Comércio Exterior Brasil-China: Anos recentes e perspectivas

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE ECONOMIA Pedro Henrique Reinaldo Lucas Di Candia Jéssica A. Gonçalves Ayumi Tashima Economia brasileira Anos Recentes e Perspectivas Trabalho referente à disciplina “Eco. bras. anos recentes e perspectivas” ministrada pelo professor Victor Leonardo Araújo, sobre as relações comerciais Brasil- China nos anos recentes.

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Este ensaio aborda, de forma sintética, as relações de comércio exterior entre o Brasil e a China, seu comportamento nos últimos anos, e as perspectivas para a continuidade desta relação nos anos seguintes.

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSEFACULDADE DE ECONOMIA

Pedro Henrique ReinaldoLucas Di CandiaJssica A. GonalvesAyumi Tashima

Economia brasileira Anos Recentes e Perspectivas

Trabalho referente disciplina Eco. bras. anos recentes e perspectivas ministrada pelo professor Victor Leonardo Arajo, sobre as relaes comerciais Brasil-China nos anos recentes.

NiteriJunho, 20141. Introduo No presente trabalho, abordaremos as relaes de comrcio exterior entre o Brasil e a China, seu comportamento nos ltimos anos, e as perspectivas para a continuidade desta relao nos anos seguintes. Vale destacar, que tocaremos no assunto de forma bastante sinttica, j que ele tema vastamente analisado e discutido por especialistas, e temos o total conhecimento de que um trabalho apenas jamais abrangeria todos os dados, perspectivas e contradies que o cercam. importante ressaltar que este estudo procura no apresentar qualquer vis que possa aparentar defesa ou critica desta ou daquela politica, tanto para a economia brasileira quanto para a economia chinesa. Para tanto, recorremos a uma leitura critica de diversos autores, filiados s mais variadas escolas do pensamento econmico, aos quais utilizamos para apresentar os dados colhidos da forma mais neutra possvel. Quanto ao tema do trabalho propriamente dito, o objeto central da nossa anlise girar em torno do incremento expressivo da presena chinesa no comrcio externo brasileiro, sobretudo a partir de 2002. Analisaremos os impactos desta intensificao de relaes comerciais para o setor externo de nossa economia, e as perspectivas quanto a estes impactos no futuro prximo, a partir da reduo no ritmo de crescimento alucinante que a China vinha mantendo anteriormente. Para cobrir com a abrangncia necessria o tema e os objetivos citados acima, o presente estudo ser composto da seguinte forma: Num primeiro momento, ser feita uma breve retomada histrica dos processos de abertura comercial empenhadas pelas economias brasileira e chinesa; posteriormente, entraremos no mbito das relaes de comrcio bilateral sino-brasileiro, suas peculiaridades e seus efeitos sobre a economia brasileira, destacando aspectos como vulnerabilidade e insero externa; finalizando a anlise, traremos a discusso para os trs ltimos anos, e abordaremos as perspectivas para o comercio exterior brasileiro, posto que a China tem reduzido seu ritmo de crescimento, mesmo ainda mantendo-o em patamares elevados.

_________________ O conceito de vulnerabilidade externa, que ser arduamente utilizado nesse trabalho, remete a definio de Reinaldo Gonalves e Lus Filgueiras em A economia poltica do governo Lula [FILGUEIRAS & GONALVES,2011]: capacidade de uma economia de resistir a presses, fatores desestabilizadores e choques externos.NDICE:

1. Introduo.........................................................................................................3

2. Abertura comercial na economia brasileira2.1 Dcada de 90 Collor e FHC..........................................................................42.2 O perodo Lula e o setor externo da economia.........................................x

3. China3.1 A abertura comercial chinesa...............................................................................x3.2 O comrcio bilateral e a vulnerabilidades externa da economia brasileira............................................................................................................x3.3 Novo padro de crescimento chins...................................................................x

4. Relaes recentes e perspectivas 4.1 Comrcio exterior Brasil- China de 2011 at hoje...............................................x4.2 A desacelerao do crescimento chins e o comrcio externo brasileiro...........x

5. Concluso....................................................................................................................x

6. Referncias bibliogrficas.....................................................................................x

2. Abertura comercial na economia brasileira Neste captulo iniciaremos com um breve histrico que situe as bases da abertura comercial empreendida na economia brasileira ao longo dos anos 90, nos governos Collor e FHC e mantida pela gesto do presidente Lula. Considera-se importante essa retomada, para apresentar a ideia de que a abertura comercial brasileira no veio do nada, mas sim, fez parte de um projeto neoliberal amplo implementado no Brasil a partir de 1990. No segundo sub-item, entramos na analise do governo Lula propriamente dita, destacando a possvel relao da sua gesto com a melhora dos resultados do setor externo.

