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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO LUIZ GUSTAVO GONÇALVES BRETAS FERREIRA CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA ANÁLISE LONGITUDINAL DAS EMPRESAS BOTICÁRIO E NATURA Mestrado em Administração Orientadora: Denise Lima Fleck, Ph.D. Rio de Janeiro 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO

LUIZ GUSTAVO GONÇALVES BRETAS FERREIRA

CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA ANÁLISE LONGITUDINAL DAS EMPRESAS BOTICÁRIO E NATURA

Mestrado em Administração

Orientadora: Denise Lima Fleck, Ph.D.

Rio de Janeiro

2009

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Luiz Gustavo Gonçalves Bretas Ferreira

CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA ANÁLISE LONGITUDINAL DAS EMPRESAS BOTICÁRIO E NATURA

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto Coppead de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Administração (M.Sc.).

Orientadora: Denise Lima Fleck, Ph.D.

Rio de Janeiro

2009

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FICHA CATALOGRÁFICA

Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas

Crescimento saudável e sustentabilidade: Uma análise longitudinal das empresas Boticário e Natura. / Luiz Gustavo Gonçalves Bretas Ferreira – Rio de Janeiro, 2009.

174 fl.: il

Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Instituto COPPEAD de Administração, 2009.

Orientador: Denise Lima Fleck

1. Responsabilidade Social. 2. Sustentabilidade. 3. Crescimento da Firma – Teses. I. Fleck, Denise Lima (Orientadora). II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração. III. Crescimento saudável e sustentabilidade: Uma análise longitudinal das empresas Boticário e Natura.

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RESUMO

Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas. Crescimento saudável e

sustentabilidade: Uma análise longitudinal das empresas Boticário e Natura.

Dissertação (Mestrado em Administração) – Instituto COPPEAD de

Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2009.

O presente estudo buscou, utilizando a história da Natura e de O

Boticário, contribuir para o entendimento da forma com que as empresas

incorporam, ao longo de sua trajetória, atitudes relacionadas à

Responsabilidade Social Corporativa – RSC e à Sustentabilidade nos

Negócios. Além disso, o trabalho procurou analisar os possíveis impactos da

incorporação dessas atitudes na propensão das empresas ao crescimento.

Para qualificar a forma de uma empresa atuar de modo sócio-

ambientalmente responsável, foram propostas duas abordagens com base na

literatura sobre o tema. A primeira abordagem foi utilizada para caracterizar

empresas que incorporam atitudes sócio-ambientalmente responsáveis de

forma reativa ao ambiente externo, condicionadas à existência de lucros e não

relacionada com as suas operações . A segunda abordagem foi utilizada para

definir firmas que incorporam essas atitudes independentemente do ambiente

externo e com o intuito de tornar suas atividades mais aderentes ao

desenvolvimento sustentável do planeta.

Para se entender em que medida a incorporação das atitudes ligadas à

RSC favorecem o crescimento de uma empresa, foi utilizado o Modelo de Fleck

(2006). Cada condição necessária ao crescimento saudável da firma proposta

pelo referido Modelo teve seus aspectos relacionados às duas abordagens.

A pesquisa histórica longitudinal realizada demonstrou que, pelo que

pôde ser observado na trajetória da Natura e de o Boticário, há indícios de que

atitudes ligadas a RSC incorporadas de forma independente, sistemática e

relacionada às operações da empresa são mais condizentes com os aspectos

necessários ao crescimento saudável das empresas. Também pôde ser visto

que, muitas vezes, esses aspectos necessários ao crescimento inerentemente

contribuem para uma postura sustentável da empresa.

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ABSTRACT

Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas. Crescimento saudável e

sustentabilidade: Uma análise longitudinal das empresas Boticário e Natura.

Dissertação (Mestrado em Administração) – Instituto COPPEAD de

Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2009.

The present study, based on the history of Natura and O Boticario,

intends to understand the way in which companies incorporate throughout its

history, attitudes towards Corporate Social Responsibility - CSR. In addition, the

study analyzed the possible impacts of the incorporation of CRS on the growth

propensity of companies.

In order to qualify the way that companies act in issues related with CSR,

two ideal types have been developed in this research. The first ideal type was

based on companies that incorporate CSR attitudes and actions responding

only to its external pressures, subjected to the existence of profits and unrelated

to their business. The second approach was used to define firms that

incorporate these attitudes regardless of the external environment in order to

make their activities more responsive to development of the planet.

To analyze the relation between business growth and incorporation of

CSR attitudes, Fleck’s (2006) model of arquetypes of success and failure was

used. Each condition required for the healthy growth of the firm proposed by the

model had its aspects related to the two ideal types.

The Historical research and the longitudinal analysis have shown that,

based on what could have been observed in the trajectory of the Natura and

Boticario, when CSR actions were related to the company's activities soma

aspects of healthy growth of companies were stimulated. Besides, generally the

aspects that were taken as necessary for growth intrinsically underpin the type

of CSR more concerned with the sustainability of the planet.

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 3. 1 – DISTRIBUIÇÃO TEMPORAL DOS FATOS E EVENTOS .............................................................................. 58

GRÁFICO 4.1 – RESULTADO INTERNACIONAL DA NATURA 1993-1998 ........................................................................ 81

GRÁFICO 4.2 – EVOLUÇÃO DO LUCRO OPERACIONAL NATURA 1993-1998 ................................................................ 82

GRÁFICO 4.3 – ENDIVIDAMENTO DA NATURA 2001-2003 ........................................................................................... 94

GRÁFICO 5.1 – NATURA: ATITUDES/INICIATIVAS PERTINENTES À DIMENSÃO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO .................... 128

GRÁFICO 5.2 – BOTICÁRIO: ATITUDES/INICIATIVAS PERTINENTES A DIMENSÃO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO................ 133

GRÁFICO 5.3 – NATURA: ATITUDES/INICIATIVAS PERTINENTES A DIMENSÃO DO INVESTIMENTO ............................... 136

GRÁFICO 5.4 – BOTICÁRIO: ATITUDES/INICIATIVAS PERTINENTES A DIMENSÃO DO INVESTIMENTO ........................... 138

GRÁFICO 5.5 – NATURA: ATITUDES/INICIATIVAS PERTINENTES A DIMENSÃO DA INSERÇÃO DE VALORES.................. 142

GRÁFICO 5.6 – BOTICÁRIO: ATITUDES/INICIATIVAS PERTINENTES A DIMENSÃO DA INSERÇÃO DE VALORES ............. 145

GRÁFICO 5.7 – NATURA: VENDAS/PIB ...................................................................................................................... 169

GRÁFICO 5.8 – BOTICÁRIO: VENDAS/PIB .................................................................................................................. 170

GRÁFICO 5.9 – NATURA X BOTICÁRIO: VENDAS/PIB ................................................................................................. 170

LISTA DE EQUAÇÕES

EQUAÇÃO 3.1 – CURVA DE CRESCIMENTO ................................................................................................................... 60

LISTA DE QUADROS

QUADRO 2.1 – DIMENSÃO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO ................................................................................................... 27

QUADRO 2.2 – DIMENSÃO DO INVESTIMENTO .............................................................................................................. 28

QUADRO 2.3 – DIMENSÃO DA INSERÇÃO DE VALORES ................................................................................................ 30

QUADRO 2.4 - OS CINCO DESAFIOS ORGANIZACIONAIS PARA A PROPENSÃO À AUTOPERPETUAÇÃO........................... 33

QUADRO 2.5 – RESUMO DA RELAÇÃO ENTE OS DESAFIOS E A ABORDAGEM “A” ......................................................... 37

QUADRO 2.6 – RESUMO DA RELAÇÃO ENTE OS DESAFIOS E A ABORDAGEM “B” .......................................................... 41

QUADRO 3.1 – PRINCIPAIS DOCUMENTOS UTILIZADOS E TABULADOS........................................................................... 51

QUADRO 3.2 – RELAÇÃO DAS PRONUNCIAÇÕES DE LÍDERES DA EMPRESA UTILIZADAS NA ANÁLISE............................. 54

QUADRO 3.3 – RELAÇÃO ENTREVISTAS NA NATURA E BOTICÁRIO ............................................................................. 56

QUADRO 3.4 – TRECHO DA TABELA DE ORGANIZAÇÃO DOS FATOS .............................................................................. 57

QUADRO 3.5 – TRECHO DA TABELA DE ORGANIZAÇÃO DE DADOS QUANTITATIVOS ...................................................... 57

QUADRO 5.1 – DIMENSÃO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO: ANÁLISE DAS ATITUDES/INICIATIVAS DA NATURA .................... 132

QUADRO 5.2 – DIMENSÃO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO: ANÁLISE DAS ATITUDES/INICIATIVAS DO BOTICÁRIO ............... 135

QUADRO 5.3 – DIMENSÃO DO INVESTIMENTO: ANÁLISE DAS ATITUDES/INICIATIVAS DA NATURA ............................... 138

QUADRO 5.4 – DIMENSÃO DO INVESTIMENTO: ANÁLISE DAS ATITUDES/INICIATIVAS DO BOTICÁRIO........................... 140

QUADRO 5.5 – DIMENSÃO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO: ANÁLISE DAS ATITUDES/INICIATIVAS DA NATURA .................... 144

QUADRO 5.6 – DIMENSÃO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO: ANÁLISE DAS ATITUDES/INICIATIVAS DO BOTICÁRIO ............... 147

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Sumário

1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................................9

1.1 Objetivos detalhados........................................................................................................................12

2. REVISÃO DE LITERATURA ..............................................................................................................14

2.1 Responsabilidade social: Introdução das abordagens “B” e “A”.....................................................14

2. 1.1 Abordagem “A” Foco nas ações socialmente responsáveis..................................................17

2.1.2 Abordagem “B”: Foco nos valores do desenvolvimento sustentável......................................20

2.1.3 Diferenciando as abordagens (Modelo 3-In)...........................................................................23

2.2 Crescimento da firma a propensão a auto-perpetuação....................................................................30

2.2.1 Os desafios do crescimento de Fleck (2006)...........................................................................32

2.3 A relação entre os desafios da auto-perpetuação e as abordagens “A” e “B”..................................36

2.3.1 Abordagem “A” e os cinco desafios........................................................................................36

2.3.2 Abordagem “B” e o cinco desafios..........................................................................................41

3. MÉTODO...............................................................................................................................................47

3.1 Descrição da pesquisa......................................................................................................................47

3.2 Níveis de análises ............................................................................................................................48

3.3 Caracterização da pesquisa ..............................................................................................................49

3.4 Coleta e preparação dos dados.........................................................................................................50

3.4.1 Dados coletados.......................................................................................................................51

3.4.2 Preparação dos dados.............................................................................................................56

3.5 Técnicas de análise de dados ...........................................................................................................58

4. HISTÓRICO DAS EMPRESAS ............................................................................................................61

4.1 Natura ..............................................................................................................................................61

4.2 O Boticário ......................................................................................................................................97

5. RESULTADOS....................................................................................................................................127

5.1 Associação das empresas às abordagens........................................................................................127

5.1.1 Quanto à Dimensão da Institucionalização...........................................................................127

5.1.2 Quanto à Dimensão do Investimento.....................................................................................135

5.1.3 Quanto à dimensão da Inserção de Valores..........................................................................141

5.1.4 Associação geral....................................................................................................................147

5.2 Relação entre os desafios do crescimento e os comportamentos ligados à RSC e a sustentabilidade

.............................................................................................................................................................149

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................................................155

6.1 Conclusões.....................................................................................................................................155

6.1.1 O modelo das abordagens “A” e “B”...................................................................................155

6.1.2 A relação entre o crescimento saudável e as Abordagens.....................................................156

6.2 Sugestão para pesquisas futuras.....................................................................................................158

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................................................159

ANEXOS..................................................................................................................................................167

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1. INTRODUÇÃO

De maneira geral, cresce no Brasil e no mundo a preocupação com a

Responsabilidade Social Corporativa (RSC), tanto em trabalhos acadêmicos

quanto nas organizações. Muitos têm sido os motivos apontados para a

necessidade de se pensar e refletir sobre o tema, mas ainda não se chegou a

um consenso sobre o que exatamente seria tal responsabilidade, nem como

deveria ser implementada ou mensurada nos cálculos gerais das organizações

(ASHLEY; 2005; p. 77). Além disso, o contexto da Responsabilidade Social é

dinâmico porque o mix ideal de objetivos das empresas e da sociedade co-

evoluem ao longo do tempo. (WHETHER e CHANDLER; 2006; p. 18). Mas é

consenso atualmente que, se algum negócio procura criar valor no longo prazo,

é necessária uma perspectiva responsável com o meio ambiente e a força de

trabalho (HAWKINS; 2006; p. 43).

Esse fato tem se agravado, pois novas demandas da sociedade têm

surgido. Isso aumenta os desafios das empresas preocupadas com a

longevidade e faz, de acordo com Andrews (1973), com que os gestores

necessitem de mais competência e de mais ética. De acordo com Hawkins

(2006; p. 145), à medida que aumentam as pressões para tornar públicas as

políticas e práticas sustentáveis e de RSC, os stakeholders se sentem no

direito de julgar a performance socioambiental das empresas. Assim, as idéias

acerca de responsabilidade social corporativa e desenvolvimento sustentável

nos negócios fazem emergir uma complexidade maior no contexto no qual as

empresas estão inseridas.

De acordo com May, Cheney e Roper (2007; p. 9), a discriminação clara

das idéias e visões que circundam a responsabilidade social é importante para

entender a complexidade inerente à ética nos negócios em múltiplos contextos

e, assim, poder explorar as ações responsáveis e irresponsáveis das

empresas, bem como as iniciativas que são utilizadas, formuladas ou

suspendidas. Campbell (2007; p. 951) ainda ressalta que se deve ter cuidado

ao lidar com comportamentos socialmente responsáveis das empresas porque

o termo pode significar coisas diferentes, dependendo do contexto. A

responsabilidade social corporativa possui várias das características dos

modismos gerenciais (ZORN e COLLINS; 2007; p. 410) e por isso deve ser

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encarada com cautela. Existem várias visões acerca do tema e elas devem ser

consideradas para que se possa entender melhor o porquê da adoção da

responsabilidade social e de comportamentos em prol do desenvolvimento

sustentável.

Ashley (2005; p. 2) afirma que uma empresa socialmente responsável é

aquela que está atenta para lidar com as expectativas de seus stakeholders

atuais e futuros. Essa definição incorpora a idéia de sustentabilidade nos

negócios, mas normalmente o desenvolvimento sustentável corporativo e a

RSC são tratados de maneiras distintas. Cada uma das visões engloba

desafios diversos, contribuindo de maneira diferente para a sobrevivência da

organização e seu crescimento saudável.

Windsor (2006) defende que a falta de consenso entre as diferentes

perspectivas acerca de RSC somente nos permite comparar diferentes visões.

Partindo dessa idéia, este trabalho propõe duas visões distintas acerca da RSC

e explora a contribuição de cada uma delas na sobrevivência da organização

no longo prazo.

A primeira visão é calcada no argumento econômico para a

responsabilidade social, que defende a idéia que valor é adicionado à empresa

através da RSC, pois ela revela as preocupações e as necessidades dos vários

stakeholders da firma (WHETHER e CHANDLER; 2006; p. 18). Essa visão

possui uma lógica instrumental focada nas ações estratégicas com os

stakeholders organizacionais. Além disso, embora a abordagem seja permeada

por ética e transparência, a RSC sob essa perspectiva possui cunho

estratégico e coloca eficácia organizacional como objetivo final. Ela evoca

questões como a gestão do risco, a imagem corporativa e a atratividade para

investidores. Essa abordagem alinha-se com a idéia de Hawkins (2006; p. 156),

que entende que o papel RSC é remoldar as ações da empresa.

A segunda abordagem, mais relacionada com o desenvolvimento

sustentável do planeta terra, vai mais além, considerando todos os níveis

organizacionais. Essa segunda visão parte da idéia de que as formas atuais de

produção estão ameaçando os recursos que garantem a qualidade de vida das

pessoas no planeta (STEAD e STEAD; 2004; p. 9). Stead e Stead (2004; p. 36)

afirmam que a implementação de um desenvolvimento sustentável requer que

as filosofias e valores das empresas sejam consistentes com a causa. Assim, a

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segunda visão está ligada ao enraizamento de valores e não na mudança de

ações. De acordo com Willard (2006; p. 141), para alcançar o desenvolvimento

sustentável é importante uma mudança cultural na organização. Essa mudança

nos valores empresarias garantiriam à organização um comportamento ético

com seus Stakeholders, uma conduta socialmente aceita e o comprometimento

da organização com a sustentabilidade da empresa e do planeta.

Assim, essas duas perspectivas têm focos de ações distintos. A

primeira, que focaliza nas ações socialmente responsáveis e nos benefícios

que essas ações podem trazer para a organização será chamada de

abordagem “A”. A segunda, que atua na mudança de valores e da cultura para

que o crescimento da organização envolva práticas sustentáveis de gestão

será chamada de abordagem “B”. As abordagens trabalhadas podem ser

entendidas como tipos ideais opostos que, apesar de não representarem

exatamente a realidade, ajudam a compreender como é a postura da empresa

em relação a questões ligadas a Responsabilidade Social.

O crescimento saudável não é uma abordagem convencional para

mensurar o desempenho das empresas, apesar de Chandler (1990; p. 138)

destacar o crescimento como um objetivo básico das empresas. Como afirma

Deetz (2007; p. 269), a utilização de indicadores de curto prazo em vez do

crescimento para valorizar a empresa coloca, normalmente, o lucro como

atividade fim e não como um meio para a sustentabilidade de um negócio.

Sendo o foco da responsabilidade social corporativa a longevidade de uma

organização, o crescimento saudável se mostra um indicador coerente para

mensurar as vantagens e desvantagens de adotar as práticas de RSC e de

sustentabilidade. Outro argumento em favor da utilização do crescimento das

organizações como medida de desempenho é ressaltado por Starbuck (1965;

p. 165), que afirma que o crescimento da firma não é um evento randômico e

único. Assim, diferente do lucro em um exercício ou de uma súbita valorização

das ações frente a eventos extraordinários, o crescimento é fruto do

comprometimento organizacional com a sobrevivência no longo prazo.

Apesar da adequabilidade da utilização do crescimento contínuo e

saudável da organização, para ser analisado à luz das abordagens da

responsabilidade social da empresa e do desenvolvimento sustentável, a

utilização desse construto deve ser feita com cautela. A dificuldade de se

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estudar o crescimento continuado e saudável das empresas emerge de

diversos aspectos.

O crescimento saudável está ligado à capacidade da firma de se

perdurar e crescer continuamente. Além disso, quando se busca entender um

processo de crescimento, é difícil estabelecer relações causais, que impliquem

condições necessárias e suficientes entre dois eventos (FLECK, 2003; p. 11).

O presente trabalho busca responder "De que maneira diferentes

atitudes sócio-ambientalmente responsáveis podem af etar o

desenvolvimento de uma propensão ao crescimento sau dável e à

autoperpetuação da organização? " Deve-se lançar mão de um modelo que

considere as particularidades do crescimento das organizações. Assim, far-se-

á uso do modelo desenvolvido por Fleck (2009), que considera os desafios do

crescimento contínuo e as possíveis respostas organizacionais às condições

necessárias para uma empresa se auto-perpetuar ao longo do tempo.

Cada desafio é fundamentado em elementos trans-históricos do

processo de crescimento das empresas. Os desafios devem ser respondidos

adequadamente para que a organização seja capaz de crescer continuamente

e se perpetuar. A resposta adequada a esses desafios permitiria que a

organização crescesse, se renovasse e não se fragmentasse, sendo essas as

condições necessárias e não suficientes para a perpetuação da organização no

longo prazo.

Utilizando tal modelo poder-se-á identificar como as duas abordagens de

responsabilidade social são capazes de contribuir para que a empresa se

perpetue. A fim de entender tal relação, foi preciso eleger empresas para

análise empírica, que estejam comparativamente avançadas nas práticas de

gestão ligadas à responsabilidade social e ao desenvolvimento sustentável nos

negócios.

1.1 Objetivos detalhados

• Contribuir para o entendimento da RSC, desenvolvendo duas

abordagens sobre o tema.

• Entender potenciais impactos das características de uma RSC do tipo

“A” na trajetória de crescimento das empresas estudadas.

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• Entender potenciais impactos das características de uma RSC do tipo

“B” na trajetória de crescimento das empresas estudadas.

• Propor relações entre os dois tipos de RSC desenvolvidos e os desafios

para o crescimento saudável.

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2. REVISÃO DE LITERATURA

A primeira seção do capítulo de revisão de literatura aborda a

responsabilidade social e os dois tipos ideais propostos no trabalho. Os “Tipos

Ideais”, termo atribuído à Max Weber, tem o intuito de expor um determinado

curso de ação baseado nas propriedades essenciais de certos fenômenos

sociais (OLIVEIRA, 2008; p. 8). O tipo ideal, surgiu nos do sociólogo para

subsidiar seus estudos históricos comparativos com o intuito de entender a

economia moderna e a ordem social associadas ao capitalismo (WEBER,

1964; p. 4). Um tipo ideal é uma ferramenta analítica que reflete um tipo puro

de um fato ou conjuntos de fatos sociais, não podendo ser encontrado na

realidade.

A necessidade de se criar os tipos idéias surgiu diante da complexidade

inerente à forma das empresas praticarem a Responsabilidade Social

Corporativa. Acredita-se que, com a utilização dos tipos ideais propostos, será

possível estabelecer associações entre o padrão de comportamento percebido

na realidade das empresas estudadas e a sua forma de atuar no Âmbito da

RSC. As duas abordagens que serão descritas ao longo da primeira sessão

deste capítulo visam sintetizar idéias antagônicas em dois tipos opostos.

2.1 Responsabilidade social: Introdução das abordag ens “B” e “A”

Apesar de responsabilidade social ser um assunto que existe há

décadas, apenas agora está sendo reconhecido como um campo de estudos

dentro da administração (FREEMAN e HARRISON, 1991). Segundo Duarte e

Dias (1986) e Hay, Gray e Smith (1989), em 1953, Howard Bowen, com o

lançamento do livro “Responsibility of the Businessman”, criou o termo

responsabilidade social para denominar as atividades que os gestores de

negócios deveriam conduzir para manter as empresas em consonância com os

objetivos e valores da sociedade.

O conceito evoluiu, mas, apesar dos vários debates promovidos sobre o

tema ao longo dos anos em diferentes contextos, ele ainda encontra-se em

processo de consolidação, acarretando interpretações distintas, tanto por parte

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dos gestores quanto por parte de acadêmicos. De acordo com Carlisle e

Faulkner (2004), os conceitos atuais derivam do conceito formulado por Carrol

(1979), que propôs um modelo piramidal que divide a Responsabilidade Social

nas quatro categorias apresentadas abaixo, que vão da base ao topo da

pirâmide:

• Responsabilidade econômica: produção de bens e serviços que sejam

necessários à sociedade e que garanta a sobrevivência da empresa.

• Responsabilidade legal: espera-se que as empresas alcancem seus

objetivos e, ao mesmo tempo, observem a estrutura e exigências legais

promulgadas pelo governo federal, estadual e local.

• Responsabilidade ética: envolve comportamentos ou atividades que a

sociedade espera das empresas. Os responsáveis pela tomada de

decisão devem agir com equidade, justiça e imparcialidade, respeitando

os direitos individuais.

• Responsabilidade filantrópica: envolve as ações voluntárias das

empresas no sentido de promover o bem-estar humano e contribuir para

projetos sociais ou instituições benevolentes.

Além de servir de base para conceitos atuais, a Pirâmide de Carrol

(1979) permitiu a ampliação do conceito de responsabilidade social, assim

como uma visão evolucionária da responsabilidade social, na qual a empresa

evolui de uma empresa que apenas cumpriria os requisitos legais e

econômicos para uma empresa em consonância com os vários públicos que

afetam ou são afetados por ela. De acordo com Carlisle e Faulkner (2004),

várias empresas começam com uma atuação estreita, que vai se ampliando ao

longo do tempo.

De acordo com Windsor (2006), a falta de consenso entre as diferentes

perspectivas acerca da responsabilidade social corporativa somente nos

permite comparar as diferentes visões. Para o autor, existem visões que tentam

simplificar a RSC abordando-a sob uma perspectiva meramente econômica,

que associa as ações de responsabilidade social com o retorno financeiro ou

com a valorização das ações da empresa.

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Como empresas são criações sociais cuja sobrevivência depende do

apoio da sociedade (REICH, 1998), essa ótica puramente econômica não

consegue captar a complexidade inerente às emergentes demandas da

sociedade. De acordo com Duarte e Dias (1986; p. 38), a sociedade está

exigindo uma redefinição do papel social da empresa. Atualmente, o ambiente

dos negócios é definido pelo aumento das demandas da sociedade (STEAD e

STEAD, 2004; p. 72). Isso trouxe uma série de novas abordagens sobre a

responsabilidade social, como a idéia de que as empresas devem cumprir um

papel importante no desenvolvimento sustentável do planeta na preservação

dos recursos naturais para as gerações futuras.

De acordo com Bullis e Le (2007; p. 327), o desenvolvimento ligado à

sustentabilidade pode ser entendido como a mais idealista das perspectivas,

pois sugere a existência de uma ideologia interna em que a organização deve

trabalhar para o desenvolvimento de um mundo ecologicamente sustentável. A

responsabilidade social, sob essa ótica, também se fundamenta nas relações

éticas e transparentes com todos os stakeholders, mas uma abordagem focada

na sustentabilidade requer uma reformulação da teoria dos stakeholders que

reconheça o planeta terra como o stakeholder primordial (STEAD e STEAD,

2004; p. 73).

Assim, essa visão mais voltada para o desenvolvimento sustentável do

planeta – “B” – se distingue de uma abordagem mais instrumental, que visa

entender os custos e benefícios da RSC. Essa segunda visão, ou abordagem –

“A” – não é nem uma visão puramente econômica nem puramente filantrópica,

sendo focada nas ações das empresas para atender as necessidades de seus

públicos interessados à medida que elas vão aparecendo (WINDSOR, 2006).

Whether e Chandler (2006; p. 18) entendem que a visão de todos os

stakehoders da firma é importante, pois ajuda a balancear os interesses

divergentes na formação de políticas empresarias.

Sob essa mesma abordagem, de acordo com Clarke e Gibson-Sweet

(1999), a RSC também pode ser entendida como meio de garantir legitimidade

e gerenciar a reputação da corporação. Isso ocorre porque a legitimidade de

uma organização pode ser entendida de várias formas, inclusive sob uma ótica

mais pragmática que envolve ações diretas da empresa para melhorar sua

imagem frente a seus públicos (SUCHMAN, 1995).

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17

As duas visões introduzidas não buscam esgotar as possibilidades de

entendimento da responsabilidade social e do desenvolvimento sustentável.

Elas foram escolhidas por possuírem focos diferentes quanto à forma de

trabalhar a responsabilidade dentro da empresa além de ambas serem

consideradas adequadas e benéficas por seus defensores. As sessões

seguintes buscam aprofundar cada uma delas.

2. 1.1 Abordagem “A” Foco nas ações socialmente re sponsáveis

A abordagem “A” é uma abordagem de responsabilidade social ligada

aos riscos inerentes ao não engajamento em ações socialmente responsáveis.

Esses riscos, na visão de Hawkins (2006; p. 125), permitem que as

organizações definam suas ações de responsabilidade social de forma mais

adequada. A questão dos riscos é extremamente importante para as empresas

que adotam uma abordagem “A”, pois, de acordo com Duarte e Dias (1986; p.

73), a delimitação do campo de atuação é complicada. Para tal estudo é

importante que o risco seja entendido, como define Penrose (2006; p. 105),

como os possíveis resultados de uma ação, especialmente no que se refere às

perdas que se pode incorrer com a prática desta ação.

Essa abordagem aceita também, como proposto por Whether e

Chandler (2006; p. 45), que quanto maior o impacto de uma empresa na

sociedade, mais importante é a migração da consideração de um leque estreito

de stakeholders para uma gama mais ampla e abrangente. Assim, defende

também uma abordagem contingencial para responsabilidade social

corporativa, que invoca as diferenças na competição das indústrias e as

possíveis estratégias a serem adotadas pelas empresas, em vez de uma

verdade global sobre a forma como a responsabilidade social deve ser adotada

(VAN DE VEN e JEURISSEN, 2005; p. 315). De acordo com Duarte e Dias

(1986; p. 77), a definição das áreas de engajamento da empresa demanda uma

racionalidade que deve levar em conta o contexto particular, as características

e a gravidade do problema.

Ações de responsabilidade social, dentro dessa linha “A”, devem deixar

claro qual público interessado motivou os esforços. Sendo assim, a análise dos

Stakeholders é um fator determinante para identificação das audiências chaves

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que impulsionarão os esforços de RSC. Essa idéia, apresentada por Clarke e

Gibson-Sweet (1999), chama atenção para um aspecto crucial dessa

abordagem: a análise dos stakeholders da organização. As empresas precisam

assegurar que suas ações não contradigam as expectativas desses públicos

(WHETER e CHANDLER, 2006; p. 26). Entretanto, os mesmos autores (2006;

P 25) assumem que, muitas vezes, os stakeholders estão dispostos a ignorar

comportamentos não sustentáveis quando outras questões exercem maiores

pressões.

Na literatura, encontram-se vários tipos de definição para o termo

Stakeholders, que variam em termos de sua abrangência (FRIEDMAN e

MILES, 2007; p. 4). Uma definição mais estreita, que classifica os Stakeholders

como os grupos que são vitais para a sobrevivência e sucesso da organização

(GREENWOOD, 2001), é mais coerente com a abordagem “A”. É necessário

entender que cada organização possui diferentes stakeholders e é influenciada

por cada grupo deles de uma maneira diferente (ROWLEY, 1997) e que cada

Stakeholder possui importância e poder diferente frente à organização

(DONALDSON e PRESTON, 1995).

De acordo com Greenwood (2001), os conceitos mais estreitos são

baseados na idéia de que existem limitações de recurso, tempo e paciência da

gerência em considerar todos os possíveis stakeholders. Além desse

argumento a favor da utilização de um conceito estreito, pode-se argumentar

que informações de verdadeira utilidade estratégica requerem a adoção de

conceitos mais estreitos e específicos (FREEMAN e REED, 1983).

Os principais propulsores para as ações socialmente responsáveis,

alinhada com a abordagem “A”, são as adaptações às mudanças legislativas e

às mudanças nas expectativas dos Stakeholders. Como afirmam Fukukawa,

Balmer e Gray (2007; p. 4), são vários os motivadores para que uma empresa

persiga a RSC e, nessa abordagem, os motivadores são, majoritariamente, os

que os autores classificam como externos. Dentre esses motivadores, podem-

se destacar a padronização da indústria, as regulamentações e a competição.

De acordo com Pirsch, Gupta e Grau (2006), existem evidências de que

as empresas que efetuam ações de responsabilidade social alcançam

benefícios na relação com seus Stakeholders.

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Hawkins (2006; p. 125) afirma que uma organização socialmente

responsável ajuda a manter os investidores e os consumidores, pois contribui

para a reputação da empresa, fortalecendo sua marca. Os gestores, já há

muito tempo, reconheceram que ações sociais e investimentos comunitários

melhoram a imagem, a legitimidade, aumentam a credibilidade e a confiança

do consumidor e de outros stakeholders (STEAD e STEAD, 2004; p. 77).

Hay, Gray e Smith (1989; p. 129) afirmam que a responsabilidade social

corporativa melhora a imagem da empresa e diminui a chance de ações de

regulação do governo. Esses dois pontos mencionados são grandes

motivadores para a responsabilidade social na abordagem “A”, pois as

regulamentações ambientais são complexas e possuem altos custos (STEAD e

STEAD, 2004; p. 90). Na visão de Whether e Chandler (2006; p. 17), a espera

de sanções e regulamentações sobre a atuação das empresas não são o meio

mais eficiente de alcançar uma conduta socialmente responsável. No entanto,

a abordagem “A” concorda com a idéia de Peterson (2007; p. 354), que

entende que em certo nível a responsabilidade social implica algumas repostas

defensivas a escândalos ou mudanças no mercado.

A responsabilidade social busca retorno econômico, social, institucional

e tributário-legal (DUARTE e DIAS, 1986; p. 28). E em parte funciona como

uma lente que filtra as possíveis ações que uma dada firma pretende executar

para realizar sua missão e alcançar sua visão (WHETER e CHANDLER, 2005;

p. 45), não atuando assim diretamente nos valores centrais das organizações.

De acordo com Stead e Stead (2004; p. 39), os valores centrais são os

que determinam os ideais e a essência da empresa. Eles perduram e são a

base da visão e orientam o que a organização será no futuro. Existem também

os valores instrumentais que apóiam os valores centrais. Eles definem os

meios pelos quais a estratégia é implementada. Assim, a abordagem “A” é

mais periférica, se resumindo a atuar de forma instrumental.

A abordagem “A” se relaciona fortemente com a visão dicotômica da

Responsabilidade Social Corporativa apresentada por Ashley (2005; p. 41).

Nessa visão, uma racionalidade que separe o desempenho socio-ambiental do

desempenho econômico é justificável, bem como as pesquisas que buscam

avaliar as contribuições de um sobre o outro. Além disso, para o sucesso da

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abordagem, é recomendável que as políticas sócio-ambientais sejam

mensuradas com indicadores financeiros e de mercado.

Por último, vale destacar que um determinante fundamental da

intensidade e profundidade dentro dessa abordagem, para que as empresas se

engajem em comportamentos ligados à responsabilidade social, é a existência

de folga organizacional (slack resources). Kraft e Hage (1990; p. 17) defendem

a idéia de que uma organização somente será socialmente responsável na

presença de folga organizacional suficiente. Além desse fator determinante,

ainda há um ponto destacado por Campbell (2007), que defende a idéia que o

ambiente institucional das organizações é que irá determinar as ações

socialmente responsáveis de uma organização.

A abordagem “A” apresentada não coloca em cheque a ética e os

valores morais das organizações e nem assume que uma empresa, agindo

dessa forma, possui um comportamento questionável ou errado para com a

sociedade e o meio ambiente. A abordagem “A” traz inúmeros benefícios para

as organizações. Segundo Van De Ven e Jeurissen (2005; p. 301), para uma

estratégia ser socialmente responsável, não é necessário que o interesse

próprio da organização seja inexistente.

Enquanto a Abordagem “A” apenas viabiliza a coexistência de interesses

organizacionais e de práticas ligadas a Responsabilidade Social Corporativa, a

próxima abordagem se caracteriza por uma relação intensa entre o propósito

da firma e as causas sócio-ambientais. De acordo com Hay, Gray e Smith

(2007; p. 9) e Peterson (2007; p. 355) o interesse organizacional deve ser

convergente desenvolvimento sustentável do planeta.

2.1.2 Abordagem “B”: Foco nos valores do desenvolvi mento sustentável

A abordagem “B” se distingue da abordagem “A”, tanto pela forma de

engajamento da empresa quanto pelas premissas básicas que sustentam essa

visão. Uma administração estratégica sustentável baseia-se na idéia de que a

firma co-evoluiu com seu ambiente competitivo, social e ambiental (STEAD e

STEAD, 2004; p. 73). De acordo com Bullis e Le (2007; p. 328), a transição

para um modelo sustentável de desenvolvimento implica uma mudança

verdadeira na concepção do papel da empresa na sociedade. Essa abordagem

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compartilha a visão de Stead e Stead (2004; p. 24), de que a sustentabilidade

deve estar enraizada em uma nova forma de pensar e é um conceito complexo

que engloba três dimensões: a Econômica, a Social e a Ecológica. Se qualquer

uma dessas dimensões se enfraquece, o sistema organizacional não será

sustentável ao longo do tempo (PASCALE, MILLEMANN e GIOJA, 2000; p.

68).

Uma outra premissa importante dessa visão é que entender RSC sob

uma lente econômica ou meramente instrumental é insuficiente, tanto para as

empresas quanto para a sociedade (WINDSOR, 2006). Isso ocorre, pois a RS

nesse sentido tem como um de seus papéis justamente atenuar as disfunções

sociais causadas pela racionalidade econômica imperante nas empresas

(NETO e FROES, 2004; p. 6). E, segundo Stead e Stead (2004; p. 35), as

decisões estratégicas são a chave para solucionar o quebra-cabeça da

sustentabilidade global.

Os dois principais desafios da sustentabilidade e, consequentemente da

abordagem “B”, são o desenvolvimento de um entendimento suficiente para

que ela se torne um ideal entre as pessoas na organização e o encontro de

meios efetivos de transformar a sociedade em uma sociedade sustentável

(STEAD e STEAD, 2004; p. 33). Como as estratégias de longo prazo, a

implementação de uma estratégia sustentável requer que as filosofias e valores

sejam consistentes com a causa, e que haja também capacitações, estruturas

e processos necessários para a transformação.

Empresas podem incorporar a RSC por meio da abordagem pós-lucro,

ou mais profundamente pela abordagem pré-lucro. Ou ainda utilizar uma visão

instrumental (Should do) ou uma abordagem normativa (Must do) (ASHLEY,

2005; p. 52). Enquanto a idéia da abordagem “A” alinha-se mais com a

incorporação pós-lucro e da visão instrumental, já a linha “B” se alinha com a

responsabilidade social corporativa pré-lucro e com uma visão normativa.

Os motivadores mais importantes para que a firma insira os valores

sustentáveis em sua identidade, como deve ocorrer na abordagem “B”, são os

chamados por Fukukawa, Balmer e Gray (2007; p. 4) de motivadores internos.

Dentro desses motivadores podem-se destacar a iniciativa de líderes, a missão

corporativa e a atuação dos funcionários.

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De acordo com Hawkins (2006; p. 26), para sustentabilidade ser

verdadeiramente alcançada, ela precisa ser enraizada na cultura da

organização. A cultura e os valores são os principais focos de atuação das

empresas que priorizam a abordagem “B” à abordagem “A”. A promoção de

cultura organizacional forte em torno da sustentabilidade é importante, pois isso

afeta não só o comportamento, mas a atitude dos stakeholders ao longo do

tempo (STEAD e STEAD, 2004; p.171). A atitude se define como sendo uma

pré-disposição para realizar determinado comportamento, diferente do

comportamento em si, que já é a realização de uma ação, podendo ser

efetuado independentemente da atitude. Valores servem tanto de filtros que

processam as informações quanto como moldadores de decisões, que

estabelecem os critérios sob os quais as decisões são tomadas.

A mudança de responsabilidade para oportunidade é um importante

sinal da adoção de uma prática da sustentabilidade proativa (HAWKINS, 2006;

p. 152) e é uma característica importante da abordagem “B”. Os problemas

ambientais e sociais devem ser encarados como oportunidades para

crescimento pelos responsáveis pela estratégia da organização. O sucesso da

sustentabilidade empresarial necessita que seus gestores estejam aptos a criar

o futuro de sua organização e a "pensar fora da caixa" (STEAD e STEAD,

2004; p. 77) e das atuais regras da competição em sua indústria.

A análise de uma indústria sob a ótica sustentável não pode ignorar o

contexto não mercadológico como as análises tradicionais normalmente o

fazem (STEAD e STEAD, 2004; p. 72). De acordo com Neto e Froes (2004; p.

184), deve haver uma mudança no entendimento da sobrevivência empresarial,

que extrapola a guerra contra os concorrentes. Segundo Senge e Carstedt

(2001; p. 27), empresas que buscam a sustentabilidade em seus negócios

abandonam uma visão mais segura de mundo e começam a competir de uma

forma ainda desconhecida. Não existem modelos a serem seguidos nem

diretrizes absolutas para empresas que estariam atuando ou pretendem atuar

da forma “B”. As organizações devem assumir a idéia de Stead e Stead (2004;

p. 44), que defende que a busca da sustentabilidade envolve a criação de

estruturas de aprendizado que facilitam a renovação contínua da firma via

recursos humanos e outros processos organizacionais.

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Assim como na abordagem “A”, na “B” existem benefícios para as

organizações adeptas. Segundo Willard (2005; p. 141), o desenvolvimento

sustentável promove a retenção de talentos na organização, uma vez que os

funcionários possuem seus valores alinhados com o que a organização busca

em termos de benefícios sociais e ambientais para o planeta. De acordo com

Hay, Grey e Simth (2007; p. 5) e Kanter (1999; p. 123), a abordagem “B” faz

surgir oportunidades lucrativas, à medida que está atenta para os problemas

sociais não solucionados. Além disso, de acordo com Willard (2005; p. 150),

aumenta a capacidade da organização de atrair investimentos.

