Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico: Impactos do Software Livre no Brasil...

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Programa de Pós-Graduação em História Social Departamento de História Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo DISSERTAÇÃO CONTRADIÇÕES E CONFLITOS DO DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO: Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso Dissertação depositada como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre em história. Rubens Araujo Menezes de Souza Filho Orientador: Prof. Dr. Gildo Magalhães dos Santos Filho Agosto de 2006 31/08/2006 - 20060830_rbns.odt 1

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Este trabalhado está centrado na questão dos sistemas operacionais, abordando as histórias do Windows e do Linux, mas trata também da idéia do progresso, da disputa pelo conhecimento, da disputa pelas patentes, e do movimento GNU/Linux.Avalia­-se ainda a relação da informática com a autodeterminação tecnológica, dando ênfase ao desenvolvimento tecnológico brasileiro.

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Programa de Pós­Graduação em História Social

Departamento de História

Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo

DISSERTAÇÃO

CONTRADIÇÕES E CONFLITOS DO 

DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO: 

Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

Dissertação depositada como parte dos requisitos

para obtenção do título de mestre em história.

Rubens Araujo Menezes de Souza Filho

Orientador: Prof. Dr. Gildo Magalhães dos Santos Filho

Agosto de 2006

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Esta obra se encontra disponível para cópia, distribuição, exibição e execução. Também é  facultada a livre criação de obras derivadas de acordo com o termos da licença  Creative Commons Atribuição­Uso Não­Comercial 2.5 Brasil1.Qualquer direito de uso legítimo (ou "fair use") concedido por lei, ou qualquer   outro   direito   protegido   pela   legislação   local,   não   são   em hipótese alguma afetados pelo disposto acima.

1 Vide: Anexos, documento V

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SumárioResumo....................................................................................................................................5Agradecimentos.......................................................................................................................7Dedicatória..............................................................................................................................8Siglas........................................................................................................................................9

 1.Introdução..............................................................................................................................101.1. Justificativa Pessoal........................................................................................................101.2. A História do minuto anterior.......................................................................................121.3. Sistemas Operacionais?..................................................................................................161.4. Considerações Metodológicas.......................................................................................181.5. Estrutura da Dissertação................................................................................................21

 2.A idéia de progresso e a disputa pelas patentes de softwares.............................................23 3.Uma História de softwares e sistemas operacionais............................................................37

 3.1.Do hardware ao software................................................................................................37 3.2.Do nascimento da Micro­soft à conquista do Desktop................................................43 3.3.O nascimento do Linux.................................................................................................55 3.4.O GNU/Linux e a antiga novidade do Software Livre................................................56 3.5.Visões de Mundo...........................................................................................................58 3.6.O Linux e o movimento do Software Livre pelos olhos da Microsoft, o Windows e a Microsoft pelos olhos do movimento do Software Livre....................................................61 3.7.Considerações Sobre a Natureza da Informática e a Autodeterminação Tecnológica ................................................................................................................................................86

 4.Uma História do desenvolvimento tecnológico brasileiro...................................................91 4.1.Brasil: raízes da industrialização e do desenvolvimento tecnológico..........................91 4.2.Mudanças no quadro político........................................................................................95 4.3.A Industrialização..........................................................................................................98 4.4.História do Software no Brasil....................................................................................109 4.5.O Software Livre e a política brasileira de desenvolvimento tecnológico, uma nova tentativa de autodeterminação.............................................................................................117

 5.Conclusões...........................................................................................................................127 5.1.Balanço Final................................................................................................................133

 6.Glossário..............................................................................................................................135 7.Bibliografia..........................................................................................................................136

 7.1.Livros............................................................................................................................136 7.2.Teses e Dissertações.....................................................................................................138 7.3.Artigos..........................................................................................................................138 7.4.Artigos da Imprensa Diária..........................................................................................138 7.5.Bibliografia Técnica de Referência.............................................................................139 7.6.Documentos na Internet...............................................................................................139 7.7.Legislação Consultada..................................................................................................139 7.8.Material de Apoio........................................................................................................139

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 8.Anexos..................................................................................................................................140 8.1.Documento I.................................................................................................................140 8.2.Documento II (Resolução n° 5.213 de junho de 2005)...............................................141 8.3.Documento III (Lei n° 7.646 de 18 de dezembro de 1987)........................................143 8.4.Documento IV (Decreto de 29 de outubro de 2003)..................................................150 8.5.Documento V (Creative Commons Licença de Atribuição­Uso Não Comercial 2.5 Brasil)..................................................................................................................................152 8.6.Documento VI (The Open Source Definition)...........................................................153

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Resumo

O software  represente hoje uma das mais interessantes criações humanas, pois é o 

conhecimento em estado puro. Ainda que não se possa tocar o software ele está presente em 

todos   os   lugares   onde   estão   as   tecnologias   digitais:   telefones   celulares,   MP3  players, 

máquinas fotográficas digitais, computadores e a Internet. Peças da rotina diária de milhões 

de pessoas, todos regidos por softwares.

A evolução e indiscriminada disseminação das tecnologias digitais impõe desafios 

às   pessoas,   empresas   e   governos,   tornando   imperativo   a   compreensão   das   relações 

econômicas, sociais e políticas que determinam a criação e utilização dos softwares, ou em 

outras palavras a criação e utilização do conhecimento humano. 

Este trabalhado está  centrado na questão dos sistemas operacionais, abordando as 

histórias do Windows e do Linux, mas trata também da idéia do progresso, da disputa pelo 

conhecimento, da disputa pelas patentes, e do movimento GNU/Linux.

Avalia­se   ainda   a   relação   da   informática   com   a   autodeterminação   tecnológica, 

dando ênfase ao desenvolvimento tecnológico brasileiro.

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Abstract

Today software is one of the most important human creations, once it knowledge in 

pure form. Even if we can not touch the software it is present at all the places where you can 

find   the   digital   technologies:   cell   phones,   MP3   players,   digital   photographic   cameras, 

computers and the Internet. Pieces in the every day life of millions of persons around the 

world, all of them ruled by softwares. 

The   evolution   and   indiscriminate   dissemination   of   digital   technologies   imposes 

challenges   to   people,   enterprises   and   governments,   making   it   urgent   to   understand   the 

economic, social  and political  relations that  define the creation and use of softwares,  or 

rephrasing it, the creation and use of human knowledge.

This work is focused in the problem of the operating systems, covering the history 

of Windows and Linux, but it  also addresses the very idea of progress,  the dispute over 

knowledge, the dispute over patents, and the GNU/Linux community.  

It also evaluates the relations of information technology and the technological self­

determination, with focus on the Brazilian technological development. 

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Agradecimentos

Agradeço à minha esposa Ana, pelo apoio, incentivo, compreensão e todo amor. A  

ela peço desculpas por todas as madrugadas no computador enquanto redigia este  

texto. 

Agradeço à minha Mãe pelo gosto que me incutiu pelas palavras longas e ao meu  

Pai que tantos anos financiou esta excentricidade.

Agradeço a todos os amigos que abandonei para poder me trancar em “meu mundo”  

e perseguir estas idéias, em especial Dedé,  Klaus, Léo, Rigotti  e Madrugada, de  

quem, com grande aperto no coração, efetivamente me escondi. 

Agradeço muito ao Prof. Dr. Gildo Magalhães, tanto por sua consistente orientação  

como por sua paciência de monge que já atingiu a iluminação. Agradeço as leituras  

cuidadosas das versões deste texto, agradeço a oportunidade, as aulas e a amizade.  

Espero um dia conquistar erudição semelhante. 

Como é  de  praxe declaro que os  erros  são meus e  os  acertos compartilhados.  

Agradeço a todos que injustamente não estão sendo mencionados. Se quem disse  

que “o trabalho do historiador é solitário” tivesse recebido metade da ajuda que eu  

recebi, teria ficado calado.

São Paulo, 27 de Agosto de 2006 

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Dedicatória

Esta dissertação é dedicada a minha filha, ou ao meu filho, cuja chegada

se avizinha. Afinal, como todos sabemos, a história se dedica ao futuro.

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Siglas

1. BBS ­ BBS ou bulletin board system. Software, que permite conexão via telefone a um sistema via computador, permitindo a interação com o sistema e com outros usuários.

2. CNPq ­ Conselho Nacional de Pesquisas3. CPD ­ Centro de Processamento de Dados4. FINEP ­ Financiadora de Estudos e Projetos5. FLOSS ­ Free/Libre Open Source Software6. FNDCT ­ Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico7. FUD – Fear Uncertanty Doub8. HTML ­ Hiper Text Markup Language, ou Linguagem de Marcação de Hipertexto9. HTTP ­ Hiper Text Transfer Protocol, ou Protocolo de Transferência de Arquivos de 

Hipertexto10. LED ­ sigla em inglês para Light Emitting Diode (Diodo que Emite Luz), um dispositivo 

semicondutor emissor de luz bastante utilizado como indicador de utilização em dispositivos eletro­eletrônicos.

11. NCSA ­ National Center for Supercomputing Applications.12. NDA ­ Nondisclosure Agreements ou NDAs13. NT, Windows ­ Windows New Technology, ou Windows NT14. NTFS ­ New Technology File System, algo traduzível como Sistema de Arquivos de Nova 

Tecnologia.15. OEM ­ Original Equipment Manufacturer 16. RAM ­ Random Access Memory, ou Memória de Acesso Randômico17. SEI ­ Secretaria Especial de Informática18. SO ­ Sistema Operacional19. TI ­ Tecnologia Informação, ou em inglês IT (information technology), sigla utilizada para 

referir profissionais e recursos deste ramos da engenharia.20. TCO ­ Total Cost of Ownership, ou em português Custo Total de Propriedade.

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 1. Introdução

"(...) fiel no sentido, não tanto na forma, o que se compreende e desculpa, já que a memória, que é  

susceptível e não gosta de ser apanhada em falta, tende a preencher os esquecimentos com criações de 

realidade próprias, obviamente espúrias, mas mais ou menos contíguas aos factos de cujo acontecer só lhe 

havia ficado uma lembrança vaga, como o que resta da passagem de uma sombra."

José Saramago ­ Todos os Nomes

1.1. Justificativa Pessoal

2Este trabalho começou a ser imaginado em fins de 1996 e foi em grande medida 

motivado e inspirado pelo editor de textos MS­Word. 

No   ano   de   1997,   como     aluno   de   graduação   do   Departamento   de   História   da 

Faculdade  de  Filosofia  Letras  e  Ciências  Humanas  da  USP,  obtive  uma  bolsa  de  apoio 

técnico, junto à CAPES, para auxiliar a Profª. Drª. Zilda Márcia Grícoli Iokoi e o seu grupo 

de alunos, em alguns projetos acadêmicos que então desenvolviam.

Meu   papel   era   auxiliar   o   grupo   em   suas   necessidades   com   computadores   e 

softwares.  Nesta  ocasião ­    como em certa  medida,  ainda  hoje  ­  o  software  central  nos 

trabalhos acadêmicos das ciências humanas era o processador de texto, porém o meu papel 

era auxiliar na apresentação das possibilidades, criação e manutenção de bancos de dados 

(que começavam a ser popularizados na baixa plataforma e cujo potencial considero, ainda 

hoje, sub­aproveexperiências de implantaçãoitado).

2  N. do A. ­  As citações de obras ou documentos encontrados originalmente em inglês foram traduzidas sempre que isto pareceu pertinente para a compreensão do texto, sendo as traduções de responsabilidade do autor. No capítulo sobre o desenvolvimento tecnológico brasileiro, nos documentos da Microsoft se optou por não fazer adaptações ao texto, mantendo redundâncias e vícios de linguagem presentes nos originais já que estes são quase sempre transcrições de apresentações e palestras. Nas  traduções  o   termo  Open Source  deliberadamente não  foi   transformado em  Software  Livre  como no restante do texto, visando justamente ajudar a diferenciar quando  a referência é feita ao Software Grátis (Free Software)   e   quando   é   feita   ao  Software  Aberto   (Open   Source),   pois   o   inglês  free  não   se   traduz automaticamente como livre, podendo ter (e aqui em geral terá) a acepção de grátis.

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Nesta   época   comecei   a   notar   que   para   um   número   sensível   de   usuários,   os 

processadores de texto, que deveriam ser relativamente simples, por alguma razão não o 

eram. O software em questão era o MS­Word ­ hegemônico já naquela época ­ que teimava 

em   tomar   "decisões"   sem   consultar   os   usuários,   "corrigindo"   palavras,   alterando 

formatações e em certa medida submetendo usuários menos experientes à  sua "vontade". 

Mesmo   eu,   usuário   pretensamente   avançado,   tinha   um   inevitável   desconforto   em   ser 

obrigado a alterar configurações e o setup de "fábrica" para utilizar o software. 

Parecia, para mim, que aquela tecnologia subvertia o pensamento, acrescentando aos 

textos   do   usuário,   de   maneira   sub­reptícia,   suas   próprias   idéias.   Algo   sem   dúvida 

descabido, pois a máquina computador, apesar de toda sua tecnologia não seria capaz de 

pensar mais do que a máquina de escrever ou o aspirador de pó.  Ainda assim a máquina de 

escrever e o aspirador não interferiam no que era datilografado ou aspirado.

A este pequeno fator incomodativo aliou­se uma palestra do intelectual  e ativista 

político norte­americano, Noam Chomsky. Em visita ao Brasil, em novembro de 1996, a 

convite  da ABRALIN (Associação Brasileira  de  Lingüística),  o  Prof.  Chomsky proferiu 

uma palestra no Departamento de Letras Modernas, onde entre outras coisas destacava a 

língua como uma manifestação ideológica dos grupos que a utilizavam e/ou apropriavam e 

modificavam3.

Estes fatores deram início à fermentação do pensamento de que poderia haver mais 

nos softwares do que simplesmente uma ferramenta estritamente técnica. Parecia, ao menos 

para mim, que ali estava contido um pensamento concreto, uma lógica particular, uma visão 

de mundo concretizada nas soluções apresentadas na tela ou, se preferirmos outro termo, ali 

estava   embutida   uma   ideologia.   Logo,   talvez   aquela   sensação   não   fosse   tão   descabida 

afinal.

Em   vista   do   fato   que   estes  softwares  eram   hegemônicos   e   onipresentes;   da 

generalizada expectativa de que cedo ou tarde eles dominariam todos os ramos da atividade 

humana;  da  percepção de  que  eram  produzidos  por  um  grupo   relativamente  pequeno  e 

3  Knowledge of History and Theory Construction in Modern Linguistics. Palestra proferida em São Paulo, Brasil (Novembro de 1996). Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada (D.E.L.T.A.) 13, (1997): 103­122. Em português no mesmo exemplar, p. 129­52.

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homogêneo de pessoas, todas partilhando os mesmos valores culturais de um país, e que 

este produto era massificado para (e consumido por) todo o planeta, surgiu em mim uma 

crescente   preocupação   com   a   aceitação   dos  softwares  como   simples   ferramentas 

desprovidas   de   intenções.   Produtos   intangíveis   que   eram   passíveis   de   críticas   apenas 

quando falhavam, e  não,  como eu principiava a  enxergá­los:  uma produção cultural,   tão 

passível de análise crítica e, quiçá, regulação. 

Neste   terreno   brotaram   as   primeiras   inquietações   motivadoras   deste   trabalho. 

Assim,   apesar   dos   desvios   e   re­elaborações   que   sofreu   ao   longo   de   sua   execução, 

movimento conhecido e bastante natural nos trabalhos de pesquisa, pode­se seguramente 

dizer   que este texto foi,  antes de mais nada, motivado pelo MS­Word e seu pretensioso 

comportamento de intervir nos textos digitados pelo usuário.

1.2. A História do minuto anterior

A   história   é   o   dialogo   entre   os   vivos   e   os   mortos,   pois   a   própria   sociedade   é  

herdada, são herdados os costumes, as crenças e os valores. As relações sociais, econômicas 

e de trabalho de vivos (e mortos), as relações de agora e as relações possíveis então, foram 

herdadas.

No diálogo de vivos e mortos, também a tecnologia é herdada e, como toda herança, 

traz sua carga histórica e ideológica, sendo esta carga o objeto de análise deste trabalho. 

Pretendendo abordar a história de uma tecnologia recente, iniciada há pouco tempo, 

quando   a   posicionamos   na   longa   cronologia   do   tempo   histórico,   somos   forçados   a 

confrontar algumas questões de ordem prática  e  metodológica que emergem de maneira 

inevitável.

Ao tratar da história da micro­informática, em nosso caso específico do ramo de 

softwares,  a primeira e mais irrefletida das questões é  se há  afinal uma história para ser 

contada  em algo   tão   recente.  Digo   irrefletida  pois  ao   iniciar  este   texto,   com  a   lúgubre 

ilustração da história como o diálogo entre os vivos e os mortos, pretendo deixar clara a 

natureza do hoje  como derivada do ontem; de forma que fique patente  que,  mesmo um 

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fenômeno   recente   tem   suas   raízes   plantadas   nas   gerações   precedentes,   por   vezes   em 

profundidades insuspeitas.  

Marc  Bloch   já  observava  em sua  "Introdução à  História"  como era  pedregoso  o 

caminho do historiador que se aproxima do tempo presente, apontando que o juízo que se 

faria deste historiador era que ele se afastava da história para lidar com "política", talvez em 

uma   avaliação   mais   gentil   com   "sociologia",   ou   em   outra   menos   gentil   que   seria 

"jornalismo". Mas Bloch observa que concordar com esse julgamento "é esquecer também 

que,  quando as ressonâncias  sentimentais  entram em jogo,  o  limite entre o  actual  e  o  

inactual não se regula necessáriamente pela medida matemática de um intervalo de tempo" 

e que haveria ainda aqueles que, mesmo aceitando o presente humano como suscetível de 

conhecimento científico, este seria reservado a outras disciplinas. "Consideram a época em 

que vivem separada das antecedentes por contrastes grandes demais para não  ter em si  

mesma a sua própria explicação”,  deixando  o  estudo das  sociedades  dividido em duas 

partes:  "De uma banda, um punhado de antiquários ocupados, por deleite macabro, em  

desenfaixar os deuses mortos; de outra, sociólogos, economistas, publicistas: os únicos  

exploradores   das   coisas   vivas...",  algo   inaceitável,   uma   vez   que   é   justamente  "nesta 

faculdade de apreensão do que é vivo é que reside, efectivamente, a qualidade fundamental  

do historiador"4.

Imbuído deste espírito, acredito que um trabalho desta natureza traz em si elementos 

de  grande  motivação para  o  pesquisador  e   interesse  para  a  sociedade.  Por  ser  a  micro­

informática aspecto dominante da economia e das sociedades modernas, ela está submetida 

a forte apropriação ideológica, já que é uma ponta de lança do capitalismo moderno.5 E esta 

é uma apropriação, sem dúvida, histórica. 

Um   dos   traços   mais   proeminentes   desta   apropriação,   parece   ser   justamente   a 

prontidão e  veemência  com que  é  negado  o  peso  de  preconceitos  e   idéias,  que   tenham 

motivações   diversas   dos   critérios   técnicos   em   sua   evolução.   Estivessem   os 

4 BLOCH, Marc. Introdução à H istória. Edições Europa­América.(vide páginas 38 e 43, nas citações foi preservada a grafia do texto consultado).5 Afirmação que pode ser verificada por um lado nos escritos de José Luiz Fiori e Giovanni Arrighi sobre a globalização financeira do capital e por outro nos escritos de Manuel Castells sobre a nova configuração da sociedade em rede.

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desenvolvimentos do hardware e software blindados do peso das ideologias, constituiriam, 

apenas por isso, irresistível tema para historiadores e outros cientistas sociais, pois tratar­se­

ia de caso único na história da humanidade. 

Uma das premissas desta reflexão é  que esta negação faz parte de um raciocínio 

economicista   dominante   na   atualidade,   raciocínio   que   afasta   as   formas   sociais   de 

compreensão do mundo em favor de  uma onipresente   lógica  empresarial,  poderosa para 

cooptar   até   mesmo   os   Estados   Nacionais.   O   principal   resultado   dessa   situação   é   que 

ressaltada   a   racionalidade   econômica,   esconde­se   a   racionalidade   humana;   desta   forma 

embora   esta   pesquisa   verse   sobre   a   historia   da   tecnologia   motriz   da   chamada   “nova 

economia”, o que nos interessa são as formas sociais que a engendraram e as formas sociais 

por ela engendradas, mais do que qualquer outra coisa.

Assim, este texto não pretende recontar a história da informática, nem tão pouco dos 

computadores, embora por vezes façamos menção a tais temas, com o objetivo de embasar 

determinadas teses, perpetrar analogias ou simplesmente por ser impossível atingir nosso 

objetivo sem passar por estes temas em algum momento. Sem menosprezar a relevância 

destas  áreas  de   investigação,  acreditamos  que  neste   sentido  nossa  contribuição  seria  de 

pequena relevância  em relação à  bibliografia   já  disponível,  bibliografia  vasta  o  bastante 

para   nos   dar   uma   pista   do   grande   interesse   que   o   tema   desperta   na   sociedade 

contemporânea6.

Como já foi dito, este trabalho aborda uma subdivisão da história da informática, a 

história  dos  softwares  que operam os  microcomputadores de hoje.  Portanto  temas como 

hardware e Internet estão fora do escopo inicial desta investigação, sendo o nosso objetivo 

específico recontar parte da história dos softwares ­ com um especial interesse nos sistemas 

operacionais Windows e Linux ­ porém, menos com o objetivo de fazer o simples registro 

cronológico de sua trajetória, do que analisar e expor as forças sociais e econômicas que 

operaram e operam esta trajetória.6Cf.   CERUZZI,   Paul   E.  A   History   of   Modern   Computing.  Massachusetts   :   MIT   Press,   1998.   ou MAGALHÃES, Gildo.  Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil   (1971­1992).  1994. Tese (Doutorado História) ­ FFLCH, USP para uma história da computação geral e para o caso específico brasileiro; ou os trabalhos de Pierre Levy e Manuel de Castells para a elaboração de aspectos mais gerais do impacto desta tecnologia na sociedade.

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O principal pressuposto deste trabalho é a idéia que a ideologia opera ativamente 

no   desenvolvimento  da   tecnologia7  (e   dos  softwares  por   conseqüência),   não   sendo   a 

evolução   da   tecnologia   resultado   exclusivo   da   imparcial   aplicação   de   novas   técnicas. 

Acreditamos que a seleção das técnicas e os caminhos escolhidos por técnicos e cientistas 

no   desenvolvimento   da   tecnologia   são   resultado   de   fatores   que   trazem   mais   do   que 

pressupostos técnicos e neutros, como em geral se considera. 

Este é um trabalho de investigação no campo da história da ciência, que ao “contar a 

história dos  softwares”, busca apontar o peso da ideologia nesta história. Porém, ao tratar 

“da   ideologia”,   estamos   obrigados   a   definir   com   qual   conceito   de   ideologia   estaremos 

trabalhando, pois o termo em si é suficientemente controverso para dar origem a inúmeros 

trabalhos   acadêmicos.   Aqui   utilizaremos   o   termo   ideologia   sem   aplicar   a   ele 

necessariamente um juízo de valor, sem desconsiderar que a ideologia pode, como tudo, ser 

boa ou má. No nosso caso trabalharemos o termo ideologia simplesmente como “idéias que 

servem a determinados fins”8, não raro, mascarando os seus reais objetivos.

Por   fim   cabe   apontar   que   se   esta   pesquisa   não   busca   o   “deleite  macabro,   em 

desenfaixar  os  deuses  mortos”,   há   o   tom   herético   de   quem   conta   uma   história  in   the 

making,   que   ainda   não   permite   o   distanciamento   temporal   tão   caro   a   tantos   colegas 

historiadores. Para os críticos da proximidade só resta oferecer o conforto de que para tratar 

da história do que está acontecendo foi necessário recuar no mínimo um quarto de século, e 

em alguns momentos mais do que isso, já que os vivos dialogam constantemente com os 

mortos. Os riscos e desvantagens desse situação eram conhecidos e foram assumidos, com 

seu peso inerente de imprecisão, que não deve porém impedir a crítica dessa história desde 

já.

7  Esta   idéia  é   apenas  uma  extensão natural   da  noção   já   bastante   sedimentada  da   força   exercida  pela(s) ideologia(s) no desenvolvimento científico. Sobre este tema existe extensa bibliografia disponível, da qual destacamos alguns títulos a seguir: MAGALHÃES, Gildo. Introdução à  metodologia científica: caminhos da ciência e tecnologia. São Paulo : Ática, 2005; CANGUILHEM, Georges. Ideologia e racionalidade nas ciências da vida. Lisboa : Edições 70, 1997; JAPIASSU, Hilton. As Paixões da ciência. São Paulo : Letras & Letras,  1991;  CHALMERS, Alan.  A Fabricação  da Ciência.  SP:  UNESP,  1994;  LACEY, H.  Valores  e Atividade Científica. São Paulo : Discurso Editorial, 1998; LACEY, H. Is Science Value Free? Values and Scientific Understanding. London and New York: Routledge, 1999. 8 MAGALHÃES, Gildo. Introdução à metodologia científica: caminhos da ciência e tecnologia. São Paulo : Ática, 2005.

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1.3. Sistemas Operacionais?

É  muito comum que  a  história da micro­informática seja contada com ênfase no 

aspecto físico, e mais evidente, das máquinas: o computador propriamente dito, tratando os 

programas que neles são utilizados como algo secundário, por vezes desimportante. Nossa 

percepção  é   contrária   a   esta   abordagem,   acreditamos  que  os  programas   (software)   têm 

relevância, se não superior, ao menos igual às máquinas (hardware).

Para ilustrar nossa visão, e familiarizar o leitor menos embrenhado nas searas da 

técnica, com o objeto deste trabalho, utilizemos a seguinte imagem cartesiana: em sendo o 

computador uma entidade “viva” o  hardware  seria  seu corpo,  e  o  software  seu espírito. 

Nesta dissertação, trataremos pois de questões “espirituais”.

A motivação desta abordagem é, em primeiro lugar, dada pela seguinte constatação: 

ainda   que   sejam   aplicados   os   mais   inovadores  designs,   quer   estejamos   tratando   de 

poderosos mainframe no CPD9 de grandes empresas ou órgãos públicos, de um tradicional 

clone dos PC em um escritório, de um roteador gerenciando tráfegos de rede, ou de um 

compacto  palmtop anotando pedidos em um restaurante, a tecnologia  física de todas estas 

máquinas   é,   sob   diversos   aspectos,   muito   parecida.   Na   verdade,   trata­se   de   tecnologia 

recorrente e comum. 

O  hardware,   pelo   menos   o  hardware  comercialmente   disponível,   fora   dos 

laboratórios de empresas e universidades, oferece uma gama limitada de abordagens, sem 

menosprezar   características   técnicas/tecnológicas   de   cada   plataforma.   Mesmo   que 

considerados diferentes modelos, fabricantes e tecnologias, todos obedecem a um mesmo 

conjunto de soluções e princípios solidamente estabelecidos pela indústria e pela história. 

Por   isso,   para   um   técnico   não   há,   ou   raramente   parece   haver,   muita   diferença   entre 

computadores   que   são   “diferentes”   para   o   público   em   geral.   Descontando   pequenas 

variações características de cada tipo de equipamento, podemos, por exemplo, fazer uma 

generalização   sobre   os   processadores.   Basicamente   todos   as   máquinas   que   podem   ser 

classificadas   como   computadores   seguem   uma   arquitetura   que   inclui   um   ou   mais 

9  Sigla utilizada para Centro de Processamento de Dados,  vide no início deste texto a  lista com siglas e abreviaturas aqui utilizadas.

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microprocessadores10, memória de acesso randômico (RAM11) e em geral alguma forma de 

armazenamento de dados como  hard­drives12  ou  memórias  flash13,  o  que  contudo não é 

obrigatório.   Estes   princípios   são   constantes,   constituindo   um   padrão   que   independe 

totalmente da plataforma e do sistema operacional.

Mas não acreditamos que o mesmo possa ser dito sobre os softwares14, que mesmo 

dentro  dos   limites   impostos  pelo  hardware  podem ser   tão criativos  como a   imaginação 

humana. Dito isto, a próxima justificativa que se faz necessária é a razão de escolhermos 

sistemas operacionais (SO) e não, por exemplo, planilhas ou processadores de texto para 

nossa análise.

10 Na definição da Wikipédia: “Um microprocessador (abreviado como µP ou uP) é um componente eletrônico de computador, feito de transistores miniaturizados em um único circuito integrado (IC) de material semi­condutor  (também chamado microchip ou apenas chip). A unidade central de processamento (CPU) é o mais comum microprocessador, mas muitos outros componentes em um computador contêm microprocessadores, como   as   unidades   de   processamento   gráfico   (GPU)   em   uma   placa   de   vídeo.   (....)”   ­ (http://en.wikipedia.org/wiki/Microprocessor ; acesado em 12/10/05 )11 Memória de acesso randômico, comumente conhecida pelo acrônimo em inglês RAM, tipo de armazenador para  computadores   (na  prática  um  chip  de  computador)  do  qual  os  conteúdos  podem ser  acessados  em qualquer   ordem   (random).   Em   contraste   com   dispositivos   de   armazenamento   seqüencial   como   fitas magnéticas e discos, no qual o movimento mecânico da mídia de armazenamento força o acesso em uma ordem fixa. (...) Computadores utilizam a RAM para guardar o código dos programas durante a execução. Uma característica que define a RAM é que o acesso a diferentes blocos da memória é feito quase na mesma velocidade,   em   contraste   com   outras   tecnologias(...).   (http://en.wikipedia.org/wiki/RAM   ;   acessado   em 12/10/05)12 Um disco rígido (hard disk) utiliza pratos rígidos que se movimentam em alta rotação. Cada prato tem uma superfície   magnética   plana   na   qual   os   dados   são   armazenados.   A   informação   é   escrita   no   disco   pela transmissão de um fluxo eletromagnético disparado por uma antena ou cabeça de leitura­gravação contra o material magnético da superfície, alterando assim sua polaridade em blocos específicos. A informação pode ser lida de volta por esta mesma cabeça de leitura­gravação devido a alteração elétrica causada pelo campo magnético na cabeça de leitura­gravação quando ela passa por este disco em rotação. (explicação adaptada da definição   da   Wikipédia,   conforme   acessado   em   12/10/05   no   endereço: http://en.wikipedia.org/wiki/Hard_disk)13 Memória Flash é uma forma de EEPROM (Electrically­Erasable Programmable Read­Only Memory) que permite que múltiplos setores sejam lidos e apagados em uma única operação de programação. (...) uma forma de chip de memória re­gravável que, ao contrário do chip de memória de acesso randômico (RAM), mantém seu conteúdo sem a necessidade de alimentação constante de energia. É um exemplo de memória não volátil (Non­Volatile Read Write Memory ou NVRWM).14  Pode­se  contra­argumentar  que   também os  softwares  obedecem a  um mesmo conjunto  de   soluções  e princípios   solidamente   estabelecidos  pela   indústria,  mas  mesmo assim  acreditamos  que   eles   apresentam variabilidade mais do que suficiente para esta análise, bem como outras características únicas que ainda serão exploradas, como sua forma de produção que serão vistas em capítulos subsequentes, para justificar nossa posição.

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A opção pelos SO deve­se em primeiro lugar à sua centralidade e sua função vital 

dentro das máquinas15. Todos os demais softwares são dependentes do SO para conseguirem 

“rodar” como se diz no jargão, ou de forma mais objetiva, os  softwares  precisam do SO 

para  desempenhar  os  papéis   para  os  quais   foram  projetados16,   como   também  precisa  o 

próprio hardware, que sem o SO consegue fazer pouco mais do que piscar alguns LEDs. O 

SO é pré­condição para que tanto o hardware ou outros softwares efetivamente funcionem, 

mal comparando poder­se­ia pensar no SO como um administrador, que mantém a máquina 

operacional e cuida das funções básicas do computador, mantendo­o ligado e funcionando 

para   que   os  softwares  possam   executar   as   funções   específicas   para   as   quais   foram 

projetados. 

Assim, nosso estudo será dirigido ao universo dos sistemas operacionais (SO) tanto 

por sua importância relativa em comparação com outros softwares, como pela possibilidade 

de análise de dois SO concorrentes e, sob diversos aspectos, antagônicos, o Windows da 

Microsoft  e  o  GNU/Linux  do  movimento  Open Source.  A  escolha  destes  dois  sistemas 

deve­se não tanto a suas características técnicas distintivas, que sem dúvida existem, mas 

principalmente à divergência dos princípios que norteiam suas criações e desenvolvimentos. 

Enquanto   o   Windows   é   um   sistema   comercial,   propriedade   de   uma   empresa   norte­

americana e desta forma protegido por patentes e segredos industriais, o GNU/Linux existe 

como   uma   espécie   de   criação   coletiva   transnacional.   Sobre   estas   diferenças   e   seus 

significados trataremos adiante.

1.4. Considerações Metodológicas

O recorte temporal desta dissertação foi definido como compreendendo os anos de 

1991 e 2005, anos que respondem respectivamente pela  gênese do sistema Linux e pelo 

15 Todas as máquinas citadas no exemplo de tecnologias recorrentes (início desta seção), apesar de fisicamente parecidas trabalham com SO próprios e diversificados, lá temos: Mac OS X (uma variação do OpenBSD)  no caso da Apple, HP­UX (uma variação do Unix) dentro do mainframe HP, uma versão do Windows, Linux ou BSD no clone IBM­PC, um SO proprietário e específico da CISCO para o seu roteador, e no Palmtop um PalmOS.16 Claro, sempre existem exceções, como por exemplo os softwares de particionamento de disco, ou mesmo os códigos gravados dentro dos  chips  dos computadores, mas são aplicações específicas o bastante para que possam ser ignoradas sem prejuízo ou invalidação das teses aqui apresentadas.

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surgimento  do  Brasil  como uma das  mais  relevantes   forças  mundiais  do  Software Livre 

(FLOSS)17. 

Esta delimitação levou­nos a expor com clareza quatro aspectos que precisariam ser 

abordados   nesta   dissertação:   1)   a   questão   da   propriedade   das   idéias,   2)   a   história   dos 

softwares  e   dos   sistemas   operacionais,   3)   a   história   do   desenvolvimento   tecnológico 

brasileiro  e  4)  os   impactos  do advento  do  Software Livre  no  Brasil;   respectivamente  as 

quatro partes em que está dividida esta dissertação.

Reconstruir   o   desenvolvimento   tecnológico   brasileiro   exigiu   o   levantamento   e 

posterior  análise  da  bibliografia  (fontes  secundárias)  disponível  sobre  o   tema;  o  mesmo 

deu­se   com   a   maior   parte  do   trabalho  necessário   para  debater   a   evolução   histórica   da 

propriedade das idéias e o seu reflexo no campo dos softwares. Já no processo de pesquisa 

da história dos softwares (tanto no Brasil como no exterior) tivemos fontes primárias pouco 

ortodoxas,   incluindo­se   aí   documentos   oficiais   de   empresas   divulgados   na   internet, 

mensagens de e­mail e mesmo  bulletin board threads18  cristalizadas em servidores; além 

das tradicionais fontes secundárias.

Algumas   hipóteses   apresentam­se   ante   os   questionamentos   propostos   nesta 

dissertação, a primeira e mais instigante é o que poderia ser chamado de teoria do refluxo, 

utilizando  aqui  a  acepção  geofísica  da  palavra   refluxo:  um movimento que se opõe a 

outro. A hipótese é que o próprio afã do capital em mercantilizar o conhecimento cria um 

movimento   contrário,   animado   justamente   com   a   idéia  de   libertar   o   conhecimento   das 

amarras do capital. 

Esta idéia só  pôde ganhar o relevo que têm hoje graças ao advento da Internet, a 

rede   de   computadores   reelaborou   a   geografia   espacial   e   política   do   conhecimento. 

Reelaborou a geografia espacial na medida que distendeu o seu acesso para além dos Campi 

das universidades e dos muros dos laboratórios das corporações, e reelaborou a geografia 

17  FLOSS ou  Free/Libre  Open Source  Software  é   a   sigla  pela  qual  o  Software  Livre  é   atualmente  mais conhecido. A idéia  por  trás do  Software  Livre (FLOSS) não é  a da gratuidade do produto,  mas sim (ou também) a liberdade para usar, distribuir, copiar e alterar o programa sem restrições legais. Em nome da simplicidade, será utilizado o termo Software Livre ao longo da dissertação. As principais características do Open Source (Software Livre) se encontram ao final do capítulo 2, à frente.18 Seqüência de mensagens em um fórum de debates eletrônico.

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política na medida em que diluiu o  espaço das nações, criando um não lugar e não tempo, 

onde convivem e convergem indivíduos cujas identidades não são pautadas unicamente por 

uma condição de funcionários de uma empresa ou membros de uma nação, mas sim por um 

ou mais  interesses comuns. 

Este convívio deu início, ou melhor acelerou tremendamente o compartilhamento, 

reelaboração e  geração de  novos  conhecimentos  em torno  dos   interesses  comuns  destes 

indivíduos que passaram a se organizar em grupos de interesse na rede de computadores. 

Como o produto desta reunião no  não  lugar  e  não  tempo  da  Internet  pertence a 

ninguém em especial e a todos ao mesmo tempo, começaram a surgir anomalias no seio da 

lógica  capitalista,  como uma forma diferente  de  produção de valor.  Trabalho autônomo, 

força de trabalho livre, combustão de energia humana que não é transformada imediata ou 

diretamente em capital. 

Ao mesmo  tempo que  as  corporações  e  os  Estados  buscam controlar  a  nascente 

idéia   da   economia   do   conhecimento,   um   problema   se   apresenta,   pois  "uma   autêntica 

economia do conhecimento corresponderia a um comunismo do saber no qual deixam de 

ser necessárias as relações monetárias de troca",  como observa com certa ironia André 

Gorz19.

Esta anomalia do  não  lugar  e  não  tempo  da Internet gera outras contestações ao 

capital, pois para além da difusão e geração livre de conhecimento propicia ainda (ou até 

por   isso)   a   contestação   da   propriedade   dos   bens   imateriais   como  softwares,   conteúdos 

artísticos e do próprio conhecimento. Todos estes itens são "bens" ou "produtos intangíveis" 

da   sociedade   moderna   que   têm   sido   livremente   distribuídos   pela   rede,   a   despeito   dos 

protestos dos detentores legais dos direitos de exploração.

Justamente  partindo  desta  contestação surge  a  segunda hipótese,  que  deriva  dela 

com linearidade, a hipótese de que o capital vem promovendo uma apropriação indébita de 

um conhecimento  outrora  pertencente  a   toda  sociedade,  privatizando   idéias  e  processos 

antes   públicos.   Trata­se   de   um   movimento   que   ocorre   com   maior   vigor   no   centro   do 

capitalismo,  nos  países  desenvolvidos  ou  mais   industrializados,  mas  que   repercute  com 

19 GORZ, André. O Imaterial. Conhecimento, valor e capital. São Paulo : Annablume; Janeiro de 2005

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maior   força   nas   bordas   do   capitalismo   prejudicando   sensivelmente   os   países   em 

desenvolvimento ou subdesenvolvidos. 

Uma terceira hipótese a ser verificada nesta dissertação é mais específica em relação 

aos  softwares  e  o seu desenvolvimento tecnológico. Mais à  frente  serão apresentados os 

dois  “macro modelos”  de  desenvolvimento  tecnológico  que  competem na  elaboração de 

softwares  na  atualidade.   O   modelo   empresarial   tradicional,   onde   o   desenvolvimento   é 

protegido por um segredo industrial e tem o objetivo de ser vendido como um produto, e o 

modelo do Software Livre onde os códigos são conhecidos e alterados por uma rede trans­

nacional   de   programadores   e   entusiastas   (não   necessariamente   remunerados   por   seu 

trabalho) e que é livremente distribuído.

Parte de nosso trabalho consiste em identificar até que ponto estas diferentes formas 

de desenvolvimento e de licenciamento interferem nos rumos tomados pela tecnologia de 

cada sistema operacional.

1.5. Estrutura da Dissertação

O   encadeamento   lógico   proposto   para   esta   dissertação   é   inicialmente   debater   a 

questão da propriedade das idéias,  derivando daí  a história dos  softwares.  Depois o foco 

será   dirigido   ao   caso   brasileiro,   tratando   primeiro   da   história   do   desenvolvimento 

tecnológico e depois de questões relativas aos softwares e em especial ao Software Livre no 

Brasil.

No   primeiro   capítulo   a   idéia   central   é   averiguar   a   maneira   pela   qual   o   capital 

apropria­se e mercantiliza conhecimentos públicos. Esta apropriação acontece em bases que 

restringem formal e legalmente o desenvolvimento contínuo ou subseqüente de uma idéia 

antes livre, propondo uma contradição que se torna especialmente perceptível no ramo dos 

softwares. Neste capítulo trataremos a questão da propriedade das idéias.

Depois   abordaremos   a   história   dos  softwares  propriamente   dita,   refazendo   a 

cronologia de eventos e conflitos que culminaram nas principais tecnologias em uso nos 

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microcomputadores atuais. Contudo o foco deste capítulo estará  na história dos Sistemas 

Operacionais e não na história dos softwares como um todo. Também é neste capítulo que 

trataremos  de   temas como Windows,  Microsoft,  Linux,  movimento  do  Software Livre  e 

suas interações. 

Antes   de   abordarmos   os   significados   do  Software   Livre  para   o   Brasil,   será 

necessário   entender   em   que   bases   se   deu   o   desenvolvimento   tecnológico   brasileiro, 

considerando que este desenvolvimento é invulgar para um país subdesenvolvido.

Buscaremos   especialmente   compreender   como   foi   possível   o   surgimento   do 

pensamento técnico­científico nacional e como foram constituídas as primeiras gerações de 

engenheiros   e   cientistas,   já   que   foram   eles   os   responsáveis,   entre   outras   coisas,   pelo 

desenvolvimento da indústria brasileira possível de micro­informática.

Assim esperamos  ter  as  bases  necessárias  para  entender  o  caminho  traçado  pelo 

Brasil até ser reconhecido como uma das potências mundiais do  Software Livre, tanto em 

desenvolvimento como em adoção.

Por fim pretendemos refletir  sobre quais os  significados deste  reconhecimento,  e 

sobre a consolidação do Software Livre enquanto alternativa viável incorporada pelo Brasil. 

Também   neste   capítulo   serão   discutidos   quais   os   impactos   do  Software  Livre   sobre   o 

desenvolvimento tecnológico e quais as possibilidades que ele apresenta ao Brasil. Junto a 

estas discussões agregamos nossas conclusões e considerações finais.

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 2. A idéia de progresso e a disputa pelas patentes de softwares.

"We are like dwarfs sitting on the shoulders of giants. We see more, and things that are more distant,  

than they did, not because our sight is superior or because we are taller than they, but because they raise us 

up, and by their great stature add to ours." 

John de Salisbury20, em 1159.