2.1. Dcada de 90 Collor e FHC A dcada de noventa foi marcada pela emerso do Neoliberalismo no Brasil: conjunto de polticas de cunho ortodoxo que objetivavam o equilbrio de longo prazo. Sua estratgia baseada em dois segmentos administrativos: A estabilizao macroeconmica com foco na inflao e nas contas pblicas; e a obteno de um ambiente favorvel ao mercado livre que resultar na volta do investimento e do crescimento econmico. Representando a consolidao deste pensamento, o Consenso de Washington, seguido fidedignamente no Brasil dos anos 90, oferece um receiturio de polticas com o intuito de guiar o alcance dos objetivos supracitados. Na verdade, quanto ao primeiro objetivo, pouco se importou no que diz respeito ortodoxia das medidas tomadas. Quanto ao segundo, isto , a criao de um ambiente pr-mercado, esta s seria garantida frente a realizao de reformas estruturais, que envolvessem a desregulamentao e a abertura dos mercados.No caso brasileiro, a estratgia neoliberal comea a ser implantada ainda no governo de Fernando Collor (1990-1992), passando pelo breve governo de Itamar Franco (1992-1994) e enfim se intensificando nos governos de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 1999-2002). Ao longo de toda dcada de oitenta, prevalece no Brasil, uma desordem macroeconmica. Aps vrios planos econmicos mal sucedidos, a economia encontra-se com uma ameaa hiperinflacionria e uma corrida s chamadas quase-moedas. A riqueza financeira era deslocada para o consumo, direcionada aquisio de bens e ativos reais. Diante deste cenrio, os agentes econmicos tinham conscincia de que apenas medidas radicais seriam capazes de restaurar a legitimidade da moeda. nesse contexto de perturbaes que eleito o candidato Fernando Collor de Mello. No havia dvidas que o plano econmico do novo governo seria composto por medidas fortes. Em 16 de maro de 1990 anunciado o novo plano econmico, posteriormente cunhado de Plano Collor. Muito mais drstico do que o previsto, apoiava-se em uma reforma monetria e um bloqueio das aplicaes financeiras. Foi institudo ainda um regime de cmbio livre, reduo de gastos governamentais acompanhada de uma reforma administrativa, ampliao da incidncia do imposto de renda, congelamento de preos com data pr-determinada, entre outras medidas. J em junho do mesmo ano comea a tomar forma a liberalizao econmica do comrcio exterior. Foram abolidos controles administrativos sobre importaes, e houve uma reduo escalonada dos impostos pagos sobre os importados. Deu-se tambm uma ampla reforma monetria que constituiu, seno a mais, uma das mais importantes partes do plano. Esta envolveu troca de padro monetrio e truques de converso. Apesar da amplitude e importncia, no cabe aqui, para uso do presente trabalho, aprofundar sua anlise.Durante os anos que se seguiram, a abertura comercial e financeira foi revisitada e aprofundada por diferentes governos. Como foi citado acima, Fernando Henrique Cardoso aprofundou a poltica neoclssica no cenrio brasileiro a partir da implantao o Plano Real que, segundo Belluzo & Almeida (2002 ,p. 373), parecia ter um objetivo mais amplo: seria um projeto neoliberal de desenvolvimento que supunha a conversibilidade relativamente rpida das estruturas produtivas e da produtividade da economia brasileira na direo dos padres competitivos e modernos das economias avanadas. Ainda segundo os autores, tal estratgia de desenvolvimento, associada s recomendaes do Consenso de Washington estavam apoiadas, entre outras coisas, na abertura comercial, que imporia disciplina competitiva aos produtores domsticos, e na liberalizao cambial que atrairia poupana externa.Cabe ressaltar que a liberalizao e abertura financeiras significaram que os residentes do pas tinham agora, maior facilidade na aquisio de ativos e passivos em moedas estrangeiras e que os no-residentes poderiam adentrar o mercado domstico. Uma medida sria e com amplas consequncias. Dentre elas, destacamos uma elevao da necessidade de financiamento externo aumentando a vulnerabilidade externa da economia. A convergncia dessas consequncias negativas culminou na crise cambial de 1999, dada em razo do crescimento excessivo dos passivos externos frente ao fluxo insuficiente de capitais e resultou em uma perda de reservas internacionais de US$ 10,75 bilhes no primeiro trimestre do ano. Aps tal colapso, feita uma mudana do regime cambial e monetrio que, no entanto, no chega a alterar a caracterstica estrutural da economia brasileira. em um cenrio de insatisfao popular e declnio da hegemonia neoliberal que ocorrem as eleies presidenciais de 2002. Marcelo Carcanholo [2010, p.xxx] define muito com maestria este cenrio: A vitria do candidato Lula parecia trazer consigo as esperanas, no apenas no Brasil mas no restante da Amrica Latina, de que a hegemonia neoliberal comearia a declinar. O novo governo assume no incio de 2003 tendo que equacionar duas coisas: a chamada herana maldita do governo anterior, definida pelas armadilhas construdas pelo processo de abertura e desregulamentao da economia, e que produziram os resultados pfios dos anos 90 e inicio do sculo XXI, e a expectativa popular de mudana na estratgia de desenvolvimento.

