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nova Economia_Belo Horizonte_16 (3)_459-480_setembro-dezembro de 2006 Das barricadas à vida privada Newton Bignotto Professor do Departamento de Filosofia da UFMG Resumo Este artigo trata da questão da participação e da ação política na contemporaneidade à luz de conceitos oriundos da tradição republica- na. Nossa preocupação central é com o tra- çado das fronteiras que separam o mundo público do privado nas sociedades atuais. Dois problemas merecem atenção especial: a questão da apatia e da solidão dos cida- dãos vivendo em sociedades democráticas periféricas e os excessos cometidos pelos que adotam o modelo de ação derivado do jacobinismo revolucionário. Abstract This article examines the issue of present-day participation and political action in light of the concepts that originated with the republican tradition. Our main concern is how the boundaries that separate the public world from the private world are drawn in contemporary societies. Two problems deserve special attention: the issue of apathy and loneliness of citizens who live in peripheral democratic societies, and the excesses committed by those who adopt the model of action derived from revolutionary Jacobinism. Palavras chave republicanismo, apatia, jacobinismo, público, privado. Classificação JEL Z00, Z10 Key words republicanism, apathy, Jacobinism, public, private. JEL Classification Z00, Z10

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Das barricadas à vida privada

Newton BignottoProfessor do Departamento de Filosofia da UFMG

Resumo

Este artigo trata da questão da participação eda ação política na contemporaneidade à luzde conceitos oriundos da tradição republica-na. Nossa preocupação central é com o tra-çado das fronteiras que separam o mundopúblico do privado nas sociedades atuais.Dois problemas merecem atenção especial:a questão da apatia e da solidão dos cida-dãos vivendo em sociedades democráticasperiféricas e os excessos cometidos pelosque adotam o modelo de ação derivado dojacobinismo revolucionário.

Abstract

This article examines the issue of present-dayparticipation and political action in light of theconcepts that originated with the republicantradition. Our main concern is how theboundaries that separate the public world fromthe private world are drawn in contemporarysocieties. Two problems deserve specialattention: the issue of apathy and loneliness ofcitizens who live in peripheral democraticsocieties, and the excesses committed by thosewho adopt the model of action derived fromrevolutionary Jacobinism.

Palavras chave

republicanismo, apatia,jacobinismo, público, privado.

Classificação JEL Z00, Z10

Key words

republicanism, apathy,Jacobinism, public, private.

JEL Classification Z00, Z10

Na segunda parte de seu roman-ce A invenção da solidão, Auster (1998) selança na reconstituição de sua vida pelarememoração de uma viagem pelo uni-verso da memória e da linguagem. Obce-cado por sua relação com os livros, o au-tor parte da idéia de que a linguagem énosso modo próprio de existência e que,por isso, não há razão para considerá-lacomo um veículo da verdade, que seriaexterior ao indivíduo, que vive e que nar-ra sua vida. O mergulho na linguagem ena busca pelo sentido da memória cobra,no entanto, alto preço daqueles que sedispõem a enfrentar as agruras do per-curso: o tempo presente parece se con-verter em uma ilusão, transformando ofuturo na única dimensão da vida, que po-de ser vivida intensamente. O narradorcoloca o leitor em contato com sua intimi-dade e o sentido de sua procura dizendo:

A atualidade na qual ele se encontrava,ele tinha a impressão de observá-la de umponto de vista que se situava no futuro, e opresente-passado parecia tão ultrapassadoque mesmo as atrocidades do dia, que nor-malmente o teriam indignado, lhe pareci-am distantes, como se essa voz sobre asondas tivesse lido a crônica de uma civili-zação perdida. Mais tarde, em um mo-mento de maior lucidez, ele chamaria essasensação de nostalgia do presente (Auster,

1988, p. 96).

O sentimento de perda do presen-te e de distanciamento do mundo cotidi-ano é cada vez constante na literaturacontemporânea e indica mudança na po-sição do indivíduo em relação à socieda-de, que não pode ser desprezada.1 No co-meço do século XX, os personagens deProust se interessaram pelas minúcias docotidiano e pela construção de personali-dades marcadas pelo convívio com obje-tos, que tornavam a vida privada o focode um interesse renovado. Tudo se passacomo se o longo século de embates pú-blicos, que marcara a vida francesa, e aqueda definitiva da monarquia tivessemesgotado as energias do mundo público eobrigado membros da sociedade a bus-car refúgio nas reentrâncias da intimida-de. Resta observar, no entanto, que emProust o mundo dos salões e das peque-nas intrigas continua a alimentar uma re-lação do indivíduo com a sociedade naqual o olhar do outro sobre as peripéciasde cada um dos atores é essencial. A polí-tica perde o lugar de destaque que obti-vera na obra de Victor Hugo ou de Zola,mas nem por isso o mundo público deixade ser uma referência constante. Muitasvezes seus ecos chegam mediante títulosnobiliárquicos, que vão perdendo valor,ou por meio de personagens, que con-servam o poder de atração, mesmo desti-tuídos de qualquer presença efetiva nos

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1 A esse respeito, são muitointeressantes as observaçõesde Renato Janine quanto aouso cada vez mais freqüentena linguagem correntebrasileira do gerúndio parasignificar uma extensãocontínua do presente (Ribeiro,2000, p. 92-95).

centros de decisão política ou econômi-ca, como é o caso de seu personagemprincipal. Seja como for, ainda não estápresente a solidão radical, que vai marcaro narrador de Paul Auster e de tantos ou-tros escritores.

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A maneira como se dá a relação do indi-víduo com a sociedade é um problemafundamental para os que se preocupamcom a questão da ação política e da parti-cipação no mundo contemporâneo. Essapreocupação leva em conta o fato óbvio,mas nem sempre lembrado por algunsteóricos da política, de que os atores con-cernidos pelos processos públicos terãocomo ponto de ancoragem costumes einstituições que definem, de forma muitoclara, as possibilidades de interação comoutros atores e com a sociedade de seutempo, e não apenas dados oriundos danatureza humana tomada abstratamente.

Por isso acreditamos que o apelo àparticipação, que integra o núcleo de mu-itas teorias republicanas do passado eatuais, deve ser analisado à luz das condi-ções que regem as relações entre os indi-víduos e as sociedades industriais da atu-alidade, não se restringindo à capacidademanifesta ao longo da história de indiví-

duos singulares influenciarem o cursodos acontecimentos. Com isso não esta-mos dizendo que o debate sobre a natu-reza das virtudes republicanas associadasà ação deva ser descartado em prol deuma sociologia dos atores políticos. Oque queremos dizer é que, ao partirmosde considerações gerais sobre a capacida-de de agir dos homens e deixando de la-do o diagnóstico das condições nas quaisos atores atuam, corremos o risco deapostar em uma teoria que nada nos ensi-nará sobre o mundo no qual vivemose sobre o qual queremos pensar. Recor-dando as lições de Merleau-Ponty (1960,p. 66), não podemos nos esquecer de que:

A filosofia está plenamente na história,ela não é jamais independente do discur-so histórico. Mas ela troca o simbolismotácito da vida por um simbolismo conscien-te, e substitui o sentido latente pelo senti-do manifesto.

