CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

100
GRADUAÇÃO 2013.1 CRIME E SOCIEDADE AUTOR: THIAGO BOTTINO COLABORAÇÃO: PALOMA CANECA E ARTHUR LARDOSA DOS SANTOS

Transcript of CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

Page 1: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

GRADUAÇÃO 2013.1

CRIME ESOCIEDADE

AUTOR: THIAGO BOTTINO

COLABORAÇÃO: PALOMA CANECA E ARTHUR LARDOSA DOS SANTOS

Page 2: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

SumárioCrime e Sociedade

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................... 3

BLOCO 1 — DIREITO PENAL ................................................................................................................................. 11Aulas 01 e 02 — Princípio da Legalidade (taxatividade, reserva legal, vedação de analogia) .......... 11Aula 03 — Princípio da legalidade (anterioridade) ....................................................................... 31Aula 04 — Princípio da legalidade (insignifi cância) ..................................................................... 52

BLOCO 2 — DIREITO PROCESSUAL PENAL ............................................................................................................... 73Aula 05 — Princípio do devido processo legal (vedação de Prova ilícita) ...................................... 73Aula 6 — Princípio do devido processo legal (presunção de inocência) ........................................ 84Aula 7 — Princípio do devido processo legal (vedação de autoincriminação) ............................... 89Aulas 10, 11, 12, 13 e 14 — Preparação para o Júri Simulado...................................................... 96

Page 3: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 3

INTRODUÇÃO

“Se, de lado, a ação criminosa constitui, de fato, ao menos como regra, o mais grave ataque que o indivíduo desfere contra os bens so-ciais máximos tutelados pelo Estado, por outro lado, a sanção criminal, também por natureza, dá corpo à mais aguda e penetrante intervenção do Estado na esfera individual”

(Francesco C. Palazzo. “Valores Constitucionais e Direito Penal”. Porto Alegre: SAFB, 1989, p. 16)

Oscar Vilhena Vieira utiliza uma imagem originalmente citada por Jon Elster — a partir da concepção fabulosa de Homero na epopéia “Odisséia” — para defi nir o papel que a Constituição desempenha num Estado Demo-crático de Direito.

Tendo que atravessar o mar em um ponto em que habitavam sereias (seres cujo canto místico enfeitiçava os homens para depois matá-los), Ulisses pe-diu a seus homens que o amarrassem ao mastro do navio, tapassem seus próprios ouvidos com cera e não obedecessem a nenhuma ordem sua até que as sereias tivessem desaparecido. Desse modo, embora tenha perdido o dis-cernimento, desejando atirar-se ao mar, Ulisses não sucumbiu ao encanta-mento, o que seria fatídico. “Neste mesmo sentido, as constituições democráticas atuariam como mecanismos de auto-limitação, ou precomprometimento, adota-dos pela soberania popular para se proteger de suas paixões e fraquezas”1.

Esse arranjo teórico entre democracia e constituição implica na limitação da soberania popular dos membros de uma coletividade e também de suas futuras gerações. Em outras palavras, o sistema democrático de tomada de decisões pode ser limitado pela substância da decisão (com exceção daquelas decisões que afetem o próprio procedimento democrático de escolha).

No campo do Direito Penal, são as garantias e os direitos fundamentais constantes no art. 5º da Constituição de 1988 que constituem os fundamen-tos de um sistema punitivo democrático, ou seja, aquelas regras e princípios que não podem ser suprimidos da estrutura do sistema punitivo (sob pena de a legitimidade do Estado para proibir, processar e punir dissociar-se do paradigma democrático) e que vinculam a produção legislativa na área penal.

A primeira preocupação na elaboração de um sistema punitivo democrá-tico é assegurar “o máximo grau de racionalidade e confi abilidade do juízo e, portanto, de limitação do poder punitivo e de tutela da pessoa contra a arbitra-riedade”2.

A justifi cativa para o controle do Estado decorre da constatação de que o Estado possui um poder incontrastável, que o exercício desse poder pode ocorrer de modo impróprio e que, por ser o próprio Estado o responsável por

Page 4: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 4

elaborar a legislação, conduzir o processo e impor as penas, deve haver um li-mite previamente estabelecido para que essa atividade seja bem desenvolvida.

Se o Estado de Direito surge vinculado à noção de garantias (vedação de punir, prender, perseguir etc., sem que estejam presentes as condições esta-belecidas em lei), tais direitos adquirem o status de invioláveis. O Estado de Direito, campo do Direito Penal Processual Penal, é entendido como um sistema de limites substanciais que deve ser observado para a salvaguarda das garantias fundamentais.

Partindo dessa premissa, podemos entender melhor as relações entre o Direito Penal, o Direito Constitucional, a Teoria do Direito e a Teoria da Democracia.

I — APRESENTAÇÃO DO CURSO

A disciplina Crime e Sociedade constitui o primeiro contato que o estu-dante terá com o Direito Penal e Processual Penal no ciclo de estudos dessa área do direito.

A concepção do curso de Direito Penal da FGV Direito Rio espelha-se na idealização original de Roberto Mangabeira Unger:

“O direito penal deve ser dividido em três partes. A primeira parte estuda-ria os conceitos básicos do direito e o pequeno número de regras que perpas-sam toda a tipologia de crimes. A segunda parte trataria das normas e práticas usadas para controlar a violência comum, sobretudo aquela que se difunde entre as partes mais pobres e mais desorganizadas da população. É um estudo que tem de abranger a discussão da polícia, das prisões e da natureza e efeitos do encarceramento episódico e quase arbitrário que caracteriza o sistema bra-sileiro. Na terceira parte do curso, o tema seria os crimes típicos dos endi-nheirados (ou aspirantes a tal condição), não só os crimes reconhecidos de colarinho branco mas também aqueles que resultam da violação do direito de proteção ao consumidor e de repressão ao abuso do poder econômico” 3

A partir dessa concepção, o ciclo de estudos de direito penal da FGV Di-reito Rio é dividido em quatro disciplinas (Crime e Sociedade, Direito Penal Geral, Penas e Medidas Alternativas e Direito Penal Econômico), ao longo dos dois primeiros anos da formação do aluno. Nesta primeira parte do ciclo (disciplinas do primeiro ano) serão abordados os conceitos fundamentais do direito penal, noções de processo penal e criminologia. Ainda serão aborda-das as questões referentes à adequação do sistema penal ao Estado Demo-crático de Direito. No segundo ano do curso serão estudados as penas e os crimes em espécie, divididos entre os crimes clássicos e econômicos.

O objetivo da disciplina Crime e Sociedade é refl etir sobre as funções de criminalizar condutas, processar os indivíduos e impor penas. Essa atividade

Page 5: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 5

é exclusiva do Estado, mas para ser legítima deve observar limites e para iden-tifi car esses critérios serão propostas as seguintes questões: Existe justiça na natureza ou se trata de uma criação humana? A justiça é um conceito moral ou jurídico? Quem deve ser encarregado da execução da justiça, o Estado ou o indivíduo? Quais as regras que devem ser observadas quando se constrói um sistema penal?

A partir dessas perguntas, e especialmente a partir da última delas, se-guem-se outros questionamentos: “por que”, “como” e “quando” criminalizar comportamentos; “por que”, “como” e “quando” processar pessoas; “por que”, “como” e “quando” punir indivíduos. Ao buscar respostas para tais questões, os alunos refl etem sobre os princípios fundamentais que orientam o Direito Penal e Processual Penal.

Essa refl exão será estimulada também a partir da comparação entre o ar-ranjo teórico constitucional e o funcionamento efetivo do sistema. Nesse ponto, destaca-se a utilização de casos paradigmáticos como forma de análise do sistema ideal e do sistema efetivo.

No âmbito do Direito Penal, são estudados temas como segurança jurí-dica, coerência legislativa e amplitude dos poderes do juiz na aplicação da lei penal. Na seara do Direito Processual Penal, destacam-se os temas como construção da verdade, confl ito entre garantias fundamentais e devido pro-cesso legal.

Por fi m, serão estudados também alguns conceitos de política criminal — especialmente a relação existente entre o sistema penal, a democracia e o Estado de Direito. A fi nalidade é questionar se existe um modelo de sistema punitivo que se coadune com os postulados básicos do Estado Democrático de Direito, criando um “modelo ideal” de sistema punitivo: quanto mais próximo desse modelo ideal estiverem as leis e as práticas policiais e judiciais, maior o grau de democracia e segurança jurídica de um determinado sistema punitivo.

Transversalmente às discussões acima, surgem temas como a  fi ltragem constitucional no Direito Penal e Processual Penal; o recurso aos postulados da ponderação, proporcionalidade e razoabilidade na construção de decisões em matéria penal; e, a utilização de argumentos de “emergência” e “exceção” como fundamento de sentenças criminais. Todos esses temas conectam o Di-reito Penal com o Direito Constitucional, a Teoria do Direito e a Teoria da Democracia, reforçando uma abordagem interdisciplinar da matéria.

II — METODOLOGIA DAS AULAS

Cada aula terá como ponto de partida um ou mais casos concretos (casos julgados pelo Supremo Tribunal Federal ou pelas cortes constitucionais de

Page 6: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 6

outros países), cuja análise será objeto de debates em sala de aula. Os alunos deverão elaborar, para cada caso estudado, uma fi cha de análise, contendo as informações principais do caso, a saber:

A pretensão é suscitar diferentes possibilidades de aplicação do direito ao caso concreto. Essa metodologia aposta na capacidade do aluno de graduação da FGV Direito Rio de discutir, com profundidade, os temas mais relevantes do direito penal e processual penal da atualidade.

O uso de casos concretos que possuem ligação com situações cotidianas traz a realidade da aplicação do direito para dentro da sala de aula e estimula a participação do aluno no processo de aprendizado, criando-se um ambiente de interatividade entre aluno e professor e aprimorando sua capacidade de raciocínio lógico-jurídico. O objetivo dessa metodologia é habilitar o aluno a identifi car problemas e resolvê-los de forma pragmática, sem deixar de se posicionar criticamente.

A fi m de orientar o aluno no estudo do caso concreto, cada caso estudado deverá ser examinado e organizado segundo os critérios defi nidos na tabela abaixo:

FICHA DE ANÁLISE

1. Identifi cação do caso

Qual o tribunal que prolatou a decisão e qual o ór-gão desse tribunal; qual o julgador relator; qual o re-sultado da votação (votos vencidos, votos concorren-tes, votos majoritários); qual a data do julgamento.

2. Relato da situação processual

Se houve decisões judiciais anteriores e o que de-cidiram; quais as partes que estão em litígio; elaborar um resumo do confl ito em discussão com foco nas etapas processuais anteriores.

3. Pretensão das partesResumo dos argumentos indicando qual a solu-

ção que cada parte pleiteia no caso concreto.

4. Classifi cação das normas

Identifi car e classifi car as normas jurídicas em dis-cussão, para saber o regime jurídico aplicável e apon-tar os eventuais confl itos normativos.

5. Questões jurídicas em discussão

Identifi car a questão jurídica que está em discus-são (ou se for mais de uma, fazer isso com todas). Não apenas o confl ito normativo, mas as diferentes ques-tões jurídicas que decorrem de cada solução possível do caso.

6. Decisão do tribunal e sua motivação

Expor a decisão (parte dispositiva) em comento e seus fundamentos.

Page 7: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 7

III — AVALIAÇÃO

A avaliação será realizada a partir de duas notas (N1 e N2).A N1 será composta por duas atividades. A primeira atividade, com

valor de 3,0 pontos, consiste na participação em sala de aula. Os alunos serão chamados a apresentar, por escrito e oralmente, as fi chas de análise dos casos em debate, bem como comentar a apresentação dos colegas. A cada aula, um ou mais alunos poderão ser chamados para relatarem ou comentarem o caso.

