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1 COMPOSTAGEM DE RESÍDUOS : FUNDAMENTOS CIENTÍFICOS, TECNOLOGIAS, IMPACTOS, AVALIAÇÃO DE CICLO DE VIDA E APLICAÇÕES F.J. Antunes Pereira Professor Catedrático, Universidade de Aveiro Índice 1.INTRODUÇÃO 2.FUNDAMENTOS 2.1-Descrição fenomenológica 2.2-Factores ambientais *Razão C/N *Arejamento *Humidade *Granulometria *Inoculação (“seeding”) *Agitação 3.EQUIPAMENTOS; TECNOLOGIAS 3.1-Pilha estática com arejamento natural (“windrow”) [com ou sem revolvimento] 3.2-Pilha estática com arejamento forçado 3.3-Reactores fechados *Verticais (silo) *Horizontais (caixa) *Tambor rotativo (túnel) 4.IMPACTOS 4.1-Qualidade do composto (Contaminações) 4.2-Odores 5.AVALIAÇÃO DE CICLO DE VIDA 6.APLICAÇÕES BIBLIOGRAFIA 1-INTRODUÇÃO Não há uma definição universalmente aceite para compostagem. Contudo, para efeitos práticos pode-se considerar a compostagem como uma operação em que decorre a decomposição biológica e a estabilização de substratos orgânicos, em condições que favorecem a geração de temperaturas termófilas como resultado de produção térmica biológica. Deste processo resulta um produto final que é estável, isento de agentes

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COMPOSTAGEM DE RESÍDUOS : FUNDAMENTOS CIENTÍFICOS,

TECNOLOGIAS, IMPACTOS, AVALIAÇÃO DE CICLO DE VIDA E

APLICAÇÕES

F.J. Antunes Pereira

Professor Catedrático, Universidade de Aveiro

Índice

1.INTRODUÇÃO

2.FUNDAMENTOS

2.1-Descrição fenomenológica

2.2-Factores ambientais

*Razão C/N

*Arejamento

*Humidade

*Granulometria

*Inoculação (“seeding”)

*Agitação

3.EQUIPAMENTOS; TECNOLOGIAS

3.1-Pilha estática com arejamento natural

(“windrow”) [com ou sem revolvimento]

3.2-Pilha estática com arejamento forçado

3.3-Reactores fechados

*Verticais (silo)

*Horizontais (caixa)

*Tambor rotativo (túnel)

4.IMPACTOS

4.1-Qualidade do composto (Contaminações)

4.2-Odores

5.AVALIAÇÃO DE CICLO DE VIDA

6.APLICAÇÕES

BIBLIOGRAFIA

1-INTRODUÇÃO

Não há uma definição universalmente aceite para compostagem. Contudo, para efeitos

práticos pode-se considerar a compostagem como uma operação em que decorre a

decomposição biológica e a estabilização de substratos orgânicos, em condições que

favorecem a geração de temperaturas termófilas como resultado de produção térmica

biológica. Deste processo resulta um produto final que é estável, isento de agentes

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patogénicos e de sementes de plantas, o qual tem efeitos benéficos quando aplicado

no solo.

O produto final assim obtido é designado por composto. Também para este não existe

uma definição universalmente aceite. Em termos práticos, contudo, considerar-se-á o

composto como um condicionante orgânico de solos que foi estabilizado na forma

húmica. O composto não atrai insectos e outros vectores de doenças infecciosas, e

pode ser armazenado e manipulado sem inconvenientes, sendo benéfico ao

crescimento de espécies vegetais importantes.

A compostagem é assim uma forma de estabilização de resíduos sólidos orgânicos,

que exige condições processuais muito específicas e controladas de humidade,

temperatura e arejamento. É essencial atingirem-se temperaturas termófilas (acima de

45 ºC) para garantir a completa pasteurização, a inactivação de agentes patogénicos e

a destruição de sementes daninhas.

A compostagem é um processo que ocorre permanentemente na Natureza e sem a

intervenção humana. A intervenção humana pretende emular o processo natural,

realizando-o duma forma controlada com o objectivo de obedecer a requisitos

tecnológicos e económicos. Neste contexto as condições processuais que mais

influenciam o sucesso da operação são: humidade, temperatura, pH, razão ponderal

Carbono/Azoto (C/N), e taxa de arejamento. Parte-se naturalmente do princípio que

estão garantidas à partida as condições básicas de existência de macro e

micronutrientes no meio de fermentação. Em rigor deve ter-se em atenção que estas

condições processuais não são independentes umas das outras; por exemplo a taxa de

arejamento influencia a temperatura, esta pode afectar a humidade, e assim

sucessivamente; na prática procura-se um compromisso entre estes vários factores.

A estabilização biológica da matéria orgânica (oxidação por acção de

microorganismos) na forma duma substância tipo húmus é levada a cabo através da

criação e da manutenção dum ambiente adequado. Este pode ser ao ar livre

(compostagem em pilha estática, ou "windrow") ou em espaço confinado

(compostagem mecanizada, ou acelerada).

O processo não controlado ocorreu sempre na Natureza, e é através dele que esta

recicla os resíduos agrícolas, e pode durar até um ano; com arejamento forçado, este

tempo pode ser reduzido a uma semana ou menos.

A compostagem como processo aeróbio tem vantagens sobre a digestão anaeróbia

devido a quatro importantes razões:

O processo aeróbio não acarreta tão mau cheiro como o anaeróbio.

A elevada temperatura geralmente atingida nas pilhas aeróbias é eficiente na

eliminação da maioria das plantas e animais patogénicos e parasitas.

A compostagem é um processo relativamente rápido.

Como o processo de compostagem cada vez é mais aplicado em operações de larga

escala, o espaço disponível torna-se um factor limitante, favorecendo assim o

processo aeróbio em detrimento do anaeróbio.

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Embora uma instalação comercial de compostagem faça geralmente o tratamento de

RSU (Resíduos Sólidos Urbanos), no entanto ela apenas processa de facto a fracção

orgânica putrescível desses mesmos resíduos. Todos os outros componentes (não

orgânicos) têm de ser previamente segregados em instalações próprias de separação,

usando equipamento eletromecânico algo complexo, e posteriormente reciclados,

incinerados ou aterrados. Este pré-tratamento mecânico pode ser feito em instalações

separadas, ou, como é mais frequente, dentro da própria instalação de compostagem.

Esta característica aplica-se, na realidade, e como é evidente, a qualquer instalação de

tratamento biológico, incluindo portanto a de digestão anaeróbia. O tamanho e

complexidade duma instalação de tratamento biológico dependem portanto da

natureza dos resíduos a tratar, ou, em última análise, da sua proveniência. Neste

aspecto interessa aqui distinguir essencialmente dois tipos:

RSU (Resíduos Sólidos Urbanos): contêm aquilo a que se chama os componentes

húmidos e os componentes secos. Os primeiros são constituídos essencialmente por

restos de alimentação e são putrescíveis (biodegradáveis); os segundos não são

biodegradáveis (com exceção do papel), e são geralmente separáveis para reciclagem:

plásticos, metais, vidros, têxteis.

Bioresíduos (biowaste): são constituídos essencialmente por componentes húmidos e

de natureza orgânica putrescível, incluindo: resíduos de alimentação (fracção

orgânica dos RSU), resíduos de jardinagem (relva, pode de árvores, etc), resíduos

florestais, lamas de ETAR, etc.

É fácil de compreender que uma instalação de tratamento biológico processando RSU

tenha de ser portanto de maior complexidade do que uma processando apenas

bioresíduos. Devido aos problemas de contaminação do composto final com diversos

produtos tóxicos (metais pesados provenientes das pilhas, baterias, plásticos,

eletrodomésticos, e de orgânicos xenobióticos provenientes do uso de pesticidas,

produtos farmacêuticos, produtos fitosanitários, etc), os quais representam um risco

para a saúde pública e para o ambiente (através da cadeia alimentar), as modernas

instalações de tratamento biológico restringem cada vez mais os materiais a processar

somente a bioresíduos. Este facto tem incrementado significativamente a recolha

selectiva na origem (recolha diferenciada) deste tipo de resíduos. Nestas condições,

para além de se minimizarem os ricos de contaminação consegue-se também reduzir

substancialmente o tamanho e complexidade das instalações.

A recente Directiva 1999/31/CE relativa a aterros sanitários limita a quantidade de

matéria orgânica dos resíduos sólidos a depositar no solo em sucessivas etapas; assim,

e tomando como referência o ano de 1995, essas quantidades deverão ser reduzidas

em 75% até 2006, em 50% até 2009, e em 35% até 2016.

Esta directiva foi transposta para o direito português através do Decreto-Lei nº

152/2002, de 23 de Maio de 2002 e, consequentemente, elaborada a "Estratégia

biodegradáveis. Na Figura 1 esquematiza-se a evolução destas quantidades para os

próximos anos.

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Figura 1-Evolução temporal prevista para as quantidades de RSU permitidas enviar para aterro

sanitário (dados do Instituto Nacional de resíduos INR)

Como consequência, destinos alternativos terão de ser encontrados para essa matéria

orgânica (bioresíduos), sendo os mais evidentes os tratamentos térmico (incineração,

gasificação, pirólise) e biológico (compostagem, biometanização ou digestão

anaeróbia). De entre eles, os térmicos não são, por um lado nem economicamente nem

tecnicamente atractivos (devido ao elevado teor em humidade dos bioresíduos, que faz

baixar o seu poder calorífico), e por outro têm cada vez menos aceitação pública. A

alternativa do tratamento biológico assume, assim, um papel de relevo nos futuros

sistemas integrados de gesto de resíduos. Esse papel torna-se tanto mais crítico quanto

o seu impacto ambiental será muito em breve objecto de regulamentação (em

discussão para aprovação na DGXI/EU) mais restritiva que a actual, como se verá

mais adiante.

