Classificação dos tributos - Eurico Marcos Diniz de Santi (Artigo)

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    Artigo - Federal - 2012/3157

    Tributo e classificao das espcies no sistema tributrio brasileiro

    Eurico Marcos Diniz de Santi*

    Nota:

    Artigo elaborado no NEF - Ncleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito da Fundao Getulio Vargas - DIREITO GV.

    1 - Relevncia do estudo das definies e classificaes no direito tributrio

    A definio de "tributo" um conceito fundamental para a demarcao do direito tributrio. Est para a dogmtica do

    direito tributrio assim como a definio de "norma jurdica" est para o Direito. A delimitao do conceito de norma

    jurdica define o liame que separa o direito do no-direito; o mundo jurdico, do universo da moral, da tica e de outras

    interaes normativistas reguladoras da conduta humana. Estar dentro ou fora dos limites do direito a circunstncia que

    determina a existncia ou no de efeitos jurdicos, de direitos subjetivos e obrigaes jurdicas; em suma, enseja a propulso

    ou no desse instrumento, que o direito, sobre a regio das condutas intersubjetivas.

    Tal demarcao , ainda, nuclear na definio do objeto de estudo do direito tributrio (as letras maisculas indicam a

    denotao de uma cincia). Se fixarmos esse objeto como o conjunto das proposies jurdicas que correspondem, direta ou

    indiretamente, instituio, arrecadao e fiscalizao de tributos, podemos inferir que o objeto do direito tributrio

    funo imediata da definio do conceito de "tributo"; mais, que tal determinao tem efeitos estritamente jurdicos.

    Salientar esse aspecto vale para no coactar ilaes em descompasso com o esprito informador da chamada proposta

    "didtica" da separao desse ramo do direito. A grande preocupao dos autores, arautos da proposta, contrapor a vitandaidia de outorgar ao direito tributrio a qualidade de "cincia autnoma do direito", desprestigiando o cnone da unidade do

    ordenamento jurdico e a viso sistemtica do direito, que pressupe o entrelaamento das regras de todos os ramos do

    ordenamento jurdico.

    Afianar que o direito tributrio autnomo para fins didticos no quer dizer que sua demarcao no apresente efeitos

    jurdicos. A definio de "direito tributrio" jurdica e tem - assim como a determinao do que "bem imvel", "direito

    penal", "ato administrativo", "contrato de trabalho" - importncia capital no s em termos tericos, mas tambm com

    reflexos diretos na vida do cidado e na prtica do jurista e do profissional do direito. Saber se dada obrigao tributo ou

    no determina sua forma de instituio, garantias especficas ao sujeito passivo, forma privilegiada de cobrana mediante

    execuo fiscal, alm de, entre muitas outras peculiaridades, estabelecer os prazos decadencial e prescricional do direito de

    repetio do indbito.

    Nesse sentido, como bem asseverou Luciano Amaro, a classificao das espcies tributrias no mera questo acadmica,

    "pois da capitulao de tais figuras como espcies tributrias depende sua sujeio aos princpios tributrios, cuja aplicao

    pode modificar ou mesmo, em dadas circunstncias, inviabilizar a exigncia tributria".

    De outra parte, importa adiantar que toda definio classificatria, na medida em que compe duas classes: a que atende e

    a que no atende ao critrio do definiens (ser ou no "tributo", por exemplo). Da mesma forma, toda classificao tambm

    definitria, pois delimita o que e o que no "taxa", "imposto", "contribuio", etc.

    2 - Sobre o ato de classificar

    Segundo John Hospers, durante muito tempo acreditou-se que havia uma relao natural entre as palavras e aquilo que elas

    representavam. Confundia-se a palavra com a coisa, a palavra "gato" com a criatura gato, a palavra "crime" com o fatocrime, ao ponto de, em civilizaes primitivas, crer-se que o emprego de certas palavras tinha efeito sobre a coisa

    significada.

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    No universo da linguagem simblica, a relao entre significante e significado convencional. "No h tal conexo natural:

    as palavras so signos arbitrrios, os significados das palavras no so descobertos, mas sim assinalados

    convencionalmente". E, dado que as palavras so convencionais, no se pode afirmar que uma palavra correta ou incorreta

    quando representa uma coisa.

    No se avana de forma sria e criteriosa no estudo do tema da definio de tributos e da classificao das espcies

    tributrias sem a necessria digresso ao campo da semntica ou cincia do significado. Semntica a parte da semitica

    que estuda o significado das palavras, i., os signos em relao com os objetos designados. Primitivamente, a semntica

    tratava de estudar as linguagens naturais, o modo como os significados se atribuam s palavras e suas modificaes atravs

    do tempo. Denominava-se, ento, semntica descritiva ou lingustica, a qual tinha como sub-ramo a lexicografia (disciplina

    que busca estabelecer o significado das palavras de um idioma em um momento dado para composio de dicionrios).

