Cirurgia vascular
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ÍNDICE
SEMIOLOGIA VASCULAR ......................................................................................................................... 1
SEMIOLOGIA VASCULAR ...................................................................................................................... 1
SEMIOLOGIA DO SISTEMA ARTERIAL PERIFÉRICO ......................................................................... 1
ANAMNESE.............................................................................................................................................. 2
EXAME FÍSICO ........................................................................................................................................ 5
SISTEMA VENOSO E LINFÁTICO ........................................................................................................ 11
I. ANAMNESE ............................................................................................................................... 11
II. EXAME FÍSICO .......................................................................................................................... 12
OCLUSÃO ARTERIAL AGUDA ................................................................................................................ 25
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................ 25
FISIOPATOLOGIA ................................................................................................................................. 26
ETIOLOGIA ............................................................................................................................................ 29
EMBOLIA ............................................................................................................................................... 29
TROMBOSE ............................................................................................................................................ 30
QUADRO CLÍNICO ................................................................................................................................ 32
DIAGNÓSTICO ....................................................................................................................................... 34
III. Diagnóstico diferencial ................................................................................................................. 35
TRATAMENTO ...................................................................................................................................... 35
COMPLICAÇÕES ................................................................................................................................... 38
PROGNÓSTICO ...................................................................................................................................... 41
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................... 41
OCLUSÃO ARTERIAL CRÔNICA DE MEMBROS ................................................................................... 44
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................ 44
ANATOMIA PATOLÓGICA ................................................................................................................... 46
FISIOPATOLOGIA ................................................................................................................................. 47
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ............................................................................................................... 48
CLAUDICAÇÃO INTERMITENTE ........................................................................................................ 48
DOR EM REPOUSO ................................................................................................................................ 50
ÚLCERA ISQUÊMICA E GANGRENA .................................................................................................. 50
NEUROPATIA ISQUÊMICA .................................................................................................................. 51
ATROFIA POR DESUSO ........................................................................................................................ 51
IMPOTÊNCIA ......................................................................................................................................... 51
OUTRAS MANIFESTAÇÕES SENSORIAIS .......................................................................................... 52
OUTROS SINTOMAS NOS TERRITÓRIOS ARTERIAIS VIZINHOS ................................................... 52
OUTROS SINTOMAS ARTERIAIS ........................................................................................................ 52
FRAQUEZA MUSCULAR E RIGIDEZ ARTICULAR ............................................................................ 53
EXAME FÍSICO ...................................................................................................................................... 53
ÍNDICE ISQUÊMICO OU ÍNDICE TORNOZELO/BRAÇO .................................................................... 54
AVALIAÇÃO LABORATORIAL ............................................................................................................ 55
RESSONÂNCIA NUCLEAR MAGNÉTICA (RNM) ............................................................................... 57
RADIOGRAFIA SIMPLES DAS EXTREMIDADES ............................................................................... 57
AVALIAÇÃO PRÉ-TERAPÊUTICA ....................................................................................................... 57
MÉTODOS TERAPÊUTICOS ................................................................................................................. 58
TRATAMENTO MÉDICO ................................................................................................................... 58
MÉTODOS ENDOVASCULARES .......................................................................................................... 59
MÉTODOS CIRÚRGICOS ...................................................................................................................... 60
DERIVAÇÕES ARTERIAIS (BYPASS).................................................................................................... 60
DERIVAÇÕES EXTRA-ANATÔMICAS ................................................................................................ 61
SIMPATECTOMIA LOMBAR OU CERVICOTORÁCICA ..................................................................... 62
AMPUTAÇÃO......................................................................................................................................... 62
INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS ............................................................................................................. 62
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................... 64
ANEURISMAS ARTERIAIS ....................................................................................................................... 66
CONSIDERAÇÕES GERAIS................................................................................................................... 66
ETIOPATOGENIA E FISIOPATOLOGIA ............................................................................................... 67
CLASSIFICAÇÃO ................................................................................................................................... 70
ANEURISMA DA AORTA ABDOMINAL.............................................................................................. 72
ANEURISMA SIFÍLITICO ...................................................................................................................... 73
HEMATOMA PULSATÍL OU PSEUDO ANEURISMA .......................................................................... 74
ANEURISMAS MICÓTICOS OU BACTERIANOS ................................................................................ 74
ANEURISMAS CONGÊNITOS ............................................................................................................... 74
ANEURISMAS DISSECANTES .............................................................................................................. 75
QUADRO CLÍNICO DOS ANEURISMAS ARTERIAIS ......................................................................... 76
Aneurisma da Aorta Torácica e Abdominal ........................................................................................... 76
Aneurisma periférico............................................................................................................................. 77
ANEURISMAS DOS MEMBROS SUPERIORES .................................................................................... 78
ANEURISMAS DA ARTÉRIA SUBCLÁVIA ...................................................................................... 78
ANEURISMAS DAS CORÓTIDAS ..................................................................................................... 78
ANEURISMAS ESPLÂCNICOS .......................................................................................................... 79
PROPEDÊUTICA ESPECIALIZADA NO DIAGNÓSTICO DOS ANEURISMAS .................................. 79
EVOLUÇÃO DOS ANEURISMAS .......................................................................................................... 81
TRATAMENTO ...................................................................................................................................... 81
TRAUMA VASCULAR ............................................................................................................................... 83
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................ 83
AGENTES AGRESSORES OU ETIOLÓGICOS ...................................................................................... 85
DISTRIBUIÇÃO ...................................................................................................................................... 85
CLASSIFICAÇÃO ................................................................................................................................... 86
QUADRO CLÍNICO ................................................................................................................................ 88
I. SÍNDROME HEMORRÁGICA ......................................................................................................... 88
II. SÍNDROME ISQUÊMICA ............................................................................................................... 88
III. SÍNDROME TUMORAL ............................................................................................................... 89
EXAMES COMPLEMENTARES ............................................................................................................ 90
TRATAMENTO ...................................................................................................................................... 91
CUIDADOS PRÉ-OPERATÓRIOS ...................................................................................................... 91
CUIDADOS INTRA-OPERATÓRIOS ................................................................................................. 92
REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS ......................................................................................................... 94
ISQUEMIA CEREBRAL DE ORIGEM EXTRACRANIANA ...................................................................... 95
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................ 95
Considerações Anatômicas ....................................................................................................................... 96
Aspectos Funcionais e Fisiopatológicos .................................................................................................... 98
Quadro Clínico das isquemias cerebrais ...................................................................................................100
Sintomas do sistema carotídeo .....................................................................................................................100
Sintomas do sistema vertebral ......................................................................................................................100
Diagnóstico das Lesões Obstrutivas das Artérias Carótidas .......................................................................101
Exame físico ............................................................................................................................................101
Duplex-scan ............................................................................................................................................102
Bases da Indicação Cirúrgica. Estudos em pacientes sintomáticos .............................................................104
Estudos em pacientes assintomáticos ........................................................................................................105
Tratamento Cirúrgico ...............................................................................................................................106
Tratamento Endovascular das Lesões Estenóticas das Carótidas ...............................................................107
Lesões Ateroscleróticas das Artérias Vertebrais ........................................................................................107
Manifestações clínicas da insuficiência vértebro-basilar ...........................................................................108
Diagnóstico das lesões ateroscleróticas das artérias vertebrais...................................................................108
Condutas no tratamento cirúrgico das lesões das artérias vertebrais ..........................................................108
Conduta Nos Casos de Estenoses de Carótidas Extracranianas ..................................................................109
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................109
VARIZES DE MEMBROS INFERIORES ...................................................................................................111
DEFINIÇÃO ...........................................................................................................................................111
ETIOPATOGENIA .................................................................................................................................112
VARIZES PRIMÁRIAS ..........................................................................................................................113
ETIOLOGIA .......................................................................................................................................113
FISIOPATOLOGIA ................................................................................................................................115
SINTOMAS ............................................................................................................................................117
EXAME FÍSICO ....................................................................................................................................118
Inspeção ..............................................................................................................................................118
Palpação ..............................................................................................................................................118
Ausculta ..............................................................................................................................................118
EXAMES COMPLEMENTARES ...........................................................................................................120
TRATAMENTO .....................................................................................................................................120
TRATAMENTO CLÍNICO OU CONSERVADOR .................................................................................120
TRATAMENTO CIRÚRGICO ................................................................................................................121
ESCLEROTERAPIA ...............................................................................................................................122
LASER....................................................................................................................................................122
CIRURGIA ENDOLUMINARES ............................................................................................................122
COMPLICAÇÕES GERAIS DA CIRURGIA DE VARIZES ...................................................................122
INSUFICIÊNCIA VENOSA CRÔNICA ..................................................................................................123
QUADRO CLÍNICO ...............................................................................................................................123
DIAGNÓSTICO ......................................................................................................................................124
TRATAMENTO .....................................................................................................................................124
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................................................126
TROMBOGÊNESE VENOSA. TROMBOEMBOLISMO VENOSO ...........................................................127
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................127
ETIOPATOGENIA E FISIOPATOLOGIA ..............................................................................................128
DIAGNÓSTICO CLÍNICO DA TROMBOSE VENOSA PROFUNDA ....................................................134
TROMBOFLEBITE SUPERFICIAL .......................................................................................................136
PROFILAXIA DA TROMBOSE PÓS-OEPRATÓRIA ............................................................................139
MÉTODOS FARMACOLÓGICOS .........................................................................................................140
ABSTRACT ............................................................................................................................................142
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA ......................................................................................................143
TROMBOSE VENOSA PROFUNDA .........................................................................................................144
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................144
QUADRO CLÍNICO ...............................................................................................................................146
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL ............................................................................................................147
EVOLUÇÃO DA DOENÇA....................................................................................................................149
TRATAMENTO .....................................................................................................................................150
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................152
Semiologia Vascular ___________________________________Edwaldo E. Joviliano, Takachi Moriya, Carlos E. Piccinato
1
Uma história clínica clara e detalhada torna-se fundamental diante de
quadro sugestivo de uma doença vascular. Devem fazer parte da abordagem inicial
toda informação referente ao tempo de início, duração, intensidade, estabilização,
melhora ou piora do quadro assim como os efeitos na qualidade de vida. Na grande
maioria das afecções vasculares pode se chegar ao diagnóstico completo através da
anamnese e exame físico sem necessidade de exames subsidiários, restringindo-se
estes apenas para aqueles casos mais graves onde haverá necessidade de
intervenção cirúrgica ou endovascular.
A apresentação clínica das doenças do sistema arterial periférico
correlaciona-se diretamente com a incompetência do mesmo em manter suas
funções primordiais enquanto estrutura fundamental para a manutenção do
funcionamento dos órgãos e tecidos por ele irrigados. As doenças arteriais
obstrutivas sejam ateroscleróticas ou não, e as dilatações aneurismáticas são as
principais afecções que acometem as artérias. Dentro deste contexto a anamnese e
o exame clínico figuram como passos fundamentais para a detecção diagnóstica.
Independentemente da natureza e da localização de uma doença arterial, o exame
clínico deve ser sempre completo e, em caso das extremidades, simétrico e
comparativo. Deve ainda ser sempre acompanhado pelo exame cardíaco que não
será abordado neste capítulo.
Semiologia Vascular ___________________________________Edwaldo E. Joviliano, Takachi Moriya, Carlos E. Piccinato
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Cada segmento anatômico responde à isquemia com sintomas
relacionados ao déficit funcional próprio daquela região. As lesões obstrutivas das
artérias viscerais têm manifestação clínica variável, segundo o órgão acometido. As
obstruções e/ou estenose das artérias que irrigam o sistema esplâncnico costumam
cursar com dor pós prandial cerca de 30 a 40 minutos após as refeições de duração
variável além de o indivíduo apresentar perda de peso significativa desde o início os
sintomas.
Como se sabe, as doenças arteriais obstrutivas são mais incidentes nos
membros inferiores. Também nesse segmento anatômico a dor é o sintoma mais
freqüente cuja manifestação inicial ocorre somente com o esforço muscular
desencadeado pela deambulação. A atividade muscular requer mais afluxo de
sangue oxigenado além de produzir maior quantidade de metabólitos ácidos.
Quando a demanda não é atendida, a produção insuficiente de ATP (adenosina tri-
fosfato) e o acúmulo de derivados ácidos do metabolismo anaeróbico passam a
estimular terminações nervosas causando sensação de dor, cansaço e até mesmo
câimbra. Tais eventos cessam instantaneamente com a interrupção da atividade
muscular, o que determina alívio dos sintomas em poucos minutos. Portanto a dor
atinge determinado grupo muscular, aumenta até o limite de tolerância obrigando a
interrupção do esforço e, cessando esse, desaparece em tempo rápido, podendo
reaparecer com a realização de igual exercício. A esta manifestação denomina-se
claudicação intermitente.
A claudicação nos membros inferiores pode ocorrer nos pés, nas
panturrilhas, nas coxas e nas nádegas conforme o nível de obstrução na árvore
arterial e também conforme capacidade de colateralização desenvolvida pelo
organismo. Chama-se de distância útil aquela que o indivíduo consegue percorrer
sem ter dor, geralmente caracterizada em terreno plano (Fig. 1).
Semiologia Vascular ___________________________________Edwaldo E. Joviliano, Takachi Moriya, Carlos E. Piccinato
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Figura 1 – Diagrama da claudicação intermitente
Pode-se dizer que a claudicação intermitente é um sintoma
patognomônico de afecção arterial do tipo obstrutivo. Existem algumas situações
descritas como pseudoclaudicações intermitentes que não devem ser confundidas
com a verdadeira claudicação intermitente. Tais condições clínicas podem
desencadear dor com o exercício, porém a cessação da dor não ocorre
instantânemante com a cessação do esforço como ocorre na claudicação
intermitente. Estas pseudoclaudicações podem ser causadas por afecções
ortopédicas, neurológicas ou reumatóides e um questionamento cuidadoso pode
evitar direcionamentos diagnósticos inadequados com retardo na implementação da
terapêutica mais apropriada.
Alguns pacientes podem procurar atendimento médico já numa fase
avançada da doença obstrutiva caracterizada pela dor de repouso e parestesias
geralmente nas porções mais distais das extremidades associada a queixa de
frialdade (ou esfriamento) e alterações de cor variando entre palidez intensa, cianose
e eventualmente rubor conforme a posição pendente.A dormência e o formigamento
são as parestesias mais comuns tanto nas isquemias crônicas quanto nas agudas.
As úlceras isquêmicas e as gangrenas são quadros terminais da
arteriopatia obstrutiva crônica periférica. Podem iniciar espontaneamente ou após
evento desencadeante como pequeno trauma ou infecção local.
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As úlceras isquêmicas são extremamente dolorosas, exceto em
diabéticos. Surgem expontaneamente ou em áreas de fácil trauma como nos
artelhos, interdigitais, calcâneos e menos frequentemente nas panturrilhas.São de
difícil cicatrização,a não ser após a revascularização; tendem a ser rasas e de fundo
pálido.É comum na doença aterosclerótica periférica (Fig. 2).
Figura 2 – Úlcera isquêmica de calcânio esquerdo
A hipertensão arterial grave de longa duração pode desencadear úlceras
isquêmicas chamadas úlceras hipertensivas. Estas comumente são muito dolorosas
e surgem na face ântero-externa da panturrilha bilateralmente. As artérias
tronculares em geral são normais nestes pacientes. A causa destas úlceras é a
arterioloesclerose.
As gangrenas nas isquemias crônicas podem se manifestar sob a forma
mumificada dos tecidos tendendo a ser menos extensas que as gangrenas após
isquemias agudas. Atingem pontas dos dedos, dedos inteiros ou pé e menos
frequentemente a perna. Quando a necrose está estabelecida e há boa rede
colateral observa-se sulco de delimitação bem preciso (Fig. 3). Em geral este tipo de
gangrena é seco e sem secreção. Por outro lado a gangrena pode se infectar,
tornando o tecido necrótico macerado, com formação de secreção e, as vezes, lojas
de pus. É a chamada gangrena úmida ou infectada. As gangrenas tendem a ser
mais amplas nas oclusões arteriais agudas embólicas ou trombóticas.
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Figura 3 – Gangrena seca do hálux e quarto dedo (delimitação precisa)
Em oclusões artérias agudas de extremidades, os sintomas de dor de
repouso surgem no início do quadro ou após algumas horas. Além disso, os
pacientes queixam-se de esfriamento, palidez e parestesia e se não tratados
evoluem para a necroses mais extensas e pouco delimitadas do membro isquêmico
pois a rede colateral em geral é escassa (Fig 4).
Figura 4 – Gangrena pós-isquemia aguda (falta delimitação)
O exame vascular deve sempre ser precedido pelo exame geral, já que a
maioria das afecções relacionadas ao sistema arterial pode ter comprometimento
sistêmico ou influenciar outros territórios vitais.
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O exame geral e particularmente das extremidades deve ser feito em
ambiente de boa iluminação se possível de luz natural.
A avaliação do sistema arterial deve iniciar-se pelo exame clínico cardíaco
seguindo-se para a região cervical com a observação cuidadosa da pulsatilidade
venosa, abaulamentos pulsáteis e posterior palpação. O exame dos pulsos deve ser
feito com pelo menos dois dedos e sempre na extensão da artéria a ser examinada.
O exame do pulso carotídeo deve ser feito na porção medial do músculo
esternoclidomastoideo com o pescoço do paciente ligeiramente rodado para o lado
contralateral evitando-se manipulação vigorosa do local para não induzir reflexo
vagal (Fig. 5).
Figura 5 – Palpação do pulso carotídeo.
Após a avaliação cardíaca e cervical deve-se prosseguir para o exame das
extremidades superiores.
Todo exame clínico, de qualquer segmento anatômico ou sistema, deve
respeitar uma seqüência lógica de avaliação e interpretação. A inspeção estática
cuidadosa através da observação da cor, do trofismo e da presença de
abaulamentos pulsáteis ou não, dão informações iniciais e subsídios para uma
adequada avaliação de eventuais testes dinâmicos. Os termos relativos à perfusão
nomeados como corado, pálido, cianótico e ruborizado são percebidos nessa fase
do exame.
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Alterações no estado de nutrição da pele e musculatura assim como dos
fâneros e a presença ou não de edema, ulcerações e gangrenas são detectadas
ainda na inspeção estática.
Em seguida deve se prosseguir com a inspeção dinâmica. A prova de
Buerger (manobra da palidez de elevação) consiste em elevar os membros, durante
cerca de um minuto, do paciente deitado e fazê-lo, em seguida, sentar-se com os
membros pendentes. Quando da elevação pode-se perceber o grau de palidez, e a
diferença de coloração entre as duas extremidades simétricas. Quando do membro
pendente pode-se cronometrar o tempo em que às extremidades voltam a se corar,
as veias superficiais se encherem e observar as eventuais diferenças entre os
membros (Fig. 6A, B e C).
Figura 6 – A) Palidez do pé esquerdo; B) Ausência de circulação venosa superficial visível no
pé esquerdo isquêmico; C) Rubor pendente à esquerda.
No membro normal as veias se enchem em até 10 segundos, porém no
membro isquêmico esse tempo sempre excede 15 segundos podendo levar até
alguns minutos. O membro isquêmico fica pálido em grau variável e leva mais de 10
segundos para recuperar a cor, quando pendente, adquirindo progressivamente cor
ruborizada após alguns segundos (rubor pendente ou hiperemia reativa). Estas três
manobras posturais: palidez de elevação, enchimento venoso e rubor pendente
devem ser executadas em continuidade com os membros elevados e a seguir
pendentes.
Na palpação deve-se perceber diferenças de temperatura, estado trófico
da musculatura e pele. Fundamentalmente, a palpação dos pulsos das extremidades
e aorta abdominal constitui-se em manobras essenciais na confirmação e
A B C
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localização de alterações no sistema arterial, caracterizando-os como normais,
aumentados, diminuídos ou ausentes.
No caso dos membros superiores os testes dinâmicos geralmente são
realizados junto com a palpação dos pulsos. Os pulsos subclávios devem ser
examinados na fossa supraclavicular com o paciente deitado, para que o músculo
platisma possa estar relaxado e a pulsatilidade da artéria subclávia possa ser
percebida mais facilmente. O pulso axilar é examinado na porção anterior da axila
com o membro superior flexionado e a mão espalmada na região occipital.
O pulso braquial deve ser palpado no terço distal do braço na sua porção
medial entre os tendões dos músculos bíceps e tríceps. O pulso radial (lateral) e
ulnar (medial) devem ser examinados no punho, sendo a artéria radial mais
superficial que a artéria ulnar (Fig. 7B, C e D).
Figura 7 – A) Palpação do pulso carotídeo; B) Braquial; C) Radial e D) Ulnar
Deve se ressaltar a utilidade da palpação do trajeto das artérias para
verificar se não existem abaulamentos ou tumores pulsáteis, frêmitos ou ainda
endurecimentos segmentares das artérias.
A palpação do pulso aórtico deve ser realizada na linha mediana
abdominal, acima da cicatriz umbilical palpando profundamente contra a projeção
anterior da coluna lombar. Quando da detecção de uma massa expansível e pulsátil
deve se proceder à manipulação cuidadosa da mesma a fim de definir
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aproximadamente o diâmetro (Fig. 8). Mudança de decúbito pode auxiliar na
diferenciação da massa expansiva de um tumor pulsátil.
Figura 8 – Aneurisma da aorta abdominal (massa tumoral visível no abdomen)
O pulso femoral é examinado na prega inguinal a meio caminho entre a
sínfise púbica e a crista ilíaca ântero-superior. O pulso poplíteo é percebido no cavo
poplíteo através de manobra bimanual envolvendo o joelho do paciente e realizando
discreta flexão do mesmo para facilitar a percepção do pulso na face posterior. Os
pulsos pedioso e tibial posterior devem ser examinados junto ao pé sendo o primeiro
palpado no dorso do pé, lateral ao tendão extensor longo do hálux e o segundo na
região retro maleolar medial (Fig. 9A, B, C e D).
Figura 9 – A) Palpação do pulso femoral; B) Poplíteo; C) Pedioso e D) Tibial posterior.
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A realização do índice tornozelo-braquial passa a ter importância
diagnóstica nos casos de dúvida quanto a diferença de percepção da amplitude de
determinados pulsos. Além disso, pode-se ter um dado quantitativo relativo ao grau
de isquemia que se encontra o membro em avaliação. Para o registro deste índice é
necessário ter a disposição um aparelho Doppler portátil, sendo possível aferir a
pressão em locais onde a palpação simples ou mesmo com o estetoscópio não se
conseguem.
Registra-se a medida da pressão arterial no membro inferior mediante a
colocação do manguito de pressão no terço distal da perna e afere-se a pressão
sistólica no local de detecção do pulso pedioso ou tibial posterior. A mesma manobra
é realizada para medida da pressão arterial sistólica no membro superior no local de
detecção do pulso da artéria braquial. A relação entre a pressão sistólica do
tornozelo e a pressão sistólica braquial corresponde ao índice tornozelo-braquial,
cujo valor normal varia de 0,9 a 1,3. Evidentemente, nas isquemias de membro
inferior espera-se queda deste índice.
A ausculta é um exame imprescindível no exame arterial. Ela é feita com
um estetoscópio comum sobre os grandes troncos arteriais: carótidas, subclávias
(fossas supraclaviculares),aorta abdominal e artérias viscerais (flancos), femorais,
poplíteas e eventuais sopros em outras localizações. Em grandes artérias pode-se
auscultar batimentos correspondendo à onda de pulso. Quando há quebra do fluxo
laminar do sangue, transformando-se em turbilhonar, surgem vibrações que tem
origem nas paredes arteriais e dão origem ao frêmito na palpação e sopro à
ausculta. Esta situação aparece nas dilatações e estenoses arteriais e nas
comunicações artériovenosas (fístulas). Assim nos aneurismas arteriais pode ser
ouvido sopro sistólico em geral suave, o mesmo acontecendo com as estenoses
arteriais. Nestas a intensidade do som é proporcional ao grau de estenose existente
e à velocidade de fluxo, isto é, quanto maior a estenose, mais intenso é o sopro. Nas
fístulas arteriovenosas existe comumente sopro contínuo (sistólico e diastólico), com
reforço sistólico, intenso e rude também conhecido como sopro em maquinaria.
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O paciente portador de doença venosa crônica e ou linfática apresenta
em geral sintomas de longa duração. A dor é um sintoma comum na doença venosa,
sendo em geral suportável. Predomina a dor em peso, em queimação ou
desconforto nas pernas que se agrava na época do calor, quando o indivíduo fica
muito tempo de pé ou no período pré ou menstrual na mulher. A presença das
varizes nos membros inferiores também corresponde a uma queixa da mulher
principalmente, preocupada com o aspecto estético das dilatações venosas. Outras
manifestações podem estar presentes como prurido, câimbras e edema discreto de
tornozelo. As varizes podem ser divididas em dérmicas, reticulares e tronculares de
acordo com o seu calibre. As varizes de membros inferiores podem se complicar.
Uma destas complicações é a tromboflebite superficial caracterizada como dor
súbita e intensa sobre um trajeto venoso associado a processo inflamatório
localizado. Quando a dor aguda atinge grupos musculares de panturrilha
principalmente e que piora aos movimentos de extensão e flexão e deambulação,
acompanhado de empastamento (edema) muscular sugere a presença de trombose
venosa profunda. O edema é uma queixa também comum tanto na doença venosa
quanto na linfática. O edema na doença varicosa, no início é vespertino e discreto, e
com o correr do tempo, se torna mais intenso e duradouro. O prurido sobre os
trajetos venosos e no terço distal da perna aparece nas varizes de longa duração e
nos casos de insuficiência venosa crônica (IVC). Na IVC surgem manifestações mais
graves como o eczema de estase, hiperpigmentação (dermite ocre),
lipodermatoesclerose e culmina com a úlcera venosa ou flebopática. Nestes casos é
importante a diferenciação entre as varizes primárias de longa duração e as varizes
secundárias (síndrome pós-trombótica, fístulas artério-venosas, etc). Classificam-se
as varizes do ponto de vista clinico em 6 nîveis conforme o Quadro 1.
Quadro 1. Classificação clinica:
C0-Sinais de doença venosa não visivel e não palpavel
C1-Teleangectasias e veias reticulares
C2-Veias varicosas
C3-Edema
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C4a-Pigmentação, eczema
C4b-Dermatoesclerose ou atrofia branca
C5-Ulcera venosa cicatrizada
C6-Ulcera venosa aberta
O edema é a queixa mais comum nas doenças de origem linfática e ele é
de longa duração. Está relacionado a doenças congênitas caracterizadas por
aplasia ou hipoplasia do sistema linfático e adquiridas do tipo linfangite ou infiltração
tumoral. O edema linfático é do tipo duro, pouco depressível e proteico. A dor súbita
em trajetos linfáticos associado a febre,mau estar geral pode corresponder a
linfangite aguda.
O exame das extremidades, como já assinalado em relação ao exame
arterial, deve ser feito em ambiente de boa iluminação se possível de luz natural. O
exame físico geral deve seguir a sequência habitual para se obter o peso, a altura, o
tipo constitucional, a frequência do pulso, a frequência respiratória, a pressão arterial
e a temperatura. O aspecto geral do doente, o desenvolvimento do panícolo
adiposo, dos ossos, do sistema ganglionar linfático e o decúbito preferencial devem
ser anotados, bem como o equilíbrio e a marcha, a umidade e a cor das mucosas.
Verificar a temperatura, a umidade, a coloração, as cicatrizes da pele.
O exame físico deve ser feito com o paciente de pé, pois a ação da força
gravitacional faz com que a circulação venosa seja dificultada, preenchendo o
sistema venoso e, dessa forma as veias superficiais se tornam mais visíveis. Nesta
posição caracteriza-se melhor os pacientes com varizes de membros inferiores. Nos
casos em que se procuram sinais de trombose venosa profunda (TVP) dos membros
inferiores, o decúbito dorsal é mais conveniente. Em TVP de membros superiores e
tromboflebites superficiais não há preferência de decúbito.
À inspecção estática deve-se pesquisar a presença de dilatações
varicosas sobre o trajeto da veia safena magna ao nível das faces medial e ântero-
medial da coxa e da panturrilha com o membro em abdução, rotação lateral e
semiflexão. As varizes do território da veia safena parva deve ser feita pela face
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dorsal com a panturrilha semi-fletida sobre a ponta dos pés. É necessário igualmente
pesquisar a existência de varizes perineares ou de colaterais da crossa da safena
magna. O exame da região suprapubiana permitirá caracterizar uma circulação
colateral abdominal podendo testemunhar sequela de trombose venosa profunda
(síndrome pós-trombótica).
A inspecção estática caracteriza as varizes tronculares (veias com calibre
acima de 3 mm) e as de menor calibre definidas como reticulares (entre 1 e 3mm) e
as teleangectasias ou microvarizes (1mm) comumente presentes nos membros
inferiores.
As varizes de longa duração e os pacientes vítimas de seqüelas de TVP
de membros inferiores (síndrome pós-flebítico) manifestam-se sob a forma de estase
venosa mais grave (IVC). Nas regiões peri e inframaleolares surgem múltiplas veias
subdérmicas dilatadas de cor roxo-azulada, conhecidas como coroa flebectásica.
Trajetos venosos sob a forma de vergão vermelho comumente em veias
varicosas caracterizam a tromboflebite espontânea ou podem existir placas de
eczemas sobre veias varicosas. A administração de drogas endovenosas ou o
cateterismo venoso podem inflamar as veias manifestando-se na forma de cordão
venoso avermelhado e outros sinais inflamatórios caracterizando a tromboflebite
(Fig. 10).
Figura 10 – Tromboflebite superficial (hiperemia de pele e cordão venoso palpável em coxa esqueda)
Quando surge um trajeto longo, estreito e retilíneo vermelho associado a
febre alta sugere linfangite aguda (Fig. 11 ).
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Figura 11 – Linfangite aguda (hiperemia da pele em trajeto estreito)
Rubor mais intenso em placas ou o terço distal da perna podem ser
observados nos casos de erisipelas, eczemas agudos e lipodermatoesclerose.
A cianose pode ser vista em tromboses venosas maciças (flegmasia
cerulea dolens) e em casos menos graves, quando o membro é mantido pendente.
Na IVC a cianose também pode aparecer quando o doente assume a posição de
perna pendente.
Em certa fase da TVP ileofemoral (flegmasia alba dolens) pode surgir
palidez por vasoespasmo.
A hiperpigmentação ou dermite ocre é a coloração púrpura ou
acastanhada (cor ocre) da pele que geralmente ocorre na região do tornozelo, mas
que pode se extender para a perna e pé (terço distal da perna) deve-se ao depósito
de hemossiderina, produto de degradação das hemácias extravasadas no interstício
quando há IVC de maior duração (Fig. 12). No inicio da formação dessas alterações,
a área é de cor eritemato-purpúrica. Com o decorrer do tempo, a pigmentação torna-
se mais escura, por deposição de melanina devido a irritação local.
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Figura 12 – Dermite ocre (varizes e hiperpigmentação do terço inferior da perna)
As manchas de cor vinhosa, planas ou ligeiramente cianóticas sugerem
hemangiomas simples ou complexos que implicam em abordagens diagnósticas
mais elaboradas. Estas angiodisplasias (má formação venosas) podem ser
acompanhadas de veias varicosas frequentemente difusas, não sistematizadas
associadas às vezes a uma modificação do volume do membro. As mal formações
complexas mais comuns são as síndromes de Klippel-Trenaunay (Fig. 13) de
Parkes-Weber.
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Figura 13 - Síndrome de Klippel-Trenaunay (hemangioma, hipertrofia e alongamento do membro inferior direito).
O edema é muito comum nas doenças venosas e quando mais intenso
torna-se facilmente perceptível. Nos casos iniciais, pode-se verificar a formação de
godê ou cacifo visível à compressão digital. O acompanhamento diário da medida da
circunferência da coxa ou panturrilha pode ser útil para analisar sua presença ou
regressão. Quando o edema se acompanha de dilatação da rede venosa superficial
comparativamente com o outro lado, sugere a presença de TVP e da rede venosa
colateral colaborando com o retorno venoso do membro.
