Contabilidade - Contabilidade de Custos - Obsolência

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OBSOLESCÊNCIA DA CONTABILIDADE DE CUSTOS [I] Nos últimos anos a contabilidade gerencial vem sofrendo severas críticas. O atual sistema de contabilidade gerencial, a contabilidade de custos, não vem sendo capaz de atender às necessidades das empresas. Para podermos analisar os problemas da contabilidade de custos, preciso definir o que quero dizer com o termo 'contabilidade gerencial'. A contabilidade gerencial, no contexto que iremos analisar aqui, tem como objetivo fornecer informações para os gerentes tomarem decisões, ela é o sistema de informação que deve ser usado pelos gerentes de uma organização para indicar se suas decisões estão levando a organização na direção do seu objetivo. Logo, antes de podermos analisar o sistema de informação gerencial, precisamos definir qual o objetivo da organização em questão. Precisamos delinear claramente com que tipo de organização estamos lidando, pois organizações com objetivos diferentes não devem usar o mesmo sistema de contabilidade gerencial. Nesse artigo estamos falando das organizações cujo objetivo é ganhar dinheiro hoje e no futuro, as organizações com fins lucrativos. Se o objetivo da organização sendo analisada é ganhar dinheiro hoje e no futuro, a contabilidade gerencial precisa informar qual o impacto de uma decisão na rentabilidade da empresa. A contabilidade gerencial deve fazer a ligação entre as decisões dos gerentes e a lucratividade da empresa. Só podemos dizer que uma decisão/ação é boa se esta aumenta a rentabilidade da empresa, pois qualquer outra situação não está levando o sistema analisado na direção do seu objetivo. Toda decisão/ação deve ser julgada pelo seu impacto no objetivo global do sistema. O objetivo de ganhar dinheiro hoje e no futuro é medido pelas variáveis Lucro Líquido (LL) e Retorno Sobre o Investimento (RSI). Portanto, a contabilidade gerencial deve informar qual o impacto de uma decisão/ação nessas variáveis. Exemplo de uso da contabilidade de custos: A contabilidade de custos tradicional é o sistema de contabilidade gerencial mais usado. Esse sistema usa o custo dos produtos, as medidas de eficiência local, análises de variância, etc. para fazer a ligação entre uma decisão e a lucratividade da empresa. Vamos usar um exemplo bem simples, onde poderemos verificar os erros da contabilidade gerencial tradicional. A empresa XY tem dois recursos, A e B. Figura 1 O produto X é processado por 2 minutos no recurso A e depois é processado por 15 minutos no recurso B. Já o Y consome 10 minutos de cada recurso. Abaixo temos a tabela que mostra os dados sobre ambos os produtos: Tabela 1 X Y Demanda Semanal 120 120 Preço 105 100 Custo de Matéria-Prima 45 50 Tempo de Processo no Recurso A 2 10 Tempo de Processo no Recurso B 15 10 Tempo Total de Processo 17 20 Cada recurso têm um operador, e todos trabalham 8 horas por dia, 5 dias por semana, o que dá uma disponibilidade total por semana de 2.400 minutos por recurso. O investimento e o custo de cada recurso são iguais. As despesas operacionais semanais somam R$10.500 (que inclui depreciações, aluguéis, luz, salários da MOD, da mão-de-obra indireta, dos gerentes, etc.), tudo o que a empresa gasta para manter-se funcionando.

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OBSOLESCÊNCIA DA CONTABILIDADE DE CUSTOS [I]

Nos últimos anos a contabilidade gerencial vem sofrendo severas críticas. O atual sistema de contabilidade gerencial, a contabilidade de custos, não vem sendo capaz de atender às necessidades das empresas. Para podermos analisar os problemas da contabilidade de custos, preciso definir o que quero dizer com o termo 'contabilidade gerencial'.

A contabilidade gerencial, no contexto que iremos analisar aqui, tem como objetivo fornecer informações para os gerentes tomarem decisões, ela é o sistema de informação que deve ser usado pelos gerentes de uma organização para indicar se suas decisões estão levando a organização na direção do seu objetivo.

