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1 CONTRIBUIÇÕES REFERENTES À AUDIÊNCIA PÚBLICA Nº 083/2015 NOME DA INSTITUIÇÃO: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE GRANDES CONSUMIDORES INDUSTRIAIS DE ENERGIA E DE CONSUMIDORES LIVRES ABRACE AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA ANEEL ATO REGULATÓRIO: Audiência Pública n.º 083/2015 OBJETO: Obter subsídios para a definição das quotas anuais da Conta de Desenvolvimento Energético - CDE para 2016.

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CONTRIBUIÇÕES REFERENTES À AUDIÊNCIA PÚBLICA Nº 083/2015

NOME DA INSTITUIÇÃO: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE GRANDES

CONSUMIDORES INDUSTRIAIS DE ENERGIA E DE CONSUMIDORES LIVRES

ABRACE

AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL

ATO REGULATÓRIO: Audiência Pública n.º 083/2015

OBJETO: Obter subsídios para a definição das quotas anuais da Conta de Desenvolvimento Energético - CDE para 2016.

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Sumário

1. Considerações iniciais ............................................................................... 3

2. Observância da decisão liminar obtida pela Abrace .................................. 5

3. Contribuições formuladas pela Abrace na AP n. 03/2015 ......................... 6

4. Critério de rateio das despesas da CDE ................................................... 9

5. Operacionalização da liminar obtida pela Abrace ................................... 10

6. Cumprimento da liminar obtida pela Abrace............................................ 11

7. Gestão da CDE pela Aneel ..................................................................... 12

8. Itens de Despesa da CDE ....................................................................... 14

8.1 Conta de Consumo de Combustíveis - CCC .................................... 16

8.2 Descontos Tarifários ......................................................................... 45

8.3 Programa Luz para Todos – PLpT .................................................... 50

8.4 Baixa Renda ..................................................................................... 53

8.5 Indenização de Concessões ............................................................. 55

8.6 Subvenção Redução Tarifária Equilibrada ........................................ 61

8.7 Carvão Mineral ................................................................................. 64

8.8 Financiamentos concedidos – RGR ................................................. 65

8.9 “Formação de uma reserva na CDE” ................................................ 68

9. Itens de Receita da CDE ......................................................................... 70

9.1 Cota CDE - Energia .......................................................................... 70

10. Resumo das propostas da Abrace ....................................................... 71

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1. Considerações iniciais

A Abrace, associação setorial que representa os grandes

consumidores industriais de energia, apresenta a seguir suas considerações sobre a

definição das quotas anuais da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para o

exercício de 2016. Inicialmente, é importante destacar o contexto geral em que a

proposta para a CDE neste novo ciclo está sendo divulgada, ressaltando que os

custos com suprimento de energia e, particularmente, com os encargos setoriais,

atingiram patamares insuportáveis para diversos segmentos da indústria brasileira e

estão promovendo a perda de competitividade, produção, investimentos e

empregos, como bem comprovado no estudo da Ex-Ante Consultoria, encaminhado

para conhecimento da Agência.

Entre as diversas análises detalhadas no referido estudo, é

importante chamar a atenção dos reguladores para o comparativo histórico do custo

da energia por unidade da produção nacional, que teria crescido 705% em 15 anos,

ao mesmo tempo em que a inflação acumulada no período foi de 162%. Este

resultado impressionante soma dois fenômenos opostos: o ganho de produtividade

da indústria submetida à competição internacional e o aumento real de custos do

setor regulado e protegido da energia. Na prática, o aumento de custo por unidade

produzida em montante superior ao do nível geral de preços da economia é um dos

fatores que vem provocando a redução da margem das empresas e, consequente,

da capacidade de investimento na produção.

Como ilustração do ponto extremo a que chegou este processo, é

importante lembrar os casos já explorados em reuniões com o Ministério de Minas e

Energia (MME) e Agência, nos quais se destacou, a partir de informações públicas e

verificáveis, que apenas o pagamento do encargo CDE de 2015 poderia superar em

200% o resultado financeiro do ano imediatamente anterior de algumas empresas.

Assim, o custo com a energia elétrica e a incerteza a ele associada

são fatores que contribuíram para que a participação da indústria brasileira na

economia nacional - sobretudo aquela intensiva em energia, que é, também, a que

oferece maior contribuição aos investimentos e ao PIB - tenha regredido aos níveis

da década de 1940. E é importante destacar que tem se agravado o fato de que a

indústria, particularmente a grande indústria, base das cadeias produtivas,

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consumidora na alta tensão e no mercado livre, está se tornado crescentemente

subsidiadora do sistema através de diversos mecanismos que têm tido inclusive sua

legalidade questionada pela Abrace, conforme detalhado nas sessões que seguem.

Assim é imperativo que a Aneel assegure que cada item de despesa

da CDE esteja devida e transparentemente justificado, tenha cobertura legal, sua

eficiência seja atestada e tenha sido fiscalizado, independentemente da destinação,

por mais meritória que ela possa ser, seja a agentes do setor, outros consumidores

ou programas de governo.

A CDE, com despesas estimadas em R$ 18 bilhões para 2016,

movimenta recursos que superam a receita de fornecimento de qualquer

distribuidora do País. Tal qual uma empresa, fundo privado ou público, ou instituição

que movimenta recursos dessa monta, é necessário que sua gestão e fiscalização

se deem de forma mais organizada, que seja dada publicidade e clareza sobre todas

as informações àqueles que arcam com as despesas e que seja atribuída

responsabilização àqueles que incluem custos algumas vezes absurdos e indevidos

– na CDE.

Isto porque, despesas, como os subsídios do Programa Luz para

Todos – que, apesar da recessão que se espera para 2016, chegarão a quase R$ 1

bilhão -, são incluídos na conta sem qualquer pedido aparente de comprovação dos

valores orçados. Ainda sobre a fragilidade em tela, de acordo com os documentos

disponibilizados no processo n. 48500.004731/2015-12, foram incluídos na CDE o

equivalente a R$ 3,2 bilhões a partir de uma correspondência1 de uma única página,

sem que a Aneel tenha acrescentado ao processo qualquer informação adicional

sobre o montante, verificado a razoabilidade dos valores informados ou fiscalizado

os valores passados para verificar se a estimativa para 2016 é coerente com valores

observados em anos anteriores. Outros exemplos similares serão detalhados ao

longo da contribuição.

Neste contexto, os pleitos de ampliação da transparência,

aprimoramento na gestão da conta e no processo de definição e fiscalização de seu

orçamento têm por objetivo mitigar ineficiências, que passam por: (i) contratos de

1 Ofício nº 298/2015-SE-MME.

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compra de gás natural em montante que supera a capacidade máxima de consumo

das térmicas da região Norte, como muito bem apontado pela Agência; (ii) pela

consideração dos valores pagos pelos consumidores locais no cálculo da CCC

destinada a distribuidoras dos sistemas recentemente interligados ao Sistema

Interligado Nacional (SIN); e (iii) pela validação do uso de recursos da conta para

arcar com a conversão de combustíveis em térmicas que terminaram por onerar

ainda mais os consumidores, ao invés de trazer mais eficiência ao sistema.

Feitas estas necessárias considerações iniciais, a Abrace apresenta

nesta contribuição embasamento jurídico, regulatório e econômico que respalda os

pleitos aqui apresentados e aqueles já levados à Justiça, e ressalta a importância de

que o regulador reconheça, neste novo ciclo, as inconsistências apontadas pela

Abrace no ciclo anterior de definição da CDE, que inclusive vem sendo reconhecidos

pelo Poder Judiciário e pelo Tribunal de Contas da União.

2. Observância da decisão liminar obtida pela Abrace

Antes de se avançar para a análise da proposta de orçamento

submetida à Audiência Pública – AP – n. 83/2015, cumpre destacar que, em julho de

2015, a Abrace obteve, na Ação Ordinária n. 0024648-39.2015.4.01.3400, em curso

na 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, decisão liminar prolatada

nos seguintes termos:

"Pelo exposto, reconheço presentes a concomitância dos pressupostos do art. 273 do CPC, e DEFIRO A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, para desobrigar as associadas da autora do pagamento da CDE/2015 apenas no tocante às parcelas de sua composição suscitadas e controvertidas nos presentes autos, devendo a autora promover o abate no cálculo da CDE/2015 para suas associadas orientando-se nos limites aqui trazidos a julgamento, devendo a ANEEL suportar o rateio do remanescente pelo critério de cálculo da tarifa TUSD ou TUST, e até que venha a contestação da Ré, quando deliberarei novamente sobre o tema."

Os pontos discutidos na aludida judicial – e afastados liminarmente

pelo Juízo prolator da liminar em favor das associadas da Abrace – são:

(i) a inclusão de três itens de despesa no orçamento da CDE que não

deveriam ser suportados por nenhum consumidor – compra de carvão

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para a Usina Termelétrica Presidente Médici, cuja Fase A está

completamente inativada e cuja Fase B produz apenas 16% de sua

capacidade; custos relacionados ao atendimento dos sistemas

elétricos de Manaus e Macapá, os quais, por Lei, não mais se

enquadram como Sistemas Isolados; e custos para a implantação do

gasoduto Urucu-Coari-Manaus, os quais foram superfaturados;

(ii) a atribuição, aos consumidores livres, de custos incorridos

unicamente em favor de consumidores cativos – indenização de

concessões, subvenção tarifária equilibrada e restos a pagar; e

(iii) a adoção de critério equivocado de rateio da CDE – de acordo

com a quantidade de energia consumida, e não na proporção do uso

dos sistemas de transmissão e distribuição.

Pede-se para que a Aneel, em atenção à liminar em apreço, continue

a desobrigar as associadas da Abrace dos valores controversos discutidos na ação

judicial, bem como continue a aplicar o critério de rateio do encargo tal qual definido

na Resolução Homologatória n. 1.967/2015.

Assim, evita-se a perpetuação da controvérsia judicial acerca do

tema.

3. Contribuições formuladas pela Abrace na AP n. 03/2015

Afigura-se ainda mais importante que a Aneel solucione em definitivo

tais questões quando da fixação do orçamento da CDE/2016, nos termos das

contribuições já ofertadas pela Abrace no curso da AP n. 03/2015, as quais, em sua

maioria permanecem pertinentes.

Naquela oportunidade, considerando os principais pleitos, a

Associação já havia requerido que:

(i) para eliminar a distorção hoje existente, que consiste em subsídio

cruzado entre grandes e pequenos consumidores, e assegurar

tratamento isonômico, o que pressupõe a consideração das

circunstâncias à vista das quais a alocação de custos é feita, a Aneel

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estabelecesse que o encargo seja cobrado sob a forma de percentual

do valor final da fatura de energia;

(ii) fossem providos maiores detalhamento e transparência com

relação ao recadastramento das unidades consumidoras, bem como a

validação e respectivas variações, pela Aneel, da quantidade de

unidades consumidoras que deixaram de ser enquadradas como

beneficiárias da TSEE;

(iii) fossem revistos os valores orçados na CDE para o PLpT,

reduzindo sua previsão de aportes na ordem de pelo menos 50%,

buscando melhor alocação dos seus custos no tempo;

(iv) os valores realizados em 2014 com as subvenções ao carvão

mineral fossem utilizados como referência, bem como para que fosse

oferecido maior detalhamento quanto ao montante inserido na

proposta de orçamento;

(v) não fossem as tarifas utilizadas para arrecadar recursos

destinados à compensação do efeito da não adesão à prorrogação

das concessões de geração ou à indenização dos ativos de geração e

transmissão;

(vi) caso essas finalidades fossem custeadas via tarifa, deveriam ser

obedecidos o princípio da proporcionalidade e a noção da própria

Aneel de que deve haver correspondência entre a percepção de

benefícios e a alocação de custos, motivo pelo qual os agentes do

mercado livre não devem ser onerados com o rateio das despesas

referentes à "Subvenção Redução Tarifária Equilibrada" e à

"Indenização de Concessões", as quais decorrem exclusivamente dos

efeitos da Lei n. 12.783/2013, que destinou ao Ambiente de

Contratação Regulada (ACR) toda a renda hidráulica;

(vii) a Aneel se atentasse para o rateio dos custos relacionados à

indenização das transmissoras, uma vez que os benefícios tarifários

advindos da renovação das concessões não recaíram apenas sobre o

consumo, mas também sobre os agentes de geração a partir daquele

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ano, motivo pelo qual deveria a Aneel buscar solução que mantivesse

a isonomia entre as classes do setor, equilibrando benefícios e

responsabilidades diante dos custos e políticas definidas;

(viii) a disponibilização de maior detalhamento das contas

apresentadas, de maneira geral;

(ix) as despesas da CCC voltassem a ser rateadas nacionalmente,

retirando o sobrepeso criado para os consumidores das regiões

SE/CO/S;

(x) a Aneel apresentasse um balanço entre os valores previstos e

valores realizados nos anos anteriores;

(xi) a Aneel utilizasse o valor da geração estimada para o conjunto

das usinas movidas a gás natural em Manaus para a composição do

orçamento da CCC;

(xii) a execução de uma auditoria pelo Regulador dos supostos

passivos da CCC indicados pela Eletrobrás;

(xii) considerando que há excedente de energia no sistema de

Manaus, o qual é valorado ao PLD da região e está sendo

contabilizado para a Amazonas Energia, a Aneel fizesse abatimentos

nos reembolsos da CCC à Amazonas Energia; e

(xiv) as despesas relativas à CDE fossem alocadas aos consumidores

localizados nos sistemas isolados, mediante cota atribuída à

distribuidora local, pois o art. 13 da Lei n. 10.438/2002 atribui o

pagamento de CDE a todos os agentes que comercializam energia

com consumidor final, bem como o art. 4º da Lei n.º 12.111/2009,

estabelece que os sistemas isolados serão considerados como

integrados ao SIN “a partir da data prevista no contrato de concessão

para a entrada em operação da linha de transmissão de interligação

dos sistemas”.

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4. Critério de rateio das despesas da CDE

Chama-se especial atenção para a contribuição atinente ao critério de

rateio de despesas da CDE, assunto sobre o qual a Aneel foi silente na abertura da

AP n. 083/2015.

Pontuou a Abrace que a Aneel equivocadamente cobra o encargo na

proporção da tarifa de energia, quando, na verdade, o rateio deveria refletir a

proporção do uso dos sistemas de transmissão e distribuição da energia (TUSD ou

TUST).

Dispõe o § 1º do artigo 13 da Lei n. 10.438/2002 que as quotas

anuais da CDE, pagas por todos os agentes que comercializem energia com

consumidor final, são recolhidas “mediante encargo tarifário incluído nas tarifas de

uso dos sistemas de transmissão ou distribuição [...]”.

Em sua redação original2, em 2002, a Lei calava quanto ao meio de

cobrança, o que permitia que a Aneel o fizesse na tarifa de energia,

consequentemente de maneira proporcional ao consumo.

Entretanto, em 2004, a lei teve sua redação alterada3 pela Lei n.

10.848/2004, passando a prever a inclusão do encargo “nas tarifas de uso dos

sistemas de transmissão ou distribuição”.

Contudo, a Aneel manteve o critério anterior de rateio, onerando em

demasia os consumidores industriais, que usam pouco os sistemas de transmissão

e de distribuição, mas são eletrointensivos.

2 Redação original: “Art. 13 (...) §1º Os recursos da CDE serão provenientes dos pagamentos anuais

realizados a título de uso de bem público, das multas aplicadas pela Aneel a concessionários,

permissionários e autorizados e, a partir do ano de 2003, das quotas anuais pagas por todos os

agentes que comercializem energia com o consumidor final.”

3 Redação dada pela Lei n. 10.848/2004: “Art. 13 (...) § 1o Os recursos da Conta de Desenvolvimento

Energético - CDE serão provenientes dos pagamentos anuais realizados a título de uso de bem

público, das multas aplicadas pela Aneel a concessionários, permissionários e autorizados e, a partir

de 2003, das quotas anuais pagas por todos os agentes que comercializem energia com consumidor

final, mediante encargo tarifário, a ser incluído a partir da data de publicação desta Lei nas tarifas de

uso dos sistemas de transmissão ou de distribuição.”

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Em virtude de a lei ter determinado a cobrança da CDE nas Tarifas de

Uso dos Sistemas de Transmissão ou Distribuição – TUST ou TUSD –, a alocação

dos custos da CDE deveria observar a mesma lógica de observada na construção

dessas tarifas, ou seja, o rateio de custos deveria ocorrer na proporção do uso dos

sistemas de transmissão e distribuição.

Aplica-se, no ponto, a máxima segundo a qual o acessório segue o

principal.

Ao discorrer sobre o tema, a Aneel invocou o artigo 74 do Decreto n.

5.163/2004 para justificar a interpretação de que a CDE deve ser cobrada com base

no montante de energia comercializado, e não na proporção do uso dos sistemas de

distribuição e transmissão.

Contudo, ao assim proceder, a Aneel acabou por interpretar a lei no

rumo do Decreto, o que não se afigura juridicamente possível.

No caso, ao ter a lei estabelecido a cobrança da CDE nas tarifas de

uso dos sistemas de transmissão e de distribuição, o critério de alocação dos custos

da CDE não pode ser diferente daquele que orienta essas tarifas: cobrança na

proporção do uso desses sistemas.

Defender o contrário significaria admitir que a Lei deixou ao livre

arbítrio da ulterior regulação, sem qualquer parâmetro de controle, a definição dos

critérios de alocação de custos da CDE, o que não se coaduna com os princípios da

legalidade e da reserva legal tarifária (art. 175, parágrafo único, da Constituição

Federal).

Afigura-se imperativo, portanto, que a Aneel revisite essa questão e

se manifeste expressa e fundamentadamente sobre o tema no curso da AP n.

83/2015.

5. Operacionalização da liminar obtida pela Abrace

Afora as questões suscitadas na AP n. 03/2015, cumpre também

reiterar os pontos levantados pela Abrace no pedido de reconsideração apresentado

contra a Resolução Homologatória n. 1.967/2015, a qual homologou "o cálculo das

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componentes tarifárias TUSD – CDE e TUST – CDE em cumprimento à decisão

liminar do processo judicial apresentado pela Abrace".

No processo judicial em questão, Ação n. 0024648-

39.2015.4.01.3400, em curso na 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito

Federal, a Abrace questionou, além do critério de rateio da CDE, a inclusão de

diversas despesas na Conta, bem como a alocação de algumas dessas despesas

aos consumidores livres.