Finalizando as idéias que constroem a abordagem denominada “B”, é

importante mencionar dois aspectos fundamentais. Primeiro que a escala do

crescimento das empresas é uma questão crítica. Pensar em crescimento em

escala apropriada é um desafio da sustentabilidade que não é fácil de ser

contornado (STEAD e STEAD, 2004; p. 136). Uma organização sob essa ótica,

não estará buscando o crescimento desenfreado a qualquer custo. Um

limitador para a taxa de crescimento das empresas na abordagem “B” é a

capacidade de renovação dos recursos produtivos utilizados pela empresa.

Segundo, o fato da empresa estar indo mal não é uma desculpa para justificar

comportamentos socialmente irresponsáveis. A empresa diante de dificuldades

continua atuando de maneira sustentável considerando seu desempenho

econômico juntamente com o social e o ambiental.

2.1.3 Diferenciando as abordagens (Modelo 3-In)

As duas visões desenvolvidas, apesar de estarem distantes na teoria, na

prática e no dia-a-dia empresarial são diferenciadas por detalhes. Acredita-se

que, na prática, elas não existam em seus tipos ideais ou puros. As descrições

foram construídas com base em idéias presentes em textos de diversos

autores e, embora elas não possam ser observadas exatamente como

descritas, seus elementos ou características são de grande valia para entender

como as empresas encaram a RSC e os desafios da sustentabilidade.

A fim de sistematizar uma forma de diferenciar a abordagem “A” da “B”,

é preciso fornecer um ferramental mais estruturado. Esta seção tenta se

concentrar em aspectos chaves e antagônicos nas duas abordagens para

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tornar viável a operacionalização das mesmas. Isso também viabilizaria o

estudo empírico proposto no presente trabalho. Assim, a identificação de tais

aspectos caracterizaria a forma de atuar das empresas nas duas abordagens e

permitiria associar as atitudes das mesmas as modalidades “A” ou “B”

desenvolvidas.

São três os aspectos chaves a serem observados e entendidos nas

abordagens. O primeiro deles possui forte relação com a origem da motivação

das firmas para incorporar comportamentos e atitudes sócio-ambientalmente

responsáveis, e será chamado de “Dimensão da Institucionalização”. O

segundo é diretamente ligado à forma como a organização emprega recursos

para se tornar sócio-ambientalmente responsável, e será chamada de

“Dimensão do Investimento”. A última, denominada “Dimensão da Difusão de

Valores”, lida com o grau profundidade com que os valores e crenças ligados à

responsabilidade social estão presentes na organização. A seguir, as três

dimensões são descritas.

2.1.3.1 Dimensão da institucionalização

A dimensão da institucionalização, como o nome indica, busca, na teoria

institucional, uma explicação para entender por que as empresas se engajam

em comportamentos responsáveis. Campbell (2007) ressaltou a importância da

teoria institucional para entender porque as empresas adotavam a RSC. O

autor afirma que as restrições do ambiente institucional moldariam a forma pela

qual a empresa se engaja em comportamentos sócio-ambientalmente

responsáveis.

Entretanto, Campbell (2007), ao propor como o ambiente institucional

molda as ações de RSC de uma empresa, trabalha majoritariamente com as

pressões institucionais externas. São elas: muita ou pouca competição no setor

(p. 953); fortes exigências legais de órgãos externos (p. 955); auto-regulação

dos membros da indústria (p. 956); presença de pressões de ONGs (p. 958); o

fato de a firma pertencer a associações comerciais ou de funcionários (p. 960);

o fato de ela operar em um ambiente onde os gestores foram “condicionados” a

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agir em prol da RSC (p. 959) e, finalmente, o fato de a empresa estar engajada

em um diálogo com sindicatos, a comunidade e os acionistas (p. 962).

Essas pressões institucionais observadas por Campbell (2007), apesar

de válidas para explicar a adoção de comportamentos sócio-ambientalmente

responsáveis por parte de empresas, não consideram as pressões

institucionais internas, que se originam nas crenças e normas internas da

organização. Desta forma, ela não lida com todos os aspectos institucionais

que potencialmente explicariam porque uma firma assumiria uma postura

sócio-ambientalmente responsável.

Indo de encontro a essa idéia, vale a pena relembrar que, de acordo

com Bullis e Lê (2007), uma atitude verdadeiramente ligada à sustentabilidade

prevê que exista uma ideologia autêntica que impulsione as ações e atitudes

da empresa. Isso significa que, além dos comportamentos sócio-

ambientalmente responsáveis poderem ser adotados por pressões

institucionais externas, como visto no trabalho de Campbell (2007), a RSC

também pode ser adotada por pressões institucionais internas. Essa orientação

ideológica adviria de uma liderança dentro da organização.

Esse segundo tipo de pressão para que a empresa seja sócio-

ambientalmente responsável também seria fruto de instituições. Entretanto, na

pressão intrínseca, a institucionalização estaria ligada à infusão de valores,

crenças e normas por lideranças dentro da organização (SELZNICK, 1972, p.

15). Esse líder institucional, de acordo com Selznick (1972, p. 24), seria um

especialista na promoção e manutenção dos valores. Assim, essa liderança

institucional pode promover a RSC e os valores de sustentabilidade na

empresa, independente das pressões externas. A empresa que adota a RSC

por essa motivação não apenas reage ao ambiente, mas tende a ser pioneira e

a construir sua própria maneira de agir sócio-responsavelmente sendo,

eventualmente, um exemplo para as demais empresas. Ela age pro-

ativamente, pois não espera que o ambiente condicione suas ações de RSC ou

voltadas para a sustentabilidade.

Essas duas vertentes da teoria institucional, a que foca nas pressões

institucionais externas e a que foca na pressão institucional dos valores

imputados por uma liderança dentro da empresa, possuem conseqüências

diferentes. Fleck (2007) separa esses dois processos distintos e qualifica-os

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em institucionalização organizacional (Organization institucionalization process)

e institucionalização ambiental (Environmental institucionalization process).

Desta forma, essa “Dimensão da institucionalização”, aqui desenvolvida, possui

essas duas vertentes distintas que ilustram as formas com que a RSC surge na

empresa pelas abordagens “A” e “B”. Fleck (2007) chamou atenção para o

aspecto responsivo do processo institucional ambiental e para o aspecto pró-

ativo do processo de Institucionalização Organizacional.

O processo de institucionalização ambiental da RSC, representado pelas

pressões externas propostas por Campbell (2007), corresponde a uma forma

mais inerte de adoção dos comportamentos responsáveis. Essa vertente de

ação socialmente responsável é um indicador de que uma dada empresa

possui um traço ou uma característica de RSC tipo “A”.

O processo de institucionalização organizacional, representado pelas

pressões intrínsecas geradas por valores e crenças imputados por uma

liderança na firma como proposto por Selznick (1972), caso fosse o motivador

dos comportamentos e de atitudes de RSC, faria com que a empresa tivesse

uma proposta diferenciada e única. Essa vertente da “Dimensão da

Institucionalização” seria um indicador de que uma dada empresa possui um

traço de uma RSC do tipo “B”.

É importante ressaltar que, à medida que a organização começa a sofrer

maiores pressões externas, ela se tornará mais perto do traço dependente e,

conseqüentemente, da abordagem “A”. A medida que lideranças intrínsecas

vão imputando crenças e normas ligadas à sustentabilidade e de RSC, a

organização se aproxima de uma RSC mais Pro-ativa e conseqüentemente da

abordagem “B”.

Assim, se teria na “Dimensão da Institucionalização” dois pólos opostos

de um mesmo contínuo, referentes às abordagens “A” e “B”. O Primeiro,

correspondente à abordagem “A”, seria o pólo da RSC Reativa, o segundo,

correspondente à abordagem “B”, seria o pólo da RSC Pro-ativa. O quadro a

seguir ilustra a “Dimensão da institucionalização”.

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Quadro 2.1 – Dimensão da institucionalização

Atitudes Seguidoras Atitudes Pioneiras

RSC Reativa <------------------> RSC Pro-ativa

Abordagem

“A” Motivação Extrínseca Motivação Intrínseca

Abordagem

“B”

Fonte: elaborado pelo autor

Em suma, dois aspectos desta dimensão devem ser considerados para

estabelecer um enquadramento adequado de uma dada firma no âmbito dessa

Dimensão. Primeiramente, uma iniciativa de RSC ou sustentabilidade de uma

empresa seria analisada quanto ao aspecto da origem da motivação que

influenciou a adoção de tal iniciativa. Essa origem poderia ser intrínseca ou

extrínseca. Depois, seria observada a originalidade de tal iniciativa, sendo que,

iniciativas Pioneiras e pioneiras posicionariam a empresa na vertente

independente da dimensão. Iniciativas que reproduzissem as mesmas práticas

de outras empresas seriam classificadas como “Seguidoras” .

Após uma análise da originalidade e fonte de algumas iniciativas

relevantes sobre RSC, seria possível enquadrar uma empresa nesta dimensão.

Assim seria estabelecido se a empresa pratica uma RSC Reativa ou uma RSC

Pro-ativa.

2.1.3.1 Dimensão do investimento

A dimensão do investimento lida com os investimentos em ações de

responsabilidade social e de sustentabilidade da empresa. Essa dimensão

surge, majoritariamente, da idéia de Ashley (2002), que defende que uma dada

empresa pode se engajar em ações de RSC por uma abordagem pós-lucro ou

por uma abordagem pré-lucro.

As empresas pós-lucro podem possuir vários focos de ações

socialmente responsáveis, mas caso haja conflitos entre o social e o

econômico, o econômico sempre prevalecerá. Ela será socialmente

responsável até que isso não ameace os lucros, ou, desde que, ela lucre em

suas atividades. Essa característica é típica de uma empresa que aborde a

RSC do tipo “A” , pois adeptas a esta abordagem só investem em projetos

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sociais caso existam lucros disponíveis para tal investimento. Dessa forma,

uma empresa pratique o tipo “A” é lucro dependente.

Uma empresa do tipo “B” possui um traço oposto, sendo caracterizada

por atuar em RSC sob uma vertente pré-lucro de Ashley (2002). Uma empresa

com o tipo “B” não condiciona suas ações de RSC à existência de um resultado

financeiro positivo. De acordo com a autora, uma empresa pré-lucro age de

forma socialmente responsável, pois acredita que o resultado positivo só é

alcançado quando medido de forma social, econômica e ambiental. Além disso,

esse traço favorece que a RSC ou os valores de sustentabilidade se equilibre

com a busca pelo retorno financeiro da organização

Para uma empresa na vertente lucro-independente, na existência de

conflitos entre o social e o econômico, haverá um balanceamento no qual os

retornos ambientais e sociais serão considerados conjuntamente com os

econômicos.

Se a empresa aderir à vertente lucro-dependente, caracterizada por

realizar investimentos em ações de RSC condicionadas à existência de lucros

e por não possuir métricas de desempenho sociais e ambientais, seria

indicativo de que a empresa possui um RSC do tipo “A”. Se a empresa estiver

na vertente lucro-Independente, caracterizada por possuir investimentos em

ações de RSC independentemente da existência de lucros e métricas de

desempenho que considere o Tripple botton-line, seria um indicativo de que a

empresa possui um RSC do tipo “A”. As duas vertentes seriam pólos extremos

do mesmo contínuo.

O quadro abaixo ilustra a “Dimensão do investimento” e os dois aspectos

que devem ser observados ao analisar atitudes concernentes à essa dimensão.

Quadro 2.2 – Dimensão do investimento

Foco apenas econômico Foco Balanceado

Lucro-Dependente <------------------> Lucro-Independente

Abordagem

“A” Condicionado ao Lucro Não condicionada ao Lucro

Abordagem

“B”

Fonte: elaborado pelo autor

Na Dimensão do Investimento, assim como na Dimensão da

Institucionalização, análise verifica dois aspectos. O primeiro, diz respeito ao

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fato de uma iniciativa de responsabilidade social estar, ou não, condicionada a

resultados financeiros positivos. A segunda, lida com os objetivos e metas

buscadas pela empresa. Uma empresa pode possuir iniciativas equilibradas,

que objetivam retorno social e ambiental conjuntamente com o econômico, ou

podem possuir iniciativas desequilibradas que não possuem preocupação com

aspectos sócio-ambientais.

2.1.3.3 Dimensão da Inserção de Valores

Essa dimensão lida com o processo de difusão dos valores de

responsabilidade social e de sustentabilidade e a profundidade que esses

valores estão inseridos na organização. Esse aspecto de análise parte da idéia

básica de que proposta de responsabilidade social da empresa pode estar nos

valores periféricos ou centrais da organização. Essa idéia é trabalhada por

Stead e Stead (2004; p. 39), que afirmam que a sustentabilidade nos negócios

pode estar, ou não, no cerne da organização. Para os autores, os valores

centrais são a fonte da disseminação da atitude responsável na empresa.

Como visto na descrição da abordagem “B”, é importante que a ideologia

sustentável esteja enraizada na cultura da organização e em todas as suas

atividades. Dessa forma, na “Dimensão da inserção de valores”, para que uma

empresa se caracterize como tendo um RSC do tipo “B”, ela deve estar na

vertente na qual os valores de sustentabilidade permeiem toda a organização,

seus departamentos e busque afetar todos os stakeholders. Essa vertente

recebe o nome de central, e possui os valores enraizados na organização e

integrados com as operações da empresa.

Como visto na descrição da RSC do tipo “A”, as ações são

contingenciais, variando sempre em função das necessidades imediatas e dos

riscos envolvidos. Sendo assim, na vertente periférica da “Dimensão da

inserção de valores”, a RSC existe, mas é desligada das operações da

empresa, não afetando as atividades dos departamentos de forma geral.

Assim, nessa vertente, uma RSC desligada caracteriza uma empresa que atua

pelo tipo “A”, que tenderia a não vincular a RSC às suas operações.

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30

Se a empresa atuasse de acordo com essa vertente periférica,

caracterizada por iniciativas sócio-ambientais não relacionadas com suas

atividades, ela estaria se aproximando de uma forma de atuação do tipo “A”. Se

a empresa aderir à vertente central, caracterizada por uma integração entre as

operações da empresa e as ações de RSC, ela possuiria uma RSC do tipo “B”.

As duas vertentes seriam pólos extremos do mesmo contínuo.

É importante ressaltar que, à medida que a organização começa a

desligar suas ações de RSC de suas operações, estará mais perto do traço da

vertente Periférica e conseqüentemente da abordagem “A”. À medida que as

iniciativas ligadas à RSC vão sendo integradas às atividades da empresa, ela

se aproxima da vertente Central e conseqüentemente da abordagem “B”.

Além disso, quando mais sistematizadas as medidas de RSC estiverem,

mais uma firma estaria apta a disseminar as essa medidas e,

conseqüentemente, mais adepta à vertente central da dimensão a firma estaria.

Segue abaixo o quadro resumo da dimensão em questão.

Quadro 2.3 – Dimensão da Inserção de Valores

Isolada Sistêmica

Fragmentada <------------------> Central

Abordagem

“A” Não Sistemática Sistemática

Abordagem

“B”

Fonte: elaborado pelo autor

Na análise da presente dimensão, iniciativas isoladas, que não exercem

interferência em outras atividades da empresa, e implementadas de forma não

sistemática caracterizam a empresa como adepta a Abordagem “A”. Em

oposição, uma empresa que possuir iniciativas ligadas a RSC e a

Sustentabilidade relacionada com as atividades operacionais e que fossem

adotadas de forma sistemática estaria adotando a Abordagem “B”.

2.2 Crescimento da firma a propensão a auto-perpetu ação

O termo “crescimento” é usado na linguagem cotidiana das organizações

e, na maioria das vezes, ele envolve apenas um simples aumento quantitativo

de tamanho (PENROSE, 2006; p. 31). Neste trabalho, procurou-se lidar com

uma outra forma de crescimento, também relacionado ao aumento do tamanho,

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31

mas especialmente preocupado com o desenvolvimento da firma. A escolha

pelo crescimento com essa conotação foi motivada por ele ser o melhor

indicador encontrado para o sucesso de uma dada firma.

Como um dos objetivos do trabalho visa relacionar a responsabilidade

social de uma empresa com sua propensão ao sucesso, essa sessão do

trabalho é dedicada ao crescimento das empresas. O presente trabalho

assume a idéia de Charan e Tichy (1998; p. 7), que entendem que o

crescimento equilibrado é a chave para o sucesso de uma organização.

Entretanto, apesar de esses autores transmitirem bem a idéia da importância

do crescimento equilibrado de uma firma, eles não conseguem sistematizar

uma teoria para entender os fatores que propiciam tal crescimento. Ao invés

disso, eles trabalham separadamente uma série de temas ligados ao assunto.

Para se avançar no sentido de compreender quais as possíveis relações entre

o crescimento das organizações e a responsabilidade social corporativa em

seus vários significados, foi necessária a utilização de um arcabouço teórico

que sintetizasse a propensão das empresas ao crescimento contínuo e

saudável.

O crescimento deve ser contínuo, pois, de acordo com Pascalle,

Millemann e Gioja (2000), a estagnação tende a levar uma organização ao

declínio. Weitzel e Jonsson (1989) também discutem que o declínio pode ser

iniciado pela estagnação.

Além disso, quando assumimos uma relação positiva entre crescimento

contínuo e o sucesso, assume-se também que a longevidade isolada não

garante o sucesso. Organizações podem ser longevas se mantendo

estagnadas. Esse tipo de organização é estudado por Meyer e Zucker (1989), e

esses autores, em seu trabalho, exemplificam como uma empresa consegue

perdurar por muitos anos sendo ineficiente e permanecendo estagnada. Ainda

nesta linha, Chandler (2004; p. 6) associa o aumento dos lucros e a redução

dos custos ao crescimento continuado das empresas. Dessa forma, o autor

também considera que o crescimento é necessário para a evolução da

empresa.

O Crescimento associado ao sucesso além de contínuo também deve

ser saudável. A continuidade de uma empresa, promovida pelo crescimento,

contribui para a institucionalização de práticas ultrapassadas fazendo com que

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32

a organização se torne rígida e menos propensa à adaptação (GREINER,

1998; p. 56). A inabilidade de se adaptar é, de acordo com Weitzel e Jonsson

(1989), um sintoma de declínio que pode levar a empresa a sua destruição.

Dessa forma, nem todo crescimento aumenta a propensão da firma ao

sucesso.

Considerando essas restrições, para entender quais fatores relacionados

à RSC possuiriam relação com o sucesso de uma empresa, optou-se pelo

Modelo de Fleck (2006). A autora desenvolveu um estudo no sentido de

entender os fatores que levariam a empresa a crescer continuamente de forma

saudável. Assim, Fleck (2006) argumentou que a propensão das empresas a

se manterem em uma trajetória de crescimento aumentaria na medida em que

elas conseguissem responder de forma adequada cinco desafios:

Empreendedorismo (Enterprising), Navegação em um Ambiente Dinâmico

(Navigating into the Dynamic Environment), Gerenciamento da Diversidade

(Managing Diversity), Provisão de Recursos Gerenciais (Managerial Resources

Provisionig) e Gerenciamento da Complexidade (Complexity Management).

Esses desafios percorrem diversas questões empresariais e, de acordo com o

padrão de resposta a cada um deles adotado pela empresa, ela pode se tornar,

ao longo de sua trajetória mais propensa ao sucesso. Na próxima seção cada

desafio e será explorado.

2.2.1 Os desafios do crescimento de Fleck (2006)

Inicialmente, é apresentado o quadro 2.4 que resume as idéias

presentes em cada desafio e o padrão de resposta associado à propensão à

autoperpetuação da firma e à autodestruição.

Page 33: CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA … · 3 FICHA CATALOGRÁFICA Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas Crescimento saudável e sustentabilidade: Uma análise longitudinal

33

Quadro 2.4 – Os cinco desafios organizacionais para a Propensão à Autoperpetuação

Desafio Descrição do Desafio Características das Respostas opostas Contestável ou pior Alto

Empreendedorismo

Promover o empreendedorismo continuado por meio de expansões

capazes de gerar valor e que previnam uma exposição

exagerada aos riscos.

Baixo nível de ambição, de tino empresarial, de versatilidade e capacidade de capitalização. Utilização expansão de motivação defensiva

Alto nível de ambição, de tino empresarial, de

versatilidade e capacidade de capitalização. Utilização

de expansão motivação produtiva ou Híbrida

A deriva Na vanguarda

Navegação em um Ambiente Dinâmico

Lidar com os múltiplos stakeholders da firma para assegurar a captura

de valor e a legitimidade organizacional

Monitoramento fraco do ambiente. Utilização de respostas fora do tempo ou inadequadas às pressões institucionais.

Monitoramento regular. Utilização de respostas

adequadas às respostas às pressões institucionais.

Fragmentada Integrada

Gerenciamento da Diversidade

Manutenção da integridade da firma e estimulação dos conflitos e

rivalidade organizacional Falha em estabelecer relações e coordenar as capacitações da organização

Sucesso em estabelecer relações e coordenar as

capacitações da organização

Tardia Cedo Provisão de Recursos

Gerenciais

Garantir prontamente que a empresa tenha os recursos

humanos necessários Ações atrasadas ou em cima da hora Provisionamento planejado

e antecipado

Ad hoc Sistemática

Gerenciamento da Complexidade

Gerenciar de questões complexas e solucionar questões relacionadas

ao aumento de complexidade Fraca solução de problemas, busca por solução imediatistas e sem estimular o aprendizado

Solução definitiva de problemas, promoção de

busca organizada por soluções e promoção do

aprendizado.

Fonte: traduzido de Fleck (2006)

A seguir são apresentadas as idéias básicas contidas em cada desafio.

• Empreendedorismo

De acordo com Fleck (2006) o desafio consiste na manutenção continua

do ímpeto da firma em expandir continuadamente. O desafio se baseia nos

serviços empreendedores propostos por Penrose (2006) e nas características

das iniciativas de expansão adotadas pela organização.

São quatro os serviços empreendedores que precisam ser fornecidos

para a organização. A “ambição”, que seria a vontade da firma de crescer e

melhorar ao longo do tempo. A “versatilidade”, que envolve questões

relacionadas à visão e a imaginação necessária para captação das melhores

oportunidades. A “habilidade de captar recursos financeiros” e o “tino

empresarial”. Esse último serviço está relacionado à capacidade da firma de

evitar riscos exagerados e estabelecer critérios adequados de julgamento para

decisão.

Page 34: CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA … · 3 FICHA CATALOGRÁFICA Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas Crescimento saudável e sustentabilidade: Uma análise longitudinal

34

Além de dispor desses serviços, para a empresa apresentar um padrão

de resposta ao desafio condizente com a autoperpetuação, ela precisa se

engajar em iniciativas de expansão produtivas ou híbridas. A expansão

produtiva, de acordo com Chandler (1977), seria aquela que geraria uma

melhor utilização dos recursos da empresa proporcionando ganhos de escala

ou escopo. A expansão Híbrida favoreceria uma maior eficiência na utilização

dos recursos produtivos e ao mesmo tempo protegeria os negócios existentes

da empresa.

Uma empresa que não fosse provida dos serviços empreendedores

abordados e realizasse iniciativas de expansão de motivação defensiva teria

uma resposta inadequada ao desafio. A forma de expansão defensiva proposta

por Chandler (1977) é caracterizada por ter como objetivo apenas a proteção

dos negócios existentes e a redução de incertezas.

• Navegação em um Ambiente Dinâmico

O Segundo desafio envolve relação da empresa com o ambiente

institucional. Toda empresa tem sua capacidade de atuar limitada pelo seu

contexto. De acordo com Fleck (2006). uma empresa que monitoriza

constantemente seu ambiente e os múltiplos stakehoders tem uma propensão

a responder de forma adequada a este desafio.

Além desse monitoramento constante é importante que a empresa saiba

responder adequadamente as pressões institucionais utilizando, quando forem

necessárias, as respostas estratégicas descritas por Oliver (1991). É

importante que a empresa saiba moldar as pressões, utilizando as estratégias

de manipular e confrontar o ambiente, e neutralizar as pressões, utilizando a

resposta estratégica de neutralizar. Eventualmente a empresa também deve

estar apta a “Transigir” (Compromise) e se tornar “Aquiescente” com as

pressões ambientais. Utilizando de modo adequado essas respostas, ela não

fica a deriva do ambiente e não tem sua legitimidade ameaçada.

Page 35: CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA … · 3 FICHA CATALOGRÁFICA Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas Crescimento saudável e sustentabilidade: Uma análise longitudinal

35

• Gerenciamento da Diversidade

Como à medida que uma firma cresce sua diversidade aumenta

(FLECK, 2006), é necessário que ela desenvolva elos que permitam o

compartilhamento de recursos. Esse compartilhamento favorece a utilização

adequada de recursos como a reputação, o conhecimento acumulado e outros

recursos socialmente complexos. Cuidar para a manutenção da integridade da

firma e favorecer a socialização de elementos do processo produtivo permite

que a empresa seja mais dificilmente copiada ou imitada pelas concorrentes.

Os recursos socialmente complexos, também conhecidos como

organizacionais, são dificilmente imitáveis e dificilmente definidos. Essa

dificuldade de definição impossibilita que eles sejam assimilados por outras

empresas. Essa qualidade permitiria, de acordo com Barney (1991), uma

empresa sustentar vantagens competitivas. Tendo em vista esse aspecto,

deve-se salientar a importância do desenvolvimento desses recursos na

organização.

• Provisão de Recursos Gerenciais

A resposta adequada a este desafio envolve o planejamento com antecedência

dos recursos humanos que serão necessários para a firma continuar e

expandir suas atividades. A renovação dos recursos humanos com certa

antecedência é vital para a organização. Uma equipe administrativa que

compartilhe a experiência da firma e tenha condições de manter a firma se

expandido não é algo disponível no mercado (PENROSE 2006; p. 91).

• Gerenciamento da Complexidade

O último desafio trata da maneira que uma firma lida com todas as questões

complexas envolvidas no processo de crescimento. Fleck (2006) afirma que a

qualidade da resposta a esse desafio afeta a qualidade das respostas dos

Page 36: CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA … · 3 FICHA CATALOGRÁFICA Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas Crescimento saudável e sustentabilidade: Uma análise longitudinal

36

outros desafios. Isso ocorre pois o gerenciamento da complexidade lida

diretamente com a capacidade da firma de sistematizar o aprendizado e utilizar

o conhecimento adquirido novamente. Uma resposta inadequada a esse

desafio pode ser identificada quando uma organização possui como padrão a

utilização de métodos ad hoc para solucionar problemas complexos.

2.3 A relação entre os desafios da auto-perpetuação e as abordagens “A”

e “B”

A proposta desta sessão é verificar dentro da literatura de

Responsabilidade Social Corporativa e de Desenvolvimento Sustentável como

as perspectivas “A” e “B” se relacionam com as respostas aos desafios do

crescimento contínuo. Isso vai ao encontro da idéia de entender em que

medida cada uma das abordagens pode contribuir para que a organização se

oriente para o crescimento longevo e saudável.

Vale a pena lembrar que o conteúdo dos desafios vai além das questões

relacionadas com a sustentabilidade nos negócios e a RSC. Portanto, nem

tudo que é abordado no modelo de Fleck (2006) será trabalhado nesta sessão.

Serão relevados apenas os aspectos dos desafios que possuem relação com a

literatura estudada de RSC e Sustentabilidade.

Na fase empírica do trabalho, os casos estudados serão utilizados na

tentativa de embasar as relações possíveis encontradas na análise da teoria.

2.3.1 Abordagem “A” e os cinco desafios

Antes de iniciar a discussão segmentada por cada desafio do modelo

Fleck (2006), é apresentado, abaixo, um quadro resumo, que relaciona a

Dimensão em questão com os cinco desafios do modelo. Procurou-se

estabelecer relações evidentes entre a a abordagem desenvolvida e cada

desafio.

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37

Quadro 2.5 – Resumo da relações sugeridas entre os desafios e a Abordagem “A” D

imen

são

Ver

tent

es

Empreendedorismo Navegação em um Ambiente Dinâmico

Gestão da Diversidade

Provisão de Recursos Humanos

Gerenciamento da Complexidade

Seg

uido

ra

Melhor arrecadação de capital pela adesão aos índices de RSC.

À deriva das pressões externas a empresa seguidora é refém de seu ambiente no que tange a TRC

Inst

ituci

onal

izaç

ão

Ext

ríns

eca

Discurso responsável promoveria a atratividade da empresa.

Foc

o E

conô

mic

o

Inve

stim

ento

C

ondi

cion

ado

ao L

ucro

Não estimula a expansão, pois não percebem as necessidades sociais e ambientais como oportunidades

Não

si

stêm

ica

Atuação isolada não garante luma legitimidade completa.

Atuação isolada não contribuiria para a retenção de pessoal

Inse

rção

de

Val

ores

N

ão

sist

emát

ica

Iniciativas não sistemáticas não favorecem a captura de valor

Iniciativas não sistemáticas não estimulam o aprendizado em termos de RSC

Fonte: Elaborado pelo autor

Nos tópicos abaixo, cada uma das relações do quadro acima é comentada

e contextualizada com os aspectos dos desafios e das abordagens

desenvolvidas.

• Empreendedorismo

A primeira relação entre a abordagem “A” e os cinco desafios é apoiada na

idéia de Hawkins (2006; p. 125). O autor afirma que a reputação sócio-

ambiental da empresa ajuda a manter e a atrair investidores. Esse aspecto da

abordagem relaciona-se diretamente com serviço empreendedor de captação

de recursos (fund raising). Entretanto, na dimensão “A” ,a iniciativa seria

motivada por fontes externas, como a adequação à expectativa do investidor,

e, além disso, não seriam Pioneiras, pois se baseariam em práticas já

estabelecidas.

Outra relação ressaltada entre a Abordagem “A” e o primeiro desafio tem

relação com caráter reativo da RSC adotada por uma empresa de postura “A”.

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38

O caráter defensivo da RSC dessa Abordagem, destacado por Whether e

Chandler (2006; p. 64), levaria a apenas a evitar conflitos com seus

stakeholders. Isso não instiga a busca de oportunidades produtivas, e, com

isso, apenas contribui para manter a organização em seus negócios atuais.

Uma empresa “A” investe em RSC condicionadamente à existência de Lucros

e, portanto, não visualiza as necessidades ambientais e sociais como

problemas capazes de gerar oportunidades produtivas. Essa idéia se alinha a

um aspecto de uma resposta inadequada ao desafio em questão, pois estimula

a expansão apenas defensiva. A forma de expansão defensiva proposta por

Chandler (1977) é caracterizada por ter como objetivo a proteção dos negócios

existentes e a redução de incertezas.

• Navegação em um Ambiente Dinâmico

A princípio, poderia se pensar que, pelo segundo desafio estar

diretamente ligado às respostas aos interesses dos stakeholders, a abordagem

“A” estaria alinhada a uma resposta adequada da Navegação no Ambiente

Dinâmico. Entretanto, ela pode promover uma reposta inadequada ao desafio,

uma vez que certas respostas ao ambiente institucional, que podem ser

cruciais para a navegação adequada ao ambiente, são desmotivadas pela

aderência à Abordagem “A”.

Dado que as instituições são críticas para a adoção de ações

socialmente responsáveis (ASHLEY, 2005; p. 49) e que a propensão a agir de

forma socialmente responsável é maior quando a indústria é regulamentada, é

razoável inferir que a abordagem “A” tenderia a favorecer ações reativas às

pressões institucionais. Assim, essa abordagem, em aspectos relacionados à

responsabilidade social, estimula as empresas a utilizar apenas duas das

respostas estratégicas às pressões institucionais de Oliver (1991):

Aquiescência (Aquiescence) e Transigir (Compromise).

Ela favorece a Aquiescência, pois a abordagem está sempre alinhada

com as principais ações de RSC existentes e, de acordo com Oliver (1991; p.

152), essa estratégia imita as normas vigentes e faz com que a organização

obedeça às regras estabelecidas. A abordagem “A” também favorece a

utilização da estratégia “Transigir” que busca balancear interesses dos

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39

stakeholders negociando adequadamente com tais públicos (OLIVER, 1991; p.

153). Isso vai de encontro às idéias da abordagem “A” que visa entender as

necessidades dos vários públicos interessados na organização. Essas

respostas estratégicas estariam alinhadas com a postura favorecida pelos dois

aspectos da vertente Dependente da Dimensão Institucional da Abordagem

“A”.

O segundo desafio também lida com a questão da legitimidade da

organização ao longo da sua trajetória. Nesse ponto, a abordagem “A” também

não contribui com um padrão de resposta adequada ao desafio “Navegação em

um Ambiente Dinâmico”. Isso se dá, pois existem três formas de conseguir

legitimidade de acordo com Suchman (1995): Pragmática, Moral e a Cognitiva.

A abordagem “A” consegue a legitimidade pragmática com sucesso, pois essa

lida com a aderência às expectativas e interesses dos stakeholders. Consegue

também parte de sua legitimidade moralmente, uma vez que suas estruturas e

processos internos são compatíveis com os valores vigentes na sociedade.

Entretanto, essa abordagem não garante a legitimidade chamada por Suchman

(1995) de Cognitiva, pois a legitimidade cognitiva presume que a organização

seja continuadamente legítima por sua própria razão de existir. Como a

abordagem “A” possui uma forma de atuação episódica e isolada de

Responsabilidade Social Corporativa, é possível que a empresa não consiga

manter-se legitima em determinado momento. A perda da legitimidade por uma

empresa pode levar à perda da liberdade da empresa de buscar seu

crescimento (WHETER e CHANDLER, 2005; p. 49).

• Gestão da Diversidade

A relação entre a abordagem “A” e o terceiro desafio não é tão explícita.

No entanto, pode-se argumentar que, pela empresa estar apenas seguindo as

tendências, a RSC sob essa ótica não seria capaz de integrar a organização na

medida que ela fosse aumentando seu tamanho. Iniciativas isoladas e não

sistemáticas também, que não envolveriam as pessoas dentro da organização,

não estimulariam a integração.

O desafio de “Gerenciar a Diversidade” propõe que a manutenção da

integridade da firma é fator determinante para uma resposta adequada. Quanto

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a esse aspecto, pode-se dizer que a abordagem “A” não exerce contribuição

positiva nem negativa. Entretanto, vale lembrar que a Abordagem “A”, que se

associa à idéia de Van de Ven e Jeurissen (2006; p. 315), que defendem uma

RSC contingencial, não contribuiu assim para um pensamento sistêmico na

organização. Assim, as ações de RSC, nessa abordagem, atuam com atenção

seqüencial aos problemas enfrentados e isso, na visão de Cyert e March

(1963), pode gerar efeitos colaterais indesejados.

• Provisão de Recursos Humanos

A abordagem “A” se preocupa com a retenção e captação de talentos

que proverão os serviços gerenciais, que, de acordo com Penrose (2006), é o

maior limitador da capacidade de crescimento. Ela se preocupa com os

interesses dos Stakeholders e, devido a isso, atende à necessidade de seus

empregados atuais e se mostra atraente para a força de trabalho disponível.

Uma empresa socialmente responsável atrairia os melhores profissionais. Uma

pesquisa realizada pela You & Company revelou que mais de 50% dos

estudantes de MBA prefeririam trabalhar em empresas éticas, mesmo que isso

significasse menores salários (ASHLEY, 2005; p. 9).

Contudo, como a abordagem não trabalha para integrar e alinhar os

valores de sustentabilidade, ela consegue reter os recursos humanos

baseando-se na atitude da corporação frente à sociedade e ao meio ambiente.

Para profissionais talentosos, ficaria evidente se a proposta de ação sócio-

ambiental de uma empresa fizesse apenas parte do discurso para que ela se

mostre mais atrativa. Uma empresa, atuando apenas na abordagem “A”,

usufruiria das vantagens de ser socialmente responsável apenas na captação

de recursos humanos, mas não na retenção destes recursos.

• Gerenciamento da Complexidade

A Responsabilidade Social Corporativa na abordagem “A” está alinhada

com um padrão não satisfatório de resposta ao quinto desafio. Isso é um

problema, pois de acordo com Fleck (2006), esse desafio impacta em todos os

outros. Apesar de a visão considerar o interesse dos stakeholders nas decisões

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e na implementação das estratégias, ela não prioriza o aprendizado na

organização nem uma reposta sistemática aos problemas enfrentados. A forma

“A” parece ser inerente a uma organização que “apaga incêndios” e não a uma

organização que valoriza as capacitações geradas pela atuação sustentável.

2.3.2 Abordagem “B” e o cinco desafios

Assim como na análise da primeira abordagem, também foi preparado,

para a segunda Abordagem, um quadro resumo com todas as relações

percebidas ao longo do estudo teórico sobre RSC e Sustentabilidade.

Quadro 2.6 – Resumo das possíveis relações ente os desafios e a Abordagem “B”

Dim

ensã

o

Ver

tent

es

Empreendedorismo Navegação em um Ambiente

Dinâmico

Gestão da Diversidade

Provisão de Recursos Humanos

Gerenciamento da Complexidade

Pio

neira

As iniciativas contribuem para atrair e manter gestores de talento

Inst

ituci

onal

izaç

ão

Mot

ivaç

ão

intr

ínse

ca

Não fica à deriva, moldando e manipulando o ambiente a seu favor

Foc

o E

quili

brad

o

Promove a versatilidade ao assumir solucionar os problemas sócio-ambientais

Métricas equilibradas para mensurar o desempenho

Inve

stim

ento

N

ão

cond

icio

nada

ao

lucr

o Busca oportunidades

produtivas nos problemas sócio-ambientais

Sis

têm

ica

Garante que a própria operação da empresa consiga legitimidade

Possibilita a criação de valor oriundo dos princípios éticos e os valores disseminados na empresa

Favorece a geração de numa experiência compartilhada entre os gestores

Inse

rção

de

Val

ores

sist

emát

ica

Iniciativas sistemáticas contribuem para o aprendizado para lidar com a complexidade.

Fonte: Elaborado pelo autor

Abaixo, seguem as análises divididas por cada um dos desafios do

modelo

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42

• Empreendedorismo

Tudo indica que a abordagem “B” se alinha a uma resposta adequada a

esse desafio. Esse desafio, ao lidar com a propensão da firma a assumir riscos

e a identificação de oportunidades produtivas, é influenciado positivamente

pela abordagem. A abordagem “B”, por estar aliada ao caráter ofensivo da

RSC que, de acordo com Whether e Chandler (2005; p. 64), vê na

responsabilidade social uma oportunidade para identificar novas fontes de

vantagem competitiva, favorece a expansão produtiva em detrimento da

defensiva. De acordo com Stead e Stead (2004; p. 64), as oportunidades de

mercado estão surgindo para gestores que pensam de maneira sustentável.

Esse aspecto é reforçado pela aderência à vertente lucro-independente.

A empresa, nessa vertente, acredita que oportunidades lucrativas de negócios

podem ser identificadas nos problemas sociais e ambientais. Já na vertente

lucro-dependente, a existência de lucros seria uma oportunidade para investir

em projetos sócio-ambientais. Assim, o aspecto equilibrado da vertente, que

favoreceria investimentos que buscam retornos sócio-ambientais e

econômicos, favoreceria as expansões produtivas.

A Versatilidade, um dos serviços empreendedores propostos por

Penrose (2006) também é favorecido pela vertente central da dimensão da

Inserção de Valores. Uma empresa atuando sob essa vertente teria uma

restrição em suas expansões atuando apenas em negócios alinhados com o

aumento do bem estar econômico, social e ambiental. Em uma perspectiva em

que restrição contribuiria para a criatividade (SENGE, CARSDTADT e

PORTER, 2001; p.37), esse aspecto favoreceria a Versatilidade. Esse estímulo

à versatilidade estaria ligado ao aspecto Sistêmico da RSC da Dimensão da

Inserção de Valores.

• Navegação em um Ambiente Dinâmico

Considerando o ambiente institucional, é possível entender em que a

empresa sob a abordagem “B” priorizaria a institucionalização ativa promovida

pela firma. Uma empresa que responde adequadamente ao desafio de

Navegação no Ambiente Dinâmico vê nos processos de institucionalização um

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instrumento para sua perpetuação. Essa idéia, de acordo com Fleck (2007), se

oporia à institucionalização reativa, mais condizente com a abordagem “A”, que

vê os processos institucionalizantes como fatos negativos que se impõem na

vida organizacional. Esse é um aspecto importante da abordagem “B” que

permite que a organização lide de forma adequada com as pressões de seu

ambiente.

