Cartilha Patrimonial PCH Bocaiúva

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Apresentação 4

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Patrimônio Histórico e Cultural 8

O que é Arqueologia 16

Apresentação dos Sítios Arqueológicos 20

Ficha Técnica 30

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Prepare-se para conhecer algo novo, porque esta cartilha que você acaba de abrir não é como as que vê em seu cotidiano escolar. Esta é uma cartilha Patrimonial e a partir desta leitura você ouvirá e entenderá muitas coisas sobre Patrimônio Histórico e Cultural, especialmente do Mato Grosso.

Esta Cartilha Patrimonial nasceu baseada em pesquisas desenvolvidas pelo Programa de Prospecção e Resgate do Patrimônio Arqueológico da PCH Bocaiúva, uma pequena hidrelétrica localizada no rio Cravari, município de Brasnorte, em Mato Grosso.

No primeiro semestre de 2003 foram realizados os estudos de diagnóstico arqueológico para a PCH Bocaiúva. O trabalho atendeu a Portaria IPHAN n. 77, de 25/04/2003. O IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - é um órgão do Ministério da Cultura e responsável por zelar pelo patrimônio cultural brasileiro. Nos trabalhos de campo feitos naquela ocasião, descobriu-se um sítio arqueológico na Área de Influência Direta (AID) da PCH, em uma área

da bacia do rio Cravari (o sítio Bocaiúva 2) e outra fora dela, na bacia do Bóia (o sítio Bocaiúva 1). Os cientistas, conversando com os moradores locais, souberam da existência também de outros vestígios nas proximidades, tanto arqueológicos quanto históricos, reforçando assim a importância de fazer uma investigação científica mais profunda em virtude das evidências novas encontradas.

Sabedores desses novos fatos e descobertas, os cientistas informaram ao IPHAN, a necessidade de realizar um Programa de Prospecção e Resgate Arqueológico para a área (a Portaria n. 230). Melhor explicando, é que de início se previa apenas realizar pesquisa de campo, para confirmar, ou não, a existência de vestígios arqueológicos em uma área menor, a que se chamou de Área Diretamente Afetada (ADA) do empreendimento – aquela que sofre impactos de modo mais visível ou que podem ocorrer com a instalação da PCH. Desse modo, somente em caso positivo seriam feitos trabalhos de prospecção e resgate mais amplos e profundos – e foi o que ocorreu.

O Programa Arqueológico da PCH Bocaiúva – ao realizar e apresentar os resultados dos trabalhos de prospecção e resgate arqueológico feitos nas áreas mencionadas, atendeu à legislação brasileira que trata da proteção e

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condições a serem respeitadas quando se faz intervenção em patrimônio público – ou seja, relacionados àqueles bens de interesse para todos os brasileiros. Por outro lado, as pesquisas contribuíram para produzir novo conhecimento científico sobre a Arqueologia e História da área e de sua população, contribuindo para a ampliação do conhecimento da cultura local e nacional.

Agora, você iniciará uma viagem ao mundo da Arqueologia. Anote tudo que achar interessante, os patrimônios que você já conhece e as dúvidas que tiver, para se preparar para debater em sala de aula com seus colegas e professores. Então, vamos conhecer um pouco mais sobre o Patrimônio Histórico e Cultural do Mato Grosso?

Boa Leitura!

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O que é patrimônio?Vamos descobrir o que é Patrimônio? Esse termo pode ser definido como um bem, uma herança, um conjunto de bens a que damos valor e que temos uma relação de propriedade, de identidade com elas. Portanto, Patrimônio é tudo aquilo que se refere aos bens materiais e imateriais que representam nossas ações, nossos costumes e crenças, nossas memórias.

Isso significa que o Patrimônio é constituído por produtos e ações da expressão humana: os modos de criar, fazer, viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; e, os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

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Herança arqueológicaO trabalho dos cientistas na área da bacia do rio Cravari, identificou dois sítios arqueológicos, chamados de Bocaiúva 1 e Praia, além de mais 11 áreas de ocorrência arqueológica, locais que apresentaram somente vestígios esparsos. Nesses sítios foram coletados, como materiais arqueológicos, os seguintes objetos:

Sítio Bocaiúva 1: 16 vestígios ao todo, sendo 15 cerâmicos (fragmentos de parede) e apenas 1 lítico lascado.

Sítio Praia: foram identificados material lítico lascado em cascalheiras existentes nas margens do rio e poucos fragmentos cerâmicos - estes, delgados, bem alisados, com superfícies de coloração cinza a marrom -, formando uma coleção de 44 peças.

Nas áreas de ocorrência arqueológica foram encontrados 3 vestígios líticos lascados e um vestígio cerâmico.

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Patrimônio Histórico e CulturalAs heranças culturais do passado são importantes e devem ser preservadas. Entretanto, não são apenas os bens do passado que merecem atenção. O lugar onde você nasce, cresce e vive, com suas histórias, crenças, tradições e costumes, também necessita ser preservado, e o nosso papel - nosso e seu -, é o de ajudar na preservação, para garantir às gerações atuais e futuras.

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Origem

Você sabia que a história natural do Mato Grosso é importante para entender a formação do sul da Amazônia, bem como dos diferentes tipos de sociedade que já ocuparam esta porção meridional da bacia Amazônica? Para se ter uma idéia, a divisão entre a bacia amazônica e as bacias dos rios Paraguai e Paraná ocorreu há pouco tempo na história da Terra. O avanço e o retrocesso da floresta amazônica, assim como seu contato com o Pantanal e o cerrado, estão registrados em território mato-grossense nas atuais áreas de tensão ecológica.