O edema de origem venosa provoca o extravazamento de líquido para o
interstício e este desencadeia o eczema definido como dermatite eritematosa que
pode progredir para vesículas, descamação, ou rachaduras na pele da perna,
também conhecido como dermite de estase. Surge em geral em hipertensão venosa
de longa duração. Pode-se acompanhar de sinais de escarificação pelo prurido ou
por sensibilizacão a medicamentos tópicos (Fig.14).
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Figura 14 – Eczema de estase ou dermite
A hipertensão venosa grave e de longa duração desencadeia fibrose
progressiva da pele e subcutâneo no terço distal da perna, principalmente em sua
face medial, caracterizando a lipodermatoesclerose ou dermatoesclerose ou
dermatofibrose ou celulite endurada (Fig. 15). Ela aparece sob duas formas aguda e
crônica.
Figura 15 – Lipodermatoesclerose do terço inferior da perna e úlceras flebopáticas.
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Na forma aguda, também chamada hipodermite, o paciente apresenta-se,
à inspecção, uma região bem delimitada, eritematosa ou acastanhada, e
discretamente saliente, às vezes com bordas nítidas, que tendem a aumentar de
tamanho. À palpação, apresenta-se endurecida, dolorosa e quente. Pode-se formar,
agudamente, uma úlcera em seu centro. Frequentemente é confundida com flebite
ou celulite, distiguindo-se desta por não vir acompanhada de febre, adenomegalia ou
leucocitose.
Na forma crônica o tecido cicatricial determina fibrose progressiva da pele
e tecido celular subcutâneo e nos casos de longa duração o terço inferior da perna
vai acinturando, contrastando com o membro edemaciado acima, o que determina
uma forma de bombacha ou garrafa de champanhe invertida (Fig. 16). A fibrose na
região pode ser intensa que leva tardiamente a anquilose da articulação tibio-társica.
Sobre esta região surgem comumente as úlceras venosas.
Figura 16 - Dermatofibrose intensa (forma de bombacha ou garrafa de champanhe invertida).
A visualização do sistema venoso superficial de aparecimento rápido,
comparando-se com o outro membro e associada com outras manifestações
sugerem TVP e quando crônica pode-se tratar de síndrome pós-trombótica.
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Atrofia branca são áreas esbranquiçadas, localizadas, frequentemente
circulares de pele atrófica, rodeadas de capilares dilatados e às vezes de
hiperpigmentação.
A úlcera venosa é o grau máximo da alteração trófica da IVC, também
chamada de úlcera de estase ou flebopática (Fig. 17). As úlceras espontâneas
surgem em geral pouco acima dos maléolos internos principalmente. Elas são
superficiais com bordas cortadas abruptamente. Pode ser pequena tipo lenticular ou
maior numular, mas as vezes se extendem por grandes áreas chegando a ser em
bota atingindo toda a circunferência do terço distal da perna. O fundo é liso,
avermelhado quando a úlcera está limpa, mas quando infectada apresenta exsudato
seropurulento. É pouco dolorosa a não ser quando infectada. Podem estar
circundadas pela hiperpigmentação ou dermite ocre. Nas úlceras de longa duração,
as bordas podem se tornar calosas e irregulares e, se, elevadas, devem levantar a
suspeita de degeneração maligna. Tendem a cicatrizar quando se alivia a
hipertensão venosa elevando-se os membros inferiores ou corrigindo-se os refluxos
venosos da IVC pela cirurgia de varizes ou pelo uso de meias elásticas.
Figura 17 – Úlceras felbopáticas (fundo avermelhado, dermite ocre ao redor junto ao maléolo medial)
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Gangrenas de origem venosa podem surgir raramente como complicação
da trombose venosa maciça (flegmasia cerulea dolens). Ela se instala logo de
imediato ou alguns dias após a evolução de uma trombose venosa grave, podendo
atingir porções distais e mesmo proximais dos membros (Fig. 18).
Figura 18 – Gangrena venosa (edema importante do membro superior direito). Á direita detalhe mostrando a gangrena da mão direita.
A inspecção dinâmica associado à palpação podem complementar o
estudo das insuficiências valvulares do sistema venoso superficial (safenas magna e
parva e perfurantes). Utilizando-se a manobra de Trendelenburg pode-se
caracterizar a incompetência da válvula ostial da safena magna e de veias
perfurantes da coxa e da perna. Solicita-se que o paciente assuma o decúbito dorsal
e após esvaziar o sistema venoso superficial com a elevação do membro a ser
avaliado; coloca-se um garrote na raiz da coxa e outro junto aos maléolos
(dispensável se a prova for realizada rápida). A seguir o paciente assume a posição
supina. Se houver enchimento inicial das varizes sugere insuficiência de veia
perfurante. A seguir retira-se o garrote da coxa; se os novelos varicosos tornarem-se
mais túrgidos caracteriza-se a insuficiência ostial da safena magna e de perfurantes.
Se não houver enchimento inicial das varizes e após a retirada do garrote da coxa,
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estas se enchem de proximal para distal sugere insuficiência ostial pura de safena
magna (Fig. 19).
Figura 19 - Manobra de Trendelenburg
Quando as varizes são do território da safena parva (face látero-posterior
da panturrilha) pode-se lançar mão da manobra dos três garrotes. Após o decúbito
dorsal do paciente e esvaziamento das varizes colocam-se os dois garrotes em
posição conforme manobra de Trendelenburg e um terceiro garrote na fossa
poplítea. O paciente estando de pé observa-se o enchimento das varizes no território
da safena parva com os mesmos significados que a manobra anterior, em relação a
safena parva.
Por se tratarem de manobras qualitativas seus resultados não são
absolutos e servem como indicativos para uma melhor avaliação. Utilizam-se,
atualmente, exames de imagens como o ecoDoppler por serem mais fidedignos na
caracterização dos pontos de refluxo ou de incompetência.
À palpação pode-se notar aumento da temperatura da pele sobre os
novelos varicosos comparando-se com a pele do tecido vizinho. Em celulites e
erisipelas notam-se em geral aumento local da temperatura, além de outras
manifestações sistêmicas.
Na TVP observa-se aumento discreto da temperatura da pele em virtude
da congestão dos tecidos e desvio do sangue do sistema venoso profundo para o
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sistema superficial. Entretanto a sensibilidade tátil para se notar a diferença depende
da temperatura, uma vez que a diferenciação só se consegue quando a temperatura
for acima de 1 grau Celsius.
O edema quando caracterizado pela depressão da pele (godê ou cacifo)
pode caracterizar a TVP, principalmente quando unilateral. Algumas vezes o edema
é pouco perceptível à palpação, mas nota-se empastamento muscular (edema
muscular), pela perda do balonamento da panturrilha quando o paciente se coloca
em decúbito dorsal e a semiflexão do joelho. Testam-se nestes casos os sinais de
Homans, Babcok e Lowemberg. No primeiro solicita-se ao paciente realizar a
dorso flexão do pé ativa ou passivamente; se o paciente referir dor na panturrilha, o
resultado será positivo. Por meio da palpação manual (Babcok) ou com o emprego
de esfignomanômetro (Lowemberg) junto a panturrilha comprime-se a mesma; o
resultado será positivo se o paciente referir dor. Os resultados positivos destes sinais
sugerem a TVP, mas não são patognomônicos. Devem ser afastadas reações
inflamatórias locais de outras etiologias.
O edema duro, pouco depressivo sugere o edema linfático conhecido
como linfedema. Entretanto nas fases iniciais o linfedema não apresenta estas
características e devem ser feito o diagnóstico diferencial do edema de outras
etiologias. A pele no paciente com linfedema é pálida, podendo apresentar-se
avermelhada nos quadros inflamatórios ou infecciosos que surge no
desenvolvimento da doença. O edema de origem venosa comumente apresenta
regressão com o repouso noturno, enquanto o linfedema pode necessitar de três a
quatro dias para obtenção de efeito similar. Deve-se fazer também o diagnóstico
diferencial do linfedema com o lipedema (denominação imprópria para a
lipodistrofia). Esta condição caracteriza a deposição excessiva de gordura nos
membros inferiores e não edema. Não há redução do aumento de volume com o
repouso mesmo prolongado. Nestes casos a pele é elástica e não há sinal de godê.
É bilateral e um coxim gorduroso é observado anteriormente ao maléolo lateral. Os
pés são preservados. Um sinal clínico importante para a caracterização do linfedema
na sua fase inicial é o de Stemmer. Este sinal consiste no espessamento cutâneo
da base do segundo artelho e é obtido pelo examinador quando se tenta realizar a
preensão da pele dessa região. Em pacientes com linfedema, consegue-se perceber
que existe uma infiltração dos tecidos, impedindo uma preensão adequada da pele.
Sendo positivo este sinal permite diferenciar dos edemas de outras etiologias.
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Os linfedemas de longa duração provocam aumento e deformidade da
extremidade pela alteração fibrótica e aparecimento de verrucosidades,
hiperqueratoses e fistulização (Fig. 20).
Figura 20 – Linfedema crônico (membro inferior direito)
Frêmitos sobre varizes, principalmente aquelas de localizações anômalas,
pode ser sentidos nos casos de fístulas artério-venosas.
A percussão pode ser realizada sobre o sistema venoso superficial e é útil
para determinar a continuidade da veia ou a comunicação entre uma veia e o botão
varicoso. A veia dilatada e cheia de sangue conduz um impulso de percussão na
mesma direção do fluxo sanguíneo normal, mas em direção inversa se as válvulas
estiverem insuficientes. Assim, a percussão suave de uma veia e a palpação distal
deve ser realizada como método para detectar o trajeto e as conexões de uma veia
dilatada, enquanto que a percussão e a palpação suave e a palpação proximal são
usadas como forma de testar válvulas insuficientes no segmento venoso situado
entre as duas mãos (Teste de Schwartz).
A ausculta tem importância na semiologia do sistema venoso,
principalmente quando ramos venosos calibrosos estiverem em posição anormal.
Em casos raros pode ser detectada a existência de uma fístula artério-venosa, pela
presença de sopro contínuo ou em maquinaria sobre as dilatações venosas.
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A ausculta poderá também ser utilizada para o diagnóstico de
insuficiência valvular, pela detecção de sopro da safena magna junto a virilha com o
indivíduo de pé ou mesmo deitado,quando se solicita a ele realizar esforço
abdominal, como, por exemplo, tossir.
A semiologia arterial, venosa e linfática evidentemente deve ser
executada de forma concomitante quando do exame físico das extremidades.
LEITURA RECOMENDADA
Boutelier P. Semiologia Cirúrgica. 6ª edição. Ed. Medsi, Rio de Janeiro, 2004.
Correia Neto, A.Clínica Cirúrgica. Volume 2. Editora. Sarvier, 1994.
Maffei FHA, Lastória S, Yoshida WB, Rollo HA, Giannini M, Moura R. Doenças
vasculares periféricas. 4ª edição, Editora Guanabara Koogan, Rio de Janeiro,
2008.
Moraes IN. Propedêutica vascular. Editora Sarvier, São Paulo,1974.
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A abordagem da isquemia aguda de extremidades é exemplificada pela
descrição de dois casos clínicos a seguir. O primeiro caso trata-se de mulher de 45
anos, portadora de fibrilação atrial, que se queixa de dor súbita em membro inferior
direito há duas horas, além de frialdade, palidez e cianose de artelhos do pé direito.
Semiologicamente caracteriza-se a arritmia, além da ausência de pulsos femoral,
poplíteo e distais à direita. Observam-se palidez, cianose e frialdade distal deste
membro. O. segundo caso: homem de 72 anos, queixa-se de dor contínua em
panturrilha esquerda há quatro horas que o impede de caminhar. Relata ainda
cianose de artelhos deste mesmo lado. Previamente sentia claudicação intermitente
da panturillha esquerda para 200 m, aproximadamente. Tratava de hipertensão
arterial e era fumante. Palpa-se o pulso femoral esquerdo pouco ampio, em relação
ao direito e ausência dos pulsos distais deste lado. Nota-se cianose discreta dos
artelhos esquerdos e palpam-se artérias endurecidas no membro contralateral.
Clinicamente caracteriza-se a embolia arterial no primeiro caso e a
trombose arterial aguda no segundo. Estes dois casos sumariamente descritos
representam os quadros mais comuns das oclusões arteriais agudas de
extremidades e representam um dos problemas desafiadores em medicina de
urgência. Estima-se sua incidência em dezessete casos por 100.000 habitantes/ano.
Apesar da melhoria nas condições de atenção aos pacientes com
isquemia aguda de extremidades, as taxas de mortalidade e morbidade ainda
permanecem altas. A mortalidade excede 25% e a taxa de amputação atinge 20%
nos sobreviventes. Estas altas taxas não estão relacionadas somente com a
isquemia do membro, mas também às comorbidades associadas: doença cérebro-
vascular, insuficiência cardíaca congestiva aguda, doença coronariana, diabetes
melhitus, hipertensão arterial, hipercolesterolemia, doença maligna e tabagismo.
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A isquemia é caracterizada basicamente pelo consumo de substrato de
alta energia (ATP), privação de oxigênio aos tecidos e a consequente conversão do
metabolismo aeróbico para a anaerobiose. O balanço entre o suprimento e a
demanda determina a magnitude e a velocidade da depleção dos compostos
energéticos celulares. A tolerância dos tecidos à isquemia varia com a natureza do
tecido e diretamente com a presença ou ausência de circulação colateral. Em geral,
o músculo tolera isquemia em um período acima de quatro a seis horas; lesões
neurológicas permanecem reversíveis até oito horas; a gordura suporta até treze
horas; a pele, vinte e quatro horas e o osso quatro dias em normotermia. Alguns
tecidos como o coração e o cérebro extraem o máximo de oxigênio do sangue no
repouso, assim qualquer aumento na demanda deve ser compensada pelo aumento
do fluxo sanguíneo. Outros tecidos, como os rins e os músculos esqueléticos, não
extraem ao máximo o oxigênio no repouso e assim qualquer aumento na demanda
metabólica é compensado pelo aumento da extração tissular de oxigênio e aumento
no fluxo sanguíneo.
O músculo esquelético, no homem, representa 40% do peso corporal e
75% da massa da extremidade inferior e contém uma variedade de substâncias
químicas em sua composição.
Embora o músculo tenha taxa metabólica relativamente baixa, quando
comparado com outros tecidos como o coração, cérebro e rim, ele é o maior
componente metabólico da extremidade, representando 90% desta taxa.
Durante a isquemia, há diminuição da tensão de oxigênio dentro da
célula, o que determina interrupção da fosforilação oxidativa e consequentemente
cessa a produção de ATP pela mitocôndria. A fibra muscular tenta manter a
atividade à custa do processo de anaerobiose mas, este é menos eficaz que o
processo de respiração aeróbica (fosforilação oxidativa). O ATP também é gerado
aerobicamente, a partir do fosfato de creatina, pela ação da enzima creatinaquinase.
Com o prolongamento do tempo de isquemia, os estoques de energia são
consumidos e o ATP é metabolizado à adenosina difosfato (ADP) e eventualmente a
adenosina monofosfato (AMP). A célula é incapaz de manter a função e o gradiente
transmembrana desaparece. A falta deste gradiente permite o influxo de cálcio
celular.
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O aumento do cálcio citosólico acompanha-se de aumento do cálcio intra
mitocondrial de músculo esquelético isquêmico. Níveis elevados de cálcio
intracelular podem desacopiar a fosforilação oxidativa, ativar proteases celulares e
promover a contratura muscular.
A elevação do cálcio celular durante a isquemía provavelmente ativa uma
protease que converte a xantina dehidrogenase em xantina oxidase. O ATP é
quebrado em inosina e então à hipoxantina, que se acumula nos tecidos. A
reintrodução do oxigênio molecular durante a reperfusão reage com a hipoxantina
formando espécies reativas de oxigênio (superóxidos). Apesar de existir grande
variabilidade nas espécies e tecidos animais, alguns órgãos reperfundidos são
dramaticamente protegidos por inibidores da xantina oxidase (alupurinol) ou
superóxido dismutase.
Estas espécies reativas de oxigênio estão relacionadas com as lesões de
isquemia e reperfusão em vários tecidos.
A reperfusâo resulta em peroxidação lipídica e destruição da integridade
da membrana celular. A administração de varredores de espécies reativas de
oxigênio é capaz de proteger as lesões de músculo esquelético isquêmico.
Fontes potenciais de espécies reativas de oxigênio estão presentes em
outros componentes tissulares como os leucócitos que podem estar presenfes na
fase isquêmica ou introduzidos na fase de reperfusão. A isquemia pode resultar em
aumento das integrinas CD11b/CD18 que são necessárias para que haja adesão
neutrófilo-endotélio. Comprova-se o sequestro ou infiltração leucocitários em
músculo esquelético reperfundido. A isquemia ativa os neutrófilos e estes secretam
enzimas proteolíticas (mieloperoxidases, elastases); sintetizam prostaglandinas e
liberam espécies reativas de oxigênio (pelo sistema NADP hidrogenase), além de
ocluírem a microcirculação pela formação de tampões e empilhamento. Este
fenômeno é conhecido como não refluxo (no reflowphenomenon). A adesão dos
neutrófilos às vênulas e o seu extravasamento vascular são mecanismos conhecidos
em tecidos lesados após isquemia e reperfusão.
Assim dois componentes maiores parecem ser responsáveis pela lesão
de reperfusão. Inicialmente o período isquêmico resulta em depleção dos estoques
de glicogênio e dos substratos de alta energia. O oxigênio moleular é introduzido
neste meio e o ânion superóxido e outras espécies reativas são produzidas. Esta
fase da reperfusão tem sido minimizada experimentalmente pela administração de
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inibidor de xantina oxidase (alupurinol); pela administração de varredores de
espécies reativas de oxigênio e antioxidantes; pela depleção de leucócitos e pelo
controle da taxa de reperfusão.
A reperfusão, especialmente após isquemia prolongada, conduz a
alterações vasomotoras e também a um aumento na permeabilidade microvascular
com resultante edema tissular. A alteração do tônus vasomotor provavelmente seja
devido à redução dos níveis de óxido nítrico (NO). O NO é responsável pelo
relaxamento da musculatura vascular e evita a agregação e adesão plaquetária na
parede vascular. Demonstrou-se que isquemia e reperfusão resulta em redução de
NO tissular e esta disfunção endotelial precede a lesão mitocondrial.
A oclusão aguda é seguida por uma série de eventos que amplifica a
lesão. O trombo pode se propagar e excluir os ramos colaterais. O tecido isquêmico
acumula líquido e edema provocando compressão dos canais vasculares dentro do
compartimento fascial. Este fato resulta em edema endotelial e estenose luminar,
com subsequente obstrução microvascular.
Após a oclusão arterial aguda, a apresentação clínica depende em grande
parte da presença ou ausência de rede de circulação colateral. Depende também da
pré-existência de doença oclusiva arterial e do local da oclusão. Após o episódio
inicial, a isquemia pode ser agravada pela propagação do trombo tanto proximal
quanto distal ou ambos. Isto impede a circulação colateral agravando o processo. A
trombose venosa pode acompanhar a ísquemia aguda de extremidade, geralmente
como evento secundário devido ao estado de baixo fluxo e a trombogenecidade do
sistema.
A reperfusão do tecido isquêmico pode resultar em importante e,
ocasionalmente, efeitos letais sobre a função de órgãos à distância. A liberação pelo
tecido isquêmico de citocinas como o fator alfa de necrose tumoral (TNF-cx),
interleucina-13, fator ativador plaquetário (PAF), prostaglandinas (tromboxanes,
leucotrienos) pode provocar profundas alterações hemodinâmicas e lesão em órgãos
à distância como o pulmão. Este efeito, que pode ser letal em casos graves, foi
descrito por Haimovici e é conhecido como síndrome metabólica mionefropática.
Após a restauração do fluxo, metabólitos ácidos entram na circulação sistêmica e
são capazes de provocar acidose metabólica grave. Alguns recomendam a
administração de bicarbonato durante a fase de reperfusão antecipando ao
problema. O músculo isquêmico pode liberar potássio em níveis altos e rápidos sufi-
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cientes para produzir hiperpotassemia aguda. Esta síndrome pode ser
acompanhada por insuficiência renal aguda devido a mioglobinúria. A tentativa de
bloquear estes efeitos ajuda evitar ou pelo menos minimizar suas consequências.
Insulina associada à gliose pode ser usada para promover a entrada do potássio
para dentro da célula e tratar a hiperpotassemia. A miogLobina precipita nos túbulos
renais em pH menor que 5,8 e então a alcalinização da urina pela administração de
bicarbonato ou cloreto de amónio é importante para evitar a necrose tubular aguda
resultante da mioglobinúria. Ë importante também manter boa hidratação.
A etiologia da oclusão arterial aguda não traumática ou de um enxerto
vascular pode ser agrupada em duas categorias: trombose e embolia. A tendência
atual mostra incidência maior de trombose em relação à embolia. A trombose de
uma artéria ou de um enxerto surge em virtude de lesão parietal, enquanto que a
embolia tende a se alojar em um vaso normal, originária de uma outra fonte. A trom-
bose de um enxerto vascular ocorre com maior frequência do que em uma artéria
nativa.
A maioria dos êmbolos dos membros inferiores origina-se do coração (60
a 70%). Isto é mais comum após o infarto do miocárdio, em virtude da discinesia da
parede do coração que serve como reservatório de sangue estagnante e formação
de trombos. Trombos murais podem ocorrer dentro de horas a semanas após o
infarto. A embolia pode ser a primeira manifestação de um infarto silencioso.
Arritmias cardíacas podem predispor à formação de trombos nos átrios.
A embolia arterial periférica é muito mais grave porque há, geralmente,
poucos vasos colaterais. Os êmbolos se alojam comumente nas bifurcações, pela
mudança brusca de calibre da artéria. Os locais mais comuns dos êmbolos são as
bifurcações da femoral, da ilíaca e do tronco tíbio-peroneiro. Os êmbolos viscerais
correspondem de 7 a 10% dos casos.
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Independentemente das causas, a fibrilação atrial é associada a dois
terços ou três quartos de casos de tromboembolismo periférico.
Embora a incidência da doença reumática tenha declinado ultimamente, a
embolia de valvas protéticas cardíacas tem aumentado, em virtude de maior número
de pacientes que são operados pela doença cardíaca valvular. A miocardioesclerose
e a cardiopatia chagásica podem ser fontes embolígenas periféricas. A endocardite
bacteriana permanece como causa importante de embolia periférica.
Pacientes com trombose venosa profunda e embolia periférica devem ser
investigados pela presença de forâmen oval que pode provocar a embolia paradoxal.
Os aneurismas e a doença aterosclerótica podem ser fontes de êmbolos.
Os aneurismas arteriais, por apresentarem fluxo turbilhonar, frequentemente são
sedes de trombos e estes fragmentando-se, também podem embolizar à distância.
As placas ateroscleróticas podem se destacar e migrarem na corrente circulatória
provocando oclusões agudas periféricas. As fontes mais comuns dos aneurismas
são os da aorta abdominal e poplítea e as placas de ateromas surgem do arco
aórtico e da aorta torácica descendente. A microembolização de membros inferiores
podem se apresentar como quadro de isquemia aguda de um artelho, podendo
chegar à gangrena. Isto é referido como síndrome do dedo roxo (azul). Na presença
deste síndrome deve ser sempre pesquisado a origem do êmbolo seja do coração
ou de uma artéria proximal.
A trombose ocorre geralmente numa artéria que apresenta lesão parietal.
Ela representa o estágio final na progressão da doença arterial aterosclerótica. Um
dos locais mais comuns da oclusão vascular aguda é a artéria femoral superficial no
canal dos adutores.
Inicialmente há a deposição de lipídios na íntima da artéria. Este núcleo
lipídio-cálcio cresce e forma uma capa fibrosa que protrui no lúmen vascular. A
infiltração de macrófago, a ativação de matriz metaloproteinase e a liberação de
outras proteases resultam em ruptura da capa e assim expõe as camadas
subendoteliais que precipitam a trombose aguda. O mecanismo de formação da
aterosclerose e de trombos é lenta e permite o aparecimento de sintomas de forma
gradual, provavelmente pelo desenvolvimento de rede colateral.
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A trombose aguda também pode ser secundária a condições de
hipercoagulabilidade. A trombose pode se desenvolver mesmo em artérias normais.
As causas de hipercoagulabilidade são várias: deficiência de antitrombina III,
presença de fator coagulante lúpico, fator de Leyden. Pacientes idosos com
poliglobulia e doença maligna são candidatos à trombose arterial aguda. A
quimioterapia pode agravar o processo, nesses pacientes, e precipitar a trombose.
A dissecção aguda da aorta pode se manifestar como quadro de isquemia
aguda de extremidade. Caracteriza-se, em geral, nestes casos a hipertensão arterial
e a queixa de dor torácica ou na região dorsal.
O aumento dQs procedimentos endovasculares diagnósticos ou
terapêuticos tem aumentado a incidência de complicações trombóticas e isquemia
de membros. O tratamento destes pacientes pode se tornar difícil, em virtude de
doenças vasculares periféricas prévias. A presença de dispositivos vasculares como
o balão intra-aórtico pode provocar isquemia distal pela formação de coágulo ao
redor do dispositivo, embolia e trombose. As manifestações clínicas podem ser
agravadas pelo estado de baixo fluxo e pela própria indicação do uso destes
dispositivos.
Síndrome compartimental secundária àrevascularização após prólongada
isquemia grave pode dificultar o retorno venoso, agravando a pressão dentro do
compartimento. Se isto não for observado o fluxo arterial torna-se limitado
provocando lesões neurológicas e musculares. As tromboses venosas graves (tipo
flegmasia alba ou cerulea dolens) podem dificultar o fluxo arterial evoluindo para
isquemia de extremidade.
Pacientes em choque cardiogênico ou hipovolêmico, em virtude do estado
de baixo fluxo, podem evoluir com isquemia distal. Drogas vasoativas podem
agravar a isquemia. A administração acidental de drogas em toxicômanos pode
provocar isquemia de extremidade pela própria toxidade de algumas drogas ilícitas
ou pela micro-embolização.
Pacientes submetidos à revascularização de membros seja próteses
vasculares ou enxertos venosos podem apresentar isquemias súbitas por tromboses
precoces ou tardias. As tromboses precoces estão ligadas geralmente a falhas
técnicas enquanto que as tromboses tardias devem-se à hiperplasia intimal nas
anastomoses proximal ou distal.
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O quadro clínico da oclusão arterial aguda de extremidade varia
dependendo do nível e da gravidade da obstrução e da presença de adequada rede
de circulação colateral. Esta pode estar presente dependendo da concomitância de
doença oclusiva arterial prévia na extremidade atingida. As tromboses agudas são
mais comuns quando há doença oclusiva prévia e, em geral, são menos graves
enquanto nos quadros embólicos há pouca chance de se desenvolver rede colateral
e as isquemias são mais intensas.
Na obtenção da anamnese deve se investigar o estado funcional do
membro antes do episódio isquêmico. Pacientes que não se queixam de claudicação
ou não apresentam revascularização prévia do membro, são mais provavelmente
acometidos por embolia periférica.
A oclusão arterial aguda de uma extremidade previamente normal é
caracterizada classicamente por dor súbita, palidez, frialdade, parestesia, paralisia e
ausência de pulsos. A ausência de pulso, aliada aos sintomas referidos na
extremidade acometida e o encontro de pulsos normais no membro contralateral são
patognomônico de uma oclusão arterial aguda embólica.
A dor é a manifestação mais comum na oclusão arterial aguda. Em geral
é intensa e progressiva, atingindo porções distais inicialmente. Se a isquemia
progride, entretanto, surge déficit sensorial que pode mascarar a dor, confundindo o
clínico inexperiente. A dor vai sendo substituida Ientamente por sensação de
dormência, que sugere agravamento da isquemia e exige atenção imediata.
A palidez é um dos sinais precoces da isquemia aguda. O vasoespasmo
arterial associado caracteriza a lividez da pele da região acometida; com o
agravamento da isquemia surge áreas de cianoses em áreas de palidez (pele
marmórea). A compressão digital demonstra que não há reenchimento capilar ou
torna-se lento. Nesta fase da isquemia, se não houver revascularização, há grande
risco de evoluir para a gangrena.
A sensação de frialdade (esfriamento) do membro é comum e ela é
referida quando o paciente toca esta extremidade no lado oposto.
Paralisia e déficit sensorial geralmente são manifestações tardias de
isquemia grave. A isquemia provoca disfunção muscular e neurológica o que
determina a impotência funcional do membro. Com a queda dos estoques
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energéticos, o músculo se torna rígido, demonstrando sinais de isquemia avançada.
Sensações proprioceptivas e a percepçao ao leve toque são perdidas
precocemente. A palpação de grupo muscular pode se mostrar doloroso
inicialmente, mas se a isquemia se prolonga o músculo torna-se rígido, sugerindo
morte celular. A revascularização, nesta fase da isquemia, poderá promover sequela
funcional ou perda do membro frequentemente e efeitos sistêmicos da reperfusão.
Estes efeitos podem ser letais e o salvamento do membro é pouco provável. Alguns
autores sugerem que isquemia nesse nível de gravidade e duração é melhor tratada
com anticoagulação sistêmica que permite a delimitação da gangrena da
extremidade e amputação precoce.
O exame físico caracteriza a ausência dos pulsos distais à oclusão. Ë
importante confrontar a palpação dos pulsos com o membro não afetado. Artérias
normais, elásticas no outro membro sugere embolia; artérias endurecidas e ausência
de pulsos sugerem trombose arterial aguda. Pode-se associar o ultrassom Doppler
na caracterização da presença ou não de pulso, especialmente em membros
edemaciados.
O exame físico pode confirmar as queixas de palidez, frialdade e paralisia.
O encontro de veias superficiais colabadas é comum.
Dependendo de alguns achados, pode-se caracterizar o grau da
isquernia. Assim analisam-se a sensibilidade superficial, reflexos motores e dor à
palpação. As isquemias graves caracterizam-se por paralisias, flictenas, cianose fixa
e dor intensa à palpação. Em isquemias moderadas há palidez, sensibilidade
discretamente preservada, algum grau de rigidez e nas isquemias discretas há pe-
quenos distúrbios de sensibilidade, reflexos motores presentes e palidez discreta.
Existe uma forma clínica de isquemia aguda muito grave que é a embolia
a cavaleiro da bifurcação da aorta abdominal. Dependendo da extensão do êmbolo e
do tempo de evolução caracterizam-se ausência de pulsos femorais, palidez ou pele
marmórea de nádegas, coxas e pernas além de paresias ou paraplegias crurais em
virtude da isquemia medular. A revascularização deste grande contingente de massa
muscular das extremidades inferiores deve ser feita lembrando-se dos riscos das
complicações locais e sistêmicas da síndrome de reperfusão.
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O diagnóstico clínico é baseado na anamnese e no exame físico do
paciente. O ultrassom Doppler pode ser útil na complementação da semiologia.
Deve-se tentar de início estabelecer o diagnóstico diferencial entre embolia e
trombose aguda, uma vez que o enfoque terapêutico, principalmente do ponto de
vista cirúrgico é diferente. De uma maneira geral as embolias acometem pacientes
sem queixas vasculares prévias; as artérias são normais à palpação e não se
observam lesões arteriais de outros membros. O encontro de arritmias cardíacas ou
história de doença cardíaca prévia sugere a fonte embolígena. Quando não há
nenhuma manifestação cardilógica deve-se solicitar radiografia de tórax,
eletrocardiograma e ecocardiografia. Nas tromboses agudas, em geral,
caracterizam-se a queixa de claudicação intermitente prévia e semiologicamente
possíveis lesões de outras artérias. Nos casos duvidosos a arteriografia pode ser útil
para definir o quadro. Resumidamente, na tabela 1, observa-se a diferenciação entre
embolia e trombose
.