Por força de decisão liminar, as associadas da Abrace foram

desobrigadas do pagamento dos valores controversos da CDE, bem como teve

aplicada em seu favor a metodologia que entende correta para o rateio do encargo.

Ocorre que a Aneel, ao operacionalizar a decisão liminar obtida pela

Abrace, acabou por onerar os demais consumidores de energia, no lugar de retirar

da Conta os itens de despesa ilegais considerados na Resolução Homologatória n.

1.857/2015.

Conforme já destacado em diversas oportunidades, o expurgo dos

itens de despesa ilegalmente incluídos na CDE/2015, dada sua representatividade

na Conta, teria o condão de neutralizar por completo os efeitos da decisão liminar

obtida pela Abrace sobre os demais consumidores, ou seja, poderia eliminar o

aumento nas tarifas de energia dos consumidores não protegidos por decisões

judiciais.

A Abrace, portanto, insiste para que a Agência exerça seu poder-

dever de extirpar da CDE/2015 os itens de despesa ilegalmente inseridos no

orçamento, fazendo a devolução aos consumidores dos montantes associados a

estes itens no orçamento da CDE 2016.

6. Cumprimento da liminar obtida pela Abrace

Ainda quanto ao cumprimento da decisão liminar obtida pela Abrace,

observa-se que, apesar do comando expresso para que as distribuidoras de energia

elétrica refaturem "os ciclos de faturamento nos quais a decisão judicial produz

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efeitos", tem-se que, na prática, diversas concessionárias relutam em proceder tal

qual previsto na Resolução Homologatória n. 1.967/2015:

"Art. 3º. As tarifas de que tratam os artigos 1º e 2º tem vigência a partir de 3 de julho de 2015, e enquanto perdurar os efeitos da antecipação de tutela concedida no Processo Judicial nº 24648- 39.2015.4.01.3400, observada a data de associação do consumidor à Abrace. §1º As concessionárias deverão refaturar os ciclos de faturamento nos quais a decisão judicial produz efeitos, sendo que eventuais valores a cobrar ou a devolver devem ser obtidos pela diferença entre o valor que foi pago à época pelo consumidor e o novo valor a ser calculado de acordo com as tarifas publicadas nesta Resolução, sem atualização monetária."

Nesse contexto, pede-se para que a Aneel diligencie no sentido de

garantir o cumprimento da Resolução Homologatória n. 1.967/2015, adotando, para

tanto, todas as medidas cabíveis, inclusive a instauração de processos punitivos.

7. Gestão da CDE pela Aneel

Antes da MP 579 e seus desdobramentos, as quotas anuais de CDE

tinham um comportamento previsível, sendo reajustadas a cada ano pela inflação e

pelo crescimento do mercado. Ao ter seu escopo de atribuições alterado, a CDE

passou a incorporar uma série de novas despesas e a conta total passou de R$ 3,6

bilhões em 2012 para R$ 14,1 bilhões em 2013; depois R$ 18,0 bilhões em 2014; R$

25,2 bilhões em 2015; e agora, para o orçamento de 2016, propõe-se uma despesa

superior a R$ 18 bilhões.

Apesar dos montantes bilionários, o entendimento que se tem é de

que é necessário - embora não suficiente - que a Aneel dedique à definição e

fiscalização da CDE mais recursos do que tem dedicado, de forma a adequar sua

atuação à dimensão que o fundo ganhou após a MP 579.

A atual metodologia de definição da CDE consiste no recebimento pela

Superintendência de Gestão Tarifária (SGT) de informações de diversas outras

áreas, como SRD4, SRG5, SFF6, SAF7 e SCG8, além do Ministério de Minas e

4 Superintendência de Regulação dos Serviços de Distribuição.

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Energia, Ministério da Fazenda e da Eletrobras, e na consolidação das informações

recebidas, sem que haja uma unidade na determinação do orçamento, seja na

fiscalização do cumprimento do orçamento do ano anterior, seja na definição de

despesas e receitas futuras e na promoção das necessárias compensações entre

anos.

Então, sem dar a devida publicidade de eventuais análises

compatíveis com as necessidades demandadas pelas informações recebidas,

propõe um orçamento a ser aprovado pela diretoria colegiada após passar por

processo de audiência pública.

Embora legalmente a responsabilidade pela gestão da CDE seja

atribuída à Eletrobras, a Aneel, como agente fiscalizador, tem o dever de garantir

uma eficiência mínima dos gastos que são repassados a todos os consumidores de

energia elétrica. Uma maior profundidade de análise com a CCC, conforme será

detalhado na seção 8.1, poderia evitar a atribuição aos consumidores de valores que

podem superar R$ 4,5 bilhões, considerando valores propostos para o orçamento de

2016, assim como cobrados indevidamente em anos anteriores – e que vem

provocando impactos na economia nacional, inclusive contribuindo com a perda de

produção, investimentos e empregos na indústria.

Apesar da área técnica da Aneel responsável pela regulação dos

serviços de geração ter identificado inconsistências importantes, esforço

reconhecido pela Abrace, irregularidades como as que serão apontadas no caso da

CCC requerem uma mobilização maior de recursos humanos e técnicos para

analisar de forma mais profunda todos os detalhes dos elementos que compõem o

custo total da conta.

A Abrace solicita ao regulador que defina uma área técnica, ou equipe

específica, ou grupo de trabalho permanente, para que a ela seja atribuída a

responsabilidade pela definição do orçamento e fiscalização de todos os elementos

formadores da CDE.

5 Superintendência de Regulação dos Serviços de Geração.

6 Superintendência de Fiscalização Econômica e Financeira.

7 Superintendência de Administração e Finanças.

8 Superintendência de Concessões e Autorizações de Geração.

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Como exemplo de aprimoramento que poderia ser feito na definição e

fiscalização da conta, é possível citar a superintendência exclusiva da Agência para

gerir cerca de R$ 1,4 bilhão dos recursos de pesquisa, desenvolvimento e

programas de eficiência energética. Considerando-se os montantes envolvidos da

CDE e seus impactos econômicos, a Abrace entende que há a necessidade de

alocação de equipe técnica da Aneel dedicada à definição e fiscalização de todos os

elementos que compõem a CDE, cujo montante total é de bilhões de reais.

Por isso, a Abrace sugere à Aneel que crie ou defina uma equipe

técnica exclusiva para efetuar um acompanhamento sistemático e perene da CDE,

que tenha como objetivo garantir a eficiência do dispêndio de recursos financeiros

pagos pelos consumidores de energia elétrica.

Em relação à governança geral da conta, também é do entendimento

da Abrace que a Aneel precisa enfrentar o modelo atual marcado por potenciais

conflitos de interesse em que a Eletrobras, controlada pelo MME, que define os

valores da CDE, é, ao mesmo tempo gestora e beneficiária, direta ou indiretamente

por empresas subsidiárias, de recursos do fundo.

8. Itens de Despesa da CDE

Antes de explorar cada um dos itens de despesa que compõem a

CDE, a Abrace faz alguns comentários em relação às informações que foram

disponibilizadas tanto pela Aneel, no âmbito da presente audiência pública, quanto

pela Eletrobras, gestora da conta, em seu sítio na internet.

Das análises realizadas pela Abrace, não foi possível compreender,

com base nas informações disponibilizadas na AP 083/2015 e naquelas divulgadas

pela Eletrobras na internet, qual é o balanço atual da CDE.

A movimentação financeira consolidada da CDE e apresentada pela

Eletrobras, com informações de janeiro a outubro de 2015, dão conta de que tanto

as saídas quanto as entradas na conta totalizaram cerca de R$ 16 bilhões no

período.

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A Abrace questiona se há outras despesas não consideradas no

balanço apresentado pela Eletrobras, pois se apenas R$ 16 bilhões saíram da conta

para o pagamento de despesas, montante que representa 64% do total de R$ 25

bilhões orçados para 2015, ainda restariam R$ 9 bilhões para serem realizados em

novembro e dezembro de 2015, o que parece apontar que teria havido um

sobredimensionamento da conta e que haveria, ao final do ano, um saldo a ser

devolvido aos consumidores na CDE 2016.

O fato é que a Aneel, no âmbito da AP 083/2015, não apresenta

nenhum balanço do exercício do ano anterior. Não se tem informações sobre o que

foi realizado em relação ao que foi orçado. Tampouco há uma explicação sobre as

diferenças que possivelmente tenham sido verificadas.

Em 2015, os consumidores foram responsáveis pelo pagamento de

quase R$ 19 bilhões, mas não conhecem muita coisa a respeito do que foi gasto,

nem como foi gasto. Não há praticamente nenhuma transparência em relação ao

balanço da CDE para o fechamento do ano.

As indagações que a Abrace faz são: para cada uma das rubricas de

despesas da CDE, do que foi orçado, quanto de fato foi realizado? Não há nenhuma

pendência em relação a 2015? Se houver, o que explica o fato de o orçamento não

ter sido verificado?

Em complemento aos questionamentos acima, a Abrace solicita que a

Aneel crie um procedimento para divulgação periódica de todas as despesas

relativas à CDE, assim como possíveis explicações sobre as movimentações, a

exemplo do que ocorre com a Conta Bandeiras, que mensalmente apresenta um

balanço dos recursos, ou do que ocorreu com a Conta ACR e com os empréstimos

às distribuidoras que agora são um Passivo da CDE que está sendo pago pelos

consumidores cativos.

Embora a Eletrobras seja a instituição responsável por dar

transparência às informações da CDE, ela tem se mostrado incapaz de cumprir as

determinações postas em regulamento pela Aneel, como é o caso da REN

427/2011, que trata das responsabilidades quanto à prestação de informações sobre

a CCC, e que será explorado adiante.

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Por isso, a Abrace solicita que a Aneel, de forma independente à

Eletrobras, passe a divulgar informações periódicas sobre a CDE, de maneira a dar

mais transparência ao processo e a ter tempo suficiente de, eventualmente, solicitar

ao longo do ano informações não prestadas por aquele que, por lei, é obrigado a

fazê-lo, mas não o faz.

Nas próximas subseções, a Abrace apresenta suas considerações e

solicitações a respeito de cada um dos itens que compõem as despesas da CDE

propostas para o exercício de 2016.

8.1 Conta de Consumo de Combustíveis - CCC

Antes de detalhar os pontos de contribuição relativos à proposta de

orçamento para a CCC 2016, a Abrace faz uma reflexão sobre o custo médio de

atendimento dos Sistemas Isolados que recai sobre os consumidores do SIN.

Se o valor proposto pela Aneel para o orçamento da CCC 2016, de

R$ 5,8 bilhões, for realmente necessário para atender os Sistemas Isolados, cuja

carga é de 452 MWmédios, isso significa que o custo unitário médio de atendimento

dos consumidores dos Sistemas isolados deverá ser de 1.451 R$/MWh em 2016.

Como os usuários dos Sistemas Isolados estão arcando com o custo

médio de atendimento do ACR, que é de R$ 295,109, então, na prática, a Aneel está

propondo que os consumidores dos Sistemas Isolados estejam sendo atendidos a

um custo unitário médio de 1.746,10 R$/MWh.

Esse valor é 11% superior ao primeiro patamar de déficit de energia,

que é de 1.571,42 R$/MWh10. Portanto, olhando apenas sob a ótica do custo unitário

de atendimento desses sistemas, não é nem um pouco razoável imputar aos

consumidores custos que resultam de uma gestão ineficiente da CCC, conforme

será demonstrado nas próximas subseções.

9 Despacho n. 3.491/2015.

10 Resolução Homologatória n. 2.002/2015

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8.1.1 Previsão orçamentária para reembolso da parcela commodity

do gás natural das UTEs de Manaus

Merece revisão a previsão orçamentária para reembolso, pela CCC,

da parcela commodity do gás natural das UTEs de Manaus.

A CCC tem sido utilizada para reembolso integral dos quantitativos

mínimos de compra de gás natural indicados pela Eletrobras, por causa dos

contratos take-or-pay e ship-or-pay.

Não se discute, nesse momento, a necessidade de compra mínima

do gás, todavia, como reconheceu a própria SRG dessa Agência, na Nota Técnica n.

143/2015-SRG/ANEEL (NT 143), “esse reembolso deve ocorrer dentro do limite

máximo de consumo do gás natural, e esse limite está intrinsicamente atrelado à

potência de cada empreendimento”.

Nessa linha, reconheceu-se a necessidade de expurgo de 210,5

milhões de reais do orçamento da CDE para 2016, valores esses relativos ao

quantitativo de gás natural (parcela commodity), em compra mínima, que excedem a

capacidade de consumo/geração do parque térmico instalado em Manaus.

Com efeito, a área técnica concluiu que a capacidade máxima total de

utilização de gás natural pelas UTEs de Manaus é de 4,076 milhões de m3/dia, ao

passo que foram contratados 5,5 milhões de m3/dia.

Vale dizer, apenas 74,1% do total da compra mínima poderá ser

efetivamente consumido.

A NT 143 esmiúça a questão:

24. (...) Contudo, esse reembolso deve ocorrer dentro do limite máximo de consumo do gás natural, e esse limite está intrinsicamente atrelado à potência de cada empreendimento. Do contrário, caso todo o custo referente ao take-or-pay e ship-or-pay fosse invariavelmente reembolsado pela CCC, não haveria incentivo à eficiência da empresa na gestão do contrato de suprimento de gás natural e na disponibilização de potência instalada para consumir o volume pactuado, o que poderia resultar em contratação de gás natural acima da capacidade máxima de consumo desse combustível e/ou em um atraso no cronograma de implantação de unidades geradoras operadas com gás natural.

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25. De acordo com o § 9º do art. 11 do Decreto nº 7.246/2010, “para incentivar a eficiência econômica e energética, a ANEEL poderá estabelecer limites para o reembolso dos custos de que trata o § 2º, incisos II e V, e § 3º, caso a contratação seja direta, por meio de metas que assegurem a sustentabilidade econômica dos agentes”. O § 3º supracitado se refere justamente ao reembolso pela CCC dos custos com o take-or-pay e ship-or-pay, e o contrato do suprimento de gás natural para as usinas dentro da área de concessão da Amazonas Energia foi firmado diretamente pela Amazonas Energia e junto à Cigás, com anuência da Petrobras, Eletrobras e Eletronorte. Por fim, o princípio basilar adotado para avaliação da questão em tela é o da eficiência na gestão dos recursos públicos. Em especial, o princípio da eficiência tem como foco a adoção de medidas para evitar desperdícios e a promoção da melhor utilização dos recursos públicos por parte dos agentes credores de reembolso da CCC. 26. Isto posto, a análise do volume de gás natural passível de cobertura pela CCC em função do gasoduto Urucu-Manaus deve, portanto, se pautar na capacidade máxima de consumo de gás natural das usinas térmicas instaladas para operar com o gás natural. (...) 29. Visando efetuar a consistência dessas vazões e, posteriormente, a aferição da parcela total da CCC referente ao ship-or-pay e take-or-pay do gás natural passível de reembolso, foi realizada a avaliação da capacidade máxima de consumo do gás natural por empreendimento. Ou seja, considerando-se a usina operando 24 horas por dia em sua capacidade máxima de geração, foi calculado o volume máximo total de gás, em m

3/dia, necessário

para abastecer essas usinas. (...) 34. Desta forma, conclui-se que, hoje, dos 5.500.000 m

3/dia

previstos no contrato de suprimento de gás natural, apenas são passíveis de reembolso pela CCC os custos relativos ao volume de 4.076.156 m

3/dia. A diferença, de 1.423.844 m

3/dia, não deverá

ter cobertura de reembolso pela CCC, uma vez que se trata de volume de gás impossível de ser consumido pelas usinas térmicas atualmente existentes. Tal volume é decorrente de uma gestão ineficiente da empresa haja vista a contratação do gás natural acima da sua capacidade máxima de consumo de cada empreendimento.” (grifo nosso)

Como destacou a SRG, o volume contratado acima da capacidade de

geração “é decorrente de uma gestão ineficiente da empresa” e “a diferença, de

1.423.844 m3/dia, não deverá ter cobertura de reembolso pela CCC”.

Ocorre que o dispositivo que determina a glosa (§ 9 do art. 11 do

Decreto n. 7.246/2010) existe desde 2010, sem mencionar o princípio da eficiência,

previsto na Constituição Federal desde o advento da Emenda Constitucional n. 19,

de 1998.

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Assim, a louvável postura ora adotada pela Agência precisa ter

efeitos retroativos, a fim de ressarcir os consumidores pelos custos indevidamente

incorridos via CCC nos anos anteriores, não somente em 2016. Se não houvesse

esta compensação, a Agência estaria aceitando que o agente se apropriasse de

valores pagos indevidamente no passado.

Frise-se que o comando contido no dispositivo regulamentar (“a Aneel

poderá estabelecer limites para o reembolso dos custos”) jamais poderia ser lido

como objeto de poder discricionário.

A busca da modicidade tarifária (art. 6º, I, Lei n. 8.987/95) e o

combate ao enriquecimento ilícito (art. 884, Código Civil de 2002) de agente

ineficiente (como reconhece a própria Aneel) não estão afetos a critérios de

conveniência ou oportunidade.

Assim, o estabelecimento de limites para o reembolso de custos com

compra mínima de gás, como ora o faz a Agência, é um poder-dever vinculado que

deveria ser cumprido, no mínimo, desde 2010.

Portanto, além do decote que ora se promove no orçamento da CDE

para o ano de 2016, deve haver compensação com o custo pago inadvertidamente

nos anos anteriores.

Em que pese a Eletrobrás não ter elaborado o Plano Anual de Custos

da CCC – PAC nos anos de 2010, 2011 e 2012, os documentos apresentados à

Aneel àquela época pela gestora da Conta, somados às notas técnicas que

discutem o orçamento da CCC, permitem identificar os valores lançados a título de

parcela commodity do gás natural de Manaus.

Em relação aos orçamentos do período de 2013 a 2015, os relatórios

do PAC apresentam, na rubrica “Despesas acessórias” da Amazonas Distribuidora

de Energia S.A. – AmE, os valores da parcela commodity do gás natural.

Assim, é perfeitamente possível que a Aneel, de posse desses

insumos, consiga precisar, no curso da AP n. 83/2015, o montante a ser ressarcido à

CCC.