Logo, antes de podermos analisar o sistema de informação gerencial, precisamos definir qual o objetivo da organização em questão. Precisamos delinear claramente com que tipo de organização estamos lidando, pois organizações com objetivos diferentes não devem usar o mesmo sistema de contabilidade gerencial.

Nesse artigo estamos falando das organizações cujo objetivo é ganhar dinheiro hoje e no futuro, as organizações com fins lucrativos. Se o objetivo da organização sendo analisada é ganhar dinheiro hoje e no futuro, a contabilidade gerencial precisa informar qual o impacto de uma decisão na rentabilidade da empresa. A contabilidade gerencial deve fazer a ligação entre as decisões dos gerentes e a lucratividade da empresa. Só podemos dizer que uma decisão/ação é boa se esta aumenta a rentabilidade da empresa, pois qualquer outra situação não está levando o sistema analisado na direção do seu objetivo. Toda decisão/ação deve ser julgada pelo seu impacto no objetivo global do sistema.

O objetivo de ganhar dinheiro hoje e no futuro é medido pelas variáveis Lucro Líquido (LL) e Retorno Sobre o Investimento (RSI). Portanto, a contabilidade gerencial deve informar qual o impacto de uma decisão/ação nessas variáveis.

Exemplo de uso da contabilidade de custos:

A contabilidade de custos tradicional é o sistema de contabilidade gerencial mais usado. Esse sistema usa o custo dos produtos, as medidas de eficiência local, análises de variância, etc. para fazer a ligação entre uma decisão e a lucratividade da empresa.

Vamos usar um exemplo bem simples, onde poderemos verificar os erros da contabilidade gerencial tradicional.

A empresa XY tem dois recursos, A e B.

Figura 1

O produto X é processado por 2 minutos no recurso A e depois é processado por 15 minutos no recurso B. Já o Y consome 10 minutos de cada recurso. Abaixo temos a tabela que mostra os dados sobre ambos os produtos:

Tabela 1

X Y Demanda Semanal 120 120

Preço 105 100 Custo de Matéria-Prima 45 50

Tempo de Processo no Recurso A 2 10 Tempo de Processo no Recurso B 15 10

Tempo Total de Processo 17 20

Cada recurso têm um operador, e todos trabalham 8 horas por dia, 5 dias por semana, o que dá uma disponibilidade total por semana de 2.400 minutos por recurso. O investimento e o custo de cada recurso são iguais. As despesas operacionais semanais somam R$10.500 (que inclui depreciações, aluguéis, luz, salários da MOD, da mão-de-obra indireta, dos gerentes, etc.), tudo o que a empresa gasta para manter-se funcionando.

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A primeira reação é tentar calcular quanto seria o lucro se vendêssemos toda a demanda dos dois produtos. Porém, a empresa não tem capacidade para produzir 120 X e 120 Y em uma semana. Isso porque o recurso B não tem capacidade suficiente (ver tabela abaixo).

Tabela 2

Recursos Minutos necessários para X

Minutos necessários para Y

Total de minutos necessários

minutos necessários / minutos disponíveis

A 240 1.200 1.440 60% B 1.800 1.200 3.000 125%

Já temos o cenário para esse exemplo. Vamos agora usar a metodologia da contabilidade de custos para tomar algumas decisões.

Não podemos vender tudo o que o mercado quer comprar, por isso precisamos definir o que vamos produzir e vender. Nesse caso, para maximizarmos o resultado da empresa, precisamos saber que produto mais contribui para a lucratividade da empresa, para produzirmos tudo o que o mercado demanda dele e, só então, se sobrar tempo no recurso B, produzir o outro produto.

Para tomar decisões a contabilidade de custos usa o custo dos produtos. Para calcular qual o custo de um produto precisamos dos seus custos de matéria-prima e precisamos somar os custos de produzir esse produto. Não vamos entrar em muitos detalhes sobre a mecânica do processo, o importante aqui é perceber que os custos dos produtos são conseqüência do consumo que cada produto tem de cada recurso da empresa.

Tabela 3

X Y melhor produto Preço R$ 105 R$ 100 X

Matéria-Prima R$ 45 R$ 50 X Tempo de processo 17 minutos 20 minutos X

Como mostra a tabela acima, o produto X é superior ao Y em todas as características. Tem um menor custo de matéria-prima, consome menos tempo dos recursos da empresa e tem maior preço. Isso faz com que, qualquer que seja o sistema de custeio adotado, a margem de lucro do produto X seja maior, pois X tem menor custo e maior preço.

