedra? E todavia vde o fim. O campeo dos filisteus caiu, e com ele caram todas as esperanas que acarinhava. Ento os homens de Israel e de Jud se levantaram c jubilaram, e seguiram os filisteus. Bem podiam eles jubilar, porque Deus ia adiante deles, para os libertar do poder dos seus inimigos. O Senhor havia operado poderosamente por mo daquele que eles no

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    conheciam, nem reconheciam, como seu rei ungido, mas cuja graa moral podia atrair os coraes.

    Porm, de entre os muitos milhares dos que viram a vitria, lemos de um cuja alma foi atrada em ardente afeio pelo vencedor. Os mais irrefletidos devem ter sido despertados com admirao pela vitria; e, sem dvida, a vitria atingiu os indivduos de modos diferentes. Podemos dizer dela, em certo sentido, que os pensamentos de muitos coraes foram revelados. Alguns tinham inveja, outros revelavam admirao; uns descansavam na vitria, outros confiavam, ainda, no instrumento da vitria; havia aqueles cujos coraes foram atrados para o Deus dos Exrcitos de Israel, que mais uma vez viera ao meio deles com uma espada desembainhada na Sua mo. Todavia, houve um corao dedicado que foi poderosamente atrado pela pessoa do vencedor, e este foi Jnatas. E sucedeu que, acabando ele de falar com Saul, a alma de Jnatas se ligou com a alma de David: e Jnatas o amou como sua prpria alma (I Samuel 18:1).

    Sem dvida Jnatas participou inteiramente da alegria de todos com o triunfo de David; contudo, no foi apenas o triunfo, mas a pessoa do vencedor que atraiu as afeies profundas da alma de Jnatas. Saul podia egoisticamente procurar reter David consigo, no porque sentisse amor por ele, mas simplesmente para se exaltar a si prprio. No aconteceu assim com Jnatas: ele amava realmente a David, e no era sem razo. David havia preenchido uma lacuna no seu corao, e tirara um fardo do seu esprito. Fora sentida uma grande falta. O desafio do gigante tinha, me- dida que era repetido diriamente, revelado a pobreza de Israel. Os olhos podiam percorrer de alto abaixo as fileiras em busca de algum que fosse capaz de enfrentar a neces- sidade urgente, mas no havia ningum.

    Ouvindo as palavras do gigante, todos os homens de Israel, vendo aquele homem, fugiam de diante dele, e temiam grandemente. Todos fugiam quando ouviam as suas pa-

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    lavras e viam a sua estatura. Era terrvel, portanto, o vazio deixado nos coraes nesta ocasio grave: e quando um ente querido aparecia para encher esse vazio, de admirar que a alma de Jnatas fosse atrada por autntica afeio por ele? E no se esquea que foi o prprio David, e no o seu feito, quem atraiu o corao de Jnatas. Jnatas admi- rava a sua vitria muito, mas admirava ainda mais a sua pessoa. No se tratava meramente do que fora feito, mas daquele que o fizera. bom notarmos isto, bom traarmos a sua notvel aplicao ao verdadeiro David. Que temos o direito de fazer tal aplicao no ser posto em dvida. Toda a cena, desde o princpio ao fim, notvel demais para admitir uma dvida. Em Golias vemos o poder do inimigo mediante o qual ele retinha a alma em escravido cruel. No havia meio algum de libertao deste poder ao alcance humano. O desafio podia ser repetido, dia a dia, ano aps ano, mas em vo. De sculo para sculo o veredicto solene podia ser ouvido pelas mirades da posteridade decada de Ado: aos homens est ordenado morrerem uma vez, vindo depois disso o juzo (Heb. 9 :27); e a nica resposta que o homem podia dar era a resposta de Israel no Vale do Carvalho - profundo desmaio. Com medo da morte, esta- vam por toda a vida sujeitos servido (Heb. 2 :15).

    Esta era a resposta do homem. A necessidade era sentida pelo vazio penoso. O corao humano suspirava por alguma coisa, mas em vo. As exigncias da justia no podiam ser satisfeitas; a morte e o juzo ameaavam distncia, e o homem apenas podia tremer com essas perspectivas. Porm, bendito seja o Deus de toda a graa, manifestou- Se um libertador poderoso para salvar - o Filho de Deus, o ver- dadeiro David, o Rei Ungido de Israel e de toda a terra. Ele supriu a necessidade, preencheu o vazio, e satisfez os anseias do corao. Mas como? Onde? Quando? Por meio da Sua morte no Calvrio, nessa hora terrvel em que toda a criao foi obrigada a sentir a realidade solene do que estava sendo cumprido.

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    Sim, prezado leitor, a cruz foi o campo onde se travou a batalha e a vitria foi ganha. Foi ali que ao homem va- lente foi tirada a sua armadura, e a sua casa foi saqueada (Mat. 12 :29). As exigncias da justia foram inteiramente satisfeitas, e a cdula das ordenaes, que nos era contrria, foi pregada na cruz. Ali, tambm, a maldio da desobe- dincia lei foi para sempre suprimida pelo sangue do Cor- deiro, e os brados da conscincia culpada foram aquietados: O precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro ima- culado e incontaminado (I Ped. 1 :18), liquidou tudo pela alma crente. O pobre pecador pode contemplar o conflito, e os seus resultados gloriosos - pode contemplar todo o poder do inimigo dominado pelo golpe do seu glorioso Liber- tador, e sentir o fardo esmagador rolar, pelo mesmo golpe, do seu esprito em luta. A onda da paz divina e a sua alegria podem inundar a sua alma, e ele pode andar no poder pleno da emancipao adquirida para si pelo sangue, e proclamada no evangelho.