As mudanças na natureza dessa região são muito marcantes. Exemplo disso é o cerrado do Mato Grosso, que anteriormente teve cobertura vegetal como o da floresta amazônica. A expansão do cerrado está ligada ao aumento de temperatura e umidade terrestre ocorridos há cerca de 5.000 anos. Essas transformações fizeram com que os primeiros habitantes da região, os grupos indígenas caçadores-coletores de pequenas aldeias, tivessem seus hábitos modificados e alguns chegaram a tornar-se agricultores. As mudanças principais ocorreram na forma de abastecimento de alimentos e na produção de artefatos.

Inicialmente, esses grupos habitavam áreas de serra, como a Chapada dos Parecis, mas aos poucos foram se espalhando pelo Brasil Central, organizando-se em assentamentos cada vez maiores e mais estáveis. Esses grupos foram se expandindo e ocuparam a região até por volta do século VIII de nossa era, quando começaram a dividir o espaço com grupos de grandes aldeias circulares. Estas aldeias, a partir do século IX, já eram maioria na região.

Mudanças nas característicasgeográficas do estado do Mato GrossoO estado do Mato Grosso é cortado por um conjunto de Chapadas que possui intensa atividade tectônica e isso teria gerado mudanças muito grandes no relevo do centro-oeste brasileiro, conforme estudos geológicos feitos na década de 1970.

Há muito tempo, todo o Mato Grosso era uma grande bacia sedimentar e parte de seu território formava um mar interior que unia a bacia amazônica e a bacia cisplatina. Com o choque das placas continentais este antigo mar

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deixou de existir. Essa mudança, que se iniciou há 60 milhões de anos e aumentou nos últimos 2 milhões de anos, transformou Mato Grosso em uma região de serras e chapadas cortadas por uma grande rede de rios.

Para os cientistas, as formações mais importantes são as chapadas, e a Chapada dos Parecis mais ainda porque ela, ao se formar, dividiu as águas que contribuem para formar a bacia Amazônica, das águas da bacia do Prata. Ela também se tornou um obstáculo para as massas de ar que vem do Sul, provocando uma concentração de umidade na região. Dessa forma, as massas de ar úmidas atravessam grandes extensões de terra sem que ocorram chuvas. Mas, quando chove, como o tipo de rocha da região que as recebe é muito poroso, há facilidade de absorção – o que torna o cerrado importante alimentador das duas bacias hidrográficas citadas. A concentração de umidade dá condição para o avanço da floresta Amazônica para o Sul até os limites da chapada e, a partir daí, o cerrado domina a paisagem.

A porção sul da Amazônia era um contínuo de floresta tropical, que já foi maior do que é atualmente, como visto. Nas áreas de cerrado encontravam-se manadas de animais de grande porte, que podiam facilmente alimentar grupos

humanos adaptados à caça. Junto com isso, através dos rios e de atividade biológica, sementes se dispersaram por toda a região, e ao brotarem em ambiente novo podiam apresentar formas diversas da conhecida, obrigando os grupos humanos que ali viviam a criar novas estratégias de captação e utilização de recursos da natureza para sua sobrevivência.

Como você pode notar, as pesquisas nos sítios arqueológicos servem tanto para revelar as transformações das características ambientais sofridas pela região, como também as possíveis relações entre os grupos indígenas pré-coloniais de caçadores-coletores, horticultores e agricultores com esta região, principalmente, onde se encontra o rio Cravari.

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Patrimônio material dos povos

Já falamos que nas pesquisas desenvolvidas pelo Programa de Prospecção e Resgate do Patrimônio Arqueológico da PCH Bocaiúva, os arqueólogos encontraram vários objetos, sendo que cada pequeno conjunto pertencia a grupos humanos diferentes.

Os patrimônios arqueológicos encontrados nos sítios de grupos da tradição Itaparica, são: raspadores plano-convexos e “lesmas” (longos raspadores sobre lascas espessas de formato oval), e uma grande quantidade de restos de lascamento, como núcleos, lascas, fragmentos de lasca, detritos e micro-detritos e espátulas feitas sobre ossos de animais como o veado. Além dessas peças foram ainda encontrados pontas de flexas de lanças, anzóis, furadores e dentes perfurados.

Os sítios arqueológicos dos grupos de tradição Serranópolis são em número maior, o que indica que tiveram uma expansão mais lenta no território. Estes sítios estão em abrigos rochosos ou a céu aberto, localizados geralmente em porções altas do relevo como é a Chapada dos Parecis (MT).

O que é?vestígio arqueológicoAgora, você aprenderá o que é vestígio material, uma expressão muito usada pelos profissionais da arqueologia. Se procurar a palavra “vestígio”, em qualquer dicionário da língua portuguesa, você verá que significa: sinal, pegada, marca ou rastro; sinal de uma coisa que aconteceu, de uma pessoa que passou. E a palavra “material”, se refere à matéria, ou seja, tudo aquilo que conseguimos tocar, pegar. Por exemplo: conjuntos de obras, objetos de casa, ferramentas de trabalho, entre outras coisas. Os arqueólogos, no desenvolvimento de seu trabalho, estudam vestígios materiais e artefatos que resistiram ao tempo, ou seja, todos os objetos que as sociedades humanas do passado e, agora, do presente, utilizam. É importante dizer que eles dão dicas para os arqueólogos, que tentam compreender como foram feitos e a função de cada um. A partir daí interpretam as sociedades que os produziram. Lembre-se, não falamos apenas de objetos pequenos, mas também de grandes construções.Há ainda os ecos fatos, que são vestígios de plantas, sementes, ossos de animais e assim por diante, sendo coisas importantes que nos ajudam a conhecer hábitos e costumes de uma sociedade. É nesse sentido que a expressão vestígio arqueológico se refere a todos objetos que caracterizem ou indiquem a presença humana em uma área qualquer estudada, e independentemente do período que por ali viveu.