2.2. Perodo Lula o setor externo da economia. Concluda esta breve retomada histrica, fundamental para a noo de que a poltica externa empenhada a partir de 2002 no caiu do cu, partiremos para uma anlise mais direta do setor externo brasileiro no perodo Lula. Lula assume a presidncia em janeiro de 2003, mas j anteriormente dava indcios da forma como seria conduzida a poltica externa em seu governo. Mesmo antes de ser eleito, quando sua campanha ganhava fora, o ex-presidente disse na famosa Carta ao povo brasileiro: Estamos de novo atravessando um cenrio semelhante. Substitumos o populismo cambial pela vulnerabilidade da ncora fiscal. O caminho para superar a fragilidade das finanas pblicas aumentar e melhorar a qualidade das exportaes e promover uma substituio competitiva de importaes no curto prazo.(...) A reforma tributria, a poltica alfandegria, os investimentos em infraestrutura e as fontes de financiamento pblicas devem ser canalizadas com absoluta prioridade para gerar divisas. [LULA,2002. p.2]

Por este pequeno trecho reproduzido j se pode ter uma noo do que seria o cerne do governo petista na conduo da poltica externa: reduzir a to falada vulnerabilidade externa da economia brasileira, aprofundada pelas polticas desordenadas de abertura de Collor e FHC. Como? Aumentando e qualificando as exportaes, reduzindo competitivamente o volume de importados e fazendo crescer as reservas internacionais. Para qu? Para qualificar a insero externa e permitir que a taxa de juros domstica fosse reduzida, recuperando a capacidade de investimento pblico e criando as bases para a retomada do crescimento econmico. Outro ponto que aparece com clareza no programa de governo lulista a crtica direta ao que ele chama de insero internacional dependente e subordinada pelo seu aspecto financeiro, conforme destacado por Adhemar Mineiro [MINEIRO,2010. p.35]. Nesse sentido, dizia um trecho do item 11 do documento Concepo e diretrizes do programa de governo do PT para o Brasil: as polticas aplicadas transformaram a dependncia do capital estrangeiro em um mecanismo de internalizao da instabilidade do mercado financeiro globalizado. Para resolver esta questo, a proposta passava, alm da j citada elevao do saldo comercial, pela reduo da dependncia dos mercados centrais, sobretudo EUA, Europa e Japo, por intermdio de uma insero internacional diversificada, expandindo o comrcio exterior brasileiro para outros mercados em iminente crescimento como a China, a India e o prprio Mercosul. Portanto, a ideia do novo governo, de forma resumida, era: ampliar os saldos comerciais externos, para acumular reservas e se precaver contra potenciais fugas de capitais rumo ao exterior. Para isso, era importante aprofundar as exportaes para aqueles mercados j consolidados, e buscar mercados novos em expanso. Como era amplamente conhecido o fato de que o Brasil tem um coeficiente alto de importaes, sobretudo no setor industrial, a busca de supervits comerciais amplos era pautada num crescimento acelerado das exportaes, principalmente de agrcolas e minerais, carros-chefes da pauta exportadora brasileira. To fundamental quanto, era reduzir o dficit na conta de servios do BP, ainda para fazer declinar o dficit em transaes correntes. Deixando de lado agora as abstraes dos programas de campanha e governo, partamos para uma anlise mais prtica das aes referentes ao setor externo tomadas pelo novo governo, e seus principais resultados efetivos. Para comear, a importante o destaque de que o governo Lula eleito em um cenrio de grande fragilidade externa: o balano de transaes correntes apresenta dficit em torno de 4% em 2002, o contexto internacional era conturbado, e a fuga de capitais era constante, fazendo o dlar saltar de R$ 2,35 para R$ 4,00 no segundo semestre do ano. Toda esta turbulncia ainda ameaa os principais ndices de preos domsticos, com a inflao correndo risco de sair do controle. No meio do ano de 2002, ainda sob a gesto FHC, um acordo costurado com o FMI (com a adeso dos principais candidatos sucesso), gerando um aporte de R$ 23 bilhes de dlares para nossas reservas internacionais. Como conclui Mineiro [2010, p.49] esse acordo fundamental para ir tranquilizando aos poucos o cenrio, mas uma espcie de delimitador das aes do novo governo (que viria a ser o governo Lula) j que todos os candidatos, inclusive o prprio Lula, se comprometeram a seguir os pontos negociados com o FMI. Pontos estes que envolviam a manuteno da abertura comercial e financeira, o