CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA E ESTRUTURAL DE DENTES … · composição química de tecidos dentais....

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XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 1 CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA E ESTRUTURAL DE DENTES BOVINOS POR MEIO DE TÉCNICAS DE ESPECTROSCOPIAS E MICROSCOPIA Roberto Pizarro Sanches 1,2,3 , Leandro José Raniero 2 , Luís Eduardo da Silva Soares 2 , Airton Abrahão Martin 2 , Walter Miyakawa 3 , Ana Maria do Espírito Santo 2 1 Universidade do Vale do Paraíba/Faculdade de Engenharias, Arquitetura e Urbanismo, Av. Shishima Hifumi, 2911 – Urbanova, São José dos Campos - SP, [email protected] 2 Universidade do Vale do Paraíba/Laboratório de Espectroscopia Vibracional Biomédica (LEVB) - IP&D, Av. Shishima Hifumi, 2911 – Urbanova, São José dos Campos - SP, [email protected] 3 Instituto de Estudos Avançados/Divisão de Fotônica – IEAv/EFO, Rod. dos Tamoios, km 5,5 - Putim, São José dos Campos - SP, [email protected] Resumo- Tratamentos químicos ou térmicos podem causar alterações na morfologia de superfície e na composição química de tecidos dentais. Este estudo teve como objetivos caracterizar, por microscopia de força atômica (AFM), as microestruturas de superfícies de bastões de esmalte e túbulos dentinários após ataque químico com ácido lático, em concentração e tempo adequados para obtenção de imagens, e utilizar as espectroscopias FT-Raman, FT-IR e a μ-EDX como técnicas de microanálise para identificar possíveis modificações químicas induzidas pela irradiação com lasers de Cu-HBr (510nm, 0,83 J/cm 2 ) e CO 2 -TEA (10,6 μm, 1,2 J/cm 2 por pulso). As imagens de AFM das amostras expostas a 1 minuto de ácido lático (113,8mmol/L e pH 3,3) mostraram seções transversais de bastões de esmalte elípticas (eixo maior médio 9±1 μm; eixo menor médio 4,8±0,6 μm) e túbulos dentinários com aberturas de 4,1±0,2 μm de diâmetro médio. Nos espectros FT-IR dos grupos irradiados com laser CO 2 -TEA, foram observados indícios de formação da fase de fosfato de tetracálcio e deformações da estrutura tetraédrica do PO 4 3- , que não estavam presentes nos espectros dos grupos irradiados com laser de Cu-HBr. Palavras-chave: dente, AFM, espectroscopias Área do Conhecimento: Engenharias Introdução Anatomicamente, o dente (CATE, 1998; MJÖR, 1990) é um órgão constituído de três partes: o esmalte, estrutura que recobre a coroa dos dentes; a dentina, tecido conjuntivo duro menos mineralizado e mais resistente, e a polpa dentinária, um tecido conjuntivo mole. Os tecidos dentais duros (esmalte e dentina) são constituídos por uma matriz orgânica, uma matriz inorgânica e água (BACHMANN et al., 2003). A matriz orgânica está presente em maior quantidade na dentina do que no esmalte e é composta basicamente por colágeno. Já a matriz inorgânica é formada principalmente, por hidroxiapatita [Ca 10 (PO 4 ) 6 (OH) 2 ], uma forma complexa de fosfato de cálcio. Em sua estrutura, o esmalte é formado, basicamente, por cristais de hidroxiapatita estreitamente reunidos e organizados em forma de bastões. Já a dentina caracteriza-se pela presença de múltiplos canalículos (túbulos dentinários), dispostos muito próximos, e que atravessam toda a sua espessura. Apesar dos tecidos dentais duros serem constituídos majoritariamente por hidroxiapatita em sua matriz inorgânica, também podem ser observadas em pequenas quantidades outras formas de apatitas (fluoroapatitas e apatitas carbonatadas), além de diferentes fases de fosfato de cálcio, a saber, beta- e alfa-fosfato de tri-cálcio (β- e α-Ca 3 (PO 4 ) 2 ), e fosfato de tetra-cálcio (Ca 4 (PO 4 ) 2 O). Sabe-se que, na dentina, as fases beta-fosfato de tri-cálcio (β-TCP), alfa-fosfato de tri-cálcio (α-TCP) e fosfato de tetra-cálcio (TTCP) são formadas através de tratamento térmico à 700ºC, 1125ºC e 1300ºC, respectivamente (LIN et al., 2001). Essas mudanças de fases podem ser induzidas através da irradiação com lasers que emitem na região do infravermelho, onde a temperatura na superfície do dente, segundo Fowler e Kuroda (1986), pode chegar a aproximadamente 1400ºC. Na odontologia, o ataque ácido e a irradiação laser podem ser utilizados, por exemplo, para aumentar a força de ligação de materiais restaurativos e promover fases mais resistentes à dissolução ácida (KLOCKE et al., 2007; FEURSTEIN et al., 2005; HANNIG et al., 2005). O presente estudo teve por objetivos: (i) caracterizar, por microscopia de força atômica (AFM), as microestruturas em superfícies de esmalte e dentina bovinos após ataque químico com ácido lático, em concentração e tempos adequados para remover riscos e resíduos de

