DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · da educação especial, é a que apresenta maiores desafios...

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4 Cadernos PDE VOLUME I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE

VOLU

ME I

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DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL: o papel do atendimento educacional especializado na escolarização1.

Eliete Cristina Berti Zamproni2 Profª Doutora Francéli Brizolla3

RESUMO

Este trabalho atende às exigências do Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE, da Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Tem como objetivo relatar a intervenção pedagógica na escola do projeto intitulado “Desenvolvimento Cognitivo do Aluno com Deficiência Intelectual: o papel do Atendimento Educacional Especializado na escolarização”. Este trabalho teve como foco de estudo a deficiência intelectual que, dentre as diferentes áreas componentes da modalidade da educação especial, é a que apresenta maiores desafios no que diz respeito à escolarização, pois a especificidade de aprendizagem dos alunos que apresentam essa deficiência desafia a escola e os profissionais envolvidos a encontrarem respostas educacionais alternativas e/ou diferenciadas de atendimento das suas necessidades. Inicialmente, este artigo traz uma pesquisa bibliográfica a respeito dos pressupostos legais e pedagógicos do Atendimento Educacional Especializado e os pressupostos teóricos que demarcam a concepção atual da deficiência intelectual na perspectiva inclusiva. Na segunda parte, apresenta-se a sistematização do desenvolvimento da intervenção pedagógica na escola, momento para implementação do projeto, realizada com um grupo e professores de Salas de Recursos – área da deficiência intelectual, séries finais do ensino fundamental, de escolas públicas da rede estadual de educação em Curitiba (PR). Desse trabalho, apresenta-se um panorama da caracterização dos serviços especializados desenvolvidos nas Salas de Recursos e uma proposta de possíveis diretrizes pedagógicas para o Atendimento Educacional - AEE, na perspectiva inclusiva, na escolarização do aluno com deficiência intelectual, reveladas pelo grupo de professores.

Palavras - chave: deficiência intelectual; atendimento educacional especializado;

escolarização.

1 Trabalho de conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2009. 2 Professora PDE 2009, especialista em Educação Especial, área da deficiência Intelectual; técnica pedagógica do Departamento de Educação Especial e Inclusão Educacional da SEED-PR. 3 Doutora em Educação; professora da UFPR setor litoral/Paraná; orientadora do PDE 2009.

2

INTRODUÇÃO

A educação inclusiva fundamentada em um paradigma que busca a

superação de preconceitos e de práticas excludentes e na defesa do direito de todos

os alunos de estarem juntos na escola impulsionou o sistema educacional brasileiro

a recomendar a matrícula obrigatória de alunos com deficiências4, transtornos

globais do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação em estabelecimentos

de rede regular de ensino, principalmente, a partir da normatização realizada pela

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96) e a Política

Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva

(SEESP/MEC, 2008).

Nessa perspectiva inclusiva, a educação especial é considerada legalmente

como uma modalidade que está inserida nos diferentes níveis da educação escolar

– educação básica e superior - e deve ofertar serviços e recursos especializados

para complementar e/ou suplementar o processo educacional realizado na escola

comum.

Considera-se importante registrar que, para a efetivação de uma escola

inclusiva que atenda a todos os alunos com equidade, não basta apenas garantir

vagas através da força da lei, ou seja, apenas a presença física do aluno em sala de

aula é essencial que a escola esteja preparada para atender as suas necessidades

educacionais especiais. No cerne dessa questão está posto o desafio de buscar

respostas pedagógicas para enfrentamento dessa realidade e alcance do objetivo

inclusivo proposto.

De acordo com o MEC/SEESP (2008), o atendimento educacional

especializado tem como função identificar, elaborar e organizar recursos

pedagógicos e de acessibilidade que eliminem barreiras para a plena participação

dos alunos, considerando suas necessidades específicas. Na perspectiva da política

de educação inclusiva vigente, deve organizar-se para realizar um trabalho

pedagógico complementar aos serviços educacionais comuns, visando à autonomia

e independência do aluno na escola e na sociedade. Neste sentido, as políticas

públicas do estado do Paraná destacam prioritariamente o trabalho pedagógico

4 No que tange aos objetivos deste artigo, abordaremos a questão da escolarização vinculada aos alunos que apresentam deficiência intelectual.

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desenvolvido nas denominadas Salas de Recursos – séries finais, para alunos com

deficiência intelectual e transtornos funcionais específicos, normatizada pela

Instrução 013/2008 – SEED/SUED. A Sala de Recursos em questão difere do

atendimento das Salas de Recursos Multifuncional propostas pelo MEC quanto ao

público alvo de atendimento.

O trabalho pedagógico realizado nessas salas diferencia-se completamente

da escolarização da classe comum. Não deve ser uma atividade que tenha como

objetivo desenvolver conteúdos acadêmicos, tais como língua portuguesa e

matemática, tampouco ser confundido como reforço escolar, mas deve propiciar

condições para o desenvolvimento de habilidades cognitivas básicas para a

aprendizagem dos conteúdos disciplinares trabalhados na escola, bem como de

habilidades práticas, sociais e conceituais.