    As coisas no mudam de nome; ns que mudamos o modo de nomear as coisas. Portanto, no existem nomes verdadeiros

    das coisas. Apenas existem nomes aceitos, nomes rejeitados e nomes menos aceitos que outros. A possibilidade de inventar

    nomes para as coisas chama-se liberdade de estipulao. Ao inventar nomes (ou ao aceitar os j inventados), traamos

    limites na realidade, como se a cortssemos idealmente em pedaos; ao assinalar cada nome, identificamos o pedao que,

    segundo nossa deciso, corresponder a ele. Um nome uma palavra tomada voluntariamente como uma marca que pode

    suscitar em nosso esprito um pensamento semelhante a algum outro pensamento que tivemos antes e que, sendo formulado

    perante os demais homens, para eles um signo que representa o pensamento que havia no esprito do interlocutor antes de

    falar.Como ensina Paulo de Barros Carvalho, "ao mesmo tempo em que todos os nomes so nomes de uma coisa, real ou

    imaginria, nem todas as coisas tem nome privativo. Algumas reivindicam designao distinta, em funo de sua

    individualidade, como acontece com as pessoas e com certos lugares que se tornam famosos. Mas h objetos que no tem

    nome prprio, de tal maneira que, se for preciso indic-los, empregam-se nomes gerais, aptos para abrang-los em nmero

    indefinido".

    3 - Classificao e os conceitos de (G) gnero prximo e (De) diferena especfica

    Um nome geral denota uma classe de objetos que apresentam um mesmo atributo. Nesse sentido, atributo significa a

    propriedade que manifesta um dado objeto. Todo nome cuja significao est constituda de atributos em potencial o nome

    de um nmero indefinido de objetos. Portanto, todo nome geral cria uma classe de objetos. As classes de objetos so criadas

    por nomes gerais. Ordinariamente, um nome geral introduzido porque temos a necessidade de uma palavra que denote

    determinada classe de objetos e seus atributos peculiares.

    Um naturalista, em vista das exigncias de sua cincia particular, v uma razo, como mais interessante que outras, para

    distribuir o mundo animal ou vegetal em certos grupos. As classes que denotam grupos de objetos so, como todas as

    demais, constitudas por certos atributos comuns, e seus nomes significam esses atributos, e no outra coisa. Os nomes das

    classes e ordens de Cuvier: os plantgrados (tribo de mamferos que andam sobre as plantas dos ps), digitgrados (que

    andam nas pontas dos dedos) etc., ainda que nascidos de sua classificao dos animais, so tambm expresso de atributos,

    como se os houvesse precedido. O atributo ou atributos que distinguem uma determinada espcie de todas as demais

    espcies de um mesmo gnero denomina-se diferena.

    Segundo Stuart Mill, o gnero compreende a espcie. Da decorre que o gnero ou denota mais que a espcie ou predicadode um nmero maior de indivduos. Segue-se que a espcie deve conotar mais que o gnero. A espcie deve conotar todos

    os atributos que o gnero conota: do contrrio haveria homens que no fossem animais; e deve conotar algo mais do que

    conota "animal": de outro modo todos os animais seriam homens. O excesso de conotao, que a espcie acumula sobre o

    gnero, a diferena ou diferena especfica. Para dizer o mesmo com outras palavras, a diferena aquilo que deve ser

    adicionado conotao do gnero para completar a conotao da espcie.

    Com efeito, diferena de uma espcie aquela parte da conotao do nome especfico, ordinrio, especial ou tcnico, que

    distingue a espcie em questo de todas as outras espcies de dado gnero a que em determinada ocasio nos referimos. Em

    objetiva sntese, diferena especfica o nome que se d ao conjunto de qualidades que se acrescentam ao gnero para a

    determinao da espcie, de tal modo que lcito anunciar: a (E) espcie igual ao (G) gnero especfico mais a (De)

    diferena especfica (E = G + De).

    Acrescente-se que "conotao" aqui quer significar o critrio de uso da palavra; por exemplo, quando afirmo que o "homem

    um ser racional", o termo "ser" designa o gnero e "racional", a espcie do gnero qual quero me referir: os homens. A

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    associao dos vocbulos "ser" e "racional" perfaz critrio de uso, ou conotao, da palavra "homem". Agora, todos o

    objetos do mundo que se subsumam a essa conotao vo compor um conjunto que denominamos "denotao".

    4 - Classificaes intrnsecas e classificaes relacionais (ou extrnsecas)

    Qualquer caracterstica pode servir de critrio de uso na elaborao de uma classificao. Quanto seleo do critrio

    classificador, podemos divisar as classificaes em relacionais e intrnsecas. Nestas, o critrio que informa a classificao

    compe a definio do objeto classificado; assim, nas substncias qumicas os elementos que compem a coisa tambm a

    definem (sal todo composto formado por sdio ou cloro); da mesma maneira, o critrio classificador dos organismos a

    forma ou figura do ser vivo objeto da classificao (forma de cachorro, gato, pssaro etc.).

    Diversamente, nas classificaes relacionais (ou extrnsecas) o critrio diferenciador externo coisa. Assim, irmos

    definem-se pelo fato de terem o mesmo pai e/ou a mesma me; os objetos domsticos classificam-se por seu uso ou funo:

    cadeira serve para sentar, caneta para escrever etc.No h classes naturais: as caractersticas comuns que tomamos como

    critrio de uso de uma palavra em geral so assuntos de convenincia. Nossas classificaes dependem de nossos interesses

    e nossa necessidade de reconhecer as similitudes e diferenas que h entre as coisas. E, convm salientar, "no h coisas no

    mundo exatamente iguais em todos os aspectos".