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XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba

1

CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA E ESTRUTURAL DE DENTES BOVIN OS POR MEIO DE

TÉCNICAS DE ESPECTROSCOPIAS E MICROSCOPIA

Roberto Pizarro Sanches 1,2,3, Leandro José Raniero 2, Luís Eduardo da Silva Soares 2, Airton Abrahão Martin 2, Walter Miyakawa 3, Ana Maria do Espírito Santo 2

1Universidade do Vale do Paraíba/Faculdade de Engenharias, Arquitetura e Urbanismo, Av. Shishima

Hifumi, 2911 – Urbanova, São José dos Campos - SP, [email protected] 2Universidade do Vale do Paraíba/Laboratório de Espectroscopia Vibracional Biomédica (LEVB) - IP&D, Av.

Shishima Hifumi, 2911 – Urbanova, São José dos Campos - SP, [email protected] 3Instituto de Estudos Avançados/Divisão de Fotônica – IEAv/EFO, Rod. dos Tamoios, km 5,5 - Putim, São

José dos Campos - SP, [email protected]

Resumo- Tratamentos químicos ou térmicos podem causar alterações na morfologia de superfície e na composição química de tecidos dentais. Este estudo teve como objetivos caracterizar, por microscopia de força atômica (AFM), as microestruturas de superfícies de bastões de esmalte e túbulos dentinários após ataque químico com ácido lático, em concentração e tempo adequados para obtenção de imagens, e utilizar as espectroscopias FT-Raman, FT-IR e a µ-EDX como técnicas de microanálise para identificar possíveis modificações químicas induzidas pela irradiação com lasers de Cu-HBr (510nm, 0,83 J/cm2) e CO2-TEA (10,6 µm, 1,2 J/cm2 por pulso). As imagens de AFM das amostras expostas a 1 minuto de ácido lático (113,8mmol/L e pH 3,3) mostraram seções transversais de bastões de esmalte elípticas (eixo maior médio 9±1 µm; eixo menor médio 4,8±0,6 µm) e túbulos dentinários com aberturas de 4,1±0,2 µm de diâmetro médio. Nos espectros FT-IR dos grupos irradiados com laser CO2-TEA, foram observados indícios de formação da fase de fosfato de tetracálcio e deformações da estrutura tetraédrica do PO4

3-, que não estavam presentes nos espectros dos grupos irradiados com laser de Cu-HBr. Palavras-chave: dente, AFM, espectroscopias Área do Conhecimento: Engenharias Introdução

Anatomicamente, o dente (CATE, 1998; MJÖR, 1990) é um órgão constituído de três partes: o esmalte, estrutura que recobre a coroa dos dentes; a dentina, tecido conjuntivo duro menos mineralizado e mais resistente, e a polpa dentinária, um tecido conjuntivo mole. Os tecidos dentais duros (esmalte e dentina) são constituídos por uma matriz orgânica, uma matriz inorgânica e água (BACHMANN et al., 2003). A matriz orgânica está presente em maior quantidade na dentina do que no esmalte e é composta basicamente por colágeno. Já a matriz inorgânica é formada principalmente, por hidroxiapatita [Ca10(PO4)6(OH)2], uma forma complexa de fosfato de cálcio.

Em sua estrutura, o esmalte é formado, basicamente, por cristais de hidroxiapatita estreitamente reunidos e organizados em forma de bastões. Já a dentina caracteriza-se pela presença de múltiplos canalículos (túbulos dentinários), dispostos muito próximos, e que atravessam toda a sua espessura.

