Congresso é o primeiro desafio de 2011...

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Ano 18 Nº 4 outubro a dezembro de 2010 Nesta Edição: EDITORIAL Inovação e Pioneirismo 2 ARTIGO Abordagem Nutrigenômica Aplicada aos Estudos de Alimentos Funcionais 3 EVENTOS Funcionais: discussão atual 7 EVENTOS Alimentação: novos hábitos 7 ENTREVISTA “Não existe atividade humana sem risco!” 8 epois de um ano de muito trabalho e bons resultados, a Diretoria do ILSI Brasil se reuniu para traçar as metas para os próximos doze meses e comemorou o saldo posi- tivo dos eventos, publicações e outros projetos que envolveram a academia, indústria, governo e novas parcerias que começam a se consolidar. É neste clima otimista que seus mem- bros agradecem o apoio de todos e desejam que, em 2011, o caminho entre sonhos e realizações seja ainda mais curto, para que os desafios se concretizem na construção de uma sociedade cada vez mais dinâmica nas áreas da pesquisa, ciência, bem-estar e preservação do Planeta. Foi nesta direção que se definiu o enfoque do II Congresso Na- cional do ILSI Brasil, que acon- tecerá nos dias 6, 7 e 8 de abril, em Águas de São Pedro, interior paulista e terá como Presidente do Comitê Científico, Dr. Fé- lix Reyes. Especialistas estarão reunidos para debater o tema “Avaliação do Risco: Ciência e Decisão - Saúde, Nutrição e Meio Ambiente”, assunto hoje na pauta de amplas discussões internacionais. O objetivo é uma abordagem ampla, considerando o impacto da questão impacto em várias áreas e abrindo o de- bate para os aspectos científicos ligados diretamente ao uso de produtos e substâncias, sem desconsiderar seus benefícios. Desenvolvida nos últimos 30 anos, a Avaliação do Risco é atualmente uma importante fer- ramenta de gestão e quantificação dos riscos inerentes às atividades humanas e o desafio é fazer com que todos os envolvidos a conheçam e possam fazer o melhor uso dela a favor da sociedade. Afinal, nem todo o risco percebido é o risco calculado. O evento é mais uma iniciativa nacional alinhada às ações do ILSI Internacional, que identifi- cou a Avaliação do Risco como um dos quatro temas prioritários para os próximos anos, a partir de necessidades apontadas globalmente. Acompanhe pelo site www.ilsi.org.br. Participem! D Congresso é o primeiro desafio de 2011 Ary Bucione, Alexandre Novachi, Mauro Fisberg, Flavio Zambrone, Ione Lemonica, Eugenio Ulian, Felix Reyes, Aldo Baccarin, Franco Lajolo. Sentados: Georgia Castro, Jose Mauro Moraes.

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A n o 1 8 N º 4 outubro a dezembro d e 2 0 10

Nesta Edição:EDITORIALInovação e Pioneirismo 2ARTIGOAbordagem Nutrigenômica Aplicada aos Estudos de Alimentos Funcionais 3EVENTOSFuncionais: discussão atual 7EVENTOSAlimentação: novos hábitos 7ENTREVISTA“Não existe atividade humanasem risco!” 8

epois de um ano de muito trabalho e bons resultados, a Diretoria do ILSI Brasil se reuniu para traçar as metas para os próximos doze meses e comemorou o saldo posi-tivo dos eventos, publicações e outros projetos que envolveram a academia, indústria,

governo e novas parcerias que começam a se consolidar. É neste clima otimista que seus mem-bros agradecem o apoio de todos e desejam que, em 2011, o caminho entre sonhos e realizações seja ainda mais curto, para que os desafios se concretizem na construção de uma sociedade cada vez mais dinâmica nas áreas da pesquisa, ciência, bem-estar e preservação do Planeta.

Foi nesta direção que se definiu o enfoque do II Congresso Na-cional do ILSI Brasil, que acon-tecerá nos dias 6, 7 e 8 de abril, em Águas de São Pedro, interior paulista e terá como Presidente do Comitê Científico, Dr. Fé-lix Reyes. Especialistas estarão reunidos para debater o tema “Avaliação do Risco: Ciência e Decisão - Saúde, Nutrição e Meio Ambiente”, assunto hoje na pauta de amplas discussões internacionais. O objetivo é uma abordagem ampla, considerando o impacto da questão impacto em várias áreas e abrindo o de-bate para os aspectos científicos ligados diretamente ao uso de produtos e substâncias, sem desconsiderar seus benefícios.