Analisando a abordagem à luz das respostas estratégicas de Oliver

(1991), percebe-se que as empresas que priorizassam uma forma “B”,

sobretudo pela vertente independente da Dimensão da Institucionalização,

lançariam mão das respostas “Desafiar” (Defy) e Manipular (Manipulate) com

maior facilidade. Isso ocorre, pois empresas dentro dessa visão carregariam os

valores sustentáveis enraizados em sua cultura, e não dependeriam das

práticas já existentes para atuar de forma responsável.

O próprio conteúdo organizacional seria o fator institucional determinante

na atuação da firma, uma vez que Abordagem “B” tem sua origem nos valores

internos da Organização. As organizações sob a vertente independente não

esperariam que as pressões institucionais fossem oriundas de outros fatores

destacados por Oliver (1991), como o contexto legal e regulatório.

Além disso, a vertente central também garantiria a legitimidade cognitiva

à empresa abordada por Suchman (1995). Enquanto a proposta de atuação

fosse relacionada às necessidades sócio-ambientais percebidas, a empresa

garantiria legitimidade a sua própria operação.

• Gerenciamento da Diversidade

A manutenção da integridade da organização, na medida em que ela

aumenta sua diversidade, é uma questão crítica para a sustentabilidade e

consequentemente para a abordagem “B”. A diversidade, de acordo com Stead

e Stead (2004; p. 136) é crítica para a sustentabilidade, pois contribui para a

provisão de talentos e aumenta o entendimento do mercado, contribuindo

também para a solução de problemas sociais que emergem em diversos

contextos.

A abordagem “B” releva a integridade da organização a todo o

momento. A integridade é um termo que incorpora tanto a moral individual dos

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tomadores de decisão como o well-being do corpo da corporação. A

integridade dos gestores contribui para o compromisso ético autêntico da

organização. Esse compromisso é capaz de alinhar a empresa em torno de

uma causa comum. Um elo forte entre as diversas áreas funcionais é criado em

torno dos valores éticos sustentáveis promovidos na organização. Esse elo

contribui para que rotinas criadas possam se tornar recursos capazes de gerar

vantagem competitiva, que na definição de Ghemawat (2000; p. 59) seria a

capacidade que uma dada firma tem de auferir retornos acima da média dentro

de sua indústria. Na linguagem de Barney (1991), a perspectiva “B” permitiria

que recursos raros, valiosos, insubstituíveis e de difícil imitação fossem

gerados com maior facilidade, aumentando as chances de a empresa sustentar

e criar vantagens competitivas.

Assim, o compromisso autêntico dos gestores da empresa com os

preceitos éticos, ligado à vertente independente, influenciaria a empresa a se

tornar menos diversa facilitando a criação de rotinas socialmente complexas e

contribuindo para a resposta adequada ao desafio do Gerenciamento da

Diversidade. Se as pessoas são a única fonte de vantagem competitiva

sustentável é importante criar uma visão comum para que elas trabalhem

juntas em busca de um objetivo compartilhado (SENGE, CARSDTADT e

PORTER, 2001; p.30). De acordo com Pascalle, Millemann e Gioja (2000; p.

92) agir de maneira consistente em uma visão de sustentabilidade oferece uma

possibilidade maior de integração na organização.

A integridade do corpo organizacional também é importante para uma

resposta adequada ao terceiro desafio. Ela permite que a organização consiga

alinhar seus negócios e construir bases de aprendizado que serão exploradas

por diversos negócios. Essa integridade promove a unidade da firma e

possibilita a solução de problemas complexos. Isso ocorre, porque os preceitos

de RSC inerentes à abordagem “B” estimulariam a empresa a perceber seu

ambiente de forma mais ampla (MCINTOSH, 2006; p. 50). Esse pensamento

sistêmico é provido pelo aspecto equilibrado da vertente lucro-independente

que estimula consideração de variáveis de natureza econômica, social e

ambiental.

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45

• Provisão de Recursos Humanos

De acordo com Hawkins (2006; p. 193), um perfil sustentável robusto

ajuda a atrair e a reter recursos humanos capacitados, além de reduzir os

custos com treinamento e recrutamento. Assim, essa é uma contribuição

positiva da abordagem “B” ao desafio. Apesar de as empresas que possuem

uma RSC do tipo “A” tenderem a responder adequadamente ao desafio de

“Aprovisionar Recursos Gerenciais Humanos”, as empresas que possuem uma

RSC do tipo “B” são mais eficazes quanto a essa questão.

Um grupo administrativo que proporciona serviços gerenciais é mais que

um conjunto de pessoas (PENROSE, 2006; p. 91). Trata-se de um conjunto de

indivíduos com experiências conjuntas. O fato de empresas que buscam

construir à abordagem “B” promoverem valores relacionados com as

estratégias adotadas, também contribui, de certa forma, para a harmonia do

corpo gerencial, aumentando a capacidade de possuir serviços gerenciais

alinhados à proposta da empresa. De acordo com Penrose (2006; P. 53),

políticas consistentes favorecem a unidade administrativa da firma,

possibilitando que julgamentos adequados possam ser efetuados por um

grande número de pessoas dentro da firma.

• Gerenciamento da Complexidade

O pensamento sistêmico da abordagem contribui de forma positiva para

o desafio de gerenciar a complexidade. De acordo com Robèrt (2000; p. 249),

um dos princípios que uma empresa que busca o crescimento sustentável deve

adotar é o da precaução, principalmente quando a organização lida com

complexidades inerentes à gestão. Além disso, a abordagem também promove

a utilização de métricas elaboradas para assegurar que a postura sustentável

nos negócios esteja sendo efetivamente implementada. Isso contribui para a

sistematização da busca por problemas que auxilia na resposta a esse desafio

(Fleck, 2006; p. 23).

À medida que a organização aumenta de tamanho, mais complexidade é

adicionada à tomada de decisão. Esse stress leva os gestores a simplificar em

demasia, precipitar nas conclusões e utilizar velhos hábitos que foram bem

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46

sucedidos no passado (PASCALE, MILLEMANN e GIOJA, 2000; p. 68). Os

mesmos autores argumentam que para que isso não aconteça é necessário

que a organização aprenda a solucionar problemas ainda não explorados e que

haja uma conexão entre o sistema organizacional e seu ambiente externo

(2000; p. 91). Indo ao encontro a essa idéia, a abordagem “B” provê um

entendimento da organização como parte de um sistema maior.

Finalmente, a visão sistêmica favorece também que os efeitos colaterais

negativos causados por um tratamento imediatista dos problemas

organizacionais não aconteçam. Isso é um ponto positivo dentro da abordagem

“B”, porque nela as soluções devem ser sustentáveis. Soluções sustentáveis,

de acordo com Pascalle, Millemann e Gioja (2000; p. 92), consideram para

todas as partes dos sistemas complexos.

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47

3. MÉTODO

3.1 Descrição da pesquisa

A pesquisa realizada consiste em um estudo de dois casos. De acordo

com Yin (1989; p. 23), os estudo de casos são uma estratégia de pesquisa na

qual o contexto pesquisado não é evidente. Desta forma, tal método é

adequado para a investigação onde se pretende entender o processo de

incorporação de atitudes e comportamentos relacionados com RSC e

sustentabilidade, bem como identificar aspectos das respostas adequadas aos

desafios do crescimento saudável. A estruturação da pesquisa se deu de

maneira linear e estruturada que, de acordo com o mesmo autor (1989; p. 139),

apresenta primeiro o problema que está sendo estudado, depois os métodos

seguidos pelos achados dos dados coletados e as análises realizadas e, por

último, as implicações oriundas dos achados.

Apesar do estudo possuir intenção de comparar os dois casos

selecionados, esse fato não foi o único fator que orientou a decisão de

investigar dois casos. De acordo com Yin (1989; p. 52), a utilização de mais

casos acrescenta robustez ao estudo proposto. A busca por uma maior

robustez é importante para a presente pesquisa, sobretudo para contribuir com

a formação e entendimento das abordagens propostas de RSC propostas.

Assim, além de permitir uma comparação, a utilização da Natura e do Boticário

como contexto de estudo ajuda a perceber as falhas e propor sugestões para

as abordagens. Com dois casos, também são maiores as chances de se

detectar relações existentes entre as abordagens “B” e “A” e os desafios do

crescimento propostos por Fleck (2006).

A presente pesquisa poderia até ser enquadrada como sendo do tipo

qualitativa, uma vez que esta pode ser definida como a que se fundamenta

principalmente em análises qualitativas, caracterizando-se, em princípio, pela

não utilização de instrumental estatístico na análise dos dados (VIEIRA,

2004;p. 21). É importante que o caráter longitudinal das análises pretendidas

também seja ressaltado. Isso ocorre porque a grande maioria das análises,

como poderá ser visto mais adiante neste capítulo de método, consideram

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alguma espécie de evolução ao longo do tempo. O estudo com perspectiva

longitudinal, de acordo com Vieira (2004; p. 21), tem a sua coleta de dados

realizada em um determinado momento, mas resgata dados e informações de

outros períodos.

Diferentemente da separação entre pesquisa qualitativa e pesquisa

quantitativa, que não agrega muito para o entendimento do método empregado

neste trabalho, existe a separação entre pesquisa de variância e pesquisa de

processo. As análises propostas, por envolverem um aprofundamento das

relações entre eventos, iniciativas e atividades, podem ser caracterizadas como

sendo de uma pesquisa focada no Processo. A pesquisa focada no processo

também pode englobar uma série de dados qualitativos e quantitativos

(LANGLEY, 1999; p. 693). Os tipos de dados e informações coletadas e as

técnicas de análises utilizadas ainda serão descritas em outra sessão deste

capítulo de método. No Anexo C, é apresentada uma breve discussão sobre os

fatores que influenciaram a escolha das duas organizações eleitas.

3.2 Níveis de análise

Como as pesquisas possuem objetivos múltiplos, é extremamente

importante delimitar os níveis e unidades de análise. As unidades de análise,

por sua vez, se referem às unidades a respeito das quais inferências serão

feitas e devem ser representativas do nível de análise (VIERA, 2004; p. 22).

Pode-se dizer que o nível principal de análise é o organizacional. Isso ocorre

porque as organizações escolhidas foram investigadas no intuito de se obter

um enquadramento às abordagens propostas. Essa análise mostrará a forma

com que cada empresa incorporou comportamentos e atitudes relacionadas à

RSC.

Além da análise no âmbito das organizações, também serão

investigadas as possíveis relações existentes entre os desafios e os dois tipos

ideais propostos. O fato do arcabouço teórico delimitador dos tipos “B” e “A”

estar em processo de desenvolvimento faz com que essa análise seja

necessária para explorar dimensões estabelecidas e suas vertentes, antes de

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buscar alguma conclusão sobre a relação entre os arquétipos do crescimento

saudável e as abordagens.

Desta forma e de acordo com os tipos básicos de Yin (1989; p. 46), o

multicaso pode ser caracterizado como sendo do tipo embutido (embedded).

Essa taxonomia designa estudos de mais de um caso onde existem mais de

uma unidade de análise. Por último, vale ressaltar que por mais que tenha

havido um esforço em delimitar os níveis de análises, é possível que durante

as análises eles se misturem em algum momento. Ao se coletar subsídios para

a análise de processos, de acordo com Langley (1999; p. 692), é muito difícil

isolar as unidades de análises. Ao tentar qualificar a empresa quanto à forma

de atuar de forma socialmente responsável, é possível que comportamentos de

departamentos isolados, ou de pessoas específicas na organização sejam

estudados para que depois se possa se concluir algo no nível organizacional.

3.3 Caracterização da pesquisa

Para caracterizar a presente pesquisa é importante relembrar ao final

das análises e conclusões que se pretendeu alcançar três objetivos distintos.

Embora todos os objetivos do estudo sejam relacionados, eles exigem

perspectivas diferentes de pesquisa. Assim, cada um dos objetivos pretendidos

é relacionado a um tipo de pesquisa. As relações são tratadas a seguir.

O estudo promovido no sentido de qualificar a forma de uma empresa

incorporar atitudes sócio-ambientalmente responsáveis pode ser caracterizado,

de acordo com Vergara (1997; p. 45), como um estudo metodológico. Essa

taxonomia designa estudos que visam adaptar ou propor instrumentos de

captação de informações, com o interesse de estabelecer procedimentos para

alcançar determinado fim. Portanto, o esforço de desenvolver uma estrutura

teórica para entender em que medida a responsabilidade social de uma

empresa é central, Pioneira e equilibrada está associado a esse tipo de

pesquisa.

O estudo também possui caráter descritivo. Isso ocorre porque, para se

entender os processos que afetaram crescimento e a RSC das empresas, um

minucioso trabalho de descrição e caracterização das empresas escolhidas

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teve que ser efetuado. Esse tipo de estudo também possui relação com a

intenção de determinar a forma das empresas de atuarem de forma

socialmente responsável. A descrição, ou o método descritivo, de acordo com

Yin (1989; P. 67), pode servir como base para estruturação geral de um estudo,

uma vez que serve para levantar os aspectos que serão trabalhados e

analisados pelo pesquisador.

A última taxonomia empregada para tipificação da presente pesquisa é

definida por Vergara (1997; p. 45) como pesquisa de caráter exploratório. De

acordo com a mesma autora, a pesquisa exploratória é normalmente, utilizada

para áreas nas quais há pouco conhecimento acumulado. No caso deste

trabalho, não se pode determinar que o conhecimento acumulado acerca dos

temas não é vasto, mas foi assumido que as relações propostas entre RSC e

os desafios do crescimento saudável não são evidentes e, por isso, precisam

ser mais bem exploradas. Dessa maneira, em vez de testar as relações

identificadas, o trabalho pretendeu verificar quais dessas relações têm

potencial para se tornarem hipóteses de trabalho no futuro.

Além disso, é importante lembrar que muito acerca da estrutura teórica

proposta precisa ser explorado. O trabalho visou aperfeiçoar e questionar o

modelo proposto para distinguir as duas abordagens de RSC e esse objetivo

invoca também uma pesquisa de caráter exploratório. Por mais que tenha

havido esforços no sentido de embasar a distinção entre as duas formas de

uma empresa incorporar atitudes voltadas para a sustentabilidade empresarial,

é necessário um trabalho empírico orientado a perceber falhas e a propor

melhorias neste framework desenvolvido.

3.4 Coleta e preparação dos dados

Vieira (2004; p. 23) ressalta a importância da descrição exaustiva da

forma com que os dados foram coletados e tabulados. Assim, nesta sessão,

primeiro foram descritos os tipos de dados coletados, e depois, os

procedimentos de tabulação e preparo dos dados para análises foram

comentados.

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51

3.4.1 Dados coletados

Grande parte dos dados coletados não foi definida a priori, ou seja, foi

buscada gradual e continuamente durante a seleção, a coleta e a interpretação

do material. Os dados foram coletados ao longo do ano de 2008.

Dentre as seis formas de evidências mencionadas por Yin (1989; p. 85),

somente duas formas não foram utilizadas para compor o material para estudo

dos casos selecionado: Artefatos Físicos e Observação com Participação do

Investigador. As outras quatro formas de evidências, que foram efetivamente

empregadas, serão comentadas a seguir.

• Documentos

No âmbito desse grupo podem ser destacados os documentos publicados na

mídia de massa, documentos administrativos, outros estudos formais

publicados acerca dos mesmos casos e livros relacionados às duas empresas

estudadas. Abaixo segue um quadro expondo a quantidade de fontes

pesquisadas e utilizadas. Apenas foram tabuladas as referências utilizadas na

presente pesquisa e as outras referências acessadas não foram contabilizadas

no quadro 3.1.

Quadro 3.1 – Principais documentos utilizados e tabulados

Tipo Quantidade

Jornal 63

Revistas 10

Relatórios Anuais 6

Relatórios sociais 1

Notícias de Internet 7

Livros 3

Dissertações sobre as empresas 3

Estudos de casos 4

Privilegiou-se as informações coletadas de grandes jornais de circulação

nacional, pois esta foi a principal fonte de dados mais antigos que se referiam

aos primeiros anos de existência das empresas. As reportagens foram

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buscadas junto à sede dos próprios jornais e na Biblioteca Nacional no Rio de

Janeiro. Várias reportagens foram conseguidas por meio de um serviço de

busca do jornal Folha de São Paulo. Esta fonte de dados foi utilizada para

todos os tipos de informações sobre as empresas, mas foi determinante para

se obter os dados sobre o faturamento e investimentos das empresas.

Utilizou-se cinco relatórios anuais de 2003 até 2007 da Natura e o

relatório social da mesma empresa do ano 2001, que mostrou a evolução dos

indicadores sociais de 1999 e 2000. Pouco dos relatórios anuais da Natura foi

aproveitado devido ao fato dos dados numéricos já terem sido obtidos por meio

de outras fontes. As inconsistências encontradas nos números não foram muito

dispares. Nesses casos optou-se por adotar os dados fornecidos pela própria

empresa. Três dissertações foram pesquisadas, uma sobre o processo de

internacionalização do Boticário, outra sobre a Fundação Boticário de

Preservação da Natureza – FBPN e uma outra que trata exclusivamente sobre

a linha Ekus da Natura.

Os estudos de caso utilizados se enquadram na categoria que Yin

(1989; p 14) denomina de casos “ferramentas de ensino”. Dois estudos de

casos no âmbito do Boticário foram utilizados, um primeiro sobre um projeto de

devolução de embalagens vazias implantadas pela empresa e outra que foca

na história da empresa em geral. No âmbito da Natura foi utilizado um estudo

de caso elaborado pela London Business School – LBS e a Fundação Dom

Cabral – FDC, que abordava vários aspectos organizacionais e outro focado no

complexo de Cajamar, uma moderna unidade produtiva da empresa

inaugurada no início do século.

Apesar de terem sido apenas três livros, esse tipo de documento foi bem

relevante para coleta de dados. Especialmente o Livro que dedica um capítulo

para relatar a história de vida de Yara do Amaral Pricolli. Esse documento foi

crucial para se entender o surgimento das empresas que impulsionaram as

vendas da Natura a partir de 1974. Um livro específico sobre a FBPN foi

utilizado. Ele contribuiu para um maior entendimento desse importante

Investimento Social-Privado – ISP do Boticário. O terceiro foi um livro

comemorativo do Boticário, lançado em 2002 e distribuído apenas para

funcionários da empresa. Nele, muitos dados sobre os produtos e propagandas

utilizadas puderam ser extraídos.

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No âmbito das revistas pode-se dizer que foram buscadas também

reportagens antigas, mais especificamente no período entre 1986 e 1992. Nas

reportagens de internet privilegiou-se utilizar reportagens direcionadas aos

temas de estudo tratadas na parte teórica deste trabalho. O Portal Exame, que

consiste em um acervo repleto de informações a respeito de várias companhias

brasileiras, foi enquadrado no próximo grupo de evidências: Archival Records.

Esse portal proveu dados de várias revistas de negócios e foi acessado via

internet.

• Archival Records

Dentro desse grupo, a principal fonte de dados foi o Portal Exame, que

arquiva e disponibiliza informações tabuladas e consolidadas sobre vários

aspectos das empresas estudadas. Nesta fonte de dados foram encontradas

informações quantitativas das empresas e, em especial, da Natura. Foram

utilizadas informações sobre a receita total desde 1991 e a variação nos

investimentos imobilizados desde 1996.

O guia exame de sustentabilidade publicado desde 2000 e do qual a

Natura foi mencionada desde o ano 2000 foi crucial para os dados mais atuais

sobre os ISP da empresa e algumas práticas de gestão relacionadas ao tema.

Também foram encontrados no referido Portal os dados consolidados

publicados na edição especial da revista exame que aborda as melhores

empresas para se trabalhar em cada setor. A Natura apareceu em todas as

edições desde o ano 2000 até o ano 2007, com exceção do ano 2001.

Apesar de não terem sido encontrados dados consolidados sobre o

Boticário, por meio do site do Portal Exame foram acessadas notícias

relevantes da empresa. Pode ser destacada a notícia que trata da premiação

da empresa como melhor do setor de cosméticos e perfumaria no ano 2001.

Notícias sobre a Natura também foram acessadas e utilizadas por meio do

Portal Exame.

A segunda fonte de dados utilizada foi o portal eletrônico da Endeavor.

Nele estavam disponibilizados palestras de importantes lideranças dentro da

empresa. O site pode ser acessado por meio do endereço

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http://www.endeavor.org.br. Foi utilizado o conteúdo de quatro palestras e

pronunciações que estão expostas no quadro 3.2 abaixo.

Quadro 3.2 – Relação das pronunciações de líderes da empresa utilizadas na análise Líder Tema Ano Empresa

Guilherme leal “Papel social do empresário” 2002 Natura

Guilherme leal Receita de sucesso da Natura – “Feitas para durar” 2003 Natura

Pedro Passos “Como fazer uma empresa dar certo em um país incerto” 2005 Natura

Arthur Grynbaum As dificuldades por traz do sucesso do Boticário 2003 Boticário Fonte: elaborado pelo autor

O conteúdo das palestras foi importante para entender os discursos dos

líderes das duas empresas. Também puderam ser levantadas algumas das

intenções declaradas que orientaram certas decisões ao longo do tempo.

A terceira e última fonte de dados dentro desse grupo de evidências foram

dois vídeos da série Pequenas Empresas Grande Negócios, transmitida pelo

canal Globo de televisão, gravados e disponibilizados pela equipe da biblioteca

do Instituto Coppead de Administração. Eles foram importantes para o

entendimento do contexto inicial das duas firmas estudadas, pois mostravam

vários relatos dos fundadores da empresa com um pouco da sua história inicial.

Os vídeos também contribuíram para contextualizar outras fontes de dados,

pois mostravam imagens antigas das duas empresas. O vídeo que tratava do

Boticário foi produzido em 1994 e o que tratava da Natura foi produzido 1993.

• Observação direta

As três visitas realizadas à sede da Natura na cidade Cajamar e as duas

visitas realizadas a sede do Boticário em São José dos Pinhais permitiu que

informações fossem coletadas. A Observação Direta permitiu que fosse visto o

grau de tecnologia aparente dos centros de armazenagem das duas empresas

bem como outros aspectos das fábricas das duas empresas. Entre os outros

aspectos podem ser destacados a forma de relacionamento dos empregados e

a infra-estrutura das duas empresas.

• Entrevistas

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Para completar o conjunto dos dados observados e utilizados, realizou-

se uma série de entrevistas com funcionários das organizações estudadas. As

entrevistas foram cruciais para complementar todo o material documental

utilizado na análise. Como se tratava de uma pesquisa processual optou-se por

uma entrevista não estruturada. A intenção era coletar relatos sobre eventos e

atividades que iriam agregar a análise processual pretendida.

A grande maioria das entrevistas realizadas pode ser caracterizada

como entrevista narrativa que, de acordo com Flick (2004; p.115), visa

oferecer aos entrevistados um escopo para que relatem sua experiência.

Nessas entrevistas, as intervenções do entrevistador foram evitadas ao

máximo.

Apenas uma entrevista foi realizada com uma estruturação prévia.

Optou-se por entrevistar o presidente atual da Natura nessa forma pela

limitação de tempo existente. Neste caso, algumas perguntas foram

previamente preparadas, focando em assuntos relacionados à navegação da

empresa no ambiente dinâmico.

Também é importante mencionar que três entrevistas não foram

realizadas pelo autor da presente pesquisa. Duas delas foram cedidas por

outros pesquisadores e uma foi realizada pelo portal Planeta Web e

disponibilizada na Internet no endereço

http://www.terra.com.br/planetanaweb/346/reconectando/grande_teia/preservan

do_01.htm.

Na seleção dos indivíduos que seriam entrevistados, tentou-se conciliar

o procedimento de amostragem teórica com o acesso às pessoas. A

amostragem teórica, de acordo com Flick (2004; p.79), não tem sua

representatividade garantida pela aleatoriedade nem pela estratificação, em

vez disso, indivíduos ou grupos são selecionados de acordo o nível esperado

de novos insights para o trabalho em elaboração. Assim, procurou-se

entrevistar funcionários mais antigos, que conheciam as histórias das

empresas e que pudessem contribuir com relatos de vários eventos. Também

foram realizados esforços no sentido de realizar entrevistas com pessoas de

diferentes áreas e níveis hierárquicos, bem como entrevistar pessoas que

possuíssem alguma relação com responsabilidade social e com a

sustentabilidade nos negócios.

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A dificuldade de acesso a funcionários das empresas restringiu a

seleção de potenciais entrevistas. Assim, adotou-se o critério da conveniência

que, de acordo com o mesmo autor (2004; p. 83), se refere à seleção daqueles

casos mais fáceis de serem acessados.

Abaixo nos quadro 3.3 são relacionados os entrevistados de cada uma

das empresas.

Quadro 3.3 – Relação Entrevistas na Natura e Boticário Nº Cargo na data da entrevista Período de atuação An o da Entrevista Empresa

1 Analista de comunicação corporativa 2007-Atual 2008 Natura

2 Coordenadora de pedidos 1983-Atual 2008 Natura

3 Presidente** 1994-Atual 2008 Natura

4 Vice-Presidente de Tecnologia* 1995-2006 2005 Natura

5 Gerente de RSC 2003-2005 2008 Natura

6 Consultora Natura 1996-Atual 2008 Natura

7 Analista de processos 2006-2007 2008 Natura

8 Diretor de operações 1981-Atual 2008 Boticário

9 Diretor de Sustentabilidade* 1990- Atual 2005 Boticário

10 Gerente da FBPN 1999-Atual 2008 FBPN

11 Gerente de RSC 1995-Atual 2008 Boticário

12 Secretaria do sócio fundador 1981-Atual 2008 Boticário

13 Analista de suprimentos 2004-2007 2008 Boticário

14 Design de lojas e criação 2002-Atual 2008 Boticário

15 Analista de Suply chain 2007-Atual 2008 Boticário

16 Comunicação interna 1995-Atual 2008 Boticário

17 Coordenadora administrativa 1986-Atual 2008 Boticário

18 Sócia da 1º rede de Franquia Boticário*** 1996-Atual 2009 Boticário

19 Vice Presidente* 1990-Atual 2004 Boticário *Entrevistas não realizadas pelo autor do trabalho ** Entrevista Semi-Estruturada *** Entrevista cuja gravação foi perdida ou danificada

3.4.2 Preparação dos dados

Todos os dados coletados foram devidamente preparados antes de

servirem de subsídios para as análises. Antes da tabulação dos fatos e eventos

que comporiam a etapa de análise, vários preparativos foram realizados.

Assumindo que a transcrição é uma etapa necessária para interpretação

(FLICK, 2004; p. 180), apenas uma entrevista realizada pelo autor da pesquisa

não foi transcrita. Também foram transcritas as 4 palestras utilizadas.

Os dados oriundos de documentos e os dados oriundos de entrevistas

foram tabulados e organizados. Montou-se para tal uma tabela agrupando

todos os eventos e fatos relevantes para a análise dos estudos de caso. Nesta

tabela de fatos, procurou-se colocar a data do evento ou fato relevante e o tipo

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de informação à qual o evento fazia relação. A seguir, o quadro 3.3 mostra um

trecho da tabela de fatos construída para auxiliar o desenvolvimento das

análises.

Quadro 3.4 – Trecho da Tabela de organização dos fatos

Data Evento / Fato relevante Empresa - Tipo de informação* Fonte Referencia

2002

Criado o Projeto "Fabrica de Talentos", que visa oferecer uma possibilidade de qualificação de mão de obra para a comunidade local.

B - Social Internet

Em Busca do Aroma da Inovação. Verve Comunicação, 27/01/2006. Disponível em http.verveweb.com.br/clipping acessado em 06/06/2008.

2002 Boticário publica o último balanço social B - Social Entrevista

Entrevista: Miguel Milano - Diretor de Responsabilidade social Corporativa - 15 de FBPN (2005).

1995 Natura distribui 9% de seu lucro aos 2500 colaboradores.

N - Recursos humanos jornal

Natura investe US$ 800 milhões em dez anos. O Estado de São Paulo, 23/09/1996.

*A letra “B” designava os fatos correspondentes ao Boticário e a “N” a Natura. Fonte: elaborado pelo autor

Após a construção da tabela de eventos e fatos, foram selecionados todos os

recortes que apresentavam algum tipo de dado numérico, como informações sobre o

faturamento das empresas e informações sobre o número de funcionários. A

construção desta tabela exclusiva de dados quantitativos foi importante para detectar

incoerências entre as informações apresentadas nas reportagens utilizadas e

possibilitar uma melhor visualização dos números das duas empresas. A seguir, segue

um trecho recortado da tabela de dados quantitativos construída.

Quadro 3.5 – Trecho da tabela de organização de dados quantitativos

Data Valor Espécie Empresa – Descrição* Evento Fonte Referência

1993 10.000.000,00 real N -

Investimento em P e D

Eram investidos 10 milhões no desenvolvimento de novos produtos e 3 milhões em aperfeiçoamento do canal de venda.

Jornal

Saída de Yara não altera comando da Natura. Estado de São Paulo, 22/04/1993.

1997 1.433 Unidades B – Número de Lojas

O Boticário está informatizando todas as 1433 lojas.

jornal

Real duplica a venda de cosméticos. Folha de São Paulo, 11/08/1997.

*A letra “B” designava os fatos correspondentes ao Boticário e a “N” a Natura. Fonte: elaborado pelo autor

Procurou-se cadastrar todos os dados relevantes encontrados. Isso fez

com que fosse possível visualizar os eventos de cada ano, permitindo que a

história das empresas fosse narrada. Os dados dos dois vídeos assistidos e

das observações realizadas nas visitas às empresas não foram catalogados ou

tabulados. A seguir, é apresentado um gráfico que mostra a distribuição dos

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eventos por ano. A interrogação significa que não se conseguiu identificar a

data do fato no tempo.

Gráfico 3. 1 – Distribuição temporal dos fatos e eventos

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

1940

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1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008 ?

Anos

Núm

ero

de F

atos

Fonte: Elaborado pelo autor

Como era de se esperar, a maior concentração de fatos e eventos se deu em

períodos mais recentes. Os dados coletados anteriores ao surgimento das

empresas, se relacionaram com a história de vida dos fundadores das

empresas estudadas.

3.5 Técnicas de análise de dados

Até agora, neste capítulo de método, falou-se muito sobre o contexto da

pesquisa realizada e sobre os dados utilizados, restando discorrer quais

análises foram efetivamente realizadas para tentar alcançar os objetivos

propostos. No presente tópico é abordado que tipo de técnicas foram utilizadas

para buscar um maior entendimento acerca das abordagens propostas e para

captar as relações entre os desafios do crescimento e as vertentes de cada

uma das dimensões. Como a pesquisa é do tipo processo, foi preciso lançar

mão de estratégias que auxiliassem a interpretação de eventos e atividades

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59

que poderiam impactar a incorporação de atitudes ligadas à RSC e à

sustentabilidade ambiental.

A primeira técnica de análise foi a construção da história das duas

empresas do estudo de caso. A descrição da trajetória da empresa,

especialmente quando se trata de alguma pesquisa transversal, é muitas vezes

utilizada apenas com o intuito de contextualizar a análise de algum aspecto da

organização. Contudo, em uma pesquisa como esta, de caráter longitudinal e

focada no processo, a descrição da trajetória é parte importante dos resultados

obtidos, pois é por meio dela que muitos traços e eventos são detectados.

Assim, a técnica primordial de análise utilizada foi a construção, por meio do

conjunto de dados levantados, da trajetória das duas empresas.

Essa técnica de pesquisa é denominada por Langley (1999; p. 695) de

Estratégia Narrativa. De acordo com a autora, ela tem não só o intuito de

preparar cronologicamente os dados para outras análises como também

servem para alcançar um entendimento do contexto organizacional. Na

construção das duas trajetórias buscou-se seguir a orientação de Langley

(1999; p. 696) de não se ater apenas aos fatos relacionados ao crescimento

saudável ou à RSC nas duas empresas e relatar toda a história das

organizações.

A segunda técnica utilizada é chamada de Estratégia de Mapas Visuais

(LANGLEY, 1999; p. 699). Os gráficos, bem como os mapas visuais, de acordo

com Langley (1999; p. 700), contribuem para apresentação de uma grande

quantidade de informações, facilitando o entendimento do processo analisado.

Essa sistematização foi necessária para visualizar e compreender melhor a

presença das altitudes ligadas à RSC na trajetória das duas empresas.

Após a análise que visou entender as empresa quanto às abordagens,

buscou-se estabelecer relações entre as vertentes das abordagens “A” e “B”.

Nesta segunda parte da análise dos dados, foi analisada cada uma das

relações encontradas entre os aspectos positivos das respostas ao desafio do

crescimento e as iniciativas associadas às vertentes das abordagens. Essa

análise permitiu sugerir relações entre as respostas aos Desafios do

Crescimento Saudável propostas por Fleck (2006) e a incorporação de

comportamentos ligados à responsabilidade social.

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60

Nesse âmbito, também se procurou detectar algum padrão ou algum

relacionamento entre a curva de crescimento da empresa e a Curva ““A” & “B””,

fornecida pela análise sintetizada das três dimensões e descrita pela equação

5.1. A seguir, é apresentado o indicador de tamanho desenvolvido por Fleck

(2001), que mostra a evolução do tamanho da empresa ao longo de sua

trajetória.

Equação 3.1 – Curva de crescimento

Vendas ano x 100 Tamanho da empresa ano

= PIB ano

Fonte: elaborado pelo autor

Os dados referentes ao PIB do Brasil foram coletados por meio do site

do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IPEA data.

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4. HISTÓRICO DAS EMPRESAS

4.1 Natura

A Natura nasceu em 1969 de uma associação entre um economista e

um farmacêutico, quando Antonio Luiz da Cunha Seabra e Jean Pierre Berjeaut

abandonaram a Bionat para iniciar as atividades da empresa. Na Bionat,

empresa do pai de Jean, eram manipulados produtos de higiene pessoal e

alguns cosméticos. O nome “Natura” surgiu por acaso, em uma época onde

não era tão usual valorizar a natureza e seus subprodutos.

Na Bionat, Seabra teve seu primeiro contato com o mundo dos

cosméticos. Entretanto foi na Remington, aos 16 anos, que ele teve seu

primeiro contato com a tecnologia de ponta, onde teve a oportunidade de

participar do projeto de um barbeador elétrico inovador para os padrões

brasileiros no início da década de 60. Em 1963, três anos antes de entrar para

a Bionat, Seabra era chefe do departamento de pessoal da empresa no Brasil,

que possuía 900 funcionários.

Enquanto Jean Berjeaut possuía um contato mais íntimo com a

manipulação de cosméticos, para Seabra foi necessário realizar cursos sobre

fisiologia, bioquímica e outros tópicos para poder gerenciar as operações da

Bionat e conseguir conhecimento suficiente para atender pessoalmente seus

clientes na sua nova empresa.

A empresa iniciou suas operações em uma pequena instalação nos

fundos do colégio Arquidiocesano em São Paulo, mas após poucos meses de

atividade, os dois sócios transferiram as instalações da empresa para a Rua

Oscar Freire em São Paulo, ficando mais perto dos consumidores de classe A,

os quais os sócios acreditavam ser seu principal público. Em 1970, um ano

depois de iniciar suas atividades, a Natura alcançou um faturamento de 13 mil

dólares, e apostava no atendimento personalizado e na qualidade dos produtos

para atrair cada vez mais clientes. Seabra considerava sua empresa uma “Anti-

empresa”, uma vez que propunha aos clientes tratamentos e não apenas

cosméticos.

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Apesar da boa aceitação dos produtos, a comercialização ainda era o

ponto fraco da empresa que, mesmo com a loja na Rua Oscar Freire, não tinha

muita penetração no mercado. Em 1972, Luiz Seabra deu o primeiro passo

para a mudança no modelo de vendas da empresa ao decidir utilizar uma

distribuidora independente para comercializar os produtos. O diretor dessa

distribuidora conhecia o trabalho de Yara do Amaral Pricoli, uma ex-professora

que trabalhava com vendas diretas desde 1968. Yara, então, se reuniu com

Seabra e o diretor da empresa a fim de elaborar um modelo de distribuição

para comercializar os produtos da Natura. Tais negociações, entretanto,

serviram para aproximar Seabra da pessoa que construiria o modelo de vendas

diretas da Natura.

Yara iniciou seu contato com vendas na Editora do Povo Brasileiro, onde

trabalhou como vendedora e aprendeu a vencer a sua timidez e, com um ano

de experiência, foi convidada para ser chefe de equipe, pois havia sido

considerada a melhor entre as vendedoras. Apesar do sucesso na editora,

Yara buscava atuar em um mercado mais interessante e se candidatou a chefe

de vendas da Rhodia, empresa do setor de perfumaria que estava entrando no

setor de cosméticos com a linha Isabelle Lancracy. Como chefe de vendas da

Rhodia, a futura sócia da Natura desempenhou funções de recrutamento de

vendedoras e segmentações de regiões de venda. Yara sabia que, apesar de

estar dedicando muitas horas às atividades da empresa, contava com um

salário quase cinco vezes maior que em seu antigo emprego na editora.

A maneira que Yara utilizava para atrair as vendedoras era mostrando-

lhes como poderiam desenvolver uma atividade lucrativa sem que se

afastassem muito de seu lar. Yara permaneceu na Rhodia por mais dezoito

meses antes de ingressar na Algermarin, uma empresa alemã que lhe ofereceu

o dobro do salário na época. Yara aperfeiçoou suas técnicas de vendas e, em

1973, foi promovida a gerente de vendas em São Paulo.

Foi neste cargo que ela teve seu contato com Seabra e a Natura, mas,

apesar de interessar-se pela filosofia e produtos da empresa, inicialmente

recusou a oferta de participar de sua direção para introduzir o modelo de

vendas diretas na Natura. No fim de 1973, como Yara esperava, a distribuidora

Algermarin acabou fechando por falta de direção adequada e desconhecimento

do sistema de vendas domiciliares.

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Meses depois, o médico Miguel Bove Netto procurou Yara para abrirem

um negócio independente no ramo dos cosméticos. A idéia era que ele

contribuísse com o capital e ela com o Know-How, tanto no setor de perfumaria

e cosméticos como em vendas diretas. Yara, então, procurou Luiz Seabra para

fundar a Pro-Estética em outubro do 1974. Essa nova empresa iria distribuir

exclusivamente os produtos Natura.

A princípio, o negócio seria arriscado para a Pro-Estética pela

dependência do suprimento dos produtos da Natura. Assim, Yara e Miguel

convenceram Seabra a entrar como sócio na nova empresa, o que sugeria uma

redução neste risco. Entrando como sócio, Luiz Seabra também garantiria que

a empresa se especializasse em seus produtos e contribuísse para fortalecer

sua marca.

Com quatro funcionários internos, quatro promotoras e uma equipe de

250 consultoras, a Pro-Estética já se mostrou viável no primeiro ano e, em

maio de 1975, Miguel Netto saiu da sociedade vendendo sua participação pelo

dobro do valor investido. Em 1975, primeiro ano de operação da distribuidora, a

Natura faturou 400 mil dólares e encerrou suas atividades na Rua Oscar Freire.

Após dobrar o faturamento em 1976, a Natura começou a experimentar

um incremento ainda mais volumoso de seu faturamento de vendas. Em 1977,

a tendência de culto ao corpo começou a ganhar popularidade, o que

impulsionava a busca por produtos naturais, que remetiam ao nome da

empresa. O grupo, formado pelas duas empresas, abrigou sua distribuição em

uma casa na Avenida Brasil, em uma das zonas mais sofisticadas de São

Paulo. Yara trabalhava mais de 12 horas por dia na Pro-Estética para

administrar uma equipe de mais de 4.000 consultoras autônomas e ainda tinha

que tomar conta de seus filhos e seu lar.

A dedicação integral à distribuição dos produtos da Natura não permitia

que Yara descansasse. A sócia da Pro-Estética afirmou que nunca saía do

trabalho mais cedo para resolver questões pessoais e que sua motivação não

era apenas a vontade de crescer. Ela acreditava que precisava do dinheiro

para sustentar suas filhas após o divórcio.

Mesmo com a garantia de exclusividade dos produtos Natura para a Pro-

Estética, Yara ainda tinha receio quanto à possibilidade de uma eventual saída

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do fornecedor dos produtos que distribuía. A Natura já crescia em termos de

prestígio e a marca se tornava cada vez mais conhecida.