O professor que atua na Sala de Recursos deve ter especialização adequada

em nível médio ou superior, conforme preconiza a Lei de Diretrizes e Base para a

Educação - LDB nº 9394/96, no Capítulo V, art. 59, inciso III. Necessita ainda,

receber formação sobre as práticas que possibilitem identificar e atender às

necessidades educacionais especiais do aluno com deficiência intelectual, saber

como ele aprende e de que modo pode ensiná-lo. Na literatura acadêmica não

encontramos ‘receitas prontas’ de práticas pedagógicas para atender às

especificidades desse alunado, pois cada aluno é único, com possibilidades e

dificuldades que devem ser consideradas pela escola em todo o processo de ensino

e aprendizagem.

Logo, torna-se imprescindível para o professor aprofundar seus

conhecimentos em pressupostos teóricos que possam embasar sua ação educativa

e, consequentemente, dispor de estratégias pedagógicas desafiadoras e

estimulantes que possibilitem a esse grupo de alunos, a superação dos limites

intelectuais que interferem substancialmente na construção do conhecimento

escolar.

Para abordar o papel do Atendimento Educacional Especializado de alunos

com deficiência intelectual que, atualmente, é um dos grandes desafios da escola,

faz-se necessário entendermos os pressupostos teóricos que demarcam a

concepção atual de deficiência intelectual na perspectiva inclusiva.

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PARTE I PRESSUPOSTOS TEÓRICOS QUE DEMARCAM A CONCEPÇÃO ATUAL DE DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

Ao longo da história, a concepção de deficiência intelectual, vem recebendo

diferentes conceitos, terminologias e classificações que foram modificados e

atualizados de acordo com os fatos que marcaram o contexto de cada época, como

os interesses econômicos e ideológicos (sociais religiosos e políticos); um fator

aglutinador desta evolução histórica e conceitual está demarcado pela atribuição de

“incapacidade” e “improdutividade”, isto é, está sempre ligado a uma imagem

negativa e pejorativa das pessoas que compõe este segmento.

Historicamente, sempre foi delegado ao indivíduo com deficiência mental um lugar específico, do diferente, sendo a diferença considerada como atributo do indivíduo, ou seja, como algo pertencente a ele. Com isso, as pessoas com deficiência mental foram no decorrer dos anos, desacreditadas socialmente. (SANTOS, 2007, p. 39).

Pletsch (2009) comenta que sob forte influência da medicina e da psicologia

diferentes terminologias foram utilizadas para a designação das pessoas com esta

característica, a saber, idiota, débil mental, infradotado, imbecil, retardado mental e,

nos últimos anos, deficiente mental.

Atualmente, sob o reflexo de correntes que defendem a escola inclusiva, a

tendência é substituir ao termo deficiência mental por deficiência intelectual5.

A expressão deficiência intelectual foi oficialmente utilizada em 1995, no

simpósio ‘Deficiência Intelectual: Programas, Políticas e Planejamento’, promovido

pela Organização das Nações Unidas, em Nova York. Mas, somente após a

publicação da “Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual”, em 2004, pela

Organização Pan-Americana de Saúde e a Organização Mundial de Saúde que esta

terminologia passou a ser adotada no meio educacional.

Outro marco na substituição dos termos foi a modificação do nome da

respeitada American Association of Mental Retardation (AAMR) para American

Association on Intellectual and Developmental Disabilities (AAIDD), recomendando o

5 Neste artigo utilizaremos o termo deficiência intelectual, salvo em algumas citações de autores e a legislação.

5

uso da expressão deficiência intelectual. No Brasil, o novo termo está sendo

mencionado nos documentos pedagógicos do Ministério da Educação e da

Secretaria de Estado da Educação do Paraná, entre outros.

No momento histórico atual, marcado pela busca de uma sociedade inclusiva,

a deficiência intelectual não é mais vista como uma condição única e própria do

sujeito, ela deve ser analisada amplamente considerando-se suas dificuldades e

potencialidades e a forma que esse se relaciona no ambiente em que vive. A

dimensão intelectual não é mais elemento suficiente para caracterizar a deficiência

intelectual, posto que outros fatores devem ser analisados, tais como funcionamento

adaptativo, os fatores psicológicos, emocionais, ambientais, físicos, etiológicos e de

saúde. Assim, o conceito de deficiência intelectual adotado atualmente foi instituído

pela Associação Americana de Retardo Mental – AARM (2006) e apresenta-se da

seguinte maneira:

Incapacidade caracterizada por limitações significativas no funcionamento

intelectual e no comportamento adaptativo e está expresso nas habilidades

práticas, sociais e conceituais, originando-se antes dos dezoito anos de

idade. (PAN, 2008, p. 63).

Logo, essa deficiência deve ser compreendida como uma interação entre o

funcionamento intelectual e as suas relações com contexto social, isto é, as

limitações deixam de ser observadas somente como dificuldade exclusiva da pessoa

deficiente intelectual, numa perspectiva quantitativa de inteligência, passando a ser

considerada como limitação do contexto social em ofertar os apoios que ela

necessita, ou seja, adota-se uma perspectiva de compreensão e definição entre o

sujeito com deficiência intelectual e seu meio. A partir desta definição,

(...) abandonam-se as tendências que classificam e categorizam, previamente, com base em diagnósticos clínicos e psicológicos, as pessoas com deficiência intelectual em níveis (leve, moderada, severa e profunda), os quais indicavam comportamentos e características próprios de cada categoria. (FERNANDES, 2007b, p. 95).