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Os artefatos encontrados nesses sítios são raspadores laminados (lesmas) e lascas, que são malfeitos e com poucos retoques. São objetos como raspadores (com ponta, bico, laterais e terminais), goivas, furadores, cunhas, plainas, buris, talhadores, formões, quebra-cocos e batedores. Pontas projéteis (para lanças ou flechas) são extremamente raras e se somam a materiais ósseos como anzóis e agulhas.

Sítios dos grupos de tradição Una possuem vários objetos, a maioria deles de cerâmica, com vasilhas pequenas e médias nos formatos de tigelas rasas e potes com gargalo.

Por sua vez, nos sítios dos grupos de tradição Uru os vestígios encontrados são tigelas rasas, jarros e assadores para mandioca amarga. A indústria lítica é novamente pouco representada, havendo apenas lâminas polidas de machado, percutores, mãos de pilão, recipientes e fusos de serpentinita, sendo raros os machados semi-lunares. É também uma indústria de lascas sem trabalhos secundários (retoques).

Os sítios dos grupos de tradição Tupi-guarani ficam na porção centro-sudeste (baixo Paranaíba, alto Araguaia, vale do São Lourenço, médio Paraná e alto Paraguai). Os

objetos, ou seja, os patrimônios arqueológicos encontrados no Estado de Goiás e Mato-Grosso são vasilhames com uma decoração feita com muitas cores. Nos sítios do Mato Grosso esses vasilhames apresentam tamanhos menores com poucas peças pintadas.

O principal tipo de vestígio encontrado nos sítios são fragmentos de cerâmica, pertencentes a vasilhas, como: tigelas rasas e abertas, jarros, e igaçabas. Na decoração deles, ainda em argila, foram encontrados cachimbos, fusos e afiadores em canaletas (ou calibradores).

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Saiba mais

As tradições culturaisNo início da povoação do Mato Grosso, viveram na região os “Paleoíndios”, que por longo tempo ocuparam o espaço com habitação permanente em alguns lugares e temporária em outros - esta última para atividades específicas como a ca ça.

Próximo da Chapada dos Parecis, no município de Jangada (MT), no abrigo Santa Elina, foram coletados instrumentos feitos de ossos de Glossotherium, o que indica que estes animais não eram caçados apenas para servir de alimento, mas também de matéria-prima para a fabricação de ferramentas.

Nos locais de abrigo por onde os Paleoíndios teriam passado foram notados sinais de ocupação mais recorrente, o que já não aconteceu no caso dos sítios a céu aberto. Esses grupos espalharam-se pelo Brasil Central, mas quando aconteceram as grandes transformações no ambiente em que viviam (o fim da última glaciação), os Paleoíndios foram se diferenciando entre eles e deram origem aos grupos classificados na tradição Itaparica, por volta de 10.000 a 12.000 anos atrás. Esses grupos são diferentes dos demais já mencionados. Nessa tradição, os enterros, por exemplo,

são raros. Os poucos vestígios já descobertos estão em Minas Gerais, Goiás e Piauí, sempre em abrigos rochosos.

sobre a região

No município de Jangada, local próximo da Chapada dos Parecis, mais precisamente na Serra das Araras, as pesquisas arqueológicas foram feitas em parceria com o Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (Universidade de São Paulo) e o Museum National d´Histoire Naturelle (Museu Nacional De História Natural) – CNRS, sito em Paris, França. Você pode não acreditar, mas essas pesquisas revelaram que a data mais antiga da ocupação humana no Estado do Mato Grosso é 25.000 anos.

Nessa mesma região, cientistas encontraram provas que confirmam o quanto antiga é essa ocupação humana. Trata-se de um sítio arqueológico também localizado na encosta da Chapada dos Parecis, no vale do rio Guaporé, conhecido por “Abrigo do Sol”, que se calcula ter 19.400 anos, aproximadamente, mas pode ser mais antigo ainda.

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Nos sítios dos grupos de tradição Serranópolis, os cientistas encontraram restos de alimentos que indicam a caça de animais de pequeno porte como lagartos, peixes e veados. Os moluscos terrestres também faziam parte da dieta, pois foi encontrada grande quantidade de conchas, depositadas no solo dos sítios arqueológicos pesquisados.

Veja que interessante: esse grupo tinha o hábito de sepultar os seus mortos em covas, abertas na posição fletida (inclinada de um dos lados). Pigmentos vermelhos foram encontrados em algumas peças, indicando de que esse grupo fazia desenhos nas paredes rochosas.

Com o passar do tempo, esses grupos deixaram de ser nômades e suas aldeias começaram a ocupar grandes territórios e a incorporar novos padrões culturais.

Os sítios dos grupos de tradição Una são encontrados a céu aberto e em abrigos rochosos. Alguns dos abrigos pesquisados nesses locais indicaram terem tido diversos usos: como habitação e acampamentos, para cerimoniais relacionadas a enterros humanos e produção de arte rupestre.

Os vestígios deixados pelos Unas são objetos de cerâmica. São vasilhas de pequenas dimensões e formas simples, sem decoração e datam de um período que vai de 800 a 2400 anos atrás. E, pesquisas realizadas no vale de São Lourenço (MT) revelaram que eles sabiam cultivar séculos antes de fazer a primeira cerâmica.

Os sítios dos grupos de tradição Uru estão espalhados pelo Estado do Mato Grosso e se estendem até a região oeste de Goiás e centro-sul do Tocantins, locais aonde foram encontrados assadores de cerâmica, que é uma indicação de uso da mandioca tóxica.

As aldeias Uru dispunham suas casas na forma circular ou linear. Nas de formato circular existia, segundo os vestígios, uma praça central e no meio dela a “casa dos homens”. Para você ver como as tradições culturais sobrevivem ao tempo - a casa dos homens na praça central existe até hoje na tradição indígena dos grupos Bororo.