Para compreender a identidade dosatores políticos nas sociedades contem-porâneas e o papel que a ação políticatem em sua maneira de se relacionar como mundo público, é preciso renunciar àidéia de que estejamos à procura de umadefinição da identidade dos indivíduos,que nos permite ligar a esfera de sua vidapsicológica profunda com a seqüência deatos que o torna membro de determinada

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comunidade. Ou seja, estamos assumin-do que não vamos tratar das característi-cas de personalidades, que constituem asidentidades individuais em sentido forte,mas apenas dos fenômenos sociais, quesão alterados pela maneira como os indi-víduos agem ou deixam de fazê-lo emdeterminados momentos.

Nosso problema diz respeito àconstituição das relações entre a esfe-ra pública e a privada. Para facilitar nos-sa argumentação, assumimos com Elias(1994, p. 127-189) que se trata de umabalança entre o eu e o nós e que é a exis-tência dessa balança, e a maneira comoela se comporta em determinadas épo-cas, que oferece nosso objeto de estudo.Não estamos com isso dizendo que oproblema da construção da identidadedas nações modernas não seja importan-te para nós, quando abordado do pontode vista da criação de seus símbolos e doimaginário popular; ou que a vida psico-lógica não seja em certas situações deter-minante para as interações entre os indi-víduos e o meio social. Estamos apenasescolhendo um caminho que nos parecemais fecundo, pelo simples motivo que oobjeto maior de nossa investigação – olugar do republicanismo no mundo con-temporâneo – tem de ser bem delimita-do, para não nos perdermos no sonho deuma teoria abrangente capaz de dar con-

ta da totalidade dos fenômenos políticos.Nossa hipótese nesse momento é, por-tanto, que a utilização da polaridade “pú-blico-privado”, em suas feições atuais,fornece um campo privilegiado para a in-vestigação do lugar da ação política naconstrução e na conservação das socie-dades democráticas.

O ponto central das considera-ções de Elias (1994, p. 152) que adota-mos aqui é que:

não há identidade-eu sem identidade-nós.Tudo o que varia é a ponderação dos ter-mos na balança eu-nós, o padrão da rela-ção eu-nós.

Portanto, a análise da ação política e deseu papel nas sociedades históricas nãopode ser feita com base na natureza hu-mana e em suas possibilidades. Precisa-mos levar em consideração a ancoragemhistórica da balança eu-nós e a posição re-lativa de seus elementos. Mas evitemosum equívoco. Não estamos dizendo queo estudo da natureza humana, ou maisespecificamente de algumas de suas ca-racterísticas, não seja importante paraa compreensão das sociedades políticas.Como procuraremos mostrar no final denosso texto, muitas de nossas análisessobre as sociedades atuais são tributáriasde teorias a respeito do fundamento dascomunidades políticas e de sua relação

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com a natureza dos homens, que não sãoclaramente explicitados, o que nos leva adesconhecer os conceitos básicos sub-tendidos em muitas análises, ou, comoprefere Taylor (2000, p. 200), a “ontolo-gia” pressuposta na concepção do mode-lo de sociedade que desejamos.

A principal dificuldade encontra-da por aqueles que defendem a partici-pação nos negócios públicos como mo-tor essencial das sociedades políticas li-vres advém do fato de que a balançaeu-nós pendeu, de forma clara, ao longodo século XX, para o pólo do indivíduo.Como afirma Elias (1994, p. 130):

Atualmente a função primordial do termo‘indivíduo’ consiste em expressar a idéiade que todo ser humano do mundo é oudeve ser uma entidade autônoma e, aomesmo tempo, de que cada ser humano é,em certos aspectos, diferente de todos os de-mais, e talvez deva sê-lo.

Esse processo de deslocamento emdireção à identidade-eu, que muitos iden-tificam com a própria formação da mo-dernidade, traz conseqüências óbvias pa-ra a análise do lugar que a ação direta dosindivíduos e de sua participação nos ne-gócios públicos ocupa na política das na-ções democráticas. Do ponto de vistahistórico, ela fornece um indicador preci-so de que a maneira como as antigas re-

públicas, em particular a República Ro-mana, concebiam e organizavam a vidade seus cidadãos na cena pública não po-de mais ser reproduzida nos dias de hoje(Elias, 1994, p. 130).

Essa constatação pode dar origema duas maneiras de abordar o problema.A primeira, que encontra sua ancoragemem boa parte da tradição liberal desdeo século XVIII, faz coincidir a constata-ção da contínua retirada dos indivíduosda cena pública com a progressiva reali-zação da natureza humana. Ou seja, oprocesso histórico de desenvolvimentodas sociedades capitalistas nada mais fa-ria do que realizar a tendência natural doshomens a concentrar sua atenção emseus interesses particulares. Como que-rem alguns utilitaristas radicais, agir se-gundo outra motivação do que aqueladerivada dos interesses individuais é agirirracionalmente.

A segunda abordagem do proble-ma, mais próxima das considerações deElias, parte do pressuposto de que a ba-lança eu-nós representa o que ele chamade um habitus, a maneira como responde-mos à pergunta “quem sou eu?” (Elias,1994, p. 154). Nesse sentido, os indivídu-os se vêem através de uma imagem quefoi sendo construída junto com outrosprocessos sociais e históricos e, por isso,

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não há lugar para uma representaçãodo indivíduo como um ente absoluta-mente autônomo, ainda que essa seja aforma como muitos de nós se representano interior das sociedades contemporâ-neas. Ainda que não nos identifiquemosinteiramente com o pensamento de Eliasno tocante ao lugar que ele atribui à idéiade progresso na teoria social contempo-rânea, sua abordagem da imagem do in-divíduo nas sociedades atuais, do pontode vista dos processos sociais amplosque o constituem, parece-nos muito su-perior às teorias que insistem em tomarcomo um dado natural a crescente buscade autonomia e de auto-realização pelosmembros das sociedades democráticas.

