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DAMÁSIO, Antônio. O mistério da consciência: do corpo e das emoções ao conhecimento de si /Antônio Damásio; tradução Laura Teixeira Motta; revisão técnica Luiz Henrique Martins Castro. — São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p.15 Escrevo sobre o sentido do self e sobre a transição da inocência e da ignorância para o conhecimento e o auto-interesse. Meu objetivo específico é examinar as circunstâncias biológicas que permitem essa transição crítica. p.19 – Em seu nível mais complexo e elaborado, a consciência ajuda-nos a cultivar um interesse por outras pessoas e a aperfeiçoar a arte de viver. p. 24 – Eu percebia que superar o obstáculo do self, o que do meu ponto de vista significava compreender suas bases neurais, poderia nos ajudar a entender o impacto biológico muito diferente de três fenômenos distintos mas estreitamente relacionados: ter uma emoção, sentir essa emoção e tomar conhecimento de que estamos sentindo essa emoção. p.26 imagem designa um padrão mental em qualquer modalidade sensorial, como, por exemplo, uma imagem sonora, uma imagem tátil, a imagem de um estado de bem-estar. Da perspectiva da neurobiologia, resolver esse primeiro problema é descobrir como o cérebro produz padrões neurais em seus circuitos de células nervosas e como ele consegue converter esses padrões neurais nos padrões mentais explícitos que constituem o nível mais elevado de fenômeno biológico, o qual designo por imagens. Definimos como qualia as qualidades sensoriais simples encontradas no azul do céu ou no tom do som produzido por um violoncelo, e os componentes fundamentais das imagens na metáfora do filme são, portanto, feitos de qualia. p.30 – Em outras palavras, resolver o segundo problema da consciência consiste em descobrir os alicerces biológicos da curiosa capacidade que nós, humanos, possuímos de construir não só os padrões mentais de um objeto — as imagens de pessoas, lugares, melodias e de suas relações; em suma, as imagens mentais, integradas no tempo e no espaço, de algo a ser conhecido —, mas também os padrões mentais que transmitem, de maneira automática e natural, o sentido de um self no ato de conhecer. A consciência, como usualmente a concebemos, de seus níveis elementares aos mais complexos, é o padrão mental unificado que reúne o objeto e o self. p.34 – O poder dessa triangulação de mente, comportamento e cérebro é evidente há mais de um século e meio — desde que os neurologistas Paul

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DAMÁSIO, Antônio. O mistério da consciência: do corpo e das emoções ao conhecimento de si /Antônio Damásio; tradução Laura Teixeira Motta; revisão técnica Luiz Henrique Martins Castro. — São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

p.15 – Escrevo sobre o sentido do self e sobre a transição da inocência e da ignorância para o conhecimento e o auto-interesse. Meu objetivo específico é examinar as circunstâncias biológicas que permitem essa transição crítica.

p.19 – Em seu nível mais complexo e elaborado, a consciência ajuda-nos a cultivar um interesse por outras pessoas e a aperfeiçoar a arte de viver.

p. 24 – Eu percebia que superar o obstáculo do self, o que do meu ponto de vista significava compreender suas bases neurais, poderia nos ajudar a entender o impacto biológico muito diferente de três fenômenos distintos mas estreitamente relacionados: ter uma emoção, sentir essa emoção e tomar conhecimento de que estamos sentindo essa emoção.

p.26 – imagem designa um padrão mental em qualquer modalidade sensorial, como, por exemplo, uma imagem sonora, uma imagem tátil, a imagem de um estado de bem-estar.Da perspectiva da neurobiologia, resolver esse primeiro problema é descobrir como o cérebro produz padrões neurais em seus circuitos de células nervosas e como ele consegue converter esses padrões neurais nos padrões mentais explícitos que constituem o nível mais elevado de fenômeno biológico, o qual designo por imagens.

Definimos como qualia as qualidades sensoriais simples encontradas no azul do céu ou no tom do som produzido por um violoncelo, e os componentes fundamentais das imagens na metáfora do filme são, portanto, feitos de qualia.

p.30 – Em outras palavras, resolver o segundo problema da consciência consiste em descobrir os alicerces biológicos da curiosa capacidade que nós, humanos, possuímos de construir não só os padrões mentais de um objeto — as imagens de pessoas, lugares, melodias e de suas relações; em suma, as imagens mentais, integradas no tempo e no espaço, de algo a ser conhecido —, mas também os padrões mentais que transmitem, de maneira automática e natural, o sentido de um self no ato de conhecer. A consciência, como usualmente a concebemos, de seus níveis elementares aos mais complexos, é o padrão mental unificado que reúne o objeto e o self.

p.34 – O poder dessa triangulação de mente, comportamento e cérebro é evidente há mais de um século e meio — desde que os neurologistas Paul Broca e Carl Wernicke descobriram uma conexão entre a linguagem e certas regiões do hemisfério cerebral esquerdo.

p.40 – ... a conexão entre emoção e consciência, de um lado, e entre ambas e o corpo, de outro, é um tema importante deste livro.

p.44 – ... uma teoria da consciência não deve ser apenas uma teoria de como a memória, o raciocínio e a linguagem ajudam a construir, de cima para baixo, uma interpretação do que se passa no cérebro e na mente.

p.47 – Vista dessa perspectiva, a consciência consiste em construir um conhecimento sobre dois fatos: um organismo está empenhado em relacionar-se com algum objeto, e o objeto nessa relação causa uma mudança no organismo.