Apesar dos tecidos dentais duros serem constituídos majoritariamente por hidroxiapatita em sua matriz inorgânica, também podem ser observadas em pequenas quantidades outras

formas de apatitas (fluoroapatitas e apatitas carbonatadas), além de diferentes fases de fosfato de cálcio, a saber, beta- e alfa-fosfato de tri-cálcio (β- e α-Ca3(PO4)2), e fosfato de tetra-cálcio (Ca4(PO4)2O). Sabe-se que, na dentina, as fases beta-fosfato de tri-cálcio (β-TCP), alfa-fosfato de tri-cálcio (α-TCP) e fosfato de tetra-cálcio (TTCP) são formadas através de tratamento térmico à 700ºC, 1125ºC e 1300ºC, respectivamente (LIN et al., 2001). Essas mudanças de fases podem ser induzidas através da irradiação com lasers que emitem na região do infravermelho, onde a temperatura na superfície do dente, segundo Fowler e Kuroda (1986), pode chegar a aproximadamente 1400ºC. Na odontologia, o ataque ácido e a irradiação laser podem ser utilizados, por exemplo, para aumentar a força de ligação de materiais restaurativos e promover fases mais resistentes à dissolução ácida (KLOCKE et al., 2007; FEURSTEIN et al., 2005; HANNIG et al., 2005).

O presente estudo teve por objetivos: (i) caracterizar, por microscopia de força atômica (AFM), as microestruturas em superfícies de esmalte e dentina bovinos após ataque químico com ácido lático, em concentração e tempos adequados para remover riscos e resíduos de

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polimento e revelar as estruturas de interesse (bastões e túbulos), e (ii) utilizar a espectroscopia FT-Raman, espectroscopia no infravermelho (FT-IR) e µ-fluorescência de raios-x (µ-EDX) como técnicas qualitativas de microanálise para identificar as fases do componente fosfato de cálcio e, analisar possíveis modificações induzidas pela irradiação com os lasers de Cu-HBr e CO2-TEA Metodologia

AFM Para a caracterização das estruturas de

bastões de esmalte e túbulos dentinários, utilizou-se a microscopia de força atômica (AFM - Shimadzu Corp. Inc., Japan, modelo SPM 9500J3). As amostras devem estar apropriadamente planas, pois é feita uma varredura na superfície com uma sonda com raio nominal de cerca de 10 nm. Por isso, os corpos de prova (16 de esmalte e 16 de dentina) passaram por desgaste manual em lixas 220, 320, 500 e 1200 e polimento com pasta de diamante de 6µ, 3µ e 1µ.

Em seguida, foram constituídos quatro grupos, denominados 1, 2, 3 e mais um grupo controle. As amostras do grupo controle não sofreram ataque químico. As dos grupos 1, 2 e 3 sofreram ataque com ácido lático, na concentração de 113,8 mmol/L e pH 3,3, durante os tempos de um, três e cinco minutos, respectivamente, para se estabelecer um tempo de ataque adequado para remoção dos resíduos de polimento e exposição das estruturas de interesse. Foram mensurados as dimensões dos bastões em esmalte e das aberturas dos túbulos dentinários, utilizando o recurso de análise de perfil, do software do próprio equipamento. Os dados obtidos passaram por teste estatístico de normalidade Shapiro-Wilk, p=0,05 e teste de análise de variância simples ANOVA, p=0,01. A densidade de túbulos foi estimada com base no número de túbulos observados por área de varredura.

Espectroscopias Para a caracterização química por técnicas de

espectroscopia, foram preparadas outras 30 amostras de esmalte e 30 de dentina. Estes corpos de prova também passaram por desgaste manual com lixas 220, 320, 500, 800 e 1200 e foram previamente analisados através das técnicas de µ-fluorescência de raios (µEDX-1300, Shimadzu, em 5 sítios, 15kV, 100µA, tempo de leitura de 144s), espectroscopia FT-Raman (espectrômetro RFS 100, Bruker, na região entre 250-4000 cm-1, com excitação por um laser de Nd:YAG, λ=1064.1 nm, 100 mW e 100 varreduras

por espectro) e espectroscopia FT-IR (Spotlight 400, Perkin Elmer, na região de 500-4000 cm-1, em modo de reflectância, 32 varreduras por espectro). Os dados da razão Ca/P pré-irradiação (controle) medidos pelo µ-EDX passaram por teste estatístico (teste de normalidade de Shapiro-Wilk, p=0,05 e teste de análise de variância simples ANOVA, p=0,01) e foram utilizados para separação de dois grupos de esmalte e dois de dentina com médias estatisticamente iguais e, irradiados com laser, como mostra a Tabela 1.

