CONTRATOS DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL E A … · Agradeço a Deus, Criador do Céu, da Terra e de...

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE DIREITO CONTRATOS DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL E A “VENDA CASADA” DE SEGURO Anderson Antonio Johann Lajeado, junho de 2015

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  • CENTRO UNIVERSITRIO UNIVATES

    CURSO DE DIREITO

    CONTRATOS DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL E A VENDA

    CASADA DE SEGURO

    Anderson Antonio Johann

    Lajeado, junho de 2015

  • Anderson Antonio Johann

    CONTRATOS DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL E A VENDA

    CASADA DE SEGURO

    Monografia apresentada ao Curso de Direito,

    do Centro Universitrio Univates, como parte

    da exigncia para a obteno do ttulo de

    Bacharel em Direito.

    Orientador: Prof. Me. Evandro Weisheimer

    Lajeado, junho de 2015

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo a Deus, Criador do Cu, da Terra e de tudo que h, aquele que me

    presenteou com a vida, com a famlia, com os amigos e com esta conquista, eis que

    cercou esta caminhada de perseverana, mesmo nas horas mais rduas.

    Aos meus pais, Flvio Antnio Johann e Maria Dulce Johann, que com amor

    me deram a vida e atravs da sua simplicidade e honestidade me ensinaram a ser a

    pessoa que sou, mostrando o que certo e errado e sempre acreditando na minha

    capacidade. No bastariam infinitas palavras para expressar o imenso amor e

    gratido que sinto por vocs.

    Ao meu irmo, Gerson Johann, mesmo de longe, foi e um exemplo de

    determinao e perseverana.

    Ao eterno, Carlos Fernando Westphalen dos Santos, (In Memorian), que tive

    o prazer de conviver, mesmo que por poucos anos, deixando registrado na minha

    alma e no meu corao, o exemplo de uma pessoa de carter, que atravs do seu

    conhecimento sempre sabia utilizar as palavras certas no momento exato,

    mostrando e me ensinando que o caminho certo o caminho do bem, fazendo com

    que os problemas parecessem uma brincadeira de criana.

    A todos meus amigos (as), que me permito no nome-los, eis que todos de

    alguma forma, em algum momento, foram essenciais para a minha trajetria. Alguns

    esto presentes at hoje, outros permaneceram por curto espao de tempo na

    minha vida. Mas todos (as), que foram de alguma forma essenciais, pelo carinho,

  • pelos conselhos, pelas alegrias e tristezas compartilhadas, pelo incentivo constante

    e, por me aguentarem, principalmente!

    Ao meu professor e orientador, que escolhi para me ajudar nessa tarefa nada

    fcil, por ser um excelente profissional e uma pessoa de carter e boa ndole, no

    qual admiro muito.

    s mulheres, sem excees, que de alguma maneira compreenderam minha

    maneira de agir, pensar e amar, acreditando no sentimento e no verdadeiro amor.

  • RESUMO

    A presente monografia objetiva verificar os elementos dos contratos de financiamento habitacional e a venda casada de seguro. Trata-se de pesquisa qualitativa realizada por meio de mtodo dedutivo e de procedimento tcnico bibliogrfico e documental. Desta forma o estudo comea pela anlise do direito bancrio, partindo de sua origem e evoluo at os tempos atuais, conceituando e classificando as instituies financeiras e banco, caracterizando as operaes bancrias como passivas e ativas, para depois, partindo da anlise do direito do consumidor nos seus aspectos histricos, identificando os princpios comuns do direito bancrio e do direito do consumidor, explicar de que forma se d a responsabilidade civil no CDC, para determinar a sua aplicao no direito bancrio. Ao final do estudo analisa-se os produtos e servios ofertados na contratao de financiamento bancrio, para examinar-se, a partir da venda casada no CDC, se ela ocorre em relao aos seguros vinculados nos financiamentos habitacionais a partir do enfrentamento de exemplos prticos e dos entendimentos do STJ, TRF da 4 Regio e TJ/RS, quanto ao tema. Palavras-chave: Venda casada. Financiamento habitacional. Seguro. Direito bancrio. Consumidor.

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    Pargrafo

    a.C Antes de Cristo

    Art. Artigo

    BACEN Banco Central do Brasil

    BCB Banco Central do Brasil

    BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social

    CC/2002 Cdigo Civil de 2002

    CC/2016 Cdigo Civil de 1916

    CDC Cdigo de Defesa do Consumidor

    CEF Caixa Econmica Federal

    CF/88 Constituio Federal de 1988

    CMN Conselho Monetrio Nacional

    CPC Cdigo Processo Civil

    FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Servio

  • INSS Instituto Nacional de Seguridade Social

    PRICE Sistema Francs de Amortizao

    SAC Sistema de Amortizao Constante

    SFH Sistema Financeiro da Habitao

    SFI Sistema Financeiro Imobilirio

    SFN Sistema Financeiro Nacional

    STF Supremo Tribunal Federal

    STJ Superior Tribunal de Justia

    TJ/RS Tribula de Justia do Rio Grande do Sul

    TRF Tribula Regional Federal

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ......................................................................................................... 9 2 DIREITO BANCRIO ............................................................................................ 11 2.1 Origem e evoluo do direito bancrio ........................................................... 11 2.2 Direito bancrio no Brasil ................................................................................. 14 2.3 Conceito e classificao de Instituio financeira e banco .......................... 19 2.4 Operaes bancrias ........................................................................................ 25 2.5 Classificao das operaes bancrias .......................................................... 28 3 DIREITO DO CONSUMIDOR ................................................................................. 32 3.1 Aspectos histricos do Direito do Consumidor ............................................. 32 3.2 Princpios comuns do Direito Bancrio e do Direito do Consumidor .......... 36 3.3 Responsabilidade Civil no Cdigo Defesa do Consumidor .......................... 40 3.4 Aplicabilidade do Cdigo de Defesa do Consumidor no Direito Bancrio.................................................................................................................... 47 4 CONTRATOS DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL E A VENDA CASADA DE SEGURO ............................................................................................................. 52 4.1 Operaes bancrios ofertadas pelas instituies financeiras quando da contratao dos financiamentos habitacionais .................................................... 52 4.1.1 Conta corrente ................................................................................................ 53 4.1.2 Cheque ............................................................................................................ 54 4.1.3 Carto de crdito ............................................................................................ 55 4.1.4 Caderneta de poupana ................................................................................. 55 4.1.5 Seguros ........................................................................................................... 56 4.1.6 Emprstimo bancrio ..................................................................................... 57 4.2 Financiamento habitacional ............................................................................. 58 4.3 A venda casada e o Cdigo de Defesa do Consumidor ............................. 61 4.4 Um olhar sobre o entendimento do STJ, TRF da 4 Regio e TJ/RS sobre a venda casada nos financiamentos habitacionais ............................................. 67 4.5 Os contratos de financiamento habitacional e a venda casada de seguro .................................................................................................................................. 76

  • 5 CONSIDERAES FINAIS ................................................................................... 81 REFERNCIAS ......................................................................................................... 85

  • 9

    1 INTRODUO

    A proposta do presente estudo verificar os elementos dos contratos de

    financiamento habitacional e a venda casada de seguro. O tema interessante e

    atual, em razo da estabilidade monetria no pas, decorrente do Plano Real, as

    pessoas passaram a ter melhores condies para adquirir bens de valores

    agregados maiores, bem como organizar-se financeiramente ao longo do tempo.

    Fatores que, em conjunto com um incentivo governamental para aquisio da casa

    prpria atravs dos programas habitacionais com taxas e juros reduzidos, causou

    um aquecimento nos ramos imobilirio e da construo civil.

    As pessoas hoje tm a oportunidade de acesso facilitado de financiar um

    imvel ao invs de pagar aluguel somente pela moradia momentnea. Contudo, o

    trmite do processo para a aquisio da casa prpria minucioso e o contrato que

    firmado entre o muturio/consumidor e a instituio financeira apresenta-se de difcil

    compreenso ao homem comum, o que facilita a sua induo a adquirir produtos ou

    servios que no necessita, o que pode caracterizar a ocorrncia da venda casada,

    prtica que vedada pelo Cdigo de Defesa do Consumidor.

    Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo geral analisar se ocorre a

    venda casada de seguro nos financiamentos habitacionais, e assim discute como

    tema: de que forma pode ocorrer a venda casada em financiamentos habitacionais

    de produtos e servios?

    Como hiptese para tal questionamento, partiu-se do entendimento de que o

    cidado interessado em adquirir um imvel atravs de financiamento habitacional,

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    ter que se sujeitar as regras contidas no contrato de adeso firmado com a

    instituio financeira. Contudo, em regra, para financiar o muturio tambm ter que

    abrir conta corrente no banco financiador, contratar seguro habitacional, adquirir

    carto de crdito, etc. para ter direito a uma taxa de juros reduzida, o que pode

    caracterizar a venda casada pelo olhar do consumidor, quando pelo olhar da

    instituio financeira, a contratao ou no desse pacote de servios mera

    faculdade que gera ao muturio/consumidor uma vantagem financeira.

    A pesquisa, na sua abordagem ser qualitativa tendo como objetivo o

    aprofundamento no contexto estudado e a perspectiva interpretativa dos possveis

    dados encontrados com a realidade, conforme Mezzaroba e Monteiro (2009). Para

    se chegar ao objetivo do estudo, ser utilizado o mtodo dedutivo, por meio de

    procedimento tcnico, com base na doutrina, legislao e jurisprudncia, relacionado

    ao direito bancrio, direito do consumidor, para ento analisar-se o questionamento

    especfico do trabalho quanto venda casada nos financiamentos habitacionais.

    Assim, no segundo captulo de desenvolvimento deste trabalho, ser

    abordado o direito bancrio, sua origem e evoluo, seu contexto no cenrio

    nacional, conceituando e classificando as instituies financeiras e bancos,

    explicando e classificando as operaes financeiras.

    Na sequncia, o terceiro captulo abordar o direito do consumidor, em seus

    aspectos histricos, relacionando os princpios do direito do consumidor e do direito

    bancrio, para sinalizar como se d a responsabilidade civil no direito do consumidor

    e sua aplicao no direito bancrio.

    Para ento se chegar ao foco do trabalho, partindo-se da exemplificao dos

    produtos e servios ofertados na contratao de financiamento bancrio, para

    examinar-se, a partir da venda casada no CDC, se ocorre a venda casada de

    seguro nos financiamentos habitacionais a partir do enfrentamento de exemplos

    prticos e dos entendimentos do STJ, TRF da 4 Regio e TJ/RS, quanto ao tema.

  • 11

    2 DIREITO BANCRIO

    Em razo do foco do presente trabalho ter como objeto a ocorrncia ou no

    de venda casada nos contratos bancrios de financiamento habitacional,

    relevante discorrer sobre o direito bancrio para familiarizar o leitor com a origem, a

    evoluo histrica do Sistema Financeiro Nacional, delimitando as diferentes

    instituies financeiras para se chegar s espcies de produtos e servios ofertados

    pelos bancos aos seus clientes, dentre eles o referido contrato de financiamento

    para a aquisio da casa prpria.

