Corporativismo Cego Ou Direto de Defesa_ - Migalhas de Peso

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 Sugerir que receber honorários que vieram de supostos delitos seja lavar dinheiro é perverso. O advogado não oculta valores para reinseri-los na economia De tempos em tempos, a advocacia é questionada. De fato, ela parece ser um certo incômodo, tanto em ditaduras como em regimes democráticos. Questionar o Estado, a defesa da legalidade, os direitos dos acusados e um devido processo legal podem ser vistos, em um ou outro cenário, como entraves ao conhecido  jargão "fazer Justiça".  A colocação mais perversa - não só posta no Brasil, é verdade - diz respeito à tentativa de criminaliza r a própria conduta do advogado no simples ato de recebimento de honorários. E isso sob a pecha de lavagem de dinheiro. É lançada a ideia da possibilidade de advogados constituídos serem acusados pela prática de lavagem quando do recebimento de valores -a título de honorários- provenientes de supostas condutas delitivas. Em suma, cuida-se dos denominados honorários maculados, como proposto no artigo "Colarinho branco: o mistério dos honorários", publicado pelo juiz federal Valmir Costa Magalhães. A realidade estrangeira já conheceu, recentemente, punições a advogados sob semelhante acusação. Mas ela é falha em seu substrato, e não por mero corporativismo cego.  A perseguição aos ativos ilícitos por meio de lavagem tem como finalidade primordial impedir que os recursos provenientes de delitos sejam ocultados ou dissimulados, de tal sorte a reingressarem na economia regular, beneficiando os infratores. Dito de outro modo, com a perseguição aos proveitos do crime se consegue, como via de consequência, dificultar ou obstaculizar a própria prática delitiva.  A conduta de lavagem, portanto, não se confunde com o mero recebimento de bens ou valores que porventura tenham sido produto de crimes, mas se constitui na ocultação de tais montantes, na sua dissimulação mediante uma série de transações que vislumbrem encobrir as máculas da ilicitude e, por fim, na sua reinserção na economia regular. No caso de honorários advocatícios, existe simplesmente um pagamento por prestação de serviços profissionais obviamente lícitos. O advogado, assim como o médico ou o lojista que realiza uma venda, não está ocultando ou dissimilando valores com a intenção de reinseri-los na economia. No caso, o advogado simplesmente recebe a contrapartida de seu ofício, assegurando o sagrado direito de defesa. O pagamento ao advogado não traz ao cliente nenhum benefício em termos de lavagem de dinheiro.  Ao contrário, é um ônus com o qual necessita arcar.  A não criminaliza ção do advogado, portanto, não deriva, como parece a alguns, simplesmente do sigilo  juridicament e garantido na sua relação com o cliente. Provém, mais do que isso, do direito do cidadão em constituir livremente sua defesa. O exercício da advocacia e suas imunidades não se destinam a este ou aquele profissional do direito, mas à garantia do Estado de Direito, o qual somente se aperfeiçoa -nas lições do próprio direito norte-americano- com a atuação do advogado independente como guardião da liberdade. Sob nenhum ponto de vista, a limitação desse direito parece aceitável, nem mesmo ao se buscar o escopo da lei. A sua leitura deve, portanto, ir além do meramente colocado, pois isso tendencialmente gera mais injustiça do que qualquer outra coisa. Corporativismo cego ou direto de defesa? Renato de Mello Jorge Silveira e Alamiro Velludo Salvador Netto De tempos em tempos, a advocacia é questionada. A colocação mais perversa é a tentativa de criminalizar o recebimento de honorários. quinta-feira, 30 de agosto de 2012 Segunda-feira, 29 de junho de 2015 CADASTRE-SE  FALE CONOSCO

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Sugerir que receber honoraacuterios que vieram de supostos delitos seja lavar dinheiro eacute perverso O advogado natildeooculta valores para reinseri-los na economia