Desta forma, iremos produzir toda a demanda de X (o produto mais lucrativo), 120 unidades. Como cada X consome 15 minutos do recurso B, para produzir 120 unidades usaremos 1.800 minutos. Temos 2.400 minutos disponíveis, logo sobram 600 minutos, que usaremos para produzir o produto Y. Como cada Y consome 10 minutos de B, podemos produzir 60 unidades. De acordo com a informação fornecida pela contabilidade de custos, o mix que proporciona o máximo lucro para essa empresa é: 120 X + 60 Y. Agora vamos calcular qual é esse lucro.

Tabela 4

R$ Receitas 18.600

Custo Matéria-Prima 8.400

Margem Bruta 10.200 Despesa Operacional 10.500

Lucro Líquido -300

Segundo esse raciocínio, o máximo que essa empresa pode gerar é um prejuízo de R$300 por semana.

Para melhorar o desempenho da empresa o diretor de marketing, usando os dados fornecidos pela contabilidade de custos, fez uma estratégia de marketing e conseguiu alavancar as vendas do produto mais lucrativo (X), e assim, parou de vender o menos lucrativo. Agora todo o tempo do gargalo será gasto produzindo o produto X.

Com os 2.400 minutos disponíveis no recurso B podemos produzir 160 unidades de X. Portanto, o mix será de 160 X + 0 Y. Agora vamos calcular qual o novo lucro.

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Tabela 5

R$ Receitas 18.600

Custo Matéria-Prima 7.200

Margem Bruta 9.600 Despesa Operacional 10.500

Lucro Líquido -900

Aumentamos as vendas do produto que a metodologia apontou como o mais lucrativo e o lucro da empresa piorou em muito! Não faz muito sentido. Explique isso ao diretor de marketing!

Vamos ver o que aconteceria se desconsiderássemos a informação da lucratividade dos produtos fornecida pela contabilidade de custos, e, ao invés de vendermos toda a demanda do produto X e apenas parte da demanda do produto Y, vendermos toda a demanda de Y e apenas parte de X.

De acordo com a contabilidade de custos estaremos concentrando nossas vendas no produto menos lucrativo e conseqüentemente nosso lucro deverá diminuir.

O novo mix para essa empresa é: 80 X + 120 Y. Agora vamos calcular qual é o lucro.

Tabela 6

R$ Receitas 20.400

Custo Matéria-Prima 9.600

Margem Bruta 10.800 Despesa Operacional 10.500

Lucro Líquido 300

Não mudamos nada nas condições da empresa e passamos de um prejuízo de R$300 para um lucro de R$300 por semana!

A contabilidade de custos não forneceu a informação correta sobre qual o produto que mais contribui para o lucro da empresa. Aumentamos a produção do produto menos lucrativo e diminuímos a produção do produto mais lucrativo e nosso lucro aumentou! A única conclusão lógica é que a contabilidade de custos tem algum erro.

Até agora vimos que a contabilidade de custos levou a uma decisão errada na identificação dos produtos mais lucrativos, mas se há um erro nessa metodologia, outros tipos de informação também podem estar incorretos.

Minimização do custo do produto.

Para ilustrar ainda mais os erros por trás da contabilidade de custos vamos a mais um exemplo. A contabilidade de custos tenta minimizar o custo dos produtos. Isso acontece porque se pressupõe que quanto menor for o custo de um produto, maior o lucro da empresa.

Como o custo do produto é formado pelo consumo que os produtos têm dos recursos, uma forma de reduzir o custo de um produto é reduzir o seu tempo de processo num recurso.

No caso da empresa XY vamos analisar uma redução no tempo de processamento do produto Y no recurso A. Atualmente o produto Y consome 10 minutos desse recurso, mas se investirmos R$100 podemos diminuir esse tempo para 8 minutos.

Iremos diminuir o tempo total de processamento desse produto de 20 minutos para 18 minutos, uma redução de 10%, e para isso precisamos apenas investir R$100. Muito provavelmente a contabilidade de custos aprovaria esse investimento.