cmbio flutuante, o regime de metas de inflao e as metas de supervits primrios em torno de 4% do PIB. Agora sim, tomando uma anlise mais efetiva dos resultados do governo Lula no que toca o setor externo, a melhora inegvel: os saldos comerciais crescem de US$ 13 bilhes em 2002 para US$ 25 bilhes j em 2003, e atingem quase R$ 45 bilhes em 2005. O volume total das exportaes tambm cresce sensivelmente, pulando de cerca de US$ 60 bilhes em 2002 para quase US$ 120 bilhes em 2005. O destino das exportaes tambm teve sua composio alterada: at 2002, um tero dos exportados iam para pases em desenvolvimento e os dois teros restantes para os mercados centrais (Europa, EUA e Japo). Em 2005, essa diviso j estava em meio a meio, com destaque para a Amrica Latina e a China. O acmulo de divisas tambm teve uma melhora sensvel nos primeiros anos de governo Lula: saltamos de US$ 38 bilhes em 2002, j computado o aporte financeiro do FMI mencionado anteriormente, para mais de US$ 50 bilhes em 2005 (com o aporte concedido em 2002 j devidamente pago e o acordo com o FMI no tendo sido renovado). Conforme averigua Mineiro [2010, p.50], a margem de manobra da politica externa brasileira havia se ampliado, com maior possibilidade de buscar alternativas e menor dependncia da ampliao de mercados no curto prazo, ou seja: a questo do investimento direto externo poderia finalmente prevalecer sobre os acordos comerciais de emergncia, geralmente desfavorveis a nossa autonomia. Porm, se no destacamos ainda nesse trabalho nenhuma grande mudana na politica externa do governo Lula frente ao seu antecessor, o que explicaria tamanha melhora da economia brasileira no seu quadro externo? Certamente, essa resposta tem de passar pelo aquecimento geral do comrcio mundial, particularmente no setor de commodities e minerais, mais particularmente ainda, com a crescente demanda chinesa, como trataremos de forma especfica mais adiante. A resposta tem de tocar tambm no intenso dinamismo do agronegcio brasileiro, sobretudo a partir de 2003, como um dos fatores que mais contribuiu para o boom das exportaes, conforme destacado pelo professor Marcos Macedo Cintra [2005, p.41]. Alm disso, a situao econmica internacional apresenta-se extremamente favorvel a partir de 2003, em todas as suas esferas, conforme anlise feita por Lus Filgueiras e Reinaldo Gonalves. [2007, p.56-57] Para os autores, a reduo da vulnerabilidade e a melhora das contas externas foram uma tendncia geral no mundo, naqueles anos. Ou seja, o mundo todo cresceu (com exceo dos EUA) e puxou o Brasil consigo. Eles ainda vo mais fundo na crtica, afirmando que o governo Lula, no s no foi o responsvel pela melhora do quadro, como ainda deve ser responsabilizado pela perda de uma extraordinria oportunidade criada pelo contexto internacional. [FIGUEIRAS & GONALVES, 2007. p. 58]. A oportunidade a que se referem, seria de reduzir de fato a vulnerabilidade externa brasileira, pr em marcha reformas estruturais que tirassem o Brasil das armadilhas comercial, fiscal e cambial, e diminussem esta dependncia to estrita em relao ao cenrio externo e aos humores do mercado financeiro internacional. Ainda nesta linha, importante ressaltar que embora tenha havido, inegavelmente, um crescimento real no nvel das exportaes, estava em curso, tambm de forma inegvel, um processo de especializao retrgrada, ou seja: uma parcela cada vez maior, tanto no valor agregado, quanto no volume, das exportaes brasileiras, era ocupada pelos bens primrios e intensivos em recursos naturais. J os bens intensivos em tecnologia, mantiveram a tendncia de reduo proporcional que j vinha sendo observada antes do governo Lula se iniciar. Dentre muitos debates e discusses acerca do setor externo brasileiro no perodo Lula, trs definies soam como unanimidade: a melhoria dos indicadores referentes ao setor externo nos primeiros anos do governo; o fato de que o comrcio mundial estava aquecido e isto teve papel fundamental para a melhoria observada; e a importncia dos novos mercados internacionais nesse processo. Dentro deste espectro de novos mercados, destacam-se a Amrica do Sul, a Rssia, a ndia, a frica do Sul, e, em maior intensidade que todos estes, a China. Nos prximos tpicos do trabalho, entraremos diretamente na anlise central a que nos propomos: a importncia da ascenso meterica da economia chinesa, sobretudo ps 2002, para a melhora do quadro externo brasileiro, e as perspectivas das relaes comerciais Brasil-China nos prximos anos.3. China