    Conforme frisa Roque Carrazza, "as classificaes objetivam acentuar as semelhanas e dessemelhanas em diversos seres,

    de modo a facilitar a compreenso do assunto que estiver sendo examinado". E a seguir arremata:"Isto nos leva a concluir que as classificaes no esto no mundo fenomnico (no mundo real), mas na mente do homem

    (agente classificador)".

    5 - Classificaes no direito positivo e classificaes da cincia do direito

    Goza de grande acolhida na doutrina nacional a clebre frase de Agustn Gordillo, segundo a qual "no h classificaes

    certas ou erradas, mas classificaes mais teis ou menos teis". A assertiva do renomado administrativista argentino tem

    suporte na clssica obra de Genaro R. Carri "Notas sobre o direito e a linguagem", um dos principais fundadores da escola

    analtica de Buenos Aires, na qual o jusfilsofo portenho adverte que grande parte das divergncias jurdicas centram-se em

    classificaes de enorme prestgio e herdadas de tradio milenar:

    Los juristas creen que esas clasificaciones constituyen la verdadera forma de agrupar las regras y los fenmenos, en lugar

    de ver en ellas simples instrumentos para una mejor comprensin de ests. Los fenmenos - se cree - deben acomodarse a

    las clasificaciones e no a la inversa.

    Colaciona a seguir, a festejada lio:

    Las clasificaciones no son ni verdaderas ni falsas, son serviciales o intiles; sus ventajas o desventajas estn supeditadas al

    inters que gua a quien las formula , y a su fecundidad para presentar un campo de conocimiento de una manera ms

    fcilmente comprensible o ms rica en consecuencias prcticas deseables. Idia que representa a projeo da doutrina de

    John Hospers no campo do direito, no tambm clssico An Introduction to Philosophical Analysis.

    Convm salientar que o relativismo das classificaes verificado por Hospers, assim como os exemplos colacionados por

    Carri e Gordillo, tm em mira as cincias naturais.

    Entretanto, pelos motivos a seguir expostos, entendemos que tal proposio no predica adequadamente as classificaes

    jurdicas. perfeita a pertinncia dessa proposio s cincias naturais, quando por exemplo, um naturalista considera os

    vrios gneros de animais e trata de classific-los do modo que, segundo a Zoologia, melhor convenha para ordenar os

    vrios espcimes. Assim, acredita-se ser prefervel dividir os animais em animais de sangue quente e em animais de sangue

    frio; ou em animais que respiram por meio de pulmes e animais que respiram por brnquias; ou em animais carnvoros,

    frugvoros, gramvoros; ou em animais que se movem arrastando-se ou com a extremidade dos ps (distines nas quais

    esto fundadas algumas das famlias de Cuvier). Ao fazer isso, o naturalista cria outras tantas classes novas, que no so,

    absolutamente, de modo algum familiares prpria natureza dos seres ou forma com que so espontaneamente divididos

    pelo senso comum, a no ser por um propsito preconcebido de convenincia cientfica.

    certo que, posto que as classes so artificiais, o ato de classificar no direito tambm decorre de uma atividade humana,

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    dependente de interesses e necessidades. Contudo, as classificaes no direito tm natureza totalmente distinta daquelas

    operadas nas cincias naturais, nas quais o objeto da classificao so animais, plantas, minerais ou espaos geogrficos;

    diversamente, nas classificaes jurdicas, os referenciais so conceitos cunhados prescritivamente pelo direito. No h

    fenmenos (objetos reais) a ordenar. Por isso, tais classificaes, no plano da linguagem do direito, visam construir

    arbitrariamente classes e definies com finalidades genuinamente prescritivas, cortando cegamente o universo do real: as

    classificaes e definies jurdicas incidem sobre o real sem pretender se confundir com ele. Por outro ngulo, num plano

    de sobrelinguagem, a Cincia do Direito cuida de descrever as classificaes edificadas no patamar do direito posto,

    surtindo dessa relao de correspondncia sua pertinncia ou no ao sistema de proposies descritivas da Cincia do

    Direito.

    Dois so os nveis, ou tipos, possveis de classificaes jurdicas: (i) aquelas construdas no direito positivo e (ii) as descritas

    na Cincia do Direito. As classificaes no direito positivo tm cunho nitidamente prescritivo e o fim precpuo de outorgar

    regimes jurdicos e definir situaes jurdicas especficas aos produtos dessas classificaes. De outra parte, as

    classificaes da Cincia do Direito caracterizam-se por se apresentar em linguagem descritiva e, justamente, tm por objeto

    descrever as proposies prescritivas do direito positivo.

    Se a classificao elaborada pelo legislador, ela vlida (valor que se ope a no-vlido), e como no se trata de

    proposio prescritiva, a ela no se pode atribuir os valores alticos "verdadeiro" ou "falso" nem "correto" ou "incorreto".

    Por outro lado, coisa diversa a classificao efetivada pelo cientista do direito; cuida de proposio descritiva, e por isso

    h de manter coerncia e fidelidade aos critrios previstos no direito positivo: sendo correta, verdadeira; caso contrrio, falsa. E quanto a "utilidade"?