Este texto busca expor o antagonismo existente entre “a idéia de progresso”, situada 

em termos do período histórico contemporâneo, abordando­a dentro das idéias dominantes 

da sociedade; e a apropriação capitalista da Inteligência Geral21, como proposto por Marx 

nos  Grundrisse22,   e   posteriormente   re­elaborado   pela   escola   autonomista23.   Para   tanto 

20 Aparentemente não é realmente possível estabelecer, com absoluta precisão, a autoria desta frase. Sendo mais conhecida como um aforismo original de Isaac Newton ("If I have seen farther, it is by standing on the  shoulders of giants"), ela é de fato apenas uma re­elaboração do que já havia sido dito por John de Salisbury em 1159. Segundo M.T. Clanchy (em From Memory to Written Record: England 1066­1307 e Abelard: A Medieval Life) a idéia por trás desta frase possivelmente pertenceria a Bernard de Chartres (Bernardus Carnotensis) outro acadêmico do século XII, hipótese provável uma vez que grande parte do que se sabe sobre seu trabalho é  conhecido somente por escritos de John de Salisbury. Devido aos estudos de Bernard de Chartes terem aparentemente  concentrado­se  sobre a  obra de Platão,  há  quem defenda que a  idéia  por   trás  desta   frase pudesse derivar diretamente do pensamento platônico, embora a comprovação de tal idéia não seja possível. O eminente sociólogo Robert K. Merton, tem um livro entitulado  On the Shoulders of Giants : The Post­Italianate Edition onde discute questões como o plágio, criatividade e o conceito de progresso partindo da busca pela origem desta famosa frase.21 Esta Inteligência Geral pode ser compreendida como a subjetividade das coletividades sociais, o conjunto de saberes historicamente acumulados pelos grupos sociais, introjetados em diferentes atividades sem que “pertençam” a um indivíduo ou mesmo que se lhes possa apontar um autor.22 MARX, Karl. Grundrisse: Elementos Fundamentales Para La Critica de la economia politica (Borrador)  1857­1858; Buenos Aires; Siglo XXI Argentina Editores S.A: junho 1972.23  Marxismo autonomista designa uma escola de pensamento que coloca o centro da autodeterminação na classe trabalhadora. Esta corrente de pensamento marxista foi formulada durante as greves e protestos de trabalhadores, movimento feminista e estudantes italianos nos anos 1960 e 70. Os principais intelectuais desta linha do marxismo são Antonio Negri, Mario Tronti, Sergio Bologna, Mariarosa Dalla Costa, Francois Beradi e Raniero Panzieri.A autodeterminação da classe trabalhadora é  uma idéia que tem ramificações profundas dentro de toda a tradição marxista, mas o conceito autonomista em particular enfatiza o poder autônomo dos trabalhadores, colocando  sua  autodeterminação acima  do  poder  do  capital,  dos  partidos,   dos   sindicatos.  No  marxismo autonomista o poder autônomo de um grupo de trabalhadores é autônomo até mesmo dos outros grupos de trabalhadores. Aqui autonomia entende­se em geral como a habilidade dos trabalhadores de identificarem seus próprios interesses e lutarem por eles, indo além da mera reação à exploração que são submetidos pelo capital ou do direcionamento dado por "líderes trabalhadores" ao seu foco/objetivo de luta.

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pretendemos explorar a questão sob a luz do crescente recrudescimento das legislações de 

Copyright e patentes.

Embora, por um lado, reconheçamos que a escola autonomista faz uma leitura um 

tanto  polêmica  do  conhecimento  marxista,   substituindo  o  operário  como o  “sujeito”  da 

revolução,   por   outro   lado   acreditamos   que   suas   formulações   sobre   diversas   facetas   do 

capitalismo   contemporâneo   e   sobre   as   formas   de   trabalho   imaterial   são   extremamente 

pertinentes, merecendo portanto ser consideradas.

Esta formulação insere­se na necessidade de compreender e explicitar a apropriação 

capitalista da subjetividade dos trabalhadores e, em seu desdobramento, a apropriação da 

subjetividade das coletividades sociais. O tema suscita o debate tanto sobre a necessidade 

do Capital em dominar a cultura e a inteligência das massas,   quanto sobre o seu poder e 

“direito” de fazê­lo.

Tratando então da relação entre o Copyright e a apropriação da Inteligência Geral, 

procuraremos   de   forma   específica   explicitar   o   antagonismo   existente   entre   a   idéia   de 

progresso no desenvolvimento histórico  da  informática  e o fenômeno contemporâneo do 

recrudescimento das patentes de  softwares. Estas idéias são parte do raciocínio acerca da 

influência   da   ideologia   no   desenvolvimento   dos  softwares  de   computador,   campo   do 

conhecimento   humano   tomado   tacitamente   como   livre   de   influências   de   natureza 

ideológica e percebido, em geral, como apenas técnico.

A idéia de progresso está bastante presente e solidamente documentada na história 

da cultura ocidental, especialmente a idéia do progresso científico­tecnológico24, progresso 

do  qual  os   atuais   estágios   e  perspectivas  para  o   futuro  próximo  nos   campos  da   física, 

biologia   e   micro­informática   parecem   ser   a   materialização,   apenas   para   ficarmos   nos 

exemplos   mais   recorrentes.   Dentro   destes   trataremos,   como   dito   acima,   da   micro­

informática, ou da especificidade de seus softwares.

Não será portanto, foco deste texto discutir o conceito de progresso, nem pesquisar 

sua validade. Dentro de nosso recorte o progresso parece tangível, se pretendemos atrelar 

24  Cf.   BASALLA   G.  The   Evolution   of   Technology.  Cambridge,   1988.   e  ROSSI,   P.  Naufrágios   sem Espectador. A idéia de progresso. EDUNESP, 2000. 

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ao   conceito   meramente   o   aperfeiçoamento   técnico,   a   potência   das   máquinas   e   o 

generalizado espraiamento de suas aplicações em diferentes ramos da atividade humana.

Compreender   o   progresso   em   um   sentido   mais   amplo,   como   progresso   da 

humanidade em geral, como a melhoria de suas condições de vida e trabalho, exigiria um 

debate maior do que o proposto aqui, que ainda que não levasse fatalmente à  negação do 

progresso, nos levaria ao menos a questionar sua pertinência, ou colocá­lo dentro de termos 

mais objetivos, como “progresso de quem?” ou, “progresso para quem”.

Portanto,   ficaremos   com   a   idéia,   por   certo   unânime,   de   que   entre   as   primeiras 

calculadoras mecânicas como a “pascalina” de Pascal (1642) ou o “relógio contador” de 

Wilhem   Schickard   (1626),25  e   os   atuais   computadores   houve   por   certo   um   progresso 

técnico,   ou   com   a   apropriação   do   conceito   biológico,   uma   evolução,   conforme 

elaboraremos a seguir. 

Em   seu   livro  The   Evolution   of   Technology,   George   Basalla   busca   explicar   a 

mudança tecnológica, seu progresso portanto, de uma perspectiva evolucionária, centrando 

sua  análise  em quatro  grandes  conceitos:  diversidade,  continuidade,   inovação e  seleção. 

Para nós, é justamente esta idéia de evolução que põe em relevo o antagonismo mencionado 

no   início   do   texto.   A   evolução   da   informática,   em   especial   dos  softwares,   parece 

incompatível  com a necessidade capitalista de proteger por meio de patentes e restrições de 

direito autoral estes mesmos softwares.

George   Basalla   coloca   o   desenvolvimento   tecnológico   como   desvinculado   das 

necessidades básicas e imediatas de sobrevivência dos homens, estando para o autor, muito 

mais relacionado à história das aspirações humanas, onde as coisas feitas pelos homens são 

fruto de suas fantasias, desejos e necessidades elaboradas. “O mundo dos artefatos exibiria  

uma   diversidade   bem   menor   se   operasse   primeiramente   sob   os   limites   impostos   por  

necessidades fundamentais”. 26

25 MAGALHÃES, Gildo. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto desenvolvimentista  na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil   (1971­1992).  1994. Tese (Doutorado História) ­ FFLCH, USP26 BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 14.

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Basalla cita Karl Marx27, na defesa da idéia de que a invenção é um processo social, 

que repousa na acumulação de inúmeras pequenas melhorias e não nos esforços heróicos de 

alguns poucos gênios. Como no exemplo do elevador, onde não é possível determinar sua 

data de invenção, nem seu inventor, uma vez que seu princípio básico, o equilíbrio entre 

peso e contra­peso era conhecido no mundo antigo, tendo sido usado na Idade Média, na 

Roma antiga  e  possivelmente antes  disso.  Foi  o  Sr.  Otis28  que no entanto  entrou para a 

história do elevador em 185229 como um grande inventor, mesmo que sua contribuição, os 

freios   de   segurança,   indispensáveis   na   proteção   de   pessoas   e   cargas,   em   um   eventual 

rompimento dos cabos, seja relativamente pequena em toda a tecnologia e conhecimento 

empregados na máquina. 

Parece haver,  portanto, uma continuidade nas técnicas e ferramentas dos homens, 

“qualquer coisa nova que apareça no mundo das coisas fabricadas é baseado em algum  

objeto já  existente.”30  Mas o que se verificou com o avanço da sociedade industrial foi a 

emergência do inventor como herói, um tipo de gênio, fortemente defendido pelos estados 

nacionais, logo que os reflexos econômicos e a importância estratégica da industrialização 

passaram a ser por eles percebidos. 

“Apesar  das  evidências  em contrário,  há  um apoio  generalizado à  

idéia de que invenções são o resultado de revelações na tecnologia, trazidas  

por gênios individuais. As origens desta visão tem três pilares: a perda ou  

supressão de antecedentes cruciais; a emergência do inventor como herói; e  

a confusão entre mudança social e mudança sócio­econômica.31” 

27 Idem, 1995. p 21.É importante deixar registrado que embora cite Karl Marx, o texto de Basalla é crítico a um bom número de  idéias apresentadas pelo economista alemão, estando longe de um texto que poderia ser caracterizado como marxista.28 Elisha Graves Otis, inventou e iniciou a produção de elevadores com freios de segurança entre 1852 e 1856, sendo com isso um dos principais responsáveis pela viabilização de edifícios cada vez mais altos nas grandes cidades.29 The New Encyclopaedia Britanica in 30 Volumes : Ready Reference and Index VII. USA; Encyclopaedia Britannica, Inc.; 1980 ­ 15th edition30 BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 45.31 Idem, 1995. p 57.

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Uma   vez   que   com   a   revolução   industrial,   o   desenvolvimento   tecnológico   foi 

integrado aos sentimentos de nacionalismo ­ pois o crescimento (e o poder) de uma nação 

passou cada vez mais a estar a ele relacionado ­ não apenas os inventores foram alçados à 

categoria de heróis, mas também a tecnologia passou a ser foco de rivalidades, tensões e 

negociações entre países. Esse movimento redundou no fortalecimento da idéia e do sistema 

de  patentes,   legislações   específicas   que  visam  proteger   a   “propriedade   intelectual”  dos 

inventores, garantindo a estes o pleno direito de exploração de seus inventos, proibindo a 

outros   a   cópia   não   autorizada   dos   princípios   e   soluções   empregados   pelo   detentor   da 

patente.

“Patentes são  a  forma jurídica pela qual  as sociedades  industriais  

premiam   e   protegem   os   inovadores   tecnológicos.   Neste   processo,   uma 

invenção é identificada unicamente com seu inventor e as associações com  

os artefatos existentes são  obscurecidas.  Toda a legislação  de patentes é  

baseada na premissa que uma invenção é entidade única, nova que pode ser  

atribuída   ao   indivíduo   que   os   tribunais   determinarem   como   sendo   seu  

legítimo   criador.  Desta   forma,   o   sistema   de   patentes   converte   o   fluxo 

contínuo das coisas criadas em uma série de entidades distintas

Em uma sociedade  capitalista,  o  detentor  de  uma patente  está   em 

posição  de  utilizar  a  patente  para  obter  vantagens   financeiras  pessoais.  

Tendo em conta que dinheiro, status social e a gratificação  do ego estão  

simultaneamente   em   jogo,   os   concorrentes   em  uma   disputa  de   patentes  

muitas   vezes   lutam de  maneira  menos  do  que   justa  para  preservar   sua 

pretensão de originalidade.32”

Sendo portanto  as   inovações   tecnológicas  decorrência  de  um processo  evolutivo, 

como   propõe   Basalla,   considerando   os   gênios   criativos   como   uma   construção   social   e 

política  e  não  como um   fato  dado  e   inconteste,   estamos   aceitando   tanto  o  conceito  de 

progresso   como   o   de   evolução   na   tecnologia   e,   considerando   que   ambos   os   processos 

32 Idem, 1995. p 60.

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decorrem  do  conhecimento   acumulado  por  gerações  passadas.  Trata­se  portanto  de  um 

conhecimento   de   massas,   ou   da   Inteligência   Geral   como   proposto   por   Karl   Marx   nos 

Grundrisse33.

Alie­se a isso a própria natureza do conhecimento científico, que repousa sobre uma 

base   acumulada   de   conhecimentos   pretéritos  para   avançar   (mesmo  que   seja   negando   e 

reformulando o conhecimento do passado), a presente e crescente dificuldade para separar 

ciência de tecnologia torna­se mais espinhosa na questão das patentes.

E esta não é de maneira alguma uma percepção nova ou recente, o próprio Sir Isaac 

Newton em carta enviada ao cientista inglês Robert Hooke em 1675 (ou 1676), admitia que 

"If I have seen further, it is by standing on the shoulders of giants34", uma idéia, formulada e 

registrada  quase  500  anos  antes   (em  1159)  pelo  monge   John  de  Salisbury,   conforme  a 

citação que acompanha a epígrafe deste capítulo. 

 O que nos parece estar ocorrendo na atualidade é uma apropriação da inteligência, 

da subjetividade construída pelas sociedades. 

Seguindo   o   delineamento   teórico   proposto   pela   escola   autonomista,   pode­se 

compreender e explicitar a apropriação capitalista da subjetividade dos trabalhadores e, em 

seu desdobramento, a apropriação da subjetividade das coletividades sociais, a apropriação 

da Inteligência Geral pelo Capital. 

Como  sugerido   atrás,   o  marxismo­autonomista   refere­se  à  vertente  marxista  que 

coloca a atividade do trabalhador, o próprio trabalho como foco da análise. Assim no lugar 

de centrar­se no avanço teleológico das forças produtivas o marxismo­autonomista centra­se 

no conflito entre aqueles que produzem e aqueles que apropriam. O termo “autonomista” 

deriva da visão da autonomia do trabalhador, pois na leitura autonomista o trabalhador não 

é vítima passiva das determinações do capitalista, sendo sujeito ativo da produção, detentor 

de habilidades, motor de inovações e cooperação com as quais o capital conta. 

Nick   Whiteford   aponta   que   o   que   torna   a   análise   autonomista   particularmente 

importante “is the perspective it opens on the new forms of knowledge and communication  

33 MARX, Karl. Grundrisse: Elementos Fundamentales Para La Critica de la economia politica (Borrador)  1857­1858; Buenos Aires; Siglo XXI Argentina Editores S.A: junho 1972;34 “Se eu vi mais longe, foi por estar nos ombros de gigantes”.

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not merely as instruments of capital domination, but also as potential resources for working  

class struggle.”35 Uma interpretação subversiva da “Information Society”.

Nas últimas décadas tem havido uma crescente necessidade do Capital em dominar 

a cultura e a inteligência das massas, refletido por exemplo no surgimento de termos como 

“indústria   cultural”,  o  que   suscita  o  debate   sobre  o  poder   e  o   “direito”  do  Capital   em 

proceder a esta apropriação, pois esta parece de certa forma indébita.

A apropriação do conhecimento social encontra­se refletida no recrudescimento da 

proteção do direito autoral e das patentes, dentro de legislações que foram sucessivamente 

alteradas  nas  últimas  décadas  em diversos  países,  especialmente  aqueles  das  economias 

mais desenvolvidas, pretendendo estender e reforçar o domínio sobre idéias, cuja original 

definição de propriedade e autoria já seriam bastante contestáveis.

Para  além dos  softwares,   talvez  o  campo onde  o  conflito  das  patentes  esteja  em 

maior relevo seja a indústria farmacêutica, onde o direito às patentes esbarra em questões 

éticas   e   morais   de   toda   a   sorte.   Este   assunto,   especialmente   no   que   tange   à   indústria 

farmacêutica é recuperado pela jornalista Maria Helena Tachinardi, em seu livro A Guerra 

das Patentes, onde são retratadas as rusgas entre Brasil e EUA neste campo, mas Tachinardi 

não   limita   sua   análise   na   questão   moral   e   ética,   indo   além,   apresentando   questões 

econômicas e de política internacional:

“Os países que lideram o processo tecnológico desejam sistemas de  

propriedade  intelectual   fortes  em nível   internacional  para  compensar  as  

deficiências nos regimes de apropriação dos países que estão aumentando  

sua capacitação  tecnológica e de imitação,  e para compensar, também, a  

taxa de difusão acelerada de novas tecnologias, o que reduz o seu tempo de  

vida.

Os   países   desenvolvidos,   sobretudo   os   EUA,   consideram   vital   a  

ampliação   dos   direitos   de  propriedade   intelectual   em   escala  planetária  

porque garantiria   incentivos à   inovação  e serviria  de barreira defensiva  35 WHITHEFORD, Nick. Autonomist Marxism And The Information Society. Capital & Class, 52, p.85­95, Spring 1994.

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contra a imitação  no exterior de tecnologias desenvolvidas nacionalmente  

em seus mercados.

Os países em desenvolvimento, contudo, receiam que surja uma nova 

modalidade   de   protecionismo   tecnológico.   Carlos   Maria   Corrêa   chama 

atenção  para o fato de que os países desenvolvidos estão  empenhados em 

uma   nova   política   comercial   que   tende   a   substituir   a   promoção   do 

investimento direto ou o licenciamento de tecnologia pelo acesso direto aos  

mercados externos, incluindo a abertura forçada de alguns recalcitrantes.

Os países seguidores, que, recorde­se, são aqueles que se apropriam 

de oportunidades, estão  dificultando aos líderes na corrida tecnológica a 

possibilidade   de   apropriação.   É   o   caso   dos   países   que   estabeleceram 

reservas de mercado, como a informática no Brasil.

A inovação é uma invenção incorporada à produção. A invenção é um 

produto  essencialmente   intelectual,  enquanto  a   inovação  é  um  fenômeno 

econômico.”36

Este   recrudescimento   da   proteção   do   direito   autoral   é   um   fenômeno   mundial, 

encontrando no campo da informática exemplos emblemáticos em leis como o Sonny Bono 

Copyright Act37, lei norte americana que estendeu por vinte anos além do prazo original o 

direito  dos  autores;   a   lei  de  patentes  de  softwares  atualmente  em vias  de  aprovação na 

Europa,   que   será   uma  versão  européia  do  Digital   Millenium  Copyright  Act   (DMCA)38 

promulgado nos EUA em outubro de 1998 pelo presidente norte­americano Bill  Clinton. 

Este afã capitalista em proteger e cercear de todas as formas o acesso à cultura e tecnologia 

reverbera mesmo na periferia do Capital, primeiro com ações bastante concretas, como o 36  TACHINARDI, Maria Helena.  A Guerra das Patentes : O conflito Brasil x EUA sobre propriedade intelectual. São Paulo : Paz e Terra, 1993. p 66.37 Sonny Bono Copyrigth Act lei promulgada nos EUA em fins de 1998 com objetivo de estender a proteção do copyrigth. É por vezes referida pejorativamente como Mickey Mouse Copyrigth Act, em referência ao fato de ter “coincidentemente” impedido que personagens da  Walt Disney Company  como o  Mickey  entrassem em domínio público.38 Lei que revoga direitos históricos de técnicos e cientistas, como a legitimidade da engenharia reversa e que vai contra as diversas legislações de outras nações.

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endurecimento da política externa dos EUA contra a pirataria em outros países, que aventa 

mesmo   a   possibilidade   de   sanções   políticas   e   econômicas   contra   os   países   tidos   por 

corsários da cultura; segundo com alterações induzidas nas próprias legislações dos países 

periféricos, como no caso brasileiro, que passou a produzir legislações específicas para o 

combate a pirataria. 

Este tema não deve ser tomado de maneira superficial,  sua importância é  central 

para   o   desenvolvimento   e   perpetuação   do   conhecimento   e   da   tecnologia   e,   para   o 

desenvolvimento econômico. 

Sobre   o   predomínio   do   fator   econômico   sobre   o   desenvolvimento   tecnológico, 

podemos novamente recorrer a Basalla, que vai ainda tratar da maneira como uma certa 

invenção  ou   tecnologia  é   classificada  de  “genial”.  “Uma invenção  é  classificada como 

genial apenas se a cultura escolher colocar um grande valor associado a ela. Desta forma,  

a reputação do inventor está atrelada a valores culturais.”39 

Em busca da proteção dos direitos (e dividendos) do Capital, eleva­se a questão a 

um grau de importância tal, que se torna capaz de limitar o acesso à cultura, conseguindo 

até fazer eco mesmo dentro das instituições de ensino público, como na situação recente da 

USP40  frente ao cerceamento das cópias  xerox no Campus41. Isto obrigou a universidade a 

tomar uma posição oficial42, em um comunicado autorizando as cópias xerox, onde defende 

pura e simplesmente o cumprimento da lei e a utilização justa do material protegido, uma 

vez que até isso estava sendo perseguido.

Tachinardi, ainda em seu livro sobre o conflito de patentes Brasil/EUA observa que:

“Por trás  do discurso de que o objetivo dos direitos de propriedade 

intelectual é  o incentivo   à  invenção,  existe o real objetivo econômico de  

permitir   a   apropriação   financeira   do   conhecimento   científico,   um   bem 

39 BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 34.40 Vide: Anexos, documento I41 Vide: jornal O Estado de S. Paulo (08/03/2005 ­ Caderno 2); (04/03/2005 ­ Metrópole ­ DEIC apura a ação de  professores  em xerox);   (03/03/2005  ­  Metrópole   ­  Polícia   investiga  comércio  de  cópias  de   livros  em universidade);   (02/03/2005  ­  Metrópole  ­  Faculdades  mantêm xerox dentro das  bibliotecas   /  Metrópole  ­ Bibliotecas oferecem xerox); (21/02/2005 ­ Índice); Jornal da Tarde (03/02/2005).42 Vide: Anexos, documento II

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público,   intangível,   mas   que   gera   vantagens   comparativas   e   aumenta   a  

competitividade   dos   países,   além   de   lhes   permitir   a   penetração   nos  

mercados e o seu controle e reduzir as incertezas associadas à inovação, ao  

grau de obsolescência dos produtos.

O   sistema   de   propriedade   intelectual   é,   portanto,   um   regime   de  

apropriação que pode ser mais ou menos abrangente, mais ou menos rígido,  

dependendo dos países.”43

A apropriação do conhecimento por parte do Capital já havia, como dissemos, sido 

notada por Marx, nos Grundrisse, que constituem os fundamentos do pensamento marxista, 

tendo sido publicados pela primeira vez entre 1939 e 1941, na União Soviética com o titulo: 

Grundrisse der Kritik der politischen Ökonomie (Rohentwurf) 1857­1858. Trata­se de uma 

coletânea  de  obras   inéditas  até  então,  que  para Marx tinham a  característica  de  esboço, 

utilizadas   pelo   autor   como   forma   de   organização   de   suas   idéias,   sem   que   houvesse   a 

intenção   manifesta   de   sua   publicação.   Estes   “cadernos”   de   Marx   devem   portanto   ser 

considerados em seu contexto, não representando o pensamento mais elaborado do autor, 

mas sim uma fase pretérita,  embrionária.  Feita esta ressalva,  sobre tratar­se de um texto 

ainda   em   formulação   pelo   autor,   podemos   considerar,   sem   sombra   de   dúvida,   que   os 

Grundrisse  estabeleceram as bases para a posterior redação do Capital,  onde muitos dos 

conceitos propostos serão retomados com maior profundidade.

Nos  Grundrisse  Marx   estabelece  bases  para   a   compreensão  do  desenvolvimento 

tecnológico, sua evolução, e também coloca de maneira clara como ocorre uma forma de 

apropriação que transcende a tradicional apropriação do trabalho, passando a existir uma 

apropriação do poder criador do trabalhador. Na extensa e detalhada introdução da edição 

argentina que consultamos, estas questões estão claramente colocadas: 

“Las fuerzas de producción son en sí mismas un producto histórico y  

social   y   para   Marx   el   proceso   productivo   es   un   proceso   social.   Es  

43  TACHINARDI, Maria Helena.  A Guerra das Patentes : O conflito Brasil x EUA sobre propriedade intelectual. São Paulo : Paz e Terra, 1993. p38.

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necessario  enfatizar  este  punto  con el   fin  de  poner  en  evidencia  que  el  

importante papel que Marx asigna al desarrollo de las fuerzas productivas  

materiales   bajo   el   capitalismo   no   lo   convierte   en   un   determinista 

tecnológico.  Por   el   contrario,   no   es   la   tecnologia   la   que   obliga   al  

capitalista a acumular, sino la necessidad de acumular la que lo obliga a  

desarrollar   los   poderes   de   la   tecnología.  La   base   del   processo   de  

acumulación,  del  proceso por  medio del  cual   las  fuerzas productivas  se 

fortalecem, es la extracción de plusvalía de la fuerza de trabajo. La fuerza  

de producción es la fuerza de explotación.

Es   evidente   entonces  que   la   dicotomía   formulada  por  Marx   en   el  

Prefacio   es   idéntica  a  que  existe   entre   los   dos  processos  perfectamente 

diferenciados que Marx identifica en los Grundrisse como fundamentales  

para la reprodución capitalista: por una parte, la produción consiste en un 

acto de cambio y por la otra, consiste en un acto que es precisamente lo  

oposto  al   cambio.  Por  un   lado,   la  produción es  un   simple  cambio  de  

equivalentes y por el otro, es la apropriación violenta del poder creador 

del obrero.”44 

Diante das propostas de Marx sobre a apropriação do poder criador do trabalhador e 

de George Basalla sobre o caráter evolucionário da tecnologia, onde um elemento criado 

depende da pré­existência de outro, já  em uso corrente, começamos a nos aproximar   da 

tese central deste trabalho, a de que possa existir um antagonismo entre a idéia de progresso 

no   desenvolvimento   histórico   da   informática   e   o   fenômeno   contemporâneo   do 

recrudescimento da defesa das patentes de  softwares. Ou melhor formulando, a legislação 

de   patentes   de  software  tende   a   emperrar   ou   atrasar   a   evolução   deste   ramo   do 

conhecimento.

44  NICOLAUS,   Martin.  El   Marx   Desconocido  (Prefácio).   Em   MARX,  Karl.  Grundrisse:   Elementos  Fundamentales Para La Critica de la economia politica (Borrador) 1857­1858; Buenos Aires; Siglo XXI Argentina Editores S.A: junho 1972; p.30 (o grifo é nosso).

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Com os argumentos até  aqui colocados podemos constatar dois movimentos, 1) a 

evolução da tecnologia baseada no conhecimento geral acumulado, e 2) a apropriação deste 

conhecimento pelo Capital, que se apropria da Inteligência Geral e então procura cercear 

seu acesso pela via legislativa.

A   hipótese   aqui   é   que   estes   dois   movimentos   fornecem   o   combustível   para   os 

movimentos contrários, que buscam tanto romper com as amarras legislativas como libertar 

a   tecnologia   (de  softwares)   do   domínio   exclusivo   do   Capital,   re­transferindo   sua 

propriedade para a comunidade. Casos como o dos movimentos  Open Source  e  Creative 

Commons45 parecem emblemáticos desta resistência e, no ramo dos sistemas operacionais, é 

o  GNU/Linux  quem  melhor   representa   esta   tendência,   politicamente   confusa,  mas   sem 

dúvida revolucionária46.

Aqui cabe a abertura de um pequeno parênteses para explicar o conceito do  Open 

Source.

A  definição  de  Open Source  foi  primeiro  elaborada  por  Bruce  Perens47,  quando 

escreveu o esboço do documento "The Debian Free Software Guidelines", que foi refinado 

com os comentários da comunidade de desenvolvedores do Debian, ao longo de um mês de 

debates   por   e­mail   em   Junho   de   1997.   Perens   terminou   por   remover   as   definições 

45 Creative Commons é uma ONG sem fins lucrativos fundada em 2001 com o seguinte objetivo:  "Thus, a  single goal unites Creative Commons current and future projects: to build a layer of reasonable, flexible  copyright in the face of increasingly restrictive default rules."Em dezembro de 2002 o grupo lançou uma série de licenças livres para o uso público, permitindo que uma obra intelectual e/ou artística seja licenciada em termos menos restritivos. Declaradamente o conceito por trás da  Creative   Commons  veio   do  Software  Livre:  "Taking   inspiration   in   part   from   the   Free   Software  Foundation's GNU General Public License (GNU GPL)". Fonte: http://creativecommons.org/ O CTS, Centro de Tecnologia e  Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro, dirige o projeto Creative Commons no Brasil, garantindo que as adaptações e traduções das licenças estejam em total acordo com a legislação brasileira. Fonte: http://www.direitorio.fgv.br/cts/46 Aspecto que pretendemos elaborar e aprofundar com maior ênfase à frente.47  Bruce Perens, antigo líder do projeto Debian (uma das mais antigas e tradicionais distribuições Linux, reconhecida como a que mais  respeita  os  princípios  do  Software  Livre)  é  co­foundador da Open Source Initiative e diversas outras instituições de defesa dos  Softwares  Livres. Também trabalhou por 20 anos na indústria de computação gráfica, 12 deles na Pixar Animation Studios, onde participou dos filmes Vida de Inseto e Toy Story II.

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específicas ao Debian e criou a "Open Source Definition"48, hoje mantida e divulgada pela 

Open Source Initiative49

Esta definição, que busca esclarecer se um determinado  software  é  ou não  Open 

Source, condiciona a observação de algumas premissas para a avaliação de uma licença de 

software e estas premissas não se referem exclusivamente ao acesso ao código fonte, como 

se poderia imaginar.

As principais características de uma licença Open Source50 são: 

● A liberdade de redistribuição, permitindo que o software seja dado 

ou vendido livremente, sem pagamento de royalties;

● A  necessidade  da  distribuição  de  um  programa   incluir  o  código 

fonte;

● Permissão para criação de produtos derivados a serem distribuídos 

na mesma forma de licenciamento;

● Não discriminar qualquer pessoa, grupo, ou finalidade de uso;

● Ser tecnologicamente neutra.

Com esta explicação fecha­se o parênteses para a retomada da linhas de 

raciocínio anterior.

Ainda   mais   à   frente   em   seu   texto,   quando   George   Basalla   pretende   definir   os 

mecanismos   psicológicos   que   motivam   a   inovação   (propondo   três   categorias:   sonhos 

tecnológicos, máquinas impossíveis e fantasias populares), volta a mencionar patentes, ao 

tratar dos sonhos tecnológicos, onde afirma:

“Patentes   compõem o   segundo  grupo  de   sonhos   tecnológicos.  Sua  

inclusão   aqui   pede   alguma   explicação   pois   patentes   são   usualmente  

concedidas   para   inovações   que   passaram   pelo   cuidadoso   escrutínio   de  

48  Open Source pode ser traduzido como Código Aberto, mas no Brasil tem sido em geral referido como Software Livre.49  Open Source Initiative (OSI)  é  uma ONG sem fins   lucrativos  dedicada à  manutenção e  promoção da definição do Open Source. Fonte: http://www.opensource.org/50 Para o texto integral vide anexos, documeto VI.

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examinadores  e  não  são  esquemas  fantasiosos.  Tomadas como um  todo,  

contudo, patentes são melhor representantes da potencialidade tecnológica  

do que da tecnologia propriamente dita.51”

É   justamente   a   possibilidade   de   registrar   e   apropriar   idéias   não   realizadas   que 

visualizamos como contradição na relação entre a necessidade do capital em apropriar­se da 

Inteligência Geral e ao mesmo tempo depender da evolução tecnológica para atender sua 

necessidade  de  aprofundar  a  acumulação.  Toda  a  questão pode  então ser  apreendida  no 

paradoxo da necessidade de um continuum de idéias, ou relações, ou mesmo de tecnologia 

para o desenvolvimento da  tecnologia e  a   imposição de propriedades  fragmentando este 

mesmo continuum.

E parece ser desta contradição que emergem os movimentos de resistência, de que 

trataremos à frente. É ainda irônico considerar que o esboço das resistências à apropriação 

da Inteligência Geral parece ser mais sólido no competitivo mercado de softwares, ponta de 

lança do moderno capitalismo financeiro, que só pôde se globalizar com a constituição de 

redes  informacionais  de   telecomunicações52,   permitindo   que   o   tempo   do   capital 

transcendesse   o   espaço   físico,   unindo   mercados   em   todos   os   fusos.   Pois   se   só   com   a 

constituição das redes de comunicação o capitalismo pôde efetivamente se globalizar53  é 

esta mesma rede o fator determinante para a existência dos movimentos contrários como 

Open Source,  Creative Commons e mesmo das redes alternativas de mídia e notícias, que 

não poderiam existir e se articular sem as modernas via de comunicação por computador.

51 BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 69.52 MARQUES, Ivan da Costa. O Brasil e a abertura dos mercados: o trabalho em questão.  Rio de Janeiro; Contraponto; 2002.53 CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: os negócios e a sociedade; Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003

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 3. Uma História de softwares e sistemas operacionais

"Não havendo testemunhas, e se as houve não consta que tenham sido chamadas a estes autos para 

nos relatarem o que se passou, é compreensível que alguém pergunte como foi possível saber que estas 

coisas sucederam assim e não doutra maneira, a resposta a dar é a de que todos os relatos são como os da 

criação do universo, ninguém lá esteve, ninguém assistiu, mas toda a gente sabe como aconteceu."

José Saramago ­ Ensaio sobre a cegueira ­ pg. 253

 3.1. Do hardware ao software

Uma breve   reconstituição da  história  da  computação e  da  micro   informática  são 

obrigatórias antes que se introduza o problema proposto neste texto. A seguir traçamos o 

histórico   do   computador,   do   desenvolvimento   deste   ramo   da   tecnologia   moderna   e 

principalmente de seu espírito fundante nos primeiros anos da informática.

Entendendo um computador  dentro  da  definição  já  apresentada  de uma máquina 

capaz de processar instruções e apresentar um resultado, poderemos dividi­los para efeitos 

didáticos e práticos em 2 tipos: analógicos e digitais.

O senso comum tende a vislumbrar na presença ou ausência de chips a diferença 

entre um computador digital e um analógico, mas esta diferença é na verdade determinada 

pelo princípio que rege seu funcionamento para obter os resultados das contas processadas.

Os   computadores   analógicos,   que   podem   ser   máquinas   estritamente   mecânicas, 

eletro­mecânicas ou até eletrônicas são diferentes na concepção dos computadores digitais 

que utilizamos hoje em dia, por não responderem a uma lógica binária discreta (em geral 

binária), podendo conceitualmente trabalhar com um espectro de possibilidades maior ou 

tendendo ao infinito. Nossos computadores atuais baseiam­se na lógica digital, ou seja dos 

dígitos, no caso binário o zero e um, oferecendo apenas duas possibilidades de resposta: 

não e sim, ou negativo e positivo, ou 0 e 1.

Considerados de maneira ampla, computadores são máquinas capazes de apresentar 

resultados   de   contas54,   e   pensando   na   história   das   máquinas   mecânicas   que   executam 

54 Na definição atual se diria máquinas capazes de fazer contas e armazenar dados, de forma ordenada.

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cálculos  podemos,   com  alguma   elasticidade   no   conceito,   citar   o   ábaco,   a   Pascalina  de 

Blaise Pascal,  a Máquina de Diferenças do matemático Charles Babbage e os protótipos 

frustrados de sua evolução,  a Máquina de Diferenças 2 e  a Máquina Analítica,   todas de 

certa forma precursoras dos atuais computadores.

Os   computadores   mecânicos   apoiavam­se   em   um   intrincado   esquema   de 

movimentação   de   engrenagens,   tendo   muitas   vezes   que   substituir   peças   para   executar 

contas diversas como somas, multiplicações e subtrações. Já  os computadores eletrônicos 

basearam   seu   funcionamento   inicialmente   em   válvulas,   mais   tarde   substituídos   por 

dispositivos semi­condutores.

Em 1944  foi  construído o  Mark  I,  na  Universidade  de  Harvard,  um computador 

baseado em relês e princípios eletro­mecânicos, projetado pela equipe de Howard H. Aiken.

Entre os anos de 1946 e 1947 foi construído o famoso ENIAC na Universidade da 

Pensilvânia. ENIAC (ou  Eletronic Integrator And Calculator) foi efetivamente o primeiro 

computador eletrônico, embora seu funcionamento ainda estivesse baseado em válvulas e 

não semi­condutores.

Desta   forma,   com   todas   as   suas   válvulas,   o   ENIAC   é   considerado   o   primeiro 

computador eletrônico, uma incrível máquina capaz de executar diferentes operações sem a 

necessidade  de   re­estruturar   sua   configuração.   Isso  permitiu   que   as   instruções   a   serem 

executadas fossem previamente preparadas, encadeadas e armazenadas, dando origem aos 

softwares.

O surgimento dos computadores, o momento de sua passagem ao “modo digital”, a 

história   de   seu   desenvolvimento,   e   a   evolução   do  hardware  encontram­se   hoje 

extensivamente documentados e têm larga bibliografia disponível, contemplando inclusive 

o caso brasileiro55, de forma que reconstituir novamente a trajetória do hardware não seria 

pertinente  a  esta  pesquisa.  Também escapa  ao escopo proposto  nesta  análise   redesenhar 

toda a  trajetória da micro­informática até  a  criação dos primeiros sistemas operacionais, 

55  Cf.  SANTOS  FILHO,  Gildo  Magalhães.  Um  bit   auriverde:   Caminhos  da   tecnologia   e   do  projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo.

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outro tema que também conta com bom numero de trabalhos publicados, contudo cumpre 

registrar que a relevância dos softwares foi logo notada. Gildo Magalhães destaca que:

“A programação cedo se revelou como o ponto sensível sem o qual as  

imensas  máquinas   que   foram   os  primeiros   computadores   não  poderiam 

operar com eficiência. Um dos primeiros programas a serem construídos foi  

o que traduzia linguagem digital (binária) das máquinas para linguagem 

mnemônica,   de   fácil   manipulação.   surgiram   assim   as   linguagens   ditas  

“científicas”:  o  FORTRAN (Formula  Translator)   foi   inventado por  John  

Backus   entre   1953   –   56;   o   LISP   (List   Processing)   foi   inventado 

especificamente para aplicação aos problemas de “inteligência artificial”,  

em  1956;   o   COBOL   (Common   Business  Oriented   Language)   e   ALGOL 

(Algorithimic   Language)   são   de   1960,   enquanto   que   o   PL/1   (de  

“Programming Language”) é de 1964, mesmo ano do PASCAL; o BASIC 

(Beginner's   All   Purpose   Symbolic   Instruction   Code)   é   da   década   de  

1970.”56

Esta relevância faz com que o acesso ao  código fonte,  a  seqüência  de  instruções 

lógicas codificadas pelos programadores de forma inteligível que é depois compilada ­ ou 

transformada em linguagem de máquina ­ gerando os  softwares ou programas necessários 

para operar o computador ou para permitir que ele execute suas inúmeras funções, se torne 

cada vez maior.

Assim   iniciaremos   a   história   contada   neste   texto   na   década   de   1970,   com   a 

importância dos  softwares  já  solidamente estabelecida e após a criação e divulgação das 

principais linguagens de programação, 

A   IBM,   um   tradicional   fornecedor   de   máquinas   para   escritório   anterior   ao 

surgimento dos computadores pessoais, vinha desde meados dos anos 50 comercializando 

software  e  hardware  conjuntamente, em um modelo de negócios baseado na  locação de 

equipamentos para empresas, algo que mudaria no final dos anos 60. 

56 Idem, 1994, p. 55

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“A IBM desvinculou seus  preços  e   fornecimentos  de  software e  de  

serviços  em 1968,  uma decisão  que   foi   encorajada  pela  ameaça de  um  

processo antitruste.  A “dissociação”  do software por parte  do principal  

fornecedor   de   hardware   (...)   abriu   oportunidades   para   a   expansão   de  

vendedores de software independentes”.57 

Esta posição aliada ao surgimento do micro­computador, criação atribuída a David 

Ahl quando trabalhava na Digital – que ignorou o invento dado sua capacidade reduzida – 

abriu   espaço   para   um   novo   tipo   de   desenvolvimento   na   indústria,   permitindo   que 

florescesse a “cultura” dos microcomputadores58,  algo muito importante para a discussão 

sobre a propriedade dos softwares e das idéias.

“O que as grandes empresas (inclusive a IBM) não perceberam é que  

estava se abrindo a oportunidade para a apropriação  individual de uma 

máquina que até então era o privilégio apenas das empresas, devido ao seu  

alto custo. No ambiente glorificador do mito individualista corporificado 

pelo movimento “hippie”, a Califórnia dos anos 70 sediaria também os 

primeiros   fabricantes  de  micro­computadores,   como Apple,  Commodore,  

etc. Tardiamente tendo se dado conta do erro estratégico cometido, a IBM 

começou a recuperar o terreno perdido, lançando seu próprio modelo de  

micro­computador, chamado de “computador pessoal” (PC, de “personal 

computer”).”59

A   importância   atribuída   aqui   ao   ano   de   1970   deve­se   aos   desenvolvimentos 

alcançados pela  Xerox Corporation, através de seu centro de pesquisas em Palo Alto na 

Califórnia,  (o famoso PARC,60  vizinho da Universidade de Stanford),  onde investigações 

57  MOWERY, David C., ROSENBERG, Nathan.  Trajetórias da Inovação  : A Mudança Tecnológica nos Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005. p. 17258  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 5859 Idem, 1994, p. 5860 PARC = Palo Alto Research Center

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sobre “interfaces de usuário” focadas no desenvolvimento de novos produtos, chegaram nas 

fronteiras mais perceptíveis de nosso objeto de estudo.

O   PARC,   desenvolveu   uma   estação   de   trabalho   gráfica,   algo   inédito   até   então, 

denominada  Xerox  Star,   onde  o   sistema  operacional   e   a   interface   com  o  usuário   eram 

inteiramente gráficas, baseadas em metáforas visuais e ícones. Foram destas pesquisas do 

PARC   que   surgiram   elementos   centrais   nos   sistemas   operacionais   atuais   (e   em   outros 

diversos   tipos   de  softwares),   itens   como  o  mouse61,   as   interfaces  de   janelas,   os   menus 

"drop­down" e os ícones. O primeiro resultado prático destas pesquisas surgiu com o “Alto” 

(1972) uma máquina que não chegou a ser comercializada, e já em 1981 estava disponível o 

“Star 8010 workstation” a primeira máquina comercializada a contar com um mouse e uma 

interface gráfica. 

 Comercialmente, o projeto foi mal recebido, especialmente por seu elevado custo, 

mas serviu de base e inspiração para que a Apple Computer, fundada por Steve Wozniak e 

Steven   Jobs,   pudesse   desenvolver   seu   novo   PC,   um   microcomputador   chamado   LISA 

(Local Integrated System Architecture), lançado em 1983.

A Apple já havia lançado outros computadores, mas o LISA contava então com 16 

bits,   e   inovava   com   um   sistema   operacional   de   interface   gráfica,   ou   seja,   baseado   em 

windows (janelas), dois itens inovadores que estavam pela primeira vez disponíveis em um 

computador pessoal com preço mais acessível. 

Esta  geração  de  máquinas  da  Apple   também  não   foi  um  grande   sucesso,  muito 

embora   tenha  sido  comercializada  até  1985  com o  nome de  Macintosh  XL,  mas   teve  o 

mérito de abrir caminho para a geração seguinte, os agora denominados  Apple Macintosh 

de   1984,   uma   geração   de   microcomputadores   que  penetrou   rapidamente   o   mercado 

acadêmico dos  EUA,  tendo também boa aceitação na automação de escritórios.  Foi  um 

sucesso de vendas,  até  hoje   lembrado pela   indústria  como um dos mais   revolucionários 

microcomputadores de todos os tempos, pois trazia a integração de soluções gráficas, aliada 

a potência e um mouse.

61 De fato o mouse fora oficialmente apresentado em uma demonstração pública em 9 de dezembro de 1968 por Douglas C. Englebart e sua equipe do Satnford Research Institute, um projeto em que vinham trabalhando desde 1962. Mais detalhes em: <http://sloan.stanford.edu/mousesite/1968Demo.html>

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O   grande   sucesso   comercial   de   seu  hardware  encontrou   a   jovem   Apple   sem 

capacidade  para  atender  à  demanda  por  softwares,  assim a  empresa  precisou   recorrer  a 

desenvolvedores   externos,   favorecendo   o   cenário   para   que   empresas   especializadas   em 

software  pudessem surgir e/ou crescer com a  indústria;  pode­se pensar  em nomes como 

Lotus, Novell e  Microsoft como empresas que foram beneficiadas por este momento.