Nosso interesse principal, no en-tanto, não é o de realizar um balanço dasteorias concernentes ao desenvolvimen-to do moderno individualismo. Na estei-ra de Elias, consideramos que se tratade um processo social inescapável e, nes-se sentido, não podemos desprezá-lo sequisermos estudar as sociedades livrescontemporâneas. Mas, contra boa partedos autores liberais, não acreditamos queesse processo possa ser diretamente as-sociado ao desenvolvimento de uma ca-racterística natural dos homens, que fariaa balança eu-nós pender para o pólo euinelutavelmente nas democracias. Por is-so, interessa-nos aprofundar a análise de

um processo que no limite terminariacom o pleno desenvolvimento do quechamaremos de uma figura tipo, o indiví-duo solitário, dedicado ao desenvolvi-mento de sua personalidade, como o per-sonagem de Auster e à defesa de seusinteresses. No extremo, esse processo mar-caria a morte definitiva do espaço públi-co, que corresponderia a um estágio su-perado da vida política do Ocidente.

Estamos nos servindo do indiví-duo isolado por ser esse um operadorprimordial de muitos pensadores atuais epelo fato de que não podemos deixar deconsiderá-lo como um dado objetivo davida política das sociedades capitalistasdesenvolvidas e de outras. Formulando omesmo problema na linguagem mais tra-dicional das Ciências Sociais da oposiçãoentre espaço público e vida privada, po-demos dizer que a vida política sofreumodificações importantes com a dimi-nuição dos lugares nos quais os cidadãosse expressavam na condição de membrosde uma comunidade política, e não comorepresentantes singulares de uma espécieque se define pela hipertrofia do desejode verem realizados seus interesses.

Como mostra Sennett (2002, p. 381-384), o equilíbrio entre os dois domíniosconexos foi sendo alterado de tal formaque a vida privada expulsou os atores– termo que ele usa com gosto em sua

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obra – da cena pública para um mundode personalidades competitivas, que bus-cam o maior contato possível entre osmembros próximos de uma comunida-de, visando realizar o ideal de uma vidapovoada por afetos e destituída de más-caras. O resultado, segundo ele, é a cons-tituição de novas formas de organizaçãodo tecido social, que reduzem ao máxi-mo o espaço da prática política, que ser-viu de base para a criação das sociedadesdemocráticas modernas, e institui um jo-go em que o reconhecimento da perso-nalidade do outro é o fator determinantedas relações de poder que se estabelecemnas diversas esferas de ordenação da vidaem comum. Isso gerou uma transfor-mação que Sennett identifica como umanova forma de tirania.

Uma instituição – diz ele – pode dominarcomo uma fonte única de autoridade; umacrença pode servir como padrão único paraenfrentar a realidade.A intimidade é uma tirania, na vida diá-ria, dessa última espécie. Não é a criaçãoforçada, mas o aparecimento de uma cren-ça num padrão de verdade para se mediras complexidades da realidade social. É amaneira de se enfrentar a sociedade em ter-mos psicológicos. E na medida em queessa tirania sedutora for bem-sucedida, aprópria sociedade será deformada (Sennett,

2002, p. 412).

Partindo da constatação do enco-lhimento da esfera púbica e do aumentoda importância dos mecanismos jurídi-cos de controle dos conflitos, parte signi-ficativa dos cientistas sociais acreditoufazer do estudo dos diversos cenáriosproduzidos pela somatória dos interessesprivados e do impacto das personalida-des na luta pelo poder os operadoresfundamentais de toda reflexão política.Mais uma vez, não é o caso de fazer o ba-lanço dessas teorias.2 O pressuposto daatomização dos atores nas sociedadescontemporâneas é verdadeiro, à condi-ção de que não seja tomado, como fazemalguns, como um dado da natureza oucomo um resultado inelutável do proces-so histórico. A conseqüência que nos in-teressa debater é a de que qualquer formade participação de atores individuais naarena pública, que não corresponda aomodelo exposto por Sennett, é uma im-possibilidade, uma vez que contraria umsuposto estado real das coisas. Ora, senão podemos deixar de lado a progressi-va destruição do espaço público, pelomenos na forma como foi conhecido aolongo dos últimos séculos, se quisermosdiscutir o papel da ação política no mun-do atual, não há razão válida para excluira participação, em todas as suas formas,do ideário de uma sociedade livre. Ou se-

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2 No caso brasileiro,merecem especial atenção asobras de WanderleyGuilherme dos Santos e deFábio Vanderley Reis.

ja, a condenação dos ideais republicanosde participação nos negócios públicos ede liberdade vivida como integração efe-tiva nos mecanismos de poder da socie-dade como utópicos ou pouco realistasderiva de uma passagem indevida do ní-vel de generalização que podemos con-ceder à idéia de atomização dos indivídu-os. Se a tomamos com uma manifestaçãode um processo necessário, estamos fa-zendo não apenas uma formulação que,por sua generalidade, demanda uma de-monstração, que não se pode contentarcom a simples constatação do estado decoisas em sociedades particulares emcontexto próprio, mas, sobretudo, abdi-cando de analisar os pressupostos de or-dem teórica que devem ser explicitadospara que a concepção mais ampla sobre anatureza das comunidades políticas pos-sa ser investigada.

O que gostaríamos de enfatizar éo fato de que o republicanismo, que ado-tamos como referência de análise, ser-ve-se de fatos, como os até aqui lembra-dos, não para negar-lhes a realidade, maspara afirmar seu caráter problemático.Ou seja, a atomização dos atores políti-cos implica tanto que ideais como os departicipação e ação terão de encontrarum novo assento nas formações sociais,para poderem se efetivar, quanto que a

total atomização é na verdade uma im-possibilidade para uma sociedade que pre-tende continuar a ser livre.

Colocando de outra forma nossoponto de vista, diríamos que, diante dosprocessos estudados, cabe lembrar, maisuma vez com Elias (1994, p. 129), que nãopodemos separar inteiramente indivíduoe sociedade mesmo nas sociedades atuais,e que por isso o quadro dos possíveis é sem-pre mais amplo do que aquele oferecidopelas organizações políticas do presente.É, portanto, como um possível que fala-mos de um conjunto de valores republica-nos ancorados na ação política a na tradi-ção, assim como não podemos deixar delado o próprio desaparecimento das soci-edades democráticas como um possível doestado atual de ordenação dos atores po-líticos individuais. Nesse particular, asobservações de Hannah Arendt sobre aperda de identidade dos indivíduos nassociedades de massa permanecem atuais:

A verdade é que as massas surgiram dosfragmentos da sociedade atomizada, cujaestrutura competitiva e concomitante soli-dão do indivíduo eram controladas apenasquando se pertencia a uma classe. A prin-cipal característica do homem da massanão é a brutalidade nem a rudeza, mas oseu isolamento e a sua falta de relações so-ciais normais (Arendt, 1998, p. 366-367).