Aqui, voltaremos nossa anlise diretamente para a economia chinesa. Primeiramente, ser abordada de forma sucinta a abertura comercial empreendida com rarssimo sucesso, e por que no, competncia, pelo governo chins, iniciando-se em 1978, e colhendo seus interminveis frutos at os dias de hoje. No segundo tpico do captulo, colocaremos a economia brasileira neste caminho, abordando diretamente o comrcio bilateral sino-brasileiro, as bases que expliquem seu expressivo incremento nos ltimos anos e sua importncia para o setor externo de nossa economia, com destaque para a questo da vulnerabilidade externa. No terceiro e derradeiro tpico, falaremos brevemente do processo de primarizao da pauta exportadora brasileira, da perda de espao que a crescente da economia chinesa tem imposto s exportaes brasileiras, e do novo padro de crescimento da economia da China.

3.1 A abertura comercial chinesa Antes de analisarmos relao bilateral que o ponto central do trabalho, faz-se necessrio contextualizar, com base Acioly,L. Pinto, E.C & Cintra M.(2011), a economia chinesa. Nas ltimas trs dcadas, o desempenho da China na Produo mundial aumentou significativamente. A partir de dados do FMI, possvel verificar que entre 2000 e 2005, perodo de expanso da economia global, a participao chinesa no PIB mundial elevou-se de 3,7% para 5%. Essa tendncia continuou entre 2005 e 2010, apesar da crise internacional, cujo impacto negativo foi menor na China do que nos demais pases, o que percebido no crescimento da participao de 5% para 9,3%. J em relao a produo chinesa, o perodo compreendido entre 2000 e 2009 foi marcado por mudanas significativas em seu processo mundial de integrao comercial. Essa integrao marcada pelas altas taxas de exportao e importao chinesas que tm crescimento superior s taxas mundiais, e tem relao direta tanto com o volume quanto com localizao de seus fluxos. Exemplo disso o comparativo da elevao da corrente de comrcio mundial da China com o Mundo (4,6 vezes) e da mdia mundial (1,9 vezes), passando assim a ser o maior exportador e o segundo maior importador mundial. Cabe tambm observar que aps a crise internacional de 2008 essa tendncia se acelerou, pois a participao chinesa nas exportaes saltou de 9,7% em 2009 para 10,4% em 2010 e nas importaes mundiais de 7,9% em 2009 para 9% em 2010.[Acioly,L. Pinto, E.C & Cintra M.(2011).p. 8-17] procura responder como, em apenas trs dcadas, se deu o milagroso crescimento chins, utilizando-se de variveis externas e internas ao seu territrio. As condies iniciais para a arrancada chinesa surgem em 1978, por meio da configurao de novos, poca, condicionantes: Externos parceria estratgica que possibilita a incluso da China ao mercado de bens e ao mercado de capitais norte-americanos, possibilitando, entre outras coisas, a manuteno de sua taxa nominal de Yuan em relao ao dlar. Internos processo de abertura ao mundo exterior, captando IDE e introduzindo tecnologias e mtodos modernos de administrao por meio das Zonas Econmicas Especiais e das Zonas de Desenvolvimento Econmico e Tecnolgico. Assim como a eliminao do monoplio do comrcio exterior pelo governo, em 1986, possibilitando aos exportadores e importadores maiores liberdade para transacionar seus bens e servios, ao mesmo tempo em que introduziu um sistema de barreiras tarifrias e no tarifrias (CUNHA & ACIOLY, 2009). Essas condutas foram pautadas pela nova estratgia de desenvolvimento, idealizada pelo XI Comit Central do Partido Comunista Chins em 1978 (Fiori, 2008; Medeiros, 2008). preciso destacar que esta estratgia da China (iniciada em 1978 e reforada em 1992) gerou dois padres de crescimento que se articularam at a crise de 2008: promoo das exportaes, com foco em setores mais dinmicos da cadeia produtiva global, e do desenvolvimento interno, por meio do elevado supervit na conta Capital e Financeira para a eliminao de gargalos estruturais. Em concluso, tais transformaes ocorridas, levaram a uma rpida expanso da participao chinesa no comrcio global e ao desenvolvimento/aumento de sua indstria, fortalecendo assim sua pauta exportadora de forma dinmica e de crescente intensidade tecnolgica. J em relao ao seus parceiros comerciais, a alterao da demanda de produtos menos industrializados (mquinas e equipamentos) e a importao de mais commodities, tais como petrleo e minrio de ferro, levaram a aproximao natural de pases em desenvolvimento no comeo do sculo XXI. [Pinto, E. C (2011) p. 37]