    2.1 Origem e evoluo do direito bancrio

    A origem do Direito Bancrio remete o leitor aos primrdios das civilizaes

    da Era Antes de Cristo.

    Para Silva (2003), na Antiguidade a funo de receber e emprestar dinheiro

    era realizada nos mercados pblicos, em bancas, pelos encarregados de guardar as

    moedas, que lhe eram confiadas para posterior devoluo.

    Nos estudos realizados por Abro (2009), este concluiu que muito embora

    no se saiba ao certo quando surgiu a primeira instituio bancria, existem

    registros que no sculo VI a.C., nas regies da Grcia e da Babilnia, j eram

    realizadas as primeiras atividades bancrias, como emprstimo em dinheiro, por

    exemplo. Informao complementada por Schonblum (2009, p. 4), que afirma que

    estes emprstimos possuam um certo estigma religioso pelo fato de que as

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    moedas eram confiadas aos sacerdotes que as guardavam nos templos .

    O doutrinador referido (2009, p. 3) ainda acrescenta que desde o surgimento

    do dinheiro, isto , remontando Antiguidade, j estariam presentes na sociedade

    algumas prticas tidas atualmente como bancria.

    Contudo, Silva e Guimares (2003) afirmam que foi a partir da Idade Mdia

    que surgiram os primeiros estabelecimentos com finalidade especfica de troca de

    moedas, o Banco, que se consolidou como local destinado a atender os

    comerciantes que queriam efetuar a troca de moedas. E continua, afirmando que,

    modernamente, os bancos passaram a ser responsveis pela mobilizao do

    crdito, no mais se limitando a serem meros trocadores de moeda, passando a

    oferecer emprstimos, receber depsitos de capital de terceiros etc.

    Por outro lado, tambm nesta poca, segundo Martins (2005) com o

    surgimento do comercio martimo despontaram inovaes nas atividades bancrias,

    como o cambio martimo que se transformou no seguro martimo.

    Para Abro (2009, p. 15) o surgimento do comercio principalmente nas

    cidades italianas, na Idade Mdia, com a troca manual de moedas impulsionou a

    atividade para tornar-se uma atividade creditcia propriamente dita, assim tornaram-

    se conhecidos os banqueiros a partir do sculo XII. O autor cita como bancos

    importantes da poca o Banco de Veneza, fundado em 1171, a Casa Di San Giorgio,

    fundada em Gnova, em 1408.

    J no sculo XIX, a partir de Revoluo Industrial houve tambm uma grande

    transformao para as instituies financeiras em razo da maior formao de

    capital e circulao de moeda. Neste sentido Schonblum (2009, p. 5) afirma que:

    [...] com o advento da Revoluo Industrial, restou consolidado o capitalismo como sistema dominante, atingindo, ento, os Bancos um enorme desenvolvimento, fazendo com que os mesmos, em pouco tempo alcanassem o status de empresas internacionais, indispensveis economia de qualquer nao.

    Nas palavras de Abro (2009, p. 16), o capitalismo liberal consolidado com a

    Revoluo Industrial, fez com que os bancos atingissem a era do seu pleno

    desenvolvimento no sculo XIX, marcado pelo aparecimento de grandes banqueiros

    e pela extenso de seus servios ao nvel internacional.

  • 13

    Abro (2009), evoluindo na histria, afirma que no sculo XX visualizou-se

    uma renovao do sistema, consolidado por meio de tcnicas mais influentes no

    redimensionamento do estabelecimento bancrio, [...], abrindo desdobramentos bem

    interessantes na reabsoro dos tipos profissionais nos albores do sculo XXI,

    diante da ciberntica e meios eletrnicos.

    Conforme Schonblum (2009, p. 5) a partir do sculo XX, os bancos passaram

    a oferecer aos clientes (e no clientes) uma vasta gama de produtos e servios

    (contas, aplicaes, emprstimos, consrcios, previdncias, seguros etc.) que como

    falado, j fazem parte do cotidiano dos cidados urbanos/modernos.

    Evolutivamente, o autor (2009, p. 5), sinaliza que no sculo XXI o progresso

    tecnolgico com a criao de terminais de caixas eletrnicos, uso da internet, os

    chamados bank-fones, segundo o autor, colocou o banco dentro da casa do

    usurio.

    Wald (1992, p. 67), considerando o desenvolvimento tecnolgico e a

    expanso comercial ocorrida nos ltimos sculos, em um contexto mundial, afirma

    que essa evoluo do sistema bancrio consolidando-se em razo de algumas

    caractersticas/circunstncias:

    a) pela expanso e democratizao (clientela muito mais ampla e obrigatria); b) pela diversificao de atividade e concentrao (cerca de 100 bancos no Brasil) fuso de bancos americanos e europeus: c) pela internacionalizao (presena dos bancos em outros pases); d) pela necessidade da contratao ensejando maior ingerncia das autoridades: e) pelo fato do banco ser criador de dinheiro multiplicador dos recursos (que esto ao mesmo tempo em vrios lugares), ensejando, assim, a velocidade de circulao da moeda, um dos elementos da poltica monetria.

    V-se, portanto, que a expanso do comrcio mundial, a democratizao e

    interligao de todos os pases, tornaram o Direito Bancrio de suma importncia

    para a economia mundial, profissionalizando-se e, por outro lado, a moeda por ser

    de interesse coletivo, tambm passou a merecer maior controle pblico, conforme

    leciona Fhrer (2003, p. 103):

    O Direito Bancrio um Direito profissional, voltado aos que de modo habitual praticam operaes bancrias. Alm da profissionalidade, caracteriza-se tambm o Direito Bancrio pela sua tendncia para adoo de normas de ordem pblica e de normas que consagram a prtica de

  • 14

    comrcio internacional.

    Tal entendimento compartilhado por Abro (2009, p. 1) que diz que

    atualmente o direito bancrio est inserido dentro do ramo do direito empresarial e

    impregna-se de acentuada conotao pblica, dada a importante repercusso, no

    interesse coletivo, do exerccio de atividade bancria, atualmente sob controle

    estatal.

    Delimitada a origem e evoluo do Direito Bancrio em um contexto mundial,

    cumpre esmiuar o desenvolvimento creditcio no Sistema Financeiro Nacional que

    objeto do prximo subcaptulo.

    2.2 Direito bancrio no Brasil

    No Brasil a atividade bancria teve incio com a transferncia da Corte

    Portuguesa para o Brasil, na primeira dcada do sculo XIX, ainda na fase colonial.

    Fundou-se assim o primeiro banco nacional, de nome Banco do Brasil (PAULIN,

    2002).

    Abro (2009, p. 17-18) afirma que as primeiras operaes realizadas pelo

    Banco do Brasil foram os descontos de letras de cmbio, sacadas ou aceitas por

    negociantes de crditos nacionais ou estrangeiros, depsito geral de prata, ouro,

    diamantes, ou dinheiro, saques por contas de terceiros, ou do Real Errio,

    cobranas etc. [...].

    Segundo Fortuna (2010, p.3), neste perodo colonial as atividades bsicas de

    um banco comercial eram o depsito e o emprstimo, em razo de um modelo

    bancrio trazido pelo Imprio ao Brasil ser o modelo Europeu, sendo que essa

    situao estendeu-se at metade do sculo XX, quando, ento, comearam as

    grandes transformaes provocadas pelo progresso e pela euforia ps-guerra.

    Por sua vez, Garcia apud Paulin (2002, p. 77) diz que a histria bancria

    brasileira tambm pode ser dividida em cinco perodos:

    a) primeiro perodo, que se inicia com a vinda da famlia real para o Brasil e

    se estende at meados da Repblica Velha; b) segundo perodo, que vai

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    de 1914 at 1945; c) terceiro perodo, compreendido entre os anos de

    1945 e 1964; d) quarto perodo que abrangeria os anos de 1964 e 1965; e

    e) o quinto perodo existente a partir de 1968.

    Paulin (2002) confirma que o desenvolvimento do sistema bancrio est

    ligado a evoluo do sistema econmico, ou seja, medida que ocorreram

    mudanas econmicas no pas, a atividade bancria sofreu alteraes paralelas,

    considerando assim a existncia de oito fases distintas, sendo a ltima iniciada em

    1994.

    Nesse sentido, Oliveira (2005, p. 588-589), sinaliza que a partir do surgimento

    dos primeiros bancos no Brasil (Banco Comercial do Rio de Janeiro, em 1837;

    Banco Comercial da Bahia, em 1845; o Banco Comercial do Maranho, em 1846; o

    Banco Comercial do Par, em 1847 e o Banco do Brasil em 1851), vrias leis foram

    sendo editadas no sentido de o Estado tutelar o crdito por meio de normas

    referentes s condies para o funcionamento das instituies nacionais e

    estrangeiras, aos limites mnimos de capital e fundo de reserva, s operaes a

    serem realizadas s taxas de juros e administrao bancria.

    Contudo, segundo Wald (1992, p. 66), o Direito Bancrio, desenvolveu-se

    como o ramo da cincia jurdica mais recentemente, eis que at 1945, representava

    alguns captulos do Cdigo Comercial e um nmero limitado de operaes

    abrangendo: a) emprstimo a pessoas fsicas, com base em nota promissria; b)

    desconto de duplicatas para as empresas comerciais; c) crdito imobilirio com

    garantia hipotecria.

    Fortuna (2010, p. 3) afirma que a partir dos anos 50, solidificaram-se as

    posies brasileiras, explodindo aos poucos seu potencial econmico, ocasionando

    assim, o desenvolvimento bancrio e a solidificao do Sistema Financeiro Nacional,

    para tal evoluo foi necessria a Reforma Bancria de 1964 (Lei 4.595) e a

    Reforma do Mercado de Capitais em 1965 (Lei 4.798).

    Insta salientar que estas reformas foram importantes para o Sistema

    Financeiro Nacional, que formado pelo Conselho Monetrio Nacional, Banco

    Central do Brasil, Banco do Brasil S/A, Banco Nacional de Desenvolvimento

    Econmico e Social (BNDES) e demais instituies financeiras pblicas e privadas

  • 16

    (FHRER, p. 105).

    Fortuna (2010, p. 4) tambm faz referncia ao Sistema Financeiro Nacional,

    ao afirmar que:

    A estrutura atual bsica do sistema financeiro resulta, portanto, dessa reforma institucional do binio 64/65, que criou o Conselho Monetrio Nacional e o Banco Central do Brasil, alm da regulamentao das diferentes instituies de intermediao, entre as quais as integrantes do Sistema Financeiro Habitacional-SFH.