Essa avaliação pretende estimular que o aluno esteja preparado para parti-cipar de todas as aulas e que contribua para o desenvolvimento das atividades. Participações inoportunas ou defi cientes não serão pontuadas positivamente. Da mesma forma, o aluno que não apresentar a fi cha de caso das aulas no dia da aula não receberá nenhuma pontuação.

No caso da apresentação oral do caso, o aluno deverá apontar as principais questões decorrentes do caso concreto ou do texto relacionado com os temas jurídicos tratados. Os casos concretos são julgamentos ocorridos no Supremo Tribunal Federal ou em Cortes Supremas de outros países. As discussões gera-das a partir das situações concretas retiradas dos cases são enriquecidas com os fundamentos doutrinários fornecidos pelos textos de apoio e pela exposição do professor.

A segunda atividade com valor de 7,0 pontos, consiste em uma prova es-crita, dissertativa e individual, que será aplicada ao fi nal do curso.

A N2 será composta também por duas atividades. A primeira delas, com valor de 3,0 pontos, consiste em um trabalho escrito, feito em grupo, baseado no livro de leitura obrigatória “O caso dos denunciantes invejosos” de Lon Fuller (São Paulo: Editora Revista dos Tribunais).

O trabalho deverá apresentar um breve relato sobre as questões jurídicas e fi losófi cas contidas no livro, seguida da apresentação de um texto argumen-tativo sobre as seguintes questões: a) Se deve haver punição aos denunciantes invejosos; b) Por que punir essas pessoas; c) Como punir essas pessoas. Essa opinião deve ser construída com argumentos próprios e deve refutar os ar-gumentos opostos constantes do livro. O trabalho deverá ter mínimo de 5 laudas impressas (fonte Times New Roman tamanho 12; espaçamento 1,5; margens superior e inferior de 2,5 cm e laterais de 3,0 cm).

A maior riqueza desses trabalhos é, sem dúvida, a diversidade de percep-ções do problema e das conseqüências de cada solução. O objetivo não é ensinar uma “forma correta” de realizar justiça, mas justamente demonstrar a multiplicidade de soluções “justas” (conforme as percepções pessoais dos alunos) para o mesmo caso, e a necessidade de se encontrar a solução mais adequada.

Serão utilizados os seguintes critérios para a correção do trabalho: formais (capa com nome dos integrantes do grupo; respeito ao tamanho 4 a 6 pági-

Page 8: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 8

nas; entrega no prazo; formatação) e substanciais (utilização dos conceitos trabalhados durante o curso; coerência, concisão e objetividade).

A segunda atividade, com valor de 6,0 pontos é a atuação dos alunos nos júris simulados com base no livro de leitura obrigatória. Serão três dias de júri nos quais serão feitas simulações com grupos de alunos funcionando como acusação ou defesa. Serão utilizados os seguintes critérios para a cor-reção do trabalho: formais (respeito ao tempo total e individual; eloqüência) e substanciais (argumentação fundamentada; quantidade e qualidade das te-ses apresentadas; clareza/foco/escolha nos fundamentos da acusação; clareza/foco/capacidade de rebater o argumento da acusação).

Os alunos que se sobressaírem nessa 1ª etapa poderão receber até 1,0 pon-to extra, caso sejam selecionados para da fi nal do júri simulado. A participa-ção no júri simulado é limitada a 10 alunos (podendo ser menos), escolhidos dentre aqueles que tenham apresentado melhor rendimento nas etapas an-teriores. Até cinco alunos deverão defender a condenação criminal e outros tantos deverão defender a absolvição. O corpo de jurados será composto por professores, alunos de outros períodos e convidados externos. Os alunos que participarem dessa fase fi nal recebem 0,5 ponto, e os que ganharem a etapa fi nal recebem 1,0 ponto.

IV — BIBLIOGRAFIA

A leitura obrigatória está limitada aos textos da apostila, aos casos que se-rão debatidos e ao livro que serve de base tanto para o trabalho escrito quanto para o júri simulado. A relação abaixo é uma bibliografi a complementar, des-tinada àqueles que desejarem aprofundar seu conhecimento sobre os temas trabalhados em sala.

• ALEXY, Robert: Derecho injusto, retroactividad y principio de legalidad penal. La doctrina del Tribunal Constitucional Fede-ral alemán sobre los homicidios cometidos por los centinelas del Muro de Berlin. In DOXA Cadernos de fi losofi a do direito nº 23, Alicante: Universidade de Alicante, 2000).

• AMARAL, Th iago Bottino Do: Notas para um sistema punitivo de-mocrático. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 385, p. 185-201, 2006.

• DERSHOWITZ, Alan: Th e Torture Warrant. In New York Law School Law Review, vol. 48, issue 2, 2004.

• GARAPON, Antoine: Crimes que não se podem punir nem perdo-ar. Lisboa: Instituto Piaget, 2002, páginas 161/191.

Page 9: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 9

• JESSBERGER, Florian: Bad torture — Good torture?. In Journal of International Criminal Justice, vol. 3, Oxford: Oxford University Press, 2005

• ROXIN, Claus; ARZT, Gunther; TIEDEMANN, Klaus: Introdu-ção ao Direito Penal e ao Processual Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

V — PLANO DE ENSINO

As aulas da disciplina Crime e Sociedade ocorrerão sempre às 3as e 5as feiras, no horário de 14:00 às 15:40. A aula inaugural será no dia 25 de abril, ocasião em que serão apresentados o curso, a metodologia das aulas, a biblio-grafi a e os critérios de avaliação.

A tabela de aulas abaixo permitirá que o aluno se prepare adequadamente para cada caso que será tratado em sala de aula, antecipando as leituras que servirão de base às discussões em sala de aula.

BLOCO 1 — DIREITO PENAL

5ª Feira — 25/abrilApresentação do cursoAula 01 — Tema: Princípio da legalidade em matéria penal (taxatividade)Caso: Habeas Corpus nº 70.389, do Supremo Tribunal Federal.

3ª Feira — 30/abrilAula 02 — Tema: Princípio da legalidade em matéria penal (reserva legal e vedação de analogia)Caso: Habeas Corpus nº 70.389, do Supremo Tribunal Federal.

5ª Feira — 02/maio Aula 03 — Tema: Princípio da legalidade em matéria penal (anterioridade)Caso: Recurso de Habeas Corpus nº 81.453, do Supremo Tribunal Federal.

3ª Feira — 07/maioAula 04 — Tema: Princípio da legalidade em matéria penal (insignifi cância)Caso: Habeas Corpus nº 84.412, do Supremo Tribunal Federal.

BLOCO 2 — DIREITO PROCESSUAL PENAL

5ª Feira — 09/maioAula 05 — Tema: Princípio da vedação de prova ilícitaCaso: Habeas Corpus nº 5.100, da Suprema Corte de Israel

3ª feira — 14/maioAula 06 — Tema: Princípio da presunção de inocênciaCaso: Doze homens e uma sentença

5ª feira — 16/maioAula 07 — Tema: Princípio da vedação de autoincriminaçãoCaso: Lei Seca

Page 10: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 10

BLOCO 3 — SISTEMA PENAL E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

3ª Feira — 21/maio Aula 08 —Tema: Ação Penal 470, STF (caso Mensalão)

5ª Feira — 23/maio Aula 09 — Tema: Analise Econômica do Direito Penal

3ª Feira — 28/maio Aula 10 — Visita externa a um julgamento do Tribunal do Júri.

3ª Feira — 04/junho Aula 11 — Entrega do memorial escrito. 1ª RODADA DO JÚRI SIMULADO

5ª feira — 06/junho Aula 12 — 2ª RODADA DO JÚRI SIMULADO

3ª feira — 11/junho Aula 13 — 3ª RODADA DO JÚRI SIMULADO

5ª feira — 13/junho Aula 14 — JÚRI SIMULADO — FINAL

3ª feira — 18/junho Aula 15 — Prova escrita (P2)

3ª feira — 25/junho Aula 16 — Prova escrita (2ª chamada)

3ª feira — 02/julho Aula 15 — Prova oral (prova fi nal)

Page 11: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 11

BLOCO 1 — DIREITO PENAL

AULAS 01 E 02 — PRINCÍPIO DA LEGALIDADE (TAXATIVIDADE, RESERVA LEGAL, VEDAÇÃO DE ANALOGIA)

I — INTRODUÇÃO

O princípio da legalidade está previsto no art. 5º, inciso XXXIX da Cons-tituição Federal: “Não há crime sem lei anterior que o defi na, nem pena sem prévia cominação legal”. Esta disposição também está prevista de modo seme-lhante no art. 1º do Código Penal, e neste sentido, é o princípio mais impor-tante desta área do direito, pois a lei é a única fonte que pode ser utilizada para proibir ou impor condutas sob ameaça de sanção. Em outras palavras, é preciso uma lei que descreva uma conduta como proibida e associe uma pena para aqueles que realizarem a conduta proibida.

Existem outros princípios que decorrem da legalidade, tais como o princí-pio da taxatividade, da reserva legal e da vedação de analogia.

O princípio da taxatividade para é sinônimo da precisão na defi nição do comportamento incriminado. Essa determinação linguística vincula tanto o legislador como o juiz. No caso do legislador, exige-se que a lei descreva de forma clara, compreensível e precisa a conduta punível pelo Estado. Isto ocorre, uma vez que é essencial que o conteúdo da lei possa ser conhecido por seus destinatários, os cidadãos, permitindo-lhes diferenciar entre o pe-nalmente lícito e o ilícito. Neste sentido, as leis penais devem ser precisas, de modo que não surjam dúvidas quanto a sua aplicação ao caso concreto.

Esse princípio também vincula o julgador, pois estabelece os limites inter-pretativos aos quais ele está vinculado. A aplicação da norma penal incrimi-nadora deve se pautar pelos parâmetros em que foi formulada, evitando-se assim o abuso judicial decorrente de uma interpretação que possa abranger um número indeterminado de comportamentos.

É importante mencionar que o princípio da taxatividade ou da determi-nação não está expresso em nenhuma norma legal, pois se trata de uma cons-trução doutrinária, fundamentada no princípio da legalidade e no Estado Democrático de Direito. O modelo oposto, no qual o juiz pode preencher livremente o conteúdo da norma incriminadora, está associado a sistemas jurídicos autoritários e representa a previsão de condutas puníveis de modo indeterminado e valorativo, permitindo discriminações fundadas nas carac-terísticas pessoais e esvaziando o princípio da legalidade.

O princípio da reserva legal tem como escopo que os tipos penais incri-minadores somente podem ser criados através de lei pelo Poder Legislativo e respeitando o procedimento previsto na Constituição Federal.

Page 12: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 12

Vale destacar, que o princípio da legalidade impõe respeito ao que a lei expressa, ou seja, possui um caráter mais amplo. Já o princípio da reserva legal, com seu caráter mais específi co, estabelece que determinada matéria só pode ser tratada através de lei. No campo do Direito Penal, essa limitação serve para assegurar que somente normas produzidas de forma democrática, pelos representantes eleitos pelo povo, podem vincular os cidadãos. Normas emanadas diretamente pelo Executivo não preenchem esse critério, pois em-bora o Presidente da República tenha legitimidade popular, somente o Poder Legislativo (com todas as difi culdades que tenha ou possa vir a ter) representa a pluralidade de concepções de justiça de uma sociedade.

O princípio da vedação de aplicação da analogia no Direito Penal impede que se use uma norma penal para punir uma conduta com base na analogia ou extensão. Isso signifi ca que o juiz não pode realizar uma interpretação integrativa ou ampliativa da hipótese que foi originalmente estabelecida na lei. Exceção a essa regra é quando se faz uma analogia para benefi ciar o indi-víduo4.

II — O CASO

Em agosto de 1991, no condomínio de classe média Jardim Colonial, X. Y., policiais militares, foram chamados para atender uma ocorrência de furto de bicicleta cometido por um menor dentro do condomínio. O crime de furto consiste em subtrair coisa alheia para si ou para outrem, como previsto no art. 155 do Código Penal.

