Cartilha da Policia Penal

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4 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 5

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

1.a CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Eixo Temático N.o 6PRINCÍPIOS E DIRETRIZES

1.o PRINCÍPIO:

CIVILIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL

DIRETRIZES

a) Desenvolver programas e projetos que assegurem efetividade na ressocialização, no amparo ao egresso e no resguardo de familiares dos diversos atores.

b) Estimular a participação da sociedade civil em projetos e programas com repercussão na reintegração social.

c) Incrementar, junto aos órgãos próprios, programas de aplicação de penas alternativas.

2.o PRINCÍPIO:

RECONHECIMENTO CONSTITUCIONAL DA POLÍCIA PENAL

DIRETRIZES:

a) Implementar esforços visando a promulgação da PEC-308.

b) Profissionalizar a Administração Prisional.

c) Aprimorar a interação da Administração Prisional com os demais órgãos do Sistema de Defesa Social.

SUMÁRIO

Apresentação .......................................... 07

Introdução ............................................. 11

Nosso mundo inseguro ..............................15

A Polícia Penal ........................................ 29

Princípios e Diretrizes ..............................41

Conclusão .............................................. 43

Bibliografia ............................................ 48

SUMÁRIO

Apresentação .......................................... 07

Introdução ............................................. 11

Nosso mundo inseguro ..............................15

A Polícia Penal ........................................ 29

Princípios e Diretrizes ..............................41

Conclusão .............................................. 43

Bibliografia ............................................ 48

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 7

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

APRESENTAÇÃO

Com muita satisfação, a Federação Brasileira dos Servido-res Penitenciários (FEBRASPEN) vem manifestar seu entendi-mento de que é extremamente oportuna a iniciativa de realiza-ção da 1.a Conferência Nacional de Segurança Pública.

Pela leitura de seu texto-base, refulge uma inusitada expecta-tiva de que, fi nalmente, atos preocupantes e fatos angustiantes, que afetam a harmonia e a paz sociais, estarão sendo discutidos e analisados sob a ótica do interesse social, com protagonismo de representantes de expressivos segmentos da sociedade bra-sileira, civil e política. Certamente, emergirá uma efetiva política de Estado – sucedida por judiciosa estratégia – em substitui-ção a políticas de Governo e de partido, que se mostraram, até aqui, impróprias para mitigar a ameaça-matriz de insegurança em nosso país: a violência, bipartida em violência da exclusão social e violência da criminalidade.

É com muita esperança que estaremos participando desse inédito trabalho. Pretendemos oferecer nossa contribuição em duas frentes: uma, genérica, trazendo subsídios inovadores, não dogmáticos, para a discussão maior sobre a (in)segurança pública (social); outra, específi ca, para que a Administração Prisional seja mais bem entendida, respeitada e valorizada. Mais profi ssional e, decerto, mais produtiva.

Pretende-se discutir a inexistência de um estável sistema penitenciário, apontando a realidade de vários órgãos e enti-dades estanques, alguns até realizando ótimos trabalhos, ain-da que isoladamente. E expor que, ao contrário de corrente lugar-comum, o chamado Sistema Penitenciário não está fali-do. Está preterido, desconsiderado, desarrumado, relegado.

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EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 9

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

É cristalino que a atual combinação desagrada apenados, profi ssionais da área e sociedade. Os primeiros reclamam, às vezes sem muito eco – que não signifi ca sem razão – de con-dições subumanas de instalações e de tratamento e, para que a mídia mostre à sociedade eventuais abandono e degradação localizados, promovem rebeliões. Já, nós, que operacionaliza-mos a Lei de Execuções Penais (LEP), via custódia e ressocia-lização, clamamos que passa do suportável a incúria do poder público, observada na postergação de quadros profi ssionais, na negligência que envolve o preparo técnico e no desprovi-mento logístico. A sociedade, tensa e angustiada, é mais outra vítima da desídia, que tende a desaparecer valorizando-se o órgão encarregado das custódia, ressocialização e – inovando – da fi scalização de decisões judiciais (medidas de segurança, penas alternativas). Isso deve começar pela profi ssionalização da instituição, pelo profi ssionalismo de seus integrantes e pela modernização tecnológica.

Por oportuno, é interessante ressaltar que alguns Estados começam a perceber a tremenda vulnerabilidade que o arre-medo de uma atividade prisional, amadora, pode provocar.

Lamentavelmente, o trabalho de reintegração de presos ao pleno convívio social, realizado em estabelecimentos penais brasileiros, com honrosas exceções, é, sabidamente, de má qualidade. Quando existe!...

A população brasileira já tem constatado que não há bons resultados, muito menos produtividade, em decorrência de tíbia política de reinserção social. E o Estado de hoje, que vê o barco dar água, hesitava em pagar a conta da imprevi-dência, do descaso do Estado de ontem.

Felizmente, a julgar pelo texto-base da 1.a Conferência Na-cional de Segurança Pública, os tempos são outros.

É de se predizer que a concretização de uma democrática e humana política prisional há de ser vista em um sistema de administração prisional que priorize o trabalho profi ssio-nalizante do preso, sua educação formal, o tratamento de dependentes químicos, cuidados com a família dos presos e com o egresso, acompanhamento das penas alternativas, de livramentos condicionais, de penas restritivas de direi-to, medidas de segurança e tratamento ambulatorial. Uma política prisional catalisadora de aspirações e de anseios sociais, uma administração prisional que compatibilize se-gurança, reajustamento e readaptação, onde o cumprimen-to integral da pena seja um objetivo, mas, a reintegração social seja o fi m.

A FEBRASPEN pode e quer dar seu contributo, em razão de experiência adquirida e conhecimentos consolidados. Via abordagem genérica, deseja apresentar seus pontos de vista sobre a (in)segurança, e, sobre a Administração Prisional, através de considerações específicas. Tem a convicção de que seus filiados, em razão de singelo ama-dorismo que tem evoluído para entusiástico profissionalis-mo ao longo dos anos, podem auxiliar no entendimento doutrinário de instigante e angustiante tema. Em paralelo, tem a certeza de que, trabalhando ao final do ciclo de Polí-cia, podem concorrer para a tranqüilidade social.

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INTRODUÇÃO

Cada um a seu modo, os brasileiros vêm sofrendo com a violência, ensejando que, em alguns locais e em algumas co-munidades, a vida passe a ser vivida em permanente afl ição. O localizado desassossego de moradores de guetos e favelas já está pulverizado nas ruas e avenidas do asfalto; o que era peculiar a grandes cidades está presente na quase totalidade das cidades brasileiras; as mazelas e as contradições sociais metropolitanas alastram-se endemicamente para o interior.

Verifi ca-se, ultimamente, muita movimentação em torno dessas duas vertentes da violência. Conseqüência, por certo, do sentimento e do clamor de que algo tem de ser feito (deve-ria ter sido feito) para se evitar o agravamento da má qualidade de vida, que atingiu alguns e tende a afetar todos.

A sociedade política, historicamente preocupada com a causalidade, com “o quê” está ocorrendo, está ocupada com “o por quê” está acontecendo, em identifi car causas e efeitos. A percepção de que a violência é menos um problema policial que um grave e complexo problema social tem ganhado es-paço, juntamente com o entendimento de que a violência da criminalidade é irmã siamesa da violência da exclusão social.