Qual o reflexo que isso teria no lucro da empresa?

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Para responder a essa pergunta precisamos saber qual o impacto dessa decisão nas vendas da empresa. Vamos vender algum produto a mais por causa disso? Não, afinal de contas é o recurso B que estabelece quanto conseguimos vender, e não mexemos nesse recurso.

Onde é que essa decisão tem algum impacto? Ela aumentou o investimento da empresa em R$100, logo também aumentou os custos da empresa (depreciação desse investimento).

Concluindo: as vendas não foram afetadas, e o investimento e o custo aumentaram. Isso quer dizer que a lucratividade piorou.

Para enfatizar ainda mais esse fenômeno, vamos analisar outro caso. Alguém propôs diminuir o tempo do produto X em 1 minuto no recurso B, e ao mesmo tempo aumentar em 3 minutos o seu tempo no recurso A, investindo R$1.000. Em outras palavras, aumentar o tempo de processamento do produto X em 2 minutos, e pagar R$1.000 por isso. Na contabilidade de custos isso ocasionaria um aumento no custo desse produto, e é claro que nunca seria aceito.

Qual seria o impacto no lucro da empresa se essa decisão fosse aceita?

Para responder a essa pergunta precisamos saber qual o impacto dessa decisão nas vendas da empresa. Vamos vender algum produto a mais por causa disso? Sim, pois agora cada produto X consome 1 minuto a menos do recurso B. Como o recurso B é quem estabelece quanto essa empresa vai produzir, poderemos aumentar a quantidade produzida.

Para quantificar esse impacto vamos usar como base o mix de venda que resultou num lucro de R$300. O mix é de 80 X + 120 Y. Esse mix utilizava 100% do tempo do recurso B. Agora, o produto X utiliza um minuto a menos do tempo desse recurso. Assim, temos ainda 80 minutos disponíveis nesse recurso. Com isso podemos aumentar a oferta do produto X (que tem uma demanda semanal de 120 unidades). Cada X consome 14 minutos de B, como temos 80 minutos, podemos produzir 5,7 Xs a mais por semana (vamos considerar apenas 5 Xs por semana).

O novo mix para essa empresa é: 85 X + 120 Y. Agora vamos calcular qual é o lucro.

Tabela 7

R$ Receitas 20.925

Custo Matéria-Prima 9.825

Margem Bruta 11.100 Despesa Operacional [II] 10.500

Lucro Líquido 600

O lucro foi de R$300 por semana para R$600.

Vamos recapitular o que fizemos. Aumentamos o tempo de processamento de um produto, e conseqüentemente, aumentamos seu custo, e com isso, dobramos o lucro da empresa! E não se esqueça que pela contabilidade de custos não teríamos aceito fazer esse investimento. Na verdade teríamos feito o investimento que piora a lucratividade da empresa.

Aumentamos os custo unitário de um produto e melhoramos em muito o desempenho do sistema. Isso mostra que a minimização de custos unitários não é um objetivo válido para quem quer otimizar o sistema. O custo unitário é mais uma das ilusões criadas pela busca por ótimos locais, ele é apenas uma transferência interna de dinheiro, que não tem impacto no desempenho de todo sistema, aliás, tem impacto sim, pois cria percepções errôneas nas pessoas, o que acaba levando-as a tomarem decisões erradas.

Um exemplo disso é o que acabamos de ver. A busca por menores custos unitários aprovou uma proposta que piora o resultado final da empresa, e rejeitou uma outra proposta que beneficia em muito o resultado final da empresa.

No exemplo acima, o tempo do recurso B é que dita quanto a empresa poderá vender, ele é a restrição do sistema. Qualquer minuto desse recurso que for desperdiçado piora o resultado da empresa. Já, o tempo do recurso A não é escasso, o que mostra que devemos dar mais importância ao tempo do recurso B. Mas, a contabilidade de custos não reconhece essa relação.

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O problema com a contabilidade de custos é que ela pressupõe que se maximizarmos as eficiências de qualquer elo de um sistema, estaremos maximizando a eficiência do sistema como um todo. Para a contabilidade de custos todos os recursos da empresa são igualmente importantes. Ela não encara a empresa como um sistema, e por isso não diferencia entre os vários elos do sistema.

