CONTA COM SALA ESCRITÓRIO E BANHEIROS. O TAMANHO DA CAMA...

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80 FEEDFOOD.COM.BR LEITE O setor leiteiro no Brasil atravessou uma fase de retração nos últimos dois anos, mas em com- pensação, para 2017, a conjuntura está mais favorável aos produtores. Dentro desse cenário otimista, os custos, em especial com a alimentação das vacas, vivem um bom momento. Além disso, conforme da- dos da Embrapa Gado de Leite (Juiz de Fora/MG), o comportamento da demanda também indica sinais positivos. Outra notícia boa, segundo o docu- mento, deve vir da balança comercial de lácteos. Apesar de ainda deficitária, a ten- dência é de melhora em volumes nos próxi- mos meses, visto que Argentina e Uruguai seguem com baixa disponibilidade de leite. Mas, nada adianta comemorar os nú- COMPOST BARN, SISTEMA AMERICANO DE CONFINAMENTO DE VACAS LEITEIRAS, BENEFICIA OS NÍVEIS DE PRODUTIVIDADE POR MEIO DE BEM-ESTAR. NO BRASIL, O PRODUTOR MARCOS SOUZA DE FREITAS COMPARTILHA ESTA EXPERIÊNCIA VALERIA CAMPOS, DA REDAÇÃO [email protected] O MÁXIMO DE CONFORTO AOS ANIMAIS Fotos: divulgação LEITE um local confortável e seco durante todo o ano e menor produção de dejetos animais, esse modelo de produção foi criado por produtores norte-americanos em meados da década de 80 e hoje vem conquistando adeptos em todo o mundo, inclusive em vários países da Europa, Ásia e América do Sul. De acordo com o pesquisador da Embrapa Gado de Leite, Alessan- dro de Sá, neste sistema os animais são mantidos dentro de um galpão ventilado, sob uma cama de serragem ou marava- lha. “Não há baias indi- viduais e o material de cama é revolvido de duas a três vezes por dia, ge- ralmente na ordenha das vacas, para promover a compostagem desse material junto às fezes e urina”. Na literatura, conta Alessandro, o au- mento do conforto e bem-estar animal são as principais consequências realça- das do sistema. Mas, também, são ob- servados outros benefícios decorrentes do confinamento, como aumento da pro- dutividade do rebanho, melhora no es- core de higiene das vacas e condições de casco e pernas, aumento de detecção de cio, redução de contagem de células so- máticas, dentre outros. “Empiricamente, os produtores que adotam esse sistema relatam um crescimento na produção de leite e melhoria na saúde da glândula mamária. Em somatória, há também im- pacto na qualidade do produto”, acres- centa a analista da Embrapa Gado de Leite, Letícia Caldas Mendonça. Os produtores brasileiros que utilizam esse sistema têm demonstrado satisfação com os resultados. Na cidade de Santa Rosa, interior do Rio Grande do Sul, por exemplo, o produtor Marcos Souza de Freitas divide esta experiência. Desde 1961, o sogro de Marcos cria a raça Jersey, e foi a partir de 2004 que o negócio foi passado para as mãos dele e da esposa. A propriedade, sempre com um número de 20 a 30 vacas em ordenha, entregou números animadores até 2011 – ano em que conseguiram a melhor média de produção – e depois disso não apresen- tou mais resultados elevados. O descontentamento com o sistema a pasto abriu possibilidades para Marcos e a esposa explorarem outros modelos de produção, e uma das alternativas que enxergaram foi o galpão com Compost Barn. Em seis meses da adoção do con- finamento, Marcos notou efeitos positi- vos na produção, além de afirmar não ter meros, se o sistema dentro da propriedade não funciona. Como é de conhecimento de todos, o tipo de instalação usada para vacas leiteiras tem forte influência nos re- sultados produtivos. E ao mesmo tempo, lidar com questões importantes, como bem-estar animal, se tornou peça-chave para sobrevivência dos negócios. Por- tanto, investir é a palavra da vez. No Brasil, embora os sistemas de cria- ção de gado leiteiro possuam o pasto como principal base alimentar, os produ- tores estão buscando alternativas para proporcionar melhor conforto e bem-estar aos animais, com impacto significativo também nos níveis de produtividade. O Compost Barn é o exemplo mais recente dessa procura. Conhecido por ser um sistema de confinamento de va- cas leiteiras que proporciona ao animal NA PROPRIEDADE DE MARCOS, O GALPÃO TEM 16M X 60M NO TOTAL E CONTA COM SALA DE ORDENHA, SALA DO LEITE, ESCRITÓRIO E BANHEIROS. O TAMANHO DA CAMA DAS VACAS É DE 12M X 48M COM UMA CAPACIDADE PARA 60 VACAS JERSEY

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80 FEEDFOOD.COM.BR

LEITE

O setor leiteiro no Brasil atravessou uma fase de retração nos últimos dois anos, mas em com-pensação, para 2017, a conjuntura está mais

favorável aos produtores. Dentro desse cenário otimista, os custos, em especial com a alimentação das vacas, vivem um bom momento. Além disso, conforme da-dos da Embrapa Gado de Leite (Juiz de Fora/MG), o comportamento da demanda também indica sinais positivos.