Ambas somente serão minimizadas mediante predominân-cia de ações simultâneas, proativas, equilibradas e sistêmicas. Signifi ca dizer, portanto, que é incorreto priorizar unilateral-mente a contenção (prevenção e repressão) criminal em detri-mento da inserção (ou da reinserção) social e vice-versa.

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EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 13

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Nas três esferas do Estado, nos três poderes, na socie-dade civil, enfim, na nação brasileira, há um sentimento coletivo e uma vontade unânime de que essas violências sejam reduzidas a patamares toleravelmente aceitos. Inú-meras comunidades acadêmicas e científicas têm pesqui-sado exaustivamente o tema; empresas públicas e priva-das se engajam no esforço da responsabilidade social; ministérios, secretarias estaduais e municipais, autarquias apresentam uma idéia, um programa, um projeto, uma pro-posta; clubes de serviço, ONG’s, comunidades diversas mobilizam-se. Junte-se a premissa básica de que há sufi-ciente recurso financeiro para pesquisas, projetos, fóruns, ações concretas, enfim, para discutir e operacionalizar ve-lozmente alternativas de solução, que se mostrem adequa-das, exeqüíveis e aceitáveis.

Se há um desejo nacional de mitigar a violência, factíveis alternativas e recursos para implementá-las, por que essa ameaça nos afl ige, cada vez mais? Porque, em maioria, as ameaças são controláveis, mas, nem sempre são controla-das; há muita notícia, pouca informação; muita comissão, pouco plano; muito planejamento, pouco fazimento; muita concepção, pouca execução; muita teoria, pouca prática; muita resignação, pouca indignação; doloroso clamor sazo-nal, solução paliativa pontual.

Fundamentalmente, falta coordenação inteligente das ativi-dades de defesa da sociedade na União, nos Estados e nos Municípios. Falta interação! Falta sistematização, falta siner-gia, falta gestão! Falta efetividade! Afi nal, como a violência é multifacetada, exige, na defi nição e tratamento dessa síndro-me, mais que o comprometimento de profi ssionais de seguran-ça pública.

Exige, e é extremamente importante, o envolvimento con-comitante e convergente de operadores de direito, médicos, educadores, assistentes sociais, psicólogos, comunicadores, sociólogos, fi lósofos, pesquisadores, arquitetos, urbanistas, engenheiros, administradores, religiosos, sindicalistas, políti-cos, militares, trabalhadores em geral, empresários, por fi m, de tantos quantos queiram e possam auxiliar na montagem do quadro da violência e na fi xação de prioridades e responsabili-dades de solução a curto, médio e longo prazos. Objetivamen-te, esse é um dos propósitos da Conferência.

E a FEBRASPEN se rejubila por isso!

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

NOSSO MUNDO INSEGURO

O brasileiro está entendendo a insegurança. Compreendeu que ela está na terra, no mar, no ar, está em qualquer lugar. Não apenas do Brasil, mas, do mundo!

Com a descoberta, está sofrendo mais, está padecendo de um mal moderno: a síndrome de insegurança social. Um fan-tasma que o sobressalta, que o ataca de imprevisto, que o estressa, que o debilita física, emocional e fi nanceiramente. Quando e como ele será a próxima vítima de crime, de desas-tre, de interrupção de serviços essenciais ou de qualquer outra desídia ou desarranjo social que põe em xeque a preservação e a perpetuação da espécie humana ou que perturba a vida social?

Por outro lado, terá sido essa síndrome, essa sensação de ser a próxima vítima que o tem levado a compreender a insegurança, a reconhecer que o ambiente de segurança é uma utopia e, para se alcançar o estágio de tranqüilidade social, temos de atuar sobre as vulnerabilidades que in-fluem no ambiente de insegurança social?

Enigma à parte, fato concreto é que a sociedade brasi-leira está sofrendo muito com a insegurança real e padece demais com a sensação de insegurança, porque as amea-ças apresentam matizes e formas que se multiplicam, ainda que previsíveis.

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EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 17

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Quais atitudes, que providências efetivas, nas esferas par-ticular e governamental, estão sendo tomadas para que se sofra menos, para que nossos fi lhos e netos tenham melhor qualidade de vida? Verifi ca-se que, instalada uma ameaça, as pessoas têm optado por uma ruidosa mas efêmera manifes-tação sazonal de revolta. Porém, constata-se que, logo, logo, a indignação é trocada pela resignação, até o surgimento de nova ameaça, num ciclo vicioso respingado de dor e angústia, que não gera soluções e que vêm alterando, para pior, o nosso exacerbado ambiente.

Observa-se que volumosos clamores não têm sido atendidos, em maioria. É que são dirigidos a instituições e órgãos que não têm a necessária capacidade de absorvê-los ou a competência legal para solucioná-los. São reclamações certas, feitas, porém, em lugares errados. Então, uma situação grave: à medida que a violência aumenta, também se banaliza.

Pessoas passam a não acreditar na efi cácia de programas ofi ciais, nem confi am na capacidade de as autoridades rever-terem o quadro, que se agrava mais e mais. Há, somente, cobranças eventuais, pontuais, isoladas, não mais que isso. Movimentos coletivos, organizados, não têm obtido grandes êxitos em suas cruzadas. Provavelmente, a causa de insuces-sos no enfrentamento a essa chaga social esteja no equívo-co do foco. Verdadeiramente, a questão da violência no Brasil não está muito bem focada.

Até bem pouco, era comum serem feitas abordagens sobre aspectos relacionados à “segurança”, como se fora, dogmatica-mente, um produto contraposto a uma ameaça. Daí, expressões em que a palavra “segurança” é usada no sentido de signifi car “estar protegido, ser defendido contra ameaças”.

A partir do momento em que a discussão desse tema foi intensifi cada, constatou-se a necessidade de se entender e de se conceituar novos fatores intervenientes, com destaque para ameaça, proteção e defesa.

Grosso modo, ameaça é tudo aquilo que pode afetar nega-tivamente a preservação e/ou a perpetuação da espécie hu-mana, seja de origem física (riscos e perigos), seja de origem psicológica (receios e medos).

Já a proteção é caracterizada por anteparos (vistos em con-junto ou individualmente) colocados diante das ameaças, com destaque para instrumentos como a família, a religião, a edu-cação, a economia, o Estado.

Quanto à defesa, pode-se dizer que se refere à operaciona-lização da proteção, através de mecanismos de salvaguarda e de progressão sociais.

Todo esforço que vise a minimização, estabilização ou elimina-ção de ameaças é um mecanismo de defesa praticado por um ins-trumento de proteção, na busca do utópico ambiente de seguran-ça. É, na prática, um redutor de vulnerabilidades por onde fl uem as ameaças. Dessa forma, a nós nos parece equivocada a colocação de que determinados trabalhos são realizados visando a aumentar-se a segurança. Trabalha-se para a redução de vulnerabilidades no ambiente de insegurança em que a vida é vivida.

Para fazer face às ameaças, não se produz segurança. Utilizam-se, sim, instrumentos de proteção, que aplicam me-canismos de defesa, que mitigam as ameaças em nosso am-biente de insegurança.

Assim, já não se tem como certo que segurança é algo que se faz, que se dá, que se realiza.

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EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 19

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Segurança, então, seria um ambiente resultante de uma situação simultânea em que, objetivamente, todas as ame-aças à preservação e à perpetuação da espécie humana estão sob absoluto controle e, subjetivamente, existe a fir-me convicção, a crença de que efetivamente estão contro-ladas.

