Contratos De Trabalho No Setor De Transporte

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C ONTRATOS DE T RABALHO NO S ETOR DE T RANSPORTE

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Contratos de trabalho no setor de transporte

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Márcio Mendes GranconatoThereza Christina Nahas

Coordenadores

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EDITORA LTDA.

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Maio, 2014

Contratos de trabalho no setor de transporte / Marcio Mendes Granconato, Thereza Christina Nahas, coordena-dores. — São Paulo : LTr, 2014.

Vários autores

Bibliografia

1. Contratos de trabalho — Brasil 2. Direito do traba-lho — Brasil 3. Relações de trabalho — Brasil 4. Trabalho e trabalhadores 5. Transportes — Brasil I. Granconato, Marcio. II. Nahas, Thereza Christina.

14-03192 CDU-34:331.106(81)

1. Brasil : Setor de transporte : Contratos de trabalho : Direito do trabalho 34:331.106(81)

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Versão impressa - LTr 5035.6 - ISBN 978-85-361-2917-4Versão digital - LTr 7800.3 - ISBN 978-85-361-3014-9

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Sumário

Apresentação — Maria Doralice Novaes ...............................................................................................7

Prefácio — Pedro Paulo Teixeira Manus ................................................................................................9

Introdução — Silvia Regina Pondé Galvão Devonald ........................................................................11

Capítulo I — Contratos de Trabalho no Transporte Aéreo

1.1. Conceito de Aeronauta — Extensão e Limites ...........................................................................15 Luciano Martinez

1.2. Jornada de Trabalho do Aeronauta .............................................................................................29 Fernando Cesar Teixeira França

1.3. A Terceirização do Serviço Aeroviário .......................................................................................37 Carlos Augusto Marcondes de Oliveira Monteiro

1.4. O Adicional de Periculosidade no Transporte Aéreo .............................................................44 Fabíola Marques

Capítulo II — Contratos de Trabalho no Transporte Ferroviário

2.1. O Contrato de Trabalho no Transporte Ferroviário Moderno ............................................55 Maurício Pereira Simões

2.2. Os Intervalos Intrajornada e Entrejornada no Transporte Ferroviário ..........................67 Gerson Lacerda Pistori

2.3. Horas de Sobreaviso e Horas de Prontidão no Transporte Ferroviário .............................80 Rodrigo Garcia Schwarz

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2.4. Metroviário: Legislação Aplicável e Características Relevantes da Profissão ...............90 Jairo Lins de Albuquerque Sento-Sé

Capítulo III — Contratos de Trabalho no Transporte Marítimo

3.1. O Meio Ambiente do Trabalho Portuário ...................................................................................99 Ronaldo Curado Fleury

3.2. O Direito Fundamental ao Meio Ambiente do Trabalho e o Trabalho Portuário ...........107 Norma Sueli Padilha

3.3. Direitos Fundamentais do Trabalhador Portuário Avulso — um Olhar sobre o Direito ao Meio Ambiente do Trabalho Decente e sobre o Direito à Igualdade ............................118 Ângelo Fabiano Farias da Costa

3.4. O Papel do Sindicato na Defesa do Meio Ambiente do Trabalho Portuário ....................129 Roberto Vieira de Almeida Rezende

3.5. Legislação Aplicável ao Trabalhador Marítimo Brasileiro em Serviço no Exterior ....136 Augusto Grieco Sant’Anna Meirinho

Capítulo IV — Contratos de Trabalho no Transporte Rodoviário

4.1. Relação de Trabalho no Transporte de Cargas: os Diversos Graus de Subordinação ...151 Thereza Christina Nahas

4.2. Meio Ambiente do Trabalho, Prevenção de Riscos, Dignidade Humana e as Responsabi-lidades pelos Danos no Setor de Transporte ...........................................................................158 Raimundo Simão de Melo

4.3. A Jornada de Trabalho, o Intervalo para Refeição e Descanso e o Controle de Ponto do Motorista Profissional ...........................................................................................................170 Francisco Ferreira Jorge Neto; Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante

4.4. Contrato de Trabalho do Mototaxista e do Motoboy ...........................................................182 André Cremonesi

4.5. Taxista Profissional: Autônomo, Cooperado ou Empregado? ..............................................188 Márcio Mendes Granconato

4.6. Contrato de Trabalho Coletivo de Passageiros: Principais Aspectos ...............................198 Andréa Presas Rocha

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ApreSentAção

Ministério Público do Trabalho e a Defensoria Pública da União, realiza diligências para identificar situações de trabalho escravo e condições degradantes de trabalho no âmbito da Segunda Região. A constituição do Núcleo de Pesquisa Patrimonial centralizando informações para fins de obtenção de patrimônio passível de penhora com be-nefícios para a efetividade da execução, são apenas alguns dos projetos exitosos que o TRT/2 realizou nesses novos tempos em prol da melhoria substantiva do desempenho da Administração Pública na sua relação com os cidadãos.

Mas não é só. Empenha-se com afinco o TRT/2 em promover a seus servidores e magistrados um ambiente seguro e saudável, onde cada um possa realizar o melhor trabalho, nas melhores condições contando, para assegu-rar essa ambição, com um sistema de gestão específico, o COS, Comitê da Ordem Social, que revê e analisa os riscos, os incidentes e o desempenho de segurança no ambiente de trabalho, reforçando os padrões para um comportamento permanentemente seguro.

E mais. Além de tentar criar um ambiente interno que desperte nas pessoas a vontade sincera de dar sua contribuição, positiva e devidamente colimada, formula e executa ações dirigidas aos atores da sociedade civil objetivando a prevenção de acidentes de trabalho e ao fortalecimento da Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho.

Promovendo a conscientização da importância do meio ambiente seguro, contribui, assim, nossa Casa de Justiça, para o desenvolvimento de uma cultura de pre-venção de acidentes de trabalho.

E, ao tornar-se parceiro do TST e do CSJT no Pro-grama Trabalho Seguro ampliou aquele horizonte, já que uniu forças com a Justiça do Trabalho para alcançar a preservação da higidez em todo e qualquer ambiente laboral.