2-FUNDAMENTOS DO PROCESSO

2.1-DESCRIÇÃO FENOMENOLÓGICA

A compostagem aplica-se a matéria orgânica não tóxica, desde que em condições

mínimas de porosidade e humidade: controlando a temperatura e a humidade

consegue-se manter o processo aeróbio. O processo é auto-térmico, produzindo por si

próprio o calor necessário (através da oxidação microbiológica da matéria orgânica) à

manutenção das temperaturas óptimas de reacção (30-70o C).

A reacção global pode sintetizar-se na seguinte reacção química:

Sólidos Voláteis .2 microorgO

gases biológicos (*) + biomassa celular(**) + composto humificado + calor

(*)CO2, H2O, H2S, COVs

(**)C5 H7 O2 N

Um dos aspectos críticos desta reacção é o facto de ser exotérmica, resultando num

aquecimento da massa em fermentação. Este aquecimento (entre 40-60 ºC) é benéfico

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para: (a) acelerar a velocidade do processo e (b) pasteurizar o produto. Contudo um

aquecimento exagerado (acima de 70º C) é prejudicial pois conduz a inactivação por

temperatura (devido à diminuição da diversidade microbiológica) e formação de

esporos (esporulação), o que retarda o processo. O controle de temperatura faz-se em

geral por remeximento mecânico ou por insuflação de ar ambiente. Para a maioria dos

biosólidos a temperatura óptima de compostagem situa-se na gama de 40-50ºC.

No caso de bioresíduos os produtos duma instalação de tratamento biológico são

basicamente os gases biológicos e o composto, como se viu na reacção química atrás.

No caso de se processarem RSU, de recolha indiferenciada, no balanço mássico da

instalação entram também os inertes (componentes secos, ou recicláveis). Nestas

circunstâncias os produtos típicos duma compostagem são indicados na Tabela 1.

Tabela 1-Balanço mássico global típico duma instalação de compostagem de RSU não

diferenciados.

Base: 1 ton RSU

Gases biológicos Composto Recicláveis Resíduo

(para aterro)

260 Kg

( 460 m3)

420 Kg 240 Kg 80 Kg

O composto obtido é uma substância rica em carbono orgânico, castanho-escura,

cheiro a terra húmida e ausência de odores. É usado como condicionador de solos

pobres, e tem um valor nutriente relativamente baixo (0,4 - 1,6% N; 0,1 - 0,4% P; 0,2

- 0,6% K).

Comparada com o processo de lamas activadas, para obter o mesmo grau de

estabilização, a compostagem acelerada requer apenas uma pequena fracção da

energia necessária para o arejamento, e corresponde a uma absorção de oxigénio cerca

de 100 vezes superior.

A degradação aeróbia (compostagem) da matéria orgânica é levada a cabo pelas

acções mecânica, química e biológica dum enorme variedade de organismos no

contexto da cadeia trófica. Em compostagem a cadeia trófica envolve consumidores

de primários, secundários e terciários. Na pirâmide da cadeia os materiais servem de

alimentação a pequenos invertebrados (caracóis, diplópodes, quilópodes, etc) e que

têm uma dupla acção:

(a) ao triturarem os resíduos criam uma maior área superficial pra a subsequente

actuação de bactérias e fungos, os quais são por sua vez fonte de alimentação

de outros invertebrados como ácaros e colêmbolos

(b) os nemátodos e anelídeos excretam produtos orgânicos que enriquecem o

composto e servem de alimento às bactérias e fungos.

Gera-se assim um equilíbrio de consumos alimentares e fecham-se ciclos nutricionais.

Por sua vez, à medida que cada decompositor morre, mais alimento é gerado para os

outros decompositores.

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Em resumo, os resíduos sólidos orgânicos variam desde material altamente

heterogéneo, presente nos resíduos municipais/lamas de tratamento de esgotos, a

resíduos homogéneos provenientes de indústria alimentar. Contudo todos estes

resíduos são misturas de açúcares, proteínas, gorduras, hemicelulose, celulose e

lenhina, numa larga gama de concentrações. Os vários constituintes dos resíduos

sólidos são selectivamente atacados pelas várias espécies microbiológicas da

extraordinária complexidade de espécies de microorganismos presentes nos resíduos

(p. ex. bactérias a açúcares solúveis, fungos a celulose, etc.). O calor resultante das

várias actividades assimilatórias e dissimilatórias origina uma segregação de

populações, cada uma predominando a uma dada zona de temperaturas.

Assim, no processo natural, podem distinguir-se três fases no processo (Fig. 2)

Figura 2 – Variação da temperatura e do pH ao longo do tempo durante a compostagem

A: fase mesófila B: fase termófila C: fase de arrefecimento D: fase de maturação

1-Fase mesófila. Nos resíduos existem normalmente as bactérias mesófilas,

produtoras de ácido, que nesta fase elevam a temperatura até cerca de 40oC em pH

ácido. A fase mesófila compreende o período de latência e o período de crescimento.

O período de latência corresponde ao tempo necessário para os microorganismos

colonizarem o meio e coincide com o período de trabalho microbiológico mais

intenso; as moléculas complexas de matérias orgânicas biodegradáveis são atacadas

tornando-se os alimentos microbiológicos assimiláveis, servindo para o período

seguinte. No período de crescimento a multiplicação dos microorganismos está ao

nível mais alto e devido à abundância de alimento, a reprodução das bactérias segue

uma progressão geométrica. O período de crescimento é acompanhado de uma grande

libertação de energia que eleva a temperatura do meio, permitindo a proliferação das

primeiras espécies características de fase seguinte.

2-Fase termófila. À medida que a temperatura sobe, a população mesófila morre e dá

lugar às bactérias termófilas, a fungos e actinomicetos que são activos até 70oC, em

pH básico.

Os diferentes tipos de bactérias termófilas habitam uniformemente todos os resíduos e

são as únicas responsáveis da intensa actividade característica dos poucos dias em que

a temperatura atinge os 60 - 70oC e ocorrem as maiores mudanças no composto. Elas

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continuam a predominar ao longo do processo no interior da pilha onde as

temperaturas são inibidoras dos actinomicetos e fungos.

Os fungos termófilos são um grupo bem definido que está confinado às camadas

exteriores (5 - 15 cm) dos resíduos e se tornam activos 5 a 10 dias depois do início da

fase; os actinomicetos surgem na fase final. Os fungos e actinomicetos desempenham

um papel importante na decomposição da celulose, lenhina e materiais mais

resistentes (na fracção papel e restos vegetais dos RSU, bem como chitina, proteína,

etc, através da produção de enzimas extracelulares), resultando formas coloidais

precursoras do húmus, de detritos diversos não fermentáveis e de uma grande

quantidade de corpos microbiológicos e de substâncias produzidas pelos agentes

biológicos, muitas vezes complexos organo-metálicos, assim como antibióticos. Os

fungos atacam preferencialmente a celulose, enquanto os actinomicetos utilizam

preferencialmente a hemicelulose e a lenhina. Os actinomicetos são capazes de crescer

a temperaturas mais elevadas do que os fungos termófilos, tornando-se mais

abundantes e até dominantes às elevadas temperaturas atingidas no composto, e são

responsáveis pelo característico cheiro a terra húmida e fresca duma pilha em

compostagem. Se a temperatura for demasiadamente elevada, isto é superior a 70oC,

os fungos, actinomicetos e a maioria das bactérias são inactivados e só subsistem

bactérias formadoras de esporos (esporulação) que param o processo de degradação

orgânica.

3-Fases de arrefecimento e maturação. Com o retardamento da decomposição a

temperatura desce, e o meio é de novo invadido, desta vez em sequência inversa, pela

população microbiológica activa (termófilas, mesófilas), completando-se as reacções.

Nos processos naturais, o período de reacção intensa dura 2 - 5 semanas, comparadas

com 2 - 5 dias numa instalação mecanizada.

O processo está completo quando a temperatura estabilizou e o material adquiriu uma

cor castanho-escura. Um indício aproximado é o teor em amido se anular por ser o

mais facilmente convertido, e dando uma indicação de quando o processo entrou na

fase final. Em alternativa podem seguir-se o teor em CO2 e o COD.

A Tabela 2 dá uma ideia das espécies microbiológicas predominando durante a

compostagem. Durante a compostagem as bactérias predominam sobre os fungos: a

sua densidade populacional é cerca de 2 ordens de grandeza superiores (Fig. 3).

Tabela 2 – Géneros representativos dos micro organismos presentes no composto

_____________________________________________________________________

Fungos Actinomicetos Bactérias Absidia Mucot Micromonospora Aerobacter Micrococcus

Aspergillus Nigrospora Nocardia Bacillus Myxococcus

Botrytis Oospora Streptomyces Cellumonas Proteus

Byssochlamys Penicillum Thermoactinomyces Chondrococcus Pseudomonas

Cephalosporium Rhizopus Clostridium Sarcina

Chaetomium Sporotrichum Diplococcus Streptococcus

Coprinus Stibella Escherichia Thiobacillus

Fusarium Thermoascus

Geotrichum Torula

Humicola Trichoderma

_____________________________________________________________________

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Figura 3- Densidade populacional das várias espécies microbiológicas durante a compostagem.

