CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE...

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Karl Marx CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL 1843 Tradução Rubens Enderle e Leonardo de Deus { & t& E D I T O R I A L

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Karl Marx

CRÍTICA DA FILOSOFIADO DIREITO DE HEGEL

1843

TraduçãoRubens Enderle e Leonardo de Deus

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CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITODE HEGBL - INTRODUÇÃO1

No caso da Alemanha, a Crítica da religião chegou, no essencial, ao seu fim;e a crítica da religião é o pressuposto de toda a crítica.

A existência profana do erro está comprometida, depois que sua oratío próuris eí/oczs2 celestial foi refutada. O homem, que na realidade fantástica do céu,onde procurara um ser sobre-humano, encontrou apenas o seu próprio reflexo,já não será tentado a encontrar a aparência de si mesmo - apenas o não-huma-no - onde procura e deve procurar a sua autêntica realidade.

É este o fundamento da crítica irreligiosa: o homem/ir a religião, a religiãonão faz o homem. E a religião é de fato a autoconsciência e o sentimento de si dohomem, que ou não se encontrou ainda ou voltou a se perder. Mas o homem nãoé um ser abstrato, acocorado fora do mundo. O homem é o mundo do homem, oEstado, a sociedade. Este Estado e esta sociedade produzem a religião, umaconsciência invertida da munào, porque eles são um mundo invertido, A religião é ateoria geral deste mundo, o seu resumo enciclopédico, a sua lógica em formapopular, o seu paint d'homteur espiritualista, o seu entusiasmo, a sua sançãomoral, o seu complemento solene, a sua base geral de consolação e de justifica-ção. É a realizaçãofftntástíca da essência humana, porque a essência humana nãopossui verdadeira realidade. Por conseguinte, a hita contra a religião é, indireta-mente, a luta contra aquele mundo cujo aroma espiritual é a religião.

A miséria religiosa, constitui ao mesmo tempo a expressão da miséria real e oprotesto contra a miséria real. A religião é o suspiro da criatura oprimida, oânimo de um mundo sem. coração e a alma de situações sem alma. A religião éo ópio do povo.

A abolição da religião enquanto felicidade ilusória dos homens é a exigên-cia da sua felicidade real. O apelo para que abandonem as ilusões a respeito da

1 O texto " Kritik der Hegelschen Rechtsphilosophie - Eilentung" foi escrito entre dezembrode 1843 e janeiro de 1S44 e publicado nos Anais Franco-Aíemães (Detitsch-FranzõsischeJohrbiicher) em 184a. Traduzido por Raul Mateos Castell. (N.E.B.)

a "Oração para altar e fogão". (NJE.A.)

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sua condição é o apelo para abandonarem uma condição que precisa de ilusões. Acrítica da religião é, pois, ó germe da crítica do vale de lágrimas, do qual a religiãoé a auréola.

A crítica arrancou as flores imaginárias dos grilhões, não para que o ho-mem os suporte sem fantasias ou consolo, mas para que lance fora os grilhõese a flor viva brote. A crítica da religião liberta o homem da ilusão, de modo quepense, atue e configure a sua realidade corno homem que perdeu as ilusões ereconquistou a razão, a fim de que ele gire em torno de si mesmo e, assim, emvolta do seu verdadeiro sol. A religião é apenas o sol ilusório que gira em voltado homem enquanto ele não circula em tomo de si mesmo.

Conseqiientemente, a tarefa da história, depois que o outro mundo da verdadese desvaneceu, é estabelecer a verdade deste mundo, A tarefa imediata dafiksofia,que está a serviço da história, é desmascarar a auto-alienação humana nassuas formas não sagradas, agora que ela foi desmascarada na sua forma sagrada.A crítica do céu transforma-se deste modo em crítica da terra, a crítica da reli-gião em critica do direito, e a crítica da teologia em crítica da política.

A exposição que se segue3 - que é uma contribuição a semelhante empreen-dimento—não se ocupa diretamente do original, mas de uma cópia, a filosofiaalemã do Estado e do direito, pela simples razão de se referir à Alemanha.

Se quisermos nos ater ao status quo alemão, mesmo da maneira mais ade-quada, isto é, negativamente, o resultado seria ainda um anacronismo. A pró-pria negação do nosso presente político é já um fato poeirento no quarto dearrumações histórico das nações modernas. Posso até negar as perucasempoadas, mas fico ainda com as perucas desempoadas. Se nego a situaçãoalemã de 1843 dificilmente atinjo, segundo a cronologia francesa, o ano de1789, e ainda menos o centro vital do período atual.

A história alemã, de fato, orgulha-se de um desenvolvimento que nenhumaoutra nação anteriormente realizou ou virá alguma vez a imitar no firmamentohistórico. Participamos nas restaurações de nações modernas, sem termos to-mado parte nas suas revoluções. Fomos restaurados/ primeiro, porque houvenações que ousaram fazer revoluções e, em segundo lugar, porque outras na-ÇÕes sofreram contra-revoluções; no primeiro caso, porque os nossosgovernantes tiveram medo e, no segundo, porque nada temeram. Conduzidospelos nossos pastores, só uma vez nos encontramos na sociedade da liberda-de, no dia do seu funeral.