A Justiça do Trabalho da Segunda Região vive um mo-mento especial e único na sua evolução histórica. Mesmo sendo septuagenária tem apresentado, dia a dia, sinais de rejuvenescimento. Sofreu MUDANÇAS FUNDAMENTAIS PAUTADAS NAS QUALIDADES QUE LHE TROUXERAM AO PRESENTE. ADAPTOU-SE AOS NOVOS TEMPOS, AOS NOVOS AMBIENTES. TORNOU-SE, ASSIM, MAIS PODEROSA E MAIS MODERNA DO QUE NUNCA, VER-DADEIRAMENTE CONTEMPORÂNEA, COERENTE COM O MUNDO ATUAL, CUJAS FACILIDADES INTRODUZIDAS PELO UNIVERSO TECNOLÓGICO TÊM PROVOCADO UMA VERDADEIRA REVOLUÇÃO.

A implantação do Processo Judicial Eletrônico, dando adeus aos autos de processo físico, ao processo judicial tradicional trazendo, além da inequívoca preservação de recursos naturais, a tão almejada redução do tempo de tramitação das demandas trabalhistas. A criação de Fóruns Distritais que, a par de desenvolver uma ação afirmativa de política pública, qualificando o atendimento ao cidadão na defesa e na promoção de seus direitos fundamentais e franqueando à população em todos os sentidos o acesso à informação, às decisões, aos serviços e ao bom aten-dimento, realiza a justiça pela, para e na comunidade. O incremento do Núcleo Permanente de Conciliação em Dissídios Individuais incentivando, promovendo, siste-matizando e realizando atividades de cunho conciliatório durante todo o ano judiciário. A criação e instalação do Núcleo Permanente de Conciliação em Dissídios Coletivos que, independentemente das tentativas de negociação previstas na CLT media todos os dissídios e ações coletivas ajuizados. A criação e instalação do Juízo Auxiliar da Infân-cia e da Juventude garantindo pleno êxito aos projetos e medidas ao propósito da erradicação do trabalho infantil e da proteção ao trabalho decente do adolescente. A criação da Vara Itinerante de Combate ao Trabalho Escravo que, juntamente com o Ministério do Trabalho e Emprego, o

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Isso porque os números alarmantes de aciden-tes de trabalho, alguns deles materializados em ações trabalhistas, não só comprometem a integridade física do trabalhador, como podem resultar, também, em alterações psiquiátrico-psicológicas que repercutem no relacionamento intrapessoal, familiar, social e laboral do indivíduo, comprometendo sonhos, projetos de vida e de realização pessoal.

Com a plena consciência dessa responsabilidade é o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, em mais uma campanha do Projeto Trabalho Seguro, promove o lançamento desta importante obra focando uma das relações de trabalho que mais têm causado polêmicas e afetado vidas, a do setor de transportes, indiscutivelmente inserida no cotidiano de cada um e de todos nós, através dos necessários meios aeroviários, marítimos, rodoviários e ferroviários.

Certos de que este primeiro estudo terá a missão de permitir a reflexão de todos em torno das diversas questões que afligem esse seguimento e, assim, cumprir nossa meta, na árdua busca pela redução de acidentes do trabalho, auguramos seja este apenas o primeiro trabalho especifico desta importante campanha.

Transferir para o leitor, também, um pouco mais do que permitem as aparências constitui outro objetivo. Em textos leves, profundos e de extremo profissionalismo a importante questão do acidente de trabalho no setor de transportes foi transformada em palavras. Os prota-gonistas, muito bem acompanhados, estão nas páginas seguintes. Agora o julgamento caberá a você, leitor.

Saudações.

Maria Doralice Novaes Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região

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prefácio

cuida da matéria. A seguir, Roberto Vieira de Almeida Rezende examina o fenômeno da terceirização no serviço aeroviário, fenômeno mundial que inquieta a comu-nidade jurídico-trabalhista, mormente pelos riscos da precarização das condições de trabalho. Fabíola Marques cuida do tema adicional de periculosidade no transporte aéreo, questão sempre presente nos conflitos judiciais que envolvem a categoria. Cláudia José Abud encerra o capítulo tratando da legislação trabalhista do aeronauta estrangeiro.

No segundo capítulo, o livro cuida do transporte ferroviário, atividade de importância capital para a vida e o desenvolvimento do nosso país e que os rumos do capital fizeram por marginalizá-la ao longo do tempo, infelizmente. Divide-se o capítulo em três abordagens. Maurício Pereira Simões trata do contrato de trabalho no transporte ferroviário moderno. Gerson Lacerda Pistori examina os intervalos intrajornada e entrejornada no transporte ferroviário e Rodrigo Garcia Schwarz ocupa-se das horas de sobreaviso e horas de prontidão no trans-porte ferroviário.

O terceiro capítulo dedica-se ao transporte marí-timo, dividido em quatro estudos. Norma Sueli Padilha cuida do meio ambiente do trabalho e da qualidade de vida do trabalhador portuário. Ronaldo Curado Fleury examina as novidades introduzidas pela Medida Provi-sória n. 595/2012, tendo escrito o texto antes da sua transformação em lei. Augusto Grieco Sant’Anna Meirinho detém-se no exame dos direitos trabalhistas do trabalha-dor avulso e, afinal, Ângelo Fabiano Farias da Costa estuda a legislação aplicável ao trabalhador marítimo brasileiro em serviço no exterior.

O quarto capítulo examina o transporte rodoviário e está dividido em cinco abordagens diversas. Francisco

Entre as várias atividades produtivas desenvolvidas no Brasil, o setor de transportes assume papel relevante, mormente ao levar em conta as dimensões do nosso país, o que demanda muito empenho na comunicação entre as várias localidades, o deslocamento das pessoas e dos bens, assim como o esforço necessário para estabelecer a conexão entre a produção e os centros consumidores e exportadores.

Daí decorre a necessidade de tratamento específico para cada setor dos transportes de pessoas e cargas, no que respeita à relação de trabalho e as suas características e a necessária disciplina legal referente a cada atividade.

Norteado por esta perspectiva e buscando dar tratamento adequado ao tema, o Programa de Trabalho Seguro, do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região, trouxe a nós este oportuno livro, que se ocupa dos vários setores de transportes, sublinhando as carac-terísticas de cada um.

O Programa, sob a gestão das magistradas Silvia Regina Pondé Galvão Devonald, vice-presidente adminis-trativa do Tribunal, e Thereza Christina Nahas, produziu a presente obra, com a coordenação da Exma. Sra. presiden-te do Tribunal, Maria Doralice Novaes, e dos magistrados Thereza Christina Nahas e Marcio Mendes Granconato.