Outra notícia boa, segundo o docu-mento, deve vir da balança comercial de lácteos. Apesar de ainda deficitária, a ten-dência é de melhora em volumes nos próxi-mos meses, visto que Argentina e Uruguai seguem com baixa disponibilidade de leite.

Mas, nada adianta comemorar os nú-

COMPOST BARN, SISTEMA AMERICANO DE CONFINAMENTO DE VACAS LEITEIRAS, BENEFICIA OS NÍVEIS DE PRODUTIVIDADE POR MEIO DE BEM-ESTAR. NO BRASIL, O PRODUTOR MARCOS SOUZA DE FREITAS COMPARTILHA ESTA EXPERIÊNCIAVALERIA CAMPOS, DA REDAÇÃ[email protected]

O MÁXIMO DE CONFORTO AOS ANIMAIS

Fotos: divulgação

LEITE

um local confortável e seco durante todo o ano e menor produção de dejetos animais, esse modelo de produção foi criado por produtores norte-americanos em meados da década de 80 e hoje vem conquistando adeptos em todo o mundo, inclusive em vários países da Europa, Ásia e América do Sul.

De acordo com o pesquisador da Embrapa Gado de Leite, Alessan-dro de Sá, neste sistema os animais são mantidos dentro de um galpão ventilado, sob uma cama de serragem ou marava-lha. “Não há baias indi-viduais e o material de cama é revolvido de duas a três vezes por dia, ge-ralmente na ordenha das

vacas, para promover a compostagem desse material junto às fezes e urina”.

Na literatura, conta Alessandro, o au-mento do conforto e bem-estar animal são as principais consequências realça-das do sistema. Mas, também, são ob-servados outros benefícios decorrentes do confinamento, como aumento da pro-dutividade do rebanho, melhora no es-core de higiene das vacas e condições de casco e pernas, aumento de detecção de cio, redução de contagem de células so-máticas, dentre outros. “Empiricamente, os produtores que adotam esse sistema relatam um crescimento na produção de leite e melhoria na saúde da glândula mamária. Em somatória, há também im-pacto na qualidade do produto”, acres-centa a analista da Embrapa Gado de Leite, Letícia Caldas Mendonça.

Os produtores brasileiros que utilizam esse sistema têm demonstrado satisfação com os resultados. Na cidade de Santa Rosa, interior do Rio Grande do Sul, por exemplo, o produtor Marcos Souza de Freitas divide esta experiência.

Desde 1961, o sogro de Marcos cria a raça Jersey, e foi a partir de 2004 que o negócio foi passado para as mãos dele e da esposa. A propriedade, sempre com um número de 20 a 30 vacas em ordenha, entregou números animadores até 2011 – ano em que conseguiram a melhor média de produção – e depois disso não apresen-tou mais resultados elevados.

O descontentamento com o sistema a pasto abriu possibilidades para Marcos e a esposa explorarem outros modelos de produção, e uma das alternativas que enxergaram foi o galpão com Compost Barn. Em seis meses da adoção do con-finamento, Marcos notou efeitos positi-vos na produção, além de afirmar não ter

meros, se o sistema dentro da propriedade não funciona. Como é de conhecimento de todos, o tipo de instalação usada para vacas leiteiras tem forte influência nos re-sultados produtivos. E ao mesmo tempo, lidar com questões importantes, como bem-estar animal, se tornou peça-chave para sobrevivência dos negócios. Por-tanto, investir é a palavra da vez.

No Brasil, embora os sistemas de cria-ção de gado leiteiro possuam o pasto como principal base alimentar, os produ-tores estão buscando alternativas para proporcionar melhor conforto e bem-estar aos animais, com impacto significativo também nos níveis de produtividade.

O Compost Barn é o exemplo mais recente dessa procura. Conhecido por ser um sistema de confinamento de va-cas leiteiras que proporciona ao animal

NA PROPRIEDADE DE MARCOS, O GALPÃO TEM 16M X 60M NO TOTAL E CONTA COM SALA DE ORDENHA, SALA DO LEITE, ESCRITÓRIO E BANHEIROS. O TAMANHO DA CAMA DAS VACAS É DE 12M X 48M COM UMA CAPACIDADE PARA 60 VACAS JERSEY

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vivido transtornos na transição dos siste-mas: “Começamos a montar as estrutu-ras em maio de 2016, e em outubro deste mesmo ano mudamos os animais para o Compost Barn. Antes, as vacas eram mantidas em pasto no inverno e verão e quando saíram de lá estavam com 17 litros de média. Hoje, neste novo modelo de pro-dução, elas atingiram 28 litros de média. Acompanho os índi-ces de outras proprie-dades ao redor e, até então, não visualizei nenhum negócio com esse mesmo desem-penho”, compartilha.