Uma escola que justifica a infâmia de hoje pela de ontem, que consideratodo o grito do servo debaixo do látego como grito de rebelião desde que olátego se tornou venerável pela idade, ancestral e histórico, uma escola para a

3 Marx refere-se à sua intenção de publicar um estudo crítico da Filosofia do direito deHegel, a que o presente ensaio serviria de introdução. O estudo crítico corresponde aotexto aqui publicado, nas páginas que antecedem esta introdução. (N.E.B.)

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qual a história só mostra o seu a posteriori, como o Deus de Israel fez com o seuservo Moisés - a Escola histórica do direitoí - poderia supor-se que ela inventoua história alemã, se não fosse realmente uma invenção da história alemã. UmShylock, mas um Shylock servil, que jura sobre a sua aliança, a aliançagermano-crista, por cada libra de carne cortada do coração do povo.

Em contrapartida, entusiastas bonacheirões, chauvinistas alemães pelo san-gue e liberais esclarecidos por reflexão, buscam a nossa história de liberdadealém da nossa história, nas primitivas florestas teutônicas. Mas qual a diferençada história da nossa liberdade em relação à história da liberdade do javali selva-gem, se apenas se encontrar nas florestas? E, como diz o provérbio, o que nafloresta se grita, a floresta ecoa. Assim, paz às antigas florestas teutônicas!

Mas guerra à situação na Alemanha! Por todos os meios! Semelhante situa-ção está abaixo do nível da história, abaixo de toda a. crítica; não obstante, continuaa ser objeto de crítica, assim como o criminoso, que está abaixo do nível dahumanidade, continua a ser objeto do carrasco. Na luta contra esta situação,a crítica não é paixão da cabeça, mas a cabeça da paixão. Não é uma lancetaanatómica, mas uma arma. O seu alvo é um inimigo que ela procura, nãorefutar, mas destruir. Pois o espírito de tal situação já foi refutado. Não constituiem si e por si um objeto digno do nosso pensamento; é uma existência tãodesprezível como desprezada. A crítica já não necessita de ulterior elucidaçãodo seu objeto, porque já o entendeu. A crítica já não é fim em si, mas apenas ummeio; a indignação é o seu modo essencial de sentimento, e a denúncia a suaprincipal tarefa.

Trata-se de pintar a pressão sufocante que as diferentes esferas sociaisempregam umas sobre as outras, o mau humor universal, mas passivo, a es-treiteza de espírito complacente, mas que se ilude a si própria; tudo isto incor-porado num sistema de governo que vive pela conservação da insignificânciae que é a própria insignificância no governo.

Que espetáculo! A sociedade encontra-se infinitamente dividida nas maisdiversas raças, que se defrontam umas às outras com suas mesquinhas antipa-

Tendência reacionaria nas ciências históricas e jurídicas, que surgiu na Alemanha no fimdo século XVItl. Seu representante mais destacado foi o jesuíta F. K. von Savigny. (N.T.)Savigny, defensor da tese de que o direito reíletía a própria "alma" de um povo - suacultura, seus costumes -, sendo portanto refratário a qualquer reformulação do direitoorientada pelos princípios rationalistas, foi professor de Maxx na Universidade de Berlimentre 1836 e 1837, e o influenciou no que tange ao método de estudo, já que era umaprerrogativa da Escola Histórica o estudo exegético dos textos e documentos relaciona-dos ao seu objeto de investigação. Entretanto, muito maior impacto na formação intelec-tual de Marx teve ç» principal adversário de Savigny, Eduaid Gans, um hegeliano detendências progressistas - bastante influenciado por Sakrt-Simon -, que propugnava queas leis deveriam ser «instantemente transformadas, de rao do a acompanharem o própriodesenvolvimento da Ideia. (N. E.TJ.)

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tías, má consciência e grosseira mediocridade; e que precisamente por causa dasua situação ambígua e suspeitosa, são tratadas sem exceção, embora de manei-ras diferentes, como existências apenas toleradas pelos senhores. E vêem-se forçadasa reconhecer e a admitir até mesmo o fato de serem dominadas, governadas epossuídas, como se fosse uma concessão do céu! Do outro lado encontram-se ospróprios governantes, cuja grandeza está em proporção inversa ao seu número!

A crítica que se ocupa deste assunto é crítica num combate corpo a corpo; esemelhante combate não oferece vantagem para saber se o adversário é damesma categoria, se é nobre ou interessante-o que conta é atingi-lo. Trata-se derecusar aos alemães um instante sequer de ilusão e de resignação, A pressãodeve ainda tornar-se mais premente pelo fato de se despertar a consciênciadela e a ignomínia tem ainda de tornar-se mais ignominiosa pelo fato de sertrazida à luz pública. Cada esfera da sociedade alemã deve ser pintada comoa partie honteuse da sociedade alemã; e estas condições sociais petrificadas têmde ser compelidas à dança, fazendo-as ouvir o canto da sua própria melodia.A nação deve aprender a se aterrar por causa de si mesma, de modo a ganharcoragem. Satisfazer-se-á assim uma imperiosa necessidade da nação alemã, eas necessidades das nações são justamente as causas finais da sua satisfação.