Tabela 1: grupos de esmalte (G1 e G3) e dentina (G2 e G4) e respectivos parâmetros de laser.

Esmalte Dentina Laser de Cu-HBr (510nm, 0,83 J/cm2 por pulso, 20 ns de largura temporal, 12.600 pulsos por segundo, durante 20 s)

G1 G2

Laser CO2-TEA (10,6 µm, 1,2 J/cm2 por pulso, 80 ns de largura temporal, 1 pulso por segundo, 2 pulsos por amostra)

G3 G4

Após a irradiação, as amostras foram

novamente analisadas pelas três técnicas. Para as comparações, os espectros médios de cada grupo foram normalizados em relação ao pico mais intenso. Resultados

AFM As Figuras 1 e 2 mostram imagens

representativas de esmalte e dentina, obtidas por AFM, com área de varredura de 50 µm x 50 µm.

Na Figura 1 (a), que corresponde à amostra de esmalte do grupo controle, nota-se apenas a presença de riscos e resíduos de polimento, sem a presença das microestruturas de hidroxiapatita (bastões). Já a Figura 1 (b) mostra que o tempo de ataque químico de um minuto permite a identificação da estrutura típica de bastões de esmalte em corte transversal ligeiramente oblíquo, uma vez que a seção transversal está elíptica. Na Figura 1 (c) (três minutos), observa-se que o ataque químico começa a dissolver as estruturas e, na Figura 1 (d) (cinco minutos), o ataque químico foi intenso a ponto de descaracterizar a superfície do esmalte e não mais permitir a visualização de estruturas.

Para a dentina, a imagem da amostra controle (Figura 2 (a)) também mostra riscos e resíduos de polimento preenchendo o interior de alguns túbulos dentinários. A imagem para o tempo de um minuto (Figura 2 (b)) mostra que tanto os

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riscos quanto os resíduos de polimento foram removidos, desobstruindo os túbulos dentinários. Já para o tempo de três minutos (Figura 2 (c)), nota-se um princípio de dissolução das estruturas e para o de cinco minutos (Figura 2 (d)), a

dissolução foi excessiva, a ponto de também perder suas características de superfície.

178.77[nm]

20.00 um 50.00 x 50.00 um

590.40[nm]

20.00 um 50.00 x 50.00 um

277.35[nm]

20.00 um 50.00 x 50.00 um

725.38[nm]

20.00 um 50.00 x 50.00 um

Figura 1: micrografias de esmalte por AFM, com área de varredura de 50 µm x 50 µm, de (a) amostra controle, (b) amostra do grupo 1 (1 min.), (c) amostra do grupo 2 (3 min.) e (d) amostra do grupo 3 (5 min.)

Figura 2: micrografias de dentina por AFM com área de varredura de 50 µm x 50 µm, de (a) amostra controle, (b) amostra do grupo 1 (1 min.), (c) amostra do grupo 2 (3 min.) e (d) amostra do grupo 3 (5 min.)

Para as imagens da Figura 1 (b), os valores medidos de eixo menor e eixo maior dos bastões de esmalte foram (3,7±0,6) µm e (8,8±1,4) µm, respectivamente. Na Figura 2 (b), o diâmetro médio de abertura dos túbulos medido foi de (4,0±0,5) µm e a densidade de túbulos, (17.000±0,1) túbulos/mm2.

Espectroscopias Os resultados da razão Ca/P, em porcentagem

molar, para os grupos controles e irradiados de esmalte (~1,92) e dentina (~1,83), medidos pela µ-fluorescência de raios-x, não apresentaram diferenças estatisticamente significantes. Acredita-se que isso se deva à alta penetração do feixe de raios-x, resultando na medida de tecidos mais profundos e não alterados pelos lasers.

Nas Figuras 3 e 4 são apresentadas as médias dos espectros FT-Raman para esmalte e dentina, respectivamente, irradiados com lasers de Cu-HBr e CO2-TEA.