    O doutrinador (2010, p. 04), acrescenta ainda que foi incorporada ao quadro

    institucional do sistema a Comisso de Valores Mobilirios CVM criada pela Lei

    6.385, de 07/02/76, que tem como finalidades, segundo Faria (2003, p. 5):

    [...] disciplinar, fiscalizar e desenvolver o mercado de valores mobilirios, entende-se como tal o mercado em que so negociados ttulos emitidos pelas empresas para captar, junto ao pblico, recursos destinados ao financiamento de suas atividades. O mercado de valores mobilirios negocia, predominantemente, aes, debntures e cotas de fundos de investimento em renda varivel, ou seja, principalmente papis de renda varivel, embora as debntures simples (no conversveis) sejam consideradas papis de renda fixa.

    No que diz respeito ao Banco Central do Brasil (BACEN), a sua instituio

    seguiu a tendncia mundial de que cada pas tem uma autoridade monetria

    nacional, chamado de Banco Central, o qual exerce diversas atividades tpicas

    decorrentes da gesto da moeda, no Brasil (OLIVEIRA, 2002).

    Quanto instituio do BACEN, Silva (2003, p. 746) afirma que:

    O Banco Central do Brasil foi fruto da chamada segunda etapa da reforma financeira realizada pelo Governo Castelo Branco, tendo sido institudo pela Lei da Reforma Bancria, lei n 4595 de 31 de dezembro de 1965, pelo seu art. 8, artigo este que abre o captulo III dessa lei, entitulado Do Banco Central do Brasil[...]. A criao de um Banco Central no Brasil j tinha sido idealizada na dcada de trinta, [...] Mas o primeiro projeto elaborado foi o de n 401, apresentado em 1950 por Correa e Castro, Ministro do Governo Dutra. Este projeto pretendia criar um Banco Central como rgo executor de poltica monetria e tambm o Conselho como rgo normativo, alm de pretender estabelecer outros cinco bancos estatais especializados nas reas rural, industrial, investimento, hipoteca, exportao e importao. O Banco Central do Brasil foi, portanto, criado com a promulgao da Lei n 4595, na forma de autarquia federal, sendo parte integrante do Sistema Financeiro Nacional.

    Quanto s funes gerais do BACEN, Silva (2003, p. 754) sinaliza como

    sendo as mais importantes: ser financiador do governo, de ser responsvel pela

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    administrao das reservas estrangeiras e de ser o gestor da poltica monetria [...],

    da poltica cambial, da poltica de crdito [...]. Por outro lado, em relao s

    instituies financeiras, o autor assevera que o BACEN tambm funciona como ente

    fiscalizador, coordenador, regulador e autorizador, possibilitando a estas oferecer ao

    mercado os servios essenciais para o fomento da economia, como por exemplo, as

    diversas linhas de crdito bancrio.

    Segundo Wald (2005, p. 220-221) o Conselho Monetrio Nacional tem como

    objetivos principais adaptar o volume por meio de pagamento s reais

    necessidades da economia nacional e propiciar o aperfeioamento das instituies e

    dos instrumentos financeiros com vistas maior eficincia do sistema de

    pagamentos e mobilizao de recursos (art. 3, I e V da Lei 4.595/64).

    No que se refere ao Banco do Brasil S/A, Fhrer (2003, p. 106) afirma que ele

    atua como agente financeiro do Tesouro Nacional e uma sociedade de economia

    mista, tendo como algumas de suas atribuies receber as importncias

    provenientes da arrecadao de tributos, difundir e orientar o crdito, suplementando

    a ao bancria, etc. Por outro lado o BNDES, que uma empresa pblica, tem por

    objetivo ser o principal instrumento de execuo politica de investimentos do

    Governo Federal (art. 23 da Lei 4.595/64).

    Assim, a importncia do Sistema Financeiro Nacional como regulador

    administrativo/econmico do poder pblico sobre o direito bancrio verificada na

    Constituio Federal de 1988, que em seu art. 192 determina:

    Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do pas e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes em que o compe, abrangendo as cooperativas de crdito, ser regulado por leis complementares que disporo inclusive, sobre a participao do capital estrangeiro nas instituies que a integram.

    Por esta razo Wald (1992, p. 67-69) afirma que o banco constitui servio

    pblico delegado, pela previso do art. 192 da Constituio Federal de concesso e

    alterao [...]. De modo que o autor entende que o direito bancrio assim, um

    direito que decorre de certas peculiaridades:

    a) do interesse pblico; b) da desigualdade entre as partes; c) da necessidade de realizar as operaes com urgncia num clima de

  • 18

    confiana; d) da massificao dos contratos, que so contratos de adeso, contratos formulrios; e) da velocidade das operaes que leva a evitar o inadimplemento ou a procrastinao dos pagamentos, que so fontes de elevao dos juros; penalizao da mora, especialmente numa fase de inflao e juros altos; f) dos efeitos monetrios das operaes bancrias, que so triangulares (credor, devedor e Estado) e que defluem de repasse dos recursos, exigindo um mesmo tratamento para as operaes ativas do Banco (nos quais ele credor) e operaes passivas do Banco (nas quais ele devedor) pois ambas utilizam os mesmos recursos. (Exemplo: das variaes da correo monetria, com amputao de prazo e falsificao dos dados).

    Alm disso, conforme Fortuna (2010, p. 5), com a implantao do Plano Real

    acompanhado do fim da inflao os bancos tiveram que enfrentar os processos de

    reestruturao e globalizao que, entre outras coisas, trouxeram novos

    competidores estrangeiros ao Brasil.

    No por outra razo Fhrer (2003, p. 103) afirma que hoje:

    O Direito Bancrio um direito profissional, voltado aos que de modo habitual praticam operaes bancrias. Alm da profissionalidade caracteriza-se tambm o Direito Bancrio pela sua tendncia para a adoo de normas de ordem pblica e de normas que consagram a prtica do comrcio internacional.

    Destaca-se, de acordo com Salomo In Jayme Jr e Crocco (2010, p. 13-14) o

    Brasil hoje conta com um sistema bancrio relativamente forte e bastante hgido:

    Cuja estrutura em termos de patrimnio lquido, de acordo com dados do BCB, majoritariamente privada, nacional (42% do total) e estrangeira (31% do total), e minoritariamente pblica (27%), parte federal (25%) e parte estadual (2%). Em termos ativos totais, porm, de acordo com mesma fonte, os bancos pblicos preponderam (41%) em parte, graas alavancagem propiciada pelas operaes com fundos pblicos vinculados seguidos dos bancos privados nacionais (39%) e dos privados estrangeiros (20%). Isso se deve em parte, tambm, a uma certa especializao dos bancos pblicos. Por exemplo, no caso das CEF, ela concentra 76% do crdito habitacional, a grande maioria das operaes de crdito a mdio e longo prazos a estados e municpios e a operao de vrios programas sociais do governo, que lhe conferem uma presena notvel junto populao de baixa renda.

    Conclui-se assim que o progresso e a expanso da economia brasileira,

    principalmente no que se refere s atividades produtivas, a expanso do comrcio e

    da indstria dependem do crdito, e por assim dizer de emprstimos os quais

    tradicionalmente so fornecidos por instituies bancrias, tema do prximo

    subcaptulo, que tratar do conceito e classificao das instituies financeiras e

    bancos, apresentando as operaes bancrias e a sua classificao.

  • 19

    2.3 Conceito e classificao de Instituio financeira e banco

    Existe uma confuso doutrinria quanto ao conceito de banco e o conceito de

    instituio financeira, sendo que alguns autores (Arnoldo Wald, Nelson Abro e

    Arnaldo Rizzardo) quando lecionam sobre atividade bancria, referem-se ao termo

    banco enquanto outros se referem s instituies financeiras. o que se verifica,

    por exemplo, no ensinamento de Fortuna (2010, p. 27): no agrupamento das

    instituies financeiras, os bancos comerciais, por suas mltiplas funes constituem

    a base do sistema monetrio e, devido aos servios prestados, sem dvida, as mais

    conhecidas so as instituies financeiras.

    Por outro lado medida que o estudo avana percebe-se que os bancos

    formariam uma espcie do gnero instituio financeira.

    Assim, de acordo com Holthausen (1998, p. 710) deve-se entender por

    instituio financeira:

    A pessoa jurdica de direito publico ou privado que possui como atividades principais a intermediao de recursos financeiros, a arrecadao de dinheiro e a distribuio de recursos no mercado econmico, bem como a prestao de servios, entre outras, salientando-se que o conceito de banco mais restrito.

    Segundo o Banco Central (2015, texto digital) as instituies financeiras

    seriam divididas em pblicas, privadas e de capital estrangeiro:

    Instituies financeiras pblicas Instituies em que a Unio ou governos estaduais e municipais detm participao superior a 50% no capital votante (Carta Circular 2.345, de 25/1/1993). Instituies financeiras privadas nacionais Instituies controladas por pessoas fsicas ou jurdicas domiciliadas e residentes no Pas (com participao superior a 50% no capital votante, de acordo com a Carta Circular 2.345, de 25/1/1993). Instituies financeiras estrangeiras Instituies nas quais a maioria do capital votante esteja sob controle estrangeiro, direto ou indireto. Compreende tambm instituies constitudas e sediadas no exterior com dependncia ou filial no Pas (Carta Circular 2.345, de 25/1/1993).

    Nesse sentido, o exerccio de certas atividades restringido s instituies

    financeiras pelo sistema jurdico brasileiro (BLAHA, 2008), o que se entende a

    partir do conceito de instituio financeira dado pelo art. 17 da Lei 4.595/64:

    Art. 17 Consideram-se instituies financeiras, para efeitos da legislao em vigor, as pessoas jurdicas pblicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessria a coleta, intermediao ou aplicao de recursos financeiros prprios ou de terceiros, em moeda nacional ou

  • 20

    estrangeira, e a custdia de valor de propriedade de terceiros.

    Tal orientao compartilhada por Salomo Neto (2005, p. 27):

    Deve-se interpretar o art. 17 da Lei 4.595/64, que define as instituies financeiras em funo de suas atividades privativas, como exigindo, cumulativamente, (i) a captao de recursos de terceiros em nome prprio, (ii) seguida de repasse financeiro por meio de operao de mtuo, (iii) com o intuito de auferir lucro derivado da maior remunerao dos recursos repassados em relao dos recursos coletados, (iv) desde que a captao seguida de repasses se realize de forma habitual.

    Por outro lado, Coelho, apud Wald (2005, p. 223), ressalva que a aplicao de

    recursos financeiros prprios ou de terceiros s poder ser considerada como uma

    atividade privativa das instituies financeiras, quando restar evidenciada a

    intermediao ou coleta anterior dos mesmos recursos. Explicando que a

    expresso recursos financeiros prprios - esta regida por coleta, intermediao ou

    aplicao, conjugadamente. No ser possvel admitir-se por absurdo coleta de

    recursos financeiros prprios ou intermediao na aplicao de recursos financeiros

    prprios.

