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Cristina Silva - ISPA Encontro TEKA 2008 A LEITURA “O acto de ler seria o produto de processos primários (correspondências entre grafemas e fonemas, descodificação parcial de uma palavra, reconhecimento imediato de sílabas ou de palavras) e de processos superiores (inteligência da língua, predições sintáctico- semânticas, recurso ao contexto precedente)” (Chauveau e Rogovas-Chauveau, 1990).

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A LEITURA

“O acto de ler seria o produto de processos primários (correspondências entre grafemas e fonemas, descodificação parcial de uma palavra, reconhecimento imediato de sílabas ou de palavras) e de processos superiores (inteligência da língua, predições sintáctico-semânticas, recurso ao contexto precedente)”(Chauveau e Rogovas-Chauveau, 1990).

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A APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA ENQUANTO UMA AQUISIÇÃO DE NATUREZA CULTURAL, DE NATUREZA

COGNITIVA/ LINGUÍSTICA E DE NATUREZA ESTRATÉGICA

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De natureza cultural, na medida em que ascrianças, para aprenderem a ler e a escrever, têmque se apropriar dos usos sociais da linguagemescrita;

De natureza cognitiva/linguística, na medidaem que as crianças, para aprenderem a ler e aescrever, têm que entender as particularidadesalfabéticas do nosso sistema de escrita;

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De natureza estratégica, na medida em que ascrianças, para aprenderem a ler e a escrever, têmque mobilizar e coordenar diversas estratégiascognitivas que variam em função dos objectivosdo leitor/escritor e do tipo de texto que se lê ouque se escreve.

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AS ETAPAS NA APRENDIZAGEM LEITURA

1) A leitura resulta da interpretação da imagem que acompanha o texto.

Esta estratégia traduz o facto de a criança se centrar na imagem para chegar ao significado do escrito sem ter minimamente em conta as propriedades objectivas da mensagem escrita. Ela inventa uma etiqueta verbal (uma frase ou nome), a partir exclusivamente da ilustração. O texto é tratado como se este reenviasse linearmente para conteúdos referenciais e não para a linguagem.

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Por exemplo, na apresentação de uma frase “Os dois patos nadam no lago” enquadrada por uma imagem correspondente, a criança poderia indicar que lá estaria escrito “patos” ou “os patos estão a nadar” indicando com um gesto vago o texto onde essa mensagem estaria escrita Pode considerar mesmo em diferentes momentos que o mesmo texto poderá ter duas interpretações.

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2) O início da interpretação do texto

Neste caso as estratégias utilizadas começam ater em conta as características do texto ou seja atendema dimensões gráficas como o tamanho do enunciado, onúmero de segmentos presentes. Consequentemente ascrianças procuram tentar perceber o que a escrita diz,sem que isso signifique que procedam a uma análiselinguística que contemple os aspectos qualitativos dalinguagem escrita.

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São vários os tipos de comportamentos de pré-leitura que podem ser enquadrados por este tipo e estratégias, os quais podem ser ilustrados retomando-se de novo a frase “os dois patos nadam no lago”. Assim, a criança pode atribuir a cada uma das palavra do texto a designação “pato”, pode indicar várias palavras para cada palavra do texto, pode proceder a uma interpretação silábica de cada palavra (por ex. dois patos designaria a palavra pato, onde dois representaria pa e patos seria nomeado por tos), ou pode ainda designar cada palavra por uma outra palavra mas sem qualquer correspondência objectiva (por ex. para a frase “os patos nadam no lago” a criança pode “lê-la”, como “os bichos andam na água “, atribuindo a cada palavra oralizada uma correspondente escrita.

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3) Enfoque em estratégias que remetem para o contexto ou em estratégias que remetem paraa identificação de palavras

A este nível as estratégias utilizadas no procedimento de leitura traduzem já um tratamento linguístico do texto, identificando segmentos que correspondem a unidades lexicais (palavras), e dentro destas a segmentos de som (sílabas e fonemas). A criança é já capaz de reconhecer algumas palavras por índices visuais, e estabelece algumas correspondências de grafo-fonéticas. Mas éfrequente que a criança dissocie as estratégias mais centradas na identificação de palavras e das estratégias mais centradas na procura de sentido.