No ano 1979, foi fundada outra distribuidora para os produtos Natura,

que se especializaria na distribuição para o Nordeste e Sul do país, regiões que

não estavam atendendo às expectativas de vendas. Jean Berjeaut convidou

seu cunhado, Guilherme Peirão Leal, e um amigo chamado Romuel Mattos

para integrar a Meridiana. Luiz Seabra foi convidado para integrar à sociedade,

mas declinou o convite dos demais sócios.

O Nordeste do Brasil era uma região pouco explorada pelas empresas

nacionais e o clima quente não privilegiava as fragrâncias e produtos

importados. A Meridiana atendia melhor a região pois atentava para as suas

especificidades.

Mesmo com o faturamento aumentando de 3 milhões de dólares em

1979 para 8 milhões em 1980, o Grupo passava por problemas na gestão e os

líderes das empresas se desentendiam constantemente.

Em 1981, quando o Grupo Natura era composto pela Natura, a

Meridiana e a Pro-Estética, Guilherme Leal e Yara associaram-se outra vez

para criar uma nova linha de produtos compatíveis com os já vendidos pela

Natura. Em associação com Anísio Pinotti eles fundaram a L´arc en Ciel, que

posteriormente mudou seu nome para YGA.

A nova empresa se especializou em artigos de maquiagem de alto

padrão, segmento ainda não atendido pela Natura. Além disso, Yara e

Guilherme conseguiram eliminar parte do risco de não possuírem participação

na Natura, se precavendo contra uma eventual saída do fabricante. Mais uma

vez, Luiz Seabra foi convidado para participar da sociedade mas não aceitou. A

empresa de Yara, Guilherme e Anísio era a quarta empresa do grupo, que se

impulsionava cada vez mais com a vontade de Yara do Amaral de crescer.

A linha de produtos, assim como a empresa, foi batizada de L´arc em

Ciel e diversificava os produtos comercializados pelo grupo. A Natura se

restringia a produzir cremes de tratamento para pele e cabelo nesta época.

No ano de 1981, o faturamento do grupo não manteve o ritmo de

crescimento, alcançando apenas sete milhões de dólares. O início da década

de oitenta foi um período complicado, pois a Natura muitas vezes tinha seu

faturamento superado pelo da Pro-Estética.

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Em 1982, a Natura lançou a linha Natura Sève, que consistia em uma

série de óleos vegetais para reduzir estrias e aumentar a elasticidade da pele.

Essa linha foi muito importante para a empresa e muitos dos produtos se

encontram em seu portifólio até hoje.

Guilherme Leal, em 1983, convidou seu companheiro de futebol Pedro

Passos para trabalhar no grupo. Pedro, que mais tarde se tornaria sócio da

empresa, iniciou suas atividades como gerente de materiais nas instalações da

Rua João Dias. Era atencioso com todos os seus subordinados, se mostrando

disponível e acessível.

Logo após a entrada de Guilherme e o lançamento da Natura Sève, o

grupo começou a trabalhar com produtos com refis, ainda em 1983. Esta

iniciativa, em um primeiro momento, permitia que clientes acessassem os

produtos da empresa por um preço mais baixo. Trabalhar com refis contribuía

na eliminação dos custos na produção de embalagem, que muitas vezes era a

parcela mais cara na composição dos custos dos produtos comercializados

pela empresa. Vale ressaltar que, de acordo com integrantes da empresa, a

Natura foi a pioneira na utilização de refis no setor de vendas diretas no

mercado brasileiro.

A força de trabalho da empresa era majoritariamente composta por

mulheres, mesmo desconsiderando-se as consultoras de vendas. Era prática

usual nas instalações da companhia levar filhos pequenos para o ambiente

trabalho, sem que houvesse qualquer repreensão por parte dos chefes que

trabalhavam na produção.

O aumento do desemprego, especialmente na classe média, verificado

no início dos anos oitenta, impactou negativamente nas vendas do setor, mas

acabou sendo positivo para a Natura, pois muitas das mulheres que perderam

seus empregos se tornaram consultoras Natura. Isso fez com que o nível de

qualificação das profissionais que lidavam diretamente com o consumidor da

Natura aumentasse consideravelmente, fato que contribuiu para a retomada do

crescimento das vendas em 1984.

Yara, em 1985, aumentou o grupo de empresas com uma nova

distribuidora. Ela inicialmente se associou a Nagib Salles, empresário carioca,

para abrir uma empresa dedicada exclusivamente à comercialização no Rio de

Janeiro. Como não poderia se ausentar de São Paulo com muita freqüência,

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Yara conseguiu com que Leal e Mauro Augusto Amim se juntassem a ela e ao

empresário carioca nesse novo empreendimento.

A nova distribuidora funcionaria como as demais empresas do grupo,

dividindo o território em regiões de vendas que seriam administradas pelas

promotoras, que por sua vez faziam o contato com as consultoras de venda.

Luiz Seabra também não participou da nova distribuidora, permanecendo sócio

apenas da Pró-Estética. A entrada da Éternelle, como foi chamada, fez com

que o faturamento global do grupo aumentasse para quarenta milhões em

1985.

Enquanto Yara se empenhava em expandir a rede de distribuição dos

produtos da empresa de Seabra, o fundador remanescente da Natura ensaiava

como poderia internacionalizar sua companhia. A tentativa frustrante de abrir

uma loja em Miami, entretanto, fez o empresário adiar estes planos.

Ainda em 1985, a L´arc en Ciel passou a se chamar YGA e começou a

comercializar, além de maquiagem, produtos sofisticados de perfumaria. A

empresa ampliou suas instalações, que funcionavam de forma independente

das utilizadas pela Natura. A nova fábrica da YGA era bastante extensa,

buscando otimização deste espaço via produção para terceiros.

A Pro-Estética também transferiu suas operações da Av. Brasil para

instalações na mesma Avenida e posteriormente para dois prédios. As

empresas de Yara se expandiam rapidamente, impulsionando a Natura. Seabra

cuidava pessoalmente do lançamento de produtos e muitas vezes se apoiava

na astrologia para tomar decisões: desde os 17 anos Seabra fazia mapas

astrais regularmente, confiando bastante nos rumos que eram apresentados.

Em 1986, a Natura lançou a Bothânica Banho, produzida com

ingredientes naturais que buscava resgatar, de acordo com o fundador da

empresa, “o prazer do banho”. O produto era inovador utilizando o

Pentaglycan, substância que atua na regeneração das células. No mesmo ano,

entretanto, outras empresas lançaram produtos com o mesmo princípio ativo,

não sendo claro se houve vazamento de informação ou se foi mera

coincidência. Dessa forma, a Natura não conseguiu se estabelecer como a

única empresa a comercializar esse princípio ativo no mercado, deixando de se

diferenciar por meio dessa nova tecnologia.

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Em 1986, uma mudança na legislação de IPI reduziu seu prazo de

recolhimento de 180 para 45 dias, gerando impactos significativos no setor de

perfumaria e cosméticos. Esta modificação, ainda que impactasse a Natura,

teve influência mais significativa em seus concorrentes, uma vez que tinham

um portifólio mais concentrado em itens que estavam sujeitos a alíquotas mais

elevadas, como os de perfumaria. Concorrentes como o Boticário e a Avon

tiveram que reajustar seus preços em até 170%, fator que permitiu à Natura

penetrar em mercados de renda um pouco mais baixa, aumentando

consideravelmente a visibilidade da marca.

Mesmo possuindo metade das ações da Pro-Estética, mais de um terço

das ações da YGA e 10% da Éternelle, Yara ainda considerava sua posição

arriscada. A marca Natura ofuscava os produtos L´arc em Ciel, fazendo com

que ela ainda dependesse do contrato de distribuição firmado com a empresa.

Ela também se sentia desconfortável em estar inteiramente exposta ao modelo

de vendas direta, mesmo com o sucesso de suas distribuidoras.

Assim, ela se juntou mais uma vez com Peirão Leal e abriu a Croma. A

Proposta desta nova empresa era utilizar o mercado tradicional para

comercializar duas linhas de produtos, uma esportiva e outra exclusivamente

masculina.

A marca Natura, apesar de conhecida em todo o Brasil e de ter

aumentado sua visibilidade com o aumento dos preços de seus concorrentes,

ainda era majoritariamente consumida apenas pelas classes mais favorecidas.

Isso, apesar de condizente com a proposta inicial dos fundadores, deixava

concorrentes como o Boticário menos ameaçados na comercialização de

produtos de beleza para consumidores de classe média. Miguel Krigsner,

fundador do Boticário, chegou a afirmar em 1987 que o foco da Natura era

diferente do de sua marca, pois focava apenas no público de alta renda. Miguel

admirava os produtos mais do que se sentia ameaçado pelos mesmos. Além

disso, a Natura já tinha um faturamento de aproximadamente 100 milhões

dólares, bem mais expressivo do que o do Boticário e de todos os seus

concorrentes nacionais.

Nesta época, outro fator externo contribuiu para fazer com que a Natura

penetrasse ainda no segmento de classes mais baixas. Além da já mencionada

diminuição do prazo de recolhimento de IPI que impactou proporcionalmente

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mais no preço final de seus concerrentes, o congelamento dos preços pelo

governo fez com que mais consumidores conseguissem acessar os produtos

da marca. Assim, a Natura ganhou participação de mercado preocupando os

concorrentes que, como o Boticário, atendiam outros segmentos de mercado.

O aumento do prestígio da Natura teve impacto não só nos

concorrentes, mas nas empresas que faziam parte do Grupo Natura. A YGA,

de Yara e Guilherme, começou a adotar as cores e conceitos da Natura. Assim,

a marca L´arc em Ciel começou a incorporar os conceitos da Natura nas suas

linhas de maquiagem e perfumes. Essa incorporação foi acontecendo aos

poucos porque, inicialmente, a idéia da L´arc em Ciel era caminhar

independente da Natura, compartilhando apenas o sistema de distribuição.

Consumidores mais atentos poderiam observar esta interferência nas

cores dos novos produtos que a L´arc em Ciel vinha criando, nos quais a cor

vinho, que remetia a realeza, foi substituída pelo preto e amarelo da Natura. O

preto se relacionava com a auto-análise e a introspecção, já o amarelo, era

associado ao brilho e à facilidade de comunicação. Também era possível notar

que a L´arc em Ciel começou a incorporar o apelo de tratamento, que antes era

inexistente nos itens da marca.

Assim, aos poucos, foi aumentando a interferência da Natura na

atividade das outras empresas do grupo. Até as distribuidoras dos produtos

estavam sofrendo com os conflitos gerados pelas marcas Natura e L´arc em

Ciel.

Em dezembro de 1988, os sócios das empresas decidiram formalizar o

que, na prática, já vinha acontecendo. Foi criada a holding Stellium, com uma

redistribuição societária das empresas do grupo. A palavra, que significa

“estrelação”, remete ao alinhamento de três ou mais astros. Assim, o nome foi

adequado ao contexto das empresas do Grupo Natura, que iniciaram seu

processo formal de alinhamento.

Das seis empresas que Leal, Seabra e Yara participavam, somente a

Croma ficou de fora da reorganização. Seabra afirmou que a Natura e a YGA

eram empresas irmãs e como já compartilhavam a estrutura de distribuição da

Pro-Estética, Meridiana, e Éternelle, a fusão já poderia ter ocorrido há mais

tempo.

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O fundador da Natura reconhecia que as várias empresas, cada uma

com seus próprios donos e seus próprios esquemas administrativos,

impulsionaram a Natura ao longo de seus primeiro anos. Isso ocorreu,

sobretudo, entre os anos de 1980 e 1985, período em que a produção

aumentou quatro vezes. Mesmo assim, o descompasso era problemático, uma

vez que cada uma das empresas tinha suas próprias metas. A

interdependência, após muita discussão dos sócios, foi transformada em

sociedade.

Além da junção das distribuidoras e das duas marcas, foi criada outra

empresa para compor o grupo. Luiz Seabra estava convencido de que o

mercado externo era importante e como já faturavam 250 mil dólares,

provenientes das vendas de Chile, Bolívia e Portugal, aumentou os esforço na

penetração internacional da empresa. Assim, foi criada a Natura Comercial

Exportadora com metas audaciosas de multiplicar por 12 vezes o faturamento

oriundo das exportações da empresa em três anos.

Jean Berjeaut não ficou satisfeito com idéia de criação da Stellium e

decidiu mudar de atividade. Ele vendeu os 50% que detinha da Natura para o

Grupo. Os co-fundadores da Éternelle também deixaram a sociedade e as

operações da empresa foram incorporadas pelas outras distribuidoras. Romuel

Matos, da Pro-Estética, e Anísio Pinotti, um dos donos da YGA, também

possuíam cotas da nova holding. Seabra era o acionista majoritário, com vinte

sete por cento da holding. Yara e Leal ficaram com 26,5% cada. Os outros

sócios e Pedro Passos, que era executivo da empresa, ficaram com o restante

das ações.

Após a fusão, deu-se início aos preparativos para a construção de uma

nova unidade produtiva, que substituiu a unidade instalada na Vila Clementino,

da Natura, e a de Santo Amaro, que fabricava os produtos da antiga YGA. Os

investimentos foram orçados em 20 milhões de dólares, prevendo a compra de

máquinas, aprimoramento profissional e aprimoramento dos processos de

regionalização comercial. Esse montante foi despendido até 1990. Assim, a

nova holding aumentou e modernizou a produção do grupo.

O projeto foi além da reestruturação jurídica e, de acordo com

funcionários da Natura, trouxe mudanças que incluíram a modernização, não

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só das máquinas, mas de toda a empresa. Os sócios priorizaram os

investimentos nas novas instalações e no sistema de distribuição que atendia

bem o Rio de Janeiro e São Paulo, mas precisava ser reforçado nos locais

onde a Meridiana costumava atender. São Paulo e Rio de Janeiro

representavam juntos 55% das vendas do grupo.

Comparado com os investimentos de 20 milhões em produção, o

investimento de dois milhões em publicidade foi relativamente pequeno. Não se

fez nenhuma campanha para reforçar a nova estrutura organizacional e todo o

valor foi despendido para promover os novos lançamentos da Natura no ano.

Os produtos da antiga L´arc em Ciel começaram a ter mais benefícios em sua

composição e os novos lançamentos também tentaram aliar a estética com as

propriedades terapêuticas.

O principal lançamento da empresa neste novo conceito foi a linha

Somma, de produtos para verão. Ela foi lançada em novembro de 1989 e seus

produtos possuíam um sistema de bronzeamento e a capacidade de filtrar

conjuntamente os raios UVB e UVA, que provocam, respectivamente, a

vermelhidão e o envelhecimento da pele. De acordo com Seabra, a Natura

tinha o único produto que reunia todos esses benefícios em um só frasco. Com

a mesma tendência dual, também foram lançados produtos, dentro da Somma,

que ajudavam fixar o bronzeamento ao mesmo tempo em que aceleravam a

recuperação epidérmica.

A intenção de alinhar as empresas impactava também a produção. Tudo

começou a ser pensado e as embalagens, que apesar de terem sofrido

interferência quanto às cores e a disponibilidade de informações, ainda não

estavam padronizadas. Elas sofreram modificações que facilitavam a

estocagem em prateleira e se tornaram mais resistentes. A linha Somma e a

Dr. N ganharam produtos com versões com refis.

A nova empresa, formada em dezembro 1988, chegava ao início do ano

de 1990 com 1300 funcionários e 36 mil consultoras que levavam os produtos

até os clientes.

A nova fábrica foi construída em Itapecerica da Serra, em São Paulo, e

foi inaugurada em junho de 1990. Foram cogitadas várias localizações para as

novas instalações e consideradas propostas de vários Estados, que

ofereceram benefícios fiscais e possuíam uma mão-de-obra mais barata, mas a

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opção escolhida foi a de abrir nos arredores da cidade São Paulo. Essa

decisão, de acordo com Pedro Passos, foi difícil de ser tomada e, para muitos,

seria mais vantajoso que a Natura realizasse a produção em localidades

menos custosas.

A escolha por Itapecerica da Serra foi embasada pelo argumento de que

o município está localizado a apenas 45 km da grande São Paulo, o maior

mercado da empresa. O sistema de distribuição deveria zelar pala agilidade e

velocidade para fazer com que os produtos chegassem até as consultoras. O

ciclo de renovação dos catálogos, espécie de revista com todos os produtos e

seus preços, era de 21 dias e, mesmo que os produtos se mantivessem, o

preço sempre sofria reajustes por causa da alta inflação.

Pedro Passos também afirma ter considerado os funcionários da

empresa no processo. Era preocupante o fato de trocar a sede produtiva da

Natura, para um lugar onde não seria possível manter a maioria dos

colaboradores que participavam da produção. Mas mesmo assim, os

funcionários sentiram a mudança e o aumento da distância, demorando a se

adaptar às novas condições de trabalho. A fábrica tinha refeitórios e um

sistema de transporte que levava e buscava os funcionários em São Paulo.

Outra novidade era uma pequena creche que viabilizava o trabalho das

mulheres, que eram quase setenta por cento dos empregados.

Assim, com a capacidade produtiva aumentada pela metade, a Natura

iniciou a década de noventa descapitalizada. O modelo de negócio foi

completamente mantido e os sócios contavam com a sua capacidade de

geração de caixa para manter os investimentos em inovação e

desenvolvimento de produtos. A Natura e a L´arc em Ciel contribuíam para a

holding com um portfólio de 120 produtos no início do processo de fusão e, já

em 1990, o número de produtos aumentou para 200.

Sem a liberdade para gerir as distribuidoras, Yara do Amaral, mesmo

com 26,5% das cotas, se afastava da empresa nesta nova fase. Ela nunca

havia participado do desenvolvimento de produtos e dos processos internos

que não eram ligados à distribuição e comercialização dos produtos. Ela, desde

o início, confiava nos produtos desenvolvidos por Seabra na Natura e nas

idéias de Guilherme Leal e Anísio Pinotti na administração da marca L´arc em

Ciel.

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Um novo produto surgiu em 1990 para se tornar uma das estrelas da

empresa: o Chronos, elaborado com ácidos de frutas e ceramidas. Muitas

pesquisas ainda seriam feitas para concluir a linha de produtos que retardava

os sinais de envelhecimento. A linha Chronos só foi lançada dois anos depois

do primeiro produto com esse nome, mas desde o início, a comunicação

escolhida para promoção não foi baseada em estereótipos de beleza. “Estética

com ética” foi o slogan que começou a ser utilizado pela empresa nesse ano.

O momento era decisivo e, de acordo Luiz Seabra, a empresa precisava

assumir um porte de grande empresa. Em uma época em que a inflação era de

quase 90% ao mês e Estellium passava por vários desafios de administração,

uma decisão incomum foi tomada envolvendo dois líderes da empresa. Frente

aos novos desafios, Guilherme Leal e Pedro Passos se afastaram dois meses

da empresa para voltar a estudar. Eles acreditavam que a empresa estava na

direção certa, mas estava defasada em práticas de gestão.

Os dois líderes voltaram dos estudos decididos a profissionalizar mais a

gestão da empresa e iniciaram uma mudança no quadro de funcionários.

Vários gestores foram trazidos de fora da empresa para compor um conselho

de administração, com capacidade de administrar a empresa que havia sido

reestruturada.

Seabra confiava no aumento das consultoras e no foco nas classes mais

altas para contornar as crises e, assim, apostava no crescimento da empresa

mesmo em épocas de recessão.

Com a chegada de vários profissionais de fora e a decisão de

profissionalizar a gestão da empresa, novos desafios de alinhamento

apareceram. Se a criação da holding permitiu que o ritmo de crescimento das

empresas fosse ajustado e que houvesse uma maior padronização da

produção, a iniciativa de Leal e Passos fez com que a empresa sofresse a

interferência de profissionais de várias culturas diferentes que não eram

acostumados com o modelo de negócios da Natura nem com a proposta que a

empresa trazia. Isso foi uma preocupação dos líderes da empresa, que teriam

que pensar em uma forma para corrigir esse problema.

No final de 1991, a busca por produtos que remetiam à natureza era

mais forte e mais compreensível para todos no ramo da perfumaria e

cosméticos, mas isso não era suficiente para orientar a administração da

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Natura. Dos 11 membros da alta administração, apenas três eram

originalmente das empresas do antigo Grupo Natura.

O contexto fez crescer a necessidade de formalizar os valores da

empresa. Embora os novos gestores contribuíssem para melhorar as práticas

da empresa, o choque cultural, de acordo com Pedro Passos1, foi grande. Por

fim, foi decidido que a empresa devia formalizar a razão de ser e sua visão de

mundo. A empresa até hoje não mudou as frases que a orientavam naquela

época.

Nos estudos que Leal e Passos realizaram, eles tiveram a oportunidade

de discutir ética nos negócios, fator que contribuiu para a tradução da forma de

atuação da empresa em palavras. A Natura passou a nortear suas decisões

com base em sua razão de ser, que passou a ser “Criar e comercializar

produtos e serviços que promovam o Bem-Estar/Estar Bem". Bem-Estar seria a

relação harmoniosa, agradável, do indivíduo consigo mesmo, com seu corpo.

Já Estar Bem seria a relação empática, bem-sucedida, prazerosa, do indivíduo

com o outro, com a natureza da qual faz parte e com o todo.

Com a razão de ser formalizada, a Natura iniciou o ano de 1992 mais

organizada. Entretanto, se a alta inflação e a crise prejudicavam mais seus

concorrentes do que ela, a abertura econômica feita pelo presidente Collor

trouxe concorrentes internacionais. Pode-se destacar a entrada da Amway, que

utilizava o mesmo sistema de distribuição da Natura. Os concorrentes

estrangeiros aumentaram a disputa, sobretudo nas camadas dos consumidores

mais ricos, público alvo da empresa de Seabra.

Nessa época, a empresa começou um processo de demissão que fez

com que sua força de trabalho reduzisse em 200 pessoas, passando de 1800

funcionários em 1991 para aproximadamente 1600 em 1992. Essa era a maior

demissão da história da empresa, que havia sempre crescido em número de

colaboradores, inclusive quando mudou suas instalações produtivas para

Itapecerica da Serra.

A produção também se retraiu, pois, vários produtos foram

descontinuados no referido ano. Entretanto, novas linhas foram desenvolvidas

com base na tecnologia e na razão de ser. A linha Chronos teve seus trinta

1 Informado em palestra “Como fazer uma empresa dar certo em um país incerto” em 2005.

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meses de desenvolvimento finalizados e chegou ao mercado com uma

proposta de comunicação inovadora. Se o slogan “Estética com Ética” já era

incomum, a Natura inovou ainda mais ao utilizar anúncios comerciais que não

utilizavam modelos na campanha de lançamento dos produtos da linha. A

proposta era trazer mulheres comuns, cada uma com uma beleza diferente,

sem falsas promessas para os potenciais consumidores dessa linha anti-rugas.

Também foi desenvolvido um novo slogan que apostava na

transparência e na realidade em cosméticos. No ano de lançamento oficial da

linha, o slogan utilizado foi “A Verdade em Cosméticos”. Além disso, a Chronos

trazia produtos anti-rugas de acordo com as idades. Eram atendidas pela linha

mulheres de 30 a 60 anos de idade e, atualmente, a linha atende também

mulheres de 25 anos de idade.

Ainda em 1992, um ano problemático no qual a Natura reduziu seu

volume de vendas e viu seu faturamento cair, Guilherme Leal se associou ao

Pensamento Nacional das Bases Empresariais – PNBE, que visa promover a

cidadania do empresário e a sua participação mais ativa na vida nacional. O

PNBE, que foi fundado no ano da adesão de Leal, promovia encontros e

debates com empresários de sociedades de todos os portes sobre questões

como democracia, ética nos negócios e, principalmente, o papel das empresas

na promoção da cidadania.

A profissionalização da gestão que influenciou na decisão de demitir os

200 funcionários também promoveu a implantação de um sistema de

monitoramento das práticas de gestão e monitoramento dos processos

internos. Com a contratação de novos diretores, os processos foram

atualizados e se tornaram compatíveis com as modernas instalações de

Itapecerica da Serra.

O centro de pesquisas da empresa em São Paulo, mesmo em

dificuldades, funcionava normalmente. Enquanto a média do setor costumava

investir um e meio por cento do faturamento em P&D, a Natura investia 2%.

A produção foi crescendo e, para o ano de 1993, era esperada uma

retomada no volume de vendas para o patamar observado em 1991.

Entretanto, quando as coisas estavam melhorando, a empresa anunciou a

saída de Yara do Amaral Pricolli. Os vinte e seis e meio por cento das ações da

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Stellium, que a fundadora da Pro-Estética e da YGA possuía, foram vendidos

por vinte e cinco milhões de dólares aos outros sócios.

Seabra, Leal e Passos aumentaram suas participações na empresa

ficando com 37,794% e 36,068% e 8,897% respectivamente. Seabra afirmou

que a saída de Yara não atrapalharia as operações da empresa e que a Natura

ganharia maior flexibilidade para tomadas de decisões. A ex-acionista havia se

casado com um empresário do ramo de turismo e estava iniciando novas

empreitadas no ramo imobiliário. Anísio Pinotti passou a ser o quarto maior

acionista seguido por Romuel de Mattos, ex-sócio fundador da distribuidora

Meridiana.

A linha Mamãe e Bebê foi criada ainda no início de 1993. Sua proposta

era estreitar as relações entre mãe e filho por meio de produtos para as

diferentes fases da gestação e os primeiros anos de vida da criança.

Diferentemente das linhas infantis que traziam produtos para as crianças e das

linhas para grávidas, que já existiam no mercado, a proposta da Mamãe e

Bebê era uma novidade. Os produtos eram divididos pelos momentos em que a

mãe se relaciona com a criança, como o “Momento do Banho” e o “Momento

da Troca de Fraldas”.

À frente dos negócios, Leal e Seabra reforçaram o processo de vendas e

promoveram o programa para capacitação das consultoras. A Natura começou

a fornecer um treinamento mais especializado para algumas consultoras,

aumentando o número de encontros entre elas e as promotoras. A Natura já

havia constatado que um aumento da capacitação da mão-de-obra tinha um

impacto significativo nas vendas da empresa.

O braço internacional da holding, a Natura Comercial Exportadora, não

havia atingido as metas estipuladas de aumentar o faturamento em doze vezes

em três anos. As vendas para o mercado externo cresceram para dois milhões

de dólares, um milhão a menos do que o pretendido na época da criação da

empresa. A empresa já tinha representações no Chile, na Bolívia, no Peru e na

Malásia. A idéia agora era criar parcerias internacionais para incrementar as

vendas, pois Seabra considerava o mercado nacional estacionado. Além disso,

a competição havia se acirrado após a abertura de mercado, fato que

pressionava ainda mais a investir para aumentar as exportações.

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No Mercado interno, as vendas também estavam abaixo do esperado e

a empresa continuou contratando profissionais de fora do mercado para

compor a alta administração. Para aumentar mais o volume de produção,

novas contratações foram feitas no nível operacional. A idéia era utilizar toda a

capacidade produtiva das instalações em Itapecerica da Serra. A empresa

terminou o ano 1993 com quase trinta por cento a mais de funcionários.

A produção da holding aumentou com o aumento da capacidade

produtiva, mas a produtividade por funcionário piorou expressivamente. Se dois

anos antes, mil e oitocentos funcionários produziram vinte e seis milhões de

unidades, em 1993, dois mil e duzentos funcionários produziram um milhão de

unidades a menos.

Gráfico 4.1 – Unidades Produzidas e Númeor de Funcionários (1991-1995)

Fonte: Elaborado a partir dos dados disponíveis no Estado de São Paulo, 23/09/1996.

A política de recursos humanos se tornou mais expressiva no ano de

1994. Os funcionários recém contratados já tinham direito a quatorze salários e

a Natura começou a oferecer bonificação para o nível gerencial. O sistema de

distribuição dos resultados passou a ser atrelado a metas. O time de diretores

que se envolviam na criação dos produtos e em sua distribuição passou a se

envolver mais na administração dos recursos humanos da empresa.

O Plano Real trouxe estabilidade econômica e oportunidades de

crescimento para o setor de perfumaria e cosméticos. A Natura havia passado

por toda uma reestruturação que a ajudaria a crescer em uma economia mais

estável.

0 500

1000 1500 2000 2500 3000

1991 1992 1993 1994 1995 0 10 20 30 40 50 60

Produção (em milhões de Unidades) Funcionários (Esquerda)

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Com o aumento do poder aquisitivo de classes mais baixas, o perfil do

consumidor dos produtos da Natura começou a mudar. Os produtos da

empresa começaram a ter seu consumo viabilizado em classes mais baixas,

enquanto a paridade do real com o dólar fez com que as classes mais elevadas

consumissem mais os produtos importados. Outra mudança no perfil de

consumo foi o aumento do público masculino consumidor de produtos de

beleza. Isso fez com que a empresa voltasse mais a atenção ao

desenvolvimento de produtos específicos para esse público, segmento que

concorrentes como o Boticário já vinham atendendo desde a década de oitenta.

O número de Consultores Natura do sexo masculino também estava

aumentando e já era cinco por cento do total. De acordo com Alessandro

Carlucci, que à época era gerente comercial, esse fato era positivo paras as

vendas, pois quando homens decidiam virar Consultores Natura, normalmente

dedicavam tempo integral à atividade. Um ano mais tarde, em 1995, o número

de consultores aumentou novamente para oito por cento do total. Com uma

carteira de 250 clientes e uma jornada de trabalho de oito horas diárias, era

possível que os consultores lucrassem até dois mil reais por mês.

Após dois anos de resultados ruins, a Natura voltou a atingir resultados

satisfatórios, assim como várias empresas do setor. O faturamento aumentou

em vinte por cento e ultrapassou o recorde de vendas alcançado em 1991. A

empresa contratou muitos funcionários para 1995 e se preparou para

aproveitar o novo período de estabilidade. A empresa, que buscava os talentos

gerenciais no mercado, passou a desenvolver seus funcionários para assumir

posições mais importantes. Até o chão de fábrica passou a ter mais

oportunidades, sendo oferecidos inclusive cursos de informática.

Com um crescimento maior do que o da sua principal concorrente, a

americana Avon, a Natura aumentou os investimentos em pesquisa e

desenvolvimento em 1995. Os investimentos de dois por cento do faturamento,

que já eram acima da média do setor, subiram para três e meio por cento em

1995. Dessa forma, a Natura elevou seu patamar para os padrões realizados

pelas gigantes internacionais L´Oréal e Procter & Gamble.

Além do aumento dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, a

Natura começou a reforçar suas parcerias para desenvolver seus produtos.

Além dos projetos em que a empresa contratava tecnologia de processos nas

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áreas químicas e farmacêuticas, a empresa estabeleceu parcerias com a

Universidade de São Paulo – USP, com a Universidade de Campinas –

Unicamp e com o Instituto Mauá de Tecnologia. Com isso, passou a ser mais

agressiva no lançamento de novos produtos, se tornando mais parecida com a

Avon, que lançava em média 120 produtos novos a cada ano.

A Natura acreditava que ela investia mais em treinamento para suas

vendedoras que sua concorrente e também acreditava declaradamente na

projeção e força de sua marca. Pedro Passos afirmou ter reconhecido na

época que tecnologia e produtos se tornariam semelhantes com o tempo e a

principal forma de diferenciação passaria a ser os valores básicos que a

empresa levava. Ao longo do ano foram investidos 16 milhões de reais em

cursos.

Em outubro do ano de 1995, melhor ano da história da empresa até

então, iniciou-se um projeto de investimento social privado. A Natura, em

parceria com a Fundação Abrinq, lançou o projeto Crer para Ver para arrecadar

recursos para serem investidos em educação. O projeto foi elaborado para ter

continuidade e utilizou as consultoras da Natura para realizar a captação de

recursos. Com o dinheiro, inicialmente arrecadado por meio da venda de

cartões de natal, seriam patrocinadas iniciativas ligadas à educação que

visavam assegurar o acesso à aprendizagem, aprimorar os modelos de ensino

e a capacitação dos educadores.

No primeiro ano, o Crer para Ver conseguiu arrecadar 659 mil reais, que

patrocinaram inúmeros projetos de até 30 mil reais. Guilherme Leal teve o

primeiro contato com a Fundação Abrinq por meio do PNBE em 1992. A

campanha, que seria permanente, recebia projetos ao longo de todo o ano, e

estes eram analisados por um comitê de especialistas da Fundação Abrinq,

que deveriam eleger quais projetos seriam patrocinados com o dinheiro

arrecadado pelas Consultoras Natura.

Com a produção e as contratações de novos funcionários aumentando,

a Natura planejava mais uma expansão em suas instalações. À época, sabia-

se que para manter o ritmo de aumento das vendas, seria preciso aumentar a

capacidade instalada de fabricação. No início de 1996, nada foi declarado a

respeito de como seriam as novas instalações, exceto que os novos

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investimentos na modernização de suas máquinas e equipamentos seriam de

36 milhões até o final do projeto.

A Natura, ao longo do ano, estudou duas possibilidades para a nova

fábrica. Ela poderia construir novas instalações que dobrariam sua capacidade

de 51 milhões de unidades, investindo 50 milhões de reais, ou poderia quase

triplicar sua capacidade investindo 100 milhões de reais.

Ao longo de 1996, já se tinha idéia de que o montante total a ser

investido seria de 200 milhões. A empresa, que normalmente reinvestia os

próprios lucros, e que havia crescido muito nas suas duas primeiras décadas

com a entrada de novos sócios aportando capital, iria pegar metade do valor a

ser investido com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social -

BNDES. Finalmente, a opção foi investir os 100 milhões e, assim, quase

triplicar a capacidade instalada de produção.

O local da nova fábrica ainda não estava especificado, mas a firma havia

mais uma vez descartado a possibilidade de receber incentivos fiscais

superiores de outros estados e havia planejado seu investimento para os

arredores de São Paulo. Essa decisão foi tomada, pois a empresa esperava

poder contar com os funcionários da fábrica de Itapecerica da Serra na nova

instalação.

Outra opção, também descartada, foi a de ampliar as instalações em

Itapecerica da Serra. Isso se deu, pois a área era uma região de mananciais,

fator que poderia prejudicar o andamento das operações no longo prazo.

Assim, somente ao final do ano, foi divulgado que a nova unidade produtiva

seria construída em Cajamar.

No ano de 1996, a Natura anunciava planos de investimentos para os

próximos dez anos. Oitocentos milhões seriam investidos até 2005 com

pretensões de alcançar um faturamento de 1,2 bilhões de reais.

A empresa, que era vista por seus líderes e por seus concorrentes

nacionais como sendo voltada para o público de poder aquisitivo mais alto,

começou deliberadamente a se posicionar de forma mais atrativa para outras

classes sociais. Apesar de a empresa ter ganhado projeção nas classes menos

favorecidas anteriormente, devido a fatores externos, desta vez escolheu

reduzir os preços e mudar seu foco de atuação.

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Com isso, a Natura avançou rapidamente sobre os seus concorrentes e

conseguiu igualar o Market Share da Avon2. A Natura que em 1989 possuía um

Market Share de 6,8% passou a ter 14% em 1996. Parte disso também foi

devido aos inúmeros lançamentos de produtos realizados no ano. A empresa

aumentou seu portfólio para 270, chegando até a importar produtos da Itália

para compor suas linhas. Ela importava batons e removedores de maquiagem,

pois alegava que os produtos chegavam ao consumidor com um preço mais

competitivo. Isso era possível mesmo pagando um imposto de importação com

alíquota de 40% sobre itens de perfumaria, maquiagens e cosméticos.

Os cursos para as consultoras tornaram-se grátis e obrigatórios em

1996. A empresa acreditava no treinamento das suas consultoras para se

diferenciar da Avon. A Natura, ao mudar seu posicionamento, passou a

disputar diretamente com Avon e outras concorrentes nacionais não focadas

nos segmentos de maior poder aquisitivo.

A empresa fechou o ano faturando 908 milhões de dólares e com 2700

funcionários. Apesar do crescimento generalizado, o indicador mais expressivo

foi o aumento no imobilizado ao longo do ano. A Natura aumentou seus ativos

imobilizados em 67%, ao se comparar com o ano de 1995. Assim, ela utilizava

a boa fase e a estabilidade econômica para fazer planos e investir.

Apesar do crescimento e do avanço sobre os concorrentes, a Natura não

conseguia ter sucesso no mercado externo. Desde 1994, a empresa verificou

prejuízos crescentes e expressivos, oriundos dos negócios internacionais. Os

planos da Natura Comercial Exportadora não estavam se concretizando e era a

segunda vez na história que a empresa repensava a sua internacionalização.

Entretanto, desta vez, a empresa havia assumido um porte muito maior do que

quando abriu lojas em Miami e poderia arriscar-se mais em suas investidas

internacionais. Optou, mesmo com prejuízos operacionais, manter o ritmo de

investimento em outros mercados latino-americanos.

2 De acordo com a reportagem “Natura vai construir sua segunda fábrica” da Gazeta mercantil, 03/07/1996.

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Gráfico 4.2 – Resultado internacional da Natura 1993-1998

Resultado Internacional

-7

-6

-5

-4

-3

-2

-1

0

1

1993 1994 1995 1996 1997 1998Milh

ões

Fonte: Fundação Dom Cabral

Se as investidas internacionais não estavam indo bem, em 1997, o

mercado brasileiro passou a ser considerado o quinto maior do mundo em

volume de vendas e cresceu mais do que a média mundial. Entretanto, o

consumo per capta dos brasileiros ainda era baixo, havendo ainda espaço para

crescimento. Quando comparado com o de outros países, o Brasil ocupava

apenas a vigésima sétima posição no ranking.

Ao longo do ano de 1997, a Natura voltou a liderar o mercado brasileiro

dos cosméticos com 16% de Market Share, contra 15% da Avon. A empresa já

havia ultrapassado a Avon no ano logo após a fusão das empresas do grupo

Natura, mas havia passado o início da década de 90 atrás de sua concorrente

em valor de vendas no mercado brasileiro. Essa conquista se deu após a

Natura combinar a estratégia de lançamentos de vários produtos com a

especialização das consultoras e novo posicionamento da marca.

É interessante observar que, apesar do aumento das vendas, os lucros

decresceram neste período. Isso se deve ao aumento das despesas

operacionais, que subiram mais que a receita operacional.

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Gráfico 4.3 – Evolução do Lucro operacional Natura 1993-1998

Evolução do Lucro Operacional

0

1020

3040

50

6070

8090

100

1993 1994 1995 1996 1997 1998Lucr

o op

erac

iona

l - B

rasi

l (M

ilhõe

s

de U

s$)

Fonte: Fundação Dom Cabral

Entre os trabalhadores, era comentada a importância dos líderes da

empresa. Pedro Passos era conhecido por ser atencioso e acessível entres os

funcionários, e era quem controlava as operações com mais proximidade.

Seabra percebia a necessidade dos consumidores e liderava a criação dos

produtos, apontando as tendências que seriam seguidas. A sua abordagem

transparente e seu carisma contribuíam para a motivação dos empregados. Ele

estava constantemente ligado ao comitê de inovação dos produtos e sempre

participava dos encontros com as consultoras. Leal, que na época era o

presidente, traçava a estratégia da empresa. Era uma pessoa aberta a novas

idéias e sua ligação com o PNBE, desde a fundação da organização, fez com

que atentasse para questões sociais e o papel social do empresário. Leal

afirmou, nesta época, que todas as empresas possuem uma série de recursos

que não os financeiros que podem contribuir para a transformação social do

país.

Guilherme Leal havia se envolvido diretamente com o Crer Para Ver e

havia se comprometido com a idéia do lançamento do programa desde o início.

O Programa ganhou mais projeção no ano de 1997 e, consequentemente, mais

projetos educacionais foram apoiados. Leal também acreditava na importância

da governança corporativa e convidou membros externos ao board de diretores

para compor um conselho de administração, que foi formado nesta época.

Foram convidados para o conselho da empresa, José Guimarães Monforte, ex-

executivo do Citibank, e Edson Vaz Musa, ex-presidente da Rhodia e dono da

Caloi. Desde então, esses cinco senhores passaram a se reunir todos os

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meses para avaliar os resultados e definir as estratégias da maior empresa

nacional de cosméticos. Pedro Passos afirmou que esse foi um exercício para

os valores da empresa, os quais constituem-se no grande diferencial de sua

firma frente aos concorrentes.

Essa experiência com governança corporativa veio antes dos

pensamentos de abertura de capital e antes da onda de demissões de

presidentes que assolou as companhias americanas em 1999, que teve entre

suas vítimas, os principais executivos da Gillette, da Procter & Gamble e da

Xerox.