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Qualquer analogia entre o indiví-duo de massa, que facilitou a ascensão donazismo e do fascismo, e os cidadãos dasnações desenvolvidas pode nos levar aum erro que consistiria a deixar de lado ofator essencial na determinação do senti-do da solidão dos indivíduos, que é a ma-neira como se relacionam com sua co-munidade e os direitos que têm garantidonos quadros legais dos países onde vivem.Em outras palavras, a maneira como abalança eu-nós influencia seu comporta-mento. Ao notar, no entanto, a proximi-dade das descrições da relação entre osindivíduos e as sociedades em situaçõeshistóricas diferentes, estamos chaman-do a atenção para o fato de que a crescen-te solidão dos habitantes das sociedadescontemporâneas abre as portas para umuniverso de possíveis muito maior, inclu-sive naquilo que possui de monstruoso,do que os cenários construídos pelos so-fisticados cultores da teoria dos jogos.No outro lado desse campo de determi-nações, encontra-se a concepção republi-cana da democracia, que coloca o acentona participação ativa dos cidadãos na vi-da política como um freio para os efeitosnefastos da atomização. Como veremosdepois, essa não é, no entanto, uma pana-céia universal para os impasses de nossotempo e possui riscos simétricos aos queacabamos de apontar na figura tipo do ho-mem solitário.

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Se as considerações anteriores nos aju-dam a pensar a questão da ação políticano contexto mais amplo das sociedadesindustriais da atualidade, não podemosdeixar de interrogar-nos sobre a validadede nossas conclusões parciais para as so-ciedades periféricas do capitalismo, quenão se desenvolveram da mesma manei-ra que as nações mais ricas e não forja-ram uma cena pública comparável comaquela que vai aos poucos desaparecendodos países que a viveram intensamente.O pressuposto inicial de que o estudo dopapel da ação numa teoria republicanadepende do diagnóstico das condiçõesreais de atuação na cena política contem-porânea obriga-nos a nos perguntar so-bre essas mesmas condições no caso bra-sileiro. Obviamente está fora de questãotentar uma leitura aprofundada da rela-ção indivíduo-sociedade em nossa socie-dade, mas é possível pelo menos procurardemarcar algumas de nossas especificida-des, que ajudam a responder à perguntamais geral sobre a pertinência do resgatede certos elementos da tradição republi-cana, para se pensar a política nos tem-pos presentes.3 Mais uma vez, o recurso àliteratura pode ajudar-nos a encurtar ocaminho. Um texto luminoso a esse res-peito é o clássico de Lispector (1996), Ahora da estrela.

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3 Um bom diagnósticohistórico da participaçãopolítica no Brasilencontra-se em Carvalho(2002, p. 157-229).

Uma das dificuldades com as con-siderações dos autores aos quais recorre-mos está no fato de que elas partem dapressuposição da alteração da balança in-divíduo-sociedade em situações nas qua-is os dois pólos foram bem delimitadosao longo da História, o que torna percep-tível a mudança nos pesos respectivos.Acreditamos poder nos servir das análi-ses de autores como Elias a condição denão nos esquecermos de que nem o es-paço público conheceu um momento áu-reo entre nós, nem a condição de solidãoe apatia das grandes massas urbanas brasi-leiras reflete um processo de progressivoabandono de acirradas disputas na arenapública. Nessas condições, a personagemMacabéa da obra citada pode servir comoum guia para nosso olhar sobre a socieda-de urbana contemporânea brasileira.

Em primeiro lugar, é preciso ob-servar que a solidão é a marca de sua per-tença ao tecido urbano. Preocupado emser o mais fiel possível à história da mi-grante nordestina, o narrador nos falacruamente de seu isolamento:

A pessoa de quem vou falar é tão tola queàs vezes sorri para os outros na rua. Nin-guém lhe responde ao sorriso porque nemao menos a olham (Lispector, 1996, p. 30).

Mais à frente, ele completa esse retrato:

Quanto à moça, ela vive num limbo impes-soal, sem alcançar o pior nem o melhor. Elasomente vive, inspirando e expirando, inspi-rando e expirando (Lispector, 1996, p. 38).

Sua vida se define como uma ausência,uma presença física que demanda muitopouco para se inserir nas brechas da cidade.

Ela nascera com maus antecedentes e ago-ra parecia uma filha de um não-sei-o-quêcom ar de se desculpar por ocupar espaço(Lispector, 1996, p. 38).

O curioso da situação de Macabéaé que mesmo a infelicidade é vivida co-mo um luxo. A tristeza é para ela que“nascera inteiramente raquítica, herança do ser-tão” (Lispector, 1996, p. 43) um luxo demoça romântica ao qual não podia aspi-rar. Sua vida transcorre em um mundono qual as esferas do indivíduo e da so-ciedade estão muito pouco definidas,não pela erosão de suas potencialidades,mas pelo simples fato de que nunca exis-tiram plenamente. A solidão de Macabéaé, portanto, de outra ordem do que aquelado personagem de Auster; ela implica ummergulho na sociedade industrial sem olastro de sua história. Não se trata assimde uma ausência, de um passo anterior deum processo que se constituiria à medidaque a personagem deixasse o sertão paraviver no Rio de Janeiro. O fato é que a ci-

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dade grande reduz ao nada um indivíduoque não chegou a se individuar:

Nem se dava conta de que vivia numa so-ciedade técnica onde ela era um parafusodispensável (Lispector, 1996, p. 44).

Devemos resistir à tentação de fa-zer de Macabéa o símbolo da massa demigrantes que, tendo perdido a identida-de cultural que os unia ao interior do Bra-sil, veio encontrar nos grandes centrosurbanos uma exclusão total dos proces-sos políticos. Ela é muito mais do que is-so. Sua força elucidativa está justamenteem que não pode ser capturada pelasanálises clássicas da formação e destrui-ção do espaço público. Em sua solidão,ela desconhece até mesmo a existência deuma vida vivida na e pela cidade.

Sua ausência de aspiração para avida pública –“ela era calada (por não ter oque dizer) mas gostava de ruídos” (Lispector,1996, p. 49) – não se traduz, no entanto,na ausência de aspiração pela vida na ci-dade. Da mesma maneira que as grandesmassas brasileiras demonstraram apetitevoraz pela integração em vários níveisde sociabilidade, sem com isso aspirarnecessariamente a uma maior participa-ção política (Carvalho, 2002, p. 220-229)segundo os moldes canônicos das de-mocracias representativas, nossa perso-nagem desconfia do suco ralo de realida-

de, que lhe é oferecido por um cotidianoestafante e sem brilho, mas não deixa dedesejar o olhar do outro, ou o prazer fur-tivo de contemplar uma paisagem urbanainesperada.4 Sua vida resumida não deixade gestar a vontade de realizar um poucode seu eu à maneira do narrador de Aus-ter, que se constrói ao longo de seu mer-gulho pela linguagem. Macabéa aspira aoconvívio com os outros, mas, como osindivíduos plenos das sociedades ricas,goza ao máximo o luxo de ter seu peque-no mundo só para si. O momento de suasolidão alcança uma generalidade insus-peita para o leitor que até então a acom-panhara no vazio de um cotidiano feitode repetições:

Tinha um quarto só para ela. Mal acredi-tava que usufruía o espaço. E nem umapalavra era ouvida. Então dançou numato de absoluta coragem, pois a tia não aentenderia. Dançava e rodopiava porqueao estar sozinha se tornava: l-i-v-r-e! Usu-fruía de tudo, da arduamente conseguidasolidão, do rádio de pilha tocando o maisalto possível, da vastidão do quarto sem asMarias (Lispector, 1996, p. 57-58).