Nos sítios de algumas aldeias os arqueólogos encontraram materiais de grupos diferentes daqueles que ocuparam o local, como uma cerâmica Tupi-guarani e uma originária da região do Pantanal, situada a 200 km de distância. Por isso, acredita-se que as aldeias maiores exerciam papel centralizador das menores em sua volata.

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Saiba maissobre os povosUnasOs grupos ceramistas da tradição Una desapareceram ou foram absorvidos por outros grupos. Para os cientistas, esse possível desaparecimento e/ou absorção aconteceu por causa da expansão das grandes aldeias da tradição Uru, mas não se tem muita certeza sobre isso.

UrusAs Pesquisas revelaram que os sítios encontrados da tradição Uru são ocupações que ocorreram, pelo menos, até o século XVII. Eles tiveram grande influência no processo de formação histórica dos grupos indígenas Bororo que, até hoje, habitam a região centro-sul do Mato Grosso.

Tupi-guaranisOs grupos portadores de cerâmica Tupi-guarani deixaram poucos assentamentos, porém, foram os grupos mais presentes em toda a história da ocupação ceramista pré-colonial do Centro-Oeste. Faziam contato com outros grupos da região e os objetos cerâmicos eram parte de um constante fluxo de objetos e informações – e, ao que parece, não era tão comum naquela época em outras regiões.

Os grupos de tradição Tupi-guarani eram agricultores tradicionais e usavam o método da coivara, um método de cultivo em que cortavam a vegetação nativa, muitas vezes com machados de pedra, e depois queimavam tudo. Isso facilitava a limpeza do terreno, como contribuía para adubar o solo. Como era uma cultura em pequena quantidade e feita de forma rotativa, o solo não era usado até a sua exaustão. Era cultivada a mandioca doce (aipim) e a amarga (ou “brava”), o milho, a batata-doce, o algodão, o feijão, o amendoim, o abacaxi e o tabaco. Alguns produtos como o milho e a mandioca eram conservados inteiros ou após a sua transformação em farinha, garantindo assim o sustento das pessoas por vários meses. Ossos de fauna diversificada e de peixes são ainda encontrados em alguns sítios.

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A Arqueologia é uma ciência social que estuda o passado humano a partir dos vestígios materiais deixados pelos povos que habitaram a Terra. O arqueólogo é o especialista que busca interpretar sociedades que, na maioria das vezes, não existem mais, e também as do presente, a partir de vestígios materiais deixados.

As investigações do arqueólogo envolvem o diálogo com a comunidade e muitas pesquisas, destacando-se, entre elas, levantamentos de campo, escavação dos sítios encontrados, estudo das peças em laboratório e a divulgação dos resultados.

Saiba o que significa a palavra arqueologia.

A palavra “arqueologia” tem origem de duas palavras gregas, archaios e logos, e significa “estudo das coisas antigas”. Entretanto, nas últimas décadas, os arqueólogos passaram a estudar não apenas as sociedades do passado, mas também as do presente

Saiba como é feito o trabalho do arqueólogo.O trabalho do arqueólogo não é só a escavação. Antes de escavar é importante encontrar o sítio arqueológico. Portanto, primeiro, o arqueólogo define a região que será estudada, os temas da pesquisa e os métodos de investigação que vai utilizar. Esses métodos dependem do tipo de sítio escolhido pelo arqueólogo e sua equipe. Quando isto estiver resolvido, iniciam-se os trabalhos. As pistas, em geral, indicam o local do sítio arqueológico a partir da ajuda de várias ferramentas como, por exemplo, mapas, imagens de satélite, radares e até documentos escritos (se o sítio arqueológico escolhido for posterior à chegada dos europeus).

Este trabalho se chama prospecção. Você já ouviu essa palavra? Prospecção é a procura de sítios arqueológicos na área de pesquisa. Alguns vestígios materiais são vistos na superfície e é possível reconhecê-los, caminhando pelo local. Outra forma de encontrar os sítios arqueológicos é fazer sondagens, abrindo-se pequenos orifícios no solo com ferramentas adequadas para verificar se apresentam vestígios que indiquem a presença humana. Sondar

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significa procurar os vestígios materiais que se encontram enterrados no solo.

O que é cultura material?

Os arqueólogos chamam de cultura material todas as evidências físicas da existência de atividades humanas em determinados locais, tais como: os artefatos e seus restos de fabricação, estruturas habitacionais, enterramentos, manifestações artísticas, entre outros. Estes vestígios devem ser tratados enquanto documentos, vetores de informação que conduzem inicialmente às atividades cotidianas, mas que, em última análise, só podem ser entendidos na totalidade do sistema sócio cultural a que se relacionam.

Como é feita a escavação?

Vamos fazer um exercício de inferência? O que vem em sua mente quando lê a palavra escavação? Você pensa em fazer buracos? Se é isso que lhe veio a cabeça, você fez um raciocínio correto, pois no dicionário da língua portuguesa escavação significa cova, depressão, desaferro, desentulho, furo, socavão e vala. Mas, em arqueologia, o

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termo vai além de abrir uma cova: escavação é um sinônimo de investigação científica.

Para você ter uma idéia, há muito tempo atrás, antes da era cristã, os gregos e babilônios já se interessavam por arqueologia, pois escolhiam e colecionavam objetos antigos, criando os primeiros museus.

No final do século XIX, entre 1887 e 1898, um general do exército britânico, Augustus Pit Rivers, usou seus conhecimentos em métodos militares, organização de campo e manobra de terreno para realizar escavações. Ao invés de coletar somente peças de valor (como era o costume naquela época), ele coletou todos os objetos encontrados, registrando com precisão a posição de cada um deles no solo. Desenvolveu assim técnicas específicas de campo para a Arqueologia.

Até hoje, quando é realizada uma escavação arqueológica, tudo é feito com muito cuidado e cada objeto encontrado é registrado (com fichas de campo, desenhos e fotografias) para que, depois, se reconstruam as atividades que ali se realizavam.