Tabela 1. Diferenciação entre embolia e trombose arterial aguda
DADOS EMBOLIA TROMBOSE
Início Súbito Agudo ou subagudo
Dor Aguda e ntensa Moderada/intensa
Claudicação préva Rara Presente
Doença cardíaca Frequente Ocasional
Fonte (êmbolo) Frequentemente detectável Nenhuma
PuIso Pulso proximal e Pulso alterado (doença contra-lateral normal vascular contra-lateral ou ipsilateral) Sopros em membro contra-ateral Pouco frequente Frequente Cor do membro Pálido Pálido (marmóreo) Angiografa Imagem da oclusão em taça Imagem irregular da invertida; nenhuma ou oclusão; circulação colateral pouca rede colateral; mínima bem desenvolvida; doença doença aterosclerótica ateroscerótca difusa
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A doença mais comum que deve ser diferenciada da oclusão arterial
aguda é a trombose venosa profunda. Esta pode se manifestar com dor no membro
mas a presença de veias superficiais distendidas e de edema, temperatura da pele
normal ou levemente elevada e a presença de pulsos arteriais palpáveis contrastam
com ausência de pulsos arteriais, palidez, frialdade, ausência de edema e colapso
das veias superficiais que caracterizam a oclusão arterial aguda. Em casos graves
de trombose venosa profunda podem ocorrer isquemias (phlegmasia caerulea
dolens), inclusive, necrose tissular mas o enorme edema a diferencia da oclusão
arterial aguda. A dissecção aguda da aorta pode causar, algumas vezes, isquemia
de membros e ou órgãos, com ausência de pulsos e outros sinais isquêmicos. A
presença de hipertensão arterial e a dor torácica ou interescapular sugerem a
dissecção. Sopro aórtico e as diferenças de amplitude de pulsos carotídeos e
braquiais podem ser detectados. O alargamento do mediastino pode ser notado na
radiografia de tórax. A aortografia, a tomografia computadorizada, a ressonância
magnética ou a ecocardiografia transesofagia na confirmam o diagnóstico.
A morbidade e mortalidade da oclusão arterial aguda dependem das
condições gerais do paciente, do grau de isquemia da extremidade e da rapidez das
medidas terapêuticas. De uma maneira geral a pronta revascularização é o objetivo
prioritário após a estabilização e controle das condições médicas coexistentes.
A maioria dos pacientes com isquemia aguda de extremidades tem
doença aterosclerótica coronariana que merece atenção. Assim, a estabilização
hemodinâmica é importante, incluindo a correção de arritmias, restabelecimento do
volume circulante e adequado débito urinário.
A história clínica revela as condições da extremidade antes da oclusão
arterial aguda. Pacientes sem história de claudicação ou de reconstrução vascular
prévia são mais provavelmente vítimas de oclusões embólicas. Pacientes com
história de doença arterial periférica, claudicação ou de reconstrução vascular são
mais provavelmente afetados por trombose arterial. A importância da diferenciação
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entre os dois processos é evidente quando se considera o tratamento. Os pacientes
com oclusões embólicas são tratados adequadamente com a tromboembolectomia,
enquanto que os doentes com doença arterial prévia requerem mais reconstruções
vasculares.
Como cuidados gerais, estes pacientes devem ser internados e mantidos
em repouso no leito, protegendo sua extremidade contra extremos de temperatura
(frio ou calor). Envolve-se frouxamente o membro com algodão ortopédico e faixa de
crepe para evitar a perda de calor por irradiação e o possível efeito vasoconstrictor
cutâneo provocado pela temperatura ambiente.
O alívio da dor isquêmica deve ser feito com doses adequadas de
analgésicos e sedativos. Nos casos de embolia com indicação definida de cirurgia,
pode-se realizar bloqueio pendurai imediatamente, objetivando-se aliviar a dor e
promover vasodilatação efetiva.
A heparinização em oclusões agudas de membros é fundamental e
recomenda-se pelo menos 10.000 UI endovenoso para se conseguir imediata e
completa anticoagulação. Os objetivos da anticoagulação imediata são a prevenção
da trombose arterial distal e da trombose venosa. Consegue-se com esta medida
melhora dos sintomas, provavelmente pelos efeitos não anticoagulantes da hepari-
na. Uma vez o paciente estabilizado e anticoagulado, deve-se tomar a decisão de
submetê-lo ou não à arteriografia. Aqueles pacientes com doença vascular prévia ou
com reconstrução arterial devem ser avaliados pela arteriografia pré-
operatoniamente. Esta avaliação é importante no esclarecimento da causa e permitir
planejamento adequado da abordagem cirúrgica. Pacientes cuja história e exame
físico sugerem embolia podem ser adequadamente tratados sem arteriografia.
Quando a diferenciação entre o evento embólico ou trombótico não pode ser feita, a
arteriografia é indicada. A imagem arteriográfica de oclusão em taça invertida, com
artérias proximais normais, êmbolo em bifurcação e pobre rede colateral, indica
embolia arterial aguda. Por outro lado, imagens de oclusão em ponta de lápis ou
secção transversa, artérias proximais com paredes irregulares (estenoses e
calcificações) e circulação colateral desenvolvida, sugerem trombose arterial aguda.
Caracterizado o quadro isquêmico agudo, a revascularização cirúrgica
imediata está indicada nos membros com isquemia grave, que ameace a sua
viabilidade a curtíssimo prazo.
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A tromboembolectomia com cateter de Fogarty é o procedimento
preferencial para os casos de oclusão arterial aguda embólica, enquanto que a
tromboendar-terectomia, a derivação (by pass) e a angioplastia transluminar
percutânea empregam-se nas tromboses agudas.
As embolias de grandes artérias (segmentos aorto-ilíaco, fêmoro-poplíteo
e subclávio-axilo-umeral) são, em princípio, de tratamento cirúrgico. As embolias de
pequenas artérias da perna, de antebraço, mão e pé são, em geral, de tratamento
clínico. Este consiste na heparinização plena utilizando-se 10000 U1 de heparina em
bolo e a seguir mantém-se 400 a 600 Ul/kg/dia.
As tromboses agudas dos segmentos aorto-ilíaco, fêmoro-poplíteo e
subclávio-axilar relativamente compensadas ou se o paciente for de alto risco
cirúrgico, deve-se tentar o tratamento clínico. Se a evolução da extremidade mostrar
agravamento da isquemia, submete-se o paciente à arteriografia e indica-se a
cirurgia reconstrutiva imediatamente.
A terapêutica fibrinolítica tem sido uma alternativa no tratamento de
pacientes com oclusão arterial aguda de extremidades. Esta terapia deve ser
reservada para pacientes em extremidades claramente viáveis e executada em
centros familiarizados com o uso e complicações dos agentes fibrinolíticos.
Em casos bem selecionados, a terapêutica fibrinolítica intra-arterial com
baixas doses proporciona melhores resultados no setor fémoro-poplíteo de natureza
embólica ou trombótica.
Emprega-se a estreptoquinase na dose aproximada de 5.000 U/h,
controlando-se o estado de coagulação do paciente a cada doze horas, dosando-se
o fibrinogênio, os tempos de trornbina e de tromboplastina parcial ativada, evitando-
se a queda de fibrinogênio abaixo de 100 rng. Conseguem-se bons resultados com
esta técnica, com a lise do trombo e êmbolo em doze a dezoito horas.
Pode-se utilizar, também, a uroquinase na dose de 40.000 U/h ou o
ativador tecidual do plasminogênio (t-PA) na dose de 5 mg em 3 vezes (0,5-1 mg/h).
A técnica atual da trombólise se faz pela introdução de cateter
multiperfurado em sua extremidade. O cateter é colocado por punção arterial e o
agente trombolítico infundido diretamente no trombo.
A trombólise pode ser usada intra-operatoriamente por via arterial para
complementar as tromboembolectomias em casos de trombos ou êmbolos residuais
de difícil acesso.
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Estudos multicêntricos, comparando a terapêutica trombolítica direta
(cateter colocado intra-trombo), e a revascularização cirúrgica, em casos de oclusão
arterial aguda, não mostraram diferenças em relação a salvamento de membro e
mortalidade (Tabela 2). Em virtude dos riscos de hemorragia, incluindo hemorragia
cerebral nos pacientes tratados com trombolíticos, esta modalidade terapêutica deve
ser usada seletivamente.
Tabela 2. Revascularização cirúrgica versus trombólise direta em oclusão arterial aguda
ESTUDO ANO RESULTADO
STILE 1994 Cirurgia vs trombólise direta )uroquinase ou rt-PA):
não houve oiferença em mortalidade, taxa de amputação e
grave morbidade nos 2 grupos; taxa de sobrevida de 85%
sem amputação no grupo trombólise e 62% no grupo
operado (6 meses de evolução).
TOPAS 1996 Cirurgia vs trombólise direta (uroquinase): não houve
oferença na mortalidade e taxa de amputação nos 2
qrupos; a magnitude da cirurgia foi reduzda no grupo
trombólise (12 meses de evolução).
As oclusões de pequenas artérias distais, por abuso de drogas com
injeção intra-arterial, devem ser tratadas com heparinização plena agressiva e
precoce, seguindo-se corticosteróide intra-arterial. Bloqueio anestésico loco-regional
é recomendado. Quando não há boa resposta, pode-se administrar fibrinolítico por
via intra-arterial em doses baixas.
A anticoagulação pós-operatória é recomendada nos casos de fibrilação
arterial e de embolia arterial em que a fonte não foi identificada ou efetivamente
controlada. Em casos de trombose arterial aguda, a anticoagulação a longo prazo
deve ser considerada quando, após tratamento ou revascularização, o risco de
retrombose persiste.
As complicações logo após a revascularização de extremidade
agudamente isquêmica estão relacionadas à própria intervenção cirúrgica, aquelas
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que surgem em virtude da reperfusão do membro e as relativas à causa primária do
evento. Esta última está relacionada à doença cardíaca ou à doença vascular
periférica. Assim casos de embolia de origem cardíaca ou outra fonte arterial devem
ser tratados cirurgicamente. Se não for possível, a anticoagulação a longo prazo
deve ser instituída para se evitar novos surtos embólicos.
A recidiva de embolia de extremidade ou visceral varia de 6 a 45% A
anticoagulação deve ser instituída logo após a tromboembolectomia. Em geral, a
recidiva da embolia aumenta significativamente as taxas de morbidade e
mortalidade. Pacientes que são anticoagulados adequadamente tem índices de
recidiva menores do que aqueles que não o fazem. A anticoagulação perene pode
ser recomendada em fibrilação atrial e em situações em que a fonte embolígena não
foi identificada ou efetivamente controlada.
A retrombose após revascularização pode ocorrer no segmento arterial
manipulado em virtude do não reconhecimento de trombo residual durante a
intervenção inicial ou trombo proximal que foi deixado ou inadequada
anticoagulação. A reoperação deve ser indicada prontamente nesta eventualidade
explorando-se o local operado e a arteriografia deve ser feita para esclarecer as
causas da retrombose. Quando se trata de retrombose de enxerto vascular, o
cirurgião deve levar em consideração a necessidade de substituir a prótese por um
enxerto venoso autógeno. Anticoagulantes (heparina, varfarina) e antiplaquetários
(dextran) devem ser usados.
As lesões arteriais são infrequentes (0,5 a 1%) e estão relacionadas
principalmente pelo uso de cateter de embolectomia (perfuração e roturas arteriais,
dissecção de íntima, embolização distal, formação de pseudoaneurisma e fístula
arteriovenosa).
Uma das mais dramáticas e frequentemente letais complicações após a
revascularização de extremidade gravemente isquêmica é a denominada síndrome
metabólica mionefropática ou síndrome de reperfusão. Ela tem essencialmente
dois componentes: um componente local que pode resultar em aumento da lesão
regional da isquemia e um componente sistêmico que pode resultar numa falência
secundária de órgãos e tecidos distantes do membro isquêmico.
As isquemias agudas de extremidades podem ser seguidas de edema de
grau variável, mas frequentemente este desenvolve-se após a revascularização bem
sucedida. O edema que surge após a reperfusão aumenta a pressão nos
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compartimentos musculares envolvidos pela aponeurose e pode comprometer a
perfusão tecidual. É a chamada síndrome compartimental. A sua persistência leva a
alterações isquêmicas irreversíveis de músculos e nervos.
Apesar do avanço no tratamento clínico da síndrome de reperfusão com o
uso de manitol e alguns varredores de espécies reativas de oxigênio, o tratamento
indicado da síndrome compartimental ainda hoje é a fasciotomia. Objetiva-se com a
fasciotomia a descompressão da musculatura, restabelecer o fluxo capilar e
restaurar o calibre das artérias e veias.
Sabe-se que dependendo da quantidade de tecido isquêmico envolvido e
o grau de isquemia e a completa revascularização, libera-se na circulação venosa
uma série de metabolitos celulares. Alguns autores preconizam, inclusive em alguns
pacientes com membros não viáveis na avaliação inicial, a heparinização e a
amputação precoce para evitar o desencadeamento dessa síndrome.
Com o restabelecimentodo fluxo sanguíneo há liberação de substâncias
ácidas capazes de causar acidose sistêmica rápida e progressiva. Isto pode conduzir
à alteração da função cardíaca, agravando a acidose, arritmias e morte. Deve-se
administrar bicarbonato de sódio (1 mEq/kg) e avaliar com frequência o pH e gases
sanguíneos. Hiperpotassemia após revascularização pode ser dramática e levar a
arritmias e parada cardíaca. Solução polarizante de glicose e insulina endovenosa (5
g de glicose/1 UI de insulina) érecomendada como medida urgente. Após esta fase
inicial pode-se usar resina de troca iônica e mesmo a hernodiálise.
A liberação de mioglobina na circulação venosa pode desencadear
insuficiência renal por precipitação desta nos túbulos coletores. A queda da função
pode ser discreta e transitória, com oligúria, anúria e mioglobinú ria, mas pode ser
definitiva quando ocorre acidose metabólica prolongada. Esta é a causa de morte
em alguns pacientes após isquemia aguda de membros. A mioglobinúria pode ser
evitada pela diurese osmótica com o uso do manitol, adequada hidratação e boa
condição hemodinamica.
Os pulmões podem ser afetados pelo efluente venoso. Os efeitos sobre a
circulação pulmonar podem eventualmente ser dramáticos e levar à insuficiência
respiratória aguda. Estes pacientes devem ser mantidos com suporte ventilatório e
evitar a extubação precoce. A radiografia de tórax simples pode caracterizar um
padrão típico da síndrome de angústia respiratória. Deve-se manter boa hidratação,
evitando-se sobrecarga de líquidos.
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A melhoria na técnica cirúrgica e no manuseio clínico dos pacientes com
isquemia aguda de membros, a partir da década de oitenta, refletiram em queda da
morbidade e mortalidade. A taxa de salvamento de membros está entre 85 a 95% e
a mortalidade diminuiu entre 10 e 15%.
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Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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A hipertensão arterial acomete aproximadamente 43 milhões de pessoas
nos Estados Unidos, das quais apenas 47% têm controle ótimo definido como
pressão arterial sistólica inferior a 140 mmHg e pressão diastólica abaixo de
90mmHg(1).
Sabe-se há muito tempo que a hipertensão arterial sistêmica está
associada com alta prevalência de doença vascular. Pressões arteriais acima de
150/90 mmHg são observadas em 25% de pacientes com claudicação intermitente,
comparados com 9% dos pacientes controle(2). No estudo de Framingham, a
hipertensão sistólica predisse o desenvolvimento subseqüente de claudicação
intermitente e acidente vascular cerebral aterosclerótico no acompanhamento
precoce(3). Os níveis de hipertensão diastólica e sistólica correlacionam com as
complicações ateroscleróticas e são fatores aceleradores da aterosclerose, a longo
prazo(4). Pressão arterial elevada, acima de 150/90 mmHg, está presente em 60%
dos pacientes com aneurismas aórticos e em 80% daqueles com dissecção
aórtica(5).
Apesar das controvérsias em relação ao controle da hipertensão arterial e
a doença vascular periférica, considera-se hoje que a hipertensão é o fator mais
potente no desenvolvimento da doença aterosclerótica e a principal causa de
morbidade e mortalidade na população americana(6).
Em um trabalho de revisão de dados disponíveis na literatura, alguns
autores determinaram que aproximadamente 1,8% dos pacientes abaixo de 60 anos,
3,7% daqueles entre 60 e 70 anos e 5,2% dos acima de 70 anos têm claudicação
intermitente(7).
A manifestação de claudicação intermitente de membros inferiores é a
mais comum e sugere a presença da doença aterosclerótica obliterante (AEO) em
artérias das extremidades.
A etiologia e a patogênese da AEO é tema de inúmeras investigações e
controvérsias. Os eventos celulares e bioquímicos conduzem ao desenvolvimento de
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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uma placa aterosclerótica e são provavelmente similares, quer a placa se
desenvolva nas artérias coronárias ou nas periféricas. A placa aterosclerótica ou
ateroma é a lesão elementar da AEO.
Fatores de risco tradicionais tais como idade e sexo, hipertensão arterial,
diabetes, colesterol total e lipoproteína de baixa densidade (LDL) elevados,
triglicérides elevados, tabagismo, obesidade, vida sedentária, história familiar de
doença vascular e fatores genéticos são tão importantes na aterosclerose periférica
quanto na aterosclerose coronária. Mais recentemente, reconheceram-se outros
fatores de risco: homocistenemia aumentada, anticorpos anticardiolipina elevados e
função plaquetária alterada.
O diabetes melito permanece um importante fator de risco particularmente
no desenvolvimento da doença AEO na extremidade. O estudo de Framignham
demonstrou que qualquer grau de intolerância à glicose estava associado com
aumento do risco de AEO(8,9).Neste mesmo estudo o hábito de fumar multiplicou por
dois o risco de AEO de extremidade inferiores, tanto para homens como para
mulheres(9).
O tabagismo está também fortemente associado a AEO avançada de
membros inferiores em pacientes acima de 50 anos. Sabe-se, por outro lado, que
nos pacientes que deixam de fumar e desenvolveram claudicação intermitente,
nenhum progrediu para dor em repouso(10). Daqueles que continuaram a fumar, 60%
desenvolveram dor de repouso. Pacientes que pararam de fumar tiveram menos
amputações, infarto do miocárdio, dor em repouso e tiveram sobrevida duas vezes
maior que aqueles que continuaram. O cigarro é provavelmente o fator mais
importante relacionado à aceleração e progressão da AEO periférica. E, ainda, a
persistência no hábito de fumar diminui significativamente a taxa de permeabilidade
em cirurgias reconstrutivas com próteses vasculares e enxertos autólogos de veia(11,
12, 13).
Há vários mecanismos pelos quais o cigarro causa a AEO. Talvez um dos
mais importantes é que o cigarro lesa diretamente o endotélio, causando danos
estruturais e disfunção endotelial. O cigarro aumenta a resistência periférica, a
agregação plaquetária, a viscosidade plasmática, níveis de monóxido de carbono,
níveis de fibrinogênio e tendências trombóticas. O fumo estimula diretamente o
sistema nervoso simpático, portanto aumenta a freqüência cardíaca, a pressão
arterial e o débito cardíaco(14).
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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Níveis elevados de lipoproteínas e de homocisteína podem também ser
importantes fatores de risco no desenvolvimento de claudicação intermitente e AEO
de membros inferiores(15, 16).
A relação entre fatores hemostáticos e AEO tem tido grande interesse
atualmente. A trombose em local de AEO é o evento final que pode precipitar
sintomas mais graves, como dor em repouso, gangrena ou úlcera isquêmica.
Anormalidades de algumas proteínas, como o anticoagulante lúpico e reatividade
plaquetária alterada, têm sido identificadas em pacientes com AEO(17). Quando
presentes essas anormalidades podem conduzir à trombose precoce de
reconstruções arteriais. Fatores hemorreológicos, tais como aumento na viscosidade
sangüínea, hematócrito elevado e níveis elevados de fibrinogênio, podem também
influenciar no sucesso da reconstrução arterial(18).
O controle dos fatores de risco constitui a parte principal do tratamento
médico, prevenindo os acidentes tromboembólicos com os antiagregantes
plaquetários e as substâncias vasoativas. A influência do controle dos fatores de
risco sobre o prognóstico a longo prazo dos pacientes tratados cirurgicamente ou por
via endovascular parece igualmente bem demonstrado e assinala bem a extrema
importância da ação do clínico geral.
A lesão elementar da AEO é a placa de ateroma. É por um mecanismo
hemodinâmico ou tromboembólico que a placa de ateroma ou suas complicações
locais vão provocar os sintomas. Inicialmente, a placa se apresenta sob a forma de
infiltração subendotelial por depósitos lipídicos. Esta placa pode ser mais ou menos
espessa, determinando redução mais ou menos acentuada da secção circular do
vaso. Ela pode ser segmentar, às vezes curta, determinando então imagens
irregulares de protrusão na luz vascular, ou longa e difusa, provocando então
estenose hemodinâmica importante, mesmo na ausência de grau importante de
estenose em diâmetro. A infiltração da placa pode ser circunferencial, mas
freqüentemente afeta de preferência uma das faces do vaso. As lesões predominam
na face posterior da aorta e nas faces póstero-internas dos eixos íleofemorais. Disto
resulta que o grau de estenose, ocasionada por estas lesões, é particularmente mal
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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visibilizado nas arteriografias de face, as quais devem ser completadas por
incidência de perfil na aorta e oblíquas nos eixos íleofemorais. Por outro, lado a
placa de ateroma afeta preferencialmente o óstio dos ramos da aorta e sua divisão,
explicando o local freqüente das lesões na emergência do tronco celíaco, artérias
mesentéricas, renais, ilíacas primitivas e bifurcações ilíacas, femorais e poplíteas.
Acrescem-se a estes locais a bifurcação carotídea e a emergência das subclávias.
No interior da placa de ateroma, inicialmente não complicada, pode
sobrevir fenômenos de hemorragia, necrose, fratura, levando à saída de conteúdo
da placa no fluxo sangüíneo. Assim, a placa ulcerada pode ser sede de trombos
plaquetários ou de fibrina, responsáveis por complicações tromboembólicas. O
descolamento da placa pode constituir o início de uma dissecção localizada ou
extensa. A degeneração local da parede pode ser o ponto de partida da formação de
um aneurisma. A placa de ateroma ainda pode tomar uma forma verrucosa, seja
coraliforme ou calcificada. Esta forma é particularmente freqüente em doentes
alcoólatras e fumantes.
As placas de ateroma ocorrem na superfície posterior das artérias das
extremidades. Com a evolução, a placa pode envolver circunferencialmente a artéria
em certas áreas. A AEO inicia-se freqüentemente nas origens ou nas bifurcações
das artérias. Outros locais incluem a artéria femoral comum, a artéria femoral
superficial distal (canal de Hunter) e o tronco tibioperoneiro. Além do acúmulo de
placas, surgem trombos que agravam a oclusão arterial. Eventualmente a placa
obstrutiva pode tornar-se instável e romper-se, causando hemorragia intraplaca ou
trombose, oclui-se completamente a artéria19. Com a progressão da AEO, ocorrem
oclusões segmentares das artérias que suprem as extremidades. Os tecidos distais
à oclusão experimentam isquemia, embora sua atividade dependa da localização e
extensão do processo oclusivo e do desenvolvimento de rede colateral.
O sintoma mais comum é a claudicação intermitente da panturrilha, mais
freqüentemente relacionada à oclusão da artéria femoral superficial. O fluxo
sanguíneo aos tecidos distais geralmente é mantido à custa da rede colateral. Na
maioria dos casos o processo é gradual; a rede colateral desenvolve-se
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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adequadamente e permite a viabilidade dos tecidos mais distais. Se a oclusão
ocorrer de forma abrupta, os sintomas surgem agudamente. As vias colaterais que
frequentemente se desenvolvem incluem os ramos lombares da aorta ou o sistema
da ilíaca interna em relação à oclusão da ilíaca comum; os vasos circunflexos
femorais em relação à oclusão da femoral comum e o sistema da femoral profunda
em relação à oclusão da artéria femoral superficial. Os ramos geniculares ao redor
do joelho formam rica rede colateral, quando a doença oclusiva envolve mais
extensamente as artérias femoral superficial e poplítea.
O desenvolvimento desta rede de colaterais pode ser tão importante que
permite ao paciente caminhar longas distâncias. As manifestações mais graves da
doença arterial oclusiva das extremidades são: a dor em repouso, gangrena e a
úlcera isquêmica. Elas surgem quando a rede colateral é inadequada para prover
oxigênio suficiente aos tecidos distais. Nessas condições, há comprometimento de
várias artérias ou do tronco arterial principal da rede colateral. Em diabéticos, a rede
colateral é mais desenvolvida do que nos não diabéticos. Ocasionalmente, a
embolização distal ou trombose in situ do leito distal vascular compromete
agudamente a viabilidade dos tecidos mais distais. Freqüentemente pequenos
traumas externos são capazes de iniciar uma lesão isquêmica mais séria. Nestes
locais desenvolvem-se gangrenas ou úlceras isquêmicas.
Os sintomas da AEO das extremidades são, em geral, insidiosos e
graduais em sua evolução e podem levar à consulta médica somente em estágio
avançado. Algumas evidências sugerem também que sintomas moderados podem
permanecer estáveis por muitos anos. Às vezes, a oclusão súbita ocorre na doença
aterosclerótica pré-existente, caracterizando o problema isquêmico agudo.
O sintoma típico da doença arterial oclusiva dos membros inferiores é a
claudicação intermitente. Seu início é geralmente gradual e frequentemente não é
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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percebido por muitos adultos idosos que podem atribuir seus sintomas à artrite ou à
idade.
A claudicação intermitente é geralmente descrita como a sensação
dolorosa associada com a marcha. Este desconforto ocorre num grupo muscular
distal à oclusão arterial. A localização mais comum é na panturrilha, provocada pela
obstrução da artéria femoral superficial. A localização da obstrução comumente
corresponde à projeção do tendão adutor (canal de Hunter) na porção distal da coxa.
A claudicação intermitente pode ocorrer também na coxa, quadril,
nádegas, se a oclusão envolver o segmento aorto-ilíaco ou artérias ilíacas internas.
Raramente a claudicação intermitente pode ser sentida isoladamente no pé. Esta
situação pode ocorrer em pacientes com doença oclusiva de pequenos vasos, como
na tromboangeíte obliterante.
Se a AEO ocorrer em vários níveis (aorto-ilíaco, fêmoro-poplíteo e distais),
o grupo muscular mais afetado é o distal, seguido pelo mais proximal se o paciente
continuar a caminhada.
A sensação de dor na claudicação é progressiva quando o paciente
caminha, mas diminui rapidamente no repouso. Em geral a claudicação é unilateral
em seu início. Pode ser bilateral nos pacientes que têm oclusão da aorta abdominal
distal. Mas geralmente uma perna é afetada primeiro, seguida pela manifestação de
sintoma similar no lado oposto.
O médico deve caracterizar bem a distância útil inicial (distância entre o
repouso até o início da dor) e atual. Em geral os pacientes conseguem precisar o
número de quadras que conseguem caminhar, em sua marcha habitual. Os
pacientes relatam que o aumento da velocidade da marcha, ou subir ladeiras ou
carregar peso aumentam, seu desconforto e diminuem a distância útil. É importante
também caracterizar o tempo de evolução da claudicação. Se a distância útil diminuir
em pouco tempo (alguns meses), pode-se inferir que a doença arterial oclusiva está
agravando-se. Este fato será importante na decisão sobre o tratamento a ser
instituído nesta circunstância.
A verdadeira claudicação deve ser diferenciada da pseudo-claudicação
(neurogênica) provocada por estenose de canal lombar ou doença discal (20,21). Esta
diferenciação pode ser feita geralmente com base na história e no exame físico.
Desde que a maioria dos pacientes com pseudoclaudicação tem concomitante AEO,
os pulsos dos membros inferiores podem ser diminuídos ou ausentes. A história é
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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importante para determinar qual doença é atualmente responsável pelos sintomas.
Por outro lado, nos pacientes com claudicação intermitente três aspectos são
característicos: consegue-se reproduzir a claudicação de forma consistente, em
situações adequadas; o paciente recupera-se da dor em 2 a 3 minutos após a
marcha e consegue caminhar a mesma distância após sua recuperação.
Claudicação intermitente pode ser empregada também como manifes-
tação de oclusão arterial do membro superior, apesar do termo não ser apropriado,
pela origem etmológica. Situações de esforço dos membros superiores, como em
trabalhadores braçais, ou mesmo movimentos finos, executados por pianistas e
pintores, por ex., podem desencadear sintomas de dor ou desconforto em grupos
musculares do braço, antebraço e mão.
Quando a distância útil da marcha se torna pequena ou nula, instala-se a
dor em repouso ou de decúbito. Em geral, obriga o paciente a manter o membro
pendente para alívio da dor, mas esta atitude provoca edema do membro e pode
precipitar o início de um distúrbio trófico (úlcera ou gangrena). Esta dor
frequentemente é contínua e de grande intensidade, caracteriza o agravamento da
isquemia. Cede somente com analgésicos potentes.
A dor em repouso sinaliza que as condições da extremidade estão se
deteriorando e que, invariavelmente, encaminha-se para necrose ou ulceração.
Se o paciente suportar sua dor em repouso, eventualmente pode surgir
necrose isquêmica entre dois dedos do pé, caracterizando a úlcera interdigital. Em
alguns pontos de pressão, como a extremidade do hálux, calcanhar ou pontos de
pequenos traumas, como nas unhas, podem surgir gangrena seca ou ulceração.
Quando ocorrem estas alterações tróficas, o indivíduo não consegue praticamente
caminhar. Estes distúrbios tróficos apresentam vários componentes etiológicos ou
agravantes: isquemia, infecção, neuropatia diabética e traumatismos. A dor em
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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repouso e as alterações tróficas constituem ameaça tissular imediata, necessitando
revascularização o mais rápido possível.
Se a isquemia for grave e de longa duração, o paciente pode desenvolver
dor ao longo da distribuição de um nervo sensorial periférico. Esta dor, referida como
neuropatia monomélica isquêmica, pode ocorrer na ausência de ulceração ou
gangrena e é frequentemente descrita como sensação de formigamento, dormência
ou queimação(22). A neuropatia isquêmica pode ocorrer após trombose arterial aguda
e subsequente revascularização, particularmente se a isquemia tiver sido de duração
prolongada. É difícil de ser tratada e pode persistir indefinidamente em alguns
indivíduos.
Pacientes com quadros graves de isquemia, que são sedentários, podem
apresentar considerável perda de massa muscular nos membros inferiores.
Ocasionalmente suas queixas de dor no membro são desproporcionais ao achado
do exame físico. Estes pacientes referem dor à simples palpação da panturrilha ou
músculos da coxa e a osteoporose pode ser demonstrada numa radiografia simples
da perna. Esta condição pode dificultar a reabilitação após a reconstrução arterial
dos membros inferiores. Fisioterapia supervisionada é necessária para reabilitar o
paciente no pós-operatório.
A impotência sexual é motivo de consulta relativamente freqüente em
pacientes portadores de lesões oclusivas aortoilíacas. Alguns pacientes, às vezes,
omitem esta queixa por pudor, mas reclamam da claudicação intermitente dos
membros inferiores. Trata-se de impotência de erecção por dificuldade de perfusão.
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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Claudicação intermitente dos membros inferiores, impotência sexual e
ausência de pulsos femorais caracterizam a síndrome de Leriche.
Muitos indivíduos com insuficiência arterial descrevem sensação de pés
frios. Pacientes diabéticos podem ter neuropatia periférica e queixarem-se de
queimação ou dor moderada nos pés e dedos. Alguns indivíduos podem apresentar
sensação de formigamento e diminuição da mobilidade dos dedos. Estes sintomas
podem ocorrer mesmo na presença de circulação adequada. Pacientes diabéticos
com sensibilidade alterada podem desenvolver úlcera traumática sobre a cabeça
plantar dos metatarsos, que é chamada úlcera neurotrófica. Sepse pode ocorrer se
infecção secundária sobrevir. A infecção pode progredir rapidamente nos tecidos e a
extensão da infecção agrava as condições gerais do paciente.
As lesões oclusivas dos ramos arteriais viscerais da aorta abdominal
devem ser pesquisadas na anamnese. Emagrecimento associado a dores
abdominais pós-prandiais deve evocar a possibilidade de lesão de artérias
digestivas principais, particularmente se a claudicação intermitente dos membros
inferiores, pela qual o doente consulta, estiver associada às manifestações
abdominais. Hipertensão arterial que se instala ou se agrava rapidamente, ou resiste
ao tratamento anti-hipertensivo, ou se acompanha de insuficiência renal, tem grande
chance de estar associada a lesões de artérias
renais em doente que se queixa de claudicação intermitente de membros
inferiores.