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As estratégias destacadas para a identificação de palavras podem ser enquadradas em diferentes fases evolutivas.

a) Procedimentos de identificação logográficos, os quais reflectem a utilização de índices visuais. Nesta estratégia a palavra poderá ser nomeada em função da primeira letra, em função da forma global da palavra, em função de traços salientes, em função da dimensão da palavra. O que tem de comum estas diferentes estratégias éo facto de não implicarem ainda qualquer tipo de processo de descodificação.

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Ilustremos a utilização destas várias estratégias para o caso da frase “O menino chama-se Mário”, atendendo especificamente àidentificação da palavra “Mário” Nas suas tentativas para apreender essa palavra a criança poderá por exemplo dizer que:

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a) Está escrito mala porque começa por m (identificação com base na letra inicial);

b) Está escrito Manuel, porque é uma palavra pequena e tem que ser um nome de um menino já que começa por letra maiúscula. (identificação com base na letra inicial e no tamanho);

c) Está escrito Mário, porque é uma palavra que é dum menino da minha sala, já vi esta palavra, tem aquele tracinho em cima (identificação em função de traços salientes e da imagem que tem da palavra);

d) Procedimentos que recorrem a índices fonéticos parciais: nestas estratégias de reconhecimento de palavras, a identificação da letra inicial funciona como base da identificação da palavra;

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b) Procedimentos que recorrem a índices fonéticos parciais: nestas estratégias de reconhecimento de palavras, a identificação da letra inicial funciona como base da identificação da palavra.

Exemplos de estratégias com base em índices fonéticos parciais

Cartão em que está escrito “Elias”Vanessa

“O que achas que está escrito neste cartão?”“Elias”.“Como é que sabes que está escrito “Elias?”“Porque eu conheço esta (aponta para E) e é do nome do

Elias”.

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Cartão em que está escrito “Tomás”

João“O que achas que está escrito neste cartão?”“Tiago”.

. “Como é que sabes que está escrito “Tiago?”“Porque tem o “T”. É o cartão do Tiago”.

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Cartão em que está escrito “Sónia”

SusanaP. “O que achas que está escrito neste cartão?”Susana “Sónia”.P. “Como é que sabes que está escrito “Sónia?”Susana “Porque é o cartão da Sónia. Começa por “S” como o meu, e tem ali aquele tracinho (acento)”. (Alves Martins & Niza, 1998)

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c) Procedimentos alfabéticos que apelam às correspondências grafo-fonéticas. Estas estratégias permitem às crianças começar a lidar com palavras desconhecidas, mesmo que a leitura das palavras não seja ainda muitas vezes conseguida.

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Exemplos de estratégias alfabéticas

AnaA Ana (para ler a palavra “joga”)“ja go, jo ga, joga”.

André“O André (para ler a palavra “Chico”)“Ch-i-co, ch-i-co, é o chi, Ch-i-co”.

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Cartão em que está escrito “A minha avó tem um cão”.

Malaquias

“Lê lá este texto”.

O Malaquias, para ler a palavra “minha” “mi; mi-na; mi-na; mi...”.

(Alves Martins & Niza, 1998)

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Quando as crianças abordam o texto procurando mobilizar sobretudo estratégias para a identificação de palavras, frequentemente perdem-se do sentido da frase, não mobilizando conhecimentos e hipóteses, relacionadas com a imagem ou outros indicadores de contexto.

Por outro lado, esta sobreposição de procedimentos pode verificar-se igualmente em relação à utilização de estratégias mais centradas no contexto, por exemplo face a uma frase enquadrada por uma imagem a criança recupera uma ou outra palavra por índices visuais, ou uma ou letra ou sílaba, e depois inventa um enunciado oral sem ter em conta as palavras ou os segmentos que acabou de identificar.