A Natura era reconhecida como um bom lugar para mulheres

trabalharem, justamente porque vários dos benefícios que a empresa oferecia

aos seus empregados estavam ligados à mão-de-obra feminina, como por

exemplo auxilio educação para seus filhos. A Natura oferecia este benefício à

mão-de-obra não-qualificada.

A dimensão que a empresa estava ganhando no final da década de

noventa era expressiva. Apesar de não ter conseguido manter a liderança em

participação de mercado, perdendo-a novamente para a AVON, a Natura se

projetava em termos de reconhecimento3. Em 1998, a empresa foi considerada

a melhor empresa do setor de perfumaria e cosmético pela revista Exame,

principalmente pelo acelerado crescimento experimentado após a criação do

plano real. Em 1997, também foram aumentados os investimentos em

publicidade e promoções.

Mesmo com a queda nos lucros, foram mantidos os investimentos em

pesquisa e desenvolvimento. Ainda em 1997, a empresa lançou produtos

infantis para a sua linha Fotoequilíbrio de produtos para o verão, que foram

desenvolvidos com tecnologia de ponta. Eram os únicos produtos nacionais

especializados para a proteção de crianças. Pedro Passos afirmava que as

economias de escala e os custos de produção que a Natura conseguia não

chegavam até o consumidor final, pois a empresa aumentava seus

investimentos nos lançamentos.

Boa parte dos custos que a Natura conseguia reduzir era com a

economia nas embalagens de seus produtos. Com a população de classe mais

3 De acordo com a reportagem “Cosméticos prevê crescer 5% em 98” da Folha de São Paulo, 02/03/1998 a Natura passou a ter 13% da participação no mercado brasileiro de Cosmético em 1998.

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baixa consumindo mais seus produtos, os refis passaram a ser mais

procurados, pois representavam economia também para o consumidor.

Uma medida importante, no final de 1997, foi o estreitamento da

empresa com a Inglesa Rexam, uma fabricante de embalagens para seus

produtos. A Rexam foi atraída pela Natura a implantar instalações no Brasil

para suprir a demanda da empresa, barateando o custo das embalagens.

Outras parceiras da empresa, as francesas Augros, fabricantes de tampas e

válvulas, e Saint Gobain, fabricante de frascos, também foram cooptadas a

virem para o Brasil para atenderem a Natura, ao longo de 1998. A Natura

argumentava que poderia garantir a demanda inicial para os produtos,

enquanto a empresa teria acesso mais próximo ao quinto maior mercado de

cosméticos do mundo.

Muitos produtos voltados ao público masculino foram lançados em 1997

e 1998. Produtos para o banho e, principalmente perfumes, compunham o

portfólio para os homens. Sabe-se que, em 1998, os produtos masculinos

representavam 30% do faturamento, e os femininos 62%. Com os novos

protetores da Fotoequilíbrio, os produtos infantis haviam passado a representar

8% do faturamento.

Além do reconhecimento pela Revista Exame, que premiava

basicamente o desempenho da empresa mensurado em termos quantitativos, o

programa Crer para Ver foi premiado como o investimento social privado do

ano pelo PNBE. Seus líderes passaram a incluir em seus discursos que a

Natura se destacava entre as demais empresas por sua postura cidadã e seus

programas sociais.

Acreditando nisso, a empresa participou da fundação do Instituo Ethos

em 1998. Criado por um grupo de empresários e executivos, o Instituto é uma

organização sem fins lucrativos que dissemina as práticas relacionadas à

responsabilidade socioambiental e de gestão empresarial sustentável no Brasil.

A empresa, em 1999, iniciou o seu programa de Trainee para

desenvolver lideranças dentro da empresa. Logo no primeiro ano, foram

inscritas 4.354 pessoas no processo. No mesmo ano, a empresa gastou 0,38%

de seu faturamento bruto no desenvolvimento profissional.

A Natura, que já se destacava pelo investimento e pesquisa no

desenvolvimento de novos produtos, comprou o laboratório carioca Flora

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Medicinal, aumentando ainda mais as possibilidades de comercialização de

novidades. Foram pagos pela empresa adquirida cerca de 20 milhões de reais.

O laboratório adquirido era especializado em produtos Fitoterápicos, mercado

com o crescimento médio anual de 12%, e havia sido fundado em 1912, pelo

cientista José Moreira da Silva. A empresa era considerada uma das principais

empresas brasileiras do setor por Pedro Passos e acrescentou uma relevante

bagagem de pesquisas relacionadas às propriedades de plantas da flora

brasileira. O laboratório carioca chegou até a publicar uma revista científica em

português e espanhol na década de quarenta.

A idéia da Natura era aproveitar as pesquisas realizadas com mais de

200 espécies para desenvolvimento de novos produtos. Eduardo Lupi, que foi

selecionado para dirigir a Flora Medicinal, era também diretor de novos

negócios da Natura. Pedro Passos afirmou conhecer a importância que a

fitoterapia tinha na promoção da saúde. A compra e o processo de absorção da

empresa foram acompanhados pela empresa de consultoria Booz Allen, que

também forneceu um estudo do potencial do setor de atuação da Flora

Medicinal para a Natura. À época, no Brasil, o segmento de fitoterápicos

correspondia a 400 milhões dos 8 bilhões de dólares movimentados pelo setor

farmacêutico.

No ano da aquisição e dos altos investimentos que estavam sendo feitos

para a construção do Espaço Natura, a empresa começava a apresentar uma

queda na rentabilidade e na participação de mercado, perdendo a liderança em

faturamento entre as empresas de cosméticos de venda direta.

Apesar dos altos investimentos já realizados, a empresa aumentou ainda

mais os desembolsos para levantar os negócios no exterior. Foram colocados

anúncios em revistas na Argentina e na televisão com o slogan “La outra cara

de la cosmética”. A meta de conquistar 15% dos consumidores de classe

média do país vizinho foi compatível com as altas apostas no mercado externo

feitas pela empresa.

Alessandro Carlucci foi nomeado diretor geral da Natura Argentina e

afirmou que as investidas realizadas até então foram ensaios que serviram

para testar a receptividade do consumidor. Seriam investidos na difusão da

marca no país, até o final de 2000, 8 milhões de dólares e mais 30 milhões de

dólares seriam desembolsados até o final 2004. Embora a prioridade fosse

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investimentos na Argentina, havia também planos para ampliar a base

instalada no Chile.

Em 1999, a empresa foi multada por não estar em conformidade com os

padrões fixados pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Básico de São

Paulo para a Demanda Bioquímica de Oxigênio – DBO. A DBO é o parâmetro

mais utilizado para medir o consumo de oxigênio na água. A Natura atentou

para o tratamento de efluentes e planejou incorporar na sua nova fábrica, em

Cajamar, uma estação para tratamento e reciclagem de água.

A Natura, após a aquisição da Flora Medicinal, começa a integrar de

forma mais intensa alguns ingredientes da flora brasileira na composição de

seus produtos. O conhecimento adquirido pela empresa, aliado à capacidade

de lançar novos produtos distribuindo-os rapidamente no mercado, era um

diferencial competitivo que a empresa possuía. Dessa forma, a Natura foi

capaz de lançar a linha Ekos, que introduziu produtos de matérias-primas

oriundas do Brasil.

Os dirigentes da empresa comumente alegavam em seus discursos que

a referida linha fazia da Natura uma pioneira da utilização da Flora brasileira

como plataforma de desenvolvimento de produtos de beleza. Apesar de

concorrentes como O Boticário afirmarem que várias empresas já usavam os

ingredientes da linha Ekos e das empresas estrangeiras The Body Shop e Yves

Rocher já fazerem pesquisas na floresta amazônica desde a década de 80, a

linha Ekos expôs o seu conceito de forma inovadora. Os seus pilares de

posicionamento eram a utilização da biodiversidade brasileira, a

sustentabilidade ambiental e social e o aproveitamento das tradições

populares. Eles deveriam ser incorporados em todas as atividades envolvendo

os produtos da linha, que iam desde a seleção de matérias-primas até o

veículo de comunicação utilizado para promover os produtos.

Apesar de a linha ter sido viabilizada com a aquisição do laboratório

carioca, desde o início de 1999 a empresa já idealizava o seu lançamento. Um

comitê de colaboradores foi à Nova York formular as premissas do projeto e

eles já haviam definido os pilares da linha Ekos antes da compra da Flora

Medicinal se concretizar. O nome veio depois e tentou simbolizar o conceito da

linha. Ekos remete à palavra “echos” do latim, que significa ressonância, à

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palavra “oikos” do grego que significa a “nossa casa” e a palavra ekó do tupi-

guarani, que é sinônimo de vida.

A linha Ekos foi importante para a companhia porque fez com que

algumas de suas diretrizes fossem extrapoladas para toda a empresa. No final

do ano, foi estipulada a meta de inserção dos direitos dos índios nos próximos

contratos da empresa. Somente após o desenvolvimento da linha, a empresa

começou a apoiar estudos especializados nos povos nativos do Brasil. Os

ativos que estavam sendo certificados para compor as matérias-primas dos

produtos da Ekos também influenciaram para que a Natura iniciasse um

programa geral de certificação de ativos. A meta, que estava presente

inicialmente apenas na nova linha, também seria aplicada gradativamente a

todos os componentes naturais da organização. O processo de certificação de

ativos, iniciado em 2000, era longo, principalmente porque não havia trabalhos

semelhantes no Brasil. Garantir que os ativos seriam extraídos da natureza de

forma ambientalmente correta e socialmente justa era complicado e a intenção

era seguir os princípios do Forest Stewardship Council e do Conservation

Agriculture Network.

Ao longo do ano 2000, foi estruturado dentro da empresa o Sistema

Gerenciamento da Satisfação do Cliente Interno – GSCI. O GSCI coletava

informações de funcionários que possuíam alguma crítica ou sugestão para

melhorar as condições e o ambiente de trabalho na Natura. A empresa, que já

fazia pesquisas para mensurar o clima organizacional, sentiu uma necessidade

maior de cadastrar e acompanhar as informações sobre o nível de satisfação

dos funcionários. As questões levantadas eram analisadas em grupos de

GSCI, cujos integrantes eram representantes de diversas áreas em conjunto

com profissionais de RH.

Também na linha de comunicação com o público interno, a empresa

investiu quinze milhões de reais para inaugurar um portal de relacionamento

com as consultoras pela internet. Foi incorporado, entre as metas da

companhia, que o site deveria ser utilizado para realizar a maioria dos pedidos

das consultoras e que não deveria ser um canal de vendas concorrente da

venda direta. Apesar de pressões para utilizar o portal como canal de vendas

alternativo, a Natura manteve sua posição de realizar as vendas no Brasil

apenas por meio das consultoras.

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Após o início do programa de trainee, a organização diminuiu muito o

número de contratações em nível gerencial. O programa para captação de

talentos dobrou o número de participantes no ano 2000.

A Natura foi a primeira empresa a preencher todos os indicadores do

Global Report Iniciative – GRI no Brasil. A Natura já tinha ajudado a difundir as

idéias do Instituto Ethos e agora participava do relatório de responsabilidade

social mais aceito no mundo antes de todas as outras empresas brasileiras.

Juntamente com 29 empresas estrangeiras, a Natura atendeu aos 95

indicadores do GRI, levando quase um ano para coletar todas as informações

necessárias para completar o relatório. De acordo com Pedro Passos, esse era

um importante passo para permitir que a empresa expandisse sua zona de

atuação internacional para fora do continente latino-americano.

Na opinião de Guilherme Peirão Leal, os resultados estavam muito longe

das metas traçadas e o processo de internacionalização da empresa deveria

considerar táticas diferentes. Estava sendo considerada a utilização de linhas

de produtos diferentes das normalmente utilizadas pela empresa no Brasil. A

idéia era vender apenas a linha Ekos, comercializando-a em lojas. Esperava-se

que o Espaço Natura em Cajamar fosse capaz de suportar toda a demanda por

produtos, chegando a produzir 300 milhões de produtos por ano. Em 2000, a

empresa produziu 81 milhões de unidades.

Em 2001, a Natura já possuía como seu cartão de visita a

Responsabilidade Social. O manejo adequado das reservas naturais em

regiões amazônicas, a linha Ekos, o programa Crer Para Ver e a forte utilização

dos produtos com refil foram os principais instrumentos que ajudaram a firma a

construir essa imagem. Rodolfo Guittila, diretor de assuntos corporativos,

realizou no ano uma pesquisa para saber o quanto o comprometimento da

empresa com a preservação do meio ambiente afetava os consumidores da

marca Natura. Foi verificado que 63% dos homens e 75% das mulheres

acreditavam que o atributo “Socialmente Responsável” era tão, ou mais

importante que a tecnologia empregada nos produtos. Apesar do resultado, o

diretor afirmava que o impacto dessas práticas nas vendas ainda era pequeno.

O Espaço Natura, inaugurado no início do ano, contribuía para imagem

da Natura de empresa socialmente responsável. Além de a obra ter sido

reconhecida como um projeto ambientalmente responsável pelos sistemas de

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economia de energia e tratamento de água, a nova fábrica possuía centros de

treinamentos, uma creche estruturada, academia e várias áreas de integração

planejadas para aumentar a qualidade de vida dos colaboradores no trabalho.

A unidade de Cajamar possuía 18 prédios ocupando 77.000 m². Ela

abrangia parte da produção, armazenagem, mas não incluía todas as

atividades corporativas. O departamento financeiro ficava em uma unidade em

Alfa Ville e muitos dos testes e pesquisas para desenvolvimento de novos

produtos continuaram sendo feitos em Itapecerica da Serra.

O Espaço Natura é visitado por grupos de várias instituições

educacionais de diversas áreas de conhecimento e possui dois grupos de

visitas guiadas por dia. Além de visitarem o centro de armazenagem, que foi

considerado o mais moderno construído no Brasil, e as Centrais de Tratamento

de Efluentes, os visitantes se deparam com uma bela fábrica, que parece um

campus universitário. Os funcionários também exaltavam a beleza do complexo

e viam no aspecto das instalações da empresa um atributo que agregava muito

à qualidade do trabalho. A Natura inaugurou um departamento exclusivo para

relacionar-se com o meio acadêmico, que dá assessoria a pesquisadores e

professores interessados em escrever trabalhos acadêmicos sobre a empresa.

Outro canal de relacionamento desenvolvido em 2001 foi o Portal

Natura. Inicialmente, o portal serviu para estabelecer comunicação com as

consultoras, com a imprensa, com os clientes, com os colaboradores e com

profissionais do ramo. O site já no primeiro ano ganhou o prêmio do Ibest nas

categorias de Higiene e Beleza. A expectativa era de reduzir os custos com os

pedidos das consultoras em até 20% e acelerar a comunicação entre elas e a

empresa. Como o ciclo dos produtos era de 21 dias, era desafiante mantê-las

atualizadas.

A internet também facilita o processo de treinamento corporativo e

comunicação com alguns investidores. O BNDES, que havia emprestado

metade do valor gasto no novo complexo industrial da empresa, havia

estipulado contratualmente com a Natura que ela deveria abrir o capital até

2004. Parte do valor do empréstimo seria pago em ações da própria

companhia. Analistas repararam que a Natura havia perdido lucratividade nos

últimos anos. Especula-se que isso seria consequência dos altos custos de

administrar as novas expansões. A dívida líquida sobre o patrimônio líquido da

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empresa subiu três anos consecutivos, triplicando seu valor. O indicador que

era de 39,3% foi para 95% em 2000 e chegou a 128% em 2001.

Guilherme Leal afirmava que, ao não entender a contribuição que uma

empresa poderia dar para a sociedade, ela estaria perdendo várias

oportunidades de entregar valor aos seus consumidores. Isso fazia parte do

discurso Socialmente Responsável dos líderes da empresa. Apesar desse

discurso e da iniciativa do processo de certificação de seus ativos, a empresa

cometeu uma falha grave em 2001. A Natura utilizou a Imbuia para fabricar a

embalagem de um mix de produtos. Essa árvore é uma madeira nobre e rara e,

apesar da empresa fornecedora estar devidamente registrada, ela não tinha

como garantir a certificação do lote comprado pela Natura.

O erro foi alertado por uma bióloga de Porto Alegre pelo canal de

relacionamento com o consumidor. A Natura, para reparar o erro, procurou

uma ONG de preservação das matas nativas e doou 65 milhões de reais. O

valor foi calculado com base no lucro oriundo da vendas dos produtos que

utilizavam as embalagens. Rodolfo Guitilla, diretor de assuntos corporativos,

afirmou que a empresa, além de fazer a doação, também replantou o dobro de

mata nativa que foi utilizado para a produção das embalagens.

Esse fato teve pouco impacto na imagem da empresa, que começou um

forte programa de controle de desperdícios. Além disso, o combustível utilizado

nos caminhões que entregavam os produtos da empresa também passou a ter

seu impacto ambiental considerado. O gás utilizado na refrigeração dos ares

condicionados passou a ser o r134a, que é menos danoso à natureza, à base

de água e que não causa impacto na camada de ozônio. A Natura nunca

utilizou o CFC em seus produtos e, desde o início, já optava pelo butano-

propano como propelente no desodorante aerosol.

O projeto Crer para Ver, que ainda era o principal investimento social

privado da empresa, fechou o ano de 2001 com um resultado pior que o de

2000. Foram investidos no Programa aproximadamente um milhão de reais

para uma arrecadação de 780 mil reais. Em 2000, haviam sido investidos 346

mil reais e a arrecadação foi de 1,05 milhões de reais. Apesar das iniciativas e

esforços, outros indicadores também pioraram. O número de processos

jurídicos e administrativos abertos contra a empresa aumentou.

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Em dois anos, desde 1999, quando a empresa ganhou pelo segundo

ano consecutivo a melhor empresa do setor de perfumaria e cosméticos, a

Natura se engajou em quatro projetos ambientais4 e seis novos projetos

sociais5. A Natura também investia em outros projetos de que não participava

ativamente, apoiando ações sociais (1,5 milhões de reais) e ambientais (500

mil reais).

De acordo com o Alessandro Carlucci, um grande desafio da empresa

era fazer com que a regulação das práticas sustentáveis se estruturasse.

Nesse sentido, a empresa sempre auxiliava na promoção de palestras e na

difusão de conhecimento sobre o tema de responsabilidade social e ambiental.

Ao iniciar um programa estruturado de certificação de ativos da flora brasileira,

a Natura teve que recorrer a órgãos externos, pois no Brasil não havia

legislação que regulasse ou pelo menos legitimasse as atividades que a

empresa começou a realizar. Esse fato tornava o processo mais lento e

impossibilitava que uma certificação mais completa fosse desenvolvida. Nesse

sentido, a companhia participava ativamente de diversos órgãos que

influenciavam a regulação e disseminavam a informação sobre a

biodiversidade brasileira. Eram ao todo 20 órgãos variados, nos quais

presidentes, diretores e vice- presidentes atuavam representando os interesses

das empresas. Dentro das participações mais notáveis estavam atuações na

Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas

Inovadoras (Anpei), no Compromisso Empresarial para a Reciclagem

(Cempre), no Instituto Ethos e a Fundação Dom Cabral (FDC). De acordo com

Eduardo Lupi, diretor de tecnologia, a intenção da empresa era participar da

formulação de diretrizes de órgãos que interessavam à empresa. Desenvolver

a regulação brasileira e estruturá-la para o modelo de negócios sustentável que

ela pretendia adotar faziam parte das iniciativas da Natura.

A maioria das notícias envolvendo a Natura possuía alguma relação com

Responsabilidade Social. Apesar das várias iniciativas, ainda era necessário

dar coerência a todos os esforços que a empresa vinha fazendo nesse âmbito.

Além disso, a empresa não tinha incluído em seu ciclo de planejamento as

4 Projeto Canguçu, Projeto Biodiversidade Brasil, Projeto Educação e Recuperação Ambiental da Mata Atlântica, Projeto Pomar. 5 Barracões culturais da Cidadania, Programa Cidadão em Movimento, Programa Natura Educação, Contadores de História, campanha na Trilha da Leitura, campanha Mudando o Cenário em Canudos.

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questões relacionadas à sustentabilidade. Pedro Passos e Guilherme Leal se

importavam com a implantação dos projetos e das ferramentas gerenciais

ligadas à responsabilidade social e ambiental. A estrutura ligada à gestão da

sustentabilidade cresceu muito a partir de 2002. Antes eram apenas

coordenações isoladas para os projetos e para as relações com a comunidade

local em Cajamar.

O tema responsabilidade social passou a ser debatido em um fórum de

discussão criado pela empresa chamado “Comitê de Sustentabilidade”. Este

comitê, que definia as metas e levantava discussões sobre o tema, tinha como

participantes os diretores da empresa e as partes envolvidas nas pautas em

questão. Os próprios donos da empresa apoiavam as idéias ligadas à RSC

naturalmente, o que tornava relativamente fácil para as respectivas iniciativas

serem consideradas seriamente. Além disso, outro aspecto que impulsionava

as decisões relativas a essas questões, era que ações voltadas para

sustentabilidade se alinhavam facilmente à razão de ser da empresa.

Os programas sociais começaram a ganhar metas. O Projeto da

Biodiversidade Brasil, que tinha como objetivo estimular o diálogo sobre temas

que envolviam a biodiversidade brasileira, possuía como meta a produção de

12 debates e a cobertura ampla da Semana Mundial do Meio Ambiente e do

Rio Eco 2002. O Programa Natura Educação estabeleceu o número de auxílios

à educação que seriam oferecidos aos colaboradores.

A Natura era referência em seus projetos sociais pela forma com que a

empresa divulgava essas informações. Tudo era devidamente relacionado em

seus relatórios sociais e relatórios anuais. Internamente, muita coisa ainda era

desorganizada. De acordo com Alessandro Carlucci, essa decisão de divulgar

essas informações foi tomada partindo do pressuposto que, se a empresa

quisesse ser parte da sociedade, deveria ser transparente. Ao assumir este

pressuposto a empresa teve que revelar informações para seus concorrentes.

Com isso, seriam divulgados os resultados da empresa e algumas das

intenções de investimento.

Apesar do esforço de transmitir uma imagem sustentável para seus

clientes, a empresa ainda tinha como sua maior preocupação para estimular as

vendas o lançamento de novos produtos. Neste período, o departamento de

tecnologia realizou uma pesquisa com as consultoras e levantou que, em

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média, elas tinham conhecimento de apenas 40% dos produtos do portfólio. A

Natura estabeleceu a meta de aumentar o treinamento das consultoras. Em

2003, foram incrementados tanto o número de consultoras treinadas quanto o

total em treinamento gasto por consultora.

Com o compromisso de abrir o capital em 2004, a Natura iniciou no ano

anterior o processo de reestruturação societária. Anísio Pinotti, Romuel

Macedo, Luiz Seabra, Pedro Passos e Guilherme Leal estruturaram todas as

empresas do grupo da Natura Cosméticos S.A. Antes da reestruturação, a

relação das diversas empresas controladas pelo grupo era diferente e a Natura

Participações, empresa dividida entre os cinco sócios, era a controladora e

proprietária. Os quadros com a estrutura societária da empresa estão

disponíveis no Anexo A.

Após a reconfiguração, a Natura participações foi distribuída entre cinco

empresas, cujos antigos sócios eram os proprietários. A estrutura ficou mais

clara e a companhia, que desde 2000 já publicava relatórios anuais, estava

pronta para abrir o seu capital como acordado em 1999 com o BNDES,

financiador do investimento em Cajamar. Muitas empresas que faziam parte do

grupo estavam em processo de liquidação. Entre elas, merecem destaques as

representações internacionais no Uruguai, na Venezuela, na Colômbia, no

México e em Portugal. Apesar da liquidação das empresas, a empresa não

deixou de operar nestes países.

As filiais internacionais foram modificadas e apenas Portugal perderia

sua filial definitivamente. As empresas da Colômbia e da Venezuela

continuariam existindo inativas. A filial da empresa em Portugal não seria mais

a representação da Natura na Europa. Foi aberta uma filial em Paris,

Chamada Natura Europa, que serviria para introduzir o produto da empresa

brasileira no continente e entender os hábitos dos consumidores franceses,

considerados os mais exigentes do mundo em relação a cosméticos e produtos

de higiene e beleza. A loja em Paris estava prevista para ser aberta em

setembro de 2004.

Em 2003, Eduardo Lupi afirmou que as classes C e D eram as que mais

impactavam a Natura, especialmente pelo volume de vendas. A Natura

também descobriu no nordeste um mercado promissor para seus produtos de

perfumaria. Setenta por cento dos produtos vendidos para a região eram itens

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de perfumaria. Os lucros da empresa aumentaram muito em 2003, sendo

grande parte usada para quitar as dívidas contraídas para suportar os

investimentos. O Gráfico 4.3 mostra a diminuição da dívida da empresa no

período de 2001 a 2003.

Gráfico 4.4 – Endividamento da Natura 2001-2003

0

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

160.000

2001 2002 2003

Anos

R$(

mil)

Empréstimos e financiamentos de longo prazo Empréstimos e financiamentos de curto prazo

Fonte: Relatório Anual da Natura 2003

A Natura, que foi pioneira na publicação do relatório social e do GRI,

deixou de publicar em canais exclusivos voltados para a divulgação de

informações de RSC e passou a incluir em seu relatório anual, que publicava

desde 2000, todas as informações acerca do tema. Além disso, esses

relatórios publicados pela Natura, que ainda não possuía ações negociadas na

Bovespa, já cumpriam todas as exigências da Companhia de Valores

Mobiliários para as empresas abertas.

No ano do IPO os porta-vozes da empresa alegavam em seus discursos

que a abertura de capital não estava sendo motivada pela busca de recursos.

O Principal argumento era a que a Natura queria ser uma empresa que fazia

parte da sociedade se tornando mais transparente. O argumento utilizado não

corroborava com o fato de a oferta de ações da companhia ter sido acordada

no final da década passada, quando a Natura buscou empréstimo com o

BNDES para iniciar as obras em Cajamar.

De acordo com os líderes da empresa, o compromisso com a

transparência da empresa estava refletido no fato de a empresa ter ingressado

no Novo Mercado. Dessa forma, ela teria que praticar os padrões mais

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elevados de Governança Corporativa e garantir aos investidores,

especialmente os minoritários, maiores direitos que os usualmente praticados.

Vinte e seis de maio de 2004 foi o primeiro dia de negociações das

ações na empresa na Bovespa. A ação valorizou mais de 15% no primeiro dia

e continuou subindo ao longo do primeiro mês. Foram arrecadados com a

oferta púbica mais de 750 milhões de reais.

Em 2004, a Natura empatou tecnicamente com a Avon na disputa “Top

of Mind” na categoria produtos e cremes de beleza. Esse prêmio era inédito

para empresa. Alessandro Carlucci afirmava que a marca possuía sua imagem

relacionada com cinco atributos. Eram eles: Inovação, Qualidade, Beleza,

Transparência e Sustentabilidade. A Natura utilizava apenas metade do

número de vendedoras da Avon e acreditava que o resultado relativamente

melhor era oriundo do suporte fornecido às suas Consultoras. A empresa

terminou 2004 com 366 mil consultoras e 2005 com 391 mil consultoras.

A Natura, apesar de ter ingressado no novo mercado, ainda possuía

61,92% do capital votante sob controle dos três principais donos. Luiz, Leal e

Pedro ainda mandavam nas decisões da empresa, mas pretendiam se afastar

aos poucos.

O desempenho das ações da companhia foi muito influenciado pelos

resultados positivos nos anos 2002 e 2003, pela capacidade demonstrada de

geração de caixa e pela redução substancial da grande dívida contraída. No

entanto, a transparência da Natura foi questionada pelo fato de a empresa não

ter apresentado os lucros auferidos no final da década de 90. De acordo com

analistas, isso não condizia com o discurso de transparência da empresa. Além

disso, foi especulado que o motivo para a não divulgação desses dados eram

os resultados.

Em 2005, a empresa articula as metas sociais ao desempenho de

empresa incluindo-os no ciclo de planejamento empresarial. Apesar disso e do

prestígio do comitê de sustentabilidade, funcionários ligados à responsabilidade

social reclamavam que faltavam verbas para a promoção dos projetos. Apesar

dos vários projetos, a empresa não conseguia implantar iniciativas como as

que visavam a conectar as consultoras às cooperativas de reciclagem. Os

empregados da empresa eram doutrinados em prol da Responsabilidade

Social.

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Acreditava-se que era extremamente importante se adaptar à realidade

da empresa e que pessoas incrédulas nos objetivos sociais e ambientais da

empresa não permaneceriam muito tempo em seus empregos na Natura6. A

implantação das metas sociais e do grande número de projetos sociais só era

possível pela pré-disposição que os funcionários tinham em relação a essas

iniciativas. Era difícil aceitar que os bônus ao final do ano poderiam não ser

concedidos se a empresa não batesse as metas de redução de emissões de

carbono.

Mesmo contratando funcionários mais conscientes, a Natura ainda

enfrentava desperdícios. Assim, implantou um sistema rigoroso de desperdício

no refeitório no início de 2006. Essas metas faziam parte do programa de

redução de desperdício estabelecido pela empresa.

Além disso, era um desafio para quem não estivesse acostumado ao

modo de trabalhar na empresa, participar das discussões. Ao discutir-se um

projeto, era comum levantar as perguntas como “o que as consultoras vão

achar”, ou “o que a comunidade local em Cajamar vai pensar”. Isso era refletido

e fugia do modelo mais usual de análise de investimentos. Existiam comitês

para discussões sobre vários assuntos, que auxiliavam a empresa na busca

pela coerência. A presença dos comitês, que analisavam cada aspecto de uma

decisão, impedia que a empresa respondesse de rapidamente a algumas

mudanças no ambiente externo.

Essa lentidão na tomada de decisão, que fazia parte da forma de atuar

da Natura, começou a causar conflitos na empresa. As decisões que passavam

por várias instâncias demandavam habilidades políticas dos interessados. Eles

tinham a possibilidade de procurar as pessoas responsáveis pelas

deliberações, uma vez que todos eram acessíveis dentro da empresa. Muitas

das metas eram discutidas entre os chefes e seus subordinados antes de

serem traçadas.

Em 2005, a Natura implantou a primeira fábrica fora do estado de São

Paulo, no município de Benevides no Pará. O município foi escolhido por suas

potencialidades naturais e abrigou uma unidade especializada na produção de

sabonetes. A fábrica beneficiaria mais de 2500 famílias da região.

6 Em uma das entrevistas, foi relatado que pessoas que não compartilhavam da postura socialmente responsável da empresa não conseguiam permanecer.

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Na Natura, ainda não eram discutidas as emissões de carbono nos

transportes da empresa. Além disso, não eram todas as áreas que tinham

preocupações diretas com a sustentabilidade. Apesar de faltar considerar

alguns aspectos de algumas áreas, a Natura aparecia cada vez mais na mídia

como empresa com atitude sócio ambientalmente responsável. Essa imagem

atraía candidatos ao processo de trainee da empresa, que por sua vez fazia

com que a empresa contratasse funcionários interessados em causas

ambientais e sociais.

4.2 O Boticário

A história do Boticário se iniciou em 22 de março 1977. Miguel Gellert

Krigsner e Eliane Nadalin, recém formados em bioquímica pela Universidade

Federal do Paraná abriram na rua Saldanha Marinho, no Centro de Curitiba,

uma farmácia de manipulação. A idéia dos dois bioquímicos era de fundar uma

farmácia que desenvolvesse produtos sob medida, adequados aos seus

clientes. Os recém formados entendiam que não havia farmácias com essa

proposta na cidade de Curitiba e, dessa forma, poderiam atrair um grande

número de clientes.

Antes de abrir a farmácia, Miguel procurou dois médicos especializados

em dermatologia que aceitaram indicar o Boticário a seus pacientes. O Dr. José

Shweidson Filho e o Dr. Wilhem Baumeier entraram na sociedade e garantiram

que seus clientes iriam procurar o novo empreendimento.

O nome Boticário não existia na época e a pequena farmácia era

chamada de Botica Comercial e Farmacêutica. Quase todo o capital investido,

que na época era equivalente a três mil dólares, foi utilizado para estruturar e

decorar o laboratório. Havia poltronas acolchoadas no estabelecimento com

intenção de manter o cliente confortável enquanto ele esperava por seus

produtos ou para ser atendido.

Apesar de ser apenas um recém formado ingressando em seu campo de

trabalho, Miguel Krigsner já tinha experiência com vendas, pois era filho de

comerciante. Os pais do Bioquímico fugiram dos horrores de Hitler e se

conheceram na Bolívia. Mudaram para Curitiba e começaram vida nova. Após

perder a mãe, Miguel teve que ajudar seu pai no pequeno comércio que

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haviam montado com o dinheiro da venda de todos bens que possuíam na

Bolívia. Miguel tinha apenas 12 anos quando começou a ajudar seu pai em seu

negócio. Ele não era um rapaz muito estudioso e, após tentar duas vezes o

vestibular para medicina, ele acabou desistindo e passando para Bioquímica.

Mesmo com uma demanda garantida para os produtos encomendados,

a Botica, que se dizia a primeira farmácia exclusiva de manipulação de

Curitiba, funcionava com tempo ocioso. Dessa forma, os dois sócios

bioquímicos começaram a desenvolver produtos de beleza. A estrutura da

farmácia se adaptou um pouco para acomodar em prateleiras xampus e

cremes de tratamento de pele, que eram preparados pelos donos da farmácia

de manipulação em seu tempo livre. Era esperado que os clientes que

aguardavam os produtos receitados experimentassem e fossem aos poucos

conhecendo os produtos, contribuindo na receita do pequeno empreendimento.

Inicialmente, foram apresentados aos públicos, dois produtos. Miguel e

Eliana pretendiam testar a aceitação de seus clientes. Por serem aviadas

apenas 20 receitas por dia, sobrava tempo para dedicar no desenvolvimento de

novos produtos.

Os cosméticos desenvolvidos eram feitos artesanalmente à base de

produtos naturais, fato que contribuía para atrair consumidores. Nos últimos

anos da década de 70, muito se falava sobre a natureza e sobre os produtos

naturais. O Boticário foi, aos poucos, aumentando a produção. Quando

começou a produzir os produtos de prateleira, a loja ainda não possuía uma

estrutura preparada para produzir em maior escala. O espaço era adaptado

para produzir sob encomenda e as poltronas acolchoadas e a música ambiente

não eram usuais para lojas de cosméticos tradicionais. Isso chamava atenção

da clientela.

Logo no primeiro ano, já se percebia que o desenvolvimento de

cosméticos de qualidade era mais promissor que o aviamento de produtos

dermatológicos manipulados. O nome do empreendimento que era conhecido

por Botica Comercial e Farmácia, logo deu lugar ao nome escrito nos rótulos

dos produtos e, assim, a marca Boticário foi aos poucos sendo usada como o

nome fantasia da nova empresa. No primeiro ano, o faturamento da empresa

foi aproximadamente US$ 3004,00 dólares, mais do que o total investido nas

instalações.

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A idéia para o nome foi dado pelo Dr. Wilhelm que, apesar da

participação discreta na sociedade, apoiava as iniciativas e filosofias de

trabalho empregadas por Eliane e Miguel. Ele acreditava nos jovens recém

formados, mas dedicava quase todo seu tempo à sua clínica de tratamento de

pele e suas pesquisas na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do

Paraná.

Em 1978, o posicionamento do Boticário era totalmente diferente. Os

quatros sócios concordaram em dedicar quase que exclusivamente à

comercialização e desenvolvimento de cosméticos. No ano de 1978 foram

desenvolvidos mais de sessenta novos produtos. Entre os vários cremes de

beleza e cabelo, eram encontrados poucos itens exclusivos de perfumaria. Os

pioneiros eram o Creme de Algas, o Xampu de Algas, o Creme hidratante à

base de colágeno e queratina e o bronzeador à base de óleo e cenoura. Os

rótulos eram cuidadosamente elaborados com textos escritos em máquinas de

escrever e os produtos eram colocados à venda em embalagens de plástico.

A idéia que norteava a criação dos produtos era que os cosméticos

deveriam ser adaptados às condições climáticas brasileiras e, principalmente,

ao gosto do consumidor brasileiro. Acreditava-se que quase todas as opções

de produtos de beleza, por serem importadas, não consideravam as

características dos consumidores locais.

No final do ano, Miguel foi a São Paulo comprar algumas fragrâncias que

seriam usadas nos produtos da empresa. Na sede da Dragoco, o fundador do

Boticário obteve a informação que uma empresa de perfumaria e cosméticos

estava sendo desativada precocemente. A empresa, que lançaria a marca

Chanson, seria aberta por Silvio Santos, mas nem chegou a funcionar. Miguel

Krigsner viu oportunidade de adquirir a preços mais baratos uma série de

insumos que poderiam ser usados no Boticário.

Visitando o depósito onde se encontravam os espólios da Chanson,

Miguel se deparou com um estoque de 70 mil frascos em formato de ânfora. O

estoque foi negociado por Miguel por U$ 45 mil dólares. Apesar do preço

extremamente alto, foram conseguidas boas condições de pagamento. Miguel

assinou algumas promissórias e despachou os frascos para Curitiba. Miguel

imaginava que, caso algo desse errado, ele poderia sempre devolver os

frascos e, por causa do acordo feito, o prejuízo não seria muito grande.

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Além do desafio de ter que produzir o conteúdo dos frascos, era

complicado armazenar todas as caixas com os vidros nas instalações da Rua

Saldanha Marinho. O Boticário se viu obrigado a direcionar sua produção para

os itens de perfumaria, sendo esta a única possibilidade para preenchimento

dos novos recipientes.

Ainda não havia no Boticário nenhum equipamento ou material para

produção dos perfumes. Tiveram que ser usados, como compartimento para

preparação dos perfumes, grandes jarras de vidro que a tia de Miguel utilizava

para fazer vinhos. Após destinar grande parte da receita para pagar as

pequenas ânforas, Miguel teria que economizar em outros investimentos.

Era necessária alguma criatividade no processo produtivo. Sem

capacidade de investir em produção, além dos garrafões emprestados pela tia

de Miguel, poderiam ser vistos na empresa equipamentos como batedeiras de

bolo e liquidificadores. Muitas das matérias-primas que o Boticário utilizava

para produzir seus produtos eram vendidas em lotes maiores que a

necessidade da empresa. Dessa forma, era comum que os insumos fossem

entregues apenas como amostras.

O produto Aqua Fresca, principal produto da empresa até os dias atuais,

foi desenvolvido nesta época. A Fragrância foi criação do perfumista Joaquim

Crispim da Dragoco. Esse produto era comercializado nos frascos adquiridos e,

por fazer sucesso junto aos consumidores, as dívidas contraídas facilmente

seriam quitadas. O Boticário estabeleceu uma parceria com a empresa de

fragrâncias, adquirindo várias essências e know how, que seriam utilizados em

seus produtos. O Boticário comprava essências mais caras, que raramente era

vendida para grandes indústrias. Isso permita que fossem adquiridos pequenos

lotes de cada vez.

Logo após a compra dos frascos, ainda antes do Boticário completar

dois anos de existência, os demais sócios foram surpreendidos novamente por

Miguel. O jovem de 28, voltando de outra viagem a São Paulo, negociou um

ponto no novo Aeroporto Afonso Pena. Como não haviam muitas lojas ainda

instaladas no local, Miguel conseguiu um bom ponto, com alto fluxo de

pessoas, em condições bem favoráveis.

Acredita-se que o Aeroporto de Afonso Pena somente aceitou receber

uma Loja do Boticário porque foi uma das primeiras a se instalar. O lugar

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estava, na verdade, reservado para o funcionamento de uma farmácia, mas

quem ganhou a licitação foi o Boticário, pois a demanda de outros interessados

foi muito baixa. Miguel conseguiu acordo com os administradores do aeroporto

para colocar alguns produtos farmacêuticos à venda. Miguel tinha a percepção

de que, nesse ponto de venda seriam vendidos apenas trinta produtos

farmacêuticos diferentes, permitindo que o Boticário se instalasse no lugar.

O segundo ponto de venda se mostrou promissor logo no início. Os

viajantes que esperavam por seus vôos, por ficarem transitando sem pressa no

aeroporto, sempre se dirigiam à loja. Os produtos, por serem novidades, eram

uma boa opção para presente para quem estava indo ou voltando de viagem.

Outro fato que auxiliava a imagem dos produtos do Boticário era o extremo

cuidado com a apresentação e com o preço dos mesmos. Era uma

preocupação impedir que os produtos da empresa fossem identificados como

produtos ineficazes, principalmente por lidar com produtos e ingredientes

naturais e brasileiros.