Mas   apesar  da  demanda  por   computadores  Apple,   foi   a   IBM  que  obteve  maior 

sucesso na forma de comercialização e fabricação de seu produto, o IBM­PC, aumentando 

muito   sua   participação   no   mercado,   apesar   de   rodar   um   sistema   operacional   que   em 

comparação com o do Macintosh poderia, já naquela época, ser considerado antiquado62. 

O sistema operacional dos IBM PC era o MS­DOS63 da Microsoft, que não contava 

com   interface   gráfica   e   tinha   todos   os   seus   comandos   controlados   exclusivamente   por 

inputs de teclado; mais à frente, ainda neste capitulo será narrada a história do MS­DOS.

“Tanto a entrada de fornecedores independentes de software quanto o  

crescimento   até   a   dominância   da   arquitetura   do   IBM­PC   estiveram  

relacionadas com a decisão  da IBM de obter a maioria dos componentes  

para   seu   microcomputador   de   fornecedores   externos,   incluindo   a   Intel  

(fornecedora do microprocessador) e a Microsoft (fornecedora do sistema 

operacional do PC, MS­DOS), sem forçá­los a restringir as vendas desses  

componentes a outros produtores”64

Apesar da tecnologia defasada, em favor da IBM pesavam os canais de distribuição 

já bastante estabelecidos, representantes comerciais, uma campanha de marketing  e a sua 

reputação   no   mercado.   Todos   fatores   que   aliados   a   um   pesado   investimento   na 

reestruturação  das   linhas  de  produção  e   canais  de  distribuição   fizeram­na   sobrepujar   a 

Apple   e   os   demais   concorrentes   com   relativa   rapidez,   assim,  “para   concorrer   com a  

florescente Apple, a IBM vendeu seu PC nas mais conhecidas lojas de departamento, como  62 Esta colocação parte da constatação de que um sistema baseado em interfaces amigáveis é mais moderno que um sistema baseado exclusivamente em linha de comando, permitindo por exemplo uma melhor curva de aprendizagem dos usuários.63 Sigla de Microsoft Disk Operational System64  MOWERY, David C., ROSENBERG, Nathan.  Trajetórias da Inovação  : A Mudança Tecnológica nos Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005. p. 173.

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Sears e Macy's, o que foi fundamental para transformar o computador em nova mercadoria 

de consumo”65. 

Este cenário fez com que em poucos anos, a participação do Macintosh no mercado 

mundial de  desktops declinasse, de seu auge em 30 %, para os menos de 2 %, estimados 

hoje em dia. A crise que se instalou com a sucessiva perda de mercado dos computadores 

Apple para os PCs da IBM fez com que a companhia afastasse seu executivo fundador, 

Steven Jobs em 1985, assustando os leais usuários do “Mac”. Um novo presidente, John 

Sculley,   que   vinha   da   Pepsi­Cola   trazendo   na   bagagem   novas   técnicas   de  marketing, 

conseguiu, por um período, fazer a empresa reagir, contudo, para esta pesquisa o interesse 

por   Sculley   dar­se­á   mais   à   frente,   como   coadjuvante   de   um   significativo   detalhe   no 

desenvolvimento do Windows.66

 3.2. Do nascimento da Micro­soft67 à conquista do Desktop

Fundada em 1975 por William H. Gates III e Paul Allen – dois estudantes que se 

conheceram por partilharem um  hobby  em comum: programar o computador PDP­10 da 

Digital Equipment Corporation – a Microsoft viria a se tornar um dos gigantes do setor de 

informática.

Foi neste ano (1975) que a revista Popular Electronics68 publicou uma reportagem de 

capa sobre o Altair 8800, considerado o primeiro computador pessoal. Reza a lenda que foi 

este artigo que empolgou Gates e Allen a desenvolverem a primeira versão da linguagem de 

programação conhecida como BASIC, pensada para funcionar no Altair.

A   fabricante   do   Altair,   Micro   Instrumentation   and   Telemetry   Systems   (MITS), 

comprou a linguagem da dupla, fornecendo­lhes assim o capital utilizado na fundação da 

Microsoft   em   Albuquerque,   Novo   México.   A   nova   empresa   tinha   como   objetivo 

65  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 5866 KAWASAKI, Guy. O Jeito Macintosh. São Paulo: Callis, 1993.67 O nome da Microsoft era originalmente escrito desta forma: Micro­soft.68 Janeiro de 1975, Popular Electronics Magazine

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desenvolver novas versões de BASIC para outras companhias do setor. A Apple Computer, 

fabricante   do   Applle   II,   a   Commodore,   fabricante   do     PET,   e   a   Tandy   Corporation, 

fabicante do Radio Shack TRS­80, foram alguns dos primeiros clientes da Microsoft.

Em   1977   a   Microsoft   lançou   no   mercado   seu   segundo   produto,   o   Microsoft 

FORTRAN69,  outra   linguagem de  programação,  e   lançou  também versões  da   linguagem 

BASIC para os microprocesadores 8080 e 8086. Gates e Allen mudaram a companhia para 

Bellevue, Washington em 1979, estando agora já bem próximos de Seattle (a cidade natal 

de ambos). A mudança definitiva para Redmond, cidade próxima de Bellevue e atual sede 

da empresa, aconteceria em 1986.

Mas o que determinaria o destino da Microsoft foi o contrato com a IBM, em 1980, 

para escrever um sistema operacional para o IBM PC, microcomputador que seria lançado 

no ano seguinte para concorrer com a Apple e outras empresas do segmento. 

“A   decisão   de   comprar   o   software   do   sistema   operacional   da  

Microsoft foi guiada por dois fatores. O desenvolvimento do IBM­PC foi um 

“programa   de   choque”   empreendido   por   uma   unidade   de   negócios  

autônoma que tinha uma equipe ou tempo insuficientes para assegurar o  

desenvolvimento interno de uma família de componentes ou de um único  

sistema operacional. Igualmente importante, entretanto, foi a preocupação  

da IBM de que o PC pudesse operar um grande número de aplicações e  

outros programas desenvolvidos (...)”70 

Com o pouco tempo disponível para realizar a tarefa, a Microsoft adotou aquela que 

seria uma de suas principais práticas nos anos vindouros sempre que quisesse entrar em um 

mercado que não fosse de sua expertise: comprou a solução de outra empresa. 

69 O FORTRAN ou Formula Translator já era empregado em 1955 no IBM 704, tendo sido inventado por John Backus em 1953.70  MOWERY, David C., ROSENBERG, Nathan.  Trajetórias da Inovação  : A Mudança Tecnológica nos Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005. p. 173­174.

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A aquisição foi o QDOS (Quick and Dirty Operating System) de Tim Paterson, um 

programador de Seattle, por US$ 50.000,00; este sistema seria rebatizado para MS­DOS ou 

Microsoft Disk Operational System.

Na medida que as vendas do MS­DOS disparavam, a Microsoft passou a ampliar 

seu   leque   de   produtos,   desenvolvendo   novos   ou   portando   uma   série   de   aplicativos 

comerciais   para   serem   utilizados   nos   IBM­PC.   Em   1982   lançou  softwares  como   o 

Multiplan,   um  programa  de  planilha  de   cálculo,   e  no   ano   seguinte  um  processador  de 

textos, denominado MS­Word.

Conforme apresentado anteriormente a Microsoft foi uma das primeiras companhias 

do   setor   que   se   dedicou   a   desenvolver   aplicações   para   o  Macintosh,   o   já   mencionado 

microcomputador lançado com grande sucesso pela Apple em 1984. Inicialmente a empresa 

obteve um grande êxito de venda em programas para Macintosh como o Word (1983) que 

fora   escrito   originalmente   para   os   IBM/PC   e   portado   em   1984   para   os   Macintosh,   o 

Multiplan,   um  software  de   planilhas   para   CP/M   (um   sistema   operacional   da   Digital 

Research), mais tarde portado para MS­DOS e Macintosh.

No ambiente do MS­DOS o Multiplan foi quase totalmente obliterado pela famosa 

planilha  de  cálculos  Lotus  1­2­3,  da  Lotus  Development  Corporation  e  mesmo o  Word 

passou   a   enfrentar   forte   competição   de   diversos   concorrentes   como   WordStar   e 

WordPerfect.   Porém   de   posse   do   sistema   operacional   que   viria   a   se   tornar   o   sistema 

operacional  de  facto  dos  microcomputadores,   em pouco   tempo  a  Microsoft   conseguiria 

eliminar ou absorver a concorrência em quase todas as frentes.

Para ela persistia a necessidade de “evoluir” o MS­DOS até o nível do sistema dos 

Macintosh, agregando a interface gráfica ao sistema, o que traz Sculley de volta à  cena. 

Além de promover a recuperação nas vendas de computadores Macintosh, o executivo John 

Sculley   da   Apple,   deixou   outra   importante   herança   durante   sua   temporada   à   frente   da 

companhia. Foi Sulley quem firmou um acordo, autorizando a Microsoft, de Bill Gates a 

utilizar   a   interface   gráfica   do   sistema   operacional   Macintosh   no   desenvolvimento   do 

software que viria a ser batizado como Windows 1.0, lançado em 1985.

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O  Windows  conseguira   se   tornar  viável  no   final  da  década  de  1980,   sendo  não 

exatamente um sistema operacional, mas uma interface gráfica para a utilização do MS­

DOS71,  passo necessário  no  rompimento de  uma das  principais  barreiras  à  adoção mais 

generalizada dos PCs, que careciam de um ambiente  amigável, que não exigisse do usuário 

comandos escritos, algo, como sabemos, há muito disponível no Macintosh.

Com o Windows era possível ampliar (ou tornar mais acessíveis) as funcionalidades 

do   MS­DOS   e   incorporar,   pela   primeira   vez   às   máquinas   IBM­PC   com   este   sistema 

operacional uma interface gráfica, simplificando o trabalho do usuário.

Como o contrato da Microsoft com a IBM permitia­lhe, de forma expressa, vender 

seu   sistema   operacional   para   outras   empresas   e   fabricantes,   a   Microsoft   cresceu 

praticamente junto com o próprio mercado de computadores pessoais. Em 1984 ela já havia 

licenciado   seu   MS­DOS   para   mais   de   200   fabricantes   de   equipamentos   e,   assim,   seu 

sistema operacional se converteu no mais utilizado entre todos os PCs; alie­se a isso o fato 

de que para tornar o MS­DOS mais amigável era necessário adquirir também o Windows 

1.0 (1985) e temos o cenário que proporcionou à empresa um crescimento vertiginoso na 

década de 1980. 

O   ano   de   1987   testemunhou   o   lançamento   do   Windows   2.0,   que   melhorava   o 

rendimento da máquina e oferecia um novo visual, com mais cores. Três anos mais tarde, 

uma nova versão, o Windows 3.0, que foi seguido pelo Windows 3.1 e 3.11 (1992). Estas 

versões,   que   já   vinham   pré­instaladas   na   maioria   dos   equipamentos   converteram­se 

rapidamente   nos   sistemas   operacionais   mais   utilizados   do   mundo,   assim,   em   1990   a 

Microsoft   já  era a empresa líder de programas para computadores pessoais.  O Windows 

3.11 que agregava capacidades de rede ao sistema deu início à derrocada de empresas como 

Novell e Lantastic que produziam sistemas operacionais focados em redes corporativas de 

computadores.

Para   fazermos   curta   uma   história   longa,   reproduzimos   abaixo   um   trecho   da 

reportagem "The Gates Operating System", publicada na revista TIME:

71 Para rodar o Windows 1.0 era necessário ter instalado no computador o MS­DOS 2.0 (no disco rígido) e um mínimo de 256 KB de RAM.

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"Logo depois que Gates apresentou seu programa Windows 3.0 em  

1990, a indústria de softwares estava se entregando. Mais de 60 milhões de 

cópias do programa Windows haviam sido vendidas, o que estabeleceu o  

sistema operacional da Microsoft como o software padrão dos PCs e deixou  

companhias como a Lotus e WordPerfect incomunicáveis (fora do padrão)  

pois elas vinham criando aplicações para o sistema da IBM, o OS/2. Seis  

anos após o lançamento do Windows a Microsoft domina os mercados de  

processadores de textos e planilhas de cálculo."72

Este caminho levou a Microsoft a consolidar seu domínio mundial no campo dos 

sistemas operacionais para computadores pessoais (PCs)  e  conseguir  assim uma enorme 

capacidade de fundos e penetração em diversos outros segmentos. A base deste domínio da 

Microsoft estava então estabelecida: o controle sobre o sistema operacional e o conseqüente 

controle sobre os softwares de escritório como planilhas e processadores de texto. 

A   posição   da   Microsoft   quando   se   consolida   como   líder   do   mercado   de   PCs, 

coincide com as acusações de práticas desleais e/ou monopolistas praticadas pela empresa. 

A primeira acontece em 1990, quando a FTC73  inicia uma investigação sobre a Microsoft 

por supostas práticas contrárias à livre concorrência, mas sendo incapaz de determinar uma 

sentença   (positiva   ou   negativa)   a   FTC   abandona   o   caso   em   1993,   sendo   o   mesmo 

continuado pelo Departamento de Justiça norte­americano.

Em 1994 a Microsoft e o Departamento de Justiça firmaram um acordo em que a 

Microsoft   deveria   abandonar   práticas   que   foram   consideradas   abusivas,   modificando   a 

forma   de   vender   e   conceder   licenças   de   seus   sistemas   operacionais   aos   fabricantes   de 

computadores   (OEM),   e   impedindo   que   fossem   feitos   contratos   que   exigissem   a 

exclusividade de instalação do Windows. O acordo também impedia a Microsoft de celebrar 

contratos de confidencialidade (NDAs) com outros desenvolvedores de software, e impedia 

que     a   Microsoft   exigisse   de   seus   parceiros   a   assinatura   de   qualquer   contrato   de 

confidencialidade que os proibisse de desenvolver software para outras plataformas.

72 The Gates Operating System; TIME; JANUARY 13, 1997 VOL. 149 NO. 2; USA.73 Federal Trade Commission, ou  Comissão Federal do Comércio

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Em 1991 a Microsoft e a IBM encerraram uma década de parceria, quando a IBM, 

apercebendo­se das  dimensões  do mercado de  softwares,  e  da  centralidade dos  sistemas 

operacionais   neste   mercado,   decidiu   dar   seqüência   a   um   antigo   projeto   que   tinha   em 

comum  com  a  Microsoft,   o   sistema  operacional  OS/2   (lançado  no   mercado  em  1987). 

Defasado o OS/2 Warp, segunda versão do OS/2, este não encontrou espaço e nunca chegou 

a ser um real concorrente para o Windows nos desktops.

O efetivo domínio da Microsoft nas redes corporativas aconteceria apenas com o 

lançamento do Windows NT em 1993, seu primeiro sistema multitarefa e multiusuário de 

32  bits.   O   Windows   NT   foi   um   lançamento   de   sistema   operacional   especialmente 

desenhado  para  ambientes  corporativos,  onde   foi   introduzida  uma  Nova  Tecnologia74  de 

controle de arquivos no disco, chamada NTFS que permitiu um SO semelhante aos UNIX, 

com controle de usuários e permissões de leitura e gravação.

Também em 1993 a  Apple perdeu um processo movido contra  a  Microsoft  onde 

acusava a empresa de violação do direito autoral por haver copiado o desenho da interface 

gráfica do Macintosh.

Em 1995 a Microsoft lançou o Windows 95, que trazia uma mudança sensível na 

interface gráfica e não necessitava mais do MS­DOS, sendo agora um sistema totalmente 

gráfico.   Multi­tarefa   e   com   uma   boa   capacidade   multi­mídia,   o   Windows   95   foi   um 

sucesso,   passadas   apenas   sete   semanas   de   seu   lançamento   haviam   sido   vendidas   sete 

milhões   de   cópias.   A   Microsoft   passou   ainda   nesta   época   a   operar   também   meios   de 

comunicação,   instituindo   empresas   e   divisões   como   The   Microsoft   Network   (1995)   e 

MSNBC (1996). 

A visão de Bill Gates de que haveria um computador em cada mesa de cada casa e 

escritório75  foi   realmente  uma  grande  antecipação do  que  estava  por  vir,  porém tanto  o 

executivo como a Microsoft falharam em ver algo realmente grande que vinha na mesma 

direção: a Internet.

74 New Technology, ou NT75 http://www.microsoft.com/billgates/speeches/industry&tech/iayf2005.asp

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A Internet, ou melhor a WWW ou World Wide Web nasceu como uma estrutura 

descentralizada de computadores em rede, capazes de comunicarem­se entre si e manterem 

a comunicação independente da perda de algum servidor (ou algum nó  da rede). A idéia 

original   partira   dos   militares   norte­americanos   e   depois   expandiu­se   para   o   mundo 

acadêmico, contando com diversos protocolos de comunicação e transferência de arquivos. 

A  entrada  do  grande  público  na   rede  deu­se  com o   lançamento  de  um  software 

chamado Mosaic, pelo National Center for Super Computing (NCSA) entre 1992 e 1993, 

este  software  permitia   uma   navegação   simplificada   por   páginas   HTML   acessíveis   pelo 

protocolo HTTP, algo que até  hoje é  identificado pelas pessoas em geral como sendo “A 

Internet”, quando na verdade esta envolve e contempla diversos outros elementos.

Em   1994   foi   fundada   a   Netscape   Communications   Corporation   que   lançou   o 

Netscape Navigator, um browser que rapidamente dominaria a quase totalidade do mercado, 

atingindo 90% em seu auge. 

Já na metade de 1995 a Internet começou a ganhar especial atenção do público e da 

mídia, sendo colocada por muitos analistas e veículos de comunicação como a derradeira 

evolução   da   indústria   da   informática,   trazendo   promessas   de   novos   paradigmas   em 

educação, comunicação, lazer e trabalho. Sem dúvida as promessas vinham embaladas no 

tradicional  exagero que acompanha o  entusiasmo por  novas   tecnologias,  mas  neste  caso 

estavam ao menos parcialmente dentro do que aconteceria nos anos vindouros.

A Microsoft só  ingressou efetivamente no mercado dos  browsers  em 1995 com o 

lançamento do Windows 95  Plus!,  uma pacote  que   trazia  atualizações,  novos  elementos 

gráficos   e   instalava   o  browser  Internet   Explorer   1.076  no   Windows   95.   Apesar   do 

engajamento   tardio   a   empresa   fez   do   controle   do   mercado   dos  browsers  um   ponto 

estratégico e empenhou muito de seus amplos recursos nesta meta.

A   história   da   ascensão   da   Netscape   e   seu   browser,   o   lançamento   do   Internet 

Explorer e a posterior queda da Netscape englobam o que é referido pela indústria como  a 

guerra dos browsers (browser wars) e são um dos principais casos lembrados quando se 

76  O Internet  Explorer  utilizava   já  desde  sua  primeira  versão o código  fonte  do  Mosaic  Spyglass,  que  a Microsoft licenciou da Spyglass, uma empresa de Internet originada dentro da Universidade de Illinois.

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quer   exemplificar  o  poder  disponível  à  Microsoft   por   controlar  o  mercado  de   sistemas 

operacionais  como o Windows.  A estratégia da Microsoft  consistiu  em oferecer  versões 

grátis dos produtos para servidores que a Netscape comercializava, o que inicialmente não 

teve  grande   efeito  pois  o  mercado  central   da  Netscape   eram   servidores   SUN,   rodando 

UNIX, mas com a popularização do Windows NT a companhia foi sendo asfixiada pela 

baixa em suas receitas. Além disso, a Microsoft passou a integrar o Internet Explorer em 

seus produtos, alegando que não era um software, mas sim uma funcionalidade do sistema.

Em 1996 surgiu o Windows CE (Compact Edition),  projetado para computadores 

portáteis   e   outros   aparelhos   de   pequeno   porte   e   processamento   que   necessitem   de   um 

sistema operacional, e em 1998 surgia o Windows 98 que corrigia inúmeras falhas de seu 

antecessor   e   tinha   como   diferencial   uma   alardeada   integração   do   SO   com   a   Internet, 

viabilizada pelo    Internet  Explorer  4,  um  software  que vinha praticamente “soldado” ao 

Windows e interagia com diversas funções do SO e com outras camadas de software. 

Esta   fusão   do   Internet   Explorer   ao   Windows,   que   era   apresentada   como   uma 

evolução do sistema, era também um golpe mortal no  browser Netscape, que não tinha a 

mesma vantagem competitiva de vir pré­instalado no sistema operacional, muito embora a 

Netscape, sem condições de se manter na briga com a Microsoft, tinha sido comprada pelo 

provedor de acesso e conteúdo América On­Line neste mesmo ano.

O saldo da guerra dos  browsers  foi positivo para a Microsoft,  que terminou com 

mais de 90% do mercado (mais do que a Nestcape teve em seu auge), porém a vitória não 

aconteceu sem danos.

Ainda   dentro   da   proposta   de   estender   sua   atuação   para   os   campos   da   mídia   e 

comunicações, em 1997, por US$ 425 milhões, a Microsoft adquiriu a WebTV Networks, 

um fabricante de aparelhos de baixo custo para conectar televisores à Internet, e no mesmo 

ano   a   empresa   investiu   US$   1   bilhão   na   Comcast   Corporation,   um   operador   norte­

americano   de   televisão   a   cabo,   como   parte   de   sua   declarada   política   de   estender   a 

disponibilidade de conexões de banda larga à Internet.

No final de 1997 o Departamento de Justiça acusou a Microsoft de violar o acordo 

de   1994,   obrigando   os   fabricantes   de   computadores   que   instalavam   o   Windows   95   a 

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incluírem  o   Internet  Explorer   como   seu  browser  de   Internet.  O  Governo  alegou  que   a 

companhia estava se aproveitando de sua posição no mercado de sistemas operacionais para 

conseguir o monopólio dos browsers. Em sua defesa a Microsoft justificava que deveria ter 

o  direito  de  melhorar  as  funcionalidades  do Windows,   integrando o  browser  ao  sistema 

operacional, acrescentando a este funções e capacidade relativas ao acesso à Internet. 

Também em fins de 1997 a Sun Microsystems processou a Microsoft, alegando que 

esta   havia   descumprido   o   contrato   pelo   qual   se   permitia   que   a   Microsoft   utilizasse   a 

linguagem JAVA, um tipo de linguagem de  programação desenvolvida pela SUN, com forte 

característica   de   universalidade,   que   em   tese   permite   que   programas   escritos   nesta 

linguagem  sejam  executadas   em  qualquer  plataforma  e/ou   sistema  operacional.  A  SUN 

acusava a Microsoft de introduzir na linguagem melhoras específicas e exclusivas para o 

Windows,   o   que   na   prática   equivalia   a   minar   a   principal   característica   do   JAVA,   sua 

capacidade multi­plataforma. 

Em novembro de 1998 um tribunal atendeu às demandas da SUN e sentenciou a 

Microsoft   a   revisar   seu  software  para   atender   os   padrões   e   especificações   de 

compatibilidade com JAVA. 

No início de 1998 a Microsoft chegou a um acordo com o Departamento de Justiça 

no caso relativo ao processo de 1997 (onde foi acusada de violar o acordo de 1994). Este 

novo acordo permitia aos fabricantes de PC oferecerem uma versão do Windows 95 sem 

acesso ao Internet Explorer. 

Mesmo assim,  em maio de  1998 o  Departamento de  Justiça  e  vinte  estados  dos 

Estados   Unidos   apresentaram   queixas   contra   a   Microsoft   por   supostas   práticas 

monopolistas   e   por   abusar   de   sua   posição   dominante   no   mercado   para   destruir   os 

concorrentes. Estas ações obrigaram a Microsoft a vender uma versão do Windows sem o 

Internet Explorer ou a incluir o Navigator, então o  browser da Netscape Communications 

Corporation, e seu principal competidor. Estas ações a obrigaram ainda a modificar alguns 

contratos e a sua política de preços.

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O   julgamento   da   Microsoft   por   violação   das   leis   anti­monopólio   começou   em 

outubro   de   1998,   nele   testemunharam   executivos   da   Netscape,   SUN   e   diversas   outras 

empresas de software e hardware, sobre seus contratos empresariais com a Microsoft.

Em novembro de 1999, o juiz norte­americano Thomas Penfield Jackson do tribunal 

federal,   declarou   que   a   Microsoft   detinha   o   monopólio   do   mercado   de   sistemas 

operacionais,  em abril  de  2000 esse   juiz  declarou sua sentença  contra  a  companhia  por 

haver violado as leis anti­monopólio ao empregar táticas que minavam a competitividade.

Neste   ano   a   Microsoft   pagou   US$   5   bilhões   à   companhia  de   telecomunicações 

AT&T Corporation para que esta utilizasse seu sistema operacional Windows CE (CE para 

Compact  Edition,  ou  Edição  Compacta,   em  português)   em  dispositivos  projetados  para 

oferecer aos consumidores serviços integrados de televisão a cabo, telefone e acesso rápido 

à  Internet77.  Além disso,  neste mesmo ano a companhia  lançou o Windows 200078,  uma 

nova versão de seu sistema operacional Windows NT. O ano 2000 iniciou com Bill Gates 

transferindo seu cargo de presidente executivo (CEO) a Steve Ballmer, alegadamente para 

que pudesse concentrar­se no desenvolvimento de novas tecnologias, agora com o cargo de 

Chief Software Engineer.

Em junho  de  2000,  o  mesmo  juiz   Jackson  decidiu  que  a  Microsoft  Corporation 

deveria   ser   dividida   em   duas   empresas   por   haver   violado   a   lei   anti­monopólio   norte 

americana79 (conhecida como Sherman Antitrust Act). Esta decisão que poderia ter trazido 

profundas conseqüências para a indústria de tecnologia e para a regulação das empresas no 

Estados Unidos não foi levada a cabo.

Diretores da Microsoft qualificaram a decisão de pouco razoável e afirmaram que 

ela poderia ser anulada com uma apelação para os responsáveis pelo  caso no Departamento 

de Justiça. Esta vitória repercutiria em benefício tanto dos consumidores como da própria 

indústria. 

A sentença que ordenou a divisão da empresa foi, possivelmente, a mais rigorosa 

desde 1982, quando a justiça norte­americana eliminou o monopólio da AT&T no ramo das 

77 http://www.cfoasia.com/archives/9910­38.htm78 Lançado em 1999.79 http://money.cnn.com/2000/06/07/technology/microsoft_ruling/

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 52

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telecomunicações,   desmembrando   a   empresa.   O   Juiz   Jackson   baseou   sua   decisão   nas 

recomendações  do  Departamento  de   Justiça,   e   a  ordem  do   juiz   estipulou  que  uma  das 

companhias deveria ocupar­se dos sistemas operacionais, enquanto a outra dos softwares de 

aplicações   e   de   serviços,   como  o  MS  Office,   MS   Exchange,   a   enciclopédia   eletrônica 

Encarta e os serviços de Internet oferecidos via MSN. Ainda segundo a decisão, os altos 

executivos da empresa, entre eles Bill Gates e Steve Ballmer, deveriam escolher para qual 

das duas novas empresas iriam trabalhar. 

A   sentença   também   impôs   significativas   restrições   às   praticas   de   negócio   da 

Microsoft,  o  que  para  alguns  analistas  eram  potencialmente  mais  prejudiciais  do  que  a 

própria divisão de empresa. Entre as decisões do tribunal constavam determinações como: o 

estabelecimento de controles estritos sobre o modo de venda e comercialização do sistema 

Windows. 

A Microsoft deveria proporcionar a outros desenvolvedores de  software  acesso ao 

código fonte do Windows, e aos fabricantes de computadores a possibilidade de adaptar o 

Windows   às   suas   necessidades   e   especificações.   Windows   e   Internet   Explorer   deviam 

desvincular­se e ser vendidos como produtos separados.

Na   época   o   juiz   afirmou   que   se   vira   forçado   a   tomar   esta   decisão   porque 

“relutantemente cheguei a conclusão que uma punição estrutural se tornou imperativa: a  

Microsoft da maneira que está  atualmente organizada e conduzida é incapaz de aceitar a  

noção de que infringiu a lei ou cumprir uma decisão corrigindo sua conduta.”80.

Os representantes da Microsoft reagiram violentamente à decisão de Jackson de não 

conceder­lhes   o   tempo   que   solicitaram   para  preparar   e   apresentar   argumentos   contra   a 

decisão. Especialistas em jurisprudência questionaram o abrupto final dado ao caso com 

esta decisão do juiz Jackson, e os advogados da Microsoft expressaram sua confiança na 

atuação do Tribunal de Apelações do Distrito de Colúmbia e recordaram que este tribunal já 

havia contestado uma decisão de Jackson em 1998 e determinou que a companhia tinha 

direito de fundir o Internet Explorer com o Windows se isso resultasse em benefício para o 

consumidor.

80 http://money.cnn.com/2000/06/07/technology/microsoft_ruling/

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Jackson ordenou deixar em suspenso o plano de divisão até que fosse cumprida a 

fase de apelações. Em 20 de junho, inesperadamente, o juiz alterou sua opinião e obrigou a 

empresa a mudar suas práticas comerciais até que um tribunal superior decidisse sobre o 

caso.   Ao   mesmo   tempo,   posicionou­se   favoravelmente   ao   Departamento   de   Justiça   e 

decidiu enviar o caso para o Supremo Tribunal. Este, por sua vez, poderia dar andamento ao 

caso ou devolvê­lo ao Tribunal de Apelações.

Aqui   cabe  um  parênteses  para   retomarmos   restrospectivamente  a   evolução  desta 

idéia  de   interface  gráfica:  ela   foi  adotada  pelo  Windows 1.0   (Microsoft)  em 1985,  com 

idéias baseadas na interface gráfica do LISA (Apple) de 1983, que fora inspirado/copiado 

da interface do Star 8010 (Xerox) de 1981, este derivando diretamente do Alto (Xerox) de 

1972.  Todas estas interfaces gráficas são, claro, dependentes da utilização e dos conceitos 

propostos pelo mouse de Douglas Englebart e sua equipe, desenvolvido entre 1962 e 1968 

na Universidade de Stanford.   Novamente a questão da propriedade das idéias  se coloca 

com ênfase. A quem pertence a idéia da interface gráfica?

Assim, o Windows como o conhecemos tem parte de sua origem no Q­DOS de Tim 

Paterson, no Xerox Star e na interface dos Macintosh., já o outro sistema operacional objeto 

de nossa análise,  o  Linux,  deriva sua  origem de um sistema operacional  mais  antigo,  e 

durante um bom tempo mais sofisticado81, o UNIX. 

Criado  nos  Bell  Laboratories82  o  UNIX   teve   sua  primeira  versão  compilada   em 

196983,   e   no  que  diz   respeito  a   sua  arquitetura   e  premissas  o  Linux  é   considerado  um 

“clone84”   do   UNIX   utilizando   inclusive   a   mesma   nomenclatura   em   seus   comandos 

operacionais principais .

Enquanto o sistema operacional MS­DOS e sua evolução, o Windows, avançavam 

no domínio do mercado mundial de desktops, o UNIX e seus diversos clones tornavam­se a 

opção   do   mercado   de   servidores,   tinham   boa   penetração   entre   pesquisadores, 

81 Como exemplo dessa sofisticação pode­se indicar a existência de diferentes usuários com perfis próprios e a faculdade de atribuir permissões de acesso aos arquivos 82 http://www.bell­labs.com/history/unix/83 http://cm.bell­labs.com/cm/cs/who/dmr/hist.html84 A popularidade do sistema UNIX, que em geral é atribuída às suas capacidades e arquitetura, fez com que surgissem diversos “clones”, ou seja, outros sistemas operacionais que emulam seus conceitos. Alguns destes clones são: HPUX (da Hewlett­Packard), Solaris da SUN Microsystems, MINIX e Linux. 

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departamentos   de   ciência   da   computação   e   no  meio   acadêmico  universitário   em  geral, 

possivelmente   por   suas   características   de   arquitetura   e   administração,   então   sem 

similaridade nos produtos da Microsoft.

 3.3. O nascimento do Linux

Em   25   de   agosto   de   1991,   uma   mensagem   postada   por   um   então   aluno   da 

Universidade   de   Helsinki,   em   um   BBS,   inesperadamente   tornava­se   um   documento 

histórico, anunciando pela primeira vez, o nascimento de um modesto sistema operacional 

batizado de Linux, outro clone do UNIX como o seu próprio nome denunciava:

“From: [email protected] (Linus Benedict Torvalds)Newsgroups: comp.os.minixSubject: What would you like to see most in minix?Summary: small poll for my new operating systemKeywords: 386, preferencesMessage­ID: [email protected]: 25 Aug 91 20:57:08 GMTOrganization: University of HelsinkiLines: 20

Olá a todos aí fora usando minix ­Eu estou fazendo um sistema operacional (grátis) (é só um passatempo, não vai ser grande e profissional como o gnu) para clones 386(486)AT. Ele tem fermentado desde abril, e está  começando a ficar pronto. Eu gostaria de comentários sobre coisas que as pessoas gostam/desgostam no minix, uma vez que meu SO lembra­o de alguma forma (mesma organização  física do sistema de arquivos (devido a razões práticas) entre outras coisas).Eu já portei o bash (1.08) e o gc(1.40), e as coisas parecem funcionar.Isso sugere que eu vou conseguir algo prático em alguns poucos meses, e eu gostaria de saber quais  as funções que a maioria das pessoas quer. Qualquer sugestão é bem­vinda, mas eu não vou prometer que vou implementá­las :­)

Linus ([email protected])PS.  Sim ­ ele está livre de qualquer código do minix, e tem um fs (file system ­ sistema de arquivos)  de múltiplas transações.Ele NÃO é portável (utiliza chaveamento de tarefas do 386 etc), e ele provavelmente nunca irá  suportar qualquer coisa além de discos rígidos AT, uma vez que são tudo o que tenho :­(.85”

85 Texto Original: “Hello everybody out there using minix ­I'm doing a (free) operating system (just a hobby, won't be big and professional like gnu) for 386(486) AT clones.  This has been brewing since april, and is starting to get ready.  I'd like any feedback on things people like/dislike in minix, as my OS resembles it somewhat (same physical layout of the file­system (due to  practical reasons) among other things).

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Com esta mensagem, em 1991 Linus Torvalds deu início ao processo de construção 

coletiva do sistema operacional Linux, um sistema operacional “tipo X”86.

O   embate   entre   Windows   e   Linux   traz,   além   do   mérito   técnico   de   cada   sistema 

operacional, uma avaliação e ponderação sobre as soluções tecnológicas e as metodologias 

adotadas em cada sistema,  que acabam evidenciando questões   ideológicas  em seara que 

seria inicialmente apenas técnica. 

 3.4. O GNU/Linux e a antiga novidade do Software Livre

Richard   Stallman   criou   a  Free  Software  Foundation  em   1984   iniciando   o   projeto 

GNU87, segundo Stallman sua motivação foi constatar o virtual desaparecimento da cultura 

de compartilhamento de softwares dentro do laboratório de Inteligência Artificial do MIT, 

de   onde   seus   pares   estava   saindo   para   entrar   ou   para   fundar   companhias   de  software 

proprietário.

Stallman é o autor da idéia por trás do "free software" (no Brasil batizado de Software 

Livre)   segundo   a   qual   aos  programadores   deveria   ser   garantido   o   direito   de   acesso   ao 

código fonte dos softwares permitindo que alterações fossem feitas para adaptar o software 

a cada necessidade.

Foi   Stallman   quem   criou   a   famosa   licença   GNU/GPL   (sob   a   qual   o   Linux   é 

licenciado), a GNU General Public License (GNU/GPL) garante ao usuário de um software 

o direito de ter acesso ao código fonte e produzir as alterações que julgar conveniente, mas 

obriga a distribuição futura deste software a ser feita nos mesmos termos.

I've currently ported bash(1.08) and gcc(1.40), and things seem to work. This implies that I'll get something practical within a few months, and I'd like to know what features most people would want.  Any suggestions are welcome, but I won't promise I'll implement them :­)

Linus ([email protected])PS.  Yes ­ it's free of any minix code, and it has a multi­threaded fs. It is NOT protable (uses 386 task switching etc), and it probably never will support anything other than AT­harddisks, as that's all I have :­(.”86 Diz se sistema “tipo X” quando um sistema operacional é derivado do UNIX.87 GNU é um acrônimo recursivo para "GNU's Not Unix", um tipo de piadinha recorrente entre os hackers e geeks.  A página  oficial   do  projeto  GNU na  internet   (http://www.gnu.org/gnu/gnu­history.html)  oferece   a seguinte explicação sobre a sigla: "O nome 'GNU' foi escolhido porque atende alguns requisitos; primeiro, era um   acrônimo   recursivo   para   'GNU   não   é   Unix'   (GNU's   Not   Unix),   segundo,   porque   era   uma   palavra verdadeira, e terceiro, era divertida de dizer (ou cantar)."

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Esta   idéia   ganhou   força   inicialmente   na   comunidade   acadêmica   e   já   em   1989   a 

Universidade   da   California   em   Berkeley   lançaria   alguns  softwares  livres   (protocolos   e 

ferramentas para rede) sob outra licença a Berkeley Software Distribution ou BSD como é 

conhecida, e em 1991 sob a mesma licença quase todo o código fonte de seu clone do Unix, 

o BSD Unix.

Assim   dois   aspectos   fundamentais   separam   os   dois   sistemas   operacionais   que 

analisamos, o primeiro sua maneira de licenciamento, enquanto o Windows vende licenças 

de utilização para seu  software  compilado, o Linux é  licenciado sob a égide do  Software 

Livre  que permite a livre distribuição e utilização do  software.  Isso não significa apenas 

uma diferença de custos, mas na verdade uma diferença de conceitos, em tese um usuário 

do Linux pode ter acesso ao seu código fonte e fazer alterações diretamente no coração do 

sistema, algo não permitido no Windows.

Esta primeira dicotomia, leva à segunda que é também relevante para este trabalho, a 

forma   de   desenvolvimento   das   duas   tecnologias.   Além   de   estarem   historicamente 

enraizados   em  conceitos   diferenciados  os   dois   sistemas   operacionais   são   desenvolvidos 

dentro de duas lógicas completamente diferentes, o Windows tem uma equipe (ou equipes) 

de  desenvolvimento,   que   trabalham  o   código   (ou  parte  do   código)   sem  contato   com  o 

mundo exterior e atendendo apenas as demandas internas de cada departamento ou líder de 

projeto,   construindo   funcionalidades   e   otimizações   que   além   de   se   originarem   em 

necessidades técnicas também são geradas por departamentos de marketing e mesmo por 

psicólogos.  Já o Linux, insere­se em um anárquico processo de criação coletiva, sofrendo 

interferências  de  programadores  de  diferentes  países,  companhias  e   formações.  Parte  de 

nosso   trabalho   consiste   em   identificar   até   que   ponto   estas   diferentes   formas   de 

desenvolvimento e de licenciamento  interferem nos rumos tomados pela tecnologia de cada 

sistema operacional.

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 3.5. Visões de Mundo.

A   História   é   poder,   ou   melhor,   a   história   pertence   ao   poder.   Expressões   como 

"história dos vencidos" ou "história oficial" evidenciam a curiosa noção de que exista mais 

de uma história a ser contada.

Nosso objetivo é retratar e compreender os diferentes discursos envolvidos na acirrada 

contenda dos sistemas operacionais para computadores. A pretensão é produzir um resgate 

histórico  e   a   analítico  dos  discursos  de  dois  universos  coexistentes  porém  antagônicos, 

representados pela   lógica empresarial  capitalista   já  solidamente  consolidada do  software 

proprietário, e a alternativa de cores comunais do movimento do Software Livre.

Focando a reflexão no caso dos sistemas operacionais (Windows e Linux), a pretensão 

não   é   fazer   o   resgate   do   processo   histórico   que   constituiu   cada   um   dos   lados,   tarefa 

impossível aqui dada a limitação de espaço, propomos­nos sim a fazer o resgate histórico da 

maneira  como cada  lado tem enxergado e  classificado a  si  mesmo e ao seu nêmesis ao 

longo de suas histórias.

Esse   debate   no   primeiro   plano   evidencia   a   disputa   capitalista   pelo   domínio   ­   e 

eventual   monopólio     ­   de   um   mercado   mundial   de   bilhões   de   dólares,   que   porém,   se 

considerado para além dos  lucros é  estratégico para empresas e mesmo para os  Estados 

Nacionais, pois constitui­se em ponto nevrálgico de uma das mais importantes tecnologias 

em uso na  sociedade  atual,  afetando  não apenas  a  economia  mas   também a difusão do 

conhecimento e até a organização social.

Portanto,  quais   são  e   têm  sido,   as  motivações  declaradas   e  ocultas  nos  diferentes 

discursos   das   partes,   em   especial   naqueles   que   emanam   de   “fatos”   aparentemente 

incontestáveis,   estatísticos,   técnicos,   econômicos,   que   criam   e/ou   aplicam   rótulos,   e 

pretendem­se   por   isso   aptos   a  definir   o   caminho   futuro   da   disputa   pela  hegemonia  da 

tecnologia. 

A luta pelo poder, presente nos discursos destes dois grupos, organizada na cronologia 

do tempo histórico auxilia na compreensão dos caminhos do desenvolvimento tecnológico, 

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que  passam  não   só   pela  busca  da   superação   técnica  do   antagonista,  mas   também  pela 

conquista dos corações e mentes dos usuários, das empresas e dos governos.

Novamente não é uma análise de mérito quanto à qualidade de cada tecnologia que se 

busca aqui, algo fora dos propósitos do texto, mas sim evidenciar que ainda que se pretenda 

o contrário, para o desenvolvimento tecnológico, o futuro não está dado e não é certo, e que 

críticas ao atual raciocínio economicista dominante podem surgir mesmo no interior dos 

mecanismos que originalmente o haviam engendrado, sendo capazes de derivar em formas 

de   resistência.   No   fim   as   escolhas   tecnológicas   parecem   estar   marcadas   de   maneira 

indelével por diferentes visões de mundo.

Aqui   buscamos   retratar   o   quanto   da   disputa   pela   técnica   e   pela   tecnologia   é 

determinada por aspectos comerciais,   ideológicos e passionais,  pretendendo produzir um 

resgate histórico e analítico dos discursos de dois universos co­existentes e antagônicos da 

micro­informática: a lógica empresarial já solidamente consolidada do software proprietário 

e a recente alternativa a esta lógica proposta pelo movimento do Software Livre.

Uma   vez   que   o  Software   Livre  é   alternativa   de   desenvolvimento   tecnológico   de 

natureza difusa é impossível que seja identificado com uma única entidade ou grupo (já que 

diferentes empresas, governos, ONGs e comunidades o representam e/ou advogam em seu 

favor),  aqui trabalharemos com duas vertentes,  a  forma de licenciamento GNU/GPL e o 

sistema operacional Linux que dela faz uso. Na defesa das posições do software proprietário 

e em oposição ao ideário do Software Livre, posicionamos a Microsoft Corporation – sem 

dúvida um dos maiores expoentes deste outro modelo de desenvolvimento tecnológico.

Antes   de   avançarmos   cabe   breve   conceituação   sobre  Software   Livre  e  software 

proprietário: o  software  proprietário é o  software  desenvolvido e comercializado por uma 

determinada empresa da mesma maneira que um produto tradicional. 

Porém   a   empresa   tem   sobre   este   produto   (que   é   um   produto   essencialmente 

intelectual) direitos de propriedade ainda mais abrangentes do que em outros segmentos, 

podendo legalmente impedir o consumidor final de utilizar,  copiar,  distribuir,  revender e 

alterar  o  software  da  maneira  que  bem entender,  algo por  exemplo  impensável  com um 

automóvel. O usuário fica portanto restrito aos termos de licenciamento do fabricante do 

software.