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Retomando a frase “O menino chama-se Mário” enquadrada por uma imagem em que a personagem aparece a brincar, poderá verificar-se um comportamento ”leitor” deste tipo: a criança identifica “O”, soletra me-ni de “menino” e depois inventa “O rapaz está a brincar” Portanto a criança sobrepõe as estratégias centradas na elaboração de hipótese decorrentes do contexto , aos procedimentos de descodificação.

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4) O início da verdadeira leitura

As estratégias subjacentes a este nível traduzem a crescente capacidade da criança em integrar e coordenar as operações de diferentes níveis que estão associadas ao acto de ler: o reconhecimento de palavras, descodificação de palavras irregulares ou não familiares, predições semânticas, etc. A criança revela-se igualmente capaz de integrar num todo significativo as várias unidades linguísticas a tratar (sílabas e letras; palavras e frases). Do ponto de vista do reconhecimento das palavras, este processo é já efectuado com base em estratégias ortográficas, as quais traduzem a utilização de regras implícitas e um sistema de analogias que permitem o conhecimento automatizado das correspondências entre letras e sons.

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Exemplos de estratégias ortográficas

Cartão em que está escrito “casaco”

Vera“O que achas que está escrito neste cartão?Vera “Casaco”.“Como é que sabes que está escrito casaco?”Vera “Porque eu sei ler. O “s” no meio de duas vogais lê-se “Z”.

Cartão em que está escrito “sapatos”

Nuno“O que achas que está escrito neste cartão?”Nuno “Sapatos”.“Como é que sabes que está escrito sapatos?”Nuno “Porque eu sei que o “s” quando está no princípio se lê “ss” e quando está no fim se lê “ch”.

Alves Martins & Niza, 1998, p. 135).

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5) A leitura verdadeira.

Este nível é caracterizado pelos procedimentos de leitor fluente, onde a criança lê sem hesitação e compreende o sentido, tendo automatizado as operações subjacentes ao acto de ler.

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LER NA IDADE PRÉ-ESCOLARComportamentos de leitura típicos da idade pré-escolar:

“Está a comer cenoura”-faz correspondência global

“Co – e –lhi –nho”. (correspondendo às 4 primeiras letras). “O resto não sei”.

Aqui é ‘Ó’ e aqui deve ser coelho porque tem um C. O resto não sei

Imagem: Um coelho a comer uma cenoura.

Texto:O Coelho é

guloso

“O macaco está a levantar a mão” - faz correspondência global

“Ma – ca –co” (correspondendo às 3 primeiras letras). “O resto não sei”.

“Ba…Banana”, porque aqui está um macaco e uma banana e macaco não começa por B. Banana começa por um B e acaba com um A.

Imagem: Um macaco com uma banana.

Texto:Banana

VanessaLuisaFilipa

(Mata, 2008)

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CONCEPÇÕES DO ACTO DE LER EM CRIANÇAS DE IDADE PRÉ-ESCOLARExemplos de algumas concepções parcelares do acto de ler:Indiferenciação entre a interpretação baseada na imagem e nos indicadores contextuais e a análise linguística subjacente ao acto de ler.Associação do acto de ler a apenas uma das dimensões da leitura, nomeadamente ler de cor, repetir o que diz na frase, encontrar as palavras para ler, juntar as letras para encontrar os sons ou inventar uma história.

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Concepções que atendem à natureza multifacetada do processo de leitura

“Para ler é preciso utilizar as palavras, olhar o desenho, utilizar as letras, tudo para saber a história”

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AS HISTÓRIAS INFANTIS E A CONSTRUÇÃO DE UM PROJECTO PESSOAL DE LEITOR

“As crianças que não ouvem ler histórias, têm menos razões para quererem aprender a ler. Aquelas a quem lêem histórias tornar-se-ão leitores e inevitavelmente tornar-se-ão pais que lêem aos seus filhos” (Cullinan ,1986).