Em geral, as técnicas de escavação são praticadas de

acordo com o que se pretende analisar. Assim:há escavações que buscam compreender as mudanças que ocorreram entre as diferentes ocupações humanas em uma determinada área, então a análise é voltada para o estudo da estratigrafia do solo, podendo, nesse caso, abrir trincheiras para “ler” as diferentes camadas. Os arqueólogos conhecem essa técnica como estratigrafia vertical; e, por outro lado, há estudos que buscam compreender as atividades realizadas no interior de um sítio arqueológico. Neste caso, é necessário escavar uma grande área para verificar como o espaço foi utilizado. Essa é a estratigrafia horizontal.

Apesar de existir dois tipos estratégicos de escavação, vertical e horizontal, muitos estudiosos da arqueologia combinam as duas.

A preservação dos sítios arqueológicos

Todos os sítios arqueológicos são protegidos por lei e é proibido destruí-los ou retirar seus objetos, pois a destruição completa ou parcial é considerada um crime contra o Patrimônio Nacional. Assim, caso um dia você encontre

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Você Sabia?um sítio arqueológico, pode, e muito, ajudar o arqueólogo na preservação dele. Veja como:em primeiro lugar, é muito importante não recolher e nem retirar os objetos, pois para a pesquisa arqueológica é fundamental conhecer o local em que os objetos foram encontrados;em segundo lugar, não cave, remova a terra ou retire a vegetação, não escreva ou desenhe sobre a arte rupestre encontrada nas lajes ou paredes de abrigos ou cavernas, e não jogue lixo na região; e,por fim, conte a um adulto sobre sua descoberta, para que ele possa avisar o órgão responsável pela preservação do sítio arqueológico.

O que é um sítio arqueológicoVocê se lembra do termo “vestígios materiais”? Então, sítio arqueológico é o local onde encontramos os vestígios materiais deixados pelos grupos humanos que passaram ou viveram por ali. Este local pode ter sido casa de alguém, como uma cabana de palha e madeira ou uma caverna. Pode, também, ter sido um cemitério, um lugar habitado por alguém durante pouco tempo para que pudesse caçar ou pintar paredes, um acampamento. Então, os sítios arqueológicos são variados e podem apresentar grandes diferenças entre si.

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Contexto arqueológicoLevantamento do campoTodas essas informações que você está conhecendo vieram das pesquisas realizadas durante o desenvolvimento do Programa de Prospecção e Resgate do Patrimônio Arqueológico da PCH Bocaiúva. Essas informações foram descobertas porque os arqueólogos fizeram as seguintes ações:inspecionaram o local da área do empreendimento, para reconhecer as suas características físico-ambientais e os padrões de ocupação humana atual e encontrar moradores antigos que pudessem fornecer dados sobre a presença de vestígios arqueológicos/ históricos na área; descobriram e identificaram possíveis vestígios em superfície; realizaram entrevistas com a comunidade, especialmente com os moradores mais antigos, para a identificação dos locais com presença de material arqueológico, ou mesmo com características ambientais favoráveis (abrigos de pedra, cachoeiras, fontes de matéria prima, entre outros) ; e, por fim, cadastraram cada local com vestígio arqueológico identificado, registrando a natureza, morfologia e estado de conservação de cada um deles.

Caracterização arqueológicada regiãoPor meio dos levantamentos arqueológicos realizados na área, que inclui a região da bacia do rio Cravari, foram identificados dois sítios chamados Bocaiúva 1 e Praia, além de 11 áreas de ocorrência arqueológica (locais com esparsos vestígios).

O Sítio Bocaiúva é um sítio cerâmico a céu aberto, localizado em área plana, próxima ao rio Bóia. Ao redor dele existe uma vegetação com grande quantidade de arbustos e também áreas de derrubadas, mata ciliar e porções com cerrado. O solo é arenoso, de coloração avermelhada. Este sítio está implantado em uma área plana próxima do rio Cravari, ficando fora da área diretamente afetada pelo empreendimento.

As áreas de ocorrência arqueológicas estão em locais diversos, sendo eles: a fazenda do Sr. Ademar, próximo ao Assentamento Tibagi; um Cemitério indígena localizado entre a Fazenda Rival e a Fazenda Floresta Negra. Essas fazendas foram compradas pelo Banco do Povo e será um novo assentamento. Foi encontrado também um Cemitério histórico, possivelmente relacionado à ocupação da área A

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por seringueiros e localizado próximo a atual sede da Associação de Moradores. Esses lugares foram indicados pelos moradores locais, tendo contribuído com a pesquisa o Sr. Zé da Brasília, morador da Vila Boa Esperança e o Sr. Márcio, o presidente da Associação dos Moradores do Assentamento.

Contexto históricoOs primórdios da ocupação

Você se lembra que os primeiros grupos indígenas a ocuparem o Brasil Central são chamados pela Arqueologia Brasileira de “Paleoíndios”. Os estudiosos calculam que ocuparam a região por volta de 27.000 (conforme datado em sítios como o abrigo Santa Elina) ou, até mesmo, 48.000 anos (conforme o sitio Boqueirão da Pedra Furada/PI). Como a data não é precisa, alguns pesquisadores questionam a teoria da chegada do homem nas Américas há 12.000 anos. Mas, várias são as ocupações humanas relacionadas ao final do período Pleistoceno e início do período Holoceno, que ocorreu por volta de 10.000 a 12.000 anos atrás. Esses grupos foram classificados como pertencendo a tradição Itaparica. Neste período, o clima e as formações vegetais (floresta amazônica, os

cerrados do planalto central, a mata atlântica, etc.) foram se estabilizando e adquirindo as feições atuais.