O livro compõe-se de quatro capítulos, divididos por setores da atividade, a saber: transporte aéreo, transporte ferroviário, transporte marítimo e transporte ferroviário, revelando não só uma preocupação com o conteúdo, mas também um cuidado didático, buscando atender ao inte-resse do leitor, facilitando sua pesquisa e compreensão.

O primeiro capítulo ocupa-se do transporte aéreo, dividindo-se entre quatro abordagens específicas. Fernan-do Cesar Teixeira França examina a jornada de trabalho e os demais aspectos relevantes da Lei n. 7.183/84, que

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Ferreira Jorge Neto estuda a jornada de trabalho, o intervalo para refeição e descanso e o controle de ponto do motorista profissional. André Cremonesi cuida do contrato de trabalho do mototáxi e do motoboy. Marcio Mendes Granconato apresenta o taxista profis-sional: autônomo, cooperado ou empregado? Thereza Christina Nahas cuida da relação de trabalho no trans-porte de cargas: autônomos, empregados e avulsos; e, finalizando a obra, Raimundo Simão de Melo dedica-se à prevenção de riscos e a dignidade no trabalho no setor de transporte.

Como se vê, trata-se de obra completa, atual e minuciosa sobre o transporte no Brasil, sob a óptica da relação de trabalho e das questões dela decorrentes, que demandam estudo cuidadoso e competente, como condição para a correta equação dos vários conflitos que ocorrem no setor.

A felicidade da iniciativa de escrever esta obra é fruto da excelente qualidade da gestão do Programa e da coordenação da obra. Coroa a iniciativa a feliz escolha dos temas tratados, todos eles por profissionais do mais alto gabarito e que aliam às suas qualidades como juristas a prática excelente na advocacia, na magistratura e no Ministério Público do Trabalho.

Temos ao nosso alcance uma excelente obra, que aborda as questões importantes sobre o Direito do Tra-balho e o transporte de pessoas e bens, e que é fruto da experiência profissional e da pesquisa de seus autores, que muito vem auxiliar a todos os que se ocupam desta área jurídica.

Pedro Paulo Teixeira Manus Diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP.

Ministro aposentado do Tribunal Superior do Trabalho. Professor titular de Direito do Trabalho da PUC-SP.

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introdução

Programa Trabalho Seguro

A Emenda Constitucional n. 45, de 2004, trouxe profundas alterações no Judiciário Trabalhista.

De um momento para outro, passamos a receber ações acidentárias, até então da competência exclusiva da Justiça comum, com um rol de pleitos inéditos para todos os operadores do Direito do Trabalho.

Além dessa alteração de competência, outra ocorreu, mais profunda. Vimos surgir uma profusão de processos discutindo acidentes de trabalho, sequelas e mortes deles decorrentes, moléstias profissionais, gas-tos previdenciários, enfim, uma variada gama de novos assuntos.

Porém, o mais preocupante se resumiu às esta-tísticas. Embora se diga que elas são frias, retratando somente números, foram estes que deram uma visão dantesca da realidade escondida de nossos trabalhadores.

Somente nos últimos anos, tivemos o seguinte quadro:

2010 — 729.413 acidentes de trabalho com 15.942 trabalhadores com incapacidade per-manente e 2.753 óbitos;

2011 — 741.205 acidentes de trabalho com 16.658 trabalhadores com incapacidade per-manente e 2.938 óbitos;

2012 — 724.169 acidentes de trabalho com 14.755 trabalhadores com incapacidade per-manente e 2.731 óbitos.

Podemos comparar estes números com os de um acidente de avião, que tanto impacto causa na sociedade

pelo de seu elevado número de mortes. No entanto não nos apercebemos que no Brasil “cai” um avião por mês em decorrência do número de mortos por acidentes de trabalho (8 por dia, em média, 240 por mês). Neste quadro sequer computamos aqueles trabalhadores que jamais retornarão ao trabalho em razão de incapacidade permanente, cerca de 40 por dia.

Estes dados, contudo, não representam a totalidade dos acidentes, uma vez que se referem, tão somente, aos acidentes notificados (por CAT) e no universo de trabalhado-res formais. Os trabalhadores informais, muito mais sujeitos a acidentes em consequência da precariedade das condi-ções de trabalho, jamais constaram nas estatísticas oficiais.

Os gastos suportados pelo INSS em razão dos aci-dentes de trabalho superam os 10 bilhões de reais ao ano; porém, se acrescentássemos os gastos operacionais do INSS e os da Saúde, esse montante ultrapassaria os 60 bilhões de reais.

Diante de quadro tão tenebroso, colocando o Brasil no 4º lugar no ranking mundial de acidentes laborais (se-gundo dados da Organização Internacional do Trabalho), a Justiça do Trabalho decidiu se posicionar na vanguarda dos acontecimentos. Os magistrados tomaram consciência de seu papel, não de meros julgadores, apreciando, tão somente, a prova fria dos autos, mas, acima de tudo, de agentes transformadores sociais. Deixaram o conforto de seus gabinetes e partiram rumo às obras, realizando palestras junto a população trabalhadora, além de ações educativas nas escolas, em um esforço inédito no sentido de conscientização dos trabalhadores e dos empregado-res sobre a importância da prevenção dos acidentes de trabalho.

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O primeiro passo foi a criação do Programa Trabalho Seguro no Tribunal Superior do Trabalho, em maio de 2011, que conseguiu engajar magistrados de todos os Regionais do país, constituindo núcleos compostos de cinquenta e quatro gestores encarregados de promover palestras e eventos durante todo o ano e, em especial, no mês de abril, quando é celebrado o dia mundial em me-mória das vítimas de acidentes de trabalho (28 de abril).

O Protocolo de Cooperação Técnica, firmado entre o Tribunal Superior do Trabalho, o Ministério do Trabalho e Emprego, o Ministério da Saúde, o Ministério da Previ-dência Social, a Advocacia-Geral da União, o Ministério Público do Trabalho, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e a Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Medicina e Segurança do Trabalho (Fundacentro), objetivou con-jugar esforços para implementação de projetos ligados à prevenção de acidentes de trabalho e ao fortalecimento da Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho.