    Fhrer (2003, p. 103-104) destaca que as instituies financeiras tm

    autorizado o seu funcionamento pelo BC ou por decreto do poder executivo (quando

    forem estrangeiras, de acordo com o art. 18 e 25 da Lei 4.595/64). Tambm informa

    que em razo de as atividades financeiras serem privativas a estas instituies, a

    referida Lei em seu art. 44 7 sinaliza que quaisquer pessoas fsicas ou jurdicas

    que atuem como instituio financeira sem a autorizao legal fica sujeitas a multas

    e deteno, de 1 a 2 anos, ficando a estas, sujeitos, quando pessoa jurdica, seus

    diretores administradores [...].

    As instituies financeiras se apresentam de formas distintas e podem

    oferecer uma grande variedade de servios, do que Howells e Bain (2001, p. 7)

    dizem que elas se especializam em uma ou mais das seguintes funes: proviso

    de um mecanismo de pagamentos; fornecimento de um meio de emprestar e tomar

    emprestado; outros servios, como cmbio, seguros e assim por diante.

    Portanto, pode-se dizer com base nos ensinamentos at agora esboados,

    que as instituies financeiras atravs das funes creditcias favorecem a

    circulao de riquezas, ensejando o acmulo de capital pela capacitao de

    poupana, para ento distribuir o crdito atravs de suas linhas de financiamentos.

  • 21

    Por sua vez, Brugnera (2013) difere as instituies financeiras entre

    monetrias e bancrias que seriam aquelas que possuem autorizao do BC para

    captao de depsito vista, que tm a capacidade de multiplicar dinheiro com essa

    captao. As instituies financeiras no bancrias ou no monetrias seriam

    aquelas que no podem criar moeda, no captam depsito vista, dos quais seriam

    exemplo os bancos mltiplos sem a carteira comercial.

    Faria (2003, p. 11) tambm faz a diferenciao entre instituies financeiras

    monetrias e no monetrias:

    A grande diferena entre as instituies financeiras monetrias e no monetrias tm acesso cmara de compensao de cheques e outros papis, ainda realizada pelo Banco do Brasil S.A.. Os cheques emitidos contra uma instituio e no sacados diretamente na boca do caixa, mas depositados em outra instituio monetria, so compensados (creditados) a favor desta ultima e debitados contra a instituio sacada [...]. Os Bancos Comerciais, Cooperativas de Crdito, Bancos Mltiplos com carteiras comerciais e as Caixas Econmicas constituem as instituies financeira monetrias. Existem tambm as Cooperativas de Crdito, porm de presena muito pouco significativa no mercado.

    Quanto ao tema, o autor continua (2003, p. 14), afirmando que existem

    quatro instituies financeiras no monetrias, assim definidas pelo BACEN [...],

    todas com a funo bsica de captar e emprestar, fomentando o crescimento do

    pas: bancos de investimentos ou bancos de desenvolvimento; sociedade de

    crdito, financiamento e investimento financeira; sociedade de crdito imobilirio e

    poupana e; companhias de arrendamento mercantil leasing.

    Fortuna (2009, p. 32-38) classifica as instituies financeiras no monetrias

    como aquelas que captam recursos para emprstimos, atravs da emisso de ttulos

    e, portanto, intermediam a moeda: Bancos de Desenvolvimento BD; Bancos de

    Investimento BI; Sociedade de Crdito, Financiamento e Investimento

    Financeiras; Sociedades de Crdito ao Microempreendedor e Empresa de

    Pequeno Porte SCM; Companhias Hipotecrias CH; Sociedades de Crdito

    Imobilirio SCI; Associaes de Poupana e Emprstimo APE; Bancos de

    Cmbio Bcam.

    Por outro lado, o autor (2010, p. 27) aponta que no agrupamento das

    instituies financeiras, os bancos comerciais, por suas mltiplas funes,

    constituem a base do sistema monetrio e, devido aos servios prestados, so, sem

  • 22

    dvida, a mais conhecida das instituies financeiras.

    Faria (2003, p. 11) conceitua instituio financeira monetria da seguinte

    forma:

    As instituies financeiras monetrias so aquelas que pode recolher depsitos vista do publico em geral e permitir que seus clientes emitam cheques para saques em suas contas correntes diretamente na boca do caixa ou por meio de depsitos desses cheques em outras instituies financeiras monetrias nas quais os clientes tambm possuam conta corrente bancos comerciais, caixas econmicas e cooperativas de crdito.

    Cumpre salientar, segundo Abro (2009, p. 22) que, os bancos so empresas

    (organizao harmnica de capital e trabalho para o exerccio de uma atividade

    econmica de produo ou de troca de bens ou servios), e no mero

    estabelecimento (complexo de bens, materiais e imateriais, de que dispe o

    empresrio para o exerccio de sua atividade), em razo da adoo da terminologia

    do direito comercial moderno.

    Nesse sentido tambm o ensinamento de Rizzardo (2009, p. 15):

    O banco promove a industrializao do crdito, o favorecimento da circulao de riquezas e enseja as condies de consolidao das poupanas individuais. Tm a funo monetria enquanto rgo de pagamento e crdito, ou quando age como rgo de investimento funes que se entrelaam e se completam.

    Abro (2005, p. 21) salienta que quanto s atividades que os bancos

    promovem, pode-se dizer que alm de praticarem atividades de fomentar a

    economia atravs da mobilizao de crdito e intermediao, desenvolvem

    atividades secundrias, em razo da subordinao tributria, na realizao de

    operaes que redundam numa operao de servios, conceituando instituio

    financeira/banco como: a) uma organizao empresria; b) que se utiliza de

    recursos monetrios prprios, ou de terceiros; c) na atividade creditcia (toma e d

    emprestado).

    Por outro lado, nas palavras de Brancher (1989, p. 16-17), os bancos podem

    se classificar em privados (capital nacional ou estrangeiro) e pblicos (federais ou

    estaduais) de acordo com a sua dependncia ao acionista majoritrio:

    Os bancos privados sediados no pas podero ser formados por maioria de capital pertencente a pessoas fsicas ou jurdicas nacionais ou [...] estrangeiras. [...] j as instituies bancrias, cuja sede se situe no exterior,

  • 23

    sero considerados bancos estrangeiros, pertena ou no o seu capital a cidados brasileiros. Por bancos pblicos consideram-se aqueles cuja maioria do capital social pertena no termos legais Unio.

    O site do BACEN (2015, texto digital) tambm fornece informaes quanto

    distino das instituies financeiras/bancos de capital pblico e/ou privado:

    Banco Comercial - Instituio financeira privada ou pblica. Tem como objetivo principal proporcionar o suprimento oportuno e adequado dos recursos necessrios para financiar, em curto e mdio prazos, o comrcio, a indstria, as empresas prestadoras de servios, as pessoas fsicas e terceiros em geral. A captao de depsitos vista, livremente movimentveis, atividade tpica do banco comercial. Banco Cooperativo - Banco comercial ou banco mltiplo constitudo, obrigatoriamente, com carteira comercial. Diferencia-se dos demais por ter como acionistas-controladores cooperativas centrais de crdito, as quais devem deter no mnimo 51% das aes com direito a voto. Banco de Desenvolvimento - Instituio financeira pblica no federal que tem como objetivo precpuo proporcionar o suprimento oportuno e adequado dos recursos necessrios ao financiamento, em mdio e longo prazos, de programas e projetos que visem promover o desenvolvimento econmico e social do estado onde tenha sede, cabendo-lhe apoiar prioritariamente o setor privado. Banco de Investimento - Instituio financeira privada especializada em operaes de participao societria de carter temporrio, de financiamento da atividade produtiva para suprimento de capital fixo e de giro e de administrao de recursos de terceiros.

    De acordo com Abro (2009, p. 25-26) a classificao dos bancos, tem-se

    alterado ao longo da histria, eis que historicamente, a distino entre eles est

    desaparecendo, partindo-se para a configurao do banco universal, isto , daquele

    que pratica todas as operaes bancrias. Assim, conforme o critrio da atividade,

    ou operao praticada, e ainda levando-se em conta o elemento histrico, o autor

    classifica os bancos da seguinte forma: I - de emisso; II - Comerciais ou de

    depsitos; III - de Investimentos; IV - de crdito real; V - de crdito industrial e VI -

    Agrcolas.

    Nessa evoluo, em que os bancos praticam todos os tipos de operaes

    bancrias, Fortuna (2010, p. 42-43), afirma que os chamados bancos mltiplos

    surgiram para racionalizar a administrao das instituies brasileiras, sendo a

    regulamentao de sua criao dada pela resoluo 1524/88 do CMN:

    O estatuto de um BM permite que algumas dessas instituies, que muitas vezes eram empresas de um mesmo grupo, se constituam em uma nica instituio financeira com personalidade jurdica prpria e, portanto, com um nico balano, um nico caixa e, consequentemente significativa resoluo de custos. [...] As carteiras de um banco mltiplo envolvem carteira comercial

  • 24

    (regulamentao dos BC), carteira de investimento (regulamentao do BI), carteira de crdito imobilirio (regulamentao das SCI), carteira de aceite (regulamentao das SCFI) e carteira de desenvolvimento (regulamentao dos BD). Em 1994, quando da adeso do acordo de Basilia, foi includa a carteira de leasing.

    Para configurar a existncia do banco mltiplo, ele deve possuir pelo menos

    duas das carteiras mencionadas, sendo, obrigatoriamente, uma delas comercial ou

    de investimento.

    Abro (2009) inclui ao rol de instituies financeiras as casas bancrias, que

    foram institudas pelo Decreto Lei 14.728/21 e reorganizada pelo Decreto Lei

    6.419/44 e, que tinham um menor capital que os bancos como tambm um nmero

    de servios reduzidos ao oferecer aos correntistas.

    Acrescentando o autor (2009, p. 35-36) a este rol as Caixas Econmicas que

    so empresas bancrias destinadas precipuamente a recolher e movimentar a

    poupana popular. Hoje o pas conta com a Caixa Econmica Federal e tambm

    Caixas Econmicas Estaduais, sendo que CEF consolidou-se como poderoso

    instrumento de crdito na poltica governamental, com os recursos advindos das

    aplicaes e depsitos fundirios, possuindo instrumentos destinados reduo dos

    contrastes, isso sem contar com as importncias advindas dos concursos lotricos.

    Cabe registrar, ainda, como outra espcie de instituio financeira, as

    cooperativas de crdito, que segundo o BACEN (2015, texto digital) so assim

    designadas:

    Cooperativa de crdito - As cooperativas de crdito devem adotar, obrigatoriamente, em sua denominao social, a expresso "cooperativa", vedada a utilizao da palavra "banco". Devem possuir o nmero mnimo de vinte cooperados e adequar sua rea de ao s possibilidades de reunio, controle, operaes e prestaes de servios. A Resoluo 3.859, de 27/5/2010, altera e consolida as normas relativas constituio e ao funcionamento de cooperativas de crdito.