Signifi ca dizer que deve haver concomitância da proteção objetiva (efetivo controle de todas as ameaças) e da prote-ção subjetiva (crença na ausência de ameaças). Pode pa-recer chocante, num primeiro momento, porém, ratifi ca-se, fi ca evidente que o ambiente de segurança é uma utopia, ainda que deva ser perseguida permanentemente.

Observa-se que, ultimamente, a discussão vem girando em torno da “insegurança” – o que nos parece absolutamente cor-reto – visto que o ambiente que nos cerca é, e sempre foi, de insegurança, porque as ameaças estão sob precário controle e há percepção disso, ou porque as ameaças, objetivamente, estão sob relativo controle, mas, não há a crença subjetiva, concomitantemente, e vice-versa.

Cada país tem uma ameaça específi ca que mais o fusti-ga, que mais afeta a serenidade e a confi ança de seu povo. Constitui o que se convencionou chamar, aqui, de raiz ou ma-triz de insegurança, podendo ser o terrorismo, a fome, a mi-séria, a violência, a AIDS, o ebola, um vulcão, dentre outras. Lembre-se que, na sociedade brasileira, as raízes da insegu-rança estão bipartidas na violência da exclusão social e na criminalidade violenta. A exclusão está presente nas carên-cias de assistência social, moradia e remuneração dignas, na inacessibilidade a serviços médico-hospitalares, na fome, na miséria, no analfabetismo, na deseducação, no desemprego, na desocupação, na concentração de renda.

Infira-se que o Estado, através de órgãos específicos, está permanentemente desenvolvendo esforços, visando a instalação de um clima de convivência harmoniosa e pa-cífica.

Para tanto, realiza trabalhos de inserção social (prepara-ção para o convívio social) e reinserção social (correção de desvios). A reinserção social abrange atividades destinadas a minimizar ou eliminar situações que levam um grande contin-gente a viver à margem social. Esse contingente é represen-tado pelos marginalizados e por marginais. Marginalizados são indivíduos à margem dos direitos sociais e todo traba-lho, de que são destinatários, tem como foco o moral e visa a reinclusão social. Marginais são indivíduos à margem de deveres sociais e o trabalho realizado com eles e para eles, pela sociedade política ou pela sociedade civil organizada, ou por comunidades isoladas, tem como foco a Moral e visa a reintegração social.

Tende-se a um consenso de que o intranqüilizador quadro da exclusão social, que agrava o fenômeno da marginalização, é um dos vetores da marginalidade. Uma das razões seria a distopia social ou funcionamento anômalo de órgãos de pro-teção social, com destaque para os vinculados à educação, verdadeiro calcanhar de Aquiles.

A afi rmação de que vivemos em um ambiente de inseguran-ça não visa trazer inquietações ou aumentar angústias, ansie-dades, tensões, mas, ao inverso, aplacá-las, trazendo ajuda para a exata compreensão desse tão real quanto tormentoso fenômeno social.

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Essa assertiva tem sustentação no fato de que é de todo impossível a contenção plena, o controle absoluto de todas as ameaças (as adversidades, os antagonismos, as pressões), em virtude do inopinado (tempo) e do imponderável (espaço) que as cercam. Predominam incertezas, mínimas que sejam, quanto às circunstâncias de sua ocorrência (local, época, for-ma, freqüência, intensidade).

Então – pode surgir a pergunta – como viver em um reco-nhecido ambiente de insegurança? De duas maneiras: de for-ma sensata, acreditando estarem as ameaças sob o controle possível ou exigindo que assim o seja, sem histerismos, ado-tando uma postura de autocontrole, que decorre da sensação de segurança (sentimento de que se está em um ambiente de segurança, no qual se está totalmente protegido contra as ameaças, conforme o que é possível e tolerável), que se ini-cia com a prática de cuidados mínimos, de responsabilidade individual; a segunda seria viver de forma insensata, onde pre-dominam atitudes irracionais, tornando-se, algumas pessoas, presas da síndrome de insegurança (não usa carro, não vai a Nova York, não sai de casa).

Manifestações dessas ameaças são vistas e sentidas através da brutalidade do homem contra a natureza, e vice-versa, e do homem contra o próprio homem, sempre na razão direta da constatação de inexistência (ausência), insufi ciência (baixa quantidade), inefi ciência (inadequação) defi ciência (bai-xa qualidade) dos instrumentos e dos mecanismos de defesa.

Acredita-se que somente através do fortalecimento dos ins-trumentos de proteção, ao qual se segue uma diligente apli-cação dos mecanismos de defesa, é que as ameaças estarão relativamente bem controladas.

Sobre a proteção social, lembre-se que, desde a pré-histó-ria, o homem sentiu que, sozinho, era impotente para enfren-tar as ameaças à preservação e perpetuação de sua espécie. Agrupou-se, dando origem a famílias, clãs, tribos, comunidades, sociedades e, fi nalmente, ao Estado. Este, portanto, teria sua origem ligada à necessidade de prover a proteção do ambiente social e promover, de forma suplementar, o seu desenvolvimen-to. Preservar e perpetuar a espécie humana e, subsidiariamen-te, bens e interesses, enquanto eleitos pela própria sociedade, são objetivos da proteção, cujo provimento se dá através de mecanismos de defesa contra as ameaças.

O Estado atual é um macrossistema integrado pelo sistema de desenvolvimento, cujas atividades são realizadas, ou regu-ladas, ou regulamentadas pela autoridade estatal, e o sistema de proteção, cujo provimento é realizado pelo Estado origina-riamente e pela sociedade civil supletivamente.

A emergente expressão novíssima “defesa social” nos pa-rece mais apropriada que “segurança pública”, para caracteri-zar o esforço de proteção à sociedade:

restritiva, ao contemplar só o trabalho realizado pelo gover-• no e, ainda, apenas aquele contra a criminalidade;

equivocada, porque segurança não seria um trabalho, uma • ação, mas, uma situação, um ambiente;

desgastada, porque sua citação, atualmente, vem acompa-• nhada de descrédito, chacotas e desconfiança;

paradoxal, porque, conforme o conceito que vem predo-• minando, é a atividade desenvolvida por órgãos estatais, enquanto que segurança privada é praticada por entidades civis, ainda que a CF, art.144, estabeleça que segurança pública (sic) é responsabilidade de todos.

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

A Novíssima Defesa Social, parece-nos, tem signifi cação mais abrangente, adequada e inovadora:

abrangente, pois, mesmo sendo iniciativa do governo, a so-• ciedade civil é convocada a participar – e vem participando – além de alcançar todos os mecanismos para minimiza-ção e controle das ameaças: a defesa da evolução social, a defesa antiadversidades sociais, a defesa da seguridade social, a defesa antiinfrações sociais e a defesa antidesor-dens sociais;

adequada, quando se entende a • “defesa” como ato ou efei-to de intervir, defender, enfim, como a manifestação prática da proteção, que ensejará o ambiente de segurança;

inovadora porque decorre de um exame inédito de surgimen-• to, delimitação e contenção de quaisquer ameaças. Não se refere , apenas, à criminalidade violenta e organizada.

Note-se que, em alguns Estados, extinguiram-se Secreta-rias de Segurança Pública e criaram-se Secretarias de Defesa Social. Porém, elas realizam, quase que na totalidade, apenas a salvaguarda social (a defesa antiinfracional – prevenir, re-primir, investigar delitos – e a defesa contra outros desarran-jos sociais, que eram atividades da então segurança pública), além da defesa antiadversidades sociais.