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Pelo exposto, deve ser revisto o orçamento da CDE/2016, para que

haja compensação dos custos arcados pelos consumidores com compra mínima de

gás em Manaus, além da capacidade máxima de geração daquele parque térmico.

Assim, a Abrace estima que o montante a ser glosado seja da ordem

de R$ 665 milhões, já considerados os valores para o exercício de 2016, assim

como aqueles relativos aos anos anteriores (2013 a 2015), conforme apresentado na

Tabela 1.

Tabela 1 - Glosa no reembolso da parcela commodity do gás natural de Manaus

Ano Valor lançado no orçamento (R$ milhões)

Glosa* (%)

Valor a ser glosado**

(R$ milhões) Fonte do valor de orçamento

2016 517,12

25,9%

210,52 NT 143 - SRG

2015 463,16 188,56 PAC 2015

2014 282,69 115,08 PAC 2014

2013 370,31 150,75 PAC 2013

Total 1.633,28 664,91

8.1.1.1 Alternativas para minimizar os prejuízos causados pela

contratação ineficiente de gás natural para atendimento do

parque térmico de Manaus

É importante reiterar, a partir das constatações da SRG na NT 143,

que “o reembolso deve ocorrer dentro do limite máximo de consumo do gás natural,

e esse limite está intrinsicamente atrelado à potência de cada empreendimento”, que

a CCC deve cobrir apenas os custos do montante de gás natural possível de ser

consumido, ou seja, de 4,076 milhões de m3/dia.

No entanto, o levantamento realizado pela SRG considera que, para

consumir esse montante de gás natural, o parque térmico de Manaus estaria

gerando sua capacidade máxima, por 24 horas por dia, durante 7 dias por semana.

Caso as usinas não estejam operando a plena capacidade, na base,

devem ser buscadas alternativas para que o gás contratado, mas não consumido,

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possa ser utilizado de forma que a receita decorrente dessa utilização seja revertida

em prol da modicidade tarifária, em benefício dos consumidores de energia elétrica.

Algumas alternativas podem ser estudas pela Aneel e discutidas com

a sociedade, como a possibilidade de revenda do gás para indústrias locais, se

houver demanda para ele. Também há a possibilidade de se instalar novas usinas

para consumir o gás e injetar energia no SIN.

Contudo, caso essa revenda não se viabilize, será necessário que a

Aneel, na definição do orçamento da CDE para o ano de 2017, verifique o consumo

efetivo de gás natural das térmicas de Manaus ocorrido em 2016, de maneira a

revisitar a glosa no reembolso dos custos da parcela commodity caso o volume

consumido ao longo de 2016 pelas usinas seja inferior a 4,076 milhões de m3/dia.

O consumo de gás natural das térmicas de Manaus pode ser obtido

dos registros do Sistema de Coleta de Dados Operacionais – SCD.

8.1.2 Custo de geração nos sistemas recentemente interligados:

rateio de custos entre a CCC e as tarifas das distribuidoras

A CCC também vem sendo indevidamente onerada com os custos

totais de geração dos sistemas recentemente interligados.

Na dicção do artigo 3º, caput, da Lei n. 12.111/2009, a CCC, a partir

de 30 de julho de 2009, passou a reembolsar “o montante igual à diferença entre o

custo total de geração da energia elétrica, para o atendimento ao serviço público de

distribuição de energia elétrica nos Sistemas Isolados, e a valoração da quantidade

correspondente de energia elétrica pelo custo médio [...] no ACR”:

“Art. 3º A Conta de Consumo de Combustíveis - CCC, de que tratam o § 3º do art. 1º e o art. 8º da Lei nº 8.631, de 4 de março de 1993, passará a reembolsar, a partir de 30 de julho de 2009, o montante igual à diferença entre o custo total de geração da energia elétrica, para o atendimento ao serviço público de distribuição de energia elétrica nos Sistemas Isolados, e a valoração da quantidade correspondente de energia elétrica pelo custo médio da potência e energia comercializadas no Ambiente de Contratação Regulada - ACR do Sistema Interligado Nacional - SIN, conforme regulamento. [...]”

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Embora o § 5º do mesmo artigo 3º da Lei n. 12.111/2009 estabeleça

que o reembolso previsto no caput permanece mesmo após a interligação do

sistema antes isolado, não há dúvida de que esse reembolso deve ser feito na forma

do caput, ou seja, a CCC reembolsa tão somente o custo excedente ao custo médio

do ACR:

“5º O direito ao reembolso previsto no caput permanecerá sendo feito ao agente definido nos §§ 3º e 4º durante toda a vigência dos contratos de compra de potência e energia elétrica, incluindo suas prorrogações, e terá duração igual à vigência dos contratos, mantendo-se, inclusive, este reembolso após a data prevista de interligação ao SIN, neste caso condicionado ao atendimento do disposto no § 1º do art. 4º desta Lei.”

O Decreto n. 7.246/2010 reproduz, no caput de seu artigo 11, o

previsto no caput do artigo 3º da Lei n. 12.111/2009:

“Art. 11. A CCC reembolsará o montante igual à diferença entre o custo total de geração de energia elétrica para o atendimento ao serviço público de distribuição de energia elétrica nos Sistemas Isolados e a valoração da quantidade correspondente de energia elétrica pelo custo médio da potência e energia comercializadas no Ambiente de Contratação Regulada - ACR do SIN.”

Já no § 7º do seu artigo 3º, o Decreto n. 7.246/2010 deixa expresso

que a CCC não deve ser utilizada para reembolsar custos já repassados em outras

fontes de recursos:

“§ 7º Fica vedada a utilização da CCC para o reembolso de custos que já tenham previsão de compensação por outras fontes de recursos, inclusive pela Conta de Desenvolvimento Energético - CDE e pelo Encargo de Serviço de Sistemas - ESS.”

Ocorre que, nos Planos Anuais de Custos da CCC – PAC

apresentados pela Eletrobrás e nas análises efetuadas pela Agência sobre o

orçamento da CCC, a geração das usinas alcançadas pela interligação não é

devidamente considerada na definição do chamado “Desconto ACR”, que

correspondente ao valor do ACRmédio.

Por outras palavras, não se observa adequadamente a sistemática de

rateio definida no artigo 3º, caput, da Lei n. 12.111/2009, segundo a qual a CCC

reembolsa os custos associados aos contratos firmados e à compra de combustível

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para geração apenas no que excede o custo médio do ACR, custo médio esse que

deve ser suportado pela distribuidora.

A Aneel, no processo tarifário das distribuidoras que atuam nos

sistemas isolados, valora o custo dos contratos de usinas recentemente interligadas

pelo ACRmédio, ou seja, repassa para as tarifas das distribuidoras os custos que

não superaram o custo médio do ACR.

A título de exemplo, vale conferir planilha que instruiu o reajuste

tarifário da Amazonas Energia em 2015, realizado no mês de outubro daquele ano:

Tabela 2 – Contratos bilaterais da AmE – dados técnicos da REH 1.975/2015

Com efeito, os consumidores brasileiros estão pagando duas vezes

pelo mesmo montante de energia, pois:

(i) a Aneel repassou o custo de geração até o valor médio do ACR; e

(ii) a CCC cobriu todo o custo de geração, sem que fosse

descontado o valor repassado às tarifas.

A corroborar a constatação de que a CCC cobriu todo o custo de

geração, cumpre remeter aos orçamentos aprovados de 2014, 2015 e de 2016, em

que os custos associados à UHE Balbina e à contratação das usinas termelétricas a

gás natural de Manaus foram incluídos na CCC sem a correta consideração dos

custos já repassados às tarifas das distribuidoras.

Essa situação precisa ser equacionada desde a origem, para evitar

enriquecimento ilícito e para restaurar o respeito à Lei n. 12.111/2009, ao disposto

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no artigo 3º, caput e § 7º, do Decreto n. 7.246/2010 e ao princípio da moralidade

administrativa.

Na elaboração do PAC 2016, a Eletrobras considerou os sistemas

Manaus e Macapá como interligados, motivo pelo qual não incluiu, no montante de

energia elétrica a ser objeto de aplicação do preço médio do ACR, a geração desses

sistemas cujos custos permanecem sendo suportados pela CCC.

No caso do sistema Manaus, identifica-se que toda a geração térmica

a gás natural (capacidade de produção de 590 MWméd conforme disposto na Tabela

2 da NT 143) e a geração da UHE Balbina (130 MWméd) não foram consideradas no

cálculo do chamado “Desconto ACR”.

Por causa disso, o valor do chamado “Desconto ACR” (vide Tabela 3

da NT 143) é de 1,2 bilhão de reais, o que, dividido pelo preço médio do ACR para

2016 (R$ 295,10/MWh) e pelo número de horas no ano (8.784 horas), chega-se ao

montante de 470,3 MWméd.

A se manter esse montante de energia elétrica, ficará caracterizado

que o custo de geração da UHE Balbina (mais de 196 milhões de reais lançados no

orçamento da CCC) e o custo de geração das térmicas a gás natural de Manaus

(mais de 2,7 bilhões de reais, somando os valores de take-or-pay, ship-or-pay e

receita fixa dos geradores) serão suportados exclusivamente pela CCC, sem

qualquer contrapartida da Amazonas Energia (ACRmédio), sendo que essa

distribuidora arrecada, de seus consumidores, o valor do ACRmédio para essa

geração.

Portanto, dada a vedação legal de cobrir os custos de geração da

UHE Balbina e das térmicas a gás natural de Manaus somente com recursos da

CCC, a Aneel tem o dever de considerar, no chamado “Desconto ACR”, o valor

correspondente ao ACRmédio para essa geração (130 MWméd para a UHE Balbina e

590 MWméd para as térmicas a gás natural de Manaus), o que resulta em 1,87 bilhão

de reais11 de dedução da CCC.

11

Geração (MWméd) x horas-ano x ACRmédio = (590 + 130) x 8.784 x 295,10 = 1,87 bilhão de reais.

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O mesmo princípio deve ser utilizado para incluir o devido valor da

contrapartida da CEA na cobertura dos custos de geração do Sistema Macapá.

Nesse ponto, chama a atenção o valor de 94,78 milhões de reais considerado no

orçamento da CCC 2016, referente ao contrato de potência e energia firmado com a

Eletronorte para atendimento do Sistema Macapá.

Se esses custos são abarcados pela CCC, o montante de energia

associado a esses custos deve ser valorado ao preço médio do ACR para atender

ao comando legal que disciplina a Conta.

Nos anos de 2014 e 2015, o fato de o orçamento da CCC ter sido

elaborado com a premissa de que o Sistema Manaus seria interligado, constata-se

divergência entre a geração atrelada aos custos incluídos na CCC e o montante

considerado na definição do chamado “Desconto ACR”.

Para ilustrar essa divergência, a Tabela 3 apresenta os parâmetros

considerados na definição do valor do chamado “Desconto ACR” nos anos de 2014

e 2015:

Tabela 3 – Parâmetros do chamado “Desconto ACR” nos anos 2014 e 2015

Ano Desconto ACR (R$ milhões)

ACRmédio (R$/MWh)

Montante de energia (MWméd)

Fonte

2014 1.300,79 155,87 952,7 NT 89 - SRG

2015 1.719,27 192,61 1.019,0 NT 14 - SGT/SRG

Considerando os dados da Eletrobras de geração térmica verificada

nos sistemas isolados em 2014 e 201512 (1.219 MWméd em 2014 e 1.077 MWméd em

2015), e de geração da UHE Balbina no mesmo período (151,3 MWméd em 2014 e

112,7 MWméd em 2015), verifica-se que a energia efetivamente gerada para atender

aos sistemas isolados supera os montantes considerados pela Aneel no cálculo do

chamado “Desconto ACR”, sendo essa diferença explicada pela interligação do

Sistema Manaus, que foi prevista no orçamento mas não ocorreu.

12

Dados constantes de tabelas disponíveis na página da Eletrobras na Internet.

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26

Desta forma, torna-se necessário revisitar o valor do chamado

“Desconto ACR” dos anos de 2014 e 2015, mediante a inclusão dos montantes de

energia elétrica que foram gerados e, por consequência, suportados pela CCC, mas

que não apresentam a contrapartida da distribuidora:

(i) 2014: R$ 570,83 milhões de reais (diferença de 418,1 MWméd13

valorada pelo preço médio do ACR de 201414); e

(ii) 2015: R$ 287,78 milhões de reais (diferença de 170,6 MWméd15

valorada pelo preço médio do ACR de 201516).

Assim, a Abrace estima que o montante a ser glosado seja superior a

R$ 2,7 bilhões, já considerados os valores para o exercício de 2016, assim como

aqueles relativos aos anos anteriores.

8.1.3 Ônus decorrente da conversão do combustível do parque

térmico de Manaus

A Aneel, no Processo n. 48500.006917/2005-46, que tratou do pedido

de sub-rogação à CCC dos custos de implantação do gasoduto Urucu-Coari-

Manaus, identificou que a decisão da Amazonas Distribuidora de Energia S.A. –

AmE de promover a conversão de combustível do parque térmico do Sistema

Manaus não traria redução de custos para a CCC.

Por essa razão, o investimento realizado no referido gasoduto não

atendeu à condição estabelecida no inciso II do § 4º do art. 11 da Lei n. 9.648/1998,

qual seja, a de que o empreendimento “promova a redução do dispêndio atual ou

futuro da conta de consumo de combustíveis dos sistemas elétricos isolados”.

No voto proferido pelo Diretor Romeu Rufino, foram apontadas as

questões atinentes ao custo de implantação do gasoduto:

13

1.219 MWméd de geração térmica + 151,3 MWméd da UHE Balbina – 952,7 MWméd previstos no

orçamento. 14

R$ 155,87/MWh. 15

1.077 MWméd de geração térmica + 112,7 MWméd da UHE Balbina – 1.019 MWméd previstos no

orçamento. 16

R$ 192,61/MWh.

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“Resta injustificado o aumento do custo de implantação do gasoduto, passando de R$ 2,488 bilhões (valor estimado em contrato) para R$ 4,465 bilhões (carta nº GE-MC 007/2011, de 07/02/2011), o que fez elevar o preço da parcela transporte de R$ 9,20/milhão BTU para R$ 16,24/milhão BTU, uma diferença de 77%. Inclusive, se considerarmos o valor estimado durante a negociação pré-contratual, em R$ 4,36/milhão BTU, a diferença atinge 272%.

É importante destacar que o preço do gás natural foi condição determinante para o planejamento energético da região norte, o que contava inclusive com a possibilidade da interligação de Manaus ao SIN, opção que pode ter sido adiada frente ao baixo custo do gás natural previsto à época.

Contudo, foi efetivado um contrato de fornecimento de gás natural com o preço em aberto (open-book), permitindo o repasse integral do custo de construção do gasoduto ao custo do transporte do combustível, porém sem consulta prévia aos “pagadores” (consumidores do território nacional que arcam com o custo da CCC).

29. Ainda que o atual preço do transporte do gás natural seja devidamente justificado, foi de grande prejuízo ao consumidor de energia elétrica o fato do custo do gasoduto ter sido minorado na fase de planejamento do suprimento de energia para a região norte, o que pode ter contribuído para postergar-se a alternativa da interligação de Manaus ao SIN.”

Além de destacar o que classificou de “injustificado aumento do custo

de implantação do gasoduto”, o Diretor-Relator apresentou o comparativo de custos

de geração a gás natural e a óleo combustível.

Mesmo considerando o cenário de aplicação de referência de preço

menor para a parcela transporte do gás natural, as conclusões apresentadas pelo

Diretor-Relator não deixam dúvidas em relação ao impacto da conversão do

combustível do parque térmico de Manaus na CCC:

“Ainda que a hipótese da redução de custos do gás natural frente ao OC1A se concretize, o benefício real da troca de combustíveis (sem a hipótese da sub-rogação) fica restrito ao período de cerca de três anos, desde o início do fornecimento comercial do combustível gasoso (dezembro de 2010) até a interligação de Manaus ao SIN (final de 2013). Com o agravante de que, diferentemente do combustível OC1A, existe compromisso de compra mínima para o gás natural fato que onerará a CCC por cerca de 17 anos após a interligação.

(...)

Ressalta-se o grande prejuízo que o gasoduto trouxe à CCC, considerando que a interligação de Manaus ao SIN ocorrerá em 2013. Após a interligação não haverá a necessidade de despacho termelétrico na base, mitigando o gasto com combustíveis líquidos, enquanto que o contrato de fornecimento de gás natural obriga ao

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pagamento de um ship-or-pay de 100% e take-or-pay de 80% e assumiu um compromisso de 20 anos.”

A sinalização de que os custos do gás natural levariam ao aumento

dos gastos da CCC após a interligação do Sistema Manaus ao SIN evidencia a

desconsideração do disposto no § 4º do art. 11 do Decreto n. 7.246/2010:

“§ 4º Na hipótese de troca do combustível, o custo total de geração de energia elétrica nos Sistemas Isolados será obtido tendo como base o combustível que representar o menor custo final de geração, de modo a preservar a eficiência econômica e energética e minimizar a necessidade de reembolso de custo da CCC no horizonte contratual”.

Além de impor à Aneel o dever de adotar, na definição do orçamento

da CCC, “o combustível que representar o menor custo final de geração”, o Decreto

n. 7.246/2010 estabelece, em seu artigo 19, a sistemática a ser empregada para

obter o valor correspondente ao custo de combustível de usina termelétrica

envolvida em processo de interligação:

“Art. 19. Após a interligação, para efeito do disposto no art. 3º, §§ 5º e 6º, da Lei nº 12.111, de 2009, a parcela do custo total de geração correspondente ao custo do combustível será substituída pelo menor valor entre o PLD e o CVU vigente para os empreendimentos termelétricos oriundos dos Sistemas Isolados.”

Na medida em que, conforme destacado pelo Diretor Romeu Rufino,

“após a interligação não haver[ia] a necessidade de despacho termelétrico na base,

mitigando [assim] o gasto com combustíveis líquidos”, o parque térmico do Sistema

Manaus, caso fosse mantido a óleo combustível, seria submetido ao processo

natural de despacho do Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS, de maneira

que, na hipótese de não ser despachado por ordem de mérito, a CCC suportaria a

exposição da distribuidora local ao mercado de curto prazo, mediante pagamento do

PLD.