Mesmo a respeito das nações modernas, a luta contra o teor limitado dosiatus (juo alemão não carece de interesse; para o alemão, o status quo constituia evidente consumação do ancien regime s o ancien regime é a imperfeição oculta doEstado moderno. A luta contra o presente político dos alemães é a luta contra opassado das nações modernas, que ainda se vêem continuamente importuna-das pelas reminiscências do seu passado. Para as nações modernas, é instru-tivo ver o ancien regime, que na sua história representou uma tragédia, desem-penhar um papel cómico como espectro alemão. O ancien regime teve uma históriatrágica, uma vez que era o poder estabelecido no mundo, ao passo que a liber-dade era uma fantasia pessoal; numa palavra, enquanto acreditou e tinha deacreditar na sua própria legitimidade. Enquanto o ancien regime, como ordemdo mundo existente, lutou contra um mundo que estava precisamente a emer-gir, houve da sua parte um erro histórico, mas não um erro pessoal. O seudeclínio, portanto, foi trágico.

Em contrapartida, o atual regime alemão, que é um anacronismo, umaflagrante contradição de axiomas universalmente aceitos—a nulidade do ancienregime revelada a todo o mundo -, supõe apenas que acredita em si e pede atodo mundo para compartilhar a sua ilusão. Se acreditasse na sua próprianatureza, tentaria ele ocultá-la debaixo da aparênàa. de uma natureza estranhae buscar a salvação na hipocrisia e na sofisticação? O moderno ancien regime éapenas o comediante de uma ordem do mundo cujos heróis reais já estão mortos.A história é sólida e atravessa muitos estados ao conduzir uma formaçãoantiga ao sepulcro. A última fase de uma formação histórico-mundana é acomédia. Os deuses gregos, já mortalmente feridos na tragédia de Esquilo, Pro-meteu acorrentado, tiveram de suportar uma segunda morte, uma morte cómica,

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nos diálogos de Luciario. Por que a história assume tal curso? A fim de que ahumanidade se afaste alegremente do seu passado. Exigimos este rejubilantedestino histórico para os poderes políticos da Alemanha.

Mas, logo que a crítica se ocupa da moderna realidade social e política,elevando-se assim aos problemas humanos autênticos, ela tem ou de sair dostatus quo alemão ou de apreender o seu objeto sob o seu òbjeto. Por exemplo, arelação da indústria, do mundo da riqueza em geral, com o mundo político, éum dos problemas fundamentais dos tempos modernos. De que maneira esteproblema começa a preocupar os alemães? Sob a forma de tarifas protecionistasf

do sistema de proibição, da economia política. O chauvinismo alemão passou doshomens para a matéria, de modo que um belo dia os nossos cavaleiros doalgodão e heróis do ferro se viram, metamorfoseados em patriotas. A soberaniado monopólio dentro do país começou a ser reconhecida desde que se princi-piou a atribuir-lhe a soberania em relação ao exterior. Por conseguinte, na Alema-nha, começa-se com aquilo que já terminou na França e na Inglaterra. A ordemantiga e podre, contra a qual estas nações se revoltam teoricamente e queapenas suportam como se suportara grilhões, é saudada na Alemanha como aaurora de um futuro glorioso que, até agora, a custo ousa mover-se de umateoria astuta5 para uma prática implacável. Enquanto na França e na Inglaterrao problema se põe assim: economia política ou o domínio da sociedade sobre ariqueza, na Alemanha apresenta-se deste modo: economia, nacional ou o domínioáa.propriedade privada sobre a nacionalidade. Portanto, na Inglaterra e na Françatrata-se de abolir o monopólio, que se desenvolveu até às últimas consequên-cias, ao passo que na Alemanha se trata de caminhar para as consequênciasfinais do monopólio. Além, é uma questão de solução; aqui, apenas uma ques-tão de colisão. A partir do exemplo referido podemos ver como os problemasmodernos estão presentes na Alemanha; o exemplo mostra que a nossa histó-ria, tal como o recruta principiante, até agora só teve de fazer exercícios adi-cionais em assuntos históricos velhos e banais.

Se a totalidade do desenvolvimento alemão não fosse além do desenvolvi-mento político alemão, seria impossível que um alemão tivesse mais interessenos problemas contemporâneos do que um russo. Se o indivíduo não é coagidopelas limitações do seu país, ainda menos a nação será libertada pela liberta-ção de um indivíduo. O fato de um cita ter sido um dos filósofos gregos6, nãocapacitou os Citas a dar sequer um passo em direção à cultura grega.

s Ustig, em alemão, astuto. Jogo de palavras com o nome de Pri.ed.rich List (1789-1846):economista e defensor do pioteciorisino, teórico da burguesia ascendente, nos anosanteriores a 1S48 e promotor da união alfandegária (Zolverein), da qual apíoveitava-se,

também, a Prússia, (N.T.)6 Mane refere-se, aqui, a Anacarsis, cita de nascimento, colocado pelos gregos, segundo

Diógenes Laérrio, entre os sete sábios da Grécia. (N.T.)