Desenvolvida nos últimos 30 anos, a Avaliação do Risco é atualmente uma importante fer-ramenta de gestão e quantificação dos riscos inerentes às atividades humanas e o desafio é fazer com que todos os envolvidos a conheçam e possam fazer o melhor uso dela a favor da sociedade. Afinal, nem todo o risco percebido é o risco calculado.

O evento é mais uma iniciativa nacional alinhada às ações do ILSI Internacional, que identifi-cou a Avaliação do Risco como um dos quatro temas prioritários para os próximos anos, a partir de necessidades apontadas globalmente. Acompanhe pelo site www.ilsi.org.br. Participem!

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Congresso é o primeiro desafio de 2011

Ary Bucione, Alexandre Novachi, Mauro Fisberg, Flavio Zambrone, Ione Lemonica, Eugenio Ulian, Felix Reyes, Aldo Baccarin, Franco Lajolo.

Sentados: Georgia Castro, Jose Mauro Moraes.

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Editorial

ão raras as pessoas que não reservam um tempinho para fazer um balanço de tudo de

bom, ou nem tanto, que aconteceu ao longo do ano. Nós do ILSI Brasil não somos exceção. Dezembro é mês de balanço não só financeiro, mas de re-alizações e um check-list. Começamos 2010 com uma grande expectativa pelos 20 anos de ativida-des no País e resolvemos comemorar trabalhan-do. Posso dizer que não nos arrependemos.

O ano não foi dos mais fáceis, diante de fusões de empresas liga-das ao ILSI, redução de investimentos, mas nada nos desanimou. A equipe deu “duro” e conseguimos cumprir nosso cronogra-ma porque não dizer, com louvor. O evento de Funcionais, em outubro, foi um dos destaques, pelo alto nível dos participantes, pela repercussão positiva e o primeiro a ter transmissão mundial via internet.

Às Publicações também se soma-ram novos títulos e a procura tem crescido. Para focar ainda mais nossas ações foram criados Grupos de Tra-balho, com objetivos de intensificar projetos nas áreas de Probióticos e Resíduos de Substâncias Químicas, dois temas que têm chamado a atenção

ILSI

Bra

sil

Publicação do:International Life Sciences Institute ILSI BrasilRua Hungria, 664 Cj. 113 – 01455-904 – São Paulo-SPtel.: (11) 3035-5585 – e-mail: [email protected]

Conselho Editorial: Clarice Tonato, Felix G. Reyes e Mariela Weingarten Berezovsky

Editora Executiva: Mariela Weingarten Berezovsky

Redação: Edna Vairoletti

Produção: DPI Studio e EditoraTel./Fax: (11) 3207-1617 – [email protected]

Circulação externa – Tiragem de 4.500 exemplares

Direitos reservados ao ILSI Brasil

Diretoria/Conselho

PresidenteAldo Baccarin

DiretoriaAlexandre Novachi – Danone Ltda Ary Bucione – Danisco Brasil Ltda. Eugenio Ulian – Monsanto do Brasil Ltda. Felix G. Reyes – Fac. Eng. Alimentos/UNICAMP Dr. Flávio A. D. Zambrone - Planitox Dr. Franco Lajolo – Fac. Ciências Farmacêuticas/ USP Geórgia Castro – Kraft Foods Brasil Ltda.Dra. Ione Pellegatti Lemonica – UNESP Botucatu José Mauro Moraes – Coca-Cola Industrias Ltda. Dr. Mauro Fisberg – UNIFESP