A descrição anterior é bastante simplificada; nela apenas se focaram dois parâmetros

(pH e temperatura), mas outros há que são determinantes do decorrer das reacções de

decomposição, como se verá mais adiante.

Em resumo, e com excepção dos sistemas com agitação mecânica, num processo de

compostagem típico em pilhas estáticas, ou medas (“windrow”) estas são geralmente

bastante heterogéneas em termos dos gradientes de temperatura e de concentração de

oxigénio que se verificam no seu interior.

A Figura 4 mostra que numa pilha, o núcleo central (miolo) está mais quente que a

periferia, sendo habitado essencialmente por microrganismos termófilos (>45 ºC).

Este gradiente de temperatura origina correntes de convexão natural de ar quente

(Fig.5), mas que não são suficientes para garantir a oxigenação adequada do núcleo

visto que rapidamente se esgota a concentração local de oxigénio, podendo conduzir à

paragem (ou retardamento) das reacções microbiológicas (inactivação por

temperatura). Para o evitar, torna-se então necessário uniformizar a pilha ou por

revolvimento ou por ventilação forçada de ar através dela. A homogeneização da pilha

por qualquer destes processos origina menores gradientes de temperatura e de

concentração de oxigénio, acelerando subsequentemente o processo global (ver Fig.s 6

e 7).

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Figura 4-Zonas de temperatura no interior duma pilha estática com arejamento natural, em

fermentação

Figura 5-Correntes de convexão natural do ar, no interior duma pilha estática com arejamento

natural, em fermentação

Figura 6-Perfil vertical de concentração de oxigénio no interior duma pilha estática com

arejamento natural, em fermentação. (a) Três dias após revolvimento, (b)Variações no centro,

após sucessivos revolvimentos na fase inicial de compostagem

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Figura 7-Perfis de temperatura no interior duma pilha estática em fermentação. (a) com

arejamento forçado, (b)com arejamento natural

2.2-FACTORES AMBIENTAIS

Os parâmetros que mais influem no processo são: razão C/N, taxa de arejamento,

humidade, granulometria, inóculo, e agitação.

Razão C/N

Devido à actividade microbiana, é necessário um fornecimento substancial de

nutrientes (N e P), mas de N em especial. Se as reacções fossem lentas o azoto poderia

ser reciclado, mas dado que há vários processos concomitantes, torna-se necessária a

adição de N, a qual se pode caracterizar pela razão ponderal C/N.

Aparentemente, para C/N = 20, o azoto não limita a velocidade do processo; mas

acima de C/N = 80 a degradação termófila é impedida pela deficiência em azoto. A

maior parte dos sistemas opera entre estes 2 limites.

Para C/N < 30, parte do azoto é perdido para atmosfera na forma gasosa (NH3).

Algum do carbono, contudo, ainda está na forma "ligada" em compostos mais

dificilmente biodegradáveis (celulose, lenhina) enquanto que o azoto está facilmente

disponível para os microorganismos. Daí que a proporção mais adequada para evitar

perdas de azoto estar, na pratica, situada na zona de 35 - 40. Como os resíduos

municipais têm uma razão C/N da ordem de 35 - 80, é geralmente necessária a adição

de azoto contido noutros materiais (Tabela 3).

Tabela 3-Valores da razão ponderal C/N para vários materiais compostáveis

MATERIAL RAZÃO C/N

lamas de esgoto 6,3 - 15,7

resíduos de alimentação 14 - 15

erva 20

resíduos vegetais 40 - 80

Os componentes dos RSU com elevados C/N e que justificam a necessidade desta

adição são, entre outros: papel (C/N = 173) e resíduos de madeira (C/N = 500 -

700).

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O valor de pH afecta também a perda de azoto, visto que acima de pH~7 dá-se a

libertação de NH3 de soluções de amónia aquosa. Desta forma, para uma operação de

compostagem que necessita de pH ~8, não será possível reter azoto se C/N > 35.

Figura 8-Variação típica do pH num processo de compostagem (NOTA: Acima de ph~8,5 liberta-

se NH3 e um conjunto de odores desagradáveis, com perda do valor agronómico nutricional do

composto obtido)

Se na fase inicial (Fig. 8) do processo for limitado o acesso de oxigénio (o processo

torna-se anaeróbio), o pH continuará a descer; há contudo, no próprio composto, um

efeito tamponizante natural que permite o pH estabilizar na zona alcalina desde que o

processo permaneça aeróbio (manter-se o arejamento).

A zona de C/N mais conveniente para o composto final é da ordem de 12 - 20; valores

demasiado elevados traduzem-se no facto de o composto "roubar" azoto do solo após

aplicação.

O P não é geralmente limitante, já que os microorganismos consomem este elemento

numa proporção mais baixa que N (cerca de C/P~5000).

Tal como na digestão anaeróbia, o excesso de ácidos voláteis, pode inibir a reacção.

Contudo, a compostagem é menos sensível a este parâmetro, admitindo até 5000 - 10

000 ppm de ácidos, contra 2000 no caso do processo anaeróbio.

Arejamento

A oxidação microbiológica da matéria orgânica conduz, no caso geral, a 3 tipos de

materiais: gases e vapores (CO2, H2O, H2S, NH3, COVs, etc), biomassa celular e

composto final.

É possível calcular a quantidade de ar necessária ao processo, com base nas seguintes

que traduzem a estequiometria das reacções, como se indica a seguir.

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Oxidação incompleta. É a situação mais frequente, e traduz-se pela equação:

CaHbOcNd + O2 = nCwHxOyNz + sCO2 + rH2O + NH3 ....(1)

4

324

4

)232( dcbawxzyn

nwas

2

3)3( dbxznr

nzd

A fórmula CwHxOyNz pretende traduzir a composição empírica do composto obtido.

Oxidação completa. Na eq. (1) é n=0, logo fica reduzida a:

CaHbOcNd + O2 = aCO2 + rH20 + dNH3 ...(2)

sendo os novos coeficientes:

4

324 dcba

as

2

3dbr

d

(OBS: Se o NH3 também for oxidado então pode verificar-se adicionalmente: NH3 +

2O2 = HNO3 + H2O)

O arejamento envolve implicitamente a conjugação de dois parâmetros indissociáveis,

e que são críticos em compostagem: a concentração de O2 e a temperatura. Ambos

variam durante o processo como resultado da actividade microbiológica, a qual

consome O2 e liberta calor; se este último não for removido (por convexão natural ou

forçada) o processo pára devido a inactivação (por causa da redução da biodiversidade

microbiológica). Nestas condições o arejamento é das operações mais críticas na

compostagem, visto que ele controla aqueles dois parâmetros, como se verá a seguir.

Oxigénio: um arejamento insuficiente (falta de O2) leva a fermentações

aneróbias indesejáveis. Mas mesmo em condições de arejamento adequado, a própria

natureza heterogénea dos resíduos origina sempre a criação de pequenas bolsas

anóxicas, conduzindo à libertação de NH3 e H2S.

Temperatura: o calor é um dos produtos da oxidação microbiológica, e deve

ser naturalmente aproveitado para elevar a temperatura do substrato ao valor óptimo

para reacção química, poupando-se assim a importação de energia de fontes externas.

Cada substrato tem uma gama de temperatura óptima de fermentação, abaixo da qual

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a reacção é demasiado lenta e acima da qual há esporulação e perda de diversividade

microbiológica, temperaturas excessivamente altas também provocam libertação

desnecessária de odores indesejáveis. Essa gama de temperatura para a maior parte

dos substratos orgânicos situa-se entre 50-60ºC. O nível de temperatura é importante

não só por uma questão de velocidade de reacção química, mas também porque em

compostagem ele permite uma pasteurização da massa em fermentação, obtendo-se

um produto final (composto) isento de risco para a saúde pública. Durante a

pasteurização as populações microbianas patogénicas inicialmente presentes nos

resíduos são progressivamente substituídas por bactérias e fungos não infecciosos. Os

tempos e temperaturas de exposição mais adequados à pasteurização serão

comentados mais adiante, aquando da descrição dos impactos ambientais, mas

considera-se que 48 h a 50ºC são condições geralmente adequadas.

Em resumo, verifica-se que a correcta operação de compostagem exige um

compromisso entre velocidade de reacção, redução de patogénicos, e produção de

odores. Este compromisso consegue-se, para a grande maioria dos substratos,

mantendo a temperatura na gama de 50-60ºC. Para conseguir estabilizar a temperatura

nesta gama o calor produzido por oxidação microbiológica tem que ser parcialmente

removido, o que se consegue essencialmente por arejamento controlado; este remove

o calor em excesso não só pelas convexões forçada e natural mas também por

arrefecimento provocado pela evaporação da humidade do resíduo (Fig. 9).

Figura 9-Controle do processo de compostagem: interacção temperatura e arejamento numa

pilha estática. (a)Perfil óptimo de evolução, (b)Elementos do sistema de controle por retroacção.