No final de 1979 o Boticário considerou migrar para o sistema de vendas

por meio de revendedoras, comum nos cosméticos, mas, de acordo com o

fundador, isso não fortaleceria a marca, pois as revendedoras não seriam

exclusivas. O sucesso com as vendas nesse ano também foi um fator que

influenciou a decisão do Boticário de manter o canal de vendas por meio de

lojas. Observando os clientes que iam até as lojas, foi constatado que, em

1979, foram atendidos mais de 1000 pedidos de produtos de pessoas que

haviam tido contato por meio de pessoas que passaram pelo Aeroporto.

Muitos funcionários das companhias aéreas eram clientes cativos da

marca. Com um grande número de vendas realizadas na loja do aeroporto, as

pessoas de outras cidades e estados começaram a ter contato com os

produtos do Boticário. Muitas dessas pessoas chegaram a encomendar os

produtos para quem estava de passagem por Curitiba. Apareciam também

pessoas que compravam em grandes quantidades para revender os produtos

com alguma margem.

Nessa época, Eliane Nadalin abandonou a sociedade. A fundadora

vendeu sua parte no empreendimento para Miguel Krigsner por um valor que

daria para comprar um bom apartamento em Curitiba.

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O primeiro interessado em revender os produtos da marca O Boticário

apareceu no início de 1980. José Antônio Ramalho negociou com o Dr. Miguel

um lote de produtos que seriam levados para Brasília para serem revendido por

sua cunhada. A cunhada, Laura Oliveira, era bem relacionada e vendeu os

produtos do primeiro lote gerando mais pedidos para a fábrica da Saldanha

Marinho. A rede de relacionamentos da cunhada permitiu a José Antonio

acabar, rapidamente, com o estoque de produtos comprado.

Depois disso, Antônio Ramalho abriu com sua mulher uma empresa

chamada Natureza Comércio e Representações de Produtos Naturais que

venderia os produtos da marca O Boticário. Essa, que foi a primeira loja a

revender os produtos da companhia originária de Curitiba, foi fundada em

quatro de julho de 1980.

A marca começou a ser procurada por outras pessoas e Miguel foi

construindo aos poucos uma rede de parceiros que revendiam seus produtos.

Não havia critérios que restringiam os interessados em revender os produtos

em lojas próprias. A expansão não ocorreu de forma planejada e as parcerias

não eram fomentadas pelo Boticário, que não tinha capacidade produtiva para

atender uma rede de lojas. A lojas atuavam com seus nomes próprios e não

eram exclusivamente dedicadas à venda de produtos do Boticário.

O Boticário aceitou produzir uma linha que seria comercializada pela

Mesbla, chamada Gotas da Natureza. Ela seria vendida sem relação com a

marca Boticário.

Com a produção crescendo, a farmácia de manipulação, que havia

virado loja, já era uma fábrica. Era reconhecido que a unidade produtiva, em

um prédio no centro da cidade de Curitiba, era um local de alto risco que não

comportava toda a produção realizada. Um acidente grave poderia ter

facilmente acontecido.

Ciente desse risco, Miguel resolveu abrir uma fábrica em São José dos

Pinhais, onde os valores imobiliários eram muito mais baratos que em Curitiba

e havia espaço considerável para aumentar a capacidade produtiva. Miguel

Krisgner optou por comprar uma chácara de 36 mil metros quadrados,

anunciada por meio de uma plaqueta de venda. Ela pertencia a Estefano

Letenski, que criava galinhas, patos e carneiros no lugar. Após a proposta ter

sido fechada, Miguel Letenski Neto, neto de Estefano e conhecido como

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Miguelzinho, continuou cuidando do lugar até que as obras fossem iniciadas.

Após o início das obras, ele iniciou o trabalho formal pela empresa como

ajudante de obras.

A Fábrica em São José dos Pinhais foi inaugurada em 1982, mantendo

as instalações na Rua Saldanha Marinho. A produção era dividida e foi sendo

transferida para a nova unidade produtiva, à medida que a estrutura do

complexo fosse aumentando. O Boticário tinha 27 funcionários envolvidos na

fabricação dos produtos, sendo que 17 deles foram transferidos do centro de

Curitiba para a instalação recém construída.

O Boticário não tinha como arcar com os investimentos necessários para

iniciar as obras e Miguel ofereceu seu carro para o empreiteiro em troca de

mão-de-obra. Os demais investimentos foram sendo pagos com os lucros da

companhia, que eram quase que integralmente reinvestidos na expansão da

empresa.

A demanda pelos produtos da empresa só crescia. O número de lojas

havia crescido substancialmente em 1981 e, em 1982, o ritmo de crescimento

havia acelerado ainda mais. No final de 1982 já havia 180 lojas que

disponibilizavam os produtos da empresa. Esse ritmo acelerado de crescimento

fez com que Miguel deixasse de ajudar o pai em seu comércio e passasse a se

dedicar exclusivamente a sua empresa.

Sem muitos funcionários capacitados para auxiliá-lo na administração e

preparação dos produtos e, como os dois sócios remanescentes não se

dedicavam operacionalmente à companhia, Miguel contratou Eliane Nadalim

para coordenar toda a parte de manipulação de medicamentos. Dessa forma,

ele ficaria integralmente dedicado ao desenvolvimento de perfumes de

prateleiras, até o final de 1982.

Miguel precisava de funcionários para auxiliar na administração e

contratou um novo diretor industrial que veio de São Paulo e se chamava

Roberto Papov. Ele promoveu Solange Semes, que havia começado como

estagiária de farmácia em 1980. A recém formada passou a ser encarregada

do laboratório. Na montagem da nova fábrica, foram atualizados os

equipamentos que eram impróprios para uma produção em maior escala.

Em 1983, alguns dos primeiros revendedores passaram a ser

distribuidores regionais, já que o número de lojas em várias áreas já justificava

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a existência desse novo elo na cadeia de vendas. Era especialmente

importante o trabalho desses distribuidores, pois não havia no Boticário uma

estrutura de distribuição organizada para fazer seu produto chegar nas

inúmeras lojas.

O número de distribuidores aumentou para 90 em 1984. Eles vendiam o

produto para outras lojistas, sacoleiras e os disponibilizavam em suas lojas.

Muitas marcas próprias surgiram com os produtos do Boticário. Neste ano, um

empresário levou os produtos da empresa para serem revendidos na Bolívia.

A área de manipulação, sob a direção de Eliane Nadalin, antiga sócia,

também estava crescendo. Desde que ela assumiu o controle dessa área do

Boticário, o número de pedidos aviados por dia cresceu bastante. Além disso,

Eliane iniciou o desenvolvimento de uma linha de chás naturais. Ela

acompanhava o desenvolvimento das ervas desde o plantio até a preparação

dos chás. Não existia técnica agrícola estabelecida no Brasil para o plantio de

ervas medicinais. As embalagens dos chás também eram especialmente

desenvolvidas e acompanhadas por Eliane.

Nesta época, o sócio José Schweidson Filho desliga-se da sociedade.

Miguel Krigners abre um processo judicial contra o Dr. Schweidson, alegando

falta de intenção de sociedade. O processo foi longo e só acabou

definitivamente em 1990. Com o Dr. Wilhelm ocupado em sua clínica, Miguel

era o único dono ativo da empresa. Com a saída, Miguel passou a ter 63 por

cento da empresa enquanto o médico remanescente mantinha em seu poder o

resto das ações.

A fábrica crescia e já eram produzidos 2,5 milhões de produtos por ano e

eram mais de 400 lojas que vendiam os produtos da empresa. O ano de 1985

foi um ano marcante para a empresa, na opinião de Miguel. Tudo se iniciou

com a contratação de uma consultoria, que auxiliou, em julho, na promoção da

primeira convenção de lojistas da empresa para mudar o sistema de vendas de

produtos. Miguel decidiu evitar que em suas lojas fossem comercializados

produtos de outras marcas para fortalecer a marca O Boticário. Miguel forçou

todos os lojistas a utilizarem o nome O Boticário em suas lojas. Além disso, ele

estabeleceu condições de apresentação da loja iniciando o sistema de

franquias.

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Isso exigiu uma série de investimentos por parte dos interessados em

manter suas lojas do Boticário. Eles deveriam seguir um padrão arquitetônico

único. Para compensar os investimentos que os franqueados teriam que fazer,

Miguel reduziu os preços de seus produtos permitindo que eles fossem

vendidos com margens mais atrativas para os remanescentes. Apesar da

utilização da marca nas lojas e da composição, Miguel não conseguiu fazer

com que todos os franqueados se limitassem a vender os produtos do

Boticário.

Após essa decisão, o processo para o próprio Boticário abrir suas lojas

ficou mais rápido. Além de outras lojas em Curitiba, foi aberta uma loja em

Aracaju para entender o mercado nordestino. Também foram abertas lojas em

Belo Horizonte, sede da L´aqua de Fiori, um dos principais concorrentes do

Boticário na época e que já funcionava sob o sistema de franquias.

No final do ano, a empresa abriu sua primeira loja fora do Brasil, após

participar da Feira Internacional de Lisboa. Foi percebido que havia espaço

para cosméticos naturais brasileiros. Nesta época, alguma pessoa oportunista

chegou até a registrar a marca “O Boticário” em Portugal. Depois de comprar a

marca O Boticário de volta por 50 mil dólares, Miguel teve que enfrentar o

desafio de vender seus produtos em Portugal. As vendedoras portuguesas não

eram tão ativas como as brasileiras e não ofereciam os produtos aos potenciais

clientes. Isso, de acordo com Miguel, era extremamente importante porque os

europeus davam pouca credibilidade aos produtos brasileiros desse setor.

Miguel também afirmava não ter pressa de internacionalizar sua empresa.

A primeira loja foi aberta em um shopping center de Lisboa e começou

com um faturamento tímido de 20 mil dólares por mês. Para montagem do

ponto fixo de venda, foram usados o restante dos produtos apresentados e

vendidos no estande do Boticário na feira. Miguel considerava o faturamento

normal por se tratar dos primeiros três meses de existência da marca no

mercado externo. As lojas no Brasil lucravam o equivalente a esse valor.

Em 1986, a empresa profissionalizou seu departamento de marketing.

Antes a empresa estava sendo atendida pela agência Fischer, Justo & Young

Rubicam de São Paulo, que possuía uma representação em Curitiba. O

Boticário criou uma estrutura interna para coordenar as ações de propaganda,

eventos e material promocional. Além disso, O Boticário abriu uma empresa de

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comunicação, chamada B&K Propaganda, que se tornou a empresa

responsável pela conta da empresa de Miguel. O acordo com a empresa de

publicidade foi bem planejado pelo Boticário. A empresa obrigava cada

franqueado a repassar 3,5% de seu faturamento para a Agência B&K. Os

investimentos em propaganda alcançaram U$ 70 mil em 1986.

O Boticário baseava toda a linha de 160 itens no conceito Natural do

Brasil que também passou a ser o slogan utilizado pela marca após 1986. A

marca era freqüentemente exposta em novelas de primeira linha no Brasil.

Essa estratégia também auxiliou a divulgação da marca em Portugal, uma vez

que muitas novelas brasileiras eram transmitidas no país. Quando a loja

chegou a Portugal, ela já era conhecida pelas novelas. O faturamento em

Portugal ainda era tímido e, com a abertura de uma segunda loja em Lisboa,

ele aumentou para 50 mil dólares.

A Natura, principal concorrente nacional na concepção de Miguel era, de

acordo com a mesma, voltada para um público mais velho que estava

interessado em cremes anti-sinais. O Boticário, mais forte nos itens de

perfumaria, iniciou a exploração de dois mercados não muito usuais. Foi

lançado o perfume Thaty em 1985 e o Styletto em 1986. O primeiro produto era

adaptado para adolescentes e o segundo dedicado exclusivamente ao público

masculino. Eles foram os primeiros perfumes exclusivos para esses

segmentos desenvolvidos no Brasil.

Além desses dois produtos, O Boticário desenvolveu um bronzeador à

base de extrato de urucum. O urucum é uma planta originária da América do

Sul, mais especificamente da região amazônica. Era comum a utilização da

planta para a confecção de corantes de batons, mas suas propriedades nunca

haviam sido utilizadas em outros tipos de cosméticos.

Dois problemas afetaram muito a empresa em 1986. O primeiro

acontecimento foi o congelamento dos preços dos produtos. O segundo foi a

interrupção do fornecimento de algumas matérias-primas, que impediu que

muitos produtos chegassem aos clientes para serem vendidos.

O Boticário começou a aparecer nos jornais e revistas de todo o Brasil.

Miguel Krigsner começava a dar entrevistas nas quais ele sempre falava dos

hábitos do consumidor brasileiro. O público masculino e os produtos adaptados

ao clima mais quente sempre eram mencionados. O Boticário realizava

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pesquisas antes para lançar seus produtos. A empresa continuava utilizando as

embalagens em forma de ânforas, que se tornou a marca registrada da

empresa.

O Boticário lançou, em 1987, o Algen Plus com um composto inovador

que utiliza o Pentaglycan, com a proposta de regenerar as células. Boticário

fez campanha de seu novo produto utilizando a novela "Cambalaxo" e

utilizando uma embalagem especial. A promoção já fez com que fossem

vendidas 100 mil unidades do Algen Plus, apesar do elevado preço de 340

cruzados.

O Grupo era composto por cinco empresas: A Fábrica "Botica Comercial

Farmacêutica", a Scorpius, que cuidava da parte administrativa e de marketing,

a "Aerofarma Perfumaria", que cuidava das lojas de Curitiba, A Distribuidora La

Paz, única que não funcionava também como franqueada, e a "B&K House,

que era responsável pela propaganda institucional. A farmácia de manipulação

continuava funcionando na Rua Saldanha Marinho. Os outros três andares

também eram ocupados pelo Boticário. Lá ainda existia um escritório

administrativo e o laboratório onde eram produzidos os produtos que seriam

aviados.

Em 1987, O Boticário já possuía mais de 1000 pontos de vendas só no

Brasil. A milésima loja foi aberta pela própria companhia no centro de Curitiba.

Somente neste ano, o Boticário começou a cobrar exclusividade dos lojistas.

Com a exigência do Boticário, vários franqueados abandonaram a parceria

reduzindo o número de lojas da empresa após o fim do ano. O contrato com o

franqueado ficou bem mais rígido. O sistema de franchising da empresa

começou a se profissionalizar. Eram feitos treinamentos padronizados por

representantes da matriz para as atendentes das lojas. Foram estabelecidas

normas de condutas, uniformes e manuais de procedimentos. Após essas

mudanças, a empresa passou a ganhar papel de destaque entre as empresas

de franquias do Brasil e era sempre lembrada em revistas de negócios como

empresa modelo desta modalidade.

O Boticário era freqüentemente procurado por ambientalistas para

patrocinar eventos e campanhas ecológicas. Por ter utilizado o slogan de

produtos naturais, muitas pessoas associavam a empresa a causas

ambientais. Os pedidos de patrocínio eram todos negados. O Diretor de

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Marketing alegava que os pedidos foram negados, pois O boticário não tinha

expertise para se engajar em projetos de ambientais. Algumas pesquisas de

mercado também ligavam o Boticário ao meio ambiente.

No Boticário, 93% da mão-de-obra era composta por mulheres. Era uma

proporção alta, comparado com a Natura que possuía 70% de mulheres entre

seus colaboradores.

Várias lojas estavam sendo abertas no exterior. Os interessados

procuravam o Boticário que, antes de conceder a franquia, pesquisava a

receptividade de seus produtos. Era difícil conter a pressão dos interessados

em abrir franquias no exterior. Apesar da procura, a expansão era restringida

pela produção dos produtos com diferentes rótulos. A composição dos produtos

também era ajustada para os diferentes países onde as lojas estavam sendo

abertas. Eram vinte e uma lojas, sendo que dezesseis lojas eram em Portugal.

As demais eram localizadas na Noruega, Escócia, Chile e Estados Unidos.

O Boticário era relativamente cuidadoso no lançamento de novos

produtos. Eram 160 produtos em seu portfólio. Poucos eram os produtos

descontinuados. De acordo com uma pesquisa realizada, 80% das vendas

eram realizadas para pessoas que já haviam comprado os produtos da marca.

A maioria delas concentradas em datas comemorativas, como dias dos

namorados, da secretária e dia dos pais. O Boticário despendia os maiores

gastos de suas campanhas publicitárias antes das datas comemorativas. Em

1987, foram gastos 2,5 milhões de dólares em publicidade, sendo que a

indústria de Miguel e Wilhelm faturava pouco mais de 8 milhões de dólares.

Ao mesmo tempo em que várias lojas foram fechadas, várias outras

estavam sendo abertas. A redução do número de franquias foi acompanhada

por uma queda no faturamento na indústria do Boticário. A empresa faturou 6,2

milhões em 1988. A redução do número de lojas não foi proposital, mas a fila

de espera para se abrir uma franquia era grande. Isso se devia ao fato de o

Boticário não cobrar nenhuma taxa além dos investimentos estruturais na

abertura de uma franquia e de que as lojas poderiam ser pequenas. Esse

último fator, além de baratear os custos dos alugueis, permitia que as lojas

fossem abertas nos mais variados lugares.

O Boticário fechou duas lojas em Miami nos Estados Unidos. Os

empreendimentos não estavam dando certo e Miguel pesava em mudar a

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estratégia de oferecer seus produtos em lojas de departamento. O

Internacional Mall foi um lugar inadequado para abertura das lojas, pois recebia

turistas mais interessados em eletrônicos e outros produtos modernos do que

pessoas interessados em cosméticos naturais do Brasil. Também foram mal

sucedidas as lojas da Noruega e do Chile.

Em 1988, foi lançada a linha Eros, exclusiva para o público masculino.

Havia produtos como cremes de barbear, xampus e loções. O perfume Stylleto

vendia bem em todos os estados do Brasil e foi um fator importante, para

impulsionar novos perfumes e produtos para esse segmento.

Em 1989, o Boticário reduziu o número de lojas. As franquias

começaram a ser bem mais controladas e a empresa aperfeiçoava, cada vez

mais, os pretendentes a entrar para a rede de lojas. A escolha dependia tanto

do franqueado quanto da análise e pesquisas que o Boticário realizava,

estudando o potencial de cada região. Isso era alinhado com o plano de

expansão da empresa e com o desempenho dos distribuidores, chamados de

Master-Franqueados. Eles eram os elos que distribuíam os produtos e

administravam algumas das condições estabelecidas pela matriz nas lojas. Em

geral, eram parceiros antigos e foram os primeiros a realizarem parcerias com

o franqueador.

Os pontos comerciais disponíveis eram analisados pelo Boticário que

também avaliava o perfil pessoal do aspirante. Alguns comerciantes

reclamavam que tudo se tornou muito rígido. Era falado que o franqueado tinha

que rezar a cartilha elaborada pela empresa. Apesar da rigidez instituída, o

suporte para instalação era excelente. O processo era acompanhado e o

franqueado era treinado na operação do negócio. Para conseguir uma franquia,

a seleção envolvia testes de idoneidade e verificação das relações sociais do

potencial franqueado.

O Boticário, em 1988, foi proibido de utilizar a palavra "Aproxima" em

suas campanhas porque a Rasto, fabricante de perfumes, usava um slogan

baseado na tal palavra desde 1966. A empresa de Curitiba foi multada e não

pôde utilizar a palavra na campanha de dia dos namorados. Na mesma época,

foram utilizados para divulgação de um novo perfume, anúncios perfumados

em revistas. A idéia não agradou os leitores das revistas que solicitaram à

editora a retirada dos anúncios perfumados. Concorrentes acusaram o

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Boticário de não empregar a mesma competência técnica empregada no

desenvolvimento de seus produtos na comunicação dos mesmos.

O Boticário criou um canal direto e permanente de comunicação com os

seus consumidores – O Centro de Relacionamento com o Cliente (CRC),

criado em 1989, antes mesmo de entrar em vigor o Código de Defesa do

Consumidor. O canal ficou responsável por esclarecer dúvidas, receber

sugestões e observações, sempre com o objetivo de apresentar as soluções

mais adequadas para cada manifestação.

O Boticário passou a se responsabilizar pelas compras de seus

franqueados. O controle, que era feito pelos Master-Franqueados, passou a ser

feito diretamente pela sede em Curitiba. Isso prendia ainda mais o franqueado.

Alguns Master-Franqueados organizavam as suas próprias campanhas

publicitárias com apoio das franquias de sua região. Isso não agradava o

franqueador.

Em 1990, o Boticário lançou outro perfume exclusivo para o público

masculino: O Quasar. O novo produto se tornou o perfume masculino de maior

sucesso da empresa e o terceiro perfume da empresa mais vendido de todos

os tempos. Ele ficava atrás apenas do Thaty, que em 1990 ainda era exclusivo

de seu segmento, e da deo-colônia Aqua Fresca. Este último chegou a ser

reconhecido como o segundo perfume mais vendido no mundo em toda a

história. Ele só vendeu menos que o Chanel 5. Entretanto, de acordo com

dados não oficiais da própria empresa, é bem possível que o perfume do

Boticário tenha sido vendido mais do que o da Chanel.

Miguel Krigsner era mais preocupado com as causas ambientais do que

a média dos brasileiros. Miguel e Eloi Zaneti, diretor de Markeitng da empresa,

tiveram uma idéia de realizar um programa ambiental de reflorestamento. A

idéia inicial era oferecer a cada cliente uma muda de árvore para ser plantada.

A proposta se mostrou inviável, tanto pelo valor que deveria ser investido nas

mudas, quanto pela operacionalização da idéia.

A segunda idéia era de plantar uma árvore para cada produto vendido.

Dessa forma, Miguel procurou o professor Miguel Milano da Universidade

Federal do Paraná, que afirmou que se o Boticário mantivesse o ritmo de

venda, não haveria espaço no Brasil para o plantio de tantas árvores. Após

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essa constatação, os dois fundaram, com o apoio da Fundação de Pesquisas

Florestais do Paraná, a Fundação Boticário de Proteção a Natureza – FBPN.

A FBPN foi constituída para administrar verba própria. Os Franqueados

eram estimulados a fazerem suas contribuições e o Boticário destinava na

época 5% de seu lucro líquido para a organização criada. O projeto da

Fundação era apoiar projetos conservacionistas, proposta diferente da inicial,

que era de atuar no reflorestamento e plantio de árvores. Essa proposta,

definida por técnicos especializados, também definiu que a FBPN deveria atuar

desenvolvendo unidades de conservação de áreas verdes nativas e proteção

da vida silvestre por meio do patrocínio de projetos.

Desde o início, a proposta foi de manter separada a administração da

Fundação Boticário, pois ela deveria estar em total liberdade para atender

melhor sua missão. As análises dos projetos eram realizadas por consultores

voluntários, que auxiliavam a alocar os recursos reservados para a realização

dos projetos. Apesar da intenção de se desligar, os diretores do Boticário, junto

com o professor Miguel Milano participavam do conselho deliberativo da

empresa nos primeiros anos.

No ano de criação da fundação, o Boticário reduziu drasticamente o

número de franquias. No início de 1991, eram apenas 1000 franquias contra as

1200 no início de 1989. O valor da implantação do metro quadrado de uma loja

Boticário variava em torno de mil dólares. O Boticário lançou, em 1991, o

Manual do Franqueadas com mais normas e estruturando mais ainda a

conduta que deveria ser assumida pelo Franqueado.

A redução no número de Franquias foi acompanhada pela queda no

faturamento da empresa. Em 1991, o Boticário demitiu 20% do seu quadro de

funcionários para se ajustar a uma queda nas vendas. Eram 840 funcionários

em 1990 e em 1991 o número caiu para 700. Também optou por reduzir o

número de horas trabalhadas. Se essa medida não fosse tomada, outros

funcionários também seriam demitidos. O início da década de 1990 foi um

período difícil na história do Boticário que evitava se endividar ao máximo.

Todos os investimentos eram feitos com os lucros reinvestidos.

A empresa começa a aumentar paulatinamente o número de Franquias.

A idéia era contar com os já franqueados para aumentar seu número de lojas.

Esse processo era mais fácil que admitir novo lojista. A fila de pessoas que

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buscavam abrir uma loja da empresa era de 4000 pessoas. Contudo, o

processo de seleção se tornou ainda mais criterioso, com o lançamento do

manual do franqueado. A matriz também não abria mão dos meticulosos

estudos de mercado. Estabeleceu-se a meta de aumentar o número de lojas

para 1500 em 1993.

Em 1992, o faturamento da empresa continuou declinando chegando a

30 milhões de dólares, cinco a menos que no ano anterior. É importante

ressaltar que o Boticário transferiu parte do valor abatido do IPI pelo decreto

governamental número 609 para seus preços de vendas praticados. A

tentativa, que não foi eficaz, era de aumentar as vendas, reduzindo o preço

pago pelo consumidor final. Houve um pequeno aumento de franqueados, mas

dificilmente a meta seria atingida. O Boticário conseguira agregar mais 175

lojistas ao longo dos anos 1992 e 1993, mas isso também não resultou no

aumento das vendas.

Resolveu-se investir, então, na criação de novos produtos e incrementar

o investimento em marketing para promover as vendas. Os investimentos que

eram oriundos de um percentual do faturamento das lojas foi acrescido de 3

milhões de dólares, fornecidos pelo Boticário. O portifólio de produtos

aumentou para 320 produtos.

Também optou por melhorar o fornecimento de alguns insumos. O

número de fornecedores de óleos e essências usadas pela empresa foi

reduzido. Contudo não se obteve uma economia com a redução, pois outros

fornecedores importados foram admitidos. A intenção era se adaptar ao

mercado externo, utilizando fragrâncias comuns ao consumidor europeu. Isso

deveria aumentar o faturamento oriundo do mercado externo.

Iniciou-se um processo de programação das compras da empresa, que

havia sofrido no passado pela falta de suprimento de alguns insumos. Noventa

e cinco por cento dos insumos produtivos passaram a ser comprados de São

Paulo. Foi calculada uma previsão de consumo de itens, como as essências e

óleos utilizados. Também começou a sistematizar as negociações com os

fornecedores. O álcool utilizado passou a ser comprado diretamente de usinas

de subprodutos, derivados da cana de açúcar. Dessa forma, as propriedades

do álcool também puderam ser mais bem selecionadas. No caso das

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embalagens, a opção foi por lotes maiores. O Boticário acordou com a

Wheaton do Brasil o fornecimento de 10 milhões de frascos.

O Boticário lançou, no final de 1993, a linha Bio Active em parceira com

a Sociedade Francesa de Laboratórios de Bioquímicas. A linha voltada para o

tratamento de pele explora um segmento que não era explorado pela empresa

em seus produtos de prateleira vendidos por seus franqueados. A linha era

semelhante à linha Chronos lançada pela Natura em 1992, com a diferença de

segmentar os produtos por tipo de pele em detrimento da idade do público ao

qual os itens eram destinados.

Apesar do orientar o desenvolvimento dessa linha para os padrões de

pele dos brasileiros, Miguel acreditava que seria possível aumentar as vendas

no exterior com os novos cosméticos. Isso tudo foi pensado e as matérias-

primas escolhidas para a fabricação desses produtos atendiam os padrões e as

normas internacionais. Os rótulos e as embalagens também foram

desenvolvidos com informações em três línguas diferentes: espanhol,

português e inglês. A campanha de Marketing não foi elaborada pela agência

da empresa. Foi contratada a Wbrasil para realização dos comerciais e dos

anúncios que seriam publicados na revista VEJA.

O Boticário criou, em 1993, o primeiro canal específico de

relacionamento com o cliente de uma empresa do setor de perfumaria e

cosméticos. O Clube Garota Thaty surgiu após a publicação do anúncio em

revista voltada para adolescentes. A leitoras da Capricho puderam adquirir da

empresa, um livreto com 100 dicas de beleza desenvolvido pelo Boticário,

enviando um cupom que foi anexado aos exemplares da revista. A empresa

havia aproveitado o momento no qual a deo colônia Thaty havia sido eleita

pelas leitoras da revista pelo terceiro ano consecutivo o perfume do ano.

O clube estreitava o relacionamento da empresa, que buscava ouvir

sugestões e críticas por meio de um mailing criado. Muitas mudanças nas

apresentações do produto foram decorrentes de sugestões enviadas por

clientes membros do Clube. As Consumidoras ficavam sabendo de promoções.

O clube Garota Thaty aumentou as vendas do perfume já no primeiro ano de

existência.

Em 1993, o Boticário elevou seu faturamento, devido às várias medidas

tomadas. O faturamento aumentou 5 milhões, mesmo sem ter atingido a meta

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de 1500 franquias. A linha Bio Acitve também não teve uma boa demanda no

primeiro ano, entretanto Miguel acreditava que ele alcançaria a liderança em

seu segmento por ser uma opção com a mesma qualidade dos similares do

mercado, bem mais acessível ao consumidor brasileiro.

Três anos após o surgimento, a FBPN adquiriu duas fazendas no litoral

do Paraná para garantir a proteção dessas áreas de floresta nativa. Os 1716

hectares de terra comprados formariam a Reserva para preservação da fauna

e a flora nativa do enorme contingente de terra de mata atlântica nativa.

Outros 55 lançamentos de produtos aconteceram em 1994. Entretanto, o

recordista de vendas foi o perfume Thaty, que começou a disputar com a

colônia Aqua Fresca o cargo de Carro chefe da empresa. O estreitamento com

o cliente havia dado certo para o perfume que chegou a ser o produto mais

vendido da empresa em vários anos.

No final de 1994, Arthur Grynbaum, que era funcionário da empresa

desde 1987, tornou-se sócio da empresa. Ele havia auxiliado a estruturar o

sistema de franquias da rede e iniciava um processo de reestruturação da

companhia que se iniciaria pela forma de distribuição dos produtos.

O Boticário por não abrir mão do seu sistema de franquias, não tinha a

agilidade de disponibilizar os novos lançamentos tão rapidamente a seus

clientes como seus concorrentes de vendas diretas. Apesar da consolidação

dos Master-Franquedos e da conveniência que ele trazia para a administração

das franquias, o Boticário não conseguia acompanhar suas vendas diretamente

e não tinha acesso a muitas das informações provenientes das demandas nos

pontos de venda.

Essa forma de distribuição começou a ser questionada e a empresa

passou a estudar a possibilidade de eliminação desse elo. O grande problema

seria o desenvolvimento de um novo sistema de distribuição e de uma estrutura

logística capaz de coordenar a demanda de lojas em todo o Brasil. Entretanto,

o Boticário, que esperava uma piora no desempenho após a implantação do

Plano Real, havia aumentado seu faturamento.

Apesar do barateamento relativo dos produtos estrangeiros, que

teoricamente aumentaria a competição no setor de cosméticos, o Boticário

aumentou muito suas vendas. A justificativa para esse acontecimento foi a

melhoria do poder de compra das classes menos favorecidas que puderam

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adquirir os produtos da marca, mais baratas inclusive do que suas

concorrentes nacionais.

Em 1995, o Boticário extinguiu os Master-Franqueados. Essa mudança

foi grande, pois alterava drasticamente as atribuições da fábrica que teria que

dedicar mais tempo em suas operações de distribuição. Após a implementação

desse novo modelo, surgiu imediatamente uma demanda de novos sistemas

informação.

A profissionalização iniciada também contemplou a elaboração de metas

de treinamento e de crescimento para empresa. Miguel Letenski, que auxiliou

na intermediação da venda do terreno onde se situa atualmente a fábrica e

havia começado como auxiliar de produção era o gerente de planejamento

antes da reestruturação. Ele teve papel importante na adoção das novas

medias após completar seu mestrado em engenharia de produção pela

Coordenação de pesquisa e Pós-graduação da Universidade Federal do Rio de

Janeiro – Coppe.

Em 1996, foi inaugurada na área adquirida em 1993 pela FBPN a

Reserva Florestal de Salto Morato. A reserva contava com uma estrutura para

receber visitas guiadas de estudantes e um centro de pesquisa especializada

na manutenção da mata Atlântica. No mesmo ano, Miguel Krigsner ganhou o

título de cidadão honorário da cidade de Curitiba.

O Boticário investia 10 milhões nesse programa de estruturação

administrativa. O programa, que visava acabar com os "Master Franqueados"

só seria finalizado 3 anos mais tarde.

Com todos os esforços voltados para as mudanças na estrutura da

empresa, o faturamento no ano de 1996 declinou no primeiro semestre.

Entretanto, as vendas foram retomadas a partir do segundo semestre do ano.

Em 1996, o faturamento foi 144 milhões de reais, 29 milhões mais elevado que

o montante em 1995.

As vendas no primeiro semestre de 1995 foram maiores que o esperado,

em parte, pelo lançamento do Floratta, um perfume de preço bem mais caro

que os normalmente praticados pela empresa. O frasco do produto foi

desenvolvido por um Designer Francês inspirado nas florestas tropicais

brasileiras.

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O Boticário, que buscava fidelizar o consumidor que se interessava por

seus produtos, aos poucos começou a utilizar o lançamento de novos produtos

para incrementar as vendas. Concorrentes como a Natura e a Avon faziam uso

intensivo dessa prática.

Ainda abaixo da meta de franqueados estipulada no início da década, o

Boticário continuava preferindo que os lojistas atuais abrissem mais lojas em

vez de selecionar novos pretendentes da lista de espera de mais de quatro mil

pessoas. Apenas novos interessados em abrir lojas no nordeste do país

estavam sendo admitidos. As análises da empresa tinham verificado que o

produto era muito bem aceito nessa região e decidiu dedicar mais atenção ao

público Nordestino. Além dos testes de mercado, começaram a ser feitos testes

de aroma para melhor adaptação de novos lançamentos ao gosto desse

público.

Iniciou-se uma aposta alta no mercado Nordestino e em 1996 o Boticário

abriu sua segunda loja própria na região. A Jasmim perfumaria e cosméticos,

uma master-franqueada nordestina, estava se tornando o maior revendedor

dos produtos da empresa. As vendas no nordeste estavam crescendo muito

quando comparadas com outras regiões. Como 12% das vendas era para o

público daquela área, produtos como o Free e Lavanda Pop, consideradas

mais baratas, estavam sendo fabricadas quase que exclusivamente para suprir

a demanda do local.

O Boticário também reformulou sua estrutura interna. O crescimento

pelo qual a empresa havia passado gerou certos problemas de comunicação e

alguns procedimentos burocráticos que tornavam o processo decisório lento.

Para melhorar o fluxo de atividades, a comunicação interna e as condições do

ambiente de trabalho, o Boticário contratou três empresas de consultoria. O

processo foi finalizado em 1996 e o Boticário passou a ter um novo

organograma. Reduziram-se os postos gerenciais e os centros de decisão

ficaram concentrados em três grupos: Gestão do Canal de Vendas, Gestão de

Produtos e Gestão de Logística. Vários funcionários antigos foram demitidos

nesta reestruturação.

No ano seguinte ao ano de criação da reserva Salto Morato, o Boticário,

que já apoiava a fundação, começou a se engajar em projetos sociais de apoio

à comunidade de São José dos Pinhais. Em 1997, foi criado o centro

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Educacional Annelize Krigsner – CEAK, dentro das próprias instalações da

fábrica da empresa. O programa acompanha filhos de funcionários e outras

pessoas até a pré-alfabetização. O centro construído é uma mistura de creche

com centro educacional, e de acordo com uma das entrevistadas, possuía uma

infra-estrutura muito superior à das creches convencionais.

Após a Criação do Centro, também foi criado o Projeto Crescer, que

recruta menores aprendizes. O foco do programa era proporcionar a jovens de

baixa renda, condições de competir no mercado de trabalho. A idéia era

permitir que jovens ganhassem experiência profissional sem que descuidassem

do estudos e dentro das regras e legislações para o trabalho de menores de

dezoito anos. A empresa ganhava muito com o projeto, que sempre dispunha

de auxiliares treinados que poderiam um dia chegar a posições de liderança.

No final de 1997, o Boticário começou a explorar diretamente o

segmento de crianças e pré-adolescentes. O sucesso do Garota Thaty, voltado

para meninas de 13 a 23 anos, estimulou o Boticário a lançar a linha Ma

Cherie. Foi a primeira linha criada para consumidores desse nicho, na qual a

promoção da venda era voltada diretamente para o potencial usuário dos

produtos. A procura foi tanta que, um ano mais tarde, a linha também ganhou

um clube de relacionamento. Assim como o Clube Garota Thaty, o Clube Ma

Cherie foi criado depois de uma promoção que sorteava viagens para a Disney.

No ano de 1998, também foram lançados vários itens da linha Quasar. O

perfume já era o preferido entre o público masculino e deu nome a uma linha

de produtos para este segmento. As embalagens também foram reformuladas.

O Boticário passou a criar linhas de produtos em vez de perfumes ou itens

isolados. A linha Ma Cherie ganhou neste ano o Oscar de L´Emballage,

concedido pelo Instituo Francês de Embalagem e Acondicionamento – IFEC.

As lojas da empresa eram estimuladas a contribuir com todos esses

projetos e, muitas vezes, não se mostravam tão adeptas aos projetos sociais

no quais a empresa se engajava. Desde a implantação da nova estrutura de

distribuição, que extinguiu os Master-franqueados, muitos lojistas reclamavam

das exigências feitas pela matriz. Isso também impedia um maior crescimento

do número de franqueados. Ao final de 1997, eram 1525 lojas Boticário no

Brasil e no exterior. Em 1998, a firma mudou a arquitetura de suas lojas

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tornando-as mais claras e expondo melhor seus produtos. Essa mudança foi

chamada de Projeto Aquarius.

Na mudança das lojas, quatro aspectos deveriam ser considerados pelo

projeto arquitetônico: natureza, brasilidade, tecnologia e sonho. O investimento

na mudança das lojas foi alto, alterando desde os uniformes até o software que

a empresa utilizava. Pretendia também implantar um sistema que permitisse

uma comunicação rápida entre a empresa e o franqueado. O Boticário,

somente no desenvolvimento do projeto, despendeu 1 milhão de reais. Cada

Franqueado teve que investir em torno de mil reais por metro quadrado para

adaptar as novas condições impostas.

O Boticário, por realizar sempre pesquisas junto a seus clientes,

descobriu por meio de dados coletados que o cliente prefere ter contato com o

produto antes de comprar. Isso fez com que o Boticário tomasse a decisão de

tornar suas lojas mais interativas. Esse projeto contemplou uma série de outras

mudanças. O vice-presidente da empresa afirmava que o espírito comercial era

o forte da empresa.

Nesta época, o Boticário encomendou outra série de pesquisas para

monitorar o consumidor. A empresa descobriu que as lojas Boticário eram

demasiadamente femininas, apesar do interesse do público masculino para os

produtos da Marca. Isso orientou algumas mudanças, assim como a

constatação de que grande proporção de clientes de classes mais baixa

ficarem constrangidos na hora de perguntar os preços dos produtos, fez com

que o Boticário eliminasse os balcões de venda. Iniciou-se a implementação de

um sistema auto-assistido de vendas por meio de leitores digitais.

O Boticário, em outra leva de pesquisas, descobriu que sua imagem,

que era anteriormente associada a produtos naturais, estava mais associada a

empresas de perfumes. Nesta época, começou-se a distribuir nas franquias

uma revista institucional apresentando os valores da empresa e sua relação

com o meio ambiente através da FBPN. O Boticário passou a concentrar

menos sua produção e o desenvolvimento de novos produtos nos itens de

perfumaria que representavam setenta por cento das vendas totais da

empresa.

Observando as várias etnias que consumiam seus produtos. o Boticário

lançou a linha Natural Colors. A linha foi reconhecida pela revista americana

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Business Week, como sendo a primeira colocada no mercado que englobava

maquiagens adequadas a todos os tipos de pele. O Boticário acreditava que os

produtos normalmente colocados no mercado eram basicamente destinados à

mulher de pele clara e, sendo assim, não adaptados ao público brasileiro.

O Nordeste aumentou o seu destaque, passando a ser a região que

mais consumia produtos da Marca em 1998, com quase 30% das vendas no

país. De acordo com o Diretor Comercial Arhtur Grymbaun, o Boticário

percebeu que o nordestino era o povo que mais se perfumava no país. O

Boticário realizava pesquisas e teste com os consumidores nordestinos. A

novidade Aqua Brasilis foi desenvolvida, voltada para o público nordestino, pois

o produto era leve e fresco. Os testes de lançamento foram realizados em

Recife. O Boticário, que pretendia descontinuar a deo-colônia Free, voltou atrás

na decisão. O nordeste consumia quase que 60% da produção total do

perfume.