O paradoxo que emerge desse mo-mento de felicidade de Macabéa é queela atinge o mesmo ápice de fruição dopróprio eu do que aquele proporcionadopelo longo desenvolvimento dos indiví-

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4 “Mas parece-me que suavida era uma longa meditaçãosobre o nada. Só que precisavados outros para crer em simesma, senão se perderia ossucessivos e redondos vácuosque havia nela” (Lispector,1996, p. 54).

duos atomizados das sociedades indus-triais avançadas. Partindo de um sertãosem lastro de cidadania e mergulhandonum tecido urbano que lhe recusa umaidentidade, ela pode aspirar ao mesmoprazer do mundo reduzido da intimida-de. Na pobreza de um quarto infecto, asolidão mostra toda sua face pré-política.

Tomada como figura tipo, Macabéanos obriga a repensar toda abordagem davida política dos países periféricos pelaótica da falta e do atraso. Isso não querdizer que a observação da história dasdemocracias mais tradicionais do Oci-dente não sirva como instrumento para oestudo de muitos de nossos problemas.Ao contrário, temos insistido no papel darecuperação da tradição republicana parao estudo de nossa realidade. Mas a idéiade um desenvolvimento da vida política eda participação por etapas sucessivas semostra ferramenta inadequada para al-cançar a particularidade de nossa vidapolítica. No tecido urbano altamente pro-blemático brasileiro, vivemos processosmuito semelhantes aos experimentadosem outros países, sem que tenhamos co-nhecido o mesmo processo de constitui-ção e destruição do espaço público. Oque aprendemos, no entanto, mais facil-mente com a pobre nordestina de ClariceLispector do que com o personagem de

Auster é que a solidão é fundamentalmen-te um fenômeno antipolítico, que não de-pende de arena pública para se manifes-tar, nem mesmo da rede de proteção dedireitos, que caracteriza as democraciasrepresentativas. A satisfação plena da in-dividualidade é a destruição definitiva davida política democrática.

Macabéa, no entanto, não aspira aser deixada em paz em seu refúgio, comoparece ser o ideal de muitos teóricos libe-rais. A solidão é um luxo que as condi-ções brasileiras proporcionam para pou-cos e isso constitui nossa particularidadehistórica. Não tombemos, no entanto,numa armadilha. Quando nossa perso-nagem se movimenta para sair de seu pe-queno mundo tão avaro em felicidade,não é o mundo da política, com toda a ri-queza de um espaço público constituídoque encontra, mas a complexa rede de re-lações pessoais e familiares, que há muitocomanda a inserção dos brasileiros no te-cido social.5 Em suas andanças pela cida-de, a moça se depara com Olímpico de Je-sus, um operário metalúrgico nordestino,que como ela se encontra perdido no vas-to silêncio que circunda os desgarrados.

Olímpico de Jesus tem tão poucoa dizer sobre o mundo quanto Macabéa,mas, longe de viver essa situação comouma limitação, deseja se tornar deputado

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5 A esse respeito,ver o instigante estudode Carvalho (2001).

e a ver reconhecida sua inteligência, quese resumia em ser capaz de pronunciardiscursos cantados e vazios. A pobrezada cena pública brasileira fica evidenteno personagem, na medida em que ele écapaz de ambicionar a participação napolítica exclusivamente como uma mani-festação da legítima ambição de sair dosilêncio constrangedor que sua vida lheimpõe. Não há em sua demanda de reco-nhecimento nem sombra de um mérito,que teria algo a ver com seu apego a valo-res republicanos.6 O aspecto mais interes-sante a ser destacado, no entanto, não étanto a carência de valores da vida públi-ca brasileira, mas o caminho que Olímpi-co segue para fugir de seu destino de nor-destino pobre na cidade grande. Assimcomo para muitos brasileiros não há umavida pública com rotas predefinidas quepermitiriam aos ambiciosos, como nossopersonagem, visar alvos e perseguir obje-tivos. O caminho para o poder, ou maissimplesmente pelo reconhecimento, pas-sa pela vida privada. Como observa Ho-landa (2002, p. 147):

No “homem cordial ”, a vida em socieda-de é, de certo modo, uma verdadeira liber-tação do pavor que ele sente em viverconsigo mesmo, em apoiar-se sobre si pró-prio em todas as circunstâncias da exis-tência.

Olímpico procura se livrar da soli-dão incômoda de Macabéa trocando-apor sua colega de trabalho Glória, que,contrariamente à seca nordestina, não oincomoda com a exposição contínua desuas limitações e ignorância. Ao contrá-rio, a “gorda” Glória o introduz em umafamília do Sul do País, abre-lhe as portas deum mundo que lhe era negado a cada mo-mento. A idéia da família que, como mos-trou Holanda (2002, p. 141-146), constituireferência obrigatória para muitos brasi-leiros no momento em que os valorespúblicos são questionados, aparece tam-bém como o porto seguro de uma socie-dade que convive mal com a conduta gui-ada por regras abstratas (Holanda 2002,p. 150). Por caminhos totalmente opos-tos, o indivíduo solitário das sociedadescontemporâneas acaba fazendo o mes-mo elogio do “homem cordial” à intimi-dade. Num caso é a hipertrofia do indiví-duo que o leva, como sugere Sennett(2002), a confiar apenas em relações tes-tadas pelas emoções; no outro, é a faltade uma história republicana que o con-duz a desprezar regras e procedimentooriundos de um mundo político no qualo afeto não conta. Em ambos os casos, avida política se vê amputada de suas refe-rências coletivas e abstratas para se con-verter no campo de encontro de indiví-

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6 Um bom estudo sobre adificuldade de criação de umespaço público no Brasil,levado a cabo com basena análise de GuimarãesRosa, encontramos emStarling (1999).

duos ou de personalidades, que se negam aviver uma vida em comum governada porrituais de comportamento e participaçãona coisa pública (Sennett 2002, p. 147).