No âmbito estadual, os gestores regionais criaram os Grupos de Trabalho Interinstitucionais (GETRIN), que con-gregam Secretarias de Estado de Saúde, Educação, Justiça e Cidadania, Trabalho, Defesa Social, além de firmarem parcerias com sindicatos de empregados e empregadores das mais variadas categorias profissionais e econômicas, todas participando ativamente da elaboração de progra-mas voltados à segurança do trabalho.

Também foi implementada a Recomendação Conjun-ta n. 2, da Presidência do Tribunal Superior do Trabalho e da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, no sentido de encaminhamento à Procuradoria-Geral Federal (PGF) de cópias de sentenças e acórdãos que reconheçam con-duta culposa do empregador em acidente de trabalho para ajuizamento de ação regressiva (art. 120 da Lei n. 8.213/91), sendo certo que desde março de 2012 foram

remetidas mais de 6.500 delas. Segundo publicações recentes (início de 2012), o INSS já moveu pelo menos 2 mil ações regressivas, com expectativa de reaver mais de 400 milhões de reais.

No 2º Seminário Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho, realizado no mês de agosto de 2013, foi firmado Acordo de Cooperação Técnica com o Ministério do Trabalho e Emprego envolvendo questões relacionadas aos agentes insalubres no meio ambiente de trabalho, outra matéria espinhosa e que deteriora a saúde do tra-balhador, caso não sejam adotadas medidas eficazes de eliminação ou neutralização de agentes nocivos. Assim, com base nos laudos produzidos na Justiça do Trabalho, o Ministério do Trabalho e Emprego é informado e poderá realizar a fiscalização dos locais de trabalho e das condi-ções de labor ali desenvolvidas.

Em âmbito nacional, os gestores realizaram em 2012 campanhas voltadas à prevenção de acidentes de trabalho na construção civil e pesada, e em 2013, no transporte, razão principal da elaboração deste livro. Todas essas cam-panhas tiveram significativo impacto social, com grande participação popular, gerando enorme expectativa para a tomada de consciência conjunta no sentido de que é pre-ciso mudar urgentemente o meio ambiente de trabalho, tornando-o saudável e valorizando o trabalhador, peça principal da engrenagem produtiva.

Se conseguirmos evitar que um só trabalhador se torne permanentemente incapacitado ou que perca a vida, já terá valido a pena essa iniciativa.

Silvia Regina Pondé Galvão Devonald Vice-Presidente Administrativa do TRT-2ª Região. Gestora Regional do Programa Trabalho Seguro.

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Capítulo I

Contratos de trabalho no transporte aéreo

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1.1. Conceito de Aeronauta — Extensão e Limites

Luciano Martinez(*)

Sumário: 1. Introdução: a aviação, o transporte aéreo e a importância da regulação do trabalho dos aeronau-tas. 2. O conceito de aeronauta: da tripulação técnica à tripulação de serviços. 3. Aeronauta como categoria profissional diferenciada em algumas problemáticas. 4. A habilitação profissional e o direito fundamental ao trabalho. 5. A profissão de aeronauta é realmente privativa de brasileiros? O direito fundamental à igualdade de tratamento entre brasileiros e estrangeiros residentes no país. 6. Aeronauta doméstico: categoria juridica-mente possível? 7. Há limite etário para o exercício da profissão de piloto de aeronave? Conclusão. Referências bibliográficas.

1. Introdução: a aviação, o transporte aéreo e a importância da regulação do trabalho dos aeronautas

Voar. Este é, sem dúvidas, o mais fascinante dos so-nhos humanos, não apenas pelas delícias de estar solto no espaço, mas, especialmente, pela indissociável ideia de li-berdade e de superação de limites que o voo proporciona. Não por outro motivo, o ato de voar com plena autonomia é historicamente visto como um atributo de potência que os seres humanos somente conseguiriam ter nos limites das fábulas, das lendas e dos contos. Aparatos são, por isso, entendidos como essenciais ao sonho de voar, mas a

segurança imposta ao ato faz lembrar a todo instante do cuidado que não teve o mitológico Ícaro, filho de Dédalo, morto ao cair sobre o mar Egeu depois de entusiasmar-se com as alturas, sem dar-se conta de que o sol derreteria a cera que unia as penas de suas [apenas artificiais] asas.

O humano tornou-se, então, ciente de suas limi-tações e compreendeu que somente por seu próprio engenho poderia subir às alturas e, mais do que isso, que o seu pouso seguro era tão ou mais importante quanto a sua ascensão ao céu.

Nesse contexto, afirma-se que Leonardo Da Vinci (1452-1519) teria sido o primeiro a empenhar-se sobre projetos capazes de permitir que um artefato levasse o

(*) Doutor em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Direito Privado e Econômico pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestre em Direito Social pela Universidad de Castilla-La Mancha (UCLM — título reconhecido pela USP) e dou-torando em Direito Social pela Universidad de Castilla-La Mancha (UCLM). É juiz do Trabalho desde julho de 1995, titular da 9ª Vara do Trabalho de Salvador. Professor adjunto (doutor) de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da UFBA. Coordenador da Pós-Graduação em Direito do Trabalho da Fundação Faculdade de Direito. Professor convidado em diversos Programas de Pós-Graduação e em diversas escolas judiciais do país. Atua nas áreas de Direitos Fundamentais, de Direito do Trabalho (relações individuais e coletivas), de Processo do Trabalho e de Direito da Seguridade Social. É titular da Cadeira 52 da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e titular da Cadeira 26 da Academia de Letras Jurídicas da Bahia. É colunista do jornal A Tarde. Autor de diversas obras, entre as quais, Curso de Direito do Trabalho e Condutas Antissindicais, ambas publicadas pela editora Saraiva. Curriculum Lattes: <http://lattes.cnpq.br/8883729921865765>.

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homem ao sobrevoo, intento somente alcançado alguns séculos depois, em 1709, pelo padre luso-brasileiro Bar-tolomeu de Gusmão, a bordo de sua Passarola, um balão de ar quente reconhecido como o primeiro aeróstato operacional que se deslocou pelos céus de Lisboa por aproximadamente um quilômetro.