6

Pletsch (2009) e Pan (2008) comentam que, para a identificação da pessoa

com deficiência intelectual, a AARM adotou o conceito multidimensional, já publicado

em 2002, que prioriza tanto os atributos individuais do sujeito como o contexto em

que vive. Para tal análise apresenta-se as dimensões:

Dimensão I – Habilidades Intelectuais. Esse fator intelectual é apenas um dos

indicadores, é avaliado por testes psicométricos de inteligência, considerados

necessários, mas não único para o diagnóstico da deficiência. Essa habilidade

refere-se à capacidade de ordem conceitual, raciocínio, planejamento, solução de

problemas, pensamento abstrato, compreensão de idéias complexas, rapidez de

aprendizagem e aprendizagem por meio de experiências.

Dimensão II – Comportamento Adaptativo. Habilidade conceitual, prática e social.

São habilidades importantes para a autonomia da pessoa, pois expressam

independência pessoal e responsabilidade com a demanda do meio em que vive, de

acordo com o esperado para sua faixa etária e grupo social.

Dimensão III – Participação, interação e Papéis Sociais. Destaca a importância

da participação na vida comunitária em ambientes típicos dos pares da mesma

idade, como a casa, a vizinhança, a escola e o trabalho.

Dimensão IV – Saúde. O diagnóstico de deficiência intelectual deve contemplado

por fatores etiológicos, assim como de saúde física e mental.

Dimensão V – Contextos. A avaliação do contexto recomenda a análise das

condições do local onde a pessoa se relaciona como a família, vizinhança e escola.

Outro aspecto proposto pela AARM para a compreensão dessa deficiência é o

sistema de classificação, baseado nos apoios que a pessoa necessita.

Os apoios são identificados como mediadores entre o funcionamento do sujeito e as cinco dimensões focalizadas no modelo teórico. Quando necessários e devidamente aplicados, os apoios desempenham papel essencial na forma como a pessoa responde às demandas ambientais, além de propiciarem estímulo ao desenvolvimento e à aprendizagem da pessoa com deficiência mental ao longo da vida. (CARVALHO e MACIEL, 2003, p. 152).

De acordo com sua intensidade, estes apoios podem ser classificados em:

a) intermitentes, utilizados em situações especificas e quando necessário;

aplicados especificamente em momentos de crise ou períodos de transição na vida

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da pessoa.

b) limitados, oferecidos por tempo limitado na escola e no trabalho; apoio a

pequenos períodos de treinamento ou no atendimento as necessidades que

requeiram atenção de curta duração.

c) extensivos, oferecidos de forma periódica e regular (por exemplo, diariamente ou

semanalmente), podendo-se estender-se sem limitação de tempo em alguns

ambientes, como na escola; e

d) pervasivos ou generalizados, caracterizados como constantes, estáveis e de

alta intensidade. Disponibilizados em diferentes ambientes, geralmente durante toda

vida. Podendo envolver uma equipe multidisciplinar.

A partir deste conceito a deficiência intelectual, recomendado pela Associação

Americana de Retardo Mental – AARM (2006), essa deficiência passa a ser

entendida como um modo particular de funcionamento com especificidades e

diferenças no desenvolvimento e aprendizagem. Assim, surge a necessidade de

adoção de novas práticas educacionais, tanto no ensino regular como na educação

especial, as quais acompanhem a evolução conceitual, sob pena de mudarem as

terminologias e permanecerem as mesmas práticas consideradas defasadas. É

fundamental, pois, que se identifiquem os tipos de apoios necessários e sua

intensidade para cada aluno com deficiência intelectual, com o objetivo de favorecer

as condições de participação e bem-estar social para todas essas pessoas.

PARTE II DESENVOLVIMENTO DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA NA ESCOLA A PARTIR DO PROJETO: “DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL: o papel do atendimento educacional especializado na escolarização”

2.1 Desenvolvimento da intervenção pedagógica na escola

A intervenção pedagógica na escola constituiu-se numa das fases do PDE,

que dá origem a este estudo, sendo o momento destinado a implementação do

projeto e operacionalização de ações planejadas e utilização do material didático

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elaborado, em uma fase anterior do programa. Esta etapa tem a finalidade de

promover a melhoria qualitativa do ensino na escola pública do Paraná.

Diante da natureza do nosso estudo e das bases teóricas que nos

fundamentam, optou-se pela dinâmica de Grupo Focal, que se caracteriza como

uma técnica de pesquisa ou de avaliação qualitativa, de caráter não-diretivo, que

coleta dados por meio das interações grupais, as quais configuraram um curso de

formação continuada para professores das Salas de Recursos – séries finais para

alunos com deficiência intelectual, implantadas em escolas de rede estadual de

Curitiba.

A temática abordada no curso foi o papel de Atendimento Educacional

Especializado na escolarização do aluno com deficiência intelectual, com o objetivo

central de orientar e fundamentar teoricamente a ação pedagógica dos professores

que trabalham com alunos que apresentam essa deficiência, tendo em vista a

proposição de princípios e diretrizes de orientação do trabalho pedagógico.

