Da dúvida ao cogito

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FILOSOFIA 11.º ano F ILOSOFIA 11.º ano Luís Rodrigues Da dúvida ao Cogito. O exercício da dúvida e os seus resultados

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FILOSOFIA 11.º ano

FILOSOFIA 11.º anoLuís Rodrigues

Da dúvida ao Cogito.O exercício da dúvida e os seus resultados

ANÁLISE COMPARATIVA DE DUAS

TEORIAS DO CONHECIMENTO

O RACIONALISMO DE DESCARTES

FILOSOFIA 11.º ano

Da dúvida ao cogito

DA DÚVIDA AO COGITO

O EXERCÍCIO DA DÚVIDA E OS SEUS RESULTADOS

FILOSOFIA 11.º ano

Da dúvida ao cogito

O objetivo fundamental do pensamento de Descartes é uma profundareforma do conhecimento humano que o coloque à margem dequalquer dúvida.

Trata-se de justificar ou fundamentar as nossas crenças de forma agarantirmos, sem margem para dúvida, a sua verdade.

A DÚVIDA AO SERVIÇO DA VERDADE

FILOSOFIA 11.º ano

Da dúvida ao cogito

Como encontrar uma verdade absolutamente indubitável?

Como encontrar uma verdade sobre a qual não possa recair a mínimasuspeita de falsidade?

A QUESTÃO QUE ORIENTA O EXERCÍCIO DA DÚVIDA

FILOSOFIA 11.º ano

Da dúvida ao cogito

• Considerar falsa qualquer opinião ou crença em que detetarmos amínima fragilidade, isto é, sobre a qual possamos ter uma razãopara duvidar, por mais ténue que seja.

• Considerar que qualquer faculdade que usamos para conhecer nãomerece confiança se alguma vez nos tiver enganado ou se tivermosalguma razão para suspeitar de que nos pode enganar.

A RESPOSTA À QUESTÃO QUE ORIENTA O EXERCÍCIO DA DÚVIDA

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Da dúvida ao cogito

Só o que for impossível considerar duvidoso merece o nome deverdade.

A dúvida é o meio de examinar que crenças ou opiniões merecem onome de verdades indiscutíveis.

A RESPOSTA À QUESTÃO QUE ORIENTA O EXERCÍCIO DA DÚVIDA

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Da dúvida ao cogito

As bases do sistema dos conhecimentos

estabelecidos:

1. A crença de que podemos confiar nos sentidos, sendo a experiênciaa origem do conhecimento.

2. A crença imediata na existência de realidades físicas.

3. A crença de que o nosso entendimento (ou a nossa razão) não seengana ou não pode estar enganado quando descobre verdades.

O QUE VAI SER EXAMINADO

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Da dúvida ao cogito

Temos de provar sem qualquer margem para dúvida que estascrenças são verdadeiras.

Se não o conseguirmos, teremos de as rejeitar como falsas.

O QUE VAI SER EXAMINADO

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Da dúvida ao cogito

Descartes considerava que a confiança na perceção sensível ouexperiência era uma das bases do saber tradicional. Rejeita essa crençausando a dúvida de forma hiperbólica. Como os sentidos algumas vezesnos enganam, nunca devemos confiar nas suas informações sobre asqualidades dos objetos sensíveis.

A sua teoria do conhecimento rejeita, por conseguinte, o

empirismo.

A opinião ou crença de que os sentidos são aorigem do conhecimento é falsa.

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Da dúvida ao cogito

«Quantas vezes me acontece que, durante o repouso noturno,me deixo persuadir de coisas tão habituais como que estou aqui, com oroupão vestido, sentado à lareira, quando, todavia, estou estendido nacama e despido! Mas agora, observo este papel seguramente com osolhos abertos, esta cabeça que movo não está a dormir, voluntária econscientemente estendo esta mão e sinto-a; o que acontece quando sedorme não parece tão distinto. Como se não me recordasse de já tersido enganado em sonhos por pensamentos semelhantes! Por isso, sereflito mais atentamente, vejo com clareza que vigília e sono nunca sepodem distinguir por sinais seguros […].»