    Para Abro (2009, p. 37-39) as cooperativas de crdito so organizaes que

    tem por escopo desenvolver a chamada mutualidade. No setor creditcio, sua

    finalidade consiste em propiciar emprstimos a juros mdicos a seus associados

    estando subordinadas ao CMN, na parte normativa e ao BACEN na parte executiva,

    alm de se subordinarem a Lei 4.595/64 como toda e qualquer instituio financeira.

    Sinalizando o autor ainda que as cooperativas tm funo importante principalmente

    no setor agrcola e de micro e pequenas empresas.

  • 25

    Ultrapassados o conceito e a classificao das instituies financeiras,

    adentra-se, no prximo subcaptulo, aos seus servios e operaes que constituem

    as atividades negociais que vinculam banco e cliente.

    2.4 Operaes bancrias

    Nas palavras de Mazzafera (2003, p. 304) as operaes bancrias se

    constituem no conjunto de atividades desenvolvidas pelos bancos e que lhes so

    peculiares. Do regramento dessas atividades decorre o Direito Bancrio.

    Segundo Abrao (2009, p. 54) colimando a realizao de seu objeto, os

    bancos desempenham, em relao aos seus clientes, uma srie de atividades

    negociais, que tomam o nome tcnico de operaes bancrias.

    Nesse sentido, Rizzardo (2009, p. 16) discorre sobre as operaes bancrias

    como sendo estas as atividades principais dos bancos, [...] consistentes em

    conceder emprstimos, receber valores em depsito, descontar e redescontar

    ttulos, abrir crditos, enfim, na realizao da srie de atos prprios para a

    consecuo de sua finalidade econmica.

    Do que Abro (2009, p. 58) entende que as operaes bancrias se

    caracterizam por terem contedo econmico e por serem praticadas em massa, ou

    seja, promovem a circulao de riqueza e atingem um nmero indeterminado de

    pessoas.

    Por outro lado, Fortura (2011, p. 162) lembra que tomar o dinheiro excedente

    de quem tem e emprest-lo para quem precisa deixou de ser, h muitos anos, a

    principal caracterstica do mercado bancrio no Brasil, assim a prestao de

    servios tornou-se vital para a expanso do sistema financeiro na renda nacional,

    ajudando a canalizar recursos das mais diversas fontes para os cofres carentes do

    deficitrio setor pblico.

    Assim, a relao comercial entre bancos e clientes se origina por meio de

    contratos bancrios, em que o banco de alguma forma passiva ou ativa realizar a

    intermediao de crdito financeiro, o que vale dizer que, quando o banco recebe o

  • 26

    dinheiro dos clientes atravs dos depsitos ou contas correntes, torna-se devedor e,

    quando empresta capital, torna-se credor (MAZZAFERA, 2003).

    Segundo Wald (1992, p. 70-71) contrato bancrio o acordo manifesto entre

    o banco e o cliente para criar, regular ou extinguir uma relao que tenha por objeto

    a intermediao de crdito. Em outras palavras o autor subdivide os contratos

    bancrios em Contrato Bancrio Subjetivo (operao de banco) e objetivo

    (envolvendo intermediao de crdito), destacando que compe o contrato: o banco

    e cliente, figurando como partes; a relao de crdito que figura como objeto; o

    crdito em sim caracterizado pela confiana, pelo prazo, pela aplicao de juros

    compensatrios e remuneratrios e, pelo risco assumido. Tendo como causa a

    mobilizao do crdito e caractersticas principais a contabilidade prpria; ser o

    contrato de adeso e sigiloso.

    Dessa forma, segundo Rizzardo (2009, p. 17):

    As operaes bancrias sobressaem dois aspectos: o econmico e o jurdico. Econmico, porque a operao bancria presta servios no setor creditcio, com proveito para o prprio banco e o cliente. Jurdico, por depender, para se ultimar, de um acordo de vontades, o que a classifica como um verdadeiro contrato.

    No mesmo sentido, Oliveira (2005, p. 597) conceitua os aspectos da

    operao bancria: o econmico e o jurdico, explicando:

    Economicamente, a que se considerar a prestao de servio no setor creditcio que redunda em proveito tanto para o banco, como para o cliente. Juridicamente, a operao bancria para se ultimar, depende de um acordo de vontades entre cliente e banco, razo pela qual se diz que se insere no campo contratual. Sintetizando, operaes bancrias so os diversos tipos de atividades bancrias, os negcios bancrios em si, que se operacionalizam atravs dos contratos bancrios. Dentre as vrias formas de classificao das operaes bancrias, os dois critrios mais utilizados so aqueles que levam em considerao o sujeito banco (ativas e passivas) e a que leva em considerao o objeto (principais e acessrias).

    Rizzardo (2009, p. 17) confirma que as operaes bancrias concretizam-se

    por meio de contratos, aos quais determinam os direitos e obrigaes das partes

    envolvidas, bancos e cliente, visando intermediao do crdito.

    Holthausen (1998, p. 711), acompanhando o entendimento dos autores j

    citados, sinaliza quanto ao contrato bancrio que o instrumento das operaes

    bancrias, em que envolve pelo menos duas partes que, mediante acordo de

  • 27

    vontades, se comprometem a realizar determinada obrigao mediante

    remunerao, sendo necessariamente o banco um dos polos da relao.

    Asseverando por fim que a regra geral dos contratos insculpida no art. 82 do

    CC/1916 (atual art. 104 do CC/2002) se aplica aos contratos bancrios em razo de

    abranger os pressupostos de validade do contrato capacidades dos agentes,

    objeto lcito, e forma prescrita ou no defesa em lei.

    Neste contexto, Rizzardo (2009, p. 16-17) faz importante referncia as

    caractersticas das operaes bancrias como:

    [...] - pecuniaridade - envolve sempre dinheiro, em razo de ser seu objeto o crdito. Realizam-se as mesmas em grande escala, de maneira homognea, e no de forma isolada. Para sobreviver, o banco necessita receber nmero elevado de depsitos, conceder mltiplos emprstimos, realizar descontos, conceder aberturas de crdito, financiar a aquisio de bens etc., sempre em operaes de massa, o que lhe d a possibilidade de lucro. [...] a complexidade em razo do surgimento constante de novas relaes econmicas entre o banco e os usurios, exigindo operaes cada vez mais sofisticadas e complexas, no apenas no sentido de atualizar a escriturao, mas de acompanhar as contnuas modificaes que ocorrem no mundo dos negcios. [...] a profissionalidade todas as suas operaes, como desconto, antecipao de crdito, emprstimo, so realizadas constante e uniformemente, sendo a razo de ser dos bancos, e no esporadicamente, semelhana do que acontece entre as pessoas fsicas. O banco exerce profissionalmente tais funes, eis que atua na intermediao do crdito como profisso. [...] a empresarialidade as atividades inerentes funo bancria consideram-se atos de empresa, porquanto envolvem a intermediao, a habitualidade e o lucro, elementos tipificadores da atividade empresarial. Tanto isto que o banqueiro chamado comerciante do crdito, eis que seu negcio consiste em intermediar, com recursos obtidos de terceiros, operaes em que usado o crdito.

    Nesse sentido, Wald (1992, p. 69) complementa que as caractersticas das

    operaes bancrias decorrem:

    a) do interesse pblico; b) da desigualdade entre as partes; c) da necessidade de realizar as operaes com urgncia num clima de confiana; d) da massificao dos contratos, que so contratos de adeso, contratos formulrios; e) da velocidade das operaes que leva a evitar o inadimplemento ou a procrastinao dos pagamentos, que so fontes de elevao dos juros; penalizao da mora, especialmente numa fase de inflao e juros altos; f) dos efeitos monetrios das operaes bancrias, que so triangulares (credor, devedor e Estado) e que defluem de repasse dos recursos, exigindo um mesmo tratamento para as operaes ativas do Banco (nos quais ele credor) e operaes passivas do Banco (nas quais ele

  • 28

    devedor) pois ambas utilizam os mesmos recursos. (Exemplo: das variaes da correo monetria, com amputao de prazo e falsificao dos dados).

    A respeito da regulamentao das operaes bancrias, Rizzardo (2009, p.

    17) assegura que elas no so reguladas especificamente, submetendo-se s

    determinaes emanadas de resolues e circulares do Banco Central do Brasil. No

    Cdigo Comercial apareciam como atos de comrcio. o Cdigo Civil, aprovado pela

    Lei 10.406, de 10.01.2002, trata das vrias figuras, como o depsito, a conta

    corrente, o desconto e o financiamento bancrios.

    Quanto normatizao dos contratos bancrios, Wald (1992, p. 71)

    complementa, especificando que eles se submetem: - Cd. Comercial e Civil; - Lei

    n. 4.595 e 4.728, e outras; - Regulamentao do CMN e do BACEN; - Costumes

    bancrios cheques; - Jurisprudncia; - Doutrina.

    Assim, conceituadas as operaes bancrias, passar-se- a apresentar as

    suas classificaes de acordo com a doutrina.

    2.5 Classificao das operaes bancrias

    Na classificao de Oliveira (2005, p. 597-598), as operaes bancrias so

    divididas em ativas e passivas, principais e acessrias, quanto primeira

    diferenciao:

    Operaes ativas So aquelas em que, pelo fornecimento de capitais latu sensu, as instituies bancrias se tornam credoras de seus clientes. Por ela se d a distribuio do capital arrecadado. Dessa forma, podemos ento reunir todas as operaes consideradas ativas dos bancos numa nica rubrica: financiamentos bancrios. Trata-se da aplicao dos recursos coletados. Operaes passivas Neste caso, trata-se da coleta dos fundos que sero aplicados. De forma bastante simplificada, so as atividades bancrias que visam arrecadar fundos, coletar capitais, para executar a atividade principal da instituio bancria, ou seja, mobilizar crditos e negoci-los atravs das diferentes espcies de financiamento. Desta forma, os clientes fornecedores dos fundos constituem-se como credores dos bancos. As principais operaes passivas so: conta corrente e depsito bancrio.

    O autor (2005, p. 598) continua a sua classificao diferenciando as

    operaes principais das secundrias. Considerando como principais aquelas

    atividades fundamentais s funes prprias das instituies financeiras, por meio

  • 29

    delas os bancos exercitam sua negociao de crdito. Constituem, de um lado, a

    coleta de capitais junto aos poupadores (operaes passivas) e, de outro lado, na

    distribuio de capitais (operaes ativas). E, como acessrias, aquelas por meio

    das quais o banco no concede nem recebe crdito; apenas presta servios.

    Citando como exemplo dessas operaes: a custdia de valores, a prestao de

    informaes, o servio de cofres de segurana, a cobrana de ttulos etc.