O fato de o contrato de fornecimento de gás natural estabelecer o

pagamento (i) de reserva de capacidade de transporte dutoviário (ship-or-pay de

100%) e (ii) de reserva de consumo mínimo (take-or-pay de 80%) não pode resultar

em ônus para a CCC, dado que essa condição de contratação só passou a vigorar a

partir da conversão de combustível e, nos termos do Decreto n. 7.246/2010, o

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reembolso da CCC deve basear-se no combustível que proporciona o menor custo

de geração.

Em que pese o custo unitário de geração de usina termelétrica a óleo

combustível ser, em sua maioria, superior ao custo unitário de geração a gás

natural, o elevado custo da parcela transporte do gás natural do parque térmico do

Sistema Manaus, somado ao valor da parcela commodity, impõe a essa geração,

que possui caráter inflexível em virtude das cláusulas contratuais de take-or-pay e

ship-or-pay, custo maior.

Mesmo considerando a glosa proposta pela SRG de 831,5 milhões de

reais no custo do gás natural, o valor que remanesce, de 1,31 bilhão de reais,

aplicável à máxima capacidade de geração do parque térmico do Sistema Manaus

(da ordem de 590 MWméd), corresponde ao custo unitário de R$ 254/MWh.

Considerando que, no período de maio a dezembro de 2015 (período

esse em que o Sistema Manaus já se encontrava plenamente interligado, conforme

atestado pela Aneel no Despacho n. 1.365/2015), o valor médio do PLD do

Submercado Norte foi de R$ 221/MWh, e mesmo que o custo de geração do parque

gerador do Sistema Manaus operando a óleo combustível fosse superior ao custo

unitário de R$ 254/MWh observado para o gás natural, o reembolso da CCC, nos

termos do artigo 19 do Decreto n. 7.246/2010, seria promovido com base no PLD, e

não no custo do gás natural.

Portanto, incluir o custo do gás natural no item de despesa CCC viola

as disposições do Decreto n. 7.246/2010.

Por esta razão, a Aneel deve, no orçamento da CDE para o ano de

2016, realizar simulação do comportamento do PLD do Submercado Norte para,

desta forma, considerar no orçamento o menor valor entre o PLD e o custo de

geração a gás natural (observadas as parcelas transporte e commodity), dado que

essa seria a dinâmica do parque térmico do Sistema Manaus operando a óleo

combustível, pois, conforme destacado pelo Diretor Romeu Rufino, “não haver[ia] a

necessidade de despacho termelétrico na base, mitigando [assim] o gasto com

combustíveis líquidos”.

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Considerando o valor médio estimado pela CCEE, constante do

InfoPLD de janeiro de 2016, de R$ 31/MWh para o PLD do Submercado Norte ao

longo de todo o ano de 2016, infere-se que o parque térmico de Manaus não seria

despachado por ordem de mérito, impondo à CCC a cobertura dos custos da AmE

com a exposição ao mercado de curto prazo, razão pela qual se torna descabida a

consideração dos custos do combustível.

Importa ressaltar que, no orçamento da CCC para 2016, estão

considerados os valores da receita fixa das térmicas a gás natural do Sistema

Manaus, e esses valores, que superam 600 milhões de reais, não são objeto de

questionamento pela Abrace.

O que se questiona é o custo do combustível, e esse custo, para fins

de reembolso pela CCC, deve observar o disposto no § 4º do artigo 11 do Decreto n.

7.246/2010, pois o parque térmico de Manaus foi submetido a processo de

conversão de combustível.

O reembolso do menor valor entre o PLD e o custo de geração da

térmica, inclusive, é o atual critério adotado para a UTE Termo Norte II em virtude do

processo de interligação do Sistema Rondônia.

Na medida em que as térmicas a gás natural do Sistema Manaus,

conforme apontado pela SRG, têm capacidade de geração de 590 MWméd, a

valoração desse montante pela estimativa de PLD do Submercado Norte para 2016,

R$ 31/MWh, resulta em 160,2 milhões de reais.

Assim, em cumprimento às disposições do Decreto n. 7.246/2010,

deve a Aneel atribuir, ao custo do gás natural das térmicas de Manaus para 2016, o

valor de 160,2 milhões de reais, e não o valor de 1,31 bilhão de reais referente à

proposta da SRG de glosa parcial no reembolso das parcelas transporte e

commodity do gás (glosa de R$ 1,15 bilhão).

Ademais, é devido replicar essa sistemática para o período de maio a

dezembro de 2015, período esse em que o Sistema Manaus já se encontrava

plenamente interligado, de maneira a atender ao disposto no § 4º do artigo 11 do

Decreto n. 7.246/2010. A Tabela 4 ilustra a diferença de valores que resulta da

observância a esse dispositivo normativo no período de maio a dezembro de 2015:

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Tabela 4 - Valores resultantes da aplicação de sistemática constante do § 4º do artigo 11 do Decreto n. 7.246/2010 no período de maio a dezembro de 2015

Custo do gás natural lançado

no PAC* (R$ milhões)

Custo do gás natural

correspondente a oito meses (R$ milhões)

Montante de

energia** (MWméd)

Valor médio do PLD Norte

(R$/MWh)

Custo da exposição ao

MCP (R$ milhões)

Diferença de valor de

reembolso pela CCC

(R$ milhões)

1.368,69 912,46 590,0 220,8 760,78 151,68

* Soma das parcelas transporte e commodity, deduzida da glosa de 25,9% proposta pela Aneel em razão da incapacidade das térmicas de consumo pleno da quantidade contratada de gás

** Considerada a capacidade de geração do parque térmico a gás natural apontada na NT 143-SRG

Assim, a Abrace estima que o montante a ser glosado seja superior a

R$ 1,30 bilhão, já considerados os valores para o exercício de 2016, assim como

aqueles relativos ao período de maio a dezembro de 2015.

8.1.4 Preço regulatório do transporte do gás natural em Manaus

Ainda sobre o tema, vale reiterar o que foi apontado pela Abrace em

seu pedido de reconsideração contra a Resolução Homologatória n. 2.005/2015,

mediante a qual foi fixado o "preço regulatório do gás natural em Manaus,

contratado pela Eletrobrás Amazonas Distribuidora de Energia, para fins de

reembolso pela Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis – CCC, resultado da

Audiência Pública n. 05/2014".

8.1.4.1 Preço regulatório do transporte do gás natural em Manaus

Em 19 de fevereiro de 2014, o Plenário do Tribunal de Contas da

União – TCU –, por meio do Acórdão n. 336/2014, apresentou os resultados de sua

"auditoria operacional sobre os impactos nas tarifas de energia elétrica no Brasil em

decorrência de políticas aplicáveis aos Sistemas Isolados, com enfoque na Conta de

Combustíveis Fósseis (CCC) e nas perdas elétricas".

Diante da identificação de diversas irregularidades atinentes ao

Contrato de Compra e Venda de Gás Natural OC 1902/2006, celebrado pela

Companhia de Gás do Amazonas – Cigás – e pela Eletrobras Amazonas

Distribuidora de Energia – AmE –, o Plenário do TCU determinou à Aneel que, em

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articulação com a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis –

ANP –, fixasse preço regulatório para o reembolso do combustível pela CCC, à vista

da impossibilidade de se considerar o preço indicado pelos agentes envolvidos na

operação:

"ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em: [...] 9.2. [...] determinar à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que: 9.2.1. adote, no prazo de 90 (noventa) dias, articuladamente com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), providências para que seja fixado o preço regulatório do combustível gás natural associado ao Contrato de Compra e Venda de Gás Natural OC 1902/2006 para fins de reembolso pela Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis (CCC), em cumprimento ao art. 3º, inciso VII, da Lei nº 9.427/1996;"

Em 13 de março de 2014, a Aneel instaurou a Audiência Pública n.

05/2014, voltada à obtenção de "subsídios para a fixação do preço regulatório do

gás natural em Manaus, contratado pela Eletrobras Amazonas Energia, para fins de

reembolso pela Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis – CCC".

Ao encerrar a AP n. 05/2014, a Aneel, por meio da Resolução

Homologatória n. 2.005/2015, (i) aprovou o valor de 11,4867 R$/MMBtu (ref.

dez/2009), indicado pela ANP, a ser reembolsado pela CCC, bem como (ii)

determinou à Eletrobras, gestora da Conta, que fossem recontabilizados os valores

acima desse limite reembolsados em períodos anteriores.

8.1.4.2 Poder-dever da Aneel de estabelecer limites para o reembolso

No voto condutor da Resolução Homologatória n. 2.005/2015, o

Diretor Relator Reive Barros dos Santos pontuou que, no curso da AP n. 05/2014, a

Abrace manifestou preocupação com o elevado aumento de 272% do preço do

transporte do gás natural ocorrido entre as fases pré-contratual e pós-implantação

do gasoduto Urucu-Coari-Manaus, preocupação essa compartilhada pela

Superintendência de Regulação dos Serviços de Geração – SRG:

"A Abrace fez críticas, dentre outros, ao elevado aumento do preço do transporte ocorrido entre as condições pré-contratuais,

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contratuais e pós-implantação do gasoduto, que resultou num aumento de 272% sem que os contribuintes pudessem participar do processo de tomada de decisão. Por fim, solicitou à SRG que faça comparações objetivas acerca do custo de geração a gás versus os demais combustíveis disponíveis em Manaus. A SRG esclareceu que compartilha da preocupação com o resultado da contratação do gás natural, entendimento que pode ser observado em todas as suas Notas Técnicas sobre o tema."

Conforme registrado nesse mesmo voto, a aprovação do gasoduto se

lastreou na premissa de que o preço do transporte do gás natural seria de R$

4,36/MMBtu – preço esse mais de três vezes menor do que o preço provisório

praticado pela Aneel – R$ 13,31/MMBtu – e ainda mais de duas vezes menor do que

o preço definitivo fixado na Resolução Homologatória n. 2.005/2015 – 11,4867

R$/MMBtu:

"Já as premissas anteriores à assinatura do contrato, que levaram à decisão da implantação do gasoduto, constantes da Carta nº CTA-DE-012719/20051 , de 08/11/2005, na qual o presidente da Eletrobras encaminha ao Ministro de Estado de Minas e Energia as condições de negociação da contratação do referido gasoduto, são as seguintes (US$ 1,00 = R$ 3,01):

Volume: 5.500.000 m³/dia

Preço do transporte: R$ 4,36/milhão BTU

Preço do gás (molécula): R$ 3,01/milhão BTU

Margem de distribuição: R$ 0,45/milhão BTU

Fator de ship-or-pay: 100%

Fator de take-or-pay: 80%"

Alegou o Diretor Relator, contudo, que, apesar de ciente da elevação

exponencial da rubrica, a Agência não poderia deixar de reconhecer o valor de

11,4867 R$/MMBtu indicado pela ANP, haja vista que a Aneel não teria competência

para fixar a tarifa de transporte de gás natural ou mesmo para discutir as premissas

utilizadas no seu cálculo:

"Entretanto, cabe ponderar que a atribuição para a definição da tarifa de transporte é da ANP e, assim, a ANEEL não é o fórum adequado para a discussão das premissas utilizadas no cálculo da tarifa. Dessa forma, há que se considerar o valor sugerido pela ANP, sem qualquer alteração."

Tais afirmações não procedem.

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De acordo com a legislação de regência, a Aneel não deve ser

passiva na fixação do preço do transporte do gás natural e muito menos na

aprovação dos valores a serem reembolsados pela CCC – contrariamente, possui

papel relevante em ambos os processos.

Com efeito, a Lei n. 9.427/1996, em seu artigo 3º, inciso VII,

textualmente compete à Aneel, em articulação com a ANP, estabelecer os critérios

para a fixação dos preços de transporte do gás natural, quando tal combustível é

destinado à geração de energia elétrica:

"Art. 3o Além das atribuições previstas nos incisos II, III, V, VI, VII, X, XI e XII do art. 29 e no art. 30 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, de outras incumbências expressamente previstas em lei e observado o disposto no § 1o, compete à ANEEL: [...] VII - articular com o órgão regulador do setor de combustíveis fósseis e gás natural os critérios para fixação dos preços de transporte desses combustíveis, quando destinados à geração de energia elétrica, e para arbitramento de seus valores, nos casos de negociação frustrada entre os agentes envolvidos;"

Na mesma linha, o Decreto n. 7.246/2010, o qual regulamenta a Lei n.

12.111/2009, prevê, em seu artigo 11, §§ 3º e 9º, que compete à Aneel limitar os

valores de reembolso de custos pela CCC – inclusive aqueles despendidos com

transporte de combustíveis –, com vistas a incentivar a eficiência econômica e

energética nos Sistemas Isolados:

"Art. 11. A CCC reembolsará o montante igual à diferença entre o custo total de geração de energia elétrica para o atendimento ao serviço público de distribuição de energia elétrica nos Sistemas Isolados e a valoração da quantidade correspondente de energia elétrica pelo custo médio da potência e energia comercializadas no Ambiente de Contratação Regulada - ACR do SIN.

§ 3

o Desde que não incluídos no preço e no custo de que tratam,

respectivamente, os incisos I e II do § 2o, serão também reconhecidos

para efeito de reembolso da CCC os custos relativos ao preço dos combustíveis para geração de energia elétrica própria ou de terceiros, incluindo, quando for o caso, as despesas de transporte, de reserva de capacidade de transporte dutoviário e de reserva de consumo mínima. § 9

o Para incentivar a eficiência econômica e energética, a ANEEL

poderá estabelecer limites para o reembolso dos custos de que trata o § 2

o, incisos II e V, e § 3

o, caso a contratação seja direta,

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por meio de metas que assegurem a sustentabilidade econômica dos agentes."

Portanto, não há dúvidas de que a Aneel (i) não está submetida a

qualquer determinação da ANP quanto à fixação do preço do transporte do gás

natural destinado à geração de energia elétrica e (ii) não apenas pode, mas deve

atuar ativamente na apuração e eventual limitação dos valores a serem

reembolsados pela CCC.

De toda sorte, ainda que a Aneel fosse passiva na fixação do preço

do transporte de gás natural – o que se admite apenas para fins argumentativos –, é

certo que sob nenhuma hipótese poderia a Agência deixar de exercer sua

competência exclusiva de limitar o repasse desse custo à CCC.

Do contrário, todo o citado § 9º do Decreto n. 7.246/2010, que delega

à Aneel a atribuição de zelar pela eficiência econômica e energética mediante a

limitação dos reembolsos de custos pela CCC, seria inócuo, o que, em Direito, não

se admite, pois "não se presumem, na lei, palavras inúteis":

“‘Não se presumem, na lei, palavras inúteis.’ Literalmente: ‘Devem-se compreender as palavras como tendo alguma eficácia.’ As expressões do Direito interpretam-se de modo que não resultem frases sem significação real, vocábulos supérfluos, ociosos, inúteis. Pode uma palavra ter mais de um sentido e ser apurado o adaptável à espécie, por meio do exame do contexto ou por outro processo; porém a verdade é que sempre se deve atribuir a cada uma a sua razão de ser, o seu papel, o seu significado, a sua contribuição para precisar o alcance da regra positiva. Este conceito tanto se aplica ao Direito escrito, como aos atos jurídicos em geral, sobretudo aos contratos, que são leis entre as partes. Dá-se valor a todos os vocábulos e, principalmente, a todas as frases, para achar o verdadeiro sentido de um texto; porque este deve ser entendido de modo que tenham efeito todas as suas provisões, nenhuma parte resulte inoperativa ou supérflua, nula ou sem significação alguma.”

17

No ponto, observa-se, ainda, que a determinação, constante do

Acórdão n. 336/2014 do TCU, de fixação de valor regulatório para o transporte do

gás natural em Manaus foi dirigida à Aneel, a qual, nos termos da legislação

supramencionada, deveria atuar em colaboração com a ANP, e não em regime de

submissão a essa Agência.

17

Maximiliano, CARLOS. Hermenêutica e aplicação do direito. – 19ª ed. – São Paulo: Forense,

2006, p. 204.

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36

De fato, tal qual revela o voto proferido pelo Diretor Relator do

processo, a determinação feita pelo TCU não foi plenamente atendida pela Aneel,

pois, apesar de ter instaurado audiência pública sobre o tema, a Agência:

(i) no que se refere à fixação do preço do transporte do gás natural

em Manaus, se limitou a reproduzir o valor indicado pela ANP, sem

conduzir análise própria; e

(ii) deixou de exercer sua competência exclusiva de limitar o

reembolso, pela CCC, de custos que não convirjam com a eficiência

econômica e energética.

Com efeito, foi um contrassenso a postura da Aneel de instaurar e

conduzir audiência pública para obter "subsídios para a fixação do preço regulatório

do gás natural" se, ao final, simplesmente encamparia passivamente indicação de

preço da ANP.

8.1.4.3 Impossibilidade de se adotarem como parâmetro os custos

efetivamente incorridos

Ademais, observa-se da Nota Técnica n. 11/2015-SCM, utilizada pela

ANP para fundamentar o valor proposto de 11,4867 R$/MMBtu, que os cálculos

efetuados por aquela Agência levam em consideração a apuração dos "custos

efetivamente incorridos na construção e operação do gasoduto" Urucu-Coari-

Manaus:

"Inicialmente, cabe destacar que dentre as considerações finais da Nota Técnica n° 013/2010 a equipe técnica da SCM/ANP chamou a atenção para a importância da plena comprovação dos custos efetivamente incorridos na construção e operação do Gasoduto U-C-M quando o mesmo estivesse em sua fase operacional, com destaque para os valores informados pela Transportadora Associada de Gás S.A. (TAG) a título de contingências."

Ocorre que, como exaustivamente demonstrado no Acórdão n.

336/2014 do TCU, o valor regulatório a ser fixado pela Aneel não pode ser dado em

função do custo efetivamente incorrido na construção e operação do gasoduto em

referência.

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37

A fixação do valor segundo o custo consiste na regra definida no

Contrato de Compra e Venda de Gás Natural OC 1902/2006.