A modernização das operações da empresa alcançou, neste ano, uma

etapa importante. O centro de distribuição, na fábrica de São José dos Pinhais,

passou a poder armazenar todos os produtos vendidos pela empresa. O centro

de armazenagem contava com o sistema de Picking by Light e de separação

semi-automática de pedidos. O Próximo passo do projeto de estruturação seria

a implantação do sistema de planejamento de recursos empresariais – ERP

que estava sendo iniciado.

Foi criado, em 1998, o Programa Reduzir, Reciclar, Reutilizar. Com o

Programa, a reciclagem que já ocorria na fábrica passou a afetar os escritórios

de O Boticário. O programa visava reduzir o lixo gerado por papéis nos

escritórios da empresa. Esse Programa ganhou o Prêmio Top social, concedido

pela Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing – ADVM. Também foi

criado mais um programa para atuar junto à comunidade local. O Projeto

Essências da Vida tinha como objetivo orientar gestantes sobre os cuidados

que devem ser tomados durante a gravidez. A idéia era de reunir gestantes e

estimular a troca de experiências, além de prepará-las psicologicamente para

os potenciais problemas decorrentes da gravidez.

Os estudos e pesquisas realizadas mostravam que os grandes centros

urbanos estavam saturados de lojas do Boticário. Isso fez com que fosse

desenvolvido um modelo menor de loja para vender os produtos da marca em

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cidades menores e em locais de grande circulação e pouco espaço. Noventa e

nove das 144 lojas inauguradas em 1999 foram sob esse novo conceito e em

município com menos de 30 mil habitantes. Esses novos pontos de venda

possuíam cerca de 40 metros quadrados.

Todas as mudanças implementadas estavam causando impacto no

faturamento. Desde 1995, a empresa crescia constantemente seu faturamento.

De acordo com a diretoria da empresa, o aumento das vendas era reflexo da

expansão geográfica. A empresa também estava mais eficiente e o tempo de

entrega de um produto ao lojista ficou 30% menor nas regiões mais distantes

do centro de distribuição e armazenagem construído na fábrica de são José

dos Pinhais.

As vendas cresceram 146% para os produtos para tratamento facial e

133% para os produtos de cabelo. Esse fato foi impulsionado pelo lançamento

de uma linha de xampus e condicionadores com preços bem competitivos. A

idéia era mostrar o Boticário como uma empresa mais completa.

A impossibilidade de abertura de novas lojas nas grandes cidades fez

com que o mercado internacional também ganhasse relevo. Em 1998 e em

1999 a empresa aumentou os pontos de vendas no exterior e, no final de 1999,

o faturamento do Boticário no exterior já era cerca de 3% do total. Além de

ampliar os pontos, elaborou uma estratégia para mover as lojas para grandes

centros comerciais, que fez com que a maioria das lojas em ruas fossem

fechadas ou transferidas para shoppings. A meta era que 12% do faturamento

fosse oriundo das exportações.

No final de 1999, uma outra linha inovadora foi desenvolvida pela

empresa. A linha, além de trazer alguns produtos de higiene para o público de

3 a 7 anos, possuía uma série de livros educativos que eram encontrados nas

lojas da empresa. Um boto rosa, animal ameaçado de extinção, era o ícone

dos produtos da linha Boti. Conjuntamente com a Linha de produtos, foi criado

o Clube Amigos do Boti, que enviava materiais que estimulavam o respeito à

natureza para seus integrantes, sempre utilizando ferramentas apropriadas. O

clube cadastrou, em pouco tempo, mais de 33 mil nomes.

No lançamento da linha foram investidos cerca de 2,1 milhões de reais.

Em apenas quatro meses, houve um aumento de 32% no volume de vendas

para o público infantil e de 40% no faturamento dos produtos infantis.

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A fundação do Instituo Ethos possibilitou que o Boticário, já engajado na

proteção à natureza, começasse a pensar de forma mais estruturada em outras

ações relacionadas à responsabilidade social e ambiental. O instituto fornecia

orientações para as empresas brasileiras que queriam adotar práticas ligada a

RSC. Nesta época, foi aumentado o percentual dedicado aos investimentos da

fundação. Até 1998, era destinado à FBPN, 1% do lucro líquido da empresa.

A expectativa era manter o crescimento nas vendas e, para isso, a

capacidade produtiva teve que ser ajustada. Foram investidos ao longo do ano

2000, 5 milhões de reais em maquinário novo. A mudança não modificou os

processos, mas aumentou a capacidade produtiva. Após o investimento, o

Boticário teria a opção de triplicar a produção, caso viesse a utilizar três turnos.

Com experiências satisfatórias nos clubes de relacionamento e com o

serviço de atendimento ao cliente que funcionava desde 1990, o Boticário criou

o programa Fidelidade em 2000. Para efetivação do programa foram

desenvolvidas ferramentas próprias de TI, que buscavam cadastrar as compras

e o perfil dos clientes adeptos ao programa. A adesão era gratuita e eram

distribuídos brindes para estimular a sua adesão ao Programa. Inicialmente,

600 lojas participaram do Programa, cerca de um terço do total na época. O

cadastro de clientes cresceu de forma substancial com a adesão de 80 mil

novos clientes por mês. Esse ritmo acelerado de novos adeptos e a estrutura

do programa rendeu o melhor “case” nacional relacionado à fidelidade do

cliente no varejo. O prêmio foi o Summit de Varejo no ano de 2001.

Em 2001, a empresa foi eleita pela revista exame a melhor do setor de

perfumaria e cosméticos.

O Boticário cria a Fábrica de Talentos, um programa para preparar

comportamental e tecnicamente os funcionários da empresa. O programa era

em parceria com o Senai e oferece cursos de desenvolvimento pessoal,

controle estatístico de processo e melhorias na limpeza. Esses cursos eram

majoritariamente destinados a profissionais não qualificados do chão de fábrica

permitindo que eles desenvolvessem habilidades gerenciais.

O Boticário vinha apoiando atletas desde 1995 e havia se engajado

fortemente na promoção de artes e cultura no final da década de 90. Contudo,

não havia políticas estruturadas de investimento social-privado. Foi só com a

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implantação do Instituto Ethos que o Boticário começou a instaurar programas

sociais com o apoio da rede de franqueados.

O Programa Reciclagem Pós-Consumo, desenvolvido pela empresa em

2001 foi estruturado com o apoio dos franqueados e envolvendo a participação

de vários elos da cadeia logística da empresa. O Programa se apoiava no

conceito de logística reversa para propiciar um canal de reciclagem das

embalagens e outros produtos de interesse dos clientes da loja. Os

freqüentadores das franquias poderiam levar as embalagens vazias às lojas

que eles seriam reciclados por uma empresa parceira do Boticário no Projeto.

A idéia era que, retornando às lojas, os clientes pudessem fazer um bem para

o meio ambiente e, ao mesmo tempo, buscar novos produtos da empresa.

O Boticário terminou o ano de 2001 com uma política de

sustentabilidade formulada. Entretanto, nada tinha sido traduzido em planos

com metas para serem alcançadas. A empresa estava se preparando para

lançar o seu balanço social, de acordo com os padrões do IBASE em 2002.

Agora, 1% do faturamento, independente de um resultado lucrativo, seriam

designados para projetos sociais e ambientais. Especificamente, seriam

destinados à FBPN 0,8% do faturamento e a causas sociais 0,2%. A principal

concorrente nacional destinava 10% dos dividendos, que seriam destinados

aos acionistas da empresa.

O Boticário planejou reforçar os investimentos no mercado americano,

mas o atentado terrorista de 11 de setembro impediu que isso fosse feito.

Miguel Krigsner, como opção, avaliou o potencial do mercado mexicano e

decidiu entrar nos Estados Unidos somente após ter se consolidado no México.

Foi calculado que o mercado pretendido tinha potencial para, no mínimo, 100

lojas da marca. Seriam investidos no mercado mexicano, ao todo, 14 milhões

de reais. O investimento englobava na abertura de 4 lojas próprias na Cidade

do México.

O Boticário já tinha 71 lojas no exterior e era a maior rede de perfumaria

de Portugal. Além de investimento em Portugal, outras lojas seriam abertas,

duas próprias no Peru e outras quatro em Portugal. No Brasil, eram 2112 lojas.

Noventa e sete por cento das cidades brasileiras com mais de 30 mil habitantes

já tinham pontos de venda do Boticário.

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A produção anual foi de 50 mil unidades em 2001 e, havia no portifólio

da marca, 540 produtos. O Boticário que demorava bastante tempo para

desenvolver seus produtos começou a desenvolver vários produtos a cada ano.

Isso gerava a necessidade de desativar certos itens. Houve vários clientes

insatisfeitos que reclamaram junto aos serviços de atendimento e à

administração do Programa de fidelização alegando que era desrespeitoso o

fato da empresa ter tirado seus produtos favoritos de linha. Só em 2001 e em

2002 foram lançados cerca de 150 produtos novos em cada ano.

Neste ano, foi lançado um perfume para o público masculino chamado

Clipping. Esse produto chegou a ser o principal item de perfumaria para este

segmento. Além disso, o produto inovou no design de sua embalagem. O

Espanhol Juan Carlos Rutarazo criou um conceito que remetia a embalagem a

um controle remoto. A idéia era modernizar e criar um novo movimento para a

hora de se perfumar. A embalagem também tinha uma válvula de propulsão

diferenciada, que permitia que o perfume saísse pela parte superior do frasco

sem desperdícios.

Após um investimento de mais 1,2 milhões de reais, o Boticário lançou a

linha Universal Solutions. As pesquisas para desenvolvimento da linha

consideraram o impacto ambiental em todos os elos envolvidos na cadeia de

suprimentos das matérias-primas dos produtos. Os principais ingredientes

eram insumos tropicais e brasileiros, como a água de coco e algumas algas

marinhas encontradas apenas no litoral do nordeste. Não houve um apelo forte

no lançamento da linha no Brasil, mas o Boticário pretendia utilizá-la para

entrar no mercado norte americano.

O Boticário anunciou que pretendia comercializar os produtos no

mercado argentino, mas a crise que perdurava no país fez com que os planos

fossem frustrados.

O Boticário lançou loja virtual, mas não visava substituir o processo

utilizado de vendas, por meio dos franqueados e, portanto, não pretendeu atuar

fortemente no canal de vendas que a loja proporcionava. O site da empresa foi

totalmente modificado passando a ter uma linguagem mais moderna. O layout

fazia alusão à natureza, reforçando a conexão da marca com a preservação do

meio ambiente. Também foi desenvolvido um link direto para o site da FBPN. A

empresa que havia optado por não utilizar a Fundação para reforçar a

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124

instituição ou a marca, começou a divulgá-la a fim de reaproximar a marca

Boticário à causas ambientais.

A loja virtual possuía fotos de todos os produtos separados pelo perfil de

cada cliente. Para viabilizar a entrega dos produtos, a empresa, que não tinha

um sistema próprio de entrega, fez uma parceria com os correios, tornando o

frete mais econômico e mais ágil. Se a solicitação fosse realizada por e-mail ou

telefone, o Boticário firmava o compromisso de entregar o produto em no

máximo 48 horas. O acordo era a entrega dos pedidos no terceiro dia após o

dia da compra. Já no início, eram mais de 5 mil visitas diárias.

Com o lançamento de seu portal, o Boticário ganhou um importante

prêmio de comércio eletrônico. A empresa recebeu o Cyber Lion no festival

internacional de publicidade de Cannes, que premiava os melhores trabalhos

do mundo relacionados com comércio eletrônico. Todos os preços praticados

eram idênticos aos praticados pela loja, acrescidos da taxa de entrega. Isso

fazia com que a opção de comprar o produto nas franquias ainda fosse a opção

mais barata.

O Boticário começava, cada vez mais, a divulgar as campanhas

associando sua imagem à de uma empresa ética e responsável com a

sociedade e o meio ambiente. Ela havia constatado, através de pesquisas, que

os seus consumidores se interessavam mais por produtos sócio-

ambientalmente responsáveis. Era possível notar no discurso de funcionários

da empresa que havia uma certa frustração pela empresa não possuir uma

imagem de sócio-ambientalmente responsável. Isso ocorria porque a empresa

apoiava várias causas sociais e ambientais, mas não era reconhecida por isso.

A empresa era reconhecida pela sua liderança no setor de franquias e pelos

produtos que ela desenvolvia.

Em 2002 foi lançado um livro comemorativo de 25 anos da empresa.

Além de um histórico segmentado por temas, o livro tinha um capítulo exclusivo

da FNPN. Eram mostrados também os principais produtos da empresa como o

Aqua Fresca, Thaty e o recém lançado Clipping. O livro foi divulgado apenas

para os próprios funcionários da empresa. Cada um dos funcionários de

escritório foi presenteado no fim do ano com exemplar deste livro

comemorativo nomeado de A Essência dos Sonhos.

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O Boticário realizou, em 2003, mais investimentos na modernização de

seu sistema de vendas. No final do ano, o Boticário começou a implementar o

Vsat, projeto ousado que visava interligar, via satélite, todos os franqueados, os

parceiros e os fornecedores. Essa ferramenta, além de agilizar a comunicação,

dava visibilidade da demanda para os fornecedores dos insumos permitindo

que estes preparassem sua produção. A demanda real, nas lojas, que já era

conhecida pela fábrica, passava a ser conhecida pelos principais parceiros e

fabricantes. A transparência do processo permitiu que fossem implantadas

metas de trabalho junto com os fornecedores que possuíam as ferramentas

interativas de acompanhamento.

O Boticário também procurava selecionar os fornecedores de acordo

com as suas características sócio-ambientais. Procurava-se dar algum

privilégio para parceiros que procuravam apoiar a sociedade ou o meio

ambiente em alguma causa, mas assim como nos primórdios, o objetivo

primordial era os ganhos de escala pela compra de várias unidades. Para os

apoiadores das causas sociais do Boticário, era difícil mudar o paradigma de

custos que vinha sendo utilizado no suprimento de matérias.

Em 2004, o Boticário estruturou a K&G. As letras representavam as

iniciais do presidente do conselho, Miguel Krigner e do presidente da empresa,

Arthur Grynbaum. A empresa, controlada pelo Boticário, ficaria responsável

pelos investimentos sociais e ambientais que a empresa passaria a fazer. A

criação dessa holding, que controlaria as empresas do grupo do Boticário,

facilitaria a gestão dos investimentos sociais privados, de acordo com os sócios

da K&G.

Uma importante ação social nesse sentido foi o desenvolvimento em

tempo recorde de um gel antisséptico especial. O Boticário enviou para o Sri-

lanka, país mais atingido pelo Tsunami, um malote com itens que poderiam

ajudar no tratamento dos feridos. Foram doadas 250 mil bisnagas do gel e

ainda 50 mil pastilhas de cloro purificador de água.

O perfume masculino mais vendido atualmente foi lançado em 2004 pela

empresa. O lançamento do perfume Malbec, que uniu o perfume ao vinho, foi

resultado de R$ 3,2 milhões em pesquisa que durou 18 meses. A idéia foi

inovadora, pois nenhuma empresa havia utilizado as propriedades dos vinhos

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para desenvolvimento de essências para produtos de beleza. Um ano depois

foi lançado o Malbec na versão feminina.

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127

5. RESULTADOS

5.1 Associação das empresas às abordagens

A presente análise tem o intuito de verificar em que medida as empresas

estudadas se alinham às abordagens de RSC desenvolvidas neste trabalho.

Assim, será possível entender mais sobre a forma com a qual o Boticário e a

Natura incorporaram atitudes ligadas à RSC e à sustentabilidade. Essa análise

também permitirá avaliar as abordagens e as três dimensões do modelo

propostos por este trabalho de pesquisa.

Como visto no capítulo de Método, a análise das empresas no âmbito de

cada uma das dimensões das abordagens será realizada separadamente.

Foram levantadas as ações e atitudes relevantes para as duas empresas em

cada dimensão de estudo. Essas atitudes, que subsidiariam a análise proposta,

foram expostas graficamente para que o período em que elas ocorreram

pudesse ser facilmente identificado. A linha do tempo delineada para cada fato

relevante foi observada para se ter uma idéia aproximada da vigência de cada

questão analisa.

5.1.1 Quanto à Dimensão da Institucionalização

Como visto anteriormente, a Dimensão da Institucionalização analisa

dois aspectos para que se possa entender a aderência das empresas na

vertente dependente ou independente. O primeiro lida com a origem ou, em

outras palavras, com a motivação que levou a firma a adotar a iniciativa ligada

à RSC. O segundo lida com a originalidade da iniciativa, que pode ser pioneira

ou pode ser uma prática seguidora, já amplamente adotada por outras

empresas.

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• Natura

A seguir, as iniciativas relevantes para a análise dos aspectos da

Dimensão da Institucionalização da Natura são demonstradas no gráfico 5.1.

Gráfico 5.1 – Natura: Atitudes/Iniciativas pertinentes à Dimensão da Institucionalização

Proposta de comunicação trasparente

Uso de Refis

Boas condições de trabalho

Explicitação da Razão de Ser

Piora na Administração dos ISP

Governaça e Ferramentas de Gestão

Fonte: Elaborado pelo Autor

• Proposta de Comunicação Transparente

A primeira atitude relacionada à RSC incorporada foi a proposta de

transparência oferecida aos compradores dos produtos da empresa. Era

incomum, em 1968, que as consumidoras de produtos de beleza fossem

orientadas sobre as potencialidades negativas dos produtos de Beleza. A

Natura baseou-se nessa proposta para realizar o atendimento a seus clientes.

Contudo, a proposta foi temporariamente abandonada ao mudar para o sistema

de vendas diretas em 1974. A Natura apenas retomou essa filosofia em 1991,

quando passou a orientar e treinar as consultoras para que elas realizassem tal

tipo de atendimento.

Essa iniciativa, no âmbito da Dimensão da Institucionalização, pode ser

considerada Pioneira. Quando a Natura iniciou a proposta de transparência, em

seu surgimento, e quando a retomou no início dos anos noventa, ela era

exclusiva no segmento de cosméticos brasileiro. Apesar desse aspecto remeter

à vertente independente, ele foi uma iniciativa que não foi exclusivamente

motivada por fontes internas (motivação intrínseca). Na maior parte do tempo

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em que a proposta transparente de comunicação vigorou, ela foi motivada pela

competição contra a Avon. A Natura captava menos consultoras que a

concorrente, e precisou aumentar a produtividade das mesmas para conseguir

aumentar a sua participação de mercado.

• Uso de Refis

Outra iniciativa pioneira no Brasil e no segmento de empresas de

cosméticos que utilizam vendedoras independentes, foi a utilização de

embalagens reutilizáveis. Foi uma iniciativa que permitia economizar com

embalagens, principal componente dos custos dos itens de perfumaria e

cosméticos. Durante muito tempo foi a única atitude incorporada pela empresa

que se relacionava com o meio ambiente. A utilização de refis foi crescendo, ao

longo do tempo, e foi sendo utilizada cada vez em mais produtos da empresa.

Essa iniciativa adere à vertente independente da abordagem em seus

dois aspectos de análise. Ela pode ser considerada Pioneira pelo fato de ser

uma proposta pioneira. Além disso, ela foi motivada por uma orientação do

principal líder da Natura. Nesta época ele já acreditava que a empresa poderia

contribuir para o meio ambiente.7

• Condições de Trabalho

Em 1984, a Natura começou a proporcionar melhores condições de

trabalho para as mulheres. À época, mesmo tendo oportunidade de contratar

funcionários sem filhos, a Natura contratava mães solteiras e gestantes, dando

oportunidade para que elas levassem suas crianças ao trabalho. Em 1991 foi

criada uma creche estruturada para esse tipo de funcionárias e, em Cajamar, a

estrutura para receber filhos de funcionários aumentou. Também foi criado, em

1999, um programa para estimular educação superior para os filhos dos

funcionários. À medida que a Natura percebeu a importância relativa da força

de trabalho feminina, ela elaborou soluções para melhorar suas condições de

trabalho. A empresa ganhou reconhecimento pelo relacionamento com esse

7 De acordo com o discurso de Pedro Passos para o Ceo Submit da Endeavor.

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público, ganhando três vezes o título de melhor empresa para a mulher

trabalhar.

Essa atitude foi incorporada em decorrência de pressões internas, pois

foi uma opção da empresa diante da necessidade específica de seus

funcionários, e do perfil de mão de obra que ela buscava contratar. No entanto,

as boas condições de trabalho proporcionadas às mulheres não foram uma

iniciativa Pioneira. Isso se deu por que a Natura apenas aplicou práticas já

utilizadas por outras empresas.

• Explicitação da razão de ser

A explicitação da razão de ser, em 1992, promoveu os valores dos

líderes em toda a empresa. A iniciativa atuou tanto na promoção de valores

para o público externo, quanto para o público interno. Esse fato pode ser

considerado uma ferramenta de relacionamento eficaz que a empresa utilizou

para posicioná-la frente a seu público. Os valores explicitados se mostraram

úteis e foram devidamente utilizados como insumos do processo criativo da

empresa.

A associação de Guilherme Leal a uma organização que debatia o papel

social do empresário, em 1992, se deu antes da proliferação de organizações

não governamentais ligadas à ética empresarial. Isso demonstra o interesse

dos líderes da empresa na RSC antes dos modismos relacionados ao tema.

Essa atitude teve motivações intrínseca. Com líderes preocupados com as

discussões sobre RSC, seria natural que os mesmos formalizassem a

identidade da empresa com uma proposta ligada à RSC e à sustentabilidade.

Isso tornou a empresa mais propensa a assumir comportamentos

socialmente responsáveis. A Natura iniciaria seu processo para se tornar

referência em termos de RSC no Brasil. Essa iniciativa foi desenvolvida e

trabalhada junto com a marca da empresa, e pode ser considerada uma

proposta única. Assim, o trabalho relacionado à razão de ser da empresa pode

ser considerado uma atitude Pioneira que se adere perfeitamente à vertente

Independente da Dimensão da Institucionalização.

Mas foi somente após o contato com outros empresários e organizações

voltadas a orientar os ISPs que a Natura criou o Crer para Ver em 1995. Na

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131

época, várias empresas já haviam decidido apoiar a educação de jovens e

adultos. Esse programa recebeu métricas claras em 1999 e, por meio delas, foi

comprovado que o programa estava se tornado menos eficiente com o passar

dos anos.

• Explicitação da razão de ser

Mesmo se esforçando para ter sua imagem associada à de empresa

cidadã, a Natura era multada e questionada por alguns de seus processos. Em

1999 ela foi multada por não lidar adequadamente com seus efluentes e, em

2001, ela foi alertada de que estava utilizando madeira nobre sem certificação

devida para fabricação de caixas. Esses fatos foram indícios do descaso com

os Investimentos Sociais Privados da Natura. Ao mesmo tempo em que a

empresa buscava trabalhar sua imagem de empresa responsável, os inúmeros

programas sociais que ela realizava em 1999 começaram a refletir certa piora

em seus indicadores. Esse fato relevante é típico da vertente dependente. Ela

começou a realizar ISPs genéricos para acompanhar a onda de

responsabilidade social vigente, promovendo ações igualmente efetuadas por

outras empresas. Dessa forma, os ISPs desenvolvidos pela empresa foram

relacionados à vertente dependente da Dimensão.

• Ferramentas de gestão da Responsabilidade Social

Em 1997, a Natura criou um conselho de administração com membros

externos, agregando diversidade de visões à tomada de decisão na diretoria.

Tal medida foi adotada sem que houvesse cobrança por uma melhor

governança corporativa. Depois, a Natura implantou o bônus dos funcionários

atrelados a indicadores ambientais e a formação do comitê de sustentabilidade.

Posteriormente, a empresa foi pioneira no estabelecimento de metas

diretamente ligadas com a RSC.

Após a criação e a estruturação das métricas relacionadas à RSC, e a

evolução de aspectos ligados à sustentabilidade, a Natura havia considerado o

Triple Bottom Line em seus resultados. Assim, o conjunto de medidas adotadas

para gerir a RSC dentro da empresa pode ser considerado uma iniciativa.

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Como poucas empresas, especialmente entre as que não tinham ações

negociadas em bolsas, se interessavam por esse tipo de mensuração, tais

iniciativas podem ser consideradas uma atitude Pioneira.

Assim, antes de outras empresas, a Natura começou a desenvolver uma

estrutura para lidar com as questões relacionadas à RSC e à sustentabilidade.

Essa atitude, por ter sido pioneira, poder ser enquadrada como Pioneira, além

de ter sido motivada intrinsecamente. Apesar da empresa aderir aos padrões

externos de divulgação, muitos desses instrumentos foram desenvolvidos ou

trazidos para o Brasil por uma iniciativa da empresa. Após 1998, já existia na

Natura uma predisposição cultural para agir de forma responsável.

Abaixo, no quadro 5.2, seguem resumidos os aspectos relevantes das

iniciativas e atitudes consideradas na análise da dimensão.

Quadro 5.1 – Dimensão da Institucionalização: Análise das atitudes/iniciativas da Natura Atitude ou iniciativa incorporada Originalidade Origem/Fonte Vertente

Proposta de comunicação transparente Pioneira Motivação Extrínseca Mista

Uso de Refis Pioneira Motivação intrínseca Pro-Ativa

Boas condições de trabalho Seguidora Motivação intrínseca Mista

Explicitação da Razão de Ser Pioneira Motivação intrínseca Pro-Ativa

Administração dos ISP Seguidora Motivação Extrínseca Reativa

Governança e Ferramentas de Gestão Pioneira Motivação intrínseca Pro-Ativa

Fonte: Elaborado pelo autor

De acordo com atitudes ou incitativas relevantes, assim como com a sua

relação com os aspectos da Dimensão da Institucionalização, a Natura pode

ser enquadrada como adepta à Abordagem “B”. O enquadramento não é ideal,

pois ainda houve atitudes consideradas da vertente dependente, e atitudes que

possuíam aspectos das duas vertentes. Cabe ainda ressaltar que a única

atitude considerada do tipo “A” perdurou por poucos anos. Desta forma, ela

pode ser considerada menos relevante nesse contexto de análise.

• O Boticário

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Gráfico 5.2 – Boticário: Atitudes/Iniciativas pertinentes a Dimensão da Institucionalização

Práticas de relacionamento com o cliente

FBPN

Outros ISPs do Boticário

Fonte: elaborado pelo autor

• Práticas de relacionamento com o Cliente

A primeira ação ou comportamento incorporado ligado à RSC ou à

sustentabilidade foi a criação do centro de relacionamento com o cliente. Essa

iniciativa ocorreu muito antes das obrigações legais, e foi orientada pelo

empenho que o Boticário exerceu ao monitorar as demandas desse público

interessado desde seu surgimento. Esse comportamento, incorporado aos

poucos, permitiu que o Boticário atendesse aos anseios de seu público, e

recebesse críticas e sugestões. A central de atendimento ao cliente, criada em

1989, foi a primeira iniciativa formal de relacionamento da empresa.

Após a Central, vieram os clubes de relacionamento, que também

fortaleciam o elo entre a empresa e seus clientes. A empresa, pelo menos em

seu segmento, foi pioneira na estruturação dessa atitude de monitoramento de

seus clientes. Isso fez com que ela identificasse segmentos de mercados

atrativos antes de seus concorrentes. Foi assim com os produtos infantis, os

itens para homens e o mercado nordestino.

Essa atitude foi desenvolvida pelo Boticário desde os primórdios da

companhia. A enorme preocupação com as necessidades dos clientes podia

ser observada na configuração da primeira farmácia da empresa. O Boticário

sempre procurou entender a fundo as expectativas do consumidor brasileiro e

se destacava por isso de várias formas. Essa orientação é classificada como

Pioneira por que, enquanto outras empresas renovavam os produtos para

aumentar as vendas, o Boticário apostava em fidelização e retenção de

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clientes. Além disso, muitas das iniciativas relacionadas foram pioneiras. Dois

exemplos dessa atitude já abordados foram a central de relacionamento com o

cliente, e os clubes desenvolvidos pela empresa.

Essa iniciativa também pode ser considerada independente quanto à

motivação. Apesar da orientação ser para um público externo, a empresa atuou

dessa forma por convicção de seus líderes. Essa perspectiva estava sempre

fortemente presente nos processos de decisões, independentemente das

práticas mais usuais.

• Outros ISPs do Boticário

Por uma orientação interna, mais especificamente do fundador Miguel

Krigsner, o Boticário criou a Fundação Boticário de Proteção à Natureza –

FBPN, exemplo de investimento social privado autêntico no Brasil. A fundação

foi motivada pelo ímpeto do empresário de contribuir com a natureza. A idéia

da fundação foi formulada com apoio profissional levando a crer que, além do

pioneirismo, havia uma preocupação legítima em realizar o investimento de

forma efetiva. Já havia, à época, fundações estruturadas para investir em

ações sociais, mas nada especializado na preservação do meio ambiente como

a FBPN. Somente após a Conferência Eco 92 que outras empresas

começaram a se dedicar a causas ambientais. Dessa forma, tal iniciativa se

enquadra completamente na vertente independente.

• FBPN

O Boticário, ao longo da década de 90, também se engajou em outros

investimentos sociais privados patrocinando eventos esportivos, estabelecendo

programas de desperdícios e programa de admissão de menores aprendizes.

Após 2001, a empresa determinou uma política de investimentos sociais. Ela

passou a investir 0,2% de seu faturamento em projetos de apoio à

comunidades locais e à sociedade. Foi criada, em 2005, uma área para

administração dos ISPs e para desenvolver a sustentabilidade corporativa.

Apesar da estruturação da RSC dentro da empresa ter sido tardia se

comparada com a Natura, o Boticário realizou investimentos sociais

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importantes após esse marco. O apoio da empresa era sempre muito bem

organizado, e as iniciativas bem mensuradas.

Apesar da boa estrutura desenvolvida, essa política de ISP se adere à

vertente Independente. Ela foi implantada após as práticas já terem sido

estabelecidas, sendo considerada uma iniciativa não Pioneira. Além disso, a

empresa foi estimulada por uma tendência de Responsabilidade Social que

influenciava grande parte das empresas brasileiras a se engajarem em práticas

sócio-ambientalmente corretas.

Quadro 5.2 – Dimensão da Institucionalização: Análise das atitudes/iniciativas do Boticário Atitude ou iniciativa incorporada Origem/Fonte Originalidade Vertente

Práticas de relacionamento com o Cliente Pioneira Motivação intrínseca Pro-ativa

FBPN Pioneira Motivação intrínseca Pro-ativa

Outros ISPs do Boticário Seguidora Motivação Extrínseca Reativa

Fonte: Elaborado pelo autor

Nesta dimensão de análise, o Boticário está mais próximo à vertente

Pioneira da RSC. A incorporação de suas principais atitudes ligadas à

sustentabilidade demonstraram certo pioneirismo, permitindo que elas fossem

qualificadas como Pioneiras. Cabe ressaltar que as ações e comportamentos

também não eram associados à marca, e possuíam motivação intrinseca. O

Boticário, diferentemente das demais empresas, não buscava ter sua imagem

associada a causas ambientais. No entanto, a empresa reviu esse conceito e,

em 2004, passou a utilizar esses seus ISPs e a FBPN para agregar valor a sua

marca.

Dessa forma, pelo fato das pressões oriundas de lideranças internas

terem estimulado a FBPN, e do Boticário não relevar suas ações para

promoção de sua imagem, pode se inferir que a segunda empresa analisada

incorporou atitudes ligadas à RSC e à sustentabilidade de forma independente.

A empresa se aproximou da vertente dependente somente em 2001, com a

incorporação de práticas aderentes à abordagem “A”.

5.1.2 Quanto à Dimensão do Investimento

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136

A análise desta dimensão visa determinar, por meio dos aspectos

sugeridos, em que medida cada empresa conseguiu balancear os

investimentos sociais, ambientais e econômicos ao longo de sua trajetória, e

em que medida seus investimentos sociais em iniciativas relacionadas foram

condicionados à existência de lucros. Como visto na parte teórica do trabalho,

para uma empresa atuante próxima à abordagem “B”, o retorno para o

acionista é balanceado com os retornos para as gerações futuras e para os

demais stakeholders da empresa.

Neste ponto serão analisadas como cada uma das empresas solucionou

conflitos entre o social, o ambiental e o econômico ao longo de sua história.

Além disso, será considerado em que medida os investimentos realizados

foram condicionados aos bons resultados financeiros.

• Natura

São quatro as atitudes ou iniciativas incorporadas que serão analisadas

na dimensão do investimento da Natura. Segue abaixo o Gráfico 5.3 que

relaciona cada atitude ou iniciativa no período no qual elas estiveram vigentes.

Gráfico 5.3 – Natura: Atitudes/Iniciativas pertinentes a Dimensão do Investimento

Uso de Refis

Proposta da Marca

Métricas sociais e ambientais

Política de ISPs

Fonte: Elaborado pelo Autor.

• Uso de Refis e Proposta da Marca

A Natura sempre buscou auferir benefícios de suas ações relacionadas

às causas ambientais e sociais. Foi assim na utilização de embalagens

retornáveis e na sua maneira de apoiar-se na imagem responsável para se

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diferenciar. Esse aspecto denota uma associação da empresa à vertente pré-

lucro, pois os investimentos eram realizados para melhorar os resultados

financeiros, e não por que a empresa passava por períodos de bonança.

Ambas as medidas tiveram, de certa forma, impacto indireto sob a perspectiva

financeira, mas os investimentos não estavam condicionados somente a elas.

Dessa forma, essas duas iniciativas podem ser consideradas aderentes

à vertente lucro-independente. Elas não estavam condicionadas à existência de

bons resultados financeiros e auxiliaram a empresa a melhorar a proposta de

valor para seus clientes. Elas também foram equilibradas, pois balanceavam os

objetivos financeiros com os sócio-ambientais.

• Métricas Sócio-ambientais

A empresa, após 2004, começou a atrelar os bônus dos funcionários à

métricas sociais e ambientais. Isso também mostra uma tentativa de balancear

a importância das perspectivas econômicas, sociais e financeiras. Além disso,

mostra que a empresa caminhou para fazer com que as ações ligadas à RSC e

à sustentabilidade fossem amarradas ao resultado financeiro. Assim, a

implantação desse tipo de mensuração de desempenho foi uma iniciativa não

condicionada à existência de lucros que contribuiu para que o foco da empresa

fosse mais equilibrado.

• Políticas de ISPs

Apesar de a maioria das iniciativas anteriores serem aderentes à

vertente lucro-independente, houve uma iniciativa que contribuiu para que a

Natura ficasse mais próxima da Abordagem “A”. A Natura adotou como política,

após 1998, investir 10% dos dividendos que seriam pagos ao acionista em

suas ações sociais. Esse fato permite associar a empresa à vertente pós-lucro,

uma vez que somente seriam destinados recursos no engajamento com causas

sociais e ambientais se houvesse dividendos a serem distribuídos. Essa

iniciativa também não contribui para o aspecto do foco equilibrado, também

importante na análise da dimensão. Corroborando esse fato, foi comentado

pelos entrevistados que, apesar da imagem da empresa, era complicado,

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138

quando se tratava de verbas, obter auxílio para levar os projetos sociais

adiante.

Segue abaixo o quadro que resume as iniciativas ou atitudes pertinentes

à Dimensão do Investimento e seu posicionamento em relação aos aspectos

de análise.

Quadro 5.3 – Dimensão do Investimento: Análise das atitudes/iniciativas da Natura

Atitude ou iniciativa incorporada Condicionamento a o Lucro Foco Equilibrado Vertente

Uso de Refis Não Condicionado Balanceado Lucro-Independente

Proposta da Marca Não Condicionado Balanceado Lucro-Independente

Métricas sociais e ambientais Não Condicionado Balanceado Lucro-Independente

Política de ISPs Condicionado Desbalanceado Lucro-Dependente

Fonte: Elaborado pelo autor

Apesar de não ser totalmente aderente, a empresa se posiciona na

vertente lucro-independente desta Dimensão de Análise e, desta forma,

acredita-se que ela esteja mais próxima à abordagem “B”. A política de

investimentos sociais e ambientais demonstra que a Natura não pode ser

completamente desassociada à vertente lucro-dependente.

• Boticário

Segue o resumo das iniciativas ou atitudes consideradas na análise da

Dimensão e seus respectivos períodos de duração.

Gráfico 5.4 – Boticário: Atitudes/Iniciativas pertinentes a Dimensão do Investimento

Práticas de relacionamento com o Cliente

Projeto Crescer

Outros ISPs do Boticário

Quesitos sócio-ambientais na qaulificação defronecedores

Fonte: Elaborado pelo Autor.

• Prática de Relacionamento com os clientes

Foi notório o fato de a empresa ter se engajado no relacionamento com

seus clientes. Esse aspecto, que fez parte da estratégia de promoção dos

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produtos ao longo de quase toda a trajetória da empresa, pode ser considerado

uma ação no âmbito de RSC. É importante atentar que ela, além de ser uma

ação mercadológica, forneceu um canal importante para a empresa se

aproximar de seus consumidores. Por estreitar o elo com esse stakeholder,

tanto no sentido de aumentar a comercialização de itens, quanto para permitir a

entrada de novas idéias, a incorporação dessa atitude foi insumo para análise

no âmbito dessa dimensão.

A central de relacionamento criada em 1989 permitiu que a empresa

coletasse informações de seus clientes recebendo sugestões e

recomendações para melhorar seus produtos e aspectos das lojas. Os clubes

de relacionamento e, em especial, o clube Garota Thaty, foram cruciais para

fazer com que o produto ultrapassasse o Aqua Fresca em vendas e fosse

reconhecido como o principal produto para o segmento jovial por vários anos.

Assim, esses foram considerados investimentos lucro-independente, e

contribuíram para que a empresa gerasse disponibilidade financeira. O outro

aspecto da Dimensão, que analisa o fato da iniciativa ou atitude estar

condicionada à existência de lucro, não pôde ser determinado.

• Projeto Crescer

O projeto crescer, que admitia menores aprendizes desde 1996, foi

elaborado para atender a comunidade local e prover a empresa com mão de

obra. Essa iniciativa pode ser considerada um investimento lucro-

independente. Isso ocorre, pois os menores integrantes do programa

eventualmente assumem cargos gerenciais no Boticário. Dessa forma, apesar

da impossibilidade de determinação da eficácia do programa para gerar folga, o

investimento possui um foco equilibrado. Quanto ao aspecto do

condicionamento ao lucro, o projeto pode ser alinhado à vertente lucro-

dependente. Isso ocorre, pois a medida surgiu como uma forma que o Boticário

encontrou para compensar a comunidade local de São José dos Pinhais que

estava provendo mão-de-obra e acompanhando seu crescimento.

Apesar da intenção de qualificar fornecedores quanto aos aspectos

ambientais e sociais, a empresa não teve nenhuma estrutura sistematizada

para resolução de conflitos até 2005. A utilização de métricas ambientais e

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140

sociais para mensuração do desempenho global é um importante indício de

que a empresa está próxima à vertente lucro-independente. Isso ocorre, por a

mensuração de desempenho equilibrada é uma maneira estruturada para a

resolução de conflitos entre os três aspectos do Triple Bottom Line.

Vale ressaltar que, apesar da incorporação das metas, o custo de

fornecimento ainda era o aspecto primordial de seleção de fornecedores. Foi

relatado por um entrevistado que os critérios sócio-ambientais eram verificados

apenas quando a diferença no preço dos insumos era insignificante. Dessa

forma, essa iniciativa foi considerada condicionada ao lucro.

A política de designação de recursos para os ISPs do Boticário pode ser

considerada um importante subsídio para a análise no âmbito da Dimensão do

Investimento. Sabe-se que a empresa, que dedicava 1% do lucro às causas

ambientais no início da década de noventa, reformulou sua política de ISP em

2001. Enquanto a Natura condicionava seus investimentos aos resultados

econômicos, o Boticário passou a dedicar parte do faturamento à FBPN e a

outras causas sociais. Isso claramente rompe com a idéia de que a empresa

deveria estar indo bem para efetuar investimentos que apoiassem causas não

diretamente financeiras. Com essa política, mesmo tendo prejuízo, o Boticário

deveria manter seus investimentos sociais e ambientais.

Esse último aspecto é claramente um indício de que a perspectiva

ambiental e social ganhou importância frente à financeira. A incorporação

dessa atitude aproxima a empresa da vertente lucro-independente, pois

sistematiza de certa forma como a empresa lida com conflitos ambientais e

sociais.

Segue abaixo o quadro 5.4 sumarizando cada iniciativa e a sua relação

com os aspectos da Dimensão do Investimento.