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O software proprietário é o modelo mais conhecido de licenciamento de software, mas 

é um modelo que vem sendo constantemente desafiado pelo  Software Livre, que pode ser 

definido da seguinte maneira:

“É   um   programa   de   computador   de   código­fonte   aberto,  

possibilitando que qualquer técnico possa estudá­lo, alterá­lo, adequá­lo às  

suas próprias necessidades e redistribuí­lo, sem restrições. Geralmente os  

softwares livres também são gratuitos.”88

É   certo  que  no   início  da   indústria  da   informática  ninguém se  ocupava  muito  dos 

softwares,   eles   já   eram   parte   integrante   do   pacote   para   empresas   e   instituições   com 

capacidade orçamentária suficiente para adquirir um computador, além disso, os primeiros 

técnicos   e   pesquisadores   estavam   imbuídos   do   espírito   de   cooperação   acadêmica   e 

compartilhamento.

Como  visto   atrás,   com  a  popularização  do  computador,   especialmente  dos  micro­

computadores  domésticos   (os  PCs89)   empresas   especializadas  na  produção  de  softwares 

surgiram e ganharam força, entre elas estava a Microsoft que embarcou em um vantajoso 

contrato com a já  poderosa IBM que proporcionou a popularização de seu sistema DOS. 

Sobre o DOS a Microsoft construiu o Windows, seu primeiro sistema gráfico, gerenciado 

por  janelas e uma interface que tornava o contato com o computador mais humanizado, 

permitindo uma ampliação da base usuária (nos moldes de pesquisas e desenvolvimentos 

que já haviam sido feito por outras empresas como a Apple e a Xerox). 

O   surgimento   dessas   empresas   fez   cair   em   desuso  o  software  “sem  dono”   a   que 

haviam se  acostumado  os  acadêmicos  e  os  entusiastas  dos  primeiros   tempos  do  micro­

computador,  algo que  não passaria  sem uma resposta  e  uma tentativa  de resgate  com o 

Software Livre. Se as guerras, para além dos campos de batalha, são também ganhas nos 

corações e mentes das pessoas, o combate entre o software proprietário e o Software Livre 

segue acirrado já faz alguns anos.

88 CASSIANO, João.  Cidadania Digital: Os Telecentros do Município de São Paulo.  In: SILVEIRA, Sérgio Amadeu da., CASSIANO, João (Org.)  Software Livre e Inclusão  Digital.  São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2003. 89PC = Personal Computers, ou Computador Pessoal.

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 3.6. O Linux e o movimento do Software Livre pelos olhos da Microsoft, o Windows e a Microsoft pelos olhos do movimento do Software Livre.

"Com as palavras todo cuidado é pouco, mudam de opinião como as pessoas."

José Saramago ­ As Intermitências da Morte ­ pg. 69

Roszack90  rememora que o espírito dos jovens técnicos que iniciaram a revolução da 

micro­eletrônica nos EUA era o espírito do movimento “hippie”, a idéia de “compartilhar” 

o fruto do trabalho estava na base do que viria a ser conhecido como a cyber­cultura, os 

computadores   pessoais   eram  per   si  socialmente   revolucionários   quando   começaram   a 

surgir, ou pelo menos assim pensava uma grande parcela dos pioneiros. 

Mas   tão   logo   sua   importância   econômica   tornou­se   evidente,   ganhou   força   o 

movimento   de   refluxo   neste   conceito   de   compartilhar,   logo   considerado   amador   e 

inadequado  ao  mundo  empresarial.   Já  em  1976  Bill  Gates  alertava  para  o  problema  da 

pirataria, em sua uma “Carta aberta aos Hobistas91” onde acusava os entusiastas amadores 

(hobbyists)   de   roubarem   seu  software  e   desta   forma   prejudicarem   as   possibilidades   de 

evolução,   já   que   sem   os   dividendos   ele   não   poderia   contratar   programadores   para 

aperfeiçoar os softwares.

Esta carta é nosso ponto de partida para a análise dos diferentes discursos envolvidos 

na acirrada contenda dos sistemas operacionais que eclodiria com força total um quarto de 

século adiante.90  ROSZAK, Theodore.  The Cult  of   Information   :  A Neo­Luddite  Treatise  on High  Tech,  Artificial Intelligence, and the true Art of Thinking. New York : Pantheon Books, 1986.91  “Bill Gates is one of the first programmers to raise the issue of software piracy. In "An Open Letter to Hobbyists," first published in MITS Computer Notes, Gates accuses hobbyists of stealing software and thus preventing "...good software from being written." He prophetically concludes with the line, "...Nothing would please me more than being able to hire ten programmers and deluge the hobby market with good software."”Disponível em: Key Events in Microsoft History ­ key_events_in_microsoft_history.doc (83 KB) em:  http://www.microsoft.com/downloads/info.aspx?na=46&p=4&SrcDisplayLang=en&SrcCategoryId=&SrcFamilyId=b604bb05­7c33­4643­96b4­38e06383bda5&u=http%3a%2f%2fdownload.microsoft.com%2fdownload%2f6%2f3%2fa%2f63a018ae­711f­4edb­8b79­ca109e5eed07%2fkey_events_in_microsoft_history.doc

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Até  1999 o movimento  do  Software  Livre foi solenemente ignorado pela Microsoft, 

tratado como algo interessante para estudantes, mas inescapavelmente amador. Porém, neste 

ano “vazou” o notório "Halloween Memo92" que trazia a primeira “imagem semi­pública de 

reconhecimento do Software Livre como ameaça competitiva”93.

Neste documento interno da Microsoft eram apontados alguns aspectos considerados 

nevrálgicos sobre o Software Livre, entre os quais o fato de representar uma ameaça direta à 

Microsoft,   especialmente   no   mercado   de   servidores;   trazer   um   problema   prático   da 

percepção de custo zero do  Software Livre  contra  o modelo de  licenças da Microsoft;  a 

constatação   de   que   qualidade   comercial   poderia   sim   ser   atingida   e   até   excedida   pelo 

Software Livre. 

O documento trazia ainda a concepção que uma política de FUD94  não poderia ser 

sustentada no longo prazo e que o ideal seria combater o conceito de Software Livre e não 

uma companhia específica.

Além disto  o  mais   interessante  eram algumas constatações  como a  enormidade da 

comunidade   envolvida,   com   milhares   de   pessoas   envolvidas   em   um   desenvolvimento 

simultâneo de velocidade sem precedentes,  valendo­se de seu  tempo livre  e   trabalhando 

sem um objetivo financeiro imediato.

Apesar da idéia de que a política de FUD não teria como ser mantida no longo prazo, 

sem dúvida, ela não foi evitada pela Microsoft e em 2000, durante o   Microsoft's Annual  

Financial   Analysts   Meeting,   Steve   Ballmer,   agora   presidente   executivo   da   Microsft, 

declararia: 

92 Vide: http://www.catb.org/~esr/halloween/93  DIBONA,  Chris;  STONE,  Mark;  COOPER,  Danese   (Eds.).  Open Source  2.0.  O'Reilly  Media.   ISBN 0596008023.94 FUD é a sigla de Fear, Uncertanty, Doubt (ou em português Medo, Incerteza, Dúvida). Trata­se de uma técnica de marketing, pouco ética porém largamente difundida baseada na propagação de desinformação. Na prática consiste em espalhar boatos que desacreditem um produto ou um concorrente, em geral no que tange à qualidade, preço e sua capacidade de se manter no mercado. Um FUD pode incluir ainda confusão proposital de   conceitos,   ameaças   jurídicas   fictícias   e   relatos   inverídicos   corroborando   as   testes   sustentadas.   Na atualidade   é   comum   associar   a   prática   de   FUD   com   a   Microsoft   dadas   suas   práticas   em   relação   aos concorrentes, mas em geral a primeira larga utilização de FUD no mercado de informática é atribuída a IBM nos anos de 1970, quando preparava­se para entrar no mercado dos computadores pessoais e desencadeou diversas   campanhas   contra   os   concorrentes   por   meio   de   seus   canais   de   vendas.  Mais   informações   sobre   a   história   do   FUD   podem   ser   encontradas   neste   endereço: <http://web.archive.org/web/20020807000404/www.geocities.com/SiliconValley/Hills/9267/fuddef.html>. Acesso em: 27 abr. 2006 ou em <http://www.catb.org/~esr/jargon/html/F/FUD.html>. Acesso em: 01 jul. 2006 

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"Não   há   uma   empresa   chamada   Linux,   mal   há   um   roadmap95  do 

Linux. Ainda assim o Linux brota organicamente da terra. E ele tem, você  

sabe, as características do comunismo que as pessoas amam tanto, tanto  

nele. Que são, ele é grátis.”96 

Qualquer que fosse o tom de vermelho com que o pinguim97 do Linux estivesse sendo 

pintado ele seria logo coberto de um azul98  bem capitalista pela IBM, que anunciou em 

dezembro planos de investir 1 bilhão de dólares em Linux ao longo do ano seguinte99, de 

longe o maior investimento feito até então em um Software Livre e sem dúvida um fator de 

atenção adicional em Redmond100.

Logo em seguida,  em fevereiro  de  2001101  Jim Allchin,  executivo  responsável  pelo 

Windows dentro da Microsoft, alertava sobre os danos que seriam causados por  softwares 

livremente   diustribuídos   como   o   Linux   e   sobre   a   necessidade   de   tornar   isto   claro   aos 

legisladores,   para  que   eles   entendessem  a   ameaça.  Em   junho  do  mesmo  ano,  em  uma 

entrevista  ao  jornal  Chicago Sun­Times102,  novamente Ballmer,  deixou claro  como via  o 

movimento do Software Livre, elaborando com mais objetividade o ponto de vista esboçado 

por Allchin: "

95  Roadmap, ou mapa da estrada é o termo utilizado para descrever as funcionalidades previstas para cada nova versão de um software a ser lançada.96  MS'   Ballmer:   Linux   is   communism.   Disponível   em: <http://www.theregister.co.uk/2000/07/31/ms_ballmer_linux_is_communism/>. Acesso em: 12 jul. 200597 O mascote e símbolo do Linux é um pinguim, animal admirado por Linux Torvalds. O pinguim do Linux foi batizado de Tux, derivado de “tuxedo” (fraque), dada a brincadeira de dizer que os pinguins estão vestidos com esta roupa.98 O azul é a cor da IBM, às vezes também referida como “Big Blue”.99 WILCOX, Joe. IBM to spend $1 billion on Linux in 2001 : CNET News.com. Dez. 2000. Disponível em: <http://news.com.com/2100­1001­249750.html?legacy=cnet>. Acesso em: 18 abr. 2006.100  Redmond é  o  local  da sede da Microsoft  nos EUA. No  jargão da  indústria  é  comum que se  refira  a Redmond para falar da Microsoft.101 Microsoft Executive Says Linux Threatens Innovation. Disponível em:   <http://www.news.com>. Acesso em: 15 dez. 2004;   <http://www.linuxtoday.com/news_story.php3?ltsn=2001­02­15­008­06­PS­MS>. Acesso em: 12 set. 2005; <https://www.linux.org/news/2001/02/14/0002.html>. Acesso em: 12 set. 2005102  NEWBART, Dave. Microsoft CEO take launch break with the Sun­Times :  Chicago Sun­Times, 2001. Disponível   em:   <http://www.suntimes.com/output/tech/cst­fin­micro01.html>.   Acesso   em:   5   jun.   2001; Disponível   em:   <http://nl.newsbank.com/nl­search/we/Archives?p_product=CSTB&p_theme=cstb&p_action=search&p_maxdocs=200&s_dispstring=(ballmer)%20AND%20AND%20date(5/31/2001%20to%206/2/2001)&p_field_date­0=YMD_date&p_params_date­0=date:B,E&p_text_date­0=5/31/2001%20to%206/2/2001)&p_field_advanced­0=&p_text_advanced­0=(%22ballmer%22)&p_perpage=10&p_sort=YMD_date:D&xcal_useweights=no>

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Linux é um câncer que se fixa no sentido de propriedade intelectual em tudo o que 

toca (...) Pela maneira como a licença é escrita, se você quiser utilizar um software open­

source,  você   têm que fazer o resto do seu software Open Source".  Assim não restaram 

dúvidas sobre o que afinal deveria ser explicado aos legisladores de acordo com a ameaça 

vislumbrada de dentro da Microsoft.

Menos  de  vinte  dias  depois,  uma  entrevista  de  Bill  Gates   reforçava  estas   idéias  e 

eliminava  qualquer  dúvida  sobre  se  a  Microsoft   tinha  ou  não uma política  de  FUD em 

andamento,   em   um   primeiro   momento   o   objetivo   parece   efetivamente   ser   o   de   criar 

confusão   sobre   os   termos   pertinentes   ao  Software   Livre  e   caracterizá­los   com   cores 

comunistas ou pelo menos anti­capitalistas.

“Há  uma parte do Open Source chamada GPL que interrompe aquele  

ciclo­­que é, ele torna impossível para uma companhia comercial utilizar  

qualquer parte daquele trabalho ou construir sobre qualquer parte daquele  

trabalho. Então  o que você  viu com o TCP/IP ou (tecnologia de e­mail)  

Sendmail ou o browser nunca poderia ter acontecido. Nós acreditamos que  

deve existir software grátis e software comercial; que deve existir um rico  

ecossistema que trabalhe em torno disto.  Existem pessoas que acreditam 

que o software comercial  não  deve existir  sob nenhuma forma­­que não  

devem existir empregos ou impostos em torno do software comercial. E este  

é um grupo pequeno, mas a GPL foi criada com este objetivo em mente.

E assim, as pessoas devem entender a GPL. Quando as pessoas dizem  

Open Source elas em geral  querem dizer GPL. Quando alguém faz uma  

pergunta, “E que tal Open Source?” eles querem dizer Open Source ou eles  

querem dizer a GPL?

Nós acreditamos naquele ecossistema e em ter um mix de software  

comercial e grátis.”103

103  RICCIUTI,   Mike   .   Gates'   grand   design   :   CNET   News.com,   Jun.   2001.   Disponível   em: <http://news.com.com/Gates+grand+design/2009­1082_3­268707.html>. Acesso em: 22 mar. 2005.

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Em 2002 a Microsoft já admitia o Linux como um competidor que viera para ficar, e 

novamente declarava na voz de Ballmer: 

"Nós temos que competir com software grátis, em valor, mas de uma  

maneira esperta. Nós não podemos precificar a zero, então nós precisamos 

justificar nossa postura e precificação. O Linux não vai desaparecer­­nosso  

trabalho é fornecer um produto melhor no mercado."104

Assim parece claro que desde os primeiros momentos de consolidação do  Software 

Livre  a  Microsoft   esteve   consciente   da   ameaça   que   estava   colocada   ao   seu   modelo   de 

negócios. Pela primeira vez as estratégias empresariais a que se acostumara não valeriam, 

não havia uma companhia específica para combater ou comprar, nem tão pouco era possível 

oferecer ao mercado um produto competitivo com um preço mais atraente, como constatava 

o próprio Ballmer com certa perplexidade em dezembro de 2003 ao falar do Linux: 

“É um concorrente esquisito. Não há uma empresa por trás dele. Você  

não sabe exatamente quem o faz. Ele é grátis. Eu prefiro dizer: “Olhe, o que  

temos aqui é  uma pequena desvantagem no preço.” É a primeira vez que 

temos uma desvantagem no preço.”105 

Ainda   em   2002   fora   fundado   o   consórcio  UnitedLinux,   que   tinha   o   objetivo   de 

consolidar   e   padronizar   diversas   distribuições   Linux,   que   eram   populares   em   pontos 

geográficos  distintos,  dando  origem a  uma  única  e  nova  distribuição.  A   idéia  era   tanto 

fundir as qualidades específicas de cada distribuição quanto produzir um sistema que fosse 

global, unificado e capaz de fazer frente ao Windows. 

O consórcio era  composto pela norte­americana Caldera (mais  tarde renomeada de 

Santa Cruz Operation, ou SCO), pela brasileira Conectiva (mais tarde adquirida por uma 

distribuição francesa chamada Mandrake, de cuja fusão resultou a Mandriva), pela SUSE 

104  JUDGE,   Peter.   Ballmer:   We'll   outsmart   Open   Source   :   ZDNet   News.   Set.   2002.   Disponível   em: <http://news.zdnet.com/2100­3513_22­959112.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.105  Steve   Ballmer   On   Microsoft's   Future   :   BusinessWeekOnline,     Jan.   2003.   Disponível   em: <http://www.businessweek.com/magazine/content/03_48/b3860078_mz063.htm>. Acesso em: 18 abr. 2006.

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Page 66: Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico:  Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

LINUX   (distribuição   alemã   considerada   a   mais   popular   da   Europa)   e   pela   Turbolinux 

(distribuição asiática).

O consórcio lançou uma única versão e nunca chegou a dar efetivamente certo, fato 

que atribuímos em especial a uma mudança de postura de um dos participantes e ao fato de 

não   ter  contado  com  a  adesão  da  Red  Hat,   então  a  distribuição  mais   importante,   e  do 

Debian, uma das mais populares entre os antigos usuários do Linux.

Porém independente do insucesso deste consórcio, em 2003 o combate dos sistemas 

operacionais   já   se   dava   em   campo   aberto,   e   se   Ballmer   afirmava   que   não   havia   uma 

empresa por trás do Linux, também poderia ter afirmado que havia várias.

Cada vez mais empresas passaram a basear seus negócios em Linux para competir 

com   a   Microsoft;   além   da   IBM   e   seu   mega   investimento   outras   companhias   de   vulto 

aderiam ou erguiam­se diretamente do  Software Livre. Empresas como a novata Red Hat, 

fundada em 1993 com o objetivo de distribuir e dar suporte ao Linux, mantenedora de uma 

das distribuições mais populares na América do Norte e que viu seu negócio crescer no 

mesmo rítimo do Software Livre. Ou a Novell, talvez o mais ilustrativo exemplo das novas 

possibilidades colocadas pelo Software Livre. 

A histórica  Novell,  uma empresa de  softwares  fundada em 1979,  que competiu no 

mercado de sistemas operacionais e chegou a dominar o filão das redes corporativas nos 

anos 80 com o   seu lendário “NetWare”, constitui um sólido exemplo de empresa quase 

colocada fora do mercado com a ascenção dos produtos de rede e dos sistemas operacionais 

da Microsoft.

Iniciando   um   reposicionamento   estratégico   em   janeiro   de   2004   a   Novell   mudou 

radicalmente sua inserção no mercado de softwares, adquiriu a SUSE, principal distribuição 

Linux da Europa, alterou sua estratégia de ação e fez   investimentos pesados em Linux, e 

desde   então   vem   tentando   –   com   relativo   sucesso   –   se     equilibrar   na   fina   linha   entre 

Software Livre e Software Proprietário.

Assim, mesmo com o confortável virtual monopólio dos sistemas operacionais dos 

microcomputadores  desktop,   a   Microsoft   passou   a   enfrentar   dificuldades   em   setores 

específicos   com   a   ascensão   do   Linux,   setores   como   servidores   de   Internet   e   super­

computadores apenas para nomear dois nichos.

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Um   movimento   inesperado,   que   pegou   o   mercado   de   tecnologia   de   surpresa, 

aconteceu em março de 2003 quando uma empresa membro da iniciativa  United Linux, a 

Caldera,   agora   adotando   o   nome   de   SCO   (Santa  Cruz  Operation),   para   espanto   geral 

processou a   IBM em mais  de  1  bilhão de dólares,  alegando que  os   investimentos  desta 

empresa no Linux violavam e tornavam públicos códigos UNIX, de propriedade da SCO, 

que agora estariam inseridos no Linux. 

A SCO afirmava ser,  em um complicado emaranhado de transferências,  compras e 

fusões a atual proprietária das patentes do UNIX, e que estas estariam sendo violadas pela 

IBM e por qualquer empresa, indivíduo ou Governo que utilizasse o Linux. 

A resposta da IBM foi contra­processar a SCO, seguida logo depois pela Red Hat em 

um processo onde afirma que as alegações da SCO prejudicam seu negócio106; ainda para 

continuarmos falando dos advogados e de táticas de FUD a SCO passou a enviar cartas para 

grandes corporações usuárias de Linux, alertando­as sobre a possibilidade de virem a ser 

processadas por violação de sua propriedade, e em Novembro a SCO finalmente passou da 

ameaça à ação processando as empresas AutoZone e DaimlerChrysler107. Red Hat, Novell, e 

HP prontamente passaram a oferecer proteção legal a seus clientes e o OSDL (Open Source 

Development Labs) criou um fundo para defesa contra processos.

Não é   razoável  sugerir  que a  Microsoft  estivesse envolvida nas  demandas  da SCO 

(como   muito   da   imprensa   especializada   aventou   na   época)108,   mas   o   movimento   foi 

providencial e com um bom senso de oportunidade a Microsoft rapidamente licenciou o 

código fonte e patentes do UNIX da SCO com o objetivo declarado de deixar claro que a 

"Microsoft respects legitimate licenses, and Microsoft took that license (from SCO)." 

106 Detalhes sobre o andamento do processo, seus desdobramentos e outras questões de Propriedade Intelectual podem ser acompanhadas no site <http://www.groklaw.net>. Mas cabe apontar que até o momento (julho de 2006) a SCO falhou em todas as oportunidades de demonstrar onde e quais de suas patentes teriam sido infringidas, encaminhando o processo para um vitória quase certa da IBM, de forma que em geral a imprensa especializada da indústria já raramente menciona os desdobramentos do processo.107 SHANKLAND, Stephen. SCO suits target two big Linux users : CNET News.com. Mar. 2004. Disponível em   <http://news.com.com/2100­1014­5168921.html>.     Acesso   em:   18   abr.   2006LYMAN, Jay. SCO Sues DaimlerChrysler, AutoZone : www.TechNewsWorld.com / LinuxInsider. mar. 2004. Disponível em <http://www.linuxinsider.com/story/33031.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.108 SHANKLAND, Stephen. Fact and fiction in the Microsoft­SCO relationship : CNET News.com / ZDNet News. Nov. 2004. Disponível em <http://news.zdnet.com/2100­3513_22­5450515.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.

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O efeito colateral deste licenciamento foi,  além de um reforço na política de FUD, 

alguma   injeção   de   fundos   no   caixa   da   SCO   que   vinha   apresentando   balanços 

sucessivamente negativos, e que após a divulgação do acordo viu suas ações subirem quase 

38%109. Estes aportes de fundos deram à SCO fôlego para seguir com os processos.

Assim,   a   questão   principal   da   argumentação   desenvolvida   no   capítulo   sobre   a 

propriedade das idéias, é novamente colocada, agora no mundo dos sistemas operacionais. 

Já  que o Linux não pode ser comprado, apropriado, ou diretamente processado, pode­se 

utilizar o sistema de proteção intelectual estabelecido, o sistema de patentes, contra os seus 

desenvolvedores e até contra os seus usuários. O raciocínio é linear: na impossibilidade de o 

superar, destruir ou assimilar, resta a possibilidade de o proibir.

Assim, se em um primeiro momento, possivelmente pega de surpresa com o veloz 

crescimento do Linux, a estratégia defensiva da Microsoft foi a de rotular o Linux como 

brinquedo e depois como algo anti­americano, uma nova possibilidade de barrar o avanço 

do concorrente (e dos Softwares Livres em geral) passa a ser a possibilidade de valer­se do 

sistema legal norte americano. Tendo sido tantas vezes arrastada as barras do tribunal por 

concorrentes, consumidores e órgãos governamentais ao redor do globo, a idéia até que faz 

bastante sentido. 

Em 2004 Ballmer, falando a líderes asiáticos, mencionou, de passagem, um estudo do 

qual ficara sabendo, onde o Linux estaria violando mais de 200 patentes110, algumas delas 

da   Microsoft,   e   claro,   eles   (a   Microsoft)   “deviam   algum   tipo   de   estratégia   a   seus  

acionistas”. Depois, com a repercussão que encontraram na Internet, os comentários foram 

oficialmente   desmentidos   pela   Microsoft,   que   alegou   uma   interpretação   errônea   das 

palavras  de   seu  presidente   executivo.  Contudo,  desde  a  ação  da  SCO  contra  a   IBM,  a 

109 LaMONICA, Martin. RICCIUTI, Mike. Microsoft sends message with Unix deal : CNET News.com. Mai. 2003. Disponível em <http://news.zdnet.com/2100­3513_22­1007715.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.  Microsoft   Licenses   Unix   From   SCO   :   Wired   News.   Mai.   2003.   Disponível   em: <http://www.wired.com/news/business/0,1367,58904,00.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.110  KERNER,   Sean   Michael.   Linux's   Patent   Risk.   :   InternetNews.   Ago.   2004.   Disponível   em: <http://www.internetnews.com/dev­news/article.php/3389071>. Acesso em: 18 abr. 2006.   VAUGHAN­NICHOLS, Steven J. Author of Linux Patent Study Says Ballmer Got It Wrong. : Eweek.com. Nov.   2004.   Disponível   em:   <http://www.eweek.com/article2/0,1759,1729908,00.asp>.   Acesso   em:   18   abr. 2006. FOLEY, Mary Jo. Is Microsoft Rattling the Linux­Patent Sabers? : Eweek.com. Nov. 2004. Disponível em: <http://www.microsoft­watch.com/article2/0,1995,1729352,00.asp>. Acesso em: 18 abr. 2006.

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questão das patentes vem sendo a principal ameaça ao Linux, dando inclusive origem a um 

movimento contrário à  aprovação de leis que regulamentem patentes de  softwares  – que 

seriam em última análise, patentes de idéias. 

É   oportuno   lembrar   que   foram   justamente   patentes   de  softwares  e   acusações   de 

pirataria   que   que   ajudaram   a   derrubar   a   Política   Nacional   de   Informática,   durante   a 

redemocratização do Brasil, como será  melhor elaborado na segunda metade do capítulo 

quatro111.

A leitura dos documentos oficiais da Microsoft, mantidos em seu site de relações com 

os   investidores   permite   traçar   a   mudança   que   se   processou   na   cultura   da   empresa   em 

relação à ameaça do Linux e dos Softwares Abertos.

Em   julho   de   2003   Bill   Gates,   em   um   encontro   com   analistas   financeiros, 

comentando o processo da SCO dava como certo que a propriedade intelectual da Microsoft 

e  de muitas  outras empresas  estava sendo utilizada e  clonada pelo  movimento do  Open 

Source:  

“BILL GATES: 

Certamente   não   há   duvida   que,   particularmente   em   algumas   das  

atividade   mais   clonadoras,   propriedade   intelectual   de   muitas,   muitas  

empresas,   incluindo   a   Microsoft,   está   sendo   usado   no   software   Open 

Source.   É   em   geral   quando   as   pessoas   clonam   coisas   que   isso 

freqüentemente se torna inevitável. O processo da SCO, é realmente – você  

fez um comentário sobre este assunto, que está  largamente relacionado, ou  

existem aspectos dele que são únicos a eles, porque eles se relacionam com  

marcas registradas e copyright.”112 

111  Sobre este tema ver: COSTA MARQUES, Ivan da.  Cloning Computers: From Rigths of Possession to Rigths of Creation.  In:  Science as Culture.  Routledge, Jun. 2005. Vol.  14,  No. 2,  139­160. e   SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto desenvolvimentista  na formulação   duma   política   nacional   de   informática   para   o   Brasil   (1971­1992).  1994.   280f.   Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo.112  Financial  Analyst Meeting ­ Executive Q&A  :  MSFT Investor Relations.  24 Jul. 2003. Disponível em: <https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/ExecQAFAM2003.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006.

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Um assunto, sem dúvida, palpitante, retomado por Steve Ballmer na mesma reunião, 

agora com ênfase  no aspecto da clonagem:

“Existe um item crítico: Irá  o software – e irá  TI, você pode dizer em 

geral, mas eu vou falar apenas do preço do software – irá o software ser um  

negócio   de   inovação   e   valor,   ou   irá   ele   ser   um   negócio   que   se   torna 

comoditizado? E ele  é   comoditizado por  clones,  ele  é   comoditizado por 

custos menores, ou alternativas com custo menor do que aquelas que os  

vendedores comerciais produzem. E essa é a questão”113.

Determinar os termos em que se dará  a discussão é, como se sabe, ter metade da 

discussão ganha, se Steve Ballmer é famoso no mundo da tecnologia por seu temperamento 

explosivo, estilo performático, personalidade intempestiva e pelo hábito de falar em alto e 

bom som o que lhe vem à mente, podemos dizer que com certeza se trata de um homem que 

sabe escolher bem as palavras. Ao opor a “comoditização” como diz, à “inovação e valor” 

Ballmer   sugere  que  o  software  proprietário  é  o  único  capaz  de   inovar  e  entregar  valor, 

justamente   por   seu   aspecto   comercial,   ao   contrário   do  Software   Livre,   que   estaria 

transformando a indústria de softwares em uma indústria de commodities. Quando Ballmer 

coloca o Software Livre na categoria de commoditie, a interpretação possível é a seguinte: 

um produto de baixo valor agregado, com pouca industrialização, que portanto mantidas as 

condições mínimas de qualidade pode ser adquirido de qualquer produtor (ou distribuição, 

no caso do Linux) utilizando­se apenas o critério do menor preço.

Os  dois  discursos  acima   também deixam  claro,  que  a  esta  altura,   tanto  Ballmer 

quanto Gates se esqueceram completamente (ou convenientemente) do acordo firmado com 

John   Sculley   em   meados   dos   anos   80,   e   do   subsequente   processo  da  Apple   em   1993, 

acusando a Microsoft de ter clonado sua interface gráfica.

113 Financial Analyst Meeting ­ Changing the World with Software : MSFT Investor Relations. 24 Jul. 2003. Disponível em: <https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/BallmerFAM2003.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006

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Ballmer continua explicitando que o problema da “comoditização” do software não 

afeta apenas a Microsoft, mas toda indústria de tecnologia, inclusive seus principais rivais, 

pois para Ballmer o Software Livre é um obstáculo à inovação:

“Não  é uma questão  apenas na Microsoft. Deveria ser uma questão  

na Oracle; deveria ser uma questão até de caras como a SAP. Continuará  o  

software a ser uma área na qual inovação cria valor, inovação é protegida  

por um período de tempo, cria valor, cria novos cenários consumidores, é  

capaz de atrair  pessoas  para  gastar  dinheiro?  Este  é  o   tipo de  cenário  

competitivo de alto nível”114.

A conclusão de Ballmer aponta inevitavelmente o vilão que ameaça a continuidade 

da indústria de tecnologia:

“Haverá   uma   competição   maior   no   negócio   de   softwares   para   o 

mundo como um todo? Será  o negócio de software maior daqui a cinco  

anos do que ele é hoje? Ou irá  o trabalho gratuito das pessoas ser tão bom 

quanto a inovação e valor que as empresas comerciais criam? Então esse é  

o diálogo Numero Um aqui. E as pessoas dizem, “Ok, eu entendi. Isso é  

sobre Open Source. Isso é sobre software não comercial. Blá,  blá,  blá.  Isso  

é sobre Linux."115

E novamente a escolha de palavras de Ballmer é  feita sob­medida para transmitir 

mais  do  que  o  que  está  dito  de   forma  direta.  A   idéia  de  um modelo  de  software  “não 

comercial” coloca o Linux e seus pares do Software Livre fora da indústria de tecnologia. É 

muito bem pensado identificar estes  softwares  como não comerciais,  o não comercial se 

ajusta como uma luva às idéias anteriores da Microsoft sobre o Software Livre, ou seja:

Não comercial é algo fora do mercado, um brinquedo; não comercial é comunista; 

não comercial  é  grátis  e  não gera  renda  ou  arrecadação;  não comercial  é  a   infração da 

propriedade intelectual, enfim, não comercial é um termo carregado de preconceito e que 

114 idem.115 idem.

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será comum nas declarações, entrevistas e documentos da Microsoft e seus executivos deste 

momento em diante, o  Software Livre, em inglês, é uma expressão que vem carregada de 

promessas de liberdade e transparência, portanto, algo a ser evitado.

Outro   executivo   da   empresa,  John   Connors116,   no   mesmo   encontro   repete   a 

fraseologia de Ballmer referindo­se ao Linux como software não comercial: 

“Eu gostaria de reiterar os fatores de risco que são muito importante  

para   as   pessoas   gerenciando   dinheiro.   Primeiro   de   tudo,   o   ambiente 

econômico.   Nós   falamos   sobre   o   fato   de   que   não   antecipamos   que   a  

economia melhore radicalmente por todo o mundo  mas nós  também não  

esperamos que ela decline de forma mensurável. 

Segundo,   Linux   e   software   não   comercial:   Nós   temos   mostrado   a  

vocês o que nós pensamos ser a cota de ganho do Linux para 04. Se o Linux  

ganhar   uma   fatia   no   desktop,   isso   é   um   impacto   para   nós.   Se   nós  

executarmos bem, nós atenuamos o risco.”117

Além   da   harmonização   do   discurso,   o   ano   de   2003   trouxe   para   a   Microsoft   a 

consolidação pétrea do Linux como um concorrente que deveria ser levado a sério em todas 

as   frentes,   agora   menções   ao   Linux,  Software  Livre  e  software  “não   comercial”   serão 

constantes na documentação da empresa; em novembro, no encontro de acionistas, Ballmer 

volta a deixar claro o quanto o assunto Linux subiu na escala de prioridades de Redmond.

“STEVE   BALLMER:  Nós   não   somos   nada   sem   competição.   John  

enfatizou o fato que cada um dos nossos negócios tem bons competidores  

neles,   e   nós   certamente   sentimos   que   nós   temos   intensa   competição   a  

qualquer hora, ao menos nos meus 23 anos com a Microsoft. Nós temos 

alguns   competidores   únicos   que   tem   emergido   nos   últimos   anos,  

competição   vindo   do   assim   chamado   software   não   comercial,   que   é  

116 Microsoft Senior Vice President, Finance and Administration, Chief Financial Officer117 Financial Analyst Meeting ­ Financial Update  : MSFT Investor Relations. 24 Jul. 2003. Disponível em: <https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/ConnorsFAM2003.mspx>. Acesso em: 29 abr.  2006

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disponibilizado   por   comunidades   de   pessoas   trabalhando   em   uma   base 

voluntária sem custo pela Internet. 

Nós acreditamos que temos um bom plano,  um plano que nos vai  

permitir inovar e entregar valor que exceda aquele que vem de softwares  

não comerciais. Mas eu tenho que lhe contar, sempre que alguém diz não  

ter  custo inicial  de aquisição,  ou seja,  que é  gratuito,   isso atraí  muita  

atenção. 

E   então   realmente  ajudando   as   pessoas   a   entender   por   que   nós  

acreditamos   oferecer   um   melhor   valor   total   e   melhor   custo   total  é  

certamente um desafio que todos nós no nosso time de gerência estamos  

encampando,   e   um   desafio   onde   nós   sabemos   que   necessitaremos   foco  

afiado como uma lâmina para ter êxito.”118

Os quatro trechos destacados em negrito, sintetizam pontos importantes do que a 

Microsoft já havia concluído sobre o Linux e sobre quais seriam os passos da empresa para 

enfrentar a competição no ano seguinte.

O primeiro destaque já foi apontado, trata da definitiva mudança do Linux para o 

centro  das  atenções  na  Microsoft,  agora  considerado como um concorrente  “único”  por 

suas característica, e  (terceiro destaque) a repetição daquilo que Ballmer aponta como o 

grande diferencial do Linux: o preço (algo que mencionara em 2002, vide nota 105).

O segundo destaque é a declaração de que a empresa já elaborou uma estratégia de 

combate ao inimigo, que se liga ao quarto destaque, que é na verdade um vislumbre desta 

estratégia:  Ballmer  propõe  ajudar  as  pessoas  a  perceberem como o custo  do produto da 

Microsoft é, de fato, mais vantajoso. Este é um conceito inusitado, que ainda será melhor 

explorado neste texto.

118 Microsoft Corporation 2003 Shareholder Meeting  : MSFT Investor Relations. 11 Nov. 2003. Disponível em: <https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/shareholdermeeting03.mspx>. Acesso em: 29 abr.  2006

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Seis dias mais tarde outro executivo da Microsoft, Jeff Raikes119,  surgia com uma 

idéia parecida, embora agora já um pouco mais elaborada:

“JEFF RAIKES:  (...)  nós pensamos sobre o Linux e a alternativa  

Open Source como sendo um importante fator no mercado. Agora, serão  

eles   hoje   um   fator   importante   em   termos   de   share   atual?   Não,  

provavelmente não, mas eu acho que você sabe que o software comercial é  

muito mais do que gorjetas e isso é algo que temos que pensar a respeito. 

Qual é nossa estratégia? Nossa estratégia é ter certeza de que criamos  

o melhor custo total de propriedade, e eu penso que na maioria dos casos  

nós estaremos aptos a ter custos totais de propriedade menores quando você  

considera o espectro do custo total.

Muitas pessoas ouvem sobre o governo de uma cidade, um governo na  

Alemanha120 buscando o Linux como uma alternativa. Esse é um importante  

pensamento para concluirmos e entendermos o que nós deveríamos ter feito  

diferentemente. (...) então o levamos muito seriamente”.121

Assim, a Microsoft vai dando forma ao conceito de “custo total de propriedade”, 

com  o  qual  pretende  demonstrar  ao  mercado  que   seus  softwares  são,  na  verdade,  mais 

baratos   do   que   os  Softwares  Livres.   Outro   destaque   é   a   intensificação   da   pressão   de 

governos ao redor do mundo na adoção do Software Livre, postura que será cada vez mais 

difundida.

No final  do ano,  em sua  tradicional  carta  aos acionistas a  Microsoft   resume sua 

posição sobre o Linux e delineia a estratégia a ser seguida: 

“(...)  Algumas organizações migrando do UNIX estão  considerando 

software não comercial como Linux e OpenOffice. Enquanto o custo inicial  

119 Microsoft Group VP, Productivity and Business Services120 Jeff está falando da cidade de Munich.121  Bear Stearns Trek to COMDEX Conference  :  MSFT Investor Relations.  17 Nov. 2003. Disponível em: <https://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/raikes1117comdex.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006

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de aquisição  de sistema operacional simplificado, faça você mesmo possa  

parecer   atraente,   um   conjunto   crescente   de   pesquisas   independentes,  

mostram   que   nossa   plataforma   integrada   fornece   não   apenas   melhor  

funcionalidade, mas também menor custo total de propriedade nas funções  

mais comuns nos negócios.

(...) Contudo, Linux e outros softwares não comerciais apresentam um  

desafio, e nós não somos complacentes. Nós estamos trabalhando duro para  

assegurar que nossos produtos e serviços continuem a melhorar e atender  

demandas   dos   consumidores   por   valor.   Nós   estamos   comprometidos   a  

ultrapassar as expectativas do consumidor por produtos confiáveis, seguros,  

e com excelência em engenharia.”122 

Não é  demais notar a observação pejorativa sobre o Linux  “stripped­down, do­it­

yourself operating system”, ou “sistema operacional simplificado, faça você  mesmo”, um 

comentário que dificilmente encontraria eco em um administrador de sistemas da época que 

tenha tido oportunidade de trabalhar com os dois sistemas. Pode­se sem dúvida atribuir ao 

Linux de então o rótulo do “faça você mesmo”, mas considerar isto algo bom ou ruim, é 

questão de opinião, e pode, na verdade, ser dito até mesmo do Linux atual. Mas classificar o 

Linux, herdeiro do UNIX de “sistema operacional simplificado” estampa perplexidade no 

rosto  de  um   técnico  que  conheça  os  dois   sistemas.  O  ponto  nevrálgico  desta  carta  aos 

acionistas é a informação de que “um crescente corpo de pesquisas independentes” estaria 

mostrando   a   maior   funcionalidade   e   menor   custo   total   de   propriedade   das   soluções 

Windows da Microsoft,  este é  o  tom da fase seguinte do combate entre  o Windows e o 

Linux. 

A organização do pensamento e do discurso da Microsoft  acompanhado até  aqui 

desemboca   no   que   seria   sua   evolução   natural,   o   lançamento   em   janeiro   de   2004,   da 

campanha   publicitária   “Get   the   Facts”.   Voltada   aos   administradores   de   sistemas   e 

122  MSFT Annual  Report  2003 Letter   to  Shareholders   :  MSFT Investor  Relations.  2003.  Disponível  em: <http://www.microsoft.com/msft/reports/ar03/alt/brazil.htm>   (português)   e <http://www.microsoft.com/msft/reports/ar03/alt/letter.htm> (inglês). Acesso em: 29 abr. 2006

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profissionais de TI em geral a campanha, que contava com mídia impressa, anúncios em 

sites de tecnologia e até seu próprio site123, veiculava “estudos”  comparando os custos entre 

a  adoção do Linux e  do Windows,  chegando invariavelmente à  conclusão sobre o custo 

superior do Linux.

Esta campanha marcou uma mudança de posição da Microsoft em relação ao Linux, 

se inicialmente o foco era desacreditar o concorrente com preconceitos, agora pretendia­se 

desacreditar o concorrente com “fatos”. Não que as prática anteriores de FUD estivessem 

totalmente desautorizadas, especialmente no que tange à propriedade intelectual, a ameaça 

mais   relevante   recebida   pela   comunidade   do   Linux,   como   discursava   o   executivo   da 

Microsoft John Connors em janeiro para analistas financeiros:

“Quando   você   pensa   sobre   financiar   novos   programas,   nós  

adicionamos mais de 300 pessoas esse ano no setor publico,   tanto para 

propósitos de política publica e para evangelização e vendas em nas arenas  

acadêmicas e do governo, onde o desafio Open Source é o mais forte.

(...) Open Source continua sendo uma ameaça para nós porque somos  

a   maior   empresa   de   software   no   mundo   que   ganha   dinheiro   vendendo 

software, mas é uma ameaça para qualquer um que licencia IP (Intellectual 

Property) e são pagos pelo software. É uma ameaça se você é a Oracle no  

espaço de banco de dados. É uma ameaça se você é a IMB e você vende  

software.”124 

Menos  de  um mês  depois,  o  mesmo executivo  estava  em um simpósio  onde   foi 

inquirido sobre como via os riscos representados pela tentativa da China, Coréia do Sul e 

Japão em desenvolver sua própria versão do Linux, já que aparentemente o objetivo deste 

desenvolvimento seria dar condições para o desenvolvimento de uma indústria de softwares 

local, baseada em um sistema operacional próprio. A mesma pergunta englobava o Estado 

123http://www.microsoft.com/windowsserver/facts/default.mspx ou http://www.microsoft.com/windowsserversystem/facts/default.mspx124 John Connors, CFO, Presentation to Financial Analysts in Boston : MSFT Investor Relations. 27 Jan. 2004. Disponível   em:   <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/Connors0127Boston.mspx>.   Acesso   em:   29 abr. 2006

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americano   de   Massachusetts,   que   fazia   movimentos   semelhantes,   e   embora   não   tenha 

mencionado   o   Brasil,   poderia,   já   que   o   país   também   havia   se   engajado   no   mesmo 

movimento.

Ao que parece esta é um pergunta sem resposta satisfatória, pois embora tenha sido 

respondida com objetividade por  Connors,  os  trechos destacados em negrito na resposta 

abaixo, deixam claro que  a visão da Microsoft só consegue contemplar o desenvolvimento 

da   indústria   de  softwares  da   cada   um   destes   países   subordinada   ao   seu   próprio 

desenvolvimento.  A  inovação da própria  Microsoft  é  a   inovação possível  para  os  países 

submetidos, situação da qual a empresa tem aparente consciência, e que pretende manter.

É   instigante   notar   que   Connors,   em   sua   resposta,   apresenta   a   dependência 

tecnológica de um sistema operacional alienígena, como um cenário positivo para os países 

que anseiam em desenvolver sua indústria de softwares, ainda que não lhes seja permitido 

produzir inovação localmente. 