    A utilidade no critrio jurdico. Seja como for, em discurso no-cientfico admissvel classificar as proposies

    descritivas verdadeiras com teis ou inteis. Mas no sem advertir que o critrio da utilidade da classificao ,

    juridicamente, intil para a Cincia do Direito em sentido estrito.

    Concluso necessria: a observao do mestre argentino sobre ser verdadeira para outras cincias no se aplica nem

    Cincia do Direito nem ao direito positivo. Conforme doutrina Roque Carrazza, uma classificao jurdica "dever

    necessariamente levar em conta o dado jurdico por excelncia: a norma jurdica. Reforando a assero, a norma jurdica

    o ponto de partida indispensvel de qualquer classificao que pretenda ser jurdica." No mesmo sentido, Geraldo Ataliba,

    convergindo com Carrazza, indiretamente, afirma, com sua peculiar autoridade, a tese da correo ou incorreo das

    classificaes jurdicas, quando execra a malfadada classificao dos impostos em diretos e indiretos como no sendo

    jurdica, denunciando que o critrio de diferenciao puramente econmico.

    Deduz-se que, juridicamente, o critrio da "utilidade" inaplicvel: as classificaes jurdicas so vlidas ou invlidas

    (direito positivo) ou verdadeiras ou falsas (Cincia do Direito) em funo do direito posto e da eficincia do discurso do

    jurista para descrever seu objeto de anlise.

    6 - Funo das definies jurdicas e seu inexorvel carter de prescritividade

    Geraldo Ataliba, com apoio em Sainz de Bujanda, registrou que o art. 3 do CTN se trata de mero precepto didtico, pois

    "no funo de lei nenhuma formular conceitos tericos". Nessa guisa, Hugo de Brito Machado tambm afirma "que, em

    princpio, no funo da lei conceituar".

    Diante dos pressupostos que adotamos como direito, no possvel concordar como a proposio desses insignes mestres.O sistema do direito, ante a plurivocidade de sentidos que a expresso suscita, denota pelo menos trs aspectos: a) o sistema

    visto como conjunto de enunciados, tomados no plano da expresso; b) o sistema jurdico como o conjunto dos contedos

    de significao dos enunciados prescritivos e c) o sistema jurdico como domnio articulado de significaes normativas. A

    conceitualizao dessa teoria, que desmembra e explicita a iterao dos trs sistemas, coloca mostra que o plano da

    literalidade textual ou plano de expresso direito independentemente da forma de linguagem com que se apresente o

    enunciado prescritivo. O enunciado prescritivo porque foi veiculado por fonte formal do direito habilitada.

    As definies do direito no pretendem alcanar o real; elas prescrevem o real. Por isso, a classe das coisas imveis, no

    sentido jurdico, como referente real, no h de apresentar-se como mvel nem imvel. Para o direito, pode ser imvel uma

    casa, um terreno, um navio ou uma aeronave (para certos efeitos). O direito cria suas prprias realidades, constri seus

    prprios conceitos e define-os para sobre eles poder falar com mais preciso. como um tecido vivo e inteligente, capaz de

    prontamente absorver novas situaes e transform-las segundo suas categorias operacionais. O direito pretende regular

    condutas e seu instrumento a linguagem; para isso, est atento ao teor de impreciso e de ambiguidade de que a linguagem

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    portadora e corta a denotao das palavras mediante definies estipulativas, redefinindo a realidade e precisando, assim,

    os traos conceituais que conformam a urdidura normativa.

    Diante disso, no podemos retirar do enunciado do art. 3 do CTN seu inato cunho prescritivo, "definindo" como devem ser

    os "tributos", ainda, que no sejam assim.

    7 - Anlise crtica da classificao das obrigaes em ex lege e ex voluntate

    A palavra "tributo" o nome de uma classe de objetos construdos conceitualmente pelo direito positivo. Trata-se de palavra

    ambgua que, conforme assinalou Paulo de Barros Carvalho, pode denotar distintas classes de objetos (relao jurdica,

    direito subjetivo, dever jurdico, quantia em dinheiro, norma jurdica e, como prefere o CTN, a relao jurdica, o fato e a

    norma que juridiciza o fato). Fixemos aqui nosso interesse na acepo de "tributo" com as propores semnticas do art. 3

    da Lei n 5 172/66:

    Tributo toda prestao pecuniria compulsria, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que no constitua sano

    de ato ilcito, instituda em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

    Definir uma palavra indicar seu significado. Uma definio como esta de "tributo" compe-se de duas partes, o

    definiendum (a palavra a definir, o sujeito da proposio: "tributo") e o definiens (a enunciao do significado: "toda

    prestao pecuniria..."). Tal definio conotativa, isto , o definiens determina as caractersticas que conformam o critriode uso da palavra "tributo". Ao mesmo tempo, esses critrios seletores constituem uma dicotomia: a classe dos tributos e a

    classe dos no-tributos. Da a procedncia em se afirmar que toda definio determina uma classificao de objetos:

    daqueles que atendem aos critrios de uso da palavra ou no.

    A tradicional classificao das obrigaes em ex lege e ex voluntate como situaes aparentemente excludentes no se

    sustenta. Analisando o critrio do definiens de ambas verificamos que no se trata de duas categorias excludentes, mas de

    dois critrios conotativos distintos que permitem a construo de quatro classes diversas: (i) obrigaes ex lege em que h a

    participao da vontade, (ii) obrigaes ex lege em que no h a participao da vontade, (iii) obrigaes ex voluntate sem

    previso em lei e (iv) obrigaes sem previso legal e nas quais a participao da vontade tambm irrelevante.