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p.51 – algumas partes do cérebro são livres para perambular pelo mundo e, ao fazê-lo, mapear qualquer objeto que a estrutura do organismo lhes permita mapear. Em contrapartida, outras partes do cérebro, as que representam o próprio estado do organismo, não são livres para perambular. Elas estão presas. Não podem mapear nada além do corpo, e fazem isso com mapas em grande medida preestabelecidos.

p.52 – nota: Na língua inglesa, a palavra brain apresenta dois significados: o primeiro deles é o de “cérebro” propriamente dito, correspondente ao sentido usual da palavra em português, que designa os hemisférios cerebrais e as estruturas profundas dos hemisférios, incluindo os núcleos da base, o tálamo e o hipotálamo; o segundo significado — visado aqui pelo autor — eqüivale a “encéfalo” em português, e abarca não apenas o cérebro propriamente dito, como explicado acima, mas também outras estruturas que compõem o sistema nervoso central: o tronco cerebral — melhor dizendo, encefálico — e o cerebelo. Na tradução deste livro empregou-se de maneira uniforme a palavra cérebro — e seus correlates — com os dois significados, tanto em razão da dificuldade, em alguns casos, de discernir o sentido do termo único do original como em razão do uso corrente da palavra na neurologia, em muitas circunstâncias, com ambos os sentidos. (N. R. T.).

p.53 – As raízes profundas do self, incluindo o self complexo que abrange a identidade e a individualidade, encontram-se no conjunto de mecanismos cerebrais que de modo contínuo e inconsciente mantém o estado corporal dentro dos limites estreitos e na relativa estabilidade requeridos para a sobrevivência. Esses mecanismos representam continuamente, de modo inconsciente, o estado do corpo vivo, em suas numerosas dimensões.

p.59 – O sentido do self no ato de conhecer um objeto é uma infusão de conhecimento novo, criado continuamente dentro do cérebro contanto que os “objetos”, realmente presentes ou evocados, interajam com o organismo e o levem a mudar.

p.60 – Curiosamente, a consciência começa como o sentimento do que acontece quando vemos, ouvimos ou tocamos. Em termos um tanto mais precisos, é um sentimento que acompanha a produção de qualquer tipo de imagem — visual, auditiva, tátil, visceral — dentro de nosso organismo vivo.

p.63-64 – A ética e o direito, a ciência e a tecnologia, a arte e a compaixão — estes são os ápices da biologia, no meu entender.

p.69 – A consciência emerge quando essa história primordial — a história de um objeto alterando de forma causai o estado do corpo — pode ser contada usando o vocabulário não verbal universal dos sinais corporais. O self manifesto emerge como o sentimento de um sentimento.

p.70 – Imagino que a consciência possa ter prevalecido na evolução porque conhecer os sentimentos causados pelas emoções era absolutamente indispensável para a arte de viver, e porque a arte de viver foi um tremendo sucesso na história da natureza.

p.77 – Neste livro, minha suposição é que, assim como a emoção, a consciência relaciona-se à sobrevivência do indivíduo e que, tal como a emoção, a consciência está alicerçada na representação do corpo.

p.80 – Define-se homeostasia como a regulação automática da temperatura, da concentração de oxigênio ou do pH em nosso corpo.

A ciência do século xx deixou o corpo de lado, devolveu a emoção ao cérebro mas relegou-o aos estratos neurais inferiores, associados a ancestrais que ninguém venerava.

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p.81-82 – A mente permaneceu ligada ao cérebro em uma relação um tanto equívoca, e o cérebro foi consistentemente separado do corpo em vez de ser visto como parte de um organismo vivo e complexo.

p.85 – ... é provável que a emoção auxilie o raciocínio, em especial quando se trata de questões pessoais e sociais que envolvem risco e conflito.