Quanto à violência da criminalidade, a violência urbana – expressão cunhada pela mídia, na década de 70, visando designar a emergente nova roupagem da velha criminal – ad-quiriu novos contornos, evoluiu e é, nos dias de hoje, uma das maiores ameaças nas grandes cidades. É uma situação que, quase, já se aproxima de um diagnóstico de endemia social, o que vem protagonizando inquietações e infortúnios para muitos cidadãos.

É possível listar, no mínimo, cinco razões: os índices de cri-minalidade violenta, efetivamente, estão subindo; há uma sín-drome de violência urbana; o foco da discussão vinha sendo dirigido apenas à causalidade; há pouca efetividade nas ações preventivas e corretivas; há informação insufi ciente sobre esta grave doença do tecido social.

Não se vive sob hipóteses, mas sob uma realidade fá-tica: está ocorrendo uma escalada da violência nas gran-des cidades brasileiras. Se se fi zer uma correlação entre as de São Paulo, Rio, Curitiba, Recife, Cuiabá, Vitória, BH e outras, é possível que, relativamente, uma seja tão violen-ta quanto as demais. Esse fato decorre da constatação de que a estatística criminal é simplista, trabalha com números linearmente progressivos, conhecidos através de relações diretamente proporcionais. Se complexa, trabalharia com números exponenciais (resultado de correlações de certos indicadores).

Comprovado que drogas e armas estiveram presentes na quase totalidade dos casos, obvia e prioritariamente devem ser desencadeadas vigorosas ações e operações de desar-mamento (não apenas de cidadãos, mas, sobretudo, de mar-ginais) e de combate ao tráfi co de drogas.

Há um comportamento letárgico, muito pouco técnico da União, no que se refere ao enfrentamento, na origem, dessas chagas sociais, que são responsáveis, em maioria, pela as-sustadora e incômoda elevação dos índices de violência nos Estados-membros. Urge que se tenha um sistema mais profi -ciente, mais ativo, atuando nos pontos de fronteiras, onde se iniciam os eixos internos de suprimento que têm suas fontes de abastecimento externamente.

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Tecnicamente, a União é que vem sendo desafi ada, vem lutando uma renhida queda-de-braço com os trafi cantes. Po-rém, aos olhos do povo, os Estados-membros, através de suas polícias, é que são os perdedores.

A União deve assumir o combate efetivo aos crimes fede-rais, não apenas por intermédio da Polícia Federal – que vem esmerando-se no trabalho de Inteligência – mas, também, con-ferindo o caráter de permanente à Força Nacional de Defesa Social, hoje de Segurança Pública, além de revisar convênios celebrados com os membros da Federação.

Isso também ajudaria no entendimento cabal de destinação de força para atuar na defesa social, fazendo desaparecer a insubsis-tente, por equivocada, celeuma do emprego das Forças Armadas no policiamento ostensivo, quando sua razão de ser é a defesa nacional. Obviamente, isso não a desobrigaria do monitoramento de nossas fronteiras, secas e molhadas, e da intervenção opera-cional, ali, contra o tráfi co, que começa a afetar a defesa do país.

A escalada da criminalidade violenta não será contida ape-nas com o trabalho das polícias, por mais bem treinadas, ar-madas, equipadas, que possam vir a ser (porque hoje não es-tão, visto que a maioria dos governantes enxerga gastos com polícia como sendo despesa e não investimento).

A contenção criminal deve ser o resultado de um esforço sinérgico, envolvendo a sociedade civil e a sociedade política, nos níveis federal, estadual e municipal.

Também se observa que, em razão de os grandes veículos de comunicação de massa do Brasil localizarem-se no eixo Rio-São Paulo, é comum que um fato, ali ocorrido e noticiado, invada nossos lares, do Oiapoque ao Chuí.

Como exemplo, a briga de quadrilhas, pela posse de de-terminado ponto de tráfi co de drogas, numa cidade, é um acontecimento com repercussão nacional e provoca abalos no ambiente de insegurança das demais cidades brasileiras, afetando, negativamente, a sensação de segurança de seus moradores.

Esse fenômeno vem sendo denominado de Ilusão de Iso-topia, isto é, aquela sensação ou aquele sentimento de que se está vivendo naquele lugar onde ocorreu o fato, ou de que, onde se vive, ocorrerá o mesmo fato, inevitavelmente, gerando a “síndrome de próxima vítima”. Fatos reais são re-presentados na estatística por uma linha sinuosa, enquanto que a lógica da síndrome é uma reta ascendente, que sem-pre acumula fatos.

Veja-se que, em concreto, paralelamente aos aspectos de ordem emocional, instalam-se situações geradoras de violên-cia. Por exemplo, há notícias de existência de “feudos” em al-guns pontos de periferias e de favelas, nas grande cidades, onde a “polícia não entra”, onde são cobrados “pedágios” de comerciantes locais e das redondezas, por trafi cantes ou mili-cianos. Isto é extremamente perigoso. Pior, inquietante e pre-ocupante.

Quanto ao foco da discussão, constata-se que estava vol-tado apenas para uma parte da questão: para a causalidade, espaço e tempo onde eclodem os delitos e para onde fl uem as causas e refl uem os efeitos. São raros os trabalhos que abordam, em amplitude e profundidade, causas e efeitos da violência, particularmente da criminalidade. Esses agentes in-tervenientes – causas e efeitos – sempre foram relegados e pouco analisados, questionados, pesquisados.

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Ainda que seja de todo impossível eliminar causas e efeitos da violência no Brasil, é urgente que se implementem medidas que visem sua redução.

De um lado, as atitudes que objetivam a inclusão social de-vem ter como foco a redução de nossa vulnerabilidade socioe-conômica e, em paralelo, não apenas o exercício da cidadania (na sua prática restrita ao gozo de direitos civis e políticos) mas, principalmente, o estímulo a atividades que conduzam à consolidação da societania (conhecimento e prática de deve-res e direitos de integrantes de uma sociedade).

Por outro lado, objetivando a redução paulatina de nossa vulnerabilidade civil, devem ser desenvolvidas ações que inci-dam sobre o vertiginoso quadro da criminalidade violenta.

Em que pese ser visto como um povo alegre, acolhedor, na realidade o brasileiro parece ter uma auto-estima muito frágil, visto que é um dos poucos no mundo a falar mal de si próprio. Esse fato, aliado a outros, como por exemplo a incapacidade de suprir-se conforme os apelos consumistas, contribui para que marginalizados migrem para a marginalidade. Deve fi car claro, porém, que nem todo marginalizado é marginal e vice-versa.

Em relação à pouca efetividade das ações, a origem estaria em políticas sociais descontínuas e/ou inadequadas, em razão de seus objetivos serem tímidos, que, quando alcançados, sempre se apresentaram como paliativos. Esse erro faz persistir e aumentar a marginalização, além de ensejar o fl orescimento de subculturas, em ambientes onde há prevalência de regras e valores comuni-tários, localizados, em detrimento de regras e valores sociais, de caráter geral. Surgem, em decorrência, e não apenas ali, os des-vios de conduta, as infrações administrativas, as contravenções, a permissividade, dando origem a uma marginalidade emergente.