Macabéa, por seu lado, é exemploda realização da figura tipo do indivíduosolitário em uma sociedade que não co-nheceu o mesmo percurso que as demo-cracias do Ocidente. Sua solidão é frutodo encontro do mundo rural com as ci-dades gigantes de hoje, mas seu percur-so não é mais o do “homem cordial”.Entregue a si mesma, ela tem poucas saí-das para um vazio que, muitas vezes,confunde com felicidade. A consciênciade sua desgraça não vem na forma de pa-lavras procurando sentido, mas de um ta-tear tímido dos pedaços de realidade quepode saborear. Como todo indivíduo, elaquer um destino, mas não sabe comoforjá-lo. A ignorância do mundo a impe-de de desejar um mundo mais justo, e se-ria melhor dizer que uma parte dos quevivem a vida miúda de nossas cidadesquer antes uma realidade que faça senti-do do que participar de sua construção.Da mesma forma, no entanto, que nãopodemos supor que o personagem deAuster (1988) representa um retrato totaldos indivíduos atomizados, também nãopodemos supor que sua busca por umdestino e sua incapacidade de realizá-lo

seja a descrição completa dos processossociais de aquisição da cidadania ao longoda História brasileira recente.7 Em suaexemplaridade, os personagens ajudam-nos a pensar os limites das sociedades de-mocráticas, que se tornam incapazes deprojetar valores republicanos em grandesparcelas de seus componentes e fecham asvias pelas quais os indivíduos ultrapassamas fronteiras de sua história particular.

Macabéa acaba encontrando a fa-ce trágica de seu destino justo no mo-mento em que acreditava poder escaparaos limites de sua condição. A ilusão deque uma porta poderia abrir-se para elamostra os limites que destroem as pontesentre os indivíduos isolados e o mundopúblico. Distantes de redes de proteçãoque os defendam da violência, como a fa-mília e a sociedade patriarcal de outrasépocas, os retirantes e os exilados dasgrandes cidades são obrigados a tentarsobreviver num mundo pré-político noqual as esferas do Estado não chegam atéeles e, por isso, acabam submetidos aprocessos que lembram muito mais associedades sem leis e corrompidas doque o mundo ordenado das democraciasdeliberativas ocidentais. Macabéa não as-pirava a participar do mundo da política.Isso nem mesmo se colocava para ela.O que ela queria era um destino, um re-

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7 Ver, a esse respeito,Souza (2003).

torno aos cumprimentos que dirigia narua, uma identidade que a conectasse comalgo além do pequeno mundo insignifi-cante do trabalho.

Como ela, muitos brasileiros con-tinuam a reivindicar laços com um mun-do que não os acolhe e que torna inefi-cazes os velhos processos sociais basea-dos em solidariedades locais e em víncu-los familiares. Em seu abandono, ela nosaponta para os riscos que rondam a rela-ção de muitos habitantes das sociedadescapitalistas periféricas com o mundo dapolítica. Nesse caso, não podemos falarde participação, uma vez que faltam ascondições mínimas para a incorporaçãode uma parte importante da população àcena pública.

Se certamente esse não é o resu-mo dos processos sociais das últimas dé-cadas no Brasil, ajuda-nos a pensar seusriscos e a importância das discussões so-bre valores republicanos em sociedadesque não conheceram o esplendor da es-fera pública. Não se trata de colocar aconcepção republicana da democracia co-mo um ideal, aos moldes dos gregos, deusar de suas referências para pensar pro-cessos sociais, que não parecem ser estu-dados corretamente com o referencialteórico que preside muitas análises atuaisdos defensores das democracias da apa-

tia. O que importa marcar é a tendênciade que o cidadão sem cidadania se en-contre com o indivíduo atomizado dasgrandes cidades no terreno antipolíticodas relações privadas.

3

A conclusão parcial à qual podemos che-gar é a de que a figura do indivíduo apáti-co, distanciado do mundo público e cadavez mais dependente de pequenos rituaisde construção do presente que, como su-gere Auster (1988), parece escapar porentre os dedos, é uma figura tipo, que nosajuda a apontar uma tendência consisten-te da contemporaneidade, mesmo nassociedades periféricas nas quais o proble-ma da participação se coloca de formabem diferente daquele das sociedades ri-cas do Ocidente. Conquanto figura tipo,não podemos nos servir dela para com-preender processos políticos particula-res, mas certamente ela aponta para aconstrução de uma cena pública que alte-ra radicalmente os termos nos quais opensamento republicano se consolidouno curso dos últimos séculos. A apatianão é um destino das sociedades demo-cráticas, mas marca um limite para suaexistência. Sua plena realização, em qual-quer formação social, mesmo naquelas

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protegidas por mecanismos legais sofisti-cados, como é o caso de nações como osEstados Unidos, destrói o equilíbrio sem-pre mutável, mas essencial, que constituia balança do eu-nós. Sem ela mergulha-mos num território no qual a simples re-ferência à democracia e à república já nãofaz o menor sentido. No extremo, por-tanto, a realização de uma “democraciada apatia” corrói o núcleo mesmo daqui-lo que, ao longo da História, chamamosde liberdade – independentemente da ma-neira como a concebemos.

O pólo oposto a essa tendência eque esteve no centro das atenções de mui-tos teóricos da política nos últimos du-zentos anos é o jacobinismo. Tambémaqui acreditamos que seja possível anali-sá-lo valendo-nos de sua caracterizaçãocomo uma figura tipo. O romance de Fran-ce (1989), Les dieux ont soif, fornece-nos omaterial adequado.

O jacobinismo constitui-se em umfenômeno fundamental para a compre-ensão da formação do mundo políticocontemporâneo, na medida em que dei-xou a cena original na qual se formou pa-ra servir de modelo para atores políticosem processos que nada tinham a ver como contexto original. Como demonstrouVovelle (2000), o jacobinismo se trans-formou numa referência ao longo do sé-culo XIX em muitos países da Europa e

fora dela, estimulando a participação navida política de estratos bastante diversifi-cados da população. Nesse movimentode expansão do jacobinismo, preservou-se de sua energia original o impulso para aação direta e a idéia de que uma radicaliza-ção nas formas de participação seria capazde fornecer uma ferramenta eficaz para atransformação profunda das sociedades.