Os irmãos norte-americanos Wilbur e Orville Wright, em 1903, conseguiram manter por 59 segundos no ar uma embarcação, disparada por uma catapulta. Coube, porém, a Alberto Santos Dumont o mérito da demonstração da possibilidade de decolagem auto-propulsada e controlada com objeto mais pesado que o ar no ano de 1906. Importante anotar a existência de controvérsias sobre o verdadeiro pai da aviação. Há quem afirme que, mesmo antes do brasileiro e dos norte-americanos, embora secretamente, por motivos militares, teria o francês Clément Ader realizado o mes-mo feito no ano de 1890.

A verdade é que, depois desses precursores, a ativi-dade de pesquisa relacionada a voos em aparelhos mais leves que o ar (aeróstatos como, por exemplo, os balões e os dirigíveis) ou mais pesados que este (aerodinos como, por exemplo, os aviões e os helicópteros) foi considera-velmente incrementada.

A aeronáutica, entendida como a ciência dedicada ao estudo da locomoção aérea no interior da atmosfera terrestre e das particularidades das aeronaves utilizadas para esse fim, viveu um boom depois da Primeira Guerra Mundial. Em qualquer dos seus dois ramos — tanto na ae-rostação, que versa sobre o deslocamento em aeróstatos, quanto na aviação, que trata da locomoção em aerodinos, houve considerável interesse econômico e social.

Cabe anotar que a aerostação destinada ao trans-porte em massa de passageiros sofreu considerável desestímulo depois que, em 1937, o dirigível alemão LZ 129 Hindenburg explodiu na estação de Lakehurst, em Nova Jersey, nos Estados Unidos, matando 36 dos seus ocupantes. Era o ponto de partida para o seu ocaso.

Todos os olhares do mundo se voltaram, então, para a aviação. O entusiasmante voo transatlântico de Charles Lindbergh, em 1927, e o transpacífico de Charles Kingsford Smith, em 1928, associados ao sucesso do Douglas DC-3, primeira aeronave de uso comercial que se revelou rentável no âmbito do transporte de

passageiros, demonstravam definitivamente que o céu era dos aviões(1).

A Segunda Guerra Mundial fez deles arma de impor-tância inquestionável e dos aeroportos, criados em toda a parte, necessidade estratégica para qualquer Estado. Milhares de pilotos foram formados e a tecnológica de construção das aeronaves difundiu-se pelo mundo. A par-tir da segunda metade do século XX, surgiram os jatos, a exemplo do Boeing 707, para reduzir ainda mais a relação tempo/deslocamento.

O ser humano queria ir mais alto e até superar os limites da atmosfera terrestre. E foi mais alto. O cosmo-nauta soviético Yuri Gagarin, a bordo da Vostok 1, viajou pelo espaço sideral em 1961, e o norte-americano Neil Armstrong chegou aos píncaros de pisar na lua em 1969, transportado pela Apollo 11. Esses domínios estratosfé-ricos, entretanto, fogem ao campo da aeronáutica e aos contornos desse estudo, uma vez que se fixam na área de estudo conhecida como astronáutica. Seja como for, entretanto, a tecnologia revela que, apesar de o homem não ter asas, sua criatividade e sua engenhosidade pode-riam levá-lo a voar além dos limites dos pássaros e numa velocidade bem maior do que a do próprio som.

A relevância da aviação, especialmente do transpor-te aéreo, pode ser medida em números. Considerados dados oficiais da ANAC(2), a quantidade de voos domésti-cos saltou no Brasil de 534.700 em 2003 para 989.137 em 2012, quase o dobro em menos de dez anos. O mesmo aconteceu com a quantidade de voos internacionais, que saltou de 76.391, em 2003, para expressivos 137.770, em 2012. Quando analisados os dados de passageiros pagantes transportados entre 2003 e 2013, os números são ainda mais acentuados e revelam que a sociedade brasileira efetivamente reconheceu o transporte aéreo como uma alternativa possível. A mesma ANAC aponta que, de 29.108.583 passageiros transportados em voos domésticos em 2003, o número saltou para 88.665.102, vale dizer, mais do que triplicou. No âmbito dos voos inter-nacionais, o crescimento também foi espetacular, saindo dos 8.093.938, em 2003, para 18.510.995, em 2012.

Se houve aumento de demanda, ocorreu, evidente-mente, um incremento no número de postos de trabalho no âmbito da aviação civil, sendo, por isso, digno de regis-tro. O número de pilotos e copilotos, segundo a mesma ANAC, cresceu de 4.733, em 2009, para 6.371, em 2012, e de auxiliares de voo (comissários de um modo geral), de

(1) Há muitos e sérios estudos sobre a história da aviação no Brasil e no mundo. Entre muitos consultados para escrever a parte histórica, citamos: MALAGUTTI, A. O. Evolução da aviação civil no Brasil. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001; MEDEIROS, João Dutra de. Pioneiros do ar e a evolu-ção da aviação. Rio de Janeiro: ETA, 1979; MORRISON, Steven A; WINSTON, Clifford. The evolution of the airlines. Washington: Brookings, 1995.(2) AGÊNCIA NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL (ANAC). Anuário do Transporte Aéreo: Dados Estatísticos e Econômicos de 2012. Disponível em: <http://www2.anac.gov.br/estatistica/anuarios.asp> Acesso em: 5.1.2014.

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9.157 para 11.996 no mesmo período(3). Essas talvez sejam razões mais do que relevantes para que se ofereça aqui um estudo concentrado sobre o conceito e a regulação do trabalho dos aeronautas.

2. O conceito de aeronauta: da tripulação técnica à tripulação de serviços

O Decreto n. 16.983, de 22 de julho de 1925, inti-tulado Regulamento para os Serviços Civis de Navegação Aérea, foi a primeira norma brasileira a disciplinar a pro-fissão do aeronauta, identificado à época, e nos limites do art. 20 do referido diploma, como “qualquer membro ativo da tripulação de uma aeronave” (destaque nosso), desde que legalmente matriculado na repartição com-petente, assim entendido o Ministério da Viação e Obras Públicas. A matrícula pressupunha a apresentação da carta de habilitação e capacidade, concedida pelas escolas de aviação do Exército e da Marinha nacionais, mediante exames e provas reveladoras da habilitação técnica e da capacidade física, moral e profissional do aeronauta. A designação “membro ativo”, por outro lado, sugeria que, à época, o conceito de aeronauta se restringia àqueles que efetivamente pilotavam a aeronave ou que contri-buíam para o seu deslocamento, sendo isso evidente na referência expressa sobre alguns deles no citado art. 20: comandante piloto, navegador, observador e mecânico de voo.