Diretoria ExecutivaMariela Weingarten Berezovsky

Conselho Científico e de AdministraçãoAldo Baccarin Alexandre Novachi – Danone Ltda Ana Carolina Aguirre – Syngenta Proteção de Cultivos Ltda. Antonio M. Mantoan – Mead Johnson Nutritional Ary Bucione – Danisco Brasil Ltda. Dra. Bernadette D. G. Franco – Fac. Ciências Farmacêuticas/ USPCláudia Araujo Fernandes – Support Prod. Nutricionais Ltda.Dra. Elizabeth Nascimento – Fac. Ciências Farmacêuticas/ USP Eugenio Ulian – Monsanto do Brasil Ltda. Felix G. Reyes – Fac. Eng. Alimentos/UNICAMP Dr. Flávio A. D. Zambrone - Planitox Dr. Franco Lajolo – Fac. Ciências Farmacêuticas/ USP Geórgia Castro – Kraft Foods Brasil Ltda.Dr. Hélio Vannucchi – Fac. Medicina USP Rib. Preto Dra. Ione Pellegatti Lemonica – UNESP Botucatu João Alberto Bordignon – Nutrimental S/A Ind. e Com. de Alimentos João Alegro – Milenia Agro Ciências S/A Dr. João Lauro Viana de Camargo – UNESP BotucatuJosé Mauro Moraes – Coca-Cola Industrias Ltda. Kathia Schmider - Nestlé Brasil Ltda. Dra. Lígia Martini – Fac. Saúde Pública/USP Dra. Maria Cecília Toledo – Fac. Eng. Alimentos/UNICAMPDr. Mauro Fisberg – UNIFESP Dr. Paulo Cesar Stringheta – Univ. Federal de Viçosa Steven Rumsey – Bunge Alimentos

Expediente

ILSI no mundo e no BrasilA manutenção de um fórum permanente de atualização de conhecimentos técnico--científicos que contribuem para a saúde da população e são de interesse comum às empresas, governos, universidades e institutos de pesquisa. Este é o principal objetivo do International Life Sciences Institute (ILSI), associação sem fins lucra-tivos, com sede em Washington, D.C., nos Estados Unidos, e seções regionais na América do Norte, Argentina, Austrália, Brasil, Europa, Japão, México e Sudeste Asiático. É afiliado à Organização Mundial da Saúde (OMS), como entidade não-

-governamental e órgão consultivo da ONU para Alimentação e Agricultura (FAO).

No Brasil, o ILSI colabora para o melhor entendimento de assuntos ligados à nutrição, segurança ali-mentar, toxicologia e meio ambiente, reunindo cientistas do meio acadêmico, do governo e da indústria.

S de pesquisadores, da indústria e da sociedade.

Entre os novos membros ficamos felizes com o retorno da Sadia e esperamos contar com outros sócios sempre, contribuindo nos nossos planos de crescimento em 2011. Também queremos intensificar as parcerias com universidades, institutos de pesquisa e

órgãos governamentais. Dentro do próprio ILSI a ideia é aumentar a proximidade com outros branches e assim estimu-lar a criação de projetos em comum, como o Pro-jeto Latino Americano de Alinhamento dos Va-lores de Referência para

Rotulagem Nutricional.Enfim, mais uma vez fomos à

luta para concretizar nossos objetivos e agradecemos o apoio de todos. E já estamos organizando nosso II Congresso e Reunião Anual, em abril, em Águas de São Pedro, e que terá como tema Avaliação do Risco, uma preocupação mundial. Esperamos que, em 2011, o ILSI Brasil possa consolidar, mais uma vez, projetos que tenham a marca da inovação e pioneirismo. Este desafio é nosso maior estímulo a cada novo ano.

Mariela Weingarten BerezovskyDiretoria Executiva

INOVAÇÃO E PIONEIRISMO

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Abordagem Nutrigenômica Aplicada aos Estudos de Alimentos Funcionais

Renata Nascimento FreitasProfessora Associado da Escola de Nutrição da Universidade Federal de Ouro Preto

desenvolvimento de habilidades para obter do meio os nutrientes necessários para a manutenção da vida e garantia da reprodução é aceito como um dos fatores

determinantes da evolução das espécies. É plausível pensar que a dieta ou os alimentos influenciaram a evolução biológica tanto quanto a evolução social e tecnológica do homem. Indivíduos que conseguiam obter dos alimentos disponíveis a melhor performance física e capacidade de sobrevivência e reprodução, possivelmente foram selecionados durante a ocupação do planeta. É possível que assim os nutrientes presentes na dieta humana tenham influenciado a programação metabólica da espécie. Podemos citar como exemplo a melhor adaptação de indivíduos apresentando menor pigmentação da pele à medida que o Homo sapiens migrou da África para regiões menos ensolaradas do planeta, já que esta característica favorecia a síntese de vitamina D em condições de baixa exposição à luz solar.

Civilizações antigas já demonstravam conhecimento sobre as relações dos alimentos ou dieta não apenas como garantia da própria vida, mas também como capazes de melhorar a performance física e auxiliar na cura de doenças. Hipócrates (460-377 a.C.) e seu discípulo Galeno (129-201 a.C.), considerados os pais da medicina moderna, reconheciam o papel fundamental da seleção adequada de alimentos para garantir menor ocorrência de doenças.