Para analisar um pouco mais essa questão, vamos usar uma analogia. Uma empresa pode ser vista como uma corrente, com vários elos interdependentes. O desempenho de toda a corrente depende da interação entre os elos, como uma empresa depende da interação entre os seus vários recursos. O desempenho do sistema como um todo depende do sincronismo entre os seus vários elos. Essa noção de sistema traz uma importante constatação, a do papel fundamental da restrição do sistema. Quando tracionamos uma corrente, onde ela quebrará? Óbvio, no seu elo mais fraco, num único elo. Se quisermos aumentar a resistência da corrente precisamos identificar o seu elo mais fraco e melhorar seu desempenho. Se aumentarmos a resistência de qualquer outro elo que não o mais fraco, não estaremos aumentando a resistência da corrente como um todo.

Então, podemos concluir que, para melhorar o desempenho de qualquer sistema precisamos identificar sua restrição. Se não soubermos onde está a restrição não poderemos aumentar seu desempenho.

Quando identificamos a restrição, estamos identificando aquelas poucas coisas que ditam o desempenho de todo o sistema. Desta forma, depois de identificada a restrição, precisamos decidir o que fazer para melhorar o desempenho do sistema.

No exemplo acima a empresa tem dois recursos, A e B. Vimos, na tabela 2, que o recurso B não tem capacidade para atender toda a demanda do mercado. Então, identificamos a restrição dessa empresa, é o tempo do recurso B. Como não temos capacidade suficiente para vender tudo o que o mercado quer comprar, precisamos decidir o que iremos produzir e vender.

O tempo do recurso B é que está limitando o desempenho de toda essa empresa. Se ele parar, por qualquer motivo, a empresa perderá vendas. Qualquer minuto desse recurso é muito valioso para a empresa como um todo. Por isso, não queremos que o recurso B pare, queremos que ele fique produzindo 100% do seu tempo. Mas ficar produzindo 100% do tempo não é suficiente, precisamos usar esse tempo de forma inteligente, temos que usar esse tempo para produzir as coisas certas.

Precisamos decidir o que produzir. Por um lado temos o produto X, e por outro lado o Y. Precisamos levar em conta quanto cada produto traz de dinheiro para a empresa. No exemplo acima, o produto X tem um preço de venda de R$ 105 e para fazer esse produto a empresa paga a seus fornecedores R$ 45 (matéria-prima), o que dá uma margem de contribuição de R$ 60 para a empresa. O produto Y tem uma margem de contribuição de R$ 50. É claro que queremos dar preferência ao produto que tem a maior contribuição.

Mas a margem de contribuição do produto não é tudo. Precisamos levar em conta o tempo que cada produto usa da restrição. Conforme já vimos, o produto X consome 15 minutos da restrição, enquanto o produto Y só consome 10 minutos. O que é melhor, um produto que consome muito tempo do nosso restrição, ou pouco tempo? Óbvio, um que consome pouco tempo, afinal de contas o tempo do recurso B é escasso.

Como podemos ver, queremos dar preferência aos produtos que têm maior margem de contribuição e, ao mesmo tempo, dar preferência aos produtos que utilizam menos o tempo da restrição. Teremos um problema quando, comparando dois produtos, um tenha a maior margem de contribuição e o outro utilize menos o tempo da restrição. Como decidir qual é melhor para a empresa?

Para resolver esse problema precisamos ter uma medida relativa, que leve em conta que queremos maximizar a margem de contribuição total da empresa ao mesmo tempo em que queremos minimizar o tempo gasto da restrição.

Por um lado temos a margem de contribuição do produto, por outro os minutos que o produto usa da restrição. Para decidir qual contribuirá mais para o resultado final da empresa precisamos dividir a margem de contribuição dos produtos pelo tempo que eles utilizam da restrição, chegando na margem de contribuição por tempo da restrição.