“JOHN CONNORS: Bem, primeiro de tudo, é meio estranho ter um 

estado nos Estado Unidos no mix que você menciona, mas isso é o que é.

Se você  olhar para a companhia e o que nós tentamos fazer, temos 

tentado ser muito claros que Linux é um competidor e um desafio para a  

Microsoft. Temos também sido muito claros que o Open Source e modelos  

de software gratuitos são uma ameaça para todos os vendedores de software 

comercial.  Visto   que  obtemos  o  maior   lucro  que  qualquer   vendedor  de  

software comercial, nossa ameaça é maior. Mas é uma ameaça para todos.

De muitos modos você  pode ver e  dizer o  que os  governantes na 

maioria dos países estão  propondo é  que eles desenvolvam sua própria 

indústria de software.  Você  poderia dizer, bem, nossa, pode ser que eles  

estejam desenvolvendo sua própria versão  do UNIX. Mas eu penso que a  

coisa   chave   é   que   eles   estão   tentando   desenvolver   uma   indústria   de  

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software,   e   desenvolver   uma   área   onde   postos   de   trabalho   possam   ser  

criados.

(...) A ponto de não sermos melhores, não importa se é um governo,  

não  importa se é  uma outra companhia, nós temos uma ameaça. Se nós  

somos melhores, então  nós temos que nos sentar com aqueles governos e  

aquelas entidades que têm uma visão  de que nós não  somos,  e explicar  

porque nós pensamos que nós somos melhores; mas, mais importante, quão  

crítico nosso papel tem sido em desenvolver suas economias de TI como  

elas existem hoje. 

A maioria dos estados durante o período de '99 a 2000, com o caso do  

DOJ (Department of Justice), ficam surpresos em saber quantas pessoas no  

seu   estado   realmente   desenvolvem,   distribuem   e   suportam   a   tecnologia  

Microsoft. Achamos que muitos países similarmente não estão conscientes  

do  quão  grande  um ecossistema de  pessoal   de  TI   existe   em  torno  da  

plataforma Microsoft  –  com quantos  clientes  nós   trabalhamos  de  seus  

países que recebem valor pela entrega de nossa inovação.  

E   assim   nós   temos   primeiro   e   principalmente,   a   fazer   um   ótimo  

trabalho em inovação.  Nós temos que fazer um ótimo trabalho em ambos,  

na venda e no lado do relacionamento.  E então  eu penso que a terceira  

coisa chave é nós termos que esperar que você veja as pessoas que vêem  

TI e a indústria do software como sendo oportunidades para seus países, e  

eles incentivarão a inovação local, e nós apenas temos que fazer um bom  

trabalho de agregar valor impedindo isto.”125

125 John Connors, CFO, Presentation at the Goldman Sachs Technology Investment : MSFT Investor Relations. 25   Fev.   2004.   Disponível   em:   <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/Connors0225GSTech.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006

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A questão do interesse dos governos pelo controle das ações do sistema operacional 

parece ser o maior calcanhar de Aquiles da estratégia da Microsoft, o modelo do software 

proprietário e estrangeiro não tem como superar as questões macroeconômicas que coloca, 

como a evasão de divisas, nem tampouco as questões da segurança das informações e da 

autonomia tecnológica.

Assim em 2004 a emergência do Linux já havia se convertido em um problema de 

grande relevo dentro da Microsoft e todos os executivos tinham os discursos alinhados na 

estratégia de se aterem aos “fatos”: 

JOHN  CONNORS   (25/02/2004)   :   “E  assim  me   deixe   explicar   um 

pouco  sobre  o  cenário  do  mercado.  Uma das   coisas  mais   interessantes  

sobre o Linux e o mundo Open Source é  a quantidade de hype e ruído,  

religião  e emoção  que  existe  quando você   está   tendo estas  discussões  e  

diálogos.  E assim o que eu gostaria de tentar  fazer é   talvez separar um 

pouco   do   ruído   da   realidade   e   deixa­los   saber   como   nós   vemos   o 

mercado.”126 

CURT ANDERSON (18/05/2004) : “Primeiro  os riscos: obviamente 

software não comercial é um risco para o nosso negócio. O software grátis  

pode ter um impacto em nosso modelo do negócio. E nós estamos pensando  

sobre como o que isso se pareceria. 

A maneira que nós combatemos o Linux e os Softwares não comerciais  

francamente  é   superando­os  na   inovação  e  nós  acreditamos  que  nossos  

produtos   ofereçam   mais   valor   ao   consumidor,   menor   custo   total   de  

propriedade   (TCO)   e   melhor   interoperabilidade   avançando,   e   esse   é  

realmente o nome do jogo, para nós é  continuar a investir e diferenciar  

126 Martin Taylor Presentation on Microsoft Platform Competitive Strategy : MSFT Investor Relations. 27 Fev. 2004.   Disponível   em:   <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/taylor022704.mspx>.   Acesso   em:   29 abr. 2006

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nossos   produtos   contra   o   Open   Source,   mais   isso   é   de   fato   um   risco  

importante.”127

KEVIN   JOHNSON   (30/11/2004):   “Deixe­me   ir   agora   de  

proporcionar satisfação  para ganhar consumidores e a questão  de como 

estamos   nos   saindo   contra   o   Linux.   Deixe­me   começar   enquadrando   a  

perspectiva de como o diálogo mudou com os clientes. Eu diria que três a  

quatro anos atrás, o diálogo em torno do Linux era muito mais um debate  

emocional sobre as metodologias de desenvolvimento de software do Open  

Source versus a metodologia do software comercial. Hoje, aquele diálogo se  

alterou para uma análise bastante lógica de valor do negócio.

(...)  Número um, custo total  de propriedade (TCO). Muitos clientes  

notaram que uma vez que software Open Source como o Linux tem um custo 

de   aquisição   de   software   de   zero,   que   ele   deve   ter   o   menor   custo   de  

propriedade (TCO). Contudo se você olhar os fatos, eles não  corroboram 

isto. Em nosso site, www.getthefacts.com, nós temos mais de 17 analistas da 

indústria e mais de 100 consumidores que passarm pela experiência de ou 

testar o Linux e descobrirem que o custo total de propriedade (TCO) era  

maior do que no Windows ou fazerem a análise.”128

E no final do ano, na carta anual aos acionistas,  assinada por Bill  Gates e Steve 

Ballmer, o esforço era apresentado:

“Ao longo do último ano, nós trabalhamos duro para comunicar aos 

consumidores sobre o valor único da plataforma Windows em comparação  

com   o   Linux   e   outros   softwares   open­source.   Inúmeros   analistas  

independentes reportaram que o Windows oferece um menor custo total de  

127  Curt Anderson Address to Institutional Investors at  Ragen MacKenzie Investment Conference : MSFT Investor   Relations.   18   Mai.   2004.   Disponível   em: <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/Anderson051804.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006128  Kevin Johnson (Group Vice President, Sales, Marketing, Services Group) at Credit Suisse First Boston Technology   Conference   :   MSFT   Investor   Relations.   30   Nov.   2004.   Disponível   em: <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/Johnson113004.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006

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propriedade   (TCO),   maior   segurança,   e   uma   proteção   mais   abrangente 

contra processos na justiça129.”130 

Em julho de 2005 o executivo da Microsoft Kevin Johnson131 oferecia no encontro 

dos analistas financeiros, um resumo da situação do combate contra o Linux e o Software 

Livre,   fornecendo   além   de   um   panorama   claro   da   atuação   da   Microsoft,   interessantes 

insights sobre o que reservaria o futuro para os mercados de países pobres como o Brasil. 

Esse assunto será tratado em maior detalhe no capítulo sobre a industrialização brasileira, 

quando esta apresentação de Johnson será novamente utilizada:

“(...)   Eu   vou   começar   com   mobilização.   Em   2003   nós   realmente  

focamos em como poderíamos contar nossa história e enviar a mensagem 

para deixar claro que há  uma clara proposição de valor no Windows versus 

Linux. A percepção que o Linux provê um menor custo de propriedade não é  

verdadeira (TCO). E assim Get the Facts visava ter análises terceirizadas132 

das   evidências   e   divulgar   amplamente   os   fatos.   Nósestamos   com   a 

campanha   Get   the   Facts   em   mais   de   50   países,   e   nós   continuamos   a  

acumular mais e mais evidências de analistas.

Em 2004, construímos com base nisto. (...) Nós agora temos mais de 

300 casos de estudo de consumidores, onde consumidores em cenários reais  

medindo perfomance, testaram o Linux, mediaram sua performance contra  

a plataforma Microsoft, e tomaram a decisão de que a plataforma Microsoft  

provê claro valor para eles.

129  N. do A. ­   No caso a expressão em inglês era  more comprehensive indemnification, mas optou­se por traduzir pelo sentido, já que é da proteção legal contra processos semelhantes ao da SCO a que Ballmer e Gates pretendem se referir.130 GATES, Bill (Chairman and Chief Software Architect). BALLMER, Steve A. (Chief Executive Officer) ­ MSFT Annual  Report   2004   ­   Letter   to   Shareholders   :  MSFT   Investor   Relations.   2004.   Disponível   em: <http://www.microsoft.com/msft/reports/ar04/flash/default.html>. Acesso em: 29 abr. 2006131  Group Vice President, Worldwide Sales, Marketing and Services Group132  N. do A. ­  O correto nesta  tradução seria “independentes” no lugar  de “terceirizados”,  mas a palavra acrescentaria um duplo sentido a frase que não existe no original em inglês.

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(...) Gartner acaba de divulgar um estudo que eles fizeram, eu acho,  

com uma grande instituição de serviços financeiros que avaliou o Linux no 

desktop.  E eles concluíram que o Windows não  apenas provê  um menor  

custo   de   propriedade   (TCO)   mas   que   também   os   custos   de   aquisição  

daquela   solução   Linux   eram   maiores   que   os   custos   de   aquisição   do  

Windows. Então mais e mais evidência surge suportando a proposição em 

torno de um menor custo de propriedade.”133 

O ano de 2006 está fora do período analisado neste texto, mas é muito importante, 

para   a   apreciação   dos   eventos   narrados   até   aqui,   deixar   registrado   que   foi   o   ano   de 

lançamento do website “Port 25”134, que marca uma nova postura da Microsoft em relação 

ao “não comercial”, Software Livre.

O Port 25 agrega os esforços da Microsoft no universo do Software Livre, e aborda 

muito a interoperabilidade do Windows, Unix e Linux, configurando um reconhecimento 

do Linux pela Microsoft como um player do mercado, um sistema com o qual, a despeito 

dos   esforços   empreendidos   até   aqui,   terminou­se   por   chegar   à   conclusão   que   será 

necessário estabelecer uma convivência. 

O nome Port 25 se refere à porta de um servidor usualmente utilizada pra o tráfico 

de emails SMTP, uma vez que o site é  a tentativa da Microsoft de se comunicar com a 

comunidade   do  Software  Livre.   O   site   é   mantido   pelo  Open  Source  Software  Lab  da 

Microsoft, dirigido por Bill Hilf, um antigo militante do Linux, ex­empregado da IBM e 

agora gerente geral de estratégia da Microsoft para o Software Livre. 

É claro, há o sempre um outro lado, e lá do outro lado as comunidades do Linux e 

do   Software Livre não assistiram pacificamente aos ataques da Microsoft e, de fato, seria 

muito difícil determinar qual lado atirou a primeira pedra.

A   postura   religiosa   tantas   vezes   mencionadas   pelos   executivos   da   Microsft   nas 

citações anteriores refere­se a um posicionamento bastante radical e quase generalizado da 

comunidade contra a Microsoft. É comum encontrar nas listas de discussão, fóruns, posts e 133  Financial   Analyst   Meeting   2005   :   MSFT   Investor   Relations.   28   Jul.   2005.   Disponível   em: <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY05/JohnsonFAM2005.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006134 http://port25.technet.com

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comentários de blogs, sites e correntes de e­mail todo tipo de críticas e comentários jocosos 

contra a Microsoft. As frases mais comuns referem­se à Microsoft como “the evil empire” 

e “dark side of the force”, a Bill Gates como “Darth Gates”, todas referências aos vilões 

da série Guerra nas Estrelas (Star Wars). Também é comum que a Microsoft seja referida 

como “The Borg” em referência aos alienígenas da série de cinema e televisão Jornada nas 

Estrelas   (Star Trek),  a  crítica  aqui  se  dá  pela  característica  dos  Borgs  de  “assimilarem” 

outras formas de vida em uma única consciência coletiva, e pelo bordão sempre repetido 

pelos alienígenas:  “resistance is futile”, duas referências ao comportamento da Microsoft 

no mercado. Esta última crítica é tão recorrente que no site Slashdot, um portal de notícias 

fundado em 1997 e um dos redutos das comunidades Linux e do Software Livre, as notícias 

referentes a Microsoft vêm acompanhadas por um ícone de Bill Gates,  transfigurado em 

“borg”.

O que se pode dizer sobre os dois lados da contenda é  que se a Microsoft trata o 

Linux   inicialmente   como  um   brinquedo  para   estudantes,   depois   como   um   câncer   anti­

capitalista,   depois  um   inimigo,   até  que   tenta  mostrar  os  “fatos”  e   termina  admitindo  a 

concorrência, do outro, a comunidade do Software Livre em geral e do Linux em especial, 

tratam a Microsoft de forma bem mais constante e consistente135.

Em quase todas as suas manifestações a Microsoft é  retratada como o império do 

mal, sem muitas concessões, e coube à Red Hat em 2005, possivelmente pela pressão que 

sofreu com campanha Get The Facts da Microsoft, sendo a maior distribuidora de soluções 

Linux   da   América   do   Norte,   responder   com   outra   campanha   publicitária,   que   parece 

traduzir o espírito da comunidade Linux de maneira fidedigna.

A campanha “Truth Happens”, ou “A Verdade Acontece” é sintetizada desta forma:

“Através   da   história,   novas   tecnologias   enfrentaram   resistência 

daqueles  que  diziam que não  poderia ser   feito.  Ainda assim,  apesar  da  

oposição,  tempo e de novo o impossível é   feito possível por aqueles com 

135  Sobre  a   imagem da  Microsoft  e  sua  representação na  cultura  de  massas  ver:  SOUZA F.,  Rubens A. Menezes. Percepção e imagem da informática. In: XXII Simpósio Nacional de História ­ História: Guerra e Paz,   2005,   Londrina.   XXII   Simpósio   Nacional   de   História   ­   História:   Guerra   e   Paz.   Londrina,   PR   : Associação Nacional de História ANPUH / Editorial Midia., 2005.

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Page 84: Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico:  Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

determinação e visão.  Nós acreditamos que o open source é uma maneira  

melhor.   Uma   maneia   melhor   de   desenvolver   tecnologia   e   uma   maneira  

melhor de a tornar acessível. E ainda que existam aqueles que ignoraram o  

open   source   ou   alegassem   que   não   funcionaria   ou   alegassem   que   não  

duraria, nós acreditamos que a verdade acontece.”136

Realizar o impossível com determinação e visão dão bem o tom messiânico que por 

vezes o Software Livre e o Linux adotam, e são exatamente as variações desta postura, em 

maior  ou  menor  grau,  que  a  Microsoft  pretendeu  combater  com com sua  campanha  de 

“fatos”.

A Red Hat por sua vez, tem sua peça publicitária principal em um vídeo137 que pode 

ser dividido em duas partes, na primeira ele é genérico e trata da evolução tecnológica geral 

da   humanidade,   apresentando   cenas   dos   primórdios   da   aviação,   do   automóvel,   do 

fonógrafo, alternadas com imagens de células, animais e microscópios, dando um “ar de 

tecnologia”   às   imagens.   Sua   estrutura   consiste   em   imagens,   vídeos   ou   fotos   de   época, 

contrastando com frases que são colocadas sobre as imagens e que expõem o ridículo de 

certas previsões do futuro. 

Na segunda parte mantém­se a linguagem, mas se concentra no caso específico do 

Linux,   onde   acontece   o   ponto   alto   do   vídeo,   uma   frase   de   Gandhi,   entrecortada   com 

declarações sobre o Linux, concluindo que se estaria vivendo o último estágio, o estágio da 

vitória. A transcrição abaixo ajudará a compreensão da peça publicitária.

O MUNDO É PLANO

A TERRA É O CENTRO DO UNIVERSO

[FATO] ATÉ PROVA EM CONTRÁRIO

APESAR DA IGNORÂNCIA

APESAR DO RIDÍCULO

APESAR DA OPOSIÇÃO

A VERDADE ACONTECE

APESAR DA IGNORÂNCIA

O   TELEFONE   TEM   MUITAS   LIMITAÇÕES 

PARA   SER   SERIAMENTE   CONSIDERADO   COMO 

UM MEIO DE COMUNICAÇÕES

WESTERN UNION [1876]

136 http://www.redhat.com/magazine/008jun05/features/truth_happens/137 http://www.redhat.com/truthhappens/

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EM   [1899]   O   ESCRITÓRIO   NORTE­

AMERICANO DE PATENTES DECLAROU, TUDO O 

QUE PODE SER INVENTADO JÁ FOI INVENTADO

APESAR DO RIDÍCULO

O FONÓGRAFO NÃO TÊM NENHUM VALOR 

COMERCIAL

THOMAS EDISON [1880]

A LOUCURA DO RÁDIO VAI MORRER LOGO

THOMAS EDISON [1922]

O AUTOMÓVEL PRATICAMENTE ATINGIU O 

LIMITE DO SEU DESENVOLVIMENTO

SCIENTIFIC AMERICAN [1909]

APESAR DA OPOSIÇÃO

APESAR DISTO TUDO

A VERDADE ACONTECE

O HOMEM NÃO IRÁ VOAR POR CINQUENTA 

ANOS

ORVILLE WRIGTH [1901]

UM   FOGUETE   NUNCA   IRÁ   DEIXAR   A 

ATMOSFERA DA TERRA

NEW YORK TIMES [1936]

HÁ UM MERCADO MUNDIAL PARA TALVEZ 

CINCO COMPUTADORES

THOMAS WATSON DA IBM [1943]

640K   DEVEM   SER   O   BASTANTE   PARA 

QUALQUER UM

BILL GATES [1981]

PRIMEIR ELES IGNORAM VOCÊ...

LINUX É O HYPE DU JOUR

GARTNER GROUP [1999]

ENTÃO ELES RIEM DE VOCÊ...

NÓS   PENSAMOS   NO   LINUX   COMO   UM 

COMPETIDOR NO MERCADO DOS ESTUDANTES E 

AFICCIONADOS   MAS   EU   REALMENTE   NÃO 

PENSO QUE NO MERCADO COMERCIAL NÓS O 

VEJAMOS DE QUALQUER FORMA SIGNIFICATIVA

BILL GATES [2001]

ENTÃO ELES LUTAM CONTRA VOCÊ...

LINUX NÃO VAI DESAPARECER

LINUX É UM COMPETIDOR SÉRIO

NÓS VAMOS ENFRENTAR ESTE DESAFIO

STEVE BALLMER [2003]

ENTÃO VOCÊ VENCE... 

PRIMEIRO ELES IGNORAM VOCÊ...

ENTÃO ELES RIEM DE VOCÊ...

ENTÃO ELES LUTAM CONTRA VOCÊ...

ENTÃO VOCÊ VENCE... 

MOHANDAS GANDHI 

VOCÊ ESTÁ AQUI

"First  they  ignore you,  then  they  laugh at you,  then  they  fight you,  then you win", 

Mohandas Karamchand Gandhi, o “Mahatma138 Gandhi”, utilizou esta frase para descrever 

a  luta de independêcia do sub­continente indiano sob o jugo colonial britânico. 

138 O termo “mahatma” pode ser traduzido como “grande alma”.

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Uma luta que poderia ser caracterizada como uma história de Davi e Golias, onde os 

ingleses, tal como o Golias bíblico, apesar da desproporção das forças e da percepção óbvia 

de que eram inimigos formidáveis, possivelmente invencíveis e contra os quais nada valia 

lutar, perderam.

A   imagem   bíblica   associada   ao   parágrafo   anterior   vem   no   socorro   de   ampliar   a 

compreensão da auto­imagem que parte das comunidades do Linux e Software Livre fazem 

de suas atividades. 

A comparação lateral da Microsoft ao poderoso império britânico, que apesar de tudo 

foi   derrotado   pelo   movimento   de   independência   indiano,   esbarra   novamente   no   tom 

messiânico mencionado acima, apontando para a crença da inevitabilidade da vitória.

O fato do movimento do  Software Livre  ter  se  espalhado pelo planeta, ganhando 

grande torque com a adoção por governos ao redor do mundo – com destaque para o caso 

brasileiro – e ter também contado com a adesão de grandes companhias de  software  que 

competiam com a Microsoft em um ou mais produtos, só faz aumentar a certeza da vitória.

Portanto dos discursos de Ballmer ao vídeo da Red Hat, é possível constatar como 

os dois lados competem, como já foi dito, por corações e mentes de usuários, empresas e 

governos.

 3.7. Considerações Sobre a Natureza da Informática e a Autodeterminação Tecnológica 

A   importância   da   cronologia   de   eventos   narrada   até   aqui   reside   no   que   se   pode 

encontrar   quando   os   discursos   dos   dois   grupos   são   analisados.   Organizando­os   na 

cronologia do tempo histórico transparece a luta pelo poder, que está o tempo todo presente 

e atuando nos caminhos do desenvolvimento tecnológico. 

Desqualificar   uma   dada   tecnologia   é   também   qualificar   outra,   no   combate   entre 

softwares livres e softwares proprietários, o que se almeja conquistar são os caminhos que 

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ainda serão percorridos pela tecnologia, ou como definiu Sérgio Amadeu, então presidente 

do ITI: “O que está em disputa é o futuro, não o presente”139.

Ainda que seja recorrente encontrar profetas pregando o contrário, o futuro não está 

dado   e   não   é   certo,   sendo   já   isto   razão   suficiente   para   que   o   raciocínio   economicista 

determinista dominante deva ser contestado. Mesmo diante do imponderável, a resistência 

existe   e   acontece   de   forma   vibrante,   oscilando   entre   o   heróico   e   o   quixotesco,   muitas 

resistências ocorrem como lutas de apropriação; desta forma as populações não se deixam 

levar e praticam sim diversas formas de resistência, até mesmo a apropriação da tecnologia.

Sem o objetivo de fazer análises de mérito quanto à qualidade de cada tecnologia, é 

possível evidenciar que existem rachaduras no atual raciocínio economicista dominante e 

que   a   tecnologia   não   contém   apenas   a   componente   técnica,   sendo   também   política   e 

ideológica, mesmo em campos onde isso não transpareceria em um primeiro olhar, como 

nos sistemas operacionais de computadores.

O conceito que apresentaremos a seguir é original do pesquisador e “evangelista” do 

movimento  do  Software  Livre140,  Eric  S.  Raymond,  conforme  apresentado  em  seu   livro 

"The Cathedral & the Bazaar141".

Baseado em sua observação do kernel142 do Linux e no processo de desenvolvimento 

do software fetchmail, em a Catedral e o Bazar143, Raymond apresenta duas metodologias de 

desenvolvimento de software aberto radicalmente diferentes e por vezes quase antagônicas: 

o modelo da catedral, onde o código fonte está disponível juntamente com o lançamento do 

software,   mas   somente   neste   momento,   sendo   até   então   exclusivo   ao   grupo   de 

desenvolvedores; e o bazar, onde o código é desenvolvido via Internet, aos olhos do público. 

Raymond   concede   a   Linus   Torvalds,   lider   do   projeto   do   kernel   do   Linux,   o   título   de 

inventor deste processo.

139 O Pingüim Avança. Carta Capital,  17 de março de 2004 ­ Ano XI ­ Número 345.140 The Open Source Definition is used by the Open Source Initiative to determine whether or not a software license can be considered Open Source. The definition was based on the Debian Free Software Guidelines, adapted   primarily   by   Bruce   Perens   and   by   April   2004   has   reached   version   1.9,   conforme   definido   na WIKIPEDIA em: http://en.wikipedia.org/wiki/Open_Source_Definition141 Inicialmente apresentado como um ensaio no Linux Kongress em 27 de maio de 1997.142 Parte central do sistema operacional, responsável por funções básicas.143 http://www.catb.org/~esr/writings/cathedral­bazaar/

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A   constatação   de   Raymond   é   importante   para   nossa   análise   na   medida   em   que 

evidencia um aspecto particularmente anárquico do processo de criação do Linux e talvez o 

elemento   que   permitiu   a   ele   crescer   onde   tantos   projetos   semelhantes   fracassaram:   “o 

código é desenvolvido via Internet, aos olhos do público”.

Este   talvez   seja,   para   além   dos   modelos   de   licenciamento   das   duas   alternativas 

estudadas aqui (Windows e Linux) o principal ponto de divergência entre duas abordagens 

para o desenvolvimento tecnológico.

Enquanto   a   Microsoft   trabalha   fornecendo   tecnologia   a   seus   clientes,   tecnologia 

proprietária, feita sob segredo industrial em seus laboratórios, o Linux tem cada segundo de 

sua  evolução aberto  e  acompanhado  por  seu  público  consumidor,  que  opina  e  altera  os 

rumos tomados por esta tecnologia.

Isso leva a dois resultados muito distintos, se o objetivo perseguido pela Microsoft ao 

desenvolver o Windows é a obtenção de lucro e conquista e manutenção de novos mercados, 

este com certeza não é o objetivo do Linux, ou pelo menos não é o objetivo central de seus 

desenvolvedores, que em seu trabalho buscam atender as demandas diretas de seus usuários 

e mantenedores. E as demandas dos usuários podem não necessariamente coincidir com 

conquista  de  novos  mercados,  ou   traduzindo,  para  a  criação,   integração e   instalação de 

novas características no sistema operacional.

Esta disparidade de objetivos distancia ainda mais os dois sistemas operacionais do 

que suas próprias origens históricas,   levando as duas tecnologias,  focadas na solução do 

mesmo problema (a operação básica do computador), a adotarem padrões e mesmo opções 

arquitetônicas muito diferenciadas.

Por sua gênese e tradição a comunidade Linux busca apoiar e manter padrões abertos 

de   computação,   intercambiáveis   entre   todos   os   sistemas   operacionais   e   plataformas, 

enquanto a Microsoft,  dentro da lógica de empresa privada, busca padrões proprietários, 

compatíveis apenas com seus produtos.

Constatado que os dois sistemas operacionais divergem em seus objetivos e métodos, 

é   cabível   iniciar   a   ponderação   do   quanto   isso   afeta   o   usuário   final   destas   tecnologias 

distintas.

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No caso do Windows, a mesma empresa que fabrica o sistema operacional, fabrica 

também suítes  de escritório  (os pacotes Office),   leitores de e­mail,  browser  de  Internet, 

instant messenger  e toda uma gama de  softwares  em diferentes funções e atividade. Isso 

significa que além do sistema operacional, a Microsoft compete com outras empresas em 

diversos segmentos, e todas estas empresas fazem seus produtos para serem utilizados no 

Windows.

Como   apenas   a  Microsoft   tem   acesso   ao   código   fonte   do  Windows  e   apenas   ela 

comanda os rumos de seu desenvolvimento, pratica muitas vezes uma política considerada 

predatória e também perigosa. Ela promove uma grande integração entre seus aplicativos e 

o kernel do sistema, o que é, desconsiderando­se o aspecto de falta de competitividade, um 

risco de segurança.

Por ocasião do processo dos estados americanos contra a Microsoft por políticas anti­

competitivas os advogados da Microsoft chegaram a alegar que não era possível remover o 

browser  Internet Explorer do Windows dado seu grau de integração com o sistema, e que 

mesmo que tal fosse possível não cabia ao Departamento de Justiça interferir e impedir a 

Microsoft de “inovar”.

Porém  este  princípio  de   “inovação”  não  é   adotado  pelos  mantenedores  do  Linux, 

sendo  na  verdade   considerado  um  erro   conceitual,  Eric  Raymond,   apesar  de   seu   estilo 

notadamente   panfletário,   parece   estar   baseado   nos   argumentos   corretos   em   seu   artigo 

“Editorial ­­ Microsoft: Designed for Insecurity144” que traz maiores detalhes sobre outro 

problema de arquitetura de produtos Microsoft.

Assim enquanto o Windows segue um plano de desenvolvimento onde os executivos, 

pessoal   de  marketing  e   analistas   de   mercado   foram   ouvidos,   o   Linux   permanece   uma 

criação coletiva da comunidade, ou como definiu Linus Torvalds:  "Linux is evolution, not  

intelligent design."145

144 http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/opensource/news/insecure_0400.html145 Citação atribuída a Linus Torvalds por Greg Kroah­Hartman, funcionário da SUSE e um dos mantenedores do kernel  do Linux (e  de  diversos   subsistemas de drivers),  que exibiu esta  citação em um slide de  sua apresentação no encerramento do OLS 2006 (Ottawa Linux Symposium), uma das principais conferência sobre o desenvolvimento do kernel do Linux. A tradução desta citação é  Linux é evolução,  não desenho inteligente, e faz referência ao combate entre as idéias do evolucionismo biológico e criacionismo divino. Daí a comparação de Torvalds, que não vê um plano traçado de para onde o Linux deva seguir, mas o vê sendo capaz de se adaptar a novos ambientes e novas condições. 

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Esta  diferença  de  abordagem  entre  os  dois   sistemas  operacionais,   traz  um  reflexo 

direto  na  vida  dos  usuários  de  computadores,  na  medida  em que  os  usuários  do  Linux 

parecem muito menos sujeitos a ataques de vírus e sempre com efeitos notadamente menos 

devastadores, já que o coração do sistema não é facilmente atingido por outros programas.

Há  portato, menos lógica matemática e muito mais idéias e ideais, direcionando os 

rumos dos bits e bytes, dentro dos onipresentes computadores.

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 4. Uma História do desenvolvimento tecnológico brasileiro

 4.1. Brasil: raízes da industrialização e do desenvolvimento tecnológico.

Tendo em vista que a existência pretérita do material humano qualificado tem sido 

um pré­requisito  para  a   inserção do  Brasil  como  um ator   relevante  no  atual  estágio  de 

desenvolvimento tecnológico do capitalismo e na arena do Software Livre, cabe a pergunta: 

“Qual a origem dos técnicos e engenheiros de informática brasileiros?” 

Não há, como é de se imaginar, uma resposta curta para esta pergunta. Chegar até 

ela exige a reconstrução dos caminhos que conduziram à industrialização brasileira, pois só 

assim pode­se compreender a origem dos técnicos, engenheiros e cientistas nacionais.

Esta   necessidade   aqui   colocada   já   foi   bem   explicitada   por   Milton   Vargas   ao 

constatar   que   existe   um  “fato  primordial  de  que  a   tecnologia  depende  do  valor   e  do  

preparo do corpo de pesquisadores nacionais”.146 Gildo Magalhães aponta ainda que “Se o 

próprio  mecanismo  da   tecnologia  avançada   implica  na  adaptação   e   no  progresso  do  

conhecimento, não há  como separar ciência, pura ou aplicada, bem como sua utilização,  

do desenvolvimento como um todo. (...) Muitos, imprecisa e vagamente, denominam isto de 

“know­how” (e para nós, o verdadeiro conhecimento tecnológico precisa incluir o “know­

why”).”147

Não   há   aqui   a   intenção   de   confundir   desenvolvimento   tecnológico   com 

industrialização, mas há que se estabelecer uma relação causal entre uma coisa e outra, já 

que   para   operar   as   máquinas,   executar   sua   manutenção,   e   controlar   seus   processos   é 

necessária uma formação técnica. A indústria se transforma, portanto, no primeiro passo 

para a demanda por novo desenvolvimento tecnológico e por conhecimentos atualizados de 

ciências   e   engenharias,   ou   seja,   conhecimentos   que   se   não   são   científicos,   deles   são 146 VARGAS, Milton. Para uma Filosofia da Tecnologia. Editora Alpha Omega, 1994, São Paulo, pág. 225.147  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 106

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derivados.   Para   implantar   as   primeiras   indústrias,   por   rudimentares   que   fossem   era 

necessária   a   existência   de   um   corpo   mínimo   de   técnicos   e/ou   de   artesãos   mais   bem 

preparados, até com algum rudimento de conhecimento em ciências.

“O   Brasil,   entretanto,   antes   de   ser   o   âmbito   de   uma   sociedade 

criadora de saber científico, para seu próprio conhecimento, foi objeto de  

investigação alheia. (...) O primeiro  modo de pensamento moderno que de 

algum modo integrou a atividade científica na sociedade brasileira foi o  

positivismo, já  nos meados do século XIX. Isto deu como resultado final a  

idéia de ciência como necessidade social – a qual prevalece até hoje entre  

nós. (...) O segundo foi a criação  das academias militares e de medicina,  

por D. João VI, a partir de 1808. As escolas militares desdobraram­se em 

escolas de engenharia, onde ao correr do século ensinava­se matemática,  

física e geologia. Nas escolas de medicina, a química e as biologias faziam 

parte do currículo. Além disso, o ensino das ciências do homem começava a  

despontar nas já existentes escolas de direito. Assim formaram­se ambientes  

de estudos ligados às profissões liberais, onde havia também o aprendizado  

de ciências.”148 

Assim as raízes da industrialização brasileira encontram­se parcialmente plantadas 

no século XIX, pois em meados deste século o Brasil já havia experimentado um pequeno 

surto   de   industrialização   com   o   desenvolvimento   da   indústria   têxtil,   a   implantação   de 

ferrovias para escoar a produção agrícola, alguns portos, hidrelétricas e mesmo sistemas de 

comunicação149. 

No início do século XX a implantação dos institutos de pesquisa é talvez o primeiro 

ponto importante para o desenvolvimento científico no Brasil, já que tinham como objetivo 

resolver problemas da sociedade por meio da pesquisa. Refletindo as necessidades  sociais 

148  Idem, 1994, p. 226­227149 PEREIRA, L.C. Bresser. Desenvolvimento e Crise no Brasil. Zahar Editores, 1968, Rio de Janeiro, pág. 29.

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estes institutos eram biológicos, agronômicos e de tecnologia, cobrindo as searas da saúde 

pública, agricultura e engenharia150.

Mesmo assim o país permanecia basicamente agrário, e por contraditório que possa 

parecer é  com a crise mundial de 1929, com a quebra da bolsa de Nova York que serão 

dadas   as   condições   para   o   início   da   industrialização   brasileira,   pois   a   crise   trará   a 

necessidade de substituição das importações.

Até   então   o   Brasil   mantinha­se   em   um   estado   economicamente   semi­colonial, 

controlado pela elite cafeeira exportadora, que cuidava apenas de garantir que o processo de 

exportação do  café   fosse  mantido  em funcionamento.  Esta  elite   importava  praticamente 

todos os produtos que o Brasil consumia e agia ora com indiferença, ora com impedimentos 

e   até   sabotagem   e   perseguição   às   iniciativas   de   industrialização,   como   aquelas 

capitaneadas  pelo  Visconde de Mauá  na  segunda metade  do século  XIX.  Além da elite 

cafeeira havia uma pequena burguesia, parasitária do Estado, indicada aos cargos estatais 

por esta elite agrária e, portanto, plenamente em uníssono com os seus  interesses.

Quando a família real portuguesa foi forçada a se transferir para o Brasil cuidou de 

ajustar a “nova sede” aos padrões de quem agora era o centro do Império, assim em 1808 o 

Príncipe Regente D. João liberava às colônias portuguesas a liberdade de indústria, que por 

si só era insuficiente para iniciar a industrialização, como já apontou Nícia Vilela Luz:

“Não   se   efetuava,   entretanto,   a   industrialização   de   um   país   por  

simples   decreto   concedendo   liberdade   econômica.   A   própria   doutrina 

liberal   reconhecia   a   necessidade   de   um   pequeno   impulso   às   indústrias 

nascentes e o Príncipe Regente foi instado a dar mais um passo à  gente, no  

sentido de favorecer o desenvolvimento industrial do Brasil. O resultado foi  

o  alvará  de  28 de  abril  de 1809 que  não  se   limitou,  porém, aos  meios  

preconizados  pelos   liberais.  Além   da   isenção  de   direitos   aduaneiros   às  

matérias­primas necessárias às  fábricas nacionais, isenção  de imposto de  

exportação  para produtos manufaturados do país e utilização  dos artigos  

nacionais no  fardamento das   tropas reais,  medidas   todas  essas  que não  

150 VARGAS, Milton. Para uma Filosofia da Tecnologia. Editora Alpha Omega, 1994, São Paulo, pág. 230.

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podiam   deixar   de   ser   aplaudidas   pelos   liberais,   estabeleciam­se   certas  

concessões que iriam, no decorrer do século, favorecer certos abusos contra  

os quais protestariam defensores do liberalismo econômico.”151

Como a propriedade das idéias,  patentes e o direito autoral  são assuntos centrais 

neste texto, cumpre notar que parte desses “abusos” consistia na  “outorga de privilégios 

exclusivos, por 14 anos, aos inventores ou introdutores de novas máquinas”152.

Mas   apenas   dois   anos   depois,   por   imposição   dos   interesses   ingleses   os 

manufaturados   oriundos   da   Grã­Bretanha   conseguiram   uma   tarifa   de   importação 

preferencial, inferior a 15%, menor que os 16% praticados contra os produtos portugueses, 

sendo isto o  bastante  para minar  os esforços anteriores  de  industrialização e  estabelecer 

clara  dependência  externa.  Findos estes   tratados  na  década  de  40 o  Brasil  buscou novo 

protecionismo à  sua indústria quando em 1843 estabeleceu impostos de 50 a 60% sobre 

bens que tivessem similares nacionais, mas logo em 1844 a tarifa Alves Branco estabeleceu 

uma taxa de importação na casa de 30%. Os anos de 1846 e 1847 viram novos esforços e 

incentivos à indústria brasileira, em especial a têxtil, mas o café então já tomava o cenário 

político  e  econômico,   tornando  menos   favorável  o  ambiente  para  as  discussões   sobre  o 

desenvolvimento industrial brasileiro, reforçando a crença da notória “vocação agrícola” do 

Brasil e colocando os dirigentes em uma gangorra oscilando ora para o protecionismo ora 

para a liberalização. Para Nícia Vilela Luz:

“Colocados nesse dilema – promover a industrialização do país, que  

reconheciam ser uma necessidade nacional, e atender ao mesmo tempo os  

interesses da lavoura – hesitaram, assim, os dirigentes brasileiros em adotar  

uma   política   francamente   protecionista.   Por   outro   lado,   repousando   o  

sistema tributário brasileiro na renda alfandegária, exigiam os interesses  

do fisco uma tarifa essencialmente  fiscal.  Nesse  impasse permanecerá  a  

política alfandegária brasileira, durante todo o período abrangido por este 

151 LUZ,  Nícia Vilela. A Luta pela Industrialização do Brasil. Editora Alpha Omega, 1978, São Paulo, pág. 21.152  Idem, 1978, p. 21.

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estudo,   incapaz   de   satisfazer   nem   aos   partidários   de   uma   política  

protecionista, nem aos defensores de um regime de livre troca.”153

Os anos seguintes trouxeram novas discussões sobre as taxas a serem aplicadas aos 

produtos importados e sobre a proteção da indústria nacional; se num primeiro momento o 

principal entrave à industrialização haviam sido os interesses ingleses, nos anos seguintes 

este   entrave   foi   interno,   configurado   como   a   pressão   exercida   pelos   interesses   da 

monocultura. Mas em 1878 os problemas de caixa do Tesouro cuidaram de elevar para 50% 

as taxas de importação, que redundaram em alívio e certa proteção para a indústria interna, 

finalmente dando condições para um primeiro surto industrial entre as décadas de 1880 e 

1890.

“Em  1885, registra­se em São Paulo o funcionamento de 13 fábricas  

têxteis com 1.670 operários e 3 fábricas de chapéus com 315 operários. No 

mesmo ano no mesmo Estado sabemos ainda da existência de 7 empresas  

metalúrgicas que reúnem cerca de 500 operários.  Em 1889, conta­se no  

Brasil 636 empresas industriais onde trabalham 54 mil operários. Em 1901,  

entre as 91 mais importantes empresas industriais paulistas, 33 empregam 

de 10 a 49 operários, 33 de 50 a 199, 22 de 200 a 499, duas outras ocupam 

600 operários cada e uma empresa possui cerca de 800 operários.”154

 4.2. Mudanças no quadro político

Mas a real implantação da industrialização brasileira só poderia ter seu início com 

uma   mudança   radical   processada   nas   direções   políticas   do   país,   onde   os   exportadores 

agrícolas não fossem mais os controladores da máquina estatal,  ainda que o processo de 

acumulação   da   lavoura   tenha   sido   determinante   para   o   nascimento   da   indústria,   como 

destaca Sérgio Silva:

153 Idem, 1978, p. 26­27.154 SILVA, Sérgio. Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil. Editora Alpha Omega, 1976, São Paulo, pág. 77.

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“Ainda   assim   a   produção   de   café   serviu   de   base   para   a 

industrialização  enquanto cumpriu seu  papel  na acumulação  de  capital.  

Mas   na   década   de   1880   a   1890,   as   necessidades   historicamente  

determinadas pelo próprio desenvolvimento do capitalismo no Brasil e pela 

sua inserção  na economia mundial capitalista em formação  conduzem ao  

rompimento   com   as   formas   de   acumulação   do   trabalho   escravo,  

características da economia colonial.

Essas   transformações   não   podem   ser   reduzidas   à   passagem   ao 

trabalho assalariado, sob risco de não entendermos a própria passagem ao 

trabalho assalariado. O trabalho assalariado é o índice de transformações  

que   incluem   as   estradas   de   ferro,   os   bancos,   o   grande   comércio   de 

exportação e importação e, inclusive, uma certa mecanização ao nível das 

operações de beneficiamento da produção.

São essas transformações que fazem da economia cafeeira o centro de  

uma rápida  acumulação  de capital baseada no trabalho assalariado. E é  

como parte integrante dessa acumulação  de capital que nasce a indústria  

no Brasil.”155

A  crise  de  1929   redunda  na  derrocada   econômica  da   elite  cafeeira   e,   em  1930, 

Getúlio Dornelles Vargas, então com 47 anos, toma o poder pela Revolução, tornando­se 

chefe do então Governo Provisório, provisório apenas até 10 de novembro de 1937, quando 

Vargas capitaneou um golpe de Estado, instituindo o Estado Novo que o manteve no poder, 

pondo fim à luta sucessória dos candidatos à Presidência da República.

Porém   a   desestruturação   do   poder   oligárquico   não   segue   com   suavidade   e 

travestidos sob o ideal constitucionalista – uma idéia em torno da qual podiam­se aliar de 

comum acordo diferentes correntes políticas – estavam os interesses da elite empresarial 

urbana   paulista   que,   cooptou   outras   camadas   com   seu   discurso   progressista   veiculado 

principalmente no jornal O Estado de São Paulo do então editor Júlio de Mesquita Filho.

155  Idem, 1976, p. 80­81.

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Da Revolução de 1930 que  levou Vargas ao poder,  desencadeou­se o Movimento 

Constitucionalista onde os paulistas em 1932 levantaram armas contra o Governo. Durante 

três meses ocorreram combates no território paulista e matogrossense, isolando São Paulo 

do restante do país  durante julho, agosto e setembro de 1932.

Comandada pelas elites a Revolução de 1932 foi apoiada pela FIESP que engajou 

diversas fábricas na produção de material bélico; assim durante estes três meses, além de 

tentar seguir com a vida civil na retaguarda, a indústria,  o comércio, os transportes e as 

comunicações,   foram  colocados  diante  do   invulgar  desafio  de   abastecer   também  várias 

frentes de batalha com armas, munições e suprimentos. “A primeira vez que um instituto de  

pesquisas brasileiro tomou parte ativa num movimento político militar foi quando o LEM156 

desenvolveu atuação decisiva na Revolução Constitucionalista de São Paulo em 1932”.157

Os outros  estados  que  inicialmente  apontaram que  iriam apoiar  São Paulo  como 

Rio   Grande   do   Sul   e   Minas   Gerais   recuaram,   vindo   a   única   adesão   do   Mato   Grosso. 