Mais uma vez, não nos interessa ahistória do fenômeno, mas, sim, o mode-lo de relação entre o eu e o nós que forne-ceu. Nesse caso, a balança pende decidi-damente para o pólo nós, transformandoa cena pública pela exacerbação do papeldo ator engajado nos negócios públicos.Como observou Abensour (1992), a Re-volução Francesa viu surgir um novo ti-po de ator político que não se identifica-va inteiramente com nenhum dos tiposanteriores de participantes da vida públi-ca. Trata-se do que chamou de “herói re-volucionário”, que foi estudado em suaparticularidade, pela primeira vez, porTocqueville (1988, p. 239-248).8

Evariste Gamelin, herói do roman-ce de Anatole France fornece um beloexemplo da figura tipo do revolucionáriojacobino disposto a fazer a balança eu-nósa se inclinar para o pólo da comunidade ede seu suposto bem. No início da estória,ele se comporta como outros cidadãosencantados com as possibilidades aber-

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8 A indicação da importânciade Tocqueville para aabordagem de nosso tema foisugerida por Abensour notexto citado.

tas pela Revolução, que derrubara antigasbarreiras e destruíra privilégios de classee permitira a muitos sonhar com uma no-va posição na sociedade. Gamelin é umpintor medíocre, discípulo de David,membro da seção do Pont-Neuf, ondeexerce militância discreta, mas entusiastaem favor da Revolução. Na primeira par-te do romance, seu grande mestre é Ma-rat, que chega a distingui-lo com umaatenção especial:

Ele venerava, amava Marat que, doente,com as veias em fogo, devorado pelas úlce-ras, gastava o resto de suas forças a serviçoda República e, em sua pobre casa, abertaa todos, o acolhia de braços abertos, lhe fa-lava com atenção ao bem público e o in-terrogava por vezes sobre os planos dos ce-lerados (France, 1989, p. 79).

O patriotismo do personagem nãotem nada de especial nesse momento.Ainda que ele não esteja disposto a acei-tar críticas à Revolução nem mesmo àcontraposição da obra revolucionária aobom senso pragmático dos homens denegócio, como Jean Blaise, que lhe diz“você vive no sonho, eu na vida” (Fran-ce, 1989, p. 67), Gamelin se mostra otempo todo um convertido aos novosprincípios, a ponto de fazer seu interlo-cutor se lembrar do perigo que corre emse mostrar cético quanto ao futuro da Re-volução. Mas, como muitos cidadãos fran-

ceses dos primeiros anos da Revolução,ele mergulha na chance que lhe pareceoferecer a História, disposto a fazer todosos sacrifícios sem exigir nada em troca.Sua adesão aos princípios revolucioná-rios de liberdade, igualdade e fraterni-dade não depende de uma recompensaimediata, mas de uma promessa, que nãopode ser quebrada sob pena de ver a pá-tria e suas conquistas serem destruídas.

Embora envolvido com os traba-lhos de sua seção, Gamelin permaneceboa parte do romance como um mem-bro modesto das classes que ascenderamna vida política francesa sem terem rece-bido benefício direto da nova situação. Oartista vive à beira da miséria ao lado desua mãe. Junto com outros habitantes deseu bairro, ele faz longas filas para obterpão, bem que se tornara escasso em Pa-ris. O que cabe observar nesse momentoé que Gamelin não possui característicasespeciais que pudessem distingui-lo en-tre os que haviam adotado os ideais dosnovos tempos. Sua radicalidade não deri-va nem de uma adesão pensada a um sis-tema filosófico complexo, como seu ami-go Brotteaux, que fazia de Lucrécio seumestre em todas as questões, nem de umconhecimento aprofundado das alavan-cas da política. Ele vive os novos temposconfiando nas novas idéias e nas diretri-zes que ouve de seus heróis. Imerso na

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ação e no desejo de uma nova era, nãolhe ocorre pensar nos riscos e nas possi-bilidades do processo que está vivendo.Embora seja um elo insignificante da ca-deia revolucionária, ele vive sua vida entrea privacidade de uma família modesta, oamor por uma jovem, e as ações que cum-pre na seção do bairro. Sua devoção é ce-ga porque Gamelin não vê como a Françapoderia retornar ao estado anterior oumesmo escolher um novo destino sem verdestruídas todas as suas conquistas.

A posição do jovem pintor é in-teressante exatamente por mostrar umainscrição na cena pública que não difereem muito de vários momentos da Histó-ria nos quais a participação de um núme-ro maior de cidadãos nas esferas políticasmudou-lhe a face. O adorador de Maratse inspira no modelo dos heróis, mas nãopretende ele mesmo ser herói. Se seu fa-natismo já mostra os riscos de sua condi-ção e a eficácia da propagação de umanova visão de mundo, ele é antes de tu-do um homem comum imerso na ação,um indivíduo que se guia por idéias abs-tratas, mas conectadas intimamente aosprocessos que se desenvolvem na socie-dade na qual luta para sobreviver. Game-lin aponta assim para a condição dos ci-dadãos comuns em um Estado no qual oengajamento na cena pública é um requi-sito para sua sobrevivência.

Ora, em que pese à densidade dopersonagem, seu amor por Elodie, Ga-melin não demonstra ser capaz de refletirsobre o que vive. Em suas discussõescom Brotteaux, ele opõe à sofistificaçãode Lucrécio uma fé ingênua nos novosvalores. A imersão na ação parece ser-vir-lhe de guia em um mundo do qualnão consegue escapar, mas também nãocompreende inteiramente (France, 1989,p. 93). Desse ponto de vista, ele parecedemonstrar a tese de Charles Taylor quan-to à importância das instâncias simbóli-cas e imaginárias na formação dos indiví-duos e dos agentes políticos. Para ele,a forma de ação dos membros de umacomunidade será sempre o produto dascondições objetivas de acolhimento dosatores nos mecanismos institucionais daarena pública e os caminhos pelos quaisessas formas são representadas pelos in-divíduos e a representação que eles têmde si mesmos (Taylor, 2003).9 Gamelin édesse ponto de vista exemplar na dialéti-ca entre valores aceitos e formas de ação.

Mas os verdadeiros riscos conti-dos no elogio da ação revolucionária seencontram no momento em que ele dei-xa o terreno da ação com seus pontosobscuros e sua natural mutabilidade, paraencontrar uma teoria que se converte emexplicação total de toda vida social. ParaGamelin essa virada dar-se-á no momen-

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9 Para uma análise de suasposições, ver Souza (2003,p. 23-61).

to em que encontra Robespierre. Condu-zido pelos acasos da vida política de seutempo a ser membro de um tribunal re-volucionário, o personagem só encarnaráseu novo papel de maneira decidida quan-do passar a representá-lo como parte deum concerto universal destinado a con-duzir a humanidade a um novo patamar.O terror surge no horizonte do pintor,quando seu desejo de preservar a obra daRevolução dá as mãos a uma nova meta-física, que se sobrepõe a todo e qualquerimperativo de prudência ou bom senso,que, no território aberto da ação livre,costuma servir de freio para os excessosdos atores convertidos abstratamente aum novo ideário. Se Gamelin já se mos-trava resistente ao pragmatismo do paide sua amada, o jacobinismo de 1993 se-rá a porta de saída da realidade cotidiana,para o mergulho definitivo no reino uni-versal do terror e do voluntarismo.

A descrição do processo de imer-são do personagem no mundo do jacobi-nismo lembra as palavras dirigidas porSaint-Just a Robespierre em uma cartade 10 de agosto de 1790:

Vós que sustentais a pátria contra a tor-rente do despotismo e da intriga, vós queconheço com a um deus, pelas maravilhas;endereço-me a vós, senhor, para suplicá-lode reunir-se a mim para salvar meu tristepaís (Saint-Just, 1968, p. 370-371).