Quadro 5.4 – Dimensão do Investimento: Análise das atitudes/iniciativas do Boticário

Atitude ou inicitiva incorporada Condicionamento

ao Lucro Foco

Equilibrado Vertente

Práticas de relacionamento com o Cliente Indeterminado Balanceado Lucro-Independente ou Mista

Projeto Crescer Condicionado Balanceado Misto

Outros ISPs do Boticário Não Condicionado Balanceado Lucro-Independente

Quesitos sócio-ambientais na análise de fronecedores Condicionado Balanceado Misto

Fonte: Elaborado pelo autor

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141

Em síntese, o Boticário pode se posicionar em uma posição

intermediária na presente Dimensão de análise. Acredita-se que há apenas

uma pequena tendência da empresa em incorporar atitudes da maneira

condizente com a RSC do tipo “B”. Isso ocorre por que todas as iniciativas ou

atitudes pertinentes incorporadas possuíam o foco Balanceado.

5.1.3 Quanto à dimensão da Inserção de Valores

Esta dimensão de análise visa examinar em que medida as atitudes

incorporadas estão integradas às atividades das empresas. Como a principal

unidade de análise deste trabalho é a firma em si, e não somente áreas

funcionais ou os investimentos sociais privados, essa dimensão se torna

crucial. É nela que será analisado se a empresa aplica os preceitos de cada

uma das dimensões em suas operações ou se são apenas atividades isoladas.

Para o entendimento da Dimensão da Inserção de Valores, serão

ressaltados se os aspectos relacionados à RSC e à sustentabilidade estão

vinculados às operações da empresa, bem como se interferem nas atividades

empresarias. Para uma empresa adepta à abordagem “B”, os conceitos de

sustentabilidade devem estar ligados a todos os aspectos do negócio,

enquanto que, para a abordagem “A”, o desligamento entre as ações

relacionadas à RSC impede a interferência das mesmas nas operações da

empresa.

Dois aspectos são considerados nas análises desta dimensão. O

primeiro, em que medida as iniciativas ou atitudes foram implantadas de forma

formal e sistemática. E o segundo, se a incitativa ou atitude se relaciona com o

negócio da empresa.

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142

• Natura

Seguem abaixo, para análise, as principais iniciativas ou atitudes ligadas à

Dimensão da Inserção de Valores.

Gráfico 5.5 – Natura: Atitudes/Iniciativas pertinentes a Dimensão da Inserção de Valores

Uso de Refis

Proposta de comunicaçãotrasparente

Explicitação da Razão deSer

Metricas sócio ambientais

Fonte: elaborado pelo Autor

As primeiras ações identificadas, relacionadas à incorporação de

atitudes relacionadas à RSC e à sustentabilidade, já possuíam um caráter de

integração, afastando a Natura da vertente desligada e da abordagem “A”.

• Proposta de comunicação transparente

A proposta de transparência promovida pela empresa nos primórdios é a

primeira atitude analisada. Essa proposta, além de promover a ética no

relacionamento da empresa e seus clientes, adicionava valor aos produtos da

empresa. Esse é um exemplo típico de uma atitude relacionada e que deve ser

considerado um indício da vertente Central da Dimensão da Inserção de

Valores. Essa Atitude, apesar de ter existido nos primeiros anos da empresa,

só foi adotada de maneira mais sistemática a partir do início da década de 90.

Assim, como essa primeira atitude foi sistematizada e relacionada com as

atividades da Natura, ela foi considerada aderente da vertente central da

Dimensão.

• Uso de Refis

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143

Além de ser possível perceber que a Natura integrava a proposta de

atendimento transparente e ético às atividades operacionais da empresa, ao

elaborar as embalagens retornáveis a empresa demonstrou mais uma vez que

as ações ligadas à RSC que ela promovia estavam inseridas nas atividades da

empresa. Essa inovação, além de ser uma proposta eficiente para reduzir o

impacto ambiental causado pela empresa, possibilita a redução de custos e

preços mais baratos para o cliente. Desta maneira, os refis, mesmo que não

utilizados para todos os produtos e linhas, indicam novamente uma atitude

integrada incorporada à empresa. Essa atitude, apesar de não estar

necessariamente no centro da geração de valor, demonstra uma solução

envolvendo as operações da empresa.

O uso dos refis, apesar de ser uma atitude ligada à RSC relacionada,

não é completamente aderente ao aspecto central da dimensão. Isso ocorre

por que a utilização não foi implementada de forma sistemática. Não há, na

empresa, nenhuma regra ou procedimento que padronize a utilização de refis.

• Explicitação da Razão de Ser

A declaração da missão e razão de ser da empresa também sinalizam

para que a Natura seja posicionada na vertente central da Dimensão. A

formalização, que foi uma ferramenta de comunicação com vários públicos

interessados, se baseava em conceitos facilmente articuláveis com as idéias da

RSC e da sustentabilidade empresarial. Com isso, a Natura pôde reforçar sua

proposta de ética na comunicação com os clientes e desenvolver toda uma

série de ações promocionais apoiadas nos valores da empresa.

A missão, em parte por ter sido considerada uma iniciativa Pioneira, e

em parte por ter sido lançada em um momento crítico, permitiu que as crenças

da Natura fossem efetivamente aplicadas em várias áreas da empresa ao

longo dos anos. Essa medida gerou o que um entrevistado denominou de

“caldo cultural”, fator que possibilitou que a Natura conseguisse adequar seu

negócio às principais demandas da sustentabilidade nos negócios e da

Responsabilidade Social Corporativa. Quando se tem uma orientação central

formal que fomente iniciativas relacionadas à sustentabilidade, a empresa fica

mais susceptível a integrar suas iniciativas sócio-ambientais às atividades.

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144

Juntamente com a formalização da razão de ser, os líderes começaram

a participar de associações ligadas à promoção da cidadania empresarial. Essa

participação permitiu que a empresa influenciasse algumas das principais

organizações ligadas à RSC no país, como é o caso do PNBE e do Instituto

Ethos. Isso também fez com que a empresa se orientasse para a incorporação

de atitudes condizentes com a teoria atual sobre o tema RSC e

sustentabilidade. Adicionalmente, aumentou a predisposição da empresa a ter

esses valores inseridos. Essa atitude relacionada e sistemática pode ser

considerada a principal questão relacionada à RSC e à sustentabilidade no

âmbito da Natura.

• Métricas sócio-ambientais

Essa orientação fez com que a empresa desenvolvesse outras iniciativas

importante para a Dimensão da Inserção de Valores: metas para os

investimentos sócio-ambientais, metas ambientais para a empresa e o bônus

atrelado ao desempenho ambiental. Essas iniciativas relacionadas, adotadas

no início da primeira década do século, mostram não só o balanceamento entre

as perspectivas do TBP, mas também a inserção de valores relacionados. Essa

atitude é determinante para a sistematização de procedimentos ligados à RSC

em várias áreas operacionais da empresa. Dessa forma, ela também pode ser

considerada um exemplo de atitude incorporada ligada à vertente central da

terceira Dimensão.

Segue abaixo o Quadro 5.5 resumindo as atitudes e incitativas

incorporadas pela Natura e analisadas sob a perspectiva da Dimensão da

inserção de Valores.

Quadro 5.5 – Dimensão da Inserção de Valores: Análise das atitudes da Natura Atitude ou iniciativa incorporada Forma sistemática Sistêmica Vertente

Uso de Refis Não Sistemática Sistêmica Mista

Proposta de comunicação transparente Sistemática Sistêmica Central

Explicitação da Razão de Ser Sistemática Sistêmica Central

Métricas sócio-ambientais Sistemática Sistêmica Central

Fonte: Elaborado pelo autor

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145

Desta forma, quanto à dimensão da Inserção de Valores, a Natura pôde

ser considerada como estando posicionada na vertente ligada à abordagem

“B”. As atitudes e as principais iniciativas realizadas, exceto por uma, possuem

caráter de central. Além disso, é possível perceber que a empresa assumiu a

sustentabilidade em sua proposta de geração de valor, fato que atende o

requisito principal da vertente central da Dimensão. Isso demonstra que houve

esforços no sentido de fazer com que valores ligados a sustentabilidade

contribuíssem para fazer os negócios prosperarem.

• Boticário

Gráfico 5.6 – Boticário: Atitudes/Iniciativas pertinentes a Dimensão da Inserção de Valores

FBPN

Outros ISPs do Boticário(K&G)

Práticas de relacionamentocom o Cliente

Fonte: elaborado pelo Autor

• FBPN

O Boticário difere da Natura quanto ao posicionamento na Dimensão da

Inserção de Valores. A empresa optou de forma clara e deliberada por realizar

seu investimento social privado de forma desvinculada das atividades da

empresa. Na criação da FBPN, a empresa optou pelo mínimo de interferência

entre as duas organizações, acreditando ser vantajoso para ambas as partes

essa dissociação. A idéia era permitir que a gestão da Fundação tivesse

autonomia para cumprir o seu papel de preservação.

Além disso, a orientação era de que a iniciativa de preservação não

deveria ser uma manobra de promoção da marca. O Boticário foi eficiente

nesse aspecto, pois fora de Curitiba os clientes não reconheciam a empresa

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146

como apoiadora de causas ambientais. A marca também foi, aos poucos, tendo

sua imagem desligada da natureza. Arthur Grynbaun, diretor comercial na

época, e atual presidente, afirmou que a empresa era reconhecida pela

qualidade dos produtos, mas não era reconhecida pelo pioneirismo no apoio às

causas ambientais.

A iniciativa de criar uma fundação desligada para administrar os ISPs

certamente contribui para que a empresa se aproxime do pólo periférico da

Dimensão. Ela também não foi articulada como atividade comercial, não

trazendo benefícios para a imagem da empresa ou para a motivação dos

funcionários em torno da causa. Essa medida afasta das atividades centrais da

empresa a preocupação com aspectos sociais e ambientais. Assim, apesar da

autenticidade da FBPN, bem como de todo seu reconhecimento técnico e do

mérito ambiental do sonho do idealizador, ela foi uma iniciativa desligada da

empresa.

• Outros ISPs do Boticário (K&G)

Outro aspecto que também contribuiu para a associação da empresa à

vertente periférica foi a criação da K&G, empresa que realizava os ISPs com

recursos do Boticário. A exemplo da FBPN, a K&G também isolava os

investimentos sociais reduzindo a interferência dos mesmos nas atividades da

empresa e nas áreas operacionais. Essa organização reforçou a aproximação

do Boticário ao pólo “A” da Dimensão.

Não foi detectado na proposta da empresa, durante o período analisado,

dados que indiquem que o Boticário procurou sistematizar ações de RSC e

sustentabilidade junto com as operações da empresa. Ações como os bônus

atrelados à metas sociais, como os utilizados pela Natura, afastaram a

empresa da vertente periférica, pois sistematizam a incorporação nas

atividades de diferentes áreas e departamentos a aspectos relacionados à

sustentabilidade.

Também não foi detectado traço de uma cultura orientada para a

sustentabilidade empresarial que remetesse à vertente central. Enquanto a

Fundação tinha programas de trainees e jovens talentos para promover a

formação de lideranças ambientais, o Boticário não realizava as mesmas

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147

atividades. Assim, não havia no Boticário a proliferação de valores ligados à

abordagem “B”.

• Práticas de relacionamento com o Cliente

Diferentemente dos fatos acima analisados, a empresa se engajou em

projetos e programas relacionados à responsabilidade social e à

sustentabilidade que possuíam elo com as atividades da empresa. Os

programas de relacionamento com os clientes contribuíram para a

comercialização dos produtos, ao mesmo tempo em que monitoraram a

satisfação, e permitiram a troca de informação com esse stakeholder

importante. Cabe ressaltar que esse programa foi sedimentado nas raízes

comerciais da empresa que, ao longo de toda sua trajetória, sempre procurou

atender às expectativas dos clientes

Essa medida tem menos expressão do que o desligamento visivelmente

ocorrido no caso da FBPN e da criação da K&G, que marcam a análise desta

dimensão. Assim, o Boticário pode ser posicionado próximo à vertente

periférica nesta Dimensão. O quadro abaixo retrata essa maior proximidade

com a abordagem “A”.

Quadro 5.6 – Dimensão da Inserção de Valores: Análise das atitudes/iniciativas do Boticário

Atitude ou iniciativa incorporada Forma sistemática Sistêmica Vertente

FBPN Não se aplica Não sistêmica Periférica

Outros ISPs do Boticário (K&G) Não se aplica Não sistêmica Periférica

Práticas de relacionamento com o Cliente Sistemática Sistêmica Central

Fonte: Elaborado pelo autor

5.1.4 Associação geral

Abaixo, as atitudes e iniciativas em todas as dimensões são agrupadas

em um diagrama ilustrativo com o intuito de permitir um posicionamentos das

duas empresas analisadas quanto a aderência ao tipo “A” e ao tipo “B”.

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148

Quadro 5.8 – Resumo das iniciativas e atitudes ligadas à RSC na Natura Abordagem “B" Mista Abordagem “A"

Sitê

mic

ae

sist

emát

ica

Equ

ilíbr

io e

Con

d. a

o lu

cro

Mot

ivaç

ão e

Pio

neiri

smo

Inst

ituci

onal

ism

oIn

vest

imen

toIn

s. d

e V

alor

es

Uso de Refis

Política de ISPs

Proposta da Marca

Métricas sócio -ambientais

Política de ISPs

Comunicação Transparente

Condições mais atrativas para mulheres

Práticas de Governaça e novas práticas de RSC

Uso de Refis

Uso de Refis

Métricas sócio -ambientais

Comunicação Transparente

Razão de Ser

Razão de Ser

Vertente Central Vertente Períférica

Lucro-dependenteLucro-independente

Independente Dependente

Abordagem “B" Mista Abordagem “A"

Sitê

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Mot

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Pio

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Uso de Refis

Política de ISPs

Proposta da Marca

Métricas sócio -ambientais

Política de ISPs

Comunicação Transparente

Condições mais atrativas para mulheres

Práticas de Governaça e novas práticas de RSC

Uso de Refis

Uso de Refis

Métricas sócio -ambientais

Comunicação Transparente

Razão de Ser

Razão de Ser

Vertente Central Vertente Períférica

Lucro-dependenteLucro-independente

Independente Dependente

Quadro 5.8 – Resumo das iniciativas e atitudes ligadas à RSC no Boticário Abordagem "A" Mista Abordagem "B"

Inst

ituci

onal

ism

oIn

vest

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toIn

s. d

e V

alor

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átic

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ond.

ao

lucr

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rigêm

e O

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nalid

ade

Investimentos Sociais do Boticário ( K&G)

Fundação Boticário

Avaliação sócio-ambiental de fornecedores

Projeto Crescer

Vertente Central Vertente Períférica

Lucro-dependenteLucro-independente

Independente Dependente

Investimentos Sociais do Boticário ( K&G)

Práticas de relacioanmento com o cliente

Fundação Boticário

Práticas de relacioanmento com o cliente

Práticas de relacioanmento com o cliente

Como esperado, a incorporação de atitudes ou iniciativas ligadas à RSC

ocorreu relacionada a aspectos das duas abordagens. No entanto, foi possível

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149

perceber que a maioria das atitudes incorporadas analisadas remeteu às

vertentes da abordagem “B”. Isso mostra que ambas as empresas possuíram,

ao longo de sua trajetória, uma tendência em adotar medidas de RSC em

consonância com os valores de sustentabilidade e com foco na atuação na

atuação integrada de RSC.

Além disso, é possível afirmar que a Natura, pelo fato de possuir mais

atitudes ou iniciativas incorporadas de forma central, lucro-independente e

independente que o Boticário, está mais distante da abordagem “A” que seu

concorrente.

5.2 Relação entre os desafios do crescimento e os c omportamentos

ligados à RSC e a sustentabilidade

Nesta sessão do capítulo de análise são verificadas a existência de

potenciais relações entre a trajetória de crescimento das empresas e a forma

de atuarem no âmbito da sustentabilidade nos negócios. Como visto no

Capítulo de Método buscou-se examinar cada uma das relações propostas na

teoria presentes nos casos estudados.

• Empreendedorismo

No início da década atual, na Natura, houve sinais de respostas

positivas ao desafio Empreendedorismo, como a aquisição da Flora Medicinal e

o desenvolvimento da Linha Ekos. Essas iniciativas podem ser relacionadas à

incorporação de atitudes responsáveis. A aquisição e o desenvolvimento da

linha podem ser qualificados como expansão do tipo híbrida. Isso ocorre, por

que auxiliariam a ampliar os domínios da empresa ao mesmo tempo em que

permitia a empresa a explorar melhores os mercados e negócios existentes.

Na parte teórica do trabalho, que procurou relacionar as abordagens às

respostas a cada desafio, a expansão híbrida foi associada à abordagem “B”.

Isso foi justificado pelo fato de a abordagem contribuir para que os gestores

pensassem fora de suas zonas de conforto para prover soluções que vão ao

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150

encontro das necessidades da sociedade. Nesse contexto, o lançamento da

linha Ekos pode exemplificar essa relação. Como a linha Ekos estava ancorada

nos valores centrais da empresa e foi idealizada com seu conceito ligado a

sustentabilidade, pôde-se entender que a expansão realizada estava

relacionada com a abordagem “B”. A linha Ekos reforçou a proposta de valor da

empresa baseada na imagem responsável e se tornou a principal linha da

empresa. Além disso ela impulsionou as atuações internacionais da Natura.

Assim, no caso da Natura, pôde-se perceber uma correlação direta entre

a resposta mais adequada ao desafio e a inserção de valores sustentáveis na

organização. A atitude ligada a esse fato se iniciou em 1992, quando a

empresa assumiu formalmente uma proposta de valor relacionada à ética. Essa

atitude foi analisada sob a luz das três dimensões, e, nas três ocasiões, foi

relacionada integralmente com a Abordagem “B”.

Não houve atitudes percebidas na trajetória das empresas que

remeteram as relações possíveis relações propostas entre a Abordagem “A” e

o primeiro desafio.

• Navegação em um Ambiente Dinâmico

Nos anos entre 1997 e 1999, a Natura começou a participar ativamente

da formação de conhecimento em RSC. Ela contribuiu para a fundação do

Instituto Ethos em 1998 e foi a primeira empresa nacional a reportar para o

GRI, influenciando as posteriormente outras empresas interessadas. Nesse

contexto, é possível afirmar que a empresa estava entre as pioneiras na

criação de políticas de RSC que seriam seguidas por outras empresas. Isso,

por ser condizente com a proposta de valor da Natura, foi importante para que

a Natura fosse reconhecida por vários stakeholders como modelo de RSC.

Participando da criação do principal agente desenvolvedor de políticas

ligadas à RSC, a Natura também contribuiu para responder adequadamente o

segundo desafio proposto por Fleck (2006). Com isso, a Natura assumiu o

controle das diretrizes que moldariam a forma das empresas atuar em RSC.

Esse fato permitiu que ela se antecipasse às tendências e ganhasse maior

reconhecimento. Essa postura adotada tem ligação com as respostas

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151

estratégicas às pressões institucionais denominada de Manipular por Oliver

(1991).

Assim, a pioneirismo e a motivação intrínseca dessa atitude adotada

estimulou e possibilitou a moldagem do ambiente. Além disso, a Natura

garantiu legitimidade a sua proposta de valor. Como a incorporação dos

princípios éticos e responsáveis foi realizada de forma sistêmica dentro da

empresa, as ações sociais da Natura conseguiram agregar valor ao produto da

empresa.

Na análise do Boticário foi visto que não houve relação entre a

motivação intrínseca de uma iniciativa e a utilização das estratégias propostas

por Oliver (1991) de Manipular ou Desafiar. A iniciativa de criar a FBPN que

possuía, além de ser uma iniciativa pioneira, a característica de ser motivada

intrinsecamente, não estimulou nenhuma resposta . Esperava-se que uma

atitude ou iniciativa que fosse incorporada com essas características

estimulasse a utilização de respostas estratégicas como a de manipular o

ambiente.

• Gerenciamento da Diversidade

A incorporação de valores éticos pela Natura e a especificação da

Razão de Ser baseada em uma proposta responsável contribuíram para que a

empresa melhorasse sua resposta ao terceiro desafio do Crescimento. Essa

atitude Pioneira e sistêmica promoveu a integração da empresa, orientando a

unificação das empresas do grupo e promovendo uma base conceitual para

geração de Produtos. Na época em que a natura lançou o conceito “Bem Estar

e Estar Bem” ela conseguiu aumentar em 60% no número de produtos

comercilaizados.

Essa capacidade, essencial na competição entre as empresas do setor

de cosméticos, está relacionada ao desafio do Gerenciamento da Diversidade ,

porque a Natura pôde utilizar os conceitos de transparência, da ética e das

relações interpessoais para impulsionar a criação de produtos. Assim, o

mesmo valor que ajudou na integração do corpo da corporação e promoveu a

ética nos negócios da empresa permitiu que ela se diferenciasse das

concorrentes.

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152

Além disso, a autenticidade da empresa, tanto no conceito criado,

quanto na utilização de seus valores para o desenvolvimento de produtos,

colaborou para que a Natura conseguisse explorar a vantagem de ter sua

imagem associada a questões ligadas à RSC. Essa capacidade de explorar a

responsabilidade social como conteúdo para gerar novos produtos é um

recurso socialmente complexo na Natura. Os próprios dirigentes chegaram a

firmar em seus discursos que a inovação seria secundário na geração de novos

produtos, sendo que, o conceito presente nos itens e os valores promovidos

pela empresa seriam a principal forma de diferenciação.

Dessa forma, a integridade, tanto no sentido de ética como no sentido de

well-being do corpo da corporação foi influenciada positivamente na medida

que a empresa atua de acordo com as vertentes da abordagem “B”. Essa

integridade influenciou a geração de recursos socialmente complexos e

duradouros que por sua vez fazem parte do âmbito do quarto desafio ao

crescimento saudável.

No Boticário, a incorporação do relacionamento forte com os clientes

contribuiu para que a empresa gerasse recursos capazes de gerar vantagem

competitiva. A aproximação da empresa a esse importante stakeholder permitiu

que ela gerasse novas linhas de produtos, fidelizasse clientes e explorasse nos

segmentos. Essa orientação contribuiu para a integração da empresa quando o

Boticário, com o intuito melhorar a confiabilidade de seus pontos de venda

padronizou todas as lojas e excluiu o Máster Franqueado de sua cadeia de

distribuição. Essa medida possibilitou um controle maior dos hábitos dos

clientes e uma estruturação unificada do posicionamento no ponto de venda da

empresa.

• Provisão de Recursos Humanos

Não foi possível analisar nenhuma iniciativa relacionada à RSC que

estimulasse a atração ou a retenção de pessoas nas duas empresas. Duas

entrevistadas da Natura, que tinham pouco tempo de casa, ressaltaram que a

imagem responsável da empresa foi um fator de atratividade. É possível se

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153

especular que isso tenha tido relação com o fato da Natura ter boas condições

de trabalho para as mulheres, mas não houve indícios fortes dessa relação.

Apesar de não ter sido possível examinar a relação entre os aspectos das

abordagens e a atração de recursos humanos nas empresas, na Natura, os

valores éticos inerentes à identidade da empresa serviram para orientar o

corpo gerencial. Após unificação das empresas do Grupo Natura, em 1990,

vários gestores foram trazidos de outras empresas para assumirem cargos

importantes na Natura. Esses gestores, acostumados a diferentes culturas

organizacionais, somente se alinharam após o desenvolvimento de uma razão

de ser e de valores comuns formalizados.

Mais uma vez, essa iniciativa, que foi enquadrada perfeitamente na

Abordagem “B”, contribuiu para uma resposta adequada. Isso vai ao encontro

da afirmação de que políticas consistentes favorecem a unidade administrativa

da firma, possibilitando que julgamentos adequados possam ser efetuados por

um grande número de pessoas dentro da firma (PENROSE 2006; P. 53). Esse

contexto contribui para que rapidamente os gestores passassem a ter uma

orientação comum acelerando o processo de geração de uma experiência

compartilhada.

• Gerenciamento da Complexidade

A adoção de práticas formais de relacionamento com seus clientes a

partir de 1989 pelo Boticário teve relação com o desafio do gerenciamento da

Complexidade. Isso ocorre, por que a empresa, devido a essa forte

preocupação com esse Stakeholder passou a sistematizar o monitoramento de

seus clientes, que antes era feito de maneira informal e não sistemática. Dessa

forma, o Boticário se tornou menos imediatista na relação com seus clientes.

A organização foi aumentando de tamanho, e, a medida que aumentou

complexidade na tomada de decisão, o Boticário promoveu uma solução ligada

à RSC. A empresa contrariou a tendência apontada por Pascale, Millemann e

Gioja (2000) de simplificar e utilizar comportamentos ultrapassados quando

formalizou e estruturou a forma de relacionar com seus clientes num âmbito

nacional. Essa atitude foi condizente com uma resposta sistemática ao desafio

Clompexity Management.

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154

A mesma atitude, percebida pela ótica das abordagens de RSC

trabalhadas, foi qualificada como “B”, pois ela ampliou o entendimento da

organização como sendo parte de um sistema maior ao trazer a rede de

clientes para “dentro” da empresa. Vale lembrar que o Boticário foi, de certa

forma, pioneiro e proativo nessa forma de atuação. Essa atitude sistêmica

contribuiu para que empresa se afastasse da vertente reativa de e da vertente

periférica da RSC do tipo “A”.

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155

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

6.1 Conclusões

6.1.1 O modelo das abordagens “A” e “B”

O presente trabalho visou contribuir para o entendimento da RSC

desenvolvendo duas abordagens sobre o tema. Diferentemente de outras

pesquisas, que tinham como principal objetivo qualificar a responsabilidade

social das empresas por meio das ações adotadas, desenvolveu-se nesta

pesquisa uma ferramenta para permitir que as organizações fossem avaliadas

pela maneira com a qual os comportamentos relacionados à RSC são

incorporados pelas empresas. Para isso, efetuou-se uma análise

contextualizada dessas atitudes.

Esse tipo de análise permite entender o engajamento de uma empresa

no tange à RSC, bem como o impacto desse engajamento na trajetória da

empresa. Foi possível perceber, nos casos analisados, que iniciativas sociais

ou ambientais Pioneiras estavam relacionados com aspectos relevantes da

forma de atuação das empresas. Quando essas ações sócio-ambientais eram

incorporadas por pressões externas, elas perdiam parte do poder de mobilizar

a organização e possuíam menos impacto na trajetória da empresa.

Nesse contexto, a dimensão da institucionalização se mostrou adequada

para entender a origem e a originalidade das atitudes e iniciativas adotadas

pela empresa. A análise das pressões que levariam a empresa a incorporar

certo comportamento contribuiu para distinguir o grau de autenticidade de certa

atitude.

Na Dimensão do Investimento, houve uma dificuldade grande de

determinar se a incorporação de uma atitude foi adotada para gerar folga

financeira. Apesar desta ter sido a dimensão mais complexa da análise ela não

pode ser descartada. Isso ocorre, pela importância atribuída por teóricos do

tema ao balanceamento dos objetivos de uma empresa quando se analisa a

postura da mesma em relação à sustentabilidade nos negócios. Contudo, os

aspectos de análises dessa dimensão precisam ser mais bem explorados.

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156

A última dimensão, que lidava com inserção dos valores ligados à

sustentabilidade na empresa foi a dimensão que mais se beneficiou do tipo de

análise realizada nesta pesquisa. Isso ocorreu, pois a análise longitudinal

permitiu analisar a sistematização, ao longo do tempo de todas as práticas

relacionadas à RSC. Com ela foi possível diferenciar a postura das duas

empresas analisadas de forma clara. Enquanto a Natura inseria cada vez mais

os valores ligados às práticas recomendáveis de sustentabilidade, o Boticário

continuava com práticas periféricas que não eram incorporadas nas operações

da empresa.

Essa dimensão de análise se sobressaiu diante das duas outras.

Aparentemente, o fato de uma atitude ligada à RSC estar relacionada à

atividade da empresa é mais importante do que o fato da empresa possuir

atitudes incorporadas de modo independente. Isso ocorre, por que esta

dimensão se ocupava exclusivamente da qualificação do processo de

incorporação das atitudes .

De uma forma geral, as três dimensões, embora não forneçam

indicadores objetivos, contribuíram para entender as atitudes incorporadas

pelas empresas. Modelos de análise com o foco nos processos de

incorporação são uma alternativa interessante para distinguir a postura sócio-

responsável de uma empresa. Quando se parte da premissa que o mundo dos

negócios está se modificando e fazendo com que empresas adotem modelos

sustentáveis de gestão, o desenvolvimento de ferramentas mais profundas de

análise das questões ligadas à RSC deve ser trabalhado.

6.1.2 A relação entre o crescimento saudável e as A bordagens

Poucas das relações sugeridas entre as respostas aos desafios do

crescimento e a incorporação de atitudes ligadas à RSC e à sustentabilidade

puderam ser observadas ao longo da trajetória das empresas analisadas. É

importante deixar claro que se adotou uma postura conservadora na busca por

relações, na qual apenas as mais evidentes foram consideradas subsídios de

análises. Além disso, procurou-se se ater estritamente às relações

mencionadas na parte teórica do trabalho, objetivando, apenas, explorar idéias

existentes na literatura.

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157

As análises realizadas, mostraram que as repostas adequadas ao

desafios de crescimento foram relacionadas a aspectos de RSC ligados à

abordagem “B”. Contudo, não foi possível estabelecer uma relação de causa e

efeito direta.

Apesar da impossibilidade de se estabelecer uma relação causal, a

análise empírica mostra que o modelo de crescimento utilizado (Fleck, 2006)

considera intrinsecamente questões importantes que também podem ser

atribuídas a uma atitude sustentável nos negócios. Por exemplo, quando as

empresas, sistematizam o aprendizado respondendo de forma mais adequada

ao desafio Gerenciamento da Complexidade, elas também favorecem para que

boas práticas de sustentabilidade sejam incorporadas de maneira adequada.

Dessa forma, a incorporação de práticas desejáveis de gestão, sejam elas no

âmbito da RSC ou não, é facilitada por um padrão de resposta adequada à

esse desafio. Outro exemplo pôde ser visto no âmbito do desafio Navegação

em um Ambiente Dinânico. A Natura, somente conseguiu ser reconhecida

como pioneira brasileira o que tange as práticas de sustentabilidade por que

respondeu adequadamente ao segundo desafio.

Mesmo sendo menos evidente, pôde-se perceber uma relação onde às

práticas incorporadas de forma “B” contribuíram para a resposta adequada aos

desafios. Como destacado na parte teórica, uma empresa poderia se beneficiar

de um elo forte estabelecido pela adesão à práticas sustentáveis inseridas na

organização de forma autêntica, e a partir disso, melhorar a sua resposta ao

desafio da Gerenciamento da Diversidade. Na Natura, quando a empresa

passou a considerar, no início da década de 90, seus valores e sua ética como

um ativo importante da empresa, ela conseguiu integrar o seu processo de

crescimento. Ela conseguiu insumo conceitual para criação de produtos e um

meio para se promover no mercado de forma diferenciada. Nesse aspecto,

tanto a inserção de valores na empresa quando o grau de pioneirismo

favoreceram a superação do terceiro desafio.

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158

6.2 Sugestão para pesquisas futuras

A grande expectativa do presente do presente trabalho foi contribuir para

entendimento da incorporação de práticas relacionadas responsabilidade social

corporativa e a sustentabilidade nos negócios e seus impactos no desempenho

geral de uma empresa. Espera-se que esta pesquisa, estimule a busca por

ferramentas que possibilitem que a RSC seja analisada de maneira

longitudinal. É importante se preocupar com o conflito entre métodos mais fiéis

aos dados, que proporcionam maior precisão, e métodos mais reducionistas,

que permitem uma objetividade maior no entendimento (Langey, 1993; p. 696).

Talvez, em um primeiro momento, técnicas mais fidedignas aos dados devam

ser utilizadas para que se desenvolvam modelos de análises como o das

dimensões “B” e “A”. Em um segundo momento, técnicas mais reducionistas

devam ser utilizadas para que os aspectos estudados sejam mais facilmente

identificados e interpretados.

Ressalta-se também a necessidade do aprimoramento das dimensões

de análises aqui exploradas. Acredita-se que para mensuração da efetividade

da RSC o Bem Estar causado pela empresa em todos os stakeholders também

deva ser percebidos de maneira longitudinal.

Por último, apesar da dificuldade, recomenda-se que modelos de

mensuração do desempenho de uma organização sejam associados à

qualificação de uma empresa quanto à forma de atuação no âmbito da RSC.

Apesar da complexidade inerente em mensurar o desempenho com o foco no

longo prazo, a RSC deve sempre ser relacionada a esse tipo de métrica.

Quando uma temática aborda o relacionamento das empresas com os seus

múltiplos stakeholders e considera o desenvolvimento sustentável como um

objetivo importante para as organizações, medidas que considerem apenas um

momento no tempo são menos válidas que medidas que incorporem a

capacidade de perpetuação de uma firma.

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159

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167

ANEXOS

ANEXO A – Estruturas societárias da Natura

Quadro 1 – Estrutura societária da Natura antes da reestruturação (2002)

Natura

Participações

(Brasil)

Natura Empreendimentos

(Brasil)

NATURA

COSMÉTICOS

(Brasil)

Natura

Inovação

(Brasil)

Natura

Cosméticos S.A.

(Argentina)

Natura

Cosméticos S.A.

(Peru)

Natura

Cosméticos S.A.

(Chile)

Natura Brasil

Cosmética Ltda.

(em liquidação)

(Portugal)

Natura

Cosméticos

S.R.L.

(em liquidação)

(Venezuela)

Natura de

Colômbia Ltda.

(em liquidação)

(Colômbia)

Commodities

Trading S.A.

(em liquidação)

(Uruguai)

Natura Indústria

(Brasil)

Nova Flora

(Brasil)

Natura

Cosméticos S.A.

(México)

Natura

Cosméticos de

México S.A.

(em liquidação)

Natura Logística

(Brasil)

Flora Medicinal

(Brasil)

Natura

Cosméticos y

Servicios S.A.

(México)

Natura

Cosméticos y

Servicios de

México S.A.

(em liquidação)

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Quadro 2 – Estrutura societária da Natura após a reestruturação (2004)

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169

ANEXO B – Análise das Curvas de Crescimento

A análise da trajetória de crescimento por meio do indicador de tamanho

proposto por Fleck (1999) auxiliará na identificação das relações ente o modelo

das abordagens e os desafios do Crescimento. Com as curvas de crescimento

relativo traçadas, será mais fácil identificar relações entre as atitudes

incorporadas, as respostas aos desafios, e possíveis períodos nos quais houve

um aumento de tamanho.

A primeira parte análise utiliza os gráficos de crescimento para perceber

algumas relações entre a incorporação das atitudes ligadas a RSC e a

sustentabilidade e a trajetória de crescimento. Os gráficos de crescimentos,

estabelecidos na Equação 3.1, são apresentados a seguir. É importante

destacar que os gráficos são um indicador do tamanho relativo de uma

empresa na economia (Fleck, 2001; p. 7) e, apesar da Natura e o Boticário

estarem competindo no mesmo ambiente, a primeira é bem maior, em termos

de faturamento, que a segunda.

Gráfico 5.7 – Natura: Vendas/PIB

1969

1970

1971

1972

1973

1974

1975

1976

1977

1978

1979

1980

19811982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

19941995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

Vendas Natura/PIB

Fonte: Elaborado pelo autor

A taxa de crescimento em ano, dada pela inclinação da curva mostra

claramente 1999 como o ano em que se percebeu a maior alta no faturamento

em comparação com o PIB. No caso do Boticário a curva é mais moderada,

não havendo um ano de destaque considerando esse indicador quantitativo.

Page 170: CRESCIMENTO SAUDÁVEL E SUSTENTABILIDADE: UMA … · 3 FICHA CATALOGRÁFICA Ferreira, Luiz Gustavo Gonçalves Bretas Crescimento saudável e sustentabilidade: Uma análise longitudinal

170

Gráfico 5.8 – Boticário: Vendas/PIB

Fonte:Elaborado pelo autor

A curva mostra um crescimento praticamente constante. Essa

característica é observada é coerente com a ambição do fundador da empresa,

que controlava a todo instante o crescimento das franquias e os níveis de

endividamento da empresa.

Como o parâmetro de tamanho da Natura no final da trajetória analisada

estava em torno de 0,3 e o do Boticário não chegou a ultrapassar a marca dos

0,03 a comparação do taxa relativa de crescimento das empresas não pode ser

visualizada conjuntamente em apenas um eixo. Para tal, foi construído um

gráfico no qual um eixo das ordenadas foi utilizado para cada uma das duas

empresas.

Gráfico 5.9 – Natura x Boticário: Vendas/PIB

1969

1970

1971

1972

1973

1974

1975

1976

1977

1978

1979

1980

1981

1982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

Fat

uram

ento

/ P

ib (

Bot

icár

io)

Vendas Natura/PIB 0% 0% 0% 0% Vendas Boticário/PIB

Fonte:Elaborado pelo autor

A diferença das duas empresas não pode ser explicada apenas pela

diferença de idade. A Natura cresceu mais rapidamente que o Boticário. Isso é

1977

1978

1979

1980

1981

1982

1983

1984

1985

1986

1987

1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

Vendas Boticário/PIB

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171

o primeiro indício que a Natura foi mais ambiciosa que o Boticário. A

sobreposição das curvas não indicou nenhum sinal claro de semelhança na

variação da taxa de crescimento.

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172

ANEXO C - Escolha das firmas estudadas

A escolha das empresas que seriam estudadas na pesquisa foi um

processo complexo. Para serem selecionadas para estudos, as empresas

deveriam atender a vários pré-requisitos que determinariam não só a qualidade

como a viabilidade da pesquisa proposta. Foram três as condições principais

que as empresas atendidas deveriam atender para viabilizar o estudo.

Como o trabalho busca entender como se deu a incorporação de

aspectos relacionados à RSC e à sustentabilidade ao longo do tempo, como o

engajamento em relações transparentes com stakeholders e a metrificação do

desempenho social e ambiental, era necessário que as empresas escolhidas

fossem reconhecidas por suas iniciativas ligadas ao tema. Além disso, era

importante que essas atitudes ou iniciativas fossem manifestadas há algum

tempo. Esse aspecto permitiria associá-las aos desafios do crescimento, bem

como viabilizariam um melhor acompanhamento da evolução dessas atitudes

ao longo do tempo. Essa restrição ocorreu para tentar garantir evidências

suficientes, fator que, de acordo com Yin (1989; p.149), contribui para validar o

estudo de caso proposto.

Também era necessário que as empresas escolhidas estivessem no

mesmo contexto competitivo para que fossem afetadas pelas mesmas

regulamentações e impactos externos. Isso viabilizaria algumas comparações

importantes na qualificação das organizações nas duas abordagens, sobretudo

quanto à autenticidade das iniciativas sociais de cada uma delas. Como o

discurso e comunicação possuem relação forte com a RSC, esse atributo

também propiciaria a identificação de aspectos comuns nos discursos das

empresas, bem como a utilização indevida de estratégias de promoção

baseadas em falsos méritos.

Quanto a esse quesito, é importante destacar que os casos não foram

escolhidos por se tratarem de casos que elucidam o que Yin (1989; p. 147)

chama de proposições rivais. Isso significa que não se espera a priori que cada

uma das empresas se enquadrem exatamente em algum tipo de RSC ou como

estando mais próxima de alguns dos pólos desenvolvido por Fleck (2006). Por

mais que essa constatação fosse possível, essa não foi uma premissa para

escolha dos casos.

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No intuito de possibilitar um levantamento de eventos que remetessem

à respostas dos desafios do crescimento saudável, seria necessário empresas

com certa idade. Isso também permitira que as empresas fossem analisadas

antes da atual onda de preocupação com a sociedade e o meio ambiente, que

fez com várias empresas voltassem esforços para essas áreas. Considerou-se

que, após 1998, muitas empresas foram influenciadas, por pressões externas,

a investir de alguma maneira em responsabilidade social e em

sustentabilidade.

Assim, após a consideração dessas restrições, foram eleitas para estudo

a Natura e o Boticário. A primeira, fundada em 1969, foi considerada empresa

modelo de responsabilidade social por várias instituições, a segunda, de 30

anos de idade, foi pioneira na preservação ambiental. Apesar da Natura ser

mais antiga e duas vezes maior em termos de faturamento anual que o

Boticário, ambas são do setor de perfumaria e cosméticos e competem em

alguns segmentos. Além desse par, outros pares foram considerados para

compor os casos estudas na pesquisa no setor de papel e celulose e serviços

financeiros.