O suposto autor do fato foi capturado e se achava detido por duas pessoas, quais sejam os vigilantes do condomínio que entraram em contato com a polícia que se dirigiu ao local. A vítima, de acordo com os vigilantes, afi rmou que o menor era autor do fato. Com base nisso, acatando as conclusões dos “vigilantes’, X. e Y. detiveram o adolescente, que não tinha qualquer bicicleta em sua posse, e conduziram-no ao posto policial, onde passaram a agredi-lo violentamente com socos, pontapés e golpes de cassetete para que confessasse haver subtraído a bicicleta.

Veja um vídeo semelhante: http://www.youtube.com/watch?v=iN0aFWkr0rU

A questão Jurídica

Diante dos atos praticados pelos policiais, duas ações foram instauradas. A primeira ação penal foi ajuizada na Justiça Estadual Militar, para apurar o crime de lesão corporal praticado por militar (art. 209, do Código Penal Mi-litar; Decreto-Lei Nº 1.001, de 21 de outubro de 1969): “Art. 209. Ofender

Page 13: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 13

a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena — detenção, de três meses a um ano”.

Uma segunda ação penal foi instaurada para apurar o mesmo fato, porém perante a Justiça Estadual Comum, para apurar o crime de tortura contra criança ou adolescente (art. 233, do Estatuto da Criança e do Adolescente; Lei 8069/90): “Art. 233. Submeter criança ou adolescente sob sua autorida-de, guarda ou vigilância a tortura: Pena — reclusão de um a cinco anos. § 1º Se resultar lesão corporal grave: Pena — reclusão de dois a oito anos. § 2º Se resultar lesão corporal gravíssima: Pena — reclusão de quatro a doze anos. § 3º Se resultar morte: Pena — reclusão de quinze a trinta anos”5.

A defesa dos policiais alegou que ninguém pode ser processado nem pu-nido duas vezes pelo mesmo fato (princípio do ne bis in idem). Para solu-cionar qual deveria ser a justiça competente, foi suscitado um confl ito de competência perante o Superior Tribunal de Justiça, que julga questões infra-constitucionais. O STJ, no entanto, determinou que ambas as ações teriam prosseguimento.

A defesa recorreu novamente, impetrando um habeas corpus e o caso foi ao Supremo Tribunal Federal, órgão responsável pela interpretação da Cons-tituição Federal e da proteção dos direitos e garantias individuais, que disse que o caso deveria ser julgado pelo Justiça Estadual Comum, pois o crime de prática de tortura contra criança ou adolescente era mais específi co que a lesão corporal genérica prevista no Código Penal Militar. Porém, o STF ini-ciou uma discussão se o art. 233 era inconstitucional, à luz dos princípios da taxatividade e da reserva legal.

Page 14: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 14

Questões a serem enfrentadas

1) O crime do art. 233, do ECA, respeita a regra da reserva legal?2) O crime de tortura pode ser preenchido por meio das convenções inter-

nacionais que o Brasil ratifi cou e incorporou ao direito pátrio?3) O crime de tortura pode ser preenchido por um conteúdo que não

esteja normatizado?4) O Poder Judiciário pode fl exibilizar (ponderar) essa garantia, quando

estiver diante de um crime grave?5) O fato de tramitarem no Congresso seis diferentes projetos para tipifi -

car a tortura permite ao judiciário escolher uma defi nição?6) É correto punir alguém por crime de tortura sem que seja taxativamen-

te defi nido em lei o ato de torturar?

III — DINÂMICA DA AULA

O aluno deverá ler a ementa e o relatório do acórdão do Supremo Tribunal Federal (HC 70.389-5) e elaborar a fi cha de análise de caso. Cada grupo de alunos deverá ler os votos de determinados Ministros de acordo com a orien-tação abaixo, incorporando o voto dos Ministros na fi cha de análise.

Em sala de aula serão debatidas as diferentes propostas de solução desse caso, conforme os diferentes votos dos Ministros.

Grupo A: Votos Celso de Mello e Sepúlveda PertenceGrupo B: Votos Carlos Velloso, Francisco Rezek, Néri da Silveira e Paulo

BrossardGrupo C: Votos Sydnei Sanches, Ilmar Galvão e Octavio GallottiGrupo D: Votos Marco Aurélio e Moreira Alves

IV. LEITURA OBRIGATÓRIA

Ementa e Relatório do HC 70.389-5

Page 15: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 15

Page 16: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 16

Page 17: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 17

Page 18: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 18

Page 19: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 19

Page 20: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 20

V. LEITURA COMPLEMENTAR

Texto do Prof. Nilo Batista

Page 21: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 21

Page 22: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 22

Page 23: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 23

Page 24: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 24

Page 25: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 25

Page 26: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 26

Page 27: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 27

Page 28: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 28

Page 29: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 29

Page 30: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 30

Page 31: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 31

AULA 03 — PRINCÍPIO DA LEGALIDADE (ANTERIORIDADE)

I — INTRODUÇÃO

O princípio da anterioridade signifi ca que uma lei penal incriminadora somente pode ser aplicada, caso esteja em vigor no momento da prática da infração penal.

Neste sentido, como bem expressa Guilherme de Souza Nucci6, “de nada adiantaria adotarmos o princípio da legalidade, sem a correspondente ante-rioridade, pois criar uma lei, após o cometimento do fato, seria totalmente inútil para a segurança que a norma penal deve representar a todos os seus destinatários”.

Em harmonia com o princípio da anterioridade da lei penal, existe o prin-cípio da irretroatividade da lei penal mais benéfi ca, disposto no art. 5º, XL da Constituição Federal (“A lei penal não retroagirá, salvo para benefi ciar o réu”) e no art. 2º do Código Penal (“Ninguém poderá ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória”).

A irretroatividade somente se aplica à lei penal mais severa que a anterior, pois a lei mais benéfi ca vai alcançar o fato praticado antes do início de sua vigência, ocorrendo assim, a retroatividade da lei mais benéfi ca. Neste caso, a pena mais leve da lei nova é justa e a mais severa da lei revogada é desne-cessária.

Com o objetivo de restringir o arbítrio legislativo e judicial na elaboração ou aplicação retroativa de lei prejudicial, o princípio da irretroatividade está em total sintonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, que em seu art. 11.2 dispõe: “Ninguém será condenado por ações ou omissões que no momento de sua prática não forem delitivas segundo o Direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta pena mais grave do que a aplicável no momento da comissão do delito”.

II — O CASO

O acusado foi processado por crime de atentado violento ao pudor, que consiste em constranger alguém mediante violência ou grave ameaça, a prati-car ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal (crime hoje não mais previsto no Código Penal, pois agora está englo-bado no crime de estupro).

Page 32: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 32

O acusado foi absolvido e o Ministério Público que fez a denúncia, incon-formado, apelou. O Tribunal de Justiça de São Paulo proveu parcialmente a apelação, condenando o acusado por atentado violento ao pudor em conti-nuidade delitiva, ou seja, o mesmo crime foi praticado várias vezes por um longo prazo de tempo (art. 214 c/c art. 224 e art. 71, todos do CP) e fi xando a pena em 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

O advogado de defesa entrou com a revisão criminal, para reverter a situ-ação, mas foi indeferida pelo TJ-SP. Além disso, impetrou Habeas Corpus, com o mesmo objetivo que foi indeferido pelo STJ.

Assim, em mais uma tentativa de reverter a condenação, foi impetrado Re-curso Ordinário de Habeas Corpus perante o STF, tendo a defesa do acusado alegado que; (a) houve confl ito de leis no tempo (Lei dos crimes hediondos x Estatuto da Criança e do Adolescente), afi rmando que a lei penal não retroa-girá salvo para benefi ciar o réu e Lei dos Crimes Hediondos que foi aplicada é pior para o réu; e (b) os fatos ocorreram em 1990, 1991 e 1992, em dias e meses incertos, não se sabe se antes ou depois da edição das Leis 8.072/90 (Lei dos crimes hediondos) e 8.069/90 (ECA), trazendo a discussão de qual lei deveria ser aplicada.

QUESTÕES JURÍDICAS A SEREM ENFRENTADAS:

1) Quando uma norma ingressa no “mundo jurídico”? Ela pode ser revo-gada, antes de entrar em vigor?

2) É possível a revogação implícita da lei penal? É possível a revogação implícita da lei penal gerando piora na situação jurídico-penal do réu?

3) Há retroatividade in malan partem no caso concreto?

Page 33: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 33

4) O Poder Judiciário pode negar vigência a uma disposição legislativa expressa e literalmente inequívoca em nome da “coerência legislativa”?

III — DINÂMICA DA AULA

O aluno deverá ler o inteiro teor do julgamento do Supremo Tribunal Federal (HC 81.453-1) e elaborar a fi cha de análise de caso. Cada grupo de alunos deverá se preparar para defender ou contestar a decisão do STF.

Grupo A: defende a decisão do Supremo Tribunal FederalGrupo B: contesta a decisão do Supremo Tribunal Federal

Page 34: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 34

IV — LEITURA OBRIGATÓRIA

Habeas Corpus 81.453, julgado pelo Supremo Tribunal Federal

Page 35: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 35

Page 36: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 36

Page 37: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 37

Page 38: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 38

Page 39: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 39

Page 40: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 40

Page 41: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 41

Page 42: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 42

Page 43: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 43

Page 44: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 44

Page 45: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 45

Page 46: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 46

Page 47: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 47

Page 48: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 48

Page 49: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 49

Page 50: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 50

Page 51: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 51

Page 52: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 52

AULA 04 — PRINCÍPIO DA LEGALIDADE (INSIGNIFICÂNCIA)

I — INTRODUÇÃO

Segundo Mauricio Ribeiro Lopes (Princípio da insignifi cância no direito penal. São Paulo: RT, 1997, p. 82), foi Claus Roxin quem primeiro enun-ciou o princípio da insignifi cância (geringfügigkeitsprinzip). Consoante esse princípio, os delitos de baixa ou nenhuma lesividade social devem ser objeto de intervenção mínima do direito penal, merecendo tratamento diferenciado e, quiçá, serem excluídos do rol daqueles que merecem a tradicional resposta punitiva estatal.

Essa lição, hoje aperfeiçoada doutrinariamente, remonta ao período das primeiras conquistas do Direito Penal Moderno, enunciadas pela fi losofi a iluminista. Cesare Beccaria (Dos delitos e das penas. São Paulo: RT, 1996, p. 28), nos idos do sec. XVIII, já alertava que “Toda pena, que não derive da absoluta necessidade (...) é tirânica”.

A despeito da grande evolução do Direito Penal, passados mais de duzen-tos anos desde a primeira edição da obra do mestre italiano, continua a van-guarda da ciência penal a reafi rmar os mesmos princípios. Modernamente, alinham-se ao lado do princípio da insignifi cância os preceitos de razoabili-dade e proporcionalidade, que, conjugados, caracterizam a doutrina do Di-reito Penal Mínimo7.

No Brasil, o princípio da insignifi cância foi acolhido pela doutrina e pela jurisprudência. No entanto, o princípio da insignifi cância não tem previsão legislativa, sendo apenas uma criação doutrinária. Diante dessa situação, o respectivo princípio sofre críticas, uma vez que surge a indagação do que seria insignifi cante.

Ao longo do tempo o Supremo Tribunal Federal passou a reiterar o enten-dimento de que deve ser analisado o caso concreto e devem estar presentes os seguintes requisitos:

(a) mínima ofensividade da conduta do agente;(b) ausência de periculosidade social da ação;(c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e(d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.Assim, o princípio da insignifi cância tem o sentido de não considerar o

ato praticado como um crime, por isso, sua aplicação gera a absolvição do réu e não apenas a diminuição e substituição da pena. Mais do que isso, aplica-se esse princípio com o intuito de retirar do direito penal condutas que não produzam prejuízos signifi cativos a bens jurídicos tutelados.