Contudo, o contrato em questão, justamente em razão de tal

disposição – que deixou em aberto o preço final da contratação –, foi considerado

ilegal pelo TCU, por violar o artigo 55, inciso III, da Lei n. 8.666/1993:

"3.1.1. O Contrato OC 1902/2006 (gasoduto Urucu-Manaus) fere o art. 55, inciso III, da Lei 8.666/1993 [...] O presente contrato se rege pelas disposições da Lei 8.666/1993. Isso porque a própria Lei de Licitações indica, em seu art. 24, inciso XXII, ser dispensável a licitação para a contratação de fornecimento ou suprimento de gás natural. Esse foi o fundamento registrado no contrato para a dispensa de licitação (peça 35, p. 4), portanto, trata-se, indubitavelmente, de contrato administrativo que deve atender plenamente às disposições da Lei 8.666/1993. No entanto, o contrato foi assinado sem valor fixo para o transporte do gás. [...] A contratação da parcela de transporte foi realizada na modalidade open book: realizou-se uma estimativa do preço a ser pago, considerando uma avaliação de fluxo de caixa descontado, a partir de premissas de custos estabelecidas no contrato. O preço final, no entanto, deveria ser recalculado de acordo com a apuração dos custos definitivos de todos os investimentos no sistema de transporte quando da conclusão das obras (peça 35, p. 23), o que vai de encontro, portanto, ao art. 55, inciso III, da Lei 8.666/1993, uma vez que não foi definido preço fixo. [...] No parecer contratado pela Eletrobras, inclusive, está explícito que as dispensas de licitação precisam justificar o preço. No caso presente, não há preço definido, tão somente uma expectativa, ferindo a Lei 8.666/1993, que estipula como cláusulas necessárias em todo contrato "o preço e as condições de pagamento". Assim, o parecer apresentado não enfrentou a questão levantada no relatório preliminar no que se refere ao preço do contrato, que não foi fixado. Acrescente-se que a celebração de contrato open book, além de ter consumado ilegalidade, por infração ao art. 55, inciso III, da Lei 8.666/1993, constituiu a prática de ato antieconômico ao permitir significativas majorações dos custos estimados para o gasoduto e para os ramais de distribuição, elevando o custo da energia gerada com o gás a patamares semelhantes ao da gerada com óleo combustível. Portanto, há a necessidade de apuração da responsabilidade dos gestores da Eletrobras pelo fato de o contrato ter sido firmado na modalidade open book, sem preço previamente definido."

Destarte, não pode a Aneel passivamente acolher e reproduzir valor

apurado pela ANP em desconformidade com as ressalvas feitas pelo TCU e, pior

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ainda, perpetuar os efeitos da ilegalidade do contrato celebrado pela Cigás e pela

AmE.

Para que se tenha adequada percepção a respeito do impacto dessa

postura passiva da Aneel, que conduz à remuneração de investimento com valores

superfaturado, a tarifa calculada pela ANP resulta no valor de 1,266 bilhão de reais

para 2016.

Considerando a proposta da SRG de efetuar glosa nessa parcela

transporte em razão da incapacidade do parque térmico de Manaus consumir toda a

quantidade contratada de gás natural (glosa de 25,9%), o custo do transporte desse

combustível, a ser suportado pela CCC em 2016, alcançaria 930,17 milhões de

reais.

Esse valor de quase 1 bilhão de reais anuais para remunerar um

investimento que, conforme destacado pelo Diretor Romeu Rufino no processo que

tratou do pedido de sub-rogação à CCC dos custos de implantação desse gasoduto,

tinha valor de projeto estimado em R$ 2,488 bilhões, mostra-se impróprio, ainda

mais se considerado que o contrato do gasoduto encerra em 2030.

Se a comparação de valores absolutos já revela o quão descabido é a

utilização da tarifa de transporte calculada com valores superfaturados de

investimento, o custo unitário da parcela transporte do gás natural também chama a

atenção pela sua magnitude.

Conforme apontado pela SRG, a capacidade de geração do parque

térmico a gás de Manaus é de 590 MWméd. Ao dividir o valor de 930,17 milhões de

reais (valor da parcela transporte proposto na AP 083/2015) pelo montante anual de

energia, alcança-se o valor unitário de R$ 180/MWh.

Imagine uma usina que, para acessar os sistemas de

transmissão/distribuição, tivesse que pagar uma tarifa de uso da ordem de R$

180/MWh. Indubitavelmente, esse projeto não apresentaria viabilidade econômica.

A analogia entre parcela de transporte de gás natural e encargos de

transmissão permite mostrar o real impacto do custo do transporte de gás natural na

CCC.

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39

Se somados, ao custo da parcela transporte, os custos da parcela

commodity e os valores de receita fixa dos geradores, chega-se ao valor unitário de

R$ 372,5/MWh, ou seja, a CCC suporta uma geração de grande porte (590 MWméd)

ao custo unitário de mais de 370 reais a unidade de energia.

8.1.4.4 Necessidade de remuneração do valor a ser devolvido aos

consumidores

Por fim, observa-se que, apesar de ter determinado à Eletrobras que

recontabilize os reembolsos pela CCC efetuados a maior, com base no valor

provisório de R$ 14,31/MMBtu (retroativo a dez./2009), a Aneel não definiu que o

valor indevidamente recolhido do consumidor, quando devolvido, será atualizado e

remunerado.

Portanto, faz-se necessário que a Aneel acrescente à Resolução

Homologatória n. 2.005/2015 previsão no sentido de garantir que, tanto a inflação

registrada no período quanto o custo dos recursos indevidamente apropriados sejam

ressarcidos, podendo ser representados pela taxa Selic do período, acrescida de um

prêmio médio que reflita o custo de captação dos consumidores brasileiros.

Importante ressaltar a necessidade de inclusão deste prêmio

adicional, pois a indústria, o comércio e a população em geral no Brasil não têm

acesso a recursos a custo tão baixo quanto a Selic.

Logo, sem a adoção desse prêmio adicional ficaria caracterizada a

criação, pela Aneel, de inusitado subsídio tomado dos consumidores para beneficiar

agentes do setor.

8.1.5 Obrigações pendentes da CCC

8.1.5.1 Nota técnica da SRG e voto do Diretor Relator

Tal qual apontado na NT 143, a Eletrobras incluiu no PAC o valor de

R$ 4.717.223.514,46, referente às seguintes supostas obrigações pendentes da

CCC:

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"– R$ 383.080.000,00 referentes a reembolsos de custo total de geração até set/2015;

– R$ 874.857.380,61 referentes a reembolsos de tributos não recuperados até set/2015, excluídos tributos do período de 2009 a 2013;

– R$ 3.318.195.617,45 referentes a contratos de confissão de dívida assinados entre a gestora da conta CCC e os beneficiários;

– R$ 141.090.516,40 referentes a reserva para quitação de passivos."

Segundo registrou a SRG, esse valor deixou de ser incluído no

orçamento submetido à AP 83/2015 devido à falta de "dados e documentos [...] que

comprovem as respectivas despesas".

Contudo, a área técnica e o Diretor Relator do processo deixaram em

aberto a possibilidade de que tal valor passe a constar do orçamento, a depender

dos demonstrativos a serem apresentados pela Eletrobras.

8.1.5.2 Relatório de Fiscalização da SFF

Acerca do tema, é imperativo que se atente para as constatações

feitas pela Superintendência de Fiscalização Econômica e Financeira – SFF – no

Termo de Notificação n. 66/2014, no qual os próprios técnicos da área e consultores

independentes da Ernst & Young apontaram inúmeras não conformidades incorridas

pela Eletrobras na gestão da CCC, as quais impediram que a Superintendência

homologasse ou apurasse as supostas obrigações pendentes da Conta.

No ponto, citem-se os seguintes excertos do Memorando n.

736/2015-SFF, nos quais a área afirma expressamente não ter podido analisar e

homologar reembolsos da CCC desde julho de 2009, devido à extrema

desorganização da Eletrobras, que inclui a perda de dados, a alteração de dados

históricos, a inexistência de sistema computacional de gestão, a não demonstração

de valores processados, entre outros:

"Assim sendo, em função das constatações da fiscalização, e ainda considerando a manifestação da Eletrobras, não foi possível a análise de qualquer passivo da conta CCC para todo o período fiscalizado, devido as severas dificuldades de apuração das informações apresentadas pela respectiva gestora, tais como controles ineficientes, inexistência de um sistema computacional de gestão, falta de críticas, perdas e alterações de históricos de

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dados, não realização do levantamento do passivo dos beneficiários da conta, não demonstração de valores processados para inúmeras competências, bem como diversos outros fatores que estão em desencontro ao estabelecido pela Resolução Normativa 427/2011. [...]

Considerando que a Eletrobras não atendeu o prazo estipulado e até o momento não encaminhou as informações solicitadas para que o grupo consiga adequadamente dar prosseguimento ao processo de homologação dos valores de reembolso da CCC desde julho/2009 até o último mês processado de 2015, estuda-se novas alternativas para o andamento dos trabalhos. Ressalte-se ainda, que, conforme expresso na Ata de Reunião com a Eletrobras, itens 3, 8, 13, 14, 16 e 17, existem pendências regulatórias específicas que necessitam de conclusão pela ANEEL para a consolidação do processo."

Do Termo de Notificação n. 66/2014, no qual tais condutas estão

exaustivamente detalhadas, vale citar as seguintes passagens:

"Não Conformidade (NC.1): A ELETROBRAS não se adequou a aplicabilidade da Resolução Normativa nº 427/11, no que diz respeito ao cálculo do reembolso desde julho de 2009, ou seja, não realizou o levantamento do passivo de cada beneficiário anterior à adoção do referido ato normativo [...] Constatou-se que o Banco de Dados mantido pela ELETROBRAS relacionado ao monitoramento de oferta [...] não contém [...] informações de custo total com contratação de potência e energia elétrica disponibilizado pelo agente de distribuição nos Sistemas Isolados. Não Conformidade (NC.2): A ELETROBRAS não se enquadrou plenamente no atendimento aos controles de informações mensais recebidas dos custos totais com contratação de potência e energia elétrica, conforme o estabelecido na Resolução Normativa n. 427/11 [...] Não Conformidade (NC.3): Descumprimento das divulgações, no site da ELETROBRAS, das informações da CCC [...] Constatou-se que não houve a elaboração dos documentos do PAC (Plano Anual de Custos) para os anos de 2010, 2011 e 2012. Não Conformidade (NC.4) Descumprimento no que diz respeito à elaboração do Plano Anual de Custos da CCC, conforme estabelece a Resolução Normativa nº 427/11 [...] Constatou-se que a ELETROBRAS não utiliza os dados de quantidade de energia gerada e de combustível consumido oriundos do Sistema de Coleta de Dados Operacionais – SCD. Não conformidade (NC.5)

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Não atendimento pleno da Resolução Normativa nº 427/11, no que diz respeito do uso do Sistema de Coleta de Dados Operacionais – SCD [...] Constatou-se que, para a amostra selecionada, as informações utilizadas pela ELETROBRAS na composição do custo de geração própria são declaradas pelo agente beneficiário. A ELETROBRAS não realiza a conferência da conformidade das informações recebidas. Não Conformidade (NC.6) Descumprimento do art. 7º da Resolução Normativa nº 427/11, no que diz respeito ao tratamento das informações declaradas pelos agentes beneficiários [...]"

Fica evidente, a partir das constatações da SFF, que a ausência de

comprovação, pela Eletrobras, dos R$ 4.717.223.514,46 referentes às supostas

obrigações pendentes da CCC vai muito além da simples não apresentação de

determinados documentos, ou seja, vai muito além de algo que poderia ser sanado

no curso da AP n. 83/2015.

O Relatório de Fiscalização da SFF noticia a verdadeira ausência de

condições mínimas para a adequada gestão da Conta, sobretudo diante da falta de

transparência na divulgação e disponibilização de dados, da inobservância de

requisitos básicos de controle – como a conferência de dados recebidos pelos

próprios beneficiados pelos reembolsos da CCC – e até mesmo a ausência de

elaboração de PAC por três anos consecutivos.

Nesse cenário, além de não haver nenhuma condição para que o

valor de R$ 4.717.223.514,46 seja incluído no orçamento da Conta, mostra-se

imperativo que a Agência dê prosseguimento ao processo de fiscalização iniciado

com o Termo de Notificação n. 66/2014, lavre os correspondentes autos de infração

e, confirmadas as graves evidências apontadas, aplique as penalidades cabíveis

contra a Eletrobras – sem prejuízo de que sejam determinadas correções estruturais

em seus processos de gestão.

8.1.5.3 Cenário semelhante ao de 2015

Mostra-se pertinente destacar que as obrigações pendentes da CCC

destacadas pela Eletrobras no PAC 2016 guardam semelhança com aquelas

apontadas pela gestora da CCC no PAC 2015, inclusive em termos de valor total.

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Segundo o PAC 2015 submetido pela Eletrobras à Aneel, foram

registrados “valores da ordem de R$ 4.301.916.799,15” assim descritos:

"– R$ 2.841.711.824,50 referem-se a compromissos do ciclo anterior até setembro (ou ciclos anteriores) que face algum motivo não foram liberados e estão considerados como Obrigações para 2015 (...);

– R$ 1.319.114.458,26 referem-se aos valores a serem transferidos para os beneficiários a título de Tributos (ICMS e PIS/PASEP e COFINS) do período 2009 a 2013, conforme REN 597/2013;

– R$ 3.318.195.617,45 referentes a contratos de confissão de dívida assinados entre a gestora da conta CCC e os beneficiários;

– R$ 141.090.516,40 refletem a necessidade de captação para transferência para a conta corrente mantida para quitação futura dos valores do Passivo do Fundo."

Confrontando os registros do PAC 2016 com os do PAC 2015, chama

atenção a última rubrica em virtude da repetição do valor, porém com descrição

alterada:

PAC 2016:

“– R$ 141.090.516,40 referentes a reserva para quitação de passivos”

PAC 2015:

“– R$ 141.090.516,40 refletem a necessidade de captação para transferência para a conta corrente mantida para quitação futura dos valores do Passivo do Fundo."

Ademais, cabe ressaltar que, em ambos os documentos de prestação

de contas da CCC, a Eletrobras registra que o passivo do fundo, cujo tratamento

deve observar o disposto nos artigos 47 a 49 da Resolução Normativa n. 427/2011,

não é incluído no PAC “em função de existir mecanismo pré-definido para a sua

quitação”.

Assim, na medida em que a CCC foi gerida pela Eletrobras ao longo

de 2015 com a existência de obrigações pendentes de mesma magnitude daquelas

apontadas no PAC 2016, sem a necessidade de aumento das quotas de CDE, não

se afigura devido aplicar tratamento diferente para esse ano, ainda mais diante da

demostrada necessidade de apuração dos valores envolvidos pela área de

fiscalização da Agência.

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8.1.6 Urgente deliberação do Processo n. 48500.003390/2013-98 –

reembolso devido pela AmE à CCC

Por meio da Nota Técnica n. 44/2014, juntada ao Processo n.

48500.003390/2013-98, a Superintendência de Fiscalização dos Serviços de

Geração – SFG:

(i) analisou "os dispêndios realizados no âmbito da [...] CCC para o

atendimento do Sistema Manaus logo após a disponibilização do gás

natural às usinas da região pela CIGÁS/PETROBRAS";

(ii) apresentou os cálculos que valoram "os prejuízos causados à

CCC pela não conversão para gás natural das UTEs da AmE nos

prazos definidos em contrato"; e

(iii) recomendou à Diretoria que demandasse da Amazonas

Distribuidora de Energia – AmE o reembolso de R$ 143.462.787,00 à

CCC.

Conforme explicitado na aludida nota técnica, a CCC é credora da

AmE em R$ 90.183.594,43 "por não ter efetuado a conversão para operação a gás

natural das UTEs Anamã, Anori, Caapiranga, Coari e Codajás "em prazo adequado

para que fosse utilizada a capacidade do gasoduto concernente às obrigação de

Ship or Pay e Take or Pay".

A Conta é credora da distribuidora em outros R$ 53.279.193,55 em

razão de a AmE "ter operado utilizando óleo [em vez de] gás natural".

A relatoria do processo em referência foi distribuída ao Diretor Reive

Barros dos Santos, o qual pautou o caso para julgamento na 25ª Reunião Pública

Ordinária da Diretoria de 2015, realizada em 14 de julho de 2015.

No entanto, o caso foi retirado de pauta.

Considerando que a definição da CDE/2016 é iminente, deve o

referido processo ser pautado e deliberado antes da conclusão da Audiência Pública

relativa à CDE/2016.

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8.1.7 Estimativa do montante total que deve ser glosado da CCC para

o orçamento de 2016

Pelo que foi exposto na subseção 8.1, a Abrace estima que o valor

total a ser glosado pela Aneel, a título de CCC para o exercício de 2016, seja

superior a R$ 4,5 bilhões, levando-se em consideração a correção para o presente

orçamento, assim como a devolução retroativa de valores cobrados indevidamente

em anos anteriores.

8.2 Descontos Tarifários

A destinação de recursos da CDE para "compensar descontos

aplicados nas tarifas de uso dos sistemas elétricos de distribuição e nas tarifas de

energia elétrica" possui previsão no artigo 13, inciso VII, da Lei n. 10.438/2002.

Conforme arrolado no artigo 1º do Decreto n. 7.891/2013, os

descontos tarifários, ou subsídios tarifários, a serem suportados pela CDE são os

seguintes:

"Art. 1o A Conta de Desenvolvimento Energético - CDE, além de suas

demais finalidades, custeará os seguintes descontos incidentes sobre as tarifas aplicáveis aos usuários do serviço público de distribuição de energia elétrica, nos termos do inciso VII do caput do art. 13 da Lei n

o 10.438, de 26 de abril de 2002:

I - redução na tarifa de uso do sistema de distribuição incidente na produção e no consumo da energia comercializada por empreendimento enquadrado no § 1

o do art. 26 da Lei n

o 9.427, de 26

de dezembro de 1996;

II - redução na tarifa de uso do sistema de distribuição e na tarifa de energia incidentes no consumo de energia da atividade de irrigação e aquicultura realizada em horário especial de unidade consumidora classificada como rural, devido à aplicação do art. 25 da Lei nº 10.438, de 2002;

III - redução na tarifa de uso do sistema de distribuição e na tarifa de energia concedida às concessionárias e permissionárias de distribuição de energia elétrica, devido à aplicação dos arts. 51 e 52 do Decreto n

o 4.541, de 23 de dezembro de 2002;

IV - redução na tarifa de uso do sistema de distribuição e na tarifa de energia aplicável à unidade consumidora classificada como de serviço público de água, esgoto e saneamento, nos termos deste Decreto;

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V - redução na tarifa de uso do sistema de distribuição e na tarifa de energia aplicável à unidade consumidora classificada como rural, nos termos deste Decreto;

VI - redução na tarifa de uso do sistema de distribuição e na tarifa de energia aplicável à unidade consumidora classificada como cooperativa de eletrificação rural, inclusive às cooperativas regularizadas como autorizadas, nos termos deste Decreto; e

VII - redução na tarifa de uso do sistema de distribuição e na tarifa de energia aplicável à unidade consumidora da classificada como serviço público de irrigação, nos termos deste Decreto."