Abaixo temos essa medida para os dois produtos:

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Tabela 8

X Y Margem de Contribuição 60 50 Tempo na Restrição 15 10

Margem Contr. / Tempo na Restrição 4 5

O produto Y utiliza menos minutos da restrição que o produto X, mas o X tem uma margem de contribuição maior. Como a empresa não tem capacidade para atender a todos os pedidos precisa decidir qual produto é mais interessante para ela. Para isso, precisamos calcular a relação entre a margem de contribuição e os minutos usados da restrição. O que essa medida nos informa é que, para cada minuto que a restrição está produzindo o produto X, a empresa tem um aumento na sua margem de contribuição de R$ 4, e quando é o produto Y que está sendo processado na restrição o aumento é de R$ 5 por minuto.

Para entender melhor essa medida é só pensar que a empresa na verdade está vendendo aquilo que tem de mais escasso, os minutos da restrição. Os produtos que pagarem melhor pelo tempo que consomem da restrição são os que mais contribuem para a lucratividade da empresa. No caso acima, o produto X "paga" R$ 4 por minuto e o Y R$ 5 por minuto. Logo a empresa deve dar preferência ao produto Y e, se a restrição ainda tiver tempo disponível depois de atendido todo o mercado deste produto, produz-se o X (essa conclusão é o oposto da conclusão que chegamos usando a contabilidade de custos).

Por essa razão que, na tabela 6, o lucro da empresa aumentou quando diminuímos as vendas do produto X para aumentar as do produto Y. O que acontece é que a contabilidade de custos não faz, corretamente, a ligação entre as decisões locais com os resultados globais.

No caso acima não mudamos nada nas condições da empresa, a única coisa que mudamos foi o processo de tomada de decisão, e passamos de um prejuízo de R$300 para um lucro de R$300 por semana! Agora vamos ver o que acontece se o marketing alavancasse as vendas do produto mais lucrativo (Y), e assim, parasse de vender o menos lucrativo. Isso quer dizer que todo o tempo da restrição será gasto produzindo o produto Y.

Temos 2.400 minutos disponíveis, logo podemos produzir 240 unidades de X. Assim sendo, o mix será de 0 X + 240 Y. Agora vamos calcular qual o novo lucro.

Tabela 9

R$ Receitas 24.000

Custo Matéria-Prima 12.000

Margem Bruta 12.000 Despesa Operacional 10.500

Lucro Líquido 1.500

Aumentamos as vendas do produto que a metodologia apontou como o mais lucrativo e o lucro da empresa melhorou em muito! Agora faz sentido!

Obsolescência

O que acontece com a contabilidade de custos é que ela soma o tempo que os produtos consomem de todos os recursos, como se todos os recursos tivessem a mesma importância. E, como vimos, isso não é verdade. O tempo de alguns recursos não é muito valioso para a empresa, enquanto o tempo da restrição é extremamente valioso. Essa é a razão da contabilidade de custos não conseguir fazer a ligação entre as decisões gerenciais e a lucratividade da empresa.

Para demonstrar isso vamos voltar ao exemplo da empresa XY. O que aconteceria aos resultados da empresa se o recurso A parasse, por qualquer motivo, por uma hora? Nada, isso não afetaria a rentabilidade da empresa.

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Agora, o que aconteceria se o recurso B parasse por uma hora? A empresa perderia uma hora de produção, isto é, a empresa perderia vendas e, o mais importante, nunca conseguiria recuperar essa perda.

A percepção da contabilidade de custos faz com que ela incentive a busca por altas eficiências em todos os recursos. Como ela pressupõe que todos os recursos são igualmente importantes, ela cria as medidas de eficiência locais. Precisamos nos certificar que todos os recursos estão trabalhando na sua carga máxima. Mas qual é o impacto desse comportamento nos resultados finais da empresa?

Conforme vimos na tabela 2, o recurso A tem mais capacidade que o B. O que aconteceria se obrigássemos o recurso A a trabalhar sem parar? Exatamente, aumentaríamos o estoque em processo entre o recurso A e o B, e não afetaríamos as vendas. Isso quer dizer que o investimento e a despesa operacional da empresa aumentariam, mas suas vendas não, o que resulta em diminuição da sua lucratividade. A conclusão óbvia é que não queremos que todos os recursos da empresa tenham 100% de eficiência.[III]

Isso é o que o bom senso nos diz. Você acha certo reforçar qualquer elo de uma corrente para reforçar a corrente como um todo? Claro que não! Então porque ir contra o bom senso na sua empresa?