3.2 O comrcio bilateral e a vulnerabilidade externa da economia brasileira O que queremos demonstrar com esta parte do trabalho que uma possvel conteno das armadilhas presentes no setor externo brasileiro foi, em grande parte, obtida pela participao da economia chinesa no nosso comrcio internacional. Porm, como veremos mais a frente, as consequncias de tal aproximao desse parceiro comercial tornaram-se nocivas estrutura produtiva brasileira e que de fato vm contendo apenas temporariamente tais armadilhas. Concludo o panorama chins de crescimento ao longo do sculo passado, viabilizando a expanso tanto de suas exportaes quanto de suas importaes, faz-se necessrio retornar ao conceito posto no tpico anterior sobre a vulnerabilidade externa brasileira. Os elevados dficits em transaes correntes (anos 90) colocado estruturalmente pelo processo de abertura externa, leva ao aumento do passivo externo em virtude da maior entrada de recursos para financiar aquele dficit. Entretanto, isso implica o maior pagamento do servio deste passivo, o que volta a elevar o dficit da balana de servios, gerando um crculo vicioso de endividamento externo (CARCANHOLO,2010 p. 119). Com a China aumentando a demanda dos produtos que preponderam na pauta de exportaes da economia brasileira e que apresentavam preos em alta, em 2001-2003, devido acelerao do ritmo de crescimento do comrcio mundial, ocorre a melhora do saldo em transaes correntes. Essa melhora nas contas externas impulsionara a reduo da dvida externa total e a diminuio dos servios pagos a esta dvida. Desta forma o crculo vicioso antes descrito demonstra-se interrompido. Porm o que se percebe ao verificar a composio da dvida pblica federal uma mudana na composio, ou seja, um deslocamento da dvida externa para a dvida interna continuando com os elevados gastos com servios da dvida. [Gentil, D. L. e Araujo, V. L. (2011) p. 12]. Alm disso, outro processo que parece ter sido mascarado com o supervit em transaes correntes pelo governo Lula, o aprofundamento da reestruturao industrial, fruto do processo de abertura comercial, que cria um efeito de especializao retrgrada fragilizando ainda mais o setor externo. Logo a dependncia do saldo positivo em transaes correntes se torna a melhor forma de conter temporariamente tal armadilha. Conforme citado rapidamente no captulo anterior, a estrutura da pauta comercial brasileira tem mudado nos ltimos dez anos em relao a composio tanto das exportaes quanto das importaes. Utilizando-se a classificao da organizao das Naes Unidas para produtos comercializados, por intensidade tecnolgica dados at 2009 -, verifica-se que, em 2000, cerca de 50% das exportaes brasileiras eram de produtos primrios e as manufaturas intensivas em recursos naturais. Os produtos de alta, mdia e baixa tecnologia representam, respectivamente, 12%, 26% e 13% do total exportados. Em 2009, os produtos primrios e as manufaturas intensivas em recursos naturais j respondiam por quase dois teros das exportaes brasileiras, enquanto os produtos de alta, mdia e baixa tecnologia responderam conjuntamente por 32,7%. Este quadro acentuou-se