Page 53: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 53

II — O CASO

Um jovem desempregado de 19 anos furtou uma fi ta de vídeo-game, com valor estimado de R$ 25,00. A vítima fez um registro na Delegacia de Polícia e B. foi localizado. A fi ta foi devolvida, pois B. a utilizara somente para jogar algumas partidas do jogo eletrônico.

Diante dos fatos, a vítima pretendia “retirar a queixa e a fi ta foi devolvida, contudo o acusado foi condenado a 8 meses de reclusão por uma conduta que para muitos pode ser considerada como insignifi cante, ou seja, não causa uma lesão a um bem jurídico protegido, qual seja o patrimônio, de forma a ensejar a necessidade de que o direito penal seja aplicado.

A defesa recorreu e a decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça e pelo Superior Tribunal de Justiça. Assim, foi impetrado Habeas Corpus no Su-premo Tribunal Federal para que, destacando que o parecer do Ministério Público foi favorável a manutenção da pena.

Questões a serem enfrentadas

1) É correto deixar de punir alguém porque o a pena seria desproporcional ao crime praticado?

3) O Poder Judiciário pode deixar de aplicar a lei penal quando estiver diante de um crime sem gravidade?

III — DINÂMICA DA AULA

O aluno deverá ler o inteiro teor do julgamento do Supremo Tribunal Federal (HC 84.412-0) e elaborar a fi cha de análise de caso. Cada grupo de alunos deverá ler as ementas dos casos incluídos na leitura obrigatória e de-fender a aplicação ou não do princípio da insignifi cância

Grupo A — Casos 1 e 2Grupo B — Casos 3 e 4Grupo C — Casos 5 e 6

Page 54: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 54

IV — LEITURA OBRIGATÓRIA

Caso 1

PROCESSO PENAL. PENAL. HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE FURTO. REINCIDÊNCIA NÃO CONFIGURADA. VALOR IRRISÓ-RIO. TIPICIDADE MATERIAL. AUSÊNCIA. APLICAÇÃO DO PRIN-CIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, INCISO III, DO CPP. ORDEM CONCEDIDA. 386, inciso III CPP. A tipicidade ma-terial — que faz parte do conceito de tipicidade — consiste em averiguar se uma conduta formalmente típica causou ofensa intolerável ao objeto jurídico penalmente protegido; A conduta de subtrair um carregador e uma capa de celular do Supermercado Carrefour, no valor total de R$56,40, não constitui crime de furto, pois inexistente a tipicidade material; Na aplicação do prin-cípio da insignifi cância leva-se em conta, tão só, o valor da coisa subtraída e nunca a utilidade que propicia ao proprietário ou possuidor, à vista do bem ju-rídico que se tutela, o patrimônio; Ordem CONCEDIDA para ABSOLVER o Paciente com base no art. 386, III, do Código de Processo Penal. 386III Código de Processo Penal (41638 Mandado de Segurança 2005/0019248-7, Relator: Ministro PAULO MEDINA, Data de Julgamento: 06/03/2006)

Caso 2

PENAL — HABEAS CORPUS — FURTO DE UM BONÉ — VALOR DE R$ 50,00 —OBJETO RESTITUÍDO À VÍTIMA — REINCIDÊNCIA — APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA OU BAGA-TELA — POSSIBILIDADE —IRRELEVÂNCIA DA REINCIDÊNCIA E DOS MAUS ANTECEDENTES. PRINCÍPIO DA NECESSARIEDADE DA PENA — ORDEM CONCEDIDA PARA RECONHECER A ATIPI-CIDADE DA CONDUTA.

1 — Se o bem tutelado nem mesmo chegou a ser ofendido, nem há rele-vância na conduta praticada, o princípio da insignifi cância deve ser aplicado, afa stando-se a tipicidade.

2 — A aplicação dos princípios da necessariedade e da sufi ciência afasta a fi xação de pena que se mostra excessiva para reprimir conduta irrelevante.

3 — Maus antecedentes e reincidência não impedem a aplicação do prin-cípio da bagatela.

4 — Ordem concedida para absolver o paciente pelo reconhecimento da atipi-cidade de sua conduta. Expedido alvará de soltura, salvo prisão por outro motivo.

(96929 Mandado de segurança 2007/0300036-8, Relator: Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), Data de Julgamento: 08/04/2008, SEXTA TURMA)

Page 55: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 55

Caso 3

Habeas Corpus. Penal. Furto qualifi cado. Incidência do princípio da in-signifi cância. Inviabilidade. Crime praticado mediante o rompimento de obstáculo. Ordem denegada.

É entendimento reiterado desta Corte que a aplicação do princípio da in-signifi cância exige a satisfação dos seguintes vetores: (a) mínima ofensividade da conduta do agente; (b) ausência de periculosidade social da ação; (c) redu-zidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

As peculiaridades do delito — praticado mediante a destruição de obstá-culo (arrombamento da janela da casa da vítima) — demonstram signifi ca-tiva reprovabilidade do comportamento e relevante periculosidade da ação, fato este sufi ciente ao afastamento da incidência do princípio da insignifi cân-cia. Ordem denegada. (110840 Mandado de Segurança, Relator: Min. JO-AQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 22/05/2012, Segunda Turma).

Caso 4

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. DECISÃO DE RELATOR, DO STJ, QUE INDEFERIU PEDIDO DE LIMINAR EM IDÊNTICA VIA PROCESSUAL. FURTO. PRINCÍPIO DA IN-SIGNIFICÂNCIA. NÃO-INCIDÊNCIA: AUSÊNCIA DE CUMULA-TIVIDADE DE SEUS REQUISITOS. RES FURTIVA DE PEQUENO VALOR (SEIS BARRAS DE CHOCOLATE AVALIADAS EM R$ 31,80). SUBTRAÇÃO DOS BENS PARA COMPRAR DROGAS: CONDUTA DE CONSIDERÁVEL OFENSIBILIDADE. ACENTUADO GRAU DE REPROVABILIDADE DO COMPORTAMENTO DO PACIENTE. FURTO PRIVILEGIADO (CP, ART. 155, § 2º): PACIENTE REINCI-DENTE. NÃO-CABIMENTO. SÚMULA 691-STF: AUSÊNCIA DE TERATOLOGIA OU DE PATENTE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. CP155 § 2º 691

1. O princípio da insignifi cância incide quando presentes, cumulativamente, as seguintes condições objetivas: (a) mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade do comportamento, e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

2. A prática reiterada de furtos para comprar drogas, independentemente do valor dos bens envolvidos, não pode, obviamente, ser tida como de míni-ma ofensividade, nem o comportamento do paciente pode ser considerado como de reduzido grau de reprovabilidade. Precedente: HC 101144/RS, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 22/10/2010.: HC 101144/RS

Page 56: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 56

3. O princípio da insignifi cância não se aplica quando se trata de paciente reincidente, porquanto não há que se falar em reduzido grau de reprovabilidade do comportamento lesivo. Precedentes: HC 107067, rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJ de 26/5/2011; HC 96684/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ªTurma, DJ de 23/11/2010; HC 103359/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 1ªTurma, DJ 6/8/2010; HC 100367, 1ªTurma, rel. Min. Luiz Fux, DJ de 8/9/2011;

4. O § 2º do artigo 155 do Código Penal (“§ 2º. Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.” — grifei), ao admitir o reconhecimento do furto privilegiado a réu pri-mário, traz ínsita a vedação do benefício a reincidentes.§ 2º 155 Código Penal

5. In casu, em que pese o ínfi mo valor dos bens furtados, a rejeição da tese da insignifi cância restou plenamente fundamentado pelo Juízo na existência de duas sentenças transitadas em julgado contra o paciente por crimes contra o patrimônio.

6. O paciente duplamente reincidente não tem direito ao privilégio do art. 155, § 2º, do Código Penal, benefício reservado a réus primários. 155§ 2ºCódigo Penal

7. Parecer do MPF pelo desprovimento do agravo regimental.8. Agravo regimental desprovido.(107733 MG, Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 07/02/2012,

Primeira Turma).

Caso 5

DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. VALOR SO-NEGADO INFERIOR AO FIXADO NO ART. 20 DA LEI 10.522/02. ATIPICIDADE DA CONDUTA. RELATIVIZAÇÃO, IN CASU, DA SÚ-MULA 691/STF. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

1. A questão de direito tratada neste writ, consoante a tese exposta pela impetrante na petição inicial, é a suposta atipicidade da conduta realizada pela paciente com base no princípio da insignifi cância.

2. No caso concreto, a paciente foi denunciada pela suposta prática do crime previsto no art. 334, § 1º, do Código Penal, no qual o valor dos tri-butos sonegados seria de R$ 381,26 (trezentos e oitenta e seis reais e vinte e seis centavos).

3. O art. 20 da Lei 10.522/02 determina o arquivamento das execuções fi scais, sem baixa na distribuição, quando os débitos inscritos como dívida ativa da União forem iguais ou inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor modifi cado pela Lei 11.033/04.

Page 57: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 57

4. Esta Colenda Segunda Turma tem precedentes no sentido de que falta justa causa para a ação penal por crime de descaminho quando a quantia so-negada não ultrapassar o valor previsto no art. 20 da Lei 10.522/02.

5. Ademais, o rigor na aplicação da Súmula 691/STF — segundo a qual “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus im-petrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribu-nal superior, indefere a liminar” — tem sido abrandado por julgados desta Corte apenas em hipóteses excepcionais de fl agrante ilegalidade ou abuso de poder na denegação da tutela de efi cácia imediata.

6. Contudo, diante da orientação que vem se delineando no âmbito desta Corte, a presente a presente hipótese autoriza, excepcionalmente, o afasta-mento da orientação contida na Súmula 691/STF.

7. Ante o exposto, não conheço do presente pedido de habeas corpus, mas concedo a ordem, de ofício.

(HC 100513, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julga-do em 23/03/2010)

Caso 6

EMENTA: HABEAS CORPUS. TIPICIDADE. INSIGNIFICÂNCIA PENAL DA CONDUTA. DESCAMINHO. VALOR DAS MERCADO-RIAS. VALOR DO TRIBUTO. LEI Nº 10.522/02. IRRELEVÂNCIA PE-NAL. ORDEM CONCEDIDA.

1. O postulado da insignifi cância é tratado como vetor interpretativo do tipo penal, que tem o objetivo de excluir da abrangência do Direito Criminal con-dutas provocadoras de ínfi ma lesão ao bem jurídico por ele tutelado. Tal forma de interpretação assume contornos de uma válida medida de política criminal, visando, para além de uma desnecessária carceirização, ao descongestionamento de uma Justiça Penal que deve se ocupar apenas das infrações tão lesivas a bens jurídicos dessa ou daquela pessoa quanto aos interesses societários em geral.

2. No caso, a relevância penal é de ser investigada a partir das coordenadas traçadas pela Lei nº 10.522/02 (lei objeto de conversão da Medida Provisória nº 2.176-79). Lei que, ao dispor sobre o “Cadastro Informativo dos créditos não qui-tados de órgãos e entidades federais”, estabeleceu os procedimentos a serem ado-tados pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, em matéria de débitos fi scais.

3. Não há sentido lógico permitir que alguém seja processado, criminal-mente, pela falta de recolhimento de um tributo que nem sequer se tem a certeza de que será cobrado no âmbito administrativo-tributário.