Todos os grupos apresentaram o pico mais intenso em 960 cm-1, referente ao modo vibracional ν1 do componente fosfato (PO4

3-) da hidroxiapatita. Outros picos relacionados aos componentes inorgânicos foram 431 cm-1 (ν2 do PO4

3-), 590 cm-1 (ν4 do PO43-) e a banda entre 990-

1096, que é uma superposição do modo ν1 do CO3

2-(1070 cm-1) e ν3 do PO43- (1042 cm-1)

(YAMADA et al., 2004; CUSCÓ, et al., 1998).,Picos localizados em 1244 cm-1, 1451 cm-1, 1665 cm-1 e 2942 cm-1 foram relacionados aos componentes orgânicos,(amida III, vibrações CH2, amida I e vibrações CH, respectivamente) (SPENCER et al., 2001; SCHULZE et al., 2004). Para o esmalte, devido ao seu baixo conteúdo orgânico (menor que 4% em massa), as bandas orgânicas, quando possível identificá-las, mostraram-se com muito menor intensidade comparadas às mesmas bandas no tecido de dentina.

Somente foram observadas alterações nos espectros FT-Raman de esmalte e dentina irradiados com o laser de CO2-TEA (grupos G3 e G4): ocorreu um aumento de intensidade, a partir de 1130cm-1, provavelmente, resultante da decomposição de proteínas e material orgânico. Assim, através da espectroscopia FT-Raman identificou-se as bandas relativas aos constituintes minerais e orgânicos, porém não foi possível caracterizar as diferentes fases do fosfato de cálcio.

Nas Figuras 5 e 6, são apresentadas as médias dos espectros FT-IR para esmalte e dentina irradiados, respectivamente, com os lasers de Cu-HBr e de CO2-TEA. As freqüências acima de 1750 cm-1 não revelaram a presença de modos vibracionais de interesse.

1.41[um]

1.98[um]

1.91[um]

1.32[um]

20 µm 20 µm 20 µm 20 µm

20 µm 20 µm 20 µm 20 µm ((aa)) ((bb)) ((cc)) ((dd))

((aa)) ((bb)) ((cc)) ((dd))

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250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000 2250 2500 2750 3000 3250

inte

nsid

ade

(u. a

.)

deslocamento Raman (cm-1)

controle laser de CuHBr laser de CO

2

Figura 3: Espectros FT-Raman de esmaltes bovinos irradiados com lasers de Cu-HBr e CO2.

250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000 2250 2500 2750 3000 3250

inte

nsid

ade

(u. a

.)

deslocamento Raman (cm-1)

controle laser de CuHBr laser de CO

2

Figura 4: Espectros FT-Raman de dentinas bovinas irradiadas com lasers de Cu-HBr e CO2.

500 750 1000 1250 1500 1750

inte

nsid

ade

(u. a

.)

número de onda (cm-1)

controle laser de CuHBr laser de CO

2

Figura 5: Espectros FT-IR de esmalte bovino irradiado com lasers de Cu-HBr e CO2.

500 750 1000 1250 1500 1750

inte

nsid

ade

(u. a

.)

número de onda (cm-1)

controle laser de CuHBr laser de CO

2

Figura 6: Espectros FT-IR de dentinas bovinas irradiadas com lasers de Cu-HBr e CO2.

Nos espectros FT-IR dos grupos de esmalte, os modos normais de PO4

3- foram observados em 570 cm-1 (ν2), 604 cm-1 (ν4), 1048 cm-1 (ν3, mais intenso) e em 956 cm-1 (ν1), além de bandas referentes às vibrações de carbonato (CO3

2-) (872 cm-1, 1400 cm-1, 1446 cm-1 e 1540 cm-1) (FEURSTEIN et al., 2005; PON-ON et al., 2008).

No espectro do grupo G3 (esmalte irradiado com o laser de CO2-TEA), nota-se a presença de uma fraca banda em 508 cm-1. Nesse grupo, também se notou a ausência de bandas de CO3

2- e que a banda referente ao modo ν2 do PO4

3- ficou menos intensa que a ν4. Além disso, os picos do modo ν3 do PO4

3- estão cerca de 10 cm-1 deslocadas para a direita em relação às dos grupos G1 e controle. Essas diferenças do grupo G3 podem ser melhor visualizadas nos espectros detalhados da Figura 7 (a), (b) e (c).