    Alis, a Constituio Federal diz:

    "ningum ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa seno em virtude de lei" (art. 5, II).

    Portanto, toda obrigao ser ex lege. Agora, h obrigaes em que a participao da vontade relevante e outras em que

    esse aspecto desnecessrio. Assim, nos contratos, o fato gerador da obrigao contratual decorre de suporte fctico em que

    a participao da vontade relevante; diversamente, nos tributos, ainda que o fato imponvel seja propriamente o negcio

    jurdico, a hiptese de incidncia toma-o como o fato do negcio, abstraindo deste a complexidade de sua conformao.

    sobremaneira interessante, nesse passo, a reflexo de Eduardo Jardim que exclui a clusula "instituda em lei" do

    definiens do termo "tributo", entendendo-a como "absolutamente irrelevante para tipificar o tributo como tal". E no poderia

    ser diferente. Se constitucionalmente toda obrigao requer lei, no faz sentido imaginar obrigao que no seja legal, j que

    se trata de requisito do direito constitucional vigente. Desse modo, tautolgico afirmar "obrigao legal", posto que,

    segundo a CF/88, toda obrigao legal. Faltando lei, de obrigao que no trata.

    Tambm merece registro que Luciano da Silva Amaro, em sua definio de tributo, no faz referncia compulsoriedade daprestao tributria, pois entende que essa qualidade j est expressa ao admitir a clusula "institudo em lei", indicando que

    o nascimento da obrigao tributria no tem por base a vontade dos sujeitos da relao jurdica, mas, sim, o comando legal.

    Diante disso, conclumos: a classificao das obrigaes em ex voluntate/ex lege no se sustenta, primeiro porque no traz

    qualquer oposio entre os critrios que a definem (a obrigao de entregar o bem, num contrato de compra e venda, ex

    voluntate e ex lege ao mesmo tempo); segundo, dizer que o tributo obrigao ex lege uma tautologia, pois todas

    obrigaes em nosso direito o so.

    8 - Classificao intrnseca dos tributos

    Na classificao intrnseca dos tributos, o critrio de classificao define-se em funo da vinculao, ou no, de uma

    atividade estatal, no desenho da hiptese tributria (que h de ser confirmada ou infirmada pela base de clculo).

    Tal proposta, agudamente desenvolvida pelo talento de Geraldo Ataliba, apresenta-se muitas vezes distorcida, a ponto de

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    suscitar a necessidade de um esclarecimento decisivo: o critrio utilizado pelo clebre professor para classificar as espcies

    tributrias no a vinculao da arrecadao a uma atividade especfica do Estado, mas a vinculao do aspecto material da

    hiptese de incidncia a uma atuao estatal, que algo bem diverso. Enfim, para Geraldo Ataliba, imposto, enquanto

    gravame no vinculado a uma atuosidade do Estado, o "tributo cuja hiptese de incidncia consiste na conceituao de um

    fato qualquer que no se constitua numa atuao estatal (art. 16 do CTN); um fato da esfera jurdica do contribuinte."; a

    taxa, diversamente, o tributo cuja hiptese de incidncia consiste em atuao estatal.

    Torna-se interessante, seguindo as lies de Paulo de Barros Carvalho, analisar, sob essa perspectiva, a atividade

    empreendida pelo sujeito do verbo contido na hiptese tributria. Tratando-se de taxa, quem realiza a ao expressa pelo

    verbo o prprio Estado, ao empreender atividade diretamente referida ao obrigado. Diversamente, nos impostos, quem

    realiza a diligncia, configurada como fato imponvel, o contribuinte. Sublinha, ainda, o atual titular da PUC/SP e da USP,

    que o substrato dessa classificao "eminentemente jurdico, pois repousa na observao fiel das hipteses de incidncia

    dos vrios tributos, em confronto com as respectivas bases de clculo. Toda vez que o binmio expressar um acontecimento

    que envolva atuao do Estado, estaremos diante de um tributo vinculado". E mais adiante arremata:

    "O interesse jurdico dessa classificao est no seu ponto de partida: o exame das unidades normativas, visualizadas na

    conjugao do suposto (hiptese de incidncia), e da base de clculo (que est na conseqUncia da norma), mantendo

    plena harmonia com a diretriz constitucional que consagra a tipologia tributria no direito brasileiro" (grifamos).

    Essa diviso dicotmica dos tributos em vinculados/no-vinculados ajusta-se, perfeitamente, ao que John Hospersdenominou de classificao de intrnseca, posto que os elementos diferenciadores constituem aspectos internos da

    regra-matriz de incidncia tributria.

    9 - Classificao relacional (ou extrnseca) dos tributos

    Ocorre que, em nosso entender, a classificao intrnseca dos tributos no esgota o repertrio de variveis do sistema

    constitucional tributrio vigente. Nele foram instaladas as seguintes peculiaridades: (i) vedada a vinculao de receita de

    impostos [art. 167, IV, da CF/88], (ii) as contribuies sociais, de interveno no domnio econmico e de interesse de

    categorias profissionais ou econmicas, tm sua destinao vinculada aos rgos atuantes nas respectivas reas [artigos 149,

    195, 212 5, etc.] e (iii) os emprstimos compulsrios, sobre serem vinculados aos motivos que justificaram sua edio,

    ho de ser, obrigatoriamente, restitudos ao contribuinte.