4. Ordem concedida para restabelecer a sentença absolutória.(HC 99594, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, jul-

gado em 18/08/2009)

Page 58: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 58

Page 59: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 59

Page 60: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 60

Page 61: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 61

Page 62: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 62

Page 63: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 63

Page 64: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 64

Page 65: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 65

Page 66: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 66

Page 67: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 67

Page 68: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 68

Page 69: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 69

Page 70: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 70

Page 71: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 71

Page 72: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 72

Page 73: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 73

BLOCO 2 — DIREITO PROCESSUAL PENAL

AULA 05 — PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (VEDAÇÃO DE PROVA ILÍCITA)

I — INTRODUÇÃO

A inadmissibilidade da prova ilícita está prevista no art. 5º, LVI da CF: “LVI — são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Trata-se de mais uma (dentre tantas outras) norma que busca limitar a ação do Estado na persecução penal.

A atividade probatória do Estado (reunião de elementos de prova que indiquem a autoria e materialidade de um crime) no processo penal pode ser pré processual (o que normalmente ocorre no âmbito da Polícia Judiciária, com o inquérito policial) e também processual (produzida pelas partes peran-te um juiz). As duas etapas concretizam a atividade persecutória do Estado.

Contudo, as provas produzidas na fase processual possuem maior valor, já que permitem a participação da defesa e da acusação. Provas produzidas na fase de inquérito tem por fi nalidade reunir elementos de informação para o início do processo. Excepcionalmente, provas que sejam produzidas na fase policial podem ser utilizadas pelo juiz para formar sua convicção.

Tanto na fase pré-processual, como na fase processual, as provas devem ser produzidas conforme determina a lei. Se houver desrespeito à lei, teremos uma prova que não pode ser utilizada, isto é, uma prova ilícita. O Código de Processo Penal tenta conceituar prova ilícita:

“Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucio-nais ou legais.

§ 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quan-do não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primei-ras. § 2º Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova. § 3º Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente.”

Page 74: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 74

II — O CASO

(Narrativa baseada no Habeas Corpus 5.100/94, julgado pela Suprema Corte de Israel).

Desde a data de sua criação, em 1948, o Estado de Israel está marcado pela instabilidade política devido aos seguintes fatores principais: (1) demanda pela instalação de um Estado Palestino na mesma área, (2) posse da cidade de Jerusalém (considerada sagrada por muçulmanos, judeus e cristãos), e (3) ocupação de regiões circunvizinhas às fronteiras originais de Israel. Apesar das tentativas de fi rmar um tratado de paz defi nitivo, tais problemas não foram resolvidos.

Os grupos palestinos mais radicais sustentam que o Estado de Israel é uma ocupação indevida do território palestino imposta pelas potências ocidentais. Tais grupos promovem ataques suicidas a alvos não-militares mediante ex-plosão de bombas em ônibus, teatros, embaixadas, etc. Esses comportamen-tos podem ser considerados terroristas.

Os grupos israelenses mais radicais sustentam que o Estado de Israel tem direito sobre o território atualmente ocupado. Setores mais conservadores do governo de Israel não hesitaram, ao longo dos anos, em autorizar a prática de assassinatos, seqüestros e prisões indiscriminadas para impedir ou retaliar os ataques palestinos. Essa atuação pode ser considerada prática de terrorismo estatal.

Em 1987, o governo de Israel criou uma comissão governamental, dirigi-da pelo ex-presidente da Corte Suprema de Israel, Moshe Landau, para exa-minar métodos de interrogatório empregados pelo Serviço Secreto Israelense (GSS). Essa comissão aprovou e recomendou uso de “pressão psicológica” e “um grau moderado de força física” pelo GSS durante suas investigações.

Alguns dos presos submetidos aos métodos questionados foram poste-riormente processados e condenados por ataques terroristas que causaram a morte de dezenas de pessoas. Outros presos submetidos aos mesmos métodos foram liberados sem que fosse formulada acusação contra eles.

A Corte Suprema de Israel recebeu centenas de petições dos detidos, ques-tionando a validade do emprego de força física como método de investigação. Até a decisão de setembro de 1999, ora examinada, a Corte rejeitara a maior parte dessas petições, permitindo que o GSS continuasse a empregar os mé-todos questionados durante interrogatórios.

O caso concreto compreende o julgamento de diversas petições de Habe-as Corpus, assinadas por indivíduos e organizações, questionando o uso de “pressão física moderada” em interrogatórios envolvendo suspeitos de terem participado de atentados, bem como em pessoas suspeitas de planejarem fu-turos ataques. Neste último caso, a investigação tem natureza preventiva.

Page 75: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 75

Petições reunidas para julgamento:• HC 4054/95 Associação para os Direitos Civis de Israel;• HC 5100/94 — Comitê Público contra a Tortura em Israel;• HC 6536/95 — Hat’m Abu Zayda;• HC 5188/96 — Centro de Defesa do Indivíduo, Wa’al Al Kaaqua e

Ibrahim Abd’allah Ganimat;• HC 7563/97 — Abd Al Rahman Ismail Ganimat e Comitê Público

contra a Tortura em Israel;• HC 7628/97 — Fouad Awad Quran e Comitê Público contra a Tor-

tura em Israel;• HC 1043/99 — Issa Ali Batat

Resumo dos argumentos das partes perante o tribunal.

Os métodos de investigação questionados compreendem: obrigar o in-vestigado a permanecer em posições desconfortáveis e dolorosas por longos períodos; privação de sono; ameaças psicológicas; agressões físicas; encapuzar suspeitos com sacos embebidos em urina; em último caso, poder-se-ia “sacu-dir” o suspeito.

Vários indivíduos “sacudidos” tiveram dores de cabeça violentas, vômito, perda de consciência, lesão cervical e danos cerebrais irreversíveis. Pelo menos dois investigados morreram durante sessões de interrogatório, um deles após ser sacudido.

Os advogados dos presos alegam que esses métodos são ilegais e consti-tuem tortura e, portanto, em nenhuma circunstância poderiam ser admiti-dos, ainda que vidas humanas estivessem em perigo. Quaisquer provas, indí-cios ou depoimentos são provas ilícitas e o Estado não poderia se valer delas.

Para o governo de Israel, tais métodos não constituem tortura, pois não causam dor ou sofrimento. Mesmo se isso ocorresse, a prática estaria permiti-da porque os agentes do GSS as utilizavam para proteger a vida e a segurança de inocentes.

Por fi m, os métodos questionados estão sujeitos à avaliação prévia da che-fi a do GSS, o que somente autoriza que sejam empregados como último recurso em situações extremas.

Page 76: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 76

Questões a serem enfrentadas.

1) Se você fosse membro do tribunal, como decidiria o pedido de proi-bição das práticas do GSS aos suspeitos de terrorismo? Para justifi car sua decisão, procure guiar-se pelas questões abaixo e veja as opiniões fi ctícias ofe-recidas por “estudiosos fi ctícios”.

2) O uso de pressão física e psicológica sobre pessoas suspeitas de crimes é uma forma de tortura?

3) A tortura é um meio efi caz de obter informações sobre crimes?4) A tortura é um meio razoável de obter informações sobre crimes?5) A tortura é um meio justo de obter informações sobre crimes?6) A tortura é um meio juridicamente válido de obter informações sobre

crimes?7) A tortura poderia ou deveria ser “legalizada” pelo Congresso e submeti-

da a um processo judicial de decretação, tal como ocorre, por exemplo, com a busca e apreensão feita pela polícia na residência das pessoas, mediante autorização judicial (como ocorre com a medida de busca e apreensão, por exemplo)?

Opiniões de juristas fictícios

Professor Emergix

O caso concreto que se apresenta para decisão é uma hipótese de colisão de princípios jurídicos. De um lado, temos o princípio da verdade real — segun-do o qual as investigações de natureza criminal devem buscar a verdade do que efetivamente aconteceu — e de outro lado temos o princípio da dignidade humana — segundo o qual os indivíduos devem ter sua dignidade preservada.

Ambos os princípios fazem parte do nosso direito. Ambos são válidos e ne-nhum desses princípios é absoluto. Numa situação concreta, devemos pesar as circunstâncias. E devemos ser claros e assumir as conseqüências de nossas escolhas.

O tratamento aplicado aos terroristas pelo GSS é uma forma de tortura. Seja porque a Convenção Internacional da ONU (que o Estado de Israel ratifi cou) diz isso, seja porque o espancamento de pessoas suspeitas de crimes constitui o caso clássico de tortura. Penso que a tortura deve ser proibida. A lei de nosso país já diz isso e tal lei deve ser respeitada. Porém, não podemos negar que há situações em que o governo deve violar a lei para poder fazer um bem maior à sociedade.

Quando os investigadores do GSS estiverem diante de uma situação em que acreditem que o suspeito possui informações relevantes e não quer for-

Page 77: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 77

necê-las espontaneamente, deverão obrigar o suspeito a falar a verdade, para o bem da segurança e da vida de outros cidadãos inocentes.

Em situações normais, o confl ito entre a busca da verdade e a dignidade do ser humano deverá ser resolvido a favor da dignidade na maioria dos ca-sos. Porém, nos crimes graves — como é o terrorismo — deverá prevalecer o princípio da busca da verdade real, mesmo porque um criminoso não tem dignidade.

Na minha opinião, todos os suspeitos da prática de crimes que não qui-serem colaborar com as autoridades espontaneamente deverão ser obrigados a tanto. Se quebraram a ordem jurídica, não podem agora querer que ela os defenda. O caso dos terroristas e dos investigadores do GSS é exemplar para comprovar minha tese de que a tortura de alguns poucos garante o bem de muitos outros.

Professor Demorradicalix

Concordo com o professor Emergenix quando fala que existe um confl i-to de princípios. Porém, discordo quando ele sugere que o Estado ou seus agentes — policiais, juízes, investigadores do GSS etc. — possam violar a lei.

Justamente o que diferencia os homens de bem dos terroristas e demais criminosos é o fato de que eles violaram as nossas leis. Ora, se também nós violarmos as leis, não teremos autoridade moral para exigir deles outro com-portamento. Além disso, se governo tem por obrigação exigir que todos obe-deçam a lei (e pune quem não o faz), como pode, justamente o governo, agir de outra forma?

Esse caso concreto deve ser defi nido com base na lei. Se a lei proíbe a tortura, não podemos praticá-la, nem mesmo em crimes graves, já que a lei não faz essa exceção. Nem a Comissão Landau, nem o Ministro da Justiça, nem o chefe do GSS têm legitimidade para decidir em que casos pode existir tortura. Somente o povo, por meio de seus representantes democraticamente eleitos pode tomar essa decisão.

Defendo que nosso país se retire da Convenção da ONU e que nosso Congresso aprove uma nova lei autorizando a tortura. Até lá a tortura seria proibida e, somente a partir da edição da lei ela seria válida (mas somente nas situações que os deputados defi nissem na lei).

Digo isso porque a tortura já é efetivamente aplicada como prática corri-queira pelos do Estado, sobretudo nas situações de crise. Diante de um crime grave, pode-se afi rmar que há grande apoio popular ao seu uso. Portanto, seria melhor se tal prática estivesse prevista em lei (poderia haver uma lista de crimes graves nos quais o suspeito pudesse ser torturado) e os agentes do GSS teriam de obter autorização judicial para torturar.

Page 78: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 78

Dessa forma, haveria regras e limitações que dessem visibilidade e controle sobre essa prática. Do contrário, tais fatos continuarão ocorrendo (com ou sem autorização do governo) enquanto todos fi ngem que não os vêem.

Professor Natuliberalix

Ouso discordar dos nobres professores que me antecederam. A tortura é uma prática abominável e nada justifi ca seu uso. A dignidade do homem não é um princípio absoluto, pois a convivência em sociedade impõe limitações a todos os direitos. Porém, a tortura representa a própria negação da dignidade; equivale a retirar completamente a dignidade de alguém.

Afi nal, não há limites para a imaginação do homem quando se trata de fazer sofrer outra pessoa. Será que é possível admitir determinada forma de tortura (pau-de-arara) e vedar outra (aplicação de choques elétricos)? Como avaliar a quantidade de dor sofrida por cada investigado?