A contabilidade de custos também pressupõe que podemos medir o impacto de uma decisão local no lucro final da empresa olhando principalmente no custo que essa decisão incorre. "...O conceito de custo está baseado no pressuposto de que 'podemos medir o impacto de uma área local (ou decisão local) no lucro final, medindo quanto dinheiro essa área (ou decisão) absorve ou libera.' Esse pressuposto só é válido se aceitarmos que a importância de todas as coisas numa organização está diretamente relacionada com a despesa operacional gasta nelas. O dia a dia nos ensina o oposto. Pegue por exemplo um caso onde ficamos sem uma matéria-prima. O dano ao sistema pode ser completamente desproporcional ao custo desse material. Ou compare a influência no resultado final de uma parada numa máquina gargalo com uma parada similar numa máquina não-restritiva... O mero fato de que aceitamos intuitivamente a existência de restrições e não-restrições numa organização indica que reconhecemos a falta de validade do pressuposto básico do conceito de custos."[IV]

Outro pressuposto da contabilidade de custos é de que as despesas irão variar proporcionalmente ao aumento do consumo dos recurso pelos produtos. Mas as despesas da empresa não variam proporcionalmente ao aumento no volume de produção. Isso é devido ao fenômeno de que um sistema tem muito poucas restrições e, por isso, a maioria dos recursos do sistema tem capacidade disponível para absorver aumentos de volume e/ou mudanças de mix.

Quando é que um custo varia? Quando precisamos aumentar a disponibilidade de algo de que não temos o suficiente. Então, só aumentamos os custos nas restrições do sistema, nos pontos onde precisamos aumentar a nossa capacidade. Os custos de uma atividade devem aumentar apenas quando aquela atividade não tiver mais capacidade em excesso, isto é, apenas quando aquela atividade for uma restrição do sistema.

Não parece razoável pressupor que todos os custos da empresa vão aumentar se aumentarmos o volume de produção ou mudarmos o mix de produção, mas é justamente isso que a contabilidade de custos pressupõe. É a mesma coisa que dizer que num sistema todas as variáveis são igualmente importantes para o seu desempenho, que todas as variáveis são restrições. Esse pressuposto vai contra a noção de sistema.

Por causa desse pressuposto é que a contabilidade de custos calcula quanto cada produto consume de cada recurso, como se todos os recurso tivessem igual importância para a empresa.

Activity-Based Costing (ABC)

Existe um consenso de que a contabilidade de custos tradicional está obsoleta. Mas não existe consenso quanto ao que usar para substituí-la. Muitos advogam a utilização de metodologias de custeio mais elaboradas.

O rateio foi inicialmente criado para facilitar a tomada de decisão, para torná-la mais ágil e para melhorar a qualidade da informação. Quando ele foi criado quase todos os custos da empresa variavam de acordo com o volume de produção, então ele fornecia informações relevantes, ainda não era correto, mas sua aproximação era suficientemente boa. Porém, a composição dos custos mudou significativamente, agora grande parte dos custos não varia de acordo com o volume de produção e/ou mudanças de mix, não só isso, como esses custos não variam de acordo com

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nenhum outro direcionador. Por isso, o rateio não serve mais. A causa da obsolescência da contabilidade de custos tradicional não foi o fato de se usar apenas a mão-de-obra direta como base para o rateio, mas sim o fato de se ratear os custos..

Hoje em dia os responsáveis pela contabilidade gerencial fazem de tudo, criam procedimentos complicadíssimos, que exigem toneladas de dados, que demoram para semre implementados, que poucas pessoas conseguem entender, para manter o rateio dos custos para os produtos. E mesmo fazendo tudo isso não conseguem fornecer informações relevantes para a tomada de decisão. esquecemos qual é o objetivo da contabilidade gerencial, estamos agindo como se o objetivo fosse ratear os custos aos produtos!