À maior freqüência e incidência de crimes, soma-se o in-grediente da crueldade. Em razão de anacronismos – de leis, de ritos e de rotinas, da processualística penal – reina uma sensação de impunidade entre os marginais, que, então, se or-ganizam em quadrilhas, com seus bem estruturados sistemas de informação, planejamento, operações, logística e adminis-tração.

Há muitas notícias, mas poucas informações, que são deco-difi cadas como estímulo, pelos iniciantes no crime, ou provo-cam indignação e revolta na sociedade civil. Esta se mobiliza, cobra correções, atitudes e soluções dos políticos.

A sociedade política se agita, cria comissões, aprova e exe-cuta projetos de políticas sociais. Inexatas!... O ciclo perverso se reinicia, por absoluta falta de ações objetivas.

Fato relevante é a questão da notícia versus informação. Interessante confrontar o tratamento que é dado, na ambiên-cia social, à violência da criminalidade e a outras doenças do organismo social, como, por exemplo, a AIDS e a dengue. Em relação à primeira, são dadas notícias, quase sempre em man-chetes bombásticas, sensacionalistas. Para as outras, são da-das informações, que orientam, formam, educam.

Por estas razões, a população conhece bem as origens da AIDS e da dengue, os grupos de risco, as precauções, o trata-mento, a recuperação. Campanhas educativas são muito bem produzidas e divulgadas, resultando em controle desses ma-les, sendo o Brasil, inclusive, referência mundial no controle da AIDS. Em contrapartida, em razão de muita notícia externa e pouca informação interna, nosso país é também referência – negativa – de violência.

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28 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 29

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

A quem interessa uma sociedade desinformada, assustada, intranqüila, que tem reduzidas sua qualidade de vida e sua produtividade, e que se torna uma presa fácil em razão da au-sência paulatina da solidariedade? A marginais! É conveniente e necessário que nossos veículos de comunicação de massa se conscientizem da enorme responsabilidade social que têm, assumindo um compromisso em relação à violência, particular-mente da criminalidade: informar, para orientar, formar e edu-car! Contribuirão para que surja uma nova sociedade pacífi ca, harmoniosa, serena e confi ante.

A pesquisa sobre a violência é muito incipiente, insufi ciente, tímida. E os recursos para fazê-la (e os há) não são muito vi-síveis, são muito pouco divulgados. Estímulos ao engajamen-to são muito difusos (ou confusos?), carecendo de o governo adotar procedimentos claros que despertem a motivação na sociedade civil para essa área, agora, particularmente, que se “descobriu” a importância da pesquisa de Causa e Efeito da violência.

A POLÍCIA PENAL

Já há algum tempo, a sociedade brasileira tem sido ví-tima de uma inusitada ameaça: a que vem de dentro de estabelecimentos penais. Criminosos cumprindo penas e, em tese, sendo preparados pelo Estado para o retorno ao convívio social pleno, planejam e coordenam ações delitu-osas, de comparsas em liberdade, destruindo patrimônios, valores e pessoas. E debilitando o organismo social. Ofi-ciosamente, constatou-se uma situação, no mínimo, inu-sitada. As rebeliões, os ataques externos eram uma con-traposição ao péssimo trabalho da Execução Penal, com ênfase para o que fica sob responsabilidade da Adminis-tração Pública Penal. Essas ações eram um clamor, um protesto, uma insurgência contra a incivilidade, o descaso, o desrespeito à pessoa humana, lançada em verdadeiras masmorras modernas.

Algo teria que ser feito! A iniciativa foi dos agentes pe-nitenciários brasileiros. Reunidos, consensaram haver chegado a oportunidade e o momento de profissionalizar a Administração Penal, de estimular o profissionalismo de seus integrantes e de adequar a modernização tecnológica à atividade. Certos administradores públicos conscientes constataram que a desídia estatal, para com o sistema, tra-zia prejuízos sociais, políticos e econômicos ao próprio Es-tado. Alguns remendos foram feitos. Mais pirotécnicos que técnicos. Modestamente, nós, sindicalistas, fomos além!

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 31

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Visando a efetividade, procuramos identifi car formas, fór-mulas e formatos que dessem transparência e consistência à atividade prisional. Com assessoria jurídica competente e as-sessoramento doutrinário independente, pesquisamos as ori-gens de nossa entidade e de nossa profi ssão. Surpreendemo-nos quando fomos esclarecidos, dentre muitos fatos, de que o trabalho realizado por nós tem origem na chegada de Cabral (o Pedro) ao Brasil, com nossos ancestrais custodiando de-gredados; que a atividade de Administração Penal se estriba no Poder de Polícia Administrativa Penal, sendo, então, uma atividade policial; que falta reconhecimento constitucional da Instituição; que, numa pequena amostragem da Administração Penal em nosso país, constata-se o amadorismo, a desaten-ção para com quem poderia contribuir, efetivamente, na rein-tegração social.

Felizmente, assim como nós, há outras Instituições que pen-sam no bem-estar social. Dentre elas, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Em 2009, a Campanha da Fraternidade tem como tema “Fraternidade e Segurança Pública” e, como lema, “A paz é fruto da Justiça (Is 32,17)”.

Em seu Texto-base, à página 72:

“Algo de que se costuma esquecer quando se fala em se-gurança pública são as guardas penitenciárias. Estas devem ser profissionalizadas e organizadas em carreira. Não se pode conceber que as delegacias de polícia continuem a funcionar como presídios, como ainda acontece em grande parte do País, o que desvia os policiais civis da sua função.”

Feliz coincidência! A FEBRASPEN, representando os ser-vidores públicos que trabalham na Administração Penal, bus-ca o reconhecimento normativo da atividade (PEC-308).

A Proposta de Emenda Constitucional n.o 308, a PEC-308, já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça e na Comissão de Segurança Pública. Deverá entrar em pauta para ser votada e, certamente, ser promulgada. O almejado reco-nhecimento normativo defl uirá da inserção da POLÍCIA PENAL no Art. 144 da Constituição Federal. Nossa argumentação, pragmática e realista, visa demonstrar aos vários segmentos representativos da sociedade brasileira de que a Polícia Penal é menos uma conveniência profi ssional que uma necessidade social; menos que uma reivindicação classista, ela vem para preencher um vácuo na defesa social, particularmente na sal-vaguarda da sociedade.

Temos consciência de que, fatalmente, esse trabalho de esclarecimentos deverá estender-se a mais algumas pessoas e órgãos que, ainda, não se mostram convencidos da oportu-nidade da promulgação. Essa postura equivocada decorre da falta de informações para uns e de inadequado embasamento técnico para outros. Isso poderá ser suprido com nossos argu-mentos e explicações que conduzirão, por certo, ao convenci-mento do impacto social extremamente positivo, decorrente da aprovação da PEC-308.

Difícil será debater com quem fundamenta seus pontos de vista em princípios doutrinários arcaicos, anacrônicos. Contu-do, se houver uma postura receptiva para o diálogo, para o debate construtivo, provavelmente ocorrerá reexame de po-sicionamentos. Há poucas discordâncias no varejo e fortes concordâncias no atacado. As divergências têm fulcro na am-bigüidade conceptual e na heterogeneidade doutrinária, cuja origem, entretanto, está numa área bem mais ampla que a dis-cussão sobre a Polícia Penal.