    No entanto, para a maioria da doutrina (Arnaldo Rizzardo, Nelson Abro,

    entre outros) existe uma classificao clssica quanto s operaes bancrias,

    dividindo-as entre fundamentais/principais e acessrias/secundrias, sendo que uns

    autores usam a terminologia fundamentais/acessrias e, outros principais e

    secundrias.

    Na concepo de Holthausen (1998, p. 710), as operaes bancrias so

    divididas entre fundamentais e acessrias:

    As operaes bancrias fundamentais so representadas pela intermediao do crdito, ou seja, pelo recolhimento e concesso de dinheiro. Estas se subdividem em passivas que tm como objeto a arrecadao de fundos, tornando o banco devedor do cliente; como exemplo, pode-se citar o depsito e as contas-correntes e ativas, que visam colocao de crdito no mercado, passando o banco a credor do cliente, consistindo nos emprstimos, aberturas de crdito, descontos entre outros. J as operaes acessrias no tm o escopo de intermediar o crdito, apresentando-se como forma de atrair clientes, como o caso dos servios de custdia de valores, aluguel de cofres, cobrana de ttulos. Nestes casos, as operaes so somente prestaes de servios.

    Nesse sentido, o ensinamento de Rizzardo (2009, p. 17):

    As operaes bancrias se classificam em fundamentais e acessrias. As primeiras compreendem a intermediao do crdito, isto , o recolhimento de dinheiro de uns e a concesso a outros. Subdividem-se em passivas e ativas. Aquelas tm por objeto a procura e proviso de fundos, significando um nus e obrigaes para o banco, pois, na relao jurdica com o cliente, se torna ele devedor. So operaes passivas o depsito, as contas correntes e o redesconto. As ltimas visam a colocao e o emprego dos fundos arrecadados por meio de operaes em que o banco se torna credor do cliente, consistindo nos emprstimos, financiamentos, aberturas de crdito, descontos, antecipao etc. Acessrias apresentam-se as funes (tambm consideradas neutras) quando no implicam nem a concesso de crdito, nem o recebimento de dinheiro. Revelam mais um cunho de prestao de servios secundrios, destinando-se mos a atrair clientes. Dentre este tipo, destacam-se a custdia.

    J Alves (2005, p. 62, 69-70) faz distino pelas atividades prestadas pelos

    bancos entre principais e secundrias:

  • 30

    Como atividades principais tem-se que as operaes bancrias de exerccio do crdito, ativas como se o banco quem empresta dinheiro a cliente, como no negcio jurdico bancrio de emprstimo e as passivas como se o cliente quem presta dinheiro ao banco, como no negcio jurdico de depsito bancrio. Nas atividades secundrias, h secundariedade porque o banco no age na funo que lhe tpica, de intermediariedade na circulao do dinheiro, ainda quando se d mediante recolhimento e repasse de dinheiro, como nos recebimentos de tributos, contas de consumo em geral, como gua, energia e gs, alm de pagamentos para Fundo de Garantia do Tempo de Servio-FGTS, Instituto Nacional de Seguridade Social INSS, entre outros. As operaes secundrias no so exclusivas das sociedades empresrias bancrias, podendo-se auferir sua prestao por pessoas naturais e jurdicas que no se qualificam como banqueiros ou bancos. Outros exemplos de operaes secundrias so as operaes bancrias de cobrana e ordem de pagamento.

    Por sua vez Fontes (2005, p. 143) divide as operaes bancrias em trs

    tipos: 1 passivas (aquelas que obtiveram procura e a obteno de fundos,

    importando em obrigaes para o banco que assume a posio de devedor), 2

    ativas, que por sua vez visam colocao e ao emprego desses fundos

    assumindo assim o banco a posio de credor; 3 neutras/acessrias, as quais se

    caracterizam to somente pela prestao de servios.

    Nesse mesmo sentido, Mazzafera (2003, p. 310-314), que ainda acrescenta

    as subclassificaes das operaes principais em ativas e passivas:

    A) As operaes principais referem-se s operaes de carter creditcio e, portanto, tpicas dos estabelecimentos bancrios. Subdividem-se em Passivas so operaes inerentes a atividade bancria, ou seja, captao de fundos. Nestas operaes o banco torna-se devedor. Recebe o depsito que dever devolv-lo. So elas: depsito, Redesconto e Conta Corrente. Ativas [...] nas operaes ativas o banco torna-se credor. So elas: - Aberturas de crdito desconto emprstimo antecipao operaes de Cmbio ACC Aditamento sobre Contrato de Cmbio Seguro OUTRAS OPERAES (contratos modernos) Leasing Franchising Factoring Know-How Alienao Fiduciria em Garantia Carto de Crdito. b) As operaes acessrias (prestao de servios) so aquelas realizadas pelos bancos em carter secundrio, acessrio s suas atividades, v.g. custdia e aluguel de cofres para guarda de valores. So elas: - custdia de valores e ttulos aluguel de cofre cobrana (grifo meu).

    Diante desses critrios classificatrios Abro (2009, p. 62) assevera que o

    melhor entendimento para a disposio das operaes bancrias, a que leva em

    conta a importncia do ato praticado. Destarte, classifica-as em

    essenciais/fundamentais e acessrias:

    So operaes essenciais: o depsito, o redesconto, a conta corrente (passivas); o emprstimo; o desconto, a antecipao, a abertura de crdito, o crdito documentrio etc. (ativas).

  • 31

    So operaes acessrias: a custdia de valores, o servio de cofres de segurana, a cobrana de ttulos, a prestao de informaes etc.

    De forma exemplificativa, Wald (1992, p. 71) apresenta as principais

    operaes bancrias como sendo:

    - Abertura de conta ou contrato bancrio; - Depsito bancrio; - Contrato de conta corrente; - Abertura de crdito; - Desconto bancrio; - Mtuo bancrio; - Financiamento; - Custdia de valores; - Operaes de bolsa; - Aluguel de cofre; - Contratos para Bancrios: - Factoring; - Leasing ou arrendamento mercantil.

    Por todo o exposto, pode-se situar o leitor nas normas do Direito Bancrio, a

    partir de sua evoluo e regulamentao para ento apresentar a sua aplicabilidade

    no cotidiano atravs dos contratos e operaes bancrias. Assim, passar-se- a

    estudar a aplicao do Cdigo de Defesa do Consumidor na esfera do Direito

    Bancrio.

  • 32

    3 DIREITO DO CONSUMIDOR

    Conforme dispe o caput do art. 4 do CDC, a finalidade primria do Diploma

    Consumerista era a de criar uma poltica nacional de tutela das relaes de

    consumo, visando defesa dos direitos morais e patrimoniais dos consumidores e

    assim compensar a sua desigualdade diante do fornecedor, para tanto o diploma

    permitiu ao magistrado inverter o nus da prova em favor do consumidor,

    desconsiderar a personalidade jurdica das sociedades empresariais, anular de

    ofcio as clusulas abusivas contidas nos contratos, presumir a responsabilidade

    objetiva do fornecedor, etc...

    Assim, este captulo descrever a importncia do direito do consumidor,

    especialmente no que se refere na sua aplicao no mbito do direito bancrio.

    3.1 Aspectos histricos do Direito do Consumidor

    A CF/88 inovou ao incorporar aos princpios da ordem econmica o direito a

    defesa do consumidor no seu art. 170 e ao elenc-lo entre os direitos fundamentais

    em seu art. 5, XXXII (KHOURI, 2013).

    Deste modo, para efetivar essa proteo ficou determinado no art. 48 do Ato

    das Disposies Constitucionais Transitrias que no prazo de 120 dias a partir da

    promulgao da Constituio, o Congresso Nacional deveria elaborar o Cdigo de

    Defesa do Consumidor, surgindo assim a Lei n.8.078/90, que lei complementar

    (BONATTO; MORAES, 2001).

  • 33

    O diploma consumerista, portanto, tem cunho de lei especfica, ou seja,

    prevalece sobre as leis gerais, predominando em todas as reas do direito onde

    ocorrer uma relao de consumo, conforme entendimento de Cavalieri Filho (2007,

    p. 451), [...] o cdigo fez um corte horizontal em toda a extenso da ordem jurdica,

    levantou o seu tampo e espargiu a sua disciplina por todas as reas do Direito

    pblico e privado, contratual e extracontratual, material e processual.

    No por outro motivo, Venosa (2007, p. 225) salienta que o CDC foi

    concebido nessa filosofia de busca da proteo de toda a classe de consumidores:

    Seu carter interdisciplinar, da porque se diz que criou um microssistema jurdico. Nele h normas de direito civil, direito comercial, direito administrativo, direito processual, direito penal. Seus princpios abarcam direito privado e o direito pblico, formando um terceiro gnero que a doutrina denomina direito social.

    Conforme disposio de Cavalieri Filho (2011, p. 31) a lei consumerista,

    portanto, introduziu no nosso ordenamento jurdico profundas inovaes, sendo

    considerada a lei mais revolucionria do sculo XX, eis que muito embora o destino

    de suas normas seja s relaes de consumo, pela sua abrangncia, influenciou e

    influencia todo o sistema jurdico, tornando-se uma espcie de lente pela qual

    passamos a ler todo o direito obrigacional, contratos e institutos que geram relaes

    de consumo,

    No mesmo sentido o entendimento de Casado (2000, p. 28), ao afirmar que

    o CDC trouxe ao pas o que h de mais moderno em matria de direito obrigacional,

    notadamente quando trata dos direitos dos consumidores (e equiparados) frente aos

    fornecedores de produtos e servios.

    Nas palavras de Oliveira (2005, p. 595):

    De fato, o Cdigo de defesa do Consumidor foi editado para revolucionar as relaes vividas na sociedade brasileira, impondo a partir de sua vigncia, o fornecimento de produtos e servios segundo os melhores padres de qualidade, confiabilidade e segurana. Desta forma, no se pode admitir que somente alguns segmentos da economia nacional fiquem margem dessa evoluo legislativa, como no caso das instituies bancrias e financeiras. A defesa do consumidor possui respaldo na Constituio Federal que a elevou categoria de princpio geral da atividade econmica (art. 170, inc. V) e garantia individual (art. 5, inc. XXXII), bem como o ordenamento jurdico repugna a abusividade, seja no plano constitucional, ou financeiro.

    A importncia do CDC para o ordenamento jurdico brasileiro percebida nos

  • 34

    dizeres de Bonatto e Moraes (2001, p. 70):

    Por fim, ressalta-se que a defesa do consumidor , tambm, um direito e uma garantia fundamental e, como tal, necessrio que seja feita sempre interpretao mais benfica a este propsito, impedindo-se, assim, que, em um pas onde proliferam as medidas provisrias, restem alteradas leis protetivas do consumidor, em benefcio dos interesses provados e, consequentemente, em prejuzos ordem pblica e ao interesse social.