Meditações sobre a Filosofia Primeira, p. 108.

A opinião ou crença de que o mundo físico existeé falsa: o argumento das ilusões dos sonhos

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Da dúvida ao cogito

Não havendo um critério absolutamente claro e distinto paradistinguir o sonho da realidade, não podemos considerar verdadeira acrença na existência de realidades físicas.

Aplicando o princípio que regula a aplicação da dúvidahiperbólica, tenho de concluir que o facto de julgar que tenho um corpoe de existirem coisas físicas é uma ilusão.

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Da dúvida ao cogito

A opinião ou crença de que o mundo físico existeé falsa: o argumento das ilusões dos sonhos

O que foi posto em causa até agora

Considerámos como duvidosa – falsa – a crença de que ossentidos são fiáveis pontos de partida do conhecimento.

Considerámos como duvidosa – falsa – a crença na existênciade objetos físicos, materiais ou sensíveis.

As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

FILOSOFIA 11.º ano

Da dúvida ao cogito

O que falta examinar

Não encontrámos qualquer verdade indubitável do lado dos objetossensíveis.

Será que examinando outro tipo de objetos encontraremos algo que possamos considerar verdade de que não podemos duvidar de

modo algum?

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As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

O que falta examinar

Examinados os objetos sensíveis e as informações dos sentidos, falta ver se os objetos inteligíveis resistem ao severo exame da dúvida

metódica e hiperbólica.

O que são objetos inteligíveis?

São o resultado da atividade da razão ou do entendimento. Que 2 + 2 sejam igual a 4 é o resultado de uma operação do entendimento.

Parece impossível de falsificar. Mas será?

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As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

«Está gravada no meu espírito uma velha crença, segundo a qual existeum Deus que pode tudo e pelo qual fui criado tal como existo. Masquem me garante que ele não procedeu de modo que não houvessenem terra, nem céu, nem corpos extensos, nem figura, nem grandeza,nem lugar, e que, no entanto, tudo isto me parecesse existir tal comoagora? E mais ainda, assim como concluo que os outros se enganamalgumas vezes naquilo que pensam saber com absoluta perfeição,também eu me podia enganar todas as vezes que somasse dois e trêsou contasse os lados de um quadrado.»

Meditações sobre a Filosofia Primeira, pp. 110-111.

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As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

O argumento pretende examinar se é justificável a confiança naverdade indiscutível das nossas crenças racionais, em especial a crençade que as verdades matemáticas são evidências acima de qualquersuspeita.

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As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

O argumento baseia-se em duas ideias:

1. Deus criou o nosso entendimento;

2. Deus é omnipotente.

O aspeto decisivo do argumento é a reflexão sobre o conceito deomnipotência.

Um ser omnipotente não será uma entidade que tudo pode fazer,mesmo o que eu acho incrível ou absurdo?

Descartes pensa que sim, apesar de considerar esta suspeita muitofrágil.

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As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

Mas basta esta frágil suspeita para que não possamos declarar que acrença nas verdades matemáticas mais elementares é indubitável.

As proposições com origem na razão, como as da Matemática, nãosão verdades indubitáveis.

Porquê?

Porque Deus pode ter-nos criado de modo que nos enganemossempre que somamos dois mais três.

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As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

Somos completamente incapazes de mostrar que não existe umDeus que nos tenha criado destinados a confundir o verdadeiro com ofalso.

É suficiente supor que um tal Deus existe para que duvidemosdo que julgávamos impensável duvidar.

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As crenças nas verdades racionais podem ser falsas: o argumento do Deus enganador

Até agora parece que a dúvida metódica e hiperbólica nãocumpriu o seu objetivo. Denunciámos como falso aquilo de cujaverdade não podemos estar certos. Mas não descobrimos nenhumaverdade.

Será que nada é verdadeiro?