Segundo informado na Nota Técnica n. 329/2015-SGT (NT 329), a

previsão de gastos da CDE com descontos tarifários em 2016 é de R$ 5,926

bilhões, assim divididos:

Figura 1 – Participação de cada subsídio no custo total

Observa-se não haver nenhuma informação quanto à fiscalização do

rol de beneficiários dos descontos.

Contrariamente, a SGT afirma que apenas atualizou os valores de

repasse vigentes com base na previsão de variação do mercado e no IPCA:

"A previsão de gastos da CDE com descontos tarifários em 2016, de R$ 5,926 bilhões, foi realizada por esta Superintendência com base nos valores dos repasses mensais vigentes, fixados nas resoluções homologatórias de cada distribuidora, sobre os quais aplicou-se, a partir do respectivo mês de aniversário contratual, a previsão de

variação do mercado, de 2,41%, e do IPCA, de 6,70%."

É preciso que a Aneel proveja maiores informações, no curso da

Audiência Pública, acerca dos procedimentos de auditagem dos dados considerados

em seus cálculos.

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Tome-se como exemplo da necessidade de fiscalização o desconto

tarifário, de mais R$ 680 milhões, destinado ao agricultor irrigante.

Consoante previsto na Lei n. 12.787/2013, a qual "dispõe sobre a

Política Nacional de Irrigação", para que pessoa física ou jurídica possa exercer

agricultura irrigada, é preciso que obtenha licenciamento ambiental ou mesmo a

outorga do direito de uso de recursos hídricos, conforme o caso:

"Art. 22. A implantação de projeto de irrigação dependerá de licenciamento ambiental, quando exigido em legislação federal, estadual, distrital ou municipal específica. [...] Art. 23. A utilização de recurso hídrico por projeto de irrigação dependerá de prévia outorga do direito de uso de recursos hídricos, concedida por órgão federal, estadual ou distrital, conforme o caso. [...] § 3

o Os projetos de irrigação que não tenham outorga do direito de

uso de recursos hídricos na data da vigência desta Lei deverão requerer a outorga no prazo e condições a serem estabelecidos pelo órgão federal, estadual ou distrital a que se refere o caput."

Essa mesma lei estabelece que competirá ao Sistema Nacional de

Informações sobre Irrigação manter cadastro único dos agricultores irrigantes:

"Art. 8o É instituído o Sistema Nacional de Informações sobre

Irrigação, destinado a coleta, processamento, armazenamento e recuperação de informações referentes à agricultura irrigada, em especial sobre: [...]

§ 2o O Sistema Nacional de Informações sobre Irrigação manterá

cadastro nacional único dos agricultores irrigantes."

O número de agricultores irrigantes considerado pela Aneel foi

informado pelo Sistema Nacional de Informações sobre Irrigação?

Existe fiscalização quanto à obtenção das licenças ambientais

cabíveis pelos irrigantes beneficiados pelo desconto tarifário?

A partir do artigo 107, caput, da Resolução Normativa n. 414/2010,

depreende-se que a Aneel não faz nenhum tipo de análise quanto à elegibilidade do

irrigante ao benefício, mas exige apenas um requerimento por escrito – ou por outro

meio passível de comprovação – do pretenso beneficiário:

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"Art. 107. A distribuidora deve conceder desconto especial na tarifa de uso do sistema de distribuição e na tarifa de energia incidentes no consumo de energia elétrica ativa, exclusivamente, na carga destinada à irrigação vinculada à atividade de agropecuária e na carga de aquicultura, desde que o consumidor efetue a solicitação por escrito ou por outro meio que possa ser comprovado."

Constata-se, portanto, existir, mais do que uma possibilidade real,

uma alta probabilidade de que o benefício esteja sendo concedido indevidamente a

pessoas físicas e jurídicas que, de acordo com a legislação específica atinente à

irrigação, não estão aptos a se estabelecerem como agricultores irrigantes.

Alguns estudos sobre a redução da vazão do rio São Francisco, que

tem sido nos últimos anos consistentemente inferior à média histórica, indicam o uso

irregular – e ilegal da água como uma das causas do problema. Em alguns destes

estudos, as áreas utilizadas para irrigação com pivôs centrais, conforme

comprovação de imagens do Google Earth, são apontadas como incompatíveis com

as autorizações efetivamente concedidas para projetos regulares de irrigação que

deveriam fazer jus ao desconto tarifário.

Aqui importante registrar que caso, por falta de fiscalização, esteja

sendo subsidiado e promovido o uso irregular da água, a CDE e sua gestão estariam

sendo um instrumento de estímulo à destruição do meio ambiente e dos recursos

renováveis.

A Abrace solicita mais uma vez ao regulador que apresente

informações detalhadas a respeito da evolução dos dispêndios em relação aos

subsídios tarifários.

É muito importante que a sociedade tenha acesso a informações

sobre todos os custos vinculados aos subsídios, separando-os por distribuidora e de

forma que seja possível avaliar a razoabilidade e sustentabilidade de cada um deles.

Os subsídios tarifários têm ganhado uma dimensão significativa e

necessitam ser acompanhados cada vez mais de perto. No orçamento de 2015, o

montante aprovado foi de R$ 5,4 bilhões, conferindo um aumento de 33% em

relação a 2014. Conforme apresentado acima, para o orçamento ora em discussão,

propõe-se considerar um custo de quase R$ 6 bilhões.

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Como consequência dos recentes mecanismos de incentivo à

geração distribuída, cuja regulamentação foi recentemente revisada e publicada pela

Aneel por meio da Resolução Normativa n. 687/2015, há a expectativa de que os

custos associados descontos tarifários continuem aumentando e, a médio e longo

prazo eles poderão se tornar insustentáveis, visto que sua participação no custo total

da energia ganha cada vez mais relevância.

Por isso, a Abrace solicita à Aneel que realize estudo aprofundado

sobre como os benefícios das políticas públicas voltadas aos subsídios tarifários

impactam o setor como um todo. Muito especialmente é importante refletir sobre o

modelo de subsídio dado nos custos de transporte, mas cujos custos são alocados

na proporção da energia consumida. Com isso, os benefícios são maiores nas

tensões mais baixas e os impactos pesam mais nas tensões maiores, justamente

nos consumidores eletrointensivos. Este movimento que faz, por exemplo, que

siderúrgicas subsidiem shopping centers, é extremamente preocupante e vem

destruindo valor na economia brasileira.

Mais ainda, cabe uma reflexão sobre qual o montante de subsídio

necessário para cada situação e por quanto tempo ele deveria ser dado. Hoje,

infelizmente, há subsídios que se eternizam e que podem ser desnecessários.

Questiona-se, adicionalmente, se os objetivos vislumbrados, quando

da criação desses subsídios, já foram alcançados. Se eles já foram alcançados, qual

a justificativa para manutenção dos mesmos? Se ainda não foram, qual seria a

expectativa de cumprimento desses objetivos e como alcançá-los de forma mais

eficiente?

Embora a Abrace tenha conhecimento de que qualquer decisão a

respeito de políticas públicas não seja de competência da Aneel, a Associação

acredita que seja papel do regulador fazer as devidas avaliações para prover ao

Poder Concedente e formuladores de políticas informações que resultem em um

diagnóstico concreto em relação à sustentabilidade dessas políticas, de forma a se

delinear uma estratégia de médio e longo prazo para que seja possível cumprir os

objetivos de forma eficiente.

Além dos pontos considerados acima, a Abrace também chama a

atenção para o crescimento de mercado considerado no orçamento proposto para

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os descontos tarifários relativos a 2016. A Aneel estima que deverá haver uma

crescimento de mercado de 2,41%, quando dados do Programa Mensal da

Operação, do ONS, apontam para uma redução de cerca de 1% da carga do SIN em

2016.

Portanto, a Abrace também solicita à Aneel que ajuste o parâmetro de

crescimento de mercado de forma a ficar compatível com as expectativas oficiais do

ONS.

8.3 Programa Luz para Todos – PLpT

8.3.1 Ausência de motivação para o valor proposto

A destinação de recursos da CDE para "promover a universalização

do serviço de energia elétrica em todo o território nacional" foi prevista no artigo 13,

inciso I, da Lei n. 10.438/2002.

A definição do volume de recursos destinados à universalização do

serviço de energia elétrica é feita pela Aneel com base nas estimativas informadas

anualmente pelo Ministério de Minas e Energia – MME, o qual, nos termos do artigo

4º do Decreto n. 7.520/2011, é responsável pela coordenação do Programa Luz para

Todos – PLpT.

Para a composição do orçamento da CDE/2016, a SGT utilizou o

valor de R$ 972.529.015,25, apresentado pelo MME no Ofício n. 298, de 11 de

dezembro de 2015:

"Senhor Diretor-Geral,

1. Em resposta ao Oficio n° 160/2015-SGT/ANEEL, informamos a Vossa Senhoria os valores a serem considerados no cálculo das cotas anuais da CDE para 2016:

(i) Programa de universalização do serviço de energia elétrica: R$ 972.529.015,25;"

Chama a atenção a circunstância de o ofício em questão, que possui

uma única lauda, não conter nenhuma justificativa para o valor indicado.

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A Aneel, por seu turno, também não fornece nenhum elemento que

permita atestar a razoabilidade do valor informado pelo MME, tal qual se verifica da

NT 329, que dedica cinco parágrafos ao tema – quatro dos quais concernentes ao

fundamento legal e à responsabilidade pela gestão do PLpT:

"Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica “LUZ PARA TODOS” – PLpT para o período de 2011 a 2014,

foi instituído pelo Decreto no 7.520, de 8 de julho de 2011, e visa propiciar o atendimento de energia elétrica à parcela da população do meio rural que ainda não possui acesso a esse serviço público.

34. Posteriormente, em 30 de dezembro de 2014, o Decreto no 8.387, prorrogou o programa até 2018. Conforme regulamentado, a estrutura do Programa “LUZ PARA TODOS”, até o ano de 2018, é composta de um Comitê Gestor Nacional de Universalização e dos Comitês Gestores Estaduais, que exercem a gestão compartilhada do Programa

35. O Programa é coordenado pelo MME e operacionalizado pela Eletrobras, sendo que os recursos necessários à sua implantação são provenientes da CDE, na forma de subvenção econômica, da RGR, na forma de financiamento, e dos agentes setoriais (concessionárias e permissionárias de distribuição e cooperativas de eletrificação rural), na forma de investimento com recursos próprios.

36. As premissas para a implantação do PLpT são estabelecidas nos Termos de Compromisso celebrados entre cada agente setorial executor e a União, por intermédio do MME, com a interveniência da ANEEL e da Eletrobras.

37. Os dispêndios previstos para a execução do Programa em 2016 são de R$ 972,529 milhões, conforme informação do MME que consta do Ofício no 298/2015-SE-MME, de 11 de dezembro de 2015."

Destarte, verifica-se que, quanto a esse quesito, a Audiência Pública

n. 83/2015 tem caráter meramente formal, pois não há possibilidade de que os

agentes efetivamente contribuam ou se informem sobre o tema.

Observa-se, portanto, ter sido violado o artigo 16, inciso II e § 1º, da

Resolução Normativa n. 273/2007, o qual estabelece que os documentos

disponibilizados na audiência pública devem ser hábeis a motivar as propostas da

Agência:

"Art. 16. A Audiência Pública compreende: [...] II - a disponibilização de documentos no site da ANEEL; [...]

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§ 1º Os documentos referidos no inciso II deverão incluir a apresentação do tema e os fundamentos para as propostas em Audiência Pública, apresentados em linguagem coloquial."

Conforme ressaltado, os documentos disponibilizados pela Aneel na

AP n. 83/2015 apenas apresentam o tema, mas não justificam a proposta de

consideração do valor de R$ 972.529.015,25 no orçamento da CDE/2016.

Portanto, a Abrace solicita à Aneel que apresente informações

concretas sobre o programa, fazendo, inclusive, um balanço de anos anteriores,

separando os dados por distribuidora.

É importante que a sociedade tenha conhecimento sobre quanto cada

uma das distribuidoras investiu até o momento e quanto pretende investir em 2016,

apontando qual o preço médio estimado por ligação.

8.3.2 Necessidade de que o MME comprove a eficiência de custo das

ligações

De acordo com o artigo 7º do Decreto n. 7.520/2011, "as prioridades e

as alternativas tecnológicas para os atendimentos previstos no Programa 'LUZ

PARA TODOS', até o ano de 2018, observarão o disposto no Manual de

Operacionalização e no Manual de Projetos Especiais, a serem editados pelo

Ministério de Minas e Energia".

O Manual de Operacionalização do PLpT, por sua vez, determina

que, com o intuito de "otimizar a utilização dos recursos públicos", o Programa

"prioriz[e] o atendimento com tecnologia de rede de baixo custo e, de forma

complementar, com sistemas de geração descentralizada com ou sem redes

associadas".

Afigura-se inconteste que, sem prejuízo do objetivo de proporcionar o

serviço de energia elétrica "à parcela da população do meio rural que não possui

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acesso a esse serviço público"18, deve o MME primar pela adoção dos meios mais

econômicos possíveis para efetivar as ligações.

Ademais, deve o MME, também em nome da otimização da utilização

dos recursos públicos, efetuar análise de eficiência de custo das ligações custeadas

pelo PLpT – e, mais ainda, compartilhar os resultados dessa análise com os agentes

do setor.

Mostra-se imperativo que os valores necessários para efetivar

ligações de unidades consumidoras localizadas em regiões remotas sejam

confrontados com outras alternativas de atendimento da população.

Conforme estudo19 divulgado pela Companhia Paranaense de

Energia – Copel –, por exemplo, o custo, em 2010, para atendimento à população

residente em locais remotos no Estado do Paraná já era de aproximadamente R$ 60

mil por unidade consumidora, valor que em muito supera aquele dos próprios

imóveis supridos.

É possível que as dispendiosas ligações custeadas pelo PLpT – e,

em última análise, pelos consumidores pagantes da CDE – não sejam as

alternativas mais eficientes no atendimento a essa parcela da população.

É imperativo, portanto, que a Aneel, antes de incluir o valor indicado

pelo MME no orçamento da CDE/2016, demande do Ministério mais informações

sobre a razoabilidade dos investimentos realizados.

8.4 Baixa Renda

A destinação de recursos da CDE para "atendimento da subvenção

econômica destinada à modicidade tarifária de fornecimento de energia elétrica aos

consumidores finais integrantes da Subclasse Residencial Baixa Renda" possui

previsão no artigo 13, inciso II, da Lei n. 10.438/2002.

18

Art. 1º, caput, do Decreto n. 7.520/2011. 19

http://www.copel.com/ci/antigas/ci_revista294.pdf.

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Consoante registrado na NT 329, essa rubrica, para o ano de 2016,

deverá onerar o orçamento da CDE em R$ 2,2 bilhões, valor estimado pela

Superintendência de Regulação dos Serviços de Distribuição – SRD – com base (i)

no desconto de R$ 19,82 por família e (ii) em projeções de crescimento vegetativo

das famílias beneficiadas, do IPCA e do IGP-M:

"A estimativa de repasses da CDE para a subvenção à Tarifa Social de Energia Elétrica em 2016, conforme Memorando no 470/2015- SRD/ANEEL, de 23 de novembro de 2015, é de R$ 2,2 bilhões. Esse valor considera: (i) a quantidade de famílias beneficiadas em outubro/2015 de 8.643.242, com desconto médio por família de R$ 19,82; (ii) o crescimento vegetativo médio de 0,23% ao mês na quantidade de famílias beneficiadas; (iii) e projeção de IPCA 2016 de 6,38% e IGP-M de 6,53% (Boletim Focus nov/2015)."

Conforme se observa, nem o Memorando n. 470/2015 da SRD, nem a

NT 329 explicitam, em detalhes, o porquê de o desconto tarifário por família ser de

R$ 19,82.

Com efeito, a íntegra do Memorando n. 470/2015-SRD consiste em

dois únicos parágrafos:

"Em resposta ao memorando em referência, informamos que a estimativa para o ano de 2016 para a subvenção destinada à subclasse residência baixa renda é de R$ 2,2 bilhões.

A estimativa foi calculada considerando os seguintes parâmetros: (i) Quantidade de famílias beneficiadas em outubro/2015 de 8.463.242,

com desconto médio por família de R$ 19,82; (ii)Crescimento

vegetativo médio de 0,23% ao mês na quantidade de famílias

beneficiadas; e (iii) Projeção de IPCA 2016 de 6,38% e IGP-M de

6,53% (Boletim FOCUS nov/2015)."

Tal qual se registrou em relação ao PLpT, nota-se que, também em

relação à Tarifa Social de Energia Elétrica – TSEE –, a Aneel cuidou apenas de

apresentar o tema, indicando o amparo legal das rubricas e o valor a ser inserido no

orçamento, mas não justificou, nem sequer resumidamente, sua proposta, o que

configura nova violação ao mencionado artigo 16, inciso II e § 1º, da Resolução

Normativa n. 273/2007.

A ausência de dados concretos impede a correta avaliação dos

agentes envolvidos durante a audiência pública. A não transparência em relação aos

dados, como tem insistentemente acontecido, impede inclusive que a Agência

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exerça sua função fiscalizadora. Assim, num processo de rotina, a Aneel deveria

exigir esta prestação de contas dos agentes envolvidos.

Ainda sobre a não disponibilização de informações, acrescente-se

que, conforme previsto no artigo 3º, § 5º, da Resolução Normativa n. 572/2013,

mesmo "nos casos de atendimento aos critérios para a concessão da TSEE, a

distribuidora deverá informar ao interessado que a continuidade da concessão do

benefício está condicionada à" manutenção das condições exigidas na norma, entre

as quais, a "manutenção das informações atualizadas no Cadastro Único" e a

"atualização das informações das famílias beneficiadas [...] a cada 12 [...] meses, [...]

quando solicitado pela distribuidora".

Tanto a SRD quanto a SGT são silentes quanto a eventual

fiscalização no sentido de verificar se as famílias beneficiadas ainda constam do

Cadastro Único e se permanecem atendendo às condições exigidas na Resolução

Normativa n. 572/2013 para a percepção do benefício.