    Nesse sentido, Oliveira (2005, p. 609) acrescenta que com a promulgao do

    CDC ficou expressado que as normas de proteo ao consumidor so de ordem

    pblica e de interesse social (art. 1), de modo que a vontade das partes no pode

    alter-las posto no ficarem no seu poder dispositivo. Mostram-se cogentes e de

    aplicao obrigatria.

    A profunda inovao (CAVALIERI FILHO, 2011) trazida pelo advento do CDC,

    confirmada por diversos autores, se deve principalmente pelo fato de que antes de

    sua criao, os consumidores ficavam totalmente desprotegidos, pois o Cdigo Civil

    de 1916 no seu art. 159, determinava a responsabilidade somente quando restasse

    comprovados o dolo e a culpa, portanto, a mudana foi significativa e modificou as

    relaes de consumo. E a partir de sua criao tornou-se fonte educativa e

    transformadora tanto para consumidores que passaram a ter mais conscincia de

    seus direitos, exercendo-os e retomando a confiana no Poder Judicirio - como

    para os fornecedores que tiveram que adequar-se as novas obrigaes e

    exigncia legais, investindo em treinamento e tecnologia para melhor atender seus

    clientes e oferecer melhor qualidade aos produtos/servios ofertados.

    No por outro motivo, tambm considerado uma das mais modernas e

    democrticas legislaes protetivas dos direitos da sociedade contra os abusos

    cometidos por fornecedores de produtos e servios, segundo Fontes (2005, p. 155).

    Por outro lado, importante distinguir as particularidades da proteo

    contratual do consumidor daquelas outorgadas no CC/2002 que s veio a ser

    modificado em 2002, em razo de ambas legislaes tratarem de contratos,

    obrigaes e responsabilidade civil, nesse sentido Khouri (2013, p. 85):

    A proteo contratual no CDC tem, pelo menos, cinco pontos essenciais que a distinguem em relao proteo outorgada pelo Cdigo Civil: (i) conforme visto anteriormente, a oferta, nos termos do art. 30, estende sua fora vinculativa para alm da fase pr-contratual e se, mais benfica ao consumidor que a clusula expressamente pactuada, esta afastada e o

  • 35

    contedo (da oferta) assume seu lugar; (ii) a flexibilidade da reviso da clusula-preo do art. 6, V, e as nulidades exemplificadas do art. 51, [...]; (iii) restituio em dobro em caso de cobrana indevida; (iv) vedao da compra casada e, por fim, (v) o direito outorgado ao consumidor, em determinadas circunstncias, de se desvincular do contrato, isto , retratar-se, arrepender-se da contratao, sem nenhuma sano.

    Ademais, como bem leciona Lutzky (1996, p. 16) os consumidores sempre

    existiram, mas at o advento do CDC no tinham uma proteo especfica e, em

    muitos casos, as regras at ento existentes eram pouco eficientes. Por isso, no

    seu entendimento o CDC no visa somente proteger o consumidor, mas tambm

    racionalizar e a dirigir o seu comportamento e, para tanto, multidisciplinar, pois,

    alm de seus conceitos, princpios e instrumentos prprios, busca foras em

    conceitos, princpios e institutos de outros ramos do Direito.

    Mas mesmo com todo carter revolucionrio positivo, o CDC, em um

    contexto histrico, causou algumas polmicas quanto a sua aplicao, como no que

    se refere s instituies bancrias e aos profissionais liberais, especialmente

    mdicos. No por outro motivo que Almeida (2011, texto digital) sinaliza:

    Diante dos conceitos legais acima delineados, resta examinar se a relao mdico-paciente se enquadra como relao de consumo e, por conseguinte, deve ser analisada sob a tica protecionista estabelecida no Cdigo de Defesa do Consumidor. A propsito, a maioria dos autores vislumbra a relao mdico-paciente como consumerista, considerando aplicvel, portanto, as disposies do Cdigo de Defesa do Consumidor. Por outro lado, parte minoritria da doutrina defende a no-incidncia da referida legislao relao mdico-paciente, considerando que tal diploma legal construiu um sistema de responsabilidade objetiva que no se coaduna com a atividade mdica, tendo em vista a natureza singular do servio.

    No que toca ao Direito Bancrio, a corrente que negava a aplicao do CDC

    nas relaes bancrias, conforme (LUTZKY, 1996 p. 18) alegava que a lei de

    proteo do consumidor s abrange s relaes de consumo, nelas no se

    enquadrando a poupana e as operaes que constituem o ciclo de produo. E

    continua, afirmando que tambm no esto includos nem o dinheiro, nem o crdito,

    pois a entrega de dinheiro sob forma de mtuo, desconto, etc., no constitui

    aquisio de produto pelo destinatrio final, porque notrio que os valores

    monetrios, por sua prpria natureza, destinam-se circulao.

    Mas essa corrente no se desenvolveu, eis que segundo a corrente

    dominante, o prprio artigo 52 do CDC confirma que as disposies a consumidores

    (art. 2) e a fornecedores (art. 3), quando estipula regras sobre os crditos e

  • 36

    financiamentos ao consumidor, no deixa ambiguidades sobre a incluso dessas

    atividades em sua sistematizao (LUTZKY, 1996).

    Veremos a seguir, como leciona Cavalieri Filho (2011, p. 31) que a partir do

    advento do Cdigo do Consumidor, pela adoo de uma avanada tcnica

    legislativa, baseada nos princpios e clusulas gerais o referido diploma

    consolidou-se como lei principiolgica (grifos do autor).

    Assim, passar-se- a elencar os principais princpios que norteiam o Direito

    do Consumidor e aqueles que tambm orientam o Direito Bancrio, face o foco do

    presente estudo.

    3.2 Princpios comuns do Direito Bancrio e do Direito do Consumidor

    Inicialmente, antes de adentrarmos nos princpios propriamente ditos, e por

    lembrar as palavras de Cavalieri Filho, j esboadas do carter principiolgico do

    CDC, se faz ressalva aos dizeres do autor do que vem a ser princpio (2011, p. 32):

    Princpio etimologicamente quer dizer incio, comeo, ponto de partida de alguma coisa. Do ponto de vista jurdico no foge desse sentido. Pelos princpios se inicia a anlise do ordenamento jurdico e se afere para onde ele se norteia. E na base da ordem jurdica, bem no seu incio, esto os valores ticos e morais abrigados no ordenamento jurdico, compartilhado por toda a comunidade em dado momento e em dado lugar, como a liberdade, a igualdade a solidariedade, a dignidade da pessoa humana, a boa-f e outros tantos (grifos do autor).

    Assim, ao que interessa ao presente trabalho, sero abordados os princpios

    inerentes tanto ao direito bancrio como ao direito do consumidor, especialmente os

    que se referem ao contrato que o meio pelo qual se firma a relao jurdica entre

    cliente e banco: princpio da boa-f, princpio da transparncia, princpio de dever de

    informao, princpio da vulnerabilidade, princpio da preveno e reparao,

    princpio da segurana, entre outros.

    Para tanto importante referir tambm que a partir do advento do CDC, o

    contrato recebeu uma concepo mais social na busca do equilbrio contratual,

    mencionando Marques (2002, p. 175) que:

  • 37

    Na sociedade de consumo moderno, o direito destacar o papel da lei como limitadora e como verdadeira legitimadora da autonomia da vontade. A lei passar a proteger determinados interesses sociais, valorizando a confiana depositada no vnculo, as expectativas e a boa-f das partes contratantes. Conceitos tradicionais os de como negcio jurdico e da autonomia da vontade permanecero, mas o espao reservado para que os particulares auto-regulem suas relaes ser reduzida por normas imperativas, como as do prprio CDC.

    Do que se fez necessrio uma melhor regulao dos contratos com base nos

    princpios que orientam o direito bancrio e o direito do consumidor, lecionando

    Rizzardo (2009, p. 23) que:

    Como bastante comum as entidades financeiras, cuja a mercadoria a moeda, usam nas suas atividades negociais uma srie de contratos, em geral de adeso, eles se aderindo aqueles que necessitam de crdito para as suas atividades. Proliferam as clusulas abusivas e leoninas, previamente estabelecidas, imodificveis e indiscutveis quando da assinatura do contrato.

    E muito embora a boa-f, que o princpio dos quais decorrem vrios outros

    que regem as relaes de consumo e por consequncia os contratos bancrios, no

    seja novo em nosso ordenamento jurdico, at o advento do CDC sua concepo era

    subjetiva, passando a ter tambm uma acepo objetiva, como ensina Cavalieri

    Filho (2011, p. 38-39):

    O termo boa-f no novo em nossa ordem jurdica, pois j figurava no art.131 do Cdigo Comercial de 1850 e em inmeros dispositivos do Cdigo Civil de 1916 art. 1.443: o segurado e o segurador so obrigados a guardar no contrato a mais estrita boa-f e veracidade; art. 490: de boa-f a posse, se o possuidor ignora o vcio; art. 510: O possuidor de boa-f tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos. O termo, todavia, era empregado pela lei, doutrina e pela jurisprudncia apenas em sua acepo subjetiva, isto , para indicar a ausncia de malcia, a suposio de estar agindo corretamente. Como o advento do Cdigo de Defesa do Consumidor, o termo boa-f passou a ser utilizado com uma nova e moderna significao, para indicar valores ticos que esto base da sociedade organizada e desempenham funes de sistematizao da ordem jurdica. chamada boa-f objetiva que, desvinculada das intenes ntimas do sujeito, indica o comportamento objetivamente adequado aos padres de tica, lealdade, honestidade e colaborao exigveis nas relaes de consumo (grifos do autor).

    Neste sentido importante a referncia de Casado (2000, p. 37) quanto ao

    princpio da boa-f: a boa-f, como norma de conduta, e um de seus deveres

    anexos, o dever de informao que impe a transparncia das condies

    contratuais, so o norte principal nas discusses acerca da fora obrigatria dos

    contratos, seja no mbito nacional ou mundial.

    E muito embora o vnculo jurdico entre consumidor/cliente e

  • 38

    fornecedor/banco nasa com a autonomia das partes em contratar, essa conexo

    sustenta-se principalmente na boa-f. Com efeito, o CDC ao positivar o princpio da

    boa-f, impe aos partcipes das relaes de consumo deveres tico de conduta. A

    boa-f como princpio vai trazer sempre consigo padres de honestidade, lealdade e

    transparncia. So esses padres que se exigem nas relaes obrigacionais de

    consumo [...] (KHOURI, 2013, p. 61).

    Casado (2000, p. 39) concorda com tal entendimento e acrescenta que a

    boa-f exerce funo importante no trato dos chamados contratos de adeso, pois

    justamente neste tipo de ajuste que costumam aparecer os maiores abusos, pelo

    fato de o aderente no ter o poder de alterar substancialmente o contedo

    contratual.