Isolados e em inferioridade numérica os paulistas foram derrotados, mas mesmo assim a 

elite empresarial posará, no ano seguinte, com a convocação da Constituinte, de vencedora 

moral e política do combate, alegando que Vargas foi incapaz de ignorar o clamor de São 

Paulo. Por conta desta “visão paulista”, que em grande medida persiste até hoje, a revolução 

de 1932 teve e tem um curioso aspecto bairrista do qual ainda se ufanam os paulistas.

Além   do   engajamento   da   indústria   na   produção   (e   concepção)   de   armamentos 

durante a revolução, a derrota paulista trouxe um importante e inesperado desdobramento 

para a ciência e tecnologia no Brasil. Mesmo de posse da dita “vitória moral” a derrota de 

1932 deixou um gosto amargo para a elite e as classes médias de São Paulo, e a idéia de que 

São Paulo perdeu por não estar preparado para a guerra tomou vulto.

Assim em 1934 foi fundada a Universidade de São Paulo, criada com a união de 

faculdades pré­existentes (como Direito e Medicina) e a criação de novos institutos (como a 

Faculdade de Filosofia).  A a USP já  nasceu com um brasão onde se  lê  sugestiva divisa 

latina "Scientia Vinces", ou “Vencerás pela Ciência”. 

156 LEM – Laboratório de Ensaio de Materiais da Escola Politécnica de São Paulo.157 VARGAS, Milton. Para uma Filosofia da Tecnologia. Editora Alpha Omega, 1994, São Paulo, pág. 233.

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O  mais   interessante  do   episódio   talvez   resida  no   fato  de  que  pela  primeira  vez 

tomou­se  consciência  em   território  nacional  do  valor  prático  da  pesquisa  científica  e  a 

necessidade  de  se   investir  nela.  Nos  anos  seguintes  a  Universidade  de  São Paulo   irá   se 

firmar como uma das mais relevantes instituições de ensino e pesquisa da América Latina, 

contribuindo decisivamente para o  desenvolvimento científico e  industrial  alcançado por 

São Paulo e pelo Brasil.

Destaca­se o processo de constituição das universidades como um dos fatores de 

peso na industrialização do Brasil, e em geral datam dos anos 30 as primeiras universidades 

brasileiras que surgem tardiamente mas firmam­se como centros produtores de ciência e 

tecnologia, ocupando o espaço de alguns institutos (muitos dos quais foram integrados às 

universidades).   Porém   Milton   Vargas   considera   que  “o   que   abriu   definitivamente   a 

atividade de pesquisas tecnológicas na universidade foi a instituição  dos cursos de pós­

graduação a partir dos primeiros anos da década de 60.”158 Sua argumentação baseia­se na 

percepção   de   que   o   estabelecimento   destes   cursos   é   igual   à   execução   de   pesquisas   na 

universidade, pesquisas estas agora financiadas por agências governamentais especialmente 

estabelecidas para tanto como a FINEP, FAPESP e CNPq.

 4.3. A Industrialização

Desta   forma,   se   por   um   lado   a   revolução   de   30,   não   permite   a   Vargas   romper 

totalmente   com   a   antiga   elite   agrária   do   país,   por   outro   afasta­a   pela   primeira   vez   na 

história do cume do poder, abrindo espaço para novas posturas e novos interesses. 

Porém   transições   desta   natureza   raramente   são   tão   simples,   e   diante   do   levante 

armado de 1932 em São Paulo, o Governo provisório se viu coagido pela necessidade de 

compor   com   a   elite   cafeeira.   O   resultado   desta   composição   foi   a   série   de   medidas 

destinadas a auxiliar o setor em sua crise, lançadas em 1933.

A crise leva o Governo a comprar as safras de café que não tinham mais condições 

de serem exportadas. Agindo desta maneira o Governo manteve o nível de demanda interna, 

impedindo o colapso da economia cafeeira. 

158  Idem, 1994, p. 238.

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“Ao   garantir   preços   mínimos   de   compra,   remuneradores   para   a 

grande maioria dos produtores, estava­se na realidade mantendo o nível de  

emprego na economia exportadora e, indiretamente, nos setores produtores  

ligados   ao   mercado   interno.   Ao   evitar­se   uma   contração   de   grandes 

proporções   na   renda   monetária   do   setor   exportador,   reduziam­se 

proporcionalmente   os   efeitos   do   multiplicador   de   desemprego   sobre   os  

demais setores da economia.

(...) Dessa forma, a política de defesa do setor cafeeiro nos anos de  

grande depressão  concretiza­se num verdadeiro programa de fomento da 

renda nacional.

(...) É portanto perfeitamente claro que a recuperação  da economia  

brasileira, que se manifesta a partir de 1933, não  se deve a nenhum fator  

externo e sim à política de fomento seguida inconscientemente no país e que  

era um subproduto da defesa dos interesses cafeeiros.159” 

Ao   mesmo   tempo,   as   diferenças   cambiais   impediam   sumariamente   que   fosse 

mantida a política de importação de bens, um fator decisivo no cenário e necessário para o 

surgimento e consolidação da empresa nacional. 

Assim, quando o primeiro Governo de Vargas deu início ao processo de substituição 

de importações, causou um surto – talvez inadvertido – de industrialização no país, logo, 

em pouco tempo a capacidade ociosa da empresa nacional foi preenchida e o investimento 

na produção industrial passou a ser altamente lucrativo, mesmo que contemplando apenas o 

mercado interno, conforme relata Bresser Pereira:

“Vai­se desenrolar então,  a partir de 30, um drama, cujos contornos 

se irão  definindo cada vez mais. De um lado,  lutando por uma volta ao  

antigo regime, a agricultura latifundiária do café e o alto comércio ligado 

ao café ou diretamente ao capitalismo internacional, com o apoio da classe  

159 FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Nacional, 1999. p.190, 192 e 193.

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média parasitária ligada por laços econômicos e sociais (familiares mesmo)  

à antiga classe dominante. Do outro, o Governo, no qual, além de parte das  

referidas   classes   de   oposição   que   aderiram   para   poder   lutar   por   seu  

interesses em campos mais favoráveis, além dêsse grupo vamos encontrar a  

classe industrial, a classe proletária e uma nova classe média.” 160

A economista Maria da Conceição Tavares estudou o processo de substituição de 

importações   que   foi   operado  no   Brasil   e   no   restante   da  América  Latina   a  partir   deste 

período,  para  ela  o  desequilíbrio  externo de  1914 a  1945  levou os  governos  a  adotarem 

medidas objetivando a defesa do mercado interno frente à crise mundial. O objetivo seria 

antes  defender­se  do  desequilíbrio  externo  do  que  estimular  o  mercado   interno,  e  estas 

medidas consistiam quase que exclusivamente em controle e restrição de importações.

Tais   medidas   proporcionaram   um   processo   de   desenvolvimento   para   “dentro”, 

contrastando como o modelo primário­exportador que operava com a exportação de um ou 

dois   produtos   primários   e   circunscrevia   o   crescimento   à   demanda   externa   por   estes 

produtos.   Se   no   modelo   anterior   a   demanda   interna   de   manufaturados   era   suprida  por 

importações, agora, com as importações limitadas seria possível tentar suprir internamente 

a  demanda,  abrindo  espaço para  a   industrialização161,  o  que  segundo  Conceição Tavares 

corresponde a novo modelo de desenvolvimento.

“Inicialmente   utilizando   e   mesmo   sobreutilizando   a   capacidade 

existente   foi   possível   substituir   uma   parte   dos   bens   que   antes   se  

importavam.   Posteriormente,   mediante   um   redistribuição   de   fatores   e,  

particularmente, do recurso escasso,  as divisas,  utilizou­se a capacidade  

para importar disponível com o fim de obter do exterior os bens de capital e  

as   matérias­primas   indispensáveis   à   instalação   de   novas   unidades  

destinadas a continuar o processo de substituição”162.

160 PEREIRA, L.C. Bresser, Desenvolvimento e Crise no Brasil, Zahar Editores, 1968, Rio de Janeiro, pág. 25. [sic]161  TAVARES, Maria da Conceição.  Da Substituição  de importações ao capitalismo financeiro: ensaios sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.162 Idem, 1982, p. 33.

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Outros fatores contribuiriam para o desenvolvimento da industrialização brasileira, 

como   a   facilidade   do   transporte   e   a   presença   do   imigrante   que   produziram   um   salto 

qualitativo entre 1919 e 1929 na indústria paulista. 

Além   disso,   as   relações   capitalistas   estavam   mais   avançadas   no   Sul,   dando   as 

condições,   juntamente   com   a   política   estatal   de   substituição   de   importações,   para   que 

tivesse   início,   após  a  crise  de  1929,  a  produção   industrial  de  manufaturados  no  Brasil. 

Alinhados   a   estes   fatores   podemos   colocar   a   dependência   nordestina   com   o   comércio 

internacional   e   sua   baixa   integração   regional   para   começamos   a   pintar   o   quadro   das 

desigualdades regionais que a industrialização brasileira agravaria. 

Apesar de ainda sentir a pressão da elite agro­exportadora, neste período o Governo 

passa a atender as demandas de novas classes emergentes: a classe proletária e uma nova 

classe média, que agora é menos parasitária do Estado. Uma disputa política que pode ser 

mais claramente compreendida quando analisamos a composição da nova classe industrial.

É comum encontrar relatos de que com a crise do café os produtores da monocultura 

cederam espaço para os imigrantes, porém parece haver mais cinza nesta transição do que 

preto e branco. Bresser Pereira sustenta  que,  com efeito,  apenas uma pequena fração da 

classe industrial surge na parcela da antiga classe dirigente que se alinha ao novo Governo, 

tendo   seus   principais   representantes   na   classe   média   paulista,   especialmente   entre   os 

imigrantes:

“Os empresários brasileiros, ou melhor, paulistas, segundo pesquisas  

que realizamos, eram em geral imigrantes êles mesmos (50%), ou filhos e  

netos   de   imigrantes.   Apenas   16%   dos   empresários   tinham   origem   em  

famílias brasileiras, em que os pais e os avós eram brasileiros” 163

Aqui está colocada a controversa idéia de que o capital para esta produção industrial 

era inicialmente familiar e imigrante, que passou a ser reinvestido na produção e expandiu­

se. Mesmo Caio Prado Junior cai, em sua História Econômica do Brasil, na armadilha de 

163 PEREIRA, L.C. Bresser, Desenvolvimento e Crise no Brasil, Zahar Editores, 1968, Rio de Janeiro, pág. 55.

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visualizar uma origem modesta para o empresariado brasileiro. Sérgio Silva não deixa de 

notar esta imprecisão quase tradicional da historiografia e aponta que:

“Warren   Dean   dá   uma   contribuição   decisiva   para   demonstrar   o  

caráter errôneo dessas teses: os imigrantes que se tornam industriais não se  

confundem   com   a   massa   de   migrantes.   Dean   os   denomina   'burgueses  

imigrantes', ressaltando desse modo aquilo que os distingue da massa de 

imigrantes constituída de trabalhadores.

(...)  Para a burguesia   industrial  nascente,  a  base  de apoio  para  o  

início da acumulação não é a pequena empresa industrial, mas o comércio,  

em   particular   o   grande   comércio   cujo   centro   está   na   atividade   de  

exportação   e   importação.   Do   mesmo   modo   que   na   exportação,   a  

importação é controlada por empresas estrangeiras. Graças às suas origens  

sociais,   o   burguês   imigrante   encontra   facilmente   um   lugar   no   grande  

comércio. Ele torna­se representante de firmas e marcas estrangeiras e se  

encarrega da distribuição de produtos importados pelo interior do país.

(...)   A   situação   privilegiada   do   importador   durante   esse   período  

implica particularmente a possibilidade de dispor de capitais relativamente 

importantes,  seja aplicando  lucros de seus  negócios,  seja recorrendo ao  

crédito   dos   bancos   estrangeiros   com   os   quais   mantém   relações  

comerciais.”164

Corroborando  esta   tese  está   também Conceição Tavares  ao  apontar  que  “grande 

parte das atividades substituidoras de importações era realizada por investimentos diretos  

estrangeiros, associados ou não  a empresários nacionais, que traziam consigo, além do  

capital, a técnica adotada em seus países de origem”165. Some­se a isso, o fato inegável de 

164 SILVA, Sérgio. Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil. Editora Alpha Omega, 1976, São Paulo, pág. 93 e 95.165  TAVARES, Maria da Conceição.  Da Substituição  de importações ao capitalismo financeiro: ensaios sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. p.51

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que   com   o   florescimento   da   indústria   parte   do   capital   acumulado   pela   monocultura 

encontrou seu caminho até esta nova fase de acumulação.

Os anos 30 trazem assim um conturbado período na história brasileira,  marcados 

por um forte nacionalismo, disputas políticas166 e pelo início da industrialização. Se até  os 

anos 30 o foco das políticas econômicas era a monocultura, não havendo política industrial 

no   Brasil,   a   mudança   de   atitude   que   vinha   se   consolidando,   tomaria   vulto   durante   o 

segundo Governo Vargas167. 

Além   do   foco   da   política   econômica,   muda   também   a   mentalidade,   e   a 

industrialização passa finalmente a ser vista como uma necessidade para fortalecer o país 

frente   os   humores   dos   mercados   externos   que   consumiam   os   produtos   agrícolas 

dominantes na pauta de exportações.

No  primeiro  Governo  Vargas,  durante  a  2ª  Guerra  Mundial,  ganharam  relevo  as 

obras de infra­estrutura e a criação das indústrias de base (siderurgia e cimento),  pois é 

quando o  “Governo decidiu entrar no setor da siderurgia dando início ao investimento 

pioneiro de Volta Redonda, cuja entrada em funcionamento em 1946 constitui a primeira  

operação   em   grande   escala   na   indústria   pesada   da   América   Latina”168.   Após   o 

desmantelamento do Estado Novo, o Governo Dutra paralisou a tendência industrializante e 

de   iniciativa   estatal,   retomada   no   segundo   Governo   Vargas,   que   marca   a   volta   da 

industrialização, “reservando um papel estratégico para as estatais”169, 

Em 1948 com o esgotamento das reserva de divisas o país precisa entrar em uma 

política de controle cambial e discriminação das importações, o que termina por oferecer 

166 Com a instituição do Estado Novo em 1937 foi dissolvido o Congresso, outorgada uma nova Constituição e garantida a permanência de Vargas no poder até  29/10/1945, data em que tomou posse o advogado José Linhares, levado à presidência por convocação das Forças Armadas, como Presidente do Supremo Tribunal Federal, tendo em vista a deposição do titular Getúlio Vargas.167  José  Linhares permanecerá  no cargo apenas até  1946, quando em 31/01/1946,  toma posse o Marechal Eurico Gaspar Dutra, eleito por sufrágio direto e de acordo com todos os dispositivos constitucionais de então. Dutra é novamente sucedido por Getúlio Vargas, também em eleição direta.168  TAVARES, Maria da Conceição.  Da Substituição  de importações ao capitalismo financeiro: ensaios sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. p.70169  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 131

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novo estímulo à   industrialização,  pois  além da proteção cambial   institui  uma reserva de 

mercado.  Esta   foi   basicamente   a   fase   de   implantação   das   indústrias   de   aparelhos  

eletrodomésticos e outros artefatos de consumo durável170.

Apesar de toda a “confusão”171 no quadro político durante os anos 50, a necessidade 

de  industrialização e  a  sua   importância  haviam se  tornado quase consenso nas  camadas 

dominantes da sociedade brasileira, em parte pela situação deficitária da balança comercial, 

em parte  pela   influência  do pensamento de Raul  Prebish  e  da CEPAL172,  que após  a  2ª 

Guerra Mundial ocuparam­se do estudo do desenvolvimento dos países sub­desenvolvidos 

da  América   Latina.  Assim,  “Graças  à   emergência   de   uma   camada   tecno­burocrática 

imbuída dessas   idéias,  criou­se  um padrão  de   intervenção  de   forma até   relativamente  

independente do grupo político no poder: o plano SALTE, de 1949­1954 (governos Dutra e  

Vargas), o Programa de Metas, de 1956­1960 (governo JK) e o Plano Trienial (governo 

Goulart).  Também nesta   fonte  podem ser  encontradas  as   raízes  das  grandes  empresas  

brasileiras, tais como a Petrobrás, BNDE e SUDENE.”173

Os   anos   50   trazem   um   aumento   da   participação   indireta   do   Governo   nos 

investimentos   e   permite   que   o   capital   privado   estrangeiro   entre   de   maneira   oficial   na 

economia.   Este   capital   estrangeiro   impulsiona   novos   investimentos,   especialmente   na 

indústria   mecânica.   “Neste   período   teve   lugar   a   instalação   de   algumas   indústrias  

dinâmicas como a automobilística,  de construção  naval,  de material  elétrico pesado e  

170  Idem, 1994, p. 71171 Vargas suicida­se em 24 de agosto de 1954, assumindo então seu vice João Fernandes Campos Café Filho. Segue­se um novo período bastante conturbado na arena política brasileira, onde Café Filho é afastado por motivo  de   saúde  e  depois   sofre  um  impedimento.  Com o  afastamento  de  Café  Filho,  em 08/11/1955,  o advogado   Carlos   Coimbra   da   Luz,   Presidente   da   Câmara   dos   Deputados,   assume   a   presidência,   onde permanece por apenas três dias, tendo sido deposto por um dispositivo militar e considerado impedido de exercer o cargo de Presidente da República pelo Congresso Nacional.Entre 11/11/1955 a 31/01/1956 Nereu de Oliveira Ramos, então Vice­Presidente do Senado Federal, assumiu o Governo em virtude do impedimento do Presidente João Fernandes Campos Café Filho e do Presidente da Câmara dos Deputados, conforme deliberação do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Somente em 31/01/1956, por eleição direta, a normalidade é restaurada, com a eleição do médico Juscelino Kubitschek de Oliveira como Presidente da República. ­ dados e datas: https://www.planalto.gov.br/historia.htm172 CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina173  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 115

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outras     indústrias   mecânicas   de   bens   de   capital”174.  O   preço   desta   nova   fase   da 

industrialização foi o agravamento das desigualdade regionais e aumento da inflação, além 

disto passa a existir a percepção de que algo está  faltando na industrialização brasileira e 

que a mesma ocorre acelerada, mas incompletamente:

“Nesse modelo de desenvolvimento “dependente”, havia lugar para o 

crescimento de um setor industrial local, que se efetuaria com recurso à  

tecnologia estrangeira. Note­se porém que a produção  transplantada dos  

países   adiantados   se   desloca   para   a   periferia   do   sub­desenvolvimento  

apenas após a tecnologia envolvida ter se tornado rotineira.

(...)  Assim,  a   indústria   local  não  chega a necessitar de pesquisa e  

desenvolvimento próprios, pois atua no mais das vezes como entreposto de  

vendas para as multinacionais”.175

Até a implantação da indústria automobilística não são feitas grandes perguntas ou 

reflexões sobre a origem da tecnologia, aceitando­se como certo que a tecnologia seria de 

alguma forma importada e paga, porém, entre o fim dos anos 60 e início dos 70 com a 

percepção de que “[u]m país que não desenvolva por si mesmo sua capacidade científica e  

tecnológica, sem dúvida se tornará  dependente tecnológicamente e será  dominado pelos  

países   mais   avançados.”176,   foi   desencadeando   uma   mudança   de   postura   do   Governo 

brasileiro.

O   Plano   Estratégico   de   Desenvolvimento,   lançado   em   1967,   cria   a   FINEP 

(Financiadora   de   Estudos   e   Projetos),   fortalece   o   CNPq   e   constituí   o   FNDCT   (Fundo 

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), ações que implementam uma base 

institucional sólida de apoio à pesquisa científica.

174  TAVARES, Maria da Conceição.  Da Substituição  de importações ao capitalismo financeiro: ensaios sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. p.72175  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 145176  SAGASTI,   Francisco   R.  Tecnologia,   Planejamento   e   Desenvolvimento   Autônomo.  São   Paulo: Perspectiva, 1986. p.16

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Em 1974 Geisel lançou o II PND, que incluía a acentuada atuação das estatais na 

economia   e   visou   promover   novamente   um   movimento   de   substituição   de   importações 

como forma de poupar divisas (especialmente devido à crise do petróleo). Os empresários 

brasileiros  encontraram neste  período uma  infra­estrutura  bastante  favorável  em energia, 

metalurgia, química e bens de capital, além de um novo padrão qualitativo na mão de obra 

oriunda das universidades e institutos de pesquisa. 

Dentro do segundo PND estava finalmente uma política de informática icialmente 

desvinculada de outras áreas em geral, que não a militar como nota Gildo Magalhães, “[a] 

formação  de uma política nacional de informática após 1974 se daria no ápice de um  

segundo ciclo industrial após Vargas, que se poderia situar em princípio entre os anos de  

1967 e 1981.”177 É nesta época, com a formulação desta política nacional de informática, que 

ganha corpo, entre os profissionais da nova área, a idéia de que a dependência tecnológica 

era muito prejudicial ao desenvolvimento: 

“(1)   a   falta   de   conhecimento   científico­tecnológico   de   como   os  

produtos era concebidos e desenhados situou o Brasil no lado da execução  

na  divisão   internacional  do   trabalho;   e   (2)  o   compromisso  no   lado  da  

execução   resulta   em   comparativa   desvantagem   econômica.   Esta   dupla  

construção   de   significado   traduzia   a   falta   de   conhecimento   científico­

tecnológico   como   a   causa   da   desvantagem   econômica   no   contexto   da 

divisão internacional do trabalho, que era também traduzida como a causa  

da pobreza”178  

Durante os anos 70 o Governo brasileiro buscou fugir do seu modelo tradicional de 

importação  de   tecnologia   e  objetivou  desenvolver  uma   indústria  de  microcomputadores 

100%   nacional,   empreendimento   que   ao   menos   no   quesito   técnico   teve   significativo 

177  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 135178 COSTA MARQUES, Ivan da.  Cloning Computers: From Rigths of Possession to Rigths of Creation.  In: Science as Culture. Routledge, Jun. 2005. Vol. 14, No. 2, 139­160.

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sucesso. Além da idéia de capacitação nacional, animava também este projeto o peso dos 

computadores e componentes eletrônicos na situação desfavorável da balança comercial.

A  capacitação  nacional  deveria   ser  baseada  na  criação  de  uma  massa  crítica  de 

técnicos brasileiros, uma posição que inicialmente encontra eco em diferentes setores da 

sociedade, dos militares à comunidade científica e burocracia estatal, fortalecida ainda com 

a existência de relativa capacitação tecnológica no Brasil179.

Para   atingir   tal   objetivo   foi   garantido  às  pesquisas  universitárias  de   engenharia­

reversa   das   máquinas   importadas,   e   comercialmente   disponíveis,   o   status   de   pesquisa 

científica “legítima”. O conceito apoiava­se na argumentação de que a engenharia­reversa 

consistia na “descoberta” e capacidade de reprodução de uma tecnologia alienígena, sem 

que a mesma fosse previamente conhecida, ou tivesse seu processo original de produção 

conhecido180.

Neste período está a resposta da pergunta que abre este capítulo, qual a origem dos 

técnicos e engenheiros de informática brasileiros? 

Basicamente a partir do final dos anos 60, com o esforço da engenharia reversa e a 

posterior reserva de mercado181 – implementada quando o Brasil atingiu capacidade técnica 

para produção de computadores, sem ter a capacidade industrial para sua produção – foram 

formados os primeiros grupos de profissionais de informática com profundo domínio de 

hardware  e  software,  o  material humano que foi base de sustentação e multiplicação da 

informatização brasileira nas décadas de 80 e 90.

Vigevani, assim como Gildo Magalhães (vide nota 173) também enxerga uma tecno­

burocracia que adere ao conceito de capacitação nacional para além das visões ideológico­

partidárias,  “[o]s   técnicos   desses   núcleos   tinham   diferentes     origens:   escolas   de   alto  

179  VIGEVANI,  Tullo.  O Contencioso  Brasil  x  Estados Unidos  da Informática  :  Uma Análise  Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995.180 COSTA MARQUES, Ivan da.  Cloning Computers: From Rigths of Possession to Rigths of Creation.  In: Science as Culture. Routledge, Jun. 2005. Vol. 14, No. 2, 139­160.181  Para a discussão detalhada da Reserva de Mercado da Informática, estressando diferentes aspectos, ver: Ivan da Costa Marques, Gildo Magalhães do Santos Filho, Maria Helena Tachinardi e Tullo Vigevani.

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gabarito tecnológico (Politécnica da USP, ITA, Engenharia da PUC/RJ, COPPE­UFRJ),  

orgãos públicos, etc.”182

Contudo   tecnocratas   de   médio   escalão   compõem   um   “bloco   social   débil”,   e   a 

desarticulação da academia e do poder público com o capital impediram a continuidade do 

desenvolvimento   alcançado   nos   laboratórios,   não   sendo   possível,   afinal,  “separar   o 

problema do desenvolvimento tecnológico do problema da capacidade industrial”183. 

O  que   ficou demonstrando  no caso do  projeto  brasileiro  de   informatização foi  a 

necessidade   de   se   trabalhar   conjuntamente   a   Tecnologia   de   Projeto,   a   Tecnologia   de 

Produção e a Tecnologia de Uso. Isto significa que além de ser capaz de manufaturar um 

artefato  em laboratório,  é  precisa   investimento   industrial  para  ganhar  os  mercados,   sem 

esquecer  do  condicionante  de  um ambiente  cultural  e  educacional  compatível,  capaz  de 

absorver o novo artefato.

Chegando nos anos 1980 a crise econômica aliada à ideologia liberalizante colocou 

um freio nas conquistas até aqui realizadas:

“O   Estado   brasileiro,   sem   diretrizes   e   incapaz   de   realizar   as  

necessárias reformas sociais, iniciou na década de 1980 o rápido declínio 

que o levaria ao colapso de vitórias conseguidas a duras penas desde os 

anos   30   com   a   decadência   da   educação,   saúde,   segurança,   energia,  

transporte, telecomunicações, etc. No afã de minimizar o Estado em funções 

claramente obsoletas e de fortalecer uma iniciativa privada encabeçada por 

empresas multinacionais, jogou­se fora a criança com a água  do banho:  

destruiu­se   também   a   capacidade   de   o   Estado   brasileiro   promover   a  

modernização e o desenvolvimento, em meio a uma crise sem precedentes  

em que o poder de caixa do Estado minguou cada vez mais.”184

182  VIGEVANI,  Tullo.  O Contencioso Brasil  x  Estados Unidos da  Informática  :  Uma Análise  Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. p.76183  Idem, 1995, p. 80.184  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 151

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Ao contrário  do  que  aconteceu  em  outros  países,   nos   anos  80,   o  capital   para   a 

produção do computador  brasileiro  não  teve origem nos grupos  industriais,  mas sim no 

sistema   financeiro.   Duas   razões   são   apontadas   para   esta   origem,   a   primeira   sendo   a 

indução do Estado, e a segunda a visão do setor, que considerou os benefícios da automação 

como caminho para a diminuição de custos na operação da economia inflacionária; assim 

nos anos 80, no Brasil, os bancos criam e/ou adquirem empresas de tecnologia. Grandes 

empresas de tecnologia, ainda em operação no Brasil, são herança deste movimento como a 

Scopus (banco Bradesco) e a Itautec (banco Itaú). 

Porém, a pressão americana sobre as reservas aplicadas ao setor de informática pelo 

governo   brasileiro   –   formalizada   em   ameaça   de   sanções   aos   produtos   exportados   pelo 

Brasil – aliada   ao descontentamento interno com a burocracia e questionamentos sobre a 

capacidade do governo em gerir a política de informática, indicavam que logo este mercado 

sofreria uma mudança185. Um dos principais pontos do qual faziam questão os americanos 

era uma lei brasileira do software, assunto abordado a seguir.

 4.4. História do Software no Brasil

A   transformação   proposta   por   uma   inovação   tecnológica   não   pode   ser 

satisfatoriamente engendrada se estiver dissociada da acumulação de capital (como Celso 

Furtado já havia notado), uma vez que a difusão da inovação é, ou deve ser, sustentada pelo 

capital previamente acumulado. 

Como já  foi mencionado neste texto, além da pesquisa, são necessários mais dois 

passos  na   consolidação  da   tecnologia:   produção  e  uso.  O  uso  é   um   fato   culturalmente 

determinado   e   se   relaciona   com   a   capacidade   social   de   absorver   a   tecnologia,   está 

diretamente ligado ao nível educacional da população. Produção, contudo, é um fator mais 

185  Cf.  SANTOS FILHO,  Gildo  Magalhães.  Um bit  auriverde:  Caminhos  da   tecnologia   e  do  projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. e VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995.

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complexo, está relacionado com a existência ou criação da base industrial necessária para 

tornar  a   inovação  em produto  viável,   logo  depende  da  acumulação prévia  de  capital   já 

convertido ou passível de conversão em instalações produtivas.

“No Brasil, como, aliás, em outros países, a indústria de informática  

não surgiu como consequência do fluir das forças produtivas ou da “mão  

invisível do mercado”, mas como consequência de uma ação deliberada do 

Estado, que foi levado a isto pela conjugação de diferentes razões, inclusive  

e   principalmente   por   vontade   política   e   por   interesses   que   não   eram 

diretamente empresariais, ao menos na origem”186.

E já  no  começo da   indústria  de   informática  no país  o  software  foi  uma questão 

espinhosa   a   ser   administrada   pelo   Governo   Brasileiro,  “desde  1968  a  Marinha   estava 

preocupada com o domínio tecnológico dos computadores de bordo para controle de tiro 

vindos em suas novas fragatas, recém­importadas da Inglaterra”187.

O protótipo G­10 (“Patinho Feio”),  realizado pela Escola Politécnica da USP em 

1971 foi o primeiro computador brasileiro, construído sob o patrocínio do GTE (Grupo de 

Trabalho Especial) da Marinha/BNDE, formado com objetivo de desenvolver o projeto do 

computador   nacional.   Além   da   Escola   Politécnica   da   USP   que   ficou   responsável   pelo 

projeto do hardware, a PUC­RJ foi patrocinada para desenvolver o software188. 

Fundada em 1974 a COBRA189  industrializou o protótipo G­10, cuja evolução o G­

11 foi o início de sua linha comercial (modelo 530). “Ao mesmo tempo foi nacionalizado o  

computador da Ferranti inglesa, para a Marinha (que como vimos estava na origem da 

186    VIGEVANI,   Tullo.  O   Contencioso   Brasil   x   Estados   Unidos   da   Informática   :   Uma   Análise   Sobre  Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. p.75.187  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 157 188 SANTOS FILHO, loc. cit.189 Computadores Brasileiros S.A.

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substituição  de importações de   computadores), resultando na fabricação  de um modelo  

destinado também para o uso civil em controle de processos.190” 

O dirigismo estatal na criação da  indústria de informática deu origem a diferentes 

atritos  com  os  Estados  Unidos191,   agravados   sensivelmente  em  outubro  de  1984,  com  a 

aprovação pelo congresso nacional da Lei de Informática192 quando se intensificou a pressão 

norte­americana contra a política de informática do governo brasileiro, com a possibilidade 

concreta de retaliações contra produtos brasileiros. Desde os primórdios destes atritos, os 

softwares  se apresentam como questão estratégica para o Brasil, estratégia e problemática 

com o forte impulso protecionista dos anos de 1982, 1983 e 1984. 

“Com o Ato Normativo 022/82 a SEI conferiu ao software natureza de  

tecnologia não patenteável, negando a tais produtos direitos de propriedade 

autoral (copyright), e ao mesmo tempo instituiu o registro dos programas de 

computador  comercializados  no  mercado  local,  cedendo preferência  aos  

produtos desenvolvidos no país”193.

Essa medida foi tomada em resposta à  tentativa de empresas norte­americanas de 

registrar no Brasil os seus softwares como obras intelectuais, ou seja, já em 1982 a questão 

da propriedade das idéias estava colocada no mercado brasileiro de softwares.

No ano de 1986 as relações com os Estados Unidos estavam extremamente tensas e 

o  copyright  para o  software  era uma das principais questões em discussão. Os órgãos do 

190  SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. p. 159191 Cf. VIGEVANI, Tullo.  O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. ; SANTOS   FILHO,   Gildo   Magalhães.  Um   bit   auriverde:   Caminhos   da   tecnologia   e   do   projeto desenvolvimentista   na formulação  duma política nacional de informática para o Brasil (1971­1992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) ­ Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. ;  TACHINARDI, Maria Helena. A Guerra das Patentes : O conflito Brasil x EUA sobre propriedade intelectual. São Paulo : Paz e Terra, 1993.192  Vide: Anexos, documento III193  VIGEVANI,  Tullo.  O Contencioso Brasil  x  Estados Unidos da  Informática  :  Uma Análise  Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. p.104.

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governo encarregados de gerir a política de informática, pretendiam que o  software  fosse 

comercializado   com   controle   sobre   o   limite   de   pagamentos   de  royalties  e   pela   via   do 

licenciamento de empresas brasileiras.  Havia também a intenção de exigir que o registro 

dos softwares fosse feito na forma de código fonte, reflexo da busca da capacitação para a 

concepção   e   engenharia   dos   produtos,   tom   principal   de   toda   a   política   brasileira   de 

informática, o que alarmava as empresas norte americanas.

“Em relação  à  questão  do software, além dos pontos já  citados, um 

outro era considerado essencial pelos Estados Unidos: a regulamentação  

da   obrigatoriedade   ou   não   das   empresas   exportadoras   de   software   de  

divulgar   seus   códigos­fonte.   Aí   residia   uma   questão   de   princípio   que,  

conforme a decisão  final do governo, implicaria debilitamento de todo o 

conceito   de   capacitação   nacional.   A   embaixada   norte­americana 

preocupava­se   com  o   risco  de  que   fossem   reduzidos  para   três   anos   os 

direitos das empresas estrangeiras sobre seus programas. Enquanto isso,  a  

questão  do código­fonte mobilizaria rapidamente, além dos negociadores  

dos Estados Unidos, as próprias empresas daquele país, em particular as de  

software, que começava a mover­se concretamente em relação  ao Brasil e  

suas empresas.

(...) a abertura do programa fonte era um risco inaceitável para as  

empresas   produtoras   de   software,   pois   abririam   mão   da   matéria­prima 

básica   do   retorno   de   seu   investimento   intelectual   em   pesquisa   e  

desenvolvimento.   Este   era,   certamente,   um   caso   de   conflitualidade  

estrutural   de   difícil   equacionamento,   em   que   a   perspectiva   cooperativa 

tinha difícil aplicação”.194

A   questão   do  software  mereceu   então   lei   específica195,   criada   devido   à   pressão 

americana e que foi enviada para tramitar no Congresso, mantendo as premissas brasileiras 

194 Idem, 1995, p. 246 e 248.195  Vide: Anexos, documento III (Lei No 7,646, de 18 de dezembro de 1987)

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de  inserção na  indústria  de   informática:  mantendo o  controle  do mercado e  buscando a 

capacitação para a concepção e engenharia dos produtos informáticos.

Em maio  de  1986  a  Microsoft  comunicou  a  empresas  brasileiras,   incluindo  aí  a 

Itautec, que poderiam ser processadas pela violação da propriedade do MS­DOS. A defesa 

da Itautec alegou ter desenvolvido um software de sistema operacional, compatível com o 

IBM­PC,   sem   consulta   a   especialistas,   código   fonte   ou   documentação   da   Microsoft, 

portanto não configurando cópia.

“A iniciativa da Microsoft  visou,   inicialmente,  a algumas empresas  

brasileiras: além da Itautec, Sid, Microtec, Prológica e outras. Cerca de 

cinqüenta empresas brasileiras poderiam ser atingidas pela acusação. (...) a  

SDD – Sistemas de Informática que licenciou para outros quinze fabricantes  

o chamado SSD­DOS, negou desde o princípio qualquer plágio. (...) provas  

em   poder   da   Microsoft,   obtidas   através   de   peritagem   em   micros   e  

programas,   eram   em   alguns   casos   comprobatórias   e   em   outros  

insustentáveis,   mas   o   fato   é   que   estas   pressões   produziram   resultados 

importantes (...)”.196

Destes  o  mais   relevante   talvez   tenha  sido  o  auxílio  em minar  o  apoio   interno  à 

Reserva de Mercado. Diante das acusações, diversos empresários viram­se compelidos a 

considerar e defender o licenciamento do produto da Microsoft. Esta postura parece ter sido 

particularmente forte entre os casos onde havia a perspectiva   “comprobatória” de fraude, 

que tornava o licenciamento ainda mais atraente, já que não haveria grande investimento em 

pesquisa e desenvolvimento a ser perdido.

Este relato dá a idéia da importância para o Brasil da autonomia sobre os softwares 

e em especial sobre o seu próprio sistema operacional, assunto sobre o qual pode­se juntar a 

efetiva atuação do USTR197 contra a obtenção de um sistema operacional pelo Brasil.

196  VIGEVANI,  Tullo.  O Contencioso Brasil  x  Estados Unidos da  Informática  :  Uma Análise  Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. p. 252.197 United States Trade Representative

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Um conjunto  de empresas  brasileiras,  unidas  na Associação para o  Progresso da 

Informática (API) vinha negociando há  três anos com a ATT198  a compra de seu sistema 

UNIX, com o código fonte incluso, até que a negociação foi terminada pela ATT.

“(...) o Departamento de Comércio e o USTR não ordenaram medidas 

concretas à  ATT, mas alertaram para os perigos que a falta de proteção de  

software   no   Brasil   traria   para   um   produto   no   qual   estava   implícito   o  

licenciamento do código­fonte.

(...) a ATT interrompeu as negociações, o que evidenciou a força de  

liderança da ação estatal norte­americana, que, confirmando mais uma vez  

nossa hipótese, tinha objetivos de caráter estratégico, mais amplos que os  

aspectos comerciais específicos”.199

Nesta época o Brasil já contava com inúmeros “clones” do UNIX desenvolvido por 

empresas como “COBRA (SOX), Digirede (Digix), Edisa (Edix), USP e Prológica (Real),  

Núcleo de Computação e Eletrônica da UFRJ (Plurix)”200, mas os empresários brasileiros 

estavam em busca do licenciamento do UNIX para contarem com um padrão único.

O contencioso da informática entre Estados Unidos e Brasil arrastou­se por anos, 

periodizados entre setembro de 1985 e outubro de 1989 pelo Prof. Tullo Vigevani.  Entre 

todas as questões levantadas nos anos de debate entre as duas nações foram contestadas 

posições   sobre:   a   legalidade   da   engenharia   reversa,   o   direito   à   autonomia   tecnológica, 

proteção à indústrias nascentes, reserva de mercado e clonagem de sistemas. 

Porém   foi   a   questão   da   propriedade   intelectual   e   do   direito   à   propriedade   dos 

softwares,   em   especial   dos   sistemas   operacionais,   que   levou   mais   tempo   para   ser 

equacionada, levando o Brasil à beira de pesadas sanções econômicas, justamente por uma 

ação contrária ao MS­DOS da Microsoft.

198 American Telephone and Telegraph199  VIGEVANI,  Tullo.  O Contencioso Brasil  x  Estados Unidos da  Informática  :  Uma Análise  Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. p.264.200 Idem, 1995, p. 264.

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Atuando dentro dos limites técnicos da lei de reserva de mercado, a SEI (Secretaria 

Especial de Informática) recusou o registro e proibiu a comercialização no Brasil do MS­

DOS em setembro de 1987, por existir um similar nacional, o Sisne, da Scopus. Com a crise 

econômica instalada no Brasil o momento era oportuno para o governo americano “atender  

às  reivindicações da Microsoft”201 (que então não tinha nenhuma participação no mercado 

brasileiro)   e   anular   porções   da   lei   do  software,   relacionadas   à   propriedade   intelectual, 

inaceitáveis para os negociadores norte­americanos.

Esta ação fora desencadeada por empresas brasileiras que considerando a posição da 

Microsoft de líder neste segmento, entraram em um acordo com a empresa e solicitaram o 

registro do MS­DOS a SEI. O resultado da negativa foi a Scopus ser acusada de pirataria 

pela   Microsoft,   que   inclusive   ao   lado   de   outras   produtoras   de  software  como   Lotus   e 

Autodesk, buscou levar o caso ao Congresso Norte Americano.

O resultado direto dos protestos da Microsoft foi o anúncio, pelo presidente Reagan, 

que o Brasil  sofreria  sanções no valor  de 105 milhões  de dólares,  em produtos a  serem 

definidos, ação que serviu definitivamente para minar o já vacilante apoio da sociedade e 

da classe empresarial (que como sabemos nunca aderiu com muita convicção) à reserva de 

mercado.  O  valor  da   sanção   inclusive  cheou  a   ser  contestado,  pois   se   fosse  constatado 

algum prejuízo da Microsoft ele escilaria entre 1,5 e 4 milhões de dólares.

“(...)  Bill  Gates   se   empenhou  pessoalmente   em  reverter   a   decisão  

brasileira  de  não  autorizar  o   licenciamento  do  MS­DOS.   (...)  Gates  em  

nenhum   momento   aceitou   que   a   similaridade   prevista   na   legislação  

brasileira era uma idéia razoável e válida (...) ele usaria todo seu poder de  

lobby para conseguir licenciar o DOS, o que efetivamente ocorreu”.202 

Pela   segunda  vez  neste   texto  é  necessário   remeter  o   leitor,  pela  semelhança  dos 

casos, à questão da clonagem do software do Lisa, o acordo da Microsoft com John Sculley 

e   o   indeferido   processo   da   Apple   contra   a   Microsoft   por   conta   da   “similaridade”   do 

Windows com os sistemas operacionais dos Macintosh.

201 Idem, 1995, p. 298202 Idem, 1995, p. 301

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Como forma de suavizar a postura americana e tentar evitar as sanções anunciadas 

Sarney sancionou a Lei 7.646 (18/12/1987), chamada Lei dos Softwares, com 13 vetos, que 

atendiam   parcialmente   às   demandas   norte­americanas,   que   viriam   a   ser   plenamente 

satisfeitas até a regulamentação da lei203.

Desta   forma,   em  “(...)   1989,   os   gastos   em   P&D   das   empresas  

nacionais  de   informática  atingiram US$ 340 milhões,  correspondendo a  

8,2% de seu faturamento total. Neste contexto, havia grande demanda por 

profissionais altamente qualificados, serviços técnicos e treinamento.

A   partir   de   1990,   com   o   início   do   processo   de   liberalização   do  

mercado de informática, as empresas passaram a buscar no exterior não só  

a tecnologia como os próprios produtos finais, através da importação  de 

kits ou equipamentos totalmente montados. Em conseqüência, as empresas  

nacionais reduziram suas atividades de P&D em até 70%, desmobilizando  

grande parte das equipes técnicas.

A   natureza   da   demanda   por   serviços   tecnológicos   também   foi  

alterada,   refletindo   a   ênfase   em   marketing   das   novas   estratégias   das  

empresas nacionais.”204

E em 1991 a Lei 8.248, de 23 de outubro é  sancionada pelo presidente Fernando 

Collor   de   Mello,   terminando   em   definitivo   com   a   reserva   do   mercado   brasileiro   de 

informática em outubro de 1992, datas que marcam a capitulação brasileira no seu objetivo 

de autodeterminação tecnológica.

203 VIGEVANI, Tullo, loc. cit.204  TIGRE,  Paulo  Bastos.  Liberalização e  capacitação  tecnológica:  o  caso  da   informática  pós­reserva  de mercado no Brasil. In: SWARTZMAN, Simon (Coord.); KRIEGER, Eduardo... [et. al.]. Ciência e Tecnologia no Brasil : política industrial, mercado de trabalho e instituição  de apoio.  Rio de janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1995. p. 179.