É de suma importância que a Aneel motive sua proposta, promova

fiscalização adequada do conjunto de beneficiados pela TSEE e apresente seus

resultados ao público, em especial aos consumidores, os quais, apenas em relação

a essas despesas, são chamados a suportar custo de do R$ 2,2 bilhões.

8.5 Indenização de Concessões

8.5.1 Finalidade da indenização

A destinação de recursos da CDE para "prover recursos e permitir a

amortização de operações financeiras vinculados à indenização por ocasião da

reversão das concessões" foi prevista no artigo 13, inciso IV, da Lei n. 10.438/2002

– inciso esse incluído pela Lei n. 12.783/2013.

Com efeito, a origem da rubrica "Indenização de Concessões" reside

na Medida Provisória n. 579/2012, posteriormente convertida na Lei n. 12.783/2013,

a qual antecipou a renovação das concessões que venceriam entre 2015 e 2017.

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56

No momento da antecipação, investimentos vinculados às

concessões não estavam integralmente amortizados, motivo pelo qual se fez

necessário indenizá-los, para depois reduzir as tarifas para o patamar pretendido.

De fato, o pagamento da indenização foi pressuposto para a

antecipação da captura da “renda hidráulica”, a qual foi integralmente alocada aos

consumidores das distribuidoras, ou seja, ao ACR.

Logo, a despesa com “Indenização de Concessões” não pode ser

rateada pelos consumidores do ACL, os consumidores livres, via CDE, por faltar o

requisito da referibilidade no componente tarifário.

Apesar de a lei ter previsto o financiamento via CDE, não se previu

que o rateio deveria incluir agentes estranhos ao benefício, donde se conclui estar

mantida a referibilidade.

Conforme se demonstrará adiante, não existem fundamentos lógicos

ou jurídicos para a imputação desse custo aos consumidores do ACL.

8.5.2 Reserva legal, política tarifária e subsídio cruzado

A reserva legal configura preocupação maior do constituinte com

determinados temas, como ocorreu com a criação de tributos (art. 150, I, CF/88),

tipificação de crimes (art. 5º, XXXIX, CF/88) e, no que interessa, a política tarifária

dos serviços públicos (art. 175, p. ú., III, CF/88).

O sentido da reserva legal é impedir que haja a delegação, por lei, a

ato infralegal para disciplinar o objeto sob proteção da reserva. Somente por lei,

determinados temas poderão ser tratados, entre eles a política tarifária.

Sobre o postulado da reserva de lei, convém citar o seguinte trecho

de voto do Ministro do Supremo Tribunal Federal – STF – Celso de Mello, no

julgamento da ADI 2075:

“[...] Não cabe, ao Poder Executivo, em tema regido pelo postulado da reserva de lei, atuar na anômala (e inconstitucional) condição de legislador, para, em assim agindo, proceder à imposição de seus próprios critérios, afastando, desse modo, os fatores que, no âmbito de nosso sistema constitucional, só

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podem ser legitimamente definidos pelo Parlamento. É que, se tal fosse possível, o Poder Executivo passaria a desempenhar atribuição que lhe é institucionalmente estranha (a de legislador), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados, competência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes. [...]”

20

8.5.3 Impossibilidade de criação de subsídio cruzado por atos da

Aneel

Nessa linha de raciocínio, não poderia a Aneel, sem previsão legal

específica, ter imputado aos consumidores livres a despesa da CDE com

indenização paga em benefício exclusivo dos consumidores cativos, sob pena de

violação à reserva legal e ao princípio da legalidade.

A Aneel propõe orçamento que, na prática, impõe o subsídio cruzado

entre diferentes classes de consumidores, o que não se permite sem expressa

previsão legal nesse sentido.

Sem expressa previsão legal, não podem atos administrativos da

Aneel estenderem o pagamento de encargo setorial a agentes estranhos ao

benefício por ele trazido.

Por outras palavras, na ausência de disposição legal expressa, não

se pode presumir que haverá subsídio cruzado.

8.5.4 Limites constitucionais à política tarifária: necessária

referibilidade subjetiva entre o ônus tarifário e o benefício com

o serviço prestado

No silêncio da lei, não se presume a política tarifária nem se presume

a existência de subsídio cruzado.

20

STF, Tribunal Pleno, ADI 2075 MC, Relator Ministro Celso de Mello, julgado em DJ 27.6.2003.

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A contrario sensu, ausente disposição legal expressa, presume-se

que o usuário beneficiário da política pública será o sujeito passivo do ônus

financeiro (encargo) por ela criado.

Nesse diapasão, Marçal Justen Filho é claro ao lecionar que:

“Insista-se em que a simples adoção do modelo de concessão já reflete uma proposta política sobre a repartição dos encargos atinentes ao fornecimento de utilidades essenciais. Reflete a concepção de que o custo dessas utilidades será arcado diretamente pelos que delas se utilizam. Celebrada a concessão, consagra-se o postulado de que paga quem usa e na medida em que o faz.”

21

A necessária referibilidade entre a exação e o seu pagante decorre da

reserva legal, porque:

(i) somente a lei pode estabelecer a política tarifária;

(ii) o encargo deve estar voltado à obrigação de manter serviço

adequado;

(iii) o sujeito passivo deve ser aquele que se utiliza do serviço cuja

adequada manutenção é propiciada pela política custeada pelo

encargo;

(iv) ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em

virtude de lei; e

(v) na ausência de lei, não se presume que terceiro arcará com o

custo financeiro da política pública, mas sim o próprio beneficiário.

A referibilidade da tarifa também pode ser extraída de um dos

pressupostos básicos para sua cobrança: o uso efetivo.

Em outros momentos, foi intenso o debate jurídico que buscava

diferenciar taxa de tarifa.

21

JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria Geral das Concessões de Serviço Público. São Paulo: Dialética,

2003, pp. 374-375.

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59

Entre as principais distinções, destacou-se a compulsoriedade da

taxa, dada sua natureza tributária, face à facultatividade da tarifa, que tem natureza

contratual (súmula n. 545/STF).

A compulsoriedade da taxa foi justamente o critério considerado pelo

Ministro Ricardo Lewandowski para, no julgamento do Recurso Extraordinário n.

576.189-4, estabelecer distinção entre as taxas e os encargos tarifários.

Outro critério determinante para distinção entre taxa e tarifa é o fato

de que as taxas podem ser cobradas pela mera disponibilização do serviço ou pela

utilização potencial (art. 145, II, CF/88), enquanto a tarifa somente pode ser cobrada

pelo uso efetivo do serviço.

O recente julgamento da ADI n. 800, pelo Supremo Tribunal Federal,

no qual se definiu a natureza jurídica do pedágio, reforçou esse pressuposto de

cobrança das tarifas.

Pois bem, o subsídio cruzado nada mais é do que uma cobrança de

tarifa por serviço não efetivamente utilizado por aquele de quem se cobra. Ao

subsidiar tarifa de terceiro, o usuário paga por serviço que não utilizou.

Ao se exigir que a cobrança da tarifa pressuponha uma utilização

efetiva do serviço, o que se estipulou, em outras palavras, foi que aquele que não

utiliza o serviço não deve pagar (ou subsidiar) por aquele que de fato o usa.

Cobrar a tarifa daquele usuário meramente potencial seria o mesmo

que obrigá-lo a subsidiar a tarifa do usuário efetivo.

Como visto, essa imposição é própria das taxas, que são tributos, de

natureza compulsória, mas não das tarifas.

O pagamento do subsídio cruzado foge do conceito clássico de tarifa,

pois não configura contraprestação equivalente ao serviço prestado. Por isso,

somente aquele que utilizou o serviço se sujeita ao pagamento da tarifa.

8.5.5 Da necessidade de vinculação da destinação dos encargos à

prestação de serviço público adequado

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Há, ainda, outro argumento apto a afastar o rateio da indenização das

concessões de geração não prorrogadas.

Além da (i) reserva legal e da (ii) referibilidade, o Supremo Tribunal

Federal estabeleceu uma terceira limitação à política tarifária: (iii) a necessidade de

vinculação dos encargos setoriais à obrigação de manter serviço público adequado.

O Ministro Moreira Alves, no voto na ADC n. 9, advertiu que, embora

seja possível, por lei, o acréscimo de encargos na tarifa, eles devem guardar estrita

pertinência com a obrigação de manter serviço adequado.

Entendimento contrário permitiria que fossem inseridos na tarifa

encargos destinados a financiar as mais variadas ações estatais cujo custo deve ser

suportado pelo orçamento público, mais especificamente, pelos impostos.

Os encargos tarifários estão constitucionalmente vinculados à

obrigação de manter serviço público adequado. Não podem financiar despesa

estranha a essa finalidade específica, sob pena de se afigurarem inconstitucionais.

O conceito de serviço adequado é encontrado no artigo 6º, § 1º, da

Lei n. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que assim estabelece:

“Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato. § 1º Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.”

No exame do mérito da Ação Declaratória de Constitucionalidade n.

9, o Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a cobrança daquela sobretarifa

por ter vislumbrado, naquele caso, vinculação ao serviço público adequado:

“1. O valor arrecadado como tarifa especial ou sobretarifa imposta ao consumo de energia elétrica acima das metas estabelecidas pela Medida Provisória em exame será utilizado para custear despesas adicionais, decorrentes da implementação do próprio plano de racionamento, além de beneficiar os consumidores mais poupadores, que serão merecedores de bônus. Este acréscimo não descaracteriza a tarifa como tal, tratando-se de um mecanismo que permite a continuidade da prestação do serviço, com a

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captação de recursos que têm como destinatários os fornecedores/concessionários do serviço. Implementação, em momento de escassez da oferta de serviço, de política tarifária, por meio de regras com força de lei, conforme previsto no artigo 175, III da Constituição Federal. [...] 4. Ação declaratória de constitucionalidade cujo pedido se julga procedente.”

22

Aqui, diferentemente, não se vislumbra vinculação entre (i) o

pagamento de indenizações ao investidor cuja concessão expirou, e (ii) a prestação

do serviço público adequado.

Não há vinculação do pagamento de indenizações a investidores com

a “regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade,

cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.” (art. 6º, § 1º, Lei n. 8.987/95).

Nenhum dos elementos do “serviço adequado” se vincula ao

pagamento de uma indenização por antecipação da extinção de um contrato da

União com os prestadores do serviço.

Desse modo, não é possível que outros agentes sejam obrigados ao

pagamento das referidas indenizações, através de sua inclusão na quota da CDE,

muito menos mediante rateio segundo critério não previsto em lei.

Por mais essa razão, portanto, é indevido o pagamento, devendo

essa rubrica ser excluída da quota de CDE dos consumidores livres.

8.6 Subvenção Redução Tarifária Equilibrada

8.6.1 Subvenção como deslocamento temporal de custo

Igualmente, a alocação, promovida pela Aneel, da despesa

“Subvenção Redução Tarifária Equilibrada” na CDE não pode alcançar os

consumidores do ACL.

22

ADC 9, Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ELLEN GRACIE,

Tribunal Pleno, julgado em 13/12/2001, DJ 23-04-2004 PP-00006 EMENT VOL-02148-01 PP-00001.

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Referida subvenção consistiu em empréstimo para que a redução

tarifária anunciada pelo Governo Federal fosse efetivamente alcançada.

O Governo Federal pressupôs que todos os concessionários de

geração adeririam às condições de prorrogação das concessões, o que permitiria

antecipar a captura da renda hidráulica em favor da modicidade tarifária, mas nem

todos os concessionários de geração aderiram.

Nesse sentido, para cumprir a promessa de redução das tarifas em

20%23, a Lei n. 12.839/2013 estabeleceu que recursos da CDE poderiam

“compensar o efeito da não adesão à prorrogação de concessões de geração”, o

que, combinado com aportes do Tesouro Nacional24, resultaria na propalada

redução.

Além de prever o aporte de recursos do Tesouro, a Medida Provisória

n. 579/2012, em seu artigo 20, estabeleceu a possibilidade de a ELETROBRAS, na

condição de gestora dos fundos setoriais correspondentes à CDE e à Reserva

Global de Reversão – RGR –, “contratar operações de crédito [...] para atender à

finalidade de modicidade tarifária”.

Para essas operações, a garantia seria o “fluxo futuro de recebimento

da arrecadação da CDE e da RGR”.

23

No ponto, cumpre destacar observação feita pelo Tribunal de Contas da União:

“38. Inicialmente, a redução de despesas prevista pela MP nº 579/2012 era de R$ 21,7 bilhões, o que

daria o desconto médio de 20% nas tarifas. Contudo, alcançou somente R$ 16,8 bilhões, sendo R$ 4,2

bilhões em geração, R$ 5 bilhões em transmissão e R$ 7,6 bilhões em redução de encargos tarifários.

Com esse valor menor, o desconto seria apenas de 15%. Ocorre que o Governo resolveu aumentar o

aporte do Tesouro Nacional e manter os 20% de desconto originalmente previstos…” (TCU, Acórdão

n. 2.565/2014).

24 A participação do Tesouro Nacional teve os seus contornos apresentados na própria exposição de

motivos da Medida Provisória n. 579/2012:

“A União, por meio da transferência de créditos referentes à dívida de Itaipu, bem como da compra

dos créditos que a Centrais Elétricas Brasileiras S.A. – ELETROBRAS também detém contra Itaipu,

transferirá recursos da ordem de R$ 3.300.000.000 (três bilhões e trezentos milhões de reais) em 2013,

para pagar as despesas vinculadas aos encargos setoriais. [...]

Para o exercício de 2013, estima-se que o impacto seja de R$ 3.300.000.000 (três bilhões e trezentos

milhões de reais). […] Para o exercício de 2014, estima-se que o impacto seja de R$ 3.600.000.000

(três bilhões e seiscentos milhões de reais), sendo R$ 3.300.000.000 (três bilhões e trezentos milhões

de reais), correspondentes aos créditos que a ELETROBRAS e o Tesouro Nacional detém junto à

Itaipu e R$ 300.000.000 (trezentos milhões de reais) correspondentes às operações entre

ELETROBRAS e Tesouro Nacional para atenuar os efeitos cambiais da tarifa de Itaipu.”

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Com efeito, as providências concebidas pela Medida Provisória n.

579/2012 – aporte do Tesouro Nacional e operações de crédito envolvendo fundos

setoriais – evidenciam ter sido necessária a obtenção de empréstimos para se

alcançar a redução tarifária de 20%, empréstimos esses pagos com recursos a

serem auferidos, no futuro, a partir da própria tarifa que, naquele momento, não

gerava arrecadação compatível com os custos incorridos no fornecimento de

energia.

A rubrica “Subvenção Redução Tarifária Equilibrada”, ora incluída

como despesa a ser financiada pela quota de CDE repassada aos consumidores

livres25, consiste justamente no pagamento desses empréstimos, obtidos para

financiar a redução que se revelou temporária das tarifas dos consumidores cativos.

A conclusão inexorável é no sentido de que a lei não concebeu a

“subvenção” como subsídio cruzado, mas mera prorrogação do pagamento de

parcela da tarifa, conforme reconheceu o TCU no Acórdão n. 2.565/2014:

“42. Para obter a redução tarifária, o Governo se valeu não só do Tesouro Nacional, mas postergou para 2015 aumentos nas tarifas que deveriam ter sido repassadas já em 2013. Adiou também o recolhimento de cotas da CDE para a cobertura da exposição involuntária e do acionamento de termelétricas por segurança energética, por um período de até cinco anos.”

8.6.2 Reserva legal: sujeição passiva e inexistência de subsídio

cruzado

Com efeito, a “subvenção” não foi concebida como subsídio, mas

mero deslocamento temporal de custo, ou seja, empréstimo tomado em nome dos

consumidores cativos e em benefício deles, razão pela qual se afigura lógico afirmar

que os recursos para pagamento viriam do Tesouro Nacional ou dos próprios

beneficiários do deslocamento: os consumidores cativos.

25

O repasse dessa despesa aos associados da Autora alcança valores superiores a 54 milhões de reais.

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Menos ainda pretendeu-se instituir subsídio cruzado: jamais se

previu, legalmente, que os consumidores livres pagariam o componente do encargo

(CDE) que beneficiou unicamente os consumidores cativos.

Assim, pelos mesmos motivos expostos quanto à “Indenização de

Concessões”, a despesa com “Subvenção Redução Tarifária Equilibrada” não pode

ser imputada aos consumidores livres, sob pena de ofensa à reserva legal e à

necessária referibilidade da tarifa.

8.7 Carvão Mineral

Registra-se, de início, a avaliação realizada pela Aneel da proposta

submetida pela Eletrobras dos custos incorridos na geração térmica a carvão

mineral, avaliação essa orientada pelas disposições da Resolução Normativa n.

500/2012 que versam sobre os critérios a serem atendidos pelas térmicas abarcadas

pela CDE para garantir o direito a reembolso integral dos custos de combustível.

Diferentemente dos anos anteriores, em que a Agência deixou de

considerar, na aprovação do orçamento da CDE, o fato de algumas usinas

apresentarem performance abaixo da geração de referência (ou seja, abaixo do

montante de energia que levou à definição dos valores incluídos nos custos da

CDE), verifica-se que a SRG, na NT 143, propõe, para 2016, realizar glosa no

orçamento em estrita observância ao disposto no § 6º do artigo 3º da Resolução

Normativa n. 500/2012.

Entretanto, é necessário ressaltar que essa sistemática de avaliação

dos critérios para reembolso integral de custos deveria ter sido empregada no

processo da CDE de 2015. Como isso não aconteceu, foram lançados valores

indevidos no orçamento de 2015, bem como foram repassados valores indevidos

aos geradores.

Uma consequência da inobservância do disposto nos §§ 6º e 7º do

artigo 3º da Resolução Normativa n. 500/2012 foi o repasse a maior de valores para

a UTE Presidente Médici (fases A e B), o que, diante do contumaz déficit de geração

provocado pela desativação da fase A e pela baixa performance da fase B, levou ao

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aumento do estoque de carvão mineral, estoque esse formado com recursos da

CDE advindos da arrecadação das quotas anuais.

A própria Eletrobras, no documento encaminhado à Aneel, informa

que o estoque do Complexo Presidente Médici alcançou o nível de 3 milhões de

toneladas no final de 2015, e essa quantidade de carvão mineral é suficiente para

suportar a geração do Complexo por período superior a um ano.