O curso foi realizado durante o segundo semestre de 2010, no Colégio

Estadual Tiradentes – EFM, Curitiba. Para efetivar o trabalho foram reunidas várias

professoras, bem como técnicos pedagógicos do núcleo regional de educação de

Curitiba. Destes, 39 (trinta e nove) profissionais aceitaram o convite para participar

do curso, sendo 31 (trinta e um) professores de Salas de Recursos; 5 (cinco)

técnicos pedagógicos do Núcleo Regional de Educação de Curitiba; 2 (dois)

profissionais do Centro Estadual de Orientação e Avaliação Pedagógica de Curitiba

e 1 (um) professor de Classe Comum. Para efetivação do curso, os profissionais

foram divididos em 3 (três) grupos que mensalmente se reuniram em 6 etapas de 4

horas cada, totalizando 24 horas.

Na primeira etapa do curso intitulada “conhecendo as práticas de atendimento

educacional especializado”, foi aplicado um questionário situacional para investigar a

formação acadêmica dos professores e as práticas de atendimento educacional

especializado que atualmente são desenvolvidas nas salas de recursos em questão.

Na segunda etapa, foi estudado o tema “deficiência intelectual: definição

atual”, por entendermos que a discussão sobre a deficiência em uma perspectiva

inclusiva, é essencial para abordar o papel do atendimento educacional

especializado para esse grupo de alunos. Para fundamentar as práticas

educacionais, faz-se necessária ainda, que o professor conheça teoricamente a

concepção desta deficiência defendida por estudiosos do desenvolvimento cognitivo

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e de aprendizagem humano. Nesse sentido, foi proposto para o terceiro encontro o

tema “teorias psicológicas de desenvolvimento e aprendizagem”.

Na quarta etapa, abordou-se o “atendimento educacional especializado e sua

potencialidade para o processo de inclusão escolar de alunos com deficiência

intelectual”, se discutiu a organização, aspectos e recursos pedagógicos, bem como

as atribuições do professor da sala de recursos.

Na quinta etapa de estudos envolveram questões referentes ao “atendimento

pedagógico do aluno com deficiência intelectual na classe comum”, e “o trabalho

colaborativo entre educação especial e ensino regular.”

Para finalizar o trabalho, na sexta etapa foi proposto como tema “o trabalho

colaborativo entre escola e família”, pois atualmente o assunto tem sido destacado

por profissionais da educação e pela literatura acadêmica, principalmente frente à

inclusão de alunos com deficiência intelectual, onde a família e a escola juntas

devem compor uma rede de apoio às necessidades educacionais desses alunos.

2.2 Sistematização e análise dos dados coletados

Por uma questão didática organizou-se a apresentação dos dados em 3 (três)

vertentes conforme segue: formação inicial e continuada do professor;

concepção teórica considerada necessária à prática do professor da SR;

atribuições pedagógicas do professor da sala de recursos.

2.2.1 Formação inicial e continuada do professor

Após análise dos dados obtidos no questionário situacional, aplicado na

primeira etapa do curso, constatou-se que todos os profissionais que participaram do

trabalho possuem formação superior, sendo 18 professores com graduação em

pedagogia; 3 professores graduados em cada uma das áreas da educação física,

educação artística, história e psicologia; 2 professores com formação em geografia

e 2 em letras. Nas áreas da sociologia, ciências e biologia, ciências, matemática e

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fisioterapia, apenas 1 professor em cada. Entre os participantes do trabalho somente

um não informou sua graduação. A pós-graduação destes mesmos profissionais

configura-se em 25 professores com especialização em educação especial; 6 com

estudos adicionais; 2 professores em educação fundamentada em artes; 2

professores em inclusão educacional; 1 professor em Arte como princípio

educacional para inclusão e 2 professores não informaram sua especialização.

Neste universo trabalhado, apenas 1 professor com mestrado na área da educação.

Conforme preconiza a lei (Deliberação 02/03 – CEE-PR), todas as

professoras têm especialização, em cursos de Pós-Graduação em Educação,

Especialização e/ou habilitação específica em nível Médio, na extinta modalidade de

Estudos Adicionais e, atualmente, na modalidade Normal.

No mesmo questionário situacional, as professoras informaram que não

receberam formação continuada para o trabalho com aluno deficiente intelectual.

Buscam, no entanto respostas pedagógicas para trabalho na troca de experiências

com outros profissionais, bem como em leituras realizadas por iniciativa própria. Um

significativo número de professoras respondeu que necessita e recebe apoio da

equipe pedagógica, direção, de outros professores e pais para desenvolverem um

bom trabalho pedagógico na Sala de Recursos.

Quanto ao tempo de experiência na docência de sala de recursos, pode-se

descrever que 10 professores não têm experiência; 25 professores têm até 5 anos

de experiência; 4 professores, de 6 a 10 anos de experiência e 1 professor com mais

de 10 anos de docência na sala de recursos.

2.2.3 Concepções teóricas consideradas necessárias à prática do professor da Sala

de Recursos

Na discussão do conceito da deficiência intelectual em uma perspectiva

inclusiva, pode-se afirmar que existe um consenso entre as professoras sobre a

concepção atual da deficiência em pauta; todas entendem que esse sujeito possui

potencialidades e limitações cognitivas e devem ser atendidos em suas

especificidades para sucesso no seu processo de aprendizagem.

As participantes da discussão defenderam que esse grupo de alunado não

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pode ser definido em um quadro único, isto é, não se pode traçar um perfil típico de

desenvolvimento, muito menos de características padronizadas de seu

comportamento ou aprendizado. Para ilustrar esta afirmação citaram como exemplo

que alguns alunos dominam a leitura e escrita e apresentam grandes dificuldades

nos conceitos básicos da matemática, enquanto outros ao contrário, solucionam

problemas de matemática, mas não realizam atividades de construção de textos;

existem aqueles que apresentam dificuldades generalizadas na apreensão dos todos

os conteúdos do ensino fundamental; registra-se ainda, um grupo de alunos que se

destacam na área artística, como a pintura e música; outro pequeno grupo que

necessita de orientação em todas as atividades acadêmicas e da vida prática.