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Assim, com o clima e a vegetação se estabilizando, favoreceu-se o surgimento de novos grupos, que se estabeleceram em locais a céu aberto, embora tenham ocupado também abrigos rochosos. Eles se organizavam em pequenos grupos, compostos provavelmente por algumas famílias, que se deslocavam pelo espaço ocupando um território difícil de se mapear. Entre 7.000 e 9.000 anos atrás, quando a instabilidade climática se definiu, o ambiente ficou mais quente e úmido, gerando a expansão da vegetação de mata e favorecendo a adaptação de diversos grupos humanos dispersos pelo vasto território brasileiro aos ambientes em que viviam. Essa adaptação gerou a permanência e o início da criação de características culturais regionais.

Os grupos de tradição Serranópolis tinham conhecimentos tecnológicos mais simples do que os grupos anteriores e expandiram-se ao longo do tempo. Habitavam abrigos rochosos ou a céu aberto, localizados geralmente em porções altas de relevo como os altos vales do Paranaíba, Sucuriú, Araguaia e São Lourenço, os altos/médios vales do Tocantins e Paraná, além das regiões de Caiapônia (BA) e na Chapada dos Parecis (MT).

Há aproximadamente 2.500 anos, o cenário arqueológico do Brasil Centro-Oeste mudou porque nesse período iniciou-se uma nova ocupação do território por grupos pertencentes à tradição Una, que eram hábeis na caça, coleta de frutos e ervas medicinais e que praticava atividades agrícolas rudimentar e pouco desenvolvida.

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Você Sabia?

Os sítios da tradição Una tinham tamanho reduzido e ocorriam quase sempre em abrigos, em regiões altas de relevo e vegetação de cerrado. Eles existiram até o século XII, o que indica que seus habitantes conviveram durante quase 400 anos com as grandes aldeias circulares. Esta convivência pode ter sido favorecida (embora não explicada) pelas diferenças entre eles. Se olharmos para a localização de seus sítios, notamos que eles não tinham como e nem porque competirem entre si. Isto porque os grupos ceramistas da tradição Una preferiam abrigos, enquanto os agricultores das grandes aldeias moravam nas porções de relevo suave, com solos mais férteis e cobertura vegetal, floresta e áreas mais propícias à agricultura.

A região Centro-Oeste, a partir do século VIII-IX, foi ocupada pelos grupos ceramistas. Eles eram construtores de aldeias circulares e pertenciam a duas tradições distintas: a Aratu e a Uru.

As primeiras aldeias que apareceram eram de tradição Aratu e se espalharam por todo o Estado de Goiás, subindo pelo menos até o médio vale do Tocantins, estendendo-se também para o norte de São Paulo até o nordeste brasileiro, alcançando inclusive a faixa do litoral. Ao contrário dos grupos que antes se encontravam no Brasil Central (os

caçadores-coletores e os ceramistas cultivadores), estes agricultores se espalharam por um território extenso e contínuo, dominando-o em aproximadamente 200 anos. Mas, desapareceram do cenário regional por volta do século XV.

Da importância dasondas migratóriasAté há pouco tempo atrás, muitos cientistas acreditavam que os habitantes iniciais das Américas foram resultados de ondas de deslocamentos humanos. Assim, grupos de populações asiáticas teriam dado origem aos chamados povos Na-Dene, que ocuparam a porção noroeste da América do Norte, e, outra, originada dos Esquimós.

Mas, depois de estudos recentes em um esqueleto de ser humano encontrado pelo arqueólogo Walter Neves, em Minas Gerais, descobriu-se que os povos da América apresentam traços físico-antropológicos mais parecidos com os de grupos que habitaram a África e a Austrália. Isso indica a possibilidade de ter ocorrido uma outra onda migratória em direção à América. Desta vez, por grupos da Ásia Central, que provavelmente descendiam diretamente dos primeiros seres humanos modernos que para lá se foram, partindo da África, possivelmente há mais de 40.000 anos atrás.

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Quanto aos grupos de tradição Uru, no início, ocuparam uma área diferente espalhando-se por todo o centro-sul do Estado do Mato Grosso, tendo como limite o rio Araguaia. Suas aldeias eram pequenas e se encontravam em áreas de cerrado. As disposições das casas podiam ser circulares, como as da tradição Aratu, ou linear com fileiras duplas de casas se estendendo na margem de rios.

As pesquisas realizadas no vale do rio Vermelho (MT) indicam que a partir do século XII pode ter havido um considerável aumento da população ceramista. Para você ter uma idéia, nesse período, os cálculos demográficos indicam que as aldeias reuniam até 3.000 indivíduos e de 800 nos períodos anteriores.

Por volta do século IX, esses grupos se expandiram em direção ao leste, no vale do rio Araguaia, onde surgiram aldeias diferentes. O material cerâmico encontrado nessa região mistura as características observadas nos artesanatos Uru e Aratu, o que levou os cientistas a acreditar que houve um forte processo de interação cultural.

A região Centro-Oeste brasileira foi ocupada por outro grupo ceramista, classificado na tradição Tupi-guarani. Estudiosos acreditam que grupo originou-se na Amazônia

Central, próximo à desembocadura do rio Madeira e de lá passou para outras regiões, após se dividir, deslocando-se no sentido norte-sul, desde o ano 100 d.C. O primeiro grupo (relacionado a tradição tupi-guarani) teria seguido a rota rio acima pelo Madeira e Guaporé, percorrendo o Paraguai e o Paraná. Subiram ao longo da costa até certa distância ao norte. O segundo grupo (relacionado a grupos de tradição Tupinambá) teria seguido em direção ao nordeste por volta do ano 500 d.C., descendo pela faixa litorânea até se encontrar com os primeiros ao sul de São Paulo.

Os assentamentos indígenas do Mato Grosso do Sul estariam relacionados à primeira grande expansão, e os grupos de tradição Tupi-guaranis souberam aproveitar os rios locais.