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1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 33

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

A gênese está numa instância superior, onde continuam sendo discutidos, em relação à sociedade, conceitos e dou-trina de proteção, de insegurança, de segurança pública, de defesa social, de sistema policial, de ameaças, de vul-nerabilidades e outros mais. A discussão sobre a Polícia Penal, vem ensejando, residualmente, a oportunidade de se conhecer e entender melhor a instituição-polícia, o sistema policial, o ciclo completo de polícia e o sistema de defesa da sociedade.

Quem é contrário argumenta, basicamente, que o sistema penitenciário não se confunde com o sistema policial; que as atribuições previstas pela PEC, para a Polícia Penal, são atribuições de polícias já existentes, inviabilizando-a; que essa atividade não é atividade policial; que o Congresso, como solução para a segurança pública, estaria propondo a criação de uma nova polícia, além de outras colocações descabidas.

Entendemos que o Sistema Penitenciário (sistema penal, sistema prisional), como está disposto, integrado pelo Minis-tério Público, Defensoria Pública, Judiciário e Administração Pública, óbvia e realmente não integra o sistema policial. En-tretanto, a Administração Pública Penal o integra, sim.

Reiteramos nosso entendimento de que a atividade desen-volvida pela Administração, na execução penal, é uma ativida-de típica de polícia, basicamente através do exercício do po-der de polícia administrativa penal e eventualmente através do exercício da força de polícia penal. Volta-se ao entendimento inovador de que o Estado existe, basilarmente, para prover a proteção e promover o desenvolvimento. E, para isso, detém autoridade, bipartida em poder e força.

Muitas pessoas, ainda, enxergam Polícia como sendo o ór-gão que “corre atrás de ladrão e prende bandido” ou que “pre-vine e reprime crimes”. Isso é muito pouco!

Polícia é instituição /sistema /atividade estatal de proteção social, distribuída em estruturas de poder e força, garantidora da ordem social.

O sistema policial é integrado por órgãos distribuídos nas esferas municipal, estadual e federal (não necessariamente existentes em todas), desempenhando atividades que repre-sentam o sempre discutido ciclo completo de polícia: começa pela Polícia Administrativa, a polícia de normas, de resolu-ções, de fi scalizações, de sanções administrativas (polícias do meio-ambiente, sanitária, fazendária, dos transportes, da seguridade social, do senado, da câmara, rodoviária, portuá-ria, ferroviária, das construções e edifi cações, da habitação, do meio circulante e inúmeras outras); passa pela Polícia Judiciária, que investiga autoria e materialidade de delitos (Polícia Civil e Polícia Federal), e pela Polícia de Desastres, que realiza a prevenção e a sustinência de desastres (Corpos de Bombeiros e Comissões de Defesa Civil); fi nda na Polícia Penal, encarregada da custódia e participante da ressocia-lização de apenados, além de poder auxiliar na fi scalização de decisões judiciais. As Forças Policiais (as PMs e a Força Nacional), integrando e enfeixando esse ciclo, fazem a polí-cia ostensiva, acautelam o poder de polícia de todos esses órgãos policiais e, ainda, garantem o funcionamento dos po-deres estaduais constituídos.

Quanto ao fato de que a Polícia Penal exerceria atividades atribuídas a outras polícias, veja-se o surgimento de especifi -cidades para atender determinadas peculiaridades.

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34 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 35

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Antes, o médico era um generalista. Hoje temos, por exem-plo, especialistas em mão, em joelho, em cabeça, etc., exigi-dos por emergentes necessidades.

Há algumas situações, bem mais complexas que a cristalina atividade de Polícia Penal, envolvendo outros exercícios poli-ciais, fl uindo sem maiores questionamentos.

De passagem, lembra-se que, recentemente, foram cria-das a Polícia do Senado e a Polícia da Câmara dos Depu-tados. Originariamente, havia a expectativa de que haveria troca de um contingente privado por um contingente público, para a proteção patrimonial e de pessoas no âmbito das res-pectivas instalações, apenas. Contudo, o atual rol de ativida-des é extremamente amplo, incluindo investigações, inqué-ritos, perícias, escoltas de dignitários, guardas residenciais e outras. E mais, Guardas Municipais, que trabalham sob o manto do Poder de Polícia Administrativa Municipal, criadas para proteger os próprios municipais, são empregadas como força pública municipal (com o risco de se transformarem em guardas pretorianas) e tem havido tácita aceitação. Essa ati-vidade continua sendo realizada, ainda, em algumas cidades, pela Força Estadual, cognome das atuais Polícias Militares Estaduais.

Foi criada, de modo recente, a Força Nacional (que, ainda subutilizada – o que é bastante lamentável – não tem reconheci-da sua extraordinária importância) para suplementar o trabalho de forças estaduais ou para cumprir atividades-força, realizadas até então pela Polícia Federal, a polícia judiciária da União.

Divulgar que a Câmara Federal pretende transformar o re-conhecimento da Polícia Penal em panacéia para a segurança pública é um equívoco, uma inverdade.

Sem dúvida, trata-se de uma grande contribuição, uma inteligente decisão técnica, visando adoção de alguns pro-cedimentos e comportamentos futuros, com interveniência positiva na redução da insegurança, em razão de fortale-cimento do Sistema de Defesa Social (não, apenas, para a segurança pública). E, ao se falar desse novel sistema, cremos ser oportuno lembrar aqui que, no enfrentamento à violência urbana, a contenção criminal é importante, mas, a inserção social é fundamental. Falhando essa, restaria o recurso da reinserção, através da reintegração e da resso-cialização, esforços de que participa a Polícia Penal.

Quando, às vezes, grandes ameaças à sociedade têm origem dentro das prisões, isso se dá, quase na totalidade, por inação governamental nas áreas administrativa, logísti-ca e operacional. Há de se cuidar para que essa omissão não gere desânimo e descompromisso com os resultados, na administração penal, em alguns Estados.

Outro fato, passando despercebido, é de que não está sendo criada uma nova polícia. Está sendo buscado o reco-nhecimento da existência de uma secular atividade policial. Através da PEC federal, busca-se o reconhecimento cons-titucional de um órgão policial – em alguns locais, institu-cionalmente virtual – que, também, desempenha ações que integram a execução penal, presente em todos os Estados brasileiros e no Distrito Federal. Esse reconhecimento en-sejará ocupação de um vácuo que tem trazido prejuízos so-ciais. Em alguns Estados, as PM e PC não querem realizar esse tipo de serviço, querem seus efetivos nas ruas: PM, para fazer polícia ostensiva, e PC, para fazer investigação de autoria e materialidade de delitos.

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36 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 37

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Outros Estados já estão transferindo a missão para Guar-das Penais, sólidas e/ou embrionárias. Com a estruturação da Polícia Penal, surgirão refl exos altamente positivos na sociedade, provocados por efetividade na administração pe-nal e instalação de uma gestão profi ssional, que farão des-pontar uma identidade profi ssional, decorrendo, no mínimo, dignidade profi ssional e respeito ao policial penal. Teremos profi ssionais altamente qualifi cados para a custódia, através de um braço armado (guardas interna, externa e de mura-lhas, escoltas e recapturas), para participar da ressociali-zação, através de seu braço desarmado (psicólogos, peda-gogos, advogados, assistentes sociais, médicos, dentistas, enfermeiros e tantos outros especialistas quantos forem necessários). Ressocialização cujo escopo fi nalisticamente é a reinserção (aspecto social), mediatamente é a reintegra-ção (aspecto psicológico), e imediatamente o reajustamento e a readaptação (aspecto operativo), através da reabilitação e da reeducação.