Se a Agência tivesse realizado os devidos cortes no orçamento dos

anos anteriores, tal estoque não estaria nesse nível, motivo pelo qual se mostra

necessário considerar esse aspecto na definição do orçamento da CDE 2016.

Nesse sentido, a Abrace solicita, como medida saneadora, corte de

100% dos custos estimados com carvão mineral de todo o Complexo Presidente

Médici, mantidos apenas os valores relativos ao combustível secundário,

observados os percentuais de glosas propostos pela SRG.

Assim, dos R$ 137,55 milhões propostos para fins de

reembolso dos custos de combustível do Complexo Presidente Médici,

solicita-se a consideração do valor de R$ 16,86 milhões, com consequente

glosa de R$ 120,69 milhões.

8.8 Financiamentos concedidos – RGR

Também merece destaque um último item constante do orçamento da

CDE/2016, o qual consta tanto no rol de receitas quanto no rol de despesas da

Conta, qual seja, a rubrica "Financiamentos Concedidos – RGR":

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Figura 2 – Orçamento anual da CDE de 2013 a 201626

Conforme detalhado pela SGT, esse item se refere ao "saldo a liberar

de contratos de financiamentos da RGR com os agentes do setor elétrico", voltados

a viabilizar "programas de universalização de energia elétrica", no valor de R$ 1,094

bilhão. Segundo a proposta da Eletrobras, a CDE custearia a liberação desse saldo

e, em contrapartida, receberia, no futuro, o pagamento do financiamento concedido

– daí a inclusão da rubrica tanto como despesa quanto como receita.

Contudo, a própria área técnica manifestou-se contrariamente à

proposta da Eletrobras, por entender que a concessão de financiamentos para

custear programas de universalização não consta entre as finalidades principais da

RGR, mas em objetivo secundário, e condicionado à existência de sobra de recursos

naquele fundo, o que não se verifica desde o ano de 2012:

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Folha 6 da Nota Técnica n. 329/2015-SGT/ANEEL.

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"Entretanto, ressaltamos o posicionamento contrário desta área técnica quanto a este item, pois entendemos que o financiamento a concessionárias para universalização uma finalidade secundária da RGR, não prevista na legislação da CDE, aplicável apenas para o caso de sobra de recursos, após o pagamento das indenizações, contexto que não se verifica desde a edição da MPv no 579/2012."

A Abrace converge com a conclusão da SGT pela não inclusão da

referida rubrica nas despesas da CDE/2016.

Isso porque o artigo 13, incisos III e IV e § 6º, da Lei n. 10.438/2002,

com redação dada pela Lei n. 12.783/2013, estabelece que os recursos da CDE só

podem ser transferidos à RGR para "prover recursos e permitir a amortização de

operações financeiras vinculados à indenização por ocasião da reversão das

concessões ou para atender à finalidade da modicidade tarifária":

"Art. 13. Fica criada a Conta de Desenvolvimento Energético - CDE visando ao desenvolvimento energético dos Estados, além dos seguintes objetivos: [...]

III - prover recursos para os dispêndios da Conta de Consumo de Combustíveis - CCC;

IV - prover recursos e permitir a amortização de operações financeiras vinculados à indenização por ocasião da reversão das concessões ou para atender à finalidade de modicidade tarifária; [...]

§ 6o Os recursos da CDE poderão ser transferidos à Reserva

Global de Reversão - RGR e à Conta de Consumo de Combustíveis - CCC, para atender às finalidades dos incisos III e IV do caput."

Assim, independentemente de quais sejam as destinações prioritárias

da RGR, é certo que a CDE não pode custeá-las, a não ser para a finalidade

expressamente prevista em lei, a qual não contempla a concessão de

financiamentos para projetos de universalização conduzidos pelas distribuidoras.

Mais ainda, caso os recursos da RGR fossem utilizados para financiar

investimentos de distribuidoras em universalização de seu atendimento estaria

havendo um subsídio cruzado criado pela Aneel, sem cobertura legal. Este subsídio,

em desfavor do conjunto de consumidores brasileiros, que teria que aportar recursos

à conta, e que tem custo de captação muito maior do que a remuneração a ser

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recebida, favoreceria os investidores e/ou os consumidores das distribuidoras que

recebessem os recursos, dependendo do tratamento regulatório dado pela Aneel.

8.9 “Formação de uma reserva na CDE”

Ao tratar do rateio da Cota CDE – Uso de 2016, no item III.3 da NT

329, a SGT sugere a criação de um fundo para cobrir eventuais variações

financeiras que venham a ser verificadas ao longo do ano, conforme destacado

abaixo.

“118. Por fim, visando a estabilidade tarifária, avaliamos a conveniência e oportunidade de se promover a concatenação das cotas pagas pelas concessionárias de distribuição, aplicando-se a essas o mesmo procedimento adotado atualmente às transmissoras e permissionárias.

119. Para isso, propõe-se a formação de uma reserva na CDE, equivalente a 50% do valor da CVA – CDE acumulada pelas concessionárias de distribuição até o processo tarifário de 2016, apurada no valor total de R$ 3,239 bilhões, conforme apresentado no Anexo IV desta Nota Técnica. Com isso, a Cota CDE – USO de 2016 seria acrescida em R$ 1,620 bilhões, e a redução das tarifas em 2016 seria de 3,53% em média, sendo 1,26% no N/NE e 5,63% no S/SE.

120. Com isso, seria possível aplicar a concatenação das cotas CDE – USO pagas pelas concessionárias de distribuição no ano de 2017, quando se espera não haver grande variação desse encargo.

121. Essa medida apresenta-se como prudente também quando se verifica que a redução de R$ 6,7 bilhões da Cota CDE – USO em 2016 deve-se principalmente ao corte de R$ 4,7 bilhões de obrigações pendentes da CCC, que não foram consideradas pela falta de comprovação dos valores pela Eletrobrás, o que poderá ocorrer no transcorrer de 2016, aumentando a necessidade de recursos do Fundo.”

Pelo entendimento da Abrace, a proposta em apreço poderia ter uma

de duas possíveis fundamentações.

A primeira, de que a CDE/2017 seria muito maior do que aquela ora

proposta para 2016. Isso faria com que o efeito tarifário a ser percebido pelos

consumidores, em 2017, fosse muito maior do que aquele decorrente do suposto

aumento econômico da CDE 2017.

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Ocorre que, como ressaltado pela própria área técnica, não se espera

grande variação do encargo para 2017, pelo que a aludida justificativa não

procederia.

A segunda possível justificativa seria o impacto do descasamento

entre as quotas da CDE – Uso e os efetivos dispêndios da Conta sobre o fluxo de

caixa das distribuidoras, que teriam que assumir um custo financeiro muito superior

à receita decorrente de uma tarifa calculada considerando um montante inferior de

recurso a ser arrecadado.

A assunção dessa premissa, contudo, significaria que a Aneel optou

por sacrificar os consumidores ao pagamento a maior da CDE – ano em que as

condições macroeconômicas do Brasil serão sabidamente adversas – em favor da

concessão de uma proteção adicional – que pode se revelar desnecessária – a um

único grupo de agentes do setor (distribuidoras).

A concessão de privilégios a um grupo de agentes em detrimento de

outros configura um completo desvirtuamento da própria missão da Aneel, que

consiste em "proporcionar condições favoráveis para que o mercado de energia

elétrica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes e em benefício da

sociedade".

Para além da perspectiva regulatória, observa-se que nem mesmo

juridicamente seria possível a criação da reserva pretendida pela Aneel.

Isso porque as quotas da CDE devem ser calculadas consideradas as

finalidades expressamente definidas em lei.

Não consta da Lei n. 10.438/2002 – ou mesmo da legislação

superveniente – a finalidade da CDE de "criar reserva para concatenar as quotas da

CDE do ano presente com as do ano subsequente".

Ausente qualquer previsão legal nesse sentido, o acréscimo à Conta

da finalidade proposta, a ser consubstanciada em ato normativo da própria Agência,

configuraria o exercício inconstitucional de política tarifária pela Aneel, por meio do

inconstitucional alargamento do alcance desse encargo tarifário, afrontando o artigo

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175, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal e o princípio da reserva

legal:

"Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: III - política tarifária;"

Independentemente dos possíveis efeitos financeiros que poderão ser

verificados nos processos tarifários de 2017, a Aneel não pode, sem previsão legal,

criar nova finalidade para a CDE, finalidade essa que implicará a imputação de um

ônus de R$ 1,62 bilhão aos consumidores com base em suposições sobre

possíveis aumentos da CDE para o exercício de 2017.

Chama ainda mais atenção a referência ao montante de R$ 4,7

bilhões de “obrigações pendentes da CCC”, sobre o qual a própria SFF da Aneel

apontou inúmeras justificativas para não considerá-lo no orçamento da CCC de

2016, conforme detalhado na subseção 8.1.5.2 do presente documento de

contribuição.

Portanto, a Abrace é absolutamente contrária à “formação de uma

reserva na CDE” 2016 como forma de amenizar possíveis efeitos financeiros a

serem percebidos nos processos tarifários relativos a 2017.

9. Itens de Receita da CDE

9.1 Cota CDE - Energia

A Abrace, salvo melhor juízo, identificou uma inconsistência no valor

apresentado pela Aneel na Tabela 2 da NT 329, relativo à rubrica Cotas CDE –

Energia, presente nos itens de receita da CDE.

Na tabela apresentada pela Aneel, o valor considerado a título de

Cotas CDE – Energia é de R$ 3,347 bilhões. No entanto, o item III.2.6 da referida

nota técnica, parágrafo 101, apresenta um valor distinto do apresentado na Tabela

2, conforme destacado abaixo:

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Para o orçamento da CDE de 2016, o MME, por meio do Ofício nº 298/2015-SE-MME, informou que também deverá ser considerado o recolhimento por meio de cotas, pelos consumidores cativos, a título de devolução, o montante equivalente a ¼ dos valores repassados às distribuidoras em atendimento ao Dec. nº 7.945/2013, com atualização pelo IPCA1. A Tabela 5 apresenta a composição desse valor, denominado Cota CDE – Energia (Decreto 7.945/2013), que resultou em R$ 3,468 milhões.

A Abrace solicita que a Aneel reveja os valores considerados e efetue

os ajustes necessários de forma que a tabela resumo, a partir da qual a Cota CDE –

Uso é calculada por meio de uma conta de chegada para que as receitas sejam

equivalentes às despesas da conta.

10. Resumo das propostas da Abrace

Ao cabo do exposto, a Abrace:

(i) chama a atenção para o processo da CDE 2015, aqui

incorporando à contribuição de 2016 os pontos apresentados pela Abrace no ano

anterior em relação a diversos itens de despesa, à forma de cobrança da CDE que

deveria ser proporcional ao uso do fio e solicitando à Agência que promova a

devolução a todos os consumidores dos valores pagos à maior conforme decisões

judiciais, evitando novos e desnecessários conflitos;

(ii) insiste para que a Agência exerça seu poder-dever de extirpar

da CDE/2015 os itens de despesa ilegalmente inseridos no orçamento, fazendo a

devolução aos consumidores dos montantes associados a estes itens no orçamento

da CDE 2016;

(iii) apela para que se crie ou se defina uma equipe técnica

exclusiva para efetuar um acompanhamento sistemático e perene da CDE, que

tenha como objetivo garantir a eficiência do dispêndio dos recursos financeiros

pagos pelos consumidores de energia elétrica;

(iv) solicita que a Aneel, de forma independente à Eletrobras,

passe divulgar informações periódicas sobre a CDE, de maneira a dar transparência

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ao processo, assim como possibilite ao consumidor conhecer como cada real

empregado na CDE está sendo gasto;

(v) considera que deve ser revisto o orçamento da Conta de

Desenvolvimento Energético de 2016, para que haja compensação dos custos

pretéritos arcados pelos consumidores com compra mínima de gás em montante

superior à capacidade máxima de geração do parque térmico de Manaus;

(vi) avalia que nos Planos Anuais de Custos da CCC – PAC, não

se observa a sistemática de rateio definida no artigo 3º, caput, da Lei n.

12.111/2009, segundo a qual a CCC reembolsa os custos associados aos contratos

firmados e à compra de combustível para geração apenas no que excede o custo

médio do ACR, custo médio esse que deve ser suportado pela distribuidora;

(vii) chama a atenção para o fato de que no período de maio a

dezembro de 2015 (período esse em que o Sistema Manaus já se encontrava

plenamente interligado, conforme atestado pela Aneel no Despacho n. 1.365/2015),

o valor médio do PLD do Submercado Norte foi de R$ 221/MWh, e mesmo que o

custo de geração do parque gerador do Sistema Manaus operando a óleo

combustível fosse superior ao custo unitário de R$ 254/MWh observado para o gás

natural, o reembolso da CCC, nos termos do artigo 19 do Decreto n. 7.246/2010,

seria promovido com base no PLD, e não no custo do gás natural;

(viii) no que diz respeito à fixação de preço regulatório do gás

natural em Manaus, considera que não pode a Aneel passivamente acolher e

reproduzir valor apurado pela ANP em desconformidade com as ressalvas feitas

pelo TCU e, pior ainda, perpetuar os efeitos da ilegalidade do contrato celebrado

pela Cigás e pela AmE;

(ix) a partir das constatações da SFF na Nota Técnica n. 143/2015

e no Termo de Notificação n. 66/2014, pondera que a ausência de comprovação,

pela Eletrobras, dos R$ 4.717.223.514,46 referentes às supostas obrigações

pendentes da CCC vai muito além da simples não apresentação de determinados

documentos, ou seja, vai muito além de algo que poderia ser sanado no curso da AP

n. 83/2015;

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(x) considerando a iminente aprovação da CDE/2016, considera

que deva haver urgente deliberação do Processo n. 48500.003390/2013-98, em que

se discute reembolso devido pela AmE à CCC;

(xi) para os itens de (iv) a (ix), estima necessária uma glosa no

orçamento da CCC superior a R$ 4,5 bilhões, levando-se em consideração a

correção para o orçamento de 2016, assim como a devolução retroativa de valores

cobrados indevidamente em anos anteriores;

(xii) pondera que não há nenhuma informação quanto à

fiscalização do rol de beneficiários dos descontos tarifários, os quais, segundo

informado na Nota Técnica n. 329/2015-SGT, onerarão a CDE/2016 em R$ 5,926

bilhões. A Aneel deve prover explicações detalhadas sobre os descontos tarifários.

Além disso, Abrace acredita que seja papel do regulador fazer as devidas avaliações

para prover ao Poder Concedente e aos formuladores de políticas informações que

resultem em um diagnóstico concreto sobre a sustentabilidade das políticas de

subsídios, de forma a se delinear uma estratégia de médio e longo prazo para que

seja possível cumprir os objetivos de forma eficiente;

(xiii) no que diz respeito à definição do volume de recursos

destinados à universalização do serviço de energia elétrica, considera que foi

violado o artigo 16, inciso II e § 1º, da Resolução Normativa n. 273/2007, o qual

estabelece que os documentos disponibilizados na audiência pública devem ser

hábeis a motivar as propostas da Agência;

(xiv) acredita que o MME deve, em nome da otimização e da

eficiência na utilização dos recursos públicos, efetuar análise de eficiência de custo

das ligações custeadas pelo PLpT, motivo pelo qual é imperativo, portanto, que a

Aneel, antes de incluir o valor indicado pelo MME no orçamento da CDE/2016,

demande do Ministério mais informações sobre a razoabilidade dos investimentos

realizados;

(xv) considera que também em relação à Tarifa Social de Energia

Elétrica – TSEE –, a Aneel cuidou apenas de apresentar o tema, indicando o amparo

legal das rubricas e o valor a ser inserido no orçamento, mas não justificou, nem

sequer resumidamente, sua proposta, o que configura nova violação ao mencionado

artigo 16, inciso II e § 1º, da Resolução Normativa n. 273/2007;

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(xvi) pondera que a despesa com “Indenização de Concessões”

não pode ser rateada pelos consumidores do ACL, os consumidores livres, via CDE,

por faltar o requisito da referibilidade no componente tarifário;

(xvii) igualmente pondera que a alocação promovida pela Aneel, da

despesa “Subvenção Redução Tarifária Equilibrada” na CDE não pode alcançar os

consumidores do ACL;

(xviii) solicita, como medida saneadora, corte de 100% dos custos

estimados com carvão mineral de todo o Complexo Presidente Médici, mantidos

apenas os valores relativos ao combustível secundário, observados os percentuais

de glosas propostos pela SRG;

(xix) avalia que a Lei n. 10.438/2002 não contempla a concessão de

financiamentos para projetos de universalização conduzidos pelas distribuidoras;

(xx) solicita que não seja acatada a proposta de “formação de uma

reserva na CDE” 2016, no valor de R$ 1,6 bilhão, como forma de amenizar possíveis

efeitos financeiros a serem percebidos nos processos tarifários relativos a 2017;

(xxi) solicita que a Aneel reveja o valor de receita considerado a

título de Cota CDE – Energia e efetue os ajustes possíveis necessários de forma

que a tabela resumo, a partir da qual a Cota CDE – Uso é calculada por meio de

uma conta de chegada para que as receitas sejam equivalentes às despesas da

conta.

Considerando as propostas da Abrace para o orçamento da CDE

2016, tanto em relação às despesas quanto em relação às receitas, a Associação

estima que a Cota CDE – Uso a ser considerada pela Aneel possa ter uma redução

superior a R$ 9,2 bilhões em relação à proposta submetida à AP 083/2015,

conforme quadro resumo apresentado a seguir.

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Tabela 5 - Quadro resumo das propostas da Abrace (em R$ milhões)

(i) Despesas não justificadas, portanto, com potencial de redução do montante

considerado;

(ii) Considera reduções tanto do exercício de 2016, no total de R$ 3,2 bilhões, quanto a

devolução retroativa de valores cobrados indevidamente em anos anteriores, que

totaliza quase R$ 1,5 bilhão;

(iii) A Abrace entende que o montante equivalente a esses itens deve ser considerado

também como contrapartida no item Cotas CDE – Energia;

(iv) Além do valor proposto pela Aneel, de R$ 3,468 bilhões (ajustado conforme

subseção 9.1 do presente relatório de contribuição), a proposta da Abrace considera

a inclusão das despesas marcadas com (ii), pois são custos que devem ser

atribuídos apenas aos consumidores cativos.