500 520 540

inte

nsid

ade

(u. a

.)

número de onda (cm-1)

controle laser de CuHBr laser de CO

2

(a)

500 550 600

inte

nsid

ade

(u. a

.)

número de onda (cm-1)

controle laser de CuHBr laser de CO

2

(b)

1020 1080 1140

inte

nsid

ade

(u. a

.)

número de onda (cm-1)

controle laser de CuHBr laser de CO

2

(c)

Figura 7: Espectros FT-IR salientado as alterações sofridas pelo esmalte irradiado. Em (a), presença de um pico em 508 cm-1. Em (b), diminuição de intensidade do modo ν2 do PO4

3 e, em (c), deslocamento dos picos ν3 do PO4

3-.

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Nos espectros FT-IR de dentina, os modos de PO4

3- apareceram em 560 cm-1 (ν2), 600-603 cm-1 (ν4), 1028 cm-1 (ν3, pico único) e 958 cm-1 (ν1). Os modos de CO3

2-, em 868 cm-1, 1442 cm-1 e 1544 cm-1, sendo os dois últimos sobrepostos por material orgânico (DELA ROSA et al., 2004). No grupo G4 (dentina irradiada com o laser de CO2-TEA), as bandas ν2 e ν4 do PO4

3- apresentaram intensidade maior que as dos grupos G2 (dentina irradiada com o laser de Cu-HBr) e controle, e as bandas de CO3

2- e material orgânico, com intensidades menores. Também foi observada uma banda fraca em 508 cm-1. Discussão

AFM Embora Hannig et al. (2005) tenham observado

que o ácido lático seja um dos mais erosivos para os tecidos dentais duros, em concentrações e tempos de exposição adequados pode melhorar a visualização de estruturas com mínima deformação. Analisando as imagens de AFM, a forma da seção transversal dos bastões de esmalte mostrada na Fig. 1 (b) (1 minuto de ataque ácido), aparentemente, não é alterada pelo ataque químico e o formato elíptico observado está relacionado com o ângulo de corte em relação ao longo eixo do bastão, que pode variar gradualmente da forma circular (corte perpendicular) a retangular (corte paralelo) (EISENMANN, 1994). O típico formato de “buraco de fechadura” visto na Fig. 1 (b), sugere que o ângulo de corte foi preferencialmente oblíquo. Com relação às dimensões, a comparação com o diâmetro típico de bastões de esmalte dental humano (5 - 7 µm) (GE et al., 2005; WATARI, 2005) sugere que as dimensões do esmalte dental bovino apresentaram uma diferença insignificante.

A Figura 2 (b) sugere que o tempo de 1 minuto de condicionamento ácido removeu riscos e resíduos de polimento para as amostras de dentina. No entanto, o diâmetro médio de abertura dos túbulos obtidos no presente estudo foi ligeiramente superior aos valores relatados por Schilke et al. (2000) para dentes bovinos (3,50 µm próximo a polpa e 2,85 µm na metade da espessura da dentina) e maior do que os valores para dentina humana (2,90 µm próximo à polpa e 2,65 µm na metade da espessura da dentina). A densidade de túbulos apresentou excelente concordância com os dados de Schilke et al. (2000) (17.310 túbulos/mm2) para a dentina bovina, Como a dentina humana apresenta maior densidade de túbulos (18.000 – 21.000 túbulos/mm2) e uma ligeira discrepância no diâmetro de abertura dos túbulos, a dentina bovina

pode não ser um substituto ideal para a dentina humana em estudos de adesão de resina.

É interessante observar que, na dentina da região intertubular (Figura. 3 (d)) o ataque químico foi mais acentuado, sugerindo que o ácido lático dissolve a dentina da região intertubular para a peritubular, o que pode ser um possível mecanismo de desmineralização da dentina no processo de cárie. Porém, o contrário foi relatado por outros autores para dentes humanos utilizando ácidos fosfórico (Marshall et al., 1997; Silikas et al., 1999), nítrico (Marshall et al., 1993) e, até mesmo, ácido lático (Kinney et al., 1995). Sem dúvida, mais estudos são necessários a fim de alcançar uma melhor compreensão dos mecanismos de dissolução ácida em dentina.

Espectroscopia Neste estudo também foram observadas

alterações químicas em esmalte e dentina bovina após irradiação com laser CO2-TEA, na fluência de 1,2 J/cm2 por pulso, resultantes do processo de interação fototérmica induzida por laser (YAMADA et al., 2004).