Convém que a vertente da Polícia Penal, envolvida com a ressocialização, interaja mais com o Poder Judiciário e com as APAC’s.

Por falta de estrutura de fi scalização, não se tem real ava-liação do efeito de aplicação de penas alternativas e de penas substitutivas. Falta fi scalização! Isso também ocorre na progres-são de regime, aberto e semi-aberto. Sabe-se de casos em que indivíduos cometem delitos durante o dia e, à noite, estão em Casas de Albergado. Outras situações dizem respeito ao Livra-mento Condicional, ao Sursis, às Autorizações de Saída (Per-missões de Saída e Saídas Temporárias), à Suspensão Condi-cional do processo ou da pena.

A nosso juízo, a Policia Penal, adequadamente estruturada, poderá participar dessa fi scalização, trazendo enorme contri-buição para a Defesa Social.

Enfatizamos nosso juízo de que, inexoravelmente, ocorre-rá esse reconhecimento normativo, hoje ou amanhã. A União não pode correr o risco de uma atividade policial, realizada por um contingente (que logo ultrapassará 50.000, cinqüenta mil homens e mulheres) treinado, equipado e armado não ter parâmetros normativos, sob pena de surgirem novas forças estaduais, ou a serviço de governadores, como acontecia até bem pouco, ou sem controle. A terceirização, tentada em al-guns Estados, provavelmente por erro de origem, não deu cer-to. Claro! Onde já se viu terceirizar atividade-fi m? Alguém já voou em empresa aérea cujo piloto é terceirizado, ou assistiu missa com o padre terceirizado?

Outro fato é que a espiral da violência está sendo alimen-tada, também, de dentro de alguns estabelecimentos penais, em razão de débeis condições para realização das custódia e ressocialização, o que exige correções profi ssionais.

Alguns Estados, ante a morosidade federal, já começam a legislar sobre o assunto. Se de um lado é muito positiva essa fuga da inércia, de outro pode provocar prejuízos a condutas operacionais e administrativos que, desejável, deveriam ser padronizados em nosso país, respeitadas as realidades cultu-rais. Convém lembrar que é reservado à União legislar sobre direito processual penal e direito penal (art. 22, I, CF). Porém, compete concorrentemente à União, Estados e Distrito Fede-ral, legislar sobre direito penitenciário. “Sobrevindo lei federal sobre normas gerais, suspende a eficácia da lei estadual no que lhe for contrário. (art. 24, CF)”.

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38 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 39

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

1.a CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Eixo Temático N.o 6PRINCÍPIOS E DIRETRIZES

1.o PRINCÍPIO:

CIVILIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL

DIRETRIZES

a) Desenvolver programas e projetos que assegurem efetividade na ressocialização, no amparo ao egresso e no resguardo de familiares dos diversos atores.

b) Estimular a participação da sociedade civil em projetos e programas com repercussão na reintegração social.

c) Incrementar, junto aos órgãos próprios, programas de aplicação de penas alternativas.

2.o PRINCÍPIO:

RECONHECIMENTO CONSTITUCIONAL DA POLÍCIA PENAL

DIRETRIZES:

a) Implementar esforços visando a promulgação da PEC-308.

b) Profissionalizar a Administração Prisional.

c) Aprimorar a interação da Administração Prisional com os demais órgãos do Sistema de Defesa Social.

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40 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

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EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 41

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

PRINCÍPIOS E DIRETRIZES

Atendendo à metodologia para apresentação de propostas, estabelecida pela organização da 1.a Conferência Nacional de Segurança Pública, estão listados na página anterior, os Princí-pios e Diretrizes que a FEBRASPEN sugere para o Eixo Temá-tico n.o 6.

O primeiro Princípio é:•

CIVILIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL

É comum ouvirem-se queixas sobre o Sistema Penitenciá-rio Brasileiro: condições subumanas, negligência, maus tratos, superlotação, academia do crime e muito mais.

Esse princípio pretende constituir-se em um alerta:

O trabalho de reintegração social, realizado pela Adminis-tração Prisional, pela Polícia Penal, se baseia, intransigente-mente, no respeito à integridade e à dignidade humanas de tantos quantos estejam envolvidos nesse processo.

Diretrizes:•

Esse princípio desdobra-se em diretrizes que proclamam a conveniência e a necessidade de os planos, programas e pro-jetos de ressocialização, de amparo ao egresso e resguardo de familiares terem efi cácia com qualidade e objetividade; que, através de informação qualifi cada, encorajam a sociedade civil a ser partícipe de eventos que conduzam à otimização na rein-tegração social; que, em paralelo à demolição, restauração ou remodelação de estabelecimentos penais impróprios, se desen-volva a aplicação judiciosa de alternativas para o cárcere.

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42 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 43

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

O segundo Princípio é:•

RECONHECIMENTO CONSTITUCIONAL DA POLÍCIA PENAL

Sem dúvida, é inimaginável, nos dias de hoje, que uma clas-se, desempenhando uma atividade secular, de suma importân-cia para a sustentabilidade do corpo social, tenha um rosto e não tenha identidade profi ssional, o que provoca graves prejuí-zos, minimamente, para sua autoridade e sua dignidade.

Uma classe sem voz e sem vez!

Impensável uma classe que não tenha um canal por onde fl uam suas proposições técnicas e suas reivindicações, mas, submeti-do a um canal por onde refl uem as críticas ásperas e o desampa-ro. Uma classe cujo desempenho amadorístico se transforma em real e forte vulnerabilidade no organismo social.

Ao que parece, felizmente para a sociedade, isso está prestes de chegar ao fi m. A Proposta de Emenda Constitucional n.o 308, a PEC-308, está em condições de ser colocada na pauta do Con-gresso e ser promulgada.

Diretrizes:•

O passo inicial é acelerar esforços visando a promulgação da PEC-308, mais que um pleito classista, chega para preen-cher uma lacuna na Defesa Social. Seguem-se uma Lei Na-cional e, na seqüência, Leis Estaduais que tratarão de concur-so público, quadro e dotação próprios, embasamentos legal e doutrinário, requalifi cação, academia, formação, reciclagens, especialização, corregedoria, ouvidoria, uniforme, armamento, equipamento, transporte, recursos tecnológicos, inteligência prisional e outros mais. Extremamente importante é buscar a sinergia, através interação da Administração Prisional com os demais órgãos do Sistema de Defesa Social.

CONCLUSÃO

Temos convicção de que todas essas mazelas e contradi-ções sociais, tratadas até agora, podem ser corrigidas e rever-tidas. Para fugir do lugar comum de que basta vontade política, é necessário que o Estado brasileiro (não apenas o governo) realize um esforço, um pacto federativo que compreenda:

1.• o Estabelecimento de uma Estratégia Nacional de Defesa Social (a atual Estratégia Nacional de Defesa se refere, em sua quase totalidade, à Defesa Nacional) elaborada por re-presentantes dos três poderes – dos níveis federal, estadu-al e municipal – e da sociedade civil, pragmaticamente, de forma a não se transformar em mais um glossário, de boas idéias, refrigerado a ar condicionado;2.• o Consignação de compromisso relativo a sua integral exe-cução, para que não ocupe lugar, ainda que de destaque, no já imenso “arquivo morto”.