Reconheço que muitas situações vividas pelos agentes do GSS são graves e que eles buscam salvar vidas. Porém, sabemos que muitos “suspeitos” foram torturados e depois nenhuma acusação foi formulada contra eles. Não posso admitir, em hipótese nenhuma, nem mesmo diante de crimes graves, que um inocente seja brutalizado dessa forma. Nenhum ganho social justifi ca tal risco individual. Ainda que 99% dos suspeitos sejam de fato criminosos, não há como justifi car que o direito deixe desprotegidos os 1% restantes.

Desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, o Direito Criminal prevê que um homem deve ser considerado inocente até que um tribunal declare sua culpa. E essa sentença só será válida se esse ho-mem puder se defender. Nossas leis e as leis internacionais confi rmam isso. Não posso admitir que se torture um suspeito antes que ele seja processado e julgado.

Além do mais, a tortura é um meio imoral de atuação. Como bem marcou o Professor Demorradicalix, não podemos nos igualar aos criminosos. Mas, na minha opinião, ao contrário da dele, não é somente a lei que proíbe a tortura: é a moral. O governo e seus agentes não podem buscar fi ns morais (segurança, vida, felicidade do povo) com meios imorais (tortura). O que nos torna homens é nossa moral; se abrirmos mão dela, seremos menos que criminosos, seremos animais.

Nessa mesma linha de argumentação, considero que nenhuma lei pode aprovar o uso de tortura em nosso país. A democracia tem que obedecer a limites morais que estão em nossa consciência. Nem mesmo a unanimidade das pessoas pode aprovar uma atuação do Estado que viole de modo tão bru-tal a dignidade de um ser humano inocente. Essa é minha opinião.

Page 79: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 79

Professor Garantilix

Vejo que os colegas que falaram antes de mim estão conduzidos pela emo-ção, mais do que pela razão. Em primeiro lugar, interessa saber se a tortura é um meio efi ciente de obtenção de informação.

Eu considero que não é. O medo de ser torturado fará com que pessoas fracas façam declarações falsas que apenas atrapalharão as investigações. Por outro lado, pessoas fortes nada falarão, mesmo se torturadas até a morte. Nesse caso, o que fará o investigador do GSS? Passará a torturar a esposa do terrorista para que ele fale? Trará para a sala de torturas a fi lha de quatro anos do terrorista e começará a espancá-la?

Por trás do desejo de torturar não está a busca pela informação, mas sim a vontade de determinados homens, que no momento são mais fortes que outros, de usar essa força para subjugar, ofender, humilhar, machucar e matar seus semelhantes mais fracos.

A questão moral, levantada pelo Professor Natuliberalix, não se aplica. Não interessa saber se a tortura é moral ou não, pois o conceito de moral é variável. Aqueles que consideram haver uma guerra entre nós dirão que a guerra é, em si, imoral e atinge tanto culpados como inocentes e que agir assim nessa situação não é imoral.

Penso que se a tortura for legalizada pelo congresso, como propõe o pro-fessor Demorradicalix, isso incentivará sua prática. Com o tempo, será tão fácil conseguir um mandado para tortura como ocorre hoje com a busca e apreensão ou a prisão. Será instituída a “tortura para averiguações”.

Além disso, será que o suspeito tem obrigação de confessar o crime? Será razoável exigir que alguém forneça as provas para sua própria condenação? Ao admitirmos a tortura, estamos supervalorizando a confi ssão como meio de prova. Logo, ele voltará a ser a “rainha das provas” exatamente como ocor-ria durante a Inquisição, quando muitas pessoas foram mortas por causa de perseguições religiosas.

A história já deu provas que os governos não hesitam em transformar seus opositores políticos em “inimigos”, “subversivos”, “terroristas”, etc. Na minha opinião, devemos ter cuidado para que o direito não dê margem aos abusos dos governos. Admitir a tortura é um convite ao abuso do poder.

Por mais pungente que seja o argumento da “bomba-relógio prestes a ex-plodir”, nós temos a responsabilidade de seguir os princípios e valores que julgamos serem corretos sem nos desviarmos desse caminho. Não devemos submeter aos argumentos de “emergência” e nos conduzirmos de acordo com nossa consciência, sob risco de destruirmos, nós mesmos, os valores pelos quais lutamos: liberdade, igualdade e fraternidade.

Page 80: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 80

III — DINÂMICA DA AULA

O aluno deverá apresentar um quadro apontando cada argumento favorá-vel à tortura e o correspondente contra-argumento. Os alunos serão divididos em grupos para defender o uso da tortura ou sua proibição.

IV — LEITURA OBRIGATÓRIA

BARANDIER, Antonio Carlos da Gama — “Interrogatório do econo-mista. A tia zelosa. Injeções na barriga e o juiz mais realista do que rei”. in Contos Criminais. Lumen Juris, Rio de Janeiro, 1998, p. 11 e 14.

Page 81: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 81

Page 82: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 82

Page 83: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 83

Page 84: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 84

AULA 6 — PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA)

I — INTRODUÇÃO

O princípio da presunção de inocência está consagrado no inciso LVII do art. 5º da CF de 1988: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A forma como está enunciado na Constituição ensejou alguns debates a respeito do seu alcance. Isto porque não se repetiu a fórmula consagrada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada pela Assembléia Nacional Francesa, em 26 de agosto de 1789, bem como pela Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966 e pela Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969.

Não está dito no texto constitucional que todo homem se presumirá ino-cente, até que seja condenado, mas sim que ninguém será considerado culpa-do até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Em vista disso, não se estaria consagrando propriamente o princípio da presunção da inocên-cia, mas sim o da desconsideração prévia da culpabilidade, de aplicação mais restrita. De fato, a Constituição Federal brasileira adotou a redação do art. 27.2 da Constituição italiana de 1948, a qual por sua vez resultou de um movimento protagonizado por parte da doutrina italiana que defendia a res-trição do alcance do princípio da inocência, com vistas a garantir a efi cácia do processo penal8.

Importante registrar que não se trata apenas de uma discussão semântica a respeito da propriedade de se utilizar o termo presunção em seu sentido técnico. O embate que se trava traduz, em verdade, duas diferentes concep-ções político-ideológicas da fi nalidade do processo penal e das garantias que devem cercar a persecução penal. Com efeito, a consagração do princípio da presunção da inocência na Declaração de 1789 refl ete uma nova concepção do processo penal defendida por pensadores iluministas em reação ao siste-ma persecutório que marcara o antigo regime, no qual a prova dos fatos era produzida através da sujeição do acusado à prisão e tormento, com o fi m de extrair dele a confi ssão. É nessa mudança de foco, em que o processo penal deixa de ser um mero instrumento de realização da pretensão punitiva do Estado, para se transformar em instrumento de tutela da liberdade, que está a chave para se compreender o conteúdo e alcance do princípio da presunção de inocência.

A partir dessa premissa, acaba por ser irrelevante a diferença que se pre-tende acentuar entre o texto contido na Declaração de 1789 e o dispositi-

Page 85: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 85

vo constitucional brasileiro. De fato, ainda que a terminologia adotada pela Constituição de 1988 seja semelhante àquela engendrada na Itália pós-fas-cista a partir das críticas capitaneadas pelas escolas positiva e técnico-jurí-dica à presunção de inocência, o certo é que na prática judiciária brasileira as expressões presunção de inocência e presunção de não culpabilidade são utilizadas indistintamente, não se suscitando suposta diferença entre ambas como fundamento para restringir as conseqüências normativas do princípio da presunção de inocência.

Com efeito, os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça referem-se ao princípio da inocência: RHC 11.387/SP; HC 13.725/RJ; RHC 9.745/PR; RHC 8.167/SP. Já estes outros — REsp 304.521/SP; HC 32.491/MS; HC 16.541/SP; HC 28.177/MS — remetem ao princípio da não-culpabili-dade. E estes últimos — HC 19.711/SP; RHC 15.139/SP; HC 30.186/SP; HC 31.662/RS; HC 33.457/SP — citam ambos como sinônimos. Todos os julgados citados tratam, contudo, do mesmo princípio.

A aplicação mais comumente defendida pela doutrina da norma sob exa-me dá-se no campo probatório. Nessa primeira formulação, o réu ser pre-sumido inocente signifi ca, por um lado, que o ônus de provar a veracidade dos fatos que lhe são imputados é da parte autora na ação penal (em regra, o Ministério Público) e, por outro lado, que se permanecer no espírito do juiz alguma dúvida, após a apreciação das provas produzidas, deve a querela ser decidida a favor do réu.

Portanto, no direito processual penal, se ao fi nal o juiz tiver dúvidas a res-peito da procedência das alegações do réu, ele deve absolvê-lo, ainda que não esteja plenamente convencido daquelas alegações. Em uma palavra, a dúvida não resolvível quanto à matéria de fato é sempre dirimida a favor do réu, independentemente das regras ordinárias de distribuição do ônus da prova.

A mera alegação do réu de que agiu, por exemplo, sob uma excludente de antijuridicidade, não o exime de produzir prova de sua alegação. A solução pro reo só existe se o juiz não chegar a um juízo de certeza contra o réu, ou seja, se ele fi car realmente em dúvida quanto à ocorrência ou não da situação que justifi caria sua conduta, em vista da prova produzida. Diz-se assim que o in dubio pro reo é uma regra de julgamento que se extrai do princípio da presunção de inocência.

Mas o princípio da presunção de inocência não se aplica exclusivamente no campo probatório, o in dubio pro reo é apenas uma de suas repercus-sões. Deve ser dispensado tanto ao investigado quanto ao réu tratamento compatível com seu estado de inocente. A condição de investigado e de réu em processo criminal já traz, por si, indiscutível constrangimento. Em vista disso, todas as medidas restritivas ou coercitivas que se façam necessárias no curso do processo só podem ser aplicadas ao acusado na exata medida de tal necessidade. Se houver várias formas de conduzir a investigação, deve-se

Page 86: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 86

adotar a que traga menor constrangimento ao imputado e que enseje a me-nor restrição possível a seus direitos. Eventual prisão anterior à condenação defi nitiva, por exemplo, deverá estar pautada em decisão judicial que indique quais circunstâncias presentes no caso concreto autorizam e recomendam a excepcional privação da liberdade do réu. O mesmo ocorre com outras me-didas que impliquem restrição de direitos fundamentais, como se observa da necessidade de que a quebra de sigilo bancário e de comunicação telefônica, ou ainda a busca e apreensão no domicílio do acusado, sejam precedidas de decisão judicial devidamente fundamentada.

II — O CASO

Filme 12 homens e uma sentença que será passado em aulaUm jovem porto-riquenho é acusado de ter matado o próprio pai e doze

jurados devem decidir se ele é culpado ou não pelo assassinato, sob pena de morte. Onze têm plena certeza que ele é culpado, enquanto um não acredi-ta em sua inocência, mas também não o acha culpado. Decidido a analisar novamente os fatos do caso, o jurado número 8 não deve enfrentar apenas as difi culdades de interpretação dos fatos para achar a inocência do réu, mas também a má vontade e os rancores dos outros jurados, com vontade de irem embora logo para suas casas.

III — DINÂMICA DA AULA

Antes da aula cada aluno deverá entrevistar pessoas (professores e alunos de períodos mais avançados da FGV Direito Rio; ou de outras escolas; ou quelquer pessoa conhecida) preenchendo o seguinte questionário: (1) você conhece o princípio da presunção de inocência? (2) como defi niria esse prin-cípio? (3) você pode citar um exemplo concreto de aplicação prática desse princípio? (4) você concorda com a forma como essa garantia é aplicada pela justiça no Brasil?

Page 87: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 87

IV — LEITURA OBRIGATÓRIA

Artigo Th iago Bottino — O empate decide o jogo?