Em resumo, a ocupação humana da região centro-oeste brasileira aconteceu de forma contínua desde há 25.000 anos atrás, com a participação de grupos humanos diversos e com padrões culturais bastante distintos entre si. E, quando os colonizadores europeus chegaram no Brasil, encontraram a área densamente povoada por populações indígenas.

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O histórico da regiãoImagino que você conheça a história da região do Mato Grosso e saiba como se deu o avanço da colonização portuguesa em direção ao interior do Brasil. Mas, vamos lembrar um pouco dessa parte da história nacional e, quem sabe, isso vai ampliar um pouco mais seus conhecimentos.A expansão territorial ocorreu no final do século XVI, quando as bandeiras paulistas de André Leão e Nicolau Barreto, explorando o vale do Paraíba do Sul e as terras além da Serra de Mantiqueira, iniciaram o movimento Bandeirante. Entre 1600 e 1620, diversas bandeiras partiram do planalto de Piratininga (hoje, São Paulo) em direção ao interior brasileiro. Elas buscavam duas mercadorias muito valiosas no comércio mercantilista: os metais preciosos e os indígenas, que eram aprisionados e vendidos como escravos aos engenhos de cana-de-açúcar.

A partir de 1670, essa atividade de captura e escravização do indígena diminuiu porque com a expulsão dos holandeses do nordeste brasileiro, o tráfico negreiro voltou a ser lucrativo para a Coroa portuguesa – pois era um negócio triangular: do Brasil, o açúcar produzido ia para a Portugal e Europa; o ouro e pedras preciosas, também, mas parte era usado para adquirir escravos em mercados

situados na costa da África. O fumo e cachaça brasileiros também faziam parte desse negócio que se chamava de escambo. O índio, assim, como mercadoria no sistema colonial português, passou a não ter significado importante.

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No início da colonização, os portugueses enfrentaram algumas dificuldades, mas, depois dos primeiros anos de desbravamento ocorreu o princípio do processo de urbanização e administração, com a visita a Cuiabá em 1726, de Rodrigo Cezar de Menezes, que era Capitão-General e Governador da Capitania de São Paulo.

No final do século XVIII, época em que o Brasil era ainda colônia de Portugal, houve o fim do “Ciclo do Ouro”, afetando a economia brasileira, inclusive o comércio cuiabano que também ficou menor. Por sua vez, todas as pessoas que viviam do fluxo comercial para a região mato-grossense, sentiram as mudanças e os tempos mais difíceis.

Nessa época, a forma característica de levar mercadorias do litoral para o interior brasileiro, eram as monções. Era um sistema comercial organizado, e muitos bandeirantes ficaram famosos por isso. Partindo principalmente da Capitania de São Paulo, levando junto pessoas de várias origens, chegavam aos locais desejados pelos rios e iam fazendo negócios nos povoados que encontravam pelo caminho. Muitos acabavam se fixando em locais de maior fluxo, formando famílias e povoados, dando origem a muitas das atuais cidades em vários recantos do Brasil.

Os moradores da região (nos atuais estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul), com a decadência das monções, começaram a passar dificuldades por não mais receber os produtos de que necessitavam, sendo obrigados a produzir seus próprios alimentos. É o que chamamos de agricultura de subsistência, uma pequena produção familiar em que se planta e se cria um pouco de cada coisa – e isso não era um hábito antes.

Fonte: http://www.jptl.com.br/adm/arquivos/d97db7509f3510106f6067ec03107895.jpg

Fonte: http://2.bp.blogspot.com/_A9dvZRoCUr0/TEJcV1867jI/AAAAAAAABWw/D-xKaSndj4w/s1600/agriculturaurbana_400.jpg

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Em 1870, a estagnação econômica começou a mudar com o fim da Guerra do Paraguai, pois embora o movimento das tropas do exército na região mato-grossense de algum modo havia estimulado os negócios locais, somente depois, por volta de 1884, quando começou a extração do látex da seringueira e da poaia na Capitania. Com o aumento da nova atividade, o povoado de Diamantino foi o mais beneficiado por estar localizado próximo à área mais rica em seringais, e as vias fluviais que davam acesso à foz do rio da Prata eram portanto muito importantes, pois permitiam e facilitavam a ligação entre o interior e o litoral, principalmente para as áreas de exploração que estavam às margens do rio Tapajós.

Mas, o ciclo da borracha não durou muito. No início deste século, o Brasil não era mais o principal fornecedor de látex no mundo. Mudas de plantas levadas clandestinamente para a Ásia, principalmente para a Malásia, ajudaram a formar imensos seringais – e isso reduziu muito o preço do produto, levando a falências muitos negócios e dificuldades aos seringueiros.

Além da extração da borracha, no início do século XX, o Mato Grosso passou por outro fato histórico significativo, quando começaram as atividades da Comissão Rondon.

Essa comissão era liderada pelo Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, um importante sertanista brasileiro de origem indígena por parte de bisavós (os da parte materna eram da tradição Bororo e Terena, e da paterna, Guaná). A missão Rondon divulgava que seu objetivo era implantar uma linha telegráfica que ligasse Cuiabá a Santo Antonio do Madeira, bem no ponto inicial de construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré. Mas, na realidade, era uma estratégia do governo brasileiro para ocupar definitivamente territórios ainda pouco conhecidos. Para tanto, foram realizadas pesquisas de reconhecimento geográfico, botânico e mineralógico da área, além de documentar as populações indígenas que existissem.

Posteriormente, as populações indígenas contatadas por Rondon ficaram “sob os cuidados” da Comissão Rondon e muitas crianças foram forçosamente separadas de seus pais e lhes imposta um tipo de educação semelhante às dadas em escolas públicas estaduais.

Nessas escolas, proibiu-se o ensino de suas línguas nativas e também impedido que as crianças frequentassem as moradias de seus pais. Muitos grupos indígenas sofreram com as medidas de Rondon, pois separavam pessoas de uma mesma etnia, em assentamentos com

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locais diferentes. O resultado disso foi a desintegração das culturas indígenas locais e isso é uma das raízes dos problemas de exclusão social.