A ananmese deve ser completada focalizando antecedentes cérebro-
vasculares, acidentes isquêmicos transitórios e definitivos, dirigindo a atenção às
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lesões associadas das artérias destinadas à irrigação cerebral (carótidas
extracranianas e vertebrais) e, sobretudo manifestações de origem cardíaca: angina
pectoris, dispnéia de esforço e distúrbios do rítmo. E, ainda, se o tratamento
cirúrgico das lesões ateroscleróticas estiver indicado, os antecedentes pulmonares e
as cirurgias anteriores podem influir muito sobre a decisão terapêutica.
Em situações de grave isquemia, a fraqueza muscular inevitavelmente
ocorre por causa da atividade ambulatorial diminuída e atrofia associada. Em certas
condições de isquemia aguda ou insuficiência arterial prolongada, grupos
musculares tornam-se infartados após a revascularização.
Esta condição é mais comum no compartimento tibial anterior. A
descompressão de emergência dos músculos edemaciados (fasciotomia) é
freqüentemente necessária para preservar a viabilidade muscular. Rigidez articular e
contratura em flexão coxo-femoral e do joelho podem ocorrer como resultado da
oclusão arterial crônica, pois muitos pacientes mantêm a coxa e o joelho fletidos
num esforço para alívio da dor. Estas contraturas podem ser difíceis de tratar,
mesmo após a revascularização ou amputação. Fisioterapia deve ser recomendada
para manter a mobilidade articular e muscular em doentes com insuficiência arterial
grave.
A combinação de amannese bem feita e exame físico cuidadoso
conduzem o clínico experiente a um diagnóstico acurado da localização anatômica e
gravidade da doença arterial oclusiva. Entretanto, em pacientes com doença arterial
oclusiva moderada, os achados físicos podem ser mínimos. É importante comparar
uma extremidade com a outra, pois um membro é mais gravemente afetado que o
outro. A inspeção simultânea de ambas as extremidades permitirá ao clínico avaliar
a cor e as condições da pele. Achados do exame físico como gangrena, ulceração,
edema e atrofia, indicam a gravidade da isquemia. A pele é seca e descamante. A
distribuição pilosa é um fraco indicador da isquemia vez que seu crescimento pode
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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diminuir normalmente com o avançar da idade. Quando se examinam
comparativamente ambas as pernas e pés, a diferença de temperatura pode tornar-
se evidente. O membro com isquemia importante torna-se mais frio. A palpação dos
pulsos das extremidades é imprescindível. Femoral poplíteo, tibial posterior e
pedioso para os membros inferiores e subclávio, axiliar, braquial, radial e ulnar para
os membros superiores devem ser pesquisados e comparados em amplitude com os
contralaterais. O exame inicial da pressão arterial de ambos os membros superiores
e a palpação de ambos os pulsos radiais servem como linha de base para
comparação com os pulsos dos membros inferiores. Os pulsos devem ser
graduados em normal, diminuído ou ausente. Alguns indivíduos podem ter seu pulso
pedioso não palpável, com perfusão essencialmente normal da extremidade. Isto
resulta freqüentemente de anomalia anatômica arterial abaixo do joelho(23).
Pacientes com significante AEO podem demonstrar às manobras
posturais: palidez à elevação, enchimento venoso retardado e rubor pendente.
Ocasionalmente pacientes podem ter pulso pedioso palpável em repouso. Uma
caminhada, seguida de novo exame físico, pode evidenciar o desaparecimento do
pulso e a medida da pressão segmentar após o exercício mostra queda da mesma.
À ausculta, pode caracterizar-se a presença de sopro sistólico que,
apesar de não ter grande especificidade, traduz a turbulência hemodinâmica que
deve atrair a atenção do médico. As grandes artérias devem ser auscultadas:
carótidas, subclávias, aorta abdominal e seus ramos e artérias femorais.
O exame neurológico (exame sensorial) é também muito útil. Os
diabéticos demonstrarão sensibilidade vibratória alterada; e dor, mesmo se não
tiverem insuficiência arterial grave. Indivíduos com neuropatia isquêmica
frequentemente têm sensibilidade alterada e, às vêzes, hiperestesia está presente.
É o teste mais simples para avaliar a circulação da extremidade inferior.
Consiste no registro de pressão de artérias distais (pediosa ou tibial posterior) com
auxílio de um aparelho ultrassônico Doppler. Insufla-se o manguito de pressão
convencional no terço distal da panturrilha até o desaparecimento do fluxo arterial
caracterizado pelo Doppler e em seguida desinsufla-se o manguito; o ressurgimento
do som determina a pressão distal. Registra-se a pressão de ambas as artérias
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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braquiais. Se houver discrepância entre elas, utiliza-se a de maior valor. A razão
entre a pressão maleolar (pediosa ou tibial posterior) e a pressão braquial
caracteriza o índice isquêmico daquela extremidade. Há boa correlação entre os
valores do índice isquêmico com os sintomas funcionais. No indivíduo normal, em
repouso, o índice varia de 0,9 a 1,3. Pacientes com claudicação têm um índice, em
geral, entre 0,4 a 0,9. Pacientes com dor de repouso apresentam índice abaixo de
0,4 e com úlcera isquêmica ou necrose, abaixo de 0,25. Este índice é interessante
para caracterizar pacientes claudicantes com pulsos distais palpáveis. Nota-se a
queda do índice registrado em repouso e naquele medido após exercício físico
(caminhada). Se não houver variação da pressão, após o exercício, deve haver outra
causa que justifique a manifestação de dor no membro. Além disso, o índice
isquêmico deve ser medido em toda visita pós-operatória de paciente que foi
submetido à reconstrução arterial, comparando-se os resultados. A queda do índice
pode representar deterioração funcional do enxerto, sugerindo risco de oclusão do
enxerto. Em pacientes com artérias distais calcificadas, não compressíveis,
principalmente diabéticos, a pressão do tornozelo pode ser superestimada.
Apesar da anamnese e o exame físico caracterizar em doença arterial
oclusiva, frequentemente são necessários exames laboratoriais, seja para concluir o
diagnóstico ou, seja para planejar a terapêutica (clínica ou intervencionista) dos
pacientes. O ecodoppler (ultra-sonografia) é o mais utilizado, por ser método não
invasivo. O dopller contínuo, a ecografia, e ainda o ultra-som colorido (ultra-som
duplex) permitem fornecer informações cada vez mais precisas sobre a geometria
das lesões, a estrutura física da parede arterial, as relações anatômicas, o conteúdo
arterial e, sobretudo o regime circulatório ao nível da lesão e à distância, no território
irrigado. Embora com algumas limitações, a ultra-sonografia é o exame de escolha
no diagnóstico das lesões oclusivas da aorta e artérias dos membros inferiores e
também como instrumento de avaliação pós-operatória. Ela é insubstituível na
detecção de lesões arteriais associadas de outros territórios (carótidas, membros
superiores, etc). A outra vantagem decisiva do método é seu custo, inferior ao de
outros métodos, e que o torna ideal para triagem de massa e de seguimento. Apesar
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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destas vantagens, o método é pouco prático e inviável em relação às extremidades,
pelo tempo gasto na realização do exame e dificuldades de se visibilizarem-se as
artérias distais. Além disso, o método é examinador-dependente e sujeito a erros de
avaliação.
A arteriografia é método indispensável na investigação de doentes
destinados ao tratamento cirúrgico ou endovascular. A redução da mortalidade
ligada ao exame permitiu estender as indicações. Em condições técnicas ideais ela
fornece praticamente todas as informações necessárias à tomada de decisão
terapêutica e fornece um documento objetivo diretamente interpretável por todo
médico. A via de abordagem arteriográfica deve ser escolhida em função de
princípios simples como o fato de evitar cateterização de zonas patológicas e injetar
em locais de alto débito, o mais próximo possível à montante das lesões. Como
regra aproveitar ao máximo desta técnica invasiva para evitar sua repetição.
A aortoarteriografia dos membros inferiores deve ser completa fornecendo
informações sobre a terminação da aorta torácica até a bifurcação da aorta
obdominal; as duas artérias renais (inclusive com radiografias para se verificar o
parênquima renal); origem das artérias digestivas (radiografias de perfil da aorta); os
eixos íleo-femorais (inclusive em oblíquas); os eixos das pernas e ainda as artérias
dos pés (arcada plantar). Pode-se investigar as artérias distais das pernas utilizando-
se arteriografia por punção das femorais bilaterais com radiografias tardias para
visibilizar melhor as artérias dos pés.
Em geral, a arteriografia é bem tolerada e pode ser realizada em regime
ambulatorial, a não ser em doentes com insuficiência renal ou diabéticos graves, nos
quais a hidratação, o reequilíbrio hidroeletrolítico e a estimulação da diurese
requerem hospitalização.
Apesar destes aspectos relativamente favoráveis, deve-se lembrar que a
arteriografia é um método invasivo e apresenta riscos de complicações ligadas ao
local da punção, às manobras intra-arteriais com o manuseio do cateter e reações
ao uso do contraste.
A tomografia computadorizada tem papel pouco relevante nas doenças
arteriais oclusivas, mas é importante no diagnóstico e caracterização dos
aneurismas.
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A RNM tem merecido a atenção no estudo da circulação periférica. Com a
RNM a velocidade de fluxo pode ser estimada e não há necessidade de
administração de contraste. As imagens podem ser obtidas nos planos transverso,
sagital e coronal. Além disso, a técnica não demonstrou efeitos adversos. Há
trabalhos que demonstram boa resolução de imagens da RNM em confronto com a
arteriografia convencional, no estudo da circulação dos membros (24,25). A RNM tem
sido muito empregada no sistema carotídeo, lembrando-se que ela superestima o
grau de estenose.
Na presença de úlcera isquêmica ou gangrena digital, a radiogradia
simples do pé pode ajudar a detectar osteomielite subjascente ou infecção de partes
moles. Pacientes diabéticos e com insuficiência renal crônica apresen-tam
comumente calcificações difusas das artérias das extremidades. Os diabéticos que
apresentam úlceras neurotróficas podem exibir osteomielite com pouca evidência
externa de infecção crônica. Assim, a radiografia simples pó de determinar se o
tratamento conservador ou mais agressivo está indicado, incluindo a possibilidade
de amputação primária do dedo ou do pé.
A avaliação pré-terapêutica melhora muito os resultados a curto e a longo
prazo, principalmente nos pacientes operados. O objetivo desta avaliação é analisar
as condições gerais (problemas metabólicos maiores) e pesquisar outras
localizações da doença aterosclerótica. Assim, a ultra-sonografia duplex das artérias
que se destinam ao cérebro é imprescindível. Problemas circulatórios nessas
artérias (carótidas e vertebrais) devem ser tratados prioritariamente ou
simultaneamente quando das revascularizações das extremidades. A doença
cardíaca, em particular a coronária, constitui a principal causa de morte peri e pós-
operatória. A avaliação cardiológica deverá basear-se não só na história clínica do
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paciente, mas deve-se recorrer ao eletrocardiograma, ecocardiograma e
eventualmente à cintilografia miocárdica e à cinecoronariografia, se necessário. As
funções renais e respiratórias devem ser avaliadas. Os doentes com alterações
tróficas (gangrenas e úlceras) são expostos a maior risco de super-infecção,
principalmente se diabéticos. Culturas das secreções e antiograma devem ser feitos
para isolamento dos germes e seleção dos antibióticos adequados.
O tratamento médico aplica-se em todos os portadores de lesões
ateromatosas dos membros e da aorta. Sem ele, o tratamento cirúrgico ou
endovascular torna-se medida paliativa. O controle dos fatores de risco constitui
seguramente a parte mais importante do tratamento médico. A interrupção do hábito
de fumar é mandatória e as dislipidemias devem ser tratadas apropriadamente e
controladas periodicamente. Os pacientes diabéticos devem ser seguidos pelo
médico, e quando possível, por equipe multidisciplinar na prevenção e tratamento do
pé diabético.
Quanto a hipertensão arterial, seu controle é essencial, apesar de não se
disporem ainda de dados para avaliar se o tratamento alterará a progressão da
doença ou o risco de claudicação.
Deve-se lembrar, entretanto, a possibilidade de desestabilização de
lesões arteriais críticas por um tratamento anti-hipertensivo muito vigoroso, em
particular, pelo uso de beta-bloqueadores.
Agentes antiplaquetários são efetivas em reduzir o risco de eventos
isquêmicos fatais e não fatais em pacientes com doença arterial periférica. A aspirina
oral (100 a 200 mg/dia) deve ser considerada para todos os pacientes.
Eventualmente pode ser empregada a ticlopidina ou o clopidogrel (potencialmente
mais efetivo)(26).
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As técnicas endovasculares apresentaram desenvolvimento importante
nos últimos anos, apesar de terem sido descritas na década de sessenta,
Atualmente, a indicação deste método tornou-se mais precisa e ampliou o arsenal
terapêutico da doença aterosclerótica. Entre os métodos endovasculares, a dilatação
endoluminal (angioplastia percutânea transluminal) tem se mantido útil. A
simplicidade de sua técnica explica sua difusão e seguem-se os passos: cateteriza-
se a artéria estenosada com ajuda de um guia, passa-se de forma coaxial um cateter
provido de balão não complacente e insufla-se este balão a uma pressão que
permita a modelagem plástica da placa de ateroma e a restituição de uma luz de
diâmetro satisfatório. Esta técnica provoca necessariamente lesões traumáticas
como a fratura longitudinal da placa, e, as vêzes, pequenos descolamentos e
dissecções que deverão cicatrizar para fornecer um resultado correto. Estas lesões
são provavelmente a origem de toda a patologia reestenosante maior ou menor,
facilmente accessível à redilatação. Estes são os limites do método de dilatação que
levou ao desenvolvimento de outros métodos endovasculares, atualmente em uso
para comprovação clínica: endopróteses (stents), aterectomia mecânica ou a laser,
ou guia rotativo (rotablator) (Fig.1).
Fig. 1 – Revascularização com Stent em ilíacas comuns
A: Aortografia pré B: Aortografia pós-Stent
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A angioplastia transluminar percutânea é indicada em lesões
alteromatosas bem regulares, curtas, tronculares e não totalmente oclusivas das
artérias ilíacas comum externas, femoral, poplítea e aorta. Pode também ser
utilizada em lesões estenosantes curtas, tronculares, das artérias renais e digetivas
em doentes que não vão ser submetidos à laparotomia para o tratamento de suas
lesões aorto-ilíacas.
Endarterectomia. É a primeira técnica historicamente proposta para
tratar a doença aterosclerótica crônica. Após a abertura da artéria, faz-se a
ressecção das placas de ateroma e trombos antigos num ponto de clivagem entre
as camadas externa e interna da média, deixando uma nova superfície endoluminal
feita da camada externa da média. A endarterectomia provoca necessariamente um
ressalto intimal à montante a à jusante da superfície endoluminal. Este ressalto
pode ser sede de complicações tromboembólicas imediatas ou de complicações
reestenosantes a longo prazo.
Os resultados a longo prazo são melhores em lesões curtas, nas quais a
competição com o método endovascular torna as indicações excepcionais nas
artérias dos membros. Pode ser um método complementar a outro procedimento de
revacularização, como as derivações aorto-femorais, fêmoro poplíteas, etc. É o
método de escolha nas lesões estenóticas carotídeas extracranianas.
São os procedimentos cirúrgicos mais realizados no tratamento das
lesões oclusivas das extremidades. A simplicidade de sua realização, a excelente
qualidade de resultados a longo prazo e os progressos obtidos na redução de sua
morbimortalidade (inferior a 3%) têm feito das revascularizações protéticas diretas, o
método de escolha para as lesões aorto-ilíacas oclusivas ateromatosas (síndrome
de Leriche). Nas oclusões arteriais infra-inguinais preferem-se os enxertos venosos
(autoenxertos) de safenas internas. Derivações fêmoro-poplíteas nas oclusões da
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
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artéria femoral e as derivações fêmoro distais (fêmoro-tibial anterior ou fêmoro-
peroneira ou fêmoro-tibial posterior) são os métodos de escolha. Frequentemente
estas derivações são indicadas em isquemia crítica com o objetivo de salvamento do
membro. Nas derivações fêmoro-distais prefere-se utilizar a veia safena interna in
situ, promovendo-se a devalvulação da veia e ligadura das veias colaterias que
drenam na safena (para evitar fístula arteria-venosa). Com esta técnica anastomosa-
se a veia safena proximal na artéria femoral comum e a porção distal da safena
anastomosa-se nas artérias tibiais ou peroneira.
A safena interna poderá ser utilizada de forma invertida para evitar o
problema de suas válvulas, mas esta técnica é mais usada no segmento fêmoro-
poplíteo. Não havendo disponibilidade de veia safena interna, pode-se empregar
enxerto protético (dacron ou politetrafluoretileno) (Fig. 2).
Figura. 2 – Aortografia demonstrando Síndrome de Leriche(1); by pass aorto-bifemural(2,3).
Estas técnicas reagrupam procedimentos de exceção, utilizando um
trajeto do enxerto a ser implantado situado à distância do trajeto natural do eixo
revascularizado. Exemplos destes procedimentos: derivações interfemorais (fêmoro-
femoral), inter-ílio-femorais cruzadas, aortofemorais a partir da aorta torácica e
derivações axilo-femorais. Apresenta menor taxa de morbimor-talidade (exceto as
aorto-femorais da aorta torácica), mas a permeabilidade destes enxertos é menor a
longo prazo. Assim, estas técnicas são empregadas em situações de salvamento de
1 2 3
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membro, em pacientes apresentando contra-indicação absoluta a todos os outros
métodos endovasculares ou cirúrgicos convencionais.
Esta técnica foi muito empregada no passado no tratamento das doenças
arteriais oclusivas das extremidades. Promove-se a vasodilatação nos membros pela
retirada cirúrgica da cadeia simpática lombar (membros inferiores) e cérvico-torácica
(membros superiores). Com o sucesso das revascularizações distais, utilizando
enxertos in situ de veia safena, reduziu-se o uso da simpatectomia. Ela tem sido útil
no tratamento da causalgia, algumas arterites (Doença de Buerger) e isquemia
digital.
O tratamento da AEO de extremidades inevitavelmente requer a
amputação em alguns pacientes. Felizmente o número é pequeno, comparado com
o número de pacientes com AEO sintomática. Os objetivos da cirurgia de amputação
são: remover a gangrena, tecidos necróticos ou infectados; aliviar a dor; obter a
cicatrização primária da porção mais distal possível e conseguir a reabilitação
máxima após a amputação. Estes objetivos podem ser obtidos por cuidadosa
avaliação pré-operatória e boa preparação dos pacientes para a cirurgia.
Independentemente das indicações terapêuticas, todos os pacientes
portadores de AEO de extremidades devem ser orientados sobre o controle dos
fatores de risco e outras medidas já assinaladas previamente.
Claudicação intermitente. O paciente queixando-se de claudicação, cuja
distância útil seja limitante às atividades profissionais ou mesmo de lazer, justifica as
intervenções endovasculares ou cirúrgicas de revascularização.
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O paciente claudicante, cuja distância útil não modifique sua qualidade de
vida, deve ser tratado clinicamente mediante o controle dos fatores de risco da AEO
e exercício físico regular (cinesioterapia). Esta ultima conduta, por ser de baixo risco
e de grande probabilidade de melhora, deve ser considerada para todos os
pacientes. A pentoxifilina oral (400 mg 2x/dia) pode ser empregada, bem como o
cilostazol. Entretanto, o acompanhamento ambulatorial com os registros da distância
útil atual e o índice tornozelo/braço deve ser feito. A queda da distância útil e do
índice indicam a conduta mais agressiva (endovascular ou cirúrgica, dependente das
lesões e segmentos atingidos). Alguns autores indicam a arteriografia nos pacientes
claudicantes somente quando a conduta intervencionista estiver prevista27.
Isquemia crítica. Pacientes com isquemia crítica (dor em repouso,
gangrena ou úlcera isquêmica), ou seja, em situações em que há ameaça à
viabilidade dos membros, a cirurgia de revascularização ou procedimento
endovascular são claramente indicados. Os procedimentos cirúrgicos ou
endovascualres serão escolhidos de acordo com as condições gerais do paciente e
locais dos segmentos arteriais atingidos pela AEO.
Em resumo a conduta diante de um paciente com isquemia de
extremidades esta resumida na figura 3.
Figura 3 – Manuseio da doença arterial obstrutiva periférica (DAP)
Avaliar fatores riscos cardiovasculares
Manuseio da Doença Arterial Obstrutiva Periférica (DAP)
1. Cessar tabagismo2. Controle: - diabetes
- colesterolemia- hipertensão
3. Antiplaquetário
Avaliar claudicação
Tratar claudicaçãoExercícioCilostasol
Isquemia crítica
Melhora Melhora do sintoma do sintoma
(manter)(manter)
Piora Piora
do sintomado sintomaLocalizar a lesão-Ultrassonografia duplex-Angiografia-Angioressonância
Revascularização:- Angioplastia- Tromboendarterectomia- Derivações (By pass)
Oclusão arterial crônica de membros ____________________________________________________Carlos E. Piccinato
64
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O termo aneurisma vem do grego e significa dilatação. Por definição,
aneurisma é a dilatação da parede arterial localizada e permanente de seu diâmetro,
acima de 50%. Exemplo: uma artéria de 2 cm de diâmetro será aneurismática
quando seu diâmetro for superior a 3 cm.
Geralmente os aneurismas contêm sangue e trombo no seu interior. Uma
vez iniciado a dilatação eles crescem continuamente levando à ruptura. No cômputo
geral do obtuário nos Estados Unidos, eles constituem a 15ª causa de óbito; sendo
também a 10ª causa de óbito em indivíduos com idade superior a 55 anos. Esses
dados são subestimados estando abaixo do valor real porque 30 a 50% de pacientes
com aneurisma roto morrem antes de alcançar o hospital. Eles se desenvolvem com
grande freqüência na aorta abdominal abaixo das artérias renais, menos
frequentemente na aorta torácica e nas artérias periféricas dos membros superiores,
inferiores, carótidas, ilíacas, femurais, poplíteas e artérias esplâncnicas. Eles são
encontrados em 2% dos casos de autópsia na população e 2 a 3% por ocasião de
estudos ou exames com ecoDoppler e 3 a 4% por após ressonância (RNM) e
tomografia (CT).
Os indivíduos portadores de obstrução arterial crônica apresentam 10%
de aneurismas. Em compensação pessoas que tem hérnias inguinal e umbilical e
diástese de reto são propensas a terem aneurismas, o mesmo acontece com os
pacientes com DPOC. Isso mostra que eles também pertencem às doenças do
tecido conjuntivo de má qualidade.
Os pacientes que tem aneurismas também tem artérias carótidas
tortuosas e kinking em 40%, enquanto indivíduos que têm apenas ateroscle-rose
apresentam apenas 10% de carótidas tortuosas.
Eles comprometem com maior freqüência as artérias dos homens na
proporção de 6/1.
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Anatomia das artérias: as artérias possuem 3 camadas distintas (Fig. 1):
1. Interna também chamada íntima
2. Camada média rica em fibras elásticas, musculatura lisa e tecido colágeno.
3. Adventícia: tecido conjuntivo.
O 1/3 interno das grandes artérias é irrigado por difusão dos nutrientes
enquanto os 2/3 externos são irrigados pelos vasa-vasorum.
As grandes artérias, como a aorta torácica e abdominal, apresentam a
parede com grande espessura. Nestas artérias predominam as fibras elásticas na
camada média, cuja função é armazenar a energia potencial originada no coração
quando elas são distendidas na sístole, para na diástole empurrar o sangue para a
periferia. O conteúdo de fibra muscular lisa é pequeno na aorta. O colágeno é
responsável por oferecer a força de contensão da expansão da artéria na sístole.
Figura 1 – Histologia da parede arterial
À medida que as artérias vão diminuindo seu calibre há redução
progressiva das fibras elásticas e aumento das fibras musculares lisas, as quais
predominam nas artérias de pequeno calibre e arteríolas.
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A aorta torácica possui um número maior de camadas do que a aorta
abdominal sendo este um dos motivos dos aneurismas da aorta abdominal (AAA)
aparecerem em maior número. Justifica-se a maior quantidade de fibra musculares
nas pequenas artérias, pois são responsáveis pela função reguladora do fluxo
nesses setores, provavelmente pela liberação do óxido nítrico que tem ação vaso-
dilatadora.
Os vasos vasorum da aorta torácica são maiores em número e diâmetro
do que os da aorta abdominal, e também justifica a maior incidência destes
aneurismas, abaixo das artérias renais.
Outro aspecto interessante é que a aorta torácica passa levemente
tangente ao plano ósseo da coluna, porém com um maior coxim de tecido, sobre o
qual se apóia à parede da artéria. Este fato não acontece com a aorta abdominal,
que está totalmente apoiada sobre a coluna, batendo reiteradamente sobre o plano
rígido, facilitando o processo de formação da placa de ateroma levando à obstrução
do vaso-vasurum e aparecimento de isquemia da parede arterial e conseqüente
lesão da parede. Portanto na fisiopatologia dos aneurismas todos esses fatores são
levados em consideração.
Geralmente as doenças que comprometem a parede arterial são múltiplas
e resultam na destruição parcial ou total da sua parede, determinando aparecimento
de pontos de enfraquecimento e conseqüentemente dilatação progressiva.
Dentre as doenças que comprometem a parede arterial, a aterosclerose é
a principal, depois a sífilis que atualmente vem recrudescendo devido à baixa
condição sócio-econômica da América Latina; causas congênitas, hereditariedade
(20% dos casos), traumatismo, endocardite bacteriana (embolia séptica resultando
em abcesso da parede arterial), processos específicos e inespecíficos, arterite
necrotizante, panarterite nodosa, necrose sística da camada média, AIDS, causas
relacionadas com o fluxo sangüíneo (alteração do eixo dinâmico do sangue) e
causas extrínsecas (como a compressão da artéria resultando na quebra do regime
laminar para regime turbulento aumentando a força de pressão pós-estenótica) e
medicamentosa (Tabela 1).
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Tabela 1 - Etiologia dos aneurismas
Aterosclerose
Sífilis
Trauma vascular Pseudo-aneurisma Aneurisma verdadeiro
Congênitos Cerebrais D. de Ehler Danlos Síndrome de Marfan
Hereditários Colágeno de má qualidade Ausência de alfa-1-antitripsina
Micóticos ou bacterianos
Endocardite Abcesso perivascular Salmonela Tuberculose Aids
Inflamatório Artrite necrotizante Panartrite nodosa
Necrose cística da camada média
Pós-estenóticos
Costela cervical Síndrome do escaleno Coarctação da aorta Estenose por placas
Medicamentosa Corticóides
Alteração de eixo dinâmico do fluxo
No organismo existem enzimas como a elastase que destroem a fibra de
elastina. A fibra elástica não se multiplica e dura mais ou menos 70 anos, porém ela
envelhece ao mesmo tempo em que existe um protetor da elastina que é a -1
antitripsina. Esta enzima é inativadora da atividade proteolítica da elastase. Existem
estudos comprovando que hereditariamente esta enzima está ausente nesses
indivíduos com aneurismas. O mesmo acontece com o colágeno ou fibra colágena
que também pode ser destruída pela colagenase. Existe uma mutação transmitida
hereditariamente resultando em colágeno de qualidade inferior ou menos resistente.
Nos pacientes com aneurismas, a colagenase está aumentada principalmente
quando há ruptura. Outros fatores como o fumo que inibe a 1- antitripsina facilitam
a destruição da fibra elástica devido à ação da elastase ficar liberada. Os fumantes
têm 14 vezes mais rupturas do que os aneurismáticos não fumantes. Há também
substâncias como os corticóides que podem influir sobre a parede arterial,
resultando enfraquecimento da mesma. O propanolol protege a parede arterial pois
ele estimula a -1 antitripsina.
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Durante a gravidez há produção de hormônios que atuam na parede
arterial causando um desarranjo estrutural provocando alguns pontos de
enfraquecimento.
Observa-se, portanto, que as causas de hipoplasia ou aplasia da parede
arterial são congênitas; as demais doenças geralmente destroem a parede arterial e
no processo de regeneração haverá substituição por tecido colágeno não adequado
para suportar a pressão, iniciando, portanto a dilatação.
Tipos de Aneurismas (Figura 2)
I. Verdadeiros
II. Falso aneurisma ou hematoma pulsátil
III. Aneurisma dissecante ou descolamento
Verdadeiros: são os aneurismas que ainda apresentam uma pequena
camada da parede original.
Hematoma pulsátil ou falso aneurisma: é o aneurisma resultante da
solução de continuidade da parede arterial com os tecidos (músculos, aponeuroses,
tendões e ossos). O sangue sai da artéria e é contido por essas estruturas. Não
existe parede arterial. Deve-se a traumas aberto por arma de fogo ou branca.
Dissecante ou descolamento: neste caso existe uma fissura da íntima do
vaso, resultando em uma dupla luz. Dependendo da espessura da lâmina descolada
pelo fluxo, a adventícia poderá dilatar.
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A– Fusiforme; B– Sacular; C– Falso aneurisma; D– Dissecante ou descolamento
Figura 2 - Tipos e formas de aneurismas.
Forma dos aneurismas
I. Sacular
II. Fusiforme
III. Dissecante ou descolamento
A distribuição e a freqüência dos aneurismas na árvore arterial podem ser
observadas na Figura 3.
Figura 3 – Distribuição e freqüência dos aneurismas na árvore arterial
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Geralmente compromete o homem a partir da 5ª década da vida numa
proporção de 6 homens para 1 mulher até 70 anos. Depois a tendência é a
equivalência. Devido ao aumento da vida média do homem, os aneurismas têm
aumentado na população. Com os métodos modernos como ultrasson e CT eles tem
sido diagnosticados com maior freqüência e precocemente, o que não acontecia
antes dos métodos atuais de investigação.
Comprometem a aorta abaixo das artérias renais em 85% dos casos o
que facilita seu tratamento cirúrgico. Em 40% dos casos verifica-se associação com
aneurismas das ilíacas. São de etiologia aterosclerótica, possuem forma fusiforme e
do tipo verdadeiro. Crescem de forma silenciosa até atingir grandes proporções.
Complicam com ruptura, embolia e raramente trombosam. Podem perfurar para a
veia cava inferior. Dez por cento deles chegam no hospital roto e por vezes sem
vida. Nestes casos de ruptura, quando operados, 50% morrem por falência de
múltiplos órgãos. Em virtude destas complicações eles devem ser tratados
cirurgicamente ou quando possível pela técnica endovascular.
O limite da dilatação para indicar a cirurgia é quando o diâmetro for
superior a 5 cm. Para diâmetros inferiores, o acompanhamento deve ser feito com o
ultrasom de 6 em 6 meses. Se ocorrer aumento de 0,5cm em 6 meses ou 1,0cm em
1 ano indica-se a correção. A técnica cirúrgica é a de inclusão onde a prótese é
suturada dentro do aneurisma.
A técnica endovascular consiste em se tratar o aneurisma com próteses
montadas sobre dispositivos introduzidos pela artéria femural guiados pela
radioscopia. Técnica é indicada somente para pacientes selecionados (Fig. 4).
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1 -Técnica convencional
2 – Técnica endovascular
Figura 4 – Técnicas de tratamento
Compromete indivíduos jovens na 3ª a 4ª décadas. Verifica-se nesse
aneurisma o comprometimento da parede da aorta conseqüente a embolização do
vaso-vasorum pelo treponema resultando um processo inflamatório denominado
mesoaortite sifilítica que destrói a parede da aorta torácica ascendente, transversa e
descendente. É menos freqüente na AA e raramente nas artérias dos membros. Tem
aumentado na população devido ao aumento da promiscuidade e à condição sócio-
econômico baixa. Com o alargamento da aorta ascendente pode haver insuficiência
aórtica. Dão sintomas indiretos de sua existência pela proximidade de estruturas
importantes como: rouquidão, engurgitamento jugular, tosse, dispnéia, disfagia e dor
torácica. Não contém trombos em virtude da idade precoce, pois ainda não se
desenvolveu a aterosclerose. Quando crescem acentuadamente corroem o externo
fazendo projeção na parede torácica anterior.