Os estudos de Gregor J Mendel (1822-1884) contribuíram para que o conceito de “determinismo genético” como causa de doenças prevalecesse até as primeiras décadas do século passado. A partir da segunda metade do século XX, o conceito de individualidade bioquímica e a influência dos nutrientes sobre o metabolismo e, logo, sobre a ocorrência de doenças

passou a ser mais amplamente aceito. Em seu livro Biochemical Individuality: The Basis for the Genetotrophic Concept, Roger J Williams (1) reconhecia o microambiente nutricional celular como crucialmente importante para a saúde e que deficiências neste ambiente constituíam a principal causa de doenças. Williams cunhou o termo doenças genetotróficas que se referiam a doenças que ocorriam em função de necessidades nutricionais geneticamente determinadas que, por não serem supridas, levavam a uma expressão gênica precária. Em 1976, publicou um artigo instigante no qual já propunha que características como consumo voluntário de alimentos e consumo de açúcar podiam ser decorrentes da influência nutricional sobre a expressão de genes e não ocorriam apenas como consequência do mau funcionamento metabólico geneticamente determinado (2).

Ao final do século passado o conceito de genoma, anteriormente considerado uma entidade rígida e estática, formada pela coleção de genes de um organismo, evoluiu para um conceito mais amplo que considerava a intricada relação entre genes, proteínas e sinais intra e extracelulares que coletivamente afetavam a função da célula (3). O conceito de “susceptibilidade genética” passou a ser mais valorizado na patogênese de diversas doenças. De acordo com este conceito, a presença de genes aberrantes por si só não é suficiente para que as doenças ocorram. A interação entre genes e a exposição a fatores ambientais passou a ser considerada como determinante na ocorrência de importantes doenças que afetam a humanidade como os cânceres, diversas doenças inflamatórias e metabólicas e as doenças cardiovasculares.

Nas últimas décadas, em decorrência do aumento dos

conhecimentos do efeito dos nutrientes sobre a saúde humana

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Artigo

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Artigo

e do desenvolvimento de novas tecnologias, o foco das pesquisas nutricionais mudou drasticamente da prevenção de deficiências nutricionais para a promoção da saúde e prevenção de doenças crônicas não transmissíveis. Doenças como o câncer, doenças cardiovasculares e diabetes, têm se tornado globalmente importantes no contexto da saúde pública e fatores dietéticos têm sido consistentemente relacionados entre os fatores ambientais relevantes. Paralelamente, nas duas últimas décadas, as revelações da genômica funcional criaram as bases para a proposição de que constituintes dos alimentos (nutrientes ou não) seriam capazes de, através da modulação metabólica e da regulação da expressão gênica, causar, prevenir ou auxiliar na cura de doenças.

O termo nutrigenômica ou genômica nutricional tem sido usado para descrever estudos na interface da bioquímica, fisiologia, genômica e nutrição que buscam esclarecer as interações recíprocas que existem entre nutrientes e o genoma de um indivíduo em níveis moleculares e genômicos. O termo foi

usado pela primeira vez por DellaPenna(4) no final do século XX e as bases conceituais desta nova fronteira da ciência da nutrição foram desenvolvidas por diferentes autores nos primeiros anos deste século(5-9). Kaput & Rodriguez (7) propuseram em 2004 as seguintes premissas como base para os estudos em nutrigenômica e prevenção de doenças:

l Constituintes dietéticos agem no genoma humano de maneira direta ou indireta, alterando a expressão ou a estrutura gênica;

l Sob certas circunstâncias e em alguns indivíduos (dependendo do seu perfil genético), a dieta pode ser um importante fator de risco para alguns cânceres, doenças cardiovasculares e outras doenças relacionadas à nutrição;

l Alguns genes regulados pela dieta têm papel na patogênese ou progressão de doenças crônicas;

l Intervenções dietéticas baseadas no conhecimento das necessidades nutricionais, no estado nutricional e no

Figura 1- As ciências “ômicas” no entendimento das relações entre nutrição e saúde/doença.

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Artigo

genótipo, podem ser usadas para prevenir, diminuir ou tratar doenças crônicas.