Deve contemplar, no mínimo:

Medidas de fortalecimento das instituições:

da família, cujo número sob a responsabilidade de mães que, • em grande número, “trabalham fora”, vem aumentando; da escola, hoje, simples agência de repasse de conhecimen-• tos, que necessita de transformações, iniciando-se pela res-tauração do mérito, da importância que têm os professores, fluindo para a educação integral em escola integrada; da igreja, que se enfraquece, na medida em que se consta-• tam ramificações estranhas, da noite pro dia; do próprio Estado, ví• tima de descrédito generalizado, já de algum tempo;

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44 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 45

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Criação e/ou difusão de atitudes fi rmes de correção de des-vios do caráter social (estimulando o respeito a valores sociais e exigindo a obediência a regras sociais). E os veículos de comunicação de massa podem dar uma enorme contribuição.

A operacionalização deve ocorrer através de efetivos proce-dimentos da sociedade política e do engajamento e participa-ção da sociedade civil. Portanto, é necessário que:

o Legislativo seja mais objetivo, modernize nossas leis, var-• ra os anacronismos, os procedimentos protelatórios, enfim, menos coreografia e mais samba-enredo;

o Judiciário intensifique o processo de modernização e in-• formatização dos ritos e práticas jurisdicionais, dando maior ênfase aos Juizados da Infância e da Juventude e estimu-lando a aplicação de penas alternativas e de penas substi-tutivas;

o Executivo reconheça, dentre outros, o extraordinário va-• lor dos assistentes sociais e dos educadores, no âmbito da Defesa Social;

se reconheça o destacado papel que deve ser reservado ao • Ministério Público, na propositura, fiscalização das medidas despenalizadoras, e à Defensoria Pública na representação dos encarcerados desassistidos.

A primeira obra de reengenharia política é conceber e efeti-var o Estado de tal maneira que ele pudesse ser mais efi ciente, tanto na implementação de medidas distributivas, afastando a ameaça da exclusão, como na consolidação de políticas retri-butivas, destinadas a controlar a ameaça da criminalidade.

Para a primeira hipótese, o trabalho de assistentes sociais é fundamental e, certamente, a curto e médio prazos, trará re-sultados concretos e perenes. Em paralelo, a participação de educadores (resgatando-se-lhes a dignidade profi ssional, co-meçando pela dignidade salarial) é fundamental na formação do caráter e na preparação da geração, que ora desabrocha, para uma convivência harmoniosa e pacífi ca. Para a segunda hipótese, é prioritário consolidar a Polícia Penal, via reconheci-mento constitucional, instituição que abarcará os profi ssionais de custódia e ressocialização, que laboram na Administração Pública Penal.

Parece claro que devemos iniciar essa cruzada, de resgate social do povo brasileiro, devolvendo-lhe a paz e a harmonia, investindo prioritariamente nesses profi ssionais, construtores de novos e sólidos alicerces.

O desgaste da autoridade de polícia, sendo desafi ada inclu-sive, tem contribuído para surgimento de vácuos na defesa da sociedade. Cresce a ausência de autoconfi ança para cumprir a missão, visto que policiais estão em condições de inferioridade de meios em relação aos bandidos. Um princípio fundamental – a supremacia de força – não vem sendo observado. Os mar-ginais estão mais bem armados que a Polícia. Em paralelo, há situações de falta de confi ança nos superiores, pela incerteza de haver reconhecimento de ação policial legítima, quando do emprego da força, da energia e fi rmeza necessárias. Essas incertezas derivam da rápida transição de autoritarismo para excessivo liberalismo, com destaque aos esclarecimentos res-tritivos dos direitos fundamentais, estreitando-se o foco do di-reito da sociedade à proteção, pela interpretação distorcida de alguns direitos individuais.

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46 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

EIXO TEMÁTICO N.º 6 / PRINCÍPIOS E DIRETRIZES 47

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

Idealmente, pela amplitude e complexidade da matéria, bem como seu refl exo na sociedade brasileira, a iniciativa de reco-nhecimento normativo da Polícia Penal deveria ser da União, alterando o Art. 144, da C.F., ao que se seguiria seu conve-niente delineamento, através de uma Lei Nacional. O fato é que, para atender a demandas conjunturais inadiáveis, Esta-dos, ratifi ca-se, já começam a legislar, alguns timidamente, so-bre a matéria, curvando-se à inexorabilidade.

Enfi m, a POLÍCIA PENAL, o sistema de administração pe-nal pode e deve contribuir para a contenção criminal e para a reinserção social, não devendo constituir-se, ainda que mini-mamente, em vetor de insegurança social, conforme é possível depreender-se de fatos ultimamente divulgados na mídia. E o Estado brasileiro é o principal responsável pela instalação das condições e do ambiente favoráveis, que irão permitir redução de vulnerabilidades no contexto social.

Convém à sociedade brasileira que a violência, este grave fenômeno social não tenha tratamento tão sazonal (ou espas-módico?), passando por um exame exaustivo das formas de seu contorno e de sua complexidade. É hora de ser dado um basta à administração de surtos (ou por susto?).

Priorizando o interesse social e evitando que a União seja atropelada por legislações estaduais, que buscam correção e adaptação, os senhores parlamentares entenderão o grande alcance da PEC-308 e irão aprová-la. Já!

É hora de um engajamento multidisciplinar! É hora da Con-ferência Nacional de Segurança Pública.

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48 A POLÍCIA PENAL NO CONTEXTO DA SEGURANÇA PÚBLICA

1.ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

BIBLIOGRAFIA

Este compêndio foi elaborado, a pedido da FEBRASPEN, pelo Cel. QOR Amauri Meireles, da PMMG, tendo como referências artigos produzidos pelo autor:As vísceras da violência.

A Novíssima Defesa Social.

Violência e Polícia.

Perplexidade.

A transferência do medo.

Indignação sazonal.

Ciclo completo de Polícia.

Ode ao auê.

Violência e esforço sinérgico.

Fundamentos para reconhecimento da Polícia Penal.

Proposta de uma Polícia Penal.

Ovo de Colômbia.

Voltando à Polícia Penal.

E as causas da violência?.

Conhecer para aderir.

Polícia Penal: exaurindo divergências.

Nossa matriz de insegurança.

Ilusão de Isotopia.

Sobre a Polícia Penal.

E pelos seguintes livros:Entendendo a Nossa Insegurança, 2003. (Co-autoria com o Cel QOR Lúcio Emílio Espírito Santo, da PMMG).

O TEMPO e a Violência.

BIBLIOGRAFIA

Este compêndio foi elaborado, a pedido da FEBRASPEN, pelo Cel. QOR Amauri Meireles, da PMMG, tendo como referências artigos produzidos pelo autor:As vísceras da violência.

A Novíssima Defesa Social.

Violência e Polícia.

Perplexidade.

A transferência do medo.

Indignação sazonal.

Ciclo completo de Polícia.

Ode ao auê.

Violência e esforço sinérgico.

Fundamentos para reconhecimento da Polícia Penal.

Proposta de uma Polícia Penal.

Ovo de Colômbia.

Voltando à Polícia Penal.

E as causas da violência?.

Conhecer para aderir.

Polícia Penal: exaurindo divergências.

Nossa matriz de insegurança.

Ilusão de Isotopia.

Sobre a Polícia Penal.

E pelos seguintes livros:Entendendo a Nossa Insegurança, 2003. (Co-autoria com o Cel QOR Lúcio Emílio Espírito Santo, da PMMG).

O TEMPO e a Violência.