    Isolamos, basicamente, duas variveis: a destinao legal e a restituibilidade.

    Ambas so extrnsecas estrutura da norma tributria. Por isso, sua utilizao como critrio conotativo da classificao dos

    tributos mereceu as consideraes tecidas por Paulo de Barros Carvalho. Entretanto, no obstante serem estranhas

    intimidade estrutural da regra-matriz de incidncia tributria, no deixam de ser jurdicas, pois fundam-se em critrios

    eminentemente jurdicos: a "existncia" de normas sobre destinao e restituio.

    a partir desses critrios que fundamos a classificao extrnseca dos tributos, que, sobre ser jurdica, necessria, pois as

    classificaes no direito no so meramente teis ou inteis. O que, alis, compromete at a fora do art. 4 do CTN: se o

    imposto no pode ser destinado especificamente a nenhum rgo, no basta ser tributo no-vinculado; exige-se tambm que

    seja no destinado.

    Reiteremos o raciocnio: se a Constituio, ex vi do art. 167, IV, ressalvada a repartio constitucional, veda expressamentea vinculao de receita de impostos a rgo, fundo ou despesa, ento o art. 4, II, do CTN infirma a desimportncia da

    destinao legal, e esse aspecto passa a tornar-se relevante (pelo menos negativamente) para se determinar a espcie

    tributria. Havendo destinao legal do gravame, de imposto que no se trata.

    Com efeito, trs so, a priori, os critrios diferenciadores que convivem, concomitantemente, no mago constitucional: o

    primeiro e indiscutvel a vinculao, ou no, de uma atividade estatal no desenho da hiptese tributria; o segundo, a

    previso do destino legal do tributo; o terceiro, a previso legal da restituio.

    Est instaurado o dilema. Tomemos como exemplo o "salrio-educao": conforme o primeiro critrio, a contribuio social

    do salrio-educao imposto; para o segundo, em decorrncia da destinao do produto da arrecadao, imposto no

    poderia ser.

    A circunstncia que, segundo entendemos, a Constituio Federal de 1988 concebeu duas diferentes acepes para a

    palavra "imposto": uma como gnero prximo, outra como diferena especfica constituinte de duas classes de "impostos".

    Imposto, gnero prximo, define-se pela no-vinculao do critrio material da hiptese tributria a uma atuao estatal

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    especfica. Imposto, como subespcie, aquele que no apresenta destinao legal de sua receita (no-afetao). Ou seja, o

    CTN combinado com a Constituio oferece dados para definirmos o gnero imposto em funo do critrio da atuao do

    Estado na composio do suposto normativo; ao mesmo tempo, a CF/88 estipula a definio de imposto sob o critrio da

    no-destinao legal como subcritrio definidor da espcie imposto. Resultado: o sistema constitucional tributrio, num

    entrelaamento de critrios de classificao intrnsecos e extrnsecos, estipula o gnero e a espcie imposto.

    So impostos em sentido estrito (imposto-imposto): II, IE, IR, IPI, IOF, ITR, Causa Mortis e doao, ICMS, IPVA, IPTU,

    ISS e Inter Vivos.

    So impostos em sentido lato (imposto-contribuio): as contribuies sociais, profissionais e de interveno no domnio

    econmico.

    Tecnicamente falando, portanto, imposto imposto em sentido estrito. No basta a no-vinculao estatal na conformao

    do fato jurdico tributrio. Requer-se, ainda, a no-afetao. To s da integrao desses dois critrios se instaura a condio

    suficiente para definio da espcie imposto em sentido estrito.

    Concordamos, destarte, com Sacha Calmon Navarro Coelho, quando afirma que seria "erro rotundo no levar em conta o

    destino da arrecadao (mormente quando constitucionalmente fixado) no momento do exame jurdico-positivo das

    "contribuies sociais", que so alfim, impostos afetados a finalidades especficas, a teor da Constituio Brasileira." E,

    semelhantemente, para Wagner Balera, "a espcie tributria denominada contribuio daquelas em que o destino dos

    recursos assumido como dado que integra o regime jurdico de tributo".

    Voltemos ao salrio-educao. Ora, o Decreto-Lei 1.422/75 definiu, como critrio material dessa contribuio, o fato deempresa comercial, industrial ou agrcola, qualificada como empregadora, emitir folha de salrio. patente: o critrio

    material da hiptese pertinente ao gnero prximo dos impostos, por no requerer nenhuma atuao estatal especfica.

    Entrementes, seu produto arrecadatrio est vinculado manuteno do ensino bsico fundamental: contribuio.

    Explicamos: o tributo que denominamos "contribuies sociais" caracteriza-se pela associao tipolgica do gnero imposto

    com a destinao constitucionalmente afetada. Assim, definindo estipulativamente, contribuio social so espcies do

    gnero prximo imposto que apresentam destinao legalmente especificada.