Page 88: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 88

Page 89: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 89

AULA 7 — PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (VEDAÇÃO DE AUTOINCRIMINAÇÃO)

I — INTRODUÇÃO

O direito ao silêncio ou garantia de vedação de auto-incriminação desem-penha um papel estruturante na construção de um sistema punitivo compa-tível com um Estado Democrático de Direito. Embora haja outras garantias igualmente fundamentais — tais como o juiz natural, o devido processo le-gal, o contraditório e a ampla defesa, a vedação de provas ilícitas, a presunção de inocência etc. —, o regime jurídico da auto-incriminação é crucial para a diferenciação entre dois modelos opostos de sistema punitivo: o modelo de-mocrático e o modelo autoritário. Mas qual o alcance do direito ao silêncio?

II — O CASO

Por iniciativa do Ministério da Justiça (com apoio do Ministério da Saú-de), a Polícia Rodoviária Federal lançou em maio de 2009 uma campanha para reforçar o conceito da Lei Seca ao volante em seu primeiro de ano de existência.

De acordo com a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), a utilização de bebidas alcoólicas é responsável por 30% dos acidentes de trânsito. E metade das mortes, segundo o Ministério da Saúde, está relacio-nada ao uso do álcool por motoristas. Diante deste cenário preocupante, a Lei 11.705/2008 surgiu com uma difícil missão: alertar a sociedade para os perigos do álcool associado à direção.

Existem vários métodos de detecção de alcoolemia. O mais popular é o teste do ‘bafômetro’, equipamento que identifi ca presença e quantidade de álcool no organismo a partir da análise do ar expelido pelos pulmões.

Neste sentido, surge o questionamento: fazer o teste do bafômetro é obri-gatório? O que pode ocorrer se a pessoa optar por não participar desse teste?

Page 90: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 90

Casos famosos

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2012/12/luciano-huck-tem-habilitacao-apreendida-em-blitz-da-lei-seca.html

O apresentador Luciano Huck foi parado em uma blitz da Lei Seca na ma-drugada deste domingo (2), na Avenida Niemeyer, em São Conrado, Zona Sul do Rio. Segundo a assessoria do governo do Estado do Rio, o apresenta-dor se recusou a fazer o teste do bafômetro e teve a Carteira Nacional de Ha-bilitação (CNH) apreendida. Huck também perdeu 7 pontos na carteira e foi multado em R$ 957,70. Como ele apresentou um condutor habilitado, o carro foi liberado. A infração é considerada gravíssima.

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2011/07/romario-tem-cartei-ra-apreendida-na-operacao-lei-seca-no-rio.html

O deputado federal e ex-jogador Romário (PSB-RJ) teve a carteira de ha-bilitação apreendida em uma blitz da Operação Lei Seca na madrugada deste domingo (10), na avenida Armando Lombardi, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. Segundo a assessoria do governo, Romário se recusou a fazer o teste do bafômetro e, por isso, teve a carteira suspensa por cinco dias e le-vou uma multa de R$ 957,70. Essa é segunda vez em que Romário se recusa a passar pelo bafômetro em uma blitz da Lei Seca. A primeira ocorreu em março de 2010.

http://oglobo.globo.com/rio/deputado-rodrigo-bethlem-multado-em-blitz-da-lei-seca-na-lagoa-6637118

O deputado federal Rodrigo Bethlem (PMDB-RJ) foi multado na noite de domingo, ao ser parado numa blitz da Operação Lei Seca, na Avenida Epitácio Pessoa, na Lagoa. O parlamentar estava sem a carteira de habilitação e, segundo a Secretaria estadual de Governo, se recusou a fazer o teste do bafômetro — ele nega. Pela recusa, a multa foi de R$ 957,70, com perda de sete pontos na carteira, já que se trata de infração gravíssima. Já a punição por não estar com a habilitação foi de R$ 53,20, três pontos a mais.

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2011/04/aecio-neves-tem-ha-bilitacao-apreendida-em-blitz-da-lei-seca-no-rio.html

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) teve a carteira de habilitação apre-endida por estar com o documento vencido e por se recusar a fazer o teste do bafômetro numa Operação Lei Seca na Avenida Bartolomeu Mitre, no Leblon, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Aécio foi parado na blitz na ma-drugada deste domingo (17). As informações são da Secretaria de Estado de Governo do Rio. De acordo com a Secretaria de Governo, Aécio Neves foi multado. O senador não teve o carro apreendido, pois apresentou um con-

Page 91: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 91

dutor habilitado, e foi liberado. A assessoria de imprensa de Aécio Neves in-formou que o senador não sabia que a carteira de habilitação estava vencida. De acordo com a assessoria, o tucano tinha saído da casa de amigos e voltava para sua residência, no Leblon, com a namorada. Ainda segundo a assessoria, os policiais reconheceram o senador e solicitaram a documentação, que foi imediatamente apresentada. Quando os policiais alertaram que a habilitação estava vencida, Aécio Neves disse que não sabia que estava vencida. A recusa do teste de bafômetro é considerada uma infração gravíssima, representa 7 pontos na carteira e vale multa de R$ 957. Dirigir com a carteira de habi-litação vencida também é uma infração gravíssima e representa 7 pontos. A multa de R$ 191,54.

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2012/10/pm-abre-sindican-cia-para-investigar-coronel-que-fugiu-da-lei-seca-no-rio.html

Na madrugada de sábado, 15 de setembro, o coronel Fernando Príncipe foi parado pela primeira vez pela Operação Lei Seca, durante blitz realizada na Praça do Ó, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio.Por ter se recusa-do a realizar o testo do bafômetro, teve a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) apreendida e recebeu multa de R$ 957,70, com perda de sete pontos na carteira. Por estar sem o cinto de segurança, Príncipe recebeu outra multa, de R$ 127,69, com perda de mais cinco pontos na carteira. O carro dele só foi liberado após uma motorista habilitada ter sido apresentada.

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2012/12/eri-johnson-tem-carteira-apreendida-em-blitz-da-lei-seca-no-rio.html

Mais um famoso teve a carteira de habilitação apreendida durante a blitz da Operação Lei Seca, neste fi m de semana, no Rio de Janeiro. O ator Eri Jo-hnson foi abordado pelos agentes, em uma fi scalização, na Avenida Sernam-betiba, na Barra da Tijuca. De acordo com a nota divulgada pelo governo do estado, neste domingo (2), ele se recusou a fazer o teste do bafômetro.

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2012/12/ator-kayky-brito-tem-habilitacao-apreendida-em-blitz-da-lei-seca.html

O ator Kayky Brito, de 24 anos, teve a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) apreendida, na madrugada deste domingo (2), após parado em uma blitz da Operação Lei Seca, na Avenida Lucio Costa, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. Por se recusar a fazer o teste do bafômetro, ele também perdeu 7 pontos na carteira, já que a infração é considerada gravíssima, e recebeu multa de R$ 957,70. Como o ator apresentou um condutor habili-tado, o carro dele foi liberado.

Page 92: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 92

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2012/07/dira-paes-tem-habi-litacao-apreendida-na-lei-seca-diz-governo-do-rj.html

A atriz Dira Paes teve a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) apreen-dida após se recusar a fazer o teste do bafômetro ao ser abordada por agentes, durante blitz da Operação Lei Seca, na madrugada deste sábado (28), na Zona Sul do Rio de Janeiro. A informação foi divulgada nesta segunda-feira (30) pela assessoria de imprensa do governo do estado. Ao se recusar ao passar pelo teste do etilômetro, além de ter a CNH apreendida, a atriz foi multada em R$ 957,70 e perdeu 7 pontos na carteira. A infração é considerada gra-víssima. O carro da atriz foi liberado após um condutor habilitado ter sido apresentado.

http://globoesporte.globo.com/futebol/times/vasco/noticia/2012/01/die-go-souza-do-vasco-tem-carteira-de-habilitacao-apreendida-na-lei-seca.html

O meia Diego Souza, do Vasco, teve a carteira de habilitação apreendida, na madrugada desta segunda-feira. Ele se recusou a fazer o teste do bafômetro em uma blitz da Operação Lei Seca, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, segundo informações do jornal “O Estado de São Paulo”. De acordo com a assessoria de imprensa do governo do Rio, o atleta foi liberado depois que um condutor habilitado se apresentou para levar o carro. Diego Souza levou sete pontos na carteira, além de uma multa de R$ 957,70.

http://oglobo.globo.com/rio/ex-chefe-de-policia-tem-carteira-apreendi-da-em-blitz-da-lei-seca-5654561

O ex-chefe da Polícia Civil do Rio, delegado Allan Turnowski, teve a car-teira de habilitação apreendida na noite de domingo, depois de ser parado numa blitz da Lei Seca. A notícia foi divulgada por Ancelmo Góis, em sua coluna, no GLOBO. Alan seguia pela Avenida Afonso Reidy, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, quando foi abordado. Allan se recusou a fazer o teste do bafômetro. Ele terá que pagar uma multa de R$ 957,60 e perdeu sete pontos na carteira.O carro do delegado foi liberado depois que um condutor habilitado se apresentou no local.

III — DINÂMICA DA AULA

O aluno deverá identifi car outras situações concretas de aplicação prática do princípio de vedação de autoincriminação.

Page 93: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 93

IV — LEITURA OBRIGATÓRIA

A BUSCA DA VERDADE NO PROCESSO PENAL E A OBTENÇÃO DE TECIDO HUMANO PARA FINS DE EXAME PERICIAL

Th iago Bottino. Carta Forense, 05 de outubro de 2010.(http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/obtencao-de-tecido-

humano-para-fi ns-de-exame-pericial/6067)

Quando se defi ne um determinado sistema processual penal, a caracte-rística que mais chama atenção diz respeito aos limites postos à busca da verdade. Pode-se dizer que quanto menor o número de limites na ativida-de investigatória do Estado, mais autoritário é o modelo penal e, de forma oposta, quanto maior o número de limites, mais democrático. Obviamente, essa afi rmação deve ser compreendida a partir da premissa de que tais limites somente se justifi cam quando protegem direitos fundamentais do indivíduo.

Em nome da busca da verdade, muitos ordenamentos previam a tortu-ra do suspeito. Esse modelo autoritário encontra defensores até hoje, cujos argumentos a favor da brutalização da autonomia individual em nome do “combate ao crime” vêm travestidos sob a roupagem da supremacia do bem comum sobre os direitos individuais. Nessa percepção, os direitos e garantias fundamentais funcionariam como “obstáculos ao funcionamento efi ciente do sistema”.

De outro lado, há quem prefi ra um modelo democrático de processo pe-nal, no qual os indivíduos (sejam culpados ou inocentes) não perdem a pro-teção jurídica da dignidade e têm assegurado o direito de defesa. É o reco-nhecimento de que não se pode exigir do indivíduo um comprometimento maior com a busca da verdade e a realização da justiça penal pelo Estado maior do que o comprometimento que tem — e deve ter — com sua própria liberdade.

Uma questão cada dia mais tormentosa que toca nesse debate diz respei-to à busca de provas no corpo do indivíduo que está sendo investigado. A obtenção compulsória de tecido humano violaria o direito de não se auto-incriminar? Criada pela Constituição de 1988 e consolidada pelo Supremo Tribunal Federal ao longo de sucessivos julgamentos, a vedação de auto-in-criminação já está incorporada à cultura jurídica nacional. São exemplos do exercício dessa garantia: (1) o direito de não responder perguntas e outras formas de inatividade (recusar-se a participar de reconstituição simulada da cena do crime, deixar de fornecer material gráfi co ou padrões vocais para exame pericial); e (2) o direito de negar falsamente a acusação, mentir ou mesmo utilizar malícia ao fornecer material gráfi co visando a prejudicar as conclusões do exame pericial. Esses comportamentos não acarretam piora na situação processual do acusado (aumento de pena, regime mais gravoso de

Page 94: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 94

execução), não confi guram crime de desobediência e tampouco podem justi-fi car a decretação de uma prisão cautelar.