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Felizmente, nós, alemães, não somos citas.Assim como as nações do mundo antigo viveram a sua pré-história na

imaginação, na mitologia, assim nós, alemães, vivemos a nossa pré-históriano pensamento, na filosofia. Somos os contemporâneos filosóficos da épocaatual, sem sermos os seus contemporâneos históricos. A filosofia alemã consti-tui o prolongamento ideal da história alemã. Consequentemente, ao criticarmos,em vez das oeuvres incomplètes da nossa história real, as oeuvres posthumes danossa história ideal - a filosofia; a nossa crítica está no centro dos problemasacerca dos quais a época atual afirma: that is the auestion. O que para as naçõesavançadas constituí uma ruptura prática em relação às modernas condiçõespolíticas é, na Alemanha, onde tais condições ainda não existem, virtualmen-te um corte Crítico em relação à sua reflexão filosófica.

A filosofia alemã do direito e ao Estado é a única história alemã que está ai paricom a época moderna oficial A nação alemã vê-se, pois, obrigada a ligar a suahistória onírica às condições presentes e a sujeitar à crítica não apenas estascondições existentes, mas também a sua continuação abstraía. O seu futuronão pode restringir-se, nem à negação díreta das suas circunstâncias jurídi-cas e políticas reais, nem à imediata realização das suas circunstâncias jurídicase políticas ideais. Com efeito, a negação direta das suas circunstâncias reais jáexiste nas circunstâncias ideais, enquanto ela quase sobreviveu à realizaçãodas suas circunstâncias ideais na contemplação das nações vizinhas. É comrazão, pois, que a facção política prática na Alemanha exige a negação da filoso-fia. O seu erro não consiste em formular tal exigência, mas em limitar-se a umaexigência que ela não torna, nem pode tornar, eficiente. Supõe que é capaz derealizar esta negação voltando as costas à filosofia, olhando para qualqueroutra parte, e murmurando um punhado de frases triviais e mal humoradas.Devido à sua tacanha maneira de ver, não considera a filosofia como parte darealidade alemã e considera até a filosofia como abaixo do nível da vida práticaalemã e das teorias que a servem. Como ponto de partida exige-se o germe realde vida, mas esquece-se de que o germe real de vida da nação alemã até agorasó brotou no seu crânio. Em suma, é impossível abolir a filosofia sem a realizar.

Erro idêntico foi cometido, mas em sentido oposto, pela ficção teórica que seoriginou na filosofia.

Na presente luta, esta facção viu apenas o combate crítico da filosofia contra omundo alemão. Não considerou que também a filosofia anterior pertence a estemundo e constitui o seu complemento, embora seja apenas um complementoideal. Crítica no que respeita à sua contraparte, não é crítica em relação a siprópria. Tomou como ponto de partida os pressupostos da filosofia; e ou aceitouas conclusões a que a filosofia chegara, ou apresentou como exigências e con-clusões filosóficas imediatas exigências e conclusões que derivou de qualqueroutro campo. Mas as últimas - supondo que sejam legítimas - só podem serconseguidas pela negação da filosofia anterior, isto é, da filosofia como filosofia.Mais adiante forneceremos uma descrição mais pormenorizada desta facção.

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O seu principal defeito pode resumir-se da seguinte maneira: pensou que pode-ria realizar a filosofia sem a abolir.

A crítica da. filosofia alemã do direito e do Estado, que teve a mais lógica,profunda e completa expressão em Hegel, surge ao mesmo tempo como a aná-lise crítica do Estado moderno e da realidade a ele associada e como a negaçãodefinitiva de todas as anteriores formas de consciência na jurisprudência e napolítica, alemã, cuja expressão mais distinta e mais geral, elevada ao nível deciência, é precisamente a. filosofia especulativa do direito. Só a Alemanha poderiaproduzir a filosofia especulativa do direito - este pensamento extravagante eabstraio acerca do Estado moderno, cuja realidade permanece no além (mes-mo se este além fica apenas do outro iado do Reno) -, o representante alemão doEstado moderno, pelo contrário, que não toma em conta o homem real, só foipossível porque e na medida em que o próprio Estado moderno não atribuiimportância ao homem real ou unicamente satisfaz o homem total de maneirailusória. Em política, os alemães pensaram o que as outras nações fizeram. AAlemanha foi a sua consciência teórica. A abstração e a presunção da sua filoso-fia seguia lado a lado com o carátei unilateral e atrofiado da sua realidade. Se,pois, o sffltus auo do sistema político alemão exprime a consumação do anãen regime,o cumprimento do espinho na carne do Estado moderno, o st atus quo da ciênciapolítica alemã exprime a imperfeição ao Estado moderno em si, a degenerescênciada sua carne.

Já como adversário decidido da anterior forma de consciência política ale-mã, a crítica da filosofia especulativa do direito não se orienta em si mesma,mas em tarefas que só podem ser resolvidas por um único meio: a atwidaâeprática.

Surge, então, a questão: pode a Alemanha atingir uma práxis à Ia hauteurdês príncipes, quer dizer, uma revolução que a elevará não só ao nível oficial dasnações modernas, mas ao nível humano, que será o futuro imediato das referi-das nações?