Os espectros FT-IR revelaram um pico de baixa intensidade em 508 cm-1, tanto para esmalte quanto para dentina irradiada, que sugerem a formação de uma fase de fosfato de tetracálcio, como observado por Feuerstein (2005), após irradiação de esmalte dental humano por laser de ArF (λ=193 nm). As modificações de intensidade das bandas ν2 e ν4 do PO4

3- observadas nos grupos G3 e G4, assim como o deslocamento em freqüência da banda ν3 no grupo G3, podem ser atribuídas a uma deformação da estrutura tetraédrica do PO4

3- (CUSCÓ et al., 1998) devido ao rearranjo das moléculas de hidroxiapatita em outras fases do fosfato de cálcio, tais como beta- e alfa- fosfato de tri-cálcio e fosfato de tetracálcio. A identificação das fases cristalográficas através da difração de raios-x, em andamento, poderá corroborar estes resultados. Conclusão

A partir de amostras de esmalte e dentina bovina polidas e submetidas a ataque químico com ácido lático, na concentração de 113,8 mmol/L, pH 3,3 e tempo de exposição de 1 minuto, foi possível caracterizar as estruturas de bastões e túbulos dentinários por microscopia de força atômica. Os resultados mostraram que, as seções transversais de bastões de esmalte apresentaram-se elípticas (eixo maior médio 9±1 µm; eixo menor médio 4,8±0,6 µm) e o diâmetro médio das aberturas dos túbulos dentinários foi de 4,1±0,2µm.

Page 6: CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA E ESTRUTURAL DE DENTES … · composição química de tecidos dentais. Este estudo teve como objetivos caracterizar, por microscopia de força atômica

XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba

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Na caracterização química por espectroscopias FT-Raman e FT-IR, foram identificadas bandas relativas aos constituintes minerais e orgânicos. Partindo-se de grupos com razão Ca/P estatisticamente iguais, foram observados, nos espectros FT-IR, indícios de formação da fase de fosfato de tetracálcio e deformações da estrutura tetraédrica do PO4

3- nas amostras irradiadas com o laser de CO2-TEA. Para o laser de Cu-HBr, não foram observadas modificações químicas nos tecidos de esmalte e dentina bovinos. Referências - BACHMANN, L.; DIEBOLDER, R.; HIBST, R.; ZEZELL, D. Infrared Absorption Bands of Enamel and Dentin Tissues from Human and Bovine Teeth. Applied Spectroscopy Reviews, v. 38:1, p. 1-14, 2003. - CATE, R. T. Histologia Bucal: Desenvolvimento, Estrutura e Função . 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. - CUSCÓ, R.; GUITIÁN, F.; AZA, S.; ARTÚS, L. Differentiation between hydroxyapatite and β-tricalcium phosphate by means of µ-Raman spectroscopy. Journal of the European Ceramic Society , v.18, p.1301-1305, 1998. - DELA ROSA, A.; SARMA, A, V.; LE, C. Q.; JONES, R., S.; FRIED, D. Peripheral thermal and mechanical damage to dentin with microsecond and sub-microsecond 9.6 µm, 2.79 µm, and 0.355 µm laser pulses. Lasers in Surgery and Medicine , v.35, p. 214–228, 2004. - EISENMANN, D.R., 1994. Enamel structure. In: Ten Cate, A.R. (Ed.), Oral Histology: Development, Structure and Function. 4th ed. Mosby-Year Book Inc., St. Louis, MO, p. 239–256. - FEURSTEIN, O.; MAYER, I.; DEUTSCH, D. Physico-chemical changes of human enamel irradiated with ArF excimer laser. Lasers in Surgery and Medicine , v. 37, p. 245-251, 2005. - FOWLER, B.O.; KURODA, S., Changes in heated and in laser-irradiated human tooth enamel and their probable effects on solubility. Calc. Tissue Int ., v. 38, p. 197-208, 1986. - GE, J., CUI, F.Z., WANG, X.M., FENG, H.L. Property variations in the prism and the organic sheath within enamel by nanoindentation. Biomaterials , v.26, p. 3333–3339, 2005 - HANNIG, C., HAMKENS, A., BECKER, K., ATTIN, R., ATTIN, T. Erosive effects of different acids on bovine enamel: release of calcium and phosphate in vitro. Arch. Oral Biol. v.50, p. 541–552, 2005 - KINNEY, J.H., BALOOCH, M., HAUPT, D.L., et al. Distribution and dimensional changes in human dentin

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