A ação pedagógica da Sala de Recursos deve respeitar todas as

particularidades possíveis, pois cada aluno é único e suas características dependem

de uma série de fatores que envolvem o desenvolvimento físico, psicológico e

principalmente as relações sociais. No entanto, é possível observar algumas

características que lhe são peculiares em diferentes níveis as quais variam de aluno

para aluno comparado a seus pares da mesma faixa etária.

Entre as características comuns dos alunos que compõe este segmento,

destacam-se as limitações na área intelectual que interferem de maneira substancial

na aprendizagem acadêmica, pois seu desenvolvimento processa de maneira

diferente no que se refere à apropriação e elaboração de conceitos mais elaborados,

com ritmo mais lento comparado ao desenvolvimento de colegas que não

apresentam essa condição. As dificuldades para adaptar-se a novas situações, para

se comunicar, controlar emoções e estabelecer vínculos afetivos com colegas de

escola e professores contribuem para a baixa auto-estima que consequentemente

comprometem o processo de aprendizagem.

Ficou evidenciado, também, que o respeito ao ritmo e às necessidades do

aluno permite ao professor da Sala de Recursos desenvolver um trabalho

individualizado, com avaliação e metodologia diferenciada.

Para realização da ação pedagógica no serviço de atendimento especializado

as professoras afirmaram que é de suma importância a fundamentação teórica sobre

o processo de desenvolvimento cognitivo e de aprendizagem do aluno com

deficiência intelectual e, na oportunidade, defenderam as duas abordagens

interacionistas: a teoria sócio-histórica abordada por Vygotsky e o construtivismo

abordado por Piaget.

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Dentro do enfoque social da deficiência descrito por Vygotsky, as professoras

discutiram que na Sala de Recursos, sua função deve ser de mediador da

aprendizagem, com a proposição de ações pedagógicas sistematizadas e

organizadas, as quais devem objetivar a compensação dos déficits decorrentes da

deficiência, ou, em outras palavras, atenderem às necessidades educacionais

decorrentes desta condição intelectual.

Para Vygotsky o professor deve ter como foco as potencialidades e

possibilidades de desenvolvimento do seu aluno, considerando as relações sociais

por ele vividas, ou seja, o que ele pode vir aprender e saber.

Nessa perspectiva destacou-se que é essencial oferecer possibilidades de

aprendizado para esse grupo de alunado, sendo a Sala de Recursos, um espaço

privilegiado de desenvolvimento das funções psicológicas superiores como:

memória, linguagem, percepção, abstração, atenção e linguagem, por meio de

atividades diversificadas através de jogos e atividades do interesse e faixa etária do

aluno, que visem atender suas necessidades e defasagens construídas socialmente.

Ancorados na teoria cognitiva de Piaget, o grupo de professoras concluiu que

esse grupo de alunos tem possibilidades de se desenvolver pedagogicamente,

desde que a escola ofereça a eles estratégias de desenvolvimento das estruturas

mentais e estimulação do funcionamento intelectual. Assim, o prognóstico

educacional - do aluno em situação de deficiência intelectual - depende dos

estímulos e de sua interação com o meio; logo, o papel do professor é propor

situações de aprendizagem que estimulem a atividade intelectual, pois, a inteligência

se estrutura a partir de seu próprio funcionamento. Desta forma, as intervenções

pedagógicas na Sala de Recursos devem:

• possibilitar a evolução de um estágio6 de desenvolvimento para o

subsequente;

• facilitar a aquisição de conceitos defasados, respeitando o nível cognitivo de

cada um;

• propor atividades através de jogos, vivências e materiais concretos que

6 Piaget (1980) estabeleceu quatro estágios de desenvolvimento sucessivamente construídos (sensório-motor, pré-operatório, operações concretas, operações formais), suas idades podem se alterar, dependendo das condições orgânicas das crianças e de sua relação com o meio ambiente. As crianças passam por todos os estágios, não necessariamente ao mesmo tempo, umas desenvolvem-se com mais rapidez, outras mais lentamente.

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provoquem a aprendizagem;

• partir do conhecimento que o aluno possui, investigar suas necessidades e

possibilitar-lhe novos conhecimentos.

Em síntese, neste bloco de discussões, as professoras concluíram que o

aluno com deficiência intelectual apresenta dificuldades de aprendizagem que não

podem ser ignoradas pelo professor, escola e família, já que a aprendizagem do

mesmo depende de condições que lhe são proporcionadas.

2.2.3 Atribuições pedagógicas do professor da Sala de Recursos

Nesta temática, as professoras reafirmaram que esse serviço especializado

não se constitui ensino particular, nem mesmo reforço escolar ou repetição de

conteúdos programáticos da classe comum, é um trabalho distinto e diferente que

complementa a escolarização do aluno, objetivando:

• a independência e autonomia na escola, família e sociedade;

• o desenvolvimento e a superação das dificuldades acadêmicas e conteúdos

defasados de leitura, escrita e conceitos matemáticos;

• a melhoria da autoestima e criatividade;

• o desenvolvimento das habilidades cognitivas e adaptativas.