Como vimos, o erro da contabilidade de custos é pressupor que altas eficiências locais levam ao ótimo global, isto é, se maximizarmos o desempenho individual de todos os elos de um sistema estaremos maximizando o seu desempenho global. Por causa desse pressuposto usamos o rateio e precisamos usar os direcionadores de custos. Achamos que se todos os recursos de um sistema estiverem com altas eficiências locais então o sistema estará tendo um bom desempenho. O ABC, que é considerado pela maioria das pessoas como o melhor substituto para a contabilidade de custos tradicional, continua baseado nesse mesmo pressuposto. "Num sistema de custeio baseado em atividade, o custo do produto é a soma dos custos de todas as atividades requeridas para produzir e entregar o produto."[V] Logo, não pode resolver o problema da falta de consistência da informação fornecida.

Os direcionadores de custos do ABC são medidas de eficiências locais, eles estão estimulando os administradores a otimizarem cada elo da corrente (cada atividade), dizendo que isso os levará há uma otimização do sistema. Na verdade, o ABC tenta maximizar a eficiência de toda atividade, o que certamente não pode contribuir para o bom desempenho do sistema.

Conclusão

O custo dos produtos é apenas uma das ilusões criadas pelo paradigma da contabilidade de custos. Achamos que se diminuirmos o custo de um produto estaremos aumentando o lucro da empresa, mas, conforme já vimos aqui, isso não é verdade. Algumas outras ilusões criadas pelo paradigma da contabilidade de custos, e que geram efeitos tão danosos à empresa quanto o custo do produto são: a busca por lotes econômicos, a busca por altas eficiências locais de todos os recursos e a busca por uma fábrica com capacidade balanceada.[VI] Tudo isso dispersa os esforços da administração e tornam a tarefa de administrar a empresa ainda mais difícil.

O que precisamos ter em mente é que o que realmente importa não são os custos dos produtos mas sim o impacto que as decisões com relação aos produtos têm no resultado da empresa e, para saber isso, não precisamos fazer nenhum tipo de alocação.

Precisamos administrar a capacidade do sistema, e precisamos considerar os limites dessa capacidade nas nossas decisões. Precisamos também ter em mente que o que limita a capacidade de um sistema são suas restrições, então para poder administrar a capacidade do sistema precisamos identificar e controlar suas restrições.

Os defensores do ABC dizem que a contabilidade de custos tradicional perdeu relevância porque usa apenas uma base de rateio. Mas na verdade, como vimos aqui, a contabilidade de custos tradicional perdeu relevância porque aloca custos aos produtos. Com isso, o ABC também perdeu relevância. Mudar do custeio tradicional para o ABC é como "...rearranjar as cadeiras do Titanic."[VII]

É por tudo o que vimos aqui que Goldratt classificou a contabilidade de custo, e nela está incluído o ABC (e qualquer outra metodologia que se baseie no mesmo paradigma), como inimigo número 1 da produtividade. Se concordarmos com a premissa de que uma empresa é um sistema, e que um sistema sempre tem muito poucas restrições, então, só nos resta concordar com Goldratt. [I] Esse artigo é baseado em alguns capítulos do livro: "Contabilidade de Ganhos. A nova contabilidade gerencial de acordo com a Teoria das Restrições." Corbett. São Paulo: Nobel,1997. [II] Na verdade a despesa operacional é um pouco maior, já que a empresa investiu R$ 1.000 para aumentar as vendas. Desta forma, a despesa operacional semanal deveria aumentar em R$ 1,92 (depreciação de 10% ao ano). [III] Para entender melhor esse ponto leia o apêndice do livro: " Contabilidade de Ganhos" Corbett. Ed. Nobel: São Paulo, 1997. [IV] GOLDRATT, Eliyahu. "The Theory of Constraints Journal." Volume 1 number 2. New Haven: The Avraham Y. Goldratt Institute, April/May 1988. Pág. 19. [V] COOPER, Robin. " The Rise of Activity-Based Costing - Part One: What Is an Activity-Based cost System?" Journal Of Cost Management for the Manufacturing Industry, Summer 1988. pág. 46. [VI] Para maiores informações sobre esses pontos leia o livro: "Contabilidade de Ganhos." Corbett. Ed. Nobel: São Paulo, 1997. [VII] JOHNSON, H. Thomas. "It's Time to Stop Overselling Activity-Based Concepts" Management Accounting, setembro de 1992. pág. 30.