Inegavelmente os genes podem influenciar a absorção, o metabolismo e transporte de um componente alimentar bioativo ou o seu sítio de ação e então influenciar a resposta geral a dieta (efeitos nutrigenéticos). De maneira similar, componentes alimentares bioativos podem alterar a estrutura e função (efeitos nutricionais epigenéticos) ou a expressão (efeitos nutricionais transcriptômicos) de genes e assim influenciar a ocorrência de doenças relacionadas à nutrição. Uma abordagem da biologia de sistemas que examine simultaneamente o perfil genético e polimorfismos associados com a resposta a dieta; alterações de cromatina e de padrões de metilação de DNA; modificações na expressão gênica (nutrigenômica); alterações na formação e/ou bioativação de proteinas (proteômica) e produtos do metabolismo (metabolômica), podem permitir que as pesquisas na área da nutrição, alimentos e prevenção de doenças avancem de uma abordagem observacional para uma abordagem molecular (Figura 1).

A genômica nutricional oferece assim oportunidades para credenciar compostos alimentares de maneira específica, determinando as modificações genéticas e epigenéticas que provocam mudanças no fenótipo que podem influenciar o risco de doenças, com o propósito de estabelecer quais interações são importantes e sob que circunstâncias (8). Este conhecimento pode levar à proposição de orientações nutricionais e prescrições dietéticas específicas, dirigidas tanto ao indivíduo quanto a populações, além de permitir o desenho de alimentos com propriedades funcionais mais eficazes tanto para a prevenção quanto para o tratamento de doenças.

As relações dos alimentos e nutrição são abordadas de uma maneira mais holística considerando não o indivíduo médio, mas a individualidade genética e metabólica que determina a resposta individual à exposição ambiental. Desta maneira, considera-se que indivíduos ou populações específicas, quando expostos a diferentes concentrações ou doses de constituintes alimentares apresentam diferentes respostas. Assim, os estudos nutrigenômicos objetivam analisar os efeitos da dieta na atividade gênica e na saúde dos indivíduos ou de populações que compartilham genótipos ou haplótipos específicos assim como avaliar os efeitos dos genes sobre os componentes dietéticos. Estes estudos compreendem necessariamente conhecimentos de várias disciplinas como Ciências de Alimentos e Nutricionais, Biologia Molecular, Genética e Genômica, Fisiologia, Bioquímica, além de Estatística e Bioinformática, constituindo-se em uma Ciência Multidisciplinar.

Em resumo, os estudos nutrigenômicos compõem a abordagem da biologia de sistemas nutricionais complementados por estudos proteômicos e metabolômicos. Nesta abordagem, não interessa apenas saber como componentes da dieta afetam, por exemplo, mecanismos epigenômicos, mas como estas alterações se refletem na expressão proteica e na produção de metabólitos e, em última análise, no fenótipo manifestado pelo indivíduo. Busca-se então esclarecer como os processos moleculares envolvidos na manutenção da saúde podem ser precocemente afetados ou influenciados por componentes da dieta antes que a doença se manifeste com objetivo de prevenir o surgimento das doenças, mitigar seus efeitos ou reduzir os processos relacionados ao envelhecimento.

Diversos modelos e tecnologias mais ou menos sofisticados estão disponíveis e são utilizados para os diferentes estudos. Os modelos variam de microorganismos unicelulares geralmente utilizados para esclarecimento de estrutura e função de genes isolados ou famílias de genes, até organismos multicelulares como D. melanogaster e C. elegans que apresentam vias metabólicas razoavelmente similares aos humanos, mas um sistema menos complexo, facilitando a realização de experimentos numa abordagem de sistemas. Organismos como os roedores e mesmo humanos, mais complexos, dificultam o estudo do sistema como um todo e ainda são mais usados na investigação de vias ou componentes isolados. As tecnologias utilizadas nos estudos de genômica funcional estão atualmente altamente automatizadas permitindo alta produção de dados nutrigenômicos que se relacionam e interagem, cuja análise só tem sido possível com o desenvolvimento de métodos estatísticos e recursos de bioinformática específicos, que permitem a interpretação da complexa diversidade.