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Em nenhum tipo de objetos – nem nos sensíveis nem nosinteligíveis – encontrámos verdades indiscutíveis.

Talvez o correto seja procurar a verdade do lado do sujeito.

Mas não foi este que tudo pôs em causa?

Não serviu a hipótese do Deus enganador para suspeitar dafiabilidade da nossa razão ou do nosso entendimento quando julgamdescobrir verdades?

Parece que estamos num beco sem saída.

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Será que nada é verdadeiro?

Parece que estamos num beco sem saída.

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Será que nada é verdadeiro?

DA DÚVIDA AO COGITO

O EXERCÍCIO DA DÚVIDA E OS SEUS RESULTADOS:

A PRIMEIRA VERDADE INDUBITÁVEL

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Duvido de tudo, mas poderei duvidar de que duvido de tudo? Não.

Duvido, logo, existo.

Como duvidar é um ato do pensamento, posso dizer:

Penso, logo, existo.

A condição de possibilidade da dúvida

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O exercício da dúvida conduziu-nos a esta conclusão: Nãotemos a certeza de nada.

Mas há algo que não podemos considerar duvidoso ou falso: osujeito que duvida existe.

A condição de possibilidade da dúvida

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Por que razão o «Duvido – penso – logo existo» é uma verdadeindubitável?

Porque para que a dúvida seja possível tem de ser verdadeira aexistência do eu que duvida.

A condição de possibilidade da dúvida

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1. Como primeira crença que resiste à dúvida, será o primeiro princípiodo novo sistema dos conhecimentos.

Nenhum conhecimento é anterior a este porque o descobrimos nomomento em que temos dúvidas sobre tudo (objetos sensíveis einteligíveis). Como primeira verdade indubitável, vai ser a partir delaque a reconstrução do saber se vai fazer.

As caraterísticas da primeira verdade indubitável

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2. É a afirmação da existência do eu como substância pensante.

Como duvidar é um ato do pensamento, o sujeito descobre a suaexistência como sujeito pensante.

3. É uma verdade autoevidente porque é conhecida pela razão sem serjustificada por uma verdade anterior.

Que o eu exista como substância pensante é uma verdadeautoevidente que não se baseia em nenhuma outra verdade.

As caraterísticas da primeira verdade indubitável

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4. É uma verdade puramente racional conhecida por intuição (intuiçãoracional e existencial).

Corresponde à descoberta da existência do eu no ato de pensar e àdescoberta da sua essência nesse mesmo ato. O eu existe como serpensante. É puramente racional porque descoberta pela razão,independentemente de qualquer contributo da experiência.

É descoberta por intuição. Não é deduzida de um conhecimentoanterior mais geral do tipo «Tudo o que pensa existe».

As caraterísticas da primeira verdade indubitável

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5. É uma verdade inata.

O «Eu penso, logo, existo» ou a existência do eu pensante é umaverdade que não deriva ou depende da experiência, dos sentidos.Apresenta-se à razão como verdade de que ela não pode duvidar.Está no nosso espírito desde sempre (ao nascer) e, mesmo que nãotenhamos desde logo consciência dela, a nossa razão descobre-aquando dá atenção a si e não às coisas exteriores.

As caraterísticas da primeira verdade indubitável

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6. É um modelo e um critério de verdade.

O Cogito é um modelo e um critério de verdade porque só é verdadeiroo que apreendemos com clareza e distinção. Serão verdadeiras todasas ideias que forem tão claras e distintas como este primeiroconhecimento. É claro e distinto o que a razão, independentementedos sentidos, considera impossível ser falso.

As caraterísticas da primeira verdade indubitável

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Da dúvida ao cogito

As caraterísticas da primeira verdade indubitável

SÍNTESE

Conhecimento indubitável e autoevidente obtido por intuição, que não depende de nenhum outro.

Conhecimento a partir do qual se vão deduzir outros porque é absolutamente primeiro.

Modelo e critério de verdade.

Ideia inata porque se impõe como verdade absoluta à razão sem recurso à experiência.

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