São diagnosticados por meio do RX, eco- trans-esofágico, CT, CT espiral
e necessitam de circulação extracorpórea para sua ressecção. São de mau
prognóstico.
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Origina-se após trauma de armas de fogo e branca. Comprometem mais
jovens dos 20 a 40 anos, porem é encontrado também em outras faixas etárias.
Nesses aneurismas há uma solução de continuidade da luz do vaso com os tecidos
vizinhos, e o sangue é contido por músculos e a aponeurose. Sua incidência tem
aumentado na população, em virtude do aumento da violência nos grandes centros
São de fácil diagnóstico levando-se em consideração a história, a
pulsatilidade e expansibilidade da massa, muitas vezes com sopro sistólico e
comprometem mais os membros superiores e são de bom prognóstico. Podem ser
tratados pela cirurgia convencional, porem alguns casos são tratados por via
endovascular.
São aneurismas que se formam à custa de abcessos na parede vascular
por êmbolos sépticos (endocardite bacteriana) ou abcessos nas proximidades da
parede arterial. Verifica-se na história pregressa do paciente a existência das
doenças que despertam esse tipo de comprometimento. Atinge indivíduo em
qualquer faixa etária, geralmente são múltiplos e saculares e de difícil tratamento
principalmente os cerebrais. No abdome poderá haver perfuração da aorta resultante
de aneurisma micótico após enterite por salmonela.
A agenesia ou a hipoplasia da parede das artérias origina pontos de
enfraquecimento. Compromete com maior freqüência as arterias cerebrais e menos
freqüentemente artérias viscerais e carótidas. São assintomáticos e hoje
diagnosticados pela RNM. Deve-se suspeitar de ruptura em pacientes jovens (2ª a
3ª décadas da vida) com história de cefaléia súbita, náuseas, vômitos, perda da
consciência e alterações motoras que podem caracterizar a ruptura e a hemorragia
cerebral. Podem ocupar lugar na árvore arterial em local de difícil acesso cirúrgico
impossibilitando a cirurgia convencional. Atualmente podem ser tratados pela
radiologia intervencionista endovascular.
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Etiologicamente se devem a doenças da camada média da aorta
ascendente caracterizado por acúmulo de mucopolissacarídios formando um cisto
resultando enfraquecimento da parede arterial. É a chamada necrose cística da
camada média. Acomete geralmente mulheres jovens na 3ª a 4ª décadas de vida,
multíparas. A etiologia é desconhecida. É assintomática. Quando o cisto cresce ele
pode perfurar para a luz do vaso criando uma solução de continuidade na íntima
para camada média e então o fluxo começa descolar a parede. A artéria fica então
com uma dupla luz, a verdadeira e a falsa. A parede delgada pode perfurar e quando
se faz para o pericárdio pode ocorrer tamponamento. O aneurisma dessecante
também ocorre nos traumas vasculares por contusão, por desaceleração no plano
horizontal (acidente automobilístico) ou no vertical (queda de grande altura). O
deslocamento do coração poderá romper a íntima no ponto onde o ligamento
arterioso fibrosado, está fixado logo abaixo da artéria subclávia esquerda. Também
as placas de ateroma em indivíduos hipertensos podem descolar e desnudar a
camada muscular e então iniciar o descolamento.
A sintomatologia apresentada é comum nos 3 casos e consta de
aparecimento de dor súbita e de forte intensidade localizada no precórdio simulando
infarto do miocárdio, que deve ser afastado. O paciente fica sudorético e pálido e
com o passar das horas a dor migra para a região interescápulo-vertebral esquerda
e continua migrando para a aorta abdominal, manifestando dor lombar ao longo do
descolamento. Surgem dores abdominais e culmina com obstrução em nível da
bifurcação da aorta pelo descolamento da íntima que se encosta na parede oposta.
Geralmente há insuficiência renal e isquemia intestinal.
O diagnóstico é baseado em dados clínicos, estudo pelo ecoDoppler,
ecotransesofágico, RNM, CT espiral e angiografia convencional. São de mau
prognóstico, com mortalidade cirúrgica gerando em torno de 50 a 70%.
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Os aneurismas da aorta torácica, em virtude do arcabouço ósseo torácico,
apresentam sinais indiretos de sua existência a não ser quando crescem e adquirem
grande tamanho e corroem o plano ósseo e se projetam na parede torácica anterior
formando uma saliência que pulsa com o ritmo cardíaco. Então os sinais de sua
existência são dispnéia, engurgitamento das jugulares, rouquidão, disfagia e dor
devido à corrosão óssea. Quando estão próximo da ruptura ou já fissurados, o
paciente queixa-se de dor e quando rompem o fazem no mediastino ou no tórax. Os
pacientes morrem ou chegam ao hospital em choque hemorrágico.
Muitas vezes são diagnosticados por ocasião de RX simples do tórax, CT
ou RNM, solicitados para investigar outras patologias. A presença de um sopro
diastólico observado na válvula aórtica pode sugerir dilatação da aorta ascendente.
Não raramente são descobertos retrospectivamente após embolia para artérias
periféricas.
Os aneurismas da aorta abdominal (AAA) evoluem de forma silenciosa
progressiva podendo atingir grandes proporções. Alguns pacientes podem referir o
aparecimento de massa pulsátil no abdome geralmente no mesogástrico, epigástrio
e flanco esquerdo. O paciente menciona como sendo “coração” no abdome. Em
indivíduos obesos ou com abdome volumoso esse fato não ocorre. A ausência de
quadro doloroso faz com que o paciente não procure médico. Pode apresentar
queixas de dores na coluna ou leve dolorimento no abdome, principalmente, quando
o aneurisma é de origem inflamatória (4% dos casos de aneurisma da AAA).
Freqüentemente são diagnosticados por ocasião de RX simples do abdome, CT,
RNM e principalmente o duplex scan. É freqüente o número de pacientes com
queixas abdominais para os quais são realizados o ultra-som e indiretamente
encontra-se o aneurisma e assim são triados para o cirurgião vascular, porém como
não sentem dores vão levando o quadro para frente até romperem. O diagnóstico
também pode ser feito retrospectivamente por ocasião de uma embolia apresentada
no membro inferior, pois, 5% delas, o êmbolo provêm de artérias aneurismáticas.
Como já citado anteriormente 10% dos AAA chegam ao hospital com
ruptura, caracterizada por forte dor abdominal e aumento do abdome juntamente
com manifestação de choque hipovolêmico (hipotensão arterial, taquicardia,
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sudorese, palidez). No exame físico de pacientes com AAA, a inspeção pode-se
verificar abaulamento pulsátil, fato esse nem sempre observado dependendo muito
do volume do abdome. A palpação é a parte essencial do exame, pois ela é
característica. Palpa-se massa pulsátil e expansiva. É possível palpar até presença
de frêmito, pouco comum nos AAA por apresentarem trombo parietal, moldando o
calibre normal do vaso, não permitindo a formação de turbilhão. Geralmente não
apresentam dor à palpação ou podem apresentar leve dolorimento, comum quando
se palpa aorta normal. Nos casos em que o crescimento é muito rápido, verifica-se
presença de quadro doloroso à palpação. Quando apresenta dor espontânea
significa que já pode ter ocorrido extravasamento de sangue e geralmente para o
retroperitônio. À ausculta freqüentemente não caracteriza sopro. Quando houver
manifestação de insuficiência cardíaca com um sopro contínuo no abdome pode-se
estar diante de um aneurisma que rompeu para a veia cava inferior.
As artérias periféricas que apresentam aneurismas são: femoral comum,
superficial, poplítea e seus ramos. Setenta por cento dos aneurismas periféricos
situam-se nas artérias poplíteas sendo 50% bilaterais, 16% no femoral comum, 3 a
4% na femoral superficial e o restante na tibial anterior, posterior e peroneira.
Geralmente são aneurismas ateroscleróticos, bacterianos ou micóticos, traumáticos
(ferimentos por arma de fogo ou branca e fraturas). Nesses últimos são em geral
pseudoaneurismas.
O aneurisma da femoral comum e superficial pode apresentar-se como
uma dilatação na região inguinal e também no trajeto da femoral superficial na coxa,
sendo pulsátil à inspeção. Já na artéria poplítea o aneurisma pode ficar oculto, pois
a artéria passa profundamente no triângulo poplíteo. Mas pode adquirir tamanho
considerável a ponto de fazer relevo na região posterior do joelho sendo facilmente
identificado de perfil. Os aneurismas distais à poplítea pela presença da musculatura
da perna passam despercebidos.
A palpação verifica-se a pulsatilidade e expansibilidade destes
aneurismas. Geralmente apresentam trombo mural e por isso não tem frêmito. A
presença de isquemia periférica diante de uma dilatação femural ou poplítea, sem
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pulsatilidade, sugere fortemente trombose do aneurisma. A presença de isquemia
distal e aneurisma caracterizam embolização. Deve-se pensar na presença de
trombose venosa profunda distal pela compressão da veia poplítea pela massa
aneurismática.
Na evolução dos aneurismas periféricos pode-se ter trombose, embolia
levando à isquemia distal e a ruptura com hematoma pulsátil. Raramente fistulizam
para a veia homônima. A infecção também pode ocorrer. Os aneurismas bacterianos
ou micóticos têm antecedente de infecção sistêmica como endocardite bacteriana.
Os traumáticos geralmente são pseudo aneurismas.
Os aneurismas da artéria subclávia em seu 2/3 proximal se devem à
aterosclerose e os demais são resultantes de trauma por arma de fogo e branca.
Ocorre aneurisma micótico ou bacteriano provocado por infecção e punções
inadvertidas da artéria para realização de procedimentos (punção de veia subclávia
para monitorização do PVC e administração de líquidos). A costela cervical
extranumerária e o músculo escaleno anterior podem comprimir a artéria subclávia
levando à formação de aneurismas pós-estenóticos.
As artérias axilar, braquial superficial, radial e cubital geralmente
apresentam aneurismas causados por trauma de armas de fogo e branca (em geral
do tipo pseudoaneurisma). Pseudo aneurisma da artéria humeral direita, próxima da
dobra do cotovelo, revela o procedimento para cateterismo das artérias coronárias.
Mais freqüente na carótida comum na proporção de 4% dos aneurismas
periféricos. Menor freqüência na carótida interna e externa. A etiologia mais comum
é a aterosclerótica e o traumatismo. Geralmente são vistos pela inspeção. São
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assintomáticos, porém poderá haver sinais de embolia cerebral e podem trombosar
e com menor freqüência romper. A ressecção é o tratamento de escolha.
São os aneurismas que comprometem as artérias viscerais como a
esplênica (60%), hepática (24%) tronco celíaco (5%), mesentérica superior (4%),
pancreática duodenal superior (3%) e inferior (3%). São assintomáticos e de difícil
diagnóstico. Por vezes são diagnosticados após exames especializados feitos ao
acaso como ultra-som, CT, e RNM para outras investigações. Em 22% dos casos
são diagnosticados na cirurgia por abdome agudo por ruptura e hemoperitônio. São
de etiologia aterosclerótica, congênita e também micótica. Podem ser verdadeiros ou
falsos aneurismas. Devem ser ressecados, pois ameaçam a vida.
I- Ultrasom
I - O ultra-som associado ao Doppler é o exame mais empregado para
avaliação dos aneurismas. É um exame não invasivo e de baixo custo e com grande
sensibilidade (98% dos casos). É empregado também para avaliar a evolução dos
aneurismas na faixa de tamanho de 3 a 4 cm, com intervalo de 6 meses em
aneurismas da aorta abdominal. A existência do arcabouço ósseo no tórax (costelas
e externo) limita o uso do ultra-som na aorta torácica. Nestes casos o ultra-som
trans-esofágico tem melhor resolução. O ultra-som também é de grande valia nos
aneurismas periféricos. O ultra-som mede o diâmetro e o comprimento do aneurisma
e caracteriza os trombos na parede e o lúmem não deixando dúvidas de sua
existência.
II – Tomografia Computadorizada (CT)
O CT oferece maiores detalhes que o ultra-som. É um exame invasivo,
necessita de injeção de contraste iônico que pode dar manifestações alérgicas
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(urticária e edema de glote). Por outro lado, seu custo é muito alto chegando ser 4 a
5 vezes maior que o ultra-som. Esse exame utiliza o RX para sua execução. Com o
CT as medidas são mais precisas onde se consegue ver a espessura da parede e
dos trombos, e a localização da veia renal esquerda (sua posição normal sobre a
aorta que por vezes se apresenta duplicada sendo que um ramo passa sob a aorta,
portanto, aspecto muito importante para o cirurgião, no momento da cirurgia). Pode-
se também observar o colo do aneurisma (local adequado para realização da
anastomose) e verificar a distância entre o colo do aneurisma e as artérias renais,
local onde se realiza a clampagem da aorta sem comprometer a irrigação dos rins.
Trombos e placas de ateroma podem ser visualizados que auxiliarão o cirurgião no
momento da clampagem.
III – Angio-Ressonância e RNM
Esse exame também é de custo elevado. Pode ser invasivo, quando se
usa contraste como o gadolíneo que não é iônico, portanto, despertando pouca
reação alérgica. Esse exame não é RX dependente. Ele se baseia na excitação dos
íons de hidrogênio gerando em campo elétrico magnético em virtude do movimento
do sangue. Esse exame permite ver as artérias em várias posições: frente, perfil,
oblíquas e até mesmo o interior dos vasos.
IV – Tomografia Espiral
Este método é muito utilizado pela alta resolução mostrando detalhes
importantes utilizados na mensuração do colo, comprimento, diâmetro, e angulação
do aneurisma facilitando a realização da cirurgia endovascular. Também utiliza
contraste iodado podendo provocar alergia. É de alto custo.
V - Arteriografia Digital e Arteriografia Convencional
Ambas são invasivas e usam contraste iodado. Dão boa resolução porém
são monoplanas, necessitando repetir as injeções para se obter perfil e oblíquas.
São muito usadas principalmente em pacientes com aneurismas e suspeita de
lesões de artérias viscerais.
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Aneurisma da aorta: geralmente crescem de forma contínua levando à
complicação mais freqüente e ameaçadora que é a ruptura que culmina com o
choque hemorrágico. Os aneurismas do tórax rompem para o mediastino, cavidade
torácica e raramente para o esôfago ou traquéia. Os aneurismas da aorta abdominal
geralmente rompem para o retroperitônio com isso permite que muitos pacientes
cheguem ao hospital com vida. Quando rompem anteriormente para a cavidade
peritonial a chance de sobrevivência até o hospital é quase nula. A embolização é a
2ª complicação dos aneurismas da aorta levando à obstrução arterial aguda dos
membros, mais comum nos inferiores. A trombose aguda dos aneurismas da aorta
é um evento raro devido ao grande calibre da aorta e a alta velocidade de fluxo.
Somente ocorre trombose quando há choque acentuado. A fístula artério-
venosa com a veia cava também é um evento raro e que pode levar à insuficiência
cardíaca nas primeiras horas devido ao grande fluxo desviado. Infecção dos
trombos: evento também raro mais deve ser questionado principalmente quando o
paciente apresenta quadro febril prolongado com queda do estado geral. Nesses
casos deve-se meditar sob qual técnica mais adequada para o tratamento.
Compressão das vias biliares, também pouco freqüente. Surge quando crescem
para a direita comprimindo o colédoco e o cístico e consequentemente provoca
aparecimento de colecistite. Poderá haver equivoco de diagnóstico entre ruptura e
colecistite. Nesse caso tem febre e dor. Compressão das vísceras e ureter:
raramente acontece mesmo em grandes aneurismas.
No caso dos aneurismas periféricos a trombose é o evento mais comum
devido ao menor calibre e menor fluxo. Outra complicação é a embolia e ambos
levam à isquemia. A ruptura é menos freqüente e quando ocorre não ameaça a vida
do paciente, porém pode levar à síndrome de compartimento que compromete a
viabilidade dos músculos.
O tratamento dos aneurismas, de um modo geral, visa evitar a morbidade
e a mortalidade devido às complicações. A cirurgia deve sempre estar voltada para a
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revascularização a fim de permitir sobrevivência dos tecidos evitando a mutilação de
órgãos e principalmente de membros.
Os aneurismas da aorta são tratados cirurgicamente pelos métodos
convencionais sendo freqüentemente utilizado a endoaneurismectomia (sutura da
prótese dentro do aneurisma após ter sido aberto e retirado os trombos). A
ressecção com interposição do enxerto raramente é empregada. A ressecção de
aneurismas periféricos é a técnica empregada, com interposição de prótese de
dacrom e PTFE. A veia autógena também pode ser utilizada. Pode-se também fazer
a ligadura proximal e distal e contornar o aneurisma com um bypass, dispensando a
ressecção.
Atualmente um novo procedimento vem sendo utilizado no tratamento dos
aneurismas, por meio da radiologia intervencionista ou endovascular. Nesse tipo de
tratamento a prótese vem montada sobre um molde de titânio denominado stent e o
conjunto é montado sobre um sistema condutor que sob radioscopia, é introduzido
pela artéria femural e conduzido até o local adequado da artéria. A prótese então é
liberada e esta se prende à parede interna da artéria impedindo a passagem do
sangue para o saco aneurismático. Este tratamento é indicado em casos
selecionados e em alguns centros corresponde a 30% dos AAA tratados.
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Genericamente, traduz lesões de artérias, veias e linfáticos, podendo
ocorrer de forma aguda e, menos freqüentemente, crônica. O trauma vascular
caracteriza-se por agressão na parede dos vasos, podendo lesar seus diferentes
elementos constituintes, desde adventícia até o endotélio, levando à hemorragia ou
à obstrução arterial. As lesões arteriais são as mais significativas pela importância
desse sistema na manutenção da viabilidade dos tecidos.
Sabe-se que apenas 15% do volume sangüíneo estão contidos dentro do
sistema arterial e, portanto, um trauma que determina solução de continuidade de
sua parede tem sua tradução sintomática, caracterizada pela hemorragia, levando
imediatamente à instabilidade hemodinâmica e ao choque hipovolêmico e,
conseqüentemente, à lesão de órgãos nobres. Quando se lesa a parede arterial sem
haver solução de continuidade, promove-se oclusão do vaso, o que determina a
isquemia dos tecidos distais.
O sistema venoso, por constituir um setor de grande capacitância (contém
85% do volume sanguíneo circulante), baixa pressão e pequena velocidade de
retorno, quando comprometido, em geral, apresenta sinais de menor gravidade.
As lesões agudas e crônicas dos vasos linfáticos, geralmente, não
ameaçam a vida do indivíduo, mas deixam seqüelas importantes, como a fístula
linfática e o linfedema.
O tratamento do trauma vascular permitiu o extraordinário avanço no
desenvolvimento da cirurgia vascular reparadora. Alex Carrel (1), cirurgião francês,
publicou, em 1902, trabalhos experimentais, nos quais padronizou todas as técnicas
de anastomose vascular até hoje realizadas. Apesar dos trabalhos de Carrel no
início desse século, ainda na 2ª Guerra Mundial as lesões arteriais foram tratadas
por De Bakey & Simeone(2) pela ligadura, procurando-se salvar o paciente, sem se
preocupar com o que poderia advir com a obstrução arterial resultante. Em 73% dos
casos, ocorreram gangrenas e 23% evoluíram com impotência funcional do membro,
o que se constitui um verdadeiro problema social. Este fato motivou os cirurgiões
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buscarem soluções de tal forma que, no conflito do Vietnã, os ferimentos vasculares
foram tratados por meio de suturas, enxertos, anastomoses, etc. O resultado destas
intervenções mostrou apenas 13% de gangrena(7). A partir daí, as técnicas de
revascularização foram aplicadas na vida civil. Paralelamente, em 1947, João Cid
dos Santos(4) fez a primeira endarterectomia, seguindo-se a angioplastia de patch ou
remendo, em 1948, por DeBakey(4). Em 1950, Kunlin5 utilizou o enxerto autógeno de
veia safena interna em ponte (derivação).
Artérias, veias e linfáticos caminham juntos, e geralmente envoltos por
uma bainha comum, de tal forma que um ferimento poderá lesar mais de um
elemento, obrigando reparo simultâneo de outras estruturas.
Em virtude do aumento da migração da população rural para a zona
urbana, a violência do trânsito e os conflitos urbanos têm provocado, de modo geral,
maior número de traumatismos, constituindo a 4ª causa de morte. Paralelamente, o
trauma vascular também tem aumentado. A população alvo tem, em média, 20-40
anos de idade. Entretanto, ele ocorre também em indivíduos mais jovens e idosos. A
violência urbana e os acidentes automobilísticos constituem as principais causas.
Outros ferimentos surgem, ainda, pela mecanização da mão de obra nas indústrias e
na zona rural, além de complicações de procedimentos médicos (cateterismo de
Seldinger, canulação de vasos femurais para circulação extracorpórea, angioplastia
intraluminal, angioscopia e balão aórtico).
O trauma vascular resultante de corrente elétrica de alta voltagem deve-
se ao excelente meio condutor, representado pelo sangue e seus eletrólitos.
Verifica-se, nesse trauma, alterações profundas da parede vascular e endotélio, com
intenso vasoespasmo e trombose. Levando à isquemia e gangrena. São casos
extremamente graves.
A introdução de drogas na luz arterial determina lesão endotelial e
alteração de sua parede por efeito vasoconstrictor ou microembolização, provocados
por cristais das substâncias injetadas (barbitúrios, derivados de ergotamina,
fenantoína, psicoestimulantes, etc). O vasoespasmo e a microembolização podem
levar à isquemia, exigindo terapêutica imediata, nem sempre com sucesso,
ocorrendo gangrena e perda da extremidade.
O traumatismo arterial crônico caracteriza-se freqüentemente, por lesões
de longa duração, não oferecendo risco de perda do membro, respondendo bem ao
tratamento clínico conservador e, se necessário, a simpatectomia.
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Os agentes agressores mais comuns são:
1. Arma de fogo: projéteis únicos e múltiplos.
2. Arma branca: faca, lâmina, estiletes, vidro, serra de fita, etc.
3. Estilhaços resultantes de explosões: botijões, caldeiras, granadas,
etc.
4. Luxações de articulações do joelho, cotovelo e fraturas ósseas.
5. Contusões resultantes de acidentes automobilísticos.
6. Desaceleração nos planos vertical e horizontal.
7. Procedimentos invasivos: cateterismo de Seldinger, angioplastia
transluminal, balão aórtico e angioscopia.
8. Corrente elétrica de alta voltagem.
9. Exposição prolongada ao frio.
10. Introdução acidental ou intensional intra-arterial: barbitúricos,
anfetaminas, derivados do ergot, fenantoínas, psicotrópicos, etc.
11. Máquinas ou aparelhos de alta vibração: perfuratrizes, martelo
pneumático, máquinas de datilografia, etc.
As artérias mais acometidas pelo trauma são as dos membros superiores:
radial, ulnar, seguidas pela braquial, subclávia e axilar. Nos membros inferiores, a
mais comprometida é a artéria femoral(6). Os traumas da artéria poplítea, tibial
anterior e posterior, embora em menor grau, atualmente vem ocupando posição de
destaque conseqüente aos acidentes automo-bilísticos, quando acompanhados de
fraturas ósseas e luxações (Tabela 1).
Tabela 1 – Distribuição de 302 casos de trauma da árvore arterial, tratados na Divisão de Cirurgia
Vascular do Departamento de Cirurgia da FMRP-USP, no período de 1985 a 1994(6)
.
LOCALIZAÇÃO
Abdômen, pélvis e membro inferior
Nº de casos Cervical e membro superior
Nº de casos Total
Aorta 03 Carótidas 08 Ilíaca 06 Vertebral 03 Renal 03 Subclávia 08 Femoral 35 Axilar 05 Poplítea 16 Braquial 30 Tibial 08 Radial Ulnar 17
Total 71 231 302
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Dependendo da lesão o trauma vascular pode ser:
1. Com solução de continuidade da parede do vaso
a) Ferimentos incisos
O ferimento inciso, geralmente, compromete uma das faces da artéria,
sendo de forma regular, não oferece dificuldade para o tratamento, pois
conserva a integridade da parede vascular. São causados por facas,
lâminas, etc.
b) Ferimentos pérfuro-contusos
O ferimento pérfuro-contuso é aquele que perfura e contunde a parede
vascular causando destruição das diferentes camadas, obrigando à
ressecção por ocasião do tratamento. São causadas por projéteis de
arma de fogo.
c) Ferimentos lacerantes
São aqueles que rasgam a parede vascular.
2. Sem solução de continuidade da parede arterial
a) Vasoespasmo
Acompanha o trauma vascular e, freqüentemente, denuncia lesão de
sua parede.
b) Contusão
A contusão determina hematoma na parede arterial, podendo também
lesar a íntima. Nas duas situações ocorre oclusão arterial em
decorrência da restrição ao fluxo, imposta pelo hematoma e, no caso
da lesão da íntima, haverá trombose local ou descolamento.
c) Compressão: fratura, hematoma e edema
A compressão ocorre em três eventualidades: 1) compressão
extrínseca por fratura óssea; 2) hematoma dentro dos compartimentos
musculares, como tibial anterior, peroneiro e tibial posterior; 3) edema
que geralmente aparece, após isquemia prolongada.
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Os traumas com solução de continuidade da parede do vaso são os mais
freqüentes e, normalmente, causados por projéteis de armas de fogo e branca.
Clinicamente, exteriorizam-se pelo hematoma e hemorragia. Os traumas fechados
são menos comuns. São causados pelas contusões, fraturas e luxações e
determinam oclusão arterial aguda. Não raro, um trauma pode comprometer artéria e
veia simultaneamente, surgindo fístula artério-venosa. As figuras 1 e 2 representam
os diferentes tipos de trauma arterial.
Figura 1. Tipos comuns de trauma arterial
Figura 2 – Representação esquemática da formação de falso aneurisma e fístula artério-venosa.
1 Ferimento inciso 2 Transfixação 3 e 4 Laceração 5 Secção transversa
1 e 2 Hematoma parietal 3 e 4 Espasmo e hematoma parietal 5 e 6 Lesão dá íntima e trombose 7 e 8 Lesão da íntima e média e descolamento 9. Secção circular da íntima e trombose
FERIMENTOS HADOS
A – Falso aneurisma B – Fístula artério-venosa
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O trauma vascular caracteriza-se clinicamente por:
I. Síndrome hemorrágica II. Síndrome isquêmica
III. Síndrome tumoral
A síndrome hemorrágica ocorre quando há solução de continuidade da
luz do vaso, com extravasamento de sangue para os tecidos vizinhos, cavidades
abdominal e torácica e, freqüentemente, para o meio exterior. Quando a hemorragia
é arterial, o sangue sai em jato, acompanhando a sístole ventricular e sua cor é
vermelha rutilante. Se venoso, sai de forma contínua e vermelho escuro. O
sangramento arterial leva, rapidamente, ao aparecimento de manifestações de
choque hipovolêmico, caracterizadas por palidez, sudorese, frialdade, veias
colabadas, taquicardia e, principalmente, hipotensão arterial. Geralmente, o paciente
chega ao hospital com um curativo compressivo, garroteamento ou compressão
dígito-manual. Se o sangramento é para o interior da cavidade torácica ou peritônio
livre, há risco de morte rápida se medidas heróicas não forem imediatamente
tomadas.
Os agentes agressores determinantes das lesões descritas são
freqüentemente projéteis de arma de fogo e objetos de borda aguda, como faca,
lâminas, estiletes, vidros, etc.
A síndrome isquêmica ocorre quando o traumatismo leva à oclusão aguda
do vaso. Resulta da lesão dos diferentes elementos constituintes da parede arterial,
traduzidos por hematoma parietal, lesão da íntima com trombose e também
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dissecção, promovendo neste caso um mecanismo valvular. As compressões
extrínsecas resultantes de fraturas ósseas, bem como o edema e o hematoma
dentro dos compartimentos musculares, determinam obstrução do fluxo e
conseqüente isquemia. Esses ferimentos são causados por objetos de bordas
rombas. Clinicamente, o paciente apresenta: dor forte, palidez, cianose, frialdade,
veias colabadas, formigamento e impotência funcional.
O exame físico caracteriza os sinais acima referidos, acrescidos de
diminuição ou mais comumente, ausência de pulso. A ausência de pulso é
erroneamente interpretada como vasoespasmo, quando na realidade este encontro
demonstra lesão arterial, até prova em contrário.
A fratura óssea com diminuição de pulso não significa, necessariamente,
lesão arterial, pois poderá ocorrer compressão da artéria pelo fragmento ósseo.
Nesse caso, deve-se proceder ao alinhamento do membro, fazendo-se uma tala
gessada ou colocar o membro sob tração e aguardar por mais ou menos uma hora.
O alívio da dor e o retorno normal da pulsatilidade é sinal de que não houve dano
arterial. A persistência ou agravamento da dor, juntamente com o pulso reduzido,
reforça a presença do trauma, devendo-se então realizar o estudo arteriográfico.
Não se deve esquecer que a secção transversa de uma artéria provoca
isquemia distal, porém neste caso haverá grande hematoma no local. Esse fato pode
ocorrer com as luxações e fraturas do joelho. Esta lesão é muito comum nos
acidentes automobilísticos, principalmente, em pessoas que sentadas recebem
golpe no joelho no sentido horizontal. Em todo paciente acidentado, deve-se sempre
pesquisar a estabilidade da articulação do joelho. Se houver hematoma ou
diminuição do pulso, deve-se proceder a arteriografia.
A síndrome tumoral caracteriza-se pela saída de sangue do vaso, ficando
contido pelos tecidos vizinhos, formando um hematoma pulsátil denominado falso
aneurisma. Geralmente, o agente vulnerante determina solução de continuidade da
luz do vaso com os músculos, aponevroses, tendões, etc. Forma-se uma saculação
contendo sangue líquido e trombo na periferia.
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Quando o ferimento lesa simultaneamente artéria e veia, forma-se uma
fístula arteriovenosa que sempre é acompanhada de um hematoma pulsátil. Se a
comunicação for igual ou maior que o diâmetro da artéria, praticamente todo o
volume de sangue é desviado para a veia, surgindo isquemia dos tecidos distais. O
hematoma pulsátil cresce continuamente, podendo romper-se. As fístulas
arteriovenosas determinam, com o tempo, grandes repercussões sistêmicas e loco-
regionais como, insuficiência cardíaca, aumento do volume sanguíneo, taquicardia e,
tardiamente, o aparecimento dos sinais descritos. Caracteriza-se massa pulsátil e
expansiva em todas as direções, além de sopro e frêmito sistólico no caso de
hematoma pulsátil e sopro contínuo nas fístulas arteriovenosas.
A semiologia do trauma vascular é muito rica de informações e,
geralmente, o médico consegue fazer o diagnóstico sem necessidade de utilizar
recursos propedêuticos especializados. Entretanto, há situações nas quais se
desejam maiores esclarecimentos. Os recursos diagnósticos complementares são:
Doppler, ultrassom e a arteriografia convencional ou de subtração. A arteriografia é o
exame mais importante para caracterização do trauma vascular. Ela deve ser usada
em casos isolados, para afastar a suspeita de vasoespastmo e também, quando
persiste a diminuição do pulso distal, após alinhamento, redução e imobilização de
fratura óssea. Freqüentemente é utilizada na luxação de joelho, fratura-luxação e
adjacências, pois nesses ferimentos há 30-40% de lesões da íntima arterial. O
diagnóstico com o Doppler ultrassom baseia-se no registro da morfologia e
amplitude da onda pulsátil. Em artérias normais periféricas verifica-se sempre onda
trifásica. A diminuição da amplitude e alteração da forma da onda denuncia lesão
arterial.
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O controle da hemorragia deve ser feito por meio de compressão dígito-
manual da artéria lesada. Evitar o garroteamento, porque este comprime também a
circulação colateral, agravando a isquemia distal e levando ao fenômeno de
reperfusão. Pinçamento inadvertido é contra-indicado, pois ocasionam lesões de
veias, nervos e muitas vezes tornando um ferimento arterial incipiente em complexo,
exigindo técnica mais elaborada para revascularização. Paralelamente, deve-se
puncionar uma veia periférica com um cateter grosso para reposição volêmica.