De tempos em tempos a advocacia eacute questionada De fato ela parece ser um certo incocircmodo tanto emditaduras como em regimes democraacuteticos Questionar o Estado a defesa da legalidade os direitos dosacusados e um devido processo legal podem ser vistos em um ou outro cenaacuterio como entraves ao conhecido

jargatildeo fazer Justiccedila

A colocaccedilatildeo mais perversa - natildeo soacute posta no Brasil eacute verdade - diz respeito agrave tentativa de criminalizar aproacutepria conduta do advogado no simples ato de recebimento de honoraacuterios E isso sob a pecha de lavagem dedinheiro

Eacute lanccedilada a ideia da possibilidade de advogados constituiacutedos serem acusados pela praacutetica de lavagemquando do recebimento de valores -a tiacutetulo de honoraacuterios- provenientes de supostas condutas delitivas Emsuma cuida-se dos denominados honoraacuterios maculados como proposto no artigo Colarinho branco omisteacuterio dos honoraacuterios publicado pelo juiz federal Valmir Costa Magalhatildees A realidade estrangeira jaacuteconheceu recentemente puniccedilotildees a advogados sob semelhante acusaccedilatildeo Mas ela eacute falha em seu substratoe natildeo por mero corporativismo cego

A perseguiccedilatildeo aos ativos iliacutecitos por meio de lavagem tem como finalidade primordial impedir que os recursosprovenientes de delitos sejam ocultados ou dissimulados de tal sorte a reingressarem na economia regularbeneficiando os infratores

Dito de outro modo com a perseguiccedilatildeo aos proveitos do crime se consegue como via de consequecircnciadificultar ou obstaculizar a proacutepria praacutetica delitiva

A conduta de lavagem portanto natildeo se confunde com o mero recebimento de bens ou valores que porventuratenham sido produto de crimes mas se constitui na ocultaccedilatildeo de tais montantes na sua dissimulaccedilatildeomediante uma seacuterie de transaccedilotildees que vislumbrem encobrir as maacuteculas da ilicitude e por fim na suareinserccedilatildeo na economia regular

No caso de honoraacuterios advocatiacutecios existe simplesmente um pagamento por prestaccedilatildeo de serviccedilosprofissionais obviamente liacutecitos O advogado assim como o meacutedico ou o lojista que realiza uma venda natildeoestaacute ocultando ou dissimilando valores com a intenccedilatildeo de reinseri-los na economia

No caso o advogado simplesmente recebe a contrapartida de seu ofiacutecio assegurando o sagrado direito dedefesa O pagamento ao advogado natildeo traz ao cliente nenhum benefiacutecio em termos de lavagem de dinheiro

Ao contraacuterio eacute um ocircnus com o qual necessita arcar

A natildeo criminalizaccedilatildeo do advogado portanto natildeo deriva como parece a alguns simplesmente do sigilo juridicamente garantido na sua relaccedilatildeo com o cliente Proveacutem mais do que isso do direito do cidadatildeo emconstituir livremente sua defesa

O exerciacutecio da advocacia e suas imunidades natildeo se destinam a este ou aquele profissional do direito mas agravegarantia do Estado de Direito o qual somente se aperfeiccediloa -nas liccedilotildees do proacuteprio direito norte-americano-com a atuaccedilatildeo do advogado independente como guardiatildeo da liberdade

Sob nenhum ponto de vista a limitaccedilatildeo desse direito parece aceitaacutevel nem mesmo ao se buscar o escopo dalei A sua leitura deve portanto ir aleacutem do meramente colocado pois isso tendencialmente gera mais injusticcedilado que qualquer outra coisa

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Renato de Mello Jorge Silveira eacute professor titular da Faculdade de Direito da USP e presidente da

Comissatildeo de Direito Penal do IASP - Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo

Alamiro Velludo Salvador Netto eacute professor doutor da Faculdade de Direito da Universidade de Satildeo Paulo emembro da Comissatildeo de Direito Penal do IASP - Instituto dos Advogados de Satildeo Paulo

Corporativismo cego ou direto de defesa

Renato de Mello Jorge Silveira e Alamiro Velludo Salvador Netto

De tempos em tempos a advocacia eacute questionada A colocaccedilatildeo mais perversa eacute a tentativa de criminalizar o recebimento dehonoraacuterios

quinta-feira 30 de agosto de 2012

Segunda-feira 29 de junho de 2015

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