Importa observar que, diante da incipiência da normatização até então existente — mesmo porque es-tamos falando dos primeiros anos do pós-Primeira Guerra Mundial —, os direitos e as obrigações dos aeronautas, entre si e em relação aos proprietários ou armadores das aeronaves a quem serviam a bordo, eram regulados pelas disposições legais vigentes, relativas à tripulação dos navios nacionais.

É bom registrar que a restrição conceitual aos mem-bros ativos permaneceu existente no Código Brasileiro do Ar, Decreto-Lei n. 483, de 8 de junho de 1938, o qual, em seu art. 28, dispunha ser aeronauta “o comandante, o piloto, o navegador, o mecânico e o radiotelegrafista, a serviço efetivo do uma aeronave”, os quais somente a poderiam tripular quando munidos das respectivas cartas de habilitação ou licenças. O Decreto n. 50.660, de 29 de maio de 1961, avançou na conceituação do aeronauta, estendendo-a também em favor do chamado comissário de bordo ou aeromoço, claramente referenciado no seu

art. 9º como “o auxiliar do comandante encarregado do serviço de atendimento dos passageiros, bagagens, car-gas, documentação, valores e malas postais” e também “do cumprimento das prescrições técnicas e disciplina-res referentes à segurança individual dos passageiros”, confirmando o que já se dispunha na Portaria n. 69, de 27 de abril de 1938, expedida pelo extinto Departamen-to de Aeronáutica Civil (e cronologicamente anterior ao Código Brasileiro do Ar), que já integrava o aeromoço como tripulante.

A norma ora em análise teve o cuidado de fazer sentir que o aeronauta assim seria considerado na medida em que, além da já consagrada habilitação agora sob os cuidados do Ministério da Aeronáutica, exercesse “função remunerada” a bordo de aeronave. Essa ressalva servia para excluir a responsabilidade (mas, especialmente, a possibilidade de formação de vínculo de emprego) daqueles que, embora habilitados como aeronautas, não estivessem propriamente a serviço da nave. Isso permitia, obliquamente, que estrangeiros habilitados como aeronautas pudessem atuar eventualmente nas aeronaves brasileiras, embora, nos termos da lei, sem remuneração, intento que ficou claramente visível, em momento posterior, no Código Brasileiro da Aeronáutica (Lei n. 7.565, de 19 de dezembro de 1986), no seu § 2º, art. 156, segundo o qual “a função não remunerada, a bordo de aeronave de serviço aéreo privado (art. 177), pode ser exercida por tripulantes habilitados, independente de sua nacionalidade”.

Pela primeira vez também a norma jurídica oferecia conceituação para cada um dos possíveis aeronautas, dei-xando claro que comandante seria o piloto responsável pela operação da aeronave, investido dos poderes e com as atribuições estabelecidas na legislação em vigor e a autoridade máxima desde o momento em que a aeronave lhe era entregue para o voo; primeiro oficial, o auxiliar e substituto direto do comandante na operação da aero-nave; segundo oficial, o piloto auxiliar do comandante na operação da aeronave que contasse com mais de dois pilotos; navegador de voo, o auxiliar do comandante encarregado da navegação; mecânico de voo, o auxiliar do comandante encarregado das operações mecânicas prescritas nos manuais da aeronave; rádio-operador, o auxiliar do comandante encarregado dos serviços de rádio e telecomunicação da aeronave, podendo cumular a função de navegador, quando munido da competente habilitação técnica; e o comissário ou aeromoço, já des-crito. Tornava-se previsto, também, que a composição das

(3) Vejam-se também os excelentes estudos do IPEA. Panorama e perspectivas para o transporte aéreo no Brasil e no mundo. Série eixos do desen-volvimento, n. 54. Brasília: Ipea, 2010, e da MCKINSEY & COMPANY. Estudo do setor de transporte aéreo do Brasil: relatório consolidado. Rio de Janeiro: McKinsey & Company, 2010.

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tripulações seria estabelecida, em cada caso, pelo órgão competente do Ministério da Aeronáutica, de acordo com as exigências operacionais da aeronave.

O Decreto-Lei n. 18, de 24 de agosto de 1966, revo-gou expressamente o Decreto n. 50.660, de 29 de maio de 1961, mas não trouxe grandes modificações no âmbito da conceituação de aeronauta, a qual permaneceu dentro dos mesmos limites, recebendo apenas o aprimoramento de uma classificação realizada, no seu art. 4º, no plano da tecnicidade: de um lado, os “aeronautas com funções técnicas”, bloco em que estavam o comandante, os oficiais, o navegador, o mecânico e o rádio-operador, e de outro, os “aeronautas com funções não técnicas”, em que se incluíam os chamados tripulantes de serviços ou comissários de bordo.

A Lei n. 7.183, de 5 de abril de 1984, ora aplicável, também não produziu expressivas modificações no pla-no da conceituação. Disse apenas, em seu art. 4º, que o aeronauta no exercício de função específica (técnica ou não técnica) a bordo de aeronave, de acordo com as prer-rogativas da licença de que é titular, tem a designação de tripulante e que, entre estes, há um categorizado como “tributante extra”.

O conceito do tripulante extra se encontra no bojo do art. 5º, que o designa como “o aeronauta de empresa de transporte aéreo regular que se deslocar, a serviço desta, sem exercer função a bordo de aeronave”. Importante dizer que, a teor dos arts. 23 e 31 do citado diploma, o tempo de deslocamento como tripulante extra para assumir voo ou retornar à base após o voo é remu-nerado e computado para fins de determinação da carga semanal e mensal de trabalho. Assim, se um voo de um determinado tripulante, depois de dias com longas horas de trabalho, terminar em Manaus, embora a sua base seja São Paulo, este poderá ingressar em aeronave com assentos disponíveis para retornar à casa. O ingresso se dará na condição de tripulante extra, ou seja, de aeronauta em viagem, utilizando o “passe de tripulante”. O mesmo pode acontecer com o tripulante cujo voo terá início em São Paulo às 20h, mas que, por conta de algum atraso ou cancelamento, se encontrava em Salvador às 12h. Ele poderá ingressar no primeiro voo com destino à capital paulista desde que existam assentos disponíveis.