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O PROJECTO PESSOAL DE LEITOR

O projecto pessoal de leitor caracteriza-se pelo modo como as crianças dão sentido à aprendizagem da leitura e da escrita, cujos indicadores decorrem do facto das crianças conseguirem atribuir várias razões funcionais para essa aprendizagem.

As crianças que explicitam um projecto pessoal de leitor (PPL), atribuindo diferentes razões funcionais para saber ler, poderão ter facilitado o processo de aprendizagem, pois na sua grande maioria, não apresentam problemas no processo de aprendizagem.

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DIFERENÇAS NOS AMBIENTES DE LITERACIA FAMILIAR

Entrevista com a Joana

“Então tu conheces pessoas que saibam escrever e ler?”Joana: “Conheço a minha mãe, o meu pai, os meus irmãos, a minha prima, os meus vizinhos”.“E o que é que eles lêem?”Joana: “A minha mãe lê livros antes de dormir. O meu pai lê o jornal e lê coisas do trabalho. Os meus irmãos lêem os livros daescola e fazem os trabalhos de casa. A minha prima escreve histórias e a minha vizinha escreve listas de compras e escreve cartas ao filho”.

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Entrevista com o Elias

“Então tu conheces pessoas que saibam escrever e ler?”Elias “Não”.“Não conheces ninguém que saiba escrever?”Elias “Não sei, nunca vi”.“Então e o teu pai?”Elias “Sabe mas eu nunca vi. Não sei o que é que escreve”.

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Entrevista com o António

“Então tu conheces pessoas que saibam escrever e ler?”António: “Não”.“Então lá na tua casa nunca viste ninguém a ler?”António: “Não”.“E na escola, a tua professora?”António: “Nunca vi”.“Nunca viste a tua professora a ler?”António: “Não a minha professora sabe ensinar a ler. Não sei se ela sabe ler”.

(Alves Martins & Niza, 1998, pp. 49-50)

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LER LIVROS INFANTISO que dizem as crianças:• OS LIVROS SERVEM:• .... aprender a ler (Rafael e Maria)• .... fazer sonhar (Rafael)• .... fazer pensar e ter ideias ( Micael)• .....aprender coisas sobre experiências, sobre animais, e sobreo corpo humano (Priscila)• ....aprender coisas importantes (Jessica)• .....divertir (Ricardo)• ....ler, contar e ouvir (Tiago)• ....ficarmos mais contentes (Carlos)• ... as pessoas que lêem muitos livros ficam mais espertas (Carlos) • Meninos de 5 anos da creche da Abóboda

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OUVIR LER HISTÓRIAS“ O que é tão importante em ouvir histórias éque, através desta experiência, a criança começa a descobrir o potencial simbólico da linguagem: o seu poder para criar mundos possíveis ou imaginários através das palavras – pela representação da experiência, por símbolos que são independentes dos objectos, acontecimentos e relações simbolizadas e que podem ser interpretadas noutros contextos.” (Wells, 1991)

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REGRAS DE LEITURA APREENDIDAS PELAS CRIANÇAS COM SITUAÇÕES DE LEITURA PARTILHADA:• Os livros são para ler não para manipular• livro é o foco da atenção ( o livro vai controlando o pensamento do leitor; o seu texto vai direccionar as conversas entre o adulto e a criança)• As figuras não são coisas mas a sua representação (aprendizagem de que o símbolo não é o objecto real)• As figuras são para nomear• As figuras representam acontecimentos (induz a conversação sobre sequências narrativas – evolução do “ Onde?”; “O que é?” para “Como?”, “ E depois?” “ Porquê?”)• Os acontecimentos do livro acontecem fora do tempo real • Os livros constituem um mundo de ficção autónomo, onde as personagens tem sentimentos, intenções necessidades, obrigações.