particularmente a partir de 2005, sendo os produtos de baixa e alta tecnologia os que mais perderam participao na pauta. No caso das importaes, entre 2000 e 2009, houve aumento na participao dos produtos importados de baixa tecnologia (de 5% para 10%) e de alta tecnologia (34% para 37%) e reduo no caso das importaes de produtos de alta tecnologia (de 24% para 20%), assim como de produtos primrios e manufaturas intensivas em recursos naturais (de 37% para 33%). [Acioly,L. Pinto, E.C & Cintra M.(2011) p. 320] Observando-se a balana comercial brasileira no perodo 2000-2010, por intensidade tecnolgica do produto, pode-se concluir que o Brasil sistematicamente deficitrio em produtos de alta tecnologia e parcialmente em produtos de mdia tecnologia. Os supervits em produtos de baixa tecnologia vm se reduzindo, com tendncia de dficits nos prximos anos. Os saldos positivos apresentam-se do lado dos produtos primrios e das manufaturas intensivas em recursos naturais. Este efeito de reduo da intensidade tecnolgica devido, principalmente, a atuao da China por meio de sua poltica cambial manipulada e dos altos nveis de produtividades de suas indstrias. Isso vem causando significativo dficit comercial para o Brasil no caso dos produtos de mais alta intensidade tecnolgica em mercados terceiros (Europa, EUA e Amrica Latina, sobretudo). Corroborando esta afirmao, revelou Luciana Acioly (pesquisadora do IPEA e especialista em China) em matria publicada na Revista Carta Capital: a participao brasileira na corrente de comrcio da Amrica do Sul est estagnada h mais de uma dcada em 11%. Em 2000, os chineses detinham 2,5% de participao. Em 2010, esse nmerosaltou para 12,5%. Analisando os dados da pauta de exportaes do Brasil para a China, Thorstensen (2011) afirma que a pauta vem se concentrando em produtos bsicos. Entre 2000 e 2009, os produtos bsicos passaram de 68% para 83% da pauta. Os produtos que apresentaram a maior participao das exportaes, em 2010, foram minrios (40%), oleaginosas (23%) e combustveis minerais (13%), que juntos responderam por 76% das exportaes brasileiras. Essa anlise apenas refora o carter de perda do dinamismo da pauta exportadora sendo ela mais uma das caractersticas da fragilidade externa de nossa economia. 3.3. O novo padro de crescimento chinsOutro evento de extrema importncia que intensificou esta relao do Brasil com a China foi a alterao do padro de crescimento chins. Este novo padro, conforme descrito pelo primeiro ministro do conselho de estado chins Wen Jaibao ( JAIBAO, 2011) procura atravs do reforo de ampliao do consumo das famlias, sobretudo os de baixa renda, e da desconcentrao regional dos investimentos, para sustentar, (mesmo que com taxas um pouco menores) o crescimento de longo prazo e a manuteno da estabilidade de preos.