Embora as bases conceituais da nutrigenômica, não sejam novas, estudos recentes têm permitido esclarecer alguns destes conceitos na perspectiva nutrigenômica. Por exemplo, vários estudos têm focado a ativação ou desativação de fatores de transcrição que regulam a transcrição gênica, que é o principal mecanismo através do qual componentes alimentares ou seus metabólitos podem alterar diretamente a expressão de genes. De fato, fatores de transcrição de naturezas bastantes diversas envolvidos na regulação de uma variedade de genes relacionados a metabolismo, crescimento, resposta ao estresse e resposta inflamatória, são ativados por macro e micronutrientes além de outros componentes alimentares (9). De maneira indireta, os componentes alimentares ou produtos do seu metabolismo podem agir sobre a atividade de receptores de membrana ou sobre componentes de vias de sinalização intracelular, interferindo

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também com a transcrição e resposta biológica. Componentes dietéticos podem ainda influenciar mecanismos epigenéticos envolvidos em alterações herdáveis no padrão de expressão gênica como a metilação de DNA e o modelamento de histonas. O ácido fólico, por exemplo, de uma maneira dependente de vitamina B6 e B12 compõe o principal doador de grupos metila para reações de metilação de macromoléculas. A metilação de DNA e de histonas constitui importante mecanismo epigenético de regulação da transcrição.

Assim, a necessidade da biologia de sistemas nutricionais de conectar diferentes níveis de dados biológicos e ambientais torna necessária a integração de dados em larga escala. Com este objetivo diferentes iniciativas têm levado ao desenvolvimento de sites e portais interativos (10-12) nos quais bancos de dados são alimentados com diferentes aspectos relacionados às diferentes vias metabólicas, possibilitando a integração de dados genômicos, proteômicos e metabolômicos e a construção de redes metabólicas que facilitam o entendimento das intricadas relações existentes. Paralelamente, os conhecimentos gerados a partir dos dados obtidos pelo Projeto Genoma Humano permitiram estabelecer que doenças complexas que se desenvolvem a partir da interação de diversos fatores, mais frequentemente ocorrem devido à presença de variações comuns presentes em diferentes genes, cada uma contribuindo para uma parcela do fenótipo observado e para a diversidade de manifestações fenotípicas e evolução destas doenças. Estas alterações na sequência ou na estrutura genética podem afetar a regulação da expressão ou a atividade de biomoléculas ocasionando uma variação na resposta individual aos fatores dietéticos e na resposta ao ambiente. Dada a importância de se estabelecer relações entre variantes genéticas e fenótipos relevantes, foi iniciado em junho de 2006 o Projeto Varioma Humano com enfoque nas variações associadas a doenças (13). O projeto inclui a descoberta de mutações e seus efeitos e a disponibilização instantânea dos dados para profissionais como auxílio na tomada de decisões clínicas e em pesquisas.

Embora as novas fronteiras das disciplinas “ômicas” aplicadas à pesquisa de alimentos funcionais estejam ainda em fase inicial de desbravamento, os resultados dos estudos realizados demonstram o grande potencial para a descoberta de novos biomarcadores do efeito dos compostos dietéticos sobre a saúde humana de uma maneira sistêmica apenas imaginada até o século passado. Estes estudos podem auxiliar a revelar indicadores precoces de predisposição a doenças; ajudar a definir a homeostase, o metabolismo e o fenótipo “saudáveis”; ajudar a diferenciar entre indivíduos “responsivos” dos “não responsivos” às intervenções dietéticas; e por último, mas não menos importante, descobrir

novos compostos dietéticos bioativos ou funcionais. Uma questão fundamental na utilização das tecnologias “ômicas” para elucidar o papel de compostos dietéticos funcionais nas pesquisas sobre prevenção e tratamento de doenças ainda é determinar quais marcadores biológicos ou fenótipos são preditivos da resposta ao composto funcional no tecido alvo.

Assim, à medida que a era da nutrição molecular se desenvolver, os conhecimentos adquiridos, utilizados com responsabilidade e bioética, serão críticos para o desenvolvimento de abordagens efetivas na redução da morbidade e mortalidade e melhoria da qualidade de vida da população.

Referências

1. Williams RJ. Biochemical Individuality: The Basis for the

Genetotrophic Concept, 1 ed. New York: Wiley & Sons, 1956.

2. Davis DR, Williams RJ. (1976) Potentially useful criteria for

judging nutritional adequacy. American Journal of Clinical

Nutrition, 29:710-715.

3. Bishop JE, Waldholz M. Genome: The Story of the Most

Astonishing Scientific Adventure of Our Time - the Attempt to

Map All the Genes in the Human Body. New York: Simon &

Schuster, 1990.