Segundo ele, o bem-estar para a raça Jersey é essen-cial, visto que se uma vaca não estiver em pleno conforto ela não consegue ser produtiva. “O Com-post Barn mantém os animais em uma situação confortável 365 dias do ano. Por enquanto, estamos pela metade, mas já tivemos resultados excelentes”.

É importante destacar que o sistema depende principalmente do bom manejo da cama, que consiste no revolvimento, como realçou Alessandro, de pelo menos duas vezes ao dia. Outros fatores que de-vem ser levados em conta são a escolha do local da instalação – para ter uma boa ventilação natural, observação do desloca-mento do sol e proteção de água da chuva. Sobre este último, Marcos conta que um dos grandes desafios é o inverno, pois há uma preocupação em manter a cama seca em locais frios e úmidos. “Não passamos por esta estação ainda, mas o verão foi chuvoso. Outro dia choveu 200 mm em um dia, e a cama ficou seca. Mas, é claro que teremos que trazer mais serragem para compensar a umidade no inverno”.

Um manejo inadequado pode levar a condições indesejáveis da cama, resul-tando no aumento de incidência de mastite clínica e contagem de células somáticas, colocando o investimento e a tecnologia em risco. Ainda sob tom de alerta, vale ressaltar que o Compost Barn, assim como outros sistemas, exige orientações técnicas. “A construção do galpão do sistema neces-sita de cuidados quanto a área disponível por vaca, orientação geográfica, ventila-ção, entrada e saída de vacas, corredor de serviços, bebedouro, linha de cocho etc. Por isso, o produtor deve sempre contar com a consultoria de um profissional espe-cializado”, realça Letícia Mendonça.

O investimento inicial dos produtores, segundo Alessandro, pode variar de R$ 3.875,04 a R$ 4.676,34, conforme dados

“QUALQUER INVESTIMENTO OU ADOÇÃO DE

NOVA TECNOLOGIA EXIGE CUIDADO,

PORQUE NÃO EXISTE UM SISTEMA DE PRODUÇÃO QUE MILAGROSAMENTE

RESOLVA OS TÍPICOS PROBLEMAS

DE UMA FAZENDA LEITEIRA”, ALERTA

ALESSANDRO DE SÁ

LETÍCIA CALDAS MENDONÇA CHAMA ATENÇÃO DA NECESSIDADE DE UMA ORIENTAÇÃO TÉCNICA PARA A CONSTRUÇÃO DO GALPÃO

ainda não publicados de uma pesquisa rea-lizada em Minas Gerais. Sobre este tópico, durante uma entrevista, o vice-presidente do Conseleite, Jorge Rodrigues, disse que recomenda cautela a quem pensa em inves-tir na tecnologia, porque ainda não há do-mínio total do sistema. “Qualquer investi-mento ou adoção de nova tecnologia exige cuidado, porque não existe um sistema de produção que milagrosamente resolva os típicos problemas de uma fazenda leiteira. O barato pode sair caro, se não seguirem as instruções corretas”, acrescenta o pes-quisador da Embrapa Gado de Leite.

Para tanto, conta Alessandro, dados científicos e condições brasileiras são ne-cessários para confirmar os relatos dos produtores. Desta forma, Embrapa e al-gumas universidades do País estão debru-çando no tema para estudar os impactos deste sistema sobre a saúde e produtivi-dade das vacas leiteiras. ■

DE ACORDO COM MARCOS SOUZA DE FREITAS, EM APENAS SEIS MESES DE SISTEMA, O COMPOST BARN ENTREGOU RESULTADOS EXPRESSIVOS

ESTUDOS EM MINNESOTA (EUA)Pesquisas realizadas na Universi-dade de Minnesota, nos Estados Unidos, mostraram mudanças com relação ao conforto dos animais, as-sim como impacto na produtividade e longevidade do rebanho. Menor incidência de problemas de casco nas vacas, com um percentual de 8% nas vacas criadas no sistema Compost Barn contra valores de 20 a 28% em propriedades no sistema Free-Stall, foi outro ponto observa-do neste sistema (Barberg et al., 2007). Consequência disso, houve também a melhoria na detecção de cio por parte dos tratadores, sendo que as taxas de detecção aumen-taram de 37% para 41% e as taxas de concepção de 13% para 17%, no sistema Compost Barn quando comparado ao Free-Stall (Barberg et al., 2007). Além disso, também houve melhora na qualidade do leite obtido, já que os índices de CCS e incidência de mastite foram reduzi-dos devido à redução da carga mi-crobiana das camas e melhoria das condições higiênicas das vacas.

Fonte: Instituto de Estudos Pecuários (IEPEC)