Mencionaram, também, que o professor de Sala de Recursos, para trabalhar

em uma perspectiva inclusiva, deve ousar propondo diferentes formas de trabalho

pedagógico na escola, ou seja, não ficar restrito apenas ao trabalho individual com o

aluno. Esse professor deve permear todas as instâncias da escola, estabelecendo

cumplicidade de trabalho com a direção, equipe pedagógica, professores de

disciplinas e família. Logo, definiram que as atribuições pedagógicas do professor

devem contemplar 3 (três) eixos de trabalho: atendimento individual ao aluno;

trabalho colaborativo entre os professores da Sala de Recursos e classe comum;

trabalho colaborativo entre escola e família. Os eixos definidos serão descritos a

seguir:

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(a) Atendimento individual ao aluno

Para as componentes do grupo de discussão, o ponto de partida do trabalho

na Sala de Recursos é o resgate da autoestima dos alunos. Incluídos na classe

comum, devem readquirir confiança em sua capacidade de aprender e

consequentemente, ampliar suas possibilidades de aprendizagem acadêmica, uma

vez que, na maioria das vezes os alunos encontram-se em situação de dificuldade

no processo de aprendizagem, reprovações sucessivas e defasagem idade-série.

Foi destacado que, apesar do fracasso na escola, os alunos com deficiência

intelectual trazem conhecimentos de vida bastante valiosos, que precisam ser

respeitados e valorizados; por esse motivo, o professor deve acreditar na

potencialidade do seu aluno, provocar o conhecimento acadêmico e intervir

positivamente para o desenvolvimento de suas habilidades cognitivas e

adaptativas.

Para proposição de intervenções pedagógicas, o professor deve identificar as

especificidades das necessidades educacionais especiais do aluno, através de

avaliação pedagógica e observações pautadas em uma concepção teórica de

desenvolvimento humano e aprendizagem.

As intervenções pedagógicas na Sala de Recursos devem primeiramente,

contribuir para desenvolver o potencial cognitivo do aluno com deficiência

intelectual e consequente superação de suas dificuldades. Neste trabalho

considera-se o conceito de cognição como a “maneira pela qual os seres humanos

adquirem, interpretam, organizam e empregam o conhecimento” (PARANÁ, p.31,

1999). Dito em outras palavras, cognição é o ato ou processo de conhecer e de

aprender e envolve processos mentais como percepção, atenção, memória,

raciocínio, abstração, juízo, pensamento e linguagem.

Para a operacionalização dessa proposta, citou-se como exemplo, o

trabalho com diferentes materiais didáticos como jogos pedagógicos, vídeos

ilustrativos dos conteúdos, computador, software, fotos, cartazes, esquemas,

mapas, desenhos, jornais, revistas, dramatização, teatro, mímica, coral, músicas,

poesias, manuseio de diferentes livros de literatura, passeios, visitas a museus,

maquetes e o favorecimento de outras atividades lúdicas, relacionadas aos

objetivos a serem alcançados por meio de situações desafiadoras, sempre de

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acordo com os objetivos propostos para cada aluno.

Além dos processos cognitivos que são fundamentais ao êxito nas

atividades acadêmicas, em um segundo plano, durante o trabalho individual com o

aluno, foram unânimes as opiniões sobre o trabalho com conteúdos defasados de

leitura, escrita e conceitos matemáticos, pois dificuldades nessas áreas trazem

consequências negativas para aprendizagem de outras disciplinas, sendo que o

domínio dessas é requisito essencial na aquisição dos conteúdos da série atual.

Os conteúdos escolares deverão ser trabalhados com estratégias e metodologias

diferenciadas. De acordo com a Secretaria de Educação Especial “esse

atendimento existe para que os alunos possam aprender o que é diferente do

currículo do ensino comum e que é necessário para que possam ultrapassar as

barreiras impostas pela deficiência” (BRASIL, 2007, p.22).

Enfim, os professores da Sala Recursos e da classe comum desempenham

um papel indiscutível, uma vez que devem mediar e avaliar a construção do

conhecimento a ser elaborado pelo aluno, através de situações pedagógicas

significativas, que despertem o seu interesse em aprender.

(b) Trabalho colaborativo entre os professores da Sala de Recursos e classe comum

As professoras das Salas de Recursos que compuseram o grupo de

discussões afirmaram que, atualmente, no âmbito escolar, os professores do ensino

comum entendem que o direito do aluno com deficiência intelectual de frequentar

escolas comuns junto às demais crianças é indiscutível; entretanto, alertam que a

inclusão educacional ainda se constitui uma preocupação, em decorrência de

preconceitos e estereótipos pautados na incapacidade intelectual dessas pessoas,

que foram construídos socialmente ao longo dos séculos. A inclusão desse grupo de

alunos é um grande desafio e alvo de resistência dos professores da classe comum

que alegam, muitas vezes, desconhecimento para o atendimento pedagógico desse

aluno, apoiados em um discurso de que não foram preparados para ensinar alunos

com necessidades educacionais especiais.

É fundamental que esse professor seja orientado na busca de novas práticas

educativas. Nesse sentido, os professores da educação especial, por terem um

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especialização especifica e por acumular conhecimentos no trabalho pedagógico

com alunos deficientes, devem atuar como apoio ao ensino regular no atendimento

aos alunos incluídos.