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 4.5. O Software Livre e a política brasileira de desenvolvimento tecnológico, uma nova tentativa de autodeterminação.

O florescimento dos microcomputadores nos Estados Unidos e no Brasil, apesar de 

tudo, guarda certas semelhanças. Se nos Estados Unidos foi a contra­cultura quem criou o 

PC, no Brasil ele foi criado pela engenharia reversa, ambos movidos a combustíveis com 

uma identidade comum: a rebeldia.

É preciso destacar o peso do conceito de “engenharia reversa” e dar alguma noção 

de  sua   importância,  pois  mesmo diante  do  fracasso,  ele  capacitou   toda  uma geração de 

técnicos brasileiros.

Este conceito faz um paralelo com a importância do conhecimento do código fonte 

dos  softwares  e   do   sistema   operacional,   já   que   é   nesta   dimensão   que   está   a   diferença 

fundamental   da   capacitação   para   o   Estado:   ter   técnicos   que   sejam   apenas   “operadores 

certificados”  de  um sistema  operacional  alienígena  ou   ter  “engenheiros”  de  um sistema 

operacional, nacional (ou transnacional no caso do Linux).

O   ocaso   da   política   nacional   de   informática   põe   em   relevo   a   questão   da 

autodeterminação  tecnológica  dos  países,  demonstrando  que  ela  não estava  acessível  ao 

Brasil de então – nem em suas décadas de desenvolvimentismo estruturalista, de inspiração 

cepalina, muito menos na guinada neo­liberal que o acomete em seguida.

“Uma   condição   prévia   para   a   autodeterminação   é   ter   um   grau  

significativo de autocontrole ou independência nacional, entendendo­se por  

isso a liberdade de fixar objetivos nacionais e de escolher os meios para  

alcançá­los. Isto implica um ato político de afirmação e a possibilidade de  

mantê­lo – neutralizando interferências externas e internas – durante todo o  

tempo necessário para consolidar as transformações e fixar as bases da  

estrutura sócio­econômica que se deseja alcançar. Este ato de afirmação  

deve incluir medidas que permitam regular investimentos, modificar pautas  

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de   consumo,   dirigir   a   orientação   das   atividades   sociais   produtivas,   e  

determinar o uso dos recursos naturais.”205

Dos três pontos que Sagasti elege como centrais na autodeterminação tecnológica de 

um  país206,   o   Brasil   só   conseguiu   implementar   satisfatoriamente   a   capacidade  de   gerar 

conhecimento técnico, falhando na tomada de decisões autônomas e falhando na capacidade 

de produção interna. Assim, os anos 90 vão configurar o Brasil basicamente em mais um 

mercado consumidor de informática.

Este cenário ficará  praticamente inalterado até  2002 quando o PT chega ao poder 

com a eleição de Lula. O PT trazia consigo diversas experiências implantação bem sucedida 

de Softwares Livres em administrações municipais, embora o Software Livre não seja seja 

exclusividade   do   PT207  é   sintomático   que   logo   que   se   confirmou   a   vitória   de   Lula,   a 

imprensa tenha especulado que Bill Gates, por intermédio do senador Cristóvão Buarque, 

tenha enviado uma cópia de seu livro A empresa na velocidade do pensamento, e uma carta 

convidado Lula  para visitar os EUA e conversar sobre como implementar projetos de alta 

tecnologia   no   Brasil208.   Afinal,   a   adoção   em   escala   Federal   da   políticas   petistas 

representaria  não   apenas   uma   perda   de   mercado,   como  um  péssimo   precedente  para   a 

Microsoft.

205  SAGASTI,   Francisco   R.  Tecnologia,   Planejamento   e   Desenvolvimento   Autônomo.  São   Paulo: Perspectiva, 1986. p. 130­131206  Francisco   Sagasti,   professor   da   Universidade   do   Pacífico,   em   Lima   na   década   de   90,   foi   chefe   de Planejamento   Estratégico   do   Banco   Mundial   de   1987   a   1991   e   trabalhou   nos   ministérios   das   Relações Exteriores e Planejamento e Indústria, do Peru. Segundo Sagasti três pontos são centrais na autodeterminação tecnológica:

a) A capacidade de tomar decisões autônomas em questões de tecnologia. b) A capacidade de gerar de modo independente os elementos críticos do conhecimento técnico que 

são necessários à obtenção de um determinado produto ou processo.c)  Capacidade  potencial  autônoma de produzir,  dentro do país,  os  bens e  serviços considerados 

essenciais na estratégia de desenvolvimento.in   SAGASTI,   Francisco   R.  Tecnologia,   Planejamento   e   Desenvolvimento   Autônomo.  São   Paulo: Perspectiva, 1986. p.128­129207  O Metrô  da cidade de São Paulo constituí  um dos casos de sucesso mais  antigos na  implantação de Software Livre na administração pública brasileira, com um processo cujo início data de 1997 e tem servido de  modelo  para  diversas  autarquias,  mas  é   com os programas  governamentais  de   inclusão digital  que  o Software Livre vai ganhar o seu momentum no Brasil.208  LÓPEZ,  Nayse   ­  Publico.pt   ­  Eleições  Brasil  2002  :  Lula  virtualmente  eleito   com 66  por   cento  das intenções de voto. 22 set. 2002. Disponível em: <http://dossiers.publico.pt/shownews.asp?id=191976&idCanal=989>. Acesso em: 20 ago. 2006

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Do exposto  até  agora,   fica  evidente  a   importância  estratégica do  Software  Livre, 

para o governo brasileiro (e para outros governos); um ponto importante é a diminuição dos 

gastos com licenciamento de softwares, que reflete na remessa de dólares ao exterior, e traz 

o   benefício   adicional   de   diminuir   os   impedimentos   orçamentários   para   programas 

governamentais  de   inclusão  digital,   uma  característica  que  é   em  si  mesma  geradora  de 

resultados sociais maiores. 

Entre   outras   medidas,   os   programas   de   inclusão   passam   invariavelmente   pela 

criação de Telecentros; espaços públicos dotados de computadores e acesso à Internet onde 

o   cidadão   (em   geral   de   baixa   renda)   tem   acesso   ao   uso   e   a   uma   formação   básica   na 

operação de computadores.

A   idéia  de   implantar  Telecentros   equipados   com  Software  Livre  na  periferia  da 

cidade  de  São  Paulo,   como  parte  da  política  de   inclusão  digital,  partiu  do   sociólogo  e 

militante político Sérgio Amadeu da Silveira. Em 2000, no Instituto de Políticas Públicas 

Florestan   Fernandes,   Amadeu   idealizou   o   projeto   que   seria   utilizado   pela   futura 

administração petista da capital. De acordo com uma de suas declarações: "Queria fazer um 

programa que servisse inclusive para ajudar na eleição da então candidata à Prefeitura de  

São Paulo Marta Suplicy."209

Com a eleição de Marta Suplicy, o primeiro Telecentro foi  implantado em 18 de 

junho de 2001, na zona leste de São Paulo, no bairro Cidade Tiradentes. O programa foi 

vitorioso   e   hoje   conta   com   145   Telecentros   espalhados   por   toda   São   Paulo,   mantidos 

“quase”210 dentro da mesma filosofia pela administração do PSDB, que se seguiu ao PT na 

administração da Capital paulista.

209  Jornal O Estado de S. Paulo (15/08/2004 – Geral ­  Um militante na batalha pelo  software  livre ­  Ex­comunista, chefe do ITI agora luta pela adoção dos programas gratuitos).210 Notícias veiculadas pela imprensa em 05/05/2006 dão conta da disposição da Prefeitura paulista em utilizar softwares proprietários nos Telecentros indicando uma mudança de postura sobre o Software Livre juntamente com a mudança da administração. Vide:  IDG Now! ­ Internet ­ Governo Eletrônico : Telecentro de São Paulo começa a usar softwares da Microsoft. 05  Abr.   2006.   Disponível   em:   <http://idgnow.uol.com.br/internet/2006/04/05/idgnoticia.2006­04­05.6370476977/IDGNoticia_view>.  Acesso em: 12 Abr. 2006  IDG Now!  ­  Computação   Corporativa  ­  Software  Livre  :  Software   livre  não  é   prioridade   em SP,   diz secretário.   26   Mai.   2006.   Disponível   em: <http://idgnow.uol.com.br/computacao_corporativa/2006/05/25/idgnoticia.2006­05­25.1402726512/IDGNoticia_view>.  Acesso em: 12 Abr. 2006

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Com   a   chegada   do   PT   ao   poder   em   2002,   chega   também   a   política   petista   de 

adoção de Software Livre em geral e do Linux em particular, consolidada por experiências 

em diversas prefeituras e no governo do Rio Grande do Sul, e pelos Telecentros paulistas. 

Quando Lula assume em 2002 Sérgio Amadeu da Silveira é indicado como diretor 

do ITI (Instituto Nacional da Tecnologia da Informação) onde dá início a agressiva política 

de implantação do Software Livre em toda a administração federal.

As motivações desta política são consistentes, para um governo o Software Livre é 

estratégico por diversas razões, além da já mencionada questão macroeconômica, existem 

ainda   a   independência   e   autonomia   tecnológica,   a   segurança   de   informações,   e   a 

independência em relação a fornecedores para serem consideradas.

Razões que não passam despercebidas pelo novo Governo Federal, que oficialmente 

integra o Software Livre à política de ciência e tecnologia:

“O presidente Luís Inácio Lula da Silva, em Decreto de 29 de outubro 

de 2003211,   instituiu oito comitês técnicos com o objetivo de coordenar e  

articular o planejamento e a  implementação  de Software Livre,   inclusão  

digital   e   integração   de   sistemas,   dentre   outras   questões   relacionadas.  

Atualmente,   o   Instituto   Nacional   de   Tecnologia   da   Informação   ­   ITI 

coordena o Comitê Técnico de Implementação de Software Livre.”212

A posição do governo é reiterada em várias oportunidades, onde incentiva a adoção 

e   a   produção   de  Software   Livre  como   um   novo   paradigma   capaz   de   possibilitar   o 

crescimento e fortalecimento da indústria de softwares, gerando emprego e renda. 

Novamente   o   Brasil   passa   a   ter   uma   política   federal   para   o   desenvolvimento 

tecnológico focada na a área de informática. Também fica clara a importância estratégica e 

especialmente a dimensão política do Software Livre, agora colocada em relevo.

211 Vide: Anexos, documento IV.212 fonte: http://www.iti.br/

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O discurso do então Ministro da Casa Civil (ministério ao qual o ITI é filiado), José 

Dirceu,   feito   na   abertura   do   Seminário   de  Software   Livre  organizado   pelo   Congresso 

Nacional213, dá o tom dessa dimensão política:

 Senhoras e senhores...

Felicito   o   Congresso   Nacional   por   incentivar   o   debate   sobre   a  

importância da adoção  do software livre neste momento em que o mundo  

começa a superar o paradigma do software proprietário. O atual Governo 

tem um claro compromisso com o desenvolvimento nacional. 

(...) A tecnologia da informação é um dos caminhos para o almejado  

crescimento.  É   necessário   que   o   país   produza   bens   de   elevado   valor  

agregado, como é o caso de softwares, e seja capaz de colocá­los de forma  

competitiva no mercado internacional. Somente assim conseguirá  quebrar  

o ciclo histórico e empobrecedor caracterizado por importações de bens de  

elevado custo contra exportação de mercadorias de pequeno valor. (...) Da 

mesma   forma   devemos   incentivar   a   nossa   inteligência   coletiva   que 

permita   a   redução   do   pagamento   de   direitos   autorais,   na   forma   de 

royalties.

Possivelmente,   temos   neste   momento   uma   janela   de   oportunidade 

única para a nação,  capaz de colocar o Estado brasileiro em patamar de  

igualdade com países economicamente mais fortes. 

(...) O movimento do software livre traduz exatamente esses anseios,  

além de reafirmar nosso  compromisso  com a  redução  de  custos,  com a  

diversificação   de   fornecedores,   com   o   domínio   tecnológico   e   com   a  

capacitação de nossas empresas. Dominar o código fonte, usar totalmente 

213  Com o objetivo de discutir a utilização do  Software  Livre no Brasil, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados promoveram a “Semana do  Software  Livre no Legislativo”, entre os dias 18 e 22 de agosto de 2003, no Congresso Nacional. Vide: www.congresso.gov.br/softwarelivre

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um software sem restrições, propiciar a criatividade e o desenvolvimento  

coletivo são condições para o rápido progresso nessa área.

(...)   Este   evento   realizado   pelo   Congresso   Nacional   é   um   marco  

histórico, sendo mais uma demonstração de que o software livre é mais do  

que uma possibilidade para o nosso crescimento,  na  verdade,  veio para 

ficar.214

Além do convite para Lula visitar a Microsoft, a empresa norte­americana passou a 

atuar   com   renovado   interesse  no   estabelecimento  de   parcerias   com   diversas   esferas   do 

governo, na forma de descontos e/ou doações de softwares, enquanto este por sua vez mais 

se mostrou arredio aos novos gestos de amizade, declinando e optando por buscar outras 

soluções tecnológicas.

Em entrevista  à   revista  Carta  Capital215,  Sérgio  Amadeu  sumarizou  a  postura  do 

governo a estas investidas, alegando que eram “prática de traficante” acreditando se tratar 

de   um  “presente   de   grego,   uma   forma   de   assegurar   massa   crítica   para   continuar  

aprisionando o País.”  Os comentários renderam a Amadeu um processo na justiça216,  do 

qual, talvez pela má  publicidade, talvez pelo movimento de defesa que a comunidade do 

Software Livre organizou para Sérgio Amadeu, ou talvez pela necessidade de manter boas 

relações com o governo, a Microsoft terminou por desistir.

As   relações   da   Microsoft   com   o   governo   brasileiro   (e   outros   governos)   são 

abordadas   em   julho   de   2005   pelo   executivo   da   Microsoft   Kevin   Johnson217  no   já 

214 Discurso do ministro­chefe da Casa Civil, José Dirceu, na solenidade de abertura do seminário "Software livre e Desenvolvimento do Brasil", no Americel Hall, localizado na Academia de Tênis, em Brasília/DF. 19 Ago. 2003. Disponível em:  <www5.senado.gov.br/boletimprodasen/ssl/semanaslleg/dirceu/document_view?month:int=6&year:int=2005> ou   <www.iti.br/twiki/bin/view/Main/DiscursoDirceu>   ou <www.presidencia.gov.br/casacivil/pronunciamentos/jd_19082003pr.htm>  Acesso em: 10 Ago. 2006. Grifos nossos.215 O Pingüim Avança. Carta Capital,  17 de março de 2004 ­ Ano XI ­ Número 345.216 Interpelação judicial da Microsoft contra Sérgio Amadeu, presidente do ITI.3a. Vara de Justiça Federal de Barueri, SP. Disponível on­line em:<http://www.cic.unb.br/docentes/pedro/trabs/eucaristia_files/interpMS.html>   e <http://www.softwarelivre.org/downloads/interpelacaoMicrosoftxAmadeu.pdf>. Acesso: 17 Ago. 2006217  Group Vice President, Worldwide Sales, Marketing and Services Group

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mencionado   encontro   dos   analistas   financeiros   (os   negritos   destacam   os   trechos 

considerados mais relevantes):

“(...)  Eu gostaria de lhes dar três coisas: Eu gostaria de falar um 

pouco sobre como nós mobilizamos. (...) Eu gostaria de tocar brevemente  

no trabalho que estamos  fazendo com governos acerca de alguns destes  

cenários de inclusão digital.

(...)  Conforme   nos   comprometemos   com   líderes   de   governo,   eles  

falam   sobre   suas   prioridades,   suas   agendas,   (...)   De   muitas   maneiras  

alguns líderes de governo, inicialmente, podem ter pensado que o Linux ou  

Open Source eram o caminho para ajudar com estas áreas. E temos focado 

em  nos   comprometer   de  uma  maneira   que   permita  mostrar   o   valor   da 

proposição  da Microsoft para o governo. (...) Então  como você  cria uma 

economia tecnológica forte e saudável em um país?

(...) Agora nós temos um programa chamado Partners in Learning218 

que   está   operando   em   91   países,   onde   nós   fornecemos   softwares   para  

educação, treinamos professores, e fazemos parcerias com empresas locais  

para a reciclagem de PCs. (...) Um exemplo que encontramos em diversos 

países   é   que   eles   focam   em   programas   de   PCs   populares.   Vou   lhes  

apresentar um cenário. Vou tratar do Windows Starter Edition, mas quero  

lhes apresentar o cenário no Brasil. O governo brasileiro estava bastante 

focado na   inclusão  digital,   e  eles   iniciaram uma discussão  sobre  o  que 

chamam PC Conectado, que era fornecer no país um PC de baixo custo  

para usuários  iniciantes.    O governo, através de um boa discussão  com 

parceiros, promoveu uma redução de impostos para PCs  independente de  

qual sistema operacional eles usem, sendo ele Linux ou Windows, deixando 

o consumidor decidir. 

218 ou “Parceiros no aprendizado” em português.

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Nós então  trabalhamos bem próximos aos consumidores no Brasil  

para   criar   uma   versão   do   Windows   Starter   Edition   em   português  

brasileiro. Nós trabalhamos com inúmeras empresas brasileiras, incluindo 

Positivo, um OEM local, e outros OEMs incluindo Itautec, Novadata, Semp 

Toshiba;   e   trabalhamos   com   os   principais   distribuidores   brasileiros 

incluindo Magazine Luiza, Casas Bahia, Extra, e Ponto Frio. 

E conforme o governo continua a dar forma ao seu programa, nós  

descobrimos que indo ao mercado com estes parceiros, com a versão focada  

do   Windows   Starter   Edition,   obtivemos   resultados   muito   positivos.   Na  

verdade, no Brasil, se olharmos para o trimestre atual versus o trimestre de  

um ano atrás, a venda de PCs para o consumidor cresceu 45%, e  nossa  

venda de unidades do Windows cresceu 107%.

Windows Starters Edition foi uma grande parte desse crescimento,  

mas também o Windows XP Windows XP Home Edition cresceu,então não  

apenas  atingimos  o  usuário   iniciante   de  PCs,   como a  oportunidade  de 

upgrades no país é ainda bastante positiva.

(...)  Nós  estamos muito contentes com o nível  das discussões  que  

temos tido com líderes de governo no Brasil, e o fato de que temos muitos,  

muitos   parceiros   participando   disto   no   Brasil.  E   isto   está   focado   na 

inclusão digital, trazendo tecnologia para usuários iniciantes de PCs, seja 

pela educação  com o Partners in Learning, ou pelo trabalho que fizemos 

com   o   Windows   Starter   Edition   e   o   times   brasileiros   locais,   que   estão  

construindo  uma  economia   local   de   softwares  mais   saudável,   economia  

tecnológica local no Brasil. Nós estamos mostrando que existem benefícios  

que podemos entregar, não  apenas para o consumidor, mas para o país  

como um todo.”219 

219  Financial   Analyst   Meeting   2005   :   MSFT   Investor   Relations.   28   Jul.   2005.   Disponível   em: <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY05/JohnsonFAM2005.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006

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As  declarações  de  Kevin   Johnson  são  verdades  parciais,   suscitam  a   reflexão  de 

alguns pontos, e auxiliam na contextualização de outros. Primeiro há  a admissão clara e 

formal de uma política de  lobby  sobre os governos e seus representantes220,  o que não é 

exclusividade da Microsoft, mas ajuda a contextualizar o convite feito por Bill Gates a Lula.

Depois há a questão da catequização de professores e alunos, conforme a Microsoft 

fornece “software para educação”, que por sua vez ajuda a contextualizar as declarações de 

Sérgio Amadeu à Carta Capital.

Porém,   o   principal   elemento   que   merece   contextualização   aqui   é   a   natureza   do 

software Windows XP Starter Edition, repetidamente mencionado. Uma versão simplificada 

do Windows XP, que foi lançada em fins de 2003 visando países como Rússia, Tailândia, 

Indonésia, Índia e Malásia.

Ele é vendido com um preço diferenciado e faz parte da estratégia da Microsoft de 

combate à  pirataria.  Também tem sido utilizado pela empresa como forma de concorrer 

com o custo quase zero do Linux nos programas governamentais de inclusão digital.

Devido às suas limitações práticas foi apelidado por seus críticos de "Windows dos 

pobres", em referência ao fato de que a simplificação do sistema, alegadamente a razão para 

o  preço   diferenciado,   traduz­se   em   limitações  de  uso   em   relação  as  outras   versões  do 

Windows XP. 

Segundo a Microsoft as limitações não são relevantes para o primeiro computador 

de um usuário, e o público­alvo do Starter Edition é justamente a população que busca sua 

inclusão digital com o programas como o do PC Conectado.

Entre as limitações do Starter Edition temos a fato de que o usuário não pode abrir 

mais de três aplicativos por vez, com três janelas de cada um; desconsiderados programas 

antivírus e  discadores de internet que não são contabilizados. Esta versão simplificada do 

Windows também não traz recursos de conexão para redes locais de computadores.

220 Sobre isto é interessante notar, por exemplo, a insistência de Bill Gates em um encontro pessoal com Lula. Depois do primeiro fracasso em 2002, logo após a eleição presidencial, o fundador da Microsoft faz nova investida em 2005 no fórum de Davos. Vide: SOUZA, Leonardo ­ Folha OnLine ­ Presidente evita ter encontro com Bill Gates. 29 Jan 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u66930.shtml>. Acesso em: 20 ago. 2006

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O  Windows XP Starter Edition é talvez o mais eloqüente exemplo da importância 

da   autodeterminação   tecnológica   para   os   países   do   Terceiro   Mundo221,   pois   exibe 

claramente a impossibilidade de um país consumidor de tecnologia alienígena em  tomar 

decisões autônomas  e ter acesso a artefatos técnicos avançados, novamente recorremos à 

citação   de   Gildo   Magalhães   lembrando   que  “a   produção   transplantada   dos   países  

adiantados se desloca para a periferia do sub­desenvolvimento apenas após a tecnologia 

envolvida   ter   se   tornado   rotineira”  (citação   na   página  105).     No   caso   específico   do 

Windows XP Starter Edition há um componente perverso que é a intenção de produzir um 

produto  inferior  derivado de  outro  superior.  Todas  as  explicações   técnicas,  comerciais  e 

mercadológicas   que   possam   ser   enumeradas   na   defesa   desta   abordagem   não   podem 

competir com o argumento de que no Software Livre as limitações, quando existirem, serão 

determinadas  pelo  usuário   que   tem  pleno  acesso   a   tecnologia   e   não   por  uma  empresa 

estrangeira. Este aspecto será melhor discutido nas conclusões que se seguem.

221 O conceito de “Terceiro­Mundo”, com o desaparecimento daquele que seria o Segundo­Mundo, vem sendo revisto e muitos acadêmicos concordam que é uma categoria ultrapassada, melhor substituída por expressões como “em desenvolvimento”. Sendo este um trabalho de história a defesa da expressão “Terceiro Mundo” é baseada na carga histórica e ideológica que carrega, já que separa com clareza o lado da mesa em que países como   o   Brasil   estão   sentados.   O   peso   do   termo   “Terceiro   Mundo”   não   nos   parece   nem   próximo   da subentendida direção de progresso presente no termo “em desenvolvimento” justificando assim, plenamente, sua utilização. 

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 5. Conclusões

Francisco Sagasti alerta em sua obra “Tecnologia, Planejamento e Desenvolvimento 

Autônomo” que os meios de controle dos países desenvolvidos sobre os sub­desenvolvidos 

mudaram   dos   equipamentos   produtivos   para   a   os   recursos   financeiros   e   agora     estão 

representados no controle da tecnologia.  “Haverá  uma tendência em utilizar o acesso à  

tecnologia como alavanca principal nas relações de dominação entre os hemisférios norte  

e sul, com a utilização  subsidiária dos alimentos e, em alguns casos, do capital,  como  

complemento.”222

Para esta pesquisa, tratando agora do significado que tem para o Brasil o Software 

Livre, é interessante refletir sobre a proposta de Sagasti para a superação desta dominação 

tecnológica e a eventual viabilização de uma autodeterminação tecnológica para o Terceiro 

Mundo. 

Esta   proposta   passa   pela   criação   de   uma   aliança   de   cooperação   científica,   que 

confessadamente só funcionaria em um contexto de cooperação econômica e política mais 

amplo. Destarte, ciente das dificuldades e da aparência utopista de sua proposta, Sagasti 

enumera as vantagens que tal cooperação traria aos países subdesenvolvidos:

1. Necessidade   comum   de   enfrentar   o   acelerado   processo   de   mudança 

tecnológica.

2. Aumento da massa crítica mínima necessária para que o esforço tecno­

científico seja viável.

3. Redução   dos   gastos   individuais   dos   países   em   pesquisa   e  

desenvolvimento.

4. Redução dos gastos individuais dos países com recursos humanos.

5. Maior   poder   de   negociação   frente   os   vendedores   de   tecnologia,  

independente do tamanho do mercado interno.

222  SAGASTI,   Francisco   R.  Tecnologia,   Planejamento   e   Desenvolvimento   Autônomo.  São   Paulo: Perspectiva, 1986. p. 133. N. do A. ­ a versão original em espanhol, Tecnología, Planificación y Desarrollo Autónomo, data de 1977

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E aponta também o que considera as principais dificuldades na implementação de 

sua proposta:

1. A   simplicidade   com   que   são   celebrados   acordos   de   cooperação  

puramente científica não  é   tão  simples quando a atividade científica pode ter  

aplicação econômica direta.

2. Mudança do conceito de “região”, onde o agrupamento dos países dar­

se­ia não  mais por critérios geográficos e sim pela natureza dos problemas a 

serem resolvidos.

3. Heterogeneidade dos regimes políticos e suas orientações.

4. Diferença nos níveis de desenvolvimento, especialmente tecnológico.

5. Pressões dos países industrializados.

6. Conduta das comunidades científicas autóctones, que não raro preferem  

ligar­se a centros de excelência nos países desenvolvidos.

Por tudo que se leu até aqui, a proposta de cooperação do livro de Francisco Sagasti, 

aparece   contemplada   na   maioria   das   vantagens   e   superando   as   desvantagens   no   atual 

movimento do Software Livre e em especial no caso do Linux.

A  necessidade  de  enfrentar  um acelerado  processo  de  mudança   tecnológica   tem 

marcado a história do Linux e de outros Softwares Livres. O Linux em especial, nasceu em 

1991 e hoje compete em pé de igualdade, por vezes superando, a técnica de outros sistemas 

operacionais.

A massa crítica mínima necessária para tornar viável o esforço tecno­científico do 

seu desenvolvimento é fornecida pela própria comunidade de desenvolvedores de Software 

Livre,   superando   sob   qualquer   forma   de   aritmética   a   capacidade   individual   de 

desenvolvimento de um Governo ou empresa. A redução dos gastos individuais dos países 

em pesquisa e desenvolvimento ou com com recursos humanos acontece igualmente pelo 

mesmo fator.

Representado por um “mercado” global transnacional, os vendedores de tecnologia, 

sempre estarão colocados frente a uma tecnologia com enorme penetração e conseqüente 

poder de barganha.

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Além  de  englobar  estas  vantagens  o  Linux  e  os  Softwares  Livres   superam  com 

galhardia as principais dificuldades apontadas na cooperação entre países, pois:

O desenvolvimento da tecnologia acontece sem restrições ou dirigismos sobre o uso 

comercial  que cada membro da comunidade fará  dela,  a aplicação econômica é  direta  e 

livre.   O   aspecto   transnacional   mencionado   acima   já   faz   com   que   as   comunidades   se 

organizem por interesses, ou pela natureza dos problemas a serem resolvidos. A questão 

geográfica   não   chega  nem  mesmo  a   ser   uma   questão,   e   a  heterogeneidade   de   regimes 

políticos e suas orientações tem um peso muito pequeno. Apenas para ficar com o caso do 

Linux, este atende programas governamentais implementados em países tão diversos como 

Alemanha, Brasil, China, Argentina, Índia, Coréia do Sul, Rússia, Japão, Peru e Bélgica, 

para citar alguns223.

O  que   nos   demonstra   que   a   diferença   nos   níveis   de   desenvolvimento   social   ou 

tecnológico não chegaram a constituir uma barreira para nenhum destes países nem para os 

desenvolvedores   nativos,   já   que   com   todos   ligados   entre   si,   diluem­se   os   conceitos   de 

“centro”  e  “periferia”.  Com adoção  tão diversificada  na  esfera  geográfica,  econômica  e 

política a pressão que poderia ser exercida pelas nações industrializadas não tem um ponto 

focal onde ser aplicada.

Sagasti   concluí   em   tom   sombrio   que  “a   menos   que   países   subdesenvolvidos  

empreendam a curto prazo ações concretas – organizando um plano de cooperação como o  

que  aqui   se  propõe,  ou   executando  na  prática  qualquer  outra   forma de  esquemas  de  

colaboração – a autodeterminação em matéria de tecnologia continuara uma ilusão para a  

quase totalidade do Terceiro Mundo”224.

Não se trata aqui de pretender mudar os destinos dos países subdesenvolvidos pela 

via do  Software Livre,  mas sim apontar a relevância desta peça no quebra­cabeças a ser 

montado por cada nação do Terceiro Mundo.

223  Brasil,   Índia,   Rússia   e   China   são   constantemente   referidos   como   os   “BRIC   Countries”,   países   com potencial de crescimento, grandes mercados e políticas governamentais incentivando maciçamente a adoção de Softwares Livres.224  SAGASTI,   Francisco   R.  Tecnologia,   Planejamento   e   Desenvolvimento   Autônomo.  São   Paulo: Perspectiva, 1986. p.142

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Outro ponto a  ser tratado aqui,  é  que a questão dos  softwares  se  coloca além da 

ideologia   motriz   do   seu   desenvolvimento,   ela   coloca   a   relevante   questão   do   domínio 

tecnológico e  cultural,  passando  assim a  ser  uma  questão estatal,   relevante  ao ponto  de 

mobilizar países díspares em população, cultura e interesses como Coréia do Sul,  Japão, 

Alemanha, Brasil, Rússia, Índia e China.

Consolidados os efeitos perversos da mundialização do capital, da globalização da 

cultura   e   com   o   crescente   recrudescimento   das   posturas   e   constantes   tomadas   de 

posição unilaterais por parte do Governo Norte Americano, os governos passam a ter 

real interesse no desenvolvimento de soluções computacionais "domésticas", capazes de 

retirar área tão sensível de sua economia do monopólio de empresas americanas.

O Brasil é hoje um dos países mais envolvidos e ativos na defesa, implantação e 

desenvolvimento   do  Software  Livre,   esta   posição   só   é   possível   como   colheita   de 

dividendos do investimento estatal feito na indústria de informática durante o período 

de reserva de mercado. O Brasil se tornou capaz de produzir tecnologia informática e o 

software  (livre  ou não) surge hoje  como produto de  alto  valor  agregado passível  de 

exportação.   O  Software  Livre   concede   ao   Brasil   a   possibilidade   de   permanecer   na 

vanguarda   tecnológica,   tanto   se   aproveitando,   como   contribuindo   com   o 

desenvolvimento tecnológico de diversos outros países.

Investir no  Software Livre é  por estas razões e por todas as outras que já foram 

apontadas estratégico para o desenvolvimento tecnológico brasileiro. A maciça adesão 

das administrações petistas ao Software Livre coloca, portanto, tanto uma oportunidade 

de desenvolvimento que não acontecia  em uma década,  como um perigo de ter este 

processo abortado a qualquer momento. 

O   sistema   democrático   pressupõe   a   alternância   de   partidos   no   poder,   a 

partidarização   da   tecnologia   pode   colocar   o   país   em   um   ciclo   interminável   de 

desmandos capazes de comprometer o desenvolvimento tecnológico brasileiro.

Ao   identificar   o  Software  Livre   como   “bandeira   petista”   imediatamente   ele   é 

posto como algo a ser combatido, substituído ou no mínimo evitado no exato momento 

em que  muda  uma administração.  Não  faltam exemplos  desta  consequência,  onde  a 

prefeitura da cidade de São Paulo parece caminhar para se tornar o caso emblemático.

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A ação em favor do Software Livre não pode estar identificada com um partido ou 

uma   causa   partidária,   embora   o  Software  Livre   seja   sem   sombra   de   dúvida   uma 

tecnologia  política,   esta   tecnologia  não  pode  e  não  deve   ser  partidarizada.  A  causa 

política  do  Software  Livre  deve  ser  social  e  não partidária,  não é  a  bandeira  de  um 

partido   que   deve   ser   com   ela   erguida,   mas   sim   a   bandeira   do   desenvolvimento 

tecnológico nacional.

Por fim, um último aspecto que merece ser abordado é o da  apropriação capitalista 

dos conhecimentos sociais.  Uma das questões centrais  neste trabalho, perseguida sempre 

pela questão subjacente de como romper com o Capital? 

Afinal, se a atuação dos indivíduos no movimento do  Software  Livre é,  como foi 

colocado com a teoria do refluxo, um movimento que se opõe à mercantilização das idéias 

e   do   conhecimento   pelo   capital,   não   há   como   negar   que   a  “idéia   de   libertar   o  

conhecimento das amarras do capital” irá também gerar uma desoneração de custo para as 

empresas, já que estas irão com o Software Livre, como já o fazem, se apropriar de trabalho 

realizado e não pago. 

Com o  Software  Livre existe portanto a apropriação de um trabalho imaterial, em 

geral executado pelo trabalhador em seu momento de lazer. Existe em parte da literatura 

uma   confusão   entre   “produto   imaterial”   e   “trabalho   imaterial”.   Muito   possivelmente   o 

“trabalho   imaterial”   é   uma   categoria   nova   e   talvez   desprovida   de   sentido   dentro   do 

marxismo, considerando o trabalho como combustão da energia humana, ele está presente 

igualmente   na   produção   imaterial,   uma   área   onde   a   exploração   capitalista   da   força   de 

trabalho parece ser na verdade otimizada. De acordo com André Gorz:

“O   fornecimento   de   serviços,   esse   trabalho   imaterial,   torna­se   a  

forma hegemônica de trabalho; o trabalho material é remetido à  periferia  

do processo de produção  ou abertamente externalizado. Ele se torna um 

“momento subalterno” desse processo, ainda que permaneça indispensável  

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ou mesmo dominante do ponto de vista qualitativo. O coração, o centro da 

criação de valor, é o trabalho imaterial”225.

O Software Livre não é, claro, a única forma de apropriação de trabalhado não pago 

da sociedade atual. O engajamento exigido pela maior parte das companhias e o avanço das 

redes telemáticas fazem com o que o trabalhador esteja 24h por dia “conectado” à empresa; 

assim, ainda que formalmente trabalhe um número menor de horas, ele está todo o tempo 

conectado   à   empresa   e   a   ela   agregando   sua   subjetividade,   esta   última   a   nova   unidade 

utilizada para medir sua produção em contraste com antigas medidas de tempo de trabalho.

Com isto pode­se chegar à conclusão de que o  Software Livre deva na verdade ser 

combatido e não incentivado, mas esta conclusão estaria considerando apenas a relação do 

trabalho  com  a  empresa  capitalista,   esquecendo  sua   relação  com  a   sociedade,   já  que  o 

trabalho busca sua emancipação do capital. Ou como coloca André Gorz:

“Essa tendência se vê  abertamente ilustrada na luta que, no centro 

dos   dispositivos   de   poder   do   capital,   os   artesãos   dos   programas   de  

computador e  das  redes   livres   levam adiante.  Com eles,  ao  menos uma 

parte dos que detém o “capital humano”, em seu mais alto nível técnico, se 

opõe   à   privatização   dos   meios   de   acesso   a   esse   “bem   comum   da 

humanidade”, que é o saber sob todas as suas formas. Trata­se aqui de uma 

dissidência   social   e   cultural   que   reivindica   abertamente   uma   outra  

concepção  de economia e sociedade. Ela tem um alcance estratégico em 

relação da importância com que a classe dos trabalhadores do imaterial –  

os   americanos   a   chamam   de   knowledge   class   –   pensa   a   evolução   da 

sociedade e seus conflitos.”226

Assim,   para   contrabalançar   a   questão   colocada   pela  desoneração   de   custo,   que 

acontece na forma de apropriação de tabalho realizado e não pago, como o do  Software 

225 GORZ, André.  O Imaterial. Conhecimento, valor e capital. São Paulo : Annablume; Janeiro de 2005. p.19226 Idem, 2005, p. 63­64

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Livre, não se pode perder de vista o panorama geral, onde este trabalho aparece como a 

busca da emancipação do capital. 

 5.1. Balanço Final.

Com   esta   dissertação   se   espera   ter   contribuído   para   colocar   em   relevo   um   novo 

processo  histórico  em  andamento.  No  coração  das  principais   ferramentas  de   controle   e 

otimização desenvolvidas pelo Capital para se apropriar do tempo e da Inteligência Geral, 

surge de forma dialética, um movimento contrário, contestador das próprias amarras que 

esta otimização e controle estenderam sobre a sociedade e seus bens intangíveis. 

Também se espera contribuir com argumentos para a discussão da propriedade das 

idéias, em especial destacando o quanto a defesa cada vez mais ferrenha das propriedades 

imateriais é prejudicial aos países em geral e aos países subdesenvolvidos em especial.

Outro objetivo perseguido foi o de compreender o processo histórico que fez do Brasil 

um ator relevante na arena do  Software  Livre, premissa necessária para que se aponte na 

direção   do   desenvolvimento   tecnológico   autônomo.   Este   desenvolvimento   passa   pela 

estreita janela de oportunidade que o Software Livre agora nos oferece, oportunidade que se 

aproveitada   pode,   por   sua   natureza,   trazer   reflexos   benéficos   nos   campos   social   e 

econômico.

Dentro dos objetivos que não foram atingidos o maior destaque é para a omissão sobre 

a anômala articulação política da comunidade do Software Livre, pois ao mesmo tempo que 

tem uma grande amplitude, articulação social e por vezes econômica, parece ser totalmente 

desprovida  de  uma   ideologia  política  no   sentido  clássico,   tendo  mesmo  dificuldade  em 

admitir que promove uma atividade que rompe com as regras estabelecidas pelo Capital.  A 

desarticulação da comunidade do Software Livre em torno de bandeiras políticas (ao menos 

para além da defesa da liberdade do conhecimento) é um processo sintomático de nossa era 

e mereceria estudo a parte.

O trabalho realizado e não pago do Software Livre é por si um tema controverso e que 

mereceria aprofundamento teórico, ele permite que seja feito um questionamento sobre as 

direções em que avança o Capitalismo.

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Também não se conseguiu tratar das novas articulações geo­políticas que emergem 

com as redes e os  softwares,  como os  BRIC Countries  (Brasil,  Rússia,  Índia e China) e 

outros países. Estas relações, como foi colocado na introdução, passam a independer  do 

tempo e do espaço, já que acontecem o tempo todo e em todos os lugares.

Novas perspectivas que parecem se abrir a partir dessa dissertação são justamente o 

estudo mais aprofundado das relações do trabalho imaterial com o Capital, no seio da alta 

tecnologia. Também haveria relevância em uma análise que perscrutasse como se dá, se deu 

ou se dará  a implementação de políticas tecnológicas quando estas se encontram frente a 

uma tecnologia essencialmente política como a do Software Livre. 

Ainda outro tema seriam os desdobramentos de conceitos que “vazam” do  software 

livre e escorrem para outras áreas como o Direito e a Arte, se descolando cada vez mais da 

tecnologia, como o Creative Commons.

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 6. Glossário

1. Baixa Plataforma – termo utilizado para referir os micro­computadores de arquitetura Intel, geralmente em oposição à Alta Plataforma dos Mainframes.

2. Geek – De acordo com a Wikipédia [http://pt.wikipedia.org/wiki/Geek] “Geek é uma palavra associada a subculturas ligadas aos computadores e à internet. Nestas subculturas, um geek é uma pessoa com um talento e um interesse por tecnologia e programação acima do normal.” 

3. Hacker – Termo utilizado para designar um especialista em Informática, habitual e errôneamente confundido com cracker, que seria o equivalente para criminosos eletrônicos.

4. Kernel ­ “Kernel de um sistema operacional é entendido como o núcleo deste ou, numa tradução literal, cerne. Ele representa a camada mais baixa de interface com o Hardware,  sendo responsável por gerenciar os recursos do sistema computacional como um todo. É  no kernel que estão definidas funções para operação com periféricos (mouse, disco,  impressora, interface serial/interface paralela), gerenciamento de memória, entre outros.” Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Kernel.

5. Mainframe – computadores de grande porte, que são em geral soluções caras utilizadas em aplicações de missão critica, em geral administrados por técnicos e DBAs especializados.

6. Multitarefa ­ Capacidade de executar mais de uma ação simultaneamente, como rodar um programa e formatar um disquete. 

7. Multiusuário ­ Capacidade de administrar diferentes perfis e permissões para usuários em uma mesma máquina.

8. Palmtop – ou (Personal Digital Assistant), ou Assistente Pessoal Digital. Um modelo de computador portátil popularizado pela empresa Palm. 

9. Portar ­ No jargão da indústria “portar” uma aplicação significa traduzir e adaptar determinado software desenvolvido para uma plataforma para outra que não era seu foco inicial.

10. Setup – sinônimo para configuração. Largamente utilizado na indústria e na literatura especializada.

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 7. Bibliografia

 7.1. Livros

1. ARRIGHI, Giovanni. O longo século XX: dinheiro, poder e as origens de nosso tempo. São Paulo: Contraponto: Unesp, 1996.

2. BASALLA, George.  The Evolution of Technology.  USA; Cambridge University  Press; 1995

3. BLOCH, Marc. Introdução à H istória. Edições Europa­América.4. CANGUILHEM,   Georges.   Ideologia   e   racionalidade   nas   ciências   da   vida.   Lisboa   : 

Edições 70, 1997; 5. CASSIANO,   João.  Cidadania  Digital:  Os   Telecentros  do   Município  de   São  Paulo.  In: 

SILVEIRA,   Sérgio   Amadeu   da.,   CASSIANO,   João   (Org.)  Software   Livre   e   Inclusão Digital. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2003. 

6. CASTELLS, Manuel.  A galáxia da Internet: os negócios e a sociedade; Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003

7. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. 8ª edição. São Paulo: Paz e Terra, 1999.8. CERUZZI, Paul E. A History of Modern Computing. Massachusetts : MIT Press, 1998.  9. CHALMERS, Alan. A Fabricação da Ciência. SP: UNESP, 1994; 10. COUTINHO, Luciano; FERRAZ, João Carlos (Coord.).  Estudo da competitividade da 

indústria   brasileira.  Campinas,   SP:   Papirus;   Editora   da   Universidade   Estadual   de Campinas, 1995.

11. DIBONA, Chris;  STONE,  Mark;  COOPER,  Danese  (Eds.).  Open Source  2.0.  O'Reilly Media. ISBN 0596008023.

12. FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Nacional, 1999.13. GAMA,   Ruy.  A   tecnologia   e   o   trabalho   na   história.  São   Paulo:   Nobel;   Editora   da 

Universidade de São Paulo, 1986.14. GORZ, André.  O Imaterial :  Conhecimento, valor e capital.  São Paulo : Annablume; 

Janeiro de 2005.15. GUROVITZ, Helio.  Linux: o fenômeno do Software Livre.  [São Paulo]: Editora Abril, 

2002.16. JAPIASSU, Hilton. As Paixões da ciência. São Paulo : Letras & Letras, 1991; 17. KAWASAKI, Guy. O jeito Macintosh. São Paulo: Callis, 1993.18. LACEY, Hugh.  Is Science Value Free?  Values and Scientific Understanding.  London 

and New York: Routledge, 1999. 19. LACEY, Hugh. Valores e Atividade Científica. São Paulo: Discurso Editorial, 1998.20. LAZZARATO, Maurizio  & NEGRI,  Antonio.  Trabalho Imaterial.  Formas  de  vida  e 

produção de subjetividade. Rio de Janeiro: DP&A editora, 200121. LOHR, Steve. Go to. [New York]: Basic Books, 200122. LUZ, Nícia Vilela. A Luta pela Industrialização do Brasil. Editora Alpha Omega, 1978, 

São Paulo.23. MAGALHÃES,   Gildo.   Introdução   à   metodologia   científica:   caminhos   da   ciência   e 

tecnologia. São Paulo : Ática, 2005; 

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 136

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24. MARQUES, Ivan da Costa. O Brasil e a abertura dos mercados: o trabalho em questão . Rio de Janeiro; Contraponto; 2002

25. MARX, Karl.  Grundrisse: Elementos Fundamentales Para La Critica de la economia politica (Borrador) 1857­1858; Buenos Aires; Siglo XXI Argentina Editores S.A: junho 1972.