Emoções bem direcionadas e bem situadas parecem constituir um sistema de apoio sem o qual o edifício da razão não pode operar a contento.

p.86 – Propus que o termo sentimento fosse reservado para a experiência mental privada de uma emoção, enquanto o termo emoção seria usado para designar o conjunto de reações, muitas delas publicamente observáveis.

p.96 – Não precisamos ter consciência do indutor de uma emoção, com freqüência não temos e somos incapazes de controlar intencionalmente as emoções. Você pode perceber-se num estado de tristeza ou de felicidade e ainda assim não ter nenhuma idéia dos motivos responsáveis por esse estado específico.

p.97 – Em outras palavras, não necessariamente prestamos atenção às representações que induzem emoções e que depois conduzem a sentimentos, independentemente de elas significarem ou não algo externo ao organismo ou algo lembrado internamente. Representações do exterior ou do interior podem ocorrer independentemente de um exame consciente e ainda assim induzir reações emocionais. Emoções podem ser induzidas de maneira inconsciente e, assim, afigurar-se ao self consciente como aparentemente imotivadas.

p. 105 – Todas as emoções usam o corpo como teatro (meio interno, sistemas visceral, vestibular e músculo esquelético), mas as emoções também afetam o modo de operação de inúmeros circuitos cerebrais: a variedade de reações emocionais é responsável por mudanças profundas na paisagem do corpo e do cérebro. O conjunto dessas mudanças constitui o substrato para os padrões neurais que, em última instância, se tornam sentimentos de emoção.

p. 105-106 – Detectamos emoções de fundo por meio de detalhes sutis, como a postura do corpo, a velocidade e o contorno dos movimentos, mudanças mínimas na quantidade e na velocidade dos movimentos oculares e no grau de contração dos músculos faciais.

p. 115 – Com toda a probabilidade, o desenvolvimento e a cultura acrescentam diversas influências aos mecanismos pré-ajustados: primeiro, moldam o que constitui um indutor adequado de uma dada emoção; segundo, moldam alguns aspectos da expressão da emoção; terceiro, moldam a cognição e o comportamento decorrentes da mobilização de uma emoção.

p. 118 – Mas, quando há consciência, os sentimentos têm seu impacto máximo e os indivíduos também são capazes de refletir e planejar. Têm como controlar a tirania onipresente da emoção: isso se chama razão. Ironicamente, é claro, os mecanismos da razão ainda requerem a emoção, o que significa que o poder controlador da razão é com freqüência modesto.p. 137-138 – (...) é preciso que ocorram duas etapas adicionais antes de uma emoção ser conhecida. A primeira é o sentimento, a transformação em imagem das mudanças que acabamos de examinar. A segunda é a aplicação da consciência central a todo o conjunto de fenômenos. Conhecer uma emoção — sentir um sentimento — só ocorre nesse ponto.

5. O organismo e o objeto /O CORPO COMO SUSTENTACULO DO SELF

CAMILA XAVIER NUNES, 09/07/09,
Reações orgânicas em imagens mentais?
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p. 264-265 – Quando refletimos acerca do que está por trás da noção de self, encontramos a noção do indivíduo singular. E, quando pensamos no que está por trás da singularidade do indivíduo, encontramos a estabilidade.

p. 268 – A vida acontece dentro da fronteira que define um corpo. A vida e o ímpeto de viver existem dentro de uma fronteira, a parede seletivamente permeável que separa o meio interno do externo.Se não existe uma fronteira, não existe um corpo, e não havendo corpo não há organismo. A vida precisa de uma fronteira.

p. 279 – O fato de as múltiplas personalidades não serem consideradas normais reflete o consenso de que a um corpo corresponde um self.Uma das razões por que admiramos os bons atores é que eles conseguem nos convencer de que são outras pessoas, que possuem outra mente e outro self. Mas sabemos que isso não é verdade, que eles apenas transmitem engenhosas simulações, e valorizamos esse trabalho devido à sua dificuldade, porque o que eles fazem não é natural.

p. 280 – A mente é tão estritamente moldada pelo corpo e destinada a servi-lo que somente uma mente poderia surgir nesse corpo.

P. 437 – O self autobiográfico que neste momento exibimos em nossa mente é o produto final não só de nossas inclinações inatas e experiências de vida reais, mas também do reprocessamento de memórias dessas experiências, sob a influência desses fatores.

ApêndiceNotas sobre mente e cérebro

p. 613 – As imagens não são apenas visuais

Refiro-me ao termo imagens como padrões mentais com uma estrutura construída com os sinais provenientes de cada uma das modalidades sensoriais — visual, auditiva, olfativa, gustatória e sômato-sensitiva. A modalidade sômato-sensitiva (a palavra provém do grego soma, que significa “corpo”) inclui várias formas de percepção: tato, temperatura, dor, e muscular, visceral e vestibular.

p. 614 – Pensamento é uma palavra aceitável para denotar esse fluxo de imagens.

p. 619 – Portanto, as imagens que cada um de nós vê em sua mente não são cópias do objeto específico, mas imagens das interações entre cada um de nós e um objeto que mobilizou nosso organismo, construídas na forma de padrão neural, segundo a estrutura do organismo.

p. 620 – Uma última razão para sermos cautelosos com o termo representação: ele facilmente evoca a metáfora do cérebro como um computador. Mas essa metáfora é inadequada. O cérebro de fato executa computações, mas sua organização e seu funcionamento têm pouca semelhança com a noção comum do que é um computador.

CAMILA XAVIER NUNES, 30/10/09,
Cinestesia
CAMILA XAVIER NUNES, 27/09/09,
Descartes acreditava que seria a glândula pineal