Observe-se, porém, que, por disposição expressa do parágrafo único do art. 5º do ora analisado diploma legal, o aeronauta de empresa de transporte aéreo não regular (empresa que não atua com regularidade em determinada rota, mas, sim, mediante voos charter ou fretamentos) ou de serviço especializado (empresas de aerofotogrametria e cartografia, empresas de tratamento aéreo a lavouras ou ainda empresa de locação de veículos aéreos despor-tivos para fins econômicos ou para publicidade) terá a designação de tripulante extra apenas quando se deslocar em aeronave da sua empresa contratante, e, além disso, a serviço dela.

Cabe, por fim, extremar os conceitos de aeronauta e de aeroviário. O Decreto n. 1.232, de 22 de junho de 1962, que regulamenta a profissão do aeroviário, deixa claro, no seu art. 1º, que este é “o trabalhador que, não sendo aeronauta, exerce função remunerada nos serviços terrestres de Empresa de Transportes Aéreos”. O referido decreto utiliza, portanto, o conceito de aeronauta para delimitar o de aeroviário.

3. Aeronauta como categoria profissional diferenciada em algumas problemáticas

Não há dúvidas de que os aeronautas integram aquilo a que chamamos de categoria profissional diferen-ciada, assim entendido “o agrupamento daqueles que, pelo exercício de profissões ou funções extremamente singulares, mantêm, na forma do § 3º do art. 511 da CLT, um vínculo social básico pautado na solidariedade de interesses laborais”(4). A adjetivação “diferenciada”, conforme bem assentamos em nosso Curso de Direito do Trabalho, provém da existência de estatuto profissional especial(5) ou da singularidade de suas condições de vida. Assim, serão integrantes de uma categoria profissional diferenciada não apenas os trabalhadores que tenham uma lei que regulamente sua profissão (como é o caso dos aeronautas, advogados, médicos, engenheiros ou vende-dores viajantes), mas também aqueles que, embora não tendo estatuto profissional especial, têm uma vida laboral distinta da de outros trabalhadores ordinários (como é o caso dos atendentes de telemarketing).

Chamamos a atenção também para o fato de que a pertinência a uma categoria profissional diferenciada

(4) MARTINEZ, Luciano. Curso de direito do trabalho. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 734-735.(5) Acerca da fonte por meio da qual se reconhece a qualidade de categoria diferenciada, manifestou-se o TST, conforme a primeira parte da Orientação Jurisprudencial n. 36 da SDC do TST, no sentido de que “é por lei e, não por decisão judicial, que as categorias diferenciadas são re-conhecidas como tais”. No mesmo sentido se pode observar o conteúdo da Orientação Jurisprudencial n. 9, também da SDC do TST (inserida em 27.3.1998), segundo a qual “o dissídio coletivo não é meio próprio para o Sindicato vir a obter o reconhecimento de que a categoria que representa é diferenciada, pois esta matéria — enquadramento sindical — envolve a interpretação de norma genérica, notadamente do art. 577 da CLT”. Em outras palavras, segundo o entendimento do TST, não há como tutelar uma pretensão declaratória da existência de uma categoria profissional diferenciada, porque essa conclusão decorre de lei.

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independe da investigação acerca da atividade desenvolvida pelo empregador. Assim, um advogado que trabalha no setor jurídico de um banco, por exemplo, será advogado(6), e não bancário; um médico que trabalha no serviço es-pecializado em medicina do trabalho de uma metalúrgica será médico, e não metalúrgico; enfim, um aeronauta que foi contratado por uma empresa de seguros será aeronauta, e não securitário.

Há, nesse particular, uma dúvida recorrente. Pode, realmente, o aeronauta ser contratado por empresa diver-sa daquelas que realizam transportes aéreos ou serviços especializados aéreos?

Embora não seja esta uma situação habitual, pois grande parte das empresas prefere se valer dos serviços de táxi-aéreo, inclusive por conta dos custos com a manu-tenção de uma aeronave, há, sim, possibilidade jurídica de qualquer empresa contratar diretamente um aeronauta para pilotar aeronave de sua propriedade. Chamamos a atenção para a inexistência de vinculação entre a na-tureza do tomador dos serviços do aeronauta e este. O art. 2º da Lei n. 7.183, de 5 de abril de 1984, ao contrário de outras normas que serão a seguir referenciadas, não especifica quem seria o contratante do aeronauta. Dispõe--se ali, apenas, que “aeronauta é o profissional habilitado pelo Ministério da Aeronáutica, que exerce atividade a bordo de aeronave civil nacional, mediante contrato de trabalho”, e também “quem exerce atividade a bordo de aeronave estrangeira, em virtude de contrato de trabalho regido pelas leis brasileiras”. Não importa, assim, quem seja o contratante.

Diferentemente ocorre com o aeroviário, cuja norma que o conceitua — e que já foi citada neste estudo — dispõe no sentido de que ele é “o trabalhador que, não sendo aeronauta, exerce função remunerada nos serviços terrestres de Empresa de Transportes Aéreos”(7). Assim, somente há falar-se em aeroviário quando contratado por empresa de transporte aéreo. Não haverá, desse modo, aeroviário contratado por empresa de transporte rodoviário, embora seja teoricamente possível que esta, desde que proprietária de uma aeronave, tenha em seus quadros um aeronauta.

Quem ainda mantém dúvidas depois das razões ora expendidas e que prefere a segurança da disposição normativa poderá se assegurar da possibilidade de o aeronauta prestar serviços para qualquer tomador que

lhe contrate diante do teor dos arts. 122 e 123 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565, de 19 de dezembro de 1986). Vejam-se:

Art. 122. Dá-se a exploração da aeronave quando uma pessoa física ou jurídica, proprietária ou não, a utiliza, legi-timamente, por conta própria, com ou sem fins lucrativos.

Art. 123. Considera-se operador ou explorador de ae-ronave:

I — a pessoa jurídica que tem a concessão dos serviços de transporte público regular ou a autorização dos serviços de transporte público não regular, de serviços especiali-zados ou de táxi-aéreo;

II — o proprietário da aeronave ou quem a use direta-mente ou através de seus prepostos, quando se tratar de serviços aéreos privados;

III — o fretador que reservou a condução técnica da aeronave, a direção e a autoridade sobre a tripulação;

IV — o arrendatário que adquiriu a condução técnica da aeronave arrendada e a autoridade sobre a tripulação. (destaques nossos)

Não há dúvidas, portanto, de que qualquer proprie-tário de aeronave pode contratar piloto para conduzi-la e que, nessa condição, será o seu empregador.