Na defesa do sucesso escolar do aluno com deficiência, Brizolla (2009)

destaca que a educação especial e o ensino regular devem estabelecer um trabalho

de cooperação, pois se de um lado a educação especial dispõe de serviços e

recursos especializados para atendimento das especificidades dos alunos com

necessidades educacionais especiais; por outro lado, o ensino regular

responsabiliza-se pela escolarização desses alunos. “Nesse sentido, estabelece-se

uma relação de parceria e colaboração entre os níveis educacionais e a modalidade

de educação especial, na qual uma categoria depende da outra para a realização do

trabalho pedagógico, ou seja, co-operam”.

Nessa perspectiva, o trabalho colaborativo deve integrar a rede de apoio aos

professores da classe comum, ou seja, deve ser estabelecida uma parceria entre o

professor da classe comum e o professor da educação especial, especificamente

neste estudo o professor da sala de recursos, com o objetivo de desenvolver

práticas pedagógicas inclusivas. Correia e Martins (2000 apud Correia, 2008)

consideram que a “colaboração é um processo interativo, através do qual

interveniente, com diferentes experiências, encontram soluções criativas para

problemas mútuos.” Para que o trabalho colaborativo ocorra com sucesso é

necessário que os profissionais envolvidos mantenham um diálogo constante,

somem suas responsabilidades quanto ao processo de ensino e após conhecer as

necessidades e potencialidades do aluno, estabeleçam objetivos a serem

alcançados.

Para efetivar essa ação de parceria entre os professores da Sala de Recursos

e das diferentes disciplinas e que as barreiras pedagógicas sejam superadas na

aprendizagem dos conteúdos acadêmicos, foi sugerido no grupo de discussões,

alguns caminhos para auxiliar a prática pedagógica adotada na classe comum,

como:

• estudar o acesso curricular para alunos com deficiência intelectual;

• propor estratégias de ensino e avaliação diferenciadas;

• estudar as características de aprendizagem do aluno em questão.

17

(c) Trabalho colaborativo entre escola e família

E, finalmente foi discutido o trabalho colaborativo entre escola e família, onde

as professoras afirmaram que tal relação é necessária e fundamental para o

sucesso da aprendizagem do aluno com deficiência intelectual. A escola e a família

devem ser parceiras no que diz respeito ao desenvolvimento do aluno/filho, muitas

das respostas às necessidades educacionais especiais surgem entre um diálogo e

ações coordenadas entre esses dois segmentos. Relações claras sobre a

responsabilidades que compete a cada um dos segmentos possibilitarão traçar

intervenções pedagógicas específicas relevantes na área cognitiva e afetiva

emocional e, consequente para a aprendizagem dos conteúdos acadêmicos.

A escola deve estabelecer compromissos com a família, quanto às suas

responsabilidades no processo de aprendizagem, como por exemplo, mostrar

interesse pelo que eles aprendem; acompanhar as tarefas da escola e de casa;

cobrar dos filhos a assiduidade e frequência deste na classe comum e na sala de

recursos; verificar se o material escolar está em ordem, participar de reuniões na

escola, mostrar ao filho a importância de cumprir as regras da escola, entre outras.

Por sua vez, a escola deve envolver a família na elaboração da proposta

pedagógica; assumir a responsabilidade de prover uma rede de apoio a

escolarização do aluno com deficiência intelectual; elaborar projetos educativos em

parceria com a família e comunidade em geral; promover reuniões, palestras, grupos

de estudos com temas de interesses aos pais.

Finalizando, a colaboração entre escola e família se resume em uma

cumplicidade de responsabilidades, onde cada uma das partes assume seu papel

para formar uma rede de apoio as necessidades educacionais especiais do aluno

com deficiência intelectual.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da oportunidade de se realizar um estudo investigativo a respeito dos

desafios da escolarização de alunos com deficiência intelectual na perspectiva

18

inclusiva, tivemos como objetivo geral observar e refletir sobre a ação pedagógica

desenvolvida por professores que atuam nos serviços de Atendimento Educacional

Especializado, nos espaços denominados Salas de Recursos, tendo como amostra a

rede estadual de educação do município de Curitiba. O curso buscou conjugar a

oferta de formação com reflexão - participação reflexiva sobre as práticas

pedagógicas nestes espaços.

No decorrer da implementação da formação e da investigação deste estudo,

foi possível constatar as expectativas e as percepções dos professores, as quais

eram reveladas pela participação dos mesmos nas discussões e estudos. No geral,

revelaram dúvidas e inquietudes referentes à sua ação pedagógica, mas, também,

esforço e profissionalismo, no sentido da busca por fundamentação teórica e

práticas compatíveis e exequíveis à perspectiva inclusiva no que diz respeito à

aprendizagem dos alunos com deficiência intelectual. Portanto, neste artigo, , estão

descritas apenas algumas conclusões sistematizadas, mas que não revelam a

totalidade das discussões realizadas durante a implementação do projeto de

formação.

As constatações realizadas ao longo da intervenção na rede básica

reafirmaram que a complementação pedagógica oferecida pela Sala de Recursos é

fundamental para o atendimento das necessidades educacionais especiais dos

alunos que compõe o grupo da deficiência em questão. Para os professores que

atuam neste atendimento, existe uma demanda reprimida e eminente de capacitação

e formação continuada, uma vez que mencionam que os cursos de graduação e

pós-graduação cursados não ofereceram subsídios teóricos e práticos para trabalhar

com as particularidades do aluno com deficiência intelectual.