4. DellaPenna D. (1999) Nutritional genomics: manipulating

plant micronutrients to improve human health, Science, 285:

375-379.

5. Davis CD. (2004) Frontiers in nutrigenomics, proteomics,

metabolomics and cancer prevention, Mutation Research, 551:

51-64.

6. Kaput J. (2004) Nutritional genomics: the next frontier in the

postgenomic era, Physiology Genomics, 16: 166-177.

7. Maillet JO. (2002) Dietetics in 2017: What does the Future

Hold? Journal of the American Dietetic Association, 102: 1404-

1406.

8. Milner JA. (2001) Molecular targets for nutrients involved with

cancer prevention, Nutrition Cancer, 41:1-16.

9. Muller M. (2003) Nutrigenomics: goals and strategies, Nature

Review Genetics, 4:315-322.

10. http://wiki.nugo.org/index.php

11. http://www.eurreca.org

12. http://www.wikipathways.org

13. www.humanvariomeproject.org

Artigo

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IV Simpósio Internacional ILSI Brasil sobre Alimentos Funcio-nais, realizado em outubro, em

São Paulo, marcou um momento especial no calendário do ILSI Brasil. Vários fatores contribuíram para o sucesso do evento, que teve 180 inscritos. O alto nível dos palestrantes trouxe para discussão temas atuais e com um amplo conteúdo científico atualizado e faltou tempo para mais perguntas, devido o grande interesse da plateia em explorar ainda mais as questões apresentadas. Outro diferencial foi o pioneirismo. Pela primeira vez, num evento do ILSI ocorreu a transmissão simultânea, via inter-net, o que abriu espaço para uma participação on-line e em tempo real.

Durante dois dias, os conferencistas es-trangeiros e brasileiros mostraram estudos e projetos focados nas últimas tendências e

té que ponto os hábitos alimentares dos Brasileiros estão mudando? Res-ponder esta questão foi um dos prin-

cipais desafios no Seminário “Sustentabilidade, Alimentação e Saúde”, que aconteceu em São Paulo, nos dias 25 e 26 de novembro, resultado da parceria inédita entre o ILSI Brasil e a ESPM.

O debate sobre as atuais tendências da ali-mentação saudável e seus impactos na vida do brasileiro analisou os novos hábitos e consumo, quando cada vez mais as pessoas comem na rua. Segundo o consultor Enzo Donna, em 2009, 31% das despesas de alimentação foi fora de casa, quando a projeção era que se atin-gisse entre 28 e 30%, somente em 2011. Esta demanda tem impulsionado o setor de Food Service, que já registra um faturamento de R$ 500 milhões/dia.

As mudanças de hábitos também aconte-cem nas escolas, onde as crianças passam boa parte do tempo e têm sua dieta dividida entre

Eventos

Funcionais: discussão atual

Alimentação: novos hábitos

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pesquisas numa programação de temas trans-versais e atuais, sinalizando os avanços recentes em biomarcadores, nutrigenética, probióticos, prebióticos, ácidos graxos, polifenóis, envelhe-cimento cutâneo, questões regulatórias, entre outros assuntos, traçando um panorama de informações apresentadas por especialistas da Holanda, Alemanha, Japão, Suíça, Estados Uni-dos, Espanha, Uruguai e Brasil. Este intercâm-

a merenda escolar, as cantinas ou lanchinho que leva de casa. Dr. Mauro Fisberg, pediatra e nutrólogo da UNIFESP, observou que as crianças vão para escola cada vez mais cedo, mas a mãe não está isenta da sua respon-sabilidade de acompanhar a alimentação do filho, em suas várias fases de crescimento, evitando riscos de deficiências nutricionais, que podem causar sérios problemas para sua saúde. Alertou, ainda, para o problema do sobrepeso e obe-sidade infantil que já se detecta entre alunos da pré-escola.