    10 - Anlise dos critrios constitucionais que permitem uma classificao juridicamente vlida das

    espcies tributrias

    Linhas atrs, firmamos que trs so, a priori, os critrios diferenciadores que convivem no bojo da Constituio Federal de

    1988: (i) a vinculao, ou no, de uma atividade estatal no desenho da hiptese tributria; (ii) a previso do destino legal do

    tributo; e (iii) a previso legal do dever de restituir o tributo arrecadado numa data futura, as quais analisaremos uma a uma,

    a partir da tabela que segue.

    Primeiro, haveremos de registrar que a figura das taxas totalmente incompatvel com a dos emprstimos compulsrios,

    posto que, se h uma atuao estatal especfica e divisvel, o Estado, automaticamente, est investido na competncia

    tributria de instituir uma taxa. Carece, portanto, de qualquer utilidade a figura do emprstimo compulsrio.

    Tais condies podem ser verificadas ou no, originando, assim, as oito combinaes logicamente possveis:

    CASO VINCULAO DESTINAO RESTITUIO tipo

    1. SIM SIM SIM Incompatvel

    2. SIM SIM NO Taxas3. SIM NO SIM Incompatvel

    4. SIM NO NO Contribuies de melhoria

    5. NO SIM SIM Emprstimos compulsrios

    6. NO SIM NO Contribuies em geral

    7. NO NO SIM Vedado pela CF/88

    8. NO NO NO Impostos

    Analisemos, primeiro, os casos vedado e incompatveis:

    1 caso: um contra-senso pensar em emprstimo compulsrio com hiptese tributria de taxa. Havendo atuao estatal que

    justifique a instituio de taxa, esta que h de ser proposta por lei ordinria; disparatado, diante da situao, propor

    emprstimo compulsrio que exija lei complementar para depois ser devolvido.

    3 caso: Pelo mesmo motivo do primeiro caso, taxa sujeita devoluo absurda.

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    7 caso: Caso vedado pela constituio, posto que a competncia para instituir o emprstimo compulsrio exige a destinao

    legal vinculada despesa que fundamentou sua instituio.

    Casos compatveis:

    2 caso: a circunstncia clssica da taxa, como tributo vinculado.

    4 caso: a circunstncia clssica da contribuio de melhoria: com vinculao, ainda que indireta, a uma atuao estatal

    (obra pblica); a destinao legal desnecessria, pois a obra pblica j foi construda e no h previso de restituio.

    5 caso: a hiptese de emprstimo compulsrio vlido, pertinente ao gnero imposto e com a diferena especfica dos

    emprstimos compulsrios: destinao legal e restituio.

    6 caso: o caso das contribuies sociais, de interveno econmica e de interesse de categorias profissionais. Observe

    que a hiptese tributria de imposto; o que lhe altera a natureza a destinao legal (imposto-contribuio).

    8 caso: o caso do "imposto-imposto" ou imposto em sentido estrito, exao com hiptese de tributo no-vinculado e sem

    afetao legal.

    Contudo, no podemos deixar de registrar as seguintes ilaes que a anlise desse quadro suscita, no que diz respeito

    controvertida figura do emprstimo compulsrio. sem dvida tributo, e s por isso sua denominao redundante, pois

    todo tributo compulsrio. Seria mais prprio, nesse sentido, cham-lo de emprstimo tributrio. Mas isso no nos parece

    relevante. Importante verificar que os emprstimos compulsrios s podem pertencer ao gnero prximo de imposto, com

    duas peculiaridades: a restituio dos valores arrecadados e o condicionamento do exerccio da competncia impositiva s

    condies previstas nos incisos I e II do art. 148, os quais devem, obrigatoriamente, compor a exposio de motivos doveculo introdutor ocupado com a edio desse gravame, em conformidade com o captulo das fontes do direito.

    Emprstimo compulsrio no espcie tributria. No obstante a fora da expresso, consolida apenas a contingncia de a

    administrao obrigar-se a devolver o valor cobrado relativo a um imposto. Trata-se, em rigor, de um imposto afetado, com

    previso de devoluo, e outorga de competncia em caso extraordinrio, alis muito prximo daquele previsto no art. 154,

    II da CF/88. Por esse motivo, Paulo de Barros Carvalho no reconhece os emprstimos compulsrios, "natureza" de

    categoria tributria sui generis; para o autor, "tais exaes podero revestir qualquer das formas que correspondem s

    espcies do gnero tributo. Para reconhec-las como imposto, taxa ou contribuio de melhoria, basta aplicar o operativo

    critrio constitucional representado pelo binmio hiptese de incidncia/base de clculo".

    Assim, so tributos extraordinrios no s os impostos extraordinrios (art. 154, II), mas tambm os emprstimos

    compulsrios (art. 148). Ou, de modo mais preciso, melhor seria dizer tributos institudos por competncias extraordinrias.

    11 - A falcia do "autntico emprstimo compulsrio"

    Tributo, reitere-se, prestao pecuniria compulsria que satisfaz s clusulas acima referidas. Se de um lado til para a

    classificao das espcies tributrias, de outro de todo irrelevante a destinao legal ou financeira ao qualificar-se uma

    prestao como tributo.