Verifica-se tanto teoricamente como empiricamente que durante o período de maior

actividade biológica (termófilo) o caudal de ar necessário para o controlo de

temperatura (arrefecimento) é muito superior ao necessário para a oxidação

microbológica; assim, desde que esteja assegurado o controlo de temperatura está

também assegurado automaticamente o fornecimento de O2 à respiração

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microbiológica (estequiometria da reacções 1 e 2 vistas atrás). Geralmente o caudal de

ar necessário na fase termófila pode ser estimado pela relação:

0,11 (1,066)T

expresso em [mg. (O2)/h - g (matéria volátil inicial)], com T(ºC).

O arejamento fornece o oxigénio necessário à oxidação e remove o calor e o vapor de

água formados. O caudal de ar tem de ser tal que a concentração de oxigénio não

baixe além do 14 - 17% (vol), i.e., quando cerca de 1/3 do oxigénio inicial foi

consumido; abaixo de 10% de oxigénio o processo decorre por mecanismo diferente.

Como o oxigénio é convertido num volume equivalente de CO2, a concentração deste

nos gases é também um bom índice, não devendo exceder 3 - 6% (vol). Estes valores

são particularmente importantes na fase termófila.

Os gases de escape saem saturados em vapor, à temperatura da massa. A 60oC

verifica-se tipicamente que partindo de 1 m3 de ar:

se libertam 23,5 KJ de energia

se libertam 130 g de vapor

se consomem 25 g de C do composto (a 10% CO2).

Durante a compostagem, cerca de 50% do carbono inicial é libertado sob a forma de

CO2. Nestas condições, sabida a composição dos resíduos iniciais, pode calcular-se

também, independentemente, a quantidade de ar para a estabilização. Como os valores

anteriores se referem somente à fase termófila, de maior intensidade, eles são

conservadores (por defeito).

Humidade

Em teoria seria desejável conduzir o processo como no caso de lamas activadas,

fazendo o arejamento forçado duma suspensão orgânica contendo cerca de 100% de

água. Dados os elevados volumes de efluente a tratar que daí resultariam esta técnica

seria praticamente irrealizável, preferindo usar-se o material simplesmente húmido,

com cerca de 55% de água; teores superiores a este conduzem à colmatação dos poros

dificultando o acesso de oxigénio, já que o coeficiente de difusão do O2 na água é

cerca de 10000 vezes inferior comparativamente ao do mesmo coeficiente no ar.

Granulometria

O material deve ser moído até 2-7 cm de tamanho para assegurar uma boa

transferência de massa (oxigénio) e de calor (uniformidade de temperatura). Se o

material a compostar for lamas de ETAR, ou análogo, será necessário juntar um

agente de porosidade ("bulking"), que é um material orgânico ou inorgânico de

dimensões suficientes para fornecer um suporte estrutural e conferir uma certa

porosidade quando adicionado. O agente de "bulking" mais usado é constituído por

cavacos de madeira, ou estilha de madeira, mas também se usam pneus triturados,

cascas de amendoim, aparas de árvores, etc. Por vezes é necessária a separação e

reutilização do agente bulking devido aos grandes volumes vulgarmente usados e aos

elevados custos dos materiais, tais como os cavacos.

Page 15: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

15

Inóculo ou Sementeira (“seeding”)

Para acelerar o processo usa-se por vezes um inóculo específico. Em vez disso pode

também reciclar-se 1-5% do material em decomposição dentro do reactor. No caso de

introdução de lamas provenientes do tratamento de esgotos o objectivo, mais do que

"seeding" é fornecer a água necessária aos resíduos sólidos e alguns nutrientes

(especialmente azoto). A inoculação não altera a velocidade nem o rendimento global

de compostagem, mas abrevia (apenas ligeiramente) a sua duração total por reduzir o

período de atraso (“lagging”) inicial; contudo comparado com o tempo total do

processo este encurtamento não é significativo.

Agitação

Em sistemas de “windrow” é importante garantir a transferência de massa e de calor,

tal como era exigido também no caso da granulometria; para isso a pilha necessita de

uma agitação periódica o que se consegue por remeximento, ou revolvimento. A

agitação tem ainda o efeito de evitar a colmatação dos poros por condensação de

vapor de água nas zonas mais frias, e evitar a aglomeração do sólido (por efeito de

secagem exagerada em zonas preferenciais) com o consequente escoamento

preferencial do ar ("channelling"). Em sistemas estáticos o efeito de arejamento é

conseguido à custa da introdução de um agente de porosidade, já que aqui a

transferência de massa e de calor se fazem exclusivamente por convexão natural.

Em resumo, o processo de compostagem (em especial no caso da compostagem

acelerada) para atingir elevadas eficiências, deve ser controlado nos seguintes limites

de parâmetros operacionais:

granulometria: 3 - 13 mm

C/N entre 20 e 40, e conter o mínimo de outros nutrientes indispensáveis

humidade: 45 - 65% (55% óptimo para a maioria dos materiais)

temperatura: 45 – 65ºC

pH: 5,5 - 9

agitação suave ou lenta, para homogeneização

caudal de ar tal que a concentração de oxigénio não desça dos 5% (no mínimo)

3. EQUIPAMENTO E TECNOLOGIAS

A tecnologia de compostagem de RSU é descrita com profundidade em vários livros,

hoje considerados como obras de referência (AGTHM, 1985; Gotaas, 1956; Haug,

1993; Martin, 1991; Mustin, 1987; Satriana, 1974; Tchobanouglous et al., 1993).

Conceptualmente, a compostagem desenrola-se em três fases, que são comuns à

maioria dos processos, e que são:

1-Preparação dos resíduos. O pré-tratamento dos resíduos antes da compostagem

inclui a trituração até 7 cm de diâmetro (moinhos de martelos) e separação de

materiais não compostáveis: inorgânicos (metal, vidro) e orgânicos (plásticos); esta

separação é feita em crivos rotativos (trommel) ou por elutriação com ar, ou em

separadores balísticos e magnéticos.

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2-Digestão. Pode ser feita ao ar livre (processo natural, em "windrows"), ou confinada

(processo mecânico, acelerado). Os vários tipos de equipamento serão discutidos mais

adiante.

3-Purificação e estabilização. A estabilização final da matéria orgânica (maturação)

não ocorre no reactor durante a compostagem convencional; esta impraticabilidade

deve-se ao excessivo tempo que seria necessário. No entanto é muito importante saber

quando é que um composto atinge o grau suficiente de maturidade, por várias razões,

tais como: (1) saber quando é que um composto está em condições de ser usado na

produção agrícola, pois um grau de compostagem insuficiente pode ser prejudicial às

culturas (por apresentar fitotoxicidade); (2) saber quando é que o material está livre de

patogénicos, maus cheiros e outros factores maléficos. À saída da digestão o material

pode ainda sofrer nova operação de moagem e separação para melhorar o aspecto

(textura uniforme) e para remoção de componentes inaceitáveis (vidros, plásticos)

antes de ser finalmente ensacado.

A Fig. 10 mostra o flow-sheet geral duma instalação de compostagem.

Figura 10 - Fluxograma para a compostagem de lixo urbano (RSU)

Existe hoje em dia uma grande diversividade de equipamento para compostagem, que

seria difícil de descrever na totalidade em pormenor. Contudo verifica-se que

praticamente todo o equipamento se resume a dois tipos conceptuais (Tabela 4):

Tabela 4-Tipos gerais de sistemas de compostagem

SISTEMAS ABERTOS

(pilhas, medas)

SISTEMAS CONFINADOS

(reactores)

Com arejamento natural e

remeximento (“windrow”)

Verticais

Horizontais

Tambor rotativo Com arejamento forçado e estático

Na Fig. 11 estão representados esquematicamente estes conceitos.

Page 17: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

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Figura 11 - Tipos conceptuais de equipamento de compostagem

Vejamos alguns destes reactores mais em pormenor.

3.1-PILHAS DO TIPO “WINDROW”

Uma vez construídas estas pilhas não são mecanicamente agitadas. A ventilação faz-

se por difusão molecular do O2 e por convexão natural do ar: o núcleo interior

(“miolo”) está quente (devido ao calor de reacção), pelo que o ar mais quente tende a

subir, sendo compensado por entrada de ar fresco por baixo (convexão natural – ver

Figuras 5 e 11A). Uma vez que não há agitação mecânica (como nos sistemas

confinados) há tendência para surgirem dois tipos de problemas:

haver compactações locais, visto que o material ao fermentar diminui de volume (gasificação

do sólido), criando-se zonas anóxicas e, entre elas, zonas ou canais de escoamento preferencial

(“channeling”),

a parte exterior da pilha, em contacto com o ar ambiente, permanece sistematicamente mais

fria e seca, impedindo a evolução normal do processo

Para obviar estes inconvenientes as pilhas são reviradas ou revolvidas periodicamente

(1 a 2 semanas), para garantir a manutenção duma adequada porosidade. Esta é a

principal função do revolvimento, embora outra vantagem seja a re-oxigenação do

Page 18: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

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interior; contudo este é de curta duração pois rapidamente se esgota o O2 nos poros.

No caso de materiais mais finos (lamas de esgoto, por ex.), além do revolvimento faz-

se a adição de agente de porosidade (cavacos ou estilha de madeira, casca de pinheiro,

etc) o qual não sendo degradável é mecanicamente separado no final do processo para

posterior reciclagem nas novas pilhas. Quanto ao equipamento usado no

revolvimento, para pequena escala de operação, um simples trator com pá frontal é

suficiente (Fig. 12), mas para uma escala maior usam-se máquinas especialmente

concebidas ou dedicadas, umas acopláveis a um tractor que fornece simultaneamente a

mobilidade e a potência para o remeximento, outras auto-suficientes em energia

mecânica. A operação mecânica está ilustrada na Fig. 13.