Quando esta via não é possível, deve-se cateterizar a veia basílica ou a cefálica e,
em último caso, recorrer à punção da veia femoral comum cuja complicação em
paciente hipovolêmico é menos relevante que as veia subclávia e jugular interna. Se
possível, monitorar a PVC e realizar a sondagem vesical. O volume de líquido a ser
administrado está na dependência das manifestações clínicas e semiológicas do
choque. Deve-se infundir solução de Ringer Lactato ou soro fisiológico. Sempre que
possível, evitar a transfusão de sangue, em virtude das complicações que poderão
surgir. É contra indicado o uso de hipertensores, pois a vasoconstricção provocada
agrava o choque hipovolêmico. Os pacientes agitados devem receber sedativos e,
se necessário, analgésicos. Deve-se, também, fazer a imunidade antitetânica e
antibioticoterapia com cefalosporina.
Se possível, manter o paciente aquecido, usando colchão térmico ou
cobertores.
Todos estes procedimentos, acima descritos, são para os casos em que
há tempo para equacioná-los. Entretanto, há casos em que os procedimentos têm
que ser executados, simultaneamente, pela enfermagem, anestesia e cirurgião,
devido à gravidade do quadro, obrigando muitas vezes adoção de procedimentos
mais agressivos para evitar a morte do pacientes. Geralmente, esta ocorre nas
lesões de vasos da base, aorta torácica e abdominal.
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Deve-se realizar a assepsia rigorosa da área comprometida, de
preferência com álcool iodado ou povidine alcoólico. Durante a assepsia, manter a
compressão manual da lesão para não haver sangramento. A seguir, realiza-se uma
incisão de extensão suficiente para expor e isolar a artéria no sentido proximal e
controlar o sangramento. Procede-se, então, a abertura ampla do local
comprometido, identificando-se as lesões. Se houver sangramento distal retrógrado,
deve-se utilizar um catéter de Fogarty para a contenção. Uma vez contornado o
sangramento, o ferimento deve ser desbridado, retirando-se todo o tecido não viável.
Na dependência do grau da lesão vascular, deve-se escolher o melhor procedimento
técnico para o caso.
Freqüentemente, as técnicas utilizadas são: sutura simples, colocação de
patch ou remendo, ressecção e anastomose, ressecção e interposição de enxerto
venoso autógeno e, se necessário, bypass ou ponte de veia safena. É contra-
indicado o uso de prótese vascular pelo alto risco de infecção nessas situações. O
bypass ou ponte de veia é usado em ferimentos externos com grande destruição de
tecidos e, também, nos casos de ferimentos arteriais múltiplos. A sutura dos vasos
deve ser realizada com fio sintético monofilamentar não absorvível (4-6 zeros) com
agulha cilíndrica. A sutura pode ser contínua ou de pontos separados. Em artéria de
pequeno calibre e principalmente em crianças, deve-se usar sutura de pontos
separados a fim de permitir o crescimento do vaso. A figura 3 mostra, de forma
genérica, as diferentes técnicas cirúrgicas usadas nas reparações dos ferimentos
arteriais. Se houver necessidade de utilização de veia para restabelecimento da
continuidade vascular, esta deverá ser retirada do membro inferior oposto ao do
ferimento junto ao maléolo interno. Em virtude de associação de lesão venosa no
lado comprometido, prefere-se o membro oposto para se retirar a veia safena. Nos
casos de ferimentos arteriais com manifestações isquêmicas, além de 6-8 horas,
realiza-se a faciotomia dos diferentes compartimentos musculares, pois o edema
que se instala, após a revascularização retardada, leva à necrose muscular.
No trauma arterial, associado à fratura óssea, deve-se priorizar a fixação
dos ossos, desde que a isquemia não se prolongue mais que 4-6 horas. Caso
contrário, deve-se primeiro realizar a revascularização. O motivo da adoção desta
conduta prende-se ao fato de que, por ocasião da redução da fratura, poderá ocorrer
Trauma Vascular ___ ___________________________________________________________________Jesualdo Cherri
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encurtamento de ossos ou estiramento, bem como movimentação exagerada que
poderá levar ao comprometimento do enxerto.
Figura 3 – Diferentes tipos de trauma arterial e técnicas de tratamento cirúrgico.
O trauma venoso, ainda, constitui-se um problema no que diz respeito à
revascularização. O sistema venoso tem baixa pressão, pequena velocidade de
retorno e sua parede sofre modificação do seu diâmetro com os movimentos
respiratórios. O que contribui para a trombose. Entretanto, sempre que possível,
deve-se tentar a reparação de veias importantes como: ilíaca, femural e poplítea no
membro inferior e subclávia e axilar no membro superior.
Quando o trauma vascular é acompanhado da lesão de nervos
periféricos, responsáveis pela motricidade dos membros, a neurorrafia está indicada
e é sempre realizada por especialista em microcirurgia.
Alguns ferimentos arteriais com características particulares, atualmente,
podem receber tratamento especializado por meio da cirurgia endovascular como
por exemplo, pequenas fístulas arteriovenosas e hematomas pulsáteis.
Trauma Vascular ___ ___________________________________________________________________Jesualdo Cherri
94
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Varizes de Membros Inferiores_____________________________________________________________Takachi Moriya
95
Nei Rodrigues Alves Dezotti
A doença cerebrovascular é a terceira maior causa de morte natural nos
EUA, sendo a obstrução parcial ou total das artérias carótidas extracranianas
responsável por um terço dos casos.
A doença aterosclerótica é a causa mais comum da obstrução carotídea,
sendo freqüente sua concomitância com doença obstrutiva ou aneurismática de
outros territórios vasculares, como a aorta, artérias de membros inferiores e artérias
coronárias.
A doença obstrutiva da carótica é insidiosa, podendo o acidente vascular
cerebral (AVC) ser a primeira manifestação, e o sopro carotídeo, o 1º sinal clínico.
Além da aterosclerose, outras causas também são responsáveis por
quadros de insuficiência vascular cerebral. Entre elas, estão: arterite de Takayasu,
displasia fibromuscular, aneurisma, dissecção, acotovelamente da artéria carótida,
embolias de origem cardíaca, tumores de pescoço e radioterapia.
A arterite de Takayasu não é uma entidade clínica muito freqüente.
Acomete indivíduos jovens, predominantemente do sexo feminino, entre 20 e 30
anos. Anatomopatologicamente caracteriza-se por reação inflamatória de todas as
túnicas arteriais, com proliferação da camada íntima e trombose. Depósitos de cálcio
na parede e aneurismas arteriais também são descritos. A doença pode
comprometer um ou mais vasos supra-aórticos e, em alguns casos, afetar também a
artéria pulmonar e a aorta abdominal e seus ramos viscerais. Sua etiologia é
desconhecida, embora alguns queiram correlacioná-la com tuberculose e
estreptococcias.
As embolias cerebrais ocorrem, freqüentemente, em portadores de
afecções cardíacas orovalvulares ou com história anterior de infarto do miocárdio.
Nesses doentes formam-se trombos intracavitários que podem fragmentar-se e dar
origem a êmbolos, que irão localizar-se em vasos intracranianos.
A displasia fibromuscular é uma patologia congênita que se manifesta em
pessoas jovens e que compromete os terços médio e distal de ambas as artérias
Varizes de Membros Inferiores_____________________________________________________________Takachi Moriya
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carótidas internas, com áreas de estenose e dilatação, que decorrem de alterações
da túnica muscular dessas artérias.
O acotovelamento da artéria carótida interna é uma entidade clínica muito
discutida como causa de insuficiência vascular cerebral. Embora sua etiologia seja
congênita, sua exteriorização ocorre geralmente na idade adulta, desencadeada por
outros fatores. A artéria apresenta-se alongada, sinuosa, acotovelada ou em anel e
sofre compressão de estruturas anatômicas vizinhas em determinadas posições da
cabeça, diminuindo ou interrompendo completamente o fluxo sangüíneo para o
cérebro. Em alguns casos, na região acotovelada formam-se placas de ateroma,
muitas vezes ulceradas. O aneurisma, a dissecção arterial, os tumores e a
radioterapia são causas menos freqüentes de insuficiência vascular cerebral.
Os vasos que irrigam o encéfalo têm sua origem na croça da aorta.
O tronco braquiocefálico é o primeiro ramo da croça da aorta e divide-se em
carótida comum direita e artéria subclávia direita. Na maioria das pessoas a artéria
carótida comum esquerda origina-se no segmento mais elevado da croça da aorta,
tendo trajeto ascendente e levemente oblíquo para a esquerda. A artéria subclávia
esquerda origina-se na porção mais posterior da croça da aorta e seu projeto intra-
torácico é um arco, com convexidade superior e medial (Fig. 1).
Figura 1. Arco aórtico e ramos
Artéria carótida externa E
Artéria carótida interna E
Artéria carótida externa
Artéria subclávia D
Tronco braquiocefálico
Veia cava superior
Parte ascendente da aorta
Artéria carótida comum E
Artéria carótida interna D
Artéria vertebral E
Artéria subclávia E
Arco da aorta
Tronco pulmonar
Artéria carótida comum D
Artéria vertebral D
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Os vasos, na altura do pescoço, são as artérias carótidas comuns, direita
e esquerda, com trajeto ascendente, póstero-lateral à glândula tireóide e lateral à
traquéia. As carótidas comuns apresentam bifurcação ao nível de C4, no plano que
corresponde ao bordo superior da cartilagem tireóide. O nível da bifurcação pode
variar, sendo às vezes mais alto, por ex., ao nível de C2 (Fig. 2).
Figura 2. Trajeto das artérias que irrigam o cérebro
A carótida externa apresenta ramos responsáveis pela circulação da face,
de pescoço e do couro cabeludo. Os principais ramos são a artéria facial, a artéria
occipital, a artéria auricular posterior, a artéria maxilar e a artéria temporal
superficial.
A artéria carótida interna* (ACI), em seu segmento cervical, tem cerca de 8
cm de extensão e se estende desde a bifurcação da carótida até o forame crivoso.
O segundo segmento da ACI, a parte intrapetrosa, é ligeiramente oblíquo-anterior,
medial, e tem trajeto normalmente verticalizado quando ultrapassa o seio cavernoso.
O segmento terminal, ou supraclinóideo, divide-se em artérias cerebral anterior e
cerebral média.
A carótida interna, em seu segmento cervical, não apresenta ramos.
O primeiro grande ramo da ACI é a artéria oftálmica, via de circulação
colateral e rede anastomótica com ramos da artéria carótida externa.
As artérias vertebrais, direita e esquerda, são ramos das artérias
subclávias, têm seu trajeto póstero-medial em suas porções iniciais e penetram no
canal vertebral, ao nível de C6, até o forame transverso de CI. Seguem pela
articulação atlanto-occipital, onde se tornam intracranianas, com seus segmentos
Artéria cerebral anterior
Artéria comunicante anterior
Artéria cerebral média
Artéria carótida externa
Artéria carótida comum
Artéria vertebral
Artéria cerebral posterior
Artéria basilar
Artéria carótida interna
Artéria subclávia
Artéria vertebral
Varizes de Membros Inferiores_____________________________________________________________Takachi Moriya
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terminais situando-se na borda inferior da ponte, onde se juntam e formam a artéria
basilar. A circulação arterial intracraniana é rica e suprida pelo polígono de Willis.
Apesar das inúmeras variações, o polígono de Willis é formado pelas artérias
comunicantes posteriores, ramos das artérias cerebrais posteriores, que se
comunicam com as artérias cerebrais médias. Das comunicações anteriores
originam-se as artérias cerebrais anteriores, que se comunicam através da artéria
comunicante anterior (Fig. 3).
O fluxo sangüíneo cerebral corresponde a 20% do débito cardíaco. Além
da ampla rede anastomótica formada pelo polígono de Willis, a vascularização do
encéfalo apresenta sofisticado mecanismo de auto-regulação, o que implica
proteção à instalação de isquemia. Os estímulos à vasodilatação são: a hipóxia, a
acidose, a hipotensão e a hipoglicemia.
Figura 3. - Círculo arterioso do cérebro (Polígono de Willis)
Artéria cerebral posterior
Artéria comunicante anterior
Artéria basilar
Artéria comunicante posterior
Artéria cerebral média
Artéria carótida interna
Artéria vertebral
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99
Estabelecida uma região de isquemia, por oclusão da nutrição arterial,
pequenos ramos arteriais formam a circulação colateral, podendo haver recuperação
total ou parcial do trofismo do tecido nervoso.
O acidente vascular cerebral (AVC), originado pela presença de placa de
ateroma na bifurcação das carótidas, pode ser causado por dois mecanismos: o
primeiro, e menos freqüente, é o acidente vascular cerebral de causa hemodinâmica,
provocado por hipofluxo distal à placa de ateroma. Na maior parte das pessoas,
como o polígono de Willis é funcionante, estenoses graves, até mesmo oclusões
completas podem ser bem toleradas. O AVC hemodinâmico ocorre em situações de
baixo débito cardíaco (hipotensão e arritmia), em associação com a estenose
promovida pela placa de ateroma.
O mecanismo mais freqüente na gênese do AVC por lesão carotídea é o
ateroembólico. Fragmentos de trombo (êmbolos), que surgem em decorrência da
placa de ateroma, são levados pelo fluxo sangüíneo, promovendo a oclusão de um
ramo distal. O êmbolo pode sofrer lise parcial ou total, conforme sua consistência, e
assim promover a reperfusão da região (Fig. 4). As localizações mais freqüentes das
placas de ateromas nos ramos supra-aórticos e artérias cerebrais extracranianas
podem ser vistas na figura 1.
Figura 4. Placa de aterona na bifurcação da carótida e ateroembolismo
Estenose crítica Placa ulcerada e embolização
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O quadro clínico depende da localização encefálica da isquemia e do
tempo de duração dos sintomas. A localização da isquemia determina a natureza
dos sintomas. As lesões arterioscleróticas das artérias carótidas determinam mais
freqüentemente, os seguintes sintomas:
Perda da visão de um olho (amaurose)
Hemi ou monoparesia
Hemi ou monoplegia
Dislalia (distúrbios de expressão e compreensão do simbolismo verbal)
Déficits sensitivos em hemicorpo
Diplopia
Disartria
Disfagia
Desequilíbrio
Sintomas do território carotídeo
Esses sintomas podem apresentar-se de diversas maneiras, constituindo
as chamadas síndromes isquêmicas cerebrais, descritas a seguir:
1. Acidente Isquêmico Transitório (AIT)
O AIT caracteriza-se pelo aparecimento súbito dos sintomas, que
desaparecem em até 24 horas, não deixando seqüelas. Exemplo clássico desse tipo
de manifestação é a amaurose fugaz associada ou não às manifestações motoras
contralaterais.
2. Acidente Isquêmico Transitório “em crescendo”
Essa síndrome caracteriza-se pela ocorrência de acidentes isquêmicos
transitórios consecutivos. Alguns pacientes apresentam vários episódios em
períodos curtos. Considera-se essa situação uma emergência cirúrgica.
Varizes de Membros Inferiores_____________________________________________________________Takachi Moriya
101
3. Déficit Neurológico Reversível (RIND)
Assim como o AIT, esse tipo de manifestação não deixa seqüelas, tendo,
porém, duração superior a 24 horas.
4. Acidente Vascular Cerebral Isquêmico
Quadro súbito de perda de função neurológica decorrente de lesão cerebral
provocada por isquemia aguda. Deixa seqüelas variáveis.
5. Acidente Vascular Cerebral em Progressão
Caracteriza-se por ser progressivo, ou seja, as manifestações tornam-se
mais intensas, acometendo mais áreas com o passar do tempo. Essa manifestação
também constitui, segundo alguns autores, emergência cirúrgica.
6. Isquemia Cerebral Generalizada
Caracteriza-se pela perda contínua de função cerebral decorrente de
isquemia crônica. É notada em pacientes que apresentam oclusões e estenoses
significativas das artérias que irrigam o cérebro.
As lesões obstrutivas ou estenosantes das artérias carótidas podem ser
caracterizadas pelo quadro clínico, pelo exame físico ou por métodos de diagnóstico
por imagem e estudos de fluxo.
O exame físico busca, além da presença de sinais de afecção
neurológica, o exame dos pulsos arteriais cervicais, das carótidas comuns, palpáveis
na borda anterior do músculo esternocleidomastóideo e temporais superficiais,
palpáveis a cerca de 1 cm anteriormente ao ouvido. A oclusão isolada da artéria
carótida interna não provoca alterações nos pulsos carotídeos e na artéria temporal
superficial, porém as lesões mais proximais podem tornar os batimentos arteriais
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102
mais fracos. A pesquisa dos sopros nos trajetos arteriais cervicais e
supraclaviculares faz parte do roteiro diagnóstico das causas de AVC. O mais
comum é auscultar um sopro na projeção da bifurcação carotídea, posteriormente ao
ângulo da mandíbula. Lesões que provocam estenose superior a 70% da luz do
vaso podem ser detectadas por meio da ausculta do sopro.
Estudos clínicos confirmam a alta sensibilidade e especificidade em se
avaliar a estenose das carótidas com esse método. Mais de 95% dos vasos com
estenose acima de 50% são detectados. As calcificações arteriais provocam
dificuldades técnicas para o método que depende da habilidade do examinador. Por
ser um método barato, seguro e sensível, é o método de escolha para se iniciar a
avaliação da doença carotídea (Fig. 5).
Figura 5. Duplex-Scan - Estenose de bulbo carotídeo
Tomografia computadorizada de crânio (TC)
A TC é de grande importância na avaliação da doença isquêmica cerebral.
Nos pacientes com manifestação aguda, ela estabelece o diagnóstico diferencial
entre hemorragia e isquemia, além de identificar a presença de tumorações intracra-
nianas que podem, eventualmente, simular manifestações isquêmicas.
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103
Por meio da TC podem ser detectadas lesões isquêmicas cerebrais em
pacientes que apresentaram AVC no passado, com conseqüente sintomatologia, ou
lesões antigas que ocorreram de forma assintomática (Fig. 6A-B).
Figura 6. Tomografia computadorizada (TCRessonância nuclear magnética (RNM)
Assim como a TC, a RNM pode nos mostrar alterações cerebrais em
pacientes com doença carotídea. A grande vantagem da RNM é ser mais sensível
que a TC. Essa vantagem se faz mais notória nos pacientes que apresentam
sintomas decorrentes de lesões do sistema vértebro-basilar, pois a RNM é capaz de
detectar pequenas lesões isquêmicas no cerebelo oriundas de embolizações das
artérias vertebrais. Angiorresonância de outro paciente com estenose crítica de
carótica interna direita (Fig. 7A-B).
Figura 7. Ressonância Nuclear Magnética
A
B
Carótida interna D Estenose
crítica
Carótida interna e Estenose crítica
A
B
A = Tomografia cerebral (seta = área isquêmica)
B = Angiotomografia
A
A- Ressonância cerebral
B- Angiorresonância (artérias cérvico-torácicas)
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Arteriografia dos troncos supra-aórticos
É o método que revela, de maneira objetiva, a relação entre a doença
caro-tídea e o quadro clínico. Mostra detalhes anatômicos da circulação cerebral e a
concomitância ou não com outras lesões obstrutivas. Deve-se contrastar desde os
ra-mos do arco aórtico até as artérias intra-cerebrais para se completar o estudo
(Fig. 8).
Figura 8. Arteriografia digital
Dois grandes estudos, European Carotid Surgery Trial (ECST) e North
American Symptomatic Carotid Endarterectomy Trial (NASCET), realizados em
pacientes sintomáticos, foram publicados no início dos anos de 1990. Somente após
a publicação desses estudos, pôde-se afirmar que:
1. A lesão da carótida é responsável pelos sintomas neurológicos ipsilaterais em pacientes que apresentam estenose acima de 70%;
2. A cirurgia reduz em 65% a incidência de AVC em pacientes com estenose da carótida acima de 70%.
Cerca de 75% dos casos são conseqüência do ateroembolismo (de origem
carotídea) e os 25% restantes têm outras causas (tumores, aneurismas intra-
cerebrais, metabólicas, cardíacas, hematológicas).
Estenose crítica de Carótida interna E
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Assim, diante de um paciente que apresente acidente isquêmico transitório,
devem ser realizados alguns testes, de preferência não-invaasivos, para estabelecer
o diagnóstico diferencial entre doença carotídea e outras doenças. O dúplex-scan e
a tomografia computadorizada (cerebral) podem mostrar se a causa é intra- ou
extracraniana.
Caso o duplex mostre que há estenose maior que 50% ou oclusão na
carótida, a angiorressonância e arteriografia servem para confirmação do grau de
estenose, identificação de ulcerações nas carótidas e o estado da circulação
intracerebral.
Convém ressaltar que a identificação de ulceração na placa da carótida
faz com que a indicação cirúrgica seja mais liberal.
Quatro grandes estudos tentaram demonstrar qual seria o melhor
tratamento para os pacientes com estenose da carótida que não apresentavam
sintomas: Carotid Artery Stenosis with Asymptomatic Narrowing: Operation Versus
Aspirin (CASANOVA); MAYO TRIAL; VA ASYMPTOMATIC TRIAL; Asymptomatic
Carotid Atherosclerosis Study (ACAS).
Desses estudos, apenas o ACAS demonstrou que o tratamento cirúrgico é
superior ao tratamento clínico para pacientes do sexo masculino com estenose
acima de 60%.
A conduta baseia-se no grau de estenose da bifurcação carotídea. Se a
estenose for menor que 50%, a melhor opção terapêutica é o tratamento clínico com
antiagregante e diminuição dos fatores de risco para arteriosclerose (tratamento da
hipertensão, obesidade, fumo e controle dos lípides).
Caso o grau de estenose seja superior a 60%, o tratamento mais
adequado é o cirúrgico, pois cerca de 15% desses pacientes terão AVC em 3 anos,
sendo a maioria destes nos primeiros 6 meses.
Se o grau de estenose das carótidas estiver entre 50% e 60%, vários
fatores têm de ser ponderados, como o risco cirúrgico e a habilidade da equipe
cirúrgica, assim como o nível educacional e o ambiente de trabalho do paciente.
Outra ocasião em que se deve pesquisar sopro assintomático da carótida
Varizes de Membros Inferiores_____________________________________________________________Takachi Moriya
106
ocorre quando o paciente está para se submeter a uma grande intervenção cirúrgica
(p. ex., revascularização do miocárdio ou aneurismectomia da aorta). Nesse
paciente, impõe-se o tratamento cirúrgico da carótida previamente ao procedimento
proposto quando o grau de estenose for superior a 60%.
O tratamento cirúrgico predominante é a endarterectomia das carótidas,
uma vez que as lesões arterioscleróticas são mais freqüentes nessa localização. A
endarterectomia da carótida é feita sob anestesia geral ou locorregional, sendo a
primeira a mais freqüentemente utilizada. A clampagem vascular para se promover a
endarterectomia deve-se heparinizar sistemicamente com 1 a 2 ml de heparina.
Deve-se indicar a utilização da derivação temporária quando a pressão de refluxo do
coto distal da carótida (inferior a 40 mmHg) e com base na monitorização do
eletrocencefalograma e na monitorização com Doppler transcraniano. Com a
derivação temporária mantém-se o fluxo cerebral enquanto se completa a
endarterectomia e o fechamento da artéria com selo (patch) de veia safena ou
pericárdio bovino (Fig. 9).
Figura 9. Reparos anatômicos
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O desenvolvimento de novos materiais (fios guia, cateteres, balões para
angioplastia e endopróteses ou stents) fez com que as indicações de terapêutica
endovascular para lesões ateroscleróticas fossem ampliadas.
Ainda não há consenso quanto à utilização desses métodos para o
tratamento das lesões carotídeas, uma vez que se alcança baixa morbidade e
mortalidade com o tratamento cirúrgico (em tomo de 2%). Em contrapartida, os
procedimentos que requerem a introdução de cateteres, balões e endopróteses
trazem consigo o risco de promover a liberação de êmbolos. Os resultados dos
estudos iniciais apresentaram índice de insucesso que variou de 3% a 18%, fazendo
com que a indicação esteja restrita a casos isolados, como a presença de retrações
cicatriciais do pescoço, em pacientes submetidos a esvaziamento cervical seguido
de radioterapia e pacientes com alto risco cirúrgico. A morfologia da placa também
deve ser levada em consideração, restringindo-se as indicações às placas lisas, não
calcificadas (Fig. 10A,B,C).
Figura 10. A = Estenose de carótida interna D B = Disparo do stent C = Pós-stent
Sinais clínicos de lesões vertebrobasilares são menos freqüentes que os
sintomas decorrentes de lesões do território carotídeo.
Com freqüência, esses sintomas são confundidos com aqueles decorrentes
de síndromes vestibulares periféricas e, portanto, pouco reco-nhecidos. A B
A B C
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A localização preferencial de lesões ateroscleróticas que comprometem o
território vértebro basilar é a origem das artérias vertebrais por continuidade de
lesões das artérias subclávias.
1. Distúrbios de campo visual (hemianopsia bilateral) 2. Amnésia/confusão 3. Diplopia 4. Disartria (dificuldade de articulação das palavras) 5. Ataxia 6. Hemiplegia / hemianestesia
7. Quedas 8. Cefaléia
A presença de dois dos sintomas referidos acima confirma o diagnóstico de insuficiência vertebrobasilar.
Além do quadro clínico mencionado, o diagnóstico é estabelecido pelos
mesmos métodos utilizados na detecção de lesões da artéria carótida,
particularmente a arteriografia digital por subtração e a RNM. O Duplex-scan, via de
regra, é insuficiente para a observação de detalhes morfológicos; no entanto,
aspectos funcionais, direção e grau de comprometimento do fluxo são, com o
dúplex-scan, bem determinados.
As principais indicações para o tratamento cirúrgico das estenoses das artérias
vertebrais são:
Estenose grave das artérias vertebrais sintomáticas, sem outra lesão acessível por via extracraniana;
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Estenose sintomática das artérias vertebrais, cujos sintomas não melhoram após a correção das lesões carotídeas;
Estenose sintomática das artérias vertebrais e oclusão das carótidas;
Embolização cerebelar.
I – Pacientes assintomáticos com estenoses de carótidas extracranianas devem ser operados nas seguintes situações:
a) Estenose maior ou igual a 70%
b) Placas irregulares ou ulceradas mesmo com estenose menor que 70%
II – Pacientes sintomáticos (AVCI, AIT, etc.) com estenoses carotídeas (exceto oclusão completa):
a) Deve-se operar todos os pacientes, independentemente do grau de
estenose (após se descartar causa intracraniana e se a origem dos
êmbolos é de outra fonte (ex. coração) que não cervical.
As indicações para as endarterectomias de carótidas são as mesmas
indicações para o procedimento endovascular (angioplasita com stent ) de acordo
com as recomendações descritas nas páginas 13 e14.
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Varizes de Membros Inferiores_____________________________________________________________Takachi Moriya
111
Segundo a Organização Mundical de Saúde, varizes são dilatações
saculares das veias, que em geral, são tortuosas, mas por esta definição ficam
excluídos as dilatações das pequenas veias subcutâneas intradérmicas conhecidas
como ¨flebectasias¨ (veias subcutâneas tortuosas conseqüente a tromboflebites
pregressas ou a uma fístula artério-venosa e também as teleangectasias ou vênulas
dilatadas). O conceito mais aceito é que varizes são veias dilatadas, tortuosas e
alongadas.
Desde a antigüidade descrevem-se as varizes (papiros de Ebris 1950 a.
C, no Egito) e constituem a mais comum de todas as alterações vasculares.
Examinando a população que procura o Centro Saúde Escola, em
Botucatu, Maffei (1986) encontrou em pessoas com mais de 15 anos de idade,
prevalência de varizes de 47,6%, sendo 37,9 % nos homens e 50,9 % nas mulheres.
A prevalência de varizes intensas ou moderadas, de maior significado clínico, foi de
21,2%. Fazendo as devidas correções para a população do município de Botucatu a
prevalência de varizes seria de 37,9 %, sendo 30% em homens e 45 % entre as
mulheres.
Vale ressaltar que a incidência das veias varicosas aumenta com a idade,
entretanto, existem diferenças geográficas cujas causas são bastante discutidas, o
que fazem alguns autores especularem a respeito da origem das varizes.
A prevalência de varizes é maior no sexo feminino, em quase todos os
trabalhos publicados. Estudos epidemiológicos mostram o acometimento das duas
pernas, na sua maioria e quando unilaterais não existe diferença entre as
freqüências de varizes entre os dois membros.
Em Botucatu, Maffei (1986) encontrou duas a três vezes mais varizes, nas
mulheres: varizes bilaterais em 75,5% dos casos e unilaterais em 24,7% (sendo 13%
no membro inferior direito e 11,7 % no membro inferior esquerdo).
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A tendência é considerar as varizes não como uma doença, mas como
um quadro clínico que incluem diferentes afecções: 1) Varizes primárias ou
essenciais: tem origem em alterações do próprio sistema venoso superficial dos
membros inferiores (Figura 1,2) Varizes secundárias: assim chamadas por serem
as veias varicosas conseqüentes do aumento de fluxo e pressão sangüínea no
interior das veias superficiais, secundária a alterações do sistema venoso profundo
ou à presença de fístula artério-venosa.
As alterações do sistema venoso profundo podem ser aplasia ou
hipoplasia congênita das veias profundas, ou de suas válvulas; obstrução por
trombose não recanalizada e, insuficiência valvular profunda por recanalização da
trombose prévia com destruição das válvulas.
Figura 1 - Veias superficiais e perfurantes mediais da perna
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Muitos fatores são considerados, mas muito deles possivelmente, só
agem como desencadeantes ou agravantes das varizes:
1. Hereditariedade: é tida como um dos principais fatores, na etiologia
das varizes.
2. Insuficiência valvular: está invariavelmente ligada à presença de
varizes. A dilatação venosa afasta os folhetos valvulares, tornando
as válvulas funcionalmente insuficientes. Então se a válvula mais
superior ou cranial torna-se insuficiente, submete-se o segmento e
a válvula imediatamente inferior, a um aumento da pressão
hidrostática, tornando-a insuficiente e assim sucessivamente.
Vários estudos mostram um número enorme de válvulas no
sistema venoso distal, superficial e profundo, e cada vez, que se
aproxima do tronco o número de válvulas diminuem, sendo que
não se observa nenhuma nas veias ilíacas, comum e na veia cava
inferior.
Existem alguns pacientes com agenesia congênita de todas as
válvulas venosas e costumam desenvolver varizes secundárias
graves.
Parece que a veia varicosa é uma patologia humana, e seria um
tributo que o homem paga à natureza por andar na posição ereta
(Lynton, 1954).
2. Idade - Varizes até a fase de puberdade é extremamente raro. A
partir da puberdade existe aumento progressivo da freqüência de
varizes com a idade, chegando a atingir, mais de 70 % das pessoas
acima de 70 anos de idade. A maior prevalência, se dá entre os 30
e os 50 anos. Esse aumento progressivo da prevalência de varizes
com a idade sugere que: pelo menos, em grande parte dos casos,
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as varizes constituem um processo degenerativo da veia que pode
surgir com o avanço da idade na raça humana.
3. Sexo: A maioria dos estudos epidemiológicos mostra que, as veias
varicosas, afligem consideravelmente mais as mulheres do que os
homens, variando na proporção de varicoso homem/mulher de 1:2
até 1:4. Esses resultados sugerem a existência de um fator,
possivelmente hormonal, responsável por essa diferença.
4. Raça: Dodd e Cockett referem que, nos negros africanos, raças
árabes, indianos e asiáticos, veias varicosas como as que se
conhece no ocidente, não existem como problema.
5. Número de gestações: Veias dilatadas surgem no inicio da
gravidez possivelmente por ação estrogênica sobre o tônus venoso
e, tendem a aumentar no decorrer da gestação, possivelmente pelo
aumento da pressão venosa conseqüente à compressão uterina.