Anote-se, ainda, e na linha de que qualquer pro-prietário de aeronave poderá contratar pilotos que os integrantes das categorias profissionais diferenciadas, como é o caso dos aeronautas, ou são arrimados por lei, que lhes é aplicável em caráter exclusivo, ou por norma coletiva, de que necessariamente deve participar a sua entidade sindical e obviamente a entidade representante da empresa que tenha contratado o aeronauta.

Não se olvide, então, que, nos termos da Súmula n. 374 do TST, um “empregado integrante de categoria pro-fissional diferenciada não tem o direito de haver de seu empregador vantagens previstas em instrumento coletivo no qual a empresa não foi representada por órgão de classe de sua categoria”. Para que fique mais claro, veja a seguinte ilustração: imagine que o sindicato nacional dos aeronautas tenha firmado uma convenção coletiva com o sindicato das empresas prestadoras de serviços aéreos especializados e que um aeronauta contratado por uma instituição financeira tenha pretendido as vantagens

(6) Veja-se, nesse sentido, a Súmula n. 117 do TST, segundo a qual “não se beneficiam do regime legal relativo aos bancários os empregados de estabelecimento de crédito pertencentes a categorias profissionais diferenciadas”. Isso acontece porque, evidentemente, quem é integrante de categoria profissional diferenciada não é bancário. Não sendo bancário, o integrante da mencionada categoria tem um sistema normativo próprio, constante de lei ou de norma coletiva específica.(7) No mesmo sentido, somente há falar-se em vigilante ostensivo ou em vigilante de transporte de valores quando, nos termos do art. 3º da Lei n. 7.102, de 20 de junho de 1983, ele tenha sido contratado por empresa especializada ou pelo próprio estabelecimento financeiro.

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contidas na mencionada norma coletiva. Evidentemente, esse aeronauta contratado pela instituição financeira não terá o direito de invocar a aplicação da referida conven-ção coletiva simplesmente porque a empresa para a qual trabalha não foi representada por órgão de sua categoria econômica, ou seja, não havia no polo patronal da norma coletiva qualquer entidade sindical que representasse as financeiras.

Há ainda um item muito controvertido em torno do qual os aeronautas foram protagonistas: o ponto que trata da possibilidade jurídica de formação de entidade sindical de pilotos a partir de desmembramento do sindicato dos aeronautas como categoria-mater. Sobre o assunto já tivemos oportunidade de sustentar a inexistência de ve-dação no ordenamento jurídico nesse particular(8), embora cônscios de que o STF posicionou-se expressamente em sentido diverso.

Os juízes e tribunais, evidentemente, têm o poder/dever de dizer o direito de acordo com a Carta e de inter-pretar cada disposição infraconstitucional de modo que ela se integre perfeitamente à sistemática constitucional. Essa missão toma elevadas proporções no âmbito da liberdade sindical porque a principal norma jurídica in-fraconstitucional que regulamenta esse direito defensivo e suas variáveis no Brasil é a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), um diploma produzido segundo o pensa-mento social, econômico e jurídico das primeiras décadas do século XX e que, inegavelmente, tem infundido um espírito corporativista que não mais é adequado à leitura democrática atual.

Por que, então, os pilotos não poderiam constituir um sindicato próprio para se desgarrar do sindicato na-cional dos aeronautas?

Segundo a perspectiva do STF, manifestada nos autos do RMS 21.305/DF (rel. min. Marco Aurélio),

[...] a organização sindical pressupõe a re-presentação de categoria econômica ou profissional. Tratando-se de categoria dife-renciada, definida à luz do disposto no par. 3 do art. 511 da Consolidação das Leis do Trabalho, descabe cogitar de desdobramento, por iniciativa dos interessados, consideradas as funções exercidas pelos sindicalizados. O disposto no parágrafo único do art. 570 do referido diploma aplica-se às hipóteses de existência de categoria similares ou conexas, e não de categoria diferenciada, muito embo-ra congregando trabalhadores que possuem

funções diversas. A definição atribuída aos trabalhadores e empregadores diz respeito à base territorial do sindicato — art. 8º, inciso II, da Constituição Federal, e não a categoria em si, que resulta das peculiaridades da profissão ou da atividade econômica, na maioria das vezes regida por lei especial, como ocorre em relação aos aeronautas. Mostra-se contrária ao princípio da unicidade sindical a criação de ente que implique desdobramento de catego-ria disciplinada em lei como única. Em vista da existência do Sindicato Nacional dos Ae-ronautas, a criação do Sindicato Nacional dos Pilotos da Aviação Civil não subsiste, em face da ilicitude do objeto. Segurança concedida para cassar-se o ato do registro no Ministério do Trabalho.

Não nos pareceu prestigiada no caso em exame a norma constitucional, que não cria nenhuma limitação à formação de agrupamentos sindicais por desmembra-mento territorial ou categorial, desde que respeitadas unicamente as restrições relativas à unicidade e à base territorial mínima. Nunca será exagerada a lembrança de que a Constituição não pode ser interpretada em tiras e que entre os fundamentos da República está a democra-cia e o pluralismo. Igualmente, ainda que tenhamos de nos vincular à literalidade do disposto no art. 8º, II, da Carta constitucional, não podemos deixar de perceber que a categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, “será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um município”. Se não há dúvidas de que a base territorial não pode ser inferior à área de um município, não existem suspeitas que se oponham à literalidade do referido dispositivo no sentido de que é justamente o conceito e a extensão de categoria — profissional ou econômica — que serão definidos pelos interessados, trabalhadores ou empregadores.

4. A habilitação profissional e o direito fundamental ao trabalho

Desde a publicação do Decreto n. 16.983/25 já se evidenciava a preocupação com a habilitação do aeronau-ta. Como o seu conceito inicial estava unicamente ligado ao exercício de atividades técnicas que permitissem à aeronave alçar voo, não se poderia dar espaço ao auto-didatismo e à falta de controle. As normas eram firmes nesse propósito e dispunham, entre outras medidas,

(8) Veja em MARTINEZ, Luciano. Condutas antissindicais. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 134-145.

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