É certo que a arma da crítica não pode substituir a crítica das armas, que opoder material tem de ser derrubado pelo poder material, mas a teoria conver-te-se em força material quando penetra nas massas. A teoria é capaz de seapossar das massas ao demonstrar-se ad hominem, e demonstra-se aã hominem.logo que se toma radical. Ser radical é agarrar as coisas pela raiz. Mas, para ohomem, a raiz é o próprio homem. O que prova foia de toda a dúvida o radica-lismo da teoria alemã, e deste modo a sua energia prática, é o fato de começarpela decidida abolição positiva da religião. A crítica da religião termina com adoutrina de que o homem é o ser s upremo para o homem. Termina, por conseguin-te, com o imperativo categórico âe derrubar Iodas as condições em que o homemsurge como um. ser humilhado, escravizado, abandonado, desprezível - con-dições que dificilmente se exprimirão melhor do que na exclamação de umfrancês, quando da proposta de um imposto sobre cães: "Pobres cães! Já que-rem vos tratar como homens!".

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Mesmo do ponto de vista histórico, a emancipação teórica possui umaimportância especificamente prática para a Alemanha. De fato, o passadorevolucionário da Alemanha é teórico - é a Reforma. Assim como na época arevolução começou no cérebro de um monge, hoje é no cérebro do filósofo que elacomeça.

Sem dúvida, Lutero venceu a servidão pela devoção, mas porque pôs no seulugar a escravidão mediante a convicção. Abalou a fé na autoridade porquerestaurou a autoridade da fé. Transformou os padres em leigos, mudando osleigos em padres. Libertou o homem da religiosidade exterior, fazendo da reli-giosidade a essência mais íntima do homem. Libertou o corpo de seus grilhõesporque com grilhões prendeu o coração.

Mas, embora o protestantismo não fosse a verdadeira solução, pelo menospôs o problema de modo correto. Já não se tratava, portanto, da luta do leigocom o padre fora dele, mas da luta contra o seu próprio padre interior, contra aprópria natureza sacerdotal. E se a metamorfose protestante dos leigos alemãesem padres emancipou os papas-leigos - os príncipes, juntamente com o clero,os privilegiados e os filisteus, a metamorfose filosófica dos alemães eclesiásti-cos em homens emancipará o povo. Mas, assim como a emancipação não seconfinará aos príncipes, também a secularização dos bens não se restringirá àconfiscação da propriedade da Igreja, que foi sobretudo praticada pela Prussiahipócrita. Nesse tempo, a Guerra dos Camponeses, o acontecimento mais ra-dical na história alemã, fracassou por causa da teologia. Hoje, que a teologiasofreu um desastre, o fenómeno menos independente na história alemã - onosso status quo - será abalado pela filosofia. Na véspera da Reforma, a Alema-nha oficial era a servidora mais incondicional de Roma. Na véspera da suarevolução, a Alemanha é servidora incondicional dos que são inferiores aRoma; da Prussia e da Áustria, de fidalgos mesquinhos e de filisteus.

Parece, porém, que uma revolução radical na Alemanha vai se confrontarcom uma grande dificuldade.

As revoluções precisam de um elemento passivo, de uma base material. Ateoria só se realiza num povo na medida em que é a realização das suas neces-sidades. Corresponderá à monstruosa discrepância entre as exigências dopensamento alemão e as respostas da realidade alemã uma discrepância se-melhante entre a sociedade civil e o Estado no interior da própria sociedadecivil? Serão as necessidades teóricas diretamente necessidades práticas? Nãobasta que o pensamento procure realizar-se; a realidade deve igualmente com-pelir ao pensamento.

Mas a Alemanha não atravessou os estágios intermediários da emancipa-ção política ao mesmo tempo em que os povos modernos. Não atingiu aindana prática os estágios que já ultrapassou na teoria. Como poderia a Alemanha,em salto mortale, superar não só as próprias barreiras mas também as dasnações modernas, isto é, as barreiras que na realidade tem de experimentar eatingir como uma emancipação das suas próprias barreiras reais? Uma revo-

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lução radical só pode ser a revolução de necessidades reais, para a qual pare-cem faltar os pressupostos e o campo de cultivo.

Mas se a Alemanha acompanhou o desenvolvimento das nações modernasapenas através da atívídade abstrata do pensamento, sem tomar parte ativa naslutas reais deste desenvolvimento, experimentou também as dores deste desen-volvimento sem participar nos seus prazeres e satisfações parciais. A atívidadeabstrata, por um lado, tem a sua contrapartida no sofrimento abstrato, por outro.E um belo dia, o alemão encontrar-se-á ao nível da decadência europeia, antesde alguma vez ter atingido o nível da emancipação europeia. Será comparável aum servo do fetiche que sofre das doenças do cristianismo.