Em algumas mulheres, essas varizes desaparecem após o parto, e
em outras, possivelmente por causa de fatores hereditários, essas
varizes mantêm-se após o parto, aumentando com as gestações
subseqüentes.
6. Obesidade: Obesidade é um fator desencadeante das varizes, pela
maior compressão abdominal sobre a veia cava inferior e ilíacas.
7. Postura predominante durante o trabalho: É controverso, mas
existem trabalhos que mostraram prevalência significativamente
maior de varizes entre as pessoas que trabalhavam a maior parte
do tempo em pé. Vale ressaltar que, também profissões, que fazem
levantamento ou tração de peso, levando à contração dos músculos
abdominais, são referidas, como propiciadoras de veias varicosas,
tanto em homens como em mulheres.
9. Outros fatores: Dentre outros fatores citam-se a constipação
intestinal, que teria embasamento teórico, se atentar para as
diferenças de prevalência de varizes, entre os povos de hábitos
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ocidentais e os povos de hábitos chamados primitivos. Vários
autores levantam a hipótese de os ocidentais, por usarem
carboidratos em sua alimentação, levariam à constipação intestinal
e este seria um fator de aparecimento de varizes (maior pressão
abdominal no esforço de defecação).
a) Posição de defecação: Esta hipótese foi aventada, mas
trabalhos comparando a prevalência de varizes, entre pessoas que evacuavam a maior parte da vida agachadas, e pessoas que evacuavam em bacia de pedestal não demonstram haver diferença entre os dois grupos. A medida da pressão das veias dos pés em indivíduos normais e varicosos, em diferentes posições durante o aumento da pressão intraabdominal, não mostram diferenças significativas
b) Calçado: O tipo de sapato usado pelos ocidentais em relação ao
pé descalço dos africanos também foi levantado como fator desencadeante de varizes. Salto alto do calçado diminuiria a ação de bomba da panturrilha.
No indivíduo normal, o fluxo de todas as veias profundas ou superficiais
faz-se sempre em direção cranial, e nas perfurantes da perna, no sentido do sistema
superficial para o profundo. O sistema superficial é responsável pela drenagem de
10 a 20 % e o sistema profundo pelos restantes 80 a 90 % do sangue que foi
transportado para a periferia pelo sistema arterial.
Quando o indivíduo está na posição ortostática a pressão nas veias do pé
é a de uma coluna líquida da altura da distância da aurícula até o pé. Ao executar
movimentos de marcha, existe uma queda progressiva da pressão e ao parar o
movimento, ocorre um retorno lento à pressão inicial.
Quando existe insuficiência valvular nas veias superficiais, há alteração
de toda a fisiologia do sistema.
No paciente varicoso durante o repouso em decúbito dorsal, o fluxo da
veia safena magna, ao nível da coxa é muito pequeno em direção cranial ou de
vaivém, acompanhando os movimentos respiratórios. Na posição ereta, em repouso,
esse fluxo é zero ou discretamente retrógrado. Quando há contração da musculatura
da perna, quer em decúbito dorsal ou em posição ereta, o fluxo na veia safena
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magna se faz no sentido cranial. Durante o relaxamento da musculatura da perna o
fluxo na veia safena se faz no sentido retrógrado. A pressão na veia safena ao nível
do pé atinge seu máximo durante a contração muscular e o mínimo com a
musculatura relaxada, quando o pé se levanta do chão e nesse momento o fluxo
retrogrado é o máximo.
Nas veias perfurantes insuficientes não há fluxo quando o paciente
varicoso está parado e relaxado. Durante a deambulação há um fluxo bidirecional,
do sistema superficial para o profundo, durante o relaxamento dos músculos da
perna, e vice versa, durante a contração, sendo a resultante final dirigida para o
sistema profundo.
A pressão venosa ao nível do tornozelo é igual tanto no varicoso como no
normal, mas durante a deambulação, essa pressão cai menos no indivíduo normal.
Pequenas variações de pressão, que ocorrem aos mínimos movimentos no indivíduo
normal, parado e em pé, possivelmente não ocorrem nos varicosos e,
conseqüentemente estes teriam um aumento constante da pressão venosa ao nível
do tornozelo durante todo o período diário de atividade.
Durante o exercício, o indivíduo varicoso não teria o esvaziamento do
sistema venoso superficial como ocorre nos indivíduos normais.
As veias varicosas são freqüentemente sede de tromboflebites
desencadeadas por trauma local sobre o vaso, onde o fluxo é baixo e, em certos
momentos, zero, fato que ocorre com freqüência nas gestantes.
Outra complicação comum das varizes é a hemorragia, que pode ser
espontânea, principalmente em pessoas idosas ou por traumatismos sobre veias
dilatadas na região do tornozelo.
Varizes reticulares da região poplítea: também chamadas de varizes
reticulares de primeiro grau e que são pequenas dilatações, que aparecem
principalmente, na região poplítea, que freqüentemente acompanham varizes
intensas, mas podem aparecer isoladamente e assim se manter.
Teleangectasias: também chamadas de microvarizes, são vasos
intradérmicos dilatados e tortuosos. São capilares, venulas e/ou anastomoses
arteriovenosas intradérmicas que se dilatam, fazendo-se sua drenagem
indiferentemente para veias do sistema superficial ou profundo. A causa de seu
desenvolvimento não é bem conhecida; parece haver um fator hormonal envolvido,
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possivelmente estrogênico, sendo mais comum nas mulheres, tornando-se
sintomáticas durante as menstruações e parecendo aumentar ou ser
desencadeadas por gravidez e pelo uso de anticoncepcionais orais. Tornam-se
importantes quando causam transtornos psicológicos, por problemas estéticos e
também pela sintomatologia clínica que causam, ou seja, dor ou queimação na
região afetada, freqüentemente mais acentuada durante o período pré-menstrual.
O que motiva a consulta do indivíduo com varizes é o sofrimento que
causam, pela preocupação estética e por temor às complicações.
Os sintomas podem ser classificados em habituais e ocasionais. Dentre
as habituais citam-se: dor, cansaço, sensação de peso e dos ocasionais: ardor,
prurido, formigamento, inchaço e câimbras. As dores determinadas pelas varizes são
dores devidas à estase venosa, manifestando-se de modo diferente das outras
dores localizadas nos membros inferiores, decorrentes de outras patologias como
obstrução arterial aguda ou crônica, artrite, gota, neurites, etc. No varicoso com o
decorrer do dia, as pernas tornam-se pesadas; há sensação de desconforto, fadiga e
dor. A característica da dor de estase venosa é o seu alívio pela elevação dos
membros, embora esse alívio nem sempre seja imediato. Há acentuação do
desconforto, da dor, do peso e da fadiga com o calor e o ortostatismo prolongado.
Os sintomas acentuam com a evolução da doença, principalmente se instalam
complicações e a dor pode tornar-se contínua, manifestando-se até em repouso, o
que no entanto é pouco freqüente. Nas mulheres há exacerbação dos sintomas na
fase pré-menstrual, durante a gestação e com o uso de anovulatórios. Sintomas
ocasionais geralmente são relatados na anamnese dirigida.
As complicações como eczema, hiperpigmentação, dermite ocre,
lipodermatoesclerose e úlcera são acompanhadas de sintomas tais como dor, ardor,
formigamento e prurido. No eczema, o que é mais freqüente é o prurido e o ardor e
na infecção a dor é mais acentuada.
As úlceras venosas sem infecção não são muito dolorosas.
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O ambiente deve ser bem iluminado e o paciente deve ser examinado de
pé e em decúbito dorsal. Deve-se observar sempre vícios posturais, arco plantar,
volume das pernas, fâneros, distribuição dos trajetos varicosos e o seu calibre,
topografia e natureza das varizes. Aspecto da pele, presença de edema e
varicoflebite e úlcera. A úlcera venosa tem forma variada, bordos nítidos, a pique ou
em declive, os tecidos da vizinhança geralmente apresentam outros sinais de
insuficiência venosa crônica, tais como edema, hiperpigmentação e fibrose. O fundo
da úlcera é róseo e geralmente localiza-se na face ântero medial do tornozelo
(maleolar interna), em razão da área de maior hipertensão venosa crônica, causada
pelos perfurantes insuficientes aí localizados e, da convergência das correntes
sangüíneas, das redes venosas do pé.
Sempre observar a elasticidade da pele, estado do tecido celular
subcutâneo, temperatura, edema e sua intensidade, existência de fibrose, pulsos
arteriais periféricos, presença de frêmitos nos trajetos varicosos, localização de
perfurantes.
Manobra de SCHWARTZ consiste em percutir o trajeto venoso dilatado
com a ponta dos dedos, enquanto que, com a palma da mão oposta se percebe a
propagação da onda sangüínea, mais abaixo ou mais acima.
Em geral o sopro proveniente em uma veia superficial, indica a existência
de uma fístula artério venosa no local.
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Figura 2 - Manobra ou teste de Rima, Brodie, Trendelemburg
Manobra de Rima, Brodie, Trendelemburg (Figura 2).
Este teste simples, feito a beira do leito, foi criado para avaliar a direção
do fluxo sangüíneo e a origem do reenchimento das veias superficiais. Sua precisão
depende da habilidade do examinador, que realiza o teste e seus resultados,
melhoram com a experiência.
O paciente deve estar deitado num divã ou leito, após colocar um garrote
ao nível do maléolo, este membro é elevado a pelos 45o, para esvaziar todas as
veias subcutâneas. Quando as veias estiverem vazias, o examinador coloca outro
garrote na raiz da coxa, o mais próximo possível da virilha. A incompetência
valvular safeno-femoral é detectada quando as varizes localizadas abaixo do garrote
da virilha continuam colapsadas por 15 a 30 segundos após o paciente ficar de pé, e
reencher rapidamente quando o garrote da virilha é retirado.
A existência de veias perfurantes comunicantes insuficientes na perna é
suspeitada caso a aplicação do garrote não colapsa as veias varicosas.
Este método não é preciso em demonstrar os pontos exatos, nos quais as
veias perfurantes insuficientes da perna, atravessam a fáscia profunda, mas avalia
qualitativamente o grau de insuficiência.
Sistema venoso varicoso não se enche, permanece vazio
As varizes se enchem = insuficiência de perfurante
Garrote na raiz da coxa, junto à virilha Garrote ao nível do maléolo,
elevação do membro em 45º,
esvaziamento do sistema venoso
Paciente varicoso de pé
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A maioria dos pacientes com varizes inequívocas não necessita de
qualquer avaliação adicional, além da história detalhada e do exame físico
cuidadoso, detalhado e meticuloso, mas diante de qualquer dúvida, pode-se lançar
mão de:
a) Métodos não invasivos - Ultrassonografia, onde os pontos chaves de estudo seriam a direção do fluxo, das veias superficiais, comunicantes e profundas. Os seus resultados são sempre examinador dependentes.
Pletismografia: permite avaliar o tempo de reenchimento venoso e o bombeamento muscular para quantificar a insuficiência venosa. É um método útil, para acompanhar o evolução natural da doença e, também para a avaliação de pacientes no pré e pós operatório.
b) Métodos invasivos - Atualmente não se usa mais medir a pressão
venosa ambulatorial e que foi substituída pela pletismografia. Recursos modernos têm surgido, ainda que em centros restritos, como a ecografia endovascular e a angioscopia, que desvenda um tratamento promissor para aquelas varizes de difícil acesso. Flebografia, ainda é o exame padrão para estudo das flebopatias, mas as indicações do seu uso, estão limitadas àqueles casos , em que a semiologia não invasiva, não consiga dirimir dúvidas quanto ao tratamento a ser instituído. Ela é empregada em pacientes com varizes recidivadas (após cirurgia de varizes), com úlcera flebopática ou venosa e com dermatoesclerose.
O tratamento das varizes tem pelo menos 5 objetivos principais que são:
1. Obter um resultado estético satisfatório 2. Atenuar sintomas 3. Tratar complicações 4. Evitar complicações 5. Evitar recidivas
Meia elástica: As meias elásticas de compressão graduada são eficazes
para atenuar os sintomas de muitos pacientes, melhorando a função venosa,
aumentando a elasticidade das veias em desenvolvimento e reduzindo a incidência
de dilatações varicosas recidivantes. A sua utilização é uma medida terapêutica
eficaz para pacientes idosos. ou debilitados ou que não querem operar.
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Medicamentoso: Alguns fármacos, principalmente os rutosídeos, têm
referência de que trazem benefícios na sintomatologia dos indivíduos com varizes,
mas não reduzem o tamanho das dilatações varicosas, são usadas
excepcionalmente.
O tratamento cirúrgico consiste basicamente na safenectomia interna e ou
externa (Figura 3), naqueles pacientes com insuficiência valvular grave e sintomas
importantes.
Figura 3 - Representação esquemática de fleboextração da safena interna
A técnica cirúrgica consiste na ligadura ao nível da junção safena femoral,
também conhecida como ligadura da croça da safena magna, fleboextração da veia
safena (Figura 3), ligadura e extração das veias comunicantes-perfurantes
insuficientes, exsérese das veias varicosa, ligaduras das tributárias e excisão local
dessas veias. Enfim é uma cirurgia para remoção radical das veias varicosas.
Cirurgias abertas específicas para ligaduras de veias perfurantes
insuficientes:
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1. Ligadura subfacial das perfurantes na face medial da perna (Cirurgia de Linton).
2. Ligadura subfacial por abordagem na face posterior das veias
perfurantes (Cirurgia de Felder). 3. Ligadura extrafacial das veias perfurantes (Cirurgia de Cockett).
Existem autores que defendem a escleroterapia com compressão como
método de tratamento de varizes, mas estudos mostram que há riscos e alta
recidiva. Recomenda-se esta técnica exclusivamente para veias reticulares,
dérmicas e teleangectasias. Trata-se da injeção intravenosa de drogas que lesam o
endotélio venoso e provocam a esclerose das microveias (ex. etanol amina,
polidocanol, glicose a 70 ou 75%).
Com o desenvolvimento e aperfeiçoamento do laser, onde o comprimento
de onda é mais específico, existem autores que defendem o uso desta técnica, que
está sendo amplamente difundida, para tratamento das teleangectasias e varizes
dérmicas.
Com o advento das técnicas mais acuradas, pode se vislumbrar o
tratamento endoscópico das varizes, pois cirurgias subfasciais para ligadura das
veias perfurantes já é uma realidade.
A medida que as cirurgias de varizes se tornaram mais freqüentes, as
complicações que antes eram raras, passaram a ocupar lugar de destaque e dentre
elas citam-se: hemorragia, lesões de artérias e veias profundas, lesões neurológicas,
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lesões de vasos linfáticos, necrose de pele, cicatrizes de aspecto estético
desagradável, etc.
Insuficiência venosa crônica (IVC) é um conjunto de alterações que ocorre
na pele e no tecido celular subcutâneo, principalmente localizados nos membros
inferiores, decorrentes de hipertensão venosa crônica de longa duração, causada
por uma insuficiência valvular e/ou obstrução venosa. Essas alterações consistem
em edema, hiperpigmentação, dermite ocre, eczema, erisipela, lipodermatoesclerose
e úlcera de estase. Essas alterações são precedidas ou se acompanham de dor em
peso nas pernas ao se manter o paciente em posição ortostática, dor essa que pode
aumentar durante o caminhar, caracterizando um quadro clínico que alguns autores
dão o nome de “claudicação venosa”.
A insuficiência venosa crônica apesar de ser freqüente tem mortalidade
quase nula, mas tem morbidade muito alta, interferindo na força laboriosa de uma
sociedade.
Estima-se em 0,2% a 5% a prevalência da IVC na população adulta (EUA
0,2%; Brasil 2% Suécia 5%).
Com a instalação da hipertensão venosa crônica ocorre eczema varicoso,
quase sempre no terço distal da face medial da perna. O eczema é uma lesão pré-
úlcera e decorre da hipertensão em vênulas e do extravasamento de hemáceas para
o interstício. Com a degeneração destas hemáceas, deposita-se hemosiderina, que
precipita e agrava a reação inflamatória e exsudativa. Com a exacerbação da
melanogênese, a pele desta região, torna-se achocolatada. Qualquer trauma
superficial, ou mesmo o ato de coçar para aliviar o prurido, pode ser fator de
instalação da úlcera varicosa, que geralmente localiza-se na face medial da perna,
normalmente é indolor, mas devido à facilidade de instalação de agentes infecciosos
passa a ser secretante e nota-se celulite ao redor. As bordas são elevadas e o fundo
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granuloso, róseo, coberto ou não de fibrina e secreção purulenta. Com o membro
pendente está sempre exsudando.
A insuficiência venosa crônica é detectada por seu quadro clínico e
quando necessário por exames complementares, destacando-se entre eles o “duplex
scan”, pletismografia e a flebografia.
A presença de varizes há alguns anos ou a história pregressa de
trombose venosa profunda sempre são encontrados nesses doentes. Como sinais
específicos observam-se a dermatofibrose e a pigmentação associadas a
varicosidades. A localização e a extensão da dermatofibrose e da pigmentação da
pele e do subcutâneo é importante para localizar a estase venosa. Na seqüela de
trombose venosa profunda ou da insuficiência primária do sistema venoso profundo;
a lesão trófica é em bota ou em meia acometendo todo terço médio ou distal da
perna.
A ultra-sonografia permite mostrar a obstrução, o refluxo em mm/seg, o
tempo de fechamento valvular e a velocidade de pico sistólico.
A flebografia, que ainda é o exame de referência, permite analisar a
morfologia da parede, válvulas e a luz da veia assim como os aspectos funcionais de
refluxo venoso.
A escolha do tratamento depende do tipo de veias comprometidas e da
fase da complicação.
O tratamento clínico visa melhorar ou atenuar os sintomas: peso,
desconforto, esquentamento ou queimação. Drogas do tipo venotônicos ou
vasculoprotetores ou flebodinâmicos tem por objetivo aliviar o quadro sintomático.
Como existe um aumento da pressão venosa deambulatória, há
necessidade de corrigi-la. O regime de hipertensão venosa é causado por varizes
primárias, oclusão do sistema profundo que podem ser por alterações valvulares
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constitucionais ou por oclusão, lesão parietal e valvular. Neste caso a hipertensão
pode ser reduzida ou atenuada com o uso de faixas ou meia elástica que são mais
práticas e eficazes desde que as medidas do paciente alvo coincidam com as do
manequim do fabricante, e as preferidas são as que dão compressão superior a 30
ou 40 mmHg (conhecida como meia de alta compressão e tem por objetivo diminuir
a capacitância do sistema venoso superficial e profundo). Estas meias corrigem
algumas insuficiências valvulares, favorecem ou auxiliam a contração muscular,
corrigem o refluxo e alguns distúrbios de pressão tronculares. Não se deve esquecer
que para se atingir os objetivos desejados é necessário que a musculatura da
panturrilha esteja livre e o movimento deambulatório seja normal.
O tratamento cirúrgico deve ser planejado adequadamente, pois o
objetivo é o alivio da hipertensão venosa crônica. Dentre os tipos de cirurgia que se
dispõe no momento, pode-se utilizar de métodos de valvuloplastia, derivações
venosas utilizando a safena contralateral e as cirurgias que corrigem os refluxos das
veias perfurantes comunicantes insuficientes (cirurgias de Felder, Linton ou Cockett)
e as ligaduras subfaciais por via minimamente invasiva).
É mandatório o uso da flebografia do membro inferior afetado antes de se
planejar a cirurgia.
As lesões tróficas, com fibrose e pigmentação são definitivas e
irreversíveis, mas a complicação mais marcante da hipertensão venosa crônica é a
úlcera. Ela recidiva com freqüência e evolui cronicamente por anos e seu tratamento
visa o seu fechamento que sempre envolve a redução da pressão venosa
deambulatória.
A principal complicação da úlcera é a infecção. A dor e a inflamação das
bordas caracterizam o processo infeccioso, situação em que a cicatrização é
retardada. Na presença de infecção, prefere-se usar antibioticoterapia para cepas
resistentes.
A cicatrização da úlcera obedece às fases histológicas definidas como
inflamatória, proliferativa e de remodelação cicatricial.
O curativo fechado mantém a ferida em ambiente úmido, evitando assim a
formação de crosta, propiciando aumento da velocidade de reposição de células
epiteliais, da síntese de colágeno, da formação do tecido de granulação e da
angiogênese, enfim preservam o exsudato da ferida, rico em fatores de crescimento
que favorecem o processo de cicatrização. Como exemplo de curativo fechado cita-
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se a clássica bota de UNNA, que além de atuar sobre a lesão, atua também na
redução da estase venosa crônica. A bota não deve ser usada em úlcera infectada
ou com muita secreção. Atualmente podem ser usados os curativos ditos hidroativos
que atuam especificamente em uma ou mais fases do processo histológico de
cicatrização.
Pode-se concluir que a hipertensão venosa crônica é uma doença grave,
pois além dos aspectos médicos, ela traz implicações sociais, econômicas de
enormes proporções e a profilaxia é fundamental.
1. BROWSE, NL.; BURNAND,KG & THOMAS, ML. - Diseases of the veins - Pathology , Diagnosis and Treatment – London, Edward Arnold - 1988.
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5. Atualização em cirurgia vascular e angiologia- Varizes e estase venosa crônica dos membros inferiores - Serviço de Cirurgia Vascular do HC da FMUSP – 2000, Publicação BYK.
6. BROWSE, NL.; BURNAND, KG. ; IRVINE, AT. & WILSON. NM. - Doenças venosas - 2a- edição, Rio de Janeiro, Dilivros, 200l.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 127
Trombose venosa é a formação aguda de trombos (coágulos) no sistema
venoso superficial ou profundo, provocando oclusão total ou parcial da veia. Os
trombos formam-se espontaneamente ou resultado de lesão parietal traumática ou
inflamatória. Emprega-se a denominação de trombose venosa profunda (TVP)
quando os trombos atingem o sistema venoso profundo e tromboflebite
superficial quando as veias superficiais são acometidas (Fig. 1).
Figura 1. Trombos retirados do sistema venoso profundo de membros inferiores
Os trombos formados em veias profundas e mais raramente no sistema
venoso superficial podem se fragmentar e migrar na corrente circulatória (via
coração direto) e se alojar em artéria pulmonar e ramos constituindo uma
complicação grave freqüentemente fatal que é a embolia pulmonar.
Em estudo retrospectivo realizado no Hospital das Clínicas da FMRP-
USP de 3012 necrópsias seriadas, foram encontrados 177 (5,8%) casos de embolia
pulmonar1. Entretanto, estudos prospectivos revelam incidência bem maior (10 a
20%)2. Na grande maioria dessas mortes por embolia pulmonar o diagnóstico pré-
morte não atinge 1/3 delas (5 a 30%)2.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 128
A TVP é muito comum em pacientes hospitalizados, politraumatizados,
no pós-operatório de cirurgias de grande porte, em idosos, em gestantes pós-parto,
portadores de doenças neoplásicas malignas, inflamatórias, infecciosas e
degenerativas e pode levar à morte súbita por embolia pulmonar.
Além da embolia pulmonar há outras complicações da TVP, não menos
graves. Após a fase aguda da trombose sobrevem a fibrinólise que é capaz de lisar
o trombo. Esta lise pode ser efetiva ou não. Assim, a veia pode ser desobstruída e
recuperar sua função ou o trombo pode se aderir à parede venosa e resultar em
obstrução parcial ou total da veia (organização do trombo).
Quando há organização do trombo (aderência) a veia terá dificuldade em
manter a drenagem sangüínea, particularmente no sistema venoso profundo dos
membros inferiores. Essa disfunção venosa resulta em estase venosa. Esta
complicação tardia da trombose venosa é conhecida por síndrome pós-
trombótica. Estima-se que a prevalência desta síndrome na população seja de 1-
3%3 .
Quando na fase aguda da trombose venosa profunda os trombos atingem
e ocluem praticamente todo o sistema venoso profundo haverá dificuldade de
perfusão dos tecidos pelo sistema arterial, resultando em quadros gravíssimos de
gangrena venosa (trombose maciça), felizmente raros.
Resumidamente, na fase aguda da TVP há risco iminente de embolia
pulmonar e raramente gangrena venosa, mas tardia e cronicamente este problema
poderá cursar com síndrome pós-trombótica (edema, varizes secundárias,
dermite ocre, etc.) em membros inferiores.
A TVP pós-operatória é uma complicação temida pelo cirurgião e todos
os esforços são feitos com o objetivo de evitar profilaticamente este problema. A
profilaxia da TVP em pacientes operados será discutida neste capítulo.
Virchow, em 1956, descreveu pela primeira vez os fatores primários
(válidos até hoje) que predispõem os pacientes à TVP, a chamada tríade de
Virchow: coagulabilidade aumentada, lesão endotelial e estase venosa.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 129
O mecanismo de formação de coágulos (coagulação) pode ser resumido
na cascata da coagulação sangüínea pela ação da via intrínseca e/ou extrínseca
resultando na formação da trombina que age sobre o fribrinogênio circulante
formando a rede de fibrina (Fig. 2).
Figura 2. Cascata de coagulação sangüínea
Mas o organismo dispõe também de mecanismos protetores que evitam
a trombose por meio de inativação dos fatores ativados da coagulação (proteínas C
e S e antitrombina III), eliminação dos fatores ativados da coagulação e a fibrinólise
(que promove a lise dos coágulos).
O desbalanço entre os fatores trombogênicos e os protetores, com o
predomínio dos primeiros, desencadeia a trombose venosa.
A estase venosa e a lesão endotelial são consideradas fatores
desencadeantes, enquanto que a hipercoabulabilidade (coagulabilidade aumen-
tada) pode ser considerada como fator predisponente.
Durante as operações de grande porte, reconhece-se aumento dos
fatores de coagulação, diminuição da atividade fibrinolítica e estase venosa por
imobilidade no leito, entretanto a lesão endotelial nem sempre é caracterizada.
Assim, quando um paciente é submetido à cirurgia torácica e abdominal e a TVP se
manifesta em veias da panturrilha (que é o local mais comum) fica difícil comprovar
CASCATA DE COAGULAÇÃO SANGÜÍNEA
Via intrínseca(contato com superfície)
Via extrínseca(lesão tecidual)
Fator X Xa
Protrombina
( II )
Trombina
( IIa )
Fibrinogênio
( I )
Fibrina
( Ia )
Xa
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 130
a lesão endotelial dessas veias. Alguns acreditam que o apoio da panturrilha no
plano rígido da mesa cirúrgica poderia desencadear a lesão endotelial.
A tromboflebite superficial por cateterismo venoso é uma complicação
freqüente em pacientes cirúrgicos ou clínicos, nos quais fica evidente o risco de
lesão endotelial (trauma do cateter, a natureza e a osmolaridade da substância
administrada são potenciais causadores da lesão). Este tema será abordado mais
detalhadamente no final deste capítulo.
Reconhecem-se algumas condições como fatores da trombogênese
venosa que, quando associada ao trauma cirúrgico, pode multiplicar o risco de
desencadear a TVP:
- Insuficiência cardíaca: o risco de TVP aumenta de 2 a 3 vezes, justificado pelo
aumento da pressão venosa central, diminuição da velocidade de fluxo sangüíneo e
a imobilidade do paciente.
- Gravidez e puerpério: após o parto a incidência de TVP é maior provavelmente
pela liberação de tromboplastina tecidual, diminuição da atividade fibrinolítica e a
estase venosa.
- Anticoncepcional oral (ACO): O risco de TVP é maior quanto maior for a
dosagem de estrógenos. As pílulas anticoncepcionais atuais apresentam níveis
mais baixos de estrógenos do que as antigas. O estrógeno tende a aumentar os
níveis de fatores de coagulação, reduz os níveis de antitrombina III (protetor) e
diminui o ativador do plasminogênio.
- Idade: Raramente a TVP surge em pacientes jovens. É mais comum após os 40
anos e principalmente após os 60 anos.
- Imobilização: pacientes imobilizados (pós-acidente vascular cerebral, pacientes
acamados, etc.), após 1 semana a chance de desenvolver TVP é de 15 a 30%,
mais de uma semana o risco é de 80%.Pacientes com acidente vascular cerebral a
TVP é mais comum no membro paralisado(63%)que no membro oposto(7%).
- Tromboembolismo venoso prévio: A ocorrência prévia de TVP aumenta 3 a 4
vezes o risco de TVP em pacientes submetidos à cirurgia justificada pela
predisposição do indivíduo a fatores locais ou fatores trombofílicos ou presença de
neoplasia maligna.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 131
- Obesidade: O risco de TVP aumenta em virtude da dificuldade de mobilização e
diminuição da atividade fibrinolítica.
- Varizes: O risco de TVP aumenta 2 vezes em portadores de varizes de membros
inferiores.
- Infecção: Infecções graves são consideradas fatores importantes para
desenvolver TVP.
- Neoplasias malignas: neoplasias malignas de pulmão, próstata, tubo digestivo e
de origem hematogênicas (linfomas, leucemias, etc.) aumentam o risco de 2 a 3
vezes de desenvolver TVP. Provavelmente devido ao fato destes tumores
formarem fatores pró-coagulantes e pela diminuição da atividade fibrinolítica.
- Trombofilia: algumas condições hereditárias ou adquiridas aumentam o risco de
desenvolver a trombose venosa. Assim, pacientes com deficiência hereditária de
antitrombina III, proteínas C e S apresentam potencial de desenvolver TVP. Mas
outros fatores apresentam maior risco: resistência à proteína C ativada(fator de
Leyden), mutação da protrombina (fator II) e níveis elevados de fator VIII são mais
trombogênicos.
Algumas condições clínicas adquiridas que se manifestam com
deficiência de plasminogênio, disfibrinogenemia, presença de antifosfolipídicos
(fator lúpico) e hiper-homocisteinemia também são trombogênicas. Todos estes
fatores, quando associados a outros tipos de cirurgias de grande porte (abdominal
ou torácica) multiplicam os riscos.
- Cirurgia: As cirurgias de grande porte, cuja duração ultrapassa 30 minutos
apresentam alto risco de desenvolver TVP pós-operatória.
Pesquisas desenvolvidas em pacientes submetidos a operações
abdominais e torácicas utilizando-se o teste do fibrinogênio marcado com I125
demonstraram que a TVP instala-se principalmente em membros inferiores, cuja
incidência varia de 10-42% nas abdominais e 26 a 65% nas cirurgias torácicas
(Tabela 1).
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 132
Tabela 1. Incidência de TVP* em pacientes cirúrgicos**
Tipo de cirurgia Incidência
Abdominal
Torácica
Histerectomia abdominal
Prostatgec tomia trnsvesical
Prostatectomia transuretral
Quadril
10 - 42
26 - 65
23
24 - 47
6 - 8
41 – 75
* TVP = trombose venosa profunda ** Com base no teste do fibrinogênio marcado
Utilizando-se o mesmo método diagnóstico de TVP (teste do fibrinogênio
marcado) conseguiu-se comprovar que é durante a operação que
aproximadamente metade delas (50%) se formam os trombos. Nas primeiras 48 h
formam-se 30% deles e até o 7º dia de pós-operatório aproximadamente 20%4.
Felizmente, 80% deles são lisados (mecanismo de fibrinólise) e somente 20%
propagam-se para veias maiores4.
O local de formação desses trombos preferentemente se faz nas veias
das panturrilhas (90%) e em menor número nas grandes veias ilíacas e femorais
(5%) e no coração direito (5%)4 (Fig. 3).
Figura 3. Local preferencial de formação dos trombos pós-operatórios (seios venosos soleares)
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 133
Distinguem-se nos trombos a cauda, trombo primário, trombo vermelho,
cabeça e trombo branco (plaquetário). A fragmentação da cabeça do trombo
propicia a migração na corrente circulatória até o coração direito e a seguir para a
artéria pulmonar (Fig. 4).
1. Cauda, 2. Trombo Primário, 3 Trombo vermelho, 4. Cabeça, 5. Trombo branco (plaquetário)
Figura 4. Morfologia do trombo
Sevitt sugere que a formação dos coágulos inicia-se junto às cúspides
valvulares das válvulas venosas (Fig. 5).
Figura 5. Formação do trombo
Anestesia: O tipo de anestesia utilizado durante operação parece influenciar no
risco de desenvolver a TVP.O risco parece ser maior na anestesia geral que na
peridural.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 134
Quimioterapia: Além da neoplasia em si,o próprio tratamento,especialmente o
quimioterápico , pode estar implicado no aumento do risco trombótico.