Figura 12-Tipos de equipamento para revolvimento de pilhas de compostagem (pá de tractor)

Figura 13-Tipos de equipamento para revolvimento de pilhas de compostagem (tractor auto-

suficiente)

Page 19: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

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3.2-PILHA ESTÁTICA COM AREJAMENTO FORÇADO

A configuração é a mesma de “windrow” (incluindo a adição de agentes de

porosidade) excepto que o arejamento é forçado com o auxílio dum ventilador que

insufla ar por uma grelha multiperfurada na base da pilha (Fig.s 11B e 14). A

ventilação é contínua, mas o caudal de ar injectado é variável ao longo do processo de

modo a manter a temperatura constante (controle de temperatura por rectroacção sobre

o caudal de arejamento, Fig. 9B). Recordar que a função do arejamento é controlar

duas variáveis importantes do processo: concentração de O2 e temperatura. A primeira

não deve ser inferior a cerca de 17% O2 nos gases de saída e a segunda deve situar-se

na gama 50-60ºC, dependendo do substrato.

Figura 14 - Configuração de pilha estática com arejamento forçado.

Entre o tipo de “windrow” e o de pilha com arejamento forçado há ainda um sistema

intermédio chamado de arejamento passivo. Neste a pilha é montada sobre uma grelha

de tubos perfurados (abertos ao ar nas duas extremidades). Fazendo-se o arejamento

por efeito de túnel: a convexão continua a ser natural mas é mais eficiente. Neste caso

não há revolvimento.

3.3-REACTORES FECHADOS

1-Verticais. Têm mais de 4 m de altura e são do tipo silo (Fig.s 11D e 15). O material

é introduzido pelo topo, cai por gravidade e é recolhido no fundo. O ar é insuflado em

contra-corrente com os sólidos. Devido ao longo trajecto que os gases têm de

atravessar (altura elevada do silo) o controlo de temperatura e de concentração de O2 é

mais difícil de realizar do que nas pilhas estáticas, visto que se originam gradientes

apreciáveis daqueles parâmetros ao longo do reactor. Estes inconvenientes são

minimizados invertendo periódicamente o sentido do fluxo de ar ou insuflando este

horizontalmente. Estes reactores são usados mais frequentemente para lamas de

ETAR do que para RSU.

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20

Figura 15 – Reactor de compostagem vertical

2-Horizontais. Nesta configuração a altura de resíduos é menor (cerca de 2-4 m), pelo

que a trajectória do ar insuflado pela base origina menores gradientes de concentração

e de temperatura do que nos reactores verticais (Figs. 11B e 16). O controlo destes

dois parâmetros é feito pelo mesmo mecanismo de rectroacção usado nas pilhas

estáticas. Por vezes estes reactores podem ter agitação mecânica e fluxo alternado do

ar insuflado.

Figura 16 – Reactor de compostagem horizontal (com agitação)

Page 21: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

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3-Tambor rotativo (tipo DANO). Os resíduos são introduzidos numa das extremidades

do tambor (dimensões aproximadas: 2-4 m , e até 45 m de comprido, rodando entre

0,5 e 2 rpm) e depois recolhidos no outro extremo; para permitir o deslocamento

natural no interior por queda por gravidade o tambor é ligeiramente inclinado para a

saída (Fig. 11C); a configuração é semelhante à de um forno de “clinker”. O ar é

insuflado em contracorrente com os resíduos. A rotação também permite uma melhor

homogeneização e trituração dos resíduos, e obviar os gradientes de concentração e de

temperatura.

Comparando os vários tipos equipamento verifica-se que os de sistema fechado têm

maiores custos de investimento e de operação comparativamente com os abertos. Por

essa razão o tempo de residência dos resíduos no interior dos primeiros é mantido no

mínimo (cerca de 1 semana nos verticais e 2-3 dias nos de tambor) e restringido

essencialmente à fase mais activa (termófila); daí que após a saída do reactor o

produto tenha de sofrer ainda uma estilização em parque fechado e arejado por mais

cerca de 3-4 semanas, para completar o processo de compostagem, em particular a

cura ou maturação (fase em que se formam os compostos húmicos responsáveis pelas

características de fertilização do composto). A compostagem em “windrow” tem

custos relativamente baixos, mas pode tornar-se dispendiosa em termos de

necessidade de terreno.

Para finalizar faz-se um resumo comparativo das características operacionais dos

vários de equipamento (Tabela 5).

Tabela 5-Características operacionais típicas dos sistemas de compostagem

Tecnologia

Substrato

Tempo necessário

Compostagem activa Maturação

Gama Típico

1-Pilha estática

sem revolvimento

(compostagem

passiva)

-Resíduos verdes

(jardim, parque,

horta)

2 – 3

anos

2

anos

Não necessita

2-Pilha estática

com revolvimento

infrequente

-Resíduos verdes

1/2 – 1

ano

6

meses

4

meses

-Estrumes 4 – 8

meses

6

meses

1 – 2

meses

3-Pilha estática

com revolvimento

frequente

-Estrumes 1 – 4

meses

2

meses

1 – 2

meses

4-Pilha estática

com arejamento

forçado

-Lamas 3 – 5

semanas

4

semanas

4 – 8

semanas

5-Reactor de

tambor

-Lamas

-RSU

3 – 8

dias

- 2

meses

6-Reactor de silo

vertical

-Lamas

-RSU

1 – 2

semanas

- 8 semanas

Indicam-se também, na Tabela 6, as gamas de condições operatórias típicas dos

sistemas de compostagem (independentemente da tecnologia usada).

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Tabela 6-Condições operatórias dum processo de compostagem típico Parâmetro Gama genérica Gama preferida

Razão ponderal C/N 20-40 25-35

Humidade (%) 40-65 50-60

Concentração de O2 (%) >5 >12

Granulometria (mm) 3-13 (1)

pH 5,5-9 6,5-8,0

Temperatura (ºC) 45-65 55-60

(1) Depende da natureza do substrato

4- IMPACTOS

Uma análise típica dum composto deve indicar pelo menos o teor em matéria

orgânica, em humidade, e em inertes. Acessoriamente, em aplicações agrícolas mais

específicas pode ser necessário analisar também os teores em metais pesados tóxicos,

a biodisponibilidade em nutrientes (poder fertilizante), e a fitotoxicidade (ensaios de

germinação, testando o desenvolvimento de certas sementes; é conhecido p.ex., que na

fase final termófila, o composto é inibidor do crescimento vegetal).

A Tabela 7 dá uma ideia das características típicas dum composto.

Tabela 7 - Composição típica de um composto (% em peso)

a) GERAL:

Humidade 30 - 50 %

Orgânicos 10 - 30 %

Inertes 30 - 70 %

pH ( 1: 10 ) 6 - 9

Tamanho ( mm ) 2 - 10

Alcalinidade ( CaO ) 1 - 20

Sais totais ( KCl ) 0,5 - 2,0

b) ELEMENTAR (base seca):

N 0,1 - 1,8%

P ( P2O5 ) 0,1 - 1,7% (0,2-3,8%)

K ( K2O ) 0,1 - 2,3% (0,1-2,8%)

S 0,5 - 3,0%

Fe 0,8 - 1,5%

B 60 - 360 ppm

Cd 15 - 40 ppm

Cu 90 - 260 ppm

Zn 800 - 1200 ppm

Pb 200 - 400 ppm

Hg 1 - 5 ppm

Mais do que o valor nutriente é o teor em matéria orgânica que interessa ao solo visto

que é a matéria orgânica que:

(i) melhora as características físicas (porosidade, friabilidade) do terreno,

tornando-o fácil de lavrar, e suporta os vermes (que mantêm a porosidade, facilitando

o acesso do ar, a percolação das águas da chuva, reduzindo assim o escoamento

superficial e erosão).

(ii) aumenta a capacidade de retenção de água do terreno (300 - 500% de

água) facilitando a sobrevivência do coberto vegetal nos períodos de seca.

(iii) reduz o arraste dos fertilizantes pela água das chuvas, retendo estes; outra

forma de retenção de N e P é conseguida à custa da conversão, pela matéria orgânica,

das suas formas solúveis numa forma orgânica incorporada no tecido celular dos

Page 23: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

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microorganismos, que após a sua morte, deixam aqueles dois nutrientes disponíveis

no solo para as raízes.

(iv) acelera a actividade biológica essencial ao crescimento das raízes.

(v) solubiliza sais minerais inorgânicos (p.ex. fosfatos), tornado-os acessíveis

às raízes.

Contudo, para além destes constituintes macroscópicos, também poderá

potencialmente entrar na composição do composto uma série de elementos orgânicos

e inorgânicos com carácter tóxico (Amlinger, 2004), dependendo da constituição do

resíduo original a partir do qual o composto foi obtido, condicionando portanto a

qualidade deste. Assim, a qualidade do composto pode constituir um impacto

potencialmente negativo para o Ambiente e Saúde Pública, aquando da sua aplicação

nos solos, através desta contaminação sucessiva.

Para além disso, não só durante o processo de compostagem como na posterior

aplicação no terreno, podem libertar-se odores prejudiciais à Saúde Pública.