26. MAZA,   Fábio.  O   idealismo   prático   de   Roberto   Simonsen:   ciência,   tecnologia   e indústria na construção da Nação. São Paulo: Instituto Roberto Simonsen, 2004.

27. MELLO,   João   Manoel   C.   de,  O   Capitalismo   Tardio.  6ª   edição.   São   Paulo:   Editora Brasiliense, 1987. 182 p.

28. MOWERY,  David  C.,  ROSENBERG,  Nathan.  Trajetórias  da   Inovação   :  A  Mudança Tecnológica nos Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005.

29. NEGROPONTE, Nicholas. A vida digital. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.30. PEREIRA, L.C. Bresser. Desenvolvimento e Crise no Brasil. Zahar Editores, 1968, Rio de 

Janeiro.31. PROPP, Vladimir Iakovlevitch.  Comicidade e riso.  Sao Paulo: Atica, 1992. 215p. ISBN 

8508040857.32. ROSSI, P. Naufrágios sem Espectador. A idéia de progresso. EDUNESP, 2000. 33. ROSZAK, Theodore. The Cult of Information : A Neo­Luddite Treatise on High Tech, 

Artificial Intelligence, and the true Art of Thinking. New York : Pantheon Books, 1986.34. SAGASTI, Francisco R.  Tecnologia, Planejamento e Desenvolvimento Autônomo.  São 

Paulo: Perspectiva, 1986.35. SENAI. De homens e máquinas. São Paulo: SENAI, 199136. SILVA,  Sérgio.  Expansão  Cafeeira  e  Origens  da  Indústria  no  Brasil.  Editora  Alpha 

Omega, 1976, São Paulo.37. SILVEIRA, Sérgio Amadeu da; CASSINO, João (Org.). Software Livre e inclusão digital. 

São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2003.38. SILVEIRA, Sérgio Amadeu da.  Exclusão  digital: a miséria na era da informação.   1ª 

reimpressão. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003.39. SILVEIRA, Sérgio Amadeu da. Software Livre: a luta pela liberdade do conhecimento. 

São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2004. (Coleção Brasil Urgente).40. SINGER, Paul. Economia Política da Urbanização. Editora Brasiliense, 1973.41. TACHINARDI, Maria Helena. A Guerra das Patentes : O conflito Brasil x EUA sobre 

propriedade intelectual. São Paulo : Paz e Terra, 1993.42. TAVARES,   Maria   da   Conceição.  Da   Substituição   de   importações   ao   capitalismo 

financeiro: ensaios sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.43. TIGRE, Paulo Bastos. Liberalização e capacitação tecnológica: o caso da informática pós­

reserva de mercado no Brasil. In: SWARTZMAN, Simon (Coord.); KRIEGER, Eduardo... [et. al.].  Ciência e Tecnologia no Brasil  : política industrial,  mercado de trabalho e instituição de apoio. Rio de janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1995.

44. TIGRE, Paulo Bastos. Liberalização e capacitação tecnológica: o caso da informática pós­reserva de mercado no Brasil. In: SWARTZMAN, Simon (Coord.); KRIEGER, Eduardo... [et.   al.].  Ciência   e   Tecnologia   no   Brasil  :   política   industrial,   mercado   de   trabalho   e instituição de apoio. Rio de janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1995. p. 179.

45. TROTSKY, Leon.  Resultados  y  perspectivas:   las   fuerzas  motrices  de   la  revolucion. Buenos Aires: Ediciones CEPE, 1972

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46. UTTERBACK,   James   M.  Dominando   a   dinâmica   da   inovação.  Rio   de   Janeiro: Qualitymark Editorial, 1996.

47. VARGAS, Milton.  Para uma Filosofia da Tecnologia. Editora Alpha Omega, 1994, São Paulo.

48. VIEIRA, Eduardo. Os bastidores da internet no Brasil. Barueri, SP: Manole, 2003.49. VIGEVANI,   Tullo.  O   Contencioso   Brasil   x   Estados   Unidos   da   Informática   :   Uma 

Análise Sobre Formulação  da Política Exterior.  São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995.

 7.2. Teses e Dissertações

SANTOS FILHO, Gildo Magalhães.  Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto desenvolvimentista  na formulação duma política nacional de informática para o  Brasil   (1971­1992).  1994.   280f.  Tese   (Doutorado  História)   ­  Faculdade  de  Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo.

 7.3. Artigos

1. WHITHEFORD,  Nick.  Autonomist  Marxism And  The   Information  Society.  Capital  & Class, 52, p.85­95, Spring 1994.

2. CHAUI, Marilena. USP 94: a terceira fundação. Estudos Avançados, Set./Dez. 1994, vol.8, no.22, p.49­68.

3. COSTA MARQUES, Ivan da. Cloning Computers: From Rigths of Possession to Rigths of Creation. In: Science as Culture. Routledge, Jun. 2005. Vol. 14, No. 2, 139­160.

4. SOUZA F., Rubens A. Menezes. Percepção e imagem da informática. In: XXII Simpósio Nacional de História ­ História: Guerra e Paz, 2005, Londrina. XXII Simpósio Nacional de História ­ História: Guerra e Paz. Londrina, PR : Associação Nacional de História ANPUH / Editorial Midia., 2005

 7.4. Artigos da Imprensa Diária

1.  O Pingüim Avança. Carta Capital,  17 de março de 2004 ­ Ano XI ­ Número 345.2. Jornal da Tarde: em 03/02/2005 ­ Polícia apreende cópias de livros em universidades.3. Jornal O Estado de S. Paulo (15/08/2004 – Geral ­ Um militante na batalha pelo software 

livre ­ Ex­comunista, chefe do ITI agora luta pela adoção dos programas gratuitos).4. Jornal O Estado de S. Paulo: 02/03/2005 ­ Metrópole ­ Faculdades mantêm xerox dentro 

das bibliotecas / Metrópole ­ Bibliotecas oferecem xerox;5. Jornal O Estado de S. Paulo:  03/03/2005 ­ Metrópole ­ Polícia investiga comércio de 

cópias de livros em universidade;6. Jornal O Estado de S. Paulo: 04/03/2005 ­ Metrópole ­ DEIC apura a ação de professores 

em xerox;7. Jornal O Estado de S. Paulo: 08/03/2005 ­ Caderno 28. Jornal O Estado de S. Paulo: 21/02/2005 ­ Índice;

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9. RIVLIN, Gary. Leader of the free world. Wired, EUA, n.11, p.152­157/206­208, nov. 2003.10. The Gates Operating System; TIME; JANUARY 13, 1997 VOL. 149 NO. 2; USA.

 7.5. Bibliografia Técnica de Referência

OLIVEIRA, Rômulo Silva; CARISSIMI, Alexandre da Silva; TOSCANI, Simão Sirineo. Sistemas Operacionais. 3ª Edição. Porto Alegre: Editora Sagra-Luzzato, 2004. p. 274. ISBN 85-241-0643-3

 7.6. Documentos na Internet

1. key_events_in_microsoft_history.doc (83 KB) em: http://www.microsoft.com/downloads/info.aspx?na=46&p=4&SrcDisplayLang=en&SrcCategoryId=&SrcFamilyId=b604bb05­7c33­4643­96b4­38e06383bda5&u=http%3a%2f%2fdownload.microsoft.com%2fdownload%2f6%2f3%2fa%2f63a018ae­711f­4edb­8b79­ca109e5eed07%2fkey_events_in_microsoft_history.doc

2. fastfacts.doc (1255 KB) em: http://www.microsoft.com/downloads/info.aspx?na=46&p=3&SrcDisplayLang=en&SrcCategoryId=&SrcFamilyId=b604bb05­7c33­4643­96b4­38e06383bda5&u=http%3a%2f%2fdownload.microsoft.com%2fdownload%2f6%2f3%2fa%2f63a018ae­711f­4edb­8b79­ca109e5eed07%2ffastfacts.doc

 7.7. Legislação Consultada

1. DECRETO DE 29 DE OUTUBRO DE 2003 ­ Institui Comitês Técnicos do Comitê Executivo do Governo Eletrônico e dá outras providências. (Diário Oficial da União – Seção 1. No 211, quinta­feira, 30 de outubro de 2003. p.4, ­ ISSN 1677­7042)

2. LEI No 7.646, DE 18 DE DEZEMBRO DE 1987 ­ Dispõe quanto à proteção da propriedade intelectual sobre programas de computador e sua comercialização no País e dá outras providências (Revogado pela Lei nº 9.609, de 19.2.1998)

3. LEI Nº 7.232, DE 29 DE OUTUBRO DE 1984 ­ Dispõe sobre a Política Nacional de Informática, e dá outras providências. (publicado no D.O.U. de 30 de outubro de 1984)

 7.8. Material de Apoio

The Columbia Dictionary of Quotations. Columbia University Press. 1993

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 8. Anexos

 8.1. Documento I    POLÍCIA APREENDE CÓPIAS DE LIVROS EM UNIVERSIDADES227

Um inquérito aberto na Divisão de Investigações Gerais DIG apura o comércio de cópias de livros em 

universidades de São Paulo. Ele foi aberto em dezembro com base em uma representação da Associação 

Brasileira de Direitos Reprográficos.

A entidade apresentou aos policiais uma lista de locais usados pelos estudantes para fazer cópias dos 

livros. "Nossos homens apreenderam grande quantidade de cópias e livros", disse o delegado Edson Soares, 

diretor da DIG, do Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic). 

Segundo   o   delegado,   os   investigadores   apreenderam   cópias   perto   de   instituições   de   ensino 

tradicionais, como a Universidade de São Paulo USP, a Pontifícia Universidade Católica PUC e a Universidade 

Mackenzie. O inquérito ainda não foi concluído, pois a polícia termina a identificação dos envolvidos. "Os 

locais   eram   próximos   das   universidades.   Não   encontramos   nenhum   dentro   delas."  

A reprodução de trechos de livros é crime contra a propriedade intelectual, cuja pena varia de 2 a 4 anos de 

reclusão. O combate a essa prática é uma das medidas aprovadas pelo Conselho de Combate à Pirataria e 

Delitos contra a Propriedade Intelectual, do Ministério da Justiça. Divulgado anteontem, o plano do governo 

federal prevê a execução dessas ações nos próximos dois anos. 

"Se eu não pudesse tirar xerox certamente não poderia estudar.  No  início do ano, os professores 

passam a bibliografia e a gente vê  que não dá para comprar tudo. E muita coisa não tem na biblioteca", 

protestou a pós­graduanda de língua portuguesa da USP D.C., 30, que tirava cópias de um livro europeu cujo 

preço fica em torno de R$ 300. O xerox saiu por R$ 28.

"Outro dia, eles não quiseram tirar a cópia, disseram que era proibido, mas assim ninguém estuda. 

Consegui o original com uma amiga que viajou para fora, mas não posso ficar com o exemplar dela."

A colega de classe de D. Verena Kewitz, 30, sofre com o mesmo problema. "Muitos títulos já saíram de 

catálogo e aí não tem jeito, temos de fazer cópia."

Outro crime de falsificação foi flagrado pela reportagem ontem à tarde, na Avenida Senador Queiroz, 

Centro da Cidade. Cinco ambulantes vendiam mercadoria falsificada na calçada, em sua maioria camisetas, 

CDs e DVDs, ao lado de um carro do DEIC.

227 Jornal da Tarde ­ 03/02/2005

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 8.2. Documento II (Resolução n° 5.213 de junho de 2005)

    RESOLUÇÃO Nº 5.213, DE 02 DE JUNHO DE 2005.228 ­ (D.O.E. ­ 06.2005)    

     Regula a extração de cópias reprográficas de livros, revistas científicas ou periódicos no âmbito da 

Universidade de São Paulo.

    O Reitor da Universidade de São Paulo, no uso de suas atribuições legais, com fundamento no art. 

207 da Constituição Federal e no art. 42, IX, do Estatuto, baixado pela Resolução nº 3461, de 07.10.88, e de 

acordo com o deliberado pelo Conselho Universitário, em Sessão de 31 de maio de 2005, baixa a seguinte

    RESOLUÇÃO:

       Artigo 1º ­ As normas constantes desse ato deverão ser observadas em todas as instalações e 

órgãos da Universidade de São Paulo,  quer  sejam vinculados diretamente à  autarquia,  quer  se  trate  de 

permissionários ou concessionários de serviços.

    Artigo 2º ­ Visando garantir as atividades­fins da Universidade, será permitida a extração de cópias 

de  pequenos  trechos,   como capítulos  de   livros  e  artigos  de  periódicos  ou   revistas   científicas,  mediante 

solicitação individualizada, sem finalidade de lucro, para uso próprio do solicitante.

       Artigo  3º   ­  As  bibliotecas  deverão marcar  seu  acervo  com sinais  distintivos  diferenciando as 

seguintes categorias de obras:

    I – esgotadas sem republicação há mais de 10 anos;

    II – estrangeiras indisponíveis no mercado nacional;

    III – de domínio público;

    IV – nas quais conste expressa autorização para reprodução.

    Parágrafo único ­ De qualquer obra que contenha o sinal distintivo de uma dessas categorias, será 

permitida a reprodução reprográfica integral.

    Artigo 4º ­ É permitido, por parte de docentes, o fornecimento de material destinado estritamente ao 

ministério de disciplina constante do programa da universidade, sendo autorizada sua reprodução para os 

alunos regularmente inscritos, observado o disposto nos artigos precedentes.

228Fonte: http://www.fflch.usp.br/sdi/imprensa/eventos/resolucao_xerox.html

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 141

Page 142: Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico:  Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

       Artigo  5º   ­  Fica  garantido  o   livre  exercício  das  atividades  desenvolvidas  pelas  bibliotecas  de 

intercâmbio de material entre instituições de ensino e pesquisa nos limites desta Resolução.

    Artigo 6º ­ Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação. (Proc. 2005.1.13361.1.1)

    Reitoria da Universidade de São Paulo, 02 de junho de 2005.

    ADOLPHO JOSÉ MELFI

    Reitor

    NINA BEATRIZ STOCCO RANIERI

    Secretária Geral

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 142

Page 143: Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico:  Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

 8.3. Documento III (Lei n° 7.646 de 18 de dezembro de 1987)

LEI No 7.646, DE 18 DE DEZEMBRO DE 1987.

Revogado pela Lei nº 9.609, de 19.2.1998

Dispõe quanto à proteção da propriedade intelectual sobre programas de computador e sua 

comercialização no País e dá outras providências. 

  O  PRESIDENTE   DA   REPÚBLICA  ,   faço 

saber   que   o   Congresso   Nacional   decreta   e   eu 

sanciono a seguinte lei: 

TÍTULO I

Disposições Preliminares 

  Art. 1º São  livres, no País, a produção e a 

comercialização   de   programas   de   computador,   de 

origem estrangeira ou nacional,  assegurada  integral 

proteção   aos   titulares   dos   respectivos   direitos,   nas 

condições estabelecidas em lei. 

 Parágrafo único. Programa de computador é 

a expressão de um conjunto organizado de instruções 

em   linguagem   natural   ou   codificada,   contida   em 

suporte   físico   de   qualquer   natureza,   de   emprego 

necessário em máquinas automáticas de tratamento 

da   informação,   dispositivos,   instrumentos   ou 

equipamentos   periféricos,   baseados   em   técnica 

digital,  para  fazê­los  funcionar de modo e para  fins 

determinados. 

  Art. 2º O regime de proteção à  propriedade 

intelectual de programas de computador é o disposto 

na Lei nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973, com as 

modificações que esta lei estabelece para atender às 

peculiaridades   inerentes   aos   programas   de 

computador. 

TÍTULO II

Da Proteção aos Direitos de Autor 

  Art. 3º Fica assegurada a tutela dos direitos 

relativos aos programas de computador,  pelo prazo 

de 25 (vinte e cinco) anos, contado a partir  do seu 

lançamento em qualquer país. 

 § 1º A proteção aos direitos de que trata esta 

lei   independe   de   registro   ou   cadastramento   na 

Secretaria Especial de Informática ­ SEI. 

  §  2º  Os direitos atribuídos por  esta  lei  aos 

estrangeiros,   domiciliados   no   exterior,   ficam 

assegurados,   desde   que   o   país   de   origem   do 

programa   conceda   aos   brasileiros   e   estrangeiros, 

domiciliados   no   Brasil,   direitos   equivalentes,   em 

extensão   e   duração,   aos   estabelecidos   no  caput 

deste artigo. 

  Art.   4º   Os   programas   de   computador 

poderão, a critério do autor, ser registrados em órgão 

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 143

Page 144: Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico:  Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

a ser  designado pelo Conselho Nacional  de Direito 

Autoral ­ CNDA, regido pela Lei nº 5.988, de 14 de 

dezembro de 1973,  e   reorganizado pelo Decreto nº 

84.252, de 28 de julho de 1979. 

 § 1º O titular do direito de autor submeterá ao 

órgão designado pelo Conselho Nacional  de Direito 

Autoral   ­  CNDA,  quando  do  pedido  de   registro,   os 

trechos do programa e outros dados que considerar 

suficientes para caracterizar a criação independente e 

a identidade do programa de computador. 

 § 2º Para identificar­se como titular do direito 

de autor, poderá o criador do programa usar de seu 

nome   civil,   completo   ou   abreviado,   até   por   suas 

iniciais, como previsto no art. 12 da Lei nº 5.988, de 

14 de dezembro de 1973. 

  §   3º   As   informações   que   fundamentam   o 

registro   são   de   caráter   sigiloso,   não   podendo   ser 

reveladas,   a   não   ser   por   ordem   judicial   ou   a 

requerimento do próprio titular. 

  Art.   5º   Salvo   estipulação   em   contrário, 

pertencerão   exclusivamente   ao   empregador   ou 

contratante   de   serviços,   os   direitos   relativos   a 

programa de computador,  desenvolvido e elaborado 

durante   a   vigência   de   contrato   ou   de   vínculo 

estatutário,   expressamente   destinado   à   pesquisa   e 

desenvolvimento,   ou   em   que   a   atividade   do 

empregado, servidor ou contratado de serviços seja 

prevista,  ou ainda, que decorra da própria natureza 

dos encargos contratados. 

  §   1º   Ressalvado   ajuste   em   contrário,   a 

compensação do trabalho, ou serviço prestado, será 

limitada à remuneração ou ao salário convencionado. 

  §   2º   Pertencerão,   com   exclusividade,   ao 

empregado,   servidor  ou  contratado  de  serviços,  os 

direitos   concernentes   a   programa   de   computador 

gerado sem relação ao contrato de trabalho, vínculo 

estatutário ou prestação de serviços, e sem utilização 

de   recursos,   informações   tecnológicas,   materiais, 

instalações   ou   equipamentos   do   empregador   ou 

contratante de serviços. 

  Art.   6º   Quando   estipulado   em   contrato 

firmado   entre   as   partes,   os   direitos   sobre   as 

modificações tecnológicas e derivações pertencerão à 

pessoa  autorizada   que  as   fizer  e  que  os  exercerá 

autonomamente. 

  Art. 7º Não constituem ofensa ao direito de 

autor de programa de computador: 

  I   ­   a   reprodução   de   cópia   legitimamente 

adquirida,   desde   que   indispensável   à   utilização 

adequada do programa; 

  II   ­   a   citação   parcial,   para   fins   didáticos, 

desde que identificados o autor e o programa a que 

se refere; 

 III ­ a ocorrência de semelhança de programa 

a  outro,  preexistente,  quando se  der  por   força das 

características   funcionais   de   sua   aplicação,   da 

observância de preceitos  legais, regulamentares, ou 

de   normas   técnicas,   ou   de   limitações   de   forma 

alternativa para a sua expressão; 

 IV ­ a integração de um programa, mantendo­

se   suas   características   essenciais,   a   um   sistema 

aplicativo ou operacional, tecnicamente indispensável 

às   necessidades   do   usuário,   desde   que   para   uso 

exclusivo de quem a promoveu. 

TÍTULO III

Do Cadastro 

 Art. 8º Para a comercialização de que trata o 

art.   1º   desta   lei,   fica   obrigatório   o   prévio 

cadastramento   do   programa   ou   conjunto   de 

programas de computador,  pela Secretaria  Especial 

de Informática ­ SEI, que os classificará em diferentes 

categorias, conforme sejam desenvolvidos no País ou 

no  exterior,  em associação ou  não entre  empresas 

não nacionais e nacionais, definidas estas pelo art. 12 

da Lei nº 7.232, de 29 de outubro de 1984, e art. 1º do 

Decreto­lei nº 2.203, de 27 de dezembro de 1984. 

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 144

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  §   1º   No   que   diz   respeito   à   proteção   dos 

direitos do autor, não se estabelecem diferenças entre 

as categorias referidas no caput deste artigo, as quais 

serão diversificadas para efeito de financiamento com 

recursos públicos, incentivos fiscais, comercialização 

e remessa de lucros, ou pagamento de direitos aos 

seus   titulares   domiciliados   no   exterior,   conforme   o 

caso. 

 § 2º O cadastramento de que trata este artigo 

e a aprovação dos atos e contratos referidos nesta lei, 

pela Secretaria Especial de Informática ­ SEI, ficarão 

condicionados,   quando   se   tratar   de   programas 

desenvolvidos   por   empresas   não   nacionais,   à 

apuração da inexistência de programa de computador 

similar, desenvolvido no País, por empresa nacional. 

 § 3º Além do disposto no caput deste artigo, o 

cadastramento de que trata esta lei é condição prévia 

e essencial à: 

  I ­ validade e eficácia de quaisquer negócios 

jurídicos relacionados a programas; 

  II ­ produção de efeitos fiscais e cambiais e 

legitimação   de   pagamentos,   créditos   ou   remessas 

correspondentes, quando for o caso, e sem prejuízo 

de outros requisitos e condições estabelecidos em lei. 

  Art.   9º   O   cadastramento,   para   os   fins   do 

disposto no artigo anterior, terá validade mínima de 3 

(três) anos, e será renovado, automaticamente, pela 

Secretaria Especial de Informática ­ SEI, observado o 

disposto no § 2º do citado artigo. 

  Parágrafo único. Da decisão que deferir  ou 

denegar o pedido de cadastramento, caberá recurso 

ao Conselho Nacional de Informática e Automação ­ 

CONIN, observado o disposto no Regimento Interno 

deste Conselho. 

  Art.   10.   Para   os   efeitos   desta   lei,   um 

programa de computador será considerado similar a 

outro, quando atender às seguintes condições: 

  a)   ser   funcionalmente   equivalente, 

considerando que deve: 

  I   ­   ser   original   e   desenvolvido 

independentemente; 

  II   ­   ter,   substancialmente,   as   mesmas 

características de desempenho, considerando o  tipo 

de aplicação a que se destina; 

  III   ­   operar   em   equipamento   similar   e   em 

ambiente de processamento similar; 

 b) observar padrões nacionais estabelecidos, 

quando pertinentes; 

 c) (Vetado); 

  d)   executar,   substancialmente,   as   mesmas 

funções, considerando o tipo de aplicação a que se 

destina e as características do mercado nacional. 

 Art. 11. Fica estipulado o prazo de 120 (cento 

e   vinte)   dias   para   que   a   Secretaria   Especial   de 

Informática   ­   SEI   se   manifeste   sobre   o   pedido   de 

cadastramento (Vetado), contado a partir da data do 

respectivo protocolo. 

  Art.   12.   Às   empresas   não   nacionais,   o 

cadastramento   será   concedido,   exclusivamente,   a 

programas   de   computador   que   se   apliquem   a 

equipamentos produzidos no País ou no exterior, aqui 

comercializados   por   empresas   desta   mesma 

categoria. 

  Art. 13. Será tornado sem efeito, a qualquer 

tempo, o cadastramento de programa de computador: 

 I ­ por sentença judicial transitada em julgado; 

  II   ­   por   ato   administrativo,   quando 

comprovado que as  informações apresentadas pelo 

interessado para instruir o pedido de cadastramento 

não forem verídicas. 

 Art. 14. A Secretaria Especial de Informática ­ 

SEI  poderá   cobrar  emolumentos  pelos   serviços  de 

cadastro   (Vetado),   conforme   tabela   própria   a   ser 

aprovada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. 

TÍTULO IV

Da Quota de Contribuição 

  Art.  15. O Fundo Especial  de  Informática e 

Automação,  de  que  trata  a Lei  nº  7.232,  de 29  de 

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 145

Page 146: Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico:  Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

outubro de 1984, será destinado ao financiamento a 

programas de: 

 a) pesquisa e desenvolvimento de tecnologia 

de informática e automação; 

  b)   formação   de   recursos   humanos   em 

informática; 

  c) aparelhamento dos Centros de Pesquisas 

em   Informática,   com   prioridade   às   Universidades 

Federais e Estaduais; 

 d) capitalização dos Centros de Tecnologia e 

Informática,   criados   em   consonância   com   as 

diretrizes   do   Plano   Nacional   de   Informática   e 

Automação ­ PLANIN. 

  Parágrafo   único.   O   Fundo   Especial   de 

Informática e Automação será constituído de: 

 a) dotações orçamentárias; 

 b) quotas de contribuição; 

 c) doações de origem interna ou externa. 

 Art 16. (Vetado). 

 Art. 17. (Vetado). 

 Art. 18. (Vetado). 

 Art. 19. (Vetado). 

TÍTULO V

Da Comercialização 

 Art. 20. (Vetado). 

 Art. 21. (Vetado). 

 Art. 22. (Vetado). 

 Art. 23. Os suportes físicos de programas de 

computador e respectivas embalagens, assim como 

os contratos a eles referentes deverão consignar, de 

forma  facilmente  legível  pelo usuário,  o  número de 

ordem de cadastro,   (Vetado) e o prazo de validade 

técnica da versão comercializada. 

  Art.   24.   O   titular   dos   direitos   de 

comercialização   de   programas   de   computador, 

durante   o   prazo   de   validade   técnica   da   respectiva 

versão, fica obrigado a: 

 I ­ divulgar, sem ônus adicional, as correções 

de eventuais erros; 

  II   ­   assegurar,   aos   respectivos   usuários,   a 

prestação   de   serviços   técnicos   complementares 

relativos ao adequado funcionamento do programa de 

computador,  consideradas as suas especificações e 

as particularidades do usuário. 

  Art. 25. O titular dos direitos dos programas 

de computador, durante o prazo de validade técnica, 

tratado   nos   artigos   imediatamente   anteriores,   não 

poderá retirá­los de circulação comercial, sem a justa 

indenização   de   eventuais   prejuízos   causados   a 

terceiros. 

 Art. 26. O titular dos direitos de programas de 

computador   e   de   sua   comercialização   responde, 

perante o usuário, pela qualidade técnica adequada, 

bem como pela qualidade da fixação ou gravação dos 

mesmos   nos   respectivos   suportes   físicos,   cabendo 

ação   regressiva   contra   eventuais   antecessores 

titulares desses mesmos direitos. 

  Art.   27.   A   exploração   econômica   de 

programas de  computador,  no  País,  será  objeto  de 

contratos   de   licença   ou   de   cessão,   livremente 

pactuados   entre   as   partes,   e   nos   quais   se   fixará, 

quanto aos tributos e encargos exigíveis no País, a 

responsabilidade pelos respectivos pagamentos. 

  Parágrafo   único.   Serão   nulas   as   cláusulas 

que: 

 a) fixem exclusividade; 

  b)   limitem   a   produção,   distribuição   e 

comercialização; 

  c)   eximam   qualquer   dos   contratantes   da 

responsabilidade   por   eventuais   ações   de   terceiros, 

decorrente de vícios, defeitos ou violação de direitos 

de autor. 

  Art. 28. A comercialização de programas de 

computador,   ressalvado o disposto no art.  12 desta 

lei,  somente é  permitida a empresas nacionais  que 

celebrarão,  com os   fornecedores  não nacionais,  os 

contratos de cessão de direitos ou licença, nos termos 

desta lei. 

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 146

Page 147: Contradições e conflitos do desenvolvimento tecnológico:  Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso

  Parágrafo único.  A aprovação pelos órgãos 

competentes   do   Poder   Executivo,   dos   atos   e 

contratos   relativos  à   comercialização  de  programas 

de computador de origem externa, é condição prévia 

e essencial para: 

 a) possibilitar o cadastramento do programa; 

 b) permitir a dedutibilidade fiscal, respeitadas 

as normas previstas na legislação específica; 

  c)   possibilitar   a   remessa   ao   exterior   dos 

montantes devidos, de acordo com esta lei e demais 

disposições legais aplicáveis. 

  Art.   29.  A  aprovação  e  a  averbação serão 

concedidas aos atos e contratos, relativos a programa 

de origem externa, que estabelecerem remuneração 

do   autor,   cessionário   residente   ou   domiciliado   no 

exterior,   a   preço   certo   por   cópia   e   respectiva 

documentação técnica, que não exceda o valor médio 

mundial praticado na distribuição do mesmo produto, 

não sendo permitido pagamento calculado em função 

de produção, receita ou  lucro do cessionário ou do 

usuário. 

  1º Excluem­se da permissão deste artigo as 

empresas   não   nacionais,   a   elas   assegurada,   em 

decorrência da comercialização regulada pelo art. 12 

desta   lei,   a   remessa   de   divisas   previstas   nas 

disposições e  nos   limites  da  Lei  nº  4.131,  de  3  de 

setembro de 1962, e legislação posterior. 

  2º   A   nota   fiscal   emitida   pelo   titular   dos 

correspondentes   direitos   ou   seus   representantes 

legais,   que   comprove   a   comercialização   de 

programas de computador de origem externa, será o 

suficiente  para  possibilitar   os  pagamentos  previstos 

no caput deste artigo. 

TÍTULO VI

Disposições Gerais 

  Art.   30.  Será   permitida  a   importação  ou  o 

internamento,   conforme   o   caso,   de   cópia   única   de 

programa   de   computador,   destinado   à   utilização 

exclusiva pelo usuário final, (Vetado). 

  Art.   31.   Nos   casos   de   transferência   de 

tecnologia   de   programas   de   computador,   será 

obrigatória,   inclusive   para   fins   de   pagamento   e 

dedutibilidade da respectiva remuneração, e demais 

efeitos previstos nesta lei, a averbação do contrato no 

Instituto Nacional de Propriedade Industrial ­ INPI. 

 Parágrafo único. Para averbação de que trata 

este   artigo,   além   da   inexistência   de   capacitação 

tecnológica nacional, fica obrigatório o fornecimento, 

por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da 

documentação completa, em especial do código­fonte 

comentado,   memorial   descritivo,   especificações 

funcionais   e   internas,   diagramas,   fluxogramas   e 

outros   dados   técnicos   necessários   à   absorção   da 

tecnologia. 

 Art. 32. As pessoas jurídicas poderão deduzir, 

até  o dobro, como despesa operacional, para efeito 

de   apuração   do   lucro   tributável   pelo   Imposto   de 

Renda e Proventos de Qualquer Natureza, os gastos 

realizados   com   a   aquisição   de   programas   de 

computador,   quando   forem   os   primeiros   usuários 

destes, desde que os programas se enquadrem como 

de relevante interesse, observado o disposto nos arts. 

15 e 19 da Lei nº 7.232, de 29 de outubro de 1984. 

 § 1º Paralelamente, como forma de incentivo, 

a   utilização   de   programas   de   computador 

desenvolvidos   no   País   por   empresas   privadas 

nacionais   será   levada   em   conta   para   efeito   da 

concessão dos incentivos previstos no art. 13 da Lei 

nº 7.232, de 29 de outubro de 1984, bem como de 

financiamentos com recursos públicos. 

 § 2º Os órgãos e entidades da Administração 

Pública Direta ou Indireta, Fundações,  instituídas ou 

mantidas pelo Poder Público e as demais entidades 

sob  o   controle   direto   ou   indireto   do   Poder   Público 

darão   preferência,   em   igualdade   de   condições,   na 

utilização   de   programas   de   computador 

desenvolvidos   no   País   por   empresas   privadas 

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nacionais, de conformidade com o que estabelece o 

art. 11 da Lei nº 7.232, de 29 de outubro de 1984. 

  §   3º   A   participação   do   Estado   na 

comercialização   de   programas   de   computador 

obedecerá ao disposto no inciso II do art. 2º da Lei nº 

7.232, de 29 de outubro de 1984. 

 Art. 33. As ações de nulidade do registro ou 

do   cadastramento,   que   correrão   em   segredo   de 

justiça,   poderão   ser   propostas   por   qualquer 

interessado ou pela União Federal. 

  Art.   34.   A   nulidade   do   registro   constitui 

matéria   de   defesa   nas   ações   cíveis   ou   criminais, 

relativas à violação dos direitos de autor de programa 

de computador. 

TÍTULO VII

Das Sanções e Penalidades 

 Art. 35. Violar direitos de autor de programas 

de computador: 

 Pena ­ Detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) 

anos e multa. 

 Art. 36. (Vetado). 

 Art. 37. Importar, expor, manter em depósito, 

para   fins   de   comercialização,   programas   de 

computador de origem externa não cadastrados: 

 Pena ­ Detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos 

e multa. 

 Parágrafo único. O disposto neste artigo não 

se   aplica   a   programas   internados   exclusivamente 

para demonstração ou aferição de mercado em feiras 

ou   congressos   de   natureza   técnica,   científica   ou 

industrial. 

  Art.  38. A ação penal, no crime previsto no 

art.   35,   (Vetado)   desta   lei,   é   promovida   mediante 

queixa, salvo quando praticado em prejuízo da União, 

Estado,   Distrito   Federal,   Município,   autarquia, 

empresa  pública,   sociedade  de  economia  mista  ou 

fundação sob supervisão ministerial. 

  Parágrafo   único.   A   ação   penal   e   as 

diligências   preliminares   de   busca   e   apreensão,   no 

crime previsto no art. 35 desta lei, serão precedidas 

de vistoria, podendo o juiz ordenar a apreensão das 

cópias produzidas ou comercializadas com violação 

de direito  de autor,   suas versões e derivações,  em 

poder   do   infrator   ou   de   quem   as   esteja   expondo, 

mantendo   em   depósito,   reproduzindo   ou 

comercializando. 

 Art. 39. Independentemente da ação penal, o 

prejudicado   poderá   intentar   ação   para   proibir   ao 

infrator a prática do ato incriminado, com a cominação 

de pena pecuniária para o caso de transgressão do 

preceito (art. 287 do Código de Processo Civil). 

  1º  A  ação de  abstenção de  prática  de  ato 

poderá ser cumulada com a de perdas e danos pelos 

prejuízos decorrentes da infração. 

  2º   A   ação   civil,   proposta   com   base   em 

violação   dos   direitos   relativos   à   propriedade 

intelectual  sobre programas de computador,  correrá 

em segredo de justiça. 

  3º   Nos   procedimentos   cíveis,   as   medidas 

cautelares   de   busca   e   apreensão   observarão   o 

disposto no parágrafo único do art. 38 desta lei. 

  4º  O   juiz   poderá   conceder   medida   liminar, 

proibindo ao infrator a prática do ato incriminado, nos 

termos do caput deste artigo, independentemente de 

ação cautelar preparatória. 

 5º Será responsabilizado por perdas e danos 

aquele que requerer e promover as medidas previstas 

neste e no  artigo  anterior,  agindo de má­fé  ou por 

espírito de emulação, capricho ou erro grosseiro, nos 

termos dos arts. 16, 17 e 18 do Código de Processo 

Civil. 

TÍTULO VIII

Das Prescrições 

 Art. 40. Prescreve em 5 (cinco) anos a ação 

civil por ofensa a direitos patrimoniais do autor. 

 Art. 41. Prescrevem, igualmente em 5 (cinco) 

anos,   as   ações   fundadas   em   inadimplemento   das 

obrigações decorrentes, contado o prazo da data: 

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  a)   que   constitui   o   termo   final   de   validade 

técnica de versão posta em comércio; 

  b)   da   cessação   da   garantia,   no   caso   de 

programas   de   computador   desenvolvidos   e 

elaborados por encomenda; 

  c)   da   licença   de   uso   de   programas   de 

computador. 

TÍTULO IX

Das Disposições Finais 

 Art. 42. Esta lei entra em vigor na data de sua 

publicação. 

  Parágrafo   único.   O   Poder   Executivo 

regulamentará esta lei no prazo de 120 (cento e vinte) 

dias, a contar da data de sua publicação. 

  Art.   43.   Revogam­se   as   disposições   em 

contrário. 

Brasília,   18   de   dezembro   de   1987;   166º   da 

Independência e 99º da República.

JOSÉ SARNEY 

Luiz Henrique da Silveira 

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 8.4. Documento IV (Decreto de 29 de outubro de 2003)

DECRETO DE 29 DE OUTUBRO DE 2003229       

                       

Institui Comitês Técnicos do Comitê Executivo do Governo Eletrônico e dá

outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da 

atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VI, alínea 

"a", da Constituição,

DECRETA: 

Art.  1o­  Ficam instituídos Comitês Técnicos, 

no   âmbito   do   Comitê   Executivo   do   Governo 

Eletrônico, criado pelo Decreto de  l8 de outubro de 

2000,   com   a   finalidade   de   coordenar   e   articular   o 

planejamento e a implementação de projetos e ações 

nas   respectivas   áreas   de   competência,   com   as 

seguintes denominações: 

I ­ Implementação do Software Livre;

II ­ Inclusão Digital;

III ­ Integração de Sistemas;

IV   ­   Sistemas   Legados   e   Licenças   de 

Software;

V ­ Gestão de Sítios e Serviços On­line;

VI ­ Infra­Estrutura de Rede;

VII ­ Governo para Governo ­ G2G; e

VIII ­ Gestão de Conhecimentos e Informação 

Estratégica. 

Art.   2o­  Os   Comitês   Técnicos   serão 

compostos por representantes de órgãos e entidades 

da   administração   pública   federal,   indicados   pelos 

integrantes   do   Comitê   Executivo   do   Governo 

Eletrônico. 

§ 1o­ Ato dos Ministros de Estado Chefe da 

Casa   Civil   da   Presidência   da   República   e   do 

Planejamento,  Orçamento  e  Gestão  estabelecerá   a 

composição dos Comitês Técnicos e designará seus 

membros e coordenadores. 

§   2o­   Em   seus   impedimentos,   os   membros 

dos   Comitês   Técnicos   serão   substituídos   por   seus 

suplentes. 

§   3o­   Os   órgãos   e   entidades   cujos 

representantes   integrem   os   respectivos   Comitês 

Técnicos   prestarão   o   necessário   apoio   técnico   e 

administrativo   ao   seu   funcionamento,   inclusive   por 

meio da designação de servidores dos seus quadros 

para a atuação em atividades e projetos. 

§ 4o­ Poderão ser convidados a participar das 

reuniões   dos   Comitês   Técnicos,   a   juízo   do   seu 

coordenador,   representantes   de   outros   órgãos   e 

229 Diário Oficial da União – Seção 1. No 211, quinta­feira, 30 de outubro de 2003. p.4, ­ ISSN 1677­7042

31/08/2006 ­ 20060830_rbns.odt 150

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entidades   públicas,   de   empresas   privadas   ou   de 

organizações da sociedade civil. 

§   5o­   O   Secretário­Executivo   do   Comitê 

Executivo   do   Governo   Eletrônico   supervisionará   os 

trabalhos dos Comitês Técnicos,  inclusive por  meio 

da   convocação   dos   seus   coordenadores   para 

participação   em   reuniões   periódicas   de 

acompanhamento. 

Art. 3o­ Este Decreto entra em vigor na data 

de sua publicação. Brasília, 29 de outubro de 2003; 

182o­ da Independência e 115o­ da República. 

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Guido Mantega 

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 8.5. Documento V (Creative Commons Licença de Atribuição­Uso Não Comercial 2.5 Brasil)

Atribuição­Uso Não­Comercial 2.5 Brasil

Você pode:

• copiar, distribuir, exibir e executar a obra • criar obras derivadas 

Sob as seguintes condições:

Atribuição. Você deve dar crédito ao autor original, da forma especificada pelo autor ou licenciante.

Uso Não­Comercial. Você não pode utilizar esta obra com finalidades comerciais.

• Para cada novo uso ou distribuição, você deve deixar claro para outros os termos da licença desta obra. 

• Qualquer uma destas condições podem ser renunciadas, desde que Você obtenha permissão do autor. 

Qualquer direito de uso legítimo (ou "fair use") concedido por lei, ou qualquer outro direito protegido pela legislação local, não são em hipótese 

alguma afetados pelo disposto acima.

Este é um sumário para leigos da Licença Jurídica (na íntegra) [http://creativecommons.org/licenses/by­nc/2.5/br/legalcode]. 

Termo de exoneração de responsabilidade [http://creativecommons.org/licenses/disclaimer­popup?lang=pt­br] 

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 8.6. Documento VI (The Open Source Definition230)

Introduction

Open source doesn't   just  mean access  to  the source code. The distribution  terms of  open­source 

software must comply with the following criteria: 

1. Free Redistribution

The license shall not restrict any party from selling or giving away the software as a component of an 

aggregate  software  distribution  containing  programs  from several   different   sources.  The   license  shall  not 

require a royalty or other fee for such sale.

2. Source Code

The program must include source code, and must allow distribution in source code as well as compiled 

form. Where some form of a product is not distributed with source code, there must be a well­publicized means 

of obtaining the source code for no more than a reasonable reproduction cost preferably, downloading via the 

Internet without charge. The source code must be the preferred form in which a programmer would modify the 

program. Deliberately obfuscated source code  is not allowed.  Intermediate  forms such as  the output of  a 

preprocessor or translator are not allowed.

3. Derived Works

The license must allow modifications and derived works, and must allow them to be distributed under 

the same terms as the license of the original software.

4. Integrity of The Author's Source Code

The license may restrict source­code from being distributed in modified form only  if the license allows 

the distribution of "patch files" with the source code for the purpose of modifying the program at build time. The 

license must explicitly permit distribution of software built from modified source code. The license may require 

derived works to carry a different name or version number from the original software.

5. No Discrimination Against Persons or Groups

The license must not discriminate against any person or group of persons.

6. No Discrimination Against Fields of Endeavor

The license must not restrict anyone from making use of the program in a specific field of endeavor. For 

example,   it  may  not   restrict   the  program from being  used  in  a  business,  or   from being used  for  genetic 

research.

7. Distribution of License

230 http://www.opensource.org/docs/definition_plain.php

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The rights attached to the program must apply to all to whom the program is redistributed without the 

need for execution of an additional license by those parties.

8. License Must Not Be Specific to a Product

The  rights  attached  to   the  program must  not  depend on   the  program's  being  part  of  a  particular 

software distribution. If the program is extracted from that distribution and used or distributed within the terms 

of the program's license, all parties to whom the program is redistributed should have the same rights as those 

that are granted in conjunction with the original software distribution.

9. License Must Not Restrict Other Software

The license must not place restrictions on other software that  is distributed along with the licensed 

software. For example, the license must not insist that all other programs distributed on the same medium must 

be open­source software.

10. License Must Be Technology­Neutral

No provision of the license may be predicated on any individual technology or style of interface.

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