(JAIBAO,2011). O premier, em relatrio apresentado na Assembleia Popular Nacional em maro de 2011, procura expor estas preocupaes e dar solues de mdio e longo prazo que posteriormente sero utilizadas pelo XII Plano Quinquenal 2011-2015.Essa intensificao do mercado interno chins ir levar ao aumento de demanda de commodities que por sua vez ter efeitos relevantes tanto no mbito comercial quanto financeiro na economia brasileira. Utilizando os trabalhos de Pinto (2010 a, 2010b) e Holland e Barbi(2010) so apresentados algumas possveis mudanas em curso no cenrio externo brasileiro: O efeito China pode estar invertendo, no mnimo no mdio prazo, os termos de troca em favor dos pases perifricos produtores de matrias-primas. Por um lado, a necessidade chinesa de grande quantidade de matrias-primas e alimentos reitera a posio altista dos preos das commodities. Por outro lado, a produo de manufaturas chinesas, intensiva em trabalho e tambm emtecnologia, para o mercado interno e para exportao refora a posio baixista ________________Disponvel no stio: Http://www.cartacapital.com.br/economia/brasil-perde-espaco-para-china-na-america-latinados preos desses produtos, devido ao efeito escala da produo chinesa. Isto apenas acentuar o efeito de reduo da intensidade tecnolgica na pauta exportadora e presso sobre a produo nacional de industrializados. A forte injeo de liquidez pelo governo americano, durante e aps o auge da crise, no reverte em significativos aumentos no produto, nos investimentos e nos emprego, gerando assim excesso de liquidez. Dado que os EUA so o emissor da moeda mundial, este excesso gera dois movimentos: i) a desvalorizao do dlar em relao s outras moedas exceo ao caso chins que adota estratgia reativa de atrelamento de sua moeda ao dlar; ii) a abundncia de dlares no mercado mundial. Isso significa aumento de liquidez que se destina busca de aplicaes rentveis mercados futuros de commodities e aplicaes em mercados de ttulos e aes -, especialmente nos pases emergentes, pressionando ainda mais a valorizaes das moedas locais e dificultando a competitividade de suas exportaes. Este possvel mudana , no Brasil, bastante perigosa podendo afetar as transaes correntes de forma negativa, necessitando incentivar ainda mais a capitao de IDE para equilibrar o balano de pagamentos. Sendo as taxas de juros brasileira j elevadssimas (em relao as taxas globais), uma possvel valorizao cambial, em um ambiente de forte abertura comercial e financeira, pode acabar provocando aumentos da dvida pblica bastantes comprometedores. No mbito do fluxo de capitais, essa nova dinmica pode significar uma realocao dos IDEs, no Brasil, ao se destinarem setores voltados aos suprimentos de alimentos e matrias-primas destinadas ao mercado chins. Concluindo o argumento deste captulo: se no forem superados esses obstculos e se desperdiadas as oportunidades, a vulnerabilidade externa estrutural a especializao regressiva da pauta exportadora e da estrutural industrial brasileira tende a agravar-se como fenmeno de longo prazo e, segundo Gonalves et al. (2009), aprofundar as assimetrias no padro de comrcio, na eficincia do aparelho produtivo, na dinmica tecnolgica e na solidez do sistema financeiro nacional. Essa situao est associada ao fato de que a irradiao do progresso tcnico ficar restrita aos setores exportadores sobretudo os grupos econmicos industriais produtores de commodities. [Acioly,L. Pinto, E.C & Cintra M.(2011) p. 346]