Outro pressuposto básico evidenciado durante o trabalho foi a necessidade

de fundamentação da ação pedagógica do professor em teorias psicológicas do

desenvolvimento e da aprendizagem. Considerou-se a teoria sócio-histórica de

Vygotsky e o construtivismo de Jean Piaget como um referencial que ainda respalda

satisfatoriamente a atual concepção de deficiência intelectual e as práticas

pedagógicas que tangenciam a perspectiva inclusiva. Importante destacar que, após

as discussões realizadas, o grupo de professores que participou do trabalho concluiu

que as atribuições pedagógicas do professor de Sala de Recursos devem “ir além

das paredes de uma sala de aula”. Em um momento histórico em que a escola vive

mudanças de paradigmas e consequente reflexão sobre sua função e prática, o

19

professor especializado em Educação Especial deve ampliar o atendimento do aluno

com deficiência intelectual, para atendê-lo em todas as suas necessidades e

peculiaridades, com o oferecimento de condições de aprendizagem para uma

inclusão educacional e social de fato.

A ação pedagógica do professor da Sala de Recursos deve ser efetivada em

3 (três) eixos, de acordo com o grupo: primeiro, o atendimento individual ao aluno,

que compreende o desenvolvimento das habilidades cognitivas e afetivas, assim

como o trabalho com conteúdos acadêmicos defasados, principalmente os

desenvolvidos nas séries iniciais do ensino fundamental, de língua portuguesa e

conceitos matemáticos. O segundo eixo de trabalho seria o estabelecimento de

parceiras com os demais professores das diferentes áreas/disciplinas da classe

comum. O trabalho colaborativo entre estes professores deve objetivar a superação

das dificuldades de aprendizagem desse alunado. Por fim, o terceiro eixo de

trabalho apontado é o trabalho colaborativo entre escola e família, pois estes dois

segmentos, embora com funções diferenciadas, objetivam o pleno desenvolvimento

do aluno.

Isto posto, encerramos este relato deste trabalho concluindo que a temática

da escolarização do aluno com deficiência intelectual é, ainda, um imenso desafio às

redes de ensino, tanto no que diz respeito à atuação quanto à formação dos

docentes que assumem o atendimento educacional especializado do aluno e os

professores que compartilham da educação desse alunado nas classes comuns.

Além disso, conforme temos observado em outros locais e situações de

escolarização de alunos com deficiência, fica posto o grande desafio ao avanço das

reflexões, qual seja, a evidência de que sob o tema da “perspectiva inclusiva” ocorre

uma multiplicidade de situações em termos de atendimento educacional

especializado – coexistência de vários paradigmas de interpretação, situação esta

que justifica todos os arranjos político-administrativos de cada localidade. Por

exemplo, em relação aos espaços de atendimento segregados, no caso, classes

especiais e escolas especiais, a manutenção, ampliação e/ou transformação dos

mesmos estão diretamente relacionadas ao sentido que os municípios e os estados

agregam ao que entendem como “educação especial”, “educação inclusiva” e à

“escola para todos”, muito embora exista uma concepção e um posicionamento

político-pedagógicos de âmbito nacional em franca discussão.

20

Outro ponto importante para discussão está relacionado à flexibilidade de

concepção a respeito da função e do trabalho a ser realizado nas salas de recurso;

neste caso, pensando em termos de paradigma educacional especial, registra-se a

ocorrência de diferentes práticas pedagógicas (inclusive, antagônicas) nas salas de

recurso dos municípios, principalmente, quando comparadas às salas das redes

estaduais com as das redes municipais e, ainda, com a proposição nacional.

Ou seja, há uma pluralidade de experiências em jogo, que são determinadas

pelas questões mencionadas e, desta forma, discutir e (re)arranjar espaços, serviços

e recursos para a escolarização de alunos com deficiência intelectual ainda é uma

decisão feita a partir da experiência primeira da localidade com os alunos “especiais”

e da constituição histórico-política local. Mesmo que o atendimento deva ocorrer

“preferencialmente” nas classes comuns do ensino e que isto iniba, de certo modo,

implantação de novas classes especiais, ainda há uma pré-disposição de exceção

para casos específicos de determinados grupos de alunos. Por fim, há uma

tendência explícita de que os espaços públicos especializados continuem

desempenhando uma função importante na escolarização dos alunos com

deficiência, agregando matrículas próprias, mas com um sentido de “apoio” e de

“complementaridade” à educação comum, especialmente após as diretrizes

nacionais divulgadas nos últimos dois anos (conforme as Diretrizes operacionais da

educação especial para o atendimento educacional especializado na Educação

Básica e o Decreto Nº 6.571, ambos de 2008). Este ponto continua sendo nevrálgico

na questão da infraestrutura e dos recursos a serem providenciados para a

escolarização, por exemplo, mas isto não parece ter garantido que novas

concepções e práticas sejam desenvolvidas, dando margem à complicada situação

de que o atendimento educacional especializado, enquanto função e espaço

diferenciado na educação de alunos com deficiência, possa simbolizar um

“reformismo” mascarado de “mudança”, ou, de “roupa nova em corpo velho”

(BRIZOLLA, 2009).

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REFERÊNCIAS

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