Grupos sanguíneos: aparentemente os pacientes do grupo A seriam mais
susceptíveis que os do grupo O. Não há confirmação.
1. Clinicamente a TVP produz poucos sintomas específicos e assim sua
caracterização pode ser difícil. Basicamente a obstrução parcial ou total de veias
profundas podem dificultar a drenagem do membro. Com o aumento da pressão
venosa haverá distalmente edema e dor nos chamados quadros mais típicos. O
edema dos músculos caracterizam-se por “empastamento” (diminuição do
bolonamento dos músculos da panturrilha) e a dor à palpação ou na dorso-flexão
do pé caracterizam o chamado “sinal de Homans” (Fig. 6).
Figura 6. Edema da panturrilha E em relação à D (A) e edema da coxa, perna e pé D (B)
Outras características clínicas e o tratamento da TVP de extremidades
serão abordados no 4º ano, na Disciplina do Sistema Cardiovascular (RCG433).
Além dos sinais e sintomas que podem sugerir a TVP, métodos de
imagens são utilizados para se pesquisá-la em todos os casos suspeitos.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 135
2. Métodos de imagens mais comuns
- Ultrassonografia (Mapeamento Duplex). É o mais utilizado por não ser invasivo. Ele associa à ecografia (imagem modo B) e o estudo do fluxo venoso com o Doppler. A imagem da veia com trombo aparece hiperecogênica e as paredes venosas não “colabam” a manobras compressivas com o transdutor (Fig. 7).
Figura 7. Mapeamento Duplex
- Flebografia: É considerada o padrão ouro no diagnóstico da TVP. Tem alta
sensibilidade e especificidade. Entretanto, o método utiliza contrastes iodados
(riscos de alegria, etc) e a injeção destes contrastes deve ser feita em veia distal da
extremidade e forçado a transitar no sistema venoso profundo (Fig. 8). A
flebografia é empregada somente quando a ecografia (US) for inconclusiva e
houver forte suspeita de TVP.
Figura 8. Flebografia
A B
A B
A = imagem longitudinal (v = veia poplítea)
B = imagem transversa da veia poplítea com trombo (não colaba)
A = Normal: nota-se veia
femoral c
o
m v
álv
ula
s (
se
B = Trombo obstruindo totalmente a veia femoral (seta)
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 136
- Teste do Fibrinogênio marcado (I125). Este método é utilizado
somente em pesquisa clínica, pois só é válido quando o paciente recebe,
previamente o fibrinogênio marcado e no caso de se desenvolver TVP, o
fibrinogênio se transforma em fibrina, que se deposita e esta inicia o processo
trombótico. Este método foi utilizado em pesquisas para se investigar os riscos de
TVP em situações clínicas e cirúrgicas. Entretanto, o emprego de fibrinogênio
humano marcado tem sido abandonado, em virtude de potenciais doenças
transmitidas (hepatite, HIV, etc.). Nos pontos previamente marcados, em que a
radioatividade aumentar, significa que houve depósito de fibrina, ou seja, o trombo
(Fig. 9-B).
A = normal B = Ponto 6: Radioatividade aumentada (trombo)
Figura 9. Teste do fibrinogênio marcado (I
125)
A tromboflebite superficial pode ser distinguida em espontâneas e
aquelas desencadeadas por uso de cateter ou injeção de drogas diretamente nas
veias superficiais.
As espontâneas surgem em indivíduos que apresentam estados de
hipercoagulabilidade (trombofilias hereditárias e adquiridas). Na maioria das vezes
está associada a alterações secundárias de coagulação e ou fibrinólise: neoplasia,
gravidez, uso de ACO, em outras condições que propiciam estase venosa como
varizes de membros inferiores, imobilização e ainda condições de disfunção
endoteliais como doença de Behcet, Mondor e Buerger.
A B
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 137
A reação inflamatória da parede venosa e das adjacências costumam ser
geralmente intensas. A embolia pulmonar é relativamente pouco freqüente, mas
pode ocorrer se o trombo estender-se proximalmente, atingindo o sistema profundo.
O quadro clínico é de início geralmente agudo, persistindo durante 1 a 3
semanas. Os sintomas e sinais costumam ser locais. Há um processo inflamatório:
calor,dor,rubor(eritema) caracterizado à palpação por cordão endurecido doloroso
e um aumento da temperatura ao longo do trajeto venoso (Fig 10).
Figura 10. Tromboflebite superficial de safena magna
O diagnóstico diferencial deve ser feito com a linfangite (Fig. 11A), a
erisipela (Fig.11 B) e o eritema nodoso.
Figura 11. A. Linfangite. B. Erisipela
A B
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 138
O tratamento se faz a base de antiinflamatórios não hormonais via oral
(aspirina 500 mg duas vezes ao dia, ou outro antiinflamatório) quando a dor é
importante. Pomadas locais com ação analgésica também são prescritas (pomadas
heparinóides). Por se tratar de processo inflamatório asséptico é contra-indicado o
uso de antibióticos. Quando a tromboflebite atinge a croça da safena magna há o
risco eventual de TVP e de embolia pulmonar, neste caso, indica-se a ligadura da
croça o que pode ser feito sob anestesia local.
A tromboflebite superficial por cateterismo venoso é uma
complicação muito comum no meio hospitalar pela utilização freqüente desta via
para administração de líquidos e drogas em pacientes internados, particularmente
em pacientes operados, em centros de terapia intensiva, centros de quimioterapias,
etc.
As causas da tromboflebite são devidas à agressão da parede venosa
pelo traumatismo do cateter ou punção, a presença do cateter, a natureza e a
concentração das soluções injetadas e a infecção potencial local que é aumentada
se o cateterismo se fez a céu aberto (daí a preferência pela punção percutânea).
A duração da infusão parece ser fator importante na gênese da
tromboflebite, por isso os pacientes que necessitam manter maior tempo de
utilização de veia cateterizada deve-se alterná-la a cada 4 ou 5 dias. Este último
fato também justifica a punção percutânea ao invés do cateterismo venoso a céu
aberto, pois uma vez a veia dissecada esta não poderá ser mais utilizada e o
capital venoso do paciente vai restringindo-se.
A manifestação clínica da tromboflebite superficial por cateterismo
venoso caracteriza-se pela dor no local e o processo inflamatório na veia
cateterizada e, às vezes, febre, em geral mais alta que a tromboflebite superficial
espontânea.
O tratamento desta tromboflebite inclui a pronta remoção do cateter
endovenoso (enviando-o ao laboratório para cultura e antibiograma, se houver
crescimento bacteriano). Além disso, precreve-se antibiótico e, se possível, com
base no antibiograma. Hemoculturas podem ser úteis nos casos de septicemias
desencadeadas por tromboflebites sépticas.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 139
A profilaxia primária da TVP e da embolia pulmonar (EP) baseia-se em
métodos físicos e/ou farmacológicos com o objetivo de impedir, ou pelo menos,
diminuir a chance de um paciente desenvolver TVP ou EP em situação de risco.
Em virtude destes riscos serem altos, alguns pacientes operados e ainda
pelo caráter clinicamente silencioso da TVP, em pelo menos metade dos casos, a
prevenção desta complicação pós-operatória atualmente se impõe.
O método profilático ideal seria aquele que oferecesse simplicidade,
segurança e eficácia, aplicável a todos os pacientes com risco de TVP, e cobrisse
todo o período de risco e fosse economicamente viável.
Os métodos mecânicos baseiam-se em:
- Deambulação precoce - solicita-se ao paciente operado ou pós-parto
ou doença clínica que se movimente ativamente (caminhar). Apesar de
recomendado não se tem comprovação científica de sua eficiência.
- Elevação dos membros inferiores - quando possível é solicitada.
- Exercícios ativos e passivos das pernas – movimentação ativa
(dorso-flexão, extensão e flexão dos membros) no leito ou mesmo passiva (quando
acompanhantes dos pacientes colaboram com a movimentação do paciente).
Apesar de empregado, este método também não é comprovado.
- Compressão elástica (meia elástica) - muito utilizada nos USA e na
Europa, tem demonstrado eficácia em alguns trabalhos clínicos em diminuir a
incidência de TVP em pacientes submetidos à cirurgia geral e neurocirurgia. Pode
ser associada a métodos farmacológicos.
- Estimulação elétrica de músculos da panturrilha – é de aplicação
complicada e pouco utilizada.
- Compressão pneumática externa intermitente – realizada por botas
(Fig. 12) ou perneiras infladas cíclicas e seqüencialmente com ar tem se mostrado
de valor na profilaxia da TVP em vários tipos de pacientes. É o método de escolha
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 140
no caso em que os métodos farmacológicos aumentam o risco hemorrágico
(pacientes politraumatizados ou neurocirúrgicos), etc.
Figura 12. Equipamento de compressão pneumática intermitente
Os métodos farmacológicos são atualmente os mais empregados e
estudados, por serem mais práticos. Podem ser associados aos métodos
mecânicos. As drogas mais utilizadas neste método são:
- Heparina padrão em baixas doses - Utilizando-se mínimas doses de
heparina padrão, comprovou-se a queda de incidência de TVP, em cirurgia geral,
de 22,4% (controle) para 9,9% nos pacientes tratados5.
- Heparina de baixo peso molecular (HBPM) - Atualmente tem sido
cada vez mais empregada em muitos países. As HBPM são preparadas a partir da
heparina padrão, que por processos químicos ou enzimáticos fracionam a heparina
em moléculas de 2000 a 6000 dáltons. Devido ao tamanho de suas moléculas,
embora ajam como a heparina não fracionada, acelerando a ação da antitrombina,
elas têm menor ação inibitória ao fator IIa (trombina), atuando principalmente sobre
o fator Xa, além de ter maior biodisponibilidade e vida média mais prolongada.
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 141
Em cirurgia geral, os efeitos da TVP revelam que nos pacientes controles
(sem a medicação) o índice é de 25%, enquanto nos pacientes tratados o índice é
de 7% .
Não há necessidade de controle laboratorial no uso profilático das
heparinas (provas de coagulação). Os principais efeitos colaterais da heparina
(hemorragia, trombocitopenia e osteoporose) são maiores que aquelas das
heparinas de baixo peso molecular. Doses e nome comercial das heparinas em uso
atualmente estão na tabela 2.
Tabela 2. Doses profiláticas da heparina padrão e as heparinas de baixo peso
molecular (HBPM)
Drogas Nome comercial Doses Início (antes
operação)
Heparina padrão
Nadroparina
Enoxaparine
Dalteparina
Liquemine
Fraxiparina
Clexane
Fragmin
5000 UI 12/12 h ou 8/h h
0,3 ou 0,6 ml
12/12 h
20 mg – 40 mg 24h
2500 UI
24 h
2-4 h
2-4 h
2-4 h
2-4h
- Anticoagulante oral - Apesar de serem utilizados antigamente, o
anticoagulante oral tem caído em desuso, por apresentar potencialmente maior
risco de hemorragia.
- Dextran – O dextran tem ação preponderante sobre a viscosidade
sangüínea e sobre a adesividade plaquetária. Também já foi utilizado mas os
resultados são contraditórios.
- Aspirina (ácido acetil salicílico) – Tem ação antiplaquetária, mas não
tem demonstrado qualquer efeito sobre a profilaxia da TVP.
Os riscos de desenvolver TVP no pós-operatório (modificado de
Bergqvist, 2007) podem ser resumidos da seguinte forma:
Baixo risco: Pacientes > 40 anos com nenhum fator de risco
Pacientes > 40 anos, cirurgias pequenas ( 30 min.) (TVP proximal < 1%; embolia pulmonar fatal 0,01%)
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 142
Risco moderado: Cirurgia maior: abdominal ou pélvica em pacientes
com 40-60 anos, sem fatores de risco
Cirurgia em pacientes com menos de 40 anos, com mais de um fator de risco (TVP proximal 2 a 4%; embolia pulmonar fatal 0,1 a 0,4%)
Alto risco: Cirurgia em pacientes com 40-60 anos, com fator de risco
adicional; Cirurgia em pacientes acima de 40 anos, com TVP ou EP prévia, neoplasia maligna ou grande operação ortopédica (TVP proximal – 4 a 8%; embolia pulmonar fatal 0,4 a 1%)
Os métodos recomendados, na profilaxia da TVP, de maneira geral, são
os seguintes:
- Cirurgias de baixo risco: métodos mecânicos (deambulação precoce, movimentação no leito).
- Cirurgias de risco moderado: métodos mecânicos (deambulação
precoce) associados a métodos farmacológicos (Heparina 5.000 UI – 2h antes da
operação e a seguir 12/12 h) ou Enoxaparina - 20 mg – 2h antes da operação e a
seguir 20 mg/dia ou Nadroparina - 0,3 ml - 2 h antes da operação e a seguir 0,3 ml
– 12/12 h.
- Cirurgias de alto risco: métodos mecânicos (deambulação,
movimentação) associados a métodos farmacológicos (Heparina – 5.000 UI 2 h
antes da operação e a seguir 5.000 UI 8/8h ou Enoxaparina – 40 mg – 2 h antes e
40 mg/dia ou Nadroparina – 0,6 – 2h antes e 0,6 ml de 12/12 h).
The thromboembolic phenomena deep venous thrombosis and superficial
venous thrombosis are caused by the formation of a thrombus in the respective
venous system. Here, the etiopathogenesis, the potential clinical as well as
laboratory diagnostics and the possible prophylaxes in order to avoid these
thromboembolic events are discussed.
key words: venous thrombosis, post-operative
Trombose Venosa Pós-operatória ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 143
1. Ferreira Filho AV, Alves SCF, Penosa Jr DC, Llorach-Velludo MAS, Cherri J, Piccinato CE. Incidência de embolia pulmonar em 3012 autópsias. 29º. Congresso Brasileiro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular, Vitória (ES), 1991.
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Trombose Venosa Profunda ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 144
Trombose venosa profunda (TVP) é a formação aguda de trombos nas
veias profundas. Relatam-se nos Estados Unidos mais 2,5 milhões de casos de
TVP anualmente, resultando em aproximadamente 600.000 casos de embolia
pulmonar e 200.000 mortes1. Apesar de ser uma doença relativamente comum, o
seu diagnóstico nem sempre é fácil.
Além da embolia pulmonar há outras complicações da TVP, não menos
graves. Tardiamente, as veias profundas, sede de trombos, não se recompõem
funcionalmente e sobrevêm à seqüela conhecida como síndrome pós-trombótica.
Esta se manifesta predominantemente nos membros inferiores, sob a forma de
estase venosa (edema, varizes secundárias, eczemas, dermite ocre, úlcera).
Estima-se a prevalência, desta seqüela, de 2 a 3%3. A trombose venosa, iniciada
em algumas veias, pode se estender para todo o sistema venoso profundo,
impedindo a drenagem e dificultando a perfusão tissular caracterizando a gangrena
venosa (trombose venosa maciça), felizmente rara.
O primeiro passo na formação do trombo é a agregação plaquetária
sobre a cúspide da válvula venosa; camadas de fibrina se ligam a este agregado
plaquetário e atraem grandes quantidades de glóbulos brancos e vermelhos.
Posteriormente, novas plaquetas se agregam sobre a superfície destes glóbulos
que mantém o processo. O trombo se propaga anterógrada (cabeça) e
retrogradamente (cauda). O segmento proximal, cabeça do trombo, pode estar livre
(flutuando), tornando-se bastante instável, fragmenta-se e migra para veias maiores
e daí ao pulmão. Dentro de 3 a 5 dias, os trombos se dissolvem (mecanismo de
fibrinólise) ou se aderem à parede venosa.
Uma vez aderido o trombo, raramente, se fragmenta. Os trombos em
veias da panturrilha se estendem às veias poplíteas, femoral, superficial e comum
em cerca de 30% dos casos1. Poucos trombos continuarão a se estender às veias
ilíacas.
Trombose Venosa Profunda ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 145
Virchow, em 1856, descreveu pela primeira vez os fatores primários que
predispõem os pacientes à TVP (Tríade de Virchow): coagulabilidade aumentada,
lesão endotelial e estase venosa. O primeiro fator é a condição em que o sangue é
mais propício ao trombo que o sangue normal. Os fatores de risco e as condições
predisponentes que favorecem a coagulação são: o tromboembolismo prévio,
imobilização, pós-operatório (duração da operação e o tipo de anestesia), idade
(acima de 40 anos), doença maligna, trauma de extremidade, gravidez, puerpério,
obesidade, uso de estrógenos na forma de anticoncepcionais orais ou reposição
hormonal, infecção, anticorpos antifosfolípides, viagem prolongada e estados
trombofílicos hereditários (deficiências de antitrombina III, proteína C e proteína S,
fator V Leiden, mutação da protrombina)4.
Acredita-se, hoje, que a formação de trombos esteja ligado ao
desequilíbrio entre mecanismos protetores (antitrombina III, proteínas C e S) e os
desencadeantes (enzimas da cascata de coagulação), com predomínio dos últimos.
A lesão endotelial é bem evidente em situações em que a veia é utilizada
para o cateterismo ou mesmo punção. O traumatismo mecânico do catéter, a
natureza e a osmolaridade da substância administrada provocam lesão endotelial
que favorecem a agregação plaquetária de fibrina e início do processo trombótico.
Entretanto, este fator nem sempre está presente nas tromboses de veias da
panturrilha, como complicação pós-operatória, uma vez que as cirurgias
abdominais ou torácicas, não implicam em manipulação ou lesão evidente do
endotélio dessas veias.
O terceiro fator é a estase venosa. Enquanto o fluxo venoso está
movendo livremente (por exemplo, durante o exercício), o trombo tem pouca
chance de se formar, mas imagina-se um paciente que seja submetido à cirurgia
pélvica ou extremidade inferior e que, provavelmente, tenha sido imobilizado
durante longo tempo de anestesia. O paciente cirúrgico corre o risco por várias
razões: o fluxo sanguíneo é particularmente estagnante durante a operação e no
pós-operatório imediato, quando o paciente fica retido ao leito. É difícil encorajá-lo,
em virtude da dor, à deambulação precoce com o objetivo de ativar os mecanismos
de drenagem venosa. Conseqüentemente, este estado de baixo fluxo promove
condição ideal para o desenvolvimento da TVP. Nestes pacientes de alto risco
descrevem-se de 20 a 50% de TVP de panturrilha. A estase venosa existe,
Trombose Venosa Profunda ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 146
também, em pacientes com paralisia após acidente vascular cerebral, imobilização
por fraturas ósseas e naqueles pacientes com história prévia de TVP (pela
destruição valvular prévia e o mecanismo muscular de bomba da panturrilha torna-
se menos efetivo).
Uma vez desenvolvido o trombo, este progride até a oclusão completa
da veia e daí o processo trombótico acelera e se estende. Este fato se deve à
estagnação do fluxo sanguíneo pelo trombo. A drenagem venosa tenta compensar
esta obstrução de 2 maneiras: as veias colaterais não afetadas pela trombose se
dilatam para ajudar no retorno venoso ao coração e o aumento da pressão distal à
oclusão força o desvio de sangue, através das veias perfurantes ao sistema venoso
superficial, para facilitar a drenagem.
O aumento da pressão venosa, tanto no sistema profundo e
secundariamente no superficial, provocada pela obstrução venosa se transmite ao
capilar venoso dificultando a reabsorção do líquido tissular na microcirculação (Lei
de Starling), resultando assim o edema.
O quadro clínico é caracterizado basicamente por dor, edema e
aumento da temperatura da pele da região afetada.
A dor é espontânea podendo ser permanente ou intermitente ao esforço
com a marcha, tosse ou ficar de pé. O local doloroso pode ser na panturrilha, ôco
poplíteo, triângulo de Scarpa, pélvis, ombro ou o membro todo. Nas tromboses de
veias pélvicas, podem surgir sintomas tipo disúria, polaquiúria ou tenesmo.
O edema é um sinal importante e comum nas tromboses venosas. É do
tipo tenso, nem sempre depressível. A pele se torna pálida, lisa e brilhante. Às
vezes, o edema apresenta o sinal de Godet. As tromboses de veias surais
provocam edema de panturrilha; as de veias poplítea de toda a perna e as do eixo
fêmuro-ilíaco apresenta, edema de coxa, perna e pé. A perda do balonamento da
panturrilha (empastamento) caracteriza o edema muscular. Este provoca, também,
aumento abrupto da circunferência da coxa ou da panturrilha.
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A dor provocada na panturrilha pela dorsoflexão ativa ou passiva do pé
caracteriza o sinal de Homans. A compressão dolorosa da panturrilha manualmente
ou com ajuda do manguito de pressão caracterizam os sinais de Babcock e
Lowemberg, respectivamente.
Outros sinais podem ser encontrados nas extremidades com trombose
venosa: cianose, dilatação venosa superficial (aumento do retorno venoso pelo
sistema superficial), temperatura elevada da pele da região. Estudo realizado neste
Departamento, em 60 casos de trombose venosa profunda de extremidades,
confirmadas com flebografia, apresentou a seguinte freqüência de sinais e
sintomas: edema 98%, empastamento muscular 95%, dor 90%, sinal de Babcock
85%, sinal de Homans 48%, dilatação venosa superficial 48%, cianose 18% e dor
no trajeto venoso 10%2. Sintomas e sinais de embolia pulmonar podem ser a
primeira manifestação da trombose venosa profunda.
Sinais e sintomas gerais podem estar presentes: febre (baixa em geral),
pulso acelerado (sem aumento de temperatura) e estado de angústia inexplicável.
As tromboses venosas profundas caracterizadas por dor, edema, mas
sem sinais de isquemia de extremidade caracterizam a flegmasia alba dolens.
Naquelas em que, além do edema importante, surge sinais de isquemia ou mesmo
gangrena caracterizam o quadro de trombose venosa maciça ou flegmasia cerulea
dolens.
O diagnóstico diferencial da trombose venosa de extremidade deve ser
feito com: cisto de Baker roto, linfedema com celulite, isquemia arterial aguda,
hematoma de panturrilha (síndrome da pedrada), compressões venosas por
tumores pélvicos ou intra-abdominais, fraturas patológicas, tromboflebite superficial,
artrite aguda e lesões de menisco.
Alguns métodos de avaliação poderão ser úteis no diagnóstico da
trombose venosa profunda. O método de escolha é a flebografia, considerado o
padrão ouro5. Apesar das restrições em épocas anteriores, hoje ele é muito
empregado, em casos suspeitos de trombose venosa.
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Os contrastes radiológicos mais modernos não provocam agravamento
do quadro. A flebografia consiste, basicamente, na contrastação do sistema venoso
profundo da extremidade por meio de punção e introdução de contraste radiopaco
em veia superficial. As imagens mais comuns são a falha de enchimento, parada do
contraste em cúpula, ausência de tronco venoso, rede venosa colateral e dilatação
venosa.
Apesar de algumas limitações, a ecografia associada ao Doppler
(“duplex-scan”) tem sido cada vez mais empregada atualmente. Trata-se de método
não invasivo e por isso pode ser repetido. Apresenta bons resultados quando
executado por examinador experiente. A caracterização de trombos em veias tibiais
é limitada, mas apresenta boa sensibilidade em veias mais proximais.
Por ser considerado um método não invasivo o duplex-scan (U.S.) é o
primeiro a ser utilizado. A flebografia só será solicitada quando houver dúvida no
U.S. (Fig.1).
Figura 1. Conduta na suspeita de trombose venosa profunda de membros inferiores com base no ecoDoppler venoso
Suspeita Clínica de TVP
Ecografia Doppler
pouco freqüente
flebografia
Normal (acompanhamento clínico)
repetir o Eco-Doppler
não conclusivo
distal proximal
25% (pac. ambulatório)
60% (pac. hospitalizado)
TVP
Tratamento
hospitalizado Tratamento
ambulatorial
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A evolução da trombose venosa poderá ser normal após a fibrinólise
completa, entretanto, acredita-se que persista seqüela do sistema valvular depois
da recanalização venosa. Se não houver a lise completa do coágulo surgirá
organização do trombo e oclusão venosa, traduzida tardiamente por estase venosa,
principalmente no membro inferior, caracterizando a síndrome pós-trombótica
(Fig.2).
Figura 2 - Evolução local da TVP
Os trombos que se fragmentam na corrente venosa migram para o
coração direito e daí ao pulmão determinando o quadro de embolia pulmonar. Este
quadro, freqüentemente, de difícil diagnóstico poderá ser caracterizado por sinais e
sintomas ou por meio de radiografia de pulmão, eletrocardiograma, cintilografia ou
arteriografia pulmonar.
A recidiva da trombose venosa é outra complicação muito freqüente na
evolução desta doença.
Cura
(veias permeáveis
válvulas normais)
Obstrução
persistente
Veias pérvias
+ destruição
valvular
Dilatação
venosa
superficial
+
Insuficiência
valvular
Refluxo em ortostatismo
ESTASE VENOSA
Edema, sobrecarga linfática
Úlcera, dermatosclerose , dermite ocre
Circulação colateral
Eficaz Insuficiente
Sem edema
TROMBOSE VENOSA PROFUNDA (EVOLUÇÃO LOCAL)
Trombose Venosa Profunda ____________________________________________________ Carlos Eli Piccinato 150
O tratamento visa, idealmente, suprimir os sintomas, destruir os trombos
formados, evitar a expansão destes, prevenir a embolia pulmonar e a síndrome
pós-trombótica. Infelizmente, não há medicação ou procedimento que atenda todos
estes objetivos.
O tratamento clínico conservador é o mais indicado nos casos de TVP e
envolve a terapêutica anticoagulante e a fibrinolítica. Esta última por ser de alto
custo, e pelos riscos de alergia e hemorragia, é pouco utilizada no Brasil.
Algumas medidas gerais devem ser tomadas para se tratar a TVP de
extremidades. Internar o paciente e mantê-lo em repouso com elevação do membro
para facilitar drenagem venosa e evitar extensão do trombo.
A heparina sódica, por sua ação antitrombina e anti-fator X ativado, é a
droga de escolha para iniciar a terapêutica. Além disso, a sua ação rápida impede a
formação de novos trombos e apresenta alguma ação antiinflamatória.
Atualmente emprega-se heparinas de baixo peso molecular (fracionada)
no tratamento hospitalar ou ambulatorial da trombose venosa profunda. Dentre elas
emprega-se a enoxaparina ou a nadroparina ou a dalteparina. Por exemplo, a
enoxaparina pode ser administrado 1 mg/kg de 12/12 horas no subctâneo. E a
seguir introduz-se a varfarina (no 1º ou 2º dia) conforrme como citado abaixo.
O tratamento poderá ser também com a heparina padrão (não
fracionada) e para isso deve-se puncionar e cateterizar veia superficial de bom
calibre para iniciar a terapêutica anticoagulante. Empregam-se 5 a 10.000 U.I. de
heparina padrão endovenosa como dose de ataque e mantêm-se 400 a 600
U.I./Kg/dia, divididas em 3 frascos e diluídas com solução glicosada a 5% ou
solução fisiológica (administrar cada frasco de 250 ou 500 ml em 8h, com
microgotas ou bomba de infusão). O controle da anticoagulação deve ser diário e,
de preferência com o tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA) ou o tempo
de coagulação (TC). Manter o TTPA em 1,5 a 2,5 vezes o controle ou o TC entre 10
a 15 minutos. Deve-se lembrar que a heparina é contra-indicada em hipertensos
graves, hemorragia digestiva alta, acidente vascular hemorrágico, pós-operatório
recente, etc. A heparina deve ser mantida por 5 a 7 dias. Paralelamente à heparina
inicia-se, no 1º dia, o anticoagulante oral (varfarina sódica ou femprocumona). Este
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tem ação mais lenta impedindo a formação hepática dos fatores de coagulação
(protrombina, fatores VII, IX e X). Seu pico máximo de ação atinge 48 a 72h. O
controle anticoagulante é feito com o tempo de protrombina mantendo-se o INR
(“International Normalized Ratio”) entre 2 e 3. Administram-se, oralmente, 2
comprimidos (varfarina) no 1º dia, 1 no 2º e no 3º; solicita-se o tempo de
protrombina e com base neste, administra-se meio a um comprimido como dose de
manutenção. Mensalmente ou quinzenalmente, quando necessário, recomenda-se
controle pelo tempo de protrombina, em ambulatório. O paciente deverá ser
orientado quanto ao uso deste medicamento em situações de trauma ou
sangramento. Algumas drogas potencializam a ação anticoagulante destes
medicamentos (aspirina, outros antiinflamatórios não hormonais, etc); outras a
inibem (certos antibióticos, alupurinol, etc). O anticoagulante oral deve ser mantido
de 3 a 6 meses. As complicações hemorrágicas pelo uso dos anticoagulantes
devem ser tratadas de imediato. A ação da heparina é inibida com protamina
(mg/mg ou 2/1) e os anticoagulantes orais devem ser suspensos e administram-se
vitamina K1 (endovenosos), plasma fresco e concentrado de fatores.
Recomenda-se o uso de meia elástica de alta compressão (40 mmHg)
no membro afetado, quando o paciente deambular .
O tratamento cirúrgico da TVP é a trombectomia venosa. Ela é feita
ocasionalmente. Alguns autores, que a empregam, recomendam após a
trombectomia, a realização de uma fístula artério-venosa temporária para aumentar
o fluxo de retorno e evitar a retrombose.
Resumidamente, as tromboses de veias do membro superior, do eixo
fêmoro-poplíteo, fêmoro-ilíaco e veias cavas são tratadas, clinicamente, com
anticoagulação endovenosa e oral, mantendo-se esta por 3 a 6 meses,
dependendo da gravidade.Tromboses proximais mantêm-se por 6 meses.
Alguns casos de tromboses distais (tibiais ou peroneiros) podem ser
tratados com heparina sódica ou de baixo peso molecular aplicada no subcutâneo.
O acompanhamento clínico deste tratamento, deve ser rigoroso para caracterizar
precocemente a extensão dos trombos para veias proximais, quando a terapia
padrão deverá ser empregada.
A flegmasia cerulea dolens deve ser tratada com trombectomia venosa
(com ou sem fístula artério-venosa), heparina endovenosa e anticoagulante oral. A
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fasciotomia dos compartimentos musculares pode ser empregada como medida
coadjuvante ou inicial seguida pela anticoagulação.
Alguns procedimentos cirúrgicos são indicados para evitar a embolia
pulmonar. A plicatura cirúrgica da veia cava inferior com sutura ou colocação de
“clips” externos são utilizados para evitar a migração de êmbolos para o pulmão. A
colocação percutânea de dispositivos intracavais pode ser, também, empregada
com a mesma finalidade (guarda-chuvas ou dispositivos de Greenfield ou Mobin-
Uddin).
Estes procedimentos são indicados em embolia pulmonar recidivante, na
vigência ou não de terapia anticoagulante, após embolectomia pulmonar, quando
há contra-indicação no uso de anticoagulantes e ou grande risco de ambolia
pulmonar.
1. CASE, T.D. Primer of noninvasive vascular technology. Boston, Little: Brown, 1995, p. 135-471: Venous disease.
2. FERREIRA FILHO, A.U; MASSUDA, C.A; MORIYA, T.; ABDALLAH, L.A.; PICCINATO, C.E.; CHERRI, J. Estudo clínico de 60 casos de trombose venosa profunda. Medicina, Ribeirão Preto, v. 25, p 61-2, 1992. Supl. 1.
3. MAFFEI, F.H.A.; LASTORIA, S.; ROLLO, H.A.; YOSHIDA, N.D. Doenças vasculares periféricas, 2 ed. Rio de Janeiro, Medsi, 1995, p. 86-177, Trombose venosa profunda dos membros inferiores: tratamento clínico.
4. PORTER, J.M.; MONETA, G.L. An international consensus Comitee on Chronic Venous Disease. Reporting standards in venous disease: Un update. J. Vasc. Surg., v. 21, p. 635-45, 1995.
5. SUMMER, D.S. Diagnosis of deep venous thrombosis, In: RUTHERFORD, R.B. Vascular surgery, 4. Ed. Philadelphia, W.B. Saunders, 1995, p. 1698-743.