É como a um deus que Gamelin escutaRobespierre e se sente salvo do mundocomplexo da ação política no qual estive-ra perdido:

Evaristo escutou e compreendeu. Até en-tão ele havia acusado a Gironda de prepa-rar a restauração da monarquia ou otriunfo da facção dos Orléans e de prepa-rar a ruína da cidade heróica, que havialiberado a França e que um dia livraria ouniverso. Agora, com a voz do sábio, eledescobria verdades mais altas e mais pu-ras; ele concebia uma metafísica revolucio-nária, que elevava seu espírito para alémdas grosseiras contingências, ao abrigo doserros dos sentidos, na região das certezasabsolutas. As coisas são em seu naturalmisturadas e cheias de confusão; a comple-xidade dos fatos é tal que neles nos perde-mos. Robespierre os simplificava, apresen-tava o bem e o mal em fórmulas simples eclaras (France, 1989, p. 165).

O jacobinismo é assim um proces-so de destruição do mundo da ação. En-quanto esteve “confuso”, Gamelin eracapaz de escutar os argumentos contrá-rios às suas idéias e compartilhar os espa-ços comuns da cidade, mesmo com aque-les que discordavam de sua fé na Revolu-ção. A partir do momento em que deixa aesfera da ação, ou se preferirmos, em quedeixa de interagir no mundo público comas armas da razão prática, ele se torna in-capaz de viver num espaço democrático.No reino das verdades, o diferente é algo

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a ser eliminado. Num sentido muito cla-ro, o jacobinismo se converte para elenuma salvação da política, numa reden-ção para as dificuldades de se viver inten-samente os impasses de uma sociedadepolítica. Dizendo de outra forma, o jaco-binismo é necessariamente um caminhopara a destruição da arena pública, e nãosua realização. Nos termos de nossos ar-gumentos, ele é uma teoria anti-republi-cana, e não sua realização plena comopretenderam alguns.

4

O estudo das duas figuras tipo empreendi-do até aqui permite visualizar o impasseno qual se encontram os que gostariamde afirmar um modelo de república base-ado no elogio da participação e na prece-dência da ação na definição da relaçãodos indivíduos com o mundo político.Como vimos, a simples afirmação de quea participação nos negócios públicos éum bem em si mesmo esbarra no fato deque as sociedades contemporâneas dei-xam pouco espaço para a interação diretados indivíduos com os mecanismos dedecisão tanto em âmbito nacional quan-to internacional. O fenômeno observadodesde o século XVIII por pensadoresfranceses, neles incluído Rousseau, deque a democracia direta dos antigos setornou um modelo irrealizável nas na-

ções de grandes dimensões se mostrouainda mais radical nas sociedades de mas-sa. O que importa, no entanto, nesse mo-mento, é notar que os modelos de rela-ção indivíduo-sociedade estudados são oproduto de concepções sobre os funda-mentos das sociedades políticas, que nãopodem ser aceitos como parte de umanatureza intrínseca de nosso tempo. Co-mo sugere Charles Taylor, o que está emquestão é na verdade uma disputa entre oque chama de “ontologias” concorrentes(Taylor, 2000, p. 198-199).

Uma conclusão de nosso percursoé a de que a plena realização das figuras ti-po aqui estudadas conduz à destruiçãodas sociedades livres e impede o desen-volvimento de qualquer uma de suas for-mas. Tanto a pura apatia quanto a entregatotal à ação e à idéia de construção volun-tarista dos laços sociais incapacitam osatores a respeitar o valor básico da liber-dade, independentemente de que ela sejaconcebida à maneira dos liberais comoausência de constrangimento ou à ma-neira dos defensores da república.

Nesse sentido, é preciso afirmarque o herói revolucionário jacobino é fru-to de um republicanismo que se destrói aose realizar. Insistir, portanto, em acusar oanacronismo das concepções republica-nas atuais com base nos resultados daação dos jacobinos – tomados na acepçãoanteriormente estudada – é lançar mão de

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um procedimento retórico, que deixa delado não apenas a crítica que os republica-nos franceses do século XIX fizeram aosprodutos mais diretos do voluntarismodos partidários de Robespierre, mas o fatoessencial de que não há razão histórica vá-lida para associar jacobinismo e repúbli-ca como se fossem sinônimos. Não háa menor dúvida de que o ator herói estáinscrito no campo das possibilidades dosdefensores do republicanismo, mas nãocomo sua síntese, e sim como seu limite.O cidadão perdido no pólo da identidadecoletiva não é mais um cidadão livre e porisso deixou de poder agir na cidade, tendocomo respaldo essencial sua condição deagente livre. Ao pender para o lado nós deseu prato, a balança deixa de representaruma sociedade republicana.

Da mesma forma, um conjunto decidadãos apáticos e capazes apenas de semobilizar para a defesa de seus interessesparticulares é uma presa fácil para os quevisam interesses globais, que vão muitoalém das fronteiras nacionais. A destrui-ção do pólo nós da balança deixa os indiví-duos isolados e sujeitos apenas à vontadedos governantes de respeitar os contratosestabelecidos com a maioria silenciosa.A simples confiança na neutralidade dasinstituições democráticas representativasnão se mostrou um freio adequado paralidar com as imposições de interesses infi-nitamente mais bem articulados do que os

dos indivíduos atomizados. Também nes-se caso, ao pender definitivamente para opólo do eu, a abalança se destrói, levandoconsigo as democracias liberais.

O que estamos propondo, portan-to, é que nenhuma sociedade pode convi-ver com um desequilíbrio total entre osdois pólos. É claro que os defensoresmais radicais dos dois modelos insistiramque os defeitos não são simétricos e queapenas os excessos dos defensores da te-se oposta representa um risco para a vidanas sociedades democráticas. Nossa hi-pótese é que essa aposta representa umrisco para a liberdade, que não pode serenfrentado senão com o abandono dosdois extremos.

Com isso, no entanto, não quere-mos dizer que seja possível uma espéciede mediania, que representaria um equilí-brio perfeito para a vida política. Talvez ocaminho mais saudável e plausível parauma vida política vivida segundo valorescaros à tradição republicana continue aexigir o respeito à indeterminação da açãoe a atenção à pluralidade e à diferença, queconstitui o solo da cidadania nas socieda-des industriais contemporâneas. Sem a to-lerância ao outro, a aceitação dos riscosinerentes à ação pública e o amor da liber-dade, estamos condenados a viver em si-mulacros do que foi em alguns momentosda História a marca de sociedades republi-canas e democráticas.

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Referências bibliográficas

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Artigo recebido em maio de 2006

e aprovado em julho de 2006.