Há situações passadas muito trágicas e não fáceis de se esquecer. Houve muitos casos de dizimação de aldeias indígenas inteiras vitimadas por epidemias de gripe, que eram fatais a eles. Contribuíram, também para tantas mortes, a disseminação de doenças não existentes ou raras entre indígenas, que foram trazidas pelos colonizadores, o que resultou em uma grande quantidade de crianças órfãs, que se tornaram vítimas fáceis ou dependentes da ajuda de outros, e, a Comissão Rondon agiu como falado.

Em 1929, foi criada a Prelazia de Diamantino, com finalidade missionário-jesuítica. Um posto da Missão foi instalado e funcionou até 1945 entre os Nambikwara, depois mudou-se para Utiariti, local de acesso mais fácil e onde havia instalações deixadas por Rondon.

Em 1946, Utiariti tornou-se um Centro Educacional, sob a direção da Missão Anchieta, onde estudavam índios das etnias Irantxe, Paresí e Nambikwara em regime de internato. Nesse local, a cultura dos índios era desrespeitada constantemente. Mas, em 1960, quando ocorreu o Concílio Vaticano II, na Itália, foi determinado

que as atividades desenvolvidas em internatos da igreja católica respeitassem os valores culturais indígenas, desde que estes não se chocassem com os valores religiosos da igreja católica. Porém, somente em 1966, a Missão Anchieta passou a ter uma preocupação maior com a herança étnica e a língua nativa dos índios. Nessa época, ocorreram também o contato dos índios da região do Mato Grosso com missões de grupos religiosos protestantes.

Em 1968, o internato da Prelazia de Diamantino foi extinto e os índios que viviam ali voltaram para suas aldeias de origem. Índios das etnias Irantxes, Rikbaktsas,

Coronel Rondon com officiaes da C. L. T. E - Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas - Comissão Rondon

Serra dos Cidezal, Rio Juruena

Serra dos Cidezal, Rio Formigas: Passagem em Pelotas

Serra dos Cidezal: Rio Papagaio C.L.T.E- Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas - Comissão Rondon

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Nambikwaras e Parecís que haviam sido internados tiveram dificuldades para se adaptar à vida na aldeia, pois passaram muito tempo afastados de seus pais, parentes e amigos, ou seja, longe de seu meio social e cultural criando uma crise pessoal – ficando difícil responder à pergunta: afinal, sou “índio ou um não índio?”

A região do Mato Grosso se desenvolveu sempre com muita luta para superar as dificuldades postas pela própria natureza e a falta de acessos. Entre os anos de 1978 e 1980, com a ajuda do governo estadual e federal, em Mato Grosso teve início uma nova expansão da sua pecuária, atividade que teve apoio da SUDAM (Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia), que oferecia incentivos para tanto. Os benefícios dados pela SUDAM também favoreceram, a partir de 1967, o desenvolvimento de um novo projeto agropecuário em uma grande área pertencente a um grupo econômico chamado Casas Anglo-Brasileiras, que tinha sede em São Paulo, o que resultou no crescimento da ocupação da região. Tempos depois, parte dessa área foi vendida para a Colonizadora Brasnorte, uma empresa de Nelson Vitorelo, que vendia lotes urbanos e rurais. Os primeiros migrantes vieram do Oeste do Paraná, uma região que fora inundada pelas águas do rio Paraná, por ocasião do fechamento das comportas da

Usina de Itaipu, uma das maiores do mundo, construída no rio Paraná, na divisa entre o Brasil e o Paraguai. O bairro Brasnorte tornou-se distrito do Município de Diamantino, e foi criado em 4 de novembro de 1980. O Distrito cresceu e a comunidade residente mais uma vez se uniu para conquistar a sua emancipação política, que aconteceu em 5 de setembro de 1986.

Com a evolução dessa nova ocupação do território, foi oficialmente criado o Município de Brasnorte. As primeiras eleições foram realizadas em 16 de abril de 1989, ocasião em que a população escolheu seu primeiro prefeito, vice-prefeito e vereadores, que tomaram posse de seu cargos em 1° de junho de 1989, data escolhida para a comemoração do aniversário do Município.

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Fich

a Té

cnic

a Programa de Prospecção e Resgate do Patrimônio Arqueológico da PCH Bocaiúva / MT

Equipe DOCUMENTO Ltda.

Coordenação GeralL.D. Dra. Erika Marion Robrahn-González Patrimônio Arqueológico, Histórico e CulturalMs. José Roberto PelliniMs. Luydy Abraham FernandesMs. Rodrigo SilvaMs. Francisco PugliesiMs. Danilo AssunçãoEduardo BespalezJob LoboCristiano FuinPaulo Afonso Vieira Cartilha PatrimonialRaquel Honorato da SilvaCássia Belini de Almeida Silvia CiprianoHealthy Hobashi

Marketing e Produtos MultimídiaPriscilla Rosa de CarvalhoLiriana Aline BorgesSuzana Cristina BugianiEduardo Staudt de Oliveira Projeto Gráfico e DiagramaçãoLucas Pedro dos Santos José Luiz de Magalhães Castro Neto

FotosPara fins de Projeto Científico, Portaria Nº 113 de 7 de Junho de 2004 e Portaria Nº 75 de 30 de Março de 2006 conforme Diário Oficial da União. Acervo Documento Ltda. e demais fontes caracterizadas.

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Contato: DOCUMENTO Patrimônio Cultural, Arqueologia e Antropologia Ltda.

E-mails: [email protected] Skype: doc.atendimento

Correspondência: Caixa Postal 822, Cotia / SP.

CEP: 06709-970

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Empreendedor: Gestão Ambiental: Desenvolvimento: Apoio Institucional:

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