Analisaremos estes dois aspectos separadamente: Qualidade do composto

(contaminação) e libertação de odores.

4.1-QUALIDADE DO COMPOSTO (CONTAMINAÇÃO)

A qualidade tem sido objecto de muita discussão a nível da EU e pode encarar-se em

três contextos diferentes: (a) no do estabelecimento de parâmetros de qualidade

física, química e microbiológica, (b) no da atribuição do Rótulo Ecológico (como

“soil improver”, ou “growth medium”) e (c) na definição dos parâmetros

operacionais da tecnologia de tratamento biológico.

Estabelecimento de parâmetros de qualidade física, química e microbiológica

A contaminação diz respeito a plásticos, metais, vidros, e patogénicos. O problema

existe apenas quando há recolha indiferenciada de lixo. Actualmente, e para o evitar,

há tendência para a recolha selectiva de fracção orgânica na origem (biosólidos).

Os metais pesados inicialmente presentes nos resíduos, e que após moagem ficam

aderentes à matéria orgânica, podem aparecer no produto final e penetrar na cadeia

alimentar através do terreno, se os seus teores não forem controlados. São eles:

a)Hg: proveniente de baterias de carros, e desperdícios hospitalares,

fotográficos, rádios, etc.

b)Cd: proveniente de tintas (usado como pigmento) e plásticos (usado como

estabilizador); ainda de películas protectoras anticorrosivas de metais.

c)Cu e Zn: provenientes da corrosão metálica, tintas (usados como pigmentos)

e corantes.

d)Boratos: provenientes de adesivos em cartão de embalagem.

Embora o cobre e zinco sejam essenciais, em micro quantidades, ao desenvolvimento

vegetal, são tóxicos em quantidades suficientemente elevadas. Não existem

infelizmente normas de regulamentação do teor em metais dos compostos obtidos por

Page 24: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

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fermentação dos resíduos urbanos, nem nacionais nem da União Europeia. Contudo

praticamente todos os países europeus têm as suas próprias normas internas e que são

bastante variáveis (Hogg et al., 2002). Normalmente verifica-se que o teor em metais

das lamas domésticas é sistematicamente superior ao do dos compostos urbanos. Dado

existir uma Directiva Comunitária para a aplicação daquelas lamas nos solos agrícolas

(Directiva 86/278/CEE de 12 de Junho, transposta para a legislação nacional através

do Dec-Lei Nº 118/2006, de 21 Junho, o qual veio actualizar o Dec-Lei Nº 446/91 de

22 de Novembro; este foi recentemente regulamentado pelo Despacho Nº 309-G/2005

de 19 Abril) deve, para efeitos comparativos utilizar-se esta Directiva, garantindo

assim uma margem de segurança adicional. A Tabela 8 indica os níveis permitidos.

Tabela 8-Níveis de metais pesados permitidos em lamas domésticas para aplicação agrícola

(Directiva 86/278/CEE de 12 de Junho)

Metal Cádmio Cobre Níquel Chumbo Zinco Mercúrio Crómio

Limites

(ppm)§

20-40 1000-1750 300-400 750-1200 2500-4000 16-25 1000-1750

§ O mesmo que [mg/kg]. Sempre referidos a base seca, e para uma gama de pH. Notar ainda que a taxa

de aplicação no solo está também regulamentada na mesma Directiva, em função do teor do solo nos

mesmos metais.

O Dec-Lei Nº 118/2006, de 21 de Junho, estabeleceu o regime a que obedece

a utilização de lamas de depuração em solos agrícolas, transpondo para a ordem

jurídica nacional a Directiva 86/278/CEE, do Conselho de 12 de Julho, relativa à

valorização agrícola de lamas de depuração, de forma a evitar efeitos nocivos para o

homem, para a água, para os solos, para a vegetação e para os animais e para

promover a sua correcta utilização.

Por outro lado, vidros e plásticos que tenham acompanhado a matéria orgânica ao

longo do processo, interferem na manipulação do composto e na alimentação animal.

Finalmente, do ponto de vista bacteriológico, a menos que as condições de operação

não tenham sido adequadas, praticamente todos os patogénicos são destruídos (Tabela

9). As bactérias patogénicas e outros microorganismos perigosos encontram-se em

Tabela 9 - Condições ambientais para destruição dos patogénicos e parasitas mais comuns

ORGANISMO OBSERVAÇÕES

_______________________________________________________________________________

Salmonelia typhosa Nenhum crescimento para além de 46oC; morte em 30 min a 55 -60oC

e em 20 min a 60oC; destruição em pouco tempo com o composto no

meio ambiente.

Salmonelia sp. Morte em 1h a 55oC e em 15 -20 min a 60oC.

S higella sp. Morte em 1h a 55oC.

Escherichia coil A maioria morre em 1h a 55oC e em 15 -20 min a 60oC.

Entamoeba histolytica, cisto Morte em poucos minutos a 45oC e em poucos segundos a 55oC.

Taenia saginata Morte em poucos minutos a 55oC.

Trichinella spiralis, larva Morte rápida a 55oC; morte instantânea a 60oC.

Brucella abortus ou B. suis Morte em 3 min a 62 - 63oC e em 1h a 55oC.

Micrococcus pyogenes var,

aureus Morte em 10 min a 50oC

Streptococcus pyogenes Morte em 10 min a 54oC.

Mycobactyerium Tuberculosis

var hominis Morte em 15 -20 min a 66oC ou após aquecimento momentâneo a

67oC.

Corynebacterium diphtheriae Morte em 45 min a 55oC.

Necator americanus Morte em 50 min a 45oC.

Ascaris lumbricoides, ovos Morte em menos de 1h a temperaturas superiores a 50oC.

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condições de competição biológica desfavorável, devido à intensa proliferação de

espécies microbiológicas de biodegradação em meio aeróbio com temperatura e

humidade elevadas e formação de antibióticos. Para os organismos patogénicos, o

lento e progressivo aumento de temperatura, do início da fermentação, em meio

húmido e rico em substâncias orgânicas nutritivas provoca a aceleração do

metabolismo dos ovos de parasitas. Assim, a rápida eclosão e evolução dos ovos até

às formas de vida mais vulneráveis, causa a própria exterminação dos parasitas devido

à temperatura elevada então atingida.

O diagrama da Figura 17 mostra as condições ambientais necessárias para

pasteurização da massa em compostagem. Notar contudo que a pasteurização

completa pressupõe que toda a massa esteja nas condições indicadas; na prática, por

Figura 17-Condições ambientais necessárias para pasteurização durante o processo de

compostagem (adaptado de Feachem et al., 1983)

razões que se prendem com dificuldades de homogeneização da mistura sólida não é

fácil de garantir uma transferência de calor tão eficiente que promova uma

temperatura tão uniforme, pelo que é necessário usar um factor de segurança.

Page 26: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

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Atribuição do Rótulo Ecológico como “soil improver” (ou “growth médium”)

A qualidade do composto para efeito de atribuição do Rótulo Ecológico (baseado

essencialmente na Análise de Ciclo de Vida) é regulamentada pela Decisão 98/488/EC

(7 de Julho), que foi actualizada pela Decisão 2001/668/EC (28 de Agosto). Esta

regulamentação ainda está a ser revista. Os limites de concentração de metais pesados

exigidos são mais restritivos do que os constantes da antiga Directiva 86/278/EC (12

de Junho) para lamas biológicas; eles estão indicados na Tabela 10, juntamente com

outros regulamentos Comunitários.

Tabela 10-Limites de concentração e metais pesados em bioresíduos fermentados: comparação da

legislação existente (i)para lamas como fertilizantes de solos, (ii)para o Rótulo Ecológico e (iii)a

emanada do Grupo de Trabalho da DGXI (EU)

Metal

Limite de concentração, mg/kg (bs)

Directiva

86/278/CE

(lamas) (1)(4)

Decisão

2001/668/CE

(rótulo

ecológico) (5)

Grupo de trabalho em bioresíduos, da EU/DGXI (2)

Composto

Estabilizado (3)

Classe 1 Classe 2

Zn 2500-4000 300 200 400 1500

Cu 1000-1750 100 100 150 600

Ni 300-400 50 50 75 150

Cd 20-40 1 0,7 1,5 5

Pb 750-1200 100 100 150 500

Hg 16-25 1 0,5 1 5

Cr 1000-1750 100 100 150 600

Mo (1)

2

Se (1)

1,5

As (1)

10

F (1)

200 (1) Só para composto a partir de resíduos industriais (2)

EU (2001), Report DG ENV A2/LM/biowaste (2nd Draft) (3)

Proveniente da biometanização (digestão anaeróbia) (4)

Transposta pelo Dec-Lei Nº 446/91 (22 Nov); actualizado pelo Dec-Lei Nº 118/2006 (21 Junho) (5)

Actualiza a Decisão 98/488/CE (7 Junho)

Também são impostos outros limites, como:

-Contaminantes físicos (metal, vidro, plástico): <0,5%

-N org <2% e N inorg <20% do N total

-Samonella: ausente em 50 g

-E. Coli: <1000 MPN/g (MPN = most probable number)

Além disso a rotulagem do produto deve indicar os seguintes parâmetros: humidade,

SV, razão C/N, pH, N total, P, K, teste de maturação, condutividade eléctrica.