    Acaso um tal pessoa, libertada deste modo, no amar a Pessoa do libertador? No se trata de amar meramente a obra, mas a Pessoa que a consumou! Ah! como poder ser de outra maneira?! Quem de entre aqueles que tm experi- mentado a sua verdadeira necessidade e gemido sob o peso intolervel do fardo dos seus pecados pode deixar de amar e adorar Aquele Senhor gracioso que supriu a necessidade e tirou o fardo? A obra de Jesus , fora de toda a dvida, infinitamente e perfeitamente preciosa; no h pensamento humano que possa jamais medir o seu valor. Alm disso, a Sua obra que realmente vale ao pecador. A obra de Cristo introduz a alma numa posio na qual ela pode contemplar a Sua Pessoa. Em suma, a obra do Salvador para o peca- dor; a Pessoa do Salvador para o santo; o que Ele fez para aquele; o que Ele , para este. Contudo, pode haver muita exatido em proclamar a obra de Cristo pelo pecador, enquanto que o corao est frio, as afeies so montonas

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    e as sensibilidades espirituais excessivamente obtusas quanto Sua Pessoa.

    No captulo 6 de Joo encontramos uma multido que segue o Senhor Jesus meramente por motivos egostas, e Ele v-Se constrangido a dizer-lhes, Na verdade, na verdade vos digo que me buscais, no pelos sinais que vistes, mas porque comestes do po e vos saciastes (versculo 26). No O bus- cavam por aquilo que Ele era, mas por causa daquilo que Ele lhes tinha dado; e por isso, quando Ele aplica aos seus coraes o argumento penetrante ... se no comerdes a carne do Filho do homem, e beberdes o seu sangue, no tereis vida em vs mesmos, lemos que muitos dos seus discpulos tornaram para trs, e j no andavam com ele. Ora, comer a Sua carne e beber o Seu sangue , por outras palavras, ter comunho com Ele na sua natureza humana- beber no poder preciosidade do grande mistrio da divin- dade: Deus manifestado em carne. Todo o evangelho de Joo o desenrolar da glria pessoal do Verbo Incarnado; e o relato que acabamos de reproduzir contm, com efeito, a prpria substncia dessa grande doutrina a nosso res- peito; contudo o homem natural no podia compreend-la, e por isso voltou para trs, e no mais andou com Ele. A maioria no podia admitir que a verdade a respeito da Pessoa do Filho do Homem lhes fosse imposta. Porm, prestemos ateno ao testemunho da Igreja tal qual dado por Pedro. Senhor, para quem iremos ns? Tu tens as palavras da vida eterna. E ns temos crido e conhecido que Tu s o Cristo, o Filho de Deus (versculos 68 e 69). Vemos nestas palavras duas coisas: o que Ele tinha, e o que Ele era; Ele tinha vida eterna para dar, e era o Filho do Deus vivo. Por meio daquela o pecador atrado a Ele; por inter- mdio desta o crente unido a Ele. Ele no s satisfaz todas as nossas necessidades, como pecadores, por meio da Sua obra, como tambm satisfaz as nossas afeies e de- sejos. como santos, por intermdio da Sua Pessoa.

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    Estes pensamentos so-nos sugeridos pela entrevista pro- fundamente interessante de David e Jnatas, depois do con- flito. Os milhares de israelitas tinham dado o brado de triunfo e perseguido os filisteus a fim de colherem os frutos da vitria, enquanto que Jnatas se deleitava em conver- sao com o vencedor. E Jnatas se despojou da capa que trazia sobre si, e a deu a David, como tambm os seus vestidos, at a sua espada, e o seu arco, e o seu cinto. Isto era um gesto de amor puro, simples, natural. O amor despe-se por amor do seu objeto. David tinha-se esquecido de si prprio e posto a sua vida em perigo por Deus e toda a congregao de Israel, e agora Jnatas esquece-se de si por amor de David.

    Prezado leitor, lembremo-nos de que o amor por Jesus a fonte do Cristianismo. O amor por Jesus leva-nos a des- pojarmo-nos de ns prprios; e, podemos dizer, despir-se a personalidade por Jesus o fruto mais belo da obra de Deus na alma.

    Quo diferentes eram os sentimentos de Saul para com David e o seu feito. No havia apreendido a esconder-se a si prprio e a regozijar-se por ver a obra feita por outro. um dom raro poder fazer-se isto. Todos ns gostamos natu- ralmente de fazer ou ser alguma coisa -- de sermos olhados e tidos como o objeto dos pensamentos dos outros. Acon- teceu assim com Saul; era um homem altivo, e no podia, portanto, suportar o cntico das raparigas de Israel: Saul feriu os seus milhares, porm David os seus dez milhares. Saul no podia tolerar a idia de ser o segundo. Esquecera-se do modo como havia tremido voz de Golias; se bem que, sendo um verdadeiro covarde, de boa vontade se deixaria ter na conta de um bravo.

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    Teremos ocasio de prosseguir nos nossos comentrios acerca da amizade de Jnatas e do dio de Saul no decorrer desta obra (4), mas devemos agora seguir o homem de f noutras cenas.

    (') preciso haver um corao simples e um olhar cndido para nos podermos regozijar com os resultados dos esforos de outrem como se fossem os nossos. Se a glria de Deus e o bem do Seu povo tivessem enchido inteiramente o corao de Saul ele no teria alimentado um pensamento sequer quanto ao nmero de vtimas que lhe era atri- budo ou a David. Contudo, no foi este o caso. Saul pensou na sua glria. Nisto est o segredo da sua inveja e cime. Oh! o descanso santo, a verdadeira elevao, a perfeita quietude de esprito que re- sultam da renncia prpria, como resultado do corao estar inteira- mente ocupado com Cristo! Quando buscamos, honestamente, a glria de Cristo, no se nos importar qual seja o instrumento usado.