Se examinarmos agora os governos alemães, veremos que devido às condi-ções da época, a situação da Alemanha, o ponto de vista da cultura alemã e,por último, o seu próprio instinto afortunado, tudo os impeLe a combinar asdeficiências civilizadas do mundo político moderno (de cujas vantagens não des-frutamos) com. as deficiências bárbaras do ancien regime (de que fruímos na quan-tidade devida); assim, a Alemanha tem de participar cada vez mais, se não nasensatez, pelo menos na insensatez dos sistemas políticos que ultrapassam oseu status <j«o. Haverá, por exemplo, algum país no mundo inteiro que, corno achamada Alemanha constitucional, participe de todas as ilusões do regimeconstitucional sem compartilhar das suas realidades? E não terá sido, pornecessidade, um governo alemão que teve a ideia de combinar os tormentosfranceses de setembro7, que pressupõem a liberdade de Imprensa? Assim comoos deuses de todas as nações se encontravam no Panteão romano, também ospecados de todas as formas de Estado se encontrarão no Santo Império RomanoGermânico. Que semelhante ecletismo atingirá um grau sem precedentes égarantido sobretudo pela glutonaria político-esíética de um rei alemão* que de-termina desempenhar todas as funções da realeza - feudal ou buiocrática,absoluta ou constitucional, autocrática ou democrática -, se não na pessoa dopovo, pelo menos na sua própria pessoa, e se não para o povo, ao menos parasi mesmo. A Alemanha, como deficiência da atual política cortstitu.íáa em sistema, nãoserá capaz de demolir as barreiras alemãs específica s sem demolir as barreirasgerais da política atual.

7 Tomando como pretexto o atentado cometido contra o rei Luís Felipe a 28 de julho de1835, seu -ministro Thiers apresentou no mês seguinte, na Assembleia, um projeto de leiessencialmente reacionário, projeto que entrou em vigor em setembro do mesmo ano.Essas leis foram chamadas "leis de setembro", A justiça podia fazer juízos sumários emcaso de rebelião e recorrer a juizes, escolhidos por ela, adobando, ao mesmo tempo,severas medidas contra a imprensa. Entre estas últimas figuravam o depósito em dinhei-ro por parte dos jornais, o encarceramento e altas multas por ataques contra a proprieda-de privada e contra o sistema estatal vigente. (N.T.)

8 Trafca-se de Frederico Guilherme rV.(N.E.B.)

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O sonho utópico da Alemanha não é a revolução radical, a emancipaçãohumana universal, mas a revolução parcial/ meramente política, que deixa de péos pilares do edifício. Qual a base de uma revolução parcial, meramente polí-tica? Apenas esta: uma seção da sociedade civil emancipa-se e alcança o domíniouniversal: uma determinada classe empreende/ a partir da sua situação particu-lar, uma emancipação gera] da situação. Tal classe emancipa a sociedade comoum todo, mas só no caso de a totalidade da sociedade se encontrar na mesmasituação que esta classe; por exemplo, se possuir ou facilmente puder adquirirdinheiro ou cultura.

Nenhuma classe da sociedade civil consegue desempenhar este papel anão ser que possa despertar, em si e nas massas, um momento de entusiasmoem que se associe e misture com a sociedade em liberdade, se identifique comela e seja sentida e reconhecida como a representante geral da referida socieda-de. Os seus objetivos e interesses devem verdadeiramente ser os objetivos e osinteresses da própria sociedade, da qual se torna de fato a cabeça e o coraçãosocial. Só em nome dos interesses gerais da sociedade é que uma classe parti-cular pode reivindicar a supremacia geral. Para alcançar esta posiçãolibertadora e a direção política de todas as esferas da sociedade, não bastam aenergia e a consciência revolucionárias. Para que a revolução de um povo e aemancipação de uma classe particular da sociedade civil coincidam, para que umestamento seja reconhecido como o estamento de toda a sociedade, outra clas-se tem de concentrar em si todos os males da sociedade, um estamento particu-lar tem de ser o estamento do repúdio geral, a incorporação dos limites gerais.Uma esfera social particular terá de olhar-se como o crime notório de toda asociedade, a fim de que a libertação de semelhante esfera surja como umaautolibertação geral. Para que um estamento seja estamento libertador parexcelhnce, é necessário que outro estamento se revele abertamente como oestamento da opressão. O significado negativo e universal da nobreza e doclero francês produziu o significado positivo e geral da burguesia, a classe quejunto deles se encontrava e que a eles se opôs.

Mas, na Alemanha, todas as classes carecem da lógica, do rigor, da cora-gem e da intransigência que delas fariam o representante negativo da socieda-de. Mais: falta ainda em todos os estamentos a grandeza de alma que, por ummomento apenas, os identificaria com a alma popular, a gerdalidade que ins-tiga a força material ao poder político, a audácia revolucionária que arremessaao adversário a frase provocadora: Nada sou e serei tudo, A essência damoralidade e da honra alemãs, tanto nas classes como nos indivíduos, é umegoísmo modesto que ostenta, e permite que os outros exibam, a sua própriamesquinhez. A relação entre as diferentes esferas da sociedade alemã não é,portanto, dramática, mas épica. Cada uma destas esferas começa por saber desi e por estabelecer-se ao lado das outras, não a partir do momento em que éoprimida, mas desde o momento em que as condições da época, sem qualqueração da sua parte, originam uma nova esfera que ela por sua vez pode oprimir.