(Snow & Ninio, 1989)

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O QUE NOS DIZEM AS INVESTIGAÇÕES:

• Quanto mais frequente é a leitura de histórias por parte dos pais maior é o número de funções atribuídos pelas crianças à linguagem escrita (Mata, 2004). • Ouvir histórias está associado aos conhecimentos em literacia e àcompreensão em leitura (Wells, 1988).• A frequência de leitura de histórias, em ambiente familiar, está relacionada com o nível de vocabulário de crianças de 4 anos.. (Sénéchal, Thomas & Monker, 1995).• As crianças que no jardim de infância têm alguma familiaridade com livrosde histórias infantis são aquelas que têm melhores resultados no final do primeiro ano de escolaridade. (Bus, 2001).• O contacto frequente com livros de histórias aumenta a motivação para a leitura, o vocabulário e a memória a curto prazo (Wood, 2002). • O contacto frequente com livros de histórias conduz ao conhecimento do nome de letras e conceitos relacionados com a linguagem escrita. (Baker, 1999).

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AS INTERACÇÕES DURANTE A LEITURA DE HISTÓRIAS

O papel do adulto

(1) apoia a construção de sentido por parte da crianças;

(2) enriquece a interacção da criança com a literatura

(McGee,1998).

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• Intervenções de mães de crianças de 3 anos, em momentos de leitura de histórias:• Foram identificados dois grandes tipos de intervenções, as ‘não imediatas’ (e.g. questões, comentários, inferências, predições, etc) e as ‘imediatas (limitadas à informação do texto e imagem) • A quantidade de intervenções ‘não imediatas’ durante a leitura de histórias, estava fortemente associada aos resultados das crianças, dois anos mais tarde, em compreensão, vocabulário receptivo e literacia emergente

(Temple & Snow, 2001).

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ETAPAS NA ABORDAGEM INFANTIL AOS LIVROS

3 anos• A leitura é vista, sobretudo, como fazendo parte de uma rotina interpessoal baseada na leitura de livros infantis pelos adultos. • Desenvolve-se a noção de que a leitura implica a interacção entre um leitor e um livro, e as crianças vão sendo capazes de apontar alguns indicadores observáveis do acto de ler.• È frequente que as crianças peçam a repetição da leitura das suas histórias favoritas, o que permite antecipar palavras, antecipar a estrutura de sequências narradas e, por vezes, identificar palavras e mesmo frases.

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3/4 anos• As crianças desenvolvem a noção de que os leitores apreendem uma mensagem com significado e sequência. • Também já conseguem discriminar as características figurativas do código escrito.

4/5 anos• Surge a ideia de que a cada livro, ou suporte de escrita, estáassociado a uma mensagem específica e única.. A esta noção está ligada o conhecimento de que diferentes formas gráficas correspondem a diferentes palavras e significados.• Também nestas idades as crianças percebem que o reconhecimento das palavras é necessário para se chegar ao sentido da mensagem escrita.

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No final do período pré-escolar

Algumas crianças, mas poucas, reconhecem que a leitura requer uma diversidade de estratégias. Estas crianças são capazes de aplicar indicadores grafo-fonéticos, sintácticos e semânticos, assim como, pistas extraídas das imagens nas suas tentativas de abordagem aos textos escritos.

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A LEITURA DE HISTÓRIAS PROMOVE:

• A consciência da funcionalidade da leitura• A apreensão da estrutura das histórias• Atitudes positivas face à leitura• Ganhos significativos de vocabulário• Apreensão de formas de ler e de umconjunto de convenção associadas ao processo de codificação escrita.

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“As crianças continuarão a ser umas boas leitoras se os adultos que as cercam alimentarem o seu entusiasmo em vez de tentarem provar a sua competência, se estimularem o seu desejo de aprender em lugar de lhes imporem a obrigação de recitar, se as acompanharem no seu esforço sem esperarem contrapartidas, se fizerem vibrar o presente sem acenar com a ameaça do futuro, se se recusarem a transformar em trabalho forçado o que era antes um prazer, se mantiverem esse prazer até se transformar numa rotina, se edificarem essa rotina sobre a gratuitidade da aprendizagem cultural e se as crianças descobrirem elas próprias o prazer dessa gratuitidade”.

Daniel Pennac

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