    Por outro lado, do princpio da boa-f, na sua acepo objetiva j

    mencionada, decorrem vrios outros deveres anexos a serem cumpridos pelos

    fornecedores os quais esto tambm elencados no CDC conforme ensinamento de

    Bonatto e Moraes (2001, p. 38):

    Emergem sob a forma do dever de completa transparncia, de integral informao ao consumidor (art. 30, 31 e outros do CDC), da no aceitao de linguagem complexa (art. 54, pargrafo 3, e outros do CDC), da interpretao em favor do consumidor, em caso de dvida no tocante a clusulas contratuais (art. 47 do CDC), o dever de cooperao (obrigao do fornecedor de agir com lealdade e de auxiliar o consumidor, proibindo qualquer conduta tendente a dificultar o cumprimento da obrigao, por parte do outro contratante) e muitos outros que esto previstos na lei protetiva.

    Decorrente desse entendimento se evidencia que outro princpio

    imprescindvel nos contratos bancrios o princpio da transparncia, proclamado

    no art. 4 do CDC e que segundo Rizzardo (2009, p. 24):

    Decorre da lealdade e do respeito que devem imperar nos negcios, nada se ocultando ao consumidor, e tudo se colocando em termos lmpidos e inteligveis sem subterfgios, com o que se chega existncia da boa-f e da equidade, requisitos tambm elevados categoria de princpios, e exigidos pelo art. 51, inciso IV.

    Neste mesmo patamar o entendimento de Cavalieri (2011, p. 43):

    Estabelecido no art. 4, caput, do CDC bem como a transparncia e harmonia das relaes de consumo -, o princpio da transparncia filia-se ao princpio de boa-f, de que constitui uma derivao concretizadora, uma espcie de subprincpio. Transparncia hoje uma palavra de ordem que se faz ouvir nos mais diversificados domnios jurdico-polticos. Significa

  • 39

    clareza, nitidez, preciso, sinceridade. Transparncia nas relaes de consumo importa em informaes claras, corretas e precisas sobre o produto a ser fornecido, o servio a ser prestado, o contrato a ser firmado direitos, obrigaes, restries. A principal consequncia do princpio da transparncia , por um lado, o dever de informar do fornecedor e, por outro, o direito informao do consumidor, do qual tratar [...] (grifo do autor).

    Da mesma forma, o direito a informao fundamental tanto no direito

    bancrio como no direito do consumidor, isto porque ele assegurado como direito

    fundamental da pessoa humana pela dico do art. 5, XIV, conforme leciona Khouri

    (2013, p. 69), que assevera ainda:

    Esse direito dever ser assegurado tambm quando o cidado vai ao mercado adquirir bens e servios. Por que a informao to importante para o consumidor? que, ao deixar de informar adequadamente ao consumidor sobre os bens e servios que esta adquirindo, o fornecedor esta deixando de ser transparente. A falta dessa transparncia pode conduzir o consumidor a decises equivocadas de consumo. Dispondo de informaes suficientes, evidente que sua deciso quanto a adquirir ou no bens de consumo, tender a maior racionalidade, evitando, por conseguinte, a aquisio de bens desnecessrios ou a celebrao de contratos desvantagiosos [...].

    Por outro lado, tratando dos princpios em espcie, Cavalieri Filho (2012, p.

    515-516) explica que em razo de que o consumidor hoje est merc da

    idoneidade do fornecedor, o princpio da preveno e reparao tornou-se o suporte

    que sustenta a relao de consumo, o qual encontra regulamentao no art. 6, VI do

    CDC:

    O artigo 6, inciso VI, dispe: So direitos bsicos do consumidor: - a efetiva preveno e reparao de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos (grifos nossos). Prevenir significa dispor com antecedncia, precaver. Reparar significa fazer voltar ao estado primitivo, consertar. So, respectivamente, as aes a serem tomadas antes e depois do sinistro.

    Sem dvida os princpios da preveno e da reparao esto vinculados ao

    princpio da vulnerabilidade diante da condio de o consumidor ser a parte mais

    fraca da relao de consumo, como se l no CDC no seu art. 4, I:

    Art. 4 A Poltica Nacional das Relaes de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito sua dignidade, sade e segurana, a proteo de seus interesses econmicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparncia e harmonia das relaes de consumo, atendidos os seguintes princpios: (Redao dada pela Lei n 9.008, de 21.3.1995). I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

  • 40

    Quanto a este princpio Miragem (2008, p. 18) observa:

    A vulnerabilidade do consumidor constitui presuno legal absoluta, que informa se as normas de direito do consumidor devem ser aplicadas. H na sociedade atual o desequilbrio entre os dois agentes econmicos, consumidor e fornecedor, nas relaes jurdicas que estabelecem entre si. O reconhecimento desta situao pelo direito que fundamenta a existncia de regras especiais, uma lei ratione personae de proteo do sujeito mais fraco da relao de consumo.

    Alm disso, ressalta-se que muito embora no seja elencado por muitos

    doutrinadores, o princpio da segurana um dos mais importantes do cdigo

    consumerista, porque nele se estrutura todo o sistema de responsabilidade civil das

    relaes de consumo, recebendo acepo no 1 dos arts. 12 e 14 do CDC,

    conforme explica Cavalieri Filho (2011, p. 52-53, grifo meu):

    O 1 do art. 12 do CDC dispe que: O produto defeituoso quando no oferece a segurana que dele legitimamente se espera. No mesmo sentido o 1 do art. 14: O servio defeituoso quando no fornece a segurana que o consumidor dele pode esperar [...] isto quer dizer: que o fundamento da responsabilidade do fornecedor no o risco, como afirmado por muitos, mas, sim, o princpio da segurana. O risco, por si s, no gera a obrigao de indenizar. Risco perigo, mera probabilidade de dano, e ningum viola dever jurdico simplesmente porque fabrica um produto ou exerce uma atividade perigosa, mormente quando socialmente admitidos e necessrios.

    Assim, o carter principiolgico do CDC mostra-se plenamente aplicvel a

    medida que cada vez mais o cidado busca a efetivao dos seus direitos, sejam

    eles inerentes sua dignidade, s suas relaes sociais ou mesmo contratuais.

    Neste ponto, pode-se concluir que a base da responsabilizao civil atravs

    deste diploma, passa pela ofensa aos princpios elencados acima como se ver no

    subcaptulo seguinte.

    3.3 Responsabilidade Civil no Cdigo Defesa do Consumidor

    A responsabilidade civil decorre da violao de um direito que pode ter como

    consequncia um prejuzo moral, esttico ou financeiro que dever ser indenizado.

    Nessa linha o entendimento de Khouri (2013, p. 170) que acrescenta:

    Pode-se dizer que o sistema de distribuio de riscos da responsabilidade civil, implicitamente, traz consigo o seguinte princpio: o dano decorrente vtima da quebra de dever de outrem ser sempre um dano injustificado e

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    por isso vai merecer sempre a reparao; ao passo que o dano justificado, isto , o dano decorrente vtima que se justifica pela sua prpria conduta (culpa exclusiva) ou que decorra de fatos alheios interferncia ou de quebra de dever por qualquer terceiro, como o caso fortuito e a fora maior, ser sempre suportado por ela prpria (a vtima) [...].

    Contudo, para se chegar responsabilidade civil aplicada atravs do Cdigo

    de Defesa do Consumidor necessrio primeiramente que haja uma familiarizao

    com alguns conceitos, principalmente no que se referem a fornecedor, produtos e

    servios que recebem a primeira conceituao nos artigos 2 e 3 do diploma

    consumerista:

    Art. 2 Consumidor toda pessoa fsica ou jurdica que adquire ou utiliza produto ou servio como destinatrio final. Pargrafo nico. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indeterminveis, que haja intervindo nas relaes de consumo. Art. 3 Fornecedor toda pessoa fsica ou jurdica, pblica ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produo, montagem, criao, construo, transformao, importao, exportao, distribuio ou comercializao de produtos ou prestao de servios [...]. 1 Produto qualquer bem, mvel ou imvel, material ou imaterial. 2 Servio qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remunerao, inclusive as de natureza bancria, financeira, de crdito e securitria, salvo as decorrentes das relaes de carter trabalhista.

    Doutrinariamente, fornecedor conceituado por Marques (2004, p. 93):

    A definio do art.3 ampla. Quanto ao fornecimento de produtos, o critrio caracterizador desenvolver atividades tipicamente profissionais, como a comercializao, a produo, a importao, indicando tambm a necessidade de uma certa habitualidade, como a transformao, a distribuio de produtos. Estas caractersticas vo excluir da aplicao das normas do CDC todos os contratos firmados entre dois consumidores, no profissionais, que so relaes puramente civis s quais se aplica o CC/2002. A excluso parece-me correta, pois o CDC, ao criar direitos para os consumidores, cria deveres e amplos, para os fornecedores.

    J quanto ao conceito de consumidor, nas palavras de Nery Jnior Apud

    Palhares (2000, p. 51), quatro conceituaes a partir do texto legal:

    O cdigo contm quatro conceitos de consumidor: a) o conceito-padro ou standard (art. 2, caput), segundo o qual consumidor a pessoa fsica ou jurdica que adquiri produto ou servio como destinatrio final; b) a coletividade de pessoas, ainda que indeterminveis que haja intervindo nas relaes de consumo (art. 2, pargrafo nico), afim de possibilitar a propositura da class action prevista no art.81, pargrafo nico, III); c) as vtimas do acidente de consumo (art. 17), afim de que possa valer-se dos mecanismos e instrumentos do CDC na defesa dos seus direitos; d) aquele que estiver exposto s prticas comerciais (publicidade, oferta, clusulas gerais dos contratos, prticas comerciais abusivas, etc.) (art. 29).

    Esmiuando o conceito de consumidor Cavalieri Filho (2011, p. 66-67) elenca

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    as caractersticas que considera mais acentuadas:

    a) Posio de destinatrio ftico e econmico quando da aquisio de um produto ou da contratao de um servio. O destinatrio ftico, simplesmente, ainda que possa receber a tutela legal em virtude de outras situaes no estar includo no conceito de consumidor padro; b) Aquisio de um produto ou a utilizao de um servio para suprimento de suas prprias necessidades, de sua famlia, ou dos que se subordinam por violao domstica ou protetiva a ele, e no para desenvolvimento de outra atividade negocial, significa dizer, ausncia de intermediao, de reaproveitamento ou de revenda; c) No profissionalidade, como regra geral, assim entendido a aquisio ou a utilizao de produto ou servio sem querer prolongar o ciclo econmico desses bens ou servios no mbito de um comrcio ou uma profisso. [...] d) Vulnerabilidade em sentido amplo (tcnica, jurdica ou cientfica, ftica ou socioeconmica e psquica), isto , o consumidor reconhecido como a parte mais fraca da relao de consumo, afetado em sua liberdade pela ignorncia, pela disperso, pela desvantagem tcnica ou econmica, pela presso das necessidades ou pela influncia da propaganda (grifos do