Estabelecido esse conceito, a questão que se coloca é se haveria alguma restrição para obtenção de material corpóreo (DNA, sangue, tecido) do sus-peito. Em outras palavras: já que não se pode compelir o suspeito a fornecer material, seria possível obter esse material contra sua vontade? Algo como uma autorização judicial para coleta de sangue de um suspeito com a fi nali-dade de realizar um exame toxicológico ou genético?

O direito alemão prevê essa possibilidade (Art. 81-A do Código de Pro-cedimento Criminal), mas a Corte Européia de Direitos Humanos já anulou um julgamento baseado em prova obtida dessa forma, alegando que a vio-lência e brutalidade com que a prova foi colhida, apesar de não caracterizar um método de tortura, reviveu a lógica do sistema inquisitório, segundo o qual a prova da acusação deve provir do próprio acusado (Jalloh v. Germany, julgado em 11/07/2006). No caso, foi administrado um medicamento para que o suspeito regurgitasse as cápsulas de entorpecente que havia ingerido para ocultar da polícia.

Nos EUA, uma prova obtida de forma semelhante à de Jalloh também foi considerada ilícita (Rochin v. Califórnia, de 1952). Por outro lado, num caso envolvendo um acidente de trânsito, admitiu-se a coleta de sangue por médico no hospital, enquanto o suspeito estava inconsciente (Breithaupt v. Abram, de 1957, posteriormente confi rmado em Schmerber v. Califórnia, de 1966). O critério diferenciador foi a forma de obtenção que, no segundo caso, não “choca a consciência” nem ofende o “senso de justiça”. Mais recen-temente, no caso Winston v. Lee (1985), a Suprema Corte dos EUA proibiu a realização de uma cirurgia que seria realizada com anestesia geral para a retirada de um projétil para exame balístico, por considerar que a magnitude da intervenção constituiria uma medida desproporcional e violaria o devido processo legal.

No Brasil, houve poucos casos em que o Supremo Tribunal Federal foi cha-mado a se pronunciar sobre o tema. No Habeas Corpus nº 71.373 (1994), em que se discutia investigação de paternidade e a possibilidade de condução coercitiva do réu para a coleta de material genético e realização de exame de DNA, a Suprema Corte entendeu que tal medida era abusiva. Estabeleceu-se ali a doutrina da intangibilidade do corpo humano, como forma de preserva-ção da dignidade humana.

Em matéria penal, há o caso da cantora Gloria Trevi, que engravidou quan-do estava presa e alegou ter sido estuprada na carceragem da Polícia Federal. Um juiz atendeu ao pedido dos policiais suspeitos do crime e determinou o exame de DNA a partir de fi os de cabelo da criança, de células da mucosa oral, de sangue ou ainda da placenta. Por maioria, o Supremo Tribunal Fede-ral entendeu que a única intervenção possível seria na placenta, tecido morto

Page 95: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 95

que não pertencia mais ao corpo da mãe, nem da criança (Questão de Ordem na Reclamação nº 2040, julgada em 2002).

Pode parecer que uma amostra de sangue, saliva ou cabelo constitui uma intervenção mínima no indivíduo e que, portanto, deveria ceder ante o inte-resse na busca da verdade. Ocorre que esse é o primeiro passo para a criação de bancos de DNA de suspeitos e, posteriormente, de todo e qualquer cida-dão. E, ao contrário de fotos e impressões digitais, o DNA humano reúne uma quantidade enorme de informações extremamente íntimas que não de-vem estar à disposição de governos e, quiçá, de particulares. A ideia que ani-ma o direito de não produzir prova contra si e de preservar a intangibilidade do corpo humano é impedir que o Estado sucumba à tentação autoritária de buscar a prova do crime por meio do (ou no) sujeito acusado no processo, o que acabaria por reduzir o indivíduo à condição de objeto dos processos e ações estatais, ferindo-lhe a autonomia moral e a dignidade humana.

O debate sobre se a intangibilidade do corpo do indivíduo deve prevale-cer sobre a busca da prova penal admite diversos outros argumentos. Com a palavra, o leitor.

Page 96: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 96

AULAS 10, 11, 12, 13 E 14 — PREPARAÇÃO PARA O JÚRI SIMULADO

O CASO DOS DENUNCIANTES INVEJOSOSOrigem: Cadernos Colaborativos. (www.academico.direito-rio.fgv.br/

wiki/O_caso_dos_denunciantes_invejosos).

INTRODUÇÃO

O texto denominado “O caso dos denunciantes invejosos” é de autoria do professor estadunidense Lon Luvois Fuller, responsável pela cátedra de Teoria do Direito da Universidade de Harvard, nos EUA, entre 1940 e 1972. Fuller é autor do conhecido texto “O caso dos exploradores de cavernas”.

No texto dos “denunciantes invejosos”, Lon Fuller provoca nos leitores a discussão sobre as relações entre direito, moral e justiça a partir de um caso de um pequeno país fi ctício que, tendo vivido durante anos em relativa esta-bilidade política, sob um regime constitucional democrático, subitamente se vê em meio a uma grave crise econômica e distúrbios causados por confl itos entre diferentes grupos políticos, religiosos e econômicos.

Basicamente, a questão que se coloca diz respeito à existência de leis in-justas, à capacidade que o direito positivo tem de dissociar-se, às vezes, dos valores da sociedade e dos mandatos mais elementares de justiça. O problema apresentado por Fuller cinge-se ao tratamento que deve ser dispensado àque-les que obedeceram e se pautaram por essas regras. A difi culdade decorre da imposição de sanções ou reprimendas quando o “descompasso” entre o sen-timento do povo e a lei só surge depois de um longo período durante o qual a impressão que se tinha era que tais leis contavam com aprovação popular.

CONTEXTO JURÍDICO-POLÍTICO

Depois de anos vivendo pacifi camente num regime constitucional demo-crático, um pequeno país é tomado por uma grave crise política, econômica e institucional. Vários Grupos disputam o poder em meio ao sentimento de abandono e desespero da população. Ao fi nal de um processo eleitoral no qual não faltaram denúncias de irregularidades (ameaças, falsifi cações etc.), é eleito para o posto de Presidente da República o chefe do partido denomina-do “camisas-púrpuras”, considerado um verdadeiro salvador da pátria.

Os camisas-púrpuras também elegem a maioria dos representantes para a Assembleia Nacional. Não há mudanças na constituição ou as leis e são mantidas as eleições periódicas, numa aparente normalidade democrática. No entanto, instala-se um regime de terror no país.

Page 97: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 97

Juízes e funcionários que se recusassem a aceitar os abusos do governo são ameaçados, agredidos ou assassinados. O governo não respeita as leis existen-tes e nem aquelas que ele próprio edita. Opositores políticos são cassados e partidos políticos suprimidos. São criados regulamentos secretos e legislações de exceção.

Promulga-se uma lei concedendo anistia a todos que “tivessem cometidos atos em defesa da pátria”, por meio da qual todos os partidários dos camisas-púrpuras que estavam presos são libertados. De outro lado, são criadas leis retroativas para punir os inimigos do regime, ou ainda conferidas interpre-tações perniciosas às leis com a fi nalidade de encarcerar todos aqueles que representem uma ameaça aos planos de poder dos camisas-púrpuras.

Após anos de dominação, os camisas-púrpuras são derrotados e novamen-te instala-se um regime constitucional e democrático. Vários problemas de-correntes dos anos de desmando e terror devem ser enfrentados. Um deles é o problema dos denunciantes invejosos.

O CASO DOS DENUNCIANTES INVEJOSOS

Aproveitando-se do clima de perseguição e terror implantado pelos cami-sas-púrpuras, muitas pessoas denunciaram seus desafetos às autoridades mo-vidas exclusivamente por inveja. Um desses casos foi o de um sujeito que se enamorou por uma moça casada e decidiu denunciar o marido desta por um delito absolutamente banal, mas que fez com que o marido fosse processado e condenado à pena de morte.

Eram duramente punidas várias espécies de condutas, entre elas a críti-ca ao governo ou ao partido, mesmo em conversas particulares; a escuta de transmissões radiofônicas estrangeiras; a omissão de informar a perda de do-cumentos no prazo de cinco dias; a posse de saquinhos de ovo em pó em quantidade superior à permitida etc. Em alguns casos, as penalidades extre-mamente duras estavam autorizadas por regulamentos emergenciais; em ou-tros casos, eram decorrentes da decisão de juízes regularmente constituídos. Essas denúncias levaram a penas de prisão e até mesmo à pena de morte.

A RESTAURAÇÃO DA DEMOCRACIA

Felizmente, o regime dos camisas-púrpuras foi desmantelado e a demo-cracia restaurada. Contudo, criou-se um problema político prestes a infl amar os ânimos da população: o que fazer com aqueles denunciantes que agiram movidos por interesse pessoal, reportando crimes que levaram pessoas à mor-

Page 98: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 98

te? A população clama pela punição dos denunciantes invejosos e a tarefa de decidir o que fazer coube a um júri de notáveis, dentre os quais está você.

Foi designado um julgamento para a próxima 3ª feira, dia 04/junho, às 11hs. Um grupo apresentará razões de acusação e outro grupo sustentará as teses de defesa. Caberá aos jurados simplesmente votar “sim” ou “não” para a seguinte pergunta:

OS DENUNCIANTES INVEJOSOS DEVEM SER PUNIDOS CRIMINALMENTE?

Page 99: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 99

THIAGO BOTTINOGraduado em Direito pela Universidade Federal do Estado do Rio de Ja-neiro (1999), Mestre (2004) e Doutor (2008) em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Professor Adjunto da Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas e Coordenador do Curso de Graduação em Direito. Leciona as disciplinas Crime e Socieda-de, Direito Penal Econômico e Direito Processual Penal na Graduação e na Pós-Graduação lato sensu. É professor do curso de mestrado em Direito e Regulação, lecionando a disciplina Refl exos Penais da Re-gulação Econômica. Membro efetivo do IAB onde integra a Comissão Permanente de Direito Penal. Coordenou projeto de pesquisa sobre as medidas cautelares no Processo Penal em parceria com o Ministério da Justiça e com fi nanciamento do PNUD (base para o PL nº 2902/2011, em tramitação na Câmara dos Deputados). Integrou a Comissão de Exa-me de Ordem da OAB/RJ e a Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ, tendo recebido a Medalha Chico Mendes oferecida pelo Grupo Tortura Nunca Mais/RJ por sua atuação nesse período. Autor de livros e arti-gos sobre Direito Penal e Processual Penal, tendo proferido palestras no Brasil e no exterior (Alemanha, França e Índia). Link para o currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3134056986747443

COLABORADORESColaboraram na elaboração dessa apostila em 2013 a ex-aluna Paloma Caneca (Turma 2006.2) e o aluno da Graduação Arthur Lardosa dos San-tos, 3º período (Turma 2012.1).

Page 100: CRIME E SOCIEDADE 2013-1.pdf

CRIME E SOCIEDADE

FGV DIREITO RIO 100

FICHA TÉCNICA

Fundação Getulio Vargas

Carlos Ivan Simonsen LealPRESIDENTE

FGV DIREITO RIO

Joaquim FalcãoDIRETOR

Sérgio GuerraVICE-DIRETOR DE ENSINO, PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

Rodrigo ViannaVICE-DIRETOR ADMINISTRATIVO

Thiago Bottino do AmaralCOORDENADOR DA GRADUAÇÃO

Marília AraújoCOORDENADORA EXECUTIVA DA GRADUAÇÃO

Cristina Nacif AlvesCOORDENADORA DE ENSINO

Andre Pacheco MendesCOORDENADOR DO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

Paula SpielerCOORDENADORA DE ATIVIDADES COMPLEMENTARES E DE RELAÇÕES INSTITUCIONAIS