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Mesmo o sentimento de si moral da classe média alemã só tem como base a cons-ciência de ser o representante da mediocridade mesquinha e limitada de todasas outras classes. Por conseguinte, não são apenas os reis alemães que sobemao trono mal-à-propos. Cada esfera da sociedade civil sofre uma derrota antesde alcançar a vitória; levanta a sua própria barreira antes dê ter destruído abarreira que se lhe opõe; exige a estreiteza das suas vistas antes de ostentar asua generosidade e assim todas as oportunidades de desempenhar um papelimportante desapareceram antes de propriamente terem existido, e cada cias-se, no preciso momento em que inicia a luta contra a classe superior, ficaenvolvida numa luta contra a classe inferior. Por esta razão, os príncipes en-contram-se em conflito com o monarca, a burocracia com a nobreza, a burgue-sia com todos eles,^nquanto o proletariado já está principiando a !uta com aburguesia. A classe média dificilmente ousa conceber a ideia da emancipaçãodo próprio ponto de vista antes do desenvolvimento das condições sociais, e oprogresso da teoria política mostra que este ponto de vista já é antiquado ou,pelo menos, problemático.

Na França, basta ser qualquer coisa para desejar ser tudo. Na Alemanha,ninguém tem o direito de ser qualquer coisa sem renunciar a tudo. Na França,a emancipação parcial é o fundamento para a completa emancipação. NaAlemanha, a emancipação total constitui uma condiíto sine qua non para qual-quer emancipação parcial. Na França é a realidade, na Alemanha é a impossi-bilidade de uma emancipação progressiva que deve dar origem à completaliberdade. Na França, toda a classe do povo é politicamente idealista e se consi-dera antes de tudo, não como classe particular, mas como representante dasnecessidades gerais da sociedade. Conseqúentemente,. o papel de libertadorpode passar sucessivamente num movimento dramático para as diferentesclasses do povo francês, até que por fim alcança a classe que realiza a liberda-de social; não já pressupondo certas condições externas ao homem, criadas noentanto pela sociedade humana, mas organizando todas as condições da exis-tência humana ma base da liberdade social. Na Alemanha, pelo contrário,onde a vida prática é tão pouco intelectual quanto a vida intelectual é prática,nenhuma classe da sociedade civil sente a necessidade ou tem a capacidadede conseguir uma emancipação geral, até que a isso é forçada pela situaçãoimediata, pela necessidade -material e pelos próprios grilhões.

Onde existe então, na Alemanha, a possibilidade positiva de emancipação?Eis a nossa resposta: Na formação de uma classe que tenha cadeias radicais, de

uma classe na sociedade civil que não seja uma classe da sociedade civil, deum estamento que seja a dissolução de todos os estamentos, de uma esfera quepossua caráter universal porque os seus sofrimentos são universais e que nãoexigeuma reparação particular porque o mal que lhe é feito não é um mcd particu-lar, mas o mal em geral, que já não possa exigir um tftuk> histórico, mas apenaso título humano; de uma esfera que não se oponha a consequências particula-res, mas que se oponha totalmente aos pressupostos do sistema político ale-

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mão; por fim, de uma esfera que não pode emancipar-se a si mesma nem seemancipar de todas as outras esferas da sociedade sem emancipá-las a todas -o que é, em suma, aperda total da humanidade/ portanto, só pode redimir-se asi mesma por uma redenção total do homem. A dissolução da sociedade, comoclasse particular, é o proletariado.

Na Alemanha, o proletariado está apenas começando a se formar, comoresultado do movimento industrial; pois o que constitui o proletariado não é apobreza naturalmente existente, mas a pobreza produzida artificialmente, não é amassa do povo mecanicamente oprimida pelo peso da sociedade, mas a mas-sa que provém da desintegração aguda da sociedade e, acima de tudo, da desin-tegração da classe média. Desnecessário se toma dizer, contudo, que os núme-ros do proletariado foram também engrossados pelas vítimas da pobrezanatural e da servidão germano-cristã.

Quando o proletariado anuncia a dissolução da ordem social existente apenasdeclara o mistério da sua própria existência, uma vez que é a efetiva dissoluçãodesta ordem. Quando o proletariado exige a negação da propriedade privada,apenas estabelece como princípio da sociedade o que a sociedade já elevara aprincípio do proletariado e o que este já involuntariamente encarna enquantoresultado negativo da sociedade. O proletário encontra-se assim, em relaçãoao mundo que está ainda a surgir, no mesmo direito em que o rei alemão estárelativamente ao mundo já existente, quando chama ao povo o seu povo ou aum cavalo o seu cavalo. Ao declarar o povo como sua propriedade privada, orei afirma simplesmente que quem detém a propriedade privada é rei.

Assim como a filosofia encontra as armas materiais no proletariado, assimo proletariado tem as suas armas intelectuais na filosofia. E logo que o relâmpa-go do pensamento tenha penetrado profundamente no solo virgem do povo,os alemães emancipar-se-ão e íomar-se-ão homens.

Façamos agora a síntese dos resultados: A emancipação dos alemães só épossível na prática se for adotado o ponto de vista da teoria, segundo a qual ohomem é para o homem o ser supremo. A Alemanha não conseguirá emanci-par-se da Idade Média, a não ser que se emancipe ao mesmo tempo das vitóriasparciais sobre a Idade Média. Na Alemanha, nenhum tipo de servidão seráabolido, se toda a servidão não for destruída. A Alemanha, que é profunda/ nãopode fazer uma revolução sem revolucionar a partir do fundamento. A emancipa-ção do alemão é a emancipação do homem. A filosofia é a cabeça desta emancipaçãoe o proletariado é o seu coração. A filosofia não pode realizar-se sem a supra-surtção do proletariado, o proletariado não pode supra-sumir-se sem a reali-zação da filosofia.