    Por isso "emprstimo compulsrio" tributo, ainda que, no futuro, tenha que ser devolvido pelo Estado. O ser tributo

    qualifica-se pela forma (obrigao legal), contedo (patrimonial) e fundamento (fato lcito), alm dos quais trs aspectos

    individualizam o emprstimo compulsrio: o primeiro formal, a exigncia de lei complementar; o segundo, a previso

    legal de sua devoluo e o terceiro, a motivao jurdica inscrita no corpo da lei que justifique sua produo, face aos

    incisos I e II do art. 148 da CF.Faltando qualquer desses pr-requisitos, prejudicado estar o perfil tipolgico tributrio do emprstimo compulsrio.

    Trata-se, em rigor, da mais complexa das competncias impositivas outorgadas Unio. Sua configurao requer o

    atendimento de vrios itens; por isso, difcil de ser validamente institudo um emprstimo compulsrio.

    Ocorre, entretanto, que tem se tornado renitente praxe entabular o seguinte raciocnio: se o tributo invlido, pois no se

    enquadra na competncia impositiva do ente tributante, ento se trata de autntico emprstimo compulsrio. Em suma, tudo

    aquilo cobrado a mais ou em desconformidade com a lei , seja por confisco, seja por invaso de competncia, seja por

    abuso de autoridade, no importa, segundo essa vitanda idia, tudo que cobrado a mais emprstimo compulsrio.

    E a raiz do problema est em confundir (i) "emprstimo compulsrio" como tipo tributrio e (ii) o fato de uma cobrana

    indevida que carreie indebitamente recursos para o Fisco. Qual o nome que se d a esse montante? Resposta: emprstimo

    compulsrio. Nesse sentido, por pura falta de nome mais apropriado, emprstimo compulsrio a materializao do fato de

    toda e qualquer cobrana indevida. Trata-se de desatino imperdovel.

    Explica-se, mas no se justifica, o uso de argumentos desse tipo, os quais s se prestam para semear a discrdia e a

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    confuso, desqualificando a doutrina do direito tributrio. Devem, portanto, ser evitados.

    12 - Sobre o problema da utilizao do regime jurdico tributrio como critrio definidor do termo

    "tributo"

    Tambm vale a pena insistir no descabimento da argumentao segundo a qual, na sistemtica de 1.967, as contribuies

    sociais no se revestiam do carter de tributo, pois a elas no era prescrito, de forma expressa, o regime jurdico prprio,

    como o faz o art. 149 da atual Carta". Entendemos que pretender definir a espcie tributria em funo do regime jurdico

    aplicvel um procedimento equivocado.

    Tomemos para incio de reflexo, a excelente sntese de Lcia Valle Figueiredo que define o conceito de "regime jurdico"

    como o complexo de normas e princpios disciplinadores de determinado instituto.

    Um homem pertence classe daqueles que querem emagrecer (critrio classificador: antecedente ou causa) e por isso se

    hospeda num spa em Campos do Jordo (submeter-se a um regime no "spa": consequente ou efeito). A primeira condio

    suficiente da segunda, as causas so condies suficientes de seus efeitos: porque o homem queria emagrecer (antecedente),

    ele hospedou-se num "spa" (consequente). O argumento recproco no valido: algum pode fazer regime por um outro

    motivo que no seja emagrecer, por questo se sade, por exemplo.

    Mesmo fenmeno acontece no direito tributrio. A classificao de um vnculo como prestao pecuniria compulsria que

    no decorra de ato ilcito condio suficiente para que esse liame jurdico se subsuma ao regime jurdico prprio dostributos, no o contrrio. Os regimes jurdicos tributrios especficos decorrem dessa demarcao: so efeitos, no causas

    distintivas das vrias espcies tributrias.

    Dizer que o regime jurdico define a natureza especfica do tributo significa incorrer na denominada falcia de inverso do

    efeito pela causa. Como ensina Paulo de Barros Carvalho: a gua uma substncia composta por dois tomos de

    hidrognio e um de oxignio, que ferve a 100 graus centgrados, no nvel do mar. No por ferver a 100 graus centgrados

    que a substncia assume o carter de gua: outros lquidos distintos apresentam o mesmo efeito, no pressuposto de idnticas

    condies. o critrio de sua composio que informa o uso da palavra "gua", que designa a substncia gua, e no o

    efeito de ferver a 100 graus centgrados. Se fosse assim, todo lquido ou slido que fervesse nessa temperatura seria gua.

    Portanto, a qualidade de ser tributo no efeito do regime jurdico aplicvel. tributo porque a norma jurdica impositiva

    instituidora da prestao apresenta critrios que a subsumem na extenso da classe dos "tributos" e, coisa que,

    consequentemente, implica o regime jurdico peculiar dessa classe de relaes jurdicas tributrias.

    Conclumos, assim, que a classificao de um liame como tributo condio suficiente para atribuir-lhe o regime jurdico

    tributrio e no o oposto. Os regimes jurdicos tributrios especficos aparecem em funo de tratar-se de "tributo", isto ,

    so efeitos, no causas seletoras das vrias espcies tributrias: o salrio-educao contribuio porque tem hiptese

    tributria de tributo no-vinculado e de ser destinado legalmente a um fundo (FNDE); em decorrncia, aplica-se-lhe o

    regime tributrio da contribuio e no o inverso; submeter-se ao prazo de vigncia em 90 dias no faz de nenhuma

    prestao jurdica contribuio social.

    Nota:

    Eurico Marcos Diniz de Santi

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