A influência da comunica-ção – por meio da embalagem ou publicidade- na hora da decisão de compra foi avaliada, entre outros aspectos, sob o ponto de vista da exigência legal da grande quantidade de infor-mação na rotulagem, que pode

bio, de ideias e propostas, mostrou a relevância do assunto em todo o mundo, com ênfase na busca por uma alimentação mais saudável e, ao mesmo tempo, os cuidados da área regulatória para liberar alimentos com alegações funcionais e/ou de saúde, exigindo das áreas de pesquisa e indústria maior atenção e investimentos. As palestras podem ser acessadas no site www.ilsi.org/brasil. l

confundir o consumidor, e qual a melhor forma de veicular as campanhas sobre alimentos, em particular quando a mensagem é dirigida para o público infantil. No encerramento, ficou acordada uma reunião de representantes das diversas áreas para traçar um projeto em con-junto e uma agenda para nortear as próximas ações. As palestras podem ser acessadas no site www.ilsi.org/brasil. l

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Entrevista

ILSI BrasilN O T Í C I A S8

II Congresso do ILSI Brasil traz para discussão a Aval-iação do Risco. Neste bate-

papo Dr. Flavio Zambrone, médico e professor de Saúde Pública e Toxicolo-gia, conta um pouco porque o assunto tem chamado tanta a atenção nos últi-mos anos.

Por que a Avaliação do Risco tem estado em evidência nos debates internacionais? A Avaliação do Risco foi desenvolvida

nos últimos 30 anos, como ferramen-ta de gestão e quantificação dos ris-cos inerentes às atividades humanas. Não existe atividade humana sem risco! O objetivo é calcular a proba-bilidade de um evento acontecer e estabelecer critérios de aceitabilidade, além de apontar os caminhos para seu gerenciamento. Apesar de não ser um procedimento novo, só mais recentemente tem sido usado como ferramenta de regulamentação, para estabelecer se o risco de uma ativi-dade ou produto é aceitável ou não. Reforçando, toda atividade humana é de risco. O crescimento social implica em aceitar riscos. Sociedades que não aceitam o risco se atrofiam.

Qual o maior desafio hoje na discussão do tema? É fazer com que os envolvidos con-

heçam as ferramentas para realização da Avaliação do Risco. Nem sempre o risco percebido é o risco calculado. Este fato leva a incompreensões e dis-cussões, quase sempre desprovidas de embasamento científico.

Como o ILSI tem tratado este assunto no mundo? Há algum projeto especial? O ILSI tem uma preocupação espe-

cial com esta questão. O Instituto identifi cou quatro temas prioritários

“Não existe atividade humana sem risco!”

O para os próximos anos, a partir de necessidades apontadas globalmente, e a Avaliação do Risco é um deles. O HESI (Health and Environmental Sciences Institute) elaborou um pro-jeto especial com este foco, denominado RISK21, que vem se desenvolvendo. O ILSI Internacional tem um interessante documento a re-speito em sua página. http://www.ilsi.org/Documents/RA%20FINAL%20(2).pdf

O tema é complexo e amplo, pois envolve aspectos de Nutrição, Biotecnologia, Segurança Ali-mentar. Qual destas áreas merece maior at-enção no momento e por quê? Em minha opinião todas merecem a

mesma atenção, pois guardam uma íntima relação entre si. Certamente a Avaliação do Risco deve contemplar os aspectos científicos ligados diretamente ao uso de produtos e subs tâncias, en-tretanto, não deve colocar de lado os seus “benefícios”. Não há razão para se avaliar o risco de substâncias ou produ-tos que não apresentem vantagens e benefícios, sejam eles tecnológicos, nu-tricionais, sociais, dentre outros.

Como o risco pode implicar num potencial impacto sobre os consumidores diante da ampla diversidade de alimentos industri-alizados? Não há diferença do risco para o con-

sumidor, entre alimentos industria-lizados e os denominados naturais. O risco para o consumidor de um alimento natural contaminado com um fungo, por exemplo, pode ser significativamente maior do que o de um alimento industrializado. Todos

os alimentos, naturais ou industria-lizados, podem ser seguros ou não. O que deve ser avaliado é o risco de cada um, com base em critérios científicos e não em percepções indi-viduais.

6. Como podemos distinguir o perigo ver-sus a exposição ao risco? O perigo é uma característica ou pro-

priedade de um alimento ou substân-cia. Não há risco se não houver ex-posição a este perigo. Ou seja, o risco é uma função dependente de duas variáveis, perigo e exposição. Não é correto, portanto, neste caso, dizer “exposição ao risco”.

7. Qual a perspectiva em relação ao tema ser foco do II Congresso do ILSI Brasil? Este é uma discussão atual e necessária

e que certamente despertará o inter-esse de diversos segmentos da socie-dade, em especial, regulamentadores, academia e indústria. Não podemos deixar de lado os consumidores. Estes sim são os grandes interessados em se-

gurança. l

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