Quando forem cumpridas todas as condições internas, o dia da ressurreiçãoda Alemanha, será anunciado com o cantar do galo gaulês.

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ÍNDICE DE NOMES CITADOS

BURIDAN, Jean (c. 1300-1358), Filósofo escolástico francês, discípulo de Guilherme de Occam,que analisou o princípio da causalidade e revisou a mecânica aristotélica. p. 109 (cf.

nota n° 43)

HEGEI., Ceorg Wilhelm Friedrich (1770-1831). Filósofo alemão; último dos grandes criadoresde sistemas filosóficos dos tempos modernos, lançou as bases das principais tendênciasposteriores. Hegel foi o maior expoente do "idealismo alemão", uma decorrência dafilosofia kantiana - surgida em oposição a ela - que começou com Fidtte e Schelling;esses dois pensadores trataram a realidade como se fosse baseada num só princípio, afim de superar o dualismo existente entre sujeito e objeto - estabelecido por Kant -,segundo o qual apenas era possível conhecer a aparência fenomenológica das coisase nâa sua essência. Para Hegel, o fundamento supremo da realidade não podia ser o"absoluto" de Schelling nem o *eu" de Fichle e sim a "ideia", que se desenvolve numalinha de estrita necessidade; a dinâmica dessa necessidade não teria sua lógica deter-minada pelos princípios de identidade e contradição, mas sim pela "diaiética". p. 27-141, 145-56

(ANO. Deus romano, orotetor da casa e mais tafde deus do princípio; é sempre representadocom duas cabeças olhando para lados opostos, p. 104

LUÍS XIV (1630-171 S). Citado inòiretamente através da frase i'éfat c'esf mói <*O Estado soueu). Rei da França de 1643, depois da morte do pai, a 1715; cognominado o Rei Sol;símbolo do absolutismo, seu reinado representou um dos momentos culminantes dahistória do país. p. 47

MARIA. Na Bíblia, filha de santa Ana e Joaquim e mãe de Jesus, venerada pelos cristãos;também é conhecida como Nossa Senhora, santa Maria, Madona e Virgem Maria. p. 53

MONTESQUIELJ, barão de (1689-1755). Charles-Louis de Secondal, pensador e jurista fran-cês, um dos maiores prosadores da língua francesa; pensador influente nas áreas dafilosofia da história e do direito constitucional, autor de O espírito das teis e As cartaspersas, entre outras obras consideradas clássicas. Com base em suas obras, os escritoresfranceses se tornaram mais que literatos e passararn a discutir os assuntos públicos e ainfluir nos destinos do país. p. 28

SCHILLER, Friedricb vor <1759-1805). Citaòo indiretamente através da referência à SanlaCasa. Escritor rornânlico-i de alista alemão; junto com Goethe, representante doClassicismo de Weinrrar em Sua obra tardia, p. 36 fcf. nola n° 8)

SHAKESPEARE, William (1564-1616). Citado indiretamente duas vezes, a primeira delasquando Marx diz "eis a questiort', parodíanto o tfiaf is the queftiofi do "ser ou não ser"

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de Hamlet; a segunda quando fala da comédia Sonho de uma noite de verão, encenadaantes de 1600. Escritor inglês; poeta nacional da Inglaterra, p. 49, 104

MAR/vIELO. Personagem leonino de Shakespeare na peça Sonho de uma noite de verão. p. 104(cf. nota n" 40)

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CRONOLOGIA RESUMIDA

1818

i 820

i 824

1830

Karl Marx

Em Trier (capital da provínciaalemã do Reno), nasce Karl Marx(5 de maio), o segundo de oitofilhos de Heinrich Marx e deEnriqueta PrEssburg. Trier naépoca era influenciada peloliberalismo revolucionáriofrancês e pela reacão ao AmigoRegime, vinda da Prússia.

Friedrích Engels

Nasce Friedrich Engets(28 de novembro)/ primeirodo: nove filhos de Friediichtngels e Elizabeth FranziskaMauritiavan Haai, em Barmen,Alemanha. Cresce no seio deuma família de industriaisreligiosa e conservadora.

O pai de Marx, nascido Hirschel,advogado e conselheiro de Justiça,É obrigado a abandonar Djudaísmo por motivos profissionaise políticos (os Judeus estavamproibidos de ocupar cargospúblicos na Renânia). Marx entrapara o Ginásio de Trier (outubro).

Inicia seus estudos no LiceuFriedrich Wílhelm, em Trier.

Fatos históricos

Sirrtôn Boíívar declaraa Venezuelaindependenteda Espanha.

George IV se tornarei da Ingiaterra,pondo fim à Regência.Insurreiçãocansti tucionaí tstaem Portugal.

Simón Br>UVar se tornachefe do Executivo doPeru.

1831

Estourarn revoluçõesern diversos pafseseuropeus. A populaçãode Pa ris insurge-secontra a promulgaçãode leis que dissolvemâ Câmara e suprimema liberdade deimprensa. Luís Filipeassume o poder.

Morre Hêgel.

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