Definição dos parâmetros operacionais da tecnologia de tratamento biológico

A optimização das condições operatórias das tecnologias de fermentação de

bioresíduos, com vista a minimizar os impactos no Ambiente e Saúde Pública dos

produtos dos respectivos processos, está actualmente em discussão na União Europeia

(EU, 2000); especificamente serão normalizados os seguintes aspectos:

Page 27: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

27

-no seu Anexo I, quais as substâncias no novo CER-Catálogo Europeu de Resíduos

(Decisão 2000/532/CE, de 20 Dez) que podem ser consideradas como bioresíduos

-a obrigatoriedade de recolha separativa na origem dos bioresíduos; para os RSU

residuais (i.e., que não foram separados selectivamente, ou que resultam de refugo de

outros processos de tratamento) destinados a aterro sanitário deverão ter um Índice de

Actividade Respiratória após 4 dias (IAR4) inferior a 10 mg O2/gSV ou, em alternativa,

um Índice Dinâmico de Respiração (IDR) abaixo de 1000 mg O2/h.KgSV.

-que durante o processo de compostagem em pilha os resíduos devem ser expostos a

temperaturas > 55ºC (2 semanas) ou > 65ºC (1 semana); para compostagem em

reactor deverá ser > 60ºC (1 semana); para biometanização deverá ser > 55ºC (mínimo

de 24 horas), com tempo de retenção hidráulico superior a 20 dias

-os limites de concentração em metais pesados não devem exceder os indicados na

Tabela 10 atrás

-os parâmetros de qualidade do produto serão monitorizados mensalmente (em

instalações de capacidade superior a 10000 t/a de produto), e incluir as seguintes

análises: ST, SVT, densidade, condutividade eléctrica, pH, N, P, K, Ca, Mg, B, Mo,

IAR4, IDR, Salmonella spp, Clostridium perfringens, índice de germinação, metais

pesados (Cd, Cr, Cu, Ni, Pb, Zn, Hg), PAHs, PCBs, índice de odor.

4.2-ODORES

A emanação dos odores é inevitável, mas pode ser tecnicamente controlada entre

limites aceitáveis, em particular nos processos mecanizados (confinados); o mesmo

não acontece sempre, contudo, nos processos naturais, em que a dispersão pelo vento

de papel, plástico, etc., pode originar um problema ambiental adicional.

Alguns dos compostos orgânicos responsáveis pela formação de odores durante a

compostagem estão indicados na Tabela 11.

Tabela 11-Compostos orgânicos responsáveis pela formação de odores em compostagem

(adaptado de Miller and Macauley, 1998)

Composto

Fórmula

Limite de

Detecção

olfactiva

(nl/l)

Etanal CH3CHO 2

Ácido butanóico CH3CH2CH2COOH 0,28

Amoníaco NH3 37

Trimeti-1-amina (CH3)2N 4

3-Metilindol (escatol) C6H5C(CH3)CHNH 7,5E-5

Ácido sulfídrico H2S 1,1

Sulfureto de carbonilo COS -

Sulfureto de dimetilo CH3S CH3 20

Dissulfureto de dimetilo CH3SSCH3 -

Sulfureto de dietilo CH3CH2SCH2 CH3 0,25

Sulfureto de metilo CH3SH 1,1

Page 28: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

28

Sulfureto de etilo CH3CH2SH 0,016

As soluções técnicas, reflectem-se necessariamente nos custos finais (Mills, 1995). A

medida primária que deve tomar-se no sentido de minorar a formação de odores é a de

prevenção, ou seja realizar a fermentação nas condições tecnológicas optimizadas, tal

como de descreveu anteriormente. A emissão de odores pode ser tecnicamente

controlada entre limites aceitáveis, em particular nos processos mecanizados

(confinados). O mesmo nem sempre acontece nos processos naturais, em que a

dispersão de papel, plástico, etc., podem originar um problema ambiental adicional.

Actualmente o processo mais vulgarizado para tratar os gases do processo é por

biofiltração, usando o próprio composto como meio de suporte para o

desenvolvimento duma flora e fauna que assimilam o carbono orgânico desses

vapores. O problema é agravado pela inexistência de legislação que regulamente os

níveis de emissão e concentração aceitáveis. Nalguns países contudo, existem

actualmente “valores-guia” recomendados, sendo o método analítico invariavelmente

usado para a sua determinação o de olfactometria. Por exemplo na Alemanha

(Frechen, 1989) considera-se que é razoável admitir um valor-guia para a

concentração em que os percentis 95 a 97 não excedam 1 UO/m3 (UO = unidade de

odor). Na Holanda (Van Harreveld, 1991) o percentil 98 aceite é também de 1 UO/m3

(médias horárias). Nos EUA os valores recomendados variam muito geograficamente

(Haug, 1993): desde valores tão restritivos como percentis de 99,8 para 2 UO5 /m3, de

99,2 para 1 UO10 /m3 (médias horárias) a valores instantâneos ou de curta duração de

5 a 7 UO/m3. No quadro legislativo holandês (VROM, 21 de Março de 1995) são

estabelecidos dois limites para as concentrações que se poderão verificar nas áreas

envolventes de instalações geradoras de odores. Assim, relativamente ao P98 das

concentrações médias horárias, tem-se como limite inferior a concentração de odor de

1 UO/m3 (a concentração de odor de 1 UO/m3 não pode ser excedida mais do que 2%

do ano perto de zonas habitacionais), e como limite superior as 10 UO/m3 (a

concentração de odor de 10 UO/m3 não pode ser excedida mais do que 2% do ano

perto de zonas habitacionais), sendo estes limites aplicados para instalações já

existentes.

5-AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA

O processo de tomada de decisão entre opções de tecnologia ambiental é hoje bastante

facilitado pela existência de várias ferramentas de gestão ambiental. De entre estas, a

Avaliação de Ciclo de Vida (ACV) é das mais importantes. A ACV tem como ponto

de partida um inventário de emissões de ciclo de vida, para no final se quantificarem

os impactos ambientais (categorias de impacto).

Na Avaliação de Ciclo de Vida todos os fluxos (materiais, energia, emissões gasosas,

líquidas, sólidas, etc.) que atravessam a fronteira do sistema em estudo são

contabilizadas para todo o ciclo de vida do processo/produto (“from craddle-to-

grave”). Deste inventário resulta uma quantidade muito grande de dados numéricos

que, para serem manipuláveis e interpretáveis têm de ser agrupados, através de

factores de equivalência adequados, em cargas ambientais globais, também

designadas por categorias de impacto (aquecimento global, depleção da camada de

ozono, eutrofização, depleção de energia, etc.). A especificação técnica desta

metodologia está descrita nas normas ISO (ISO 14040:1997, ISO 14041:1998, ISO

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29

14042:2000 e ISO 14043:2000). Para a execução de ACVs existem actualmente

vários modelos matemáticos (Menke et al., 1996) e metodologias operacionais

(Guinée et al., 2000; Heijungs et al., 1992; Van den Berg et al., 1995; Jensen et al.,

1999). Uma das primeiras aplicações à gestão de resíduos, para ajudar à tomada de

decisões ambientalmente mais correctas foi feita pela Procter & Gamble (White et al.,

1996); depois disso foi apresentado um novo modelo dedicado (CSR, 2000). Outros

estudos de ACV foram já publicados na área de gestão de RSU (Sonesson, 2000;

Dalemo, 1999; Weitz et al., 1999; Denison, 1996; Camobreco et al., 1999;

Tsiliyannis, 1999; US EPA, 2002, Smith et al., 2001, Grant et al., 2003).

Numa ACV há que definir a “fronteira” do sistema em estudo, o que se mostra na

Figura 18 para a compostagem.

Figura 18-Definição da fronteira do sistema para a Avaliação do Ciclo de Vida dos processos de

tratamento biológico de resíduos sólidos por compostagem (OBS: ainda não está representada a

fase de utilização do composto final)

Na Tabela 12 resumem-se os dados de inventário referentes aos fluxos de materiais,

energia e emissões.

Tabela 12-Inventário de emissões na ACV do processo de tratamento biológico de resíduos

sólidos urbanos por compostagem. (White et al., 1996) Base: 1 ton resíduos (tal qual)

Fluxo ou Emissão

Composto produzido (kg) 500

Consumo de energia eléctrica (kWh) 30

Emissões atmosféricas (g):

CO2 320000

Águas residuais (g):

BOD 81

COD 137

Amónia 14

Page 30: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

30

Emissões gasosas

A maior emissão (em volume) gasosa é a de CO2, que contribui fundamentalmente

para a categoria de impacto de aquecimento global (efeito de estufa). Na

compostagem o carbono orgânico biodegradável é praticamente todo convertido em

CO2. Apenas nalguns casos, em que o processo é deficientemente conduzido, com

formação de zonas anóxicas e anaeróbicas, uma pequena parte é convertido em CH4

(Notar que o efeito de aquecimento do CH4 é várias ordens de grandeza superior ao do

CO2, pelo que a sua contribuição para o aquecimento global pode não ser desprezável;

o CH4 também contribui adicionalmente para as categorias de impacto de formação de

agentes fotoquímicos (p. ex. “smog”)).

Calculemos a quantidade total de gases libertados nos dois processos, assumindo que

se parte dum RSU com tipicamente 50% de humidade: durante a compostagem cerca

de 40% do peso seco (SVT) é gasificado, produzindo-se cerca de 200 kg de gases.

Supondo que o que se decompõe é essencialmente celulose (que tem 44% de C), então

a produção de CO2 é de 323 kg (CO2)/ton RSUbtq (44/12*200=332), ou seja, em

termos volumétricos, é de aproximadamente164 m3

N (CO2)/ton RSUbtq. (Ver Tabela

18)

Para além do CO2, CH4 e H2O também se forma uma pequena quantidade de uma

gama muito grande de outros gases e vapores (odores, COV), como já foi referido

anteriormente. De entre esses vapores destacam-se, pelo seu significado ao nível de

saúde pública e de efeitos globais os seguintes: NH3, H2S, e hidrocarbonetos (COV).

Tanto o NH3 como o H2S contribuem essencialmente para a categoria de impacto de

acidificação; adicionalmente, o NH3 contribui também para a categoria de

eutrofização. Os COV (compostos orgânicos voláteis) contribuem essencialmente

para as categorias de depleção da camada de ozono (estratosférico) e formação de

agentes fotoquímicos.

Efluentes líquidos

A sua quantidade depende muito da natureza do resíduo e do processo tecnológico. Na

compostagem há uma evaporação significativa de vapor de água para a atmosfera; o

pouco lixiviado que se forma é recirculado nas pilhas. Na Tabela 13 resumem-se as

características dos efluentes líquidos na compostagem.

Tabela 13-Características físico-químicas dos lixiviados produzidos no tratamento biológico de

resíduos sólidos urbanos por compostagem (White et al., 1996)

Caixa Tambor

rotativo

Túnel

Quantidade (l/ton) 300 - -

Composição (mg/l):

CBO5 270-485 50-600 3300-7050

CQO 458-808 150-7000 6200-15100

N total 0-1 6-36 0-3

Resíduos sólidos

O resíduo sólido mais importante produzido na compostagem é obviamente o produto

final: composto. Dependendo do tipo de resíduos à entrada do processo, assim se

originarão outros resíduos, consistindo essencialmente nos materiais inorgânicos e

orgânicos não degradáveis separados no início do processo, e que por qualquer motivo

Page 31: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

31

não são recicláveis ou incineráveis. Por exemplo se a instalação tratar bioresíduos (ou

seja, fracção biodegradável dos RSU recolhida separativamente, lamas de esgoto,

resíduos de alimentação e de jardins, etc.), não se produzirão quantidades

significativas de resíduos finais inertes para deposição em aterro.

Consumo energético

O consumo de energia nas instalações de compostagem depende do processo

tecnológico usado e está relacionado com as seguintes actividades: operações

mecânicas de manipulação de resíduos (transporte, moagem, crivagem), produção de

energia para aquecimento do reactor, transporte de fluidos, etc. Verificam-se valores

na gama 20-50 kWh (eléctricos), podendo considerar-se como valor típico o de 30

kWh /ton RSUbtq.

Os resultados duma ACV não são especificamente generalizáveis, pois dependem

muito da região ou país onde o processo de compostagem tem lugar.

Algumas conclusões genéricas podem contudo tirar-se. Como exemplo duma ACV

aplicada à compostagem, analisam-se a seguir resumidamente, os resultados dum

estudo de compostagem em pilha com revolvimento frequente da fracção orgânica

proveniente da recolha selectiva de RSUs numa região australiana; o estudo engloba,

para além das fases de produção do composto, o seu transporte (até 100 km) e

aplicação agrícola em culturas de vinha e algodão (ROU, 2003).

Numa ACV dum processo de compostagem, é feito o balanço entre as emissões

geradas ao longo do ciclo e as evitadas (“avoided”) como resultado dos benefícios da

aplicação no solo. Um exemplo característico é o balanço entre a geração de gases de

estufa (que promovem o aquecimento global, principalmente o CO2 resultante da

queima de combustíveis para a produção de energia necessária à produção e transporte

do composto) e as emissões esses mesmos gases que são evitadas (“avoided”) como

resultado da poupança de fertilizantes convencionais, biocidas e herbicidas, e água de

irrigação (ver adiante Capítulo 6.APLICAÇÕES). O mesmo raciocínio se aplica ao

consumo/produção de materiais e energia como recursos bióticos e abióticos.

Um dos impactos mais salientes do estudo referido acima (ROU, 2003) é o consumo

energético (electricidade e “fuel diesel”) total ao longo do ciclo de vida, o que tem

repercussões a nível das várias categorias de impacto ambiental.

Globalmente a Tabela 14 resume o balanço da avaliação do ciclo sob a perspectiva de

quais as categorias de impacto que são mais afectadas (positivamente e

negativamente).

Tabela 13 - Balanço global dos impactos do ciclo de vida da produção e utilização do composto

(ROU, 2003)

Categorias de impacto afectadas

positivamente

(Benefícios)

Categorias de impacto afectadas

negativamente

(Custos)

Aquecimento Global Formação de Agentes

Fotoquímicos (1)

Toxicidade Humana Depleção de Recursos

Abióticos

Page 32: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

32

Ecotoxicidade (terrestre, e

aquática de águas

interiores)

Ecotoxicidade (aquática

marinha) (2)

Eutrofização (1)

Devido às emissões de CO, COVs, HC e NOx (combustão para

produção de energia e transporte)

(2)

Devido ao facto de que (no caso em estudo), os combustíveis (“fuel

diesel) serem produzidos e consumidos na região costeira marítima

Em termos globais conclui-se que as emissões de gases de estufa, de nutrientes

orgânicos (N, P, e K) (eutrofização) e de produtos tóxicos (ecotoxicidade e toxicidade

humana) resultantes da produção e distribuição do composto (custos), são mais do

que compensadas favoravelmente pelas mesmas emissões que foram evitadas

(“avoided”) como resultado da aplicação e uso do composto (benefícios); essas

emissões foram evitadas em consequência da correspondente redução potencial das

culturas em necessidades de água, fertilizantes, herbicidas, biocidas, e electricidade

(ver adiante Capítulo 6.APLICAÇÕES).

A situação inversa ocorre nas categorias de impacto de formação de agentes

fotoquímicos, de ecotoxicidade aquática (marinha) e de depleção de recursos, em que

os custos ambientais da produção e utilização do combustível para produção de

energia, excedem os benefícios virtuais resultantes da redução potencial das culturas

em necessidades de água, fertilizantes, herbicidas, biocidas, e electricidade.

A análise deste balanço de impactos fornece indicações úteis sobre quais os processos

e fases do ciclo de vida em que poderá haver modificações para diminuir os impactos

negativos.

6-APLICAÇÕES

Para finalizar faz-se uma breve referência às aplicações dum composto. O composto

pode ser utilizado como:

Fertilizante orgânico natural

Corrector de solos

Meio de cultura (em espaços verdes)

Material de cobertura (“mulching”)

Meio (suporte) para bioremediação (p.ex. de gases e vapores poluentes)

A aplicação do composto faz genericamente uso das suas características biocidas,

herbicidas, fertilizante orgânico natural e de condicionador físico e químico dos solos

(intercepção e captação de águas pluviais, melhoramento da estrutura, porosidade e

oxigenação das zonas radiculares, etc).

Os objectivos principais da aplicação de composto são portanto, naturalmente, de

redução de:

Erosão do solo (melhora a intercepção e captação de água, bem como a estrutura do solo)

Consumo de água (retenção de água)

Page 33: Compostagem de resíduos - Fundamentos científicos, tecnologias, impactos, avaliação de ciclo de vida e aplicações

33

Consumo de biocidas e herbicidas (evita a proliferação de ervas daninhas e pestes)

Consumo de fertilizantes

Além disso, o carbono do composto fica retido (“sequestrado”) no solo, em maior ou

menor grau de interacção física e química, em benefício da mitigação do aquecimento

global.

Notar no entanto que, depois de maturado e antes de aplicado no solo, o composto

deve ficar em repouso (em ambiente aeróbio) durante várias semanas até deixar de

diminuir de volume. Antes da aplicação ou armazenamento em local protegido poderá

ainda ser necessária a crivagem de forma a remover contaminantes (vidro, plástico,

etc.) ou material ainda não completamente transformado. A granulometria pode variar

consoante a aplicação: grânulos grandes para a agricultura e finos para a horticultura.

Das principais aplicações destacam-se portanto:

Cobertura (“mulching”) - O composto (pronto ou imaturo) pode ser espalhado pela

superfície do solo para fertilizar, reter a humidade e impedir o crescimento de ervas

daninhas. A camada de composto deve ter pelo menos 5 cm de altura e deve ser

aplicada, idealmente, algumas semanas antes das sementeiras.

Vasos e sementeiras - Para vasos e sementeiras não se deve empregar composto

imaturo visto que grande parte das plantas é sensível a substâncias fitotóxicas. O

composto deve ser misturado com terra numa proporção de 1:2 (uma parte de

composto para duas partes de terra).

Hortas e agricultura - O composto pode ser empregue como cobertura ou

incorporado no solo antes da sementeira ou plantação. A proporção de composto a

aplicar depende das necessidades das culturas e das características do solo.

Para além de ser aplicado como correctivo orgânico e na bioremediação, o composto

pode ser utilizado como material de enchimento na recuperação da paisagem de

antigas minas e pedreiras, na cobertura de aterros, na cobertura de valas e taludes, na

silvicultura, na floricultura e em campos de futebol e de golfe.

Um composto instável (não maturado) aplicado no solo vai continuar a decompor-se

rapidamente e cria limitações ao crescimento vegetal. Se assim for, é preferível